10 minute read
Leituras
Débora Oliveira Ferreira
Solicitadora
Advertisement
O QUE DIZ MOLERO de Dinis Machado
Com uma linguagem coloquial, acessível e bem-humorada, esta obra conta a história de um rapaz, cujo nome nunca é referido, com uma infância particularmente estranha, que enceta uma viagem com o propósito único de compreender quem é e qual o sentido da vida. De diálogo em diálogo, e através da leitura do relatório do detetive Molero, vai-se conhecendo a vida de um rapaz de origem humilde, as suas aventuras, as viagens, as mulheres, os amores, os encontros e reencontros. Assim, através de uma viagem emocional, centrada no que dizem duas personagens – Deluxe e Austin – sobre o “enigma” do rapaz, vão sendo oferecidas pistas ao leitor que ajudam a traçar a personalidade de alguém que procura incessantemente um sentido para a existência.
VENENOS DE DEUS, REMÉDIOS DO DIABO de Mia Couto
Este aclamado escritor moçambicano, entre mistérios e ilusões, entre o divino, o fantástico e o profano, dá-nos a conhecer a pacata Vila Cacimba, comunidade assolada por um estranho surto que aterroriza os habitantes da aldeia, habituados a atribuir tais infortúnios a causas sobrenaturais. Sidonho – o jovem médico Sidónio Rosa –, chega a Vila Cacimba em busca de Deolinda, a jovem que conheceu em Lisboa e por quem se perdeu de amores. É em Vila Cacimba, aldeia onde os pais da amada residem, que se hospeda e aguarda o seu regresso. A peculiar narrativa desvenda os segredos, as histórias e os mistérios sombrios nunca revelados de Vila Cacimba e dos seus habitantes, de entre eles: Bartolomeu Sozinho, Munda (a sua esposa), a ausente Deolinda (filha do casal), o corrupto Alfredo Suacelência e de Dona Esposinha.
São muitos os produtos que fazem já parte da tradição portuguesa. São produtos que cruzam gerações e que se distinguem pela qualidade de excelência. Neste espaço, desvendamos todos os segredos dos produtos com história, desde as suas origens até ao seu processo de fabrico.
Do mar para a lata: uma epopeia de sabores
História, autenticidade, cor, originalidade, paixão e sabor… muito sabor. Estes são alguns dos elementos que fazem parte do ADN da Comur, as Conservas da Murtosa. Uma marca que nos traz o melhor do mar português com deliciosas iguarias que fazem crescer água na boca. Nasceu em Aveiro, há já 8 décadas, e é hoje uma das maiores bandeiras da indústria conserveira do nosso país. Porque são muito mais do que simples latas, damos-lhe a conhecer o segredo destes saberes e sabores verdadeiramente portugueses.
REPORTAGEM DINA TEIXEIRA / FOTOGRAFIA COMUR
Chegam diariamente de bicicleta à fábrica, como faziam as suas mães e avós noutros tempos. São cerca de 100 as mulheres da Murtosa e muitas delas pertencem à mesma família. “São só mulheres porque, como o trabalho é manual, consideramos que as mulheres têm uma maior sensibilidade para garantir que o peixe é tratado com a devida delicadeza”, revela-nos Sónia Felgueiras, Diretora de Marketing da Comur. E é pelas suas experientes mãos que todos os dias se escreve a história desta marca. “As trabalhadoras da fábrica chegam muito cedo. Toda a grande atividade da produção de conservas acontece de manhã. Umas começam a tratar do peixe, outras dos ingredientes que serão usados para temperá-lo e há ainda as que ficam responsáveis pela máquina de vapor para proceder à cozedura do peixe. Elas trabalham de forma bastante coordenada, o que permite assegurar a fluidez na produção”, acrescenta.
Conservas de peixes há muitas. São cerca de 30. Os sabores seculares que se reúnem nas suas latas oferecem-nos a mais pura forma de sentir o mar português. Enguias, robalo, linguado, atum, mexilhões, trutas, corvina, anchovas, lulas, polvo, salmão, bacalhau, sardinha, etc. Há peixe para todos os paladares e a sua qualidade é inegável. Não há quaisquer aditivos ou conservantes. São produtos preparados ainda frescos, que primam pela riqueza nutricional. Os seus bene cios para a saúde são múltiplos. “Fazemos questão de ter fornecedores fixos que nos garantem sempre a qualidade dos produtos”, assegura a responsável de Marketing.
