Solicitadoria e Ação Executiva | Estudos #1

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CÂMARA DOS SOLICITADORES

SOLICITADORIA E AÇÃO EXECUTIVA ESTUDOS #1 MAIO 2013



CÂMARA DOS SOLICITADORES

SOLICITADORIA E AÇÃO EXECUTIVA ESTUDOS #1 MAIO 2013


LABOR IMPROBUS

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SOLICITADORIA E AÇÃO EXECUTIVA ESTUDOS #1


OMNIA VINCIT

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NOTA INTRODUTÓRIA

Caros colegas, estagiários, formadores e estudantes universitários,

A

o longo do tempo, muitos trabalhos têm vindo a ser desenvolvidos no âmbito das mais diversas áreas de estudo associadas à solicitadoria e à ação executiva. Assim sendo, pretendendo-se conservar esses contributos intelectuais e ambicionando-se que também as gerações vindouras venham a conhecê-los, considerou-se que a melhor alternativa para alcançar tais objetivos seria compilar os mesmos numa edição anual. Este desafio foi dirigido não só aos nossos associados, mas também aos estagiários, formadores e estudantes, pois estamos conscientes de que muitos poderão ser os contributos oriundos do meio académico dado o aumento evidente do número de licenciaturas e mestrados em solicitadoria. Lançado o apelo, foram muitos aqueles que colaboraram connosco, enviando trabalhos de carácter científico que se debruçavam sobre temáticas de inquestionável interesse para a classe. Após a avaliação e a seleção dos trabalhos apresentados, trabalho que ficou a cargo de uma comissão editorial, temos agora, nas nossas secretárias, uma nova ferramenta: aquela que se espera que seja a primeira de muitas compilações de trabalhos sobre a solicitadoria e a ação executiva. Como esperávamos, nasceu mais um marco na História de uma classe que não desistiu de acompanhar o avançar dos tempos. Afinal de contas, pensar o passado, o presente e o futuro é o grande objetivo deste projeto, cujo sucesso, hoje mais palpável, com cheiro a papel, também depende de si. Obrigado. O 1.º Vice-presidente do Conselho Geral da Câmara dos Solicitadores, Paulo Teixeira

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Coordenador Paulo Teixeira Colaboram nesta edição: Ana Márcia do Amaral Vieira, Carlos José Matos, Carlos Marcelino, Francisco Moreira Braga, Manuel de Almeida, Nuno Abranches Pinto, Rui Miguel Simão, Rute Couto, Susana Ferreira dos Santos, Timóteo de Matos Conselho Geral Tel. 213 172 063 | Fax 213 534 870 c.geral@solicitador.net Conselho Regional do Sul Tel. 213 534 862 | Fax 213 534 834 c.r.sul@solicitador.net Conselho Regional do Norte Tel. 222 074 700 | Fax 222 054 140 c.r.norte@solicitador.net Design Atelier Gráficos à Lapa www.graficosalapa.pt Impressão ACD Print, S.A. Tiragem 4 000 Exemplares Periodicidade Anual ISSN 2182-9225 Depósito legal 358745/13 Propriedade Câmara dos Solicitadores Av. José Malhoa, n.° 16, 1.°-B2, Edifício Europa, 1070 – 159 Lisboa Tel. 213 172 063/4/5 Fax 213 534 870 c.geral@solicitador.net www.solicitador.net

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ÍNDICE

ACÇÃO EXECUTIVA: A BUSCA DE “BOAS PRÁTICAS” E A “ABSOLVIÇÃO” DOS TRIBUNAIS Ana Márcia do Amaral Vieira

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APREENSÃO DE DOCUMENTOS E IMOBILIZAÇÃO DE VEÍCULOS PENHORADOS – OFÍCIOS DAS AUTORIDADES POLICIAIS Carlos Marcelino

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MERCADO DE HABITAÇÃO EM PORTUGAL – MUDANÇA DE PARADIGMA Francisco Moreira Braga

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SIMULAÇÃO, EVASÃO FISCAL, PLANEAMENTO FISCAL E CLÁUSULAS ANTI-ABUSO Manuel de Almeida

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CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA FASE INICIAL DA AÇÃO EXECUTIVA NA EXECUÇÃO PARA PAGAMENTO DE QUANTIA CERTA Nuno Abranches Pinto

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ALTERAÇÕES AO PLANO CONVENCIONADO NO CONTRATO DE EMPREITADA Rui Miguel Simão

87

A PRIVACIDADE DOS CONSUMIDORES Rute Couto

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O REGIME JURÍDICO DO CONTRATO DE FRANCHISING Susana Ferreira dos Santos

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BALCÃO ÚNICO DO SOLICITADOR BUS Carlos José Matos e Timóteo de Matos

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ACÇÃO EXECUTIVA: A BUSCA DE “BOAS PRÁTICAS” E A “ABSOLVIÇÃO” DOS TRIBUNAIS ANA MÁRCIA DO AMARAL VIEIRA Juíza de Direito, Vogal para a Comissão da Eficácia das Execuções por Deliberação do Conselho Superior de Magistratura e formanda do Curso de Especialização de Gestão e Organização da Justiça (CES, OPJ, UNIFOJ, FEUC, CSM)

I. INTRODUÇÃO

A

ideia do tema nasce da tentativa de unificar os ensinamentos (Conceptualização, gestão recursos humanos, financeiros, técnicos, do conhecimento, comunicação e gestão processual) obtidos no contexto da frequência do Curso de Especialização Gestão e Organização da Justiça, com a experiência profissional de 18 anos como magistrada Judicial na área cível, visando dar um breve contributo para a implementação daquilo a que se poderia denominar: «Boas Práticas na tramitação executiva». A escolha deste segmento dos nossos tribunais funda-se na prática pessoal como Juíza dos Juízos de Execução do Porto (titular do 1.º Juízo, 3.ª Secção) desde 21-10-2004 até 24-7-2009 (durante pelo menos 5 anos – tendo estado a acumular funções na 2.º Secção do 1.º Juízo desde 21-10-2004 até 13-5-2005), e dado ter sido nomeada, desde 11-9-2012, pelo Conselho Superior da Magistratura como Vogal do Plenário da Comissão para a Eficácia das Execuções.1 O meu início de funções nos Juízos de Execução do Porto coincidiu com a sua instalação, altura em que foram recebidos processo executivos das Varas Cíveis, Juízos Cíveis e da Pequena Instância Cível da Comarca do Porto, sendo do conhecimento público as dificuldades na distribuição do elevado número de processos, nos então criados Juízos de Execução do Porto) – o que não impediu a realização de um trabalho de organização e gestão que logrou ter eficácia quanto à tramitação dos processos. No contexto da experiência profissional de 18 anos como Magistrada Judicial tramitei sempre execuções e apensos, dado que à excepção dos anos de ingresso e primeiro acesso (São João da Pesqueira e Marco de Canaveses) sempre trabalhei exclusivamente na área do direito Cível (Porto, Matosinhos) e exerci ainda as funções de Juiz Presidente nos juízos de execução do Porto. Igualmente frequentei e conclui a área Curricular do Mestrado na Faculdade Portucalense, tendo tido duas cadeiras que se relacionam com os processos de natureza executiva: Direito do Consumo e Direito Processual Civil (tendo tido como docente o Mestre Paulo Pimenta conhecido doutrinador nessa área do processo executivo e membro da Comissão para a Revisão do Código de Processo Civil) e sou membro do Instituto Português do Processo Civil. 1

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Acção Executiva: A Busca De “boas práticas” E A “absolvição” Dos Tribunais

RESUMO A acção executiva nacional devido a assimilar grande parte da pendência processual nos nossos tribunais – tendo-lhe valido a pertinente comparação com um «Tsunami»* –, tem sido mencionada como uma das principais causas da imagem de morosidade da Justiça, o que torna imperativo, neste cenário e no actual contexto da Reforma do processo Civil, realizar uma reflexão visando dar um contributo essencialmente pragmático quanto aquilo que poderão vir a ser «boas práticas» a realizar no processo executivo. Nessa pesquisa pela eficácia dos processos executivos encontraremos vários tipos de sugestões de melhoramento que envolvem toda a sociedade, e poder executivo e legislativo, e face à circunstância de os Tribunais não terem a maldição do «Toque de Midas»**, poderemos formular a seguinte questão: A Acção Executiva «Absolverá» os Tribunais?

O presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), Noronha Nascimento, defendeu na cerimónia solene de abertura do ano judicial (2011) que o grande problema da Justiça actualmente é a acção executiva (cobrança de dívidas): “O nosso maior tsunami é o processo executivo”, afirmou, revelando que “dois em três processos são execuções” – http://www.sabado.pt/Arquivo/Ultima-Hora/Sociedade/Noronha-Nascimento-quot;Onosso-maior-tsunami-e.aspx. A acção executiva (cobrança de dívidas pela via judicial) é hoje um dos maiores problemas da justiça. Só em 2011 deram entrada nos tribunais mais 247 mil acções executivas que se juntaram aos 1,2 milhões de processos pendentes, sendo que em 2002 estavam pendentes 516.780 execuções, em 2007 estavam pendentes 700 mil execuções, em 2010 estavam pendentes cerca de um milhão de acções executivas. **  Segundo a mitologia grega, Midas foi um rei que viveu na Frigia no século 8 a.C., que possuía mais ouro que qualquer pessoa no mundo, todavia não estava satisfeito. Segundo a lenda numa noite um homem vestido de branco apareceu diante do rei Midas e concedeu-lhe um desejo: O rei imediatamente desejou ter o toque de ouro; assim todo o que ele tocasse se transformaria em ouro. Quando Midas acordou pela manhã viu que seus lençóis de linho haviam se transformado em ouro puro, ao tocar na sua casa também ocorreu o mesmo. Quem não desejaria ter esse toque? Mas a história não termina com esse final feliz, porque o rei quando tocou no seu pão viu que o mesmo se transformou em ouro e tudo mais em que tocava, ficou assustado e apreensivo então pensou: “se a comida vira ouro o que vou comer?”, nesse instante sua filha Aurélia aparece, o rei sem pensar tocou nela e ela se transformou numa estátua de ouro. Como é uma lenda e toda lenda tem uma moral da história, o ser vestido de branco aparece novamente ao Rei e lhe pergunta: Porque esta triste, não lhe dei o que mais amava? E o rei responde: não, o que eu mais amava era minha filha! Continuou o ser reluzente: Então quer me dizer que prefere um pão e um cálice de água do que todo o ouro do mundo? Sim responde o rei e prossegue, dou toda a minha fortuna se me tirar essa maldição que coloquei sobre mim e a minha família, lamentou Midas (Fonte: http://pt.shvoong.com/humanities/1693635-toque-midas/#ixzz2GvaShqXL). *

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Ana Márcia Do Amaral Vieira

Pese embora, essas dificuldades e a distribuição ter sido de pelo menos 13.000 processos para cada Juiz, e de até Setembro de 2005 ter estado instalado apenas um Juízo de Execuções no Porto (1.º Juízo), de durante o seu primeiro ano de vida, terem estado em exercício de funções apenas duas magistradas, e de ter sido o 1.º Juízo a receber a distribuição dos processos mais antigos, foi possível ter a Secção em dia e em pleno e integral funcionamento, sobretudo nos apensos declarativos (oposição à execução à penhora, embargos de Terceiro, graduações de créditos, incidentes, cumprindo-se os prazos processuais de marcação de julgamentos, sentenças, saneadores e despachos). Ancorando-me nessa experiência cumpre-me referir que a eficácia na tramitação das execuções e apensos teve em conta a gestão da Secção e a cooperação dos Funcionários tendo sido dado Provimentos visando o bom andamento dos processos, não tendo tal esforço de gestão e eficácia impedido que os julgamentos fossem feitos de forma célere (1 a 2 meses de dilação) e que as sentenças e saneadores fossem proferidos nos seus prazos legais e com análise detalhada da doutrina e jurisprudência. Outro segmento muito relevante que contribui para a eficácia traduz-se na necessidade de se estabelecerem boas relações profissionais com os Agentes de Execução, Advogados, e todos os restantes Operadores Judiciários e todos os utentes da Justiça. Assim, procurarei apenas realizar uma breve reflexão (atenta a limitação de tempo disponível) ou dar um contributo quanto ao novo diploma baseado na experiência profissional na área em apreço conjugando os ensinamentos obtidos no Curso de Especialização de Gestão e Organização da Justiça. Esta análise visa encontrar pistas para um contributo para a Reforma do Processo Civil – Acção Executiva – tendo como cenário a anunciada reforma do Processo Civil – e parcialmente tem por base a reflexão que realizei sob solicitação do Conselho Superior da Magistratura, em Outubro de 2012, na sequência de nomeação como Vogal para a Comissão para a Eficácia das Execuções, e sob solicitação da referida Comissão da Eficácia das Execuções2 quanto à análise do Projecto de Diploma do novo Código de Processo Civil e projectos da Lei de Organização do Sistema Judiciário e Regime de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciários, centrada apenas no segmento da acção executiva face à natureza e objectivos da Comissão para a Eficácia das Execuções. No fundo indo buscar «inspiração» na reforma do Código de Processo Civil em curso, e a actual conjuntura nacional, e à experiência profissional no sector, conjugando com os ensinamentos do Curso de Gestão, pretendia lançar o debate sobre algumas opções legislativas e práticas visando introduzir alguns melhoramentos ao nível da eficácia da acção executiva.

II. COMEÇO, SE ME PERMITEM, POR LANÇAR UM PEQUENO DESAFIO AO COLOCAR AS SEGUINTES QUESTÕES: – A Acção Executiva poderá «absolver» os Tribunais de uma imagem negativa? – A acção Executiva devido à ausência do «Toque de Midas» por parte dos Magistrados, irá «absolve-los» da imputação de morosidade e ineficácia ? – A acção Executiva por não estar desde 2008 sujeita ao controlo do Juiz de Execução, irá «absolve-lo» dessa imagem de «crise» ? Em resumo: Se a reforma da acção executiva iniciada em 2003 e aprofundada em 2008 (podem existir execuções que correm totalmente sem qualquer intervenção judicial, para além da mera

Parcialmente tem por base a reflexão que realizei sob solicitação do Conselho Superior da Magistratura, em Outubro de 2012, na sequência de nomeação como Vogal para a Comissão para a Eficácia das Execuções, e sob solicitação da referida Comissão da Eficácia das Execuções quanto à análise do Projecto de Diploma do novo Código de Processo Civil e projectos da Lei de Organização do Sistema Judiciário e Regime de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciários, centrada apenas no segmento da acção executiva face à natureza e objectivos da Comissão para a Eficácia das Execuções.

2  Sobre a promoção da eficácia das execuções e para outros desenvolvimentos sobre a sua actividade e recomendações, vide o estudo da APDSI (e-Justiça II, sob a coordenação do Prof. Doutor João Bilhim) «CPEE – Um órgão Independente e Democrático Ao serviço da Justiça Cível», pág. 297 a 362. Quanto à natureza da CPEE vide Paula Meira Lourenço, «A Comissão para a eficácia das Execuções», Scientia Iuridica, n.º 317, Tomo 58, Jneiro-Março 2009, pág. 129 a 157 e quanto a relevância e actividade da CPEE: O Papel da Comissão para a Eficácia das Execuções, Boletim da Ordem dos Advogados n.º 85, Dezembro de 2011, 64 a 65; a Relevância da Participação dos Cidadãos e das Empresas na Comissão para a Eficácia das Execuções, in Revista Industria – Revista de Empresários e Negócios da Confederação Empresarial de Portugal, n.º 90.

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Acção Executiva: A Busca De “boas práticas” E A “absolvição” Dos Tribunais

entrega em tribunal do título executivo) pretendeu consagrar um paradigma que se baseia na privatização ou na desjudicialização, qual a legitimidade em se atribuir aos tribunais a responsabilidade quanto às elevadas pendências na acção executiva e ineficiência? Nesse sentido ouso afirmar que a «história da acção executiva absolverá» os tribunais da imputação da crise. Poderá parecer contraditório com o acima explanado, quanto às elevadas pendências e às muitas criticas que habitualmente são feitas à Justiça no seio da acção executiva, todavia, resulta da experiência num Juízo de Execução que a eficácia judicial é maior nos processos de natureza declarativa que correm por dependência da acção executiva do que nos processos executivos, dado que o Magistrado, segundo o seu ritmo de trabalho e cooperação da Secção e demais operadores judiciários, logra tramitar eficazmente esses processos (julgamentos, saneadores, sentenças), mas no processo executivo, dada a falta de bens e aos obstáculos à penhora e venda, essa pendência vai-se eternizando no tempo, com reduzidas possibilidades de o tribunal de forma isolada inverter a situação. Ao fazer está pergunta não pretendo referir-me à questão, da qual posso e sou testemunha, do imenso trabalho realizado nos Juízos de Execução por todos os Magistrados que exercem e exerceram funções nesse tribunal, nem pretendo escamotear as criticas que ecoam por toda a comunidade quanto à chamada acção executiva e muito menos imputar esse estado de coisas a outras entidades ou intervenientes processuais, porque manifestamente não lhes poderão ser atribuídas. Apenas pretendo centrar a questão na exigência de se fixar com algum rigor qual será o alcance das críticas que são feitas ao sistema de Justiça quanto à acção executiva e por outro lado demonstrar que a «crise do processo executivo» actualmente não é uma «crise dos tribunais» ou uma crise da justiça como sinonimo de tribunais, mas sim estamos perante uma crise social muito mais profunda do que a «crise judicial no contexto executivo» – a qual é apenas a ponta de um imenso «iceberg». Numa frase: Como se poderá dizer que a crise da acção Executiva é uma crise da Justiça ou dos Tribunais, se o paradigma desde 2003 iniciou uma desjudicialização destes procedimentos e se em 2008 se ampliou esse caminho, tendo retirado esses processos do controlo geral do Juiz (e nessa medida se demonstra que se os tribunais deixaram de gerir os processos executivos e as elevadas pendências se ampliaram, então essa «crise» não é uma «crise dos tribunais ou dos Magistrados» em sentido estrito)? Será que não se pode dizer que o actual panorama da acção executiva não vai demonstrar precisamente o inverso, – «Absolver os Tribunais da imputação da ineficácia» –, de que a acção executiva não se apresenta com tantos obstáculos e problemas de celeridade devido a muitos factores, mas não devido a actuação dos tribunais em sentido estrito? O legislador nacional com a Reforma do DL 38/2003 de 8/3 que entrou em vigor a 15-9-2003 (não obstante não estar instalado nenhum Juízo de Execução) criou a figura do Agente de Execução a qual se tornou essencial para a acção executiva que começou a ser desjudicializada, sendo o mesmo uma entidade externa ao tribunal e sem vinculo ao Ministério da Justiça3, mantendo o juiz o poder geral do controlo dos autos. Com a Reforma introduzida pelo DL 226/2008 de 20/11 que entrou em vigor em 31-3-2009 foi assumido pelo legislador uma posição de desjudicialização mais acentuada, ao se retirar do juiz o poder geral do controlo (não obstante os limites do artigo 265 do CPC). A nova reforma que está em curso prevê a reintrodução do dever geral de controlo do Juiz no processo executivo. Em Portugal, e seguindo a classificação realizada por Virgínio da Costa Ribeiro4 vigorou até 15-9-2003 um «modelo público» de acção executiva dado que a tramitação da execução era feita exclusivamente pelo tribunal, atribuindo-se ao Juiz a competência para a sua tramitação integral conjuntamente com os Funcionários Judiciais, por contraposição a um modelo privado no qual a totalidade da tramitação da acção é atribuída a uma entidade administrativa (vigora na Suécia). 3  Sobre o conceito e funções do Agente de Execução, vide a obra de Virgínio da Costa Ribeiro, «As Funções do Agente de Execução», Almedina Janeiro de 2011. 4  Obra citada, pág. 28 a 30.

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Com a Reforma de 2003 o legislador aproximou-nos do modelo francês o qual se poderá designar por «semi-privado», ao atribuir ao agente de execução a prática das diligências dos autos executivos não obstante o juiz ter um campo de actuação que vai para além da existência do litigio. Com a Reforma de 2008 foi retirado ao juiz o poder geral de controlo intervindo apenas em casos tipificados, cabendo ao agente de execução a condução do processo. Assim, o legislador com a reforma de 2008 realizou a denominada «contra-reforma» da acção de 2003 ao retirar o dever geral de controlo por parte do juiz, sendo que a actual reforma vai no sentido de um «regresso ao figurino inicial» de 2003, e nessa medida creio que se poderá falar com alguma pertinência no «mito do eterno retorno»! Este ciclo de regimes desde 2003 ao se desjudicializar o processo executivo, na minha opinião, demonstra que no fundo não se pode imputar aos tribunais e aos Magistrados e Funcionários e à justiça «Tout court» (no sentido estrito do termo) a responsabilidade neste cenário de crise da acção executiva e por isso fiz a afirmação de que a evolução da acção executiva não só demonstra que a «crise» não é imputável aos tribunais, como demonstra que o legislador pretende suavizar o «caminho da desjudicialização». Acresce que a evolução histórica da acção em analise e o contexto económico nacional demonstra igualmente que não se pode imputar esta crise a nenhuma entidade ou interveniente processual (Juízes, Magistrados do Ministério Publico, Funcionários, Advogados, Agentes de Execução), mas sim a um cenário macro económico e social, o qual se traduz num «iceberg», do qual os tribunais são apenas a parte visível. Esta conclusão também demonstra que a «crise da Justiça no sector executivo» se traduz na ponta de um iceberg, com múltiplos factores a contribuir para a sua génese, que não apenas uma actuação mais ou menos rápida ou eficaz de qualquer um dos intervenientes processuais, e que a sua solução apenas se poderá obter com um trabalho conjunto e interdisciplinar de todos os operadores judiciários na área da Justiça com a sociedade civil e com o poder legislativo e executivo e vários ramos do saber (Sociologia, Economia, Finanças, Psicologia), e entidades que se dedicam ao estudo da «Justiça» (Observatório da Justiça, CES). Esta necessidade de união e trabalho multidisciplinar entre todos os intervenientes na acção executiva (Poder Executivo, Magistrados, Funcionários, Advogados, Agentes de Execução, sociedade, partes) está espelhada precisamente no grande contributo para a eficácia que a Comissão Para a Eficácia das Execuções5 tem dado ao sistema de Justiça no contexto da acção executiva, que é um órgão independente da Câmara dos Solicitadores, a qual tem precisamente uma composição que envolve todos os operadores judiciários e utilizadores do sistema de justiça (Vogal designado pelo Conselho Superior da Magistratura; Vogal designado pelo Governo responsável pela área da Justiça; Vogais designados pelo Governo responsáveis pelas áreas das Finanças e da Segurança Social; Vogais designados pelo Presidente da Câmara dos Solicitadores e pelo Bastonário da Ordem dos Advogados; Presidente do Colégio da Especialidade dos Agentes de Execução; Vogal designado pela Associação representativa dos Consumidores ou utentes dos Serviços de Justiça; Vogais designados pelas Confederações com assento na Comissão Permanente de Concertação Social do Conselho Económico e Social: Confederação dos Agricultores de Portugal; do Comércio e Serviços de Portugal, da Industria Portuguesa; Confederação do Turismo Português; Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses Intersindical e da União Geral dos Trabalhadores Portugueses). No fundo, poder-se-á referir que o estado da Acção Executiva e a composição deste órgão e a desjudicialização da acção executiva «radicalizada» a partir de 2008, demonstram que os problemas da acção executiva vão muito para além do «sistema de justiça» (tout court) e a actuação de um dado operador judiciário, e se centram na actual conjuntura económico-social, numa prática de intenso recurso ao consumo e facilidade de concessão de crédito, e agravado por um contexto de «crise socio-económica». E nessa medida, afigura-se-me adequado concluir que a acção executiva demonstra, como nota positiva, que é necessário existir uma análise conjunta dos problemas da acção executiva

A eficácia judicial é maior nos processos de natureza declarativa que correm por dependência da acção executiva do que nos processos executivos.

Sobre a composição e funções da Comissão para a Eficácia das Execuções vide Paula Meira Lourenço in Comissão Para a Eficácia das Execuções, Scientia Ivridica, LVIII, 317, Janeiro-Março 2009, 129 a 157. 5

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Acção Executiva: A Busca De “boas práticas” E A “absolvição” Dos Tribunais

e busca de soluções colectivas com a junção de vários saberes e experiências de todos os que intervêm na acção executiva envolvendo a comunidade no seu todo e o poder executivo e legislativo – só desta forma poderemos tornar este processo mais célere. Numa frase: a evolução da acção executiva vai «absolver os tribunais» da «culpa na crise da justiça executiva» e vai demonstrar que a crise é muito mais profunda do que «aquela que é atribuída aos tribunais em geral e em particular aos Magistrados e Funcionários» e que não pode ser imputada a nenhum interveniente especifico, dado que tem as suas raízes no actual contexto social de crise e recurso ao crédito.

III. ENQUADRAMENTO DA ACÇÃO EXECUTIVA É um dado assente que um sistema de Justiça eficiente no que diz respeito à «cobrança de dívidas» é vital para a economia de um pais, sendo ainda mais patente num contexto de crise financeira, gerando investimento e a confiança dos cidadãos e no tecido empresarial (de resto o Conselho Europeu elegeu através da Comissão Europeia para a Eficiência da Justiça (CEPEJ), a implementação da eficiência da justiça como um dos pilares do desenvolvimento econó­ mico).6 Para outros desenvolvimentos sobre esse segmento, vide Conceição Gomes ‘Os Atrasos na Justiça’, na qual se salienta que os cidadãos têm necessidade de justiça no tempo em que lhes “seja útil e não no tempo em que ela pode chegar”, e se analisa essa problemática tão actual e importante face aos reflexos nefastos que tem ao nível económico e social, salientando-se que essa morosidade ocorre sobretudo em processos complexos e tem causas multifactoriais. Chama-se a atenção para a circunstância de os tribunais contribuírem de forma notória para o desenvolvimento da economia, porque uma decisão tomada em prazo razoável, justa e fundamentada, é naturalmente um elemento de tranquilidade, de confiança para os cidadãos, nomeadamente para os diferentes actores económicos (vide, Entrevista ao Diário Económico, 24 Agosto 2012). Neste cenário, permita-se-me referir citando A. Casimiro Ferreira (Sociedade de Austeridade e Direito do Trabalho de Excepção – Jurisprudência de Austeridade), onde este autor refere nomeadamente, que dos dados dos Agentes de Execução em Janeiro de 2012 mais de 100 mil pessoas tinham salários penhorados), sendo que uma grande maioria deste tipo de acções resulta dos trabalhadores e consumidores terem consumido de forma «desenfreada». A maioria da litigância que existe na acção executiva tem subjacente uma relação de consumo. Neste ponto, conforme se desenvolve na dissertação de Mestrado de Liliana Bastos Pereira Santo (Da Concessão de Crédito ao Sobreendividamento dos Consumidores, Universidade Portucalense, Outubro 2009), o desenvolvimento económico conduziu a um aumento do consumo que implica uma procura crescente pelo crédito e redução da poupança. Conforme se refere apesar de nosso pais existir uma cultura tradicional de poupança, a taxa de recurso ao crédito tem vindo a aumentar e Portugal tem uma das taxas de sobreendividamento mais elevadas da Europa. Neste segmento, permita-se-me a fim de não adulterar a eloquência da comunicação, citar a frase de Armindo Ribeiro Mendes, Membro da Comissão de Revisão do Código de Processo Civil (Forças e Fraquezas do Modelo Português de Acção Executiva no Limiar do Século XXI – Que Modelo Para o Futuro?, intervenção Colóquio sobre Processo Civil 27-5-2010 no Supremo Tribunal de Justiça), e que ilustra cabalmente a situação nacional: «…como é possível que um pais com uma população de pouco mais de 10 milhões de habitantes possa ter um milhão de execuções pendentes nos tribunais judiciais ? Se a isto acrescentarmos as execuções fiscais, as execuções movidas pelos Institutos da Segurança Social e as numerosas liquidações universais no domínio dos processos de insolvência, acabaremos por verificar que existe uma curiosa situação neste «jardim à beira mar plantado» e que pode exprimir-se de forma seguinte:«em Portugal, tudo gira à volta da regra do «executai-vos uns aos outros!»(SIC). 6  Dando voz ao sector empresarial remeto para a conferência de Belmiro Mendes de Azevedo, O Impacto Económico da morosidade judicial Reflexões para uma Reforma Urgente, in Novas Exigências do Processo Civil, Organização, Celeridade e Eficácia, Associação Jurídica do Porto (AJP), pág. 265 a 282.

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Nesta senda, poderemos concluir que a situação nacional carece de soluções legislativas e preventivas quanto à difusão de hábitos de consumo adequados e equilibrados, à semelhança do que ocorre noutros países da Europa. Os sistemas europeus apostaram numa «reeducação», partindo da ideia de que o consumidor «errou e precisa ser reeducado», o crédito ao consumo não é visto como uma situação normal é antes visto com cautela, o consumidor é visto como um cidadão responsável e não um agente económico (Esta filosofia conduz a uma total responsabilidade do devedor), por contra-polo com o modelo Norte-americano e Inglês do «fresh start policy» onde o consumidor é um elemento do bom funcionamento da economia e existe a crença numa segunda oportunidade. Acresce que na Dinamarca, França, Alemanha, Holanda, Luxemburgo, Áustria, Noruega, Suécia, Finlândia, os consumidores sobreendividados têm a faculdade de obter um reescalonamento de parte ou da totalidade das dividas (na Suíça após o fracasso desse reescalonamento surge a insolvência). Nos EUA e Inglaterra conjuga-se a falência com a reestruturação das dívidas. Em Portugal os casos de sobreendividamento tem tido soluções judicias (CIRE) e extrajudiciais: Instituto do Consumidor, Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor, Centros de Informação Autárquicos ao Consumidor, Centros de Arbitragem de Conflitos de Consumo. No nosso país resulta que o enquadramento não é o da «reeducação», sendo socialmente aceite e estimulada a procura ao crédito, não se realizam campanhas de sensibilização quanto aos gastos em excesso no sentido de dar informação e formação segura aos consumidores.7 Neste segmento dos sistemas de crédito existem alguns pontos negativos que aumentam a pendência: negligência na contratação do crédito por parte do mutuário, o incentivo ao incumprimento e ao consumo8, aumento de despesa pública com varias instituições envolvidas no processo, ineficácia do sistema de recuperação, e a escolaridade maioritária, instabilidade legislativa. Cordeiro, António Menezes, Banca Bolsa e Crédito, in EDCDE, Volume I, Almedina, Coimbra 1990, salienta a existência de uma grande instabilidade legislativa neste sector do crédito ao consumo, ( Código Civil 934 a 936; DL 457/79 de 21-9, Portaria n.º 602/79 de 21/9 e Portaria 62/80, de 27/2; DL n.º 359/91 de 21/9, alterado em 2000 e 2006 pelo DL 101/2000 de 2/6 e DL 82/2006 3/5; e DL 133/2009 de 2/6, declaração de rectificação 55/2009 de 31/7), como algo nefasto para a eficácia da acção executiva, sendo que noutros países só após uma imensa evolução doutrinária e legislativa e jurisprudencial se alteram as leis (Na Alemanha a lei das insolvências de pessoas singulares aprovada em 1994 só entrou em vigor em 1999) como prova de que as soluções devem ser introduzidas com muita cautela. Realizando uma leitura sobre o recente estudo «Justiça Económica em Portugal», Fundação Francisco Manuel dos Santos, Associação Comercial de Lisboa,9 disponível na Internet, foram elencadas algumas das causas que originam a elevada pendência: – Necessidade de propor a acção para recuperação do IVA; – Execuções onde não existem bens a penhorar; Neste ponto sugere-se a criação de um procedimento extra-judicial que permitisse verificar o património do devedor antes de instaurar a acção executiva (demonstrando ter um titulo poderia ter acesso a informação atinente e obter a declaração de incobrabilidade para efeitos de devolução do IVA). – Execuções instauradas quando existe um litígio que pressupõe uma acção declarativa prévia (esta situação minimiza-se se se reduzirem os títulos executivos). Existindo uma acção executiva que pressupõe uma acção declarativa (oposição à execução ou embargos de terceiro) poder-se-ia remeter oficiosamente para os tribunais cíveis competentes.

Portugal tem uma das taxas de sobreendividamento mais elevadas da Europa.

7  FRADE, Catarina, Um Perfil dos Sobreendividados em Portugal, in «Projecto de Investigação», CES/FEUC, Coimbra, 2008. 8  Apenas como tópico de reflexão: em muitos países da Europa, nomeadamente em França os Centros Comerciais estão totalmente encerrados ao Domingo, situação que não ocorre em Portugal, sendo que desta forma um dia que poderia ser de lazer em família passa a transformar-se numa deslocação a uma superfície comercial, sendo habituais e reveladoras as imensas filas de trânsito que existem nesse dia tradicionalmente de repouso em direcção aos Centros Comerciais. 9  Justiça Económica em Portugal, Síntese e Propostas, Fundação Francisco Manuel dos Santos, Associação Comercial de Lisboa, coordenadores científicos: Mariana França Gouveia, Nuno Garoupa, Pedro Magalhães, Jorge Morais Carvalho, Dezembro 2012.

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O recente estudo mencionado (Dezembro 2012) elencou várias medidas para melhorar a eficácia da acção executiva, nomeadamente: «a) eliminação da necessidade de propor acção executiva para obter a declaração de incobrabilidade para efeitos da devolução do IVA, optando pela sua devolução automática ou pela supressão da devolução, ou ainda por criar um sistema préjudicial de certificação segura; b) Criação de procedimentos prévios de verificação do património para eliminar acções executivas em que não há bens a penhorar; c) Remessa de processos com oposição para a acção declarativa; d) Redução do elenco legal dos títulos executivos, limitandose à sentença e injunção; e) Desjudicialização plena do processo executivo ou perante os títulos mais seguros; f ) Restrição da competência nas execuções desjudicializadas a agentes de execução com mais anos de experiência e sem sanções disciplinares; simplificação processual, reduzindo a complexidade normativa procurando a tramitação electrónica e eliminação da citação dos credores públicos. Dado que a acção executiva é da responsabilidade de toda a comunidade, dentro da nossa experiência, ir-se-á analisar alguns dos pontos da reforma e emitira sugestões concretas neste contexto.

IV. A REFORMA DO PROCESSO EXECUTIVO PROJECTADA Centrando-nos no Projecto da referida Lei Adjectiva Civil cumpre-me louvar de forma expressa, as soluções propostas pela Comissão de Revisão do citado diploma civil10, no sentido de considerar que no geral em sede de acção executiva, a reforma terá a virtualidade de dar eco aos principio da celeridade e eficácia (sendo esta a área onde se sente maior necessidade de alterações11). Fazendo uma leitura de todo o Projecto do diploma, o que desde logo nos chama a atenção traduz-se na implementação de uma nova prática judiciária que envolve todos os intervenientes na acção executiva – Magistrados, Advogados, Agentes de Execução, Funcionários Judiciais – dado que são propostas soluções que implicam, conforme refere o preambulo, –: «uma nova cultura judiciária» – e a acrescida responsabilização e cumprimento dos deveres processuais (indica-se o principio da unidade tendencial que determina que o Juiz perante o qual decorreu a audiência, elabora também a sentença mesmo nos casos de transferência e promoção).12 Tal facto que emerge de vários preceitos, desde logo, no que diz respeito ao Agente de Execução, o artigo 752.º (consigno que os artigos citados sem menção de origem referem-se ao novo diploma, inversamente os restantes são relativos ao actual código), que fixa o prazo de três meses a partir da notificação ao Agente de execução para iniciar a penhora, a fim de se extinguir a execução por falta de bens. Esta solução que determina a extinção da execução se não forem encontrados bens penhoráveis no espaço de 3 meses (visando acelerar o processo e resolver as pendências), afigura-se-nos como adequada (de resto no direito Sueco existe a regra de que o processo executivo se extingue sempre que no período de seis meses a um ano, não se encontrem bens penhoráveis), sem prejuízo de considerar que o prazo deveria ser de pelo menos 6 meses a um ano, dada a dificuldade em se encontrarem bens e face à «importação» da experiência do referido país, onde já vigora a regra. O cumprimento desta determinação implica a necessidade de existir uma formação adequada quanto aos Agentes de Execução e todos os Intervenientes, e pressupõe a existência de meios logísticos para cumprir este prazo. Num aspecto puramente formal saliento a questão da renumeração ou alteração da numeração dos artigos, (sendo que o processo executivo surge a partir do artigo 704.º), o que em nosso Cumpre-me consignar o enorme respeito e admiração para com todos os membros que fazem parte da Comissão e saudar a sua actuação na difícil e tão honrosa missão que conduziram de forma tão eloquente, sendo que ao se reflectir sobre a Reforma, dever-se-á ter como horizonte que, o difícil é «fazer a mudança», e não «o analisar ou comentar ou até criticar», e nessa medida a minha tarefa acaba por ser «cómoda». 11  António Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil” (2012), Revista Julgar, n.º 16 Janeiro/Abril de 2012), pág. 47 a79. 12  João Correia, “Reformar o C.P.C, para quê?”, Revista Julgar (2012), n.º 16, pág. 131 a 135, que considera que com esta reforma Juízes e Advogados terão as mais sérias e profundas responsabilidades, em função da dignidade da sua função, em homenagem ao cidadão. 10

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entender, irá exigir um esforço no sentido de se fixarem alguns artigos que se usam todos os dias de uma forma intuitiva e por mera remissão numérica, – dado que actualmente basta a enunciação de um número para todos os operadores judiciários saberem qual o tema ou o conteúdo da norma em causa; situação que não irá ocorrer, face à alteração de numeração e de sistematização. Tal exigirá, em nosso entender, uma necessidade de ser dada formação intensa a todos os intervenientes processuais e bem como a necessidade de uma vacatio legis ampla a fim de se alterarem hábitos com vários anos, não obstante a virtualidade relevante de evitar a imagem «retalhada», decorrente da introdução de artigos novos que foram sendo feitas, e a difusão da ideia de que estaremos perante um novo Código de Processo Civil (de resto não se trata de uma mera renumeração de artigos mas uma diferente sistematização).13 Sem prejuízo, e como nota ao regresso à antiga terminologia, refere-se a reintrodução muito positiva da expressão «embargos de executado», em vez de «oposição à execução», dado que se tratava de uma terminologia muito sedimentada na prática judiciária (artigo 729.º) que apesar de introduzida com a reforma de 2003 nunca chegou a ser suficientemente interiorizada. Igualmente, e ainda no contexto da simplificação, entende-se que a Comissão realizou uma muito adequada sistematização relativamente ao cônjuge do executado e tramitação, o que permitirá uma mais fácil compreensão do regime legal e maior clarificação (o que não ocorria anteriormente, dado o regime extremamente complexo estatuído).14 Continuando a análise resulta que a actual reforma quanto à execução por quantia certa institui duas formas processuais sumária e a ordinária, (em sede executiva a execução para pagamento de quantia certa terá a forma ordinária ou sumária, e existem as execuções para entrega de coisa certa e prestação de facto (artigo 551.º), sendo que neste ponto afigura-se-me, que tal como no processo declarativo, poder-se-ia pugnar por uma única forma de processo para a tramitação dos embargos de executado ou oposição à execução. Em sede executiva a execução para pagamento de quantia certa terá a forma ordinária ou sumária, e existem as execuções para entrega de coisa certa e prestação de facto (artigo 551.º). Nesta sede, se me é permitida a sugestão, poder-se-ia aplicar, a tramitação do regime processual civil experimental, que rompe a inflexibilidade e com a diferenciação em razão do valor da causa como elemento distintivo das «antigas» três formas de processo (ordinário, sumário e sumaríssimo), sendo que a tramitação desconsidera o valor das pretensões, independentemente do valor, todas as acções regem-se pelas regras unitárias constantes do regime processual civil experimental.15 Assim, afigura-se igualmente possível a extensão deste regime (ainda que integrado no Código e não em diploma avulso) aos excertos declarativos do processo executivo, mormente à fase de oposição à execução e à penhora, com a inerente simplificação e celeridade processual e redução de pendências. Realço igualmente como ponto extremamente positivo a opção do legislador em evitar a dispersão existente no actual código de processo civil (que contem o elenco dos títulos e­ xecutivos­ António Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil” (2012), Revista Julgar, n.º 16 Janeiro/Abril de 2012), pág. 77 pugna que em termos ideais a solução melhor seria a aprovação de um novo Código suficientemente debatido. 14   Sobre a questão da comunicabilidade vide Maria José Capelo, in Themis A Reforma da Acção Executiva, 2003, pág. 84, e Rui Pinto, in A Acção Executiva depois da Reforma, pág. 97 e Miguel Teixeira de Sousa, in A Reforma da Acção Executiva, pág. 89. 15  Sobre as virtualidades deste regime remeto para a breve comunicação realizada pela signatária no Tribunal da Relação do Porto, contexto das Jornadas para a Transparência da Justiça (Tribunal de Porta Aberta) 3 a 10/12/2012, ASJP: Regime Processual Civil Experimental: O que nos fica de uma «Revolução»?». A resposta pode ser avançada desde já com a constatação de que entendo que os princípios deste «mini-diploma» lograram operar uma «pequena Revolução» no processo civil e alteraram algumas formas de trabalho no contexto do sistema judiciário, tendo dado alguma inspiração à nova reforma processual civil. Numa palavra este diploma surgiu como algo de «carácter micro» (com uma vigência limitada no tempo e no espaço), mas logrou influenciar, em meu entender, a cultura judiciária vigente e ser um «laboratório de boas praticas» no «plano macro» (– usando expressões do Exm.º Sr. Desembargador Dr. Nuno Coelho, in Organização, Decisão, Administração, Gestão dos Tribunais, Programa de formação avançada CES, OPJ, Justiça XXI, Coimbra 19-102012), ao demonstrar a importância da prestação de contas e da transparência e papel do Juiz na vida judiciária, dado que foi acompanhado de formação judicial e de monitorização rigorosa. E nessa influência é a prova de que «uma andorinha pode fazer a Primavera». 13

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no artigo 46 do CPC e só a partir do artigo 801 do CPC dá inicio à regulamentação da acção executiva propriamente dita) quanto à acção executiva ao ter regulamentado a acção executiva de forma unitária e aglutinada a partir do artigo 704.º e ao ter iniciado com o conceito de titulo executivo. Esta sistematização afigura-se-nos ser exemplar dado que deste logo tem a virtualidade de concentrar os artigos atinentes à acção executiva o que facilita a sua apreensão e estudo, e por outro lado, dá eco à ideia de que são os títulos executivos a figura nuclear da acção executiva. O título executivo é condição necessária da acção executiva, porque não há execução sem título, o qual tem de acompanhar o requerimento inicial (vide, Lebre de Freitas, in A acção Executiva, 1993, pág. 56 e ss.). Trata-se de uma nota, que para além, do aspecto formal e pragmático traz muita eficiência, centra a atenção na circunstância de se dever ter sempre em conta que a título executivo é o pressuposto de toda a tramitação e demonstra que é imperativo a concretização de acções de formação intensas neste segmento (dado que se evitam acções executivas sem viabilidade com a inerente redução de pendências). De resto, não nos devemos esquecer que o regime nacional sempre se pautou por uma grande amplitude de títulos executivos e ao se colocar este artigo 704.º como o «artigo inaugural» da acção executiva, tal implica o desafio de se realizar uma análise prévia sobre a existência ou não de titulo executivo e uma mudança de procedimentos (a eficácia, em meu entender, está mais uma vez centrada na formação a ministrar e eventualmente na compilação de um documento onde se indiquem os títulos executivos e os pressupostos e limites e a discussão doutrinária e de jurisprudência contribuindo assim para uma salutar prática judiciária). V. A CENTRALIDADE DOS TÍTULOS EXECUTIVOS E DESPACHO LIMINAR NA EFICÁCIA DA ACÇÃO EXECUTIVA. O Preambulo do diploma aponta no sentido claro da diminuição do leque dos títulos executivos, sendo que tal medida, no nosso entendimento, assume inegável relevância quanto à diminuição das pendências nos Juízos de Execução e tal permitirá uma maior eficácia na tramitação dos processos para todos os intervenientes na acção executiva. Conforme ensina A. Geraldes, in Themis, Revista da Faculdade de Direito da UNL, Ano IV, n.º 7-2003, Almedina, pág. 36 e seguintes, o título executivo mais do que um mero documento comprovativo de um direito de crédito, foi elevado à categoria de verdadeiro requisito, sem o qual a acção executiva não pode ser instaurada ou prosseguir. O que implica que se no âmbito de um processo declarativo é necessário alegar os factos constitutivos ou a causa de pedir – já no caso da acção executiva basta, salvo as excepções legais, a alusão ao próprio documento, do qual emerge o conteúdo da relação de crédito, noutros termos, o título executivo é auto-suficiente, demonstrando a sua análise, de forma quase imediata, tantos os aspectos de ordem subjectiva, como os aspectos de ordem objectiva ligados aos fins e limites da acção executiva. Continuando na senda do citado Autor, cumpre referir que o título para além de ser a condição necessária – «chave que abre a porta à acção executiva», Castro Mendes, citado pelo referido Autor, in obra citada, pág. 36, é condição suficiente, o que implica que basta a apresentação do título executivo, o qual fazendo presumir a existência do direito, dispensa, em geral, a alegação é prova de quaisquer outros factos. A tendência do legislador foi para alargar o âmbito dos títulos executivos apresentando-se o sistema português como o mais «generoso» do espaço Europeu.16 Tal circunstância implicou um imediato acesso à acção executiva fundada em documentos particulares, originando uma elevada pendência processual, face ao contexto nacional relativamente à facilidade do acesso ao crédito, como bem salienta o Preambulo do Projecto, que Parafraseando Prof. Lebre de Freitas in «Os paradigmas da acção Executiva», pág. 2:« A generalidade dos países europeus é avara na concessão de exequibilidade a títulos não judiciais»: http://www.dgpj.mj.pt/sections/informacao-eventos/anexos/sections/informacao-e-eventos/anexos/professordoutorlebre/downloadFile/file/plf.pdf?nocache=1210676672.22. 16

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potenciou o risco de execuções, que ao iniciarem pela penhora, não tutelavam o principio ao contraditório e nessa medida poderiam reduzir os direitos de defesa do executado. Como é sabido o contexto socio-económico nacional estimulou muito o recurso ao crédito ao consumo, sendo que os documentos particulares gerados neste contexto, apresentam uma grande taxa de oposições à execução e litigiosidade dado não ter existido uma acção declarativa prévia: no fundo, o alargamento dos títulos de crédito acabou por transferir para os juízos de Execução muitos processos que demandavam uma acção declarativa prévia de forma a garantir a segurança jurídica e o respeito pelo princípio do contraditório. No contexto dessa exclusão da força executiva quanto aos documentos particulares assinados pelo devedor, cumpre-me realçar ainda a circunstância de o artigo 704.º, que indica os títulos executivos, ter excluído do artigo 46 n.º 1, alínea c) a possibilidade de entrega de coisa. É notório que os documentos particulares assinados pelo devedor assumem-se como os títulos de «menor segurança» e determinaram várias decisões de indeferimento liminar ou de rejeição oficiosa de execução (artigo 820 do CPC).17 Há legislações que não reconhecem a exequibilidade dos documentos particulares, como é o caso da lei alemã, e outras que a restringem aos títulos de crédito (caso da lei italiana) ou aos cheques (caso da lei francesa), vide o Ac da RC de 14-6-2012 (de 4664/11.1TBLRA-B.C1: Carlos Querido). Não devemos olvidar a discussão jurídica em torno deste tipo de títulos, sobretudo no que aos imóveis dizia respeito (nomeadamente o anterior artigo 46.º, do CPcivil, que alargou aos documentos particulares a exequibilidade quanto à obrigação de entrega de imóveis).18 Assim, considero louvável a redução do leque de títulos executivos de natureza particular dada a enorme litigiosidade subjacente e de forma a garantir os direitos de defesa do executado, uma vez que como bem salienta Nuno Lemos Jorge, a segurança e a clarificação são exigências necessárias.19 Este normativo continua a considerar os títulos de crédito como títulos executivos desde que sejam alegados no requerimento executivo os factos constitutivos da relação subjacente [artigo 704 n.º 1 c)]. Concordamos inteiramente com esta opção legislativa dado que clarifica a questão que foi extremamente debatida em sede de jurisprudência, da necessidade de alegação da causa de pedir quando o título de crédito seja um mero quirografo (vide, neste sentido Nuno de Lemos Jorge, in A Reforma da Acção Executiva de 2012: Um Olhar sobre o (Primeiro) Projecto, pág76.20 A titulo meramente exemplificativo vide o Ac da RC de 15-5-2012 (Rel Artur Dias) 710/11.7TBCTB-A.C1, cujo sumário: Sumário: O contrato promessa de compra e venda de imóvel não constitui título executivo susceptível de servir de base a execução em que, com a alegação de que os executados (promitentes vendedores) não querem cumprir as obrigações assumidas, se visa a cobrança coerciva de uma quantia correspondente ao dobro do sinal que oportunamente lhes havia sido entregue. 18  Neste cenário existiu muita discussão quanto aos limites do título executivo, no sentido de que a obrigação de prestação de facto deve emergir do próprio documento, sem necessidade de outras indagações, ou seja, sem necessidade da confirmação de pressupostos da obrigação exequenda. Nesta medida, constando do documento contratual a constituição de uma obrigação (v. g. entrega de um imóvel em certa data), apenas esta é revestida de exequibilidade, sendo o documento insuficiente para exigir o cumprimento coercitivo da obrigação cuja causa resulte de outra vicissitude (v. g. a obrigação de entrega na sequência da resolução de contrato). Isto porque a resolução contratual não emerge do próprio documento, exigindo-se a prova de outros factos que deverão ser submetidos à discussão contraditória no âmbito de uma acção declarativa (vide, A. Geraldes, obra citada, pág. 46). Para outros desenvolvimentos, ainda que no âmbito de um contrato de locação financeira, vide o Ac. da RL de 29/1/2002, in CJ 2002, tomo I, 94, onde se concluiu que o contrato de locação financeira não constituí título executivo para entrega do veículo, porque essa obrigação de entrega do veículo não resulta directamente do documento, carecendo de prova complementar, constituindo o documento apenas meio de prova da obrigação. Igualmente, poder-se-á consultar o Ac. da RP de 18-11-2003, disponível na INTERNET, na Pág. Da DGSI, quanto à exequibilidade de uma escritura de compra e venda, e onde se refere de forma lapidar: «…Em resumo se consigna, assim, que só pode promover-se a execução de obrigação que seja certa e exigível, e só é exigível a obrigação que já se tenha vencido, em face do título. Mas o título não pode é resumir-se a um qualquer meio de prova Ele é mais do que isso: ele tem de ser condição necessária e suficiente do direito que vai ser realizado, ao qual se substitui...». 19  Nuno Lemos Jorge, in “A Reforma da Acção Executiva de 2012: um olhar sobre o (primeiro) projecto”, in Revista Julgar n.º 17, Maio-Agosto de 2012, pág. 77. 20  Nesta sede surge a questão relativa ao título de crédito prescrito ou o cheque apresentado para além dos 8 dias no sentido de saber se têm força executiva. Esta problemática tem sido largamente estudada, nomeadamente quanto aos cheques, sendo que as considerações para o mesmo valem também para os restantes títulos de crédito (letras e livranças). 17

A tendência do legislador foi para alargar o âmbito dos títulos executivos apresentando-se o sistema português como o mais «generoso» do espaço Europeu.

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Neste aspecto e tal como em ensina o Ac do STJ de 29/1/2002, in CJ 2002, Tomo I, 64, existem várias teses contraditórias: – Contra a possibilidade de os cheques valerem como título executivo como documento particular se pronunciou Lopes Cardoso (Manual da Acção Executiva, 89) e o Ac. do STJ de 29/2/2000, in CJ STJ 2000, I, 124). E igualmente o Ac da RP de 28/02/2000, disponível na INTERNET, na Base de Dados da DGSI: «Sumário: I – O propósito da reforma do Código de Processo Civil operada pelo Decreto-Lei 329-A/95 foi o de ampliar o elenco dos títulos executivos, conferindo força executiva aos documentos particulares assinados pelo devedor. II – No entanto, não foi dada autorização legislativa para o legislador alterar o regime especial da Lei Uniforme relativa aos Cheques, nem resulta do Decreto-Lei 329-A/95 a vontade inequívoca do legislador em excepcionar o princípio de que a lei geral não revoga a lei especial. III – Assim, é de considerar prescrito o direito à execução fundada em cheque, se a respectiva acção não foi intentada dentro dos 6 meses contados do termo do prazo de apresentação do cheque a pagamento. – Inversamente, e no sentido favorável vai Pinto Furtado (Títulos de Crédito, 82 e 285) e o Ac da RC de 3-12-1998, In CJ 1998, V, 34 e o Ac da RP de 12/06/2001: «Sumário: Um cheque prescrito, subscrito pelo devedor a favor do credor, e vista a sua normal função de meio de pagamento implica o reconhecimento unilateral de uma obrigação pecuniária, constituindo, assim, título executivo face à alínea c) do artigo 46 do Código de Processo Civil.». – Por fim, Lebre de Freitas (Acção Executiva, 2.º Ed. 1997, 53) defende a seguinte posição: «Quando o título de crédito mencione a causa da relação jurídica subjacente, não se justifica nunca o estabelecimento de qualquer distinção entre o título prescrito e outro documento particular, enquanto ambos se reportem à relação jurídica subjacente. Contudo, "há que distinguir consoante a obrigação a que se reportam emerge ou não de um negócio jurídico formal. No primeiro caso, uma vez que a causa do negócio é um elemento essencial deste, o documento não poderá constituir título executivo. No segundo caso, porém, a autonomia do título executivo em face da obrigação exequenda e a consideração do regime de reconhecimento da dívida (art. 458.º, n.º 1 CC) leva a admiti-lo como título executivo, sem prejuízo de a causa da obrigação dever ser invocada no requerimento inicial da execução e poder ser impugnada pelo executado"(Lebre de Freitas, "A Acção Executiva", pág. 50). Igualmente, neste sentido vide o Ac da RP de 06/07/2001: «Sumário: Embora extinta a obrigação cartular, abrangida por prescrição, no âmbito das relações imediatas e para execução da respectiva obrigação subjacente, o cheque valerá como quirógrafo dessa obrigação, com a força de título executivo que lhe é dada pela alínea c) do artigo 46 do Código de Processo Civil, desde que o exequente alegue, no requerimento executivo, a relação causal.». E o Ac da RP de 19/02/2001: «Sumário: I – II – Se o exequente, no processo executivo, apenas invocou a relação cambiária, a prescrição da obrigação exequenda rege-se pelo artigo 52 da Lei Uniforme relativa às Letras e Livranças, não podendo ser interrompida nos termos dos artigos 323 e seguintes do Código Civil. III – Se o exequente não alegou factos reveladores da relação causal o cheque, após prescrição, não pode servir de título executivo, como documento particular...». E o Ac da RP de 02/07/2001: «Sumário: Os cheques, apesar de ter decorrido o prazo de prescrição, continuam a valer como títulos executivos, na qualidade de documentos particulares, desde que o exequente alegue, no requerimento executivo, a relação causal da emissão do cheque. Igualmente, poder-se-á citar a seguinte jurisprudência a título meramente exemplificativo: – Ac da RP de 04/06/2001: «Sumário: I – Um cheque, depois de prescrito, apenas pode servir de título executivo, como documento particular assinado pelo devedor, se o exequente, no requerimento executivo, invocar expressamente a relação subjacente que esteve na base da sua emissão....». – Ac da RC de 29/05/2001: «Sumário: I – Os cheques dos autos são títulos à ordem, porque neles indicam o nome do beneficiário (o tomador dos cheques) a ordem de pagamento dada ao estabelecimento bancário (o sacado) onde deveria existir uma provisão de fundos constituída pelo emitente dos cheques (o sacador). São validamente considerados como títulos executivos. II – Prescrita a acção cartular ou cambiária, os cheques conservam a eficácia como documentos particulares à margem da obrigação cambial. Valerão como quirógrafos duma obrigação não cambiária, i.é, como títulos ou escritos comprovativos de qualquer obrigação de natureza diferente. III – Sendo um escrito particular assinado pelo devedor, podem ser considerados títulos executivos para efeitos do art.º 46.º do CPC, desde que constituam ou certifiquem a existência da obrigação de pagamento de quantia determinada ou determinável. IV – A prescrição da obrigação cambiária não afecta a obrigação que a determinou, não implicando, por isso, a extinção da obrigação subjacente ou causal que subsistirá. V – A discussão da relação subjacente dependerá da sua invocação no requerimento inicial da acção executiva como causa de pedir. VI – Nas execuções a causa de pedir não é o próprio título executivo, mas antes, e de acordo com o art.º 498.º n.º 4 do C.P.C., os factos constitutivos da obrigação exequenda reflectidos, porém, no título. VII – Assim, pese embora o decurso do prazo de prescrição da acção cambiária, os cheques ajuizados – valendo agora na base de escritos particulares recognitivos ou confessórios de obrigação – continuam a valer como título executivo.». – Ac da RC de 02/05/2000: «Sumário: I – Tendo decorrido o prazo de seis meses preceituado no art.º 52.º da LU, e uma vez invocada a prescrição, encontra-se prescrito o direito de acção do portador do cheque cuja qualidade é a de título cambiário. II – Porém, se na acção intentada fora daquele prazo for invocada a relação de fundo, substancial da obrigação, possui o cheque a qualidade de quirógrafo-prova documental, assinada pelo devedor dessa relação fundamental, pelo que continua a ser título executivo, apesar de estar prescrito como título cambiário.». Igualmente, vide o Ac. do STJ de 29/1/2002, in CJ 2002, Tomo I, 64, já citado, uma vez que se entende que a interpretação restritiva, e sempre com o maior respeito por melhor entendimento, contraria os objectivos tidos com a reforma processual ao prever a alínea c) do artigo 46.º, do CPCivil, uma vez que o cheque é um documento particular, assinado pelo devedor, que importa o reconhecimento de uma obrigação pecuniária de montante determinado. E o artigo 458 n.º 1.º do CC admite que através de uma declaração unilateral se efectue o reconhecimento de uma dívida sem que o devedor indique o fim jurídico que o leva a obrigar-se, presumindo--se a existência e a validade da relação fundamental.

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Com esta limitação do leque dos títulos executivos, o novo Código de Processo Civil promete proteger mais o devedor/consumidor: um simples papel assinado pelo devedor deixa de ser suficiente para avançar imediatamente com a penhora dos bens, como acontecia até aqui. Deixam de ter força executiva todos os documentos particulares – aqueles que não são revistos pelo notário ou outro oficial público –, à excepção dos títulos de crédito dotados de segurança e fiabilidade no comércio jurídico, isto é, cheques, letras ou livranças. Nestes casos, para conseguir cobrar a dívida o credor terá de intentar uma acção declarativa prévia ou requerer uma injunção contra o alegado devedor. Porém, cumpre salientar que, para que de facto as questões relativas ao crédito ao consumo não sigam logo para os tribunais, deverá estabelecer-se a proibição de o exequente utilizar títulos de crédito no contexto do crédito ao consumo (caso contrário resulta que a exequente já não poderá executar um documento particular conforme agora se fixa no artigo citado, mas pode contornar essa situação dando à execução um titulo de crédito e invocando a relação de crédito ao consumo subjacente, dado que é prática neste tipo de contratos ser subscrita um livrança ou letra). De referir que uma forma extremamente eficiente de tutelar o consumir está prevista já no Anteprojecto do Código de Consumidor o qual estabelece a proibição de o crédito ao consumo ter subjacente títulos de crédito (artigo 303.º desse diploma e ao impor ao financiador que recuse o uso desses títulos mesmo se o consumidor os quiser subscrever, e ao determinar que o financiador responde pelos danos que cause no caso de os títulos de crédito proibidos forem postos a circular. Esta nota vai para além do princípio da liberdade contratual e dá eco ao principio de protecção dos consumidores – quanto a mim talvez seja a forma mais eficaz de protecção porque a maioria dos casos que chegam a tribunal decorrentes do crédito ao consumo, surgem sob a veste de um título de crédito.21 No entanto e sem se pressupor um Código do Consumidor, entende-se que o artigo 704 c) ao exigir a indicação da causa de pedir quanto aos títulos de crédito poderia retirar a qualidade de titulo executivo quando a causa de pedir fosse o denominado contrato de crédito ao consumo. Tal opção contribuiria de forma muito significativa para a diminuição das elevadas pendências da acção executiva e por inerência aumentar a eficiência. No contexto da fase liminar da acção executiva cumpre saudar desde logo a preocupação da Comissão em afastar o «labiríntico» regime da reforma constante do DL 226/2008 de 20/11, ao clarificar quando é que existe despacho liminar (quando a citação precede a penhora).22 Neste ponto, na minha opinião pessoal, entendo que no processo executivo deveria existir sempre despacho liminar ou um controlo liminar por parte do Juiz, dado que se evitaria, por vezes a agressão do património do executado e a pendência de acções executivas que não têm viabilidade. De resto, cumpre referir que o despacho liminar em nada retarda ou atrasa o processo (exigindo empenho e formação especializada quanto à questão), sem prejuízo, de caso

Neste ponto, na minha opinião pessoal, entendo que no processo executivo deveria existir sempre despacho liminar ou um controlo liminar por parte do Juiz, dado que se evitaria, por vezes a agressão do património do executado e a pendência de acções executivas que não têm viabilidade.

Assim, a citada norma legal, embora dispensando o credor da prova da relação fundamental, não dispensa a alegação da causa de pedir. Tal como se refere no Ac. da RE de 8-3-2001, in CJ 2001, Tomo V, 249, para que o cheque prescrito enquanto documento particular possa ter a força de título executivo terá de preencher os seguintes requisitos: a) represente um acto jurídico pelo qual alguém se constitui em obrigação para com outrem; b) traduzir-se essa obrigação no pagamento de quantias determinadas ou entrega de coisas. Por outro lado a causa de pedir tem de ser devidamente invocada no requerimento inicial. Neste sentido, vide, a seguinte jurisprudência disponível na Internet, na base de dados da DGSI: – Ac da RP de 25/10/2000: «Sumário: Apesar da presunção da existência da obrigação causal, estabelecida no n.º 1 do artigo 458 do Código Civil, o exequente em execução fundada em cheque prescrito não fica dispensado de invocar aquela obrigação no requerimento inicial da execução, com o fim de poder ser impugnada pelo executado, uma vez que o citado normativo apenas dispensa a prova, mas não a alegação da causa de pedir, havendo apenas uma inversão do ónus da prova. – Ac da RP de 14/02/2002: «Sumário: Os cheques prescritos poderão continuar a valer como títulos executivos, enquanto documentos particulares, consubstanciando a obrigação subjacente, desde que estes sejam emergentes de negócio formal e a sua causa seja invocada no requerimento inicial da execução pelo credor originário, de modo a poder ser impugnado pelo devedor originário/executado na petição de embargos.». 21  Estudo que publiquei na Revista Jurídica da Universidade Portucalense N.º14, 2011, Porto intitulado: «Encontros entre o Contrato de Crédito ao Consumo e o de Compra e Venda e de Seguro nos Tribunais. 22  Sobre a complexidade deste regime vide Mariana França Gouveia «A novíssima acção executiva: análise das mais importantes alterações», Revista da Ordem dos Advogados, 2009, n.º 3 e 4, pág. 572.

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o legislador assim o entendesse, poder-se-ia considerar que a apresentação a despacho liminar seria um acto urgente e fixar o prazo de 2 dias para ser proferido o respectivo despacho inaugural, tal como as providências cautelares. Este controlo liminar teria a vantagem de evitar pendências inúteis ou inviáveis e permitir a apreciação dos pressupostos processuais, com a inerente redução de pendências quando não existisse título executivo (a titulo exemplificativo, são muito frequentes os requerimentos de injunção com força executiva relativamente a uma entidade sem personalidade judiciária –estabelecimentos comercias, restaurantes, firmas e nesse caso deverá existir um despacho liminar de indeferimento). Nesta senda, concordo inteiramente com a posição de Nuno Lemos Jorge, quanto a pugnar pela necessidade desse controlo no caso das actas de Condomínio dado que esse título habitualmente conduz a indeferimentos.23 Todavia, não se tendo pugnado por esta solução, resulta que no caso dos títulos onde não existe esse despacho liminar, exige-se uma especial atenção do Agente de Execução na análise desse alegado título, devendo solicitar a intervenção judicial quando tenha dúvidas sobre a existência de força executiva. Esta apreciação prévia torna imperativa uma formação cada vez mais exigente e continua junto dos Agentes de Execução, a qual poderia ser realizada em cooperação com os tribunais com a colaboração dos respectivos Magistrados e Centros de Formação. Poder-se-ia equacionar inclusivamente a instituição de um procedimento de «boas praticas» na acção executiva, nomeadamente não só regras de conduta, mas também quanto aos títulos e seus limites, e a instituição de prémios de desempenho na aplicação de práticas inovadoras. Entendo que a «pedra de toque» da reforma depende desde logo da existência desse despacho liminar e da instituição do dever de os Funcionários e Solicitadores de Execução analisarem todos os títulos executivos e perante qualquer duvida relativa à força executiva de um dado documento suscitar a questão junto do Magistrado – e esse procedimento poderia ser de carácter informal e serem estabelecidas ordens de serviço para essa apresentação e indicações sob a forma de provimento quanto à indicação dos documentos que poderão não ter força executiva. Neste segmento seria muito relevante dar cursos de formação, ou o Magistrado numa perspectiva micro ou macro dar indicações precisas sobre aquilo que é título executivo e as regras a observar no caso de dúvidas. Em resumo: É habitual a menção de que o despacho liminar se traduz num «bloqueio da acção executiva», todavia, e ressalvado o devido respeito por melhor entendimento, pugno pela tese de que esse despacho, mesmo sem a atribuição de natureza urgente, só em casos «patológicos» poderá provocar um retardamento do processo, dado que a verificação da existência de força executiva de um titulo não contende com a celeridade, dado ser uma decisão expedita e que tem a virtualidade de por fim a execuções inviáveis evitando um dispêndio de meios que poderia ser canalizado para outros processos e a prática de actos executivos inúteis. Pelo exposto, defendo pessoalmente que em todas as acções executivas, mesmo nas baseadas em injunção, exista um despacho liminar (á excepção das de sentença) quanto à existência ou não de titulo executivo, de resto esta decisão é complexa e tem a virtualidade de evitar a pendência de execuções inviáveis e a agressão do património do executado.24 Nuno Lemos Jorge, in “A Reforma da Acção Executiva”, Revista Julgar, n.º 17, pág. 86). Neste contexto poder-se-ia equacionar a elaboração de estudos ou publicações contendo alguns dos documentos cuja força executiva seja controversa e habitualmente determinem um indeferimento liminar. Baseada na minha experiência profissional posso exemplificar algumas dessas situações com despachos que foram por nós proferidos e a complexidade atinente à verificação ou não da existência de um título executivo: – Garantia bancária «First demand»: «...Compulsados os autos resulta que a exequente instaurou esta execução contra o executado alegando a existência de uma garantia bancária prestada pelo banco executado em beneficio da exequente por referencia a quaisquer montantes à mesma devidos por parte da sociedade Mais refere que essa garantia foi objecto de uma adenda no qual o valor foi alterado para 54.000 Euros e ulteriormente foi novamente alterado mudando a denominação da exequente. Acresce que em 24-9-2004 foi alterado o texto da seguinte forma: em vez de constar do bom pagamento de bolachas tal expressão foi substituída pela expressão bom pagamento das facturas referentes ao fornecimento de produtos alimentares. Depois houve novas alterações do valor e da designação da beneficiária da garantia. Depois foram feitas mais 3 adendas através das quais foi a garantia automaticamente renovada. Mais alega que a Cereal Basic não cumpriu as obrigações e a exequente notificou o banco executado(a)(s) para pagar a quantia de 117.000.00 Euros ao abriga da alegada garantia autónoma.

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Conclui, o seu douto requerimento(s) executivo no sentido da existência de uma garantia denominada de «first demand» e como tal por se considerar a existência de titulo executivo contra o banco executado. Compulsados os autos resulta que o título dado à execução diz o seguinte, e passo a transcrever, passando-se a indicar os vários documentos que a exequente alega como títulos executivos: – Em 27-10-2003 « … banco… declara que emite uma garantia bancária no montante de Euro 28.000.00… referente ao bom pagamento de fornecimentos de biscoitos, pelo que nos obrigamos enquanto pagador principal e devemos qualquer montante devido ao beneficiário até ao limite de euro 28.000,00 … se a Cereal Basic… não pagar atempadamente. O montante total desta garantia por euro 28.000,00 … e a mesma é válida pelo período de 1 um ano a contar da data deste documento e é sucessivamente renovável por iguais períodos excepto se for denunciada por nós banco… dentro de 30 dias antes do seu prazo inicial ou do prazo das suas renovações e cessará imediatamente mediante declaração formal emitida pelo banco durante o período de vigência…» – dos. De fls. 32 cujo teor aqui se dá por reproduzido. – Em 16-8-2004 – «…declara que aumentamos o montante desta garantia em 54.000 Euros … sendo agora válida pelo montante total de 82.000,00, …todos os outros termos e condições mantém-se inalteradas…» – conforme o teor do doc. De fls. 89 (tradução) cujo teor aqui se dá por reproduzido. – Em13/9/2004 e em 28-9-2004 há uma alteração da denominação da beneficiária conforme o teor do doc de fls. 90 e de fls. 92 – Em 22/9/2004: «… por esta via declara que alteramos a nossa garantia nos seguintes termos: onde se lê x… o bom pagamento de fornecimento de biscoitos…X deverá ler-se x… o bom pagamento de facturas referentes ao fornecimento de produtos alimentares…X todos os outros termos e condições mantêm-se inalterados…», conforme o teor do doc. De fls. 91 cujo teor aqui se dá por reproduzido. – Em 2-9-2005 há uma declaração de aumento de capital da garantia e em 22-9-2006 há uma declaração de validade até 27-10-2007 e até 27-10-2006, conforme o teor dos documentos de fls.93 a 95 cujo teor aqui se dá por reproduzido. A exequente alega que esses documentos dados à execução (tendo junto as facturas) se traduziriam num titulo executivo dado serem uma garantia à primeira solicitação. Será que estamos perante um título executivo? Neste caso é necessário analisar esta questão prévia e analisar se existe ou não titulo executivo o que implica uma tarefa de interpretação do contrato ou documentos dados à execução e uma delimitação da natureza desta figura jurídica. A interpretação dos contratos é uma tarefa que, se por vezes parece simples, e até desnecessária, não pode todavia dispensar-se, porque muitas vezes, e como bem salienta, Galvão Telles (Manual Dos Contratos em Geral, pág. 355 a 361), o conteúdo das declarações não é bem amadurecido nos espíritos dos pactuantes. De acordo ainda com os ensinamentos deste autor, a determinação da vontade negocial tem de ser feita segundo um critério objectivista da teoria da interpretação do destinatário – mais concretamente a teoria da impressão do destinatário – , que determina que a declaração deve interpretar-se como a interpretaria uma pessoa de qualidades médias, colocada na real situação em que se encontrava aquele a quem a declaração foi feita. Paralelamente, o intérprete não deve preocupar-se com o interesse das partes, mas sim com a sua intenção. E parafraseado Larenz (in Derecho Civil, Parte General, pág 455), o ordenamento jurídico não tem motivo para impor às partes um significado da declaração diferente daquele que ambas lhe derem. Não se discute aqui que a garantia bancária à primeira solicitação seja um título executivo porque a maioria da jurisprudência o entende, conforme se passará a analisar. Tal como resulta do Ac da RL de 5/12/2000, in CJ 2000, tomo V, 115, a garantia bancária «on first demand» é título executivo contra o banco garante. Trata-se de um contrato inominado um contrato autónomo de garantia o qual se baseia no princípio da liberdade contratual e de corresponder a interesses dignos de protecção legal (artigos 406.º e 398.º do CCivil). Este tipo de garantia começou a ser utilizado no nosso país em 1973, conforme refere Mónica Jardim, na sua dissertação de Mestrado defendida em 1998 sendo que no continente Europeu a garantia autónoma só teve consagração legal na antiga Checoslováquia e na Antiga Republica Democrática Alemã e na Antiga Republica socialista da Jugoslávia. Nos vários países da Europa Ocidental a garantia autónoma apresenta-se como um tipo contratual de origem social e jurisprudencial. Existem garantias autónomas simples e automáticas, sendo que no primeiro caso o beneficiário tem de provar o incumprimento da obrigação do devedor ou outro evento e no segundo caso o beneficiário está isento de tal prova devendo o garante entregar-lhe a quantia pecuniária fixada ao seu primeiro pedido: «on first demand», «à priemiére demnade» ou «auf dês erstes Anforden». Trata-se de uma garantia simples (porque não se decompõe noutras obrigações), pura, fungível, instantânea (cumpre-se num só momento) e de garantia, na medida em que assegura ao credor o resultado, e é uma garantia determinada uma vez que o quantitativo que o banco se obrigará a liquidar é conhecido, pelo menos no seu limite máximo, já no momento da constituição da obrigação (o garante apenas está obrigado a prestar ao beneficiário o montante indicado na convenção celebrada). Tal como nos ensina Galvão Telles, in Garantia Bancária Autónoma, Edições Cosmos, 1991, a fim de se afastar as contingências da mera garantia comum, são por vezes estabelecidas garantias especiais a favor de certos credores. As garantias bancárias são garantias de natureza pessoal prestadas por um banco, sendo que actualmente, e nomeadamente em contratos internacionais, vultosos, de execução continuada, ou entre empresas que não tem seguro ou total confiança, é frequente o surgimento desta figura. O contrato de garantia bancária é um negócio inominado definido como a garantia pela qual o banco que a presta se obriga a pagar a outrem certa quantia pecuniária no caso de alegado incumprimento de contrato determinado,

Pelo exposto, defendo pessoalmente que em todas as acções executivas, mesmo nas baseadas em injunção, exista um despacho liminar (á excepção das de sentença) quanto à existência ou não de titulo executivo, de resto esta decisão é complexa e tem a virtualidade de evitar a pendência de execuções inviáveis e a agressão do património do executado.

