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A Comunidade Chinesa em Portugal: Processo de Assimilação ou Etnicização? A cultura é um conjunto complexo de conhecimentos, arte, crenças, leis, costumes e hábitos adquiridos pelo Homem de acordo com a sociedade onde está inserido (Tylor, 1871 como referido em Correio da Manhã, 2004). Esta é ainda definida como um conjunto de práticas passado de geração em geração que permite ao indivíduo adaptar-se e adquirir especificidade. Deste modo, é possível afirmar que uma das características da cultura é o facto de esta ser transmissível (Correio da Manhã, 2004, p.3975). Pode-se assumir ainda que a cultura é global, evolutiva e partilhada. Global porque é capaz de agrupar um conjunto complexo de comportamentos, tais como o modo como se fala em determinada sociedade ou como se veste e escreve. Por outro lado, diz-se que é evolutiva porque não é estática, ou seja, não é por se encontrar um consenso que esta deixa de se desenvolver. Esse desenvolvimento passa por inovações tecnológicas até ao progresso de ideias. Por fim, esta é partilhada uma vez que não é intrínseca somente a um indivíduo, mas sim a uma comunidade (Correio da Manhã, 2004, p.3975). Cada país/comunidade apresenta a sua própria cultura, sendo que esta é influenciada por diversos factores. Por vezes, certos hábitos que são considerados “boa educação” em determinada sociedade, não o são noutras, mostrando exactamente o contrário. O facto de o ser humano possuir a capacidade de se adaptar e de aceitar certas mudanças é resultado da sua cultura e da forma como esta lhe é intrínseca. Exemplo dessas situações são os emigrantes. Quando alguém se desloca para outro país, normalmente, começa por aprender a cultura do país que o acolhe e aceita as suas diferenças. Contudo, há casos em que isso não se verifica. Assim sendo, é possível distinguir dois aspectos: Assimilação e Etnicização. O assimilacionismo não se define como sendo a aquisição total das características do país de acolhimento, mas sim a mudança de certos comportamentos e a eliminação de outros, de modo a encontrar-se um todo harmonioso entre a comunidade de acolhimento e a comunidade emigrante, por exemplo. A assimilação social torna possível uma estreita associação entre comunidades sendo que desta associação resulta uma interpretação mútua das culturas, cujo resultado final é a criação
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de uma unidade homogénea (Correio da Manhã, 2004, p.1266). Porém, há situações em que isto não se sucede, estando-se perante a etnicização, ou seja, quando uma comunidade emigrante decide viver noutro país seguindo os seus costumes e hábitos e não assimilando os do país de acolhimento, pois consideram que a sua cultura é um modelo a que tudo se deve cingir (Correio da Manhã, 2004, p.5320).
No que diz respeito à cultura portuguesa e à cultura chinesa, as diferenças são inúmeras. A diferenciação na cultura portuguesa manifesta-se em factores como: habitação, gastronomia, manifestações religiosas, música, arquitectura, calcetaria (calçada portuguesa) e o folclore. “O fado é o património musical mais famoso, que reflecte uma característica do povo português: o saudosismo.” (Cabral & Frazão, 2011, para.2) Relativamente à cultura chinesa, esta apresenta uma história de mais de três mil anos e é marcada pela serenidade e rigidez de valores estéticos. Os chineses procuram a harmonia com o universo, sendo que para o conseguirem seguem a religião (Budismo). O facto de serem tão crentes faz com que se mantenha o tradicionalismo neste povo, ligado à sua rigidez de ideais e normas, transmitido de geração em geração. Exemplo dessa rigidez de ideias é o facto de os chineses serem muito ligados à família e ao trabalho e sacrificarem o prazer pessoal em bem dos mesmos (Ning, 2012, p.56). Um outro aspecto da sua cultura é o facto de estes atribuírem muita importância às acções, aquilo que elas representam – “As pessoas não precisam de falar, mas os actos têm muitos significados, é tudo muito simbólico.” (Rodrigues, 2012 como referido em Pires, 2012). No que diz respeito à gastronomia, os chineses utilizam muitos temperos, sendo que a culinária varia muito de região para região. O que mais se destaca, ao nível da gastronomia, é o facto de estes consumirem também carne de cão, cobra e escorpião, consideradas exóticas no Ocidente. Devido a esse exotismo, muitos foram os mitos criados sobre a cozinha chinesa, levando a que muitos restaurantes fossem fechados.
