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legislação do patrimônio histórico
legislação do patrimônio histórico
Além da legislação urbana, nesse ponto atentamos também para as leis advindas do tombamento do Complexo Ferroviário de Bauru (Figura 15) pelo órgão de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (CONDEPHAAT). O tombamento, deliberado em 2017, é delimitado pelo perímetro de proteção, e inclui o prédio da Estação Ferroviária, os prédios de administração e assistência, um conjunto de residências dos funcionários da EFNOB, oficinas, almoxarifado e toda a infraestrutura demandada pela ferrovia.
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Figura 15: Carta de Tombamento do Complexo Ferroviário de Bauru. Fonte: (RESOLUÇÃO SC-22 (2018).
São estabelecidas diretrizes de modo a assegurar a proteção dos bens de valor histórico, como:
I-As intervenções deverão ser previamente aprovadas pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo –CONDEPHAAT, pautadas por critérios científicos de preservação patrimonial. [...] IV - Para o Pátio Ferroviário, no caso da conversão produtiva e urbanística da
área, com a supressão das linhas férreas, dever-se-á preservar um ou mais
segmentos de vias, com vista à preservação de referência(s) que evoque(m) a trajetória ferroviária do local, mantendo-se a área predominantemente não edificada devido à importância da preservação de eixos visuais entre os edifícios listados e da permeabilidade do solo; V - Permitem-se os tráfegos de composições nas vias férreas e de veículos automotivos nas vias imediatamente lindeiras e interiores ao perímetro de proteção, desde que não comprometam a preservação e integridade dos
elementos listados
1º. Estabelecem-se os seguintes parâmetros para as áreas envoltórias supra: I - Para o inciso I do caput deste Artigo: gabarito máximo de 12 (doze) metros de altura, contado a partir da cota média da testada dos lotes voltados para suas respectivas vias de acesso. II - Para o inciso I do caput deste Artigo: a. Gabarito máximo correspondente à altura da platibanda da Estação Ferroviária da EFNOB; [...] Parágrafo Único. Para o perímetro de proteção, os elementos listados e nos imóveis inseridos nas áreas envoltórias supracitadas, os elementos de identificação visual deverão ser aprovados pelo CONDEPHAAT, ficando vedada a instalação de anúncios publicitários. Artigo 6º. Quaisquer intervenções no interior do perímetro de proteção, nos
edifícios listados e na área envoltória relacionada deverão ser previamente
aprovadas, mediante projeto a ser submetido ao CONDEPHAAT. (RESOLUÇÃO SC22, DE 22-3-2018)
Ou seja, além da preservação dos edifícios, deve haver a preservação das áreas envoltórias e dos eixos de visualização entre eles, que são submetidas
aos parâmetros como a limitação do gabarito, principalmente visando preservar a visualização do conjunto patrimonial e a preservação dos elementos de identificação visual. Outras Zonas pertinentes ao recorte estão sintetizadas na Tabela de Zoneamento, cujas informações foram extraídas da atualização da Lei de Uso, Parcelamento e Ocupação do Solo, e sintetizadas pela autora (Quadro 2).
Quadro 2: Zoneamento.
Fonte: LEI LPUOS, 2022
_aspectos socioespaciais
O Plano Diretor Participativo do Município de Bauru de 2008, ainda vigente, regularizado pela Lei 5631, dispõe que toda propriedade deve atender a
função social e que o ordenamento e controle do uso do solo deve evitar “a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou
não utilização” (Art. 3º). Entretanto, o produto diagnóstico do Plano Diretor Participativo (p.47, 2020) declara ‘’o grande problema do Setor 1, a área central, está relacionado ao grande número de imóveis vazios, desocupados e/ou abandonados’’. Um
levantamento da Polícia Militar feito em 2011, contou mais de 200 imóveis desocupados que não cumpriam sua função social. Foram 110 prédios
enquadrados pela lei do IPTU Progressivo no Tempo (JORNAL DOIS, 2018). O produto diagnóstico acrescenta ‘’o setor central tem por característica
a forte relevância histórica e os diversos bens tombados’’. Entretanto, muitos
desses bens importantes e históricos encontram-se na categoria de imóveis mencionada. Imóveis esses comumente pertencentes à órgãos públicos estaduais ou municipais, e até mesmo a ferrovia. Como discutido em capítulos anteriores, a desvalorização das áreas do
centro principal e a subsequente valorização de centralidades em outras partes da cidade, impacta diretamente na migração de segmentos do comércio e do direcionamento dos investimentos para outras áreas. O processo de migração
atrela-se à tendência de esvaziamento da área, sendo ela causa e consequência, simultaneamente.