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sem que possa opor a seu favor quaisquer meios de defesa relacionados com este segundo contrato, sendo uma garantia autónoma e não acessória, e é exequível mediante simples comunicação pelo beneficiário do incumprimento dessa obrigação (para outros desenvolvimentos, vide Ac. do STJ de 25/5/1999, CJ STJ 1999, II, pág. 114 e Ac da RP de 26/10/2006, disponível na pág. da DGSI). Resulta deste último Acórdão que a obrigação do pagamento do garante determina-se unicamente em função das condições prestadas no contrato garantia, sendo que a independência da obrigação do banco em relação obrigação subjacente leva a que nenhuma relevância tenha para a obrigação assumida pelo banco as vicissitudes ocorridas com a relação subjacente ou aquelas que possam estar relacionadas com as partes deste contrato, devendo o pagamento ser feito após interpelação de terceiro. Igualmente neste sentido, e quanto ao conceito desta figura, vide Miguel Pupo Correia, in Direito Comercial, Direito da Empresa, Almedina 2005, pág. 542, que considera que neste tipo de garantia o garante fica automaticamente obrigado ao cumprimento da garantia com a interpelação que para tal lhe seja dirigida pelo beneficiário. A garantia automática conhecida na Alemanha por Garantievertrag, sendo o país onde a figura é amplamente estudada chama-se assim porque o banco deve pagar logo que o pagamento lhe é solicitado, sem poder formular quaisquer objecções, isto é trata-se de um sucedâneo prático de um depósito em que o devedor tem vantagem em não efectuar e o beneficiário abdica do depósito mas no pressuposto de que a posteriori, e se necessário, receba os fundos, e o banco paga de «olhos fechados». O garante paga ao credor sem discutir, depois o devedor tem de reembolsar o garante sem discutir, e será entre o devedor e o credor que se estabelecerá a controvérsia, se a ela houver lugar, cabendo ao devedor o ónus de demandar o credor para reaver o que haja desembolsado, caso a dívida não existisse e ele não fosse o verdadeiro devedor. Portanto a garantia autónoma é a garantia pela qual o banco que a presta se obriga a pagar ao beneficiário certa quantia em dinheiro, no caso de alegada inexecução ou má execução de um dado contrato (contrato base) sem poder invocar em seu benefício quaisquer meios de defesa relacionados com esse contrato. Trata-se de uma figura triangular onde existem 3 ordens de relações: entre o garantido (dador de ordem) e o beneficiário; o garantido e o garante e o garante e beneficiário. O banco só tem de pagar o que consta do título de garantia e em harmonia com o respectivo teor, devendo pagar ao primeiro pedido, imediatamente, e sem discussão. Mas desde que o beneficiário respeite esse teor e reclame o que face à garantia lhe é devido, o banco não tem outro remédio senão pagar, de imediato, sem hesitações, nem discussão. No dizer expressivo de Mónica Jardim, in A Garantia Autónoma, Almedina, 2002, citando a expressão do juiz inglês Kerr, – «The lifeblood of internacional commerce») a garantia autónoma já foi definida como o «sangue da vida do comércio internacional», dada a enorme importância que tem, a qual é igualmente conhecida por garantia pura, incondicional, abstracta, independente, ou garantia à primeira solicitação. Esta figura ao isentar o beneficiário da prova do pressuposto do seu direito, afasta o perigo da litigância sobre a ocorrência ou não dos pressupostos que legitimam o pedido de pagamento, tendo o beneficiário segurança total, ou a mesma segurança que um depósito em dinheiro. – Mas será que neste caso os documentos dados à execução se podem considerar titulo executivo tendo a natureza de garantia bancária à primeira solicitação? Desde já cumpre-nos adiantar que entende o tribunal no sentido negativo porque não se pode considerar, salvo o devido (todo) respeito por melhor entendimento, que se esteja perante uma garantia autónoma. Conforme refere o Ac da RP de 12-06-2000 disponível na DGSI: «Sumário: I – Se da vontade das partes não resulta a total abstracção do proclamado contrato de garantia bancária em relação à obrigação base, porque, por exemplo, as partes convencionaram que não era qualquer incumprimento que despoletaria o funcionamento da garantia, nem convencionaram o pagamento on first demand, então o garantido terá que provar que se acham preenchidos os requisitos factuais estipulados no contrato. II – Desta forma, porque do documento apenas se prevê a constituição de uma obrigação, dele não resultando a constituição ou certificação da mesma, não pode aquele servir de título executivo.», Nesta sede iremos ancorar-nos no douto Ac. da RP de 12-6-2000, disponível em texto integral na CJ de 2000, Tomo III, 213, dada a similitude com o caso destes autos e como tal iremos citar a fim de não adulterar a eloquência da exposição: «… se analisarmos o texto do documento, logo uma conclusão se impõe, é que não foi estipulada qualquer interpelação on first demand. A imprevisão desta clausula se não desqualifica, desde logo, o acordo negocial como garantia bancária, sem dúvida que cerceia, em muito, a proclamada autonomia da garantia, o que não frustrará ao garante a possibilidade de usar as excepções de que o garantido se possa prevalece. No caso em apreço, o banco embargante não só não se obrigou a pagar à 1.ª interpelação, como assegurou que o pagamento… dependeria de quantias que deixasse de receber por fornecimento de materiais de alumínio…. A autonomia do contrato de garantia bancária está normalmente, ligada à clausula de pagamento à 1.ª interpelação, mas se tal clausula não existe e a prestação da garantia está dependente de condições que aludem a aspectos específicos da relação base, então o garantido não, pode pura e simplesmente, reclamar o pagamento com base no contrato-garantia. Incumbe-lhe provar que se verifica o condicionalismo de que dependia o pagamento assegurado. Neste quadro estamos perante uma fiança. A relação de Lisboa, por Ac. de 27/4/99 in CJ 1999, Tomo II, 123, sentenciou: «Não se comprometendo o banco garante pagar à primeira interpelação não estamos perante uma garantia autónoma (on first demand), mas sim perante uma livrança. II – O documento em que foi prestada essa garantia não constitui titulo executivo contra o banco fiador, atento o carácter acessório da fiança…. Se da vontade das partes não resultar a total abstracção do proclamado contrato de que não era qualquer incumprimento que despoletaria o funcionamento da garantia, nem convencionaram o pagamento on first demand, então o garantido terá de provar que se acham previstos os requisitos factuais estipulados no contrato…

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Não resultando da vontade negocial, a autonomia do negocio é de qualificar como fianças art.º 627 e ss do Ccivil – não conferindo ao beneficiário titulo executivo….» (sic). Ora, resulta da leitura dos documentos dos à execução, sobretudo o primeiro (já que os outros mantêm o texto à excepção da validade e da denominação da beneficiária e apenas quanto ao objecto) que em nenhum local se prevê que a responsabilidade do banco executado(a)(s) sejá à primeira solicitação (não consta tal clausula em nenhum desses documentos) e por outro lado resulta que a responsabilidade do banco está dependente da relação base, isto é, do não pagamento dos produtos alimentares (inicialmente de biscoitos) atempadamente por parte da sociedade Xeral Basic. A responsabilidade do banco executado(a)(s) depende do incumprimento da relação base e como tal ter-se-á de considerar a declaração do banco como uma fiança porque se obrigou a cumprir a obrigação de outra pessoa no caso desta não o fazer, sendo o seu compromisso acessório, sendo que a garantia não tem objecto distinto do objecto da obrigação decorrente do contrato base (conforme se estabelece na garantia autónoma). Fazendo recurso à interpretação das declarações negociais resulta que ao não constar uma clausula que responsabilize o banco à 1.ª interpelação e ao não existir autonomia entre as obrigações, daqui decorre que não se pode considera a declaração do banco como uma garantia autónoma à 1.ª solicitação. O que implica que a exequente não possua titulo executivo contra o banco executado(a)(s) porque terá de demonstrar o incumprimento da sociedade referida e tal carece de ser feito numa acção declarativa. Assim, a exequente não tem título executivo porque não podemos considerar estar perante uma garantia autónoma on first demand. Para outros desenvolvimentos, e neste sentido vide o Ac do STJ de 28-09-2006, disponível na DGSI :«Sumário: I – A garantia autónoma é uma figura jurídica (cujo fundamento jurídico-positivo se encontra no art. 405.º do CC) que se destina a proteger o credor contra o risco de incumprimento por parte do devedor. II – É uma medida de protecção mais forte do que aquela que constitui o arquétipo das garantias pessoais – a fiança – na medida em que arreda da sua disciplina o princípio da acessoriedade, que constitui o traço característico da fiança. III – Enquanto a obrigação do fiador é acessória da que recai sobre o principal devedor (art. 627.º, n.º 2, do CC), o que significa que o fiador pode opor ao credor os meios de defesa de que pode valer-se o devedor – designadamente as excepções relativas à validade, eficácia, conteúdo, extinção, (...) da obrigação garantida – , a garantia autónoma acha-se inteiramente desligada da relação principal, não podendo o garante opor ao beneficiário as excepções atinentes à dita relação principal. IV – A obrigação assumida pelo garante, na garantia autónoma, funda-se na responsabilidade objectiva, é autónoma e independente, e não se molda sobre a obrigação (de prestar ou de indemnizar) do devedor do contrato-base, nem quanto ao objecto nem quanto aos pressupostos da sua exigibilidade. V – Há, por outro lado, garantias autónomas simples e garantias autónomas automáticas. Enquanto nas primeiras o beneficiário só pode exigir o cumprimento da obrigação do garante desde que prove o incumprimento da obrigação do devedor ou a verificação do circunstancialismo que constitui pressuposto do nascimento do seu crédito face ao garante, já tal prova não lhe é exigível nas segundas, devendo nestas o garante entregar imediatamente ao beneficiário, ao primeiro pedido deste, a quantia pecuniária fixada. VI – Se a garantia não for à primeira solicitação, se não contiver esta cláusula que lhe confere automaticidade, o beneficiário só pode exigi-la desde que prove o facto que é pressuposto do nascimento da obrigação de garantia. VII – A questão de saber se, em dado caso, estamos perante uma fiança ou uma garantia autónoma e, dentro do género, se perante uma garantia autónoma automática e à primeira solicitação, supõe interpretação do negócio jurídico e da vontade das partes, à qual há-de proceder-se de acordo com o disposto nos arts. 236.º e 238.º do CC. VIII – Não se tratando de garantia autónoma, automática ou à primeira solicitação, o documento em que se funda a execução não tem força executiva, não é documento enquadrável na al. c) do art. 46.º do CPC e, como tal, a execução não pode prosseguir – nem devia ter sido instaurada – por inexistência de título executivo – arts. 813.º, a) e 815.º, n.º 1, do CPC (na versão de 1997), 814.º, al. a), e 816.º, na redacção introduzida pelo DL n.º 38/2003, de 08-03.». Conforme se refere no citado Acórdão: «…A fiança é o contrato pelo qual uma pessoa se obriga para com o credor a cumprir a obrigação de outra pessoa, no caso de esta o não fazer. O fiador compromete-se a pagar a dívida de outrem – o devedor principal. O seu compromisso é acessório. No caso de garantia autónoma, o garante não se obriga a satisfazer uma dívida alheia. Ele assegura ao beneficiário determinado resultado, o recebimento de certa quantia em dinheiro, e terá de proporcionar-lhe esse resultado, desde que o beneficiário diga que não o obteve da outra parte, sem que o garante possa entrar a apreciar o bem ou mal fundado desta alegação. O objecto da fiança confunde-se com o objecto da dívida afiançada, no sentido de que o fiador tem de pagar o que o afiançado deixou de satisfazer. O objecto da garantia autónoma é distinto do objecto da obrigação decorrente do contrato-base. Daqui resulta que o garante autónomo ou independente, ao contrário do fiador, não é admitido a opor ao beneficiário as excepções de que se pode prevalecer o garantido. Faz-se muitas vezes uma declaração expressa nesse sentido, afirmando-se no título da garantia não poder o garante invocar as excepções derivadas do contrato-base. Essa declaração não é indispensável, mas tem a vantagem prática de explicitar melhor que não se trata de uma fiança. Em regra, tal declaração aparece rotulada de renúncia, mas verdadeiramente não se trata de renúncia – ou melhor, exclusão – de um direito que assistisse em princípio ao garante, e sim de uma consequência necessária da natureza autónoma da garantia» (6). …A garantia autónoma, pelo contrário, gera uma obrigação totalmente independente, nem subsidiária nem acessória do contrato-base. O fiador poderá renunciar ao benefício da excussão (art. 638.º, CC), e, nesse caso, retirar à fiança a característica subsidiária; em todo o caso, a fiança continuará dependente da obrigação principal, em termos de validade e de eficácia; será sempre uma garantia acessória. A garantia autónoma funciona, pois, independentemente da excussão dos bens do beneficiário e da validade substancial ou formal da obrigação garantida.

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A garantia autónoma é, normalmente, apetrechada com uma cláusula on first demand, que se poderá traduzir por "à primeira solicitação", e que representa, para o beneficiário, um acréscimo de garantia, pois que o seu significado é o de que o banco fica constituído na obrigação de pagar imediatamente, a simples pedido do beneficiário, sem poder discutir os fundamentos e pressupostos que legitimam o pedido de pagamento, designadamente, sem poder discutir o incumprimento do devedor. ... A teorização desta matéria distinguindo a garantia autónoma da fiança remonta a "Stammler" há já quase um século: distinguia aquele autor os contratos (8) de garantia em duas categorias: de um lado, os contratos de garantia, acessórios de uma obrigação principal; de outro, os contratos de garantia que encontravam fundamento na autonomia da vontade e prescindiram daquela relação com qualquer outra relação jurídica, gerando para o promitente uma obrigação totalmente autónoma. E foi esta doutrina, acolhida no código alemão, que permitiu um grande desenvolvimento, sobretudo na Alemanha, da figura da "garantievertrag", como excelente instrumento de desenvolvimento do comércio internacional, sendo três as vantagens práticas apresentadas por estas garantias, enunciadas por José Simões Patrício (in "Preliminares sobre a garantia", On First Demand – Revista Ordem dos Advogados, ano 43, III, 1983) e Galvão Teles, Garantia Bancária Autónoma, págs. 20). A garantia autónoma surge, no comércio jurídico, como garantia pela qual o Banco que a presta se obriga a pagar ao beneficiário certa quantia em dinheiro, no caso de alegada inexecução ou má execução de determinado contrato (o contrato-base) sem poder invocar em seu benefício quaisquer meios de defesa relacionados com esse mesmo contrato (Galvão Teles, ob. cit., págs. 22; Simões Patrício, ob, cit. págs. ...). A garantia autónoma e a fiança correspondem a preocupações semelhantes, na medida em que ambas têm uma função específica de garantia: não podem, todavia, assimilar-se porque as separam traços fundamentais. A fiança é o negócio jurídico pelo qual uma pessoa se obriga para com o credor a cumprir a obrigação de outra pessoa, no caso desta o não fazer. O fiador compromete-se a pagar a dívida de outrem – o devedor principal. O seu compromisso é acessório – art. 627.º n.º 1. No caso de garantia autónoma, o garante não se obriga a satisfazer uma dívida alheia. Ele assegura ao beneficiário determinado resultado: o recebimento de certa quantia em dinheiro, e terá de proporcionar-lhe esse resultado, desde que o beneficiário diga que não o obteve da outra parte, sem que o garante possa apreciar o bem ou mal fundado desta alegação (Galvão Teles, ob. cit. 24). O garante autónomo ou independente, ao contrário do fiador, não é admitido a opor ao beneficiário as excepções de que se pode prevalecer o garantido (Galvão Teles, ob. cit. 24; Ferrer Correia, “Notas para o Estudo do Contrato de Garantia Bancária”, na Revista de Direito e Economia, ano VIII, 1982, págs. 250 e 251). A questão de saber se em determinado caso existe uma garantia simples (fiança) ou um contrato realmente autónomo, em face da relação obrigacional, pode apresentar dificuldades. É um problema a resolver em sede de interpretação da vontade das partes, atentas as circunstâncias da situação concreta e os usos comerciais, se os houver (Ferrer Correia, ob. cit., págs. 252), sendo certo que não haverá lugar a interpretação da vontade das partes quando o Banco se compromete a pagar "à primeira interpelação": On first demand. A inserção de tal cláusula no contrato de garantia bancária tem um duplo alcance: 1) Em primeiro lugar, ela significa que o Banco renuncia a opor ao beneficiário quaisquer excepções derivadas tanto da sua relação com o cliente e mandante (relação interna), como da relação causal (a relação entre o devedor principal e o beneficiário). 2) Em segundo lugar, a cláusula on first demand teria por efeito isentar o beneficiário do ónus da prova dos pressupostos do seu crédito contra o Banco. A simples afirmação feita pelo beneficiário de que o facto se produziu (de que a outra parte não cumpriu o contrato que por isso foi por ele rescindido unilateralmente) bastaria para colocar o Banco na situação de ter de efectuar o pagamento pedido, sem mais indagações (Ferrer Correia, ob. cit., págs. 252 e 253).Não existindo cláusula expressa on first demand no contrato de garantia bancária haverá que interpretar o mesmo no sentido de se apurar qual a vontade das partes: fiança ou garantia autónoma. Na interpretação haverá que ter presente que, por um lado, o n.º 1 do art. 236.º do CC representa a consagração da chamada "teoria da impressão do declaratário", teoria esta que entende que a declaração negocial deve ser interpretada como um declaratário razoável, colocado na posição concreta do declaratário, a interpretaria, com o que se procura, num conflito que atribuiu à sua declaração e o interesse do declaratário no sentido que podia razoavelmente atribuir a esta, que se julga merecedora de maior protecção, não só porque era mais fácil ao declarante evitar uma declaração não coincidente com a sua vontade do que ao declaratário aperceber-se da vontade real do declarante, mas também porque assim se defendem melhor os interesses gerais do tráfico, do comércio jurídico. Por outro lado, na interpretação da declaração de vontade das partes serão atendíveis todas as circunstâncias do "caso concreto", todos os coeficientes ou elementos que um declaratário medianamente instruído, diligente e sagaz, na posição do declaratário efectivo, teria tomado em conta (Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 1980, pág. 421) (9). ... Na posse destes ensinamentos e revisto o texto da garantia à luz dos preceitos reguladores da interpretação negocial, é ponto assente que no documento em que foi vazado o contrato de garantia não se contém a cláusula on first demand ou à primeira interpelação, o que logo afasta a automaticidade da garantia, ao abrigo da qual e ao primeiro pedido do beneficiário da garantia o garante é, em princípio, obrigado a pagar imediatamente, sem contestação, sem poder exigir a prova da inadimplência do devedor garantido e mesmo com a eventual oposição deste. Afastada a automaticidade da garantia, afectada fica a sua autonomia ou independência em relação à relação principal ou contrato-base, pois, como acima se viu, se a garantia não for à primeira solicitação, (se não contiver esta cláusula que lhe confere automaticidade), o beneficiário só pode exigi-la desde que prove o facto que é pressuposto do nascimento da obrigação de garantia. Também se não vê no texto da garantia qualquer declaração de renúncia do banco à invocação de excepções derivadas do contrato-base. Essa declaração não é indispensável, mas tem a vantagem prática de explicitar melhor que não se trata de uma fiança. Em regra, tal declaração aparece rotulada de renúncia, mas verdadeiramente não se trata de renúncia – ou

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melhor, exclusão – de um direito que assistisse em princípio ao garante, e sim de uma consequência necessária da natureza autónoma da garantia. No nosso caso e bem ao contrário, a garantia bancária (porque prestada por um banco) destinou-se a caucionar o bom cumprimento das obrigações emergentes para o mandante ... relativas ao contrato-promessa de aquisição de 360.000 acções... Nem uma palavra sobre autonomia da garantia antes expressa referência ao bom cumprimento do contrato-base. Nem se diga – como pode afirmar-se a propósito de garantias bancárias destinadas a substituir a caução em empreitadas de obras públicas ou particulares a que se aplique o regime daquelas – que a autonomia da garantia resulta dessa finalidade. Aqui visou-se caucionar o bom cumprimento de um contrato promessa de compra e venda de acções que, nem por sua natureza nem por regulamentação legal, impõe qualquer prestação de caução. ..Transformar esta garantia bancária simples em garantia autónoma – assim impedindo o garante de discutir a relação de base quando nenhuma cláusula de exclusão foi contratada – fazê-la equivaler a garantia automática, apesar de não conter cláusula de pagamento à primeira solicitação ou semelhante, é concluir que qualquer garantia, só por ser prestada por um banco, há-de ser garantia bancária autónoma, à primeira solicitação, é atraiçoar a liberdade contratual, impor a uma das partes obrigações que ela não contratou. Tanto mais que, em caso de dúvida, o negócio de garantia presume-se ser de fiança, em virtude de esta ser o tipo considerado na lei e de em matéria de garantias autónomas valer a interpretação textual, o conteúdo objectivo do acto e não o literal. Isto, se dúvida houvesse, que não as há, ao menos fundamentadas. Não se tratando de garantia autónoma, automática ou à primeira solicitação, o documento em que se funda a execução não tem força executiva, não é documento enquadrável na al. c) do art. 46.º do CPC e, como tal, a execução não pode prosseguir – nem devia ter sido instaurada – por inexistência de título executivo – ar. 813.º, a) e 815.º, n.º 1 do CPC (na versão de 1997), 814.º, a) e 816.º na redacção introduzida pelo Dec-lei n.º 38/2003, de 8 de Março…» (sic). Portanto, e tendo por base os ensinamentos dos doutos Acórdãos que antecedem e o teor da doutrina referida, resulta que neste caso, e salvo o devido respeito, o documento ou documentos juntos como títulos executivos não têm força executiva porque não surge nenhuma clausula à primeira solicitação nem clausula que separe a obrigação do banco do contrato base (dado que o banco só diz que será principal pagador no caso de não cumprimento da outra sociedade) não se considera que se esteja perante uma garantia bancária à primeira solicitação e como tal a exequente não possui titulo executivo contra o banco executado. Pelo exposto, e nos termos do artigo 812.º, do CPCivil indefiro liminarmente o requerimento(s) executivo e considero extinta a execução, uma vez que é manifesta a falta de título executivo quanto ao executado. Assim, entende o tribunal que o documento dado à execução não tem a virtualidade de se traduzir num título executivo, motivo pelo qual se indefere liminarmente o requerimento executivo…». – Injunção: « O requerimento inicial de injunção com a oposição pelo Secretário Judicial da fórmula executória «este documento tem força executiva» constitui título executivo nos termos do artigo 14.º do DL n.º 268/98, de 1/9, o qual é um título extrajudicial (para maiores desenvolvimentos vide o AC da RL de 6/6/2000, in CJ 2000, Tomo III, 118). Estabelece o artigo 812.º, n.º 2, do CPCivil que o requerimento executivo será liminarmente indeferido, nomeadamente, quando: «a) Seja manifesta a falta ou a insuficiência do título; b) Ocorram excepções dilatórias, não supríveis, de conhecimento executivo;...». Ora, a presente execução (na sequência da instauração da acção de injunção) foi instaurada contra «Papelaria Triângulo Cristina Lemos»., sendo que a(o) executada(o) manifestamente não tem personalidade judiciária (não se trata de pessoa colectiva ou de pessoa singular). Conforme estabelece o artigo 66.º, n.º 1, do CCivil, a personalidade judiciária adquire-se no momento do nascimento completo e com vida. Todavia, e como refere o douto AC da RE de 23/1/1996, (in CJ de 1996, t.I, 292), na sociedade os homens por vezes agrupam-se para prosseguir determinados fins, ou realizar determinados interesses, fins esses que por vezes são distintos daqueles dos indivíduos que formam os grupos – surgindo desta forma a ideia de pessoa colectiva (para maiores desenvolvimentos, vide Ac. do STJ de 22-1-1997, in CJ de 1997, t.I, 259 e AC. de RL de 8/7/1998, in CJ de 1998, tomo III, 99). Ao contrário do que sucede com o ser humano considerado em singular, ao qual a atribuição da personalidade é automática, no caso de entes colectivos, a atribuição dessa qualidade depende de uma lei formal ou de um acto de reconhecimento, por uma autoridade administrativa. Como é sabido o estabelecimento comercial (ou industrial) não é em princípio património autónomo e não tem por isso personalidade judiciária. Mas embora destituído de personalidade judiciária, o Estabelecimento Individual de Responsabilidade Limitada, E.R.I.L., constituído nos termos do artigo 2.º, do dl n.º 248/86, de 25-8, porque património autónomo, goza de personalidade judiciária, nos termos do artigo 6.º do C.P.C. (neste sentido Ac do de 13-2-1992, CJ 1992, 1.º, 156 e BMJ de 414, 620). A falta de personalidade judiciária é insanável. Noutros termos o estabelecimento comercial não tem personalidade judiciária e como tal estamos perante uma excepção dilatória de conhecimento oficioso, insanável, o que determina o indeferimento liminar da execução (vide, o Ac. de 19-2-1982, CJ 1982, 1.º, 194). Mesmo que assim não fosse entendido, e fosse dado um despacho de aperfeiçoamento (para se esclarecer qual a entidade demandada, se uma pessoa colectiva ou singular e quem), iria existir uma desconformidade entre o título executivo e o executado, visto serem entidades diferentes, e como tal essa desconformidade determinaria que existisse uma falta de causa de pedir (de resto, a entidade a indicar como sendo a executada não se poderia considerar citada dada a sua identificação não corresponder com a requerida na injunção). Consequentemente, e nos termos dos artigos 812.º, do CPCivil, e 494.º e 495.º, do CPC, e 820.º todos do CPC, indefiro liminarmente o presente requerimento executivo.».

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VI. INCIDENTES E APENSOS DECLARATIVOS NA EXECUÇÃO E A ESTATÍSTICA PROCESSUAL: PROPOSTAS CONCRETAS DE REDUÇÃO DE PENDÊNCIAS – APENSOS POR LINHA OU ADMINISTRATIVO. O actual projecto estipula a regra que quando o titulo seja uma sentença, que um eventual oposição seja tramitada nos próprios autos, como um incidente, em nome da celeridade processual, dado que tal tem a virtualidade de em sede de oposição à execução, quando está em causa a citação, não ser necessário extrair traslado do processo declarativo, e de ser logo visível a forma como ocorreu a citação e se houve ou não intervenção da parte e evitar a contabilização de mais uma acção pendente com a virtualidade de uma redução de pendências. Igualmente a opção por a execução quanto a custas e multas correr por apenso na 1.ª instância se revela muito oportuna porque evita gastos financeiros com a elaboração de certidões e de recursos humanos, para além de evitar descoordenações entre o processo principal e o executivo que pende noutro tribunal (não é raro vir o executado informar o processo executivo, aquando de uma penhora, que já havia pago as custas, no processo principal). No entanto, neste segmento, se concordamos com a opção legislativa de as execuções de sentença correrem por dependência da acção declarativa, já a decisão de a tramitação estar integrada nos autos, nos causa algumas reservas uma vez que e como bem se salienta no Parecer do C.S.M.25, dever-se-ia separar os processados evitando-se a «confusão» ou «cruzamento» de actos de diferente natureza dado que a instância declarativa não termina com a prolação da sentença e poderá surgir uma enorme «perturbação na boa gestão processual». Neste segmento entendo que a opção do futuro código tem como critério orientador uma diminuição de pendências, ao considerar um execução de sentença como um mero incidente da acção declarativa, no entanto, face à pertinente critica acima referida quanto à «confusão de tramitações», permita-se-me a sugestão de compromisso, no sentido de criar um apenso por linha – um processo administrativo apenso apenas para fim de comodidade na tramitação sem contabilização estatística. Neste ponto e em nome de uma redução de pendências poder-se-ia defender que tanto nas execuções de sentença, como nas execuções por custas ou multas, fossem tramitadas por dependência da acção declarativa respectiva, mas não integradas nos próprios autos declarativos (mesmo com o eventual uso de «separadores» a tramitação poderá ser complexa e exigir gastos acrescidos com a compra desse material de escritório para separar acções de natureza muito diversa), mas sim elaborando-se um apenso por linha criado com uma finalidade meramente administrativa com a finalidade prática de separar os processos (este apenso não seria contabilizado de forma estatística e respeita os princípios do actual artigo 542.º, n.º 2 do CPCivil que estabelece que os documentos incorporam-se no processo, salvo se, por sua natureza, não puderem ser incorporados ou houver inconveniente na incorporação, neste caso ficarão depositados na secretaria). De resto, neste ponto defendo a opção, dando eco ao principio da gestão processual, de deixar ao critério do julgador a integração ou não nos autos da fase executiva, ou a criação meramente administrativa de um «apenso por linha», consoante a complexidade ou não da tramitação declarativa (podendo inclusive haver uma integração nos autos desse apenso por linha, finda a acção executiva e inerentes incidentes). Tal opção conduziria de forma clara a uma diminuição muito significativa das pendências processuais em sintonia com os compromissos assumidos pelo Estado Português com a Troika, porque as pendências das execuções de sentença e por custas são extremamente elevadas (a grande maioria dos processos declarativos «gera» um processo de execução por custas ou multas). Por fim, quanto à tramitação processual, e no contexto da locação, o legislador permite agora a cumulação de execução com fins diversos, nomeadamente no caso da entrega e de quantia certa, sendo que tal opção dá eco à celeridade e evita que se tenham de instaurar duas acções Parecer do CSM sobre a proposta de Lei n.º 113/XII/2.ª (GOV.) – "Aprova o Código de Processo Civil" – Comissão de Assuntos Constitucionais Direitos, Liberdades e Garantias da Assembleia da República, elaborado pelos Mm.º Juízes de Direito Dr.os Paulo Ramos de Faria e Nuno de Lemos Jorge, disponível in http://www.csm.org.pt/ ficheiros/pareceres/parecercsm_projectocpc2012.pdf 25

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(uma para a entrega e outra para a obtenção das quantias) e está em plena harmonia com os compromissos que o estado Português assumiu internacionalmente no contexto actual. A reforma traz outra nota extremamente positiva ao se basear no paradigma do regresso do controlo do processo executivo por parte do Juiz, (Esta opção acarretou que a destituição do Agente de Execução seja uma decisão Judicial, sem prejuízo das questões disciplinares a cargo da CPEE), e ao estabelecer a delimitação de funções entre os intervenientes processuais, clarificando os seus deveres processuais o que contribui para uma maior transparência e eficácia (artigos 720 e 721, 723 e 724.º)26. Neste segmento, saliento o entendimento que volta a conceder competência ao Juiz para a apreciação e decisão das questões relativas à redução ou isenção da penhora quanto aos vencimentos, o que se traduz num avanço na tutela dos direitos dos executados.27 Neste contexto, e quanto a oposição à penhora, mais concretamente quanto à questão do pedido de redução ou isenção de penhora sobre o vencimento dever-se-ia consignar ser um incidente da execução e não uma oposição à penhora tout court (a tramitar por apenso), dada a questão relativa a eventual necessidade de constituição de mandatário conforme valor da execução (podendo o executado por si próprio suscitar esse incidente quanto ao seu vencimento) e não existir a necessidade de pagamento de taxas de justiça, dado que tal omissão, para quem considera ser uma oposição tramitada por apenso, poder determinar a prolação de um despacho de indeferimento liminar dessa oposição por um aspecto puramente formal, com as inerentes nefastas implicações em termos socais e humanos.28 De resto, permita-se-me a sugestão, para evitar excessivos incidentes quanto à penhora de rendimentos laborais ou pensões, que fosse adoptada a prática de se iniciar a penhora pela percentagem mínima prevista na lei, e só em caso de ser possível, face a um rendimento elevado, o exequente suscitar a questão da ampliação da penhora (de resto no actual cenário económico afigura-se-nos ser prudente harmonizar o entendimento da penhora ser iniciada pelo mínimo legal, até para se obstar a danos decorrentes do tempo que demora a decisão e da dedução de incidentes evitáveis). Acresce que em meu entender, este incidente deveria ter a natureza de um processo urgente, de forma a ser decidido em tempo útil face às implicações socio-económicas que tem inerentes, e face à sua simplicidade.29 De resto esta previsão normativa, poderá ir buscar as suas raízes ao Regime Processual Civil Experimental ao princípio da adequação formal, ligado ao poder de direcção do processo (artigo 2.º do DL 108/2006). No que diz respeito ao artigo 2.º o chamado «dever de gestão processual» exige que o juiz exerça a direcção do processo, devendo adoptar a tramitação processual adequada às especificidades da causa e o conteúdo e forma dos actos, e deverá garantir que não sejam praticados actos inúteis, recusando o que for impertinente ou dilatório e adoptar mecanismos de agilização processual. Nesta sede o legislador pretendeu introduzir uma verdadeira mudança na atitude processual do juiz e vai mais longe que o principio da adequação formal dos artigos 265 e 265-A do CPC, e esse aspecto traduz-se num desafio quanto à «mentalidade processual» instalada (Sobre a evolução histórica e os contornos do dever de gestão, vide Paulo Duarte Teixeira, “O Dever de Gestão no Processo Experimental”, in Regime Processual Civil Experimental, DGPJ, Março de 2008, pág. 9 a 51). Neste segmento, é referido que o eixo nuclear deste processo está fixado neste dever de gestão processual do Juiz, sendo que inclusivamente um autor considera que «o legislador deu um claro voto de confiança aos Juízes» e que será a judicatura a ser «posta à prova», atenta a sua dimensão (Paulo Ramos de Faria, in Regime Processual Civil Experimental, A Gestão Processual no Processo Declarativo Comum experimental, DGPJ, pág. 61). 27  Para outros desenvolvimentos, vide Orlando Sérgio da Silva Rebelo, “O Juiz no Processo de Execução”, in Revista Julgar, ASJP, n.º 18, Coimbra Editora, Setembro-Dezembro 2012, pág. 131 a 146; e Virginio da Costa Ribeiro, “O Poder Geral de Controlo Na Acção Executiva, A Sua Consagração Legal Será Útil e Necessária Ou Poderá Ser Considerada Inconveniente?”, in Revista Julgar, ASJP, n.º 18, Coimbra Editora, Setembro-Dezembro 2012, pág. 147 a 159. 28  No contexto da reforma de 2003 perante o pedido de redução ou isenção de penhora proferia despacho a considerar que se entendia que tal requerimento não se traduzia numa oposição à penhora a deduzir por apenso, mas sim um requerimento avulso a ser tramitado nos autos. De resto, neste sentido, vide o Ac da RP de 17/9/2007, disponível na Internet, na Pág. Da DGSI: «meio processual adequado para o executado poder, por sua iniciativa, vir a beneficiar da redução ou isenção previstas no art. 824.º n.º 4 do CPC, é a apresentação de requerimento avulso nos próprios autos e não a dedução de oposição à penhora, nos termos do disposto no art. 863.º-A, n.º 1, a), 2.ª parte do mesmo diploma.». 29  Nesta sede cumpre não perder de vista que a acção executiva deve sempre acautelar os direitos do exequente, sem desrespeitar os direitos dos executados, dado os valores que estão em causa, com uma penhora, nomeadamente de salários ou saldos – conforme a ideia salientada por José Mouraz Lopes, in “Justiça, Um Olhar (Des) Comprometido”, Almedina, Coimbra, 2005 :O sistema de justiça é antes de mais e de tudo um sistema de garantia, de garantia de direitos historicamente estabelecidos, sedimentados e aprofundados e é sobre este pilar que deve, sem qualquer hesitação, assentar todo o edifício jurisdicional em construção. 26

Tal opção conduziria de forma clara a uma diminuição muito significativa das pendências processuais em sintonia com os compromissos assumidos pelo Estado Português com a Troika, porque as pendências das execuções de sentença e por custas são extremamente elevadas (…).

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Neste ponto e visando igualmente uma redução de pendências, pode-se optar claramente pela tramitação nos próprias autos executivos ou criar um mero apenso por linha ou administrativo, em paralelo com a sugestão acima mencionada quanto à execução de sentença e por custas ou multas. Ainda no contexto da redução de «pendências» que resultam de uma actividade que não é jurisdicional, e dizem respeito, nomeadamente a execuções suspensas devido a penhora no vencimento; acordo de pagamento em prestações, sendo que dado que neste tipo de situação o tribunal não pode tramitar o processo entendo que deveria existir uma possibilidade informática de se assinalar estes processos e coloca-los como processos «parados por factos extra-judiciais» com a inerente retirada da estatística, sem prejuízo de caso não se concluíssem os pagamentos, se reabriria a pendência dessa execução. Tal possibilidade iria reduzir de forma muito significativa a pendência e contribuir para uma melhor imagem dos tribunais, sendo que de resto estas situações não lhe «são imputáveis». Neste domínio podermos referir que foi por nós aplicado este entendimento nos juízos de Execução do Porto quanto à integração nos autos executivos do incidente de habilitação de cessionário (reduzindo as pendências) mediante a aplicação da lei transitória da Reforma de 2008.30 30  O despacho por nós proferido no caso era o seguinte: «Conforme é sabido e atento o artigo 142 do Cpcivil a forma dos diversos actos processuais é regulada pela lei que vigore no momento em que são praticados. Tendo em conta os ensinamentos de A. Varela e Sampaio e Nora e J. Miguel Bezerra in Manual de Processo Civil, pág. 53 a 55, sobre a aplicação da lei no tempo resulta que quanto aos actos processuais ou formalismo processual vale o princípio da aplicação imediata da nova lei na sua plenitude, ou seja, abrangendo não só as acções futuras, mas também os actos a praticar no futuro nas acções pendentes à data da entrada em vigor da nova lei. Neste ponto distingue-se quanto à aplicação das lei no tempo relativas ao formalismo processual, por um lado as normas reguladoras de actos a praticar na proposição e desenvolvimentos da acção, bem como das formalidades e termos próprios de cada um deles (aplicação imediata da lei nova), por outro lado a forma do processo que a acção deve seguir (aplicação da lei antiga). Resulta que o que não se pode é colocar em causa a validade de actos processuais anteriores não se podendo inutilizar actos processuais anteriormente praticados, e igualmente também se tem de manter a validade de actos duradouros (audiência de jugamento). Tal como referem estes autores, obra citada, pág. 55, nota 1, devem aplicar-se imediatamente a lei, dentro da forma de processo que está a ser seguida, suprima um acto ou altere os pressupostos da sua prática. Como é sabido foi publicado o Decreto-Lei n.º 226/2008 de 20 de Novembro que conforme o seu preambulo refere visar tornar mais célere a acção executiva «…Decorridos mais de cinco anos desde a entrada em vigor da Reforma da Acção Executiva e após a adopção de várias medidas que permitiram testar, com resultado, várias das suas inovações, é agora possível perceber efectivamente o que deve ser aperfeiçoado no modelo então adoptado, aprofundando-o e criando condições para ser mais simples, eficaz e apto a evitar acções judiciais desnecessárias. O presente decreto-lei adopta, pois, um conjunto de medidas que visam esses objectivos. Em primeiro lugar, introduzem-se inovações para tornar as execuções mais simples e eliminar formalidades processuais desnecessárias…». Nesta senda pelo referido Decreto-Lei (que entrará em vigor em 31-3-2009) estabelece de forma expressa no Artigo 23.º: «Entrada em vigor O presente decreto-lei entra em vigor em 31 de Março de 2009 com as excepções seguintes: O disposto no artigo 376.º, no artigo 10.º e no artigo 22.º do presente decreto-lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação….». Ora, o artigo 376 do cpc tem agora a seguinte redacção:«.. Artigo 376.º[...] 1 – A habilitação do adquirente ou cessionário da coisa ou direito em litígio, para com ele seguir a causa, faz-se por termo de cessão lavrado no processo ou por requerimento de habilitação. 2 – Nos casos em que a habilitação se faz por termo de cessão lavrado no processo é notificada a parte contrária para contestar, podendo o notificado, designadamente, impugnar a validade do acto ou alegar que a transmissão foi feita para tornar mais difícil a sua Posição no processo…» (sic). Desta norma que está em vigor desde o dia 21-11-2008 resulta de forma expressa que ao contrário da anterior legislação em que o incidente de habilitação era autuado e registado por apenso (artigo 376 anterior dizia de forma expressa que o incidente seguia por apenso), actualmente o incidente de habilitação é tramitado nos próprios autos da execução (conforme diz o actual artigo 376 do CPCivil ao indicar que a habilitação se faz por termos ou requerimento de habilitação). Ora, resulta que esta norma já está em vigor e que a mesma suprime um acto atinente à autuação e tramitação do incidente por apenso passando o mesmo a correr nos autos e entende-se que se deverá integrar o incidente de habilitação que estava a correr por apenso nos próprios actos de execução (dando a respectiva baixa do apenso) porque tal segmento da norma que diz respeito à integração do incidente nos autos diz respeito ao formalismo processual atinentes a actos a praticar na propositura e desenvolvimento da acção e nesse caso aplica-se de imediato a lei nova mesmo aos processos pendentes – vide Abílio Neto, CPCivil Anotado, pág. 194, citado A. Varela obra citada, pág. 51 e 52. Consigna-se que o que entra de imediato em vigor é só o segmento atinente ao incidente passar a correr nos autos de execução em vez de correr por apenso (aplicando-se de imediato a lei nova mesmos aos processos anteriores) porque tal norma diz respeito ao mero formalismo processual da pratica de actos do desenvolvimento da

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Cumpre-me consignar que entendo que estas sugestões de criação de «apensos por linha», ou de «retiradas temporárias de processos da estatística» poder-se-iam, dado serem actos de natureza processual, ser de aplicação imediata, nomeadamente através de uma adequada norma transitória que o permitisse e determinasse.

VII. O CHAMAMENTO DOS CREDORES DEVERÁ EXISTIR ? Quanto à citação dos credores para a reclamação de créditos prevista no artigo 788.º que fixa o prazo de 5 dias para a sua realização, defendo que essa citação só deveria ocorrer mediante despacho judicial prévio porque é muito habitual serem feitas as citações e o bem já estar penhorado anteriormente não tendo havido sustação, ou de existirem situações processuais que não se coadunam com essa citação (declaração do exequente de ter sido pago ou de pretender desistir da execução), e tal chamamento dos credores, sem esse controlo prévio, irá originar a pendência de mais um processo o qual, mesmo após constatação, de que o bem já estava penhorado, não poderá ser extinto sem mais porque o exequente sempre poderá vir a impulsionar os autos (ficando pendente contabilisticamente a referida acção por tempo quase indeterminado). Acresce que a pendência da reclamação de créditos dificulta ou impede em muitas circunstâncias a extinção da própria execução ou levantamento da penhora e até da suspensão da execução para pagamento em prestações (dado que o exequente já não poderá de forma unilateral realizar esse acto sem o acordo dos credores reclamantes ou com a sua oposição). Esta situação implica um aumento da pendência processual, dado que por um lado a execução não se pode extinguir devido ao crédito reclamado, e por outro lado, cria mais um apenso declarativo que poderia ser evitado facilmente no caso de o Agente de Execução apenas dever cumprir o artigo 864.º do CPC mediante despacho judicial prévio.31 instância e não anula nenhum dos actos que já estavam praticados nem altera nenhum dos pressupostos do incidente (porque neste ponto aplica-se a lei anterior e vigente à data da entrada do incidente, nomeadamente mantém-se o mesmo requerimento inicial e citações e todos os actos relativos a esse formalismo, dado que o artigo 376 do CPC quanto à forma de processo só se aplica aos processos de habilitação deduzidos após 21/11/2008). O único aspecto que se considera ser de aplicação imediata do artigo 376 do cpc novo é quanto ao incidente ser integrado nos autos e não por apenso, devendo integrar-se integralmente o incidente junto e tal como se encontra nos autos de execução e prosseguir a sua tramitação habitual nos termos do artigo 376 do CPC anterior redacção. De resto o entendimento desta aplicação imediata (quando a integrar o processo que corria por apenso) para além de se basear no artigo 142 do CPc e no acima exposto baseia-se no objectivo fixado no próprio preambulo do DL referido que visa evitar a litigiosiade e as pendências e actos inúteis. Acresce por outro lado que a decisão de aplicar de imediato este ponto do actual artigo 376 do CPC garante a validade da totalidade dos actos praticados antes desta decisão prosseguindo o incidente nos seus precisos termos anteriores e sob a redacção do anterior artigo 376 do CPC – quanto aos processos de habilitação entrados até 21/11/2008 – e mantendo-se a validade de todos os actos já praticados antes, não se anulando qualquer tramitação processual anterior. Pelo exposto, e atento o ter do artigo 376 n.º 1 do CPC que entendo ser de aplicação imediata quanto ao ponto de deixar de correr por apenso a passar a correr nos autos de execução ou reclamação (conforme a situação), mesmo aos processos anteriormente instaurados à data de 21/11/2008, proceda-se de imediato à integração integral e nos seus precisos termos do incidente de habilitação de cessionário ou adquirente que está autuado por apenso e integre-o nos autos de execução /reclamação (consoante a parte pretenda substituir) dando a competente baixa e prossiga-se com a tramitação determinada nos termos do artigo 376 do cpc quanto à forma dos actos. Notifique o requerente e D.N.». (SIC) 31  Para ilustrar esta situação, que acarreta vários problemas processuais e dificulta a extinção das acções (dado que o executado mesmo procedendo ao pagamento ao exequente poderá ser confrontado com a manutenção da execução ou renovação devido à existência de créditos reclamados), invoco um despacho-tipo que proferia no contexto da anterior reforma (2003) perante a situação de se ter convocado os credores perante a penhora de um bem já anteriormente penhorado: «Assim, resulta que não obstante a execução principal estar sustada nos termos do artigo 871.º do Código de Processo Civil e de a reclamação de créditos dever ser apresentada na execução onde a penhora é mais antiga, que o(a)(s) credor(es) reclamante apresenta reclamação nesta execução. Poder-se-ia colocar a questão da admissibilidade dessa reclamação dado que a penhora mais antiga não foi feita à ordem destes autos (e de resto resulta que o artigo 864.º do Código de Processo Civil não devia ter sido cumprido porque previamente se deveria sustar a execução nos termos do artigo 871.º do Código de Processo Civil). Neste sentido, vide o Ac do STJ (Relator: Araújo Barros) de 9-06-2005: «Sumário: 1. Para o efeito do regime estatuído no artigo 871.º do Código de Processo Civil – reclamação na execução em que foi feita a penhora mais antiga do crédito exigido em execução sustada por nela ter sido feita a penhora mais recente – deve considerar-se pendente

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a execução em que se encontra paga a quantia exequenda e se ordenou a remessa do processo à conta para se proceder ao cálculo das custas da responsabilidade do executado e se processar o seu pagamento. 2. A reclamação do crédito deduzida na altura em que a execução se encontra nessas condições é atempada, devendo ser liminarmente admitida.». Passemos a citar o predito Acórdão: «…Designadamente no que concerne à duplicação de penhora sobre um mesmo bem, estabelece o n.º 1 desse artigo 871° que "pendendo mais de uma execução sobre os mesmos bens, sustar-se-á quanto a estes a execução em que a penhora tiver sido posterior, podendo o exequente reclamar o respectivo crédito no processo em que a penhora seja mais antiga; se a penhora estiver sujeita a registo, é por este que a sua antiguidade se determina"…. Assim sucedendo, será sustada a execução em que a penhora tiver sido feita posteriormente e, nesse caso, o exequente tem a oportunidade de, no prazo de 15 dias posteriores à notificação do despacho de sustação (se não foi citado pessoalmente nos termos do disposto no artigo 864° do C.Proc. Civil) ir ao processo onde a penhora é mais antiga e aí reclamar o seu crédito (art. 871.º, n° 2). "Sustou-se a execução com penhora anterior; consequentemente o respectivo exequente fica impossibilitado de obter nela o pagamento do seu crédito. O que tem a fazer? Tem de ir à execução que fica a correr (a execução com penhora anterior) reclamar o seu crédito para conseguir que seja aí reconhecido, graduado e pago. Quer dizer, o facto de se sustar a execução determina, como consequência necessária, a concorrência do exequente à outra execução que continua a correr termos". (5) Atento o exposto, assim encarado o processo de reclamação de créditos como dependente da acção executiva, tendente a abranger o pagamento dos créditos reclamados pelo produto da venda executiva, inequívoca é a conclusão de que as reclamações apenas poderão ser deduzidas se e enquanto a execução em que são deduzidas estiver pendente. (6) Se, porventura, a execução já se não encontra a correr termos, isto é, já se não mostra pendente, resta ao credor reclamante fazer prosseguir a execução em que se procedera à penhora mais recente, que havia sido sustada por força da penhora efectuada no processo que, estando pendente na altura da sustação, já o não estava no momento da reclamação do crédito. E daí a questão, que importa apreciar, suscitada no recurso: saber se deve considerar-se pendente, nomeadamente para os efeitos do artigo 871.º do C.Proc.Civil, a execução que foi sustada pelo pagamento da quantia exequenda e remetida à conta. Ora, da ratio legis do preceito, a que subjazem razões de certeza jurídica e protecção, quer do devedor executado, quer do credor exequente, resulta que, para que o preceito tenha conteúdo útil, a execução em que foi efectuada a penhora mais antiga deva estar, senão em movimento, pelo menos em fase processual de onde a sua prossecução seja possível, à luz da tramitação processual prevista. Consequentemente, essa execução (onde o credor/exequente que instaurou a execução em que se procedeu à penhora mais recente deve ir reclamar os seus créditos em virtude da sustação) tem de estar em posição de poder prosseguir, já que a lei, ao conferir a possibilidade de reclamação do crédito, ao abrigo do artigo 871.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, na execução em que primeiramente ocorreu a penhora sobre os mesmos bens, pretende que se pondere a relação dinâmica de ambas as execuções ou, quando muito, a possibilidade de dinamismo daquela em que ocorreu a penhora mais antiga…Por isso é que só se justificará a reclamação do crédito exigido na execução sustada, desde que a execução para onde se remete a reclamação desse crédito esteja em condições de poder efectivar, com a usual normalidade, esta assinalada prerrogativa do credor exequente. Acontece, porém, in casu, que a execução foi suspensa tão só porque se procedeu ao pagamento da quantia exequenda, tendo os autos sido remetidos à conta para apuramento da responsabilidade do executado. Assim, haverá que aguardar por uma operação contabilística para tanto necessária e destinada a pôr termo ao processo. Tendo-se iniciado o caminho para concretizar a liquidação na execução onde deveria ser acolhida a reclamação, a extinção da execução fica, no entanto, dependente do pagamento, pelo executado, das custas que serão da sua responsabilidade… Por sua vez, prescreve o n.º 1 do art. 919.º que a execução é julgada extinta logo que se efectue o depósito da quantia liquidada, ou depois de pagas as custas quando se mostre satisfeita pelo pagamento coercivo a obrigação exequenda ou ainda quando ocorra outra causa de extinção da instância executiva. E só nessa altura, aquando da sentença de extinção da execução, será ordenado o levantamento da penhora ali efectuada. Pelas razões expostas, não se pode concluir, como fez o acórdão recorrido, que para o efeito do regime estatuído no artigo 871.º do C.Proc.Civil (reclamação na execução em que foi feita a penhora mais antiga do crédito exigido em execução sustada por nela ter sido feita a penhora mais recente) não está pendente a execução em que se encontra paga a quantia exequenda e se ordenou a remessa do processo à conta para se proceder ao cálculo das custas e se processar o seu pagamento…. É que, verdadeiramente, embora suspensa, a execução mantém-se pendente, só se verificando a sua extinção na medida em que o executado venha a pagar as custas da sua responsabilidade, o que necessariamente implica que o crédito reclamado nesta fase processual tenha que ser admitido…». (sic). Igualmente, quanto à eventualidade de a execução sustada retomar o seu curso, vide o Ac da RP de 11-10-2004: «Sumário: I – A lei ao conferir a possibilidade de reclamação do crédito, ao abrigo do artigo 871 n.º 1 do Código de Processo Civil, na execução em que primeiramente ocorreu a penhora sobre os mesmos bens, pretende que se pondere a relação dinâmica de ambas as execuções ou, quando muito, a possibilidade de dinamismo de mais antiga. II – Não está nessa situação de dinamismo potencial a execução primeiramente instaurada, onde foi paga a quantia exequenda e as custas, pois, que foram satisfeitos os direitos do credor, ou credores, e até os do Estado que obteve o pagamento das custas devidas. III – Estando, assim, a execução mais antiga extinta, a execução mais recente deve prosseguir, devendo aí decretar-se a cessação da suspensão, mesmo que subsista o registo da penhora, na execução primeiramente instaurada, por inércia do devedor executado em pedir o cancelamento do respectivo registo.».

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VIII. OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO BASEADA EM INJUNÇÃO (CENTRALIDADE DA CITAÇÃO). Louvo, igualmente a Reforma ao estabelecer a previsão do artigo 732 relativamente aos fundamentos de oposição à execução baseada em requerimento de injunção ao remeter para os fundamentos quanto a outros títulos, e em não fazer uma equiparação à sentença.32 Tal entendimento prende-se com a questão de não obstante o processo de injunção ser extremamente relevante e funcionar de forma eficaz, o mesmo não tem qualquer controlo quanto à forma como foi feita a notificação (e não será por acaso que não se diz «citação). Neste sentido e como forma de demonstrar a centralidade da citação, vide o recente Ac da RC de 03-07-2012 (disponível na base de dados da DGSI, local de proveniência de toda a jurisprudência indicada sem menção de proveniência): «Sumário: 1. Por força da introdução do n.º 2 do artigo 814.º do Código de Processo Civil, operada pelo decreto-lei n.º 226/2008, de 20 de Novembro, no que respeita aos fundamentos de oposição, o requerimento de injunção a que foi aposta a fórmula executória foi equiparado à sentença… 3. O n.º 2, do artigo 814.º do Código de Processo Civil, na redacção introduzida pelo decreto-lei n.º 226/2008, de 20 de Novembro enferma de inconstitucionalidade material por violação do direito de defesa e do princípio da reserva do juiz.» (sic Conforme se refere no predito Acórdão, e passo a citar a parte atinente a esta reflexão, a fim de não adulterar a eloquência da exposição: «... O requerido do procedimento de injunção é notificado por carta registada com aviso de recepção para, em quinze dias, pagar ao requerente a quantia pedida, acrescida da taxa de justiça por ele paga, ou para deduzir oposição à pretensão (artigo 12.º, n.º 1, Regime dos procedimentos a que se refere o artigo 1.º do decreto-lei n.º 269/98, de 01 de Setembro). A lei determina o conteúdo da notificação a efectuar o requerido (artigo 13.º do Regime dos procedimentos a que se refere o artigo 1.º do decreto-lei n.º 269/98, de 01 de Setembro). A notificação do requerimento de injunção cujo conteúdo se acaba de rememorar provém de uma entidade administrativa (o Balcão Nacional de Injunções) e não consta da mesma qualquer referência ou advertência de que a falta de oposição do requerido determinará o acertamento definitivo da pretensão do requerente de injunção. Essa notificação apenas permite ao requerido concluir que, na falta de oposição, será aposta fórmula executória no requerimento de injunção, assim se facultando ao requerente da injunção a instauração de acção executiva. Pode assim afirmar-se, de forma segura, que o requerido no procedimento de injunção, em face da notificação que lhe é efectuada, não é advertido de que sobre si impende um qualquer ónus de oposição, se quiser evitar um acertamento definitivo do caso. Ora, é dificilmente explicável que num procedimento tramitado por uma entidade administrativa, não investida no exercício da função judicial, se possa lograr uma composição definitiva do caso sem que sejam observadas as advertências que se impõem na generalidade dos procedimentos judiciais, inclusivamente na própria acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato (veja-se o artigo 235.º do Código de Processo Civil, também aplicável aos processos especiais por força do disposto no artigo 463.º, n.º 1, do mesmo diploma legal). E isso é ainda mais inexplicável quando na acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato o legislador teve o cuidado de esclarecer que a decisão a conferir força executiva à petição, no caso de revelia operante do réu, tem o valor de uma decisão condenatória, sendo em todo o caso essa atribuição de força executiva à petição impedida quando ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias ou quando o pedido seja manifestamente improcedente (artigo 2.º, do Regime dos procedimentos a que se refere o artigo 1.º do decreto-lei n.º 269/98, de 01 de Setembro. Na nossa perspectiva, a equiparação legal do Dado que a presente execução, não pode prosseguir até ao eventual levantamento da penhora mais antiga (por qualquer causa de extinção), mas uma vez que se encontra pendente (não está extinta, não obstante se consignar que a penhora mais antiga está feita à ordem de outro processo que não esta execução, o que implicaria que em princípio a reclamação de créditos deveria ser apresentada junto dessa execução e não nesta), suspende-se a instância da reclamação de créditos até a esse eventual momento, sem prejuízo de eventual extinção.». 32  Para outros desenvolvimentos, vide Joel Timóteo Ramos Pereira, “Execução De Injunção: Questões Controvertidas na Instauração e na Oposição”, in Revista Julgar, ASJP, n.º 18, Coimbra Editora, Setembro-Dezembro 2012, pág. 101 a 130.

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requerimento de injunção a que foi aposta a fórmula executória a uma sentença de condenação contende não só com as garantias de defesa do requerido por omissão das necessárias advertências aplicáveis em qualquer processo judicial, mas também com as exigências constitucionais do processo equitativo por se traduzir numa injustificada e desproporcional restrição dos fundamentos da defesa. Face ao exposto, uma vez que o n.º 2, do artigo 814.º do Código de Processo Civil[21] viola o disposto nos artigos 20.º, n.º 4 e 202.º, n.º 1, ambos da Constituição da República Portuguesa, ao abrigo do disposto no artigo 204.º da Constituição da República Portuguesa, com fundamento em inconstitucionalidade material, recusa-se a aplicação daquele normativo….» (sic). Da leitura do predito Acórdão resulta que um dos fundamentos para esta declaração de inconstitucionalidade e consequente não aplicação do artigo 814 n.º 2 do CPC (que conduz a que nas oposições à execução baseadas em injunção possa o executado deduzir fundamentos de oposição diversos dos que pode invocar em sede de execução de sentença) se centra precisamente na forma como é feita a citação em sede de processo de injunção e nas advertências que indica no acto de citação. Considerou-se em resumo que devido ao teor da notificação do Réu (e no caso se me permitem esta terminologia em vez de citação poderá causar uma perturbação na valoração do acto já que é através da citação que se chama alguém ao processo o qual não o conhecia antes) que não indica as mesmas cominações que no acto de citação num processo declarativo, não poderia o legislador equiparar o requerimento de injunção a uma sentença. De realçar de resto que na Proposta de Reforma do Processo Civil é eliminado o n.º 2 do artigo 814.º do Código de Processo Civil, deixando o requerimento de injunção em que foi aposta fórmula executória de ser equiparado à sentença. É mister salientar que o Acórdão do Tribuna Constitucional do dia 31/10/2012 declarou que é inconstitucional a norma contida no artigo 814.º do CPC quando interpretada no sentido de limitar a oposição à execução fundada em injunção à qual foi aposta fórmula executória, aos fundamentos atinentes à sentença. Pelo exposto, concordo inteiramente com a referida conclusão na medida em que de facto se constata que o teor e a forma de notificação para deduzir oposição à injunção não permite o mesmo tipo de garantias que são conferidas numa citação em sede de processo declarativo. Ainda, no que diz respeito ao regime da citação resulta que a Reforma do processo civil decidiu aplicar ao processo comum o regime de citação de ausentes em parte incerta em vigor no regime experimental, prevendo-se que a citação edital no caso de incerteza do lugar seja feita por afixação de edital seguida de publicação de anuncio em página informática de acesso público substituindo esta publicação em suporte informático os tradicionais anúncios publicados nos jornais (in Revista do Ministério Público, Cadernos 11, 2012 – Debate A Reforma do Processo Civil 2012, pág.157, e vide Paulo Faria, Regime Processual Civil Experimental Comentado, pág. 71 entende que a simplificação desta forma de citação ao ser feita na pagina informática de acesso público aponta no bom caminho, todavia a aplicação informática deve ser de fácil consulta e apreensão ou permitir a pesquisa pelo nome). Apesar de quanto à citação o projecto ter versado sobretudo quanto à citação edital, poderse-ia equacionar a aplicação prática de algumas propostas de agilização e segurança quanto à citação, dado que o acto de citação contribui muito para atrasos e morosidade dada a dificuldade em se localizar o executado/réu e a eventual anulação de actos processuais devido a irregularidades na citação.33 Paralelamente, e quanto à acção executiva, no contexto dos Agentes de Execução pugna-se pela necessidade de se salientar a extrema relevância do acto de citação e de se cumprirem todas as formalidades, e nessa medida seria salutar a realização de acções de formação especificas sobre esse relevante passo da lei adjectiva civil.

Remeto para o trabalho realizado no Curso de Especialização de Gestão e Organização da Justiça – Unidade Curricular 1 – As reformas, a governação e a organização do sistema de justiça – Em busca de novos rumos de celeridade e segurança para as citações em direito civil.

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IX. PRÁTICAS A «JUSANTE» DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. A jusante do Código de Processo Civil é mister salientar o importante contributo, para a eficácia da acção executiva, do recente Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10 (Ministério da Economia e do Emprego) que entrou em vigor no dia 1/1/2013, o qual traduz-se num instrumento, que actuando ainda que à margem do Código, tem uma enorme potencialidade em auxiliar a eficácia da acção executiva, dado que envolve todas as instituições de crédito na participação da gestão de risco de incumprimento perante dificuldades económicas e o dever de acompanhamento da execução dos contratos de crédito e a implementação de procedimentos extrajudiciais de regularização de situações de incumprimento. De resto o artigo 18.º deste diploma impede que durante a data de integração do cliente bancário no PERSI e a conclusão deste procedimento que a instituição de crédito, possa intentar acções judiciais tendo em vista a satisfação do seu crédito. Neste ponto e permanecendo num contexto extra-judicial, afigura-se-me que deveria existir o dever de um dado exequente (auxiliado pelo Agente de Execução e aplicações informáticas), antes de instaurar, a acção executiva de verificar se aquele devedor em concreto terá bens suficientes para satisfazer o seu crédito (de resto actualmente o exequente tem alguns meios ao seu dispor para verificar previamente a situação financeira do executado – o acesso prévio ao registo das execuções), sob pena, nomeadamente de não se localizando bens e na impossibilidade de se citar o executado as custas por uma eventual inutilidade da lide ficarem a cargo do exequente dado o previsto no artigo 267.º, n.º 2, do CPCivil que estabelece que o acto de proposição da acção não produz efeitos em relação ao Réu/executado, senão a partir do momento da citação. Tal prática, a qual poderia ser regulamentada, conduziria à diminuição de acções que são desde o seu nascimento totalmente inviáveis devido à falta de bens existente e daria impulso a adopção de uma prática cautelosa por parte dos agentes económicos antes da concessão do crédito no sentido de lhes exigir o dever jurídico de fazerem uma análise quanto à situação económica do executado. Por outro lado, defendo o entendimento que nos casos de o exequente não realizar o pagamento prévio ao Agente de Execução, no prazo sugerido de 30 dias, essa falta de pagamento determinar a extinção da execução. Creio que esta actividade pré-judicial (analise prévia da viabilidade da acção, e de uma maior responsabilização na concessão do crédito), num cenário de prevenção, teria efeitos muito significativos na diminuição de pendências de acções executivas. Um outro ponto que destaco como potenciador de uma eficácia acrescida no âmbito processual, diz respeito às próprias instalações do tribunal, nomeadamente a adequada dimensão das Secções, e proximidade entre o gabinete do Magistrado e a Secção é vital para a tramitação eficaz nas acções (se o local onde está instalada a Secção está distante ou até noutro piso em relação ao gabinete do Magistrado tal é um factor de «distanciamento» e de dificuldade de deslocação e comunicação imperativa traduzindo-se num factor de ineficiência). 34

Creio que esta actividade pré-judicial, num cenário de prevenção, teria efeitos muito significativos na diminuição de pendências de acções executivas.

X. PROPOSTAS DE AGILIZAÇÃO NA PRÁTICA DIÁRIA DE UM JUÍZO DE EXECUÇÃO. Numa perspectiva «micro» centrada num dado Juízo, e apenas como forma de «inspiração», entendo partilhar um dos provimentos por nós adoptados nos juízos de Execução, devido à elevada pendência processual existente e visando uma maior celeridade e economia processual e maior eficácia na tramitação processual, foi dado o seguinte provimento: Quando nos autos houver notícia de que um dos executados foi declarado falido ou insolvente deverá a Secção, sem a necessidade de abrir termo de conclusão, enviar oficio a esse processo e proceder às notificações em conformidade com o despacho que ora se indica: Projecto GAJ 01-07 (Organização, Funcionalidade e Segurança nos Tribunais Judicias de Primeira Instância) Relatório Preliminar de Síntese, Projecto GAJ 01-07, Estudo da ASJP, disponível em http://www.asjp.pt/wp-content/ uploads/2011/06/Estudo-organiza%C3%A7%C3%A3o-funcionalidade-e-seguran%C3%A7a-nos-tribunais-relat%C3%B3rio-preliminar.pdf

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«Atento o teor da informação que antecede oficie-se ao referido processo e solicite informação sobre o seu estado actual e envio de sentença que haja decretado a insolvência/ou outra medida e nota de trânsito (sendo caso disso) e informe sobre a pendência destes autos e o seu estado actual, nomeadamente se há outros co-executados e se foi feita a penhora de algum bem da entidade em causa, e solicite informação sobre se interessa ou não a apensação dos nossos autos ao processo de insolvência. Mas solicite indicação no caso de a insolvência ser decretada com carácter restrito a indicação sobre o trânsito e se nenhum credor requereu o complemento da sentença dentro do prazo legal para o efeito. Informe o Solicitador do teor da informação que antecede e que não deverá realizar penhoras estando os autos suspensos quanto a esta executada/o/s. Caso a informação não haja sido dada pela exequente notifique-se o mesmo da informação que antecede ou ofício a fim de tomar conhecimento e para os fins tidos por convenientes.». Quanto nos autos ao se tentar citar um dos executados se verificar que o mesmo não foi citado deverá a Secção oficiosamente cumprir o artigo 244 do Código de Processo Civil, integralmente, da seguinte forma: «Proceda-se ao cumprimento integral do artigo 244.º do CPC, tentado obter-se o domicílio profissional e pessoal, e solicite informação junto do órgão de polícia criminal. No caso de pessoa colectiva oficie-se ao registo comercial e solicite envio do registo comercial com indicação dos legais representantes e moradas. D.N. Oportunamente, e se necessário, deverá notificar-se o Solicitador para juntar os originais ou os resultados das tentativas de citação frustradas nos autos têm sempre de constar os originais das citações sob pena de não se poder considerar a sua validade DL 202/2003, de 10/9, que refere que por razões de prudência impõe-se que constem dos autos os originais dos documentos de citação – em dez dias.». E obtidas as informações referidas deverá ser notificado o Solicitador(a) de Execução para tentar proceder à citação em todas as moradas indicadas e para no caso de alguma carta ser devolvida com a indicação de que «não atendeu» ou de que não foi «reclamada» deverá notificar-se o Solicitador(a) de Execução para tentar citar através de contacto pessoal. Caso a exequente ou o Solicitador(a) de Execução antes das diligências do artigo 244.º do Código de Processo Civil e dessas tentativas de citação requeiram nos autos a citação edital, deverão ser notificados de que em primeiro lugar se irá cumprir o artigo 244 do Código de Processo Civil e tentar citar em todas as moradas indicadas e só depois se fará conclusão, no caso de se frustrarem as diligências de citação, nos autos para o tribunal decidir o pedido de citação edital. Consigna-se que se deve pedir informação sobre o domicílio profissional junto do CRSS e Finanças, caso os executados estejam registados nesses locais, e que as informações serão pedidas a todas as bases de dados indicadas (CRSS, Finanças, DGV, e registo civil) sem prejuízo de outras diligências tidas por pertinentes, nomeadamente junto de bases de dados de acesso no tribunal. Por outro lado, consigna-se que sempre que aos autos de execução sejam pelos Serviços de Finanças ou CRSS (ou outros) enviadas certidões de dívidas as mesmas deverão ser entregues de imediato aos Serviços do Ministério Público, sem prejuízo de se deixar cópia nos autos (sendo necessário) – visando uma maior celeridade atentos os prazos legais em curso. Quanto antes de o(a)(s) executado(a)(s) serem citados o(a)(s) exequente(s) informar(em) que receberam a quantia exequenda e nos autos não conste a realização de nenhuma citação ou intervenção da parte contrária, deverá a Secção notificar oficiosamente o Solicitador(a) de Execução para sustar a execução de imediato, e para em dez dias indicar se fez alguma penhora e se citou o(a)(s) executado(a)(s), ou se convocou credores, e em caso afirmativo deverá documentar esses eventuais autos e as diligências de penhora nos autos. Quando forem feitos pedidos nos autos de obtenção de certidões e à Secção não suscitem dúvidas sobre a aplicação do artigo 167, n.º 2 do Código de Processo Civil e não se tratando de nenhuma das restrições do artigo 168 do Código de Processo Civil (nomeadamente providências

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cautelares sem o direito ao contraditório prévio), deverá a Secção emitir e entregar ao requerente a certidão pedida de forma oficiosa e pela forma mais célere. Assim, como deverá facultar a confiança do processo caso não tenha dúvidas de estarem preenchidos integralmente os pressupostos do artigo 169 do Código de Processo Civil. Quanto aos cancelamentos das penhoras existentes sobre bens sujeitos a registo (nomeadamente imóveis e veículos) consigna-se que esse cancelamento ou levantamento só poderá ser feito mediante despacho e se o mesmo estiver transitado em julgado (após a notificação às partes e Solicitador(a) de Execução e eventualmente credores reclamantes) – sendo que a certidão a emitir para esse cancelamento deverá ser emitida apenas no caso de a decisão estar transitada e com essa menção. Quando seja determinada e cumprida a citação edital deverá a Secção proceder ao cumprimento do artigo 15 do Código de Processo Civil oficiosamente. Quando na sequência de despacho a convidar a parte a juntar alguma certidão ou documento a parte respectiva vier pedir uma prorrogação de prazo, e desde que o mesmo não suscite dúvidas ou seja justificado ou não seja superior a 30 dias, poderá a Secção notificar a parte de que o pedido de prorrogação do prazo foi deferido sem necessidade de abrir conclusão para o efeito). Quando as partes de comum acordo vierem requerer a suspensão da instância executiva nos termos do artigo 882 do Cpcivil (ou seja pagamento em prestações), e o acordo não suscitar dúvidas de forma ou de oportunidade nos termos do artigo 882.º do Código de Processo Civil, n.º 2 Código de Processo Civil e não for feito qualquer pedido de levantamento ou cancelamento de penhora (altura em que será aberta conclusão) deverá a Secção notificar as partes subscritoras do acordo de pagamento em prestações de que a instância nos termos do artigo 882 do Código de Processo Civil está suspensa e notificar o Solicitador(a) de Execução de que a instância executiva está suspensa pelo tempo acordado pelas partes, devendo ser sustada a realização de qualquer acto de penhora, ou venda, ou qualquer outra diligência no âmbito deste processo executivo e devendo o Solicitador notificar as entidades envolvidas em eventuais penhoras em curso para sustarem a sua execução. E caso haja créditos reclamados deverá a Secção notificar da requerida suspensão nos termos do artigo 882 do Código de Processo Civil aos credores reclamantes e de que a instância está suspensa em conformidade. Consigna a signatária de que se entende que neste caso em que é pedida a suspensão nos termos do artigo 882 do Código de Processo Civil não é necessário proferir-se qualquer despacho, uma vez que se entende que tal não está contido nas funções jurisdicionais, uma vez que em relação à Secretaria e ao Agente de Execução tal requerimento ou manifestação de vontade (do(a)(s) exequente(s) e executado(a)(s) é suficiente para a actuação do preceito que a prevê (sem necessidade de se abrir conclusão). Noutros termos, entende-se que não cabe em relação ao referido requerimento a prolação de qualquer decisão jurisdicional visto que não está suscitada nenhuma questão carecida de decisão, não existe nenhum litígio ou a verificação de qualquer pressuposto ou a alteração dos sujeitos ou da instância executiva. De resto entende-se, e na senda dos ensinamentos de Lebre de Freitas, in Themis Revista da faculdade de Direito da UNL, Ano IV, n.º 7, 2003, A Reforma da Acção Executiva, pág. 33 a 34, que quando acordado o pagamento em prestações, for ulteriormente requerido pelo exequente o prosseguimento da execução com fundamento em falta de pagamento de alguma prestação, há que notificar o executado para se pronunciar e, se nenhum litígio surgir, designadamente por o executado referir ter pago, o Agente de Execução fará prosseguir a execução, sem necessidade de intervenção judicial (a qual só existe para além dos casos expressamente previstos na lei, quando exista a necessidade de decisão de interesses contraditórios). Este Provimento que foi por nós aplicado na 3.º Secção do 1.º Juízo de Execução do Porto, e a deslocação diária junto da Secção, e reuniões informais para se fixarem métodos de trabalho,

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teve bons resultados reduzindo a pendência estatística (de resto quanto às acções declarativas logrou-se baixar a pendência), sendo que logrou motivar toda a Secção por forma a tramitar os processos com espírito de «missão», «cooperação», «brio, oportunidade e autonomia, já que foram «delegadas» várias tarefas na referida Secção, o que se revelou ter efeitos positivos em termos de gestão recursos humanos. Exemplificando de forma prática o resultado dessas «práticas»: – Os Funcionários notificavam por sua iniciativa o Agente de Execução, para complementar o cumprimento do artigo 864 do CPC, sempre de uma forma correcta, quando esse normativo o estava cumprido de uma forma imperfeita (faltava citar algum dos serviços da área da residência do executado ou da localização dos bens) pelo Solicitador de execução, o que é digno de menção dado o elevado volume processual e a atenção que exige do funcionário. – Notificavam por sua iniciativa o Agente de execução para realizar as diligências adequadas à citação dos executados, com elevado sentido de oportunidade e eficácia, sendo que regra geral o processo só era concluso quanto era para determinar a citação edital (o que permite rentabilizar o serviço). – Manifestavam, interesse em estudar a legislação e todas as suas alterações e livros atinentes. – Lavravam nos termos de conclusão, informações processuais sempre pertinentes e oportunas, realizando termos de conclusão apenas quando é necessário e em tempo oportuno e nunca praticando actos inúteis ou desnecessários nos processos, e tramitando sempre devidamente e conjuntamente os processos e todos os apensos, o que permite uma maior rentabilidade processual. – Revelaram conhecimentos muito correctos quanto à avaliação da existência de títulos executivos ou não e regras da competência, e quanto às citações e extrema atenção na tramitação dos processos (neste ponto atinente aos títulos executivo era habitual transmitir os casos mais duvidosos e muitas vezes os processos eram «trazidos em mão» solicitando indicação rápida sobre se estávamos perante um título ou não ou se o tribunal era competente). – Motivação quanto à inovação dos método de trabalho, dando sugestões de melhoria, iniciativa e cooperação entre a Secção e magistrada. Pelo exposto, resultou que esta simples «orientação de serviço» ou «Provimento» que foi aplicado na prática, teve a virtualidade de imprimir extrema celeridade na tramitação dos processos por parte da Secção, já que reduziu muito o número de conclusões diárias, permitindo uma redução dos «tempos-de-espera» com imensos ganhos na tramitação das restantes acções e apensos declarativos e realização de maior número de julgamentos e de saneadores e de sentenças (reduzindo as pendências). Neste ponto, defendo a necessidade de se implementarem métodos de coordenação entre os funcionários e os Magistrados quanto à tramitação processual, através de Provimentos, ou orientações de serviço, ou divisão de tarefas, nomeadamente ser acordado entre o Magistrado e os Funcionários a melhor hora para se debaterem de forma unitária e condensada questões que surjam na tramitação diária, sem prejuízo de se deverem realizar reuniões periódicas sobre temas da acção executiva.35

XI. CONCLUSÃO Entendo que a reforma de 2012 no contexto executivo vai no bom sentido, e que a mesma para ter a sua eficácia garantida pressupõe uma regulamentação preventiva no sentido de se controlar o acesso ao crédito numa sociedade de consumo, e numa responsabilização das entidades que o concedem sem quaisquer garantias, e igualmente na necessidade de uma ­intervenção­

35  Saliento neste segmento o denominado «Projecto X» que se traduz num método de trabalho aplicado que impõe uma reorganização das secretarias segundo modelos de trabalho em equipa orientado para resultados versus realização burocrática de tarefas rigidamente assentes em diferenciações hierárquicas, que assenta numa decidida opção gestionária à qual proporciona informação e meios de execução (vide, Ana Azeredo Coelho, Uma Experiência de Gestão Processual Grande-Lisboa Noroeste, Juízo de Execução, Espinho, 23 de Setembro de 2011 ).

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interdisciplinar através dos ensinamentos da Sociologia no sentido de se alterarem hábitos de consumo extremo.36 Partilho o entendimento de Armindo Ribeiro Mendes ao considerar que devemos manter as virtualidades da reforma de 2003 e a da de 2008, apesar de se deverem realizar medidas administrativas que reduzam as pendências das execuções onde não existem bens. Existe um trabalho paralelo no segmento da prevenção que carece de ser feito junto da sociedade em geral, e em que o Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10 (Ministério da Economia e do Emprego) que entrou em vigor no dia 1/1/2013, poderá enriquecer e constituir-se como um farol para as necessárias alterações na acção executiva mas também na vivência social. Neste segmento é mister igualmente o cuidado na explicação e comunicação, de forma adequada, quanto aquilo que se pode exigir dos tribunais em sede de acção executiva, – e acautelar a imagem da Justiça dado que a mesma não resolve, nem tem essa função, os problemas da ausência os escassez de bens (mais a mais no actual cenário socio-económico).37 Por outras palavras: a evolução da acção executiva vai «absolver os tribunais» da «culpa na crise da justiça executiva» e vai demonstrar que a crise é muito mais profunda do que «aquela que é atribuída aos tribunais em geral e em particular aos Magistrados e Funcionários» e que não pode ser imputada a nenhum interveniente especifico, dado que tem as suas raízes no contexto socio-economico e intenso recurso ao crédito, agravado actualmente pela crise vigente, e só poderá ser ultrapassada com um trabalho interdisciplinar. Sugeria a criação de uma Comissão Especifica para promover e analisar alterações à acção executiva e monitorizar na prática a tramitação das acções executivas, e a realização de cursos de formação a todos os intervenientes na acção executiva. Devendo essa Comissão ou grupo de trabalho recolher (num contexto institucional, nomeadamente através da Comissão para a Eficácia das Execuções como órgão independente ou outra entidade designada) junto de todos os tribunais de natureza executiva os Provimentos em vigor, e as práticas, realizar uma compilação adequada e divulgar a mesma, com sugestões práticas, junto de todos os tribunais pelos canais institucionais e também através de uma publicação disponível na Internet por forma a ser acessível pelos Tribunais e todos os operadores – com a vantagem de as práticas circularem por todos os tribunais, existir uma tendência para a uniformização e através da transparência informar os intervenientes processuais sobre o entendimento praticado nos tribunais (sobretudo o maioritário). Neste segmento quanto à Comissão para a Eficácia das Execuções como interlocutor e veículo deste estudo a mesma tem a vantagem de ter uma composição interdisciplinar (engloba todas as entidades envolvidas com a acção executiva), o que vincularia todos os seus intervenientes e facilitaria a interacção com essas entidades entre si (é composta por um Plenário com 11 membros e um Grupo de Gestão com 5 membros), e de ser um órgão público e independente, e ter muita experiência nessa área dadas as competências legais que possui: Emissão de recomendações sobre a eficácia das Execuções e a formação dos Agentes de Execução; Definição do número de candidatos a admitir em cada estágio de agente de execução, escolher a entidade externa responsável por essa formação e avaliação, e a parte disciplinar e fiscalização da actividade dos Agentes de Execução e as questões acerca dos impedimentos, escusas e suspeições dos Agentes de Execução. Este trabalho realizado pela CPEE está descrito de forma detalhada no estudo de Paula Meira Lourenço (A Acção Executiva entre 2000 e 2012 – A Urgente Necessidade de Executar as Recomendações da CPEE, Revista Julgar, ASJP n.º 18, Setembro-Dezembro 2012, pág78 a 100), sendo que se pugna pela necessidade de se aplicarem e executarem as recomendações da CPEE com

Neste segmento é mister igualmente o cuidado na explicação e comunicação, de forma adequada, quanto aquilo que se pode exigir dos tribunais em sede de acção executiva, - e acautelar a imagem da Justiça dado que a mesma não resolve, nem tem essa função, os problemas da ausência os escassez de bens.

36  No sentido de que a justiça não é um desígnio exclusivo dos tribunais e envolve o parlamento, o governo, o poder local, a administração central, os cidadãos, vide Pedro Bacelar de Vasconcelos, A Crise da Justiça em Portugal, Cadernos Democráticos, 3/6/1998, Gradiva. 37  Acompanho a eloquente exposição de Nuno Lemos Jorge (obra citada, pág. 108) no sentido de que se pode pedir ao tribunal e ao agente de execução que sejam diligentes nos actos que praticam,… Peça-se-lhes tudo isso, mas não se lhes peça o impossível, que é transformar um vazio de património em dinheiro para o credor.».

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destaque para vinte medidas tidas como urgentes. Neste trabalho parte-se do estudo de base realizado pelo Observatório Permanente da Justiça Portuguesa (OPJ)38. Acompanhando o exaustivo estudo realizado por Paula Meira Lourenço cumpre referir que a CPEE promoveu a emissão de 105 recomendações para a eficácia das execuções e formação dos Agentes de Execução aprovadas por unanimidade pelas 18 entidades que fazem parte do Plenário, sendo que se defende a imediata implementação de 20 Recomendações (disponíveis no Site da CPEE) atinentes no geral ao recurso intensivo da aplicação informática, acessos electrónicos, extinção das execuções com falta de bens, controle da conta corrente dos processos, e formação continua obrigatória dos Agentes de Execução. Paralelamente ao referido, entendo que seria desejável a realização de um estudo ao nível do direito comparado aprofundado, de forma a se «importar» alguns ensinamentos nesta área, sem esquecer as especificidades do país, tanto no aspecto preventivo ou pré-judicial, se assim se pretender designar, (análise social e acesso ao crédito e condições socio-económicas) como já no contexto judiciário. Por fim, cumpre-me salientar que a presente reforma exigirá uma tónica muito intensa no aspecto da formação dos recursos humanos39 e na sua motivação para a concretização das novas práticas e a consciência de que esta «crise da acção executiva» pertence a toda a sociedade e todos devemos dar o nosso contributo a fim de ser restaurada a «boa imagem da Justiça» e saber trabalhar de forma pluridisciplinar com o objectivo de melhorar a acção executiva. Termino, sem ironia, mas recorrendo a uma metáfora: só se o Tribunal tivesse o toque de Midas, poderia resolver como um passe de magia o problema das execuções, nomeadamente: a falta de bens.

