Offereço meu original como lembrança: circuito social da fotografia nos sertões da Bahia (1900-1950)

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Barthes (1981) suspeitava que a fotografia tivesse alguma relação com essa “crise da morte”. A fotografia é coetânea desse sentimento de mudança diante do inevitável momento da morte e foi requisitada como antídoto para essa crise. A memória do morto foi cultivada através da imagem fotográfica como forma de escamotear a própria morte ou como forma de enfrentamento do luto. Desaparecia o corpo, ficava a imagem como meio de reintegração social do morto. Ruby (2001) aponta que na América da Era Vitoriana emergiram três estilos de fotografias relacionadas ao tema da morte. Dois deles idealizados como mecanismos de “negar a morte”, ou seja, simular os defuntos de forma que não parecessem que morreram realmente, e o terceiro estilo em que se retratavam os mortos como um “objeto de dor”, diante de parentes e pessoas queridas enlutadas. O primeiro estilo foi marcado por uma convenção da época, intitulada de “último sono”, na qual o fotógrafo procurava transmitir uma impressão de que a pessoa estivesse “adormecida”, ao invés de morta, colocando o corpo em algum mobiliário doméstico. O segundo, uma variação da primeira, procurava disfarçar a ideia da morte, como um simulacro, deixando a pessoa com olhos abertos ou posando de diversas maneiras. Por fim, no final do século, o corpo passou a ser fotografado no interior do caixão, em enquadramento isolado ou com acompanhantes ao redor do féretro.

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