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Gabriel Bicho
Gabriel Bicho
E como foi sua aproximação com as artes, seu início?
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(PORTO VELHO-RO, 1989)
CASA DO ARTISTA/ESPAÇO VISAGE, EM 29 DE ABRIL DE 2015.{ É muito engraçado, porque é uma conversa que eu tenho até hoje com meus pais, porque a minha família não tem um histórico de relação com as artes. Não existe nenhuma profissão na minha família que tenha relação com história, com literatura ou com as artes. Minha família, na verdade, é muito de enfermeiros, advogados e contadores. Eu lembro que em torno ali dos quinze, dezesseis anos, eu ganhei uma câmera da minha mãe, essa câmera foi comprada na Bolívia e era pequeninha. Na verdade, ela era uma filmadora, mas eu usava mais a função de fotografar. E foi a partir daí que começou essa minha relação, esse despertar com a imagem. E ao longo dos anos esse gosto foi só crescendo, né? Essa vontade de produzir e esse apreço pela fotografia foi evoluindo.
Quando eu fiz dezenove anos, eu queria ir pra São Paulo para estudar fotografia. Eu tinha isso na minha cabeça, mas fui podado pelos meus pais. Na época eles falaram que eu era muito novo e que não aguentaria uma cidade grande e eu
acabei ficando em Porto Velho. Como eu fazia muito esporte na época, fui fazer um curso que eu não queria, mas fui só para agradar os meus pais. Isso é um processo natural de filhos que moram com os pais. Só que chegou um momento que eu não aguentava mais. A fotografia falava tanto, me instigava tanto, estava me provocando tanto, que depois do quarto período de Educação Física, eu com quase vinte e um anos, eu decidi abandonar o curso e ir embora para São Paulo. Tranquei o curso e fui para São Paulo estudar fotografia. Isso também foi influência de alguns amigos em São Paulo que já eram fotógrafos, me instigavam falando das possibilidades, que o curso era muito bom. Então, eu fui fazer o curso técnico de três anos. Nesse processo, eu já estava tendo uma relação muito mais íntima com a fotografia. E aí, nesse período, fiz outros cursos extras que foram muito importantes pra mim. Aí meu mundo começou a ganhar amplitude. Foi nesse período, final de 2012 pra 2013, que eu comecei a ver a imagem de uma maneira mais atual, contemporânea, e comecei a pensar a fotografia relacionada a outras manifestações. Foi quando eu construí umas das minhas primeiras séries, a 2por4. Essa série participou do Arte Pará, em 2013. Eu estava voltando para Porto Velho e aí já tinha um material construído do Edifício Copam e fotografei o Galpão da Estrada de Ferro aqui em Porto Velho. E desde então, eu venho pensando a fotografia unida a outras manifestações. O curso de artes aqui na UNIR tem potencializado isso. E hoje eu me encontro nesse caminho, pensar a fotografia com outras manifestações e também tenho pensado muito nas palavras. Eu tenho sentido nesses últimos tempos que eu preciso escrever mais sobre os meus trabalhos.
Como foi a sua volta pra cá? O seu sentimento?
A volta pra cá foi doída porque eu não queria voltar. Eu concluí o curso de fotografia e estava entrando no curso de artes, lá em São Paulo. Mas por conta de uma doença que eu constatei, que é o ceratocone, eu fiquei nessa berlinda. Eu precisava fazer as cirurgias, e quem bancou as cirurgias foram meus pais, em 2012. E essas cirurgias foram caras. E minha mãe acabou falando: “Se você precisa eu vou pagar, mas você vai ter que voltar, porque eu não vou conseguir continuar te ajudando da forma que eu te ajudava, pagando as mensalidades da cirurgia.” Então, eu não tive outra opção. Eu não tinha mais uma relação com a cidade. Voltei como se fosse um novo morador. Isso eu fui construindo ao longo do tempo, com os trabalhos que foram aparecendo, com as oportunidades e também através do curso na Universidade. Mas eu acho que muito por essa influência forte que eu tive com São Paulo, essa vivência intensa, São Paulo é muito intensa. Você tem possibilidades de cursos, de contatos, que é incrível e você não precisa pagar por isso, você só precisa ir. E quando eu retornei para Porto Velho eu senti muita falta disso, porque aqui não tem um circuito, não só de fotografia, mas de galerias, de museus, de cursos mais contemporâneos. Isso não existe em Porto Velho. E eu senti a necessidade de construir um trabalho que falasse isso, foi quando o 2por4 veio à tona. No começo foi uma angústia voltar, mas depois eu vi que regressar é importante.
Qual é o teu momento de trabalho agora?
A relação com a Mídia Ninja foi muito importante, é um jeito muito legal de criar narrativas colaborativas. Quando eu voltei de São Paulo, eu voltei muito influenciado pela Cris [Bierrenbach] e eu fotografava muito a rua, o cotidiano de Porto Velho, foi nesse momento que começaram a surgir oportunidades: Festcine, Mídia Ninja, Greenpeace... Isso pra mim foi muito legal, porque você criar uma relação íntima com certas comunidades e fazer uma produção sobre aquele local, aquela região, pra mim é incrível, eu acho isso maravilhoso. Só que nesse processo, eu comecei a fazer artes na UNIR e comecei a ser muito influenciado pelos professores, pelas leituras. E aí, naturalmente eu comecei a pensar essas outras séries: Ceratocone, Pele Sufocada... e fotografia com texto, fotografia com palavra, coisa que eu nunca tinha pensado, um trabalho meu, fotográfico, que conseguisse inserir palavras ali dentro e hoje eu estou conseguindo inserir. Mas eu não tenho vontade de deixar de transitar pelo campo do fotojornalismo, pelo contrário. Se as oportunidades aparecerem e forem boas pra mim, não tem como negar, é algo que de fato eu gosto muito.
Mas hoje, o que eu sinto é que eu estou pensando a fotografia mais na forma textual. Por exemplo, eu posso contar nos dedos, de janeiro até hoje, quantos trabalhos eu fiz. E eu fiz poucos porque de fato eu estou tentando desapegar mais do obturador e pensar mais na minha mente, transcrever a minha mente, todas as coisas que eu estou pensando internamente. Então eu estou muito nessa relação de texto mesmo do que da produção de fato. Eu construí algumas coisas esse ano, mas tudo que eu construí não tem nada a ver com fotografia. Tem trabalhos de pintura, de colagem... e a fotografia tem sido construída internamente hoje pra mim. Ela não vai sair de mim. Mas hoje eu sinto essa necessidade mais de me expressar de forma textual do que com a imagem. Dois mil e quinze começou assim pra mim, eu não sei onde isso vai dar, mas também não me importo onde isso vai dar. Essa ideia de dormir sem saber o que vai acontecer amanhã é ótima pra mim.
Quando eu retornei para Porto Velho eu senti muita falta disso, porque aqui não tem um circuito, não só de fotografia, mas de galerias, de museus, de cursos mais contemporâneos. Isso não existe em Porto Velho. E eu senti a necessidade de construir um trabalho que falasse isso, foi quando o 2por4 veio à tona. No começo foi uma angústia voltar, mas depois eu vi que regressar é importante.