O artigo não está escrito segundo o novo acordo ortográfico.

A Acção Executiva: Caracterização, Bloqueios e Propostas de Reforma, editado em A Reforma da Acção Executiva – Trabalhos Preparatórios Vol II, Relatório do Observatório Permanente da Justiça Portuguesa, Centro de Estudos Sociais, Ministério da Justiça, Março 2001; tendo sido apresentado em 2001 na Conferência Internacional subordinada ao tema «A Reforma da Acção Executiva». Fevereiro de 2001, organizada pelo GPLP em colaboração com o Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra 39  Numa palavra, considero que para existir esta «alteração de mentalidades», (parafraseando Paulo Pimenta), exige-se que a pedra de toque para o sucesso da implementação desta reforma se centre numa aposta na formação contínua de todos os intervenientes. 38

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APREENSÃO DE DOCUMENTOS E IMOBILIZAÇÃO DE VEÍCULOS PENHORADOS – OFÍCIOS DAS AUTORIDADES POLICIAIS UNIFORMIZAÇÃO DE PROCEDIMENTOS

CARLOS MARCELINO Agente de Execução

O

s Agentes de Execução têm vindo a ser oficiados pelas autoridades policiais no âmbito da solicitação de apreensão de documentos de veículos automóveis, em processo executivo, após a sua penhora registada, nos seguintes termos: a) Necessidade de Despacho Judicial para efeito; b) Presença do Agente de Execução no momento da penhora juntamente com as autoridades policiais ou solicitar a sua presença, com antecedência mínima de 30 minutos relativamente à apreensão a efectuar.

A) DA (DES)NECESSIDADE JURÍDICA DE DESPACHO JUDICIAL PARA A IMOBILIZAÇÃO DE VIATURAS PREVIAMENTE PENHORADAS E APREENSÃO DE DOCUMENTOS. No âmbito do processo executivo os Agentes de Execução procedem, entre outras, à penhora de veículos automóveis.

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Apreensão De documentos E Imobilização De Veículos Penhorados

RESUMO Apresentamos esta reflexão com o claro objectivo de uma melhor articulação entre os diversos intervenientes na acção executiva no que respeita, especificamente, à apreensão de veículos previamente penhorados em processo de execução. Quando o Agente de Execução solicita a colaboração das Autoridades Policiais para a concretização da diligência, não raras vezes depara-se com decisões de exigência de Despacho Judicial para o efeito. E pergunta-se: Despacho Judicial para quê? O bem já não está penhorado? E o acto que se requer não é apenas a apreensão de documentos e certificação de quilómetros? Com a entrada em vigor do DL 226/2008 de 20/11, mudou-se o paradigma da anterior necessidade de despacho judicial para apreensão de veículos, para a centrar essa responsabilidade na figura do Agente de Execução. De facto, com os normativos actualmente em vigor, o Juiz, não perdendo, como é evidente, o controlo geral do processo executivo, viu a sua intervenção reduzida no seio do processo executivo nas actividades de mero expediente e meramente burocráticas, e (…) reserva-se a intervenção do juiz para as situações em que exista efectivamente um conflito ou em que a relevância da questão o determine. É o que sucede quando, por exemplo, se torne necessário proferir despacho liminar, apreciar uma oposição à execução ou à penhora, verificar e graduar créditos, julgar reclamações, impugnações e recursos dos actos do agente de execução ou decidir questões que este suscite. (preâmbulo do DL 226/2008 de 20/11) Somos da opinião que o legislador andou bem ao dispensar um despacho – para a requisição de Força Pública – que nada de novo trazia à

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segurança do processo executivo, nem à própria protecção dos direitos do executado, os quais, crê-se, estão sempre salvaguardados. Na realidade, a existência prévia desse despacho apenas significava um entrave na concretização de diligências essenciais próprias da coercibilidade do processo executivo. E não se julgue que somos da opinião que as autoridades públicas estão ao serviço dos Agentes de Execução para concretizarem os seus interesses particulares nos processos que são titulares, como já nos foi referido por diversas situações em que se solicitava a presença ou a colaboração das autoridades em determinada diligência. E neste contexto, será bom referir que o Agente de Execução, não age em nome próprio, embora seja um profissional liberal, mas por conta dos processos executivos que tem de tramitar. Além disso, tais diligências são sempre efectuadas ao abrigo dos normativos legais em vigor e de um controlo disciplinar forte por parte da CPEE (Comissão Para a Eficácia Das Execuções). Recorde-se, finalmente, que, além dos Solicitadores, também os Advogados podem tramitar processos executivos - pela alteração operada no Código Processo Civil, pelo referido do DL 226/2008 de 20/11.


Carlos Marcelino

Na sequência das penhoras efectuadas, os AE citam os executados da execução e da penhora efectuada (ou notificam do auto de penhora se já houve citação anteriormente). Nessa comunicação com o executado, este é instigado expressamente a entregar os documentos da viatura ou viaturas penhoradas. Sucede, porém, que a maior parte das vezes as ordens dos AE não são respeitadas não se obtendo, pois, o efeito desejado (a entrega do bem penhorado), e em consequência é necessário o recurso às autoridades policiais para a materialização da apreensão do(s) documento(s) e imobilização dos veículo/os.1 Com a entrada em vigor do DL 226/2008 de 20/11, o legislador pretendeu simplificar a acção executiva, nomeadamente eliminou (a nosso ver bem) a necessidade de Despacho para o recurso às autoridades públicas em caso de necessidade por banda do AE, permitindo que este possa, agora, requerer a sua intervenção directamente. Assim, conforme se exporá, e salvo melhor opinião, caberá à Autoridade Policial a apreensão dos documentos, e sem precedência de qualquer Despacho judicial, pois a ele não há lugar, quando o executado se tenha recusado na entrega dos documentos do automóvel previamente penhorado. Referem alguns ofícios das autoridades policiais que se regem pelo “GUIA DE PROCEDIMENTOS” elaborado pelo Gabinete de Auditoria e Modernização do Ministério da Justiça, com a colaboração da Câmara dos Solicitadores. No que respeita ao referido GUIA DE PROCEDIMENTOS, sempre se refere o seguinte: O GUIA pelo qual as autoridades se regem, e em consequência fundam a sua posição data de (pelo menos) de Janeiro de 2005. De facto, toda a fundamentação que é prescrita nos ofícios remetidos aos AE´S está inserta genericamente num livro [o referido GUIA DE PROCEDIMENTOS] denominado “Ministério da Justiça – Gabinete de Auditoria e Modernização – Perguntas Frequentes Sobre a Reforma da Acção Executiva2”. Ora, em particular a fundamentação para a exigência do Despacho Judicial encontra-se referida na pág. 52 do referido GUIA DE PROCEDIMENTOS, sendo a resposta à pergunta 111. Quando pretenda recorrer à intervenção das autoridades policiais, como deve o solicitador de execução proceder? E, logo de seguida, vem a resposta, sendo certo que à cabeça vem referido “Em primeiro lugar, o solicitador de execução deve requerer ao juiz do processo a autorização do recurso à Autoridade Policial.” Note-se que o Despacho supra referido, não seria especificamente para a apreensão de documentos e imobilização de viaturas, mas genericamente, e à luz do que anteriormente estava estatuído, era necessário Despacho Judicial sempre que o solicitador de execução (hoje Agente de execução) necessitasse de auxílio das Forças Policiais. O que, como é sobejamente conhecido, criava entraves à realização de diligências externas, fosse porque o Juiz não deferia em tempo útil o auxílio oportunamente requerido pelo SE, fosse por existir (como algumas vezes acontecia) falta de Despacho para o efeito, por o Juiz, por algum motivo considerar que não haveria necessidade do uso da força policial, não deferindo em consequência o requerido, fosse, ainda, porque o Juiz entendia que, primeiramente, o SE teria de, numa primeira instância, promover a diligência independentemente das consequências práticas e físicas que daí poderiam advir para o próprio SE, Exequente ou mandatário que acompanhava a diligência externa, e só depois é que deferia a requisição da força policial. De resto, todos os outros requisitos que se seguem à exigência do Despacho Judicial por parte das autoridades policiais, estão completamente, salvo entendimento diverso, desactualizados, em face dos normativos legais ora em vigor nosso ordenamento jurídico executivo.

(…) olvidam as forças públicas, estranhamente, que actualmente a realidade jurídica do nosso processo executivo modificouse, mercê (…) da publicação do DL 226/2008 de 20/11

(…) se há recusa/ resistência por banda do executado, o AE mune-se directamente – portanto sem necessidade de prolação de despacho – do auxílio das autoridades policiais.

Lopes do Rego, em anotação ao mesmo preceito [851.º] refere que o n.º2 altera o regime de apreensão de veículo automóvel, que constava dos n.º 5 do artigo 848, e 4 do artigo 849; para além da precedência na feitura do registo “constitutivo”, nos termos do artigo 838, n.º 1, dispensa-se a efectiva apreensão e subsequente depósito do veículo, substituído pela sua imobilização (feita por qualquer autoridade administrativa ou policial), mediante imposição de selos, – cfr., Portaria n.º 700/03 de 31 de Julho dispensando-se em regra a remoção da viatura penhorada e imobilizada. Sendo ”necessário” ou “conveniente” proceder à apreensão material da viatura ou documentos respectivos é aplicável o preceituado no DL n. º 54/75 de 12/2. – ide Comentários ao CPC, V II, 2.ª edição, 2004. Apud : Acórdão da Relação dd 17-06-2008, PROC. 4500/2008-1 – Relatora – Maria Rosário Barbosa. 2  Edições Almedina, S.A., Janeiro de 2005 1

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Apreensão De documentos E Imobilização De Veículos Penhorados

Apenas se ressalva a questão – prática – relativa à organização de diligências, que nos parece ser de manter, isto é, deverá o Agente de execução, apesar de poder requerer diretamente o auxílio da força pública, articular com o posto de polícia territorialmente competente o dia e hora de diligência para que haja elementos disponíveis para acompanhar o AE na concretização da mesma. Contudo, por lógica, e como não poderia deixar de ser, tal não se poderá aplicar a diligências com carácter urgente, nem àquelas em que o AE não tendo requerido o auxílio da força pública por, numa fase inicial, julgar desnecessário, vem a necessitar, no decorrer da diligência, da presença de elementos que garantam a Ordem Pública. Posto isto, olvidam as forças públicas, estranhamente, que actualmente a realidade jurídica do nosso processo executivo modificou-se, mercê, como se deixou dito, da publicação do DL 226/2008 de 20/11, pelo que neste momento, o processo executivo civil, não exige a prolação de Despacho para apreensão de documentos e certificação de quilómetros (e até para a aplicação de bloqueadores). De facto, a exigência estatuída no CPC (n.º 2 do artigo 840.º ex vi n.º 3 do artigo 848.º CPC) é a única que nos parece que deverá ser cumprida, isto é, se há recusa/resistência por banda do executado, o AE mune-se directamente – portanto sem necessidade de prolação de Despacho – do auxílio das autoridades policiais. Ora, em lado nenhum no processo executivo, salvo o respeito por opinião contrária, o legislador quis que o AE solicitasse ao Juiz o Despacho para a apreensão de documentos da viatura e certificação de quilómetros. Se assim fosse, evidentemente, alguns dos artigos 840.º, 848.º e 851.º do CPC refeririam expressamente esse facto. Mas a verdade é que não referem. Veja-se que, o n.º 3 do artigo 840.º elenca, apenas, duas situações específicas para a prolação de Despacho judicial: “A requerimento fundamentado do Agente de execução, o juiz determina o auxílio da autoridades policiais nos casos em que as portas estejam fechadas (1) ou haja receio justificado de oposição de resistência (2) arrombando-se aquelas, se necessário, e lavrando-se auto da ocorrência. Ou seja, pela redacção o normativo legal, conclui-se que o mesmo apenas diz respeito a bens imóveis, ou evidentemente bens móveis que possam existir dentro do imóvel objecto da diligência, pelo que, apenas no caso de as portas estarem fechadas ou haja justificado receio que tal venha a acontecer, é que há lugar ao referido Despacho judicial. Neste sentido Joel Timóteo refere3 “Das alterações introduzidas pelo Dec.-Lei n.º 226/2008, ficou mais facilitada a penhora e entrega efectiva de bem imóvel. Assim, se for oposta “alguma resistência”, o Agente de execução pode solicitar diretamente o auxílio da Autoridade Policial (artigo 840, n.º 2), só estando sujeitos a autorização por parte do Juiz nos casos em que o Agente de execução encontre as portas fechadas e ocorra receio justificado de oposição de resistência à entrega. O requerimento que o Agente de execução dirigir ao juiz terá, no entanto, de ser fundamentado (art.º 840.º n.º 3). Tal justifica-se porque existe uma garantia Constitucional consagrada – n.º 2 do artigo 34.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) – que protege a inviolabilidade do domicílio de qualquer pessoa contra a sua vontade. Posto isto, parece não resultar dúvidas que o estatuído artigo 840 n.º 3 do CPC, apenas diz respeito à protecção da inviolabilidade do domicílio previsto no referido art.º 34.º n.º 2 da CRP, pelo que o legislador, para que a protecção dos direitos dos executados, e dos cidadãos em geral não fossem postos em causa pelo livre arbítrio do próprio Agente de execução, exige prévio Despacho Judicial para o efeito, não o exigindo, no entanto, quanto à apreensão de documentos e imobilização de veículos previamente penhorados à ordem de processo executivo. Contudo, e conforme se deixou exposto, a inviolabilidade do domicílio do executado quebra, como não poderia deixar de ser, e atentos os fundamentos invocados previamente pelo Agente de execução perante o juiz do processo, ante a prolação de Despacho Judicial para o efeito. 3  PEREIRA, Joel Timóteo Ramos, Juiz de Círculo – Prontuário de Formulários e Trâmites Volume IV – Processo Executivo – Tomo 1, Título; Instância e fase Inicial da Ação Executiva – 5.ª Edição (Reformulada); Quid Juris, Sociedade Editora, Lisboa 2011, PP 18 (8.2).

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SOLICITADORIA E AÇÃO EXECUTIVA ESTUDOS #1


Carlos Marcelino

“A entrada no domicílio dos cidadãos contra a sua vontade só pode ser ordenada pela Autoridade Judicial competente (…)” – art.º 34.º n.º 1 da CRP Já no que respeita aos artigos 848.º n.º3 e 851.º CPC, remete o primeiro – no que ao caso importa – precisamente para o artigo 840.º CPC (n.os 2 a 6), enquanto o segundo nos remete para o 838.º e para o DL 114/94 de 3 de Maio (Código da Estrada), não referindo, nem um nem outro um vislumbre da necessidade de Despacho Judicial para imobilização de veículo automóvel previamente penhorado e apreensão dos respectivos documentos. Voltando a centrar a questão que nos traz aqui e, aliás, como referem – e a nosso ver bem – os juízes de direito Eduardo Paiva e Helena Cabrita4, “Da remissão feita pelo n.º 2 do artigo 851.º para os artigos 164.º n.º 3 a 8, e 161.º do Código da Estrada, resulta que a apreensão dos documentos e a colocação de bloqueadores nos veículos será feita pelas autoridades policiais.” Ainda a este propósito, refere um acórdão5 do Tribunal da Relação de Lisboa, relativamente à inovação trazida pelo DL 226/2008 de 20/11 “Nos termos do artigo 851º/2 do C.P.C. “ a penhora de veículo automóvel é seguida de imobilização, designadamente através da imposição de selos e, quando possível, da apreensão dos respectivos documentos; a apreensão pode ser efectuada por qualquer autoridade administrativa ou policial, nos termos prescritos na legislação especial para a apreensão de veículo automóvel requerida por credor hipotecário; o veículo apenas é removido quando necessário ou, na falta de oposição à penhora, quando conveniente”. Esta norma é uma inovação da reforma da acção executiva.” Acolhemos a posição sufragada. De facto o legislador não achou necessário, mercê das alterações introduzidas no processo executivo através do DL 226/2008 de 20/11, que a apreensão de documentos e imobilização do veículo previamente penhorado fosse precedido de Despacho Judicial para o efeito. Se assim fosse tê-lo-ia referido expressamente. Na verdade o bem que se pretende apreender está já penhorado. E, a dificuldade prática do Agente de Execução reside no facto incontornável de, aquando da ordem de entrega dos documentos emitida através do próprio executor (o AE), esta não ser respeitada pelo executado. Pois bem, sucede que confrontado o executado com o Agente de execução para obedecer à entrega de documentos do seu automóvel, aquele irá, na maioria da vezes, para não dizermos sempre, obstar à entrega do que lhe é exigido. Nesta medida, o Agente de execução, poderá fazer na nossa opinião uma de duas coisas: – A primeira: socorrer-se da Autoridade Policial para a apreensão dos documentos do bem previamente penhorado, e eventualmente, caso o executado alegue não ter na sua posse naquele momento os documentos da viatura, conceder-lhe prazo para a sua entrega no posto policial mais próximo; Ou – A segunda: lançar mão da queixa-crime por desobediência a ordem emanada pelo Agente de execução em momento oportuno. Parece-nos claro que a primeira opção é a mais acertada, na medida em que o executado confrontado com as autoridades policiais – que têm o poder de intimar o detentor dos documentos para sua entrega imediata, ao contrário do Agente de execução que apenas detém poder funcional de registar a penhora, ou seja procede tão só ao registo da penhora mas que não tem o bem efectivamente na sua posse – alternativa não lhe restará que não seja a de entregar os documentos que lhe são exigidos. Evidentemente, caso o executado insista na não entrega e não justifique a sua atitude, será lançada mão da referida queixa-crime por desobediência ao tribunal. Mas apenas nessa altura, e nunca antes! Recordemos que o direito penal é um Direito de Última Rácio, pelo que só deverá ser usado em última instância. A apreensão de património em processo executivo civil, de facto, em face do supra exposto, não carece de autorização judicial, vulgo Despacho, – aqui em particular a imobilização de veículo automóvel e apreensão dos respectivos documentos –, ao contrário do que acontece, por exemplo no processo-crime, em que a apreensão necessita de ser autorizada por autoridade

(…) continua-se a insistir em garantias já revogadas legalmente como seja a exigência da prolação de despacho judicial para a apreensão de documentos e certificação e quilómetros em veículos previamente penhorados.

De resto, qualquer cidadão pode solicitar a presença da polícia para a manutenção da Ordem Pública (…) e sendo esse um direito Costitucional, não se vê razão para que o AE, investido de poderes públicos, o não pudesse fazer.

Paiva, Eduardo; Cabrita, Helena, Juízes de Direito “O Processo Executivo e o Agente de Execução” – A Tramitação da Acção Executiva Face às Alterações Introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 226/2008 de 20 Novembro; Coimbra Editores, Maio de 2009, pp 128. 5  Acórdão da Relação dd 17-06-2008, PROC. 4500/2008-1 – Relatora – Maria Rosário Barbosa. 4

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Apreensão De documentos E Imobilização De Veículos Penhorados

judiciária – neste caso poderá ser o juiz, o juiz de instrução e o Ministério-Público – ou em casos limite pelo próprio órgão de polícia criminal (com ou sem mandado prévio) e a qual terá de ser obrigatoriamente validada no prazo de 72 horas pela autoridade judiciária sob pena de não produzir os efeitos pretendidos (artigo 178.º n.º 5 CPP). Mas neste último caso, a apreensão tem, sem dúvida, natureza diferente. Não existe penhora prévia. Apenas se apreende com base em ilícito criminal, que, em última instância poder-se-á vir a verificar não existir. O escopo do processo executivo comum ou civil é o de garantir o pagamento de certa quantia (colocando-se agora de lado a execuções de prestação de facto e entrega de coisa certa). Por outro lado, a apreensão de bens em processo-crime, não tem esse objectivo, antes quer garantir que o ilícito criminal cesse, ou que o infractor beneficie de bens cuja proveniência se presume ser ilícita. Ou seja, enquanto no primeiro se protege o interesse privado – a falta de cumprimento de determinada prestação por banda do executado para com o exequente –, já no segundo interessa a protecção de um interesse “colectivo”, isto é, o bem jurídico atacado pelo alegado prevaricador. Atento o que se vem expondo, no caso do processo civil, a apreensão por parte da Autoridade Policial, já não tem de ser “validada” por qualquer autoridade judiciária, com a prolação de um Despacho para o efeito, uma vez que o objectivo da apreensão do bem ao contrário, reitere-se, do que se passa no processo-crime, não se prende com a obtenção de prova e/ou apreensão de objecto usado na concretização do ilícito criminal ou proveniente de actividade criminosa, mas antes com o pagamento de uma dívida que o executado não solveu em devido tempo. E este facto faz toda a diferença, pelo que não se poderá exigir ao Agente de Execução aquilo que o legislador não exigiu ao sistema executivo civil português, isto é um Despacho para apreensão de documentos e imobilização de veículo penhorado.6 No dizer de Eduardo Paiva e Helena Cabrita, “(…) a acção executiva surge numa fase em que determinada obrigação se encontra assente e o respectivo direito a ela pacífico e bem definido.”7, pelo que, salvo as excepções previstas legalmente, nada há a decidir quanto ao direito do executado. Ora, o que nos parece é que, tendo naturalmente o processo executivo civil português (e ainda mais acentuadamente no penal) sido rodeado de garantias para o executado, continua-se a insistir em garantias já revogadas legalmente como seja a exigência da prolação de Despacho Judicial para a apreensão de documentos e certificação e quilómetros em veículos previamente penhorados. E, a este propósito chama-se à colação os casos em que há necessidade de Despacho Judicial para a presença ou auxílio das autoridades policiais, para efectivação de penhoras, no âmbito da acção executiva, e, salvo melhor opinião não haverá outros. Na verdade estes estão previstos no n.º 3 do artigo 840.º e n.º 3 do artigo 848 ambos do CPC: “A requerimento fundamentado do Agente de execução, o juiz determina o auxílio das autoridades policiais nos casos em que as portas estejam fechadas, ou haja receio justificado de oposição de resistência arrombando-se aquelas, se necessário, e lavrando-se auto da ocorrência.” Ora, de facto quando houver necessidade de arrombar portas ou justificado receio que tal aconteça, há lugar a Despacho Judicial. Fora destes casos, não há lugar a outro Despacho ou autorização Judicial de penhora de bens8, além do que se autoriza não é a penhora em si, mas o meio coercivo para a concretizar e chegar aos bens do executado – o arrombamento. Por outro lado, já não há lugar a Despacho Judicial se as portas se encontrarem abertas e houver necessidade de recorrer às autoridades policiais, por exemplo, para a remoção dos bens penhorados por eventual resistência do executado confrontado com a sua iminente remoção. 6  E isto porque, não se discute o direito – pois este encontra-se já definitivamente assente – antes, aplica-se directamente o direito, obrigando-se literalmente – o executado – ao cumprimento de certa, determinada e exigível prestação que anteriormente terá sido declarada/reconhecida em definitivo. 7  Paiva, Eduardo; Cabrita, Helena, Juízes de Direito “O Processo Executivo e o Agente de Execução” – A Tramitação da Acção Executiva Face às Alterações Introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 226/2008 de 20 Novembro; Coimbra Editores, Maio de 2009, pp 35. 8  Excepciona-se o Despacho para o levantamento do sigilo bancário. Somos no entanto do parecer que tal Despacho é desnecessário por inútil. A nosso favor vem a alteração do Código Processo Civil que entrará em vigor brevemente.

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SOLICITADORIA E AÇÃO EXECUTIVA ESTUDOS #1


Carlos Marcelino

Contudo, assim não sucedia anteriormente ao referido DL 226/2008 de 20/11, onde era necessário o Despacho para a intervenção policial. Referia, assim, o n.º 2 do artigo 840.º do CPC (redacção anterior ao DL 226/2008 de 20/11): “Quando (…) seja oposta alguma resistência, bem como quando haja receio que tal se verifique, o Agente de execução requer ao juiz que determine a requisição do auxílio da força pública (…).” Facto de difícil compreensão, atento as não raras dificuldades enfrentadas pelo AE no cumprimento do seu dever legal, como de resto já deixámos expresso supra.9 Assim, e nestes casos, caberia à Autoridade Policial garantir a Ordem Pública, permitindo que o Agente de Execução pudesse concluir a diligência Judicial que lhe foi incumbida. Ora, mas o que vem referido nos ofícios das autoridades policiais, os quais se sustentam no revogado GUIA DE PROCEDIMENTOS elaborado pelo Gabinete de Auditoria e Modernização do Ministério da Justiça, com a colaboração da PSP e Câmara dos Solicitadores, será sempre necessário Despacho Judicial para a apreensão de veículo (materializada com a apreensão dos documentos, certificação de quilómetros e indicação onde a mesma se encontra). Tal entendimento, com o devido e merecido respeito que é muito, carece de suporte legal para o efeito, como anteriormente, e sobejamente, já se sustentou. Por outro lado, actualmente, também não há lugar a Despacho Judicial se, o AE, presente no local, se deparar com qualquer obstáculo, que não seja o de arrombamento de portas, e que impeça a efectivação da diligência de penhora e remoção, caso em aquele que pode solicitar directamente o auxílio às Forças Policiais sem necessidade de Despacho para o efeito. De resto, qualquer cidadão pode solicitar a presença da polícia para a manutenção da Ordem Pública, e, sendo esse um direito Constitucional, não se vê razão para que o AE, investido de poderes públicos o não pudesse fazer. Também, nesse sentido, a apreensão de documentos e imobilização do veículo automóvel já penhorado, não carecerá de qualquer Despacho Judicial que a ordene. Pois se assim fosse, o legislador teria referido expressamente a sua necessidade, ao invés de prescrever que cabe ao Agente de Execução requerer directamente o auxílio das Autoridades Policiais. Da mesma forma que, também não caberá Despacho Judicial a autorizar o recurso à Autoridade Policial fora dos casos previstos dos n.º 3 dos artigos 840.º e 848.º do CPC, cabendo ao AE promover intervenção da competente Autoridade Policial para o efeito, na exacta medida que se mostrar necessário para o cumprimento das diligências materiais de penhora de bens como seja a remoção de bens móveis e/ou apreensão de viaturas penhoradas, a qual deverá ser materializada pela apreensão de documentos e certificação de quilómetros. B) PRESENÇA DO AGENTE DE EXECUÇÃO NO MOMENTO DA PENHORA JUNTAMENTE COM AS AUTORIDADES POLICIAIS OU SOLICITAR A SUA PRESENÇA, COM ANTECEDÊNCIA MÍNIMA DE 30 MINUTOS RELATIVAMENTE À APREENSÃO A EFECTUAR. Salvo opinião em contrário, a exigência da presença do Agente de Execução aquando da apreensão dos documentos da viatura previamente penhorada ou solicitar a presença de Autoridade Policial com antecedência mínima de 30 minutos relativamente à apreensão carece de sustentabilidade jurídica, senão vejamos: Em momento nenhum no CPC existe norma a sustentar a exigência supra referida. Além disso, a concretização de penhora de automóveis, atento o alargamento a todo território nacional da actuação por parte do Agente de Execução, este dificilmente poderia estar presente em diligências de apreensão requeridas às forças públicas em locais distantes do seu domicílio profissional (além de que os automóveis pela sua própria natureza é incerto o seu paradeiro). Pergunta-se, (embora não seja este o objecto da nossa exposição): como foi possível manter um normativo legal em que era necessário o Agente de Execução justificar ao Tribunal a necessidade da intervenção da força pública na diligência externa – e tantas vezes recusada –, quando aquele estava (como continua a estar) em funções públicas – e com poderes públicos – “por conta” do Estado português, percebendo-se logo à partida que as funções próprias inerentes à actividade executiva já são, por si só, desgastantes, com a natural apetência para fricções entre AE e executado/os? 9

(…) no caso da penhora de bens móveis sujeitos a registo, não sucede o mesmo, isto porque ao contrário dos bens móveis não sujeitos a registo, aqueles já se encontram penhorados, só que o executado, por algum motivo, não obedeceu ao comando de entrega de documentos ao Agente de Execução.

(…) não cabe ao agente de execução promover a apreensão efectiva do documentos da viatura previamente penhorada (…) havendo a recusa de entrega por parte do executado, ou a não obediência ao comando emanado pelo AE aquando da citação ou notificaçã o para o efeito, caberá às autoridades policiais a diligência de apreensão (…)

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Apreensão De documentos E Imobilização De Veículos Penhorados

Se quanto a outros bens, nomeadamente, imóveis, contas bancárias, salários, créditos, entre outros, não existe obstáculos à realização da penhora, porquanto o Agente de Execução ao emanar a ordem de penhora, esta materializa-se de imediato, porque não depende da vontade do executado, já o mesmo não acontece relativamente a duas categorias de bens a saber: – Os bens móveis; – Os bens móveis sujeitos a registos (automóveis; motociclos; barcos; aeoronaves e até armas de fogo). Quanto aos primeiros, a penhora só se concretiza com a presença do Agente de Execução no local, o qual se tem de deslocar a casa/residência/sede do executado para a efectivação da penhora da qual lavra o competente auto de penhora. Neste caso, atentas as dificuldades muitas vezes enfrentadas pelo Agente de Execução na concretização da penhora, nomeadamente (embora nem sempre) com a remoção dos bens do executado, este vê-se na circunstância de se socorrer das autoridades policiais para o auxiliarem no cumprimento das funções que lhe foram legalmente cometidas. Contudo, no caso da penhora de bens móveis sujeitos a registo, não sucede o mesmo, isto porque ao contrário dos bens móveis não sujeitos a registo, aqueles já se encontram penhorados, só que o executado, por algum motivo, não obedeceu ao comando de entrega de documentos ao Agente de Execução. Pelo que em face do exposto, entendemos, à semelhança, aliás, do que já referimos relativamente à alínea a) supra, que não cabe ao Agente de execução promover a apreensão efectiva do documentos da viatura previamente penhorada, e nessa medida, havendo a recusa de entrega por parte do executado, ou a não obediência ao comando emanado pelo AE aquando da citação ou notificação para o efeito, caberá às autoridades policiais a diligência de apreensão de documentos, certificação de quilómetros e informação do local onde o bem penhorado se encontra, cabendo da mesma forma, caso o executado ou o detentor da viatura persista na desobediência à intimação efectuada pelas autoridades policiais competentes quanto à entrega dos elementos oportunamente solicitados, a promoção da queixa-crime consubstanciada na desobediência a ordem legalmente emanada. Em conclusão, e de acordo com todo o explanado supra, consideramos não haver lugar a Despacho Judicial para a apreensão de viaturas previamente penhoradas, assim como não sufragamos o entendimento inserto nos ofícios quanto à necessidade da presença do Agente de Execução no momento da penhora juntamente com as autoridades policiais – efectivamente não existe penhora, mas apreensão de documentos – e bem assim a antecedência mínima de 30 minutos relativamente à apreensão a efectuar, pois tal entendimento e/ou exigência não encontra, actualmente, acolhimento legal.

O artigo não está escrito segundo o novo acordo ortográfico.

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SOLICITADORIA E AÇÃO EXECUTIVA ESTUDOS #1


MERCADO DE HABITAÇÃO EM PORTUGAL – MUDANÇA DE PARADIGMA FRANCISCO MOREIRA BRAGA Solicitador, mestre em solicitadoria (ISCAD) e docente universitário. Antigo diretor de risco de crédito do Barclays Bank Plc – Sucursal em Portugal

INTRODUÇÃO

A

o falarmos de uma mudança de paradigma no mercado de habitação estamos claramente a afirmar que, em determinadas épocas, um conjunto de circunstâncias terá condicionado as escolhas dos portugueses na opção entre arrendamento ou aquisição da sua própria habitação e que, no momento presente, um outro conjunto de circunstâncias, diversas das anteriores, estará novamente a condicionar as escolhas dos portugueses, no que se refere a essa mesma opção, mas levando-os agora a decidir noutro sentido. Sendo as condicionantes diferentes, certamente as escolhas serão igualmente diferentes. Procuraremos caracterizar a evolução do mercado de habitação em Portugal no passado recente e a encontrar os motivos que nos trouxeram à situação atual, os quais não só nos condicionaram, como ao longo de décadas nos levaram a assumir como dados adquiridos, como dogmas, alguns pressupostos que entretanto deixaram de ter correspondência com a realidade. Uma das características mais marcantes da realidade portuguesa atual no mercado de habitação é a elevadíssima percentagem de proprietários da sua própria habitação sendo uma das origens deste facto o progressivo desaparecimento do mercado de arrendamento ao longo das últimas décadas motivado por decisões políticas que enviesaram as mais elementares regras da livre iniciativa, de que resultou o desinteresse dos investidores por este mercado, enquanto, paralelamente se fomentava a opção pela aquisição de habitação própria. Este panorama levou-nos a estudar o mercado da habitação em Portugal, a sua evolução recente que veio influenciar de forma decisiva as suas atuais características, assentes numa notória distorção das regras de mercado do sector do arrendamento, e da existência de uma elevadíssima percentagem de proprietários da sua própria habitação.

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Mercado De habitação Em Portugal – Mudança De paradigma

Analisaremos igualmente as perspetivas futuras, que nos apontam um rumo que se veio a revelar na mesma linha de resolução do Conselho de Ministros1 no sentido da necessidade de uma revitalização do mercado de arrendamento. Pretende-se com este trabalho, não um estudo exaustivo, mas caracterizar em traços gerais o mercado de habitação em Portugal, bem como a evolução que o mesmo tem sofrido no passado recente, resultado de decisões políticas e sua consequente tradução legislativa, da forma como as condições proporcionadas pelo sistema financeiro português e respetivas opções em termos de política de crédito o têm vindo a condicionar e influenciar e, mais recentemente, talvez de forma ainda não totalmente consciente, da mudança de paradigma em curso no mercado de emprego que cada vez mais levará, sobretudo os mais jovens, a ponderar as vantagens proporcionadas, quando a opção é o arrendamento, no que à mobilidade diz respeito, em contraposição às limitações impostas pela opção por aquisição de habitação própria no que se refere à disponibilidade para aceitação de ofertas de emprego. Com efeito, essa necessidade de disponibilidade para aceitação de ofertas de emprego, cada vez em locais mais distantes, no país ou mesmo no estrangeiro, bem como a instabilidade e precariedade muitas das vezes associadas a esses possíveis postos de trabalho, obrigam a que estejamos sempre, mentalmente disponíveis e fisicamente preparados a rapidamente nos podermos deslocar de uma cidade para outra, de um país para outro, necessidade, essa, que é manifestamente incompatível com a opção por aquisição da própria habitação, que, em regra, nos amarra a um local determinado, um ativo cuja liquidez é, nos tempos que correm, muito reduzida, mas também a um empréstimo de longa duração e a uma hipoteca.

Há quem afirme existirem duas formas de destruir uma cidade, a primeira por via de bombardeamento, a segunda por via do congelamento das rendas.

1. O CONGELAMENTO DAS RENDAS E A DEGRADAÇÃO DO PARQUE HABITACIONAL Comecemos então por tentar perceber o motivo do enviesamento da situação existente em Portugal, traduzido no facto de uma percentagem elevada da população ser proprietária da sua própria habitação. Há quem afirme existirem duas formas de destruir uma cidade, a primeira por via de bombardeamento, a segunda por via do congelamento das rendas. E se, nem Lisboa nem o Porto foram sujeitas a bombardeamentos, foi precisamente pela instabilidade social causada pelas grandes guerras ocorridas na Europa que ambas foram sujeitas ao congelamento das rendas nos termos do art. 48.º da Lei 2030 de 22 de junho de 1948. Previa esta Lei a possibilidade de atualização das rendas, que corresponderiam no máximo a um duodécimo do valor tributável dos imóveis, excepto nas cidades de Lisboa e Porto, enquanto ao senhorio não se facultasse a avaliação. Na verdade, não foram as rendas que foram congeladas, mas sim as avaliações de imóveis que deixaram de ser levadas a cabo, o que implicou, na prática, uma impossibilidade para os senhorios de procederem à atualização das rendas. Basta passearmo-nos pelas zonas históricas daquelas duas magníficas cidades para, em ambas, nos ser dado constatar o grau de abandono e de degradação a que chegaram, e cujos esforços de recuperação por parte dos municípios não conseguem fazer reduzir a frequência com que notícias de derrocadas de prédios e de famílias desalojadas são disputadas pelas diferentes estações televisivas para os “diretos” de abertura dos noticiários. Não podemos deixar de fazer uma alusão, neste momento, pela sua peculiaridade, a diversas disposições constantes no Decreto-Lei n.º 157/2006 de 8 de agosto2, que aprova o regime jurídico das obras em prédios arrendados, ao preverem a possibilidade de realização de obras coercivas por parte dos municípios, ou mesmo por parte dos inquilinos, e respetivo ressarcimento do seu custo através do recebimento das rendas. Não pela previsão dessa possibilidade em si mesma, que parece perfeitamente aceitável e pacífica, mesmo recomendável, mas pelo facto de a legislação que recentemente tem vindo a lume, parecer fazer crer, aos olhos dos cidadãos, serem os senhorios os únicos responsáveis pelo estado de degradação a que chegaram os imóveis de que Resolução do Conselho de Ministros n.º 20/2011, de 17 de Março, publicada no Diário da República, 1.ª série – n.º 58 – 23 de Março de 2011. Posteriormente veio a ser publicada a Lei 31/2012 de 14 de Agosto que entrou em vigor a 12 de Novembro de 2012 e que procede à revisão do regime jurídico do arrendamento urbano. 2  Entretanto alterado pela Lei 30/2012 de 14 de agosto. 1

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são proprietários, sem que o próprio Estado reconheça a sua quase exclusiva responsabilidade nessa matéria. Com efeito, tem sido à custa do património dos senhorios, por via legislativa, e ao longo de décadas, que a estes últimos tem vindo a ser imposto subsidiarem as rendas das habitações, não só às famílias eventualmente mais desfavorecidas, mas da população em geral sem que, em ocasião alguma, o Estado tenha vindo reconhecer a sua quase exclusiva responsabilidade nessa matéria, o que veio coartar a muitos senhorios a capacidade financeira necessária para procederem à manutenção dos seus prédios. O congelamento das rendas prolongou-se ao longo dos anos, de décadas mesmo, prevendo o Decreto-Lei n.º 47.334, de 25 de novembro de 1966, no seu art. 10.º a suspensão das avaliações fiscais prescritas em 1948 apenas para Lisboa e para o Porto. A esse propósito, transcrevemos parte do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 321-B/90 de 15 de outubro, que por seu lado se referia a declarações proferidas pelo Ministro da Justiça em 1966, as quais reconheciam as implicações que tal opção (congelamento das rendas) poderia vir a provocar na deterioração do património imobiliário: “ (...) como foi afirmado em 1966 pelo então Ministro da Justiça, em comunicação à Assembleia Nacional, “da inalterabilidade das rendas, no mercado em permanente evolução, há-de resultar por força a progressiva deterioração de uma parcela não despicienda do património imobiliário nacional, fenómeno a que os poderes públicos não devem assistir impassíveis”. Na senda da anterior legislação, também a revolução que ocorreu em 1974, e desta feita, quiçá, influenciada pelas correntes ideológicas preponderantes à época, numa torrente de sucessivos Decretos-Lei, de que Pinto Furtado3 destaca o DL 445/74, de 12 de setembro e que tentaram de alguma forma por cobro a diversos fenómenos sociais que então se verificavam, não só manteve em Lisboa e Porto mas veio alargar a todos os concelhos do País a suspensão das avaliações fiscais para atualização de rendas4. Apesar de mais recentemente, desde a publicação de diversas normas como o Decreto-Lei 148/81, de 4 de Junho e a Lei n.º 46/85, de 20 de Setembro e, sobretudo, da publicação do Regime do Arrendamento Urbano pelo Decreto-Lei 321-B/90 de 15 de Outubro, se ter permitido a celebração de contratos de arrendamento urbano de renda livre, já no que se refere aos contratos vigentes à data da entrada em vigor da lei nova, cujas rendas se encontravam e mantêm muito desfasadas relativamente ao que seria uma renda normal de mercado, apenas medidas muito tímidas foram adotadas no que se refere à sua atualização. A este propósito, referem os respetivos autores em nota prévia, em obra recentemente publicada, que “(…) a Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto (…) introduz profundas e significativas alterações aos vários diplomas que, em conjunto, constituem o Regime Jurídico do Arrendamento Urbano (…)” 5. E se, até ao início da década de 1970, as taxas de inflação eram baixas e estáveis, pelo que, mesmo sem atualizações, as rendas se iam mantendo relativamente próximas do seu valor real de mercado, no período seguinte, sobretudo no pós 25 de Abril de 1974, como veremos mais à frente6, as taxas de inflação disparam, chegando na primeira metade da década de 1980 a atingir valores próximos de 30%, o custo de vida aumenta significativamente, e o valor real das rendas sofre uma desvalorização progressiva e acelerada. É necessário chegarmos à década de 1990 depois de um período prolongado de elevadas taxas de inflação e consequentemente numa época em que o valor médio das rendas já é totalmente desfasado da realidade, para assistirmos à publicação do RAU7 (Regime de Arrendamento Urbano) que entra em vigor em 1991 e que vem tornar possível a celebração de contratos de arrendamento urbano de renda livre, mas que, no que se refere aos contratos vigentes à data da sua entrada em vigor – os denominados contratos do tipo vinculístico – pelo facto de os ­senhorios deles não se poderem desvincular, as rendas mantêm-se inalteradas continuando-se

(...) a legislação que recentemente tem vindo a lume, parecer fazer crer, aos olhos dos cidadãos, serem os senhorios os únicos responsáveis pelo estado de degradação a que chegaram os imóveis de que são proprietários, sem que o próprio Estado reconheça a sua quase exclusiva responsabilidade nessa matéria.

Jorge Henrique da Cruz Pinto Furtado, pag. 231, Manual de Arrendamento Urbano, Volume I, 4.ª Edição, 2007, Edições Almedina SA. 4  O que, tendo em linha de conta as taxas de inflação anuais à época (ver quadro III), facilmente se depreende a rapidez e a dimensão da degradação do valor das rendas de casa. 5  MARTINS, Manteigas; FREIRE, Carla Santos; NABAIS, Carlos; RAIMUNDO, José M., Novo Regime do Arrendamento Urbano Anotado e Comentado, Vida Económica, 2012. 6  Vidé Quadro V – Taxa de inflação. 7  RAU – Regime do Arrendamento urbano, aprovado pelo Decreto-Lei 321-B/90 de 15 de Outubro. 3

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Mercado De habitação Em Portugal – Mudança De paradigma

É necessário chegarmos à década de 1990 depois de um período prolongado de elevadas taxas de inflação e consequentemente numa época em que o valor médio das rendas já é totalmente desfasado da realidade, para assistirmos à publicação do RAU que entra em vigor em 1991 e que vem tornar possível a celebração de contratos de arrendamento urbano de renda livre,

assim, a assistir à degradação contínua do valor real dessas rendas e, consequentemente, das zonas históricas das principais cidades. A própria Lei 6/2006 de 27 de fevereiro que aprovou o NRAU – Novo Regime de Arrendamento Urbano e vem revogar o RAU, que tinha como objetivo mais publicitado a implementação de um sistema de atualização das rendas antigas, em virtude da sua complexidade e da manutenção do legislador numa preocupação centrada nos baixos rendimentos dos arrendatários, acabou por não produzir os efeitos alegadamente pretendidos, uma vez mais, à custa do património dos senhorios. Considerando ser seu propósito a atualização das rendas mais antigas, mas prevendo a própria lei, nos seus artigos n.os 37.º e 38.º, no caso de arrendatários com mais de 65 anos de idade – porventura a maioria do segmento das rendas mais baixas – mas de forma cega e independentemente do rendimento auferido por estes, que esse mesmo aumento seria processado de forma faseada ao longo de 10 anos e que a nova renda não poderia nunca exceder o valor correspondente a 4% do valor patrimonial atualizado, e isto apenas se o estado da habitação fosse classificado de bom ou de excelente, poderemos concluir, pese embora a bondade da iniciativa, da timidez da solução apresentada. Um breve exemplo de um caso concreto é disso uma prova. Aplicando a nova legislação aprovada e seguindo todos os preceitos legais, que levaram o processo a arrastar-se por cerca de um ano, uma renda de €60,00 referente a um apartamento do tipo T2, localizado na cidade da Amadora, foi possível ser atualizada para um novo valor de €260,00 que, sendo sem dúvida, em termos percentuais, muito significativo, não deixa de continuar a ser uma renda desfasada da realidade ditada pelo mercado. Sucedeu que, pelo facto de a inquilina ter mais de 65 anos de idade, a referida renda, independente do rendimento auferido pela arrendatária, tem vindo a ser paulatinamente atualizada, grosso modo ao ritmo de €20,00 por ano, apenas vindo a atingir o seu novo valor ao fim de um período de 10 anos. Mesmo com as mais recentes alterações introduzidas pela Lei 31/2012 de 14 de Agosto, claramente, e como vem sucedendo desde há décadas, o Estado, novamente, alijando a sua responsabilidade à custa do património dos senhorios, impõe a estes a manutenção de um subsídio direto às famílias com rendas mais antigas. Referimo-nos ao regime de salvaguarda para agregados familiares de baixos rendimentos, estatuído pelo art. 35.º da Lei 6/2006 de 27 de fevereiro, já com as alterações introduzidas pela Lei 31/2012 de 14 de agosto, que mantém o conceito de baixos rendimentos para os agregados familiares, cujo RABC (Rendimento Anual Bruto Corrigido), seja inferior a cinco RMNA (Retribuição Mínimas Nacionais Anuais)8. Convenhamos que, no atual panorama da economia portuguesa, estabelecer o conceito de rendimento baixo a este nível, será no mínimo, pouco consistente com as diversas medidas anunciadas pelo governo de cortes nas reformas dos pensionistas do Estado, cujo valor exceda os €1.500,00 mensais. Para que não subsistam dúvidas, é óbvio que chegados ao ponto em que estamos, é forçoso, cada vez mais, salvaguardar as famílias de menores rendimentos assegurando-lhes uma habitação condigna. Ao que nos opomos, é que o Estado imponha a privados, neste caso os senhorios, que se substituam ao próprio Estado nas suas obrigações de carácter social. Mas já que assim é, então, para minimizar os danos, que seja permitido aos senhorios deduzir ao rendimento coletável da categoria “F” (rendimentos prediais) ou mesmo diretamente à coleta, em sede de IRS, como custo, o prejuízo resultante do diferencial entre o que seria o rendimento máximo permitido por uma renda anual correspondente a 1/15 do VPT (valor patrimonial tributário) e aquele que lhes é permitido auferir em resultado do RABC (Rendimento Anual Bruto Corrigido) declarado pelo arrendatário9. Outro aspeto fortemente desmotivador da opção pelo investimento, no mercado de arrendamento, tem sido a deficiente proteção jurídica oferecida aos senhorios, que, mesmo perante 8  O sítio https://www.portaldahabitacao.pt/pt/portal/legislacao/rmna.html, informava, em consulta efetuada a 29 de dezembro de 2012 que em 2011, cinco RMNA correspondiam à quantia de €33.950,00. 9  Vide artigos 30.º e seguintes da Lei 6/2006, de 27 de Fevereiro com as alterações introduzidas pela Lei 31/2012, de 14 de Agosto, segundo os quais, nos contratos para habitação celebrados antes da entrada em vigor do RAU, a nova renda máxima anual permitida corresponderá a um valor igual a 1/15 do valor patrimonial tributário do arrendado, determinado pelos serviços de finanças segundo as regras dos artigos 38.º e seguintes do CIMI, valor este excecionado para arrendatários cujo RABC do seu agregado familiar seja inferior a cinco RMNA (Remunerações Mínimas Nacionais Anuais).

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a­ rrendatários faltosos, através de um procedimento imperativo previsto nos artigos 1079.º a 1090.º do Código Civil, os obrigava a aguardar pela ocorrência de mora superior a três meses no pagamento da renda para que lhes fosse permitida a resolução do contrato, e que, mesmo após a comunicação ao inquilino faltoso, teriam de aguardar novo período de três meses até poderem entrar com um procedimento executivo para entrega de coisa certa referente ao arrendado e um outro para pagamento de quantia certa referente às rendas vencidas e não pagas, além do que, ainda assistia ao arrendatário faltoso o direito a invocar todo um conjunto de situações previstas nos artigos 930.º-A e seguintes do CPC, e aqui enxertados pela mesma Lei que aprovou o Novo Regime do Arrendamento Urbano que lhe permitiriam, em certas circunstâncias, dilatar ainda mais os prazos acima referidos.10 Salvo melhor opinião, esta perspetiva de excessiva preocupação de protecionismo dos arrendatários faltosos, contribui, não para a dinamização, que carece de urgência, de um verdadeiro mercado de arrendamento, mas para o prejuízo dos arrendatários cumpridores. Estes, em virtude da escassez de oferta de habitações para arrendar, quantas vezes são compelidos a pagar rendas de valor excessivo e aceitar práticas ilegais por parte de senhorios sem escrúpulos que, aproveitando quantas das vezes a ignorância ou inexperiência dos inquilinos, se recusam a celebrar contratos e a emitir recibos, chegando mesmo ao ponto de publicitar nos media esta prática, o que, com a crescente procura, nomeadamente por parte de comunidades imigrantes, se tem vindo a generalizar.11 Essas opções políticas e legislativas acabaram afinal por fomentar e manter a possibilidade de existência de uma verdadeira “economia subterrânea” no mercado de arrendamento, onde muitos senhorios deixam de declarar este tipo de rendimentos e de pagar os respetivos impostos, e muitos inquilinos ficam impossibilitados da dedução à coleta, em sede de IRS, até ao respetivo limite, o valor das rendas pagas12. A este propósito, vejamos a título ilustrativo o quadro que abaixo se reproduz, segundo o qual nos é dado constatar a distorção existente no mercado de arrendamento e a sua evolução nas duas últimas décadas do Séc. XX. Com efeito, em 1981, cerca de 90% dos cerca de 1,07 milhões de contratos de arrendamento existentes mantinham rendas abaixo dos €15,00 e que menos de 1% se situava acima dos €60,00. Duas décadas mais tarde, de acordo com o censo 2001, esta relação evoluía passando aproximadamente 16% dos cerca de 740 mil contratos então existentes a contar com rendas abaixo dos €15,00 e 52% acima dos €60,00. A Lei 31/2012, de 14 de agosto, veio introduzir alterações significativas aos Códigos Civil e do Processo Civil sobre esta matéria. Como referem os autores na obra referida na anotação 5, pág.123, “O n.º 3 deste artigo (1083.º CC) contém uma situação objetiva de incumprimento grave por parte do inquilino e que justifica a resolução do contrato de arrendamento, consistente na mora quanto ao pagamento da renda por um prazo superior a dois meses, prazo que anteriormente à alteração introduzida pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, era de três meses.” Realçam também os autores, entre outras, duas medidas introduzidas no Código Civil cujo objetivo será, sem dúvida, agilizar o processo de resolução do contrato de arrendamento: “A redação introduzida pelo n.º 4 (art. 1083.º CC) cria um novo fundamento de resolução do contrato de arrendamento e que consiste em o arrendatário se constituir em mora superior a 8 dias, no pagamento da renda, por mais de quatro vezes seguidas ou interpoladas (ou seja, pelo menos 5 vezes) durante 12 meses.” Na mesma obra (pág.124) referem-se os autores ao encurtamento de um outro prazo importante ao sublinharem que “A alteração constante do n.º 3 (art. 1084.º CC) reduz de três meses para um mês o prazo de que o inquilino, a quem foi resolvido o contrato por mora no pagamento da renda, dispõe para poder considerar sem efeito a resolução, através do pagamento das rendas em mora acrescidas de 50%.” De referir ainda a criação do denominado BNA (Balcão Nacional de Arrendamento) pelo Decreto-Lei 1/2013, de 7 de Janeiro, dentro do mesmo objetivo de agilização do processo de despejo de inquilinos incumpridores e da desjudicialização deste procedimento que ficará a cargo de agentes de execução e de notários, mas cujo alcance prático é ainda cedo para se perceber. 11  Sobre este tema, de referir as intenções já demonstradas pelo anterior executivo (do 1.º Ministro José Sócrates) em resolução do Conselho de Ministros já citada, segundo a qual se previa, por parte do senhorio, o recurso a procedimento mais célere com vista ao despejo e restituição do imóvel, em caso de não pagamento de rendas, o qual ficaria, contudo, reservado apenas a senhorios que tivessem, quando da celebração de contratos de arrendamento, observado e cumprido, todos os preceitos legais nomeadamente o registo do contrato nos serviços de finanças. De referir ainda na mesma resolução, a previsão de algumas medidas de carácter fiscal, nomeadamente a fixação de uma taxa autónoma em sede de IRS para os rendimentos prediais semelhante à taxa que em sede do mesmo imposto é aplicada em regra, às aplicações financeiras, o que poderia também, por via do efeito fiscal, vir a incentivar o investimento no mercado do arrendamento, para além de outras especialmente destinadas a incentivar a reabilitação urbana, processo este, que como sabemos, reveste carácter urgente em zonas históricas das principais cidades, podendo também ele contribuir para contrariar a desertificação que nas referidas zonas é tantas vezes referida pelas autoridades locais. 12  O art. 85.º do CIRS, na alínea a) do n.º 1, prevê com referência aos rendimentos auferidos em 2012, a dedução à coleta até ao limite de €591,00 do valor das rendas pagas para habitação permanente do sujeito passivo. 10

Mas já que assim é, então, para minimizar os danos, que seja permitido aos senhorios deduzir ao rendimento coletável da categoria “F” ou mesmo diretamente à coleta, em sede de IRS, como custo, o prejuízo resultante do diferencial entre o que seria o rendimento máximo permitido por uma renda anual correspondente a 1/15 do VPT e aquele que lhes é permitido auferir em resultado do RABC declarado pelo arrendatário.

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Mercado De habitação Em Portugal – Mudança De paradigma

Quadro I Distribuição das rendas por escalões (1981 –> 2001). ESCALÕES DE RENDA ­A NOS

TOTAL DE CONTRATOS

MENOS DE €15,00

DE €15,00 A €35,00€

DE €35,00 A €60,00

MAIS DE €60,00

1981

1.074.590

957.498

95.747

16.582

4.763

1991

545.710

173.482

148.807

81.721

141.700

2001

740.425

117.330

138.803

101.369

382.923

Fonte de Dados: INE – II a IV Recenseamentos Gerais da Habitação

Entretanto o Censo 2011 veio atualizar a informação no que se refere à distribuição das rendas por escalões, como nos mostra o Quadro II, onde é nos é dado constatar, por um lado um ligeiro crescimento do número de contratos de arrendamento, tendência esta que já se vinha fazendo sentir desde 1991, e por outro lado a tendência para uma redução progressiva do número de contratos nos escalões de rendas mais baixas, verificando-se uma evolução de sentido contrário nos escalões de rendas mais altas. Quadro II Distribuição das rendas por escalões (2001 –> 2011). ESCALÕES DE RENDA ANOS

TOTAL

MENOS DE €100

DE €100 A €200

DE €200 A €300

DE €300 A €400

DE €400 A €500

MAIS DE €500

2001

740.425

439.844

128.001

91.447

49.611

17.334

14.188

2011

794.465

257.299

123.900

136.883

152.797

58.345

65.241

Fonte: Pordata / INE – Censo 2011

No que se refere ao valor das rendas podemos igualmente constatar uma evolução com um decréscimo contínuo do número de contratos de rendas mais baixas, celebrados antes da entrada em vigor do RAU13, o que resultará provavelmente do facto de estas rendas se referirem a inquilinos de idade mais avançada e que progressivamente, pela ordem natural da vida, vão deixando as habitações livres facto do qual poderá ter resultado uma transferência direta das mesmas habitações, dos escalões de rendas mais baixas para os de rendas mais elevadas. Com efeito, partimos de 2001 com cerca de 440 Mil contratos de renda inferior a €100 e 81 Mil contratos de renda superior a €300 e chegamos a 2011 com 257 Mil contratos de renda inferior a €100 (menos 183 Mil) e 276 Mil contratos de renda superiores a €300 (mais 195 Mil).

2. DE UM MERCADO DE ARRENDAMENTO À MASSIFICAÇÃO DA PROPRIEDADE DA HABITAÇÃO Como vimos anteriormente, a conjugação de diversos acontecimentos como a Segunda Grande Guerra que devastou a Europa e, mais recentemente, o processo revolucionário que ocorreu em 1974 em Portugal, vieram condicionar algumas decisões políticas com grande impacto no mercado de arrendamento, não só contribuindo fortemente para uma progressiva degradação do parque imobiliário já existente vocacionado para esse mercado, mas, mais do que isso, vieram desincentivar potenciais investidores de entrar no mercado, contribuindo também para uma cada vez maior escassez de oferta de casas para arrendar, e, ao mesmo tempo, originando um incremento significativo na pressão do lado da procura no mercado de aquisição de habitação própria assistindo-se, por essa via, a uma transferência continuada e crescente da procura de um 13

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RAU – Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/1990 de 15 de Outubro.

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mercado para o outro facto a que não alheio, por um lado a falta de alternativas mas também, a opção por uma política de incentivos fiscais à aquisição da própria habitação. Poderemos constatar no Quadro III abaixo, que o número de alojamentos ocupados por inquilinos apresenta uma curva descendente contínua sendo em 1970 já idêntico o número de alojamentos familiares ocupados por inquilinos e por proprietários, tendência que se veio a acentuar drasticamente nos anos seguintes, não tanto por um decréscimo no número de arrendados pelo acentuado crescimento da opção pela aquisição. Quadro III Alojamentos familiares clássicos de residência habitual segundo os censos: total por ocupantes proprietários e inquilinos. Ocupantes proprietários

Inquilinos e outros

3000000 2700000 2400000 2100000 1800000 1500000 1200000 900000 600000 300000 0 1960

1970

1981

1991

2001

2011

Fonte: PORDATA – INE, Censos ( Recenseamentos Gerais da Habitação).

Nos primeiros anos do Séc. XXI, atinge-se o pico do número de prédios urbanos vendidos (vide Quadro IV) e desde aí temos vindo a assistir a uma curva descendente deste tipo de transações, tendo em 2008 sido vendidos sensivelmente menos 100.000 prédios urbanos que em 1999). De acordo com o censo realizado em 2001 (vide Quadro III), o desequilíbrio atingia já a enorme desproporção de quase 2,7 Milhões de proprietários para menos de 0,9 Milhões de inquilinos enquanto quatro décadas antes, em 1960, esta proporção era de pouco menos de 1 Milhão de proprietários para quase 1,6 Milhões de inquilinos. Segundo o censo de 2011, apesar de se ter mantido a tendência de crescimento na opção pela aquisição da própria habitação, este crescimento é já mais lento, verificando-se por outro lado, uma tendência para algum crescimento no mercado de arrendamento, atingindo-se em 2011 um total superior a 2.9 milhões de proprietários e pouco mais de 1 milhão de inquilinos. Quadro IV Número de prédios urbanos vendidos e respetivo valor médio.

Número de prédios urbanos vendidos

Valor médio dos prédios (euros)

300 000 250 000 200 000 150 000 100 000 50 000 0 1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

Fonte: Anuário Estatístico de Portugal 2009, INE, Edição 2010.

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Mercado De habitação Em Portugal – Mudança De paradigma

Mas o pico do número de venda de habitações ocorrido no início do Séc. XXI não sucede por acaso. Localizemo-nos na história. Encontramo-nos na fase que antecede a adesão de Portugal ao Euro, são fixadas irrevogavelmente as paridades das várias moedas, a taxa de inflação (Quadro V) apresenta dos valores mais baixos de sempre até à data (2,3%): Quadro V Taxa de inflação – Portugal. Taxa de inflação 35 30 25 20 15 10 5 0 -5 1970 1972 1974 1976 1978 1980 1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008 Fonte: PORDATA (dados INE).

A taxa de desemprego (Quadro VI) é das mais baixas registadas (cerca de 4%), verificando-se uma situação de quase pleno emprego, o que se por um lado significa em termos absolutos maior poder de compra, por outro tem ainda implicações na subida do valor médio dos salários por influência da pressão do lado da procura, sobretudo no caso do emprego mais especializado. Quadro VI Taxa de desemprego (total por sexo) [%] Masculino

Feminino

20 18 16 14 12 10 8 6 4 2 2012

2011

2010

2009

2008

2007

2006

2005

2004

2003

2002

2001

2000

1999

1998

1997

1996

1995

1994

1993

1992

1991

1990

1989

1988

1987

1986

1985

1984

1983

0

Fonte: Pordata / INE – Censo 2011

Adicionalmente a taxa de referência para os empréstimos à habitação (Quadro VII) vem a decrescer acompanhando a taxa de inflação, sendo já igualmente baixa sobretudo para os parâmetros a que estávamos habituados em Portugal atingindo na época em análise o valor de 2,2%.

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Quadro VII Taxas de juro – Euribor 6 meses.

5.0 4.0 3.0 2.0 1.0 0.0 99

00

01

02

03

04

05

06

07

08

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Fonte: http://pt.global-rates.com/taxa-de-juros/euribor/2000.aspx

Poderemos então afirmar que estavam reunidas todas as condições para que se registassem máximos de vendas no mercado imobiliário as quais eram ainda influenciadas por uma política de incentivos fiscais à aquisição da própria habitação e por uma postura por parte dos bancos de apelo ao crédito, que lançam sucessivas campanhas agressivas de crédito à habitação. Mas, como tentaremos demonstrar no ponto seguinte, para além dos motivos explanados, outros porém podem influenciar a decisão pela opção de aquisição de habitação própria em detrimento do arrendamento.

2.1 INFLUÊNCIA DOS NÍVEIS DE INFLAÇÃO E DE TAXAS DE JURO NA OPÇÃO PELA AQUISIÇÃO DE HABITAÇÃO PRÓPRIA Se no passado recente apontámos as reduzidas taxas de juro como sendo um dos motivos para o maior recurso ao crédito e a consequente apetência pela aquisição de habitação própria, não nos poderemos esquecer que taxas de juro baixas existem em períodos de reduzida inflação, e que taxas de juro elevadas existem em períodos de inflação elevada. O fenómeno referido tem, como é por demais conhecido, implicações diretas quer na evolução positiva do valor de um imóvel adquirido em períodos de grande inflação, quer na evolução negativa do valor real do dinheiro que permaneça nos bancos em aplicações financeiras nesses mesmos períodos, pelo que, como tentaremos expor mais à frente, em ambas as situações, de inflação baixa ou elevada, poderá haver razões lógicas conducentes à opção pela aquisição em detrimento do arrendamento. No Quadro V acima reproduzido, é-nos dado constatar o comportamento da taxa de inflação em Portugal, que no final da primeira metade da década de oitenta do séc. XX veio a atingir um valor próximo de 30%, o que revela bem a velocidade a que o dinheiro parado no banco perdia o seu valor real ano após ano. A opção pela aquisição de habitação nesta época, se por um lado implicava a contratação de empréstimos bancários a taxas de juro elevadíssimas e consequentemente a prestações também elas de elevado valor, tinha por outro lado a grande vantagem de permitir aos agregados familiares conseguir, em poucos anos, uma redução significativa do peso das despesas com a prestação do empréstimo para habitação no respetivo rendimento. Com efeito, os incrementos salariais anuais nominais concedidos nos referidos anos, tal como a taxa de inflação, ascendiam a valores da ordem dos 20% a 25%, o mesmo é dizer, que num período relativamente curto, sobretudo na primeira metade da década de oitenta, em alguns casos, os salários mais do que duplicavam em valor nominal. A opção pela aquisição de habitação própria era assim uma forma segura de garantir um investimento num bem durável cujo valor real tendia a manter-se ou mesmo a valorizar-se, em contraposição com a manutenção de poupanças em dinheiro, cujo valor real rapidamente

Salvo melhor opinião, esta perspetiva de excessiva preocupação de protecionismo dos arrendatários faltosos, contribui, não para a dinamização, que carece de urgência, de um verdadeiro mercado de arrendamento, mas para o prejuízo dos arrendatários cumpridores.

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se d ­ egradava. Numa primeira fase, o valor da prestação a pagar pelo financiamento contraído poderia, em alguns casos, pelas elevadíssimas taxas de juro praticadas, absorver 50% ou mais do orçamento de alguns agregados familiares, mas, em face das elevadas taxas de inflação e das correspondentes atualizações salariais, mantendo-se fixo o valor nominal inicial do capital mutuado, a proporção do peso da prestação pelo pagamento dos empréstimos no total do orçamento familiar (a denominada taxa de esforço) rapidamente se diluía, enquanto por outro lado, simultaneamente, o valor real do imóvel adquirido se ia mantendo ou mesmo incrementando. No entanto, se pela conjugação destes dois fatores, se afigurava a opção pela aquisição de habitação como a mais interessante, do ponto de vista financeiro, em épocas de inflação elevada, não deveremos deixar de referir que o valor do encargo mensal com a prestação dos empréstimos contraídos restringia significativamente o número de agregados familiares com a capacidade necessária para o efeito. Aos motivos acima expostos, acresce outro não menos importante que também contribui para a evolução do preço dos imóveis. Se em época de taxas de inflação elevadas e consequentemente de altas taxas de juro, os promotores imobiliários teriam uma menor margem de manobra, pois caso elevassem demasiado os preços de venda, reduziriam o número de potenciais clientes pela relativamente reduzida capacidade de endividamento, já o efeito nos preços do mercado imobiliário provocado pela significativa redução das taxas de juro que, sobretudo a partir da segunda metade da década de noventa, se veio a verificar, acabou por ser, diríamos, perverso, como poderemos constatar no Quadro VIII abaixo que, a título ilustrativo utilizamos de novo, mas, desta feita, para nos referirmos à evolução do valor médio dos prédios vendidos. Quadro VIII Número de prédios urbanos vendidos e respetivo valor médio. Número de prédios urbanos vendidos

Valor médio dos prédios (euros)

300 000 250 000 200 000 150 000 100 000 50 000 0 1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

Fonte: Anuário Estatístico de Portugal 2009, INE, Edição 2010.

Como já atrás referido, o número máximo de prédios urbanos vendidos em Portugal, que ascendeu a perto de 300 Mil nos primeiros anos do Século XXI, foi atingido precisamente um dos anos em que a inflação apresentou um dos seus pontos mais baixos (2,3%), e que coincidiu com a fase que antecedeu a adesão de Portugal à moeda única Europeia. Mas podemos concluir igualmente que foi precisamente a partir desse momento, que a grande pressão por parte da procura resultante da maior capacidade de endividamento das famílias, decorrente das baixas taxas de juro, que o preço médio dos prédios urbanos vendidos em Portugal mais cresceu, tendo evoluído, em termos médios nacionais, de pouco mais de 50 Mil Euros em 1998, para mais de 100 Mil Euros em 2004, vindo a atingir o seu valor máximo em 2008 ultrapassando os 125 Mil Euros. A partir dessa data, com o eclodir da grave crise financeira que atravessamos, tem vindo sempre a decrescer até aos dias de hoje, chegando, segundo o Censo 2011 a um valor próximo dos 100 Mil Euros. Como já referimos, mas queremos realçar, o fenómeno de grande crescimento do valor médio dos prédios urbanos vendidos, deu-se precisamente em período de reduzido nível de inflação, sem a ocorrência de aumento do preço dos fatores de produção para os construtores,

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­ omeadamente­o custo do financiamento que terá sido dos mais baixos alguma vez alcançado, n pelo que se afigura pertinente questionar o motivo deste abrupto crescimento. Pesem embora as leis de mercado e a relação entre a oferta e a procura que não deverá ser menosprezada, em nossa opinião o período de baixas taxas de juro acompanhado por uma maior agressividade da generalidade dos bancos na oferta de crédito à habitação com redução das suas margens de lucro, e a influência destes fatores no valor médio das prestações pelos empréstimos hipotecários para aquisição de habitação própria, vieram permitir que os promotores imobiliários, tomando em conta estes dados, passassem a definir o nível de preços de venda das habitações em função da capacidade de endividamento das famílias, isto é, do valor até ao qual as famílias poderiam suportar a prestação do empréstimo bancário. Como já acima referido, o número máximo de prédios vendido num só ano em Portugal, foi atingido nos primeiros anos do Século XXI, tendo a partir daí vindo a decair sempre até aos dias de hoje, no entanto, apesar do cada vez menor número de prédios vendidos anualmente, o volume global do crédito concedido para habitação, como poderemos observar no Quadro VIII abaixo­,­manteve-se sempre em linha ascendente até 2007, passando de um pouco mais de 13 Mil Milhões de Euros em 2003 para vir a atingir um máximo de cerca de 20 Mil Milhões de Euros em 2007, iniciando também este indicador, a partir dessa data, uma tendência acentuadamente decrescente, chegando ao ano de 2012, com um total de 1,9 Mil Milhões de Euros de crédito concedido, o que se pode considerar, em termos comparativos, um valor residual e que corresponde a aproximadamente 10% do máximo atingido poucos anos antes, em 2007. Quadro IX Crédito hipotecário concedido a particulares Crédito à habitação

Crédito para consumo e outros fins

20000 18000 16000 14000 12000 10000 8000 6000 4000 2000 0 2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

2011

2012

Fonte: Pordata / INE – Censo 2011.

O mesmo é dizer que nos anos que vão sensivelmente de 2004 a 2007, as famílias se permitiram passar a contrair empréstimos de valor cada vez mais elevado, olhando, não ao nível de responsabilidades assumido, mas apenas ao valor da prestação mensal que teriam de suportar, o que, como referido, foi aproveitado pelos promotores imobiliários, enquanto por sua vez, os bancos, indo ao encontro dos ensejos dos seus clientes e simultaneamente com o objetivo de aumentar os seus lucros no curto prazo, aceitaram que a qualidade do risco de crédito da sua carteira se degradasse, chegando, em alguns casos, a financiar, não só o correspondente ao valor total do imóvel, mas mesmo acima desse valor para outros custos e despesas associados à aquisição, como impostos, aquisição de mobiliário, etc., política esta, cujos efeitos, no denominado crédito mal parado, se vão verificando com cada vez maior acuidade.

2.2 O SECTOR FINANCEIRO, O NOVO PARADIGMA DO MERCADO DE TRABALHO, E A SUA INFLUÊNCIA NO AUMENTO DA PROCURA NO MERCADO DE ARRENDAMENTO Se o sistema financeiro, as baixas taxas de juro e as condições de crédito oferecidas nos anos que se seguiram ao momento da fixação irreversível das taxas de câmbio das moedas da zona

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euro, tiveram grande influência no acentuado crescimento do mercado da habitação própria, este mesmo sistema financeiro tem também sido no passado mais recente, sobretudo desde o eclodir da crise financeira que se iniciou em 2008, como já referido, um dos grandes responsáveis pela acentuada quebra nas vendas de habitação própria. E desta feita, não pela existência de taxas de juro elevadas, dado que, apesar de a Euribor a 6 meses, principal indexante utilizado no crédito à habitação, ter atingido um máximo de 4,727% em 2008, este mesmo indexante voltou a cair até ao seu valor mais baixo de sempre, para próximo de 1%, tanto em 2009 como em 2010, mantendo-se atualmente em patamares ainda mais baixos. Os motivos terão sido diversos, por um lado o aumento do nível de risco de crédito associado às operações de financiamento hipotecário em resultado da instabilidade social que se verifica e, por outro, pela dificuldade por parte das instituições de crédito em obterem financiamento, elas próprias, para a sua atividade. Face a uma situação de crise que começou por ser financeira, com origem precisamente no mercado de crédito à habitação nos EUA, mas que rapidamente se transformou em crise económica e em crise social, os bancos, se por um lado passaram a ter mais dificuldade em se financiarem, logo em disporem dos recursos necessários para poderem financiar os seus clientes, por outro, em face da crise económica e da maior probabilidade de os seus clientes poderem vir a encontrar-se em situação de desemprego pela instabilidade económica que originou uma verdadeira crise social, rapidamente se adaptaram a uma nova realidade apertando os critérios de análise de risco “fechando a torneira do crédito” tanto a promotores imobiliários como a clientes particulares potenciais compradores de habitação própria. Esta nova postura por parte dos bancos veio não só restringir o acesso ao crédito mas simultaneamente torná-lo mais caro, não pelas taxas de juro mas pelos “spreads”14 praticados, provocando numa primeira fase uma quebra acentuada da procura no mercado de aquisição de habitação e, subsequentemente, de forma progressiva, um acréscimo da procura no mercado de arrendamento. Em 6 de Julho de 2010, podia ler-se num despacho da Agência Lusa publicado no Jornal Público “online” o seguinte título: O mercado de arrendamento em Lisboa cresceu 40 por cento em 2009 em termos anuais, disse à Lusa o director do Confidencial Imobiliário (CI), entidade que produz estatísticas sobre o mercado residencial. E mais à frente referia a mesma notícia que (...) o mercado de arrendamento tem vindo a crescer, sobretudo por se constituir como uma resposta a uma necessidade de rentabilizar um ativo que se tinha em mente vender, (...) pelo que (...) o aumento da oferta no mercado imobiliário teve como consequência a redução das rendas de habitação. Deparamo-nos então com uma nova realidade onde diversos fatores e os diversos agentes económicos, condicionados pela conjuntura que teve origem numa crise financeira mundial, se conjugam para que o mercado de arrendamento volte a ser, para quem procura habitação, a sua primeira opção, e, para os promotores imobiliários, uma verdadeira solução de recurso, com vista à rentabilização dos seus ativos. Estarão criadas as condições para o ressurgimento de um verdadeiro mercado de arrendamento? Em nossa opinião estão de facto reunidas as condições, ditadas pelas leis de mercado, o qual tende sempre a adaptar-se a cada nova situação que vai surgindo. A maior dificuldade no acesso ao crédito por parte de potenciais compradores, motivada essencialmente por dois factores – menor capacidade por parte dos bancos no financiamento da sua atividade e a maior instabilidade no emprego que incrementa o risco de crédito e torna os bancos mais seletivos – tem vindo a contribuir para uma forte restrição na concessão de crédito e, consequentemente, num significativo decréscimo na procura pela aquisição de habitação própria junto dos promotores imobiliários. Por outro lado, os promotores imobiliários, para fazerem face aos compromissos assumidos e tendo absoluta necessidade de rentabilizar os seus activos, em alternativa à venda, optam, cada vez mais, pela colocação dos seus imóveis no mercado de arrendamento, fenómeno este que Termo anglo-saxónico muito utilizado no jargão bancário, que significa, grosso modo, a margem de lucro que o banco financiador adiciona à taxa de juro nominal à qual, o próprio banco se poderá financiar no mercado monetário interbancário. De entre outras variáveis, o risco de crédito associado à operação de financiamento tem ele próprio influência significativa no “spread” a praticar pelo banco. 14

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tem vindo, também ele, a contribuir progressivamente para um aumento da oferta de casas para arrendar o que virá a contribuir para balancear o mercado. Pela exposição acima, poderíamos ser levados a concluir que esta nova tendência no mercado da habitação existe apenas porque o mercado a impõe àqueles que procuram uma habitação para viver. Mas será este o único motivo? Não estaremos no limiar, ou provavelmente mesmo já na presença, de um novo paradigma do mercado do emprego em Portugal e não só, cujas características influenciarão, também elas, a opção pelo arrendamento? Não deveremos considerar, em face da realidade atual e da denominada precariedade do emprego ser a mobilidade uma vantagem competitiva no mercado de trabalho? Provavelmente, um número significativo das famílias que neste momento optam por arrendar, em alternativa a adquirir, ainda não terão esta perceção. Face aos elevados custos iniciais com despesas de processo e de avaliação junto dos bancos, imposto municipal de transacções e imposto do selo aplicáveis, escritura e registos, a aquisição apenas é vantajosa quando possa ser encarada como um investimento de longo prazo que permita diluir todos estes encargos ao longo dos anos da sua duração. Sucede que a realidade do mercado nos tem ditado novas regras, nos tem levado a reequacionar os dogmas por que temos pautado o nosso raciocínio no que à habitação diz respeito, e como tal, todas essas questões deverão ser questionadas. Considerando a incerteza ditada pela conjuntura que atravessamos, cada vez será maior a necessidade de estarmos mentalmente disponíveis e fisicamente preparados para a mobilidade num mercado de emprego geograficamente disperso. Contudo, tal apenas será possível para aqueles que não se tenham “amarrado” à âncora de uma habitação própria, de um empréstimo e de uma hipoteca. Embora não totalmente apreendidas, por muitas décadas de convivência com um mercado habitacional distorcido por regras impostas pelo poder político, as vantagens do arrendamento sobre a aquisição, sobretudo para as camadas mais jovens da população na entrada para o mercado de trabalho, serão também elas, sem dúvida, sobretudo no médio longo prazo, um dos fatores de maior peso a considerar numa tendência crescente da procura no mercado de arrendamento. Neste âmbito, de realçar também pelo seu significado, alguns dos objetivos delineados no acordo de entendimento celebrado entre o Estado Português e a Troika, que no seu ponto 6 – Mercado de Habitação, prevê, por um lado, medidas tendentes a quase eliminar os isentivos fiscais à aquisição da própria habitação, e, por outro, a flexibilizar a legislação sobre arrendamento urbano, medidas às quais não é certamente alheio o elevado nível de endividamento a que as famílias chegaram e cuja tendência se pretende agora inverter e que passamos a referir: – A revisão e flexibilização da legislação que suporta o Regime do Arrendamento Urbano; – A redução dos incentivos ao endividamento das famílias; – Redução dos limites de dedução à coleta referentes a juros de empréstimos para habitação; – Eliminação da dedução de encargos com amortizações de capital com efeitos a 1 de Janeiro de 2012; – A redução considerável dos períodos de isenção de IMI na aquisição de habitação própria e permanente; – Agravamento dos custos fiscais de prédios devolutos ou não arrendados; – O nivelamento dos incentivos ao arrendamento com os da aquisição de habitação própria; – A simplificação dos procedimentos administrativos inerentes à reabilitação urbana.