Contrariamente a Portugal, a China é um país com maior incidência no que respeita à violação dos direitos humanos. A total liberdade de expressão, bem como a liberdade religiosa, ainda não foram alcançadas. Por outro lado, só recentemente é que o Governo deixou de controlar a família, na medida em que a política do filho único deixou de estar em vigor e o infanticídio, de raparigas, sobretudo, foi abolido – “na Catarina Costa
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balança demográfica do país, existe um desequilíbrio de 24 milhões a favor dos homens” (Siza, 2013, para. 3), sendo que esta situação durava há cerca de 35 anos. Esta situação levou à denúncia pela violação dos direitos humanos, por parte de vários grupos de activistas, e teve consequências relativamente à demografia: “A mudança prende-se com a quebra demográfica que levou a uma diminuição da população activa e um aumento dos idosos – em 2050 mais de 25% da população terá mais do que 65 ano” (Siza, 2013, para. 2) Apesar de grande parte da população chinesa, em tempos, ter tido o desejo de uma grande descendência, hoje em dia, o objectivo dos casais é ter dois filhos. Porém, apesar disso, este nunca foi um dos motivos da emigração por parte dos chineses, embora reconheçam que em Portugal é mais confortável ter filhos, quer sejam rapazes ou raparigas (Rodrigues, 2012 como referido em Pires, 2012). Assim sendo, é possível indagar sobre o motivo pelo qual os chines imigram para Portugal. De acordo com a antropóloga Irene Rodrigues, “Os migrantes chineses vêm com o objectivo de fazer dinheiro ou juntar dinheiro (zhuanqian). São ideias muito antigas na cultura chinesa e que têm a ver com um ideal de prosperidade e de riqueza.” Por acréscimo a este objectivo, outro dos motivos que tem feito com que os chineses abram negócios em Portugal deve-se ao facto de estes quererem alcançar a sua independência (Oliveira, 2010, p.237). Após a descolonização (74/75), chegou a Portugal a primeira vaga de imigrantes chineses, vindos das antigas colónias – Timor, Angola e Moçambique. Contudo, na década de 80, foi registada uma nova vaga migratória que poderá estar relacionada com a Reforma e Abertura do Governo Chinês. Neste caso, os imigrantes vieram directamente da China, sendo que, contrariamente aos imigrantes da primeira vaga migratória, estes desconhecem a língua portuguesa, provocando a criação de comunidades muito fechadas, que se dedicam, sobretudo, à restauração e ao comércio (Ning, 2012, p.6). Devido ao grande número de cidadãos chineses instalados em Portugal, esta onda de migrações contínua intensa. A maioria dos imigrantes instalados em Portugal tem família na China ou pessoas conhecidas, incentivando-os a virem para a Europa em busca de melhores condições e melhores salários, sendo que lhes garantem emprego, uma vez que os chineses afirmam que preferem contratar pessoas da sua etnia, visto que consideram que é mais fácil de confiar e encontram facilidade face ao idioma. Por outro lado, os chineses são das poucas pessoas que se sujeitam a longas horas de trabalho com uma baixa remuneração (Oliveira, 2010, p.234-235). Catarina Costa
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Pode-se dizer que entre os imigrantes chineses em Portugal existem dois grupos: os que vieram na década de 70, que têm um estilo de vida “tipicamente português” e que trabalham em sectores públicos, possibilitado pelo facto de antes da sua chegada a Portugal já terem passado por um processo de aproximação da cultura e do idioma, em Moçambique, sendo que imigraram para Portugal por motivos políticos (Neves & Trindade, 2008, p.175). Estes imigrantes são rotulados como “portugueses autênticos” e não como “descendentes chineses”, sendo que esta distinção também se manifesta nos seus pensamentos e valores culturais. Consequentemente a sua descendência já é instruída de “maneira não-chinesa”; Por outro lado, os chineses que imigraram na década de 80 têm maior dificuldade no que respeita à integração. Apesar de alguns chineses contactarem frequentemente com portugueses, a grande maioria só o faz por necessidade de trabalho e estudo e muito poucos fazem amigos entre portugueses (Ning, 2012, p.41) De acordo com o inquérito realizado por Ding Ning, alguns chineses sentem que os portugueses não os descriminam mas sentem-se reticentes ao integrá-los na sociedade, porém, é também por iniciativa dos imigrantes