Aspecto compareceu nas entrevistas realizadas. Paulo, de 72 anos, comerciante e proprietário no centro de Bauru há 27 anos, após declarar seu incômodo e insatisfação com relação à insegurança, às tentativas de furto já sofridas e à poluição sonora do bairro, foi questionado sobre as possíveis vantagens de habitar o centro, o comerciante expôs:
Ultimamente não está tendo vantagem nenhuma, a Zona Sul tem melhores condições de trabalho do que aqui no centro. Nós mesmos já construímos propriedade lá pra fugirmos do centro. Já coloquei o prédio a venda aqui que eu vou fechar a empresa e passar a atuar na Zona Sul em um outro negócio.
Além do exemplo de Paulo, outros estabelecimentos seguem o mesmo caminho. A tradicional loja de roupas Casa Carvalho, localizada no Calçadão da Batista desde 1924, atualmente fecha as portas e se dirige à zona sul. Segundo o JCNET, em reportagem veiculada em setembro de 2021, ‘’A decisão
dos proprietários foi de melhor atender a clientela, que está localizada, em sua maioria, na região dos Altos da Cidade’’. Demonstrando, portanto, que ainda hoje o processo de migração está em curso.
Em outra parte do centro, há as ruínas do edifício do INSS, uma edificação demolida em 2019, após passar uma década sofrendo com depredações e a ação do tempo, foi
ocupada pela população em situação de
rua. Após ser cobrado pelo Ministério Público Federal, o INSS afirmou não ter condições financeiras de recuperá-lo, optando pela demolição. Atualmente, no local do antigo edifício demolido, há ruínas, pedaços da construção antiga e lixo. Sebastião, vigia de carros há mais de 11 anos no centro, ao lado do INSS, quando questionado sobre o processo de abandono . do edifício e sua demolição, ele apresenta sua insatisfação quanto a inutilização do terreno, afinal, sua fonte de renda é extraída a partir dos carros que estacionam abaixo do viaduto (Figura 1). Com a ausência do edifício o movimento diminuiu, e após isso, a situação de deterioração transformou o espaço, trazendo insegurança, como ele relata:
Foto 1: Sebastião em frente à área mencionada. Fonte: Trabalho de campo, por HERNANDES (2021).
Abandonaram o prédio, os “noia” invadiram, ai “lotou” de sujeira, a sujeira tinha essa altura. – fazendo um gesto indicando a canela - Os policiais não venciam correr atrás deles, eles iam no centro, roubavam e traziam material para esconder aqui e daqui já passava para a favela. Ao invés de reformar, fazer um muro mais alto, ou fazer um salão para o pessoal da cultura, eles falaram: quer saber? Vamos derrubar tudo, e derrubou.
Continuando, quando questionado sobre o que poderia melhorar na área, Sebastião responde:
Sabe o que poderia melhorar? Dizem que o fórum tá cheio de arquivo que não vence, ta aí – apontando para o terreno em ruínas, em sugestão. Isso aqui é do estado! Uma delegacia, uma creche para as crianças, um ginásio maior para escolarizar os adultos, ou senão, um postão de saúde, um mini hospital, ai ó!
Tem um terreno no centrão da cidade, tudo parado.
Quando questionado se acreditava que a demolição do edifício fora positiva, negativa ou irrelevante para a questão social da área, o mesmo entrevistado acrescentou:
Não mudou nada. Melhorou só porque agora não tem mais aquele monte de “noia”, viviam de monte aqui, era perigoso. Nesse ponto melhorou, os policiais espantaram tudo eles daqui, lá para o lado da favela. Quando eles acham um por aqui eles “metem” a borracha.
A solução empregada não passou perto de solucionar quaisquer problemas da área central, que carece infraestrutura, e atualmente, 12 anos após o abandono da edificação, é desconhecida a existência de planos ou projetos para o terreno vazio.