CONCLUSÃO O estudo do mercado da habitação em Portugal no passado recente permite-nos perceber as causas que levaram a uma distorção do equilíbrio entre o número de proprietários e de arrendatários, distorção essa que resultou primordialmente de medidas que levaram ao congelamento das rendas, primeiro nas cidades de Lisboa e do Porto no final da década de 40 do século passado como consequência direta da Segunda Grande Guerra Mundial que devastou a Europa entre

Em nossa opinião o período de baixas taxas de juro acompanhado por uma maior agressividade da generalidade dos bancos na oferta de crédito à habitação com redução das suas margens de lucro, e a influência destes fatores no valor médio das prestações pelos empréstimos hipotecários para aquisição de habitação própria, vieram permitir que os promotores imobiliários, tomando em conta estes dados, passassem a definir o nível de preços de venda das habitações em função da capacidade de endividamento das famílias, isto é, do valor até ao qual as famílias poderiam suportar a prestação do empréstimo bancário.

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1939 e 1945, efeito esse, que no período revolucionário que se sucedeu após 25 de Abril de 1974, se estendeu ao resto do país. Na realidade, o Estado, por via destas medidas, vem ao longo de já muitas décadas atribuindo à generalidade das famílias portuguesas titulares de contratos de arrendamento do denominado tipo “vinculístico” 15 sem distinção do respectivo nível de rendimentos, e à custa do património dos respectivos senhorios, um verdadeiro subsídio de renda que resulta da conjugação de dois fenómenos, por um lado a imposição da renovação automática dos referidos contratos de arrendamento, independentemente do prazo convencionado pelas partes16 e, por outro, pelo já mencionado congelamento das rendas, este último, que, em virtude de períodos alargados de elevadas taxas de inflação ocorridos no passado, veio originar um acelerado processo de desfasamento progressivo entre o valor normal de mercado para uma renda de um determinado imóvel, e o valor efetivamente pago pelo arrendatário, do que veio a resultar a incapacidade financeira por parte dos respectivos proprietários para a manutenção dos imóveis, o que teve como consequência direta a visível atual degradação a que chegou o parque habitacional nas zonas históricas das principais cidades. Os factos referidos, desmotivadores do investimento no mercado de arrendamento, associado à promoção de medidas incentivadoras da concessão de crédito para aquisição de habitação própria, bem como um conjunto de incentivos fiscais, vieram originar um crescimento acentuado da opção por “adquirir em vez de arrendar”. Esta opção, que como acima mencionado, veio contribuir para uma verdadeira massificação da habitação própria em Portugal, está já a sofrer uma inflexão de sentido contrário decorrente de alterações profundas no sistema financeiro, através de uma forte restrição à concessão de crédito em todos os setores ligados à habitação, desde a construção à aquisição e, por outro lado, na opção por parte dos promotores imobiliários, em colocarem no mercado de arrendamento habitações cujo destino inicial seria o da venda, o que, pelo aumento da oferta, irá tendencialmente criar um equilíbrio de mercado no sentido do ajustamento do valor das rendas e, por último, pela alteração de paradigma no mercado de emprego face ao que, a capacidade de mobilidade passou a ser não só uma vantagem competitiva, mas uma verdadeira necessidade. Como pudemos constatar, o enquadramento histórico temporal caracterizado por uma acelerada desvalorização da moeda e acentuada especulação imobiliária, que condicionou num determinado sentido o espírito do legislador de então, sofreu profundas alterações sobretudo desde os anos que antecederam a adesão de Portugal à moeda única Europeia e, mais recentemente, desde o estalar da crise financeira, económica e social em 2008 cujo auge é ainda imprevisível no momento em que escrevemos estas linhas. Assim assistimos no tempo presente a um mercado de habitação depressivo, com sérias dificuldades de financiamento, e, em consequência, a um decréscimo generalizado e progressivo dos preços dos imóveis. Em virtude de tudo o exposto, poderemos então esquematizar os argumentos nos quais nos baseamos para sustentar a defesa de uma alteração de paradigma no mercado da habitação, nos termos seguintes: 1. Ponto de partida: – Os empregos eram seguros, estáveis e para toda a vida (a taxa de desemprego em Portugal era historicamente baixa). – Ao longo de décadas pelos motivos longamente expostos o mercado de arrendamento foi quase desprezado e consequentemente desaparecendo. – Com a redução das taxas de juro, a prestação do empréstimo para habitação passou a ser semelhante ao valor de uma renda. – O investimento com aquisição da própria habitação era tido como seguro, as habitações valorizavam-se sempre.

15  Pinto Furtado, Jorge Henrique da Cruz, pag.184, Manual de Arrendamento Urbano, Volume I, 4.ª Edição, 2007, Edições Almedina SA. 16  A Lei 31/2012 de 14 de Agosto vem introduzir alterações significativas a este nível, prevendo-se um período de transição (ou de salvaguarda para os inquilinos) pelo prazo de 5 anos, após o que os contratos do chamado tipo vinculístico poderão transitar para o NRAU (Novo Regime do Arrendamento Urbano).

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– Mesmo que o encargo inicial fosse um pouco elevado, com os aumentos anuais dos salários assumidos como naturais, o seu peso no orçamento familiar ia-se diluindo. – Os bancos emprestavam a quase toda a gente muitas vezes acima do valor das próprias habitações, guerreavam-se para captar empréstimos uns dos outros, descurando muitas vezes elementares regras de análise de risco de crédito. – Os elevados custos iniciais com os empréstimos à habitação (comissões bancárias, avaliação, IMT, escritura, registo), eram diluídos ao longo da vida dos empréstimos os quais tinham uma duração da ordem dos 30 anos. – O Estado seguia uma política de incentivos fiscais à aquisição de habitação própria. – A legislação sobre o arrendamento era pouco flexível e a proteção dos senhorios no caso de arrendatários incumpridores era reduzida. 2. Ponto de chegada: – Ausência de emprego estável e elevadas taxas de desemprego. – A capacidade de mobilidade constante passa a ser uma necessidade na busca de emprego. – A capacidade de endividamento das famílias decresce abruptamente. – O risco de crédito associado aos empréstimos, sobretudo de longa duração dispara. – Os bancos restringem o crédito, tornam-se muito seletivos e exigem garantias acrescidas, nomeadamente através de uma redução significativa da relação entre o valor do imóvel e o capital mutuado, e as margens dos bancos aumentam. – A evolução do valor do imobiliário é uma incógnita e deixa de se considerar garantida a valorização das habitações adquiridas. – As construtoras colocam no mercado de arrendamento habitações que anteriormente se destinavam a venda, contribuindo para uma maior oferta no sector e para o seu equilíbrio. – O mercado imobiliário perde a sua liquidez do passado. A confrontação com a necessidade de vender a habitação passa a ser um pesadelo. – Parte significativa das habitações desvalorizam-se e muitas das vezes o seu valor não chega para cobrir a dívida ao banco. – A aquisição da própria habitação que representa uma ancoragem a uma habitação, a um local, a um empréstimo e a uma hipoteca, passam a ser um entrave à necessidade de mobilidade imposta pelo mercado de trabalho. – Os incentivos fiscais à aquisição de habitação tendem a reduzir-se significativamente. – A legislação sobre arrendamento torna-se mais flexível e existe a previsão de maior proteção aos senhorios em caso de incumprimento pelos arrendatários. 3. Opções: 3.1 Para quem procura habitação: a) Opção por aquisição: – Dificuldade em obter financiamento, que é mais caro e com exigência de mais garantias. – Perspetiva de valorização do imóvel é incerta. – Reduzida liquidez no mercado dificulta venda em caso de necessidade. – Empréstimos para habitação apenas fazem sentido numa perspetiva de longo prazo, para diluição dos elevados custos iniciais, mas por outro lado, o longo prazo é incompatível com o mercado de trabalho atual. – Mercado de trabalho é incerto e incompatível com entraves à capacidade de mobilidade.

Não deveremos considerar, em face da realidade atual e da denominada precariedade do emprego ser a mobilidade uma vantagem competitiva no mercado de trabalho? Provavelmente, um número significativo das famílias que neste momento optam por arrendar, em alternativa a adquirir, ainda não terão esta perceção.

b) Opção por arrendamento: – Mercado tenderá para equilíbrio entre oferta e procura que implica normalização de preços das rendas com redução das mesmas. – Disponibilidade para mobilidade sempre que o mercado de trabalho ou a dimensão do agregado familiar o imponham sem risco de perdas potenciais. – Inexistência de elevado investimento inicial na aquisição de habitação. – Incentivos fiscais com tendência a uniformização na opção de aquisição de habitação própria. – Flexibilidade na contratação do arrendamento em conformidade com as necessidades das partes.

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3.2 Na perspetiva dos investidores: – Reduzida rentabilidade das aplicações financeiras sem risco. – Sensação de insegurança em manter dinheiro nos bancos. – Baixa generalizada dos preços no mercado imobiliário. – Possibilidade de obtenção de maior rentabilidade e com menor risco do que em aplicações financeiras. – Tendência para aumento da procura no mercado de arrendamento. – Flexibilidade na legislação que permite contratação do arrendamento em conformidade com as necessidades das partes. – Previsibilidade de maior proteção em caso de incumprimento pelos arrendatários. Em face do exposto defendemos que no momento presente nos encontramos perante uma nova realidade, uma verdadeira mudança de paradigma claramente já instalada no mercado de habitação, em que, contrariamente ao que se tem verificado sobretudo nos últimos 30 anos (mais do que uma geração), a opção pelo arrendamento em detrimento da aquisição da própria habitação é já uma realidade.

Artigo escrito segundo o novo acordo ortográfico.

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SIMULAÇÃO, EVASÃO FISCAL, PLANEAMENTO FISCAL E CLÁUSULAS ANTI-ABUSO MANUEL DE ALMEIDA Solicitador

PREÂMBULO

A

satisfação das necessidades coletivas leva o Estado a, de forma ativa, procurar recursos para financiar a demanda de fundos para suportar os encargos públicos1. Os impostos, apesar de não serem a única fonte de receitas estatais, são o principal tipo de receitas públicas que suportam a actividade financeira do Estado. O imposto é uma singular ferramenta de política económica e de política social, pois permite a adoção de medidas deflacionarias, de proteção a indústrias nacionais, de incentivos fiscais, bem como de produzir o efeito de redistribuição da riqueza, entre muitos outros. A evasão e fraude fiscal continuam a ser um grave problema de ordem tributária nos nossos dias, apesar do progresso técnico-científico na vida económica e da fiscalidade. A luta contra esta conjuntura requer uma ação dirigida e forte nos planos legislativos, administrativos e doutrinários. Este é um problema que envolve toda a sociedade, pelo que todos os indivíduos devem estar informados e conscientes das consequências da evasão e fraude fiscais, não só em termos sociais pela diminuição das receitas e, consequentemente, dos recursos públicos disponíveis, mas também das consequências individuais para os cidadãos devido ao não cumprimento do dever de declarar a totalidade dos seus rendimentos e pagar os respetivos impostos. Em termos práticos e funcionais, os comportamentos fiscalmente evasivos e fraudulentos alimentam as chamadas economias paralelas, desregulam os mercados, dificultando a construção do estado Social de Direito, impedindo a diminuição do défice e da dívida pública. 1

CARDOSO DA COSTA, JOSÉ MANUEL – “Curso de Direito Fiscal”, 2.ª ed., Coimbra, 1972, pp. 172 e ss.

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Perante este facto, pretendemos abordar: a simulação dos negócios jurídicos no contexto da evasão fiscal, bem como os seus efeitos fiscais; distinguir entre evasão fiscal e planeamento fiscal; e fazer uma leve abordagem geral das cláusulas anti-abuso. O DEVER DE CONTRIBUIR E O PODER DE TRIBUTAR O dever de contribuir é, segundo Pereira Marques2 um dever inato, decorrente da qualidade de ser social3. Possuidor de uma dupla faceta, consubstancia-se no dever de proporcionar ao Estado os meios de apuramento, determinação e controlo do montante do tributo, por um lado e por outro, o direito de iniciativa de apuramento desse mesmo montante, partindo da lei, dos factos e da presunção de verdade da respetiva declaração do contribuinte. O n.º 2 do artigo 31.º da LGT, prevê como obrigações acessórias dos contribuintes a de apresentação de declarações e a de exibição da contabilidade ou escrita (artigo 17.º n.º 3 do CIRC). Sendo assim, o procedimento de liquidação do imposto é instituído, por iniciativa do contribuinte, com base nas respetivas declarações, apresentadas nos prazos legalmente fixados para o efeito – Artigo 16.º do CIRC, artigos 57.º e 58.º do CIRS, 59.º/1 do CPPT. No entanto, a actual constituição deixa de fora uma norma como a do artigo 28.º da CRP de 1933 e posteriores4, limitando-se a consagrar, no artigo 103.º os fins visados pelo sistema fiscal e o princípio de reserva legal5; e no artigo 104.º6 a enumerar os objectos dos impostos (rendimento, património e consumo), bem como, afirmar como propósito do imposto sobre o rendimento pessoal “a diminuição das desigualdades” e a “repartição justa dos rendimentos e da riqueza”7 em outras disposições, a menção dos impostos como objecto da ordem jurídica e da ordem política (Martins, 2006; CRP, 2005). De salientar, a referência à tributação do consumo (n.º 4 do artigo 104.º da CRP), tendo como objectivo “adaptar a estrutura do consumo à evolução das necessidades do desenvolvimento económico e da justiça social, devendo onerar os consumos de luxo”. De acordo com Martins8 e Pereira Marques9 é dever fundamental de todos os membros da comunidade, que constitui o estado, contribuírem, na medida da sua capacidade contributiva10, para suportarem os custos financeiros devidos das tarefas do estado, o que pressupõe a opção por um estado fiscal, sendo o pagamento de impostos o preço a pagar pela manutenção da liberdade ou de uma sociedade dita civilizada. A Administração Fiscal tem assim duas opções: Ou considera como verdadeira a informação prestada pelo contribuinte que se limita a liquidar o imposto que lhe é devido em função das declarações prestadas; Ou reage contra a presunção de verdade estabelecida, procurando encontrar vícios que possam lesar o estado em termos da receita tributária. Assim, não procedendo o contribuinte em conformidade, ou encontrando-se as declarações prestadas viciadas por qualquer forma, ou tomando a administração fiscal conhecimento de factos não declarados pelo contribuinte, o procedimento tributário é instaurado com base em todos os elementos de que dispuser a entidade competente para a liquidação. A Administração Fiscal 2  PEREIRA MARQUES, SARA RAQUEL - “A fraude fiscal e a simulação”. III Curso de Pós-Graduação em Direito Fiscal. Faculdade de Direito da Universidade do Porto. 2007. p. 3. 3  MARTINS, ANTÓNIO CARVALHO - “Simulação na Lei Geral Tributária e Pressuposto do Tributo: Em contexto de Fraude, Evasão e Planeamento Fiscal”. Coimbra Editora. 2006. p. 32 4  Na Constituição de 1822, no seu artigo 19.º; no § 14 do artigo 145.º da Carta Constitucional de 1826; no artigo 24.º da Constituição de 1838; e na Constituição de 1933, no artigo 28.º. Na generalidade, estabelecia-se que “todos os cidadãos eram obrigados a contribuir para a satisfação dos encargos públicos conforme os seus haveres”; a redacção só diferia na Constituição de 1838, em que, em vez da norma afirmativa da obrigação, se usava a forma negativa de “ninguém é isento de contribuir…” 5  “O sistema fiscal visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades públicas e uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza.”, N.º 1 do art. 103.º da CRP. 6  MARTINS, ob. cit., p. 46 “O artigo 104.º da CRP, ao mencionar e regular expressamente as espécies de tributação – certamente por serem as mais importantes sob o ponto de vista jurídico-constitucional - , a Constituição não exclui obviamente a existência de outros impostos além dos mencionados, desde que criados de acordo com os requisitos constitucionais.” 7  MARTINS, ob. cit., p. 47. 8  MARTINS, ob. cit., p. 50. 9  PEREIRA MARQUES, ob. cit., pp. 2 e 5. 10  “O imposto sobre o rendimento pessoal será único e progressivo, tendo em conta as necessidades e os rendimentos do agregado familiar.”, n.º 1 do art. 104.º do CRP.

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tem, então, uma função de controlo do cumprimento das obrigações tributárias que legalmente recaiam sobre o contribuinte, nomeadamente, como refere Pereira Marques11, no que diz respeito ao apuramento dos factos tributários.

SIMULAÇÃO De acordo com Martins12, e com intuito de enganar terceiros, de os iludir, de fazer com que aceitem a aparência como se fosse realidade, as partes declaram livre e conscientemente, que querem uma coisa que realmente não querem. Assim, a simulação13 é um caso de divergência intencional entre a vontade e a declaração. O art. 240.º do CC determina que “Se, por acordo entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante, o negócio diz-se simulado”. Assim, estatui que o negócio será considerado nulo14. Desta forma, o conceito de simulação15, de acordo com Martins16 pressupõe três requisitos: 1 – Divergência entre a vontade real e declarada; 2 – Intuito de enganar terceiros; e, 3 – Acordo simulatório. No entanto, a lei distingue entre simulação absoluta e relativa. Desta forma, o art. 241.º do CC sob a epígrafe “simulação relativa17” estabelece que “Quando sob o negócio simulado exista um outro que as partes quiseram realizar, é aplicável a este o regime que lhe corresponderia se fosse concluído sem dissimulação, não sendo a sua validade prejudicada pela nulidade do negócio simulado”. Porém, considera que se o negócio dissimulado for de natureza formal, este é considerado válido desde que, e só se, tiver sido observada a forma exigida por lei. A simulação relativa dá-se quando as partes pretendem realizar, e de facto realizam, um contrato, mas para iludir terceiros o ocultam, o encobrem, com um contrato diverso pela sua função e natureza, ou divergente em algum aspecto essencial. Por outro lado, a simulação absoluta existe quando na aparência se celebra um contrato, mas na realidade nenhum contrato se quer. Enquanto o negócio simulado é sempre nulo (artigo 240.º, n.º 2 CC), o negócio dissimulado fica sujeito a uma valoração jurídica autónoma, destinada a verificar se os requisitos legais de validade para o negócio em causa foram ou não observados com a celebração do negócio simulado. Assim, se os requisitos legais de validade houverem sido cumpridos, o negócio dissimulado é válido; se não foram, o negócio será nulo ou anulável, conforme o vício que estiver em causa. Um aspecto muito importante a ter em conta é que o vício de simulação pode ser invocado e oficiosamente declarado por qualquer interessado. Podendo inclusive ser arguido pelos próprios

(…) é dever fundamental de todos contribuírem para suportarem os custos financeiros devidos das tarefas do estado (…)

PEREIRA MARQUES, ob. cit., p. 3. MARTINS, ob. cit., p. 57. 13  Para mais desenvolvimentos sobre simulação vide:PEREIRA MARQUES, ob. cit.; GOMES, NUNO SÁ “Evasão Fiscal, Infracção Fiscal e Processo Penal Fiscal. 2.ª edição revista, actualizada e ampliada com Adenda sobre “A Infracção Fiscal na LGT” e “Breve apreciação do Anteprojecto do Regime Geral das Infracções Tributárias”. Lisboa: Rei dos Livros. 2000; ANTUNES, FRANCISCO VAZ – “A Evasão Fiscal e o Crime de Fraude Fiscal no Sistema Legal Português”. Verbo Jurídico, Julho de 2005; SANTOS, BELEZA DOS, “A simulação em Direito Civil”, Vol. I.; POMBO, NUNO, “A fraude fiscal. A Norma Incriminadora, A Simulação e outras reflexões”. Edições Almedina, 2007; FERNADES SILVA, AMÂNDIO, “O direito dos contribuintes ao planeamento fiscal. Fiscalidade.” TOC 104 - Novembro 2008: pp. 43-45 e MARTINS, ob. cit.. 14  A simples simulação do preço não é suficiente para tornar nulo o negócio. Declarada a nulidade do acto simulado, que é somente a declaração respeitante ao preço, e não às demais cláusulas do contrato de compra e venda, o contrato vale com o preço realmente pactuado, ficando a competente repartição das finanças habilitada a instaurar o processo de transgressão pela fraude fiscal (RLJ, 100.º-181 a 183. NETO, ABÍLIO,“Código Civil Anotado”. 17.ª edição revista e actualizada. Ediforum. Abril 2010.. 15  A simulação, como forma de fraude fiscal, está prevista e punida no artigo 23.º do RJIFNA. NETO, ob. cit.,. 16  MARTINS, ob. cit., p. 58. 17  A simulação relativa, só fica demonstrada se ficarem provados cumulativamente os três requisitos da simulação do n.º 1 do art.º 240 do CC e ainda, a existência de negócio dissimulado. NETO, ob. cit.,. 11  12

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simuladores (artigo 242.º do CC), por meio de ação ou por via de exceção, e a todo o tempo pode ser invocado, não podendo ser sanado por confirmação da declaração18.

SIMULAÇÃO FISCAL Particular importância assume a simulação fiscal. O conceito de simulação fiscal implica a ocorrência de dois requisitos em simultâneo: a simulação do ato ou contrato e a obtenção por essa via de benefício económico sob a forma de redução do montante da prestação tributária a pagar relativamente aquele que resultaria da vontade real das partes19 Esta figura encontra-se muito próxima da simulação civilística. Elencada no artigo 240.º do Código Civil, que a define como sendo o acordo entre o declarante e o declaratário pelo qual, no intuito de enganar terceiros, se verifica uma divergência entre a vontade implícita na declaração negocial e a vontade real do declarante.20 A simulação pode assim ser relativa e absoluta. A simulação pode ser relativa quando as partes celebraram um determinado contrato, mas na realidade tinham a intenção de celebrar um contrato diferente. Quanto à simulação absoluta, as partes quando celebraram um qualquer negócio jurídico, não pretendiam na realidade celebrar negócio nenhum.

A SIMULAÇÃO DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS E OS EFEITOS FISCAIS De entre os exemplos mais comuns de negócios que sofrem mais frequentemente do vício de simulação fiscal, podemos destacar21: – A celebração de um contrato de compra e venda, quando na realidade as partes pretendem celebrar um contracto de doação; – Declaração no contrato de mútuo da inexistência de juro ou de um juro inferior ao que estipularam; – Constituição simulada de uma sociedade cooperativa, por forma a beneficiar do seu regime fiscal mais favorável; – Reconhecimento simulado de uma divida com o objectivo de ocultar uma doação. A simulação de negócios jurídicos serve o propósito das partes de enganar a Administração Fiscal e, assim, não sofrerem o respetivo imposto ou sofrerem um imposto mais reduzido, criando a aparência de um negócio, menos tributado, quando na realidade pretendem a realização de um outro negócio (Castro, 2007). Assim, segundo Courinha22 “… o negócio simulado será menos oneroso do que o negócio dissimulado. (…) o regime da simulação pretende atingir a realidade que se esconde por detrás da aparência, enquanto a “cláusula geral anti-abuso” visa analisar a própria realidade, uma vez verificados certos pressupostos…”. Na opinião de Francisco Vaz23, a “… simulação fiscal (…) consiste na divergência dolosa entre a vontade real e a vontade declarada pelos contraentes de um negócio jurídico, com o intuito de levar a administração fiscal a liquidar menos ou nenhum imposto.” Desta forma, o contribuinte infringe normas tributárias e engana dolosamente a Administração Fiscal. 18  A possibilidade de invocação pelos simuladores sofre da restrição indirecta do n.º 2 do art.º 342.º. Assim, é ela praticamente restringida à prova documental e à confissão, pois não é admissível a prova por presunções, nem a testemunhal e poucos ensejos terão a prova pericial ou por inspecção (Mota Pinto, Teoria Geral, 1967, 204. NETO, Abílio. Código Civil Anotado. 17.ª edição revista e actualizada. Ediforum. Abril 2010 19  MARTINS, ob. cit., p. 60. 20  PEREIRA MARQUES, ob. cit., pp. 12 e 13. 21  MARTINS, ob. cit., pp. 60 e 61. 22  CCOURINHA, GUSTAVO LOPES, “A cláusula geral anti-abuso no direito tributário. Contributos para a sua compreensão”. Coimbra, Almedina, 2004, pp. 84 e 85. No mesmo sentido CASTRO, ALEXANDRA. “Combate à evasão fiscal”. III Curso de Pós-Graduação em Direito Fiscal. Faculdade de Direito da Universidade do Porto. 2007. 23  ANTUNES, ob. cit., p. 15.

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De acordo com Torres24, a aplicação das regras da simulação pode ter reduzido alcance prático, uma vez que “O próprio conceito de simulação contém uma exigente formulação, não se bastando nem com a simples divergência entre a vontade e a declaração, nem com o pacto simulatório entre declarante e declaratário, mas exigindo ainda a intenção fraudulenta, lesiva do Fisco”. Apesar de os negócios jurídicos simulados, serem considerados nulos pelo Direito civil, este não produzem efeitos fiscais enquanto tal. O n.º 1 do artigo 39.º da LGT prevê a simulação relativa, estatuindo que, “Em caso de simulação de negócio jurídico, a tributação recai sobre o negócio jurídico real e não sobre o negócio jurídico simulado”. No entanto, para que isto ocorra é necessário que seja legalmente declarada a nulidade do negócio jurídico. Assim sendo, a nulidade afecta apenas o negócio simulado, desde que se encontrem preenchidos os requisitos da validade do negócio dissimulado. Todavia, a tributação do negócio jurídico real constante de documento autêntico depende de decisão judicial que declare a sua nulidade, sem prejuízo dos poderes de correção da matéria tributável legalmente atribuídos à administração tributária. Este pressuposto decorre do n.º 2 do artigo 39.º da LGT, onde pode ler-se “Sem prejuízo dos poderes de correcção da matéria tributável legalmente atribuídos à administração tributária, a tributação do negócio jurídico real constante de documento autêntico depende de decisão judicial que declare a sua nulidade”. Perante um negócio fiscalmente menos oneroso podemos estar perante um negócio jurídico celebrado com o único fim de enganosamente e deliberadamente prejudicar a administração tributária. Como exemplo de tal facto temos; um contrato de compra e venda celebrado, quando na verdade pretendem celebrar uma doação25. Por outro lado, a simulação não deve ser confundida com negócios celebrados em termos de prevenção fiscal ou negócios menos onerosos26. Isto é, quando não existe divergência entre a vontade real e a declarada relativamente ao negócio celebrado, pois as partes querem o negócio e os seus efeitos, mas optam por uma, entre várias vias jurídicas, que conduza a uma menor tributação.

NEGÓCIOS INDIRETOS A celebração de negócios jurídicos, fiscalmente menos onerosos, em que não se verifica qualquer simulação, enquadra-se na figura do negócio indireto, i. e., no negócio a que as partes recorrem para com a intenção de evitar a aplicação de regime tributário mais oneroso, correspondente à directa realização daqueles mesmos fins. Trata-se de um negócio jurídico verdadeiro, em que não há qualquer contradição entre a vontade real das partes e a vontade declarada, uma vez que pretendem celebrar o negócio jurídico indireto (lícito) e obter a correspondente poupança fiscal27. Contudo, para alguns autores, os negócios fiscalmente menos onerosos são casos de simulação fiscal, desde que praticados com o fim de afastar, total ou parcialmente, ou retardar, a tributação. De acordo com Leite de Campos28, são negócios indiretos aqueles em que as partes utilizam um tipo negocial legal para prosseguir um fim que não é típico desse negócio, mas que pode ser alcançado através dele. “No negócio indireto há uma diferença entre o fim típico e o fim indirecto que é efectivamente prosseguido”. É o caso, por exemplo, da fusão de duas sociedades por incorporação, com vista a evitar uma dupla transmissão de bens sujeita a imposto. Assim, as partes realizam um ato ou conjunto de atos, correspondentes à sua vontade real (logo, não simulados) de forma a obterem um resultado económico equivalente a outro ato ou atos que a lei fiscal tribute de forma menos favorável. Tal negócio é, portanto, praticado com um fim estritamente fiscal, no sentido de que se não fossem as consequências tributárias as partes teriam recorrido a outro negócio que mais directamente e adequadamente permitiria atingir os fins pretendidos29.

A simulação de negócios jurídicos serve o propósito das partes de enganar a Administração Fiscal e, assim, não sofrerem o respetivo imposto (…)

TORRES, MANUEL ANSELMO. “A Simulação Fiscal na Lei Geral Tributária”, Separata da Revista da Banca, n.º47, Janeiro/Junho. 1999. p. 85. 25  PEREIRA MARQUES, ob. cit., p. 12. 26  MARTINS, ob. cit., pp. 60-62. 27  GOMES, NUNO SÁ. “As garantias dos contribuintes: algumas questões em aberto”. Ciência e Técnica Fiscal, n.º 371. 1993. 28  LEITE DE CAMPOS, DIOGO. “Cláusula Geral Anti-Abuso e Fraude Fiscal”. Nota Informativa: Questões Fiscais da Globalização – III. De 21 de Junho de 2007. 29  MARTINS, ob. cit., pp. 64 e 65. 24

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EVASÃO FISCAL VERSUS PLANEAMENTO FISCAL A evasão e a fraude fiscais constituem um dos mais graves problemas da ordem tributária. A complexidade da lei fiscal não permite que a administração fiscal fiscalize devidamente os atos tributários, potenciando os fenómenos de evasão, dado que a maioria dos contribuintes procuram aproveitar este aspeto para aumentar o seu rendimento disponível30. Segundo Martins31, entende-se por evasão fiscal ”todos os procedimentos de fuga consciente e intencional, tendo por objectivo evitar a assunção de obrigações tributárias individuais efetivamente existentes, ou ocultar ou alterar os elementos que as determinam ou as constituem “. No entanto, a lei nacional não define nenhum conceito geral de evasão, tendo-se limitado a estabelecer dois grandes grupos de infrações evasivas do dever e obrigação tributária: o das contraordenações fiscais, e o dos crimes fiscais (artigo 2.º do RGIT). Só sendo considerados crimes fiscais as evasões que contivessem procedimentos evasivos passíveis de ser qualificados como fraude fiscal. Segundo o Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho32, artigo 103.º, “constituem fraude fiscal, punível com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias, as condutas ilegítimas tipificadas no presente artigo que visem a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária ou a obtenção indevida de benefícios fiscais, reembolsos ou outras vantagens patrimoniais suscetíveis de causarem diminuição das receitas tributárias”. Ainda de acordo com a mesma Lei, a fraude fiscal pode ter lugar por diversas razões, tais como: a) Ocultação ou alteração de factos ou valores que devam constar dos livros de contabilidade ou escrituração, ou das declarações apresentadas ou prestadas a fim de que a administração fiscal especificamente fiscalize, determine, avalie ou controle a matéria coletável; b) Ocultação de factos ou valores não declarados e que devam ser revelados à administração tributária; c) Celebração de negócio simulado, quer quanto ao valor, quer quanto à natureza, quer por interposição, omissão ou substituição de pessoas. De acordo com Leite de Campos33, só se pode considerar a hipótese de crime fiscal depois de o conteúdo do negócio passar pelos seguintes crivos: a) A existência de atos e negócios juridicamente válidos e dotados de racionalidade económica que se mantêm; b) A requalificação da matéria de facto; c) A invalidade ou ineficácia dos atos ou negócios celebrados; d) A existência de atos ou negócios praticados ou celebrados, sem racionalidade económica própria, e só, ou preponderantemente, com o fim de diminuir a carga fiscal. Segundo Gomes34, os agentes económicos devem e tendem a minimizar os custos das suas empresas, nomeadamente os custos fiscais. Contudo, esta minimização fiscal, que a doutrina designa por poupança fiscal, deve, obviamente, regular-se pelo estrito e rigoroso cumprimento das leis tributárias. Relativamente à definição de planeamento fiscal, Fernandes Silva35, defende que a maioria dos autores tenta limitá-lo às atuações legítimas e lícitas de redução do encargo fiscal, demarcando deste conceito as situações que configuram um ato ilegal ou de evasão fiscal. Afirma, assim, que “o planeamento fiscal é o conjunto de atos que, no respeito pela lei, visam reduzir ou minimizar a carga fiscal do contribuinte. Neste sentido, o planeamento fiscal não se conPEREIRA MARQUES, ob. cit., p. 2. MARTINS, ob. cit., pp. 15 e 16. 32  A lei n.º 15/2001, de 5 de junho, estabeleceu o “Regime Geral das Infrações Tributárias” em que abrangeu os regimes das infrações aduaneiras e das infrações fiscais não aduaneiras. Mas manteve a dualidade de crimes e contra ordenações. O Decreto-Lei n.º 20-A/90 foi revogado. 33  LEITE DE CAMPOS, ob. cit. 34  Para maiores desenvolvimentos sobre esta matéria vide: GOMES, NUNO SÁ. “Evasão Fiscal, Infracção Fiscal e Processo Penal Fiscal. 2.ª edição revista, actualizada e ampliada com Adenda sobre “A Infracção Fiscal na LGT” e “Breve apreciação do Anteprojecto do Regime Geral das Infracções Tributárias.” Lisboa: Rei dos Livros. 2000, pp. 18 e 19. 35  FERNADES SILVA, AMANDIO. “O direito dos contribuintes ao planeamento fiscal”. Fiscalidade. TOC 104, Novembro 2008, p. 43.. 30  31

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funde com a evasão fiscal em que a redução da carga fiscal é conseguida mediante atos ilícitos (falsificação da contabilidade, faturas falsas, apropriação de impostos, etc.)”. À contrária, o planeamento fiscal ilegítimo consiste em qualquer comportamento de redução indevida, por contrariar princípios ou regras do ordenamento jurídico-tributário, das onerações fiscais de um determinado sujeito passivo. As posições defendidas por este autor alicerçam-se nas proferidas por Germano Marques da Silva, que considera o planeamento fiscal como a ordenação dos atos do contribuinte em conformidade com a lei tributária, de forma a conduzir ao não pagamento, ao menor pagamento ou ao pagamento mais distante; no pressuposto do respeito da lei e, por isso, não se verificando qualquer ilegalidade. Desta forma, para o referido autor, tal conduta não é passível de ser confundida com a sonegação fiscal que consiste em procedimento fraudulento capaz de iludir o fisco para desobrigar o contribuinte ao pagamento do imposto devido. Aliás, pode ocorrer noutros termos, mediante negócios jurídicos não previstos nas normas de incidência fiscal ou mediante práticas contabilísticas permitidas e mais favoráveis aos contribuintes. Posição semelhante é defendida por Saldanha Sanches36 (2006), citado por Fernandes Silva (2008): “O planeamento fiscal (legitimo) consiste numa técnica de redução da carga fiscal pela qual o sujeito passivo renúncia a um certo comportamento por este estar ligado a uma obrigação tributária ou escolhe, entre as várias soluções que lhe são proporcionadas pelo ordenamento jurídico, aquela que, por ação intencional ou omissão do legislador fiscal, está acompanhada de menos encargos fiscais. O planeamento fiscal ilegítimo consiste em qualquer comportamento de redução indevida, por contrariar princípios ou regras do ordenamento jurídico-tributário, das ordenações fiscais de um determinado sujeito passivo.” De acordo com Fernandes Silva37, o problema coloca-se quando o legislador pretende combater a denominada elisão fiscal abusiva que se traduz na prática de atos lícitos cujo resultado não é aceite pela nossa ordem jurídica, por se encontrarem em contradição com os princípios que alicerçam o nosso sistema fiscal. Acrescenta ainda, que apesar de neste caso, os atos e práticas dos contribuintes serem legais, a administração fiscal pode considerar estes comportamentos concretos ilegítimos na medida em que os mesmos visem apenas obter a eliminação ou redução dos impostos a pagar. No sentido de restringir esta prática, o Estado adotou medidas anti-abuso.

(…) o planeamento fiscal não se confunde com a evasão fiscal (…)

EVASÃO FISCAL E A FRAUDE FISCAL Há que distinguir se um determinado comportamento é ou não um ilícito fiscal. Ou seja, como refere Pereira Marques38 saber se determinado comportamento com vista a evitar a ocorrência de facto que possa resultar no preenchimento da previsão de uma norma de incidência, evitando, assim, as decorrências fiscais impostas pelo preceito é ou não um ilícito fiscal . Ora, quando nos referimos a evasão fiscal estaremos mais próximos do chamado “planeamento fiscal”. Ou seja, o contribuinte, com vista a evitar a obrigação fiscal, ou apenas diminuir o montante do tributo a pagar, socorre-se de operações que não se encontram legalmente previstas e que lhe permitem realizar uma poupança fiscal39. Por outro lado, quando nos referimos a fraude fiscal, estamos perante uma intensão clara, direta e intencional de enganar o fisco, desrespeitando o nosso sistema legal. Ou seja, o contribuinte com a realização de certos atos ou negócios jurídicos pretende obter, essencialmente, duas coisas: Fugir ao pagamento do tributo e a obtenção de proveitos fiscais.

36  SALDANHA SANCHES, JOSÉ LUÍS. “Os Limites do Planeamento Fiscal, Substância e Forma no Direito Fiscal Português, Comunitário e Internacional.” Coimbra Editora, 2006, p. 21. 37  FERNADES SILVA, ob. cit., p. 43. 38  PEREIRA MARQUES, ob. cit., p. 6 39  Não podemos nunca deixar de salientar que estes comportamentos evasivos são permitidos pelo princípio da tipicidade taxativa das normas tributárias, que não deixa margem para a sua aplicação analógica.

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CLÁUSULAS ANTI-ABUSO Com a integração de cláusulas anti-abuso na nossa ordem jurídica, a administração fiscal pode, se devidamente comprovado e justificado, desconsiderar as figuras jurídicas utilizadas pelos contribuintes e tributar de acordo com realidade económica subjacente40 (Fernandes Silva, 2008). A denominada norma geral anti-abuso no direito fiscal português , (n.º 2 do artigo 38.º, da LGT, com a sua nova redação na Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro)41 estabelece que são ineficazes no âmbito tributário os atos ou negócios jurídicos essencial ou principalmente dirigidos por meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso de formas jurídicas, à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em resultado de factos, atos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmente, sem utilização desses meios, efectuando-se então a tributação de acordo com as normas aplicáveis na sua ausência e não se produzindo as vantagens fiscais referidas . No entanto, na opinião de Leite de Campos42, esta norma apresenta uma redacção demasiadamente pesada, pelo que há que a subdividir para determinar o seu sentido. Relativamente à referida “ineficácia , esta configura uma das formas de invalidade, o que significa que tais atos ou negócios jurídicos são ilícitos, por contrários à lei. Por outro lado, esta ineficácia pressupõe determinados requisitos de meio e de fim. Quanto aos requisitos de meio, é preciso que eles assentem em meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas. No que se refere ao fim, têm de ser essencial ou principalmente dirigidos à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em resultado de factos, atos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas sem a utilização desses meios. Quanto às consequências, estas só se produzem em termos fiscais. A tributação realiza-se de acordo com as normas aplicáveis na ausência dos meios abusivos ou fraudulentos e não se produzindo as vantagens fiscais visadas, não comprometendo a validade dos negócios para efeitos privados. Sobre a cláusula anti-abuso, Fernandes Silva43, reitera que o requisito essencial da cláusula geral anti-abuso está relacionado com o fim essencial ou principal do negócio, ou seja, a desconsideração do negócio jurídico em causa para efeitos de tributação, o que depende da prova de que o negócio visa exclusivamente fins fiscais. Ainda neste contexto, o mesmo autor recorda a existência de várias cláusulas especiais anti-abuso plasmadas nos códigos fiscais portugueses, como por exemplo, as regras sobre preços de transferência (artigo 63.º do CIRC); a não dedução como custo fiscal dos pagamentos feitos a pessoas ou entidades sujeitas a um regime fiscal claramente mais favorável (artigo 65.º do CIRC), imputação aos sócios residentes em território nacional dos lucros obtidos por sociedades não residentes sujeitas um regime fiscal mais favorável (artigo 66.º do CIRC), as regras sobre subcapitalização (artigo 67.º do CIRC); a simulação de negócios jurídicos (artigo 39.º n.º 1 da LGT), entre muitas outras. Tendo em atenção estes factos, Fernandes Silva44, afirma se estas cláusulas especiais são de fácil entendimento e interpretação, nomeadamente pelo seu carácter e objetivos concretos, já a aplicação e interpretação da norma geral anti-abuso, pela sua natureza abstrata, é difícil e pode colidir com os mais elementares princípios da certeza e segurança jurídica. Para devida aplicação desta norma devemos atender a uma interpretação sistemática destas normas à luz da letra e espírito da cláusula geral anti-abuso e das normas fiscais aplicáveis naquele caso. Pinto45 (2009), afirma que uma norma como a do n.º 2 do artigo 38.º da LGT pode ser uma “arma” bastante perigosa quando não manejada com os cuidados necessários. Alerta para o facto de os perigos serem maiores em períodos como aquele em que vivemos, marcado por uma busca desenfreada de receita fiscal, em que os técnicos da administração fiscal partem sempre do princípio de que o contribuinte foge ao cumprimento das suas obrigações fiscais e que todas as liquidações têm FERNADES SILVA, ob. cit., p. 44. Redacção anterior “ São ineficazes os atos ou negócios jurídicos quando se demonstre que foram realizados com o único ou principal objectivo de redução ou eliminação dos impostos que seram devidos em virtude de atos ou negócios jurídicos de resultado económico equivalente, caso em que a tributação recai sobre estes últimos (Lei n.º 100/99, de 26 de Julho). 42  LEITE DE CAMPOS, ob. cit. 43  FERNADES SILVA, ob. cit., p. 44. 44  FERNADES SILVA, ob. cit., p. 44. 45  PINTO, JOSÉ ALBERTO PINHEIRO. “O abuso das normas antiabuso”. Fiscalidade. TOC 107, Fevereiro 2009, p. 45.. 40

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legitimidade, com o lamentável argumento de que os sujeitos passivos sempre dispõem do recurso aos tribunais no caso de discordarem dessas liquidações (sem pensarem, obviamente, nas consequências em termos de tempo e de exigências financeiras com vista à suspensão da execução). Ainda segundo Pinto46, a aprovação de normas anti-abuso com um carácter tão genérico e dependente de apreciação subjetiva do comportamento dos sujeitos passivos, são na opinião do autor “o reconhecimento expresso da incompetência do Legislador “…” que ciente de que não é capaz de redigir as leis por forma a evitar a evasão fiscal, opta por estabelecer normas genéricas que tentam impedir determinados efeitos práticos quando venha a concluir-se, sabe-se lá como e por quem, que a adopção de certas práticas teve como motivo principal ou único a evasão fiscal, sob qualquer das formas que esta possa assumir”. De acordo com Menezes Leitão47, a cláusula geral anti-abuso “trata, no entanto, de uma disposição que coloca manifestos problemas, uma vez que com base nela pode sempre a Administração fiscal, a pretexto de resultados económicos equivalentes entre o negócio tributado e o negócio efectivamente praticado pelo contribuinte, relacionada com uma pretensa intenção evasiva dos contribuintes, manipular o âmbito de incidência da norma tributária em termos que se traduzirão numa efectiva aplicação analógica da norma fiscal.” Na opinião de Fernandes da Silva48, “num mundo globalizado, a adopção de medidas anti-abuso excessivas pode ter como efeito a fuga de empresas e capitais”, cabendo aos Estados definir as políticas fiscais que permitam a captação de investimentos e o aumento da concorrência fiscal, desempenhando um papel ativo na criação dos principais mecanismos de planeamento fiscal. Neste contexto, o autor afirma ser necessário respeitar aos limites estabelecidos pelos princípios de liberdade de iniciativa económica ou estabelecimento que decorrem quer da Constituição da República Portuguesa quer dos Tratados Comunitários.

CONCLUSÕES A tributação visa a satisfação das necessidades financeiras do estado e de outras entidades públicas e promove a justiça social, a igualdade de oportunidades e as necessárias correcções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento. Atualmente, a evasão e a fraude fiscais constituem um dos mais graves problemas da ordem tributária. Efectivamente, não será razoável esperar que alguém que possa legalmente pagar menos impostos opte por procurar uma via alternativa que o conduza a um pagamento acrescido. Os contribuintes, sejam eles pessoas singulares ou pessoas colectivas, procuram aumentar o seu rendimento disponível, pelo que se furtam ao pagamento dos impostos devidos, de forma consciente e intencional, com a intenção de evitar a assunção de obrigações tributárias que sobre eles impendem, muitas vezes, fruto da elevada carga fiscal existente. Praticando atos que visam a evasão e a fraude fiscal, os contribuintes violam, deliberadamente, os princípios fundamentais da igualdade, da legalidade, da justa repartição dos rendimentos e da riqueza, da solidariedade social e da solidariedade fiscal. Particular importância assume a simulação fiscal, que se traduz na divergência dolosa entre a vontade real e a vontade declarada pelos contraentes de um negócio jurídico, com o objetivo de liquidar menos ou nenhum imposto. Esta figura não deve ser porém confundida, com o denominado negócio indireto, ao qual as partes recorrem com a intenção de evitar a aplicação de regime tributário mais oneroso, correspondente à direta realização daqueles mesmos fins, sem no entanto cometerem qualquer ilícito. Em caso de simulação de negócio jurídico, a tributação recai sobre o negócio jurídico real e não sobre o negócio jurídico simulado. A tributação de negócio jurídico real constante de documento autêntico depende de decisão judicial, sem prejuízo dos poderes de correcção da matéria tributável legalmente atribuídos à administração tributária.

“(…) quando nos referimos a fraude fiscal, estamos perante uma intensão clara, direta e intencional de enganar o fisco (…)”

PINTO, ob. cit., p. 44. MENEZES LEITÃO, LUÍS MANUEL TELES DE. “Aplicação de medidas anti-abuso na luta contra a evasão fiscal”. In: Fisco, n.º107/108, Ano XIV, Lisboa, LEX, 2003, p. 341. 48  FERNADES SILVA, ob. cit., p. 45. 46  47

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Simulação, Evasão Fiscal, Planeamento Fiscal E cláusulas Anti-abuso

É igualmente imperativo deixar claro que o denominado planeamento fiscal é bem distinto de evasão ou fraude fiscal. O planeamento fiscal, baseia-se em atos praticados ou os negócios jurídicos celebrados que não vão contra qualquer proibição legal, apesar de terem em vista evitar a obrigação fiscal, ou apenas diminuir o montante do tributo a pagar, em que o contribuinte se socorre de operações que lhe permitem realizar poupança fiscal. O contribuinte utiliza, assim, meios técnicos, sejam eles negócios jurídicos que escapam às normas de incidência, sejam eles operações contabilísticas, legalmente admissíveis, que lhe são mais favoráveis. Entretanto, chegando ao conhecimento do legislador notícias de práticas deste tipo, é também natural que ele tente impedi-las, alterando em conformidade as normas fiscais, tendo em vista eliminar as condições que permitam a obtenção de vantagens fiscais decorrentes de tais práticas. Surgem assim, as normas anti-abuso, como uma resposta ao planeamento fiscal abusivo. No entanto, é natural, porém, que novas normas, embora impossibilitando certas práticas, permitam outras ou até que venham introduzir condições para que novas práticas possam surgir no domínio do planeamento fiscal. Sendo assim, é natural que esses procedimentos suscitem novas alterações legislativas, com efeitos porventura semelhantes aos enunciados, ou seja, impeditivas de algumas práticas, mas fomentadoras de outras. Por outro lado, dado que a máquina fiscal não se encontra preparada para fiscalizar todos os contribuintes, e em virtude da complexidade da lei fiscal, em bom rigor é muito difícil fazer com que o contribuinte cumpra com rigidez as obrigações fiscais, conduzindo estas, muitas vezes à evasão fiscal.

Artigo escrito segundo o novo acordo ortográfico.

LISTA DE ABREVIATURAS CC – Código Civil CRP – Constituição da República Portuguesa CIRC – Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas CIRS – Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares CIVA – Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado CPPT – Código de Procedimento e Processo Tributário DL – Decreto-Lei LGT – Lei geral Tributária RGIT – Regime Geral das Infracções Tributárias RJIFNA – Regime Jurídico das Infracções Fiscais Não Aduaneiras

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CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA FASE INICIAL DA AÇÃO EXECUTIVA NA EXECUÇÃO PARA PAGAMENTO DE QUANTIA CERTA NUNO ABRANCHES PINTO Advogado

A

fase inicial da ação executiva integra um conjunto de atos processuais de escrutínio formal e substancial da pretensão do exequente, fazendo corresponder um certo tipo de pretensão a um certo formato no que se refere à subsequente tramitação. Concretamente está em causa a possibilidade de recusa do requerimento executivo, a remessa do requerimento executivo para despacho liminar e a dispensa de citação prévia. Esta fase inicial é paradigmática do protagonismo que a reforma da ação executiva (bem como a “reforma da reforma”1) veio conferir (e incrementar) à intervenção do agente de execução. Aliás, atualmente, depois de ser apresentado ao tribunal, o requerimento

No que se refere à reforma, está principalmente em causa o Decreto-Lei 38/2003, de 8 de março. A “reforma da reforma” é a expressão que contribui para formar o título da obra do autor José Lebre de Freitas (José Lebre de Freitas, A Acção Executiva Depois da reforma da reforma, 5.ª Ed. Coimbra Editora, Coimbra, 2009); refere-se a um movimento legislativo (encabeçado pelo Decreto-Lei 226/2008, de 20 de novembro) que altera com alguma profundidade o regime resultante do Decreto-Lei 38/2003, de 8 de março. Aliás, as principais alterações vão justamente no sentido de reforçar o estatuto do agente de execução como primeiro responsável por assegurar a tramitação da ação executiva (art. 808.º, n.os 1 e 2 do Código de Processo Civil [CPC]) (Deste ponto em diante, na falta de indicação expressa, são do CPC todos os artigos referidos sem menção de outro diploma legal). 1

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Considerações Em Torno Da Fase Inicial Da Ação Executiva Na execução PARA PAGAMENTO DE QUANTIA CERTA

executivo é diretamente encaminhado para o agente de execução (art. 810.º, n.os 7 e 8 do CPC), sendo este a primeira entidade de controlo e valoração da petição do exequente. 2/3 Outras circunstâncias têm contribuído para exacerbar a relevância desta fase processual, nomeadamente a dificuldade de adaptação do regime legal à tramitação de algumas ações executivas e o assinalável impacto que a fase liminar repercute sobre o seguimento dos autos. Quanto à primeira questão, a doutrina tem vindo a apontar dificuldades de leitura conjugada dos arts. 812.º-C a 812.º-F do CPC.4 A complexidade do regime resulta da circunstância de se contemplarem três seguimentos (alternativos ou subsequentes) para o requerimento executivo (recusa, dispensa de citação prévia e remessa para despacho liminar) sem que o legislador forneça um critério seguro para lidar com as situações que não estão expressamente contempladas. Acrescem incongruências e hesitações suscetíveis de tornar menos evidente a ligação entre os três seguimentos enunciados. Quando à segunda questão, se é certo que a execução comum segue hoje forma única (art. 465.º do CPC), não menos certo é que, consoante exista citação prévia ou dispensa de citação prévia, o processo terá tramitação significativamente distinta. A decisão inicial do agente de execução repercute-se sobre a definição do momento em que se realiza a penhora, sobre a definição do momento em que se cita o executado e sobre o efeito (suspensivo ou devolutivo) da eventual oposição à execução.5 A recusa prende-se com a verificação de irregularidades eminentemente formais associadas ao requerimento executivo (art. 811.º do CPC).6/7 A competência para a recusa é do agente de Em bom rigor a secretaria preserva a incumbência de verificar se a informação necessária para comprovar o pagamento da taxa de justiça está inserida no CITIUS e no sistema informático de pagamento das custas (art. 10.º-A da Portaria 331-B/2009, de 30 de março, com as alterações resultantes da Portaria 1148/2010, de 4 de novembro). Por outro lado (sinal dos tempos), o próprio CITIUS, enquanto plataforma de front office entre o sistema judiciário e o utente do sistema judiciário, ao mesmo tempo que viabiliza a apresentação do requerimento executivo por transmissão eletrónica de dados, cumpre também uma função de controlo. A título de exemplo, refira-se que o sistema informático não permite o envio do requerimento executivo sem identificação das partes ou sem indicação do domicílio profissional do mandatário judicial. Esta função é tanto mais relevante quando atualmente o envio do requerimento executivo pelo CITIUS é obrigatório para quem intervenha patrocinado por mandatário (art. 810.º, n.os 7, 10 e 11 do CPC e 3.º da Portaria 331-B/2009, de 30 de março, na medida em que estabelece o pagamento de uma multa para quem não cumpra a obrigação de apresentação por via eletrónica). Não deixa, contudo, de estar contemplada a possibilidade de apresentação em papel (art. 2.º, al. b) da Portaria anteriormente referida). 3  É relevante que esta entidade de controlo seja escolhida, remunerada e livremente destituída por uma das partes do processo (arts. 808.º, n.os 3 e 6 e 455.º do CPC e art. 13.º, n.º 2 da Portaria 331-B/2009, de 30 de março [certo, no que se refere a honorários e despesas do agente de execução, os mesmos integram as custas de parte que o exequente tem a haver do executado; contudo, o reembolso efetivo não é garantido e está dependente do sucesso da própria ação executiva]). Se considerarmos que parte das competências do agente de execução pertenciam anteriormente à secretaria ou ao próprio juiz, os novos moldes da sua intervenção, se bem que não necessariamente negativos se se assumir que o agente de execução é também mandatário do exequente e se se considerar que o juiz de execução se mantém como instância que aprecia impugnações de atos do agente de execução, suscitam importantes desafios deontológicos mas também relativos à própria definição do respetivo posicionamento como operador judiciário. 4  Alertando para a possibilidade de ocorrerem “divergências interpretativas quando se ponha a questão da aplicação analógica de uma ou outra norma a um caso omisso” (José Lebre de Freitas, cit., p. 159). Também com críticas Mariana França Gouveia, A Novíssima Acção Executiva – Análise das mais importantes alterações, disponível em http://www.fd.unl.pt/docentes_docs/ma/mfg_ma_8053.pdf­, e Maria João Areias, Algumas notas à fase 1 do processo executivo, disponível em http://www.cpee.pt/media/uploads/pages/Maria_Joao_Areias.pdf, p. 8. 5  Uma das medidas de reforma da ação executiva que atualmente está em discussão traduz-se justamente na distinção entre execução sumária e execução ordinária, sendo a primeira reservada para situações que obedecem em certa medida ao critério que hoje preside à dispensa de citação prévia (título executivo decisão judicial ou arbitral, injunção e título extrajudicial de obrigação pecuniária, cujo valor não exceda o dobro da alçada da 1.ª instância). A principal característica do eventual futuro processo sumário é o de a penhora preceder a citação (Proposta de revisão do Código de Processo Civil apresentada pela Comissão de Reforma do Processo Civil, disponível, p. ex., em http://www.fd.lisboa.ucp.pt/ resources/documents/CONFERENCIAS/2012/PropostaRevisaoCPC.pdf ). 6  Poderia entender-se que a recusa impede o início da instância (art. 267.º do CPC), tal como sucede com a ação declarativa. Se assim fosse, não se justificaria a solução do art. 811.º, n.º 4 quando estabelece que a recusa dá lugar à extinção da execução (aliás, não existe na ação declarativa qualquer norma que regule especificamente as consequências da recusa da petição inicial – arts. 475.º e 476.º). Contudo, na ação declarativa o controlo que pode conduzir à recusa é efetuado pela secretaria judicial, antes da distribuição. Já na ação executiva, em que a secretaria controla apenas aspetos muito limitados relativos à taxa de justiça, a verificação pelo agente de execução vai ocorrer necessariamente após a criação de um número único de processo, a distribuição (ou apensação) e a remessa do processo ao agente de execução designado pelo exequente ou pela secretaria judicial. 7  Evidentemente, não podem confundir-se a recusa do requerimento executivo prevista no art. 811.º com a prerrogativa de não aceitação prevista no art. 810.º, n.º 12. Na primeira situação o agente de execução iniciou funções e decidiu recusar o requerimento executivo no exercício dessas funções; na segunda situação o agente de execução não chegou sequer a iniciar funções. 2

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Nuno Abranches Pinto

execução que nesta matéria substituiu a secretaria judicial a partir do Decreto-Lei 226/2008, de 20 de novembro. O requerimento executivo pode ser recusado por ter sido apresentado em desobediência ao modelo aprovado8 ou com omissão de algum dos requisitos impostos pelo art. 810.º, n.º 19 ou als. f ), g) e h) do art. 474.º10 do CPC. Parte dos elementos que constam do art. 810.º, n.º 1 são de indicação facultativa ou eventual pelo exequente. É o que sucede com a designação do agente de execução (o exequente pode pretender que ele seja designado pela secretaria e pode até pretender recuperar a possibilidade de designação após ter conhecimento do concreto agente de execução que foi nomeado11), com a exposição de factos (que não é efetuada sempre que os factos já constam do título executivo) e com a indicação de bens à penhora12. Por outro lado, pode causar estranheza que se exija a formulação de pedido no requerimento executivo. É que na ação executiva para pagamento de quantia certa o pedido tende a ser o mesmo em todos os processos, isto é, pede-se que se execute o património do executado até pagamento integral da quantia exequenda (variando apenas o valor desta). Trata-se de uma pretensão de certo modo implícita à própria apresentação do requerimento executivo, afigurando-se desproporcionada a sanção da recusa quando esta indicação não surja expressamente reproduzida. A referência ao art. 474.º, al. f ) não era necessária já que a regulamentação da ação executiva tem um preceito “homólogo” (art. 810.º, n.º 6, al. d)). Não assim no que se refere às als. g) e h). O requerimento executivo constitui uma forma de petição inicial. Daí que os requisitos da apresentação do requerimento executivo possam ser regulados por remissão para o primeiro articulado da ação declarativa, solução que sempre resultaria do art. 466.º, n.º 1 do CPC. O art. 811.º, n.º 1, al. b) do CPC trata duas situações distintas. Uma delas prende-se com a não apresentação de qualquer documento como título executivo. Isto é, o exequente ou não tem título ou, se tem título, não o juntou. Nestas hipóteses, a intervenção do agente de execução mantém-se de índole formal. Já não será assim quando o exequente junta um documento pretendendo que ele constitua título, mas o agente de execução entenda que o mesmo não consta do elenco taxativo do art. 46.º do CPC. Esta situação também integra o elenco de motivos de recusa. O exequente que pretenda impugnar a decisão de recusa deve fazê-lo no prazo de 10 dias13 perante o juiz de execução. A decisão do juiz é irrecorrível, salvo se o motivo de recusa for a insuficiência de título ou a falta de exposição de factos (art. 811.º, n.º 2 do CPC).14 8  Note-se que, mesmo não sendo apresentado por transmissão electrónica de dados, o requerimento executivo não deixa de obedecer ao modelo que constitui o Anexo IV à Portaria 331-B/2011, de 30 de março [art. 2.º, al. b) da mesma Portaria]. 9  Identificação das partes com nomes, domicílios ou sedes e, sempre que possível, profissões, locais de trabalho, filiação e números de identificação civil e de identificação fiscal; domicílio profissional do mandatário judicial; designação do agente de execução; fim da execução, exposição de factos que fundamentam o pedido; formulação do pedido; declaração do valor da causa; liquidação da obrigação e escolha da prestação, quando assim caiba ao credor; indicação, sempre que possível, do empregador do executado, das contas e dos bens deste, bem como dos ónus e encargos que sobre eles incidam; requerimento de citação prévia ou de dispensa de citação prévia, nos casos em que é admissível. 10  Comprovação do pagamento da taxa de justiça ou da concessão de apoio judiciário, falta de assinatura e redação em língua estrangeira. 11  V. art. 811.º-A do CPC e 3.º-A da Portaria 331.º-B/2009, de 30 de março. Nos termos do n.º 2 deste art. 3.º-A “O resultado da designação (pela secretaria) é ainda apresentado ao mandatário para que este aceite a designação ou possa ainda designar agente de execução sem recurso à designação electrónica”. Trata-se de um claro sinal de que o legislador pretendeu privilegiar a responsabilização do exequente na indicação do agente de execução. Aliás, a prerrogativa do art. 3.º-A está subordinada à mesma razão de ser da possibilidade de livre substituição prevista na I parte do art. 808.º, n.º 6 do CPC. 12  A indicação de bens pode ser contrária aos interesses do exequente, nomeadamente nas hipóteses de citação prévia em que essa indicação constituirá a exposição prematura de um projeto de apreensão. 13  Aplica-se o prazo supletivo previsto no art. 153.º, n.º 1 do CPC. 14  Com considerações muito críticas quanto ao esquema da recusa v. Paula Costa e Silva, A Reforma da Acção Executiva, 3.ª Ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2003, pp. 46 a 49. Com base no regime anterior ao Decreto-Lei 226/2008, de 20 de novembro (logo, num momento em que a recusa era competência da secretaria) a Autora insurge-se contra a imposição de modelos pré-aprovados no requerimento executivo (e o modo como essa imposição desvaloriza o direito de ação que lhe subjaz) e a atribuição à secretaria de prerrogativas de controlo da atuação das partes processuais que deveriam ser exclusivas do poder jurisdicional (nomeadamente no que se refere à recusa do requerimento com fundamento na insuficiência do título e falta de exposição de factos). Estas críticas continuam pertinentes com a passagem do controlo da secretaria para o agente de execução. Contra, Fernando Amâncio ­Ferreira,

Se é certo que a execução comum segue hoje forma única, não menos certo é que, consoante exista citação prévia ou dispensa de citação prévia, o processo terá tramitação significativamente distinta.

A competência para a recusa é do agente de execução que nesta matéria substituiu a secretaria judicial.

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Considerações Em Torno Da Fase Inicial Da Ação Executiva Na execução PARA PAGAMENTO DE QUANTIA CERTA

Não havendo lugar a recusa, a ação executiva segue com penhora ou é remetida ao juiz de execução para despacho liminar. Uma terceira hipótese consiste na imediata citação do executado. Como já aqui se referiu, a análise do atual quadro normativo não permite que se aponte a qualquer destas possibilidades o estatuto de via de regra. A lei limita-se a elencar as circunstâncias concretas que podem levar a cada uma das soluções, o que implica um esforço acrescido na gestão das hipóteses práticas que não se inserem na dispensa de citação prévia, na citação prévia ou na remessa para despacho liminar. Os arts. 812.º-C e 812.º-F, n.º 1, I parte começam por estipular as situações em que a penhora é efetuada antes de o executado ser citado. Esta solução representa uma vantagem processual para o credor que agride o património do devedor aproveitando uma espécie de “efeito surpresa”15. Só posteriormente à apreensão de bens é que se faculta ao devedor a possibilidade de se pronunciar sobre a existência ou inexistência do crédito do exequente16. As situações integradas no art. 812.º-C17 são aquelas em que a existência do crédito é mais provável (é o que sucede com os títulos decisão judicial, decisão arbitral e injunção em que o direito do credor foi apreciado ou, pelos menos, admitido pelo devedor18; é também o que sucede com a exigência de reconhecimento presencial de assinaturas no documento particular19). Por outro lado, constam situações em que a investida judiciária do credor causará menor surpresa (admitem-se apenas obrigações já vencidas20 e mesmo quanto a estas, em alguns casos, é necessário prova da interpelação do devedor21) ou menor impacto na esfera patrimonial do devedor (estipulam-se limitações ao montante exequendo ou ao tipo de bens penhorados22).23 Quando a execução se inicia com as diligências prévias à penhora, a citação do executado é efetuada no ato de penhora se o executado estiver presente ou no prazo de 5 dias a contar da realização da última penhora (art. 864.º, n.º 2 do CPC).24 Fica a dúvida sobre a interpretação mais correta do art. 812.º-C, al. d). É evidente que a redação do artigo não é gramaticalmente coerente [para o ser deveria ler-se “ (…) desde que não tenha sido indicado à penhora pelo exequente, estabelecimento comercial, direito real menor que sobre ele incida ou quinhão em património autónomo que o inclua.”]. No entanto, não é claro se com o Decreto-Lei 226/2008, de 20 de novembro, se pretendeu efetivamente viabilizar a dispensa de citação prévia quando se indica para penhora um imóvel ou se a omissão da referência aos Curso de Processo de Execução, 11.ª Ed., Almedina, 2009, p. 163, nr. 259 e José Lebre de Freitas, cit, p. 158, nr. 4-B, essencialmente por considerarem que o âmbito (muito limitado) da intervenção da secretaria (agora, agente de execução) e a possibilidade de reclamação para o juiz conferem garantia suficiente da reserva da função judicial. 15  Muito mitigado dado que, como veremos, um dos critérios que preside à constituição do elenco de hipóteses contempladas pelo art. 812.º-C é justamente o da menor surpresa que a instauração da ação executiva causa ao devedor. 16  Em qualquer caso, é necessário citar, mesmo que a citação se efetue depois da penhora. Quando o título é judicial, não é tão evidente a necessidade de citação do executado, tanto mais que já houve citação na ação declarativa. A este propósito considere-se a possibilidade de instauração automática da ação executiva prevista no art. 675.º-A do CPC. 17  Decisão judicial ou arbitral; requerimento de injunção no qual tenha sido aposta fórmula executória; documento exarado ou autenticado, por notário ou por entidades ou profissionais com competência para tal, ou documento particular com reconhecimento presencial de assinatura do devedor, desde que o montante da dívida não exceda a alçada do tribunal da relação e seja apresentado documento comprovativo da interpelação do devedor, quando tal fosse necessário ao vencimento da obrigação, ou desde que, excedendo o montante da dívida a alçada da relação, o exequente mostre ter exigido o cumprimento por notificação judicial avulsa ou equiparada; qualquer outro título de obrigação pecuniária vencida de montante não superior à alçada do tribunal da relação, desde que não tenham sido indicados à penhora, pelo exequente, estabelecimento comercial, direito real menor que sobre eles incida ou quinhão em património que os inclua. 18  Als. a) e b) do art. 812.º-C. 19  Al. c) do art. 812.º-C. 20  Excluem-se obrigações puras (sem prazo) em que o credor pretenda fazer valer a citação como ato de interpelação [art. 812.º-C, al. c), i)]. 21  Art. 812.º-C, al. c), ii). 22  Art. 812.º-C, als. c), i) e d). 23  Maria Olinda Garcia, A Responsabilidade do Exequente e de outros intervenientes processuais – Breves Considerações, Coimbra Editora, Coimbra, 2004, pp. 22 e ss. 24  No caso de pluralidade de executados, a circunstância de se penhorar um bem que pertence apenas a um dos executados não constitui motivo para sobrestar na citação dos restantes, desde que a penhora efetuada deva considerar-se a última.

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Nuno Abranches Pinto

bens imóveis consiste em lapso na transposição do artigo. Lebre de Freitas defende que o lapso está na omissão da referência ao bem imóvel.25 Em sentido contrário, Mariana França Gouveia entende que o lapso está na falta de transposição para o singular.26 A Comissão para a Eficácia das Execuções27 também veicula o entendimento de que constituiu intenção expressa do legislador a supressão da referência a bens imóveis.28 Trata-se de uma matéria que deve merecer a atenção de futuras intervenções do legislador. Neste momento não existem elementos que apontem claramente no sentido de ter havido intenção de alterar o artigo, não só devido à falta de coerência gramatical, mas também devido ao facto de não haver referência a esta alteração na exposição de motivos do Decreto-Lei 226/2008, de 20 de novembro. Finalmente, não se compreende em que medida se justifica mais a tutela do devedor se estiver em causa a apreensão do estabelecimento comercial quando comparada com a perspetiva de apreensão de bens imóveis, sendo certo que nestes poderá, por exemplo, incluir-se a casa de morada do executado e do respetivo agregado familiar. A aplicação desta al. d) do art. 812.º-C não depende apenas da indicação de bens à penhora pelo exequente. Se, não tendo o exequente indicado qualquer bem, o agente de execução vier a apurar que o executado dispõe apenas de um estabelecimento comercial como bem suscetível de penhora, deve afastar-se o cenário da dispensa da citação prévia porque só assim se acompanha a ratio do artigo (viabilizar a dispensa de citação quando existe menor impacto na esfera patrimonial do devedor). Na falta de indicação legal mais rigorosa, fica a dúvida sobre o que seja a notificação equiparada a notificação judicial avulsa a que se refere o art. 812.º-C, al. c), ii). Parece que poderá estar em causa o contacto pessoal de advogado, solicitador ou agente de execução (feito na pessoa do devedor, com entrega de duplicado da comunicação, devendo o notificando assinar o original) prevista no art. 9.º, n.º 7 da Lei 6/2006, de 27 de fevereiro, sendo certo que é de rejeitar o mero envio de correio registado ou registado com aviso de receção dado que são muito diferentes as garantias associadas à notificação avulsa e ao expediente de correio.29 Para além dos casos contemplados pelo art. 812.º-C, existe outra hipótese em que, por impulso do exequente, a penhora precede a citação. Assim, em processos que devam ser remetidos para despacho liminar o exequente pode, invocando o justo receio de perda de garantia patrimonial do seu crédito, requerer que o juiz autorize a penhora com dispensa de citação prévia (art. 812.º-F, n.os 3 e 4). Compete ao exequente indicar imediatamente as provas que serão produzidas perante o juiz. O mesmo ocorre quando o executado está ausente em parte incerta, desde que o exequente invoque que o atraso decorrente da realização da citação edital (bem como das diligências de pesquisa que viabilizam essa forma de citação) prejudica a garantia do seu crédito.30 A remessa para despacho liminar representava a via de regra antes das alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 226/2008, de 20 de novembro. Com efeito, o anterior art. 812.º definia a regra de remessa ao juiz, sendo certo que quanto aos processos remetidos, exceção feita aos casos de indeferimento liminar total, seguir-se-ia a citação do executado (art. 812.º, n.os 1 e 6 e 812.ºA, n.º 2). Depois existiam duas outras situações (ambas teoricamente excecionais): um primeiro grupo em que era efetuada citação prévia sem despacho liminar (art. 812.º, n.º 7)31; um segundo grupo em que haveria lugar a dispensa de despacho liminar e de citação prévia (art. 812.º-A)32. Ao contrário do esquema anterior (regra / exceções), atualmente a lei enumera especificamente os casos de remessa para despacho liminar e os casos de dispensa de citação prévia. José Lebre de Freitas, cit., p. 163. Mariana França Gouveia, cit., p. 6. 27  Doravante CPEE. 28  Manual de Perguntas e Respostas sobre a Ação Executiva, p. 36 disponível em www.cpee.pt onde se lê a este propósito o seguinte: “nestes casos, e em relação ao regime anterior da alínea d) do n.º 1 do artigo 812.º-A do CPC, foi intenção clara do legislador dispensar o despacho liminar nos casos em que o exequente indicou à penhora bem imóvel”. 29  A este propósito veja-se o Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 21.6.2011, sendo relator Luís Lameiras, disponível em www.dgsi.pt com o n.º de processo 6542/09.5YYLSB-A.L1-7. 30  Trata-se aqui de uma forma abreviada de arresto sendo certo que o exequente não tem de fazer prova relativa à existência do crédito porque dispõe de título executivo. 31  Corresponde, em certa medida, ao que hoje estabelece o art. 812.º-F, n.º 2. 32  Atual art. 812.º-C. 25

A aplicação desta al. d) do art. 812.º-C não depende apenas da indicação de bens à penhora pelo exequente. Se, não tendo o exequente indicado qualquer bem, o agente de execução vier a apurar que o executado dispõe apenas de um estabelecimento comercial como bem suscetível de penhora, deve afastar-se o cenário da dispensa da citação prévia porque só assim se acompanha a ratio do artigo (viabilizar a dispensa de citação quando existe menor impacto na esfera patrimonial do devedor).

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Considerações Em Torno Da Fase Inicial Da Ação Executiva Na execução PARA PAGAMENTO DE QUANTIA CERTA

Deve aqui salientar-se que não é absolutamente seguro que a abolição do despacho liminar como regra tenha sido intencional. A CPEE, por exemplo, veicula a posição de que a regra do despacho liminar sobreviveu à reforma da reforma. Aliás, a CPEE, no nosso entender sem fundamento legal bastante, refere expressamente que há lugar a remessa para despacho liminar sempre que o caso não se enquadra no art. 812.º-C (bem como sempre que se verifique alguma da situações previstas nas als. a) a g) do art. 812.º-D33). Ao contrário, é seguro defender que o processo só é remetido para despacho liminar nas situações do art. 812.º-D.34 Neste conjunto de situações distinguem-se dois grupos. Um grupo constituído pelas als. a) a d) em que a remessa para despacho liminar se funda na necessidade de um controlo judicial qualificado mas que não assenta em causas “patológicas”, isto é, em juízos de desvalor dirigidos à prestação do exequente. Um segundo grupo, constituído pelas als. e) a g), em que a remessa é pré-juízo de censura dirigido ao exequente. Pode acontecer que uma certa hipótese concreta se integre ao mesmo tempo nos arts. 812.ºC e 812.º-D. Nesses casos o agente de execução deve remeter para despacho liminar dado que o art. 812.º-D dispõe sobre um conjunto de situações específicas que o legislador entendeu serem merecedoras de cuidados especiais com intervenção prévia do juiz (muito embora esta regra fosse menos equívoca ao abrigo da redação do art. 812.º-A anterior ao Decreto-Lei 226/2008, de 20 de novembro). Sendo o processo remetido para despacho liminar, pode o juiz de execução indeferir liminarmente o requerimento executivo (no todo ou em parte) ou determinar a citação do executado. A primeira hipótese aplica-se aos casos do art. 812.º-E, n.º 1 (vícios que inviabilizam o prosseguimento da instância e que não podem ser sanados). A segunda hipótese aplica-se aos casos em que o requerimento executivo não apresenta vícios de conhecimento oficioso (porque o motivo inicial de remessa para despacho liminar não era patológico ou porque, sendo patológico, o juiz de execução não acompanhou as dúvidas ou suspeitas que levaram o agente de execução a remeter o processo). Em terceiro lugar, pode ainda o juiz determinar o convite ao aperfeiçoamento pelo exequente de qualquer vício do requerimento executivo que não imponha o indeferimento liminar e que possa ser sanado (art. 812.º-E, n.os 3 e 4). Neste ponto a solução legal é insuficiente na medida em que não contempla a hipótese de o juiz determinar a penhora na sequência da apreciação liminar.35 Pode perfeitamente acontecer que a remessa para despacho liminar tenha por base dúvidas do agente de execução assim como pode perfeitamente acontecer que essas dúvidas se venham a revelar infundadas. Se for esse o caso e se estivermos perante uma hipótese enquadrada também no art. 812.º-C, as dúvidas do agente de execução, mesmo que infundadas, levarão a que se inverta (sem nenhum motivo) a solução típica da dispensa de citação prévia. A redação anterior ao Decreto-Lei 226/2008 não excluía a possibilidade de penhora na sequência da apreciação do juiz. Nela os fundamentos patológicos não eram tratados juntamente com os restantes casos de remessa para despacho liminar; pelo contrário, estavam perfeitamente autonomizados e o que se dizia era que deveria ser suscitada a intervenção do juiz36. Esta intervenção do juiz era diferente da apreciação liminar típica e deixava em aberto a possibilidade de o juiz, não se confirmando a dúvida ou a suspeita suscitada, devolver o processo à tramitação que normalmente lhe estaria associada (dispensa de citação prévia). Resta o cenário da citação prévia independente de despacho liminar. Desde logo existem casos em o agente de execução remete para despacho liminar mas, ao mesmo tempo, procede à Manual de Perguntas e Respostas sobre a Ação Executiva, p. 36 disponível em www.cpee.pt Execuções movidas apenas contra o devedor subsidiário; casos previstos no art. 804.º, n.os 2 e 3; execuções fundadas em ata da reunião da assembleia de condóminos, nos termos do Decreto-lei 268/94, de 25 de outubro; execuções fundadas em título executivo, nos termos da Lei 6/2006, de 27 de fevereiro; se o agente de execução duvidar da suficiência do título ou da interpelação ou notificação do devedor; se o agente de execução suspeitar que se verifica uma das situações previstas nas alíneas b) e c) do n.º 1 do art. 812.º-E; se, pedida a execução de sentença arbitral, o agente de execução duvidar de que o litígio pudesse ser cometido à decisão por árbitros, quer por estar submetido, por lei especial, exclusivamente a tribunal judicial ou a arbitragem necessária, quer por o direito controvertido não ter carácter permanente e não poder ser objeto de transação. 35  No mesmo sentido Maria João Areias, cit., p. 8. 36  A redação do art. 812.º-A, n.º 3 era a seguinte: “Nas execuções dispensadas de despacho liminar, o funcionário judicial deve suscitar a intervenção do juiz quando …”. 33

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Nuno Abranches Pinto

citação – art. 812.º-F, n.º 2.37 Esta solução não se justifica a não ser que se ponha a hipótese (pouco plausível) de ter sido intenção do legislador ganhar tempo na realização da citação. O art. 812.ºF, n.º 2 compreendia-se ao abrigo do regime anterior à reforma de 2008. É que nesse contexto (como já se referiu) o despacho liminar era a regra; depois, havia situações em que o legislador determinava que a citação prévia se efetuasse independentemente de despacho liminar. Nesse conjunto de situações, contudo, já não havia lugar a despacho liminar (era como se o legislador se substituísse ao despacho liminar determinando ele próprio a realização da citação). 38 / 39 Esta norma nem sequer é compatível com a referência do art. 234.º, n.º 4, al. e) do CPC na parte em que determina que a citação depende de despacho judicial, no processo executivo, nos termos do n.º 2 do art. 812.º-F, justamente porque o que diz este 812.º-F, n.º 2 é que a citação não depende de despacho. A citação prévia é ainda o caminho a seguir em duas outras situações. Primeiro quanto o exequente o pretenda, estando a situação prática configurada no art. 812.ºC. Nas hipóteses a que a lei faz corresponder dispensa de citação prévia, tem o exequente a faculdade de requerer que se efetue em primeiro lugar a citação. Não há necessidade de intervenção do juiz na medida em que esta atuação do exequente configura uma renúncia a prerrogativa processual. A atitude do exequente pode justificar-se para evitar a prescrição (o requerimento de citação prévia corresponderá então ao que se encontra regulado pelo art. 323.º, n.º 2 do Código Civil) ou porque o exequente considera que o executado cumprirá voluntariamente logo que confrontado com a citação. Pode ainda o exequente pretender precludir a possibilidade de aplicação do art. 819.º que o penaliza com particular ênfase em caso de procedência da oposição à execução. Segundo, quando a situação não se enquadra nem no despacho liminar nem na dispensa de citação prévia. A citação prévia (sem despacho liminar) vem ocupar o lugar de via de regra que anteriormente pertencia à remessa para despacho liminar.40 Significa isto que, sempre que o processo não deva seguir com diligências prévias à penhora (por não haver enquadramento no art. 812.º-C) e sempre que o processo não deva seguir com remessa para despacho liminar (por não haver enquadramento no art. 812.º-D), compete ao agente de execução efetuar a citação do executado para pagar ou para se opor à execução.41 É esta a solução que, como refere Maria João Areias, melhor se compagina com um dos traços essenciais da reforma (limitar a intervenção do juiz de execução a questões de litígio substancial ou a questões de particular importância). Por outro lado, esta solução é perfeitamente acolhida pela própria lei já que do art. 234.º, n.º 4 do CPC se retira (a contrario) a regra de que a citação, em princípio, não depende de despacho liminar, regra essa que merece ser exportada para a ação executiva (se necessário fosse por apelo ao art. 466.º do CPC), sendo com ela totalmente compatível. Execução movida apenas contra o devedor subsidiário sem que o exequente tenha pedido a dispensa de citação prévia; título extrajudicial para execução de obrigação ilíquida cuja liquidação não dependa de simples cálculo aritmético; execuções fundadas em título extrajudicial de empréstimo contraído para aquisição de habitação própria hipotecada em garantia; constar do registo informático de execuções menção da frustração, total ou parcial, de anterior ação executiva movida contra o executado. A propósito desta última situação Maria João Areias assinala a manifesta incompatibilidade entre o que dispõe o art. 812.º-F, n.º 2, al. d) (determinando a citação) com o que determina o art. 832.º, n.º 3 (determinando que a tramitação subsequente da ação executiva nem sequer contemple a citação do executado) (Maria João Areias, cit., p. 11). 38  Concretamente o anterior art. 812.º-F, n.º 7 dizia o seguinte: “A citação é previamente efetuada, sem necessidade de despacho liminar (…)”. 39  Com posição crítica de idêntico teor Mariana França Gouveia, cit., pp. 7 e 8 e Maria João Areias, cit., p. 8. 40  Em sentido divergente, defendendo que a regra deve manter-se a anterior (despacho liminar seguido de citação prévia) Mariana França Gouveia, A Novíssima Acção Executiva – Análise das mais importantes alterações, cit., pp. 7 -9. No sentido aqui propugnado Maria João Areias, cit., p. 5 (com o argumento de que a regra da citação prévia sem despacho liminar é a mais conforme à intenção de desjudicialização) e Ata da Reunião de Trabalho de 11 de setembro de 2009, no âmbito das II Jornadas de Trabalho – A Nova Reforma da Acção Executiva, disponível em http://www.cpee.pt/media/uploads/pages/Acta_da_2_reuniao_de_trabalho_realizada_no_Juizo_de_Execucao_de_ Agueda1.pdf, p. 2. 41  Não pode deixar de se admitir que a possibilidade de requerer a dispensa de citação prévia com base no receio de perda de garantia patrimonial do crédito também se aplica aos casos em que o processo tem início com a citação, sob pena de se prejudicar injustificadamente a posição do exequente. Assim, o art. 812.º-F, n.os 3 a 5 aplica-se analogicamente às situações em que o processo deva ter início com citação prévia mas sem remessa para despacho liminar. Com a mesma posição Maria João Areias, cit., p. 13. 37

Nas hipóteses a que a lei faz corresponder dispensa de citação prévia, tem o exequente a faculdade de requerer que se efetue em primeiro lugar a citação. Não há necessidade de intervenção do juiz na medida em que esta atuação do exequente configura uma renúncia a prerrogativa processual.