Agora que já sabe os produtos que a Comur tem para lhe oferecer, falta conhecer também as suas receitas. “Temos as enguias em molho de escabeche, as enguias fumadas, as lulas em caldeirada, o salmão fumado, as sardinhas cozidas ao vapor e, do pack de quatro receitas alusivas aos Santos Populares, as sardinhas com tomate, as sardinhas alimadas, as sardinhas com pimentos e as sardinhas fumadas picantes”, refere Sónia Felgueiras. Nesta variedade de aromas e sabores, temos de destacar o peixe fumado em conserva: uma receita única e exclusiva desta conserveira, preparada com lenha cuidadosamente selecionada. As enguias fumadas ou salmão fumado são já um best-seller. “Temos também duas opções vegetarianas: bolinhas de aveia com legumes e pataniscas de grão”, complementa, salientando ainda: “Tentamos ter uma grande variedade de peixe e, sempre que possível, inovar naquilo que oferecemos”.
SÓNIA FELGUEIRAS
Mas como é que se fazem as famosas enguias em molho de escabeche? É a questão que se impõe. Ou não fosse esta a especialidade de conservas mais antiga da Comur e uma das favoritas dos consumidores. A Diretora de Marketing responde: “As enguias chegam à fábrica e começam a ser preparadas num balcão. Todo o trabalho é manual, à exceção da última fase de crivagem. A primeira tarefa é mesmo cortar a cabeça e tirar as vísceras. Numa etapa seguinte, as enguias são colocadas num espeto e vão a fritar. Depois de fritas, são postas nas latas, devidamente esterilizadas, e regadas com o molho de escabeche que é um molho avinagrado, típico da região da Murtosa. De seguida, essas latas vão à crivagem - são fechadas hermeticamente de forma a garantir a sua máxima durabilidade – e depois para um tanque onde é feita a sua lavagem. Por fim, são arrumadas em caixas e seguem, primeiro, para o armazém e, posteriormente, para as lojas”. Se dúvidas houvesse, ficaram esclarecidas. Mas ainda assim, relativamente ao método de produção, clarifica: “Depende sempre do peixe e da forma como este vai ser cozinhado, mas regra geral são processos relativamente simples”.
A tradicional receita de enguias em molho de escabeche marca o início da fábrica de conservas da Murtosa. À conversa com Sónia Felgueiras, recuamos até 1942 para conhecer mais sobre essas origens. “A Comur, pela sua grande proximidade com a ria de Aveiro, sempre teve um grande excedente de enguias. Naquela altura, enquanto os homens iam à pesca, as mulheres aproveitavam para fritar as enguias com o molho de escabeche e vendiam-nas em feiras da região, sobretudo na Feira de São Mateus que era o grande ponto de escoamento das enguias da Murtosa.” Conta-nos que a indústria conserveira portuguesa floresceu muito durante a 2.ª Guerra Mundial e a Comur também. Eram enviadas muitas conservas para as tropas, principalmente para as italianas, porque era um produto prático, fácil de transportar, pronto a comer e saudável. “Nessa altura, havia cerca de 400 conserveiras em Portugal e hoje são menos de 20. Começaram a entrar numa discussão de preço de prateleira de supermercado e, consequentemente, acabaram por desvalorizar o seu produto, o que levou ao encerramento de muitas destas conserveiras”, contextualiza. A fábrica da Murtosa acabou também por ficar numa situação de decadência financeira grave, tendo sido, em 2015, adquirida e recuperada pelo grupo «O Valor do Tempo». Este grupo detém 15 marcas em setores de atividade completamente distintos (por exemplo: o café «A Brasileira» do Chiado, a «Joalharia do Carmo», a «Casa Portuguesa do Pastel de Bacalhau», o «Museu da Cerveja»; o «Figurado de Barcelos», entre outros), mas que partilham de um denominador comum: enaltecer tesouros portugueses que pudessem não estar a ter o merecido palco e dar-lhes espaço para brilhar. “Aquilo que quisemos fazer foi valorizar e engrandecer as conservas portuguesas. Começámos por abordar o retalho, tentando explicar que, com todo o trabalho do pescador, das mulheres da fábrica, de embalamento e de logística, uma conserva nunca poderia ser valorizada sendo vendida a 0,80 cêntimos. Contudo, não fomos ouvidos”, admite.