chineses que a integração não se verifica, uma vez que parte dos indivíduos apresenta ideias muito conservadoras e apenas interagem com os portugueses se necessário e se a situação se justificar. Este estudo demonstrou ainda que os chineses têm maior interesse em interagir com pessoas da mesma etnia, onde a comunicação e a identidade cultural é facilidade (Ning, 2012, p.42). Segundo Li Bin, os portugueses, por vezes, não têm paciência para compreender o que os chineses dizem, contudo não são inconvenientes nem mal-educados e tratamnos de forma cordial (Bin, 2005, como referido em Gonçalves, 2005). Os chineses apresentam três motivos específicos para esta “auto-exclusão”. O motivo principal é o facto de terem dificuldade na língua portuguesa. A maioria dos imigrantes não possuem um nível de escolaridade muito elevado, logo não apresentam uma grande capacidade para a aprendizagem de novas línguas, por outro lado, o facto de estes se relacionarem maioritariamente com pessoas da sua etnia dificulta a aprendizagem da língua e da cultura. Outro motivo pelo qual estes preferem a convivência com chineses, deve-se ao facto de, naturalmente, os chineses se ajudarem uns aos outros, sendo que é um valor que lhes é intrínseco, daí o seu maior conforto dentro da comunidade chinesa. Por fim, a maneira da ser deste povo é muito fechada, o
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que dificulta a comunicação e a partilha de ideias, bem como a sua inclusão na sociedade portuguesa (Ning, 2005, p.44). Para se ultrapassar esta “auto-exclusão” é necessário que a comunidade chinesa comece por assimilar os hábitos portugueses, bem como instruir-se de acordo com a educação portuguesa. Assim sendo, é de realçar a importância da interiorização dos valores básicos, da lei, das tradições e dos princípios morais básicos da sociedade acolhedora, visto que assim é mais fácil estabelecer uma confiança mútua, que contribui para a integração social (Ning, 2005, p.47). Por outro lado, é ainda necessário que os imigrantes tenham iniciativa de se instruírem em escolas portuguesas, uma vez que assim apreendem a história portuguesa e a justificação de certos hábitos e leis, facilitando a sua inclusão (Ning, 2005, p.49). É de realçar um dos mais recentes exemplos de integração por parte da comunidade
chinesa.
Até
há
pouco
tempo
estes
imigrantes
dedicavam-se
exclusivamente à comercialização de produtos oriundos do seu país, actualmente verifica-se uma saída do comércio étnico. Como já referido anteriormente, os chineses são pessoas dotadas de ambição e que arriscam. Portanto, actualmente, como forma de contornar a crise portuguesa, estes decidem abrir mercearias e frutarias (“O novo negócio dos chineses em Portugal”, 2011, para. 1). Esta saída do comércio étnico permite a sua inclusão na sociedade, visto que são obrigados a contactar com fornecedores portugueses e não somente com chineses (Serafim, 2014).
Apesar desta dificuldade em se integrarem na sociedade, há um grupo de imigrantes que se destaca devido à sua facilidade no que diz respeito à integração. Esse grupo refere-se aos descendentes, aos jovens, aqueles que vieram para o país antes da idade escolar ou mesmo aqueles que já nasceram em Portugal. Ou seja, todos aqueles que passaram pelo processo de socialização primária em Portugal. Devido a esta fácil integração e ao facto de os “chineses da segunda geração” contactarem diariamente com o estilo de vida português, estes questionam-se várias vezes se “são chineses ou portugueses”. A verdade é que, de acordo com a sondagem feita por Ding Ning, parte destes jovens consideram-se chineses por razões óbvias: a aparência e a influência dos pais (Ning, 2012, p.54). O facto de estes possuírem determinadas características fenotípicas faz com que se considerem e sejam considerados chineses, uma vez que “a raça emite informações a outras pessoas sobre os vários aspectos da sua identidade étnica” (Kibria, 2000, como referido em Ning, 2012). Catarina Costa