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Considerações Em Torno Da Fase Inicial Da Ação Executiva Na execução PARA PAGAMENTO DE QUANTIA CERTA

Em conclusão, o agente de execução deve recusar o requerimento executivo ou remetê-lo para despacho liminar de acordo com os pressupostos enunciados pelos arts. 811.º, n.º 1 e 812.ºD, respetivamente. Sendo o processo remetido para despacho liminar, competirá ao juiz de execução indeferir liminarmente o requerimento executivo (no todo ou em parte) (arts. 812.º-E, n.os 1, 2 e 4), convidar o exequente ao seu aperfeiçoamento (art. 812.º-E, n.º 3) ou viabilizar o prosseguimento dos autos. Caso viabilize, o juiz determina a citação do executado (art. 812.º-E) ou (caso a remessa tenha tido por fundamento alguma das als. e) a g) do art. 812.º-D e caso a hipótese prática se insira ao mesmo tempo no art. 812.º-C) a penhora. Nas hipóteses previstas no art. 812.º-C, há lugar a penhora imediata. Haverá também lugar a penhora imediata quando a situação prática não se enquadra no art. 812.º-C mas o juiz autoriza a inversão de ordem, tutelando cautelarmente o crédito do exequente. A citação é o primeiro passo da execução nas hipóteses previstas no art. 812.º-F, n.º 2, bem como nas hipóteses em que a situação prática se insere no art. 812.º-C mas o exequente prefere que se faça primeiro a citação (art. 812.º-F, n.º 1, in fine). Do mesmo modo, a execução inicia-se com a citação sempre que o caso prático não se insere nem no art. 812.º-C, nem no art. 812.º-D.

Artigo escrito segundo o novo acordo ortográfico.

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ALTERAÇÕES AO PLANO CONVENCIONADO NO CONTRATO DE EMPREITADA

RUI MIGUEL SIMÃO Solicitador

INTRODUÇÃO

E

ste trabalho servirá de estudo ao contrato de empreitada. Especificamente, abordaremos as alterações que poderão surgir ao plano convencionado da obra. Neste contrato em especial existem três elementos fundamentais. São eles os sujeitos, o pagamento do preço e a realização da obra. Os sujeitos têm as designações legais de dono de obra e empreiteiro, sendo que ao primeiro cumpre a obrigação de pagar o preço e ao segundo a de entregar a obra tal como convencionado no contrato, e consequentemente, sem defeitos. O próprio artigo 1208.º do Código Civil (CC), estabelece o dever do empreiteiro executar a obra em conformidade com o que foi convencionado. A obtenção de um resultado, é portanto da perspectiva do dono de obra um direito que lhe assiste. O comitente que celebra com o empreiteiro um contrato de empreitada tem por isso o direito a que, no prazo acordado, lhe seja entregue uma obra realizada nos moldes convencionados. Apesar do forte carácter vinculativo ao projecto convencionado, que emerge do contrato de empreitada, casos há em que se torna preciso alterar o plano convencionado. Para esses casos, existirão regras específicas que orientem as adaptações necessárias por parte de cada um dos três elementos acima referidos do contrato de empreitada. Neste estudo, analisaremos essas normas, que embora só se apliquem nos contratos de empreitada em que se venham a verificar alterações, são de essencial observação para o completo entendimento do contrato ora em apreço. Veremos que tipos de alterações podem surgir e qual a sua respectiva qualificação legal, assim como tentaremos concretizar situações que demonstrem a aplicação prática dos preceitos legais. Para auxiliar a exposição será também analisada alguma jurisprudência de conteúdo relevante para o estudo das alterações à obra.

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Alterações Ao Plano Convencionado No Contrato De empreitada

ALTERAÇÕES À OBRA Como já foi exposto na introdução, embora a obrigação principal do empreiteiro seja a de realizar uma obra certa e determinada, não raras vezes pode o projecto inicial ser alterado. O facto de a obra ser entregue ao dono de obra de forma diversa do estipulado, poderá de facto consubstanciar um defeito1 o que concederá ao comitente os direitos previstos nos artigos 1221.º a 1223.º do CC. Portanto será sempre de analisar a razão que motivou a divergência entre a obra entregue e o plano convencionado. Para melhor entender que casos se enquadram nas alterações ao plano, diremos que são todas as variações se limitarem a modificar o tipo ou a qualidade, a estrutura, o tempo ou o lugar de execução da obra. Apurado que esteja um dos requisitos anteriores e não consubstanciando a alteração uma modificação da natureza da obra, então sim estaremos perante alterações ao plano convencionado. “São transformações que não modificam a natureza e que não têm autonomia em relação à obra convencionada”2 As alterações à obra podem ser de um dos seguintes tipos: – Alterações da iniciativa do Empreiteiro. – Alterações necessárias. – Alterações exigidas pelo dono de obra. – Alterações posteriores à entrega, e novas obras.

ALTERAÇÕES DA INICIATIVA DO EMPREITEIRO O n.º 1 do artigo 1214.º CC corrobora no fundo o pensamento civilista expresso no artigo 406.º CC segundo o qual o contudo dos contratos só pode se modificar ou extinguir por consentimento dos contraentes, e em conformidade com as suas vontades. Dessa forma o empreiteiro está impedido de per si, alterar a obra sem autorização do principal interessado: o comitente; se o fizer a obra é havida como defeituosa. “O empreiteiro não pode, sem autorização do dono de obra, fazer alterações ao plano convencionado”. Mesmo que o dono de obra a aceite, com as alterações introduzidas por iniciativa do empreiteiro e sem sua autorização, não está obrigado a pagar o aumento do preço nem tampouco lhe poderá ser exigida indemnização por enriquecimento sem causa. O n.º 3 do artigo 1214.º CC será porventura o que nos merecerá uma análise mais cuidadosa neste tipo de alterações. Segundo o preceito legal: “Se tiver sido fixado para a obra um preço global e a autorização não tiver sido dada por escrito com fixação do aumento do preço, o empreiteiro só pode exigir do dono da obra uma indemnização correspondente ao enriquecimento deste”. Desta forma o legislador protege o dono de obra contra expedientes do empreiteiro tendentes a elevar o preço da obra. Se para determinada obra tiver sido fixado o preço global de 100.000 euros, o comitente esperará que todos os trabalhos do empreiteiro sejam pagos por esse preço. No caso do empreiteiro ter proposto uma alteração aceite pelo dono de obra, e ainda que essa aceitação seja reduzida a escrito, se não for fixado o aumento do preço, o empreiteiro não poderá exigir um “preço” superior ao valor global inicialmente estipulado. Isto sem prejuízo de ressarcido pelo enriquecimento do dono da obra.

ALTERAÇÕES NECESSÁRIAS “É possível que, no decurso da execução, para evitar imperfeições da obra ou em consequência de direitos de terceiro, haja necessidade de proceder a alterações ao plano convencionado”. 1  2

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De resto o artigo 1214.º n.º 2 CC diz expressamente que “a obra alterada sem autorização é havida como defeituosa”. Martinez, Pedro Romano – Contrato de Empreitada, Coimbra Editora.

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Rui Miguel Simão

Por imposições inultrapassáveis pode ser necessário, ao longo da execução da obra, modificar o plano inicialmente convencionado. Estas alterações podem mesmo surgir por imposição legal, por ordem administrativa ou por direitos de terceiro. Um exemplo de um caso que pode vir a alterar os planos de execução da obra é a invocação por parte de um terceiro de uma servidão legal de passagem conforme prevista no artigo 1550.º CC. Uma vez invocado este direito potestativo, pode obrigar a alterações das obras em execução no prédio serviente. Caso se verifique esta necessidade de alteração cabe às partes tentar chegar a acordo quanto às modificações a introduzir (406.º CC), caso contrario terá de ser o Tribunal a determinar quais obrigações de parte a parte que resultam da necessidade de alteração. O tribunal guiar-se-á por princípios de equidade e determinará sobre quem irão recair as despesas da alteração seguindo as regras do risco de obra previstas no artigo 1228.º CC. No entanto, estas alterações podem vir a atingir proporções não só inesperadas como insuportáveis para o empreiteiro. Sabendo disso, o legislador determinou no n.º 2 do artigo 1215.º CC, que empreiteiro poderá porém denunciar o contrato, caso as alterações elevem o preço da obra em mais de vinte por cento. Caso existam diversas alterações, que individualmente não superem este valor mas que no total o ultrapassem, existe também o direito de renúncia por parte do empreiteiro. O valor de todas as alterações é ser somado e o direito de renúncia nascerá quando se atinja uma importância que supere vinte por cento do valor inicialmente previsto para a execução da obra. São dessa forma acautelados os interesses do empreiteiro que pode nesses casos não ter as necessárias condições técnicas ou económicas para de forma eficiente concluir a obra. No entanto caso o empreiteiro não renuncie ao contrato não lhe é lícito que o faça caso já tenha iniciado os trabalhos de alteração. Mais ainda, informa o mesmo preceito legal que nestas circunstâncias pode o empreiteiro exigir uma indemnização equitativa que o compense dos gastos e lucros cessantes resultantes das expectativas de execução da obra. Este é de resto um entendimento que vai de encontro ao expresso no artigo 1227.º que consagra que “se a execução da obra se tornar impossível por causa não imputável a nenhuma das partes, é aplicável o disposto no artigo 790.º, tendo, porém, havido começo de execução, o dono de obra é obrigado a indemnizar o empreiteiro do trabalho executado e das despesas realizadas”. Este direito de renúncia aproveita apenas ao empreiteiro, mesmo que o valor da obra exceda vinte por cento do valor inicialmente estipulado, caso o empreiteiro não exerça o direito de renúncia, não poderá mesmo assim o dono de obra desvincular-se por este meio da execução da mesma. Entendemos assim que nessa situação é concedido ao empreiteiro um direito, que tem em atenção a sua condição e a expectativa com que aceitou a obra mas que deixa por outro lado o dono de obra obrigado a assumir as suas obrigações ainda que para isso não estivesse preparado no inicio da execução. Caso não consiga suportar a execução da obra suplementada com as alterações necessárias, restará ao comitente desistir da obra nos termos do artigo 1229.º CC, tendo contudo de indemnizar o empreiteiro dos seus gastos e trabalho e do proveito que este poderia tirar da obra. Quanto à desistência por parte do dono da obra importa aqui fazer referência às questões de direito analisadas pelo Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão 11 Outubro 2005: “De facto, mediante um contrato de empreitada pretende-se que o dono da obra obtenha um determinado resultado, a realização de uma obra. Ora pode acontecer que o comitente perca o interesse na obtenção desse resultado – por alteração da sua vida, da sua situação económica, etc. – e então não se justifica que ele continue vinculado àquele negócio jurídico. Por outro lado, o comitente pode pretender que a obra seja realizada por outro empreiteiro porque, por exemplo, perdeu a confiança no primeiro, ou querer realizar a obra por outra forma, verbi gratia, por administração directa. A desistência por parte do dono da obra é uma faculdade discricionária, não carece de fundamento, apresenta-se como insusceptível de apreciação judicial e não carece de qualquer pré-aviso. A desistência tem eficácia ex nunc. (…) O art. 1229.º, talvez propositadamente, utiliza um termo sem conotação jurídica: “desistência”. Com pouco apuro técnico, o art. 215.º do REOP usa a expressão “rescisão”. Caberá ­perguntar

O facto de a obra ser entregue ao dono de obra de forma diversa do estipulado, poderá consubstanciar um defeito o que concederá ao comitente os direitos previstos nos artigos 1221.º a 1223.º do CC.

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Alterações Ao Plano Convencionado No Contrato De empreitada

se o direito que é conferido ao dono da obra deverá ser entendido como uma resolução, uma revogação ou uma denúncia do contrato. A desistência não se pode enquadrar na figura da resolução, porque esta é vinculada (há que alegar um fundamento) e opera retroactivamente; em contrapartida, a desistência é discricionária e tem eficácia ex nunc. Mais difícil se apresenta a distinção com respeito à revogação, que também é discricionária e não retroactiva. Porém, a revogação do contrato tem origem bilateral e a desistência é unilateral. Por último, a denúncia, além de discricionária e não retroactiva, também se apresenta como unilateral; mas a denúncia é específica dos contratos de duração indeterminada e o contrato de empreitada, apesar de dele poderem constar prestações que se protelam no tempo, não é, por via de regra, de execução continuada. A desistência do contrato é uma situação sui generis, algo intermédio entre a revogação e a renúncia. Contudo, havendo razões plausíveis para se consagrar uma excepção à regra pacta sunt servanda, seria injusto que não se tivesse tido em conta os direitos do empreiteiro. Assim, admite-se que o comitente possa desistir da realização da obra, desde que indemnize o empreiteiro das despesas e trabalhos realizados, bem como do proveito que este poderia retirar da obra (art. 1229.º). A desistência da obra é lícita, mas conduz, todavia, a uma obrigação de indemnizar; trata-se, por conseguinte, de um dos exemplos de responsabilidade por intervenções lícitas” (Cfr. P. Romano Martinez, “Contrato de Empreitada”, Almedina, ed. 1994, pág. 173/174). (…) “No Código Civil de 1966, no seguimento do art. 1402.º do Código precedente, adoptou-se um critério positivo para determinar o montante da indemnização a atribuir ao empreiteiro. Por conseguinte, o dono da obra, caso desista da empreitada, terá de pagar ao empreiteiro a soma das despesas que este teve com a aquisição dos materiais, transporte, etc., acrescida do valor do trabalho incorporado na obra, em que se inclui o trabalho do empreiteiro e o daqueles que trabalharam para ele (empregados, subempreiteiros, etc.). Às despesas e ao trabalho será aduzido o proveito que o empreiteiro poderia retirar da obra; entenda-se da obra completa e não daquela que efectivamente se realizou. Este proveito não é visto no sentido amplo do Iucrum cessans, mas no de benefício económico que o empreiteiro auferiria daquele negócio. Assim, o proveito será determinado pela subtracção ao preço total fixado (que nas empreitadas em que o preço não foi acordado de forma global pode ser difícil de estabelecer), do custo total da obra. O empreiteiro é, pois, indemnizado pelo interesse contratual positivo. Trata-se de uma obrigação de indemnizar pelo quantum meruit como consequência de uma responsabilidade por factos lícitos danosos”. (CIT. P. Romano Martinez, ob. cit., pág. 175/176).

ALTERAÇÕES EXIGIDAS PELO DONO DA OBRA Por ser o principal interessado no resultado do contrato de empreitada o dono da obra tem o direito de exigir ao empreiteiro alterações ao plano convencionado conforme dispõe o artigo 1216.º n.º 1 CC. Esta é uma excepção ao já referido artigo 406.º CC, pois é um dos casos em que a lei permite que um contrato seja unilateralmente alterado. Ainda assim, esta especificidade do contrato não se afasta do respeito civilista pela iniciativa privada, tendo presente que o dono de obra é um cliente do empreiteiro, a que este deverá responder com a disponibilização dos seus serviços específicos, dos quais livremente se encarregou. A lei não obriga a que estas alterações sejam ordenadas por escrito, ainda que o contrato de empreitada tenha obedecido a essa forma.3 Como seria de esperar, aplicar-se-ão a estes casos, princípios de proporcionalidade que garantam a estabilidade e equilíbrio na execução do negócio jurídico. O empreiteiro tem nestes casos o direito ao aumento do preço correspondente ao acréscimo de despesa e de trabalho bem como a um prolongamento do prazo para a execução da obra. Quanto a esta questão será digno de análise mais detalhada o Acórdão 19 Abril 2004 do Tribunal da Relação de Coimbra 3

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Porém, se estas alterações vierem a resultar numa diminuição de trabalho ou do custo da obra, será deduzido no preço estipulado o que o empreiteiro poupar em despesas ou conseguir adquirir por outras aplicações da sua actividade. Contudo, este direito do comitente não é infinito e deve respeitar dois requisitos: o valor das alterações não deve exceder a quinta parte do preço estipulado, e não devem ocorrer modificações da natureza da obra. Caso contrário, o empreiteiro terá mais uma vez o direito de renunciar ao contrato pelas mesmas razões anteriormente salientadas. Ainda assim se o empreiteiro aceitar executar as alterações solicitadas pelo comitente não lhe será lícita a renúncia iniciada a execução das alterações. O artigo 1216.º CC protege o empreiteiro pois concede-lhe a hipótese de não executar as modificações que excedam no seu valor a quinta parte do preço total convencionado ou que alterem a natureza da obra. Salvaguarda-se ainda a especificidade dos trabalhos executados pelo empreiteiro, de forma a prevenir que determinada empreitada degenere, por capricho do dono de obra, numa nova obra a que o empreiteiro é alheio, e para a qual poderá não ter conhecimentos técnicos ou meios de execução que lhe permitam a prossecução da obra.

OBRAS NOVAS E ALTERAÇÕES POSTERIORES Estas alterações são trabalhos independentes, que saem do alcance do contrato original de empreitada e que por isso são autónomos em relação face à primeira obra prevista. Assim sendo, trata-se no fundo de uma nova relação contratual que ambas as partes terão de aceitar para que sejam efectuadas. Como tal, empreiteiro não tem a obrigação de aceitar estes novos trabalhos que saem do alcance da obra original. Nem tampouco, o dono de obra não tem de aceitar uma obra onde o empreiteiro tenha vindo a introduzir alterações não solicitadas. Caso o empreiteiro adicione obras não convencionadas, à obra por si executada a mando do comitente, pode este exigir a sua eliminação ou uma indemnização pelo prejuízo. Porém, é possível que o comitente venha a tirar vantagens da obra com as alterações não solicitadas e nesse caso deverá compensar a contraparte pelo maior proveito que veio a ter face às novas obras introduzidas pelo empreiteiro. Para tanto, pode o empreiteiro fazer-se valer dos seguintes institutos: – Gestão de negócios – art.os 464 ss. CC – Acessão – art.os 1340.º 1341.º CC – Enriquecimento sem causa – art.os 473 ss CC Para melhor analisar esta questão, dada a possível controvérsia de o comitente ser sujeito a pagar por obras novas não solicitadas iremos socorrer-nos da apreciação constante no Acórdão 26 de Abril de 2006 do Tribunal da Relação de Coimbra. Na relação material controvertida em apreço a firma A intentou no Tribunal Judicial de Santa Comba Dão, em 19/06/2002, acção sumária contra B pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 9.568,99, remanescente do preço em falta de obras que executou na casa de habitação da R e que incluíram trabalhos extra. R alegava, em resumo, que a A executou trabalhos não solicitados e que a obra apresenta vícios, e também não foi a empreitada cumprida integralmente. A, alegava ainda que todos os trabalhos forma efectuados enquanto R residia na casa tendo portanto tomado conhecimento do decurso das obras sem nunca se ter oposto a tal. Pode ler-se no referido douto acórdão: “ (…) É o que a recorrente pretende, ao sinalizar que as obras por ela levadas a cabo na casa de habitação se traduziram numa valorização desta o que nos parece manifesto à luz da experiência comum. Ninguém, por certo, pode discutir que uma casa que viu obras que lhe alargaram a área habitável num dos pisos, viu cimentado o pátio de entrada, melhorado o estado de um barracão, com a respectiva pavimentação e dotação de uma porta e janela, reforçado o sistema de aquecimento central e implantada uma fossa séptica não ficou nessa mesma medida valorizada e enriquecida com as novas comodidades por elas proporcionadas.”

A desistência do contrato é uma situação sui generis, ficando num intermédio entre a revogação e a renúncia.

Admite-se que o comitente possa desistir da realização da obra, desde que indemnize o empreiteiro das despesas e trabalhos realizados, bem como do proveito que este poderia retirar da obra.

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Alterações Ao Plano Convencionado No Contrato De empreitada

Exposta a situação apreciou o tribunal: [“De harmonia com o disposto no art. 1217.º, n.º 2 do CCivil, tendo havido obras novas ou seja obras que tenham autonomia em relação às previstas no contrato, o dono da obra tem o direito de as recusar, se as não tiver autorizado e pode além disso, exigir a sua eliminação e se esta for possível, e em qualquer caso, uma indemnização nos termos gerais. Contudo e como explica Pedro Martinez, in Empreitada, incluída no Direito das Obrigações, 3.º Vol., sob a coordenação de Menezes Cordeiro, se o comitente apesar de na obra terem sido executados trabalhos extracontratuais, aceitar a mesma e retirar vantagens dessa actividade do empreiteiro, deverá compensá-lo nos termos legais E essa compensação basear-se-á, consoante os casos, nas regras de um novo contrato de empreitada, ou nos institutos da gestão de negócios, da acessão industrial imobiliária ou do enriquecimento sem causa. No caso vertente, parece-nos claro, pela análise da contestação que esta não recusou as obras em causa, nem reclamou a sua eliminação, o que apenas se limitou foi a afirmar que as não tinha pedido e que por isso não tinha de as pagar. Com efeito, se a R entendia que tais obras para nada serviam, podia recusá-las ou exigir, se fosse possível, a sua eliminação, tendo num ou noutro caso, direito a uma indemnização pelos prejuízos eventualmente sofridos (cfr. P de Lima e A Varela, CCivil Anotado, Vol. lI, 889). Mas não procedendo à sua recusa, nem reclamando de quaisquer prejuízos, senão os decorrentes da execução defeituosa de alguma das obras contratadas, ficaria aberto o caminho para a A poder fazer valer aqueles direitos. Acontece que no caso, a A pretende justamente que face aos factos provados lhe caberia o direito de reclamar da R o valor da beneficiação da sua casa com as obras que consistiram em: – Pavimentação do pátio e construção de uma fossa séptica; – Dotação do rés-do-chão com mais uma casa de banho e um compartimento anexo; – Melhoramento de um barracão; – Aumento e reforço da instalação de aquecimento e arranjos em portas e janelas. E isto sob pena de ficar a R. injustamente enriquecida no seu património imobiliário. Segundo o disposto no art. 475.º n.º 1 do CCivil aquele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou E o n.º 2 acrescenta que” a obrigação de restituir por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido ou o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou.” O enriquecimento sem causa como fonte da obrigação de restituir tem como é sabido natureza subsidiária e no caso como atrás vimos, não se tendo provado que a R enquanto dona da casa objecto de uma empreitada de reconstrução encomendara as ditas obras não tinha a A outro meio de cobrir as despesas com as mesmas, senão com o uso de tal instituto. Na sua contra alegação, a R. contraria essa pretensão com enfoque em não se poder medir o enriquecimento com base no valor de determinados trabalhos unilateralmente quantificados pelo empreiteiro, antes sendo exigível que se descrevesse a situação da casa antes da sua benfeitorização e se descrevessem e quantificassem as obras nele realizadas e além disso haveria ainda que se alegar e provar quais os trabalhos que não seriam passíveis de restituição em espécie e não sendo eles estritamente necessários para a conservação da casa. A R não tem razão, neste ponto, a nosso ver e salvaguardado o devido respeito. Face ao disposto no art. 479.° do CCivil, a obrigação de restituir incide em princípio sobre tudo aquilo que se tenha obtido à custa do empobrecido. Ora tendo sido apurado que a A despendeu com a feitura das obras a importância de Esc. 950.000$00, conforme resposta ao quesito pertinente e com base numa perícia que consta a fls. 86, montante portanto objectivo do seu empobrecimento, nada se apurou quanto a ser menor o montante do enriquecimento da R e tal valor entrado no património 92

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desta, corresponde pois ao empobrecimento correlativo do património da A e constitui o objecto da obrigação de restituir de que esta é devedora (v. no mesmo sentido e em situação similar, o Ac. do Supremo de 8/02/1 996 in CJ /STJ, T°1°,80 e ss) Outros sim, não é de considerar a aventada necessidade da A dizer quais as benfeitorias que deveriam ser levantadas em espécie, já que a R não recusou as mesmas, como atrás vimos, nem exigiu a respectiva eliminação, antes se quedou por uma atitude de mera recusa de pagamento O que de modo algum nos parece aceitável, à luz do sistema jurídico e da correcta ordenação jurídica dos bens que não aceita o enriquecimento obtido à custa do sacrifício de outrem, pese embora a R tenha razões de queixa sobre a qualidade de alguns dos trabalhos contratados. A recorrente tem, assim, razão na discordância que manifesta sobre a decisão que sem embargo de se não ter provado que os trabalhos extra, revestindo autonomia em face da empreitada ajustada haviam sido (verbalmente) contratados, poderia e deveria atender aos mesmos para condenar a R a pagar à A aquele valor monetário, como medida do incremento por eles trazido ao valor patrimonial da casa.”] Desta forma entendeu o tribunal que dono da obra apenas tem direito a recusar o pagamento das obras novas realizadas sem a sua autorização, se as recusou previamente. Resultando provado que a dona da obra continuou a morar na casa durante o decurso das obras e que nunca recusou as obras novas realizadas pelo empreiteiro nem pediu a sua eliminação, não tem direito a recusar o pagamento. Tendo as obras valorizado a casa de habitação, deve o empreiteiro ser indemnizado pelo valor acrescido resultante dessas obras, com fundamento no enriquecimento sem causa. Mesmo que não tenha autorizado todas as obras realizadas, mas tendo delas tirado proveito, deve o dono da obra pagar ao empreiteiro todas as despesas da sua realização. Conforme se entende a partir do supra citado acórdão, não é licito que o empobrecimento por parte do empreiteiro na execução de novas obras ainda que não solicitadas pelo comitente não seja por este compensado. Pela leitura do acórdão entendemos ainda que o dono de obra estaria de boa fé a introduzir novas obras na casa sob o consentimento (ainda que tácito) do comitente que durante a execução acompanhou os trabalhos. Entendemos assim que o legislador criou regimes que não só salvaguardam não só os interesses legítimos do dono de obra como também têm em atenção o esforço económico dispendido pelo empreiteiro, merecendo esse esforço a tutela dos já citados institutos.

CONCLUSÃO No presente estudo começamos por definir o conceito de alterações à obra. Percebemos que existem requisitos para que a execução de forma diversa do convencionado sejam consideradas alterações. Partindo do pressuposto de que se tratam efectivamente de alterações à obra, descrevemos ao longo deste trabalho os diversos casos em que o plano convencionado no contrato de empreitada pode ser alterado e procurámos salientar os direitos e deveres que nesses casos incubem aos contraentes. Salientamos que as alterações podem surgir em quatro formas distintas. As por iniciativa do empreiteiro que obedecem aos estipulado no artigo 1214.º CC, e que se operam segundo as regras expostas. As alterações necessárias, que surgem sem iniciativa de qualquer dos contraentes mas que se tornam essenciais no decurso da execução da obra por regras técnicas, ou direitos de terceiro. Vimos que nestes casos pode ser necessário alterar não só a obra mas também outros elementos do contrato original como por exemplo, o preço ou o tempo estipulado para a execução. Sendo que estas alterações não dependem da vontade das partes, salientámos que no caso de estas não chegarem a acordo cabe ao tribunal pronunciar-se acerca dos ajustes necessários ao contrato conforme dispostro no artigo 1215.º CC.

Por ser o principal interessado no resultado do contrato de empreitada o dono da obra tem o direito de exigir ao empreiteiro alterações ao plano convencionado conforme dispõe o artigo 1216.º n.º 1 CC. Esta é uma excepção ao já referido artigo 406.º CC, pois é um dos casos em que a lei permite que um contrato seja unilateralmente alterado.

Contudo, este direito do comitente não é infinito e deve respeitar dois requisitos: o valor das alterações não deve exceder a quinta parte do preço estipulado, e não devem ocorrer modificações da natureza da obra.

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Alterações Ao Plano Convencionado No Contrato De empreitada

Quanto às alterações exigidas pelo dono de obra, referimos o interesse directo que este pode ter em alterar o plano convencionado razão pela qual o empreiteiro fica adstrito a realizar este tipo de alterações, sendo que o preço e tempo de execução devem nestes casos ser actualizados e aplicados ao novo plano. Tal como nas alterações necessárias, também nestas o empreiteiro pode denunciar caso o valor das alterações ultrapasse vinte por cento do inicialmente previsto, ou seja alterada a natureza da obra. Desta forma o legislador protege o empreiteiro contra a ­possibilidade­de se ver obrigado a executar uma obra para a qual não tem capacidade económica ou competências técnicas.

O artigo não está escrito segundo o novo acordo ortográfico.

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BIBLIOGRAFIA MARTINEZ, Pedro Romano: Contrato de Empreitada, Almedina, ed. 1994 P. de LIMA e A. VARELA: Código Civil Anotado, Vol. II. PITÃO, José António de França : Contrato de Empreitada – Anotado, Almedina.

JURISPRUDÊNCIA CONSULTADA Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão 11 Outubro 2005 Acórdão 19 Abril 2004 do Tribunal da Relação de Coimbra Acórdão 26 de Abril de 2006 do Tribunal da Relação de Coimbra

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A PRIVACIDADE DOS CONSUMIDORES RUTE COUTO Docente e Directora do Curso de Solicitadoria do Instituto Politécnico de Bragança Presidente da delegação de Trás-os-Montes da Associação Portuguesa de Direito do Consumo

1. INTRODUÇÃO

“Todo o progresso técnico é, ao mesmo tempo, fonte de libertação e servidão”1

N

a história da humanidade, nem sempre a privacidade foi uma dimensão valorizada2, podendo atribuir-se a génese deste direito a Samuel Warren e Louis Brandeis quando afirmaram o right to be let alone no seu artigo “The right to privacy” publicado no Harvard Law Review em 1890.3 Desde então, as instâncias internacionais e os diferentes ordenamentos jurídicos acolheram a privacidade como essencial na tutela da pessoa humana.4 Em Portugal, a Constituição da República Portuguesa (CRP) eleva à categoria de direitos fundamentais o direito à reserva da intimidade da vida privada (artigo 26.º n.º 1 CRP) e o “direito à autodeterminação informativa”, no que se refere à protecção dos dados pessoais face à informática (artigo 35.º CRP).5 Por sua vez, o Código Civil (CC) português consagra este direito especial de personalidade, estabelecendo, no seu artigo 80.º, que “todos devem guardar reserva quanto à intimidade da vida privada de outrem” e que “a extensão da reserva é definida conforme a natureza do caso e a condição das pessoas”. Mas, tomando Faria Costa, “a historicidade trouxe-nos o bálsamo do refúgio da privacidade, mas trouxe-nos também – talvez em relação de recíproca causalidade – os instrumentos, a técnica, que permite violar avassaladoramente aquele mesmo valor”6.

Garcia Marques, Telecomunicações e protecção de dados (Do número nacional único aos novos atentados à vida privada). (In As Telecomunicações e o Direito na Sociedade da Informação, p. 90). 2  Cf. Diogo Leite de Campos (A Imagem que dá Poder: Privacidade e Informática Jurídica, p. 294 e segs.), a propósito da contemporaneidade do conceito de privacidade, “desconhecido, mais, rejeitado, nas sociedades que precederam a nossa”. 3  Para a contextualização deste célebre escrito, cf. Catarina Sarmento e Castro, Direito da Informática, Privacidade e Dados Pessoais, p. 17-18. 4  A propósito da evolução de diversas legislações nesta matéria, cf. Têmis Limberger, Da evolução do direito a ser deixado em paz à protecção dos dados pessoais, p. 276-280. 5  Cf. Catarina Sarmento e Castro, Direito da Informática, Privacidade e Dados Pessoais, p. 22-39. 6  Cf. José de Faria Costa, As Telecomunicações e a privacidade: o olhar (in)discreto de um penalista, p. 77. 1

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A Privacidade Dos consumidores

RESUMO Na moderna sociedade de consumo, muitas práticas e formas de comunicação comercial comportam riscos para a privacidade dos consumidores. O regime jurídico de protecção de dados pessoais é o mote para uma reflexão em torno de algumas situações particularmente lesivas da intimidade do cidadão-consumidor, como sejam a videovigilância, as comunicações publicitárias não solicitadas (spam) e os testemunhos de conexão online (cookies).

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O Big Brother está presente, ainda que em moldes diferentes dos prenunciados por George Orwell no seu “1984”. Bastará atentar no relato de Wolfgang Sofsky7 para os mais desatentos se consciencializarem que vivemos numa sociedade “aquário”8, em que quase todos os movimentos quotidianos são registáveis e controláveis. Os rastos que deixamos são “o custo, o perigo e o bem de vivermos neste tempo”9. Mais do que uma construção doutrinal destas temáticas, pretendemos neste texto apresentar os traços fundamentais do regime de protecção dos dados pessoais e da privacidade na ordem jurídica nacional, e partilhar um conjunto de preocupações sobre alguns dos riscos que hoje se verificam relativamente à protecção da privacidade dos cidadãos. Escolhemos como sujeito das nossas reflexões o consumidor, pela sua vulnerabilidade num contexto histórico e social em que os dados não valem por si só, mas pelo seu conteúdo económico e valor de mercado. Os dados pessoais, na medida em que traduzem aspectos de personalidade, incluindo perfis de consumo, têm importância “para a propaganda e o comércio”10 e, nessa medida, são frequentes os tratamentos ilícitos de dados pessoais no âmbito da actividade de marketing e publicidade, com consequente lesão da privacidade dos consumidores.

2. PROTECÇÃO DOS DADOS PESSOAIS E DA PRIVACIDADE A Lei da Protecção de Dados Pessoais (LPDP)11 define dados pessoais como “qualquer informação, de qualquer natureza e independentemente do respectivo suporte, incluindo som e imagem, relativa a uma pessoa singular identificada ou identificável (‘titular dos dados’)”. Na medida em que se considera ser identificável “a pessoa que possa ser identificada directa ou indirectamente, designadamente por referência a um número de identificação ou a um ou mais elementos específicos da sua identidade física, fisiológica, psíquica, económica, cultural ou social” [artigo 3.º a) LPDP], estão incluídos neste conceito dados tais como os números de identificação, matrícula da viatura, dados biométricos (impressão digital, íris, etc.), perfil de ADN, sistemas de GPS, perfis de consumo, etc., de índole e susceptibilidade diversas. A qualificação como “dados pessoais” não exige, portanto, a menção do nome de alguém, mas sim que seja possível atribuir informações a pessoas. Aliás, como realça Catarina Sarmento e Castro, “o que verdadeiramente torna ‘apetecível’ uma listagem de nomes, é o facto de estes estarem associados a outras características”12. Ainda no plano dos principais conceitos, a LPDP define tratamento de dados pessoais de forma abrangente como “qualquer operação ou conjunto de operações sobre dados pessoais, efectuada com ou sem meios automatizados, tais como a recolha, o registo, a organização, a conservação, a adaptação ou alteração, a recuperação, a consulta, a utilização, a comunicação por transmissão, por difusão ou por qualquer outra forma de colocação à disposição, com comparação ou interconexão, bem como o bloqueio, apagamento ou destruição” [artigo 3.º b) LPDP], sendo o responsável pelo tratamento “a pessoa singular ou colectiva, a autoridade pública, o serviço ou qualquer outro organismo que, individualmente ou em conjunto com outrem, determine as finalidades e os meios de tratamento de dados pessoais” [artigo 3.º d) LPDP].

Escolhemos como sujeito das nossas reflexões o consumidor, pela sua vulnerabilidade num contexto histórico e social em que os dados não valem por si só, mas pelo seu conteúdo económico e valor de mercado.

O autor de “Privacy, a Manifesto” descreve, no capítulo “Traces”, um dia na vida de um cidadão, sob escrutínio constante. Cf. http://press.princeton.edu/chapters/s8725.html 8  Paulo Mota Pinto (O Direito à Reserva sobre a Intimidade da Vida Privada, p. 585) alude à necessidade de tutela jurídica eficaz “para evitar que que cada um de nós se sinta a viver numa «casa de cristal» com «paredes de vidro» que não pode sequer embaciar a seu gosto”. Também José de Faria Costa (O Direito Penal, a Informática e a Reserva da Vida Privada, p. 308) refere o “risco de «vitrificação» da nossa existência”. 9  Cf. José de Faria Costa, O Direito Penal, a Informática e a Reserva da Vida Privada, p. 308. 10  Cf. Têmis Limberger, Da evolução do direito a ser deixado em paz à protecção dos dados pessoais, p. 269. 11  Lei n.º 67/98, de 26 de Outubro (com a Rectificação n.º 22/98, de 28 de Novembro), que transpõe para a ordem jurídica portuguesa a Directiva 95/46/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de Outubro de 1995, relativa à protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento dos dados pessoais e à livre circulação desses dados. 12  Cf. Catarina Sarmento e Castro, Direito da Informática, Privacidade e Dados Pessoais, p. 70. Como exemplos dessas características, a autora refere a profissão e a doença. 7

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A Privacidade Dos consumidores

O tratamento de dados pessoais é uma “tarefa de responsabilidade”13, que impõe ao seu responsável um conjunto de obrigações. Apresentamos aqui os traços gerais desse regime jurídico, em cinco dos seus aspectos cruciais: a qualidade dos dados, a legitimidade do tratamento, os direitos do titular dos dados, as garantias de segurança e confidencialidade e a intervenção da Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD). A qualidade dos dados pessoais afere-se pela concretização dos critérios vertidos no artigo 5.º LPDP: licitude e boa fé, finalidade, adequação e proporcionalidade, exactidão e conservação. Os dados pessoais devem ser tratados de forma lícita e conforme à boa fé. Tal imperativo reflecte ainda o princípio geral de que “o tratamento de dados pessoais deve processar-se de forma transparente e no estrito respeito pela reserva da vida privada, bem como pelos direitos, liberdades e garantias fundamentais” (artigo 2.º LPDP). É determinante a questão da finalidade na utilização de dados pessoais, quer na recolha dos dados (“para finalidades determinadas, explícitas e legítimas”), no seu tratamento (“não podendo ser posteriormente tratados de forma incompatível com essas finalidades”14) e na conservação (“…apenas durante o período necessário para a prossecução das finalidades da recolha ou do tratamento posterior”). A finalidade constitui ainda o referencial de valoração para a adequação, pertinência e proporcionalidade dos dados. Como adiante melhor referiremos, a finalidade é elemento essencial dos direitos do titular dos dados, nomeadamente o de ser informado, na recolha, sobre o destino dos dados recolhidos e o de posteriormente obter do responsável pelo tratamento mais informações. E a utilização de dados pessoais para fins que não foram determinantes na recolha impõe um controlo adicional por parte da autoridade de controlo. Os dados pessoais devem ser exactos e actualizáveis, o que fundamenta o correspondente direito dos titulares de acesso de apagamento ou rectificação dos dados inexactos ou incompletos. Finalmente, os dados pessoais não podem ser conservados de forma ilimitada temporalmente, mas tão somente de forma a permitir a identificação dos seus titulares durante o período necessário para a prossecução das finalidades da recolha. A lei salvaguarda a possibilidade de conservação por período superior para fins históricos, estatísticos ou científicos, mediante autorização da CNPD. Ao reflectirmos sobre os vários tratamentos de dados pessoais a que somos sujeitos no nosso quotidiano, facilmente concluímos que se muitos só se realizam porque nós em tal assentimos15, outros há em que a falta de consentimento do titular não inviabiliza a realização da operação sobre os seus dados16. São, portanto, duas as condições de legitimidade do tratamento de dados: consentimento do titular17 (corpo do artigo 6.º LPDP) ou necessidade do tratamento para um dos efeitos previstos na lei [artigo 6.º a) a e) LPDP], a saber: execução de contrato(s) em que o titular dos dados seja parte ou diligências contratuais prévias; cumprimento de obrigação legal do responsável pelo tratamento; protecção de interesses vitais do titular dos dados, se este estiver incapaz (física ou legalmente) de dar o seu consentimento; execução de missão de interesse público ou exercício de autoridade pública; e prossecução de interesses legítimos do responsável pelo tratamento (ou de terceiros a quem os dados sejam comunicados) desde que não devam prevalecer os interesses ou os direitos, liberdades e garantias do titular dos dados.18 Há situações em que a natureza dos dados ou do seu tratamento ditaram a especificação deste regime geral, e que aqui apenas enunciaremos. É o caso dos dados sensíveis, i. e. referentes a convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa, vida privada e origem racial ou étnica, saúde e vida sexual, incluindo os dados genéticos (artigo 7.º LPDP)19, dados Cf. Catarina Sarmento e Castro, Direito da Informática, Privacidade e Dados Pessoais, p. 65. Para exemplos de compatibilidade ou incompatibilidade com as finalidades da recolha, cf. Catarina Sarmento e Castro, Direito da Informática, Privacidade e Dados Pessoais, p. 231-235. 15  Muitas vezes pelo simples clicar de um “aceito” em inúmeros formulários na internet. 16  Não poderíamos, por exemplo, exigir que se desligassem as câmaras de videovigilância num banco à nossa entrada ou negar-nos a fornecer um conjunto de informações imperativas num contrato de seguro, crédito ou outro. 17  Definido como “qualquer manifestação de vontade, livre, específica e informada, nos termos da qual o titular aceita que os seus dados pessoais sejam objecto de tratamento” [artigo 3.º h) LPDP]. 18  Cf. Catarina Sarmento e Castro, Direito da Informática, Privacidade e Dados Pessoais, p. 205-213. 19  Sobre o fundamento de dados sensíveis, nomeadamente a regra geral de proibição e os dois fundamentos de excepção (lei ou consentimento), cf. Catarina Sarmento e Castro, Direito da Informática, Privacidade e Dados Pessoais, p. 88-99 e p. 215-227. 13

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Rute Couto

r­ elativos­a suspeitas de actividades ilícitas, infracções penais e contra-ordenações(artigo 8.º LPDP) e a interconexão de dados, ou seja, a “possibilidade de relacionamento dos dados de um ficheiro com os dados de um ficheiro ou ficheiros mantidos por outro ou outros responsáveis, ou mantidos pelo mesmo responsável com outra finalidade” [artigos 3.º i) e 9.º LPDP]. Como contraponto dos princípios gerais de qualidade dos dados pessoais, os seus titulares beneficiam de determinados direitos. A lei refere quatro: direito de informação (artigo 10.º LPDP), de acesso (artigo 11.º LPDP), de oposição (artigo 12.º LPDP) e de não ficar sujeito a uma decisão individual automatizada (artigo 13.º LPDP).20 Ao titular de dados pessoais deve ser prestado um conjunto de informações, nomeadamente quanto à identidade do responsável pelo tratamento, as finalidades, o destinatário dos dados21, o carácter obrigatório ou facultativo da resposta e as condições do direito de acesso e rectificação. De forma particular, no caso de recolha de dados em redes abertas, o titular deve ser informado dos riscos inerentes à circulação na rede sem condições de segurança e eventual acesso por terceiros não autorizados.22 Além disso, tem o titular o direito de obter do responsável pelo tratamento – “livremente e sem restrições, com periodicidade razoável e sem demoras ou custos excessivos” – confirmação daquelas informações, conhecimento da lógica subjacente ao tratamento automatizado, rectificação, apagamento ou bloqueio. Por último, o titular dos dados tem direito de se opor ao tratamento dos dados pessoais que lhe digam respeito, “por razões ponderosas e legítimas relacionadas com a sua situação particular” [artigo 12.º a) LPDP] ou no caso de dados pessoais usados para efeitos de marketing directo ou prospecção [artigo 12.º b) LPDP]. O responsável pelo tratamento deve providenciar pela segurança dos dados pessoais, implementando medidas técnicas e organizativas, que impeçam qualquer ofensiva à integridade daqueles dados. Tais medidas podem incluir a segurança física nas instalações (restrição de acesso, sistemas de alarme, etc.) e segurança do sistema informático (passwords, cópias de backup, informação encriptada, etc.), de forma especialmente acautelada no caso de dados sensíveis e registos de dados de natureza criminal ou contra-ordenacional. Além disso, todas as pessoas que nas suas funções tenham conhecimento de dados pessoais tratados ficam obrigadas a sigilo profissional (artigo 17.º LPDP), e a sua violação é considerada crime (artigo 47.º LPDP). A Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) é uma entidade administrativa independente, que funciona junto da Assembleia da República, e que tem como principal atribuição controlar e fiscalizar o cumprimento das disposições normativas relativas à protecção de dados pessoais.23 Em matéria de tratamento de dados pessoais, e no que se refere ao grau de intervenção da CNPD, podemos recorrer a uma metáfora com um semáforo e as suas três cores: – Como “luz verde”, temos as situações de isenção de notificação, por razões de celeridade, economia e eficiência para as categorias de dados insusceptíveis de pôr em causa os direitos e liberdades dos titulares (artigo 27.º n.º 2 LPDP).24 – Em “luz amarela”, a generalidade dos tratamentos de dados pessoais implica a obrigatoriedade de notificação à CNPD para efeitos de registo25 (artigo 27.º LPDP). Esta notificação deve ser 20  De forma mais detalhada, Catarina Sarmento e Castro (Direito da Informática, Privacidade e Dados Pessoais, p. 239262) explana os direitos ao esquecimento, à curiosidade, de informação, de acesso, de rectificação e actualização, de pagamento ou bloqueio dos dados, de não se ficar sujeito a uma decisão individual automatizada, de oposição (em particular no marketing directo) e ao não tratamento de dados sensíveis. 21  Cf. artigo 3.º g) LPDP, “a pessoa singular ou colectiva, a autoridade pública, o serviço ou qualquer outro organismo a quem sejam comunicados dados pessoais, independentemente de se tratar ou não de um terceiro, sem prejuízo de não serem consideradas destinatários as autoridades a quem sejam comunicados dados no âmbito de uma disposição legal”. 22  Cf. artigo 10.º n.º 4 LPDP. 23  Cf. artigos 21-31 LPDP. 24  Foram assim considerados o processamento de retribuições, prestações, abonos de funcionários ou empregados (autorização de isenção n.º 1/99), a gestão de utentes de bibliotecas e arquivos (autorização de isenção n.º 2/99), a facturação e gestão de contactos com clientes, fornecedores e prestadores de serviços (autorização de isenção n.º 3/99), a gestão administrativa de funcionários, empregadores e prestadores de serviços (autorização de isenção n.º 4/99), o registo de entradas e saídas de pessoas em edifícios (autorização de isenção n.º 5/99) e a cobrança de quotizações em associações e contactos com os respectivos associados (autorização de isenção n.º 6/99). Todas as isenções, publicadas no Diário da República n.º 22, II série, de 27 de Janeiro de 2000, podem ser consultadas em http://www.cnpd.pt/bin/legal/isencoes.htm. 25  O registo público está disponível em http://www.cnpd.pt/bin/registo/registo.htm

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feita antes da realização do tratamento de dados, mediante um formulário disponível online no sítio da CNPD.26 A omissão desta obrigação de notificação implica responsabilidade contra-ordenacional (se por negligência)27 ou criminal (em caso de conduta intencional)28. – Os casos de “luz vermelha” são os tratamentos de dados que carecem de autorização da CNPD (artigo 28.º CNPD). Já não se trata aqui de um mero registo, mas sim de um controlo prévio a que ficam sujeitos: a) os tratamentos de dados pessoais sensíveis, ou dados relativos a suspeitas de actividades ilícitas, infracções penais, contra-ordenações e decisões que apliquem penas, medidas de segurança, coimas e sanções acessórias; b) o tratamento de dados relativos ao crédito e solvabilidade; c) a interconexão de dados pessoais; e d) a utilização de dados pessoais para fins não determinantes da recolha.29 Atentemos agora em algumas situações especialmente danosas da privacidade dos consumidores.

3. “SORRIA, ESTÁ A SER FILMADO”: A VIDEOVIGILÂNCIA O legislador inclui na definição de dados pessoais o “som e imagem” [artigo 3.º a) LPDP] e expressamente dispõe que o regime jurídico de protecção de dados pessoais se aplica “à videovigilância e outras formas de captação, tratamento e difusão de sons e imagens que permitam identificar pessoas” (artigo 4.º n.º 4 LPDP).30 Presente em vários domínios do quotidiano31, a videovigilância está normalmente associada à segurança de pessoas e bens, mas pode encobrir outras finalidades. Têmis Limberger alerta que “pode haver câmaras em locais sob o pretexto de vigilância que, na realidade, servem para observar perfis de consumo, em um completo desvio de finalidade” e cita o caso de um estabelecimento comercial norte-americano que filma as reacções dos seus consumidores, para avaliar, por exemplo, quais os produtos que lhes prendem mais a atenção e as expressões faciais perante os preços praticados.32 Os tratamentos de videovigilância estão sujeitos a notificação à CNPD, que para o efeito disponibiliza no seu sítio um formulário geral e outros adaptados às exigências de actividades específicas33. A Comissão definiu os “princípios sobre o tratamento de dados por videovigilância”34, discriminando os parâmetros a considerar no controlo prévio a estes tratamentos de dados. 26  Em http://www.cnpd.pt/bin/legal/forms.htm, subdivididos em “Formulário Geral de Notificação”; “Formulário Biometria” (controlo de acessos e/ou assiduidade dos trabalhadores) e “Formulários de Videovigilância”. 27  Cf. artigo 37.º LPDP. 28  Cf. artigo 43.º n.º 1 a) LPDP. 29  Cf. tabela anexa à Deliberação da CNPD n.º 50/2011, disponível em http://www.cnpd.pt/bin/legal/Del50_2011.pdf 30  São ainda relevantes, neste domínio, o Decreto-Lei n.º 35/2004 (alterado pelos DL n.º 198/2005, de 10/11, Lei n.º 38/2008, de 08/08, DL n.º 135/2010, de 27/12 e DL n.º 114/2011, de 30/11), que regula o exercício da actividade de segurança privada, e a Lei n.º 1/2005 (alterada pelas Lei n.º 39-A/2005, de 29/07, Lei n.º 53-A/2006, de 29/12 e Lei n.º 9/2012, de 23/02), que regula a utilização de câmaras de vídeo pelas forças e serviços de segurança em locais públicos de utilização comum. Existe ainda legislação avulsa, referente a instituições de crédito, recintos desportivos, estabelecimentos de restauração e bebidas com espaços de dança, etc. 31  Catarina Sarmento e Castro (Direito da Informática, Privacidade e Dados Pessoais, p. 123) aponta, como exemplos de utilização, o controlo de fluxos de trânsito, o acesso de veículos a zonas de circulação limitada, a protecção do ambiente e património cultural, a protecção de pessoas e bens, e a garantia das condições de segurança em meio laboral. Para além destas, Garcia Marques e Lourenço Martins (Direito da Informática, p. 170) mencionam a detecção precoce de fogos e a fiscalização do cumprimento da obrigação de permanência na habitação. Os autores referem ainda (p. 171, nota 207) um estudo segundo o qual no centro de Londres [num país onde os sistemas de videovigilância têm um elevado grau de penetração] uma pessoa é filmada em média 300 vezes por dia. 32  Cf. Têmis Limberger, Da evolução do direito a ser deixado em paz à protecção dos dados pessoais, p. 271. 33  Actualmente estão disponíveis (em http://www.cnpd.pt/bin/legal/forms_video.htm) formulários para: Armeiros; Bancos e outras instituições financeiras; Casinos / Bingos; Condomínios; Discotecas com lotação entre 101-1000 lugares; Discotecas com lotação superior a 1000 lugares; Escolas e outros estabelecimentos de ensino; Escritórios e Serviços; Farmácias, parafarmácias e similares; Gasolineiras; Hospitais e outros estabelecimentos de saúde; Hotéis e outros estabelecimentos de hotelaria; Igrejas e outros locais de culto; Indústrias e outras instalações de fabrico ou reparação; Lares e outros estabelecimentos para a 3.ª idade; Moradias e outras residências unifamiliares; Museus/Bibliotecas/ Salas de espectáculo; Ourivesarias/Joalharias/Relojoarias; Parques de estacionamento; Recintos desportivos; Restaurantes e outros estabelecimentos de restauração; Outros estabelecimentos comerciais de venda ao público. 34  Cf. Deliberação da CNPD n.º 61/2004, disponível em http://www.cnpd.pt/bin/orientacoes/DEL61-2004-VIDEOVIGILANCIA.pdf.

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Importa realçar que a única finalidade admitida pela CNPD é a “protecção de pessoas e bens”, admitindo-se a utilização posterior das imagens nos termos da lei processual penal.35 O legislador expressamente proíbe – no artigo 20.º do Código do Trabalho – que estes meios de vigilância sejam utilizados para controlar o desempenho profissional dos trabalhadores, norma que a CNPD traduz na determinação de que as câmaras não podem incidir regularmente sobre os trabalhadores durante a actividade laboral. Catarina Sarmento e Crasto faz notar a dupla exigência ao nível do cumprimento do princípio da proporcionalidade: proporcionalidade da utilização (no sentido de que, atentas as finalidades, só deverão ser implementados meios de videovigilância se não existirem outros meios menos onerosos para a privacidade) e proporcionalidade na utilização (relevando aspectos tais como o número de câmaras, a sua localização e orientação, o alcance do zoom, etc.).36 Quanto ao prazo de conservação dos dados, quando não exista diploma específico que o preveja, o entendimento da CNPD tem sido no sentido de fixar o prazo máximo de 30 dias (previsto no artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 35/2004, de 21 de Fevereiro, que regula a segurança privada), findo o qual as gravações devem ser destruídas.37 Os responsáveis pela implementação de sistemas de videovigilância ficam adstritos à obrigação de informar os titulares dos dados (aqueles cuja imagem for captada pelas câmaras) sobre tal recolha, mediante a afixação de aviso com o teor “Para sua protecção, este lugar encontra-se sob vigilância de um circuito fechado de televisão” ou “Para sua protecção, este lugar encontra-se sob vigilância de um circuito fechado de televisão, procedendo-se à gravação de imagem e som”, seguido de símbolo identificativo (artigo 13.º n.º 3 do Decreto-Lei n.º 35/2004). Uma observação ainda para o “terrorismo psicológico” que tem justificado muitas das actuais tecnologias de videovigilância, sobretudo no período pós-11 de Setembro38. A esse propósito, ponderam Garcia Marques e Lourenço Martins que “com os progressos da tecnologia, cada vez menos coisas, cada vez menos actos da nossa vida fugirão à atenção dessas máquinas sofisticadas e invasoras. Importa, por isso, procurar evitar que as preocupações de segurança – razoáveis e imperiosas – que tanto têm contribuído para o apertar da malha tecnológica da vigilância levem à perda da privacidade e à devassa permanente da vida dos cidadãos comuns”.39 O mesmo se diga quanto à preocupação com as crianças, em que os legítimos receios dos progenitores pela sua segurança poderiam conduzir a mecanismos de hiper-vigilância com consequências na conformação de comportamentos e personalidades. Luísa Neto refere a propósito a decisão, pela CNPD, de não-autorização de câmaras em determinados espaços de uma creche, já que tal podia criar nas crianças “a habituação ou aceitação natural da sujeição a tal modo de controlo, na sua vida futura”.40

Presente em vários domínios do quotidiano, a videovigilância está normalmente associada à segurança de pessoas e bens, mas pode encobrir outras finalidades

A propósito do fundamento legitimante do tratamento de dados pessoais por via de videovigilância, Catarina Sarmento e Castro (Direito da Informática, Privacidade e Dados Pessoais, p. 136 e segs) analisa várias hipóteses. Desde logo, pode considerar-se a imagem (e som) como um dado relativo à vida privada e, como tal, enquadrável nos “dados sensíveis” objecto da especial regulamentação do artigo 7.º LPDP. A autora defende que o fundamento não deverá ser o do artigo 8.º n.º 2 LPDP, já que “o texto deste dispositivo da Lei não aponta num sentido de prevenção referida a uma vigilância indistinta e genérica, como será o caso da videovigilância para finalidades de protecção de pessoas e bens, mas para uma ideia de ‘suspeita de actividades ilícitas’, de vigilância concreta, dirigida a indivíduos específicos previamente determinados (…) ou para situações em que já existe ou está em curso a aplicação de sanção por ‘infracções penais’, ou em que se verifiquem ‘contra-ordenações’ ou ‘decisões que decisões que apliquem penas, medidas de segurança, coimas e sanções acessórias’”. Também o facto de existirem avisos a alertar os consumidores para o facto de estarem a ser filmados não poderá considerar-se um consentimento tácito – tanto mais que para dados sensíveis se exige consentimento expresso – mas antes o cumprimento, por parte do responsável pelo tratamento, da obrigação de informação prevista no artigo 10.º LPDP. 36  Cf. Catarina Sarmento e Castro, Direito da Informática, Privacidade e Dados Pessoais, p. 150. A título exemplificativo, aludimos à Autorização n.º 1011/2009 (disponível em http://www.cnpd.pt/bin/decisoes/aut/10_1011_2009.pdf) em que a CNPD considerou legítima a instalação de câmaras na entrada e saída de um parque de campismo, mas já não na zona de campismo, por considerar que tal captação seria excessiva e desproporcional. Outras especificações frequentes nas autorizações da CNPD são as de que as câmaras não estejam direccionadas para os terminais de pagamento (por forma a não serem captadas imagens relativas à digitação dos códigos dos cartões bancários) e que se limitem ao perímetro da propriedade em questão (não envolvendo recolha de imagens de zonas limítrofes ou da via pública). 37  Cf. Catarina Sarmento e Castro, Direito da Informática, Privacidade e Dados Pessoais, p. 148. 38  A título de exemplo, refira-se os scanners corporais nos aeroportos. 39  Cf. Garcia Marques e Lourenço Martins, Direito da Informática, p. 172. 40  Cf. Luísa Neto, Acórdãos do TC n.os 213/2008 e 486/2009: a prova numa sociedade transparente, p. 343. 35

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4. “SPAM NÃO, OBRIGADO!”: AS COMUNICAÇÕES PUBLICITÁRIAS NÃO SOLICITADAS Luís Menezes Leitão41 preludia o tratamento desta temática com a constatação de que “as denominadas ‘autoestradas da informação’ não têm restrições à colocação de publicidade, ao contrário do que acontece com as autoestradas comuns. Esta situação é preocupante, uma vez que a conversão da internet num mar de publicidade pode levar a que se venha a perder o triunfo da humanidade que representou a sua criação”42. A publicidade reveste essencialmente duas funções, por um lado de informação ao consumidor e, por outro, de persuasão ou apelo à compra dos produtos ou serviços do anunciante. Como refere Carla Amado Gomes, a necessidade de estar informado para tomar convenientemente as suas decisões de consumo, expõe o consumidor à “radiação publicitária”; e se é evidente a utilidade informativa da publicidade, “a sua componente é predominantemente promocional, e nessa medida pode facilmente tornar-se desgastante”43. No “cerco tentacular da publicidade”44, a necessidade de protecção “contra o ataque da publicidade indiscreta, que agride o consumidor pela sua cadência e volume, violando a sua esfera mais privada”45 fundamenta a regulamentação normativa do fenómeno comummente designado por spam46 ou “lixo”.47 O spam constitui um óbice ao desenvolvimento do comércio electrónico por duas ordens de razões. Por um lado, pelo carácter indesejado e a multiplicidade de mensagens48, que podem inclusivamente qualificar a prática comercial como desleal49. Por outro lado, pelo conteúdo, já que muitas vezes o spam é utilizado com intentos ilícitos50, tais como a difusão de conteúdos ilegais, a prática de crimes informáticos e económicos, e a recolha ilegítima de dados pessoais, esta última aproveitando o desleixo dos utilizadores mais incautos que reenviam massivamente todo o género de “correntes”, sem confirmar a fidedignidade da informação veiculada e sem ocultar os endereços dos sucessivos destinatários das mensagens reencaminhadas.51 Em matéria de comunicações publicitárias não solicitadas, importa distinguir dois âmbitos: por um lado, o da publicidade domiciliária, que inclui a publicidade por via postal, distribuição directa, telefone e telecópia (regulada pela Lei n.º 6/99 de 27 de Janeiro) e por outro lado as O autor tem publicados três escritos sobre “spam”: A distribuição de mensagens de correio electrónico indesejadas (SPAM) (In Estudos em homenagem à Professora Doutora Isabel de Magalhães Collaço, p. 219-240), A distribuição de mensagens de correio electrónico indesejadas (SPAM) (In Direito da Sociedade da Informação, Volume IV - Separata 2003, p. 191-212) e Comunicações não solicitadas (spam) (In Lei do Comércio Electrónico Anotada, p. 213-238). Por serem no essencial análogos, referenciaremos aqui este último, o mais recente e actualizado face à Lei da privacidade nas comunicações electrónicas. 42  Cf. Luís Menezes Leitão, Comunicações não solicitadas (spam), p. 213. 43  Cf. Carla Amado Gomes, O direito à privacidade do consumidor – A propósito da Lei 6/99, de 27 de Janeiro, p. 102. 44  Cf. Carla Amado Gomes, O direito à privacidade do consumidor – A propósito da Lei 6/99, de 27 de Janeiro, p. 103. 45  Cf. Carla Amado Gomes, O direito à privacidade do consumidor – A propósito da Lei 6/99, de 27 de Janeiro, p. 90. 46  Sobre a origem do termo spam, cf. Cf. Luís Menezes Leitão, Comunicações não solicitadas (spam), p. 214, nota (1). 47  O spam é apelativo sobretudo pelo baixo custo e facilidade de disseminação para quem promove o seu envio. São incalculáveis, porém, os prejuízos que acarreta, quer para o fornecedor de acesso à rede quer para os utilizadores. Ao primeiro, por exigir do sistema maior capacidade de tráfico de mensagens e pelos danos à própria imagem do servidor. Aos utilizadores, sobretudo em termos de tempo, desconfiança perante o comércio electrónico, e privacidade. Cf. Luís Menezes Leitão (Comunicações não solicitadas (spam), p. 215. No mesmo texto (p. 218-232), o autor analisa as três formas de reacção contra o spam: através das normas sociais e da auto-regulação, através da técnica e a reacção jurídica (americana e europeia). 48  Cf. Luís Menezes Leitão (Comunicações não solicitadas (spam), p. 218). Alexandre Sousa Pinheiro (Comunicações não solicitadas (spam), p. 239 e segs) afirma que “o facto de a mensagem não ser solicitada não determina, de imediato, uma prática censurável”, ressalvando as situações em que se trate de uma única comunicação destinada a promover uma actividade lícita. 49  Cf. artigo 12.º c) do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26 de Março (que estabelece o regime aplicável às práticas comerciais desleais das empresas nas relações com os consumidores): “São consideradas agressivas, em qualquer circunstância, as seguintes práticas comerciais: (…) c) Fazer solicitações persistentes e não solicitadas, por telefone, fax, e-mail ou qualquer outro meio de comunicação à distância, excepto em circunstâncias e na medida em que tal se justifique para o cumprimento de obrigação contratual”. 50  Cf. Luís Menezes Leitão (Comunicações não solicitadas (spam), p. 215) e Alexandre Sousa Pinheiro (Comunicações não solicitadas (spam), p. 243). 51  São disso exemplo os falsos pedidos de dádivas de sangue e de procura de crianças desaparecidas. Por vezes, uma simples pesquisa num motor de busca permite identificar o expediente fraudulento, cuidado a que se deve aliar a utilização da funcionalidade de bcc no envio das mensagens de correio electrónico. 41

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c­ omunicações electrónicas, nomeadamente a publicidade por correio electrónico (agora reguladas na Lei n.º 41/2004 de 18 de Agosto, alterada pela Lei n.º 46/2012 de 29 de Agosto52)53. A salvaguarda dos direitos constitucionais à liberdade de expressão e iniciativa económica não se compadece com a proibição absoluta de qualquer comunicação não solicitada54, daí a tónica ser colocada no consentimento do receptor à recepção de comunicações publicitárias, por uma de duas vias: o sistema de opção positiva (ou opt-in) significa que apenas pode ser enviada uma comunicação comercial se o seu destinatário previamente tiver manifestado esse desejo de recebimento; o sistema de opção negativa (ou opt-out) permite o envio de comunicações publicitárias até ao momento em que o receptor manifesta a vontade de não mais as receber.55 Os dois sistemas convivem na ordem jurídica nacional, consoante o suporte publicitário em causa. No que se refere à publicidade recebida por via postal ou distribuição directa, rege o princípio do opt-out, i. e., o consumidor que não deseje receber publicidade no espaço físico da sua “caixa do correio”, terá de manifestar a sua oposição. No caso da publicidade não endereçada, essa oposição traduz-se na afixação de um dístico no local de recepção da correspondência56. Tratando-se de publicidade endereçada, a forma do destinatário manifestar o desejo de não receber material publicitário dependerá do alcance da sua recusa: se for uma oposição casuística, a um ou mais anunciantes em particular, o consumidor terá de contactar individualmente cada uma das entidades e exercer o seu direito de oposição [nos termos supra referidos do artigo 12.º b) LPDP]; já se se tratar de uma atitude de recusa generalizada, pode inscrever-se na designada “lista Robinson”57 ou lista de pessoas que manifestaram o desejo de não receber publicidade endereçada. Quanto às comunicações electrónicas não solicitadas para fins de marketing directo – e a lei inclui aqui as comunicações através da utilização de sistemas automatizados de chamada e comunicação que não dependam da intervenção humana (aparelhos de chamada automática), de aparelhos de telecópia ou de correio electrónico, incluindo SMS (serviços de mensagens curtas), EMS (serviços de mensagens melhoradas) MMS (serviços de mensagem multimédia) e outros tipos de aplicações similares (artigo 13.º-A Lei 41/2004) – o legislador consagrou um sistema de opt-in, ou seja, o envio de tais comunicações está sujeito a consentimento prévio e expresso do seu destinatário.58 Não tendo o legislador europeu optado por um opt-in generalizado, justifica-se aqui “tendo presente a sua natureza mais agressiva e intrusiva relativamente à publicidade por via postal”59 Admitem-se no entanto duas excepções, em que vigorará o sistema de opt-out: quando o destinatário seja uma pessoa colectiva (n.º 2 do artigo 13.º-A) ou um cliente com quem o fornecedor de bens ou serviços anteriormente contratou, desde que seja dada possibilidade de recusa no momento da recolha e em cada mensagem (n.º 3 do artigo 13.º-A). Para efeitos de aplicação deste regime, as entidades que promovam o envio de comunicações electrónicas para fins de marketing directo devem manter uma lista das pessoas que manifestaram o consentimento para a recepção deste tipo de comunicações (opt-in), bem como dos

A salvaguarda dos direitos constitucionais à liberdade de expressão e iniciativa económica não se compadece com a proibição absoluta de qualquer comunicação não solicitada, daí a tónica ser colocada no consentimento do receptor à recepção de comunicações publicitárias

Esta lei transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 2002/58/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Julho, relativa ao tratamento de dados pessoais e à protecção da privacidade no sector das comunicações electrónicas). Até à alteração de 2012, a matéria das comunicações não solicitadas estava enxertada no Decreto-Lei n.º 7/2004 de 7 de Janeiro (“lei do comércio electrónico”), no seu artigo 22.º. 53  O artigo 2.º n.º 1 a) da Lei n.º 41/2004, de 18 de Agosto define comunicação como “qualquer informação trocada ou enviada entre um número finito de partes mediante a utilização de um serviço de comunicações electrónicas acessível ao público”. A Lei n.º 6/99 de 27 de Janeiro inclui na publicidade domiciliária a publicidade por telefone e telecópia (artigo 5.º) e remete para o anterior regime jurídico da privacidade nas telecomunicações (Lei n.º 69/98 de 28 de Outubro), devendo hoje essa remissão ser entendida para o artigo 13.º-A da Lei n.º 41/2004, de 18 de Agosto (aditado pela Lei n.º 46/2012 de 29 de Agosto). 54  Cf. Luís Menezes Leitão, Comunicações não solicitadas (spam), p. 222. 55  Quanto aos prós e contras de cada um dos sistemas, cf. Luís Menezes Leitão (Comunicações não solicitadas (spam), p. 223). 56  Os mais usuais são os autocolantes amarelos facultados pela Direcção-Geral do Consumidor com a mensagem “Publicidade não endereçada, aqui não, obrigado!” (disponível em http://www.consumidor.pt?cfl=3818). 57  Assim apelidada numa alusão ao isolamento do famoso náufrago com o mesmo nome. Na realidade, se assim o pretender, o consumidor tem o direito a ficar sozinho numa “ilha” livre de comunicações exteriores. 58  Não é portanto lícita a prática habitual de incluir no final das mensagens de correio electrónico a menção de que “o email não poderá ser considerado SPAM, quando incluir uma forma do receptor ser removido da lista” já que tal traduz um sistema de opt-out e não de opt-in. 59  Cf. Garcia Marques e Lourenço Martins, Direito da Informática, p. 172, a propósito da publicidade por telefone e telecópia. 52

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A Privacidade Dos consumidores

c­ lientes que não se opuseram à sua recepção. Já os consumidores que manifestem expressamente opor-se à recepção de comunicações não solicitadas para fins de marketing directo (opt-out) devem inscrever-se na “lista Robinson” mensalmente actualizada pela Direcção-Geral do Consumidor (DGC)60 e que aquelas entidades devem consultar. O incumprimento destas regras implica responsabilidade contra-ordenacional [artigo 14.º n.º 1 f )-j) Lei 41/2004]. Proíbe-se ainda o envio de correio electrónico para fins de marketing directo, ocultando ou dissimulando a identidade do anunciante, ou sem a indicação de um meio de contacto válido para exercício do opt-out, ou ainda que incentive os destinatários a visitar sítios na internet que violem estes normativos. Uma nota final para as dificuldades práticas da coexistência de dois sistemas diferenciados de regulação do spam – o europeu e o norteamericano61 – face ao carácter universal da internet.

5. “ACEITAR COOKIES?”: OS TESTEMUNHOS DE CONEXÃO NA INTERNET Sempre que acedemos a um sítio na internet, a nossa navegação fica registada. “Um site não pode ser visitado sem que se deixem traços”62 e esses traços, quiçá pela analogia com a criança que vai deixando um rasto de migalhas quando come bolachas, são conhecidos por cookies. Um cookie é um arquivo de texto (ficheiro) colocado, através de sítios na internet, no computador, para armazenar informações sobre o utilizador e respectivas preferências, informações essas que podem ser “relidas” em futuras visitas ao sítio. 63 Um exemplo de cookie é o criado para guardar informações de login (utilizador e palavra-passe) para o utilizador não ter de iniciar a sessão de cada vez que visitar um sítio em particular. Os cookies podem ser temporários (também designados “cookies de sessão”) quando são removidos do computador após encerrar o browser de internet, como por exemplo, o cookie utilizado por um determinado sítio de comércio electrónico para armazenar os itens no ‘carrinho de compras’ durante o processo de compra. Mas os que constituem maior risco para a privacidade do utilizador de comunicações electrónicas são os cookies permanentes ou persistentes (os “cookies guardados”) que permanecem armazenados no computador, provenientes do próprio sítio que o utilizador está a visitar (cookies “originais”) ou de terceiros (através de anúncios publicitários em banners ou janelas pop-up no sítio visitado), estes últimos frequentemente utilizados para finalidades de marketing. Os cookies traduzem operações de recolha de informações pessoais, na maior parte das vezes sem conhecimento ou consentimento do seu titular, permitindo traçar perfis de comportamento, incluindo dados sensíveis, como a orientação sexual ou religiosa. Para os direitos dos consumidores, o grande perigo dos cookies advém da “exploração comercial das informações que recolhem” sendo inegável que “é efectivamente no âmbito da publicidade que a actuação dos cookies se torna mais valiosa”64. Por exemplo, é possível registar quais os bens pesquisados ou comprados num dado sítio de comércio electrónico, para numa futura visita o gestor do sítio destacar, nos espaços de publicidade, produtos ou serviços que sejam consonantes com as preferências daquele utilizador em concreto.65 60  A inscrição na lista nacional de não recepção de comunicações publicitárias podes ser feita no sítio da DGC ou Portal do Consumidor, em http://www.consumidor.pt. 61  Cf. Luís Menezes Leitão, Comunicações não solicitadas (spam), p. 222-232. 62  Cf. Garcia Marques e Lourenço Martins, Direito da Informática, p. 433. 63  Cf. Catarina Sarmento e Castro (Direito da Informática, Privacidade e Dados Pessoais, p. 160), Garcia Marques e Lourenço Martins (Direito da Informática, p. 440-441) e Luís Menezes Leitão, (Os testemunhos de conexão (cookies), p. 764). Na ‘Ajuda e Suporte do Windows’ pode ler-se que “Os Web sites utilizam cookies para oferecer uma experiência personalizada aos utilizadores e para recolher informações acerca da utilização do Web site. Muitos Web sites também utilizam cookies para armazenar informações que permitem oferecer uma experiência consistente entre as secções do site, tal com um carrinho de compras ou páginas personalizadas. Num Web site fidedigno, os cookies podem enriquecer a experiência permitindo que o site aprenda as preferências ou permitindo evitar o início de sessão de cada vez que visita um Web site. No entanto, alguns cookies, tais como os guardados pelas faixas de anúncios, poderão colocar a privacidade em risco, controlando os sites que são visitados.” 64  Cf. Luís Menezes Leitão, (Os testemunhos de conexão (cookies), p. 763 e 765. 65  A propósito, confira-se o Parecer 2/2010 sobre publicidade comportamental em linha, do “Grupo de Trabalho do Art.º 29” (órgão consultivo europeu independente em matéria de protecção de dados e de privacidade, instituído pelo artigo 29.º da Directiva 95/46/CE), disponível em http://ec.europa.eu/justice/policies/privacy/docs/ wpdocs/2010/wp171_pt.pdf.

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Rute Couto

Enquanto tratamento de dados, a utilização de cookies está sujeita ao regime jurídico da LPDP; nomeadamente no que se refere ao direito à informação e ao consentimento do titular. O regime da protecção da privacidade no sector das comunicações electrónicas (Lei n.º 41/2004) salvaguarda – no seu artigo 5.º – que “o armazenamento de informações e a possibilidade de acesso à informação armazenada no equipamento terminal de um assinante ou utilizador apenas são permitidos se estes tiverem dado o seu consentimento prévio, com base em informações claras e completas nos termos da Lei de Protecção de Dados Pessoais, nomeadamente quanto aos objetivos do processamento.” Como bem aponta Luís Menezes Leitão66, “a recolha de dados é completamente invisível, pelo que raramente se põe a questão do consentimento do titular”, sendo certo que a possibilidade conferida pelo browser de rejeitar ou aceitar cookies67, não poderá equivaler a um consentimento para recolha. Não se cumpre, ademais, o imperativo do artigo 10.º n.º 4 LPDP, de informar o utilizador de que os seus dados podem circular na rede sem condições de segurança.68 Na esteira da Directiva europeia – que admite que estes testemunhos de conexão possam ser um “instrumento legítimo e útil, nomeadamente na análise da eficácia da concepção e publicidade do sítio web, e para verificar a identidade dos utilizadores que procedem a transacções em linha”69 – o diploma de transposição admite a utilização de cookies quando a finalidade seja meramente técnica, ou seja, é permitido o armazenamento ou acesso de informações “que tenha como única finalidade transmitir uma comunicação através de uma rede de comunicações electrónicas” ou “estritamente necessário ao fornecedor para fornecer um serviço da sociedade de informação solicitado expressamente pelo assinante ou utilizador”70. Luis Menezes Leitão critica esta abertura, que considera “claramente excessiva”71, sobretudo se legitimar a prática de um sítio não permitir sequer o acesso aos utilizadores que rejeitem a instalação de cookies. A problemática dos cookies é paradigmática do facto de mesmo os utilizadores frequentes de serviços de comunicações electrónicas, desconhecerem muitas das práticas lesivas da sua privacidade, o que impõe a necessidade de uma reflexão crítica (e necessariamente global) em torno da protecção dos dados pessoais em circulação nas redes de comunicação.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Todas as invenções da humanidade são passíveis de aproveitamento para o bem e para o mal, e as tecnologias informáticas não são excepção. Num mundo que não seria hoje imaginável sem a internet e as suas infindas possibilidades, cada nova oportunidade de evolução representa uma nova ameaça de perturbação do equilíbrio individual e social. As mesmas tecnologias que são sinónimo de progresso e bem-estar, podem representar o enfraquecimento dos direitos de cidadania, entre os quais o direito à privacidade. Por outro lado, numa sociedade de vertiginoso consumo, a (hiper)vulnerabilidade do consumidor agudiza-se face a práticas comerciais cada vez mais intrincadas e invasivas da sua intimidade, seja no domicílio, nos espaços em que se movimenta, no mundo virtual. O intuito lucrativo não deveria afastar os profissionais da ética e da lealdade que se impõe nas relações de consumo, para que o cidadão-consumidor possa fazer as suas escolhas de forma informada e livre, sem ilegítimos controlos ou pressões.