Os desafios foram numerosos, mas a solução não tardou em aparecer. “Criámos a resolução pelos nossos próprios meios. Decidimos abrir as nossas lojas e criar nelas um ambiente que nos permitisse contar a história da indústria conserveira e das mulheres da Murtosa, valorizando o seu trabalho, e proporcionar, simultaneamente, uma experiência de consumo única, deixando as pessoas felizes, confortáveis e aptas a querer saber mais sobre a nossa marca”, assume a Diretora. Tudo se resume à experiência. E para garantir que essa experiência se concre-
tiza, a Comur concentra toda a produção nas suas lojas: “Nós fabricamos cerca de 2 milhões de latas por ano e exclusivamente para as nossas lojas”. Além disso, todo o staff tem formação, não só de produto e de processo de fabrico, como também da história da marca para que possam enaltecê-la junto dos clientes. “Temos 20 lojas, entre o conceito «Comur» e o conceito «O Mundo Fantástico da Sardinha Portuguesa», e todas elas acabam por provar que afinal a nossa fórmula, no que se refere à valorização das conservas, estava correta”, ressalva.
Decerto estará a questionar-se sobre o paradeiro destas lojas. É simples. Basta deslocar-se até aos centros históricos destas cidades: Lisboa, Cascais, Sintra, Óbidos, Coimbra, Aveiro, Porto, Braga, Évora, Faro, Funchal e Ponta Delgada. De norte a sul do país, passando pelas ilhas, será convidado a entrar num verdadeiro espetáculo dos sentidos. Um mundo de luz, cor, música e muita fantasia, onde todos os dias se celebra a alma portuguesa. E onde não falta originalidade. As latas litografadas com belas e harmoniosas ilustrações conquistam os olhares de todos. Os seus rótulos festivos e coloridos recuperam e enobrecem o passado feliz da indústria conserveira portuguesa. Retomar esta tradição foi o propósito da Comur: “Quisemos trazer, de novo, um colorido para os rótulos das latas de conservas e, se possível, contar nelas uma história”. «Mar Português», «Cidades», «Ouro português» e «Sardinha – o prodígio do atlântico» são algumas das coleções que nos contam histórias. “Tentamos sempre adicionar conteúdo relevante ao nosso produto, trazendo alguma história de Portugal, mas de uma forma positiva e animada.” Nunca há episódios tristes. Na coleção dos anos, por exemplo, em que se assinala uma efeméride e o nascimento de personalidades relevantes, desde 1916 até à atualidade, nunca se marca o início de uma guerra ou da pandemia. O que existe, é sim, o fim da guerra ou a descoberta da vacina para a COVID-19. “A forma como fazemos chegar o produto ao consumidor,
SÓNIA FELGUEIRAS
dando-lhe uma roupagem bonita e colocando-o num ambiente onde os clientes se vão sentir felizes, é aquilo que realmente mais nos distingue”, sublinha.
E se acha que já lhe revelámos tudo, desengane-se. Há uma curiosidade ainda por desvendar: “Muitas vezes perguntam-nos se é possível abrir a lata sem danificá-la, porque gostavam de guardá-la como recordação”, afirma Sónia Felgueiras. E a solução existe: “É só virar a lata ao contrário e encontramos uma linha vermelha através da qual se pode abrir a lata, recorrendo a uma faca, e extrair o peixe, deixando a parte da frente intacta”.
Com 80 anos de história, esta conserveira 100% portuguesa tem seguramente um segredo. Foi o que tentámos descobrir. “O segredo é apostar na origem, na autenticidade e na história da Comur e apresentá-la ao mundo de uma forma original, enaltecendo não só o trabalho da indústria conserveira portuguesa, mas também das mais de 100 mulheres que trabalham na fábrica e que tratam o peixe com muita delicadeza, muito brio e muita sabedoria”, realça.
Com os olhos postos no futuro, Sónia Felgueiras remata: “O nosso maior propósito não é crescer em vendas desmesuradamente. O nosso propósito é mesmo ter uma marca diferenciadora que ofereça uma experiência marcante e que fique na memória das pessoas. E é também manter o processo maioritariamente manual e o mais fiel ao original possível, porque essa é a nossa fórmula de sucesso”.
A Comur é feita de gente com alma portuguesa. Gente que faz perpetuar a essência desta marca e que mantém viva uma tradição de décadas, reavivada pelas icónicas lojas, num universo pleno de história, cor e magia que vale a pena conhecer.