Lá estavam as mesmas árvores, de sentinela, algumas já começavam a pintar as folhas de tons de vermelho e amarelo, também elas se preparavam para a chegada do lugares, o pequeno parque com o escorrega e os baloiços também já estavam ocupados pela debandada de crianças que tinha saído desvairada, a correr, das salas de aula. Mas então, o que havia de novo ali no recreio e que a Alice não estava a conseguir distinguir?
- Larissa, não achas que o nosso recreio está diferente? – perguntou a Alice à amiga,
- Sim, são os novos alunos. - a Larissa deixou cair estas palavras e não disse mais nada, parece que não estava ali...
A Larissa conhecia bem a face da discriminação e aquela sensação de não se pertencer a um lugar. Ela, os irmãos e os pais tinham vindo do Brasil, chegaram a Portugal a meio do 2.º ano letivo. Deixaram tudo para trás: a casa, a família, os amigos, os empregos, a escola, foi muito difícil lidar com tantas diferenças. Naquele tempo, a Larissa chorava sozinha, todos os dias, no seu quarto. Sentia tantas saudades do seu país, de tudo e de todos, mas não queria que os pais ficassem ainda mais tristes, queria ajudá-los, por isso disfarçava a sua dor. Os pais também não queriam abandonar tudo, tinham lá uma boa vida, eram felizes... Mas não conheciam o sentimento de segurança, viviam sobressaltados e ameaçados pela violência das ruas, pela instabilidade social e política.
- Vês este colar que trago comigo? – perguntou a Larissa, com a voz trémula, interrompendo as palavras duras da amiga.
- Sim, é muito bonito! Parece um coração partido ao meio. O que significa?
- Quando deixei o Brasil, a Clara, a minha melhor amiga, ofereceu-mo. Ela ficou com a outra metade, assim nunca nos esquecemos uma da outra e a distância fica mais curta...
- Estou a perceber, queres dizer que tens saudades, não é? - percebeu, por fim, a Alice.
- Sim, e estes alunos novos também devem sentir falta de tudo o que deixaram para trás, nos seus países de origem. Eles precisam da nossa amizade, foi assim que eu consegui superar tantas mudanças.
Por momentos, a professora Josefa, que também lhes queria falar sobre os refugiados, assumiu a postura de um mensageiro. Ligeiramente inclinada para a frente, olhou bem todos os alunos e, depois de um momento
- O mundo vive hoje uma crise de refugiados. Em muitos países, há guerras, perseguições políticas, vários tipos de discriminação e, infelizmente, também são palco de catástrofes naturais. Por motivos como estes, pessoas veem-se forçadas a abandonar os seus países, pois muitas vezes, se lá devagarinho sobre cada um, uma chuva miudinha que ao início não se sente, mas que depois acaba por molhar e encharcar.
A Andrea, que dobrou a atenção para perceber a professora, ganhou coragem e questionou, num espanhol arrastado, mas que todos perceberam: - E para onde podem ir essas pessoas? Podem refugiar-se em qualquer país?
- A forma como os refugiados são recebidos no país de acolhimento depende das leis de cada um. Contudo, há protocolos internacionais que obrigam as nações a darem asilo e a não enviarem, através da força, os refugiados para os seus lugares de origem.
Aproximava-se a hora do almoço, roncavam as barrigas de fome, mas na cabeça de cada um havia fartança... de informação!
Há coisas de adultos que custam entender Como todos gritam, guerras que fazem sofrer
E como a andorinha nos traz o verão
Há quem venha de longe à espera de compreensão
No meu coração tenho um lápis de cor
Se me abraçares pinto-te com o meu amor
E podemos pintar o mundo
Há coisas de adultos que nem quero ver
Um mundo a preto e branco onde ninguém quer saber Se olhares p’ra mim e me deres a mão Pode ser tão fácil ser feliz em união