Os cookies traduzem operações de recolha de informações pessoais, na maior parte das vezes sem conhecimento ou consentimento do seu titular, permitindo traçar perfis de comportamento, incluindo dados sensíveis.

As mesmas tecnologias que são sinónimo de progresso e bem-estar, podem representar o enfraquecimento dos direitos de cidadania, entre os quais o direito à privacidade.

Cf. Luís Menezes Leitão, Os testemunhos de conexão (cookies), p. 768-769. Para informação relativa à eliminação ou activação/desactivação de cookies, cf. http://dadus.cnpd.pt/filez/file/ apoio/cookies.pdf. Ademais, é conveniente aos utilizadores de internet a consulta das políticas de privacidade (no que se refere aos cookies) dos sites habitualmente utilizados. A título de exemplo, cf. as políticas do “Facebook” (http://www.facebook.com/help/cookies/), “Almedina” (http://www.almedina.net/catalog/privacy.php) e “Priberam” (http://www.priberam.pt/Informacao-Legal.aspx). 68  Já que apenas surge um texto do género “Um Website ‘(designação).com’ pediu para guardar um ficheiro no seu computador chamado ‘cookie’. Este ficheiro pode ser utilizado para rastrear informação de utilização. Deseja permitir isto?”. 69  Cf. Considerando (25) da Directiva 2002/58/CE. 70  Cf. artigo 5.º n.º 2 da Lei n.º 41/2004, de 18 de Agosto. 71  Cf. Luís Menezes Leitão, Os testemunhos de conexão (cookies), p. 773-774. 66  67

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A Privacidade Dos consumidores

Numa era de “interacção quase instantânea entre a realidade e o direito”72, são constantes os desafios que se colocam às instâncias político-legislativas. Em anteriores reflexões sobre o tema73, cuidamos já da importância de uma política educativa e do rigoroso cumprimento da legislação que disciplina a protecção de dados pessoais, evitando o risco de “banalização” da protecção da privacidade, em nome de lógicas de globalização, segurança ou económicas. Tendo sempre presente que os sistemas de tratamento de dados devem estar ao serviço do Homem74 e nunca o oposto.

O artigo não está escrito segundo o novo acordo autografico.

Cf. Cunha Rodrigues, Informática e Reserva da Vida Privada, p. 288. Cf. nossas Conclusões-Propostas das III Jornadas de Direito do Consumo de Trás-os-Montes, promovidas pela Associação Portuguesa de Direito do Consumo e pelo Instituto Politécnico de Bragança em 17 de Maio de 2011, disponíveis em http://www.netconsumo.com/2011/05/iii-jornadas-de-direito-do-consumo-de_70.html, no seu ponto II, relativo à “Protecção de Dados Pessoais e a Reserva da Privacidade dos Consumidores”: 72  73

1. Que se exija do Estado e dos Reguladores a promoção de uma activa política educativa em matéria de protecção dos dados pessoais e consciencialização dos cidadãos (em particular as gerações mais jovens) para a importância da “autodeterminação informacional” na preservação da reserva de privacidade, com especial relevo no contexto das redes sociais. 2. Que se garanta a efectividade do direito de oposição do consumidor à utilização dos seus dados pessoais para efeitos de marketing, nomeadamente pela afirmação da lista de pessoas que não desejam receber comunicações publicitárias (designada “lista Robinson”) e correspondente sancionamento das entidades infractoras. 3. Que se fiscalize com rigor as práticas de interconexão de dados pessoais, porquanto muitas correspondem a vendas de bases de dados - pouco transparentes e consolidadas em negócios de avultado valor entre empresas - à revelia dos direitos do consumidor e do seu consentimento. 4. Que se precise a responsabilidade pela segurança e confidencialidade dos tratamentos de dados pessoais, por forma a que se não caia na “inimputabilidade” justificada pela globalização, com diluição de condutas passíveis de responsabilidade contra-ordenacional ou criminal num falacioso universo de “crimes sem vítimas e sem culpados”. 74

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Cf. Considerando (2) da Directiva 95/46/CE.

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Referências Bibliograficas CAMPOS, Diogo Leite de: A Imagem que dá Poder: Privacidade e Informática Jurídica. In Comunicação e Defesa do Consumidor. Coimbra: Instituto Jurídico da Comunicação, 1996. p. 293-301. CASTRO, Catarina Sarmento e: Direito da Informática, Privacidade e Dados Pessoais. Coimbra: Almedina, 2005. ISBN 972-40-2424-5. COSTA, José de Faria: As Telecomunicações e a privacidade: o olhar (in)discreto de um penalista. In MONTEIRO, António Pinto (coord.) - As Telecomunicações e o Direito na Sociedade da Informação. Coimbra: Instituto Jurídico da Comunicação, 1999. ISBN 972-98462-0-0. p. 49-78. COSTA, José de Faria: O Direito Penal, a Informática e a Reserva da Vida Privada. In Comunicação e Defesa do Consumidor. Coimbra: Instituto Jurídico da Comunicação, 1996. p. 302-321. GOMES, Carla Amado: O direito à privacidade do consumidor – A propósito da Lei 6/99, de 27 de Janeiro. Revista do Ministério Público. Lisboa. ISSN 0870-6107. N.º 77 - Separata (1999), p. 89-103. LEITÃO, Luís Menezes: Comunicações não solicitadas (spam). In Lei do Comércio Electrónico Anotada. Coimbra : Coimbra Editora, 2005. ISBN 972-32-1320-6. p. 213-238. LEITÃO, Luís Menezes: Os testemunhos de conexão (cookies). In Homenagem da Faculdade de Direito de Lisboa ao Professor Doutor Inocêncio Galvão Telles – 90 anos. Coimbra: Almedina, 2007. p. 763-774. LIMBERGER, Têmis: Da evolução do direito a ser deixado em paz à protecção dos dados pessoais. Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Porto. ISSN 1645-1430. Ano VIII (2011), p. 267-292. MARQUES, Garcia; MARTINS, Lourenço: Direito da Informática. 2ª edição – refundida e actualizada. Coimbra: Almedina, 2006. ISBN 972-40-2859-3. NETO, Luísa: Acórdãos do TC n.os 213/2008 e 486/2009: a prova numa sociedade transparente. Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Porto. ISSN 1645-1430. Ano VIII (2011), p. 315-343.

PINHEIRO, Alexandre Sousa: Comunicações não solicitadas (spam). In Lei do Comércio Electrónico Anotada. Coimbra: Coimbra Editora, 2005. ISBN 972-32-1320-6. p. 239-261. PINTO, Paulo Mota: O Direito à Reserva sobre a Intimidade da Vida Privada. Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Coimbra. ISSN 0303-9773. Vol. LXIX (1993), p. 479-585. RODRIGUES, Cunha: Informática e Reserva da Vida Privada. In Comunicação e Defesa do Consumidor. Coimbra: Instituto Jurídico da Comunicação, 1996. p. 287-291.

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O REGIME JURÍDICO DO CONTRATO DE FRANCHISING SUSANA FERREIRA DOS SANTOS Licenciada e Mestre em Direito pela Universidade Católica Portuguesa – Porto Professora do Instituto Politécnico de Bragança Preletora convidada da Câmara dos Solicitadores Membro e preletora da Associação Portuguesa de Direito do Consumo

1. INTRODUÇÃO

F

oram diversos os motivos que nos levaram a escolher, entre muitos outros contratos, o contrato de franquia ou de franchising como o contrato eleito para o presente artigo. Na sociedade hodierna, os convites ao consumo são frequentes, não obstante a atual conjuntura económica. Temos uma “sociedade voltada para a cultura de consumo, que reduz o indivíduo à condição de consumidor como consequência da autonomização do sistema de produção”1, E o universo dos contratos de franquia é bastante vasto: desde o vestuário à restauração; desde o imobiliário à hotelaria; desde a informática às limpezas… Na maioria das vezes, não nos apercebemos que muitas das nossas compras são feitas a comerciantes que celebraram contratos de franchising. A compra de roupas na Benetton, de acessórios na Parfois, de óculos de sol na Multiópticas; a utilização dos serviços da lavandaria 5 à Séc, dos serviços de seguros da Império; o almoço de um hamburguer da MacDonald`s, acompanhado de uma Coca-Cola, são alguns daqueles exemplos. O Direito tem que acompanhar a evolução económica e social e o princípio da liberdade contratual, consagrado no artigo 405.º do Código Civil (CC), possibilita ao direito adaptar-se a novas realidades. No que concerne ao contrato de agência, de concessão e de franquia, Pinto Monteiro considera que estas figuras foram criadas como forma de aumentar a produtividade e de desenvolver o comércio, face às necessidades sentidas. Assim sendo, foi indispensável criar «novos métodos de colocação dos produtos no mercado e sua distribuição»2, até como forma de diminuir o risco e as despesas, acompanhados de uma mais fácil conquista de novos mercados.

Diógenes Faria de Carvalho, – “Consumidor Endividado, Vítima do Sistema Cultural”. Revista Luso-Brasileira de Direito do Consumo, Vol. II, # 1, Março de 2012, pp. 60, 61 e 63. 2  António Pinto Monteiro – Contratos de Agência, de Concessão e de Franquia («Franchising»). Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Ferrer Correia, pp. 304 e 305. 1

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O Regime Jurídico Do contrato De franchising

2. QUESTÃO TERMINOLÓGICA Discute-se na doutrina qual a terminologia a adoptar para o contrato em questão. Existem várias posições, entre as quais, destacamos as dos seguintes autores: – Menezes Cordeiro propõe as expressões contrato de franquia, franquiador e franquiado, como tradução do inglês franchising, franchisor e franchisee; do francês franchisage, franchiseur e franchisé; e do alemão Franchise-Vertrag, Franchise-Geber e Franchise-Nehmer3; – Pinto Monteiro utiliza indiscriminadamente contrato de franquia ou franchising; as partes intervenientes no contrato são o franquiador e o franquiado; – Manuel Pereira Barrocas aceita a proposta de Menezes Cordeiro apenas no que respeita às partes, franquiador e franquiado. Todavia, no que concerne à tradução do contrato para a língua portuguesa, este autor não utiliza e desaconselha a expressão franquia, preferindo franchising ou franchise, tendo em conta a sua aceitação no plano internacional e pela razão de existirem, no plano interno, conceitos diferentes que utilizam a mesma expressão, tal como acontece nos seguros4; – Isabel Alexandre aceita a proposta de Menezes Cordeiro, mas salienta que utiliza a expressão franchising “por conveniência e para tornar a figura mais facilmente reconhecível”5; – Romano Martinez considera que franquia é o nome a dar ao contrato de franchising e as partes contratuais são o franquiador ou licenciador e o franquiado ou licenciado6. A nosso ver, a expressão franchising é a mais divulgada pelos meios de comunicação social, bem como a utilizada pela Associação Portuguesa da Franchise7 e do Instituto de Informação em Franchising8. Tal como Isabel Alexandre9, consideramos desaconselhável denominar as partes como licenciador e licenciado, uma vez que se poderá confundir o contrato de franquia com o contrato de licença de exploração de um direito de propriedade industrial. Concluindo, neste estudo utilizam-se as expressões contrato de franquia ou franchising para apelidar o contrato em questão e franquiador e franquiado para apelidar as partes contratantes, adiantando, desde já, que tendo em conta o âmbito internacional deste contrato, a expressão mais utilizada para o designar será franchising.

3. ORIGEM HISTÓRICA Alguns autores consideram que o contrato de franchising nasceu na Idade Média, todavia não era o contrato tal como o conhecemos hoje. Na verdade, este contrato teve a sua origem nos Estados Unidos da América, na segunda metade do século XIX, com a Singer Sewing Machine Company. No final da Guerra da Secessão, com o objetivo de superar as dificuldades comerciais existentes entre os estados federados, concretamente no que respeita à distribuição de bens, aquela empresa decidiu instalar uma rede de distribuição de máquinas de costura, em regime de franchising. Fátima Ribeiro salienta que não seria fácil para um empresário do norte do país expandir os seus negócios, para além da dificuldade em se mover geograficamente, não teria o capital suficiente. Assim, os comerciantes do sul e oeste do país investiram na compra de produtos já conhecidos pelos consumidores10. Cf. António Menezes Cordeiro – “Do Contrato de Franquia (Franchising): Autonomia privada versus tipicidade negocial”. Revista da Ordem dos Advogados. Lisboa. Ano 48, 1988, p. 67. 4  Cf. Manuel Pereira Barrocas – “O Contrato de Franchising”. Revista da Ordem dos Advogados. Lisboa. Ano 49, Abril de 1989, pp. 134 e 135. 5  Cf. Isabel Alexandre – O Contrato de Franquia (Franchising). O Direito. Lisboa. Ano 123, n.º 2 e n.º 3. Abril-Setembro de 1991, pp. 322 e 323. 6  Cf. Pedro Romano Martinez – Contratos Comerciais. Cascais. Principia, 2003, p. 22. 7  Cf. http://www.apf.org.pt/apf.php. Muito embora o nome da própria associação não contenha a palavra franchising, o certo é que é o termo utilizado no seu site para designar o contrato em causa. 8  Cf. http://www.infofranchising.pt/homepage.aspx?menuid=2. 9  Cf. Isabel Alexandre – O Contrato de Franquia (Franchising). O Direito. Lisboa. Ano 123, n.º 2 e n.º 3. Abril-Setembro de 1991, p. 323. 10  Cf. Maria de Fátima Ribeiro – O Contrato de franquia (franchising). Coimbra : Almedina, 2001, pp. 11 e ss. 3

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Susana Ferreira Dos Santos

No entanto, apenas nos anos 20 e 30, este sistema viciou outras áreas, tais como o mercado automóvel, com a General Motors e o setor dos refrigerantes, com a Coca-Cola, na modalidade de franchising industrial ou de produção. A grande expansão do franchising deu-se após a II Grande Guerra: a título de exemplo temos a MacDonald`s ou Kentuchy Fried Chicken. O sucesso obtido foi tão grande, que vários franquiadores norte-americanos, por volta dos anos 50, decidiram alargar as suas redes ao mercado europeu. Só nos anos 80, temos o contrato de franquia, em que as partes contratuais são europeias.

4. DEFINIÇÃO A doutrina reconhece as dificuldades em definir este contrato sinalagmático, “dada sobretudo a necessidade de, nela, incluir fenómenos bastante diferenciados”11. Na verdade, existem três modalidades do contrato de franchising; ora encontrar uma noção global e generalizada compatível com aquelas três modalidades não é fácil, daí que alguns autores se limitem a indicar as características essenciais do contrato. O Regulamento (CEE) n.º 4087/88 da Comissão de 30 de Novembro de 198812 definiu o contrato como o “conjunto de direitos de propriedade industrial ou intelectual relativos a marcas, designações comerciais, insígnias comerciais, modelos de utilidade, desenhos, direitos de autor, saberfazer ou patentes, a explorar para a revenda de produtos ou para a prestação de serviços a utilizadores finais”13, tendo em conta a propriedade industrial ou intelectual. No que concerne ao objeto do contrato diz-nos que é “o acordo pelo qual uma empresa, o franquiador, concede a outra, o franquiado, mediante uma contrapartida financeira, directa ou indirecta, o direito de explorar uma franquia para efeitos da comercialização de determinados tipos de produtos e/ou serviços; inclui, pelo menos, obrigações relativas: ao uso de uma designação ou insígnia comum e à apresentação uniforme das instalações e/ou dos meios de transporte previstos no contrato; à comunicação ao franquiado, por parte do franquiador, de saber-fazer; à prestação contínua de assistência comercial ou técnica ao franquiado, por parte do franquiador, durante a vigência do acordo”. Já a definição dada pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, no célebre Acórdão Pronuptia, de 28 de Janeiro de 198614, foi muito semelhante à consagrada posteriormente pelo referido Regulamento. E a noção consagrada no Código de Deontologia Europeu do Franchising é muito semelhante a ambas as definições. De acordo com Engrácia Antunes, o contrato de franchising é definível como «o contrato pelo qual um empresário – o franquiador – concede a outro empresário – o franquiado – o direito de exploração e fruição da sua imagem empresarial e respetivos bens imateriais de suporte (mormente, a marca), no âmbito da rede de distribuição integrada no primeiro, de forma estável e a troco de uma retribuição», um contrato sinalagmático e oneroso, ficando o franquiado vinculado ao pagamento de determinadas prestações pecuniárias, usualmente consistentes numa prestação inicial fixa ( “front money” ou “initiation fee”) e prestações ulteriores periódicas proporcionais ao volume de negócios (“royalties”, “redevances”)»15. Consciente das dificuldades em oferecer uma definição completa, já que o contrato de franquia não se limita a um franchising de distribuição, Pinto Monteiro propõe uma definição bastante completa: “contrato pelo qual alguém (franquiador) autoriza e possibilita que outrem (franquiado), mediante contrapartidas, atue comercialmente (produzindo e/ou vendendo produtos ou serviços), de modo estável, com a fórmula do sucesso do primeiro (sinais distintivos, conhecimentos, assistência...) e surja aos olhos do público com a sua imagem empresarial, obrigando-se o segundo a actuar nestes termos, a respeitar as indicações que lhe forem sendo dadas e a aceitar o controlo e fiscalização a que for sujeito”.16

Neste estudo utilizam-se as expressões contrato de franquia ou franchising para apelidar o contrato em questão e franquiador e franquiado para apelidar as partes contratantes.

Existem três modalidades do contrato de franchising; ora encontrar uma noção global e generalizada compatível com aquelas três modalidades não é fácil.

António Menezes Cordeiro – “Do Contrato de Franquia (Franchising): Autonomia privada versus tipicidade negocial”. Revista da Ordem dos Advogados. Lisboa. Ano 48, 1988, p. 67, nota de rodapé n.º 10. 12  Regulamento (CEE) n.º 4087/88 da Comissão de 30 de Novembro de 1988 relativo à aplicação do n.º 3 do artigo 85º do Tratado a certas categorias de acordos de franquia 13  Cf. Artigo 1.º n.º 3 a) do Regulamento (CEE) n.º 4087/88 da Comissão. 14  Cf. http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CELEX:61984CJ0161:PT:PDF. 15  Engrácia Antunes – Direito dos Contratos Comerciais. Coimbra : Almedina, 2009, p. 451. 16  Cf. António Pinto Monteiro – Contratos de Distribuição Comercial. Coimbra : Almedina, 2009, p. 123. 11

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O Regime Jurídico Do contrato De franchising

5. ATIPICIDADE O contrato de franquia não está regulado na lei portuguesa, tal como acontece na generalidade dos ordenamentos jurídicos europeus. Curiosamente, em Espanha este contrato foi disciplinado há alguns anos pelo Real Decreto 2485/1998, de 13 de Novembro17, muito embora atualmente esteja em vigor o Real Decreto 201/2010, de 13 de Março, que regula o exercício da atividade comercial em regime de franchising18. Bélgica, Itália, França19 e o Brasil são exemplos de outros países em que há legislação aplicável a este contrato. Note-se que actualmente é frequente a celebração de um contrato prévio à celebração do contrato de franchising, apelidado por uns por “Pré-acordo de Franchising” e por outros como “Contrato-Promessa de Franchising”. Estamos perante um contrato atípico, embora “pese a sua indiscutível tipicidade social”20, que se desenvolve ao abrigo da liberdade contratual, nos termos do artigo 405.º CC. Assim sendo, o franchising é um contrato consensual, mas tendo em conta a sua importância e complexidade, as partes, em regra, reduzem-no a escrito. Na verdade e tendo em conta que este contrato envolve, em regra, uma licença de utilização da marca, aplica-se à relação contratual o disposto nos artigos 30.º a 32.º do Código da Propriedade Industrial21, que obriga à forma escrita sempre que exista um contrato de licença. O facto de estarmos perante um contrato não tipificado na lei, não significa que o contrato esteja desprotegido, uma vez que será aplicável àquele: – O Regime Geral dos Contratos, designadamente, o artigo 227.º CC (responsabilidade contratual), o artigo 280.º CC (possibilidade do objeto, não contrariedade à lei, à ordem pública e aos bons costumes), os artigos 334.º e 762.º, n.º 2 CC (dever de agir de boa fé na execução do contrato); – O Regime das Cláusulas Contratuais Gerais, caso o contrato em apreço seja um contrato de adesão – o que é muito frequente, previsto no Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro22; – O Regime Jurídico da Concorrência, caso alguma cláusula do contrato não esteja conforme às normas constantes deste novo regime aprovado pela Lei n.º 19/2012, de 8 de Maio; – O Código da Propriedade Industrial, como já referido, uma vez que o contrato de franquia implicará, muitas vezes, licenças de exploração de direitos industriais, nomeadamente no que diz respeito a marcas e patentes; – O Decreto-Lei n.º 383/89, de 6 de Novembro, acerca da responsabilidade objetiva do produtor, já que existe independentemente de culpa, “na medida em que qualquer das partes deva considerar-se “produtor”, nos termos do artigo 2.º, ainda que mero produtor aparente ou presumido”23; – O Decreto-Lei nº 178/96, de 3 de Julho, (LCA) “por analogia - quando e na medida em que ela se verifique”,24 diploma que regula o contrato de agência, sabendo à partida que a analogia se verifica sobretudo em matéria de cessação do contrato.

O Real Decreto 2485/1998, de 13 de Novembro, foi alterado pelo Real Decreto 419/2006, de 7 de Abril. Cf. http://www.boe.es/boe/dias/2010/03/13/pdfs/BOE-A-2010-4175.pdf. 19  Cf. Lei Doubin, de 31 de Dezembro de 1989, que estipulou alguns deveres de informação. 20  Cf. António Pinto Monteiro - Contratos de Distribuição Comercial. Coimbra : Almedina, 2009, p. 64. 21  O Código da Propriedade Industrial foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 36/2003, de 5 de Março, foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 318/2007, de 26 de Setembro, pelo Decreto-Lei n.º 360/2007, de 2 de Novembro, pela Lei n.º 16/2008, de 1 de Abril, pelo Decreto-Lei n.º 143/2008, de 25 de Julho, pela Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto e pela Lei n.º 46/2011, de 24 de Junho. 22  O Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 220/95, de 31 de Agosto, pelo Decreto-Lei n.º 249/99, de 7 de Julho e pelo Decreto-Lei n.º 323/2001, de 17 de Dezembro. Aliás, é habitual os três grandes contratos de distribuição serem contratos de adesão, e especialmente, “quando se pretende uniformizar as condições contratuais e de atuação dos vários distribuidores no âmbito da rede” será esse “o modus negocial típico e adequado da formação destes contratos”. Cf. António Pinto Monteiro – Contratos de Distribuição Comercial. Coimbra : Almedina, 2009, p. 65. 23  O produtor é responsável, independentemente de culpa, pelos danos causados por defeitos dos produtos que põe em circulação: responsabilidade pelos defeitos de segurança. 24  O Decreto-Lei nº 178/96, de 3 de Julho, foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 118/93, de 13 de Abril, que transpôs a Diretiva 86/653/CEE, do Conselho, de 18 de Dezembro de 1986. 17  18

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6. REGULAMENTOS DA UNIÃO EUROPEIA O contrato de franquia tem sido analisado pelas instituições comunitárias, tendo em conta a sua originalidade e especificidades, uma vez que suscitou e suscita alguns problemas no que respeita ao direito da concorrência. São frequentes no contrato de franquia cláusulas que protegem o saber-fazer do franquiador, que obrigam a respeitar os preços impostos pelo franquiador, que proíbem que os franquiados concorram com o franquiador, mesmo depois de cessado o contrato, inter alia. O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias pronunciou-se, a título prejudicial, sobre a relação entre o antigo artigo 81.º do Tratado de Roma, atual artigo 101.º n.º 3 do Tratado de Funcionamento da União Europeia, e o contrato de franquia, no já mencionado Acórdão “Pronuptia”, em 1986. Este acórdão considerou que uma série de cláusulas, como os exemplos acima mencionados, não constituía restrições à concorrência. Em primeiro lugar, há que referir o Regulamento (CEE) n.º 4087/88 da Comissão, de 30 de Novembro de 1988, respeitante à aplicação à data do artigo 81.º do Tratado de Roma aos contratos de franquia de distribuição e de serviços (duas das três modalidades do contrato). Este regulamento não teve como objetivo regular o contrato de franquia na sua plenitude, mas somente estabelecer que determinadas cláusulas estipuladas no contrato seriam compatíveis com o direito comunitário da concorrência. A aplicação deste regulamento foi afastada pelo Regulamento n.º 2790/1999 da Comissão, de 22 de Dezembro de 199925. Respeitava à aplicação do n.º 3 do artigo 81.º do Tratado de Roma a certas categorias de acordos verticais e práticas concertadas, estabelecendo um regime uniforme para os acordos verticais de distribuição e esteve em vigor até 31 de Maio de 2010. A Comissão, no seguimento da experiência globalmente positiva com a aplicação do Regulamento n.º 2790/1999, aprovou um novo regulamento de isenção por categoria. Foi então adotado o Regulamento (UE) n.º 330/2010 da Comissão de 20 de Abril de 2010, relativo à aplicação do n.º 3 do artigo 101.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia a determinadas categorias de acordos verticais e práticas concertadas, que cessará a sua vigência no dia 31 de Maio de 202226.

7. MODALIDADES A generalidade dos autores refere que existem várias classificações de franquias, mas destaca a adotada pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, no caso Pronuptia, que também foi a consagrada pelo Regulamento (CEE) n.º 4087/88 da Comissão, de 30 de Novembro de 1988. Na franquia de serviços, o franquiado oferece um serviço sob o logótipo ou marca do franquiador, ajustando-se com as instruções deste. Temos como exemplos a MacDonald`s, na área da restauração; a Avis e Hertz, na locação de automóveis; a Império, na comercialização de serviços de seguro; a 5 à Sec, na lavandaria e limpeza a seco, entre muitos outros. Na franquia de produção ou industrial “o próprio franquiado fabrica, segundo as indicações do franquiador, produtos que ele vende sob a marca deste”27. Os exemplos mais conhecidos desta modalidade de franquia são a Coca-cola e a Pepsi. Por último, na franquia de distribuição o franquiado limita-se a vender determinados produtos num estabelecimento que utiliza os sinais distintivos do franquiador. São muitos os exemplos desta modalidade: Pronuptia, Benetton, Tintoretto, Pré-maman, Levi`s, Silverfield, Boticário, entre muitos outros. A distribuição de produtos e a prestação de serviços podem ser conjugadas no mesmo contrato de franquia. É exatamente o que se passa, com a Multiópticas e a Optivisão: para além dos

Estamos perante um contrato atípico, embora “pese a sua indiscutível tipicidade social”.

O facto de estarmos perante um contrato não tipificado na lei, não significa que o contrato esteja desprotegido

Este regulamento afastou a aplicação do Regulamento nº 4087/88, respeitante aos acordos de franquia, bem como do Regulamento n.º 1983/83, respeitante aos acordos de venda exclusiva e do Regulamento n.º 1984/83, relativo aos acordos de compra exclusiva. 26  Cf. http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CELEX:32010R0330:PT:NOT. 27  Cf. António Pinto Monteiro – Contratos de Distribuição Comercial. Coimbra : Almedina, 2009, p. 126. 25

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serviços óticos que prestam, também vendem óculos de sol, armações, lentes de contacto, etc. É suficiente uma simples leitura das muitas franquias disponíveis nas revistas da área28, para se concluir que a franquia de serviços e a de distribuição são as dominantes.

8. VANTAGENS E DESVANTAGENS Um conjunto de vantagens para os contraentes contribuiu para o sucesso do franchising. O franquiador chega a um mercado maior e com muito menos esforço em termos de investimento, do que se quisesse expandir o seu negócio por conta própria, ou seja, controla e gere, “através de empresas independentes”, a distribuição dos bens, como se se tratasse de uma filial, mas não suporta riscos, nem custos29. Por sua vez, o franquiado tudo fará para que o negócio corra o melhor possível, uma vez que também procura o lucro e a eficiência, comercializando produtos e/ou serviços conhecidos pelos consumidores, sendo maiores as hipóteses de sucesso, em comparação com a criação de raiz de um negócio, já que utiliza a marca e outros sinais distintivos de uma empresa, que muitas vezes até é conhecida a nível mundial. O franquiado beneficia ainda do saber-fazer, o chamado know-how, comunicado pelo franquiador, bem como da assistência técnica prestada por este. A maior desvantagem será se a rede de franchising tiver algum problema de imagem, quer seja da responsabilidade do franquiador, quer do franquiado, por exemplo, uma intoxicação alimentar no MacDonald`s, serão também afectados todos os outros franquiados, embora se trate de empresas independentes.

9. OBRIGAÇÕES As cláusulas mais frequentes em relação às obrigações do franquiador são as seguintes: transmitir o direito ao uso da marca e logótipo na comercialização de serviços ou produtos; comunicar o saber-fazer; fornecer assistência técnica e/ou comercial; cláusula de exclusividade territorial, ou seja, o franquiado terá o direito exclusivo de vender os produtos ou prestar serviços numa determinada zona; retomar os bens em stock depois da cessação do contrato; estipulação de uma indemnização de clientela. As cláusulas mais comuns em relação às obrigações do franquiado são: pagamento de uma contrapartida; obrigação de suportar um controlo30; obrigação de não concorrer com a rede durante a vigência do contrato, bem como depois de cessado o contrato; cláusulas respeitantes à publicidade; manutenção de um stock mínimo; cumprir um volume mínimo de negócios; fixação dos preços de venda dos bens e/ou serviços; manter as instalações, mobiliário, decoração e demais material nas condições exigidas pelo franquiador; não adquirir participações sociais no capital de concorrentes do franquiador; apresentar anualmente o seu balanço e prestação de contas àquele. Carece de explicação a cláusula que estipula a obrigação do franquiado efetuar o pagamento de contrapartidas, que poderão consistir num direito de entrada, nas royalties e na taxa de publicidade. – No direito de entrada, falamos de uma prestação inicial, paga, em regra, no momento da celebração do contrato (poderá ser paga numa ou em várias prestações); é uma “jóia” que

Por exemplo, a “Negócios & Franchising” ou a “Franchising.pt”. Cf. António Pinto Monteiro – Contratos de Distribuição Comercial. Coimbra : Almedina, 2009, pp. 122 e 123. 30  Isabel Alexandre considera que o controlo tem que existir para se manter a “homogeneidade e reputação da rede”. Esta autora apresenta vários exemplos de cláusulas onde esse controlo está explícito, por exemplo, cláusulas em que é necessário o acordo do franquiador, caso o franquiado pretenda fazer publicidade; em que o franquiador tem a faculdade de fiscalizar os inventários da outra parte; em que é necessária a autorização do franquiador quanto à localização do estabelecimento e sua decoração; em que os produtos e os serviços prestados só podem ser os autorizados pelo franquiador; entre outras. Aliás, frequentemente existe uma cláusula que estipula o abastecimento exclusivo por parte do franquiador. Cf. Isabel Alexandre – O Contrato de Franquia Franchising). O Direito. Lisboa. Ano 123, n.º 2 e n.º 3. Abril-Setembro de 1991, p. 363. 28

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remunera o franquiador pelo saber-fazer e notoriedade da marca e pelos serviços iniciais prestados ao franquiado. – Nas royalties existe um pagamento regular, em regra mensal, cujo valor resulta normalmente da aplicação de uma percentagem sobre as vendas, poderá ser um valor fixo ou até nem existir31. – Por último, a taxa de publicidade trata-se de um pagamento regular, em regra mensal e, tal como as royalties, pode resultar da aplicação de uma percentagem sobre as vendas, poderá ser um valor fixo ou nem existir. O pagamento da referida taxa destina-se a pagar um serviço de publicidade prestado pelo franquiador, contudo nada impede que o próprio franquiado promova as suas campanhas publicitárias, desde que o franquiador as aprove. Por último, entendemos que será importante mencionar uma cláusula que poderá constar do contrato de franquia, que consiste na possibilidade do franquiado contratar sub-franquiados na zona que lhe foi atribuída pelo franquiador. Estamos perante o master franchising ou contrato de franquia principal, que a nosso ver, até se podia chamar “franchising do franchising”32. O franquiado fica, desta forma, responsabilizado pela administração da rede nessa zona, pela assistência e controlo dos sub-franquiados. Geralmente tal ocorre num país estrangeiro, relativamente ao país de origem do franchising.

10. FORMAS DE CESSAÇÃO DO CONTRATO A jurisprudência portuguesa sobre o contrato de franquia versa sobretudo sobre as causas de cessação. Assim, analisaremos as respetivas formas de cessação, bem como alguns problemas que se podem colocar depois do contrato ter cessado, designadamente a questão do direito à indemnização de clientela e a questão dos bens em stock. O contrato de franquia é um contrato atípico. Desta forma, aplicar-se-ão, por recurso à analogia, as causas de cessação previstas para o contrato de agência, consagradas no artigo 24.º LCA, tendo em conta que este é o contrato típico com mais laços de afinidade com a franquia. O contrato de agência pode cessar por: acordo das partes, caducidade, denúncia e resolução. 10.1 ACORDO DAS PARTES As partes podem celebrar um acordo cuja vontade de ambas as partes é pôr fim ao contrato – quer seja celebrado por tempo determinado, quer por tempo indeterminado. É uma causa de cessação prevista no artigo 25.º LCA. Exige-se que o acordo conste de documento escrito, por razões de segurança33. 10.2 CADUCIDADE O artigo 26.º LCA faz uma enumeração meramente exemplificativa dos factos que determinam a caducidade do contrato, entre os quais, “findo o prazo estipulado”. Trata-se de uma forma de cessação automática do contrato, pois verificando-se algum dos factos estipulados no artigo ou outros acordados, o contrato caduca. Na realidade, a maior parte dos contratos é celebrado

O franquiador chega a um mercado maior e com muito menos esforço em termos de investimento, do que se quisesse expandir o seu negócio por conta própria.

O franquiado tudo fará para que o negócio corra o melhor possível, uma vez que também procura o lucro e a eficiência.

31  Em média ronda os 5% ou 6%, de acordo com os dados fornecidos pela Associação Portuguesa de Franchise. No Acórdão do STJ de 23.02.2010 (Sebastião Póvoas) realça-se que as royalties “não representam, apenas, a contrapartida de utilização de um bem, como acontece no contrato de locação, mas incluem várias outras, como a assistência, a colocação no mercado de um produto com nome comercial firmado, e ainda amortização de equipamento, custos de gestão e da assistência prestada”. 32  O Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 13 de Dezembro de 2001, refere-se ao master-franchise: “Nos últimos tempos assiste-se a uma consolidação da internacionalização do franchising. Este tanto pode estabelecer-se por via duma relação direta como por recurso a uma figura “subcontratual”. No comércio internacional, normalmente o franquiador (designado por primeiro franquiador) atribui uma zona alargada ou um país ao franquiado principal que, por sua vez, se relaciona com “subfranquiados”, mediante contratos de “subfranquia”, que abrangem áreas inferiores”. 33  Cf. António Pinto Monteiro – Contratos de Distribuição Comercial. Coimbra : Almedina, 2009, p. 133.

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por tempo determinado. É bastante frequente as partes preverem a renovação automática do contrato; todavia, os contraentes podem estipular, de igual modo, que o contrato não será renovado. Se as partes não tiverem previsto a renovação automática do contrato e continuarem a cumpri-lo­passado o prazo estipulado, a doutrina é pacífica em aplicar analogicamente o artigo 27.º LCA: aproveita-se o silêncio das partes e considera-se o contrato renovado por tempo indeterminado. Estamos perante o nascimento de um novo contrato, “cujas cláusulas reproduzem as do contrato antigo”34. Esta solução justifica-se para evitar que uma das partes pudesse fazer cessar o contrato sem necessidade de aviso prévio. 10.3 DENÚNCIA Esta declaração unilateral recetícia aplica-se aos contratos celebrados por tempo indeterminado e não carece de ser motivada. A denúncia só poderá ser exercida validamente, se comunicada à outra parte com razoável antecedência. As partes podem ter previsto esta situação no contrato e é o aconselhável; caso contrário, a questão primacial é a de saber qual será essa “razoável antecedência”. Os tempos de pré-aviso estabelecidos para o contrato de agência, consagrados no artigo 28.º, cuja finalidade é impedir uma repentina cessação do contrato, a nosso ver, não deverão ser aplicados ao contrato de franquia. Aquele artigo estabelece que a antecedência mínima seja de um mês, caso o contrato dure há menos de um ano; dois meses, se já tiver iniciado o segundo ano de vigência; e três meses, nos restantes casos. Ora, os prazos de aviso prévio no franchising devem ser mais longos do que os estabelecidos para o contrato de agência, desde logo porque o capital investido é, em regra, superior ao investido no contrato de agência. Daí que a melhor solução será uma apreciação casuística das situações, a fim de aferir se a denúncia foi ou não exercida licitamente. Contudo, os prazos consagrados no artigo 28.º, poderão guiar-nos para estabelecer a duração dos pré-avisos no franchising35. De qualquer forma, se as partes não tiverem estipulado os prazos de pré-aviso no contrato e uma delas considerar que a denúncia não foi feita num prazo razoável, poderá sempre recorrer ao instituto do abuso de direito, caso se verifiquem os respetivos pressupostos36. 10.4 RESOLUÇÃO A resolução carece de ser motivada; faz-se, em regra, através de declaração extrajudicial de uma parte à outra; e aplica-se quer aos contratos celebrados por tempo determinado, quer por tempo indeterminado. A declaração resolutiva pode fazer-se mediante declaração à outra parte, como resulta claramente do artigo 436.º, n.º 1, CC, que se torna eficaz logo que chega ao destinatário ou é dele conhecida – artigo 224.º, n.º 1, CC, tornando-se, assim, irrevogável – artigo 230.º, n.º 1, CC. O franquiador e o franquiado podem prever no contrato as situações que poderão levar à resolução do contrato, através das chamadas cláusulas resolutivas. Se nada estiver estipulado no contrato, aplicamos, por analogia, o artigo 30.º LCA que estabelece dois fundamentos de resolução para o contrato de agência. O primeiro, estipulado na alínea a), consagra que o contrato possa ser resolvido, caso uma das partes falte ao cumprimento das suas obrigações, de forma de tal modo grave ou reiterada, que não será exigível a subsistência do vínculo contratual. Por exemplo, caso o franquiado não realize pontualmente as contrapartidas financeiras a que está obrigado ou quando o franquiador não concede ao franquiado uma assistência eficaz, incumprimentos de tal modo graves ou reiterados, que não se pode exigir à parte cumpridora que o contrato se mantenha. Coloca-se a questão de Isabel Alexandre ­– O Contrato de Franquia (Franchising). O Direito. Lisboa. Ano 123, n.º 2 e n.º 3. Abril-Setembro de 1991, p. 367. 35  Neste sentido, temos o Acórdão do STJ de 09.01.2007 (Sebastião Póvoas), disponível na base de dados do ITIJ, que refere que “o artigo 28.º do DL n.º 178/86, de 3 de Julho não é aplicável ao contrato de franquia mas os prazos de pré-aviso aí estabelecidos podem ser usados como indicadores e referência. 36  Cf. António Pinto Monteiro – Contratos de Distribuição Comercial. Coimbra : Almedina, 2009, p. 139. 34

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saber se a parte que resolve o contrato tem direito a ser ressarcida pelo interesse contratual positivo ou apenas pelo interesse contratual negativo. A posição dominante da jurisprudência portuguesa “é no sentido de que, a indemnização que se pode cumular com a resolução do contrato não é a indemnização pelo dano «in contractu» mas pelo dano «in contrahendo», ou seja, pelo interesse contratual negativo”37. Assim, coloca-se o lesado na situação em que estaria se não tivesse celebrado o contrato e não na situação em que se encontraria se o contrato fosse cumprido. Na alínea b) estipula-se que o contrato possa ser resolvido “se ocorrerem circunstâncias que tornem impossível ou prejudiquem gravemente a realização do fim contratual”, de forma a que também não seja exigível que o contrato se mantenha até ao prazo convencionado (quando está em causa um contrato celebrado por tempo determinado) ou imposto em caso de denúncia (nos casos de contratos celebrados por tempo indeterminado ou que se renovaram por tempo indeterminado). Desta forma, “a resolução não depende de qualquer incumprimento culposo por banda da outra parte”38, trata-se de um fundamento objetivo e o legislador estipula que não pode ser exigível a subsistência do vínculo contratual39. Se aplicarmos analogicamente ao contrato de franquia o artigo 30.º, devemos aplicar, de igual modo, o artigo 32.º que estipula uma indemnização, que terá lugar nos dois fundamentos de resolução do contrato. No fundamento previsto na alínea a) existe o direito a ser indemnizado pelos danos sofridos; no caso da alínea b), a indemnização será calculada segundo a equidade.

11. DIREITO À INDEMNIZAÇÃO DE CLIENTELA O artigo 33.º LCA consagra o direito a uma indemnização de clientela para o agente, após a cessação do contrato, preenchidos que sejam os requisitos exigidos naquele artigo. Esta indemnização visa “compensar o agente da atividade por si desenvolvida e de que o principal veio a beneficiar; é o ressarcimento de uma mais-valia acrescida colocada ao serviço do principal, criada ou incrementada pelo esforço do agente”40. Não se trata, em rigor, de uma indemnização, o que interessa são os benefícios proporcionados pelo agente ao principal, que durante a vigência do contrato eram de ambos, e que agora só irão ser aproveitados por este último. A questão principal é a de saber se se poderá aplicar, por analogia, ao contrato de franquia, a indemnização prevista para a agência. A doutrina diverge. – Menezes Cordeiro considerando que a clientela é angariada através da marca e não pela ação do franquiado, nega a este o direito à indemnização de clientela, afirmando que “as vantagens e desvantagens que tudo isso acarrete fazem parte dos riscos próprios do negócio, que as partes livremente assumiram e que a boa fé manda honrar” 41. – Pereira Barrocas não concorda com Menezes Cordeiro e refere-o expressamente, no que concerne ao facto de a clientela ser angariada através da marca. Aliás, para Pereira Barrocas, não existem grandes diferenças entre o agente e o franquiado neste aspecto, para além da marca poder influenciar mais o público, do que o nome do principal na agência. Na verdade, o franquiado pelo seu desempenho na actividade poderá conquistar uma carteira de clientes, “em benefício de si próprio e da marca”. Todavia, para este autor não é possível aplicar, por analogia, a indemnização de clientela do contrato de agência ao contrato de franquia, pelas diferenças existentes entre os dois contratos, realçando o facto do franquiador actuar sempre em nome e por conta própria42. – Carlos Olavo defende a possibilidade de aplicação do artigo 33.º ao contrato de franchising, mas não se poderá consagrar uma regra geral, isto porque, “a clientela pode ficar ligada ao

O contrato de franquia é um contrato atípico. Desta forma, aplicarse-ão, por recurso à analogia, as causas de cessação previstas para o contrato de agência, consagradas no artigo 24.º LCA, tendo em conta que este é o contrato típico com mais laços de afinidade com a franquia.

Cf. Acórdão do STJ de 15.12.2011 (Álvaro Rodrigues), disponível na base de dados do ITIJ. Cf. Acórdão do STJ de 25.01.2011 (Garcia Calejo), disponível na base de dados do ITIJ. 39  O exemplo dado por Pinto Monteiro para o contrato de agência, poder-se-á aplicar ao franchising: perda de mercado dos bens ou serviços que constituem o objeto do contrato. Cf. António Pinto Monteiro - Contratos de Distribuição Comercial. Coimbra : Almedina, 2009, p. 148. 40  Cf. Acórdão do STJ de STJ de 05.03.2009 (Alberto Sobrinho), disponível na base de dados do ITIJ. 41  Cf. António Menezes Cordeiro - “Do Contrato de Franquia (“Franchising”): Autonomia privada versus tipicidade negocial”. Revista da Ordem dos Advogados. Lisboa. Ano 48, 1988, p. 83. 42  Cf. Manuel Pereira Barrocas - “O Contrato de Franchising”. Revista da Ordem dos Advogados. Lisboa. Ano 49, Abril de 1989, pp. 157 a 160. 37

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estabelecimento do licenciado como ao do licenciador”. Caso, o licenciado (franquiado) continue a exercer uma actividade semelhante à que exercia, este autor considera que já não se justifica o direito à indemnização43. – Isabel Alexandre não afasta a aplicação do artigo 33.º LCA ao contrato de franquia, mas defende “uma apreciação casuística das várias situações”44. – Pinto Monteiro entende que o regime do contrato de agência está vocacionado para se poder aplicar analogicamente quer à concessão, quer à franquia45; todavia, salienta que existem dois aspectos a ter em conta: se a clientela foi angariada pelo franquiado, e em que medida o franquiador vai beneficiar dessa clientela. De acordo com este autor, e apoiado por Pestana de Vasconcelos46, se as circunstâncias do caso concreto revelarem que o franquiado desempenhou funções, cumpriu tarefas e prestou serviços semelhantes aos que o agente está obrigado, de forma a serem considerados “um relevante factor de atracção da clientela” fica preenchido o primeiro dos dois requisitos47. Quanto ao segundo requisito, na agência é o principal que contrata com os clientes, e uma vez cessado o contrato, estes ficarão ao dispor daquele; por sua vez, na franquia quem celebra os contratos com os clientes é o franquiado. Desta forma, não se preenche um requisito fundamental para se atribuir ao franquiado a referida indemnização. Todavia, a solução será outra se no termo do contrato, o franquiador tiver “efectivo acesso à clientela angariada pelo distribuidor, sem que isso deva resultar de uma qualquer obrigação prevista no contrato”48. A nosso ver, as melhores soluções são aquelas que defendem uma apreciação casuística, não fechando a porta à aplicação do artigo 33.º ao contrato de franquia, mas também tendo em conta que a clientela, de uma forma geral, é angariada através da marca.

12. BENS EM STOCK O problema que se coloca neste âmbito é o de saber se cessado o contrato de franquia, existirá a obrigação do franquiador em retomar os bens em stock. Parece-nos desde logo que apenas se as partes o tiverem acordado. Existe jurisprudência italiana que permitiu que o ex-franquiado utilizasse durante algum tempo a marca e outros sinais distintivos do ex-franquiador49. De igual forma e de acordo com Carlos Olavo, a jurisprudência francesa já entendeu que caso a denúncia não seja feita com a antecedência necessária para escoar os bens em stock, o ex-franquiado poderá escoar os bens com a marca e os sinais distintivos de comércio do ex-franquiador, já depois de cessado o contrato50. A generalidade da doutrina europeia considera não existir qualquer obrigação de retomar os bens em stock; todavia, a solução poderá ser outra, tendo em conta o caso concreto, mais especificamente a forma como cessou o contrato. Para além da forma de cessação do contrato, poderá 43  Cf. Carlos Olavo - O Contrato de “franchising”. Novas Perspectivas do Direito Comercial. Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa. Centro de Estudos Judiciários. Coimbra : Almedina, 1988, p. 171. 44  Cf. Isabel Alexandre - O Contrato de Franquia (Franchising). O Direito. Lisboa. Ano 123, n.º 2 e n.º 3. Abril-Setembro de 1991, p. 369. 45  Cf. António Pinto Monteiro - Contratos de Distribuição Comercial. Coimbra : Almedina, 2009, pp. 165 e ss. 46  Cf. L. Miguel Pestana de Vasconcelos – O Contrato de Franquia (Franchising). Coimbra : Almedina, 2010, pp. 131 e ss. 47  A nosso ver, em regra, a atividade dos franquiados não será um fator de atração de clientes; aliás, uma das vantagens do contrato para o franquiado é usar a marca e demais sinais distintivos do comércio do franquiador, muitas vezes, conhecidos a nível mundial pelos consumidores. 48  António Pinto Monteiro – Contratos de Distribuição Comercial. Coimbra : Almedina, 2009, pp. 168 e 169. 49  Pestana de Vasconcelos transcreve a referida decisão do tribunal italiano: “ Deve ser ordenada a prossecução por um ulterior período adequado de tempo, de um acordo comercial de colaboração por tempo indeterminado entre empresas no sector das bebidas gasosas, acordo com base no qual a primeira (franquiador) havia concedido à segunda (franquiado) a faculdade de produzir a fim de vender a mesma bebida, fornecendo-lhe a essência, o Know-how e a licença de marca quando, expirado o aviso prévio concedido pelo franquiador com vista à denúncia do contrato, exista ainda stock por escoar...”. Cf. L. Miguel Pestana de Vasconcelos – O Contrato de Franquia (Franchising). Coimbra : Almedina, 2010, p. 140. 50  Cf. Carlos Olavo - O Contrato de “franchising”. Novas Perspectivas do Direito Comercial. Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa. Centro de Estudos Judiciários. Coimbra : Almedina, 1988, p.170.

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ser muito importante a razão da existência do stock. Pestana Vasconcelos apresenta a seguinte solução: – nos casos de cessação do contrato por acordo das partes, na caducidade por decurso por prazo (o franquiado sabe perfeitamente quando cessará o contrato, logo terá que gerir o seu stock), na denúncia pelo franquiado e na resolução pelo franquiador com fundamento no incumprimento das obrigações contratuais do franquiado, em princípio, não existirá nenhuma obrigação do franquiador em retomar os bens em stock; – nos casos de cessação do contrato por caducidade do contrato por morte do franquiador, na resolução pelo franquiado com fundamento no incumprimento das obrigações contratuais do franquiador e na denúncia pelo franquiador51, a questão dos bens em stock já é relevante. Nestes casos poderá recair sobre o franquiador a obrigação de retomar os bens ou permitir ao ex-franquiado utilizar durante um período de tempo razoável a marca e outros sinais distintivos do ex-franquiador unicamente para escoar o stock52. A doutrina italiana divide-se quanto à solução a adotar, mas aquele autor entende que em vez de se optar por uma das hipóteses, pode deixar-se à escolha ao próprio franquiador, que melhor do que ninguém sabe quais são os seus interesses, “tendo em conta a modalidade da franquia em questão e o tipo de bens envolvidos”. Este problema só se coloca “se e na medida em que o stock tenha níveis razoáveis”, resultado de uma gestão equilibrada do franquiado, frequentemente imposta pelo franquiador por cláusulas de compra mínima. Na hipótese de ter sido o próprio franquiado a comprar bens em excesso, sem que exista uma obrigação contratual, o problema já não se colocará53.

13. DISTINÇÃO DO CONTRATO DE FRANQUIA DO CONTRATO DE AGÊNCIA E DE CONCESSÃO COMERCIAL Por último, é imperativo estabelecer alguns traços de distinção entre o contrato de franquia dos contratos de agência e de concessão comercial. Estes três contratos são classificados como contratos de distribuição comercial, embora apenas o de agência seja um contrato típico. Uma das notas comuns entre aqueles três contratos é a obrigação do distribuidor – agente, concessionário e franquiado – promover os negócios e interesses da outra parte – agente, concedente e franquiador. Para todos os efeitos, são ainda frequentes as distinções doutrinárias entre o contrato de franquia e a licença de exploração de marca, do contrato de mandato, de comissão, de trabalho, de sociedade, de consórcio, de transmissão de saber-fazer. O contrato de agência é o “o contrato pelo qual uma das partes se obriga a promover por conta da outra a celebração de contratos, de modo autónomo e estável e mediante retribuição, podendo ser-lhe atribuída certa zona ou determinado círculo de clientes” 54. Enquanto que o franquiado atua em nome e por conta própria, assumindo o risco de comercialização, o agente atua por conta do principal; o franquiado beneficia da promoção feita pelo franquiador e da sua notoriedade, enquanto que na agência esta promoção de bens e/ou serviços é feita pela ação do agente; enquanto que o franquiado obtém lucros ou perdas, que resultam da sua atividade, o agente é retribuído pelo principal, com base no volume dos negócios celebrado; uma das obrigações do franquiado é pagar uma contrapartida ao franquiador, já o agente tira partido a título gratuito da marca e/ou logótipo e do saber-fazer. O contrato de concessão é o contrato pelo qual uma das partes, o concedente, vende à outra, o concessionário, determinado produto, de forma exclusiva ou não, para que este revenda ao público, numa determinada zona. Para além de estarmos perante dois contratos atípicos, quer o franquiado, quer o concessionário, de um modo geral, compram para revenda, agem por conta

51  52  53  54

As melhores soluções são aquelas que defendem uma apreciação casuística, não fechando a porta à aplicação do artigo 33.º ao contrato de franquia, mas também tendo em conta que a clientela, de uma forma geral, é angariada através da marca.

O problema que se coloca neste âmbito é o de saber se cessado o contrato de franquia, existirá a obrigação do franquiador em retomar os bens em stock. Parece-nos desde logo que apenas se as partes o tiverem acordado.

Na denúncia, embora haja um aviso prévio, este poderá não ser suficiente para escoar o stock existente. Cf. L. Miguel Pestana de Vasconcelos – O Contrato de Franquia (Franchising). Coimbra : Almedina, 2010, p. 140. Cf. L. Miguel Pestana de Vasconcelos – O Contrato de Franquia (Franchising). Coimbra : Almedina, 2010, p. 142. Cf. artigo 1.º, n.º 1, LCA.

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própria e assumem o risco de comercialização55. Na prática é frequente surgirem dificuldades na qualificação do contrato, muito embora teoricamente esta distinção seja clara e fácil de ser feita. A franquia tem um âmbito mais alargado, uma vez que existem três modalidades, a concessão aplica-se sobretudo à distribuição; na franquia, “o grau de integração da empresa franquiada na rede” confere ao franquiador uma maior ingerência na actividade do franquiado, do que no caso da concessão56; no contrato de franquia existe uma assistência mais ampla e a obrigação do franquiador em transmitir o saber-fazer. A esta maior ingerência na actividade do franquiado, contrapõem-se as técnicas de gestão empresarial e de comercialização próprias do concessionário57. O franquiado comercializa os bens e/ou serviços, mediante a utilização da marca e logótipo, que pertencem ao franquiador; o concessionário age sob a marca e outros sinais distintivos de comércio próprio. Por outras palavras, é mais visível o carácter autónomo do concessionário, em contraste com a franquia, em que muitos dos consumidores se convencem que estão perante uma filial. Por último, é comum apenas existir no franchising o pagamento das contrapartidas mencionadas.

“Tudo é franqueável” – Walter Skaupy Artigo escrito segundo o novo acordo ortográfico.

Cf. António Pinto Monteiro - Contratos de Distribuição Comercial. Coimbra : Almedina, 2009, p. 71. Cf. António Pinto Monteiro - Contratos de Distribuição Comercial. Coimbra : Almedina, 2009, p. 124. 57  Cf. Manuel Pereira Barrocas - “O Contrato de Franchising.” Revista da Ordem dos Advogados. Lisboa. Ano 49, Abril de 1989, p. 138. 55

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Bibliografia ALEXANDRE, Isabel - O Contrato de Franquia (franchising). O Direito. Lisboa. Ano 123, n.º 2 e n.º 3. Abril-Setembro. 1991, pp. 319-383. ANTUNES, José Engrácia – Direito dos Contratos Comerciais. Coimbra : Almedina, 2009. ISBN 978-972-40-3935-0. BARROCAS, Manuel Pereira - O Contrato de Franchising. Revista da Ordem dos Advogados. Lisboa. Ano 49, Abril de 1989, pp. 127 a 168. CARVALHO, Diógenes Faria de – Consumidor Endividado, Vítima do Sistema Cultural. Revista Luso-Brasileira de Direito do Consumo, Vol. II, # 1, Março de 2012, pp. 55 a 74. ISSN 2237-1168. CORDEIRO, António Menezes - Do Contrato de Franquia (“franchising”): autonomia privada versus tipicidade negocial. Revista da Ordem dos Advogados. Lisboa, Ano 48, 1988, pp. 63-84. DUARTE, Rui Pinto – Tipicidade e atipicidade dos contratos. Coimbra : Almedina, 2000. ISBN 9789724012964. LEITÃO, Luís Menezes - A indemnização de clientela no contrato de agência. Coimbra : Almedina, 2006. ISBN 9789724027555. MARTINEZ, Pedro Romano – Contratos Comerciais. Cascais : Principia, 2003. ISBN 972-8500-61-0. MONTEIRO, António Pinto - Contratos de Agência, de Concessão e de Franquia («franchising»). Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Ferrer Correia. Coimbra : Universidade de Coimbra. 1984. MONTEIRO, António Pinto - Contratos de Distribuição Comercial. Coimbra: Almedina, 2009. ISBN 9789724016146. OLAVO, Carlos - O Contrato de “franchising”. Novas Perspectivas do Direito Comercial. Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa. Centro de Estudos Judiciários. Coimbra : Almedina, 1988, pp. 159-174. PEREIRA, Alexandre Libório Dias – Da franquia de empresa (“Franchising”). Boletim da Facultade de Direito da Universidade de Coimbra. Volume 73. 1997, pp. 215-278. RIBEIRO, Maria de Fátima - O Contrato de franquia (franchising). Coimbra : Almedina, 2001. ISBN 972-40-1521-1.

VASCONCELOS, L. Miguel Pestana de, – O Contrato de Franquia (Franchising). Coimbra : Almedina, 2010. ISBN 978-972-40-4123-0.

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MANUAL ELEMENTAR DE FORMAÇÃO

BALCÃO ÚNICO DO SOLICITADOR BUS CARLOS JOSÉ MATOS Solicitador, Formador do CG e do CRN da Câmara dos Solicitadores, Prelector das cadeiras de “Registos” e “Documentos Particulares Autenticados” nos Pólos de Leiria e Coimbra do Estágio de Solicitadores, membro do GOE do Pólo de Leiria TIMÓTEO DE MATOS Solicitador (cuja inscrição se encontra, actualmente, cancelada por invalidez), foi membro do CRN da Câmara dos Solicitadores, membro de várias comissões nacionais da CS: membro Comissão Nacional de Imagem e Publicidade, membro Comissão Nacional de Formação, membro Comissão Nacional do Balcão Único dos Solicitadores, membro Comissão Nacional de Revisão dos Estatutos e membro da redacção da Revista Sollicitare, entre outras; Formador do CG e do CRN da Câmara dos Solicitadores, Prelector das cadeiras de “Registos” e “Documentos Particulares Autenticados” nos Pólos de Leiria e Guarda do Estágio de Solicitadores, Coordenador do Pólo de estágio de Leiria. INTRODUÇÃO

O

s autores deste manual, solicitadores ambos, tendo o segundo muito recentemente passado à situação de reforma, desenvolveram, desde o início nos escritórios que compartilhavam, as competências inerentes ao Balcão Único, sendo ambos formadores da Câmara dos Solicitadores nessa mesma área. A ideia de estruturar este pequeno e modesto manual elementar de formação sobre o Balcão Único do Solicitador decorre da dificuldade que sentem Solicitadores estagiários e Solicitadores em actividade em responder cabalmente às questões que se lhes põem de aprendizagem, ou de pôr em prática as competências que lhes são conferidas pelo Balcão único. Com a formação nacional que decorreu no ano de 2011, onde os autores foram, também, prelectores, mais se reforçou essa necessidade, pelo que resolveram deitar mãos ao trabalho. A tarefa, que aparentemente era fácil, veio a demonstrar alguns escolhos, pelo que só agora foi possível fornecer o trabalho, ainda que muito incompleto, a formandos e formadores. Temos a veleidade de supor que poderemos vir a contar com as sugestões de todos, com vista à sua beneficiação e actualização. Pese embora tudo isso, achámos que valia a pena apresentá-lo agora, com o intuito de poder dar uma pequena ajuda na formação de estagiários recentemente iniciada. Aqui fica, pois, este incompleto manual, à disposição da Câmara dos Solicitadores, a quem o dedicamos. Esperamos que sirva a todos aqueles que se interessam por esta matéria e, sobretudo, a todos os que tiveram a coragem de implementar o Balcão Único nos seus escritórios. Por opção e convicção, está este trabalho escrito conforme as normas do anterior acordo ortográfico. Nota dos Autores: Devido a alterações na legislação, este manual, concluído em Janeiro de 2012, foi objecto de algumas modificações efectuadas em 26/11/2012, com as quais é agora apresentado.

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Balcão Único Do solicitador Bus

MÓDULO 1: O balcão único do solicitador (BUS) 127 MÓDULO 2: Regulamento do BUS 129 MÓDULO 3: O registo online de actos dos solicitadores (ROAS) 131 MÓDULO 4: Traduções e sua certificação 133 MÓDULO 5: Certificação de fotocópias 135 MÓDULO 6: Reconhecimento de assinaturas Reconhecimento Simples 137 Reconhecimento com Menções Especiais 137 Reconhecimento de Assinaturas a Rogo 139 MÓDULO 7: Autenticação de documentos particulares (não sujeitos a registo predial) 143 MÓDULO 8: Escritura ou documento particular autenticado sujeito a registo (DPA) 148 MÓDULO 9: Documento particular autenticado: o contrato Compra e venda 150 Doação 154 Partilha 157 Propriedade horizontal 163 Divisão 166 Permuta 168 MÓDULO 10: DPA: Particularidades do termo de autenticação sujeito a registo predial 171 MÓDULO 11: DPA: O depósito 177 MÓDULO 12: DPA: O registo 178 MÓDULO 13: Organização de escritório e arquivo 179 MÓDULO 14: DPA: O Modelo 11 181

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MÓDULO 1 O BALCÃO ÚNICO DO SOLICITADOR (BUS) EXERCER OU NÃO AS FUNÇÕES DO BALCÃO ÚNICO Anteriormente à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 116/2008, as competências do Solicitador (excluindo os que trabalhavam como agentes de execução) eram reduzidas. O Solicitador, nos Tribunais, tinha intervenção esporádica em Inventários e num ou noutro processo executivo. Porém, nas Conservatórias, Repartições de Finanças e Câmaras Municipais, os Solicitadores foram, a pouco e pouco, ganhando confiança, transformando-se em autênticos especialistas. Pelas suas mãos passava a quase totalidade dos processos mais complicados. Os Solicitadores tinham intervenção numa grande quantidade de registos e larguíssima fatia na preparação de escrituras. Eram profissionais muito bem preparados para o estudo e obtenção de toda a documentação necessária à elaboração de escrituras e registos. Mas não mais do que isso. Por outras palavras: eram agentes menores que se limitavam a requerer documentos numas repartições e a transportá-los para outras, onde era feita a respectiva apresentação. Com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 116/2008, tudo muda: Em primeiro lugar, são agilizados procedimentos diversos, como é o caso da consulta e obtenção de certidões e apresentação de registos via Internet. Para além disso, o Solicitador passa a deter poderes de elaborar e autenticar a grande maioria dos documentos, equiparando-se, neste capítulo, a sua acção à dos notários e advogados. Essa fatia de mercado, no que diz respeito à preparação de escrituras e registos, que o Solicitador detinha, só será mantida enquanto o cidadão, que decide hoje a escolha do profissional a quem quer recorrer, confiar plenamente no profissional onde estava habituado a deslocar-se, o Solicitador. Para que isso aconteça, terá o Solicitador, em primeiro lugar, que preparar-se devidamente e, em segundo, optar por exercer no seu escritório as funções que lhe foram conferidas por esse diploma legal (autenticação de documentos particulares sujeitos a registo), bem como os que lhe tinham sido já anteriormente conferidos pelo Decreto-Lei n.º 76-A/2006 e outros anteriores (certificação de fotocópias, certificação de traduções, reconhecimento de assinaturas e autenticação de documentos particulares não sujeitos a registo predial). A não exercer estes serviços no seu escritório perderá, a pouco e pouco, a fatia de trabalho que lhe era concedida já que os cidadãos rapidamente se aperceberão da desnecessidade de contratarem um profissional que, não autenticando os documentos, pouco mais fará, na maioria dos casos, do que aquilo que eles próprios poderiam fazer, isto é, deslocar-se ao notário para solicitar a realização de uma escritura.

VANTAGENS DE ADESÃO AO BUS Decorre do Decreto-Lei n.º 116/2008 que o facto de se ser Solicitador implica automaticamente a possibilidade de usar todas as faculdades acima indicadas, quanto a certificações, reconhecimentos e autenticações, independentemente de aderir ou não ao BUS. Sobre o regulamento do BUS e respectiva adesão falaremos no capítulo seguinte. No entanto, deveremos adiantar já os seguintes direitos dos Solicitadores constituídos em Balcão Único, referidos no art.º 34.º do Regulamento de Publicidade e Imagem dos Solicitadores e Agentes de Execução, direitos esses que constituem vantagens consideráveis para os respectivos aderentes. Assim, de acordo com o referido artigo, os Solicitadores constituídos em Balcão Único, com registo na Câmara dos Solicitadores, têm direito: – A constar da lista de Solicitadores constituídos em Balcão Único, em sítio na internet, propriedade da Câmara dos Solicitadores;

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Balcão Único Do solicitador Bus

– Ao uso da imagem e estacionário do Balcão Único do Solicitador; – A ter a qualidade do seu serviço de Balcão Único reconhecida pela Câmara dos Solicitadores; – A beneficiar da publicidade funcional da Câmara dos Solicitadores; – A usar cartazes, anúncios e demais suportes de divulgação autorizados do Balcão Único do Solicitador; – Ao acesso à área reservada do sitio www.balcaounicodosolicitador.pt, com informação específica sobre os actos dos Solicitadores constituídos em Balcão Único e modelos de imagem, tabuletas, cartazes, anúncios e estacionário.

Bibliografia CARREIRA, Idalina – A Afirmação de uma Identidade, Sollicitare, Edição nº 9, 2011 RODRIGUES, Fernando – Reflexões sobre as primeiras jornadas culturais dos Solicitadores, in Boletim Informativo CRNorte, edição 19, Outubro de 2009. TEIXEIRA, Paulo – Balcão Único do Solicitador, in Boletim Informativo CRNorte, edição 34, Março de 2011.

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MATOS, Timóteo de – Balcão único: o Futuro nas nossas mãos, Comunicação ao V Congresso Nacional dos Solicitadores, Outubro de 2011 OLIVEIRA, José Manuel – A formação na Câmara dos Solicitadores, Comunicação ao V Congresso Nacional dos Solicitadores, Outubro de 2011


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MÓDULO 2 REGULAMENTO DO BUS Estudámos, no capítulo anterior, os direitos dos Solicitadores constituídos em Balcão Único. Referimos então que, mais do que simples direitos, se trata de verdadeiras vantagens para os aderentes. Vamos agora abordar o Regulamento do Balcão Único do Solicitador (art.º 29.º a 35.º, inclusive, do Regulamento de Publicidade e Imagem dos Solicitadores e Agentes de Execução): A Câmara dos Solicitadores registou a marca Balcão Único do Solicitador e desenvolveu uma imagem que inclui estacionário, cartazes e o sítio www.balcaounicodoSolicitador.pt, estando o uso da marca e imagem sujeito a registo e cumprimento das obrigações constantes do regulamento referido. O processo de registo inicia-se com a entrega de um requerimento e o pagamento (ou o seu comprovativo) da taxa fixada para o efeito. Será o pedido deferido, pelo Conselho Geral, desde que o escritório reúna os requisitos necessários, que serão verificados por auditoria, e que são os seguintes: – Ter escritório que assegure dignidade e privacidade no atendimento dos utentes com horário afixado; – Ter estrutura de arquivo; – Ter equipamento informático, nomeadamente computador, digitalizador, impressora e ligação de banda larga à internet; – Possuir linhas de telefone e fax; – Ter certificado digital; – Ter afixada a tabela de honorários dos actos praticados em regime de Balcão Único; – Ter seguro de responsabilidade civil no montante mínimo de cinquenta mil euros. Após o registo, fica o Solicitador obrigado a frequentar acções de formação, a definir anualmente pelo Conselho Geral, podendo aquele que frequente outras acções não ministradas pela Câmara, pedir o seu reconhecimento como válidas para esse efeito (art.º 31.º, n.º 3 e 4 do Regulamento). O registo deve ser renovado de dois em dois anos, com nova verificação da manutenção, ou não, dos requisitos exigidos, nomeadamente a existência dos créditos da formação obrigatória. Caso se verifique a não existência das condições necessárias, caduca o registo, só podendo ser efectuado novo registo depois de totalmente sanados os vícios que levaram à caducidade. Caso tenha dúvidas fundadas sobre a qualidade das estruturas ou do serviço prestado, pode o Conselho Geral auditar os escritórios registados em Balcão Único, revogando o respectivo registo desde que seja negativo o parecer do respectivo auditor. As infracções, no âmbito do serviço do BUS, são comunicadas ao Conselho Geral e, resultando da infracção pena superior à de multa, pode ser aplicada pena acessória de cancelamento do registo do Balcão Único, por um prazo certo. Também os órgãos com competência disciplinar podem requerer ao Conselho Geral o cancelamento do registo, com indicação das infracções disciplinares praticadas e da pena aplicada. A marca, logótipos e estacionário vêem definidos no anexo IV do Regulamento (que abaixo se transcreve), sendo de uso obrigatório para os Solicitadores registados no Balcão Único do Solicitador.

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Balcão Único Do solicitador Bus

ANEXO IV

LOGÓTIPO E ESTACIONÁRIO BUS

Descrição: No lado esquerdo uma imagem gráfica composta por quatro semi-círculos concêntricos em três dimensões. No lado direito os dizeres “Balcão Único do Solicitador”. Cores: Bordeaux. Estacionário: pastas, envelopes, papel de carta, papel de fax e cartão pessoal.

LEGISLAÇÃO – Regulamento de Publicidade e Imagem dos Solicitadores e Agentes de Execução.

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MÓDULO 3 O REGISTO ONLINE DE ACTOS DOS SOLICITADORES (ROAS) O QUE É E PARA QUE SERVE O ROAS Ao Solicitador foram conferidas competências para a prática de reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, de autenticar documentos particulares, de certificar ou fazer e certificar traduções de documentos, bem como de certificar a conformidade das fotocópias com os documentos originais e de tirar fotocópias dos originais que lhe sejam presentes para certificação (n.º 1 do art.º 38.º do Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março). Todos esses actos efectuados pelo Solicitador conferem ao documento igual força probatória à que teriam se realizados com intervenção notarial (n.º 2 do referido art.º 38.º). No entanto, esses mesmos actos apenas podem ser praticados validamente pelo Solicitador se forem registados em sistema informático. Esse registo encontra-se definido pela Portaria n.º 657-B/2006, de 29 de Junho, que no seu art.º 2.º confere à Câmara dos Solicitadores a competência para o desenvolvimento e gestão do respectivo sistema informático. Tal sistema encontrase já em funcionamento e denomina-se ROAS (Registo Online de Actos dos Solicitadores). Relativamente a cada um dos actos, terão de ser registados no sistema informático os seguintes elementos (art.º 3.º da referida Portaria): – Identificação da natureza e espécie dos actos; – Identificação dos interessados, com menção do nome completo e do número do documento de identificação; – Identificação da pessoa que pratica o acto; – Data e hora de execução do acto; – Número de identificação do acto. O registo é efectuado no momento da prática do acto, sendo gerado um número de identificação pelo sistema informático (art.º 4.º, n.º 1 da referida Portaria). Ainda, nos termos do n.º 1 do referido art.º 4.º, deverá o número de identificação gerado pelo sistema ser aposto no documento que formaliza o acto. A mais não obriga a Portaria. No entanto, tem vindo a ser prática da grande maioria dos Solicitadores obter cópia de todos os dados do registo e juntá-la ao documento reconhecido, autenticado ou certificado. Tal prática merece a nossa inteira aprovação já que, para além de significar uma total transparência por parte da entidade competente, tem, ainda, a vantagem de, por um lado, facilitar a verificação por parte de quem observa o documento e, por outro, de ser mais uma possibilidade de defesa da própria entidade registada. Nos termos do art.º 21.º do Regulamento de Publicidade e Imagem dos Solicitadores e Agentes de Execução, é sempre obrigatório apôr o selo de autenticação (regulado no art.º 20 do referido Regulamento) nos reconhecimentos de assinaturas, traduções, certificados de tradução, certificação de fotocópias e autenticação de documentos

COMO ACEDER AO ROAS E REGISTAR O ACTO Para aceder ao ROAS é necessário, previamente, requerer, ao Conselho Geral da Câmara dos Solicitadores, o utilizador e a senha. Obtidos estes dados, estamos prontos a fazer o registo de todos actos que venhamos a executar. Para aceder e fazer o registo no ROAS, deverão dar-se os seguintes passos: 1 – Aceder ao site www.Solicitador.org/roas/login.jsp; 2 – Escrever utilizador (nome fornecido pela Câmara dos Solicitadores) e senha (também fornecida pela CS); 3 – Entrar clicando em “OK”; 4 – Seleccionar “registos”;

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5 – Seleccionar “registo”; 6 – Seleccionar acto pretendido (p. ex.: autenticação de documentos, reconhecimentos, etc.); 7 – Inserir número do Selo de Autenticação; 8 – Descrever acto praticado (reconhecimento da assinatura de F… no documento X); 9 – Inserir valor (não obrigatório); 10 – Introduzir dados referentes aos intervenientes no acto; 11 – Seleccionar “Inserir”; 12 – Clicar em “Documento” para obter página com dados do acto; 13 – Imprimir página.

LEGISLAÇÃO – Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março: especialmente art.º 38.º; – Portaria n.º 657-B/2006, de 29 de Junho; – Regulamento de Publicidade e Imagem dos Solicitadores e Agentes de Execução.

Obs: Via internet, na área restrita da página da Câmara dos Solicitadores, será fornecido anexo contendo simulação de registo de acto no ROAS.

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MÓDULO 4 TRADUÇÕES E SUA CERTIFICAÇÃO O documento escrito em língua estrangeira deve ser acompanhado da correspondente tradução, a qual, nos termos do número 3 do art.º 44.º do Código do Notariado, pode ser feita por notário português (ou Solicitador), pelo consulado português no país onde o documento foi passado, pelo consulado desse país em Portugal ou, ainda, por tradutor idóneo que, sob juramento ou compromisso de honra, afirme, perante o notário (ou Solicitador), ser fiel a tradução. A tradução não é mais do que a versão, para a língua portuguesa, do conteúdo integral de um documento, quando escrito numa língua estrangeira, ou a versão do conteúdo integral, para língua estrangeira, do documento escrito em língua portuguesa [Código do Notariado, art.º 172.º, número 1, alíneas a) e b)]. A tradução deverá sempre indicar a língua em que o original foi escrito e a declaração de que o texto foi fielmente traduzido. No caso de a tradução ser feita por tradutor ajuramentado, deverá ser aposto, na própria tradução ou em folha anexa, certificado que mencione a forma pela qual foi feita a tradução (p. ex.: escrito em língua inglesa e traduzido para a língua portuguesa) e o cumprimento das formalidades previstas no número 3 do art.º 44.º do CN. Nos termos do número 4 do art.º 172.º do CN, à tradução aplicam-se ainda as seguintes disposições: a) Deve conter a declaração de conformidade com o original [art.º 167.º, alínea c) do CN]; b) Nela devem constar averbamentos, quotas de referência e as contas dos instrumentos e documentos a que respeite (art.º 168.º, número 2 do CN); c) Deve fazer menção dos selos e demais legalizações, estampilhas e verbas de pagamento do Imposto de Selo constantes dos originais, devendo, ainda, nela ser assinaladas, de forma visível, todas as irregularidades ou deficiências do texto que viciem o acto ou o documento (art.º 170.º, número 1 do CN); d) Os originais deverão ser certificados em conformidade com as ressalvas que neles foram feitas, podendo estas ser incluídas a pedido dos interessados (art.º 170.º, número 2 do CN). A validade da certificação da tradução depende de registo em sistema informático, no caso do Solicitador o ROAS (Registo Online dos Actos do Solicitador), de acordo com o previsto no número 3 do art.º 38.º do Decreto-Lei 76-A/2006, regulamentado pela Portaria 657-B/2006, de 29 de Junho, devendo ser aposto o Selo de Autenticação no documento.

MINUTAS PARA ELABORAÇÃO DE CERTIFICAÇÃO DE TRADUÇÃO Seguem-se minutas para a certificação de tradução, devendo, no entanto, ser tido em conta que estas são um simples guia e não uma imposição ou modelo único:

1.ª HIPÓTESE: Tradução feita por tradutor ajuramentado CERTIFICADO DE TRADUÇÃO Eu, abaixo assinado, ……………, Solicitador, com a cédula profissional ……, com escritório na Rua ………………, na cidade de …………, contribuinte fiscal n.º …………, certifico que compareceu, no meu escritório, perante mim, F………, casado, natural da freguesia de …………, concelho de …………, residente na Rua ……………, no lugar de ……, freguesia de ……………, concelho de …………, cuja identidade verifiquei pelo Bilhete de Identidade n.º ………… de …/…/……, emitido pelos S.I.C. de …… e que me apresentou a presente tradução do documento que fica anexo, outorgado no dia ………. por F………… que consta de ………… (p. ex.: de uma procuração, de um assento de nascimento, etc.) e por ele efectuada, composto de duas folhas,

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escrito em língua ………… e traduzido para a língua Portuguesa, afirmando sob compromisso de honra, que o texto foi fiel e integralmente traduzido e está conforme o original. -------------------Local, Data O Tradutor: O Solicitador: Recibo n.º ROAS:

2.ª HIPÓTESE: Tradução feita por Solicitador TRADUÇÃO Eu, abaixo assinado, ……………, Solicitador, com a cédula profissional ……, com escritório na Rua ………………, na cidade de …………, contribuinte fiscal n.º …………, certifico que me foi apresentado, para tradução, o documento anexo escrito em língua ……… cujo teor da versão original para a língua portuguesa é o seguinte “………”. -----------------------------------------------------Tem aposto no final uma estampilha no valor de …… com os seguintes dizeres “……………”, bem como a assinatura ilegível e à margem o seguinte averbamento (ou outras quotas de referência, contas, etc). ------------------------------------------------------------------------------------------------------Está conforme o original. ------------------------------------------------------------------------------------------Local, Data O Solicitador: Recibo n.º ROAS:

LEGISLAÇÃO – Código do Notariado: especialmente art.º 44.º, 167.º, 168.º, 170.º e 172.º; – Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março: especialmente art.º 38.º; – Portaria n.º 657-B/2006, de 29 de Junho.

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MÓDULO 5 CERTIFICAÇÃO DE FOTOCÓPIAS O art.º 38 do Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março, com as alterações que lhe foram dadas pelo Decreto-Lei n.º 8/2007, de 17 de Janeiro, confere aos Solicitadores competência para certificarem a conformidade das fotocópias com os documentos originais, extraírem fotocópias dos originais que lhes sejam presentes para certificação e certificarem a conformidade de documentos electrónicos com os documentos originais em suporte de papel, podendo proceder à digitalização de originais que lhes sejam apresentados para certificação. Antes de estudarmos o modo de procedimento na certificação e conferência de fotocópias, deveremos compreender as seguintes distinções feitas pelo Código do Notariado. Assim: Certidões são documentos emitidos pelo Notário (ou outras repartições públicas) extraídas de documentos lá arquivados. As certidões emitidas nestas condições têm a força probatória dos originais (art.º 164.º número 1 do CN e 383.º número 1 do CC). Públicas-formas são cópias de teor, total ou parcial, extraídas pelo notário ou outra entidade autorizada (p. ex.: o Solicitador), de documentos, que lhe sejam presentes para esse efeito (art.º 171.º do CN e 386.º do CC). O notário pode efectuar conferência de fotocópias de documentos não arquivados no cartório, desde que, tanto a fotocópia como o documento, lhe sejam apresentados para esse fim. Poderá, no entanto, exigir que a fotocópia seja extraída no próprio Cartório, caso a natureza ou extensão dos documentos implique uma conferência excessivamente demorada (art. º 171.º-A do CN). Do exposto e em conjugação com o número 1 do art.º 38.º do referido Decreto-Lei 76-A/2006, verifica-se que o Solicitador tem poderes para certificar a conformidade de fotocópias com os originais (conferência de fotocópias) e, ainda, de tirar fotocópias dos originais, certificando-as (pública-forma). O IRN (P.º C.N. n.º 3/2010 SJC-CT) entende ser possível a certificação do DPA pelo Solicitador que o autenticou. Entendemos, entretanto, não lhe chamar certidão por não constar de arquivo público, o que em nada altera o seu valor (ver a 2.ª hipótese de minuta do presente módulo). Ao invés, Fernando Neto Ferreirinha e Zulmira Neto da Silva em “A Função Notarial dos Advogados”, 2.ª Edição – Almedina, entendem que tal certificação não é possível. Quer a certificação de fotocópias, quer a sua conferência, nos termos do número 2 do art.º 38.º do citado diploma, conferem ao documento a mesma força probatória que teria se tais actos tivessem sido realizados com intervenção notarial. Para que os actos acima referidos tenham validade deverá o Solicitador cumprir os seguintes requisitos: a declaração de conformidade com o original, local e data da realização do acto, nome e assinatura do autor da certificação, carimbo profissional ou selo branco, numeração das folhas, tudo nos termos dos art.º 160.º e número 2 do art.º 171.º do CN. Para validade dos actos terá ainda o Solicitador de proceder ao registo de cada um deles em sistema informático (o ROAS, no caso do Solicitador) conforme previsto na Portaria 657-B/2006, de 29 de Junho. Caso se trate de públicas-formas de bilhetes de identidade ou passaportes, só poderão estas ser extraídas se o documento estiver dentro do prazo de validade e em bom estado de conservação, salvo se requeridas pelo tribunal, devendo conter a menção do número, data de emissão e emitente do original do documento (art.º 171.º números 3 e 4 do CN). Igualmente, de acordo com o número 3 do art.º 171.º-A do CN, não é permitida a conferência de fotocópias de bilhetes de identidade ou passaportes quando ultrapassada a validade desses documentos ou caso se encontrem em mau estado de conservação. É, ainda, possível extrair publicas-formas de documentos escritos em língua estrangeira, que o Solicitador domine, desde que o interessado alegue que não é exigível a sua tradução pela entidade perante a qual vai fazer fé (número 5 do art.º 171.º do CN). Encontrando-se ainda em vigor o art.º 2.º do Decreto-Lei 28/2000, de 13 de Março, deveremos entender que o Solicitador não poderá cobrar valor superior ao resultante da tabela para

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as entidades certificadoras, em vigor nos Cartórios Notariais. Os honorários máximos a cobrar por certificação de fotocópias estão previstos no art.º 10.º, n.º 7 da tabela que foi aprovada pela Portaria 385/2004, de 16 de Abril, e são, actualmente, os seguintes: Por cada certificação ou conferência: até 4 páginas inclusive 16,81 €; A partir da 5.ª página, por cada página a mais, 2,10 €. Acresce o IVA. Não esquecer o ROAS e Selo de Autenticação.

MINUTAS PARA ELABORAÇÃO DE CERTIFICAÇÃO DE FOTOCÓPIA Seguem-se minutas para a certificação de fotocópias, devendo, no entanto, ser tido em conta que estas minutas são um simples guia e não uma imposição ou modelo único:

1.ª HIPÓTESE: Conferência de fotocópia CONFERÊNCIA DE FOTOCÓPIA Eu, abaixo assinado, ……………, Solicitador, com a cédula profissional ……, com escritório na Rua ………………, na cidade de …………, contribuinte fiscal n.º …………, certifico que esta fotocópia, composta de …… folhas, está conforme o original de …… (p. ex.: projecto de obras n.º …, aprovado em ……, pela Câmara Municipal de …… ou procuração lavrada em ……, no Cartório Notarial de ………), que me foi apresentado para fim desta conferência. ----------------Local, Data O Solicitador: Recibo n.º ……… ROAS: ……

2.ª HIPÓTESE: Certificação de fotocópia CERTIFICAÇÃO DE FOTOCÓPIA Eu, abaixo assinado, ……………, Solicitador, com a cédula profissional ……, com escritório na Rua ………………, na cidade de …………, contribuinte fiscal n.º …………, certifico que esta fotocópia, que extraí do Documento Particular Autenticado de ……… (p. ex.: Compra e Venda, Doação), autenticado aos ……, arquivado no meu escritório sob o Doc. …… na respectiva Pasta ……, está em conformidade com o original e consta de 6 folhas, sendo a última a do ROAS. ------Local, Data O Solicitador: Recibo n.º ……… ROAS: ……

LEGISLAÇÃO – Código Civil: especialmente art.º 383.º, 386.º, 387.º; – Código do Notariado, especialmente art.º 160.º, 164.º, 171.º e 171.º-A; – Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março: especialmente art.º 38.º; – Decreto-Lei n.º 28/2000, de 13 de Março: especialmente art.º 2.º; – Portaria n.º 385/2004, de 16 de Abril; – Portaria n.º 657-B/2006, de 29 de Junho.

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MÓDULO 6 RECONHECIMENTO DE ASSINATURAS ESPÉCIES DE RECONHECIMENTOS Os reconhecimentos de assinaturas podem ser simples ou com menções especiais (art.º 153.º, número 1 do Código do Notariado [CN]). O reconhecimento simples respeita à letra e assinatura, ou só à assinatura, do signatário do documento (art.º 153.º, número 2 do CN). O reconhecimento com menções especiais inclui a menção de qualquer circunstância especial que se refira aos interessados, aos signatários ou aos rogantes, que seja conhecida do Solicitador ou por ele verificada nos documentos que lhe são exibidos e que deverá referir no reconhecimento. A menção referida decorre da exigência da lei ou do pedido dos interessados (art.º 153.º, número 3 do CN).

RECONHECIMENTO SIMPLES O reconhecimento simples é sempre presencial devendo, portanto, letra e assinatura ou só assinatura serem feitas na presença do Solicitador ou, estando o signatário presente no acto (números 4 e 5 do referido art.º 153.º).

RECONHECIMENTO COM MENÇÕES ESPECIAIS Os reconhecimentos com menções especiais podem ser presenciais ou por semelhança (número 4 do art.º 153.º do CN). Designa-se reconhecimento por semelhança, aquele que refere menção especial relativa à qualidade de representante do signatário (p. ex.: gerente de uma sociedade, procurador, etc.) e é feito por simples confronto da assinatura deste com a assinatura aposta no seu Bilhete de Identidade, ou documento equivalente, emitido pela autoridade competente de qualquer país da União Europeia, ou no passaporte, ou respectiva reprodução em pública-forma extraída por fotocópia (número 6, do mencionado art.º 153.º). No caso de reconhecimento na qualidade de representante de pessoa colectiva (p. ex.: gerente) com poderes para o acto da alienação de um veículo automóvel, em que a actividade de compra e venda desses veículos não esteja incluída no objecto, é possível fazer o reconhecimento de assinatura, devendo o representante declarar que tal é conveniente à prossecução dos fins da sua representada (ver deliberação do Conselho Técnico da DGRN de 26/1/2001 no BRN n.º 2/2001 [2.º caderno], pp. 50 e 51). REQUISITOS NECESSÁRIOS Quer se trate de reconhecimentos presenciais, quer de reconhecimentos por semelhança, deverão ser respeitados os seguintes requisitos: – Os reconhecimentos são lavrados no próprio documento a que respeitam, ou em folha anexa (art.º 36.º, número 4 do CN), agrafando-se, numerando-se e rubricando-se todas as folhas.

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– O termo de reconhecimento deverá conter: – Designação do dia, mês, ano e lugar em que é efectuado; – Menção do nome completo do signatário ou do rogante e a forma como foi verificada a identidade: por conhecimento pessoal, por exibição dos documentos referidos no art.º 48.º do CN, ou por declaração de dois abonadores; – Nos reconhecimentos com menções especiais, a menção dos documentos exibidos e referenciados; – Nos reconhecimentos de assinatura a rogo, a menção de que o rogante não pode ou não sabe assinar e que deu, ou confirmou, o rogo perante o Solicitador, no acto, depois de ter sido lido e explicado o conteúdo do documento; – A assinatura dos abonadores, nos casos em que intervenham nos reconhecimentos presenciais; – A assinatura do Solicitador; – A menção de que fica arquivada declaração para liquidação do IMT e respectivo comprovativo de pagamento, nos reconhecimentos apostos em contratos promessa de aquisição de bens imóveis, com cláusula de cedência de posição contratual a terceiro ou nos contratos de cessão dessa posição (art.º 154.º e 155.º do CN e 49.º, número 1 do CIMT). O código do Notariado, no seu art.º 152.º, não exige a obrigatoriedade de aposição da impressão digital do rogante nos reconhecimentos a rogo. No entanto, é, geralmente, seguida a prática da inclusão da impressão digital, a qual recomendamos, por constituir mais um elemento de segurança, à semelhança do que prescreve o artigo 51.º do CN para os instrumentos. Sobre as regras a observar na escrita deverá ter-se em consideração o preceituado no art.º 40.º do CN, sendo de realçar que é permitido o uso de algarismos e abreviaturas nos casos apontados nas alíneas a) a g) do número 3 do referido artigo. RECUSA DO RECONHECIMENTO DE ASSINATURAS O Solicitador deverá recusar o reconhecimento da assinatura (quer seja a rogo, quer nos outros reconhecimentos) especialmente nos seguintes casos previstos no artigo 157.º do Código do Notariado: – Em documento com leitura não facultada ao Solicitador; – Em documento sem quaisquer dizeres; – Em documento com linhas ou espaços em branco não inutilizados; – Em documento escrito em língua estrangeira, não dominada pelo Solicitador, salvo se traduzido, nos termos do Código do Notariado; – Em documento escrito ou assinado a lápis; – Quando o acto titulado no documento estiver isento de Imposto de Selo e nele não esteja mencionada a disposição legal que confere o benefício (art.º 8.º do CIS) ou quando não se mostre pago o imposto devido. ENCARGOS Actualmente o reconhecimento é de custo livre, acrescendo o IVA ao valor cobrado a título de honorários. O reconhecimento de assinaturas não está sujeito a Imposto de Selo. No entanto, convém lembrar que não foi devidamente actualizado o Código do Notariado, que impõe, neste caso documento selado, no seu artigo 157.º. A verdade é que a Lei 3-B/2010, de 28/4, revogou a verba 15 da Tabela Geral do IS. E revogada a verba, revogado também está o referido artigo 157.º. Quando, nos documentos e títulos sujeitos a imposto, verifique não se encontrar este liquidado (p. ex.: imposto de selo da verba 2 da Tabela Geral do CIS), deverá o Solicitador proceder à sua liquidação, mencionando no final do termo do reconhecimento “liquidado hoje imposto de selo da

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verba 2 no valor de …… euros, como consta do documento número …. comprovativo do respectivo pagamento” ou outra expressão aplicável. LEGITIMIDADE E FORÇA EXECUTIVA A legitimidade para reconhecer assinaturas é conferida ao Solicitador pelo Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29/3, nomeadamente pelo seu artigo 38.º, sendo conferida força executiva ao documento no qual o reconhecimento da assinatura foi feita pelo Solicitador, pelo artigo 51.º do Código de Processo Civil.

RECONHECIMENTO DE ASSINATURAS A ROGO E agora, como é que vou fazer para reconhecer a assinatura do homem, se ele não sabe assinar? É esta uma das questões que, frequentemente, coloca o Solicitador quando lhe surge, pela primeira vez, um indivíduo que, não sabendo assinar, pretende que lhe seja reconhecida a assinatura num documento que lhe é essencial. O reconhecimento a rogo constitui, de facto, uma das maiores dificuldades para o Solicitador que, pela primeira vez, é chamado a fazê-lo, pelo que vamos abordar esta questão um pouco mais profundamente, repetindo mesmo, nalguns casos, algumas questões já abordadas anteriormente. Podemos, no entanto, afirmar que o reconhecimento a rogo se transformará numa tarefa simples e rotineira do dia a dia do nosso escritório, desde que se tenham os conhecimentos necessários e alguns cuidados essenciais: 1 – CONHECER A LEGISLAÇÃO APLICÁVEL; 2 – SEGUIR, PASSO A PASSO, AS NORMAS CONSIGNADAS NA LEI; 3 – ELABORAR O TEXTO DO RECONHECIMENTO E APÔ-LO NO DOCUMENTO OU EM FOLHA ANEXA. Analisemos, então, cuidadosamente cada um destes aspectos: 1 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL: Aos reconhecimentos notariais, aplicam-se, especialmente, os seguintes diplomas legais, aconselhando-se aos formandos que os tenham sempre à mão: – Código Civil: artigos 373.º e seguintes; – Código do Notariado: artigos 153.º a 157.º, inclusive e, ainda, o artigo 46.º, n.º 1 e artigo 51.º do mesmo Código. Especificamente sobre assinatura a rogo: artigo 154.º; – Código de Processo Civil: artigo 51.º; – Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29/3: artigo 38.º; – Portaria n.º 657-B/2006, de 29/6. 2 – ASPECTOS E NORMAS LEGAIS A TER EM CONTA: COMO E QUANDO É FEITO O RECONHECIMENTO DA ASSINATURA A ROGO Determinado indivíduo necessita de assinar um contrato, um instrumento notarial, ou qualquer outro documento, ou, é-lhe solicitado, nesta ou noutras circunstâncias, o reconhecimento da sua assinatura. Admitamos, ainda, que esse indivíduo não sabe assinar ou, por qualquer razão, está impossibilitado de o fazer. Como proceder, em tal caso, para resolver a questão? Quem não sabe ou não pode assinar, solicita a outra pessoa que assine por si. Neste caso, o primeiro denomina-se “rogante” e o segundo, “rogado”.

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Deverá acrescentar-se que o rogo só acontece nas condições indicadas, isto é, quando alguém não saiba ou não possa assinar (artigo 373.º, número 1, do CC). O rogo é sempre presencial e terá de ser dado, ou confirmado, perante o Solicitador, no próprio acto do reconhecimento da assinatura e depois de lido o documento ao rogante (artigo 154.º do CN). Simultaneamente, deverá o Solicitador verificar a identidade do rogante e do rogado, por qualquer dos meios que o Código do Notariado indica: por exibição de documento de identificação (BI, Passaporte, Carta de Condução, Cartão do Cidadão); por conhecimento pessoal, ou por dois abonadores. Como acima ficou dito, é pratica comum, e de toda a conveniência, apor, à margem do documento, a impressão digital do indicador da mão direita do rogante, à semelhança do prescrito no art.º 51.º do CN para os instrumentos notariais. Na impossibilidade de ser utilizado este dedo, deverá ser substituído por outro, à escolha do Solicitador, fazendo-se menção do dedo a que corresponde junto à impressão digital. Na impossibilidade, ainda, de ser usado qualquer dos dedos do rogante é aceitável a não aposição de qualquer impressão digital. Neste último caso, vem sendo seguido o entendimento de substituir a impressão digital pela intervenção de duas testemunhas, que assinam o documento conjuntamente com o rogado. OBRIGAÇÕES FISCAIS Convém relembrar que, à semelhança de qualquer outro reconhecimento, não está o reconhecimento de assinaturas a rogo sujeito a Imposto de Selo. LEGITIMIDADE E FORÇA EXECUTIVA A legitimidade é dada ao Solicitador, de acordo com o acima referido, pelo Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29/3, sendo-lhe reconhecida força executiva pelo artigo 51.º do Código de Processo Civil. ELABORAÇÃO DO RECONHECIMENTO E REGISTO NO ROAS Sabida a legislação e aspectos a ter em conta, fica o Solicitador perfeitamente apto a escrever o texto e fazer o reconhecimento de qualquer assinatura, após o que terá de proceder ao Registo Online de Actos do Solicitador (ROAS), para total validade.

MINUTAS PARA ELABORAÇÃO DE RECONHECIMENTOS DE ASSINATURAS Seguem-se minutas para o reconhecimento de assinaturas, lembrando-se, de novo, que estas são um simples guia e não uma imposição ou modelo único:

1.ª HIPÓTESE: Reconhecimento simples RECONHECIMENTO DE ASSINATURA Eu, abaixo-assinado, F……, solicitador, com cédula profissional ……, com escritório em ……, reconheço a assinatura supra (ou infra ou em folha anexa) de F……, feita na minha presença pelo próprio, cuja identidade verifiquei por …… (ex: exibição do BI). --------------------------------------------Local e data Recibo n.º ……… (ou, se for o caso, acto gratuito) ROAS n.º ……… Assinatura (sobre selo de autenticação)

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2.ª HIPÓTESE: Reconhecimento simples (letra e assinatura feitas na presença do Solicitador) RECONHECIMENTO DE ASSINATURA Eu, abaixo-assinado, F……, solicitador, com cédula profissional ……, com escritório em ……, reconheço a letra e assinatura supra (ou infra ou em folha anexa) de F……, feitas na minha presença pelo próprio, cuja identidade verifiquei por …… (ex: exibição do BI …). -----------------------Local e data Recibo n.º ……… (ou, se for o caso, acto gratuito) ROAS n.º ……… Assinatura (sobre selo de autenticação)

3.ª HIPÓTESE: Reconhecimento simples (assinatura ou letra e assinatura feitas anteriormente mas confirmadas pelo próprio no acto do reconhecimento) RECONHECIMENTO DE ASSINATURA Eu, abaixo-assinado, F………………, solicitador, com cédula profissional ………, com escritório em ………………, reconheço a assinatura (ou letra e assinatura) supra (ou infra ou em folha anexa) de F……………………, que, presente neste acto, confirmou como sendo sua a autoria da referida assinatura (ou das referidas letra e assinatura), cuja identidade verifiquei por …… (ex: exibição do BI …). --------------------------------------------------------------------------------------------------------Local e data Recibo n.º ……… (ou, se for o caso, acto gratuito) ROAS n.º ……… Assinatura (sobre selo de autenticação)

4.ª HIPÓTESE: Reconhecimento por semelhança com menções especiais RECONHECIMENTO DE ASSINATURA Eu, abaixo-assinado, F……, solicitador, com cédula profissional ……, com escritório em ……, reconheço a assinatura supra (ou infra ou em folha anexa) de F……, que confrontei com a assinatura aposta no Bilhete de Identidade ……, emitido em …… por ……, pelo qual verifiquei a sua identidade, na qualidade de gerente e em representação, com poderes para o acto, da sociedade comercial por quotas “………”, com sede em ………, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de ……… com o número único de matrícula e identificação fiscal ………, qualidade e poderes que verifiquei pela certidão permanente com o código de acesso …………, subscrita em ……… e válida até ………, que consultei no Portal da Empresa. -------------------------------------Local e data Recibo n.º ……… (ou, se for o caso, acto gratuito) ROAS n.º ……… Assinatura (sobre selo de autenticação)

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5.ª HIPÓTESE: Reconhecimento por semelhança com menções especiais (com poderes para o acto que se destina à prossecução dos fins estatutários da sociedade - p. ex.: venda de automóvel) RECONHECIMENTO DE ASSINATURA Eu, abaixo-assinado, F…………………, solicitador, com cédula profissional …………, com escritório em ………………, reconheço a assinatura supra (ou infra ou em folha anexa) de F………………………, que confrontei com a assinatura aposta no Bilhete de Identidade ……, emitido em …… por ……, pelo qual verifiquei a sua identidade, na qualidade de gerente, com poderes para o acto, que se destina à prossecução dos fins estatutários, e em representação da sociedade comercial por quotas “………”, com sede em ………, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de ……… com o número único de matrícula e identificação fiscal ………, qualidade e poderes que verifiquei pela certidão permanente com o código de acesso …………, subscrita em ……… e válida até ………, que consultei no Portal da Empresa. ------------------------Local e data Recibo n.º ……… (ou, se for o caso, acto gratuito) ROAS n.º ……… Assinatura (sobre selo de autenticação)

6.ª Hipótese: Reconhecimento de assinatura a rogo RECONHECIMENTO DE ASSINATURA Eu, abaixo-assinado, F……, solicitador, com cédula profissional ……, com escritório em ……, reconheço a assinatura supra (ou infra ou em folha anexa) de F……, feita na minha presença e na do rogante F……, o qual não assina por não saber (ou não poder), sendo o rogo dado perante mim neste acto, depois de lido o documento ao rogante. ---------------------------------------------------Verifiquei a identidade do rogado e do rogante por …… (ex: exibição dos BI …). ---------------Local e data Recibo n.º ……… (ou, se for o caso, acto gratuito) ROAS n.º ……… Assinatura (sobre selo de autenticação)

LEGISLAÇÃO – Código Civil: artigos 373.º e seguintes; – Código do Notariado; – Código de Processo Civil: artigo 51.º; – Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29/3: especialmente artigo 38.º; – Portaria n.º 657-B/2006, de 29/6.

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MÓDULO 7 AUTENTICAÇÃO DE DOCUMENTOS PARTICULARES (não sujeitos a registo predial) INTRODUÇÃO À semelhança de outras competências anteriormente atribuídas aos solicitadores, nomeadamente para os reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, certificar (ou fazer e certificar) traduções de documentos, também autenticar documentos particulares obriga à verificação da conformidade com a lei notarial e demais legislação, para além da verificação de outros pressupostos legais, tais como a validade, competência e capacidade. O Código do Notariado é a lei reguladora destes actos, pelo que, também, terá de ser tido em conta em tudo o que se refere ao presente caso. Ver ainda o n.º 1 do art.º 38 do Decreto-Lei 76-A/2006 de 29 de Março. Os documentos particulares denominam-se documentos autenticados (artigo 35.º, n.º 3 do Código do Notariado) sempre que são confirmados pelas partes perante a entidade a quem foram conferidos poderes para a sua autenticação, como é o caso do solicitador (ou do advogado, do notário, etc.). Estes documentos, lavrados num só exemplar, são sempre entregues às partes, salvo se titularem actos sujeitos a registo predial, caso em que ficarão arquivados no escritório do Solicitador, como, mais adiante, melhor se verá. Para autenticar um documento particular, deverá o solicitador, logo que este lhe seja apresentado para esse fim, reduzir a autenticação a termo, de acordo com o preceituado nos artigos 150.º a 152.º do CN. A autenticação, no essencial, consiste na confirmação do conteúdo do documento pelas partes que devem declarar que o leram e assinaram, que conhecem perfeitamente o seu conteúdo e que este exprime a sua vontade.

O TERMO DE AUTENTICAÇÃO A forma a utilizar na autenticação de um documento particular (o termo de autenticação) seguirá o preceituado no artigo 151.º do CN, devendo, ainda, satisfazer, com as necessárias adaptações, o disposto nas alíneas a) a n) do n.º 1 do artigo 46.º do CN (artigo 151.º, n.º 1 do CN). Assim, nos termos do artigo 151.º, n.º 1, alínea a), será obrigatório consignar no termo as seguintes declarações das partes: Que já leram o documento ou que estão perfeitamente inteiradas do seu conteúdo; Que este exprime a sua vontade; Nos termos do artigo 151.º, n.º 1, alínea b), será obrigatório que o termo contenha “a ressalva das emendas, entrelinhas, rasuras ou traços contidos no documento e que neste não estejam devidamente ressalvados”. Sobre a verificação da identidade dos outorgantes deverá ter-se em conta o preceituado no artigo 48.º do CN. Em consequência, deverá esta ser feita de um dos três modos seguintes: Por conhecimento pessoal; Por exibição de bilhete de identidade (ou documento equivalente), carta de condução, desde que emitidos pela autoridade competente de um dos países da União Europeia, ou passaporte; Por declaração de dois abonadores, cuja identidade se verifique por uma das duas formas anteriores; Para o efeito de identificação, não deve ser aceite documento cujos dados não coincidam com os elementos fornecidos pelo interessado ou cujo prazo de validade tenha expirado, admitindose a alteração de residência e estado civil, se neste último, for comprovada a alteração há menos de seis meses.

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REGRAS A OBSERVAR No termo de autenticação deverão ter-se em conta, especialmente, as seguintes regras consignadas nos artigos 40.º a 42.º do CN: O termo deverá ser escrito por extenso, sendo permitidos o uso de algarismos e abreviaturas, nomeadamente, nos seguintes casos: – Na indicação da naturalidade e residência; – Na menção de números de polícia dos prédios, bem como das inscrições matriciais e dos respectivos valores patrimoniais; – Na numeração das folhas do documento; – Na referenciação de diplomas legais; – Na designação de títulos académicos ou honoríficos. O termo não pode conter espaços em branco, que deverão ser inutilizados por traço horizontal. As palavras emendadas, rasuradas, entrelinhadas ou traçadas, no termo, devem ser expressamente ressalvadas antes das assinaturas. O termo é escrito em língua portuguesa, em termos claros e precisos.

OUTROS REQUISITOS A OBSERVAR (CIMT) O Solicitador deverá (art.º 49.º do CIMT) arquivar a declaração para liquidação do IMT e o correspondente comprovativo da cobrança, ou documento comprovativo da isenção do imposto, nos casos abaixo indicados a que se referem as alíneas a), b) e c) do n.º 2 e alíneas a), b) e e) do n.º 3 do art.º 2.º do CIMT: – Promessa de aquisição e de alienação, logo que verificada a tradição para o promitente adquirente, ou se este estiver a usufruir o bem; – Arrendamento com a cláusula de que os bens arrendados se vão tornar propriedade do arrendatário, logo que satisfeitas as rendas; – Arrendamento ou subarrendamento a longo prazo; – Contrato promessa de aquisição com a cláusula de cedência de posição contratual a terceiro; – Contrato de cessão de posição contratual a terceiro; – Cedência de posição contratual, por parte do promitente adquirente, num contrato de promessa, vindo o contrato definitivo a ser celebrado entre o anterior promitente alienante e o terceiro. Nestes casos, o termo de autenticação deve incluir a referência à liquidação e pagamento prévio do imposto, ou comprovativo da sua isenção, bem como a menção de que ficam arquivados esses mesmos documentos. Deverá ainda o Solicitador submeter à Autoridade Tributária e Aduaneira, em suporte electrónico, até ao dia 15 do mês seguinte, uma relação dos actos acima referidos, contendo, em relação a cada um deles, o número, data e importância dos documentos de cobrança, ou os motivos de isenção, nome dos contratantes, artigos matriciais e respectivas freguesias, ou menção dos prédios omissos [n.º 4, alínea a) e n.º 5 do art.º 49 do CIMT]. Obs: Em determinadas circunstâncias poderá o prazo limite ser o dia 10 do mês seguinte. Sobre o assunto consultar o capítulo 14.

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AUTENTICAÇÃO DE DOCUMENTO ASSINADO A ROGO Se o documento a autenticar estiver assinado a rogo, o respectivo termo de autenticação deve conter os seguintes elementos do rogado, nos termos do artigo 152.º do CN: – Nome completo; – Naturalidade; – Estado civil; – Residência. Além destes elementos, tem, também, de mencionar a confirmação do rogo pelo rogante no acto da autenticação, a forma como foi verificada a identidade do rogado e do rogante, bem como conter a impressão digital do rogante.

AUTENTICAÇÃO DE PROCURAÇÃO A autenticação de documento particular, que revista a forma de procuração, pode ser feita por termo de autenticação ou por reconhecimento de letra e assinatura. Assim, o solicitador quando lhe seja apresentada uma procuração para fins de autenticação pode lavrar o termo de autenticação ou reconhecer presencialmente a letra e assinatura do outorgante (art.º 116.º, n.º 1 do Código do Notariado).

REDACÇÃO DO TERMO DE AUTENTICAÇÃO Iniciar-se-á o termo com a menção da data, do lugar e morada em que é assinado, seguindo-se a identificação do Solicitador, bem como o número da sua cédula profissional, conforme as alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 46.º do CN. Seguir-se-á a identificação completa de todos os outorgantes: – As pessoas singulares serão identificadas pelo nome, o estado civil, a naturalidade e o respectivo NIF (e, se casados, o nome do cônjuge e o regime de casamento, se se tratar de documento que possa vir a instruir ou titular acto sujeito a registo). – As pessoas colectivas identificar-se-ão pela denominação, sede, o número de matrícula e identificação fiscal, identificando-se os seus representantes e respectivas qualidades, tudo em conformidade com a alínea c) do número 1 do artigo 46.º do Código do Notariado. Imediatamente após, será feita a verificação da identidade dos outorgantes e dos seus poderes. Deve indicar-se expressamente qual a forma por que foi verificada a identidade [alínea d) do número 1 do artigo 46.º e número 1 do artigo 48.º do Código do Notariado]: Os poderes dos intervenientes em representação de pessoas colectivas verificar-se-ão por certidão do registo comercial e, ainda, outros documentos que completem a respectiva verificação [artigo 46.º, n.º 1, alínea e) e artigo 49.º do Código do Notariado]. Segue-se o termo propriamente dito que deverá ter uma redacção igual ou semelhante à seguinte: Os outorgantes apresentaram para fins de autenticação o documento em anexo que consta de ………… (p. ex: procuração, contrato promessa, etc.), tendo declarado que já o leram e o assinaram, e que o conteúdo do mesmo exprime as suas vontades (e a dos seus representados, se for caso disso).

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No final do termo, far-se-á: – Referência à leitura e explicação do conteúdo do mesmo ou sua dispensa pelos intervenientes, nos termos da alínea l) do número 1 do indicado artigo 46.º; – Indicação dos outorgantes que não assinam e o motivo declarado pelo qual não o fazem [alínea m) do número 1 do artigo 46.º]; – Ressalva de quaisquer rasuras, emendas, entrelinhas e palavras traçadas, nos termos da alínea b) do número 1 do artigo 151.º e dos números 1 e 3 do artigo 41.º do Código do Notariado; – É, finalmente, assinado o termo por todos os intervenientes que possam assinar seguindo-se a assinatura do Solicitador, sobre selo de autenticação, de acordo com o disposto na alínea n) do número 1 do mencionado artigo 46.º.

MINUTAS PARA ELABORAÇÃO DE TERMO DE AUTENTICAÇÃO Seguem-se minutas para o termo de autenticação, devendo, no entanto, ser tido em conta que estas minutas são um simples guia e não uma imposição ou modelo único: 1 – Minuta de termo de autenticação para documento assinado pelos interessados: TERMO DE AUTENTICAÇÃO ---------- No dia …, no meu escritório, na Rua ……, em ……, perante mim, F…, Solicitador, com cédula profissional n.º ……, compareceu: ---------------------------------------------------------------------------------- F…, casado com F… sob o regime de …………, natural da freguesia de ……, concelho de ……, residente em ………, titular do NIF ………. -------------------------------------------------------------- Verifiquei a identidade do outorgante por exibição do Bilhete de Identidade (ou outro documento) ………………………………. ------------------------------------------------------------------------------- O outorgante apresentou, para autenticação, o documento que antecede, que consta de uma procuração, tendo declarado que já o leu, estando perfeitamente inteirado do seu conteúdo, que o mesmo exprime a sua vontade e o assinou. -------------------------------------------------------------- O presente termo de autenticação foi lido e explicado o seu conteúdo ao outorgante que vai assinar na minha presença. ------------------------------------------------------------------------------------------- Assinatura: ---------- O Solicitador ---------- Recibo n.º ---------- ROAS:

2 – Minuta de termo de autenticação para documento que está assinado a rogo por o interessado não saber ou não poder assinar: TERMO DE AUTENTICAÇÃO ---------- No dia …, no meu escritório, na Rua ……, em ……, perante mim, F…, Solicitador, com cédula profissional n.º ……, compareceu: --------------------------------------------------------------------------------- F…, casado com F… sob o regime de …………, natural da freguesia de ……, concelho de ……, residente em ………, titular do NIF ………. ------------------------------------------------------------- Verifiquei a identidade do outorgante por exibição do Bilhete de Identidade ………………………………. ------------------------------------------------------------------------------------------------ O outorgante apresentou, para autenticação, o documento que antecede, que consta de uma procuração, tendo declarado, depois de lho ter lido, que está perfeitamente inteirado do seu conteúdo, que o mesmo exprime a sua vontade e que não o assina por não saber (ou não

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poder), estando assinado a seu rogo por F……, casado, natural da freguesia de ……, concelho de ………, residente em …………, rogo que o interessado confirmou neste acto. --------------------------- O presente termo de autenticação foi lido e explicado o seu conteúdo ao outorgante, que o não assina por não saber (ou não poder) assinar, assinando, a seu rogo, F……, acima identificado, cuja identidade verifiquei por exibição de ………… (ex: Bilhete de Identidade). ----------------------- Assinatura: ---------- O Solicitador ---------- Recibo n.º ---------- ROAS:

3 – Minuta de termo de autenticação para documento assinado em representação de pessoa colectiva: TERMO DE AUTENTICAÇÃO ---------- No dia …, no meu escritório, na Rua ……, em ……, perante mim, F…, Solicitador, com cédula profissional n.º ……, compareceram: ------------------------------------------------------------------------------ PRIMEIRO: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ F…, casado, natural da freguesia de ……, concelho de ……, residente em ………, na qualidade de sócio-gerente e em representação da sociedade: ------------------------------------------------------ “F…………, Lda”, com o número único de matrícula e de identificação fiscal …………, com sede na Rua ……………………, no lugar de ……………, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de ……………, com o capital social de ……… euros. ----------------------------------------- SEGUNDO: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ F…, casado com ……… sob o regime de ……………, natural da freguesia de ……, concelho de ……, residente em ………, titular do NIF…………. ---------------------------------------------------- Verifiquei a identidade dos outorgantes por exibição dos Bilhetes de Identidade ……………………………… e a qualidade e poderes do primeiro por consulta online à certidão permanente com o código ……………, subscrita em ………… e válida até ………, que consultei no Portal da Empresa. ----------------------------------------------------------------------------------------------- Os outorgantes apresentaram, para autenticação, o documento que antecede, que consta de um contrato promessa de compra e venda, tendo declarado que já o leram, estando perfeitamente inteirados do seu conteúdo, que o mesmo exprime a sua vontade e a da representada do primeiro e o assinaram. ----------------------------------------------------------------------------------------------- O presente termo de autenticação foi lido e explicado o seu conteúdo aos outorgantes que vão assinar na minha presença. ------------------------------------------------------------------------------------------ Assinaturas: ---------- O Solicitador ---------- Recibo n.º ---------- ROAS: LEGISLAÇÃO Para além de legislação avulsa diversa, deverá ter-se especial atenção a: – Código Civil, especialmente artigos 362.º a 377.º; – Código do Notariado; – Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março: especialmente art.º 38.º; – Código do IMT, nomeadamente o seu art.º 49.º. Obs: O Código do Notariado no seu art.º 152.º não faz referência à exigência de aposição da impressão digital do rogante (ao contrário do que acontecia anteriormente à aprovação do Dec.-Lei 207/95, de 14 de Agosto). Não o obrigando a lei, vem sendo prática a inclusão da impressão digital dos rogantes nos termos de autenticação, prática que consideramos aconselhável.

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MÓDULO 8 ESCRITURA OU DOCUMENTO PARTICULAR AUTENTICADO SUJEITO A REGISTO (DPA) Como já atrás foi dito, são autenticados os documentos, devidamente assinados pelas partes, ou a seu rogo (art.º 373.º, n.º 1 do CC), que essas mesmas partes confirmam perante a entidade competente, que, para além do notário (art.º 35.º, n.º 3 do CN), são também os Solicitadores, os advogados, os conservadores, os oficiais de registo, as câmaras de comércio e indústria, para além de outras entidades com competência atribuída (art.º 38.º, n.º 1 do Decreto-Lei 76-A/2006). A escritura é um documento autêntico, exarado com as formalidades legais, pelo notário nos respectivos livros, ou por autoridades públicas competentes ou oficial público (art.º 35.º, n.º 2 do CN e art.º 363.º do CC). Deve acrescentar-se que os documentos particulares, sempre que autenticados por entidade autenticadora competente, gozam da mesma força probatória que os autênticos, embora não os possam substituir no caso de a lei exigir documento autêntico para a validade do acto (art.º 377.º do CC e n.º 2 do art.º 38.º do DL 76-A/2006). Com a entrada em vigor do Decreto-Lei 116/2008, de 4 de Julho, a quase totalidade dos actos que só teriam validade quando celebrados por escritura passou a tê-la da mesma forma, se celebrados por documento particular autenticado. Esses actos estão consignados no art.º 22.º do referido Decreto-Lei 116/2008. Desta forma, todos os actos mencionados no referido artigo, que a lei não excepcione, poderão ser validamente celebrados pelo Solicitador. O grande avanço refere-se, óbvia e especialmente, a actos sobre imóveis. Deverão, no entanto, ser tidas em a conta as excepções consignadas no art.º 80.º do CN, obrigando a escritura pública e retirando a possibilidade de serem feitos por documento particular autenticado, não tendo assim o Solicitador a possibilidade de os celebrar, os seguintes actos: – As justificações notariais; – Os actos que importem revogação, rectificação ou alteração de negócios que, por força da lei ou por vontade das partes, tenham sido celebrados por escritura pública, sem prejuízo do disposto nos art.º 221.º e 222.º do CC; – As habilitações de herdeiros; – Os actos de constituição de associações e fundações, bem como os respectivos estatutos, suas alterações e revogações. Com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei 116/2008, nomeadamente através do depósito e registo electrónico, aumentou a oferta de entidades autenticadoras, reduziram-se as formalidades e encargos, tornando mais rápida e eficaz a efectivação dos actos que importem reconhecimento, constituição, aquisição, modificação, divisão ou extinção dos direitos de propriedade, usufruto, uso e habitação, superfície ou servidão e outros direitos sobre coisas imóveis ou outros direitos. Enquanto a escritura pública é redigida pelo notário, conforme a vontade das partes, mas adequando-a ao ordenamento jurídico, o documento particular é suposto ser escrito pelas partes, apresentando-o à entidade competente para que seja feito o competente termo de autenticação. No entanto, nada impede que o documento possa ser elaborado pelo Solicitador, a pedido das partes que, de seguida, lho apresentam para que ele o autentique. Pelo contrário, é até aconselhável que seja o Solicitador a redigir o documento que por esse facto não deixa de ser particular, já que, assim, mais facilmente poderá obviar às exigências, diversos pressupostos e requisitos, adequando a vontade das partes à legalidade do acto, observando as regras de escrita dos actos, utilizando, com as necessárias adaptações, as formalidades comuns e especiais dos actos notariais, especialmente nos casos de actos sujeitos a registo (art.º 40.º, 41.º, 42.º, 46.º, 47.º, 54.º a 64.º e 151.º, todos do CN). Deve, pois, concluir-se que a escritura terá de ser lavrada e exarada nos livros respectivos, embora as partes possam apresentar minutas que poderão ser alteradas pelo notário se este

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entender que existem imperfeições inaceitáveis [n.º1 e alínea b) do n.º2 do art.º 4.º do CN], ao passo que o documento particular é exarado em folhas soltas, num só exemplar, que o Solicitador deverá arquivar juntamente com o termo de autenticação, nos termos do n.º 6 do art.º 24.º do Decreto-Lei 116/2008. [alínea c) do n.º2 do art.º 4.º, n.º 3 do art.º 35.º, n.º4 do art.º 36.º e o art.º 150.º, todos do CN]. Deverão ficar os originais arquivados no escritório do Solicitador e não sendo entregues aos outorgantes (referido art.º 24.º do Decreto-Lei 116/2008 e n.º 1 do art.º 8.º da Portaria 1525/2008). No entanto, como já atrás ficou dito, se se tratar de documentos particulares autenticados não sujeitos a registo predial, serão estes entregues aos outorgantes. Convém lembrar aqui, embora o facto venha a ser referido e estudado mais adiante, que o documento particular autenticado e os documentos que o instruem e que devam ser arquivados, por não constarem de arquivo público ou sistemas de consulta “on-line”, deverão ser depositados, condição da respectiva validade de autenticação, na plataforma electrónica com o endereço www.predialonline.mj.pt, (art.º 24.º do Decreto-Lei 116/2008 conjugado com Portaria 1535/2008). O referido depósito electrónico deverá ser efectivado na data da autenticação do documento, podendo, em circunstâncias excepcionais que deverão ser justificadas, ser efectuado nas 48 horas posteriores. (art.º 7.º n.º 1 e 2 da Portaria 1535/2008). Não sendo feito nestas condições, o depósito electrónico não é válido, afectando, por sua vez, a validade do documento particular autenticado. Neste caso, pesem embora algumas opiniões em contrário, as partes intervenientes deverão confirmá-lo novamente perante o Solicitador, procedendo-se a nova autenticação, seguida de novo depósito electrónico e subsequente registo.

LEGISLAÇÃO Para além de legislação avulsa diversa, deverá ter-se especial atenção a: – Código Civil, especialmente artigos 362.º a 377.º; – Código do Notariado; – Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março: especialmente art.º 38.º; – Decreto-Lei n.º 116/2008, de 4 de Julho: especialmente art.º 22.º a 26.º.

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MÓDULO 9 DOCUMENTO PARTICULAR AUTENTICADO: O CONTRATO INTRODUÇÃO Não referiremos, no presente conteúdo programático, algumas das questões relativas ao contrato já que ultrapassam o âmbito elementar deste trabalho. No entanto, deverá o formando ter em conta o que, sobre o assunto, prescreve o Código Civil, bem como outra legislação aplicável. O que se pretende, neste caso, é, apenas, que o formando domine a técnica da redacção do contrato, com especial atenção sobre as normas do Código do Notariado e alguns aspectos elementares da fiscalidade que se lhe aplica. Ao redigir um contrato (ou ao autenticá-lo, caso não o tenha redigido), deverá o Solicitador verificar a conformidade com as disposições do CN, se estão cumpridos os requisitos legais aplicáveis aos negócios jurídicos e outra legislação existente sobre a matéria, devendo, ainda, proceder à verificação de obrigações fiscais e administrativas que possam dizer respeito ao acto em causa. Assim, algumas das normas e conselhos aqui expressos são aplicáveis ao presente módulo, já que o Solicitador só deverá elaborar o contrato para autenticação, caso o possa autenticar, sendo-o, igualmente, ao módulo seguinte, “DPA: PARTICULARIDADES DO TERMO DE AUTENTICAÇÃO SUJEITO A REGISTO PREDIAL”. A alínea d) do n.º 1 do art.º 3.º do CN, considera que desempenham funções notariais, excepcionalmente, entidades a quem a lei atribua, em relação a certos actos, competência notarial. Assim, deveremos concluir que ao Solicitador se aplicam as normas do CN, com a correspondente adaptação em cada caso, devendo, sempre que execute um contrato, ou este lhe seja apresentado, ter em atenção se cumpre estas mesmas normas. O documento particular deverá ser escrito em língua portuguesa e redigido utilizando a sistematização habitual de um contrato, em linguagem clara, directa e precisa, sem quaisquer ambiguidades ou hipóteses de várias interpretações. Habitualmente, o contrato é expresso na terceira pessoa do presente do indicativo. Sobre as regras de escrita, nomeadamente dizeres por extenso, rasuras e entrelinhas, convirá sempre ter em conta os art.º 40.º, 41.º e 42.º do CN. Em conclusão, adaptado o contrato a cada caso concreto, nele deverá constar: – a identificação completa das partes e seus representantes [alíneas c) e h) do n.º 1 do art.º 46.º e alínea a) do n.º 1 do art.º 47.º do CN]; – as cláusulas do negócio jurídico, que deverão ter a forma articulada; – as menções exigíveis relativas ao registo (descrições e inscrições) [art.º 54.º e 55.º do CN]; – as menções relativas à matriz (art.º 57.º e 58.º do CN); – o valor dos bens (art.º 63.º do CN); – a menção de documentos que façam parte integrante do contrato (art. 64.º e 105.º do CN); – o local e data, seguido das assinaturas. Sobre o conteúdo do contrato, ver, ainda, o art.º 44.º (menções obrigatórias) do Código de Registo Predial. Posto isto, vamos agora analisar individual e mais especificamente alguns tipos de contratos.

COMPRA E VENDA O contrato de compra e venda é, de acordo com a definição do art.º 874.º do CC, “o contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa ou outro direito, mediante um preço”. Sem prejuízo do disposto em lei especial, este contrato apenas é válido quando celebrado por escritura pública ou documento particular autenticado (art.º 875.º do CC e 22.º do Decreto-Lei 116/2008).

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ALGUNS CASOS DE PROIBIÇÃO De notar que a lei proíbe algumas vendas, das quais referimos as seguintes, por se tratar de hipóteses mais habituais: – O usuário ou morador usuário não pode vender, nem tão pouco onerar, trespassar ou locar os respectivos direitos (art.º 1488.º do CC); – A compra e venda é proibida entre cônjuges, excepto quando separados judicialmente de pessoas e bens (art.º 1714.º, n.º 2 do CC); – É proibida a aquisição, por parte dos pais, de bens dos respectivos filhos sujeitos ao poder paternal (art.º 1892.º do CC). COMPRA E VENDA DE BENS FUTUROS Quando se trate de compra e venda de bens futuros, a transferência do direito não se verifica por mero efeito do contrato. Fica dependente de um facto futuro, não sendo, após a ocorrência deste, necessário a celebração de novo contrato (n.º 2 art.º408.º do CC). CLÁUSULA DE RESERVA DE PROPRIEDADE Estamos perante uma cláusula de reserva de propriedade (coisas corpóreas) ou cláusula de titularidade (coisas incorpóreas), quando o efeito translativo depende do pagamento do preço (art.º 409.º e 1302.º do CC) (só oponíveis a terceiros quando registadas). ALGUMAS NORMAS A TER EM CONTA Ao formalizar um contrato de compra e venda, o Solicitador deverá ter em conta os seguintes requisitos legais, cuja inexistência poderá tornar o contrato nulo ou anulável. 1 – Não podem ser titulados actos de que resulte transmissão de direitos, sem que estejam definitivamente inscritos a favor da pessoa de quem se adquire esse direito ou contra quem se constitui o encargo (n.º 2 do art.º 54.º do CN e n.º 1 do art.º 9.º do CRP). No entanto, deverão ser tidas em conta as seguintes excepções a esta regra: – Bens transmitidos no mesmo dia [art.º 54.º, n.º 3, alínea b) do CN]; – Casos de urgência [art.º 54.º, n.º 3, alínea b) do CN]; – Venda executiva com adopção da modalidade de venda por negociação particular [art.º 9.º, n.º 2, alínea a) do CRP]; – Primeiro acto posterior a 01/10/1984, desde que seja exibido documento comprovativo da aquisição do transmitente (n.º 3 do art.º 9.º do CRP). 2 – A compra e venda de pais e avós a filhos e netos, necessita do consentimento dos restantes filhos ou netos e respectivos cônjuges, quando casados em regime de comunhão geral ou de adquiridos (art.º 877.º do CC). Este princípio salvaguarda a legitima de todos os herdeiros legitimários, pelo que também carece de consentimento a venda feita aos cônjuges dos filhos dos alienantes, desde que casados nos regimes da comunhão. 3 – É proibido o fraccionamento de terrenos aptos para cultura em parcelas de terreno com áreas inferiores à unidade de cultura fixada para cada zona do País (Portaria n.º 202/70). Esta disposição inclui os terrenos contíguos pertencentes ao mesmo proprietário (art.º 1376.º do CC). 4 – O loteamento implica a emissão do respectivo Alvará (Decreto-Lei 555/99). Assim, os negócios jurídicos que impliquem loteamento (fraccionamento ou reparcelamento de prédios destinados, imediata ou subsequentemente, à edificação urbana), sem a emissão do correspondente alvará, são nulos, salvo os casos abaixo indicados, por incumprimento de requisitos legais de carácter imperativo (art.º 294 do CC).

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Não são consideradas operações de loteamento: a) O fraccionamento de terrenos com vista à constituição ou ampliação de logradouros de prédios urbanos (ver parecer no Boletim dos Registos e Notariado n.º 9/2002, II, pág. 19). Neste caso, deverá, no contrato, ser identificada a parcela resultante do fraccionamento e o prédio urbano ao qual a parcela vai ser anexada; Neste caso de ampliação ou constituição de logradouros de prédios urbanos, deverá a parcela de terreno a anexar, classificada como outros, ser objecto de avaliação, bem como o prédio que resultar da ampliação e, ainda, se for urbano, o prédio de onde foi feita a desanexação, para o que devem ser apresentadas as correspondentes declarações modelo 1 de IMI. Quer o prédio resultante da anexação, quer o prédio de onde foi destacada a parcela, se urbanos, são avaliados nos termos do art.º 38.º e seguintes do CIMI, sendo a parcela de terreno avaliada, nos termos do art.º 46.º, n.º 3 do CIMI; b) O fraccionamento que vise a rectificação de estremas entre prédios rústicos confinantes; c) As operações em que se verifique o destaque de uma única parcela de prédio com descrição predial (n.º 4 e 5 do art.º 6.º do Decreto-Lei 555/99), implicando ónus de não fraccionamento pelo prazo de dez anos. 5 – Na transmissão do direito de propriedade de prédios urbanos e suas fracções autónomas é exigível a menção da autorização de utilização (Decreto-Lei n.º 281/99). No entanto, a sua exibição poderá ser dispensada, quando esteja anotada à descrição do prédio e este não tenha sofrido alterações, nos termos da alínea a) do art.º 90.º-A do CRP. É, também, dispensada a licença de autorização de utilização no regime da compra e venda executiva (art.º 905.º, n.º 6 do CPC), ficando o adquirente com o ónus da sua obtenção para posterior transmissão; É, ainda, dispensada a licença de autorização de utilização, na transmissão de prédios cuja construção seja anterior ao RGEU (7/8/1951) ou, em determinados concelhos, anterior à data da deliberação municipal de entrada em vigor do RGEU. 6 – Não pode ser celebrado o DPA, na compra e venda e nas restantes aquisições a titulo oneroso, de prédio urbano ou fracção autónoma, destinados a habitação, sem a existência da ficha técnica da habitação, quando exigível, e sendo a mesma entregue ao adquirente no acto (Decreto-Lei n.º 68/2004 e Portaria n.º 817/2004). Na prática, a ficha técnica é exigível para todos os prédios edificados após 30/3/2004 ou aos que edificados após 7/8/1951, não tenham licença de utilização ou requerimento apresentado para a respectiva emissão na referida data de 30/3/2004 [art. 2.º, n.º 2, alíneas a) e b) do referido Decreto-Lei]. A anotação da existência da ficha técnica à descrição registral [alínea b) do n.º 1 do art.º 90.º-A do CRP] não é portanto suficiente, sendo obrigatória, como ficou dito, a sua entrega no acto. 7 – No DPA de compra e venda, bem como nos arrendamentos, deve ser mencionada a existência do certificado energético e da qualidade do ar [alínea c) do n.º 1 do art.º 3.º do Decreto-Lei n.º 78/2006, conjugado com a Portaria n.º 461/2007]. No entanto, o que a referida alínea c) obriga é que seja o proprietário a apresentar o certificado ao comprador, pelo que o Solicitador pode formalizar o DPA, podendo advertir as partes de que é objecto de coima a não existência do certificado. 8 – Deverá, na compra e venda, ser mencionada a intervenção de mediador imobiliário, com indicação expressa da denominação social e número da licença, ou a sua não intervenção, conforme o caso (n.º 1 e 2 do art.º 50.º do Decreto-Lei n.º 211/2004).

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9 – Na primeira transmissão de prédios urbanos ou de fracções autónomas, edificados num lote de terreno, terá que ser exibida certidão emitida pela Câmara Municipal, comprovativa da recepção provisória das obras de urbanização ou comprovativa de que a caução, a que se refere o art. 54.º do Decreto-Lei 555/99, é suficiente para garantir a boa execução das obras de urbanização (art.º 49 do Decreto-Lei 555/99). É dispensada a referida certidão sempre que o alvará de loteamento tenha sido emitido ao abrigo do Decreto-Lei n.º 287/73 ou do Decreto-Lei n.º 400/84, logo antes do referido Decreto-Lei 555/99. 10 – Na transmissão de imóveis integrados na zona geral de protecção de 50 metros dos limites externos de um imóvel classificado como de interesse nacional, de interesse público, ou de interesse municipal, ou em vias de classificação, ou na transmissão de imóveis classificados, para além dos comproprietários, também o Estado, as Regiões Autónomas e os Municípios têm direito de preferência, no caso de compra e venda ou dação em pagamento. Não poderá, pois, ser autenticado o documento sem ser concedido o direito de preferência, mediante prévia comunicação escrita aos respectivos serviços (Lei n.º 107/2001). A comunicação para o exercício do direito de preferência, bem como a intenção de exercer esse direito (10 dias úteis após a submissão da comunicação), pode ser feita através do site www.predialonline.mj.pt ou do www.casapronta.mj.pt, nos termos da Portaria 1535/2008. PRECEITOS FISCAIS A compra e venda está sujeita a IMT e Imposto de Selo. IMT e Imposto de Selo devem ser liquidados e pagos anteriormente à autenticação do documento particular. Isenções: – Prédios para revenda (art.º 7.º do CIMT); – Aquisição de imóveis por instituições de crédito (art.º 8.º do CIMT); – Aquisição de prédios destinados exclusivamente a habitação própria e permanente por valor inferior ou igual a 92.407,00 euros (para o ano de 2012). Segue-se uma minuta de compra e venda. CONTRATO DE COMPRA E VENDA ---------- Entre: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------ PRIMEIRO: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ MARIA e cônjuge SILVINO, casados sob o regime da comunhão geral de bens, ambos naturais da freguesia de ……, concelho de ……, onde residem no ……, n.º …, no lugar da ……, Nifs: ……… e ………. ----------------------------------------------------------------------------------------------------------- SEGUNDO: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ CHANTAL, viúva, natural de França, de nacionalidade francesa, residente em ………, França e quando em Portugal, na Rua ………, n.º …, no lugar e freguesia de ……., Nif ………. ----------- É celebrado o presente contrato de compra e venda, que se rege pelas cláusulas seguintes: --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Primeira: Pelo presente contrato, os primeiros outorgantes vendem, pelo preço de ……… euros, que já receberam e de que dão quitação, à segunda outorgante, que o aceita, o prédio rústico, sito em ………, na freguesia de ……, concelho de ……, composto de ……, descrito na Conservatória do Registo Predial de ……… sob o número ……, da freguesia de ……, lá registado a seu favor pela inscrição Ap. …… de … de …… de ……, inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o artigo ……, com o valor patrimonial de IMT de …… euros. -------------------------------- Segunda: O prédio é vendido livre de quaisquer ónus ou encargos. ----------------------------------- Terceira: Os vendedores declaram que o prédio rústico vendido não é confinante com outros prédios rústicos que lhes pertençam. ----------------------------------------------------------------------

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---------- Quarta: As partes não recorreram a mediação imobiliária. ----------------------------------------------- O outorgante Silvino não assina por declarar não o saber fazer, assinando a seu rogo, Carla, casada, natural da freguesia de ……, concelho de ……, residente em Rua ……, n.º …, 1.º direito, no lugar e freguesia da ……, concelho de ……. ---------------------------------------------------------------- Local e Data. --------------------------------------------------------------------------------------------------------- Assinaturas: -------------------------------------------------------------------------------------------------

DOAÇÃO Doação é o contrato pelo qual uma pessoa jurídica, por espírito de liberalidade e à custa do seu património, dispõe, gratuitamente, de uma coisa ou de um direito, ou assume uma obrigação, em benefício do outro contratante (art.º 940.º, n.º 1 do CC). Algumas especificidades da doação: – Não pode abranger bens futuros (art.º 942.º do CC); – Pode conter liberalidades a várias pessoas conjuntamente, sem que haja direito de acrescer, salvo se o doador houver declarado o contrário (art.º 944.º, n.º 1 do CC), mas o direito de acrescer entre usufrutuários mantém-se desde que o usufruto tenha sido constituído por doação (art.º 944.º, n.º 2 do CC); – Pode ser pura ou modal (art.º 963.º do CC) ou remuneratória (art.º 941.º do CC). A doação modal, ao contrário da pura, é onerada com encargos. A doação remuneratória é a doação em que é feita a liberalidade para pagamento de serviços recebidos pelo doador, mas que não tenham natureza de dívida exigível. A proposta de doação caduca se não for aceite em vida (art.º 947.º do CC). No entanto, as doações puras feitas a incapazes não carecem de aceitação. Doações com encargos apenas poderão ser aceites por intermédio dos seus representantes legais (art.º 951.º do CC). Só poderá presumir-se a aceitação de doação pura feita a quem for incapaz, por anomalia psíquica, depois de decretada a sua interdição, por sentença judicial; A regra geral, quanto à capacidade de aceitar doações, consigna-se no art.º 950.º do CC, podendo receber doações todos as pessoas jurídicas que não estão pessoalmente inibidas de as aceitar. FORMA A doação de coisas imóveis só é válida se for efectuada por DPA ou escritura pública, enquanto que a doação de coisas móveis não depende de qualquer formalidade especial quando acompanhada da tradição. Não havendo tradição, só pode ser formalizada por contrato particular (art.º 947.º do CC). USUFRUTO: ALGUMAS ESPECIFICIDADES Na doação com reserva do usufruto, pode este ser simultâneo e sucessivo até à morte do último, ou não, e o usufruto pode ser vitalício ou temporário (art.º 1441.º, 1442.º e 958.º do CC). O art.º 1442.º admite o direito de acrescer transmitindo-se, assim, o usufruto até ao último usufrutuário, só por sua morte se dando a consolidação na pessoa do radiciário. No entanto, pode-se convencionar o contrário. É possível reservar o usufruto a favor de terceiro, que não o autor da doação. No entanto, tem sempre de haver aceitação por parte desse mesmo terceiro. Concretizando: Sendo o usufruto constituído simultaneamente a favor de várias pessoas, só por morte do último, se efectiva a consolidação na pessoa do radiciário, funcionando até aí o direito de acrescer com as liquidações respectivas de Imposto de Selo, consoante os

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graus de parentesco de cada um dos usufrutuários falecidos (art.º 26.º do CIS) (Ver, ainda, art.º 1763.º, n.º 3 do CC). Mas, no caso de prédio em compropriedade, na ausência de convenção em contrário, cada um dos comproprietários, limita-se a deter o usufruto proporcional à sua quota parte indivisa na compropriedade já anteriormente determinada. Não há aqui o direito de acrescer. Na redacção do próprio texto do contrato, poderão ficar consignados alguns destes aspectos, conforme o pretendido, usando expressões como (ver n.º 2 do art.º 958.º do CC): 1. “O usufruto extingue-se, apenas por morte do último usufrutuário que lhes sobreviver”; 2. “O usufruto extingue-se, em metade, por morte do primeiro usufrutuário”. CLÁUSULAS MODAIS (art.º 963.º do CC) As doações podem ser oneradas com encargos pecuniários, pensões vitalícias ou temporárias, com géneros ou outros encargos diversos, não sendo obrigado o beneficiário a cumprir encargos que ultrapassem o valor do bem doado. Alguns exemplos de encargos: pensões alimentícias, subsídios para estudos, missas ou sufrágios pelas almas dos falecidos, autores das liberalidades, pagamento de dívidas dos doadores e encargos pecuniários a título de rendas temporárias ou vitalícias. O autor de liberalidade gratuita ou os seus herdeiros podem solicitar a resolução da doação, com base no incumprimento de encargos específicos, quando esse direito lhes estiver conferido no contrato (art.º 966.º do CC). COLAÇÃO Quando o beneficiário da doação é presumível herdeiro legitimário do doador, deverá ter-se em conta a vontade deste em beneficiar ou não o donatário. Assim, deverá ficar consignado no contrato (art.º 2104.º a 2014.º do CC): – Se a doação é por conta da quota disponível, caso em que fica dispensada a colação, ficando, no entanto, a doação eventualmente sujeita à redução por inoficiosidade, ou, – Se é por conta da legítima, sendo os bens doados objecto de colação e, portanto levados à conferência, após a morte do doador. A redução emergente da colação constitui um ónus real, pelo que o registo da doação de bens imóveis sujeita à colação está sempre dependente do registo oficioso do ónus de eventual redução [art.º 2118.º do CC e alínea q) do n.º 1 do art.º 2.º do CRP]. O valor dos bens doados é sempre o que eles tiverem à data da abertura da sucessão, excluindo-se desse valor as benfeitorias (art.º 2109.º n.º 1; 2168.º; 2169.º; 2171.º; 2173.º e 2178.º todos do CC). No caso de não ficar consignado no contrato se a doação é feita pela quota disponível ou pela legítima, entende-se que é feita pela legítima, já que o doador não dispensou a colação, como o poderia ter feito (art.º 2113.º, n.º 1 do CC). Neste caso o conservador deve registar o ónus de colação. DOAÇÃO ENTRE CASADOS As doações entre casados não são proibidas, excepto se vigorar entre eles o regime da separação de bens, caso em que são nulas (art.º 1762.º do CC). No entanto, doações recíprocas feitas no mesmo acto são proibidas, com excepção das reservas de usufruto e rendas vitalícias, que beneficiam o cônjuge sobrevivo, desde que convencionadas em doações de ambos os cônjuges a terceiros (art.º 1763.º, n.º 2 e 3 do CC). Só podem ser feitas doações entre cônjuges, de bens próprios do doador, passando esses bens a ser bens próprios do donatário, uma vez que não são comunicáveis (art.º 1764.º do CC). Assim, não é possível um cônjuge doar ao outro a meação de um bem comum.

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As doações entre cônjuges podem a todo o tempo ser livre e unilateralmente revogadas pelo cônjuge doador (art.º 1765.º do CC). Nos termos do art.º 1766.º do CC, a doação entre casados caduca nos seguintes casos: a) Por falecimento do donatário antes do doador, salvo se este confirmar a doação nos três meses subsequentes à morte daquele; Esta confirmação deve ter a mesma forma que a doação. b) Se o casamento vier a ser declarado nulo ou anulado, sem prejuízo do disposto em matéria de casamento putativo (aquele em que os nubentes, por ignorarem a realidade dos factos, julgam ter contraído um casamento isento de defeito) (art.º 1647.º do CC); c) No divórcio ou separação judicial de pessoas e bens (antes de 1/12/2008 – ver Lei 61/2008), se o donatário foi considerado único ou principal culpado. FISCALIDADE As doações estão sujeitas a Imposto de Selo, excepcionando-se, porém, quanto à verba 1.2 da Tabela, os casos previstos no n.º 5 do art.º 1.º do CIS, entre os quais, a doação a pessoas colectivas. De notar que pode, ainda, haver incidência de IMT, no caso das doações modais, como é o caso de entradas pecuniárias ou em géneros, de pensões, etc. A liquidação do IMT é efectuada no prazo da liquidação do Imposto de Selo, independentemente de haver, ou não, isenção deste (p. ex.: doações a herdeiros legitimários), portanto, após a formalização do contrato. No entanto, se o contrato não estiver sujeito a Imposto de Selo, deverá o IMT ser liquidado previamente (art.º 36.º, n.º 8 do CIMT). Deverá ter-se em atenção que se a doação não for aceite no próprio DPA, com excepção das doações puras a favor de incapazes, o Imposto de Selo da verba 1.1 da Tabela Geral, não é liquidado com a proposta de doação mas sim quando vier a ser feita a aceitação da doação. Segue-se uma minuta de doação.

CONTRATO DE DOAÇÃO ---------- Entre: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------ PRIMEIRO: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ ARMINDO e cônjuge MARGARIDA, casados sob o regime da comunhão de adquiridos, naturais ele da freguesia de …… e ela da freguesia de ……, ambas do concelho de ……, residentes na Rua ……, n.º …, no lugar do ……, referida freguesia de ……, titulares dos Nifs.: ……… e ………. ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------ SEGUNDO: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ EDGAR, solteiro, maior, natural da freguesia de ……, concelho de ……, residente na dita Rua ……, n.º …, titular do Nif.: ……… ---------------------------------------------------------------------------------- É celebrado o presente contrato de doação, que se rege pelas cláusulas seguintes: -------------- Primeira: O primeiro outorgante marido doa ao segundo, seu filho, pela sua quota disponível, o seguinte bem: -------------------------------------------------------------------------------------------------------- Urbano, sito na Rua ……, número …, no lugar do ……, freguesia de ……, concelho de ……, composto de casa de rés-do-chão, dependência e logradouro, descrito na Conservatória do Registo Predial de …… na ficha ……, da freguesia de …., lá registado a favor do doador pela inscrição Ap. … de … de …… de …, inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo …, com o valor patrimonial de …… euros, a que atribui igual valor. ----------------------------------------------------- Segunda: O prédio é doado livre de quaisquer ónus ou encargos. ------------------------------------- Terceira: O segundo outorgante aceita a presente doação. ---------------------------------------------- Quarta: A primeira outorgante mulher presta a seu cônjuge o necessário consentimento para este acto. ---------------------------------------------------------------------------------------------------------

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---------- Quinta: Foi emitida certidão aos …/…/…, pela Câmara Municipal de ……, por onde se verifica que o prédio foi construído antes da entrada em vigor do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (Decreto Lei n.º 38382 de 07/08/51). ----------------------------------------------------------------------- Local e data. ---------------------------------------------------------------------------------------------------------- Assinaturas: -------------------------------------------------------------------------------------------------

PARTILHA A competência para autenticar documentos particulares de partilhas de patrimónios hereditários, societários ou outros patrimónios comuns de que façam parte coisas imóveis, é conferida ao Solicitador pela alínea f) do art.º 22.º do Decreto-Lei 116/2008. Vamos, no presente módulo, estudar os seguintes casos de partilha: a) Partilha de Herança: é feita por dissolução do casal, por morte de um ou de ambos os cônjuges, ou por morte de uma qualquer pessoa física, existindo um determinado acervo de bens (art.º 2101.º e seguintes do CC); b) Partilha do Casal: é feita em consequência da dissolução do casamento por divórcio, da separação judicial de pessoas e bens ou da simples separação judicial de bens (art.º 1689.º, 1770.º, 1788.º, 1790.º, 1794.º e 1795.º, todos do CC); c) Partilha de Bens Sociais: é feita em resultado da dissolução e liquidação de uma sociedade (art.º 147.º e 156.º do CSC). 1. PARTILHA DA HERANÇA A partilha tem por objecto a universalidade dos bens da herança, sendo atribuídos, aos herdeiros, os diversos bens que a constituem, procedendo-se ao preenchimento dos quinhões como melhor entenderem os herdeiros, a um só ou a diversos, em propriedade exclusiva ou em compropriedade. Os interessados a quem forem atribuídos bens a mais do que o valor do respectivo direito repõem o excesso em tornas a favor dos que levam a menos, devendo ficar, assim, igualados os quinhões de todos eles. Se a partilha não abranger todos os bens, poderão os herdeiros proceder a partilha adicional dos bens em falta. Para proceder à partilha deverão os herdeiros estar habilitados por escritura de habilitação, ou por procedimento simplificado de habilitação de herdeiros [art.º 55.º, alínea a) do CN]. Conhecidos os interessados (herdeiros, adquirentes de quinhões hereditários, donatários e legatários), e determinados, com rigor, cada um dos bens a partilhar, é necessário determinar, entre eles, como é feita a repartição dos bens. Para realizar a habilitação de herdeiros e, consequentemente, a própria partilha, terá o Solicitador de ter em conta a sucessão testamentária (art.º 2179.º e seguintes do CC), a sucessão contratual (art.º 1700 a 1707.º e 2028.º do CC) e a sucessão legal que resulta da lei e que, portanto, não depende da vontade do autor da sucessão. A sucessão legal engloba a legítima (art.º 2131.º e seguintes do CC) e a legitimária, que ocorre quando ao autor da herança sobrevivem cônjuge, descendentes ou ascendentes. Neste caso, há uma parte da herança, a legítima, de que o autor da sucessão não pode dispor e que é destinada a esses herdeiros, pela ordem e segundo as regras estabelecidas para a sucessão legítima (art.º 2156.º e seguintes do CC). Para efectuar a partilha é necessário efectuar a descrição dos bens, com indicação da situação matricial e registral e respectivos valores, calcular ainda o valor total dos bens e do quinhão de cada herdeiro, indicar a quem é adjudicado cada um dos bens e o cálculo do que cada interessado leva a mais ou a menos e, consequentemente, que tornas tem a pagar ou a receber.

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Para fazer este tipo de operações, é aconselhável fazer previamente um mapa de partilha, de que se segue um exemplo simples: MAPA DE PARTILHA

VERBA

ARTIGO

DESCRIÇÃO

VALOR

1

U-223

n/d

2

U-1.461

3 4

HERDEIROS Joana (viúva) 5/8

João (filho) 1/8

Maria (filha) 1/8

Elvira (filha) 1/8

862,19

862,19

n/d

763,46

763,46

R-4.808

n/d

53,05

53,05

R-5.924

5024

277,64

277,64

1.956,34

862,19

53,05

763,46

277,64

1.222,71

244,54

244,54

244,54

- 360,52

- 191,49

518,92

33,10

TOTAIS QUOTAS IDEAIS DIFERÊNÇAS

Para elaborarmos este mapa, teremos obviamente de ter em consideração todos os aspectos da sucessão. A hipótese presente é muito simples: morre o cônjuge marido, a esposa é meeira e herdeira conjuntamente com os filhos. Mas nem sempre parece tão fácil fazer as contas, porque há testamentos, porque há bens a trazer à colação, porque há filhos que podem não ser comuns, ou outras razões. Nesses casos, desde que se sigam os mesmos princípios, atendendo às disposições legais aplicáveis, chegar-se-á à forma à partilha com facilidade. A prática e o estudo serão obviamente importantes neste caso. Convém relembrar que à partilha se aplicam os aspectos formais do Código do Notariado, já referidos para outros casos. Aplicar-se-á, ainda, à partilha a alínea a) do n.º 2 do art.º 9.º do CRP, bem como o n.º 3 do art.º 34.º do mesmo código, conforme melhor se esclarece no parágrafo seguinte. Poderemos realizar a partilha no caso dos bens partilhados estarem omissos no registo ou nele inscritos. No caso de inscritos, os bens, a favor de pessoa diversa do autor da herança, é também possível autenticar o documento de partilha. Deverá, no entanto, ser tido em conta que terá de ser cumprido o princípio do trato sucessivo no registo, para o que será conveniente, por uma questão de cumprir os prazos do CRP, a obtenção prévia dos documentos necessários a esse mesmo trato sucessivo. A transmissão dos bens não é operada no momento da partilha, mas sim no da abertura da herança. Por outras palavras, feita a partilha, cada um dos herdeiros é considerado, desde a abertura da herança, sucessor único dos bens que lhe foram atribuídos (art.º 2119.º do CC). Não havendo transmissão, não é exigível, relativamente aos prédios urbanos, a licença de utilização, nem a ficha técnica naqueles que se destinem a habitação. Segue-se uma minuta de partilha, seguindo os valores do quadro acima transcrito. CONTRATO DE PARTILHA ---------- Entre: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------ PRIMEIRO: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ JOANA, viúva, natural da freguesia de ………, concelho de ……, residente na Rua ………, n.º …, no lugar e freguesia de ………, concelho de ……, Nif: ………. ----------------------------------- SEGUNDO: --------------------------------------------------------------------------------------------------

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---------- JOÃO e cônjuge IDALINA, casados sob o regime da comunhão de adquiridos, ambos naturais da freguesia de ………, residentes na Rua ……, n.º …, no lugar e freguesia de ……, Nifs: …… e ………. -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- TERCEIRO: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------- MARIA, solteira maior, natural da freguesia de ………, concelho de ……, residentes na Rua ………, n.º ……, Nif: ………. -------------------------------------------------------------------------------------------- QUARTO: -------------------------------------------------------------------------------------------------------------- ELVIRA e cônjuge JOSÉ, casados sob o regime da comunhão de adquiridos, ela natural da freguesia de ……… e ele da freguesia e concelho de ………, residentes na Rua ………., n.º …, Nifs: …… e ……. ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ É celebrado o presente contrato de partilha, que se rege pelas cláusulas seguintes: -------------- Primeira: Que, como consta de escritura de habilitação de herdeiros exarada a folhas ……, do Livro ……, no Cartório Notarial de ……, em ……, no dia ………. de …. de ………, na freguesia de ……, concelho de ……, faleceu intestado Manuel, natural que era da freguesia de ………, residente que foi na Rua ……, n.º …, no lugar e freguesia de ……, concelho de ……, no estado de casado, em primeiras núpcias de ambos, com a primeira outorgante, Joana, sob o regime da comunhão geral de bens. ---------------------------------------------------------------------------------------------- Segunda: Que lhe sucederam como únicos herdeiros a viúva, Joana, e seus filhos, João, Maria e Elvira, como acima foram identificados. --------------------------------------------------------------------------- Terceira: Sendo os únicos interessados na herança do falecido, pelo presente, procedem à partilha dos bens do dissolvido casal do falecido e da primeira outorgante que são os seguintes: --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- VERBA UMA – Urbano, sito em ……, freguesia de …, concelho de ……, composto de casa de habitação de rés do chão, com a superfície coberta de …… metros quadrados e logradouro com a área de …… metros quadrados, a confrontar do Norte com ……, do Sul com ……, do Nascente com …… e do Poente com ……, não descrito na Conservatória do Registo Predial de ……, inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo 223, com o valor patrimonial de € 862,19. ----------- VERBA DUAS – Urbano, sito em ……, freguesia de …, concelho de ……, composto de ……, com a superfície coberta de …… metros quadrados, a confrontar do Norte com ……, do Sul com ……, do Nascente com …… e do Poente com ……, não descrito na Conservatória do Registo Predial de ……, inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo 1.461, com o valor patrimonial de € 763,46. --------------------------------------------------------------------------------------------------------------- VERBA TRÊS – Rústico, sito em ……, freguesia de ……, concelho de ……, composto de ……, com a área de ……… metros quadrados, a confrontar do Norte com ……, do Sul com ………, do Nascente com …… e do Poente com ……., não descrito na Conservatória do Registo Predial de ……, inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o artigo 4.808, com o valor patrimonial de IMT de € 53,05. ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ VERBA QUATRO – Prédio rústico, sito em ……, freguesia de ……, concelho de ……, composto de ……, descrito na Conservatória do Registo Predial de …… na ficha cinco mil e vinte e quatro, da freguesia de Pataias, lá registado a favor do autor da herança pela inscrição Ap. …. de …. de …… de ……, inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o artigo 5.924, com o valor patrimonial de IMT de € 277,64. ------------------------------------------------------------------------------------------ Quarta: Atribuem, aos prédios a partilhar, valor igual aos valores patrimoniais, cuja soma é de mil novecentos e cinquenta e seis euros e trinta e quatro cêntimos. --------------------------------- Quinta: Dão à partilha a seguinte forma: dividem aquele valor de mil novecentos e cinquenta e seis euros e trinta e quatro cêntimos por dois, para determinar a meação do falecido e da viúva, que é de novecentos e setenta e oito euros e dezassete cêntimos, sendo a meação do falecido dividida por quatro, tantos quantos os seus herdeiros, no valor de duzentos e quarenta e quatro euros e cinquenta e quatro cêntimos, cabendo esse valor a cada um dos filhos, e acrescendo à meação da viúva, totalizando assim, o seu quinhão, o valor de mil duzentos e vinte e dois euros e setenta e um cêntimos. ---------------------------------------------------------------------------------

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---------- Sexta: Que, para pagamento do quinhão hereditário da primeira outorgante, Joana, adjudicam-lhe o bem da verba uma, pelo correspondente valor de oitocentos e sessenta euros e dezanove cêntimos, pelo que leva a menos a quantia de trezentos e sessenta euros e cinquenta e dois cêntimos, que já recebeu de tornas e de que dá quitação. ------------------------------------------------------ Sétima: Que, para pagamento do quinhão hereditário do segundo outorgante, João, adjudicam-lhe o bem da verba três, pelo correspondente valor de cinquenta e três euros e cinco cêntimos, pelo que leva a menos a quantia de cento e noventa e um euros e quarenta e nove cêntimos, que já recebeu de tornas e de que dá quitação. ------------------------------------------------------------- Oitava: Que, para pagamento do quinhão hereditário da terceira outorgante, Maria, adjudicam-lhe o bem da verba duas, pelo correspondente valor de setecentos e sessenta e três euros e quarenta e seis cêntimos, pelo que leva a mais a quantia de quinhentos e dezoito euros e noventa e dois cêntimos, que já pagou de tornas, como declarou. ------------------------------------------------- Nona: Que, para pagamento do quinhão hereditário da quarta outorgante, Elvira, adjudicam-lhe o bem da verba quatro, pelo correspondente valor de duzentos e setenta e sete euros e sessenta e quatro cêntimos, pelo que leva a mais a quantia de trinta e três euros e dez cêntimos, que já pagou de tornas, como declarou. ------------------------------------------------------------------------------------ Décima: Que os prédios rústicos adjudicados aos segundo e quarto outorgantes não são contíguos entre si. ----------------------------------------------------------------------------------------------------------- Décima primeira: A segunda outorgante mulher e o quarto outorgante marido declaram que prestam a seus cônjuges o consentimento necessário a este acto. ------------------------------------- Local, data. ----------------------------------------------------------------------------------------------------------- Assinaturas: ------------------------------------------------------------------------------------------------2. PARTILHA DOS BENS DO CASAL Dissolvido o casal, ou no caso da separação judicial de pessoas e bens, ou simples separação judicial de bens, cada um deles deverá receber a sua meação no património comum, com a realização da correspondente partilha. Dada a elementaridade deste trabalho, não abordaremos aqui a questão das dívidas comunicáveis, recomendando, para o efeito, o estudo do art.º 1691.º e seguintes do CC. Não há, obviamente, lugar a partilha entre cônjuges que foram casados no regime da separação, porque cada um deles detém o domínio e fruição dos seus bens e deles dispõe livremente (art.º 1735.º do CC). No caso de partilha de bens de cônjuges que foram casados em comunhão de adquiridos, serão objecto de partilha apenas os bens comuns do casal (adquiridos a título oneroso após o casamento) (art.º 1722.º e 1724.º do CC). No caso da comunhão geral, serão partilhados todos os bens comuns, que são os adquiridos a título gratuito ou oneroso antes ou na constância do casamento, com excepção dos constantes no art. 1733.º do CC (bens incomunicáveis). A partilha dos bens do casal é feita nos mesmos termos de qualquer outra partilha. Deve, no entanto, ser tida em conta a redacção do art.º 1790.º do CC, introduzida pela Lei 61/2008, de 31 de Outubro. Esta lei entrou em vigor em 1/12/2008, aplicando-se apenas aos processos decretados pelo tribunal depois desta mesma data. Assim, convirá verificar sempre se a cessação das relações patrimoniais ocorreu antes de 1 de Dezembro de 2008 ou na sequência de processo pendente nessa data em tribunal, caso em que se um deles foi considerado principal culpado, a partilha tem de obedecer ao que se achava no art. 1790.º antes da referida Lei 61/2008: o cônjuge declarado único ou principal culpado não pode, na partilha, receber mais do que receberia se o casamento tivesse sido celebrado na comunhão de adquiridos. Se, pelo contrário, o processo foi iniciado depois de 1 de Dezembro de 2008, seguir-se-á o preceituado na lei referida, acarretando tal que, nos casos de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, ou simples separação judicial de bens, nenhum dos cônjuges pode, na partilha,

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receber mais do que receberia se o casamento tivesse sido celebrado segundo o regime da comunhão de adquiridos. Tem vindo a ser prática notarial corrente, na partilha dos bens do casal, a não exigência de licença de utilização ou equivalente, bem como a da ficha técnica, quando a idade do prédio a tornasse exigível. Também, neste caso, os conservadores estão a fazer os registos, sem colocar em questão a legalidade dos títulos. Esta opinião não é pacífica. Opinião contrária expressam Fernando Neto Ferreirinha e Zulmira Neto Lino da Silva no livro “A Função Notarial do Advogados”, 2.ª edição, página 244, Almedina, defendendo que a partilha tem efeito translativo e, por isso, nos caso dos prédios urbanos, deverão ser exigidos aqueles documentos. Segue-se uma minuta de partilha. CONTRATO DE PARTILHA ---------- Entre: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------ PRIMEIRO: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ FERNANDA, divorciada, natural da freguesia de ………, concelho de ……., residente na Rua ………, n.º …., no lugar e freguesia de …….., concelho de ……, Nif: ………. -------------------------- SEGUNDO: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ JOÃO, divorciado, natural da freguesia de ………., residente na Rua ……, n.º …, no lugar e freguesia de ……., Nif: ……. ---------------------------------------------------------------------------------------- É celebrado o presente contrato de partilha em consequência de divórcio, que se rege pelas cláusulas seguintes: ------------------------------------------------------------------------------------------------------- Primeira: Os outorgantes foram casados um com o outro sob o regime da comunhão geral, mas por decisão proferida em 15 de Outubro de 2008 pelo Conservador do Registo Civil de ……, foi entre ambos decretado o divórcio por mútuo consentimento. ------------------------------------------ Segunda: Os bens a partilhar do património comum do seu dissolvido casal são os seguintes: --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- VERBA UMA – Urbano, sito em ……, freguesia de …., concelho de ……, composto de casa de habitação de rés do chão, com a superfície coberta de …… metros quadrados e logradouro com a área de ……. metros quadrados, a confrontar do Norte com ……, do Sul com ……, do Nascente com …… e do Poente com ……, não descrito na Conservatória do Registo Predial de ……, inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo …, com o valor patrimonial de € 862,19. ---------- VERBA DUAS – Rústico, sito em ……, freguesia de ……, concelho de ……, composto de ……, com a área de ……… metros quadrados, a confrontar do Norte com ……., do Sul com ………, do Nascente com …… e do Poente com ……., não descrito na Conservatória do Registo Predial de ……, inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o artigo …, com o valor patrimonial de IMT de € 53,05. ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Terceira: Atribuem, aos prédios a partilhar, valor igual aos valores patrimoniais, cuja soma é de novecentos e quinze euros e vinte e quatro cêntimos, cabendo assim a cada um deles o valor de quatrocentos e cinquenta e sete euros e sessenta e dois cêntimos. ----------------------------------- Quarta: À primeira outorgante, Fernanda, em pagamento da sua meação, é adjudicado o prédio descrito sob a verba uma, no valor de oitocentos e sessenta e dois euros e dezanove cêntimos, pelo que leva a mais a quantia de quatrocentos e quatro euros e cinquenta e sete cêntimos, que já pagou de tornas como declarou. ---------------------------------------------------------------------- Quinta: Ao segundo outorgante, João, em pagamento da sua meação, é adjudicado o prédio da verba duas, pelo correspondente valor de cinquenta e três euros e cinco cêntimos, pelo que leva a menos a quantia de quatrocentos e quatro euros e cinquenta e sete cêntimos, que já recebeu de tornas e de que dá quitação. ----------------------------------------------------------------------------------- Local, data. ----------------------------------------------------------------------------------------------------------- Assinaturas: -------------------------------------------------------------------------------------------------

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3. PARTILHA DE BENS SOCIAIS Dissolvida a sociedade, entra esta imediatamente em liquidação. Não havendo dívidas, os sócios podem proceder à partilha dos bens sociais, sendo um ou vários sócios inteirados em bens de valor igual, inferior ou superior ao seu quinhão (art.º 147.º e 156.º do CSC). É entendimento quase geral de que, nesta partilha, há transmissão, pelo que deverá ser exibida a licença de utilização e a ficha técnica, esta entregue ao adquirente, nos casos em que esses documentos sejam exigíveis. Segue-se uma minuta de partilha. CONTRATO DE LIQUIDAÇÃO E PARTILHA DE BENS SOCIAIS ---------- Entre: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------ PRIMEIRO: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ FERNANDA, divorciada, natural da freguesia de ………, concelho de ……., residente na Rua ………, n.º …., no lugar e freguesia de …….., concelho de ……, Nif: ………. ------------------------- SEGUNDO: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ JOÃO, divorciado, natural da freguesia de ………., residente na Rua ……, n.º …, no lugar e freguesia de ……., Nif: ……. ---------------------------------------------------------------------------------------- TERCEIRO: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------- ANTÓNIO, solteiro maior, natural da freguesia de ………., residente na Rua ……, n.º …, no lugar e freguesia de ……., Nif: ……. ------------------------------------------------------------------------------------ É celebrado o presente contrato de liquidação e partilha de bens sociais, que se rege pelas cláusulas seguintes: ------------------------------------------------------------------------------------------------------- Primeira: Por escritura pública lavrada aos … de …… de …, no Cartório Notarial de ……, foi constituída a sociedade ……, com o capital social de ……, dividido em duas quotas iguais de …… euros, uma de cada um dos segundo e terceiro outorgantes, sendo a primeira designada gerente. -------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Segunda: A sociedade foi matriculada sob o número ……., mas por escritura lavrada aos … de …… de …, no Cartório Notarial de ……, foi dissolvida por acordo dos sócios, passando, nos termos do artigo 151.º do Código das Sociedades Comerciais, a primeira outorgante a ser liquidatária da sociedade. -------------------------------------------------------------------------------------------------- Terceira: Encontram-se satisfeitos todos os direitos dos credores, tendo as contas sido encerradas em … de …… de …. ------------------------------------------------------------------------------------------- Quarta: As contas finais apresentadas pela primeira outorgante, liquidatária, aos segundo e terceiro, sócios, acompanhadas de relatório completo de liquidação e do projecto de partilha do activo restante, foram aprovadas em … de …… de … por deliberação unânime dos sócios. ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Quinta: O activo a repartir pelos sócios é constituído pelos seguintes bens: ---------------------- VERBA UM – Urbano, sito em ……, freguesia de …., concelho de ……, composto de ……, destinado a indústria, com a superfície coberta de …… metros quadrados e logradouro com a área de …… metros quadrados, a confrontar do Norte com ……, do Sul com ……, do Nascente com …… e do Poente com ……, não descrito na Conservatória do Registo Predial de ……, inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo …, com o valor patrimonial e atribuído de € 15.000,00. ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------ VERBA DUAS – Urbano, sito em ……, freguesia de ……, concelho de ……, composto de ……, destinado a comércio, com a superfície coberta de ……… metros quadrados, a confrontar do Norte com ……., do Sul com ………, do Nascente com …… e do Poente com ……., não descrito na Conservatória do Registo Predial de ….., inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o artigo …, com o valor patrimonial e atribuído de € 55.000,00. ------------------------------------------ Sexta: Somam os bens a partilhar o valor de setenta mil euros, dele cabendo cinco mil a cada sócio para reembolso integral da sua entrada de capital inicial, devendo o restante ser

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repartido entre eles em partes iguais, pertencendo, assim a cada um deles a quantia de trinta e cinco mil euros. -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Sétima: De acordo com o acima mencionado projecto de partilha, são ambos os bens entregues ao terceiro outorgante, António, no indicado valor de setenta mil euros, pelo que leva a mais a quantia de trinta e cinco mil euros, que repõe em dinheiro ao segundo outorgante, João, que declara ter recebido e de que dá quitação. --------------------------------------------------------------------------- Oitava: Os livros e demais escrituração comercial da sociedade são confiados à guarda do sócio António. ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Local, data. ----------------------------------------------------------------------------------------------------------- Assinaturas: -------------------------------------------------------------------------------------------------

PRECEITOS FISCAIS APLICÁVEIS À PARTILHA A transmissão de bens na partilha hereditária e na societária está sujeita ao IMT no que exceder o valor da quota parte do adquirente [art.º 2.º, n.º 5, alínea c) e 12.º, n.º 4, regra 11.ª do CIMT]. Porém, o excesso da quota parte que pertence ao adquirente em acto de partilha por dissolução do casamento não está sujeito a tributação de IMT (n.º 6, art.º 2.º do CIMT). A circular 10/2009 da DGCI determina esta exclusão para os casos de partilha resultante de divórcio, separação judicial de pessoas e bens ou de simples separação judicial de bens. A liquidação do IMT é promovida com base no próprio documento de partilha, portanto, posteriormente à sua celebração. O Selo da verba 1.1 da Tabela Geral, ou seja, 0,8% sobre o excesso adquirido é igualmente liquidado após a realização da partilha, com base no mesmo documento.

PROPRIEDADE HORIZONTAL A propriedade horizontal possibilita que as diversas fracções de um edifício possam pertencer a proprietários diferentes (art.º 1414.º do CC) desde que constituam unidades independentes, distintas e isoladas entre si, com saída própria para a via pública ou para uma parte comum do prédio e desta para a via pública (art.º 1415.º do CC). Estas partes autonomizadas podem ficar a pertencer a titulares distintos, ficando as restantes, como comuns, a pertencer aos diversos proprietários na proporção do valor da parte autónoma de cada um deles, expressa em percentagem ou permilagem. A propriedade horizontal encontra-se definida no art.º 1414.º e seguintes do CC. A propriedade horizontal pode ser constituída, para além de outros casos, por negócio jurídico (logo por DPA) (art.º 1417.º do CC). O título de propriedade horizontal terá obrigatoriamente de especificar as partes do edifício correspondentes às várias fracções, de modo a que fiquem individualizadas, e nele será fixado o valor relativo a cada fracção, expresso em permilagem ou percentagem do valor total do prédio (art.º 1418.º, n.º 1 do CC). Deve, pois, notar-se, desde já, que, ao contrário do que ainda é comum pensar-se, a permilagem (ou percentagem) deve ser fixada em função do valor e não da área da fracção. Para além da especificação das fracções e respectiva permilagem, o título pode, ainda, conter (art.º 1418.º, n.º2): a) Menção do fim a que se destina cada fracção ou parte comum; b) Regulamento do condomínio; c) Previsão de compromisso arbitral para resolução de litígios;

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Daqui se infere que, ao contrário do que também é normal supor-se, não é obrigatório constar do título de constituição de propriedade horizontal o fim a que se destina cada uma das fracções. Deve, porém, ter-se em conta que, indicado esse fim, terá de ser coincidente com o que foi fixado no projecto aprovado, sob pena de nulidade do título constitutivo. Igualmente é nulo o título que não especifique as partes do edifício correspondentes às várias fracções e respectivo valor em permilagem ou percentagem (art.º 1418.º, n.º 3). Para constituir a propriedade horizontal por DPA, deverão os interessados apresentar documento, passado pela Câmara Municipal, comprovativo de que as fracções autónomas satisfazem os requisitos legais, ficando este documento arquivado, ou, tratando-se de prédio construído para transmissão em fracções autónomas, a exibição do projecto de construção e, sendo caso disso, dos posteriores projectos de alteração aprovados pela mesma entidade (n.º 1 e 2 do art.º 59.º do CN). Será de um destes dois documentos que o Solicitador extrairá todos os elementos necessários à elaboração do documento. No caso da exibição do projecto de construção, poderá dar-se o caso de o prédio estar totalmente construído, caso em que será exigível o competente modelo 1 ou a inscrição na matriz, ou encontrar-se em construção, caso em que o modelo 1 ou a inscrição na matriz exigível será a do lote ou parcela para construção. Em qualquer dos casos, deverá, na hipótese de exibição do projecto, constar que o prédio se destina a ser transmitido em fracções autónomas, no próprio projecto, na sua memória descritiva ou noutro documento que o integre. Deve notar-se que a propriedade horizontal, quando o prédio pertença a diversos comproprietários, é, frequentemente, seguida de divisão entre eles, onde se adjudica a cada um, sua fracção. O QUE DEVE CONSTAR DO TÍTULO Como atrás ficou referido, o conteúdo do título constitutivo, quer obrigatório, quer facultativo, encontra-se consignado no art.º 1418.º do CC. Estabelece, por sua vez, o Código do Registo Predial (art.º 83.º, n.º 1) o que deve conter a descrição de cada uma das fracções autónomas. Assim, tendo por base os artigos referidos e outros do Código Civil e do Código de Registo Predial, chega-se à conclusão que o título deverá conter o seguinte: – Especificação das partes do edifício a que correspondem as várias fracções; – Fixação do valor relativo de cada fracção, expresso em permilagem ou percentagem do valor total do prédio; – Denominação do prédio e sua situação, por referência ao lugar, rua, números de polícia ou confrontações, composição sumária, área do prédio e artigo de matriz, provisório ou definitivo; – Menção do fim a que se destina cada fracção (facultativa). Deverá, ainda, indicar-se as partes comuns, sendo que as referidas no n.º 1 do art.º 1421.º são imperativamente comuns, podendo o título afastar essa presunção para as referidas no n.º 2 do mesmo artigo, podendo, assim, passar estas a integrar qualquer fracção autónoma. Finalmente, poderá ficar consignado, quando for o caso, a afectação ao uso exclusivo de uma fracção de certas zonas de partes comuns (n.º 3 do referido art.º 1421.º), sendo frequente ocorrer tal facto com os terraços de cobertura. O art.º 1438.º-A do CC alarga a aplicação da propriedade horizontal a conjuntos de edifícios contíguos ligados entre si pela existência de partes comuns afectadas ao uso de algumas ou todas as fracções que os compõem.

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FISCALIDADE O acto de constituição de propriedade horizontal deixou de estar sujeito a Imposto de Selo com a eliminação da verba 15.8 da Tabela Geral, não se lhe aplicando qualquer outra sujeição a imposto. Segue-se uma minuta de propriedade horizontal. TÍTULO CONSTITUTIVO DE PROPRIEDADE HORIZONTAL ---------- OUTORGANTE - DIAMANTINO, divorciado, natural da freguesia de ……, concelho de ……, residente na Rua ……, n.º …, na vila e freguesia de ……, Nif.: ……. ---------------------------------------- O OUTORGANTE DECLARA: ------------------------------------------------------------------------------------- PRIMEIRO: Que é dono e legítimo possuidor do prédio urbano sito na Rua ……, com os números de polícia ……, na vila e freguesia de ……, concelho de ……, inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo ……, descrito na Conservatória do Registo Predial de ……… na ficha número ………, lá registado a seu favor pela inscrição Ap. …… de … de …… de …, a que atribui o valor de ……… euros; ------------------------------------------------------------------------------------------------------ SEGUNDO: Que sobre o prédio incidem, ainda, a inscrição Ap. …… de … de …… de …, de ónus de não fraccionamento, pelo prazo de dez anos, com início em … de …… de … e a inscrição Ap. …… de … de …… de … de hipoteca voluntária a favor da Caixa ……. ------------------------ TERCEIRO: Que o prédio, composto por dois edifícios contíguos de rés-do-chão para habitação, um a Nascente e outro a Poente, tem a área coberta de …… metros quadrados e descoberta de …… metros quadrados, foi construído para transmissão em fracções autónomas, em conformidade com o projecto de construção ……, aprovado pela Câmara Municipal de ……, no dia … de …… de …, sendo composto por duas fracções que constituem unidades independentes, distintas e isoladas entre si, com saída própria para uma parte comum do prédio e desta para a via pública. ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- QUARTO: Que, pelo presente, submete o prédio ao regime de propriedade horizontal, com as seguintes fracções autónomas: ------------------------------------------------------------------------------------ Fracção “A” – Rés do chão, destinado a habitação, com entrada pelo número … de polícia, com três alpendres, com as áreas, respectivamente, de … metros quadrados, … metros quadrados e … metros quadrados, uma garagem, com a área de … metros quadrados e uma piscina, com a área de … metros quadrados, com a permilagem de quinhentos do valor total do prédio e o valor de … euros. --------------------------------------------------------------------------------------------- Fracção “B” – Rés do chão, destinado a habitação, com entrada pelo número … de polícia, com três alpendres, com as áreas, respectivamente, de … metros quadrados, … metros quadrados e … metros quadrados, uma garagem, com a área de … metros quadrados e uma piscina, com a área de … metros quadrados, com a permilagem de quinhentos do valor total do prédio e o valor de … mil euros. --------------------------------------------------------------------------------------------- QUINTO: Que à fracção “A” é afectado o uso exclusivo de uma parcela demarcada do logradouro, com … metros quadrados; e à fracção “B” é afectado o uso exclusivo de uma parcela demarcada do logradouro, com … metros quadrados. ---------------------------------------------------------------- SEXTO: Que além das referidas parcelas de uso exclusivo, são comuns as partes não discriminadas ou como tal consideradas por lei. ------------------------------------------------------------------------ SÉTIMO: Este prédio é conjunto de edifícios contíguos e funcionalmente ligados entre si pela existência de partes comuns afectas ao uso de todas as unidades e fracções que as compõem. ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Local e data. -------------------------------------------------------------------------------------------------------- Assinatura: --------------------------------------------------------------------------------------------------

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DIVISÃO A divisão de coisa comum é uma das formas de pôr termo à compropriedade. A divisão pode ser feita nos termos da lei de processo ou amigavelmente, estando, neste caso, sujeita à forma exigida para a alienação onerosa (art.º 1413.º do CC). Sendo uma divisão de coisa comum efectuada sobre bem imóvel há sujeição de forma: documento particular autenticado ou escritura [alínea f ) do art.º 22.º do Decreto-Lei 116/2008]. Embora possa haver semelhanças entre a partilha e a divisão, são coisas distintas: na divisão põe-se termo a um regime de compropriedade; na partilha põe-se termo a uma comunhão. Na compropriedade, cada um dos comproprietários tem direito a uma fracção que pode ser alienada. Na comunhão, os titulares têm direito, em conjunto, sobre toda a massa patrimonial, não tendo, qualquer deles, direito a uma determinada quota sobre cada um dos bens que a compõem. Se se pretender dividir um determinado bem, em que uma parte está em compropriedade, enquanto a outra está registada em comum e sem determinação de parte ou direito ou, não estando registada, pertence a uma herança indivisa, poderá proceder-se de duas maneiras distintas: a) Partilhar, em primeiro lugar, entre os respectivos herdeiros, a parte de que a herança é titular, procedendo-se de seguida à divisão; ou b) Fazer a divisão directa, adjudicando a um comproprietário o prédio que lhe cabe, adjudicando o outro prédio ao conjunto dos herdeiros, em comum e sem determinação de parte ou direito, por sub-rogação dos direitos da herança. A divisão deverá incidir sobre um só prédio susceptível de ser constituído em fracções, como é o exemplo da propriedade horizontal ou dos prédios rústicos fraccionáveis nos termos da lei. É fraccionável o prédio rústico que possa sê-lo em parcelas iguais ou superiores à unidade de cultura, desde que, do fraccionamento, não resulte o encrave de qualquer uma das parcelas (n.º 1 e 2 do art.º 1376.º do CC), devendo, no entanto, ser presente, na divisão, parecer favorável da direcção regional de agricultura, sem o qual se mantém o acto anulável (art.º 20.º do Decreto-Lei 384/88 e art.º 45.º do Decreto-Lei 103/90). É ainda possível o fraccionamento, se o adquirente da parcela resultante do fraccionamento for proprietário de terreno contíguo ao adquirido, desde que a restante parte do terreno fraccionado corresponda, pelo menos, a uma unidade de cultura [art.º 1377.º, alínea b) do CC]. Do mesmo modo é anulável o acto se da divisão resultar área inferior à da unidade de cultura para qualquer dos prédios dela resultantes. Os documentos e regras necessários à divisão são, no essencial, os mesmos que à partilha. Não havendo, na divisão, transmissão mas sim definição da fracção ideal de cada comproprietário, não é necessária a exibição da autorização de utilização ou da ficha técnica, quando se trate de prédios urbanos. PRECEITOS FISCAIS Aplica-se o já referido para a partilha. A liquidação é posterior e efectuada com base no título. Do mesmo modo, o Selo é liquidado após a autenticação do DPA.

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Segue-se uma minuta de divisão. CONTRATO DE DIVISÃO ---------- Entre: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------ PRIMEIRO: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ ISABEL e cônjuge JOSÉ, casados sob o regime da comunhão de adquiridos, ambos naturais da freguesia de ……, concelho de ……, residentes na Estrada ……, n.º …, no lugar e freguesia de ……, concelho de ……, titulares dos NIFs ……… e ………. ------------------------------------------ SEGUNDO: ----------------------------------------------------------------------------------------------------------- LEONOR, viúva, natural da referida freguesia de ……, residente na Rua ……, n.º …, no mesmo lugar de ……, titular do Nif: ………. ----------------------------------------------------------------------------- TERCEIRO: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ NÉLIO e cônjuge GRAÇA, casados sob o regime da comunhão de adquiridos, ele natural da dita freguesia de …… e ela da freguesia de ……, concelho de ……, residentes na Rua ……, n.º …, no citado lugar de ……, titulares dos Nifs: ……… e ………. ---------------------------------------- QUARTO: -------------------------------------------------------------------------------------------------------------- IDÁLIO e cônjuge ÂNGELA, casados sob o regime da comunhão de adquiridos, naturais ele da freguesia e concelho de …… e ela da freguesia e concelho de ……, residentes na Rua ……, n.º …, no aludido lugar de ……, titulares dos Nifs ……… e ………. ---------------------------------------- É celebrado o presente contrato de divisão, que se rege pelas cláusulas seguintes: --------------- Primeira: A primeira outorgante mulher e a segunda e os terceiro e quarto maridos, são donos, na proporção de metade para a primeira e metade em comum e sem determinação de parte ou direito para a segunda, o terceiro marido e o quarto marido, do prédio rústico, sito no ……, freguesia de ……, concelho de ……, composto de ……, com a área de …… metros quadrados, descrito na Conservatória do Registo Predial de Alcobaça na ficha ……, da freguesia de ……, inscrito na respectiva matriz predial sob os artigos 58 e 59, com o valor patrimonial de IMT de …… euros, a que atribuem igual valor. --------------------------------------------------------------------------- Segunda: Sob metade do prédio incide a inscrição de aquisição Ap. … de … de …… de …… a favor de Manuel. ----------------------------------------------------------------------------------------------------- Terceira: Os direitos da primeira outorgante vieram à sua posse por Documento Particular Autenticado de Contrato de Doação de Manuel à primeira outorgante Isabel, autenticado previamente a este pelo Solicitador ……, nesta mesma data e arquivado no seu escritório, sito na Rua ……, n.º …, …, na vila e freguesia de ……, concelho de ……. ------------------------------------------------ Quarta: Os referidos direitos sobre o prédio vieram à posse da segunda outorgante e dos terceiro e quarto maridos por sucessão hereditária por morte de Aguinaldo, que faleceu intestado, de quem são únicos herdeiros, nos termos de Procedimento Simplificado de Habilitação de Herdeiros e Registos com o número ………, realizado em … de …… de …, na Conservatória do Registo Civil de ……. ------------------------------------------------------------------------------------------- Quinta: Que, pelo presente contrato, procedem à divisão do referido prédio em dois novos prédios distintos e demarcados como de seguida se identificam: ----------------------------------------- UM – Prédio rústico, sito no ……, freguesia de ……, concelho de ……, composto de ……, com a área de …… metros quadrados, a confrontar do Norte com …, do Sul com …, do Nascente com … e do Poente com …, inscrito na respectiva matriz sob o artigo 58, com o valor patrimonial para efeitos de IMT e atribuído de … euros, parte do descrito na Conservatória do Registo Predial de …… na ficha ……, da freguesia de ……. --------------------------------------------------------- DOIS – Prédio rústico, sito no ……, freguesia de ……, concelho de ……, composto de ……, com a área de …… metros quadrados, a confrontar do Norte com …, do Sul com …, do Nascente com … e do Poente com …, inscrito na respectiva matriz sob o artigo 59, com o valor patrimonial para efeitos de IMT e atribuído de … euros, parte do descrito na Conservatória do Registo Predial de …… na ficha ……, da freguesia de ……. --------------------------------------------

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---------- Sexta: No valor global atribuído de …… euros, cabe à primeira, um quinhão de … euros e, em comum e sem determinação de parte ou direito, à segunda, ao terceiro marido e ao quarto marido, um quinhão de …… euros. ------------------------------------------------------------------------------- Sétima: Calculados os quinhões dos intervenientes interessados, pondo termo à compropriedade, procedem à adjudicação destes novos prédios da seguinte forma: ------------------------------- À primeira outorgante, Isabel, adjudicam o prédio identificado em UM, pelo valor atribuído de …… euros, pelo que leva a mais em imóveis a quantia de …… euros, que já pagou de tornas. --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- À segunda outorgante, ao terceiro marido e ao quarto marido, em comum e sem determinação de parte ou direito, por sub-rogação no lugar dos referidos direitos da herança por óbito de Aguinaldo, adjudicam o prédio identificado em DOIS, com o valor atribuído de …… euros, pelo que levam a menos em imóveis a quantia de …… euros, que já receberam de tornas e de que dão quitação. ---------------------------------------------------------------------------------------------------------- Oitava: O primeiro outorgante marido e as terceira e quarta outorgantes mulheres dão aos seus cônjuges o necessário consentimento para o presente acto. -------------------------------------------- Local e data. -------------------------------------------------------------------------------------------------------- Assinaturas: -------------------------------------------------------------------------------------------------

PERMUTA À permuta aplicam-se, com as necessárias adaptações, as normas reguladoras da compra e venda. Entre essas normas, conta-se a de que só é válida se for celebrada por escritura pública ou por documento particular autenticado [art.º 875.º do CC e alínea a) do art.º 22.º do Decreto-Lei 116/2008]. Na permuta deverá ser tido em conta o valor dos bens. Se as partes atribuem aos bens permutados o mesmo valor, não haverá lugar a tornas. Se lhe atribuem valor diferente, então, a parte que recebe o bem de valor menor, tem de receber, da outra parte, um valor que iguale o valor dos bens, normalmente quantia em dinheiro. Frequentemente, através da permuta, põe-se termo à compropriedade: A e B são detentores cada um de metade dos prédios X e Z. A cede a B metade de Z e B cede a A metade de X, ficando assim A detentor da totalidade do prédio X e B detentor da totalidade do prédio Z. Também é possível, numa operação contrária, estabelecer-se a compropriedade onde ela não existia. Actualmente é muito corrente a permuta de bens presentes por bens futuros, como se pode verificar no seguinte exemplo: A cede a B o terreno P; em troca, B cede a A a fracção autónoma F que resultará da constituição em propriedade horizontal do prédio que no terreno P irá construir. FISCALIDADE A permuta está sujeita ao pagamento de IMT pela diferença declarada de valores ou pela diferença entre os valores patrimoniais tributários, conforme a que for maior [art. 2.º, n.º 1 e 5, alínea b) do CIMT]. Daqui se entende que, não havendo diferença declarada de valores, funcionará a dos valores patrimoniais. Fica sujeito ao pagamento do imposto, o permutante que receber os bens de maior valor. O pagamento de IMT precede a autenticação do contrato. Conjuntamente com o IMT terá de ser liquidado e pago o Selo de 0,8% sobre o valor da diferença (verba 1.1 da Tabela Geral).

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Segue-se uma minuta de permuta. CONTRATO DE PERMUTA ---------- Entre: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------ PRIMEIRO: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ JOÃO, casado com Hortense sob o regime da comunhão geral de bens, ele natural da freguesia de ……, concelho de …, residente na Rua ……, n.º …, no lugar de ……, referida freguesia de ……, titular do Nif: ……, por si e na qualidade de procurador de sua esposa: ------------------ HORTENSE, natural da mesma freguesia de ……, consigo residente, Nif: ………. --------------- SEGUNDO: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ ARLINDO e cônjuge MARIA, casados sob o regime da comunhão geral de bens, naturais da freguesia do ……, concelho de ……, onde residem no Largo ……, n.º …, titulares dos Nifs: …… e ……. ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- É celebrado o presente contrato de permuta, que se rege pelas cláusulas seguintes: ----------- Primeira: O primeiro outorgante e a sua representada são donos e legítimos possuidores do seguinte bem: ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ Um – Fracção autónoma designada pela letra “…”, destinada a habitação, no piso …, no Bloco … e um lugar para estacionamento no piso … identificado pelo número ……, descrita na Conservatória do Registo Predial de …… na ficha ……-“…”, lá registada a favor dele vendedor pela inscrição Ap. … de … de …… de …, do prédio urbano, afecto ao regime da propriedade horizontal pela inscrição Ap. … de … de …… de …, sito na Rua …, no lugar de …, freguesia de …, concelho de …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … na ficha …, da freguesia de …, inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo …, com o valor patrimonial de …… € e atribuído de cinquenta mil euros. --------------------------------------------------------------------------------- Segunda: Os segundos outorgantes são donos e legítimos possuidores do seguinte bem: ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Dois – Trinta mil, setecentos e onze mil quatrocentos e dezanove avos indivisos, que é tudo quanto nele possuem, do prédio rústico, sito no ……, freguesia de ……, concelho de ……, composto de ……, descrito na Conservatória do Registo Predial de …… sob o número ……, da freguesia de ……, com o registo de aquisição a favor dos vendedores pela inscrição Ap. … de … de …… de …, inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o artigo …, com o valor patrimonial para efeitos de IMT correspondente de … € e atribuído de trinta mil euros. ----------------------- Terceira: Pelo presente contrato o primeiro outorgante, por si e em nome da sua representada, e os segundos procedem à seguinte permuta: --------------------------------------------------------------- O primeiro outorgante e a sua representada, João e cônjuge Hortense, cedem aos segundos outorgantes, Arlindo e cônjuge Maria, que o aceitam, o bem identificado em um, pelo valor atribuído de cinquenta mil euros. -------------------------------------------------------------------------------------- Os segundos outorgantes, Arlindo e cônjuge Maria, cedem ao primeiro outorgante e à sua representada, João e cônjuge Hortense, que para si e para a sua representada o aceita, o bem identificado em dois, pelo valor atribuído de trinta mil euros e, ainda, a quantia em dinheiro de vinte mil euros. ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Quarta: As partes não recorreram a mediação imobiliária. --------------------------------------------- Quinta: O primeiro outorgante, por si e em nome da sua representada, declara ter recebido, dos segundos outorgantes, a quantia de vinte mil euros. ----------------------------------------------- Sexta: Os outorgantes declaram que o prédio um se destina exclusivamente a habitação. ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Local e data --------------------------------------------------------------------------------------------------------- Assinaturas: -------------------------------------------------------------------------------------------------

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LEGISLAÇÃO Para além de legislação avulsa diversa, deverá ter-se especial atenção a: – Código Civil: – Compra e Venda: art.º 874.º e seguintes; – Doação: art.º 940.º e seguintes, entre outros; – Partilha da Herança: art.º 2101.º e seguintes; – Partilha do Casal: art.º 1689.º, 1770.º, 1788.º, 1790.º, 1794.º e 1795.º; – Propriedade Horizontal: art.º 1414.º a 1438.º-A; – Divisão: art.º 1403.º a 1413.º; – Permuta: art.º 939.º que remete para os da Compra e Venda. – Código das Sociedades Comerciais: – Partilha de Bens Sociais: art.º 147.º e 156.º; – Código do Notariado; – Código do Registo Predial; – Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis; – Código do Imposto de Selo; – Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro; – Decreto-Lei n.º 68/2004, de 25 de Março; – Decreto-Lei n.º 78/2006, de 4 de Abril; – Decreto-Lei n.º 211/2004, de 20 de Agosto; – Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março: especialmente art.º 38.º; – Decreto-Lei n.º 116/2008, de 4 de Julho: especialmente art.º 22.º a 26.º; – Portaria n.º 202/70, de 21/04.

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MÓDULO 10 DPA: PARTICULARIDADES DO TERMO DE AUTENTICAÇÃO SUJEITO A REGISTO PREDIAL O Documento Particular Autenticado é um dos actos mais responsáveis e solenes entre todos aqueles que fazem parte das competências do Solicitador. Como tal, a elaboração do termo de autenticação obriga o Solicitador a aplicar as formalidades dos instrumentos notariais e a fazer referências, alusões e menções, juntar documentos necessários, identificá-los, bem como a consignar declarações ou advertências. Ao termo de autenticação de um contrato sujeito a registo aplicam-se, com as necessárias adaptações, as normas referidas para a autenticação de documentos não sujeitos a registo predial, bem como as aplicáveis referidas para os contratos, devendo ter-se ainda em consideração as que no presente módulo se referem. Alguns requisitos necessários, ao solicitador, para autenticar documentos particulares sujeitos a registo predial: – Possuir certificado digital válido, instalado no browser; – Observar os regulamentos da Câmara dos Solicitadores aplicáveis; – Ter estrutura de arquivo; – Ter equipamento informático, nomeadamente computador, digitalizador, impressora e ligação de banda larga à internet. O termo, para além de servir de autenticação ao contrato, poderá e deverá, ainda, completar ou esclarecer o próprio contrato, eliminando ou sanando as suas imperfeições. Assim, importa verificar os impedimentos previstos no Código do Notariado, cujas limitações e incompatibilidades se aplicam ao Solicitador. Deste modo, deverá o Solicitador recusar intervir em actos em que tenha interesse directo ou indirecto, quer ele próprio, quer o seu cônjuge, ou qualquer parente, ou afim, na linha recta, ou em segundo grau, na linha colateral, ou possa comprometer a segurança e garantia de isenção e rigor (art.º 5.º do CN). Este impedimento deve entender-se como extensivo aos empregados do Solicitador (art.º 6.º, n.º 1 do CN). Deverá entender-se como aplicável ao Solicitador o segredo profissional imposto ao notário (art. 32.º do CN), articulando-o com o segredo profissional imposto ao Solicitador pelo seu Estatuto. No entanto, deverá adaptar-se este segredo profissional, no caso dos contratos particulares autenticados de actos sujeitos a registo predial, caso em que deverão ser tidas em conta as especificidades relativas ao registo, quanto à publicidade destes actos. O Solicitador deverá recusar o acto nos casos seguintes (art.º 173.º do CN): – Se for nulo; – Se não for da sua competência, ou estiver pessoalmente impedido de o praticar; – Se tiver dúvidas sobre a integridade das faculdades mentais dos intervenientes, salvo se no acto intervierem dois peritos médicos, que deles garantam a sanidade mental. No caso de o acto ser anulável ou ineficaz, deverá praticá-lo, advertindo as partes da existência do vício e consignando no termo de autenticação a advertência de que o tenha feito (art.º 174.º do CN). Exemplo de acto anulável, que pode, portanto, ser praticado, é o fraccionamento de prédios rústicos ou a doação sem consentimento do cônjuge. Deverá sempre o Solicitador verificar se o contrato exprime a vontade das partes; se pode ser por si autenticado, verificar da possibilidade física e jurídica do objecto e da sua licitude (ver art.º 1488.º, 1545.º, 2008.º, 2095.º, 2291.º e 2294.º todos do CC) e, ainda, se cumpre todos os requisitos legalmente exigíveis. Se esses requisitos não forem cumpridos, o negócio jurídico é nulo. Vejamos alguns exemplos de nulidade: – Casos dos art.º 220.º, 240.º, 271.º, 280.º, 294.º, 892.º, 902.º, 1408.º e 1416.º todos do CC; – Art.º 54.º da Lei 91/95, alterada pela Lei 165/99 e alterada e republicada pela Lei 64/2003 (contratos de transmissão de prédio rústico que importem criação de compropriedade ou seu aumento, sem autorização camarária).

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Outros casos de recusa (art.º 157.º do CN): – Documento com leitura não facultada ao Solicitador; – Documento em papel escrito ou assinado a lápis ou sem quaisquer dizeres; – Documento em que foram utilizados materiais sem garantia de fixidez; – Documento com linhas ou espaços em branco por inutilizar. – Documento escrito em língua estrangeira, não dominada pelo Solicitador e sem a correspondente tradução. Apresentado pelas partes, ao Solicitador, o documento particular (ou elaborado este pelo Solicitador e assinado pelas partes) para autenticação, deverá esta ser reduzida a termo, em folha anexa ou no próprio documento. A autenticação, no essencial, consiste na confirmação do conteúdo do documento pelas partes que devem declarar que o leram e assinaram, que conhecem perfeitamente o seu conteúdo e que este exprime a sua vontade. Deverá, assim, o Solicitador fazer, aos outorgantes, a explicação do conteúdo do documento e do termo de autenticação, bem como esclarecer quaisquer dúvidas que possam verificar-se. Convém referir que os documentos particulares, sujeitos a registo predial, de transmissões onerosas, não podem ser autenticados enquanto não se encontrar pago ou assegurado o IMT e o Imposto de Selo (art.º 25.º, n.º 1 do Decreto-Lei 116/2008). Deve constar, no termo de autenticação, o valor dos impostos e a data da liquidação ou a disposição legal que prevê a sua isenção (n.º 2 do mencionado art.º 25.º). Compete, ainda, à entidade autenticadora de documento que titule actos e contratos previstos no CIS (com excepção nos previstos na verba 1.2 da Tabela Geral), assegurar que a liquidação desse imposto seja efectuada nos prazos, termos e condições definidas no art.º 22.º do CIMT (n.º 3 do citado art.º 25.º). REDACÇÃO DO TERMO DE AUTENTICAÇÃO A redacção do termo deve ser feita numa linguagem sintética, clara e precisa e insusceptível de interpretações diversas (art.º 42.º do CN). Iniciar-se-á o termo com a menção da data, do lugar e morada em que é assinado, seguindo-se a identificação do Solicitador, bem como o número da sua cédula profissional. Seguir-se-á a identificação completa de todos os outorgantes: – As pessoas singulares serão identificadas pelo nome, o estado civil, o nome do cônjuge (se casados), o regime de casamento, a naturalidade e o respectivo NIF. – As pessoas colectivas identificar-se-ão pela denominação, sede, o número de matrícula e identificação fiscal, identificando-se os seus representantes e respectivas qualidades, tudo em conformidade com a alínea c) do número 1 do artigo 46.º e ainda do artigo 47.º, número 1, alínea a) e número 2, tudo do Código do Notariado. Imediatamente após, será feita a verificação da identidade dos outorgantes e dos seus poderes. Deve indicar-se expressamente qual a forma por que foi verificada a identidade [alínea d) do número 1 do artigo 46.º e número 1 do artigo 48.º do Código do Notariado]: – Documento Identificativo: Bilhete de Identidade, Carta de Condução, Cartão de Cidadão, ou Passaporte; – Conhecimento pessoal; – Por dois abonadores.

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Os poderes dos intervenientes, em representação de pessoas colectivas, verificar-se-ão por certidão do registo comercial e, ainda, por outros documentos que completem a respectiva verificação (artigo 49.º do Código do Notariado). Segue-se o termo propriamente dito, que deverá ter uma redacção igual ou semelhante à seguinte: Os outorgantes apresentaram o documento em anexo que é um contrato de compra e venda, tendo declarado que já o leram e o assinaram, e que o conteúdo do mesmo exprime as suas vontades (e a dos seus representados, se for caso disso). Posteriormente, inscrever-se-á no termo a menção de quaisquer advertências a serem feitas por decorrerem da lei, nomeadamente a da intervenção de mediador imobiliário, a da anulabilidade ou ineficácia do acto que não deva ser recusado com outro fundamento válido, a da falta de consentimento do cônjuge, de filhos ou netos, na compra e venda a filhos ou netos, bem como a menção de autorizações e consentimentos, quando não prestadas no contrato. De seguida, exarar-se-á, no termo, a referência aos documentos que sejam verificados por consulta online (certidões prediais, certidões do registo comercial, cadernetas matriciais, direitos de preferência legal). Seguir-se-à a alusão aos documentos que tenham de ficar, obrigatoriamente, arquivados (procurações, autorizações de consentimento, comprovativos do pagamento de impostos [se necessários ao acto]), nos termos da alínea f ) do mencionado número 1 do artigo 46.º. Será, após, feita a menção dos documentos apenas exibidos, conforme preceitua a alínea g) do mesmo número – certidão predial, alvará de utilização ou comprovativo da sua dispensa, ficha técnica da habitação com a menção de que foi entregue ao comprador, certificado energético, se necessários, e outros que sejam pertinentes. No final do termo, far-se-á: – Referência à leitura e explicação do conteúdo do mesmo [ou sua dispensa pelos intervenientes, nos termos da alínea l) do número 1 do indicado artigo 46.º]; – Menção do depósito electrónico obrigatório; – Indicação dos outorgantes que não assinam e o motivo declarado pelo qual não o fazem [alínea m) do número 1 do artigo 46.º]; – Ressalva de quaisquer rasuras, emendas, entrelinhas e palavras traçadas, nos termos da alínea b) do número 1 do artigo 151.º e dos números 1 e 3 do artigo 41.º do Código do Notariado; – Será, ainda, de recordar a inutilização dos espaços em branco, conforme preceitua o número 4 do artigo 40.º do mesmo diploma legal. É, finalmente, assinado o termo por todos os intervenientes que possam assinar seguindo-se, por último, a assinatura do Solicitador, sobre selo de autenticação, de acordo com o disposto na alínea n) do número 1 do mencionado artigo 46.º. Após completa a autenticação, é feito o depósito electrónico obrigatório em www.predialonline.mj.pt, como já atrás foi referido. Caso o acto seja sujeito a registo predial, não será necessário o registo no ROAS, nos termos do art.º 6.º, n.º 2 da Portaria 1535/2008.

MINUTA PARA ELABORAÇÃO DO TERMO DE AUTENTICAÇÃO Seguem-se minutas para o termo de autenticação, devendo, no entanto, ser tido em conta que são simples guias e não imposições ou modelos únicos:

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1.ª HIPÓTESE: TERMO DE AUTENTICAÇÃO ---------- No dia …, no meu escritório, na Rua ……, em ……, perante mim, F…, Solicitador, com cédula profissional n.º ……, compareceram: ------------------------------------------------------------------------------ PRIMEIRO: F… e cônjuge F…, casados sob o regime da comunhão de adquiridos, ambos naturais da freguesia de ……, concelho de ……, residentes em ……, titulares dos NIFs ……… e ………. ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------- SEGUNDO: F… e cônjuge F…, casados sob o regime da comunhão de adquiridos, ambos naturais da referida freguesia de ……, residentes em ……, titulares dos NIFs ……… e ………. ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------ TERCEIRO: F…, casada com F… sob o regime da comunhão de adquiridos, natural da citada freguesia de ……, residente em ………, titular do NIF ………. ------------------------------------------- Verifiquei a identidade dos outorgantes por exibição dos Bilhetes de Identidade, respectivamente, ……………………………………………. ----------------------------------------------------------- Os outorgantes apresentaram o documento que antecede, para autenticação, que é um contrato de ……, tendo declarado que já o leram, estando perfeitamente inteirados do seu conteúdo, que o mesmo exprime a sua vontade e o assinaram. ---------------------------------------------------- Verificado nesta hora por consulta online: Certidão de registo predial com o código de acesso ……………………, comprovativa da descrição e de todas as inscrições em vigor sobre o prédio. ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Exibido: Caderneta predial urbana comprovativa dos elementos matriciais do prédio obtida via Internet aos ………………. ------------------------------------------------------------------------------------- Certidão emitida pela Câmara Municipal de ………… por onde verifiquei que o prédio foi construído antes da entrada em vigor do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (Decreto Lei n.º 38382 de 07/08/51). ----------------------------------------------------------------------------------------- O presente termo de autenticação foi lido às ……… horas e ……… minutos e explicado em voz alta o seu conteúdo aos outorgantes que vão assinar na minha presença, sendo de seguida feito o depósito electrónico obrigatório em www.predialonline.mj.pt. ---------------------------------- Assinaturas: ---------- O Solicitador ---------- Recibo n.º

2.ª HIPÓTESE (inclui um outorgante que não sabe assinar e um intérprete. Corresponde à minuta de compra e venda apresentada no módulo anterior):

TERMO DE AUTENTICAÇÃO ---------- No dia …… de ……… de ……, no meu escritório, na Rua ……, n.º ……, em ……, perante mim, ……, Solicitador, com cédula profissional n.º ……, compareceram: ----------------------------- PRIMEIRO: MARIA e cônjuge SILVINO, casados sob o regime da comunhão geral de bens, ambos naturais da freguesia de ……, concelho de ……, onde residem na Rua ……, n.º …, no lugar de ……, Nifs: ……… e ………. ----------------------------------------------------------------------------------- SEGUNDO: CHANTAL, viúva, natural de França, de nacionalidade francesa, residente em ………, França e quando em Portugal, na Rua ……, n.º …, no lugar e freguesia de ……, Nif ………. ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------ Verifiquei a identidade dos outorgantes pela exibição respectivamente do seu Bilhete de Identidade …… emitido aos ../../… pelo S.I.C. de Leiria, …… emitido aos ../../… pelo S.I.C. de Lisboa e pelo seu Passaporte ……, emitido aos ../../… pelo …… e válido até ../../…. -------------------

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---------- Os outorgantes apresentaram, para autenticação, o documento em anexo que é um contrato de compra e venda, declarando depois de lho ter lido e explicado, apresentando a segunda, como intérprete da sua escolha, por não compreender a língua portuguesa, e falar a língua francesa, Rui ……, casado, residente na Rua ……, lote …, na cidade, freguesia e concelho de ……, o qual transmitiu à interveniente, verbalmente, a tradução do contrato e a mim, solicitador, a declaração de conformidade da vontade da mesma, que estão perfeitamente inteirados do seu conteúdo e que o mesmo exprime a sua vontade e já o assinaram, não o assinando, porém, o outorgante Silvino, por não o saber fazer, tendo-o assinado a seu rogo, Carla, abaixo identificada, rogo que o interessado confirmou neste acto. ----------------------------------------------------------------------- Pelos outorgantes foi ainda declarado que, no presente negócio jurídico, as partes não recorreram a mediação imobiliária, tendo-lhes sido feita advertência de que a omissão ou a prestação de falsas declarações sobre a intervenção de mediador imobiliário no contrato faz incorrer as partes na pena prevista para o crime de falsidade de depoimento ou declaração, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 50.º do Decreto-Lei n.º 211/2004, de 20 de Agosto. ------------------------------ Verificado nesta hora por consulta online: certidão permanente de registo predial, com o código de acesso ………, comprovativa da descrição e de todas as inscrições em vigor do prédio. -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Exibido: ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Caderneta predial rústica comprovativa dos elementos matriciais do prédio obtida via internet aos …/…/…. --------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Arquivado: Documento único de cobrança de IMT n.º 160………, no valor de … €, liquidado e pago em …/…/…; ---------------------------------------------------------------------------------------------------- Documento comprovativo de liquidação do Imposto do Selo da verba 1.1 da Tabela Geral, com o número 163………, no valor de … €, liquidado e pago em …/…/…. --------------------------------- O presente termo de autenticação foi lido às … horas e … minutos e explicado o seu conteúdo aos outorgantes, apresentando a segunda outorgante, como intérprete da sua escolha, por não compreender a língua portuguesa, e falar a língua francesa, Rui, casado, residente na ……, lote …, na cidade, freguesia e concelho de …… cuja identidade verifiquei por exibição do Bilhete de Identidade …… emitido aos …/…/… pelo S.I.C. de Lisboa, o qual prestou perante mim, solicitador, o compromisso de honra de bem desempenhar as suas funções e transmitiu à interveniente, verbalmente, a tradução deste termo e a mim, solicitador, a declaração de conformidade da vontade da mesma, termo que vão assinar na minha presença, não assinando o outorgante Silvino por me ter declarado não saber assinar, assinando, a seu rogo, Carla, casada, natural da freguesia de ……, concelho de ……, residente na Rua ………, n.º …, no lugar e freguesia de ……, concelho de ……, cuja identidade verifiquei por exibição do Cartão de Cidadão ……… válido até …/…/…, sendo de seguida feito o depósito electrónico obrigatório em www.predialonline.mj.pt. ---------------------- Assinaturas: ---------------------------------------------------------------------------------------------------------- Os Outorgantes: ---------------------------------------------------------------------------------------------------- O Solicitador ---------- Recibo n.º

3.ª HIPÓTESE (inclui advertência de anulabilidade, sub-rogação de direitos de herança e bem adquirido no próprio dia e corresponde à autenticação da minuta de divisão apresentada no módulo anterior): TERMO DE AUTENTICAÇÃO ---------- No dia … de …… de …, no meu escritório, na Rua ……, n.º …, na vila e freguesia de ……, concelho de ……, perante mim, ……, Solicitador, com cédula profissional n.º …, compareceram: --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

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---------- PRIMEIRO: ISABEL e cônjuge JOSÉ, casados sob o regime da comunhão de adquiridos, ambos naturais da freguesia de ……, concelho de ……, residentes na Estrada ……, n.º …, no lugar e freguesia de ……, concelho de ……, titulares dos NIFs ……… e ………. ----------------------------- SEGUNDO: LEONOR, viúva, natural da referida freguesia de ……, residente na Rua ……, n.º …, no mesmo lugar de ……, titular do Nif: ………. -------------------------------------------------------- TERCEIRO: NÉLIO e cônjuge GRAÇA, casados sob o regime da comunhão de adquiridos, ele natural da dita freguesia de …… e ela da freguesia de ……, concelho de ……, residentes na Rua ……, n.º …, no citado lugar de ……, titulares dos Nifs: ……… e ………. ------------------------------ QUARTO: IDÁLIO e cônjuge ÂNGELA, casados sob o regime da comunhão de adquiridos, naturais ele da freguesia e concelho de …… e ela da freguesia e concelho de ……, residentes na Rua ……, n.º …, no aludido lugar de ……, titulares dos Nifs ……… e ………. ---------------------------- Verifiquei a identidade dos outorgantes pela exibição, respectivamente, dos Bilhetes de Identidade: …… emitido aos …/…/…, …… emitido aos …/…/…, ambos do S.I.C. de Lisboa, …… emitido aos …/…/…, pelo S.I.C. de Leiria, …… emitido aos …/…/… e …… emitido aos …/…/…, ambos pelo S.I.C. de Lisboa, do Cartão de Cidadão …… válido até …/…/…, emitido pela República Portuguesa e pelo Bilhete de Identidade …… emitido aos …/…/…, pelo S.I.C. de Lisboa. --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Os outorgantes apresentaram, para autenticação, o documento em anexo que é um contrato de divisão, tendo declarado que já o leram e o assinaram, e que o conteúdo do mesmo exprime a sua vontade. --------------------------------------------------------------------------------------------------------- Os direitos da primeira outorgante sobre o prédio objecto de divisão vieram à sua posse por contrato de doação autenticado por mim, previamente a este, nesta mesma data e escritório. --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Adverti os outorgantes de que o acto é anulável por infracção às leis vigentes sobre fraccionamento. ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Verificado nesta hora por consulta online: certidão permanente de registo predial, com o código de acesso …………, comprovativa da descrição e de todas as inscrições em vigor sobre o prédio. ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Exibido: Duas cadernetas prediais rústicas, comprovativas dos elementos matriciais do prédio obtidas via Internet aos …/…/…. -------------------------------------------------------------------------------------- Certidão do Procedimento Simplificado de Habilitação de Herdeiros e Registos n.º ……, passada aos …/…/… pela Conservatória do Registo Civil de ……. -------------------------------------------- O presente termo de autenticação foi lido às … horas e … minutos e explicado o seu conteúdo aos outorgantes que vão assinar na minha presença, sendo de seguida feito o depósito electrónico obrigatório em www.predialonline.mj.pt. ------------------------------------------------------------------ Assinaturas: ---------------------------------------------------------------------------------------------------------- Os Outorgantes: ----------------------------------------------------------------------------------------------------- O Solicitador ---------- Recibo n.º

LEGISLAÇÃO Para além de legislação avulsa diversa, deverá ter-se especial atenção a: – Código Civil, especialmente artigos 362.º a 377.º; – Código do Notariado; – Decreto-Lei 116/2008, de 4/7; – Código do Registo Predial.

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MÓDULO 11 DPA: O DEPÓSITO Após autenticado o documento, tem este de ser depositado online, bem como todos os documentos que o instruam que não constem de arquivo público. Tal depósito é condição da validade da autenticação do documento, conforme refere o n.º 2 do art.º 24.º do Decreto-Lei 116/2008. De notar que o n.º 5 do mesmo art.º 24.º do referido Decreto-Lei estatui que a consulta electrónica dos documentos depositados electronicamente substitui para todos os efeitos a apresentação, perante qualquer entidade pública, ou privada, do documento em suporte de papel. De acordo, ainda, com o n.º 3 do referido art. 24.º foi publicada, posteriormente, a Portaria 1535/2008 que regulamenta “requisitos e condições de utilização da plataforma electrónica para o depósito de documentos particulares autenticados, que titulem actos sujeitos a registo predial e dos documentos que os instruam”. O depósito electrónico dos documentos particulares autenticados pode ser efectuado no momento do pedido online de actos de registo predial, através do sitio www.predialonline.mj.pt, podendo também sê-lo feito separadamente. O depósito deve ser efectuado na data da realização da autenticação do documento particular (art.º 7.º, n.º 1 da Portaria 1535/2008). Se, em virtude de dificuldades de carácter técnico, relativos ao funcionamento da plataforma electrónica, não for possível realizar o depósito, terá este facto de ser expressamente mencionado em documento instrutório a submeter, onde se indique o motivo da impossibilidade, a data e a hora do facto e a identificação da entidade autenticadora. Neste caso, e só neste caso, poderá o depósito ser efectuado nas 48 horas seguintes (n.º 2 do referido art.º 7.º). Os ficheiros com os documentos a submeter a depósito devem adoptar os formatos pdf, jpeg ou tiff e a sua dimensão não poderá exceder 5 MB. Para proceder ao depósito, deverá o Solicitador autenticar-se, previamente, mediante certificado digital que comprove a qualidade profissional do utilizador (art.º 13.º, n.º 1 da mesma Portaria). O depósito do DPA, incluindo os documentos que o instruam, ou de consentimento de credor ao cancelamento de registo de hipoteca, tem o custo de 20,00 €, considerando-se como não feito caso não seja pago nos 5 dias posteriores à submissão (art.º 21.º, n.º 18 do Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado, alterado pelo art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 209/2012). Caso se esteja a depositar documentos a associar a DPA previamente depositado, o custo deste depósito é de 15,00 € (art.º 21.º, n.º 18.3 do referido Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado). O código de acesso ao DPA é válido por 6 meses, após o que tem o custo de 5,00 €, se o pedido de renovação do código for feito através do site www.predialonline.mj.pt. Por cada depósito é disponibilizado um documento comprovativo, com menção da entidade autenticadora, da data e hora da submissão, dos documentos depositados e, só após efectuado o pagamento, é disponibilizado o código de identificação atribuído ao documento. Este código é enviado por correio electrónico e, sempre que possível, por sms, à entidade que procedeu ao depósito (art.º 12.º da Portaria 1535/2008). Adiante, mais detalhadamente, se referirá, mas não deixaremos de fazê-lo já aqui: os ­originais­ dos documentos autenticados depositados deverão ser arquivados pelas próprias entidades autenticadoras. LEGISLAÇÃO Para além de legislação avulsa diversa, deverá ter-se especial atenção a: – Decreto-Lei 116/2008, de 4/7, especialmente seus art.º 22.º a 26.º; – Portaria 1535/2008, de 30/12; – Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado, especialmente art.º 21.º, n.º 18 e 19. Obs: Via internet, na área restrita da página da Câmara dos Solicitadores, será fornecido anexo contendo simulação de depósito online na plataforma www.predialonline.mj.pt. Esperamos que, estudando a simulação, passe o formando a fazer facilmente qualquer depósito online.

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MÓDULO 12 DPA: O REGISTO Nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 8.º-B do CRP, as entidades que autentiquem os documentos particulares ou reconheçam as assinaturas nele apostas, ficam obrigadas a promover o registo dos factos a ele sujeito. Esse registo deve, em regra, ser promovido no prazo de dez dias a contar da titulação dos factos (n.º 6 do art.º 8.º-C do CRP) ou no prazo de trinta dias a contar do pagamento das obrigações fiscais quando este deva ocorrer depois da titulação (n.º 1 do art.º 8.º-C). Nos termos do art.º 8.º-D do mesmo código, as entidades que não cumprirem atempadamente a obrigação de registar, devem entregar o emolumento em dobro, cujo agravamento sobre elas recai. Obrigado que está ao registo, o Solicitador poderá fazê-lo nos termos do art.º 41.º-B e seguintes do CRP, presencialmente, por via postal, por via imediata, por telecópia e por via electrónica. A Portaria 621/2008 veio regulamentar alguns aspectos do registo, nomeadamente os elementos que devem constar do pedido de registo predial, a realização do registo predial por telecópia e a publicação de notificações e editais e decisões em sitio da internet, no âmbito dos processos de justificação e de rectificação. Deixando estas questões para abordagem do Código do Registo Predial, por aqui não terem, directamente, lugar, vamos, neste módulo, referir-nos à promoção de actos de registo predial online. Tal promoção encontra-se regulamentada na Portaria 1535/2008, nos seus art.º 18.º e seguintes. REGISTO PREDIAL ONLINE O pedido é formulado através do endereço www.predialonline.mj.pt, enviando-se através dele os documentos necessários ao registo, designadamente aqueles que comprovem os factos constantes do pedido de registo e aqueles que comprovem a capacidade e os poderes de representação para o acto, salvo se essa verificação resultar, de forma expressa e inequívoca, do título que serve de base ao pedido de registo [art.º 18.º, n.º 1, alíneas a) e b) da Portaria 1535/2008]. Todos os documentos entregues através do site referido têm o mesmo valor probatório dos originais desde que correctamente digitalizados, integralmente apreensíveis e enviados por quem tenha competência para tal (n.º 3 do referido art.º 18.º). O Solicitador fica obrigado a arquivar os respectivos originais (art.º 19.º, n.º 1). A autenticação electrónica dos utilizadores é feita mediante a utilização de certificado digital qualificado. O pedido de registo predial online só é considerado validamente submetido após emissão de comprovativo electrónico pelo site mencionado que indique data e hora em que o pedido foi concluído. Este comprovativo é enviado ao interessado através de mensagem de correio electrónico (art.º 21.º). Após submissão electrónica do pedido, é gerada automaticamente uma referência para pagamento dos encargos devidos, caso este não seja efectuado de imediato através de cartão de crédito (art.º 22.º, n.º 1). O pagamento deve ser efectuado no prazo de cinco dias, após a geração da referência para pagamento, sob pena de inutilização do pedido de registo (art.º 22.º, n.º 2). Os pedidos de registo predial online são anotados no livro de diário pela ordem da respectiva recepção, ocorrendo essa apresentação com a confirmação do pagamento das quantias devidas (art.º23.º). LEGISLAÇÃO Para além de legislação avulsa diversa, deverá ter-se especial atenção a: – Código do Registo Predial; – Decreto-Lei 116/2008, de 4/7, especialmente art.º 24.º; – Portaria 1535/2008, de 30/12; – Portaria 621/2008, de 18/7. Obs: Via internet, na área restrita da página da Câmara dos Solicitadores, será fornecido anexo contendo simulação de registo online na plataforma www.predialonline.mj.pt. Estamos seguros que com esta simulação conseguirá o formando apreender a forma de proceder com facilidade ao registo online.

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MÓDULO 13 ORGANIZAÇÃO DE ESCRITÓRIO E ARQUIVO O que diremos neste capítulo, para além de um ou outro aspecto, não passará de uma tentativa de ajudar o formando a organizar o seu próprio escritório e arquivo e, ainda, um apoio à forma como poderá emitir os documentos em Balcão Único. Deve, pois, ser entendido como um conselho e não como uma imposição. Compete às entidades autenticadoras de documentos particulares sujeitos a registo predial arquivar os respectivos originais, após efectuado o depósito electrónico, de acordo com o referido no n.º 6 do art. 24.º do Decreto-Lei 116/2008, ao mesmo obrigando o art. 8.º da Portaria n.º 1535/2008, que prevê, ainda, que a Câmara dos Solicitadores (para além de outras entidades) possa criar sistemas de arquivo centralizados, por ela mantidos ou por entidades terceiras contratadas para o efeito, para os quais podem ser transferidos os originais dos documentos depositados, devendo informar o IRN, I. P., por meios electrónicos, de quais os Solicitadores que utilizam este sistema. Por sua vez, o Regulamento do Balcão Único do Solicitador obriga os registados em regime de balcão único a, entre outras condições, terem escritório que assegure dignidade e privacidade no atendimento dos utentes, com horário afixado e estrutura de arquivo [art. 31.º, alíneas a) e b)]. Conclui-se assim que, para cumprir estas condições, deveremos ter no nosso escritório uma sala destinada à leitura (que nada proíbe que seja o gabinete onde atendemos habitualmente os clientes, se não pudermos dispor de outra) e um espaço para arquivo, que poderá funcionar na mesma sala de leitura, desde que devidamente recatado, de forma a afastar a possibilidade de manuseamento por parte de elementos estranhos ao escritório. Dito isto, podem ainda surgir as seguintes questões: Como organizar os meus documentos particulares autenticados, como devo numerá-los, como arquivá-los correctamente? Para resolver estes problemas, são hoje postas em prática duas soluções diferentes: – Entendem alguns colegas dever fazê-lo como procede o Notário, com as escrituras, por outras palavras, arquivando o DPA por livros; – Entendem alguns colegas dever fazê-lo como procede o Notário, com os instrumentos notariais, por outras palavras, arquivando o DPA por Maços ou Pastas; A primeira apresenta o inconveniente de, sendo o documento particular apresentado pelas partes (embora habitualmente por nós elaborado), não fazer muito sentido iniciar a numeração por um número superior a 1, o que fatalmente aconteceria a partir do segundo DPA de cada livro. A segunda parece-nos mais aconselhável pela razão inversa à anterior: arquivando por maços constituídos por pastas de arquivo, cada documento tem a sua própria numeração, sempre iniciada na folha 1. É sobre essa segunda hipótese que nos vamos debruçar por ser aquela que nos parece mais correcta (respeitando a opção da organização por livros de alguns colegas). Assim, é aconselhável utilizar pastas de material resistente e, de preDOCUMENTO ferência, de cor diferente das restantes, para melhor se poderem distinguir PARTICULAR dentro do escritório. AUTENTICADO A numeração das Pastas (maços) deverá ser anual, podendo ser abertas diversas. Exemplo: P001/11 será o Maço ou Pasta n.º 1 do ano de 2011. PASTA P001/11 O ano de 2012 iniciar-se-á com a P001/12 e assim sucessivamente. Na lombada de cada pasta constará ainda, para total facilidade de consulta, o número dos documentos nela arquivados, conforme sugestão na Doc n.º a imagem ao lado. Doc n.º Dentro de cada uma das pastas, para menor dispersão, aconselhamos que seja arquivado o documento autenticado conjuntamente com os Solicitador restantes documentos que o instruem e que têm, obrigatoriamente, de JOÃO SILVESTRE

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ficar arquivados. Para o efeito, dever-se-á usar uma “micra” ou outro recipiente que seja prático (no fundo, uma subpasta para cada DPA). Aconselhável será, também, inserir, como capa de cada um dos documentos, uma folha a indicar o respectivo número, o tipo de acto, a data, o número de processo de depósito e respectivo PIN, a chave de acesso ao depósito, o nome dos intervenientes, bem como os documentos arquivados. Cada solicitador poderá, ainda, mencionar quaisquer outras indicações que considere convenientes. O DPA terá, obviamente, uma numeração, que deverá ser simples e, em tudo, semelhante à indicada para os Maços. Exemplo: D014/11 será o décimo quarto documento particular autenticado no ano de 2011; D001/12 será o primeiro autenticado no ano de 2012. Se tivermos dois escritórios, poderemos utilizar, para cada um, a sua inicial. Exemplo: A001/11 é o primeiro documento autenticado no ano de 2011 no escritório de Amiais; P004/11 é o quarto documento autenticado no ano de 2011 no escritório do Porto. Este parece-nos um modo de arquivo fácil e eficiente, sendo a consulta muito rápida e acessível, já que, sem mais buscas, consultamos o DPA e todos os documentos que ficaram arquivados. Resolvido o problema do arquivo, debrucemo-nos agora sobre a impressão do próprio documento particular autenticado: Pode ser utilizado papel previamente timbrado, no canto superior direito, como a imagem reproduzida ao lado, ou utilizando um pequeno carimbo com a mesma imagem, para definir a folha, o número do docuJoão Silvestre mento e o maço ou pasta onde fica arquivado. Pode o carimbo, tamSolicitador bém, ser aposto folha a folha, no próprio momento da impressão do Doc. documento particular. Será, no entanto, sempre necessário utilizar o carimbo para os casos Fls. (embora pouco habituais) em que as partes nos apresentem um documenPasta to particular por elas elaborado em papel próprio, sob pena de, nesse caso, produzirmos um conjunto diferente daquele que normalmente utilizamos. A numeração das folhas é, aqui, feita em função do próprio documento, na frente de cada uma delas, servindo para o delimitar e não permitir a introdução de quaisquer outras folhas, não tendo, neste caso, a função de definir a sua situação no arquivo, o que, como ficou dito, é feito pela numeração do documento e do próprio maço. Inútil será acrescentar que, para buscas futuras, é de toda a importância fazer e manter actualizado um ficheiro de todos os documentos em suporte informático (eventualmente também em papel). Resta-nos lembrar a todos que, nos documentos particulares autenticados, não é necessário o registo no ROAS, de acordo com n.º 2 do art. 6.º da Portaria n.º 1535/2008. A prática habitual, por parte de alguns colegas, de proceder, neste caso, ao registo no ROAS não passa de uma duplicação absolutamente inútil já que se estão a registar apenas alguns dados da totalidade de um documento já depositado. No entanto, não deve ser esquecida a utilização do selo de autenticação e do carimbo ou do selo branco, para aqueles que o possuam. Uma questão final que não é pacífica: sendo o DPA um documento com a força probatória da escritura e, no essencial, a ela semelhante, aconselhamos que, previamente, seja formatado o texto de modo a que cada folha tenha exactamente vinte e cinco linhas. Parecem óbvias as vantagens: maior semelhança com a escritura, título que as pessoas estão habituadas a manusear e, portanto, maior credibilidade para o DPA; maior segurança e afastamento da hipótese de introdução posterior de qualquer outro texto em novas linhas. E, sobretudo, pela razão de que não faz sentido traçar todos os espaços em branco, enquanto se deixa a possibilidade de introduzir novas linhas.

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MÓDULO 14 DPA: O MODELO 11 Refere o n.º 3 do art.º 23 do Decreto-Lei 116/2008 que todas as disposições legais, regulamentares ou outras, que imponham obrigações de verificação, comunicação ou participação relacionadas com a prática dos actos que pressuponham ou exijam celebração de escritura pública ou a autenticação de documento particular sobre coisas imóveis, devem ser entendidas como sendo impostas a todas as entidades com competência para autenticar documentos particulares. Todavia, de acordo com o n.º 4.º do art.º 24.º do mesmo diploma legal, se o registo do acto for pedido por via electrónica, é dispensada a obrigação de participação desse acto às entidades públicas, devendo estas participações ser promovidas pelos Serviços de Registo. Vamos agora verificar como proceder então com algumas questões fiscais, às quais se aplica o referido na Portaria 975/2004: Impõe o art.º 49.º, n.º 4 do CIMT que, quando seja devido IMT, as entidades e profissionais com competência para autenticar documentos particulares que titulem actos ou contratos sujeitos a registo predial, devem submeter até ao dia 15 de cada mês, à Direcção Geral dos Impostos (actualmente Autoridade Tributária e Aduaneira), em suporte electrónico, entre outros, uma relação dos actos ou contratos sujeitos a IMT ou dele isentos, efectuados no mês antecedente. O mesmo preceitua o n.º 1 do art.º 186.º do CN. De igual modo, o n.º 1 do art.º 63.º do CIS, aplica às transmissões gratuitas, com as necessárias adaptações, o atrás referido no CIMT. Finalmente, o art.º 123.º do CIRS, obriga os profissionais que titulem actos ou contratos sujeitos a registo predial, a enviar à Direcção Geral dos Impostos (Autoridade Tributária e Aduaneira), relação dos actos por si praticados, no mês anterior, que sejam susceptíveis de produzir rendimentos sujeitos a IRS, sendo que, neste caso, está o Solicitador a obrigado a fazê-lo até ao dia 10 de cada mês. Posto isto, deveremos estar muito atentos para não cair em incumprimento. Vejamos: ­– Enquanto autenticarmos documentos e procedermos, para todos eles, ao registo electrónico, estamos desobrigados pelo referido no n.º 4 do mencionado art.º 24.º a efectuar essa participação, a declaração modelo 11, já que ao Conservador compete fazê-lo. ­– Pode, no entanto, acontecer: a) Autenticarmos um contrato de que não requeremos o registo predial, por a ele não estar obrigado, estando, no entanto, sujeito a IMT (por exemplo promessa de aquisição e de alienação, logo que verificada a tradição para o promitente adquirente ou contrato promessa de aquisição com a cláusula de cedência de posição contratual a terceiro); b) Autenticarmos um documento particular sujeito a registo predial, mas, por qualquer razão, fazermos o pedido de registo por outra via que não a electrónica. Nos casos acima referidos em a) e b), passaremos, obviamente, a, no mês seguinte, ter de preencher e enviar o modelo 11. Admitamos que, nesse mês, autenticámos quatro Documentos Particulares. Desses quatro, pedimos o registo, por via electrónica, de três, tendo apresentado o restante numa Conservatória, por outro qualquer modo que não a via electrónica. Teremos, então, forçosamente de enviar o modelo 11 desse contrato. Só desse contrato? Quanto a nós, deveremos enviar o modelo 11 de todos os contratos autenticados no mês anterior e não apenas daquele, já que, ao indicarmos apenas um, poderemos ser acusados de falsas declarações por dizermos que autenticámos um documento quando, efectivamente, autenticámos quatro.

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Acontece, ainda, que é entendimento da Autoridade Tributária e Aduaneira, que, enviado num mês o modelo 11, terão as entidades autenticadoras que enviá-lo todos os meses, independentemente de praticarem actos ou não: praticando alguns, deverão, obviamente, inseri-los no modelo 11; não praticando nenhum, deverão preencher vazia a declaração modelo 11. Deve concluir-se, assim, que, após o primeiro acto ou contrato, cujo pedido de registo não seja feito via electrónica, fica o Solicitador obrigado, todos os meses, a preencher e enviar o modelo 11, independentemente de autenticar ou não contratos e de pedir o seu registo ou não electronicamente. Quanto ao envio, em princípio, deverá este ser feito até ao dia 15 do mês seguinte. No entanto, convém verificar se algum dos actos é susceptível de produzir rendimentos sujeitos a IRS, caso em que terá de ser enviado até ao dia 10 de cada mês. Aconselhável será, para evitar qualquer deslize ou errónea interpretação, enviar, até ao dia 10 de cada mês, o modelo 11.

LEGISLAÇÃO Para além de legislação avulsa diversa, deverá ter-se especial atenção a: – Código do Notariado, especialmente art.º 186.º; – Código do Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis; – Código do Imposto de Selo; – Código do Imposto sobre os Rendimentos das Pessoas Singulares; – Decreto-Lei 116/2008, de 4/7, especialmente art.º 23.º e 24.º; – Portaria 975/2004, de 3/8.

Obs: Via internet, na área restrita da página da Câmara dos Solicitadores, será fornecido anexo contendo simulações de preenchimento de modelo 11 na plataforma www.portaldasfinanças.gov.pt ou através de ficheiro submetido na mesma plataforma. Estamos seguros que com esta simulação conseguirá o formando apreender a forma de proceder com facilidade ao preenchimento da declaração modelo 11, quer em HTML, quer em ficheiro XML.

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AGRADECIMENTOS FINAIS Para além de apoios e ideias que nos foram dados por colegas e outras entidades, queremos agradecer, muito especialmente: – Ao responsável directo nacional da Formação, colega Fernando Rodrigues, por ter lançado a um de nós, o Carlos José Matos, o repto de coligir um manual e powerpoints que pudessem servir para uma formação ministrada num curso elementar, podendo, ainda, ser aproveitados em sessões menores, focando apenas alguns dos conteúdos da matéria. – Aos colegas Aventino de Lima e Luís Rua Teixeira, o estudo profundo que fizeram sobre todas as matérias aqui abordadas. O presente manual muito fica a dever aos trabalhos que apresentaram. Ao Luís agradecemos, ainda, a disponibilização das oito imagens sobre submissão do modelo 11, via ficheiro XML. – Ao “Factor H” e Dr. Artur Ferraz que, ao longo do curso de formação pedagógica de formadores, em tão pouco tempo, mas com tanta eficiência, nos forneceram as informações e os conhecimentos necessários à concretização deste projecto. Os Autores

O artigo não está escrito segundo o novo acordo ortográfico.

Bibliografia CARREIRA, Idalina. A Afirmação de uma Identidade, Revista Sollicitare, Edição n.º 9, 2011 FERREIRINHA, Fernando Neto e Zulmira Neto Lino da Silva, A Função Notarial dos Advogados, 2.ª Edição, 2010, Almedina LIMA, Aventino de. Escritura versus Documento Particular Autenticado, edição para formação em PowerPoint, 2009 MATOS, Timóteo de. Balcão único: o Futuro nas nossas mãos, Comunicação ao V Congresso Nacional dos Solicitadores, Outubro de 2011 OLIVEIRA, José Manuel. A formação na Câmara dos Solicitadores, Comunicação ao V Congresso Nacional dos Solicitadores, Outubro de 2011 PACHECO, José. Autenticidade e forma legal dos actos jurídicos extrajudiciais, 2009, Coimbra Editora RODRIGUES, Fernando. Reflexões sobre as primeiras jornadas culturais dos Solicitadores, in Boletim Informativo CRNorte, edição 19, Outubro de 2009.

TEIXEIRA, Luís Rua. Formação: Escritura versus Documento Particular Autenticado, edição para formação em PowerPoint, 2011 TEIXEIRA, Paulo. Balcão Único do Solicitador, in Boletim Informativo CRNorte, edição 34, Março de 2011.

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Ao longo do tempo, muitos trabalhos têm vindo a ser desenvolvidos no âmbito das mais diversas áreas de estudo associadas à solicitadoria e à ação executiva. Assim sendo, pretendendo-se conservar esses contributos intelectuais e ambicionando-se que também as gerações vindouras venham a conhecê-los, considerou-se que a melhor alternativa para alcançar tais objetivos seria compilar os mesmos numa edição anual.

CÂMARA DOS SOLICITADORES Av. José Malhoa, n.º 16 – 1B2 - Edifício Europa 1070-159 Lisboa Telefone 213 172 063 Fax 213 534 870 E-mail: c.geral@solicitador.net www.solicitador.net


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