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De acordo com vários entrevistados, o facto de estes apresentarem características fisionómicas que os assemelham a qualquer chinês, faz com que nunca se possam considerar verdadeiramente portugueses, apesar de lidarem diariamente com o estilo de vida português. Para além disso, os pais desempenham o papel essencial e decisivo na vida de qualquer criança. No caso dos pais chineses, estes são muito rigorosos e tentam transmitir a sua própria cultura e valores. Exemplo disso é o facto de estes incentivarem ao ensino português e à prática de actividades tipicamente portuguesas (Rodrigues, 2012 como referido em Pires, 2012), porém, no seio familiar, continuam a transmitir a sua cultura, seguem os seus valores e a sua religião e alimentam-se com a gastronomia tipicamente chinesa (Ning, 2012, p.55). Como já referido anteriormente, os chineses não se sentem discriminados, porém “os pais chineses são muito susceptíveis a falar com os seus filhos sobre discriminação, mas na maioria dos casos, os chineses são pouco propensos a experienciarem a discriminação” (Waters & Philip, 2010, p.107). Este facto poderá ser responsável pelo modo reticente como os portugueses lidam com os chineses. No entanto, apesar de os jovens serem educados “à maneira chinesa” e de essa cultura lhes ser intrínseca, há características que estes não assimilam e que chegam a contrariar. Por exemplo, os chineses da primeira geração são orientados para o trabalho e para fazer fortuna, abdicando do descanso e do prazer, enquanto a segunda geração já não considera essencial o trabalho árduo para alcançar a fortuna e “atribui maior importância à vida em si” (Ning, 2012, p.56). Para além disso, os chineses da segunda geração consideram que há hábitos e comportamentos negativos relativamente à cultura chinesa, sendo que procuraram contrariá-los e afastar-se deles. Estes referem que os chineses são muito interesseiros e egoístas no que diz respeito ao dinheiro e aquilo que o outro possui. Assim sendo, a segunda geração considera-se chinesa baseando as suas crenças em determinadas características étnicas. Contudo, na maioria dos casos, decidem identificar-se com a cultura portuguesa, uma vez que discordam com alguns comportamentos e hábitos chineses – “há chineses de segunda geração que se sentem cada vez mais portugueses” (Malta & Saramago, 2007). Devido a esta “auto-exclusão” seria expectável, que após uma melhoria das condições de vida, os imigrantes chineses desejassem voltar para o seu país de origem,
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porém esta hipótese, para a maioria da comunidade chinesa, está fora dos seus objectivos. Embora esta “auto-exclusão” seja da sua vontade, derivado sobretudo à sua personalidade e às dificuldades com a língua, os chineses encontram em Portugal um ambiente de conforto e segurança, mesmo que não consigam fazer tanta fortuna quanto conseguiriam noutro país da Europa, por exemplo (Rodrigues, 2012 como referido em Pires, 2012). Para além disso, estes indivíduos têm noção que em Portugal há maior liberdade e mais oportunidades para os seus filhos serem bem sucedidos. Por fim, a questão de regressar à China não é prioritária, uma vez que, a maioria dos indivíduos se encontra em Portugal com a família – pais, irmãos, tios, avós (Chow, 2005 como referido em Gonçalves, 2005). No entanto, apesar de desejarem permanecer em Portugal e terem noção da qualidade de vida que podem obter, estes não deixam de tecer críticas relativamente a alguns aspectos do país de acolhimento. Exemplo de uma dessas críticas é relativa ao ensino e à capacidade de trabalho dos portugueses. De acordo com os chineses “o ensino português é muito branco”, face ao ensino chinês em que não há tempo para “brincar e divertir” (Rodrigues, 2012 como referido em Pires, 2012). Para além disso, afirmam ainda que os “portugueses desejam o descanso face ao trabalho” (Malta & Saramago, 2007) – “Pretendem ter uma vida mais relaxada, com fins-de-semana no campo” como diz Y Ping Chow, ao comparar o actual pensamento dos filhos que já estão mais relacionados com o estilo de vida português. Em consequência destas opiniões são criados estereótipos sobre os chineses/asiáticos, como por exemplo, que estes são muito inteligentes e que “se não existe, há-de haver um chinês que vai inventar”. Portanto, devido a esta capacidade de trabalho é normal que estes tenham consciência que conseguirão vingar em Portugal e obter uma boa qualidade de vida. Esta certeza relativa ao desejo de permanência no território português é confirmada pelas declarações de alguns imigrantes – “Não! Fico cá. À China não volto” (Bin, 2005 como referido em Gonçalves, 2005) e “Talvez, mas não é o meu sonho [regressar à China] ” (Mónica, 2008 como referido em Salvador, 2008).
De acordo com os censos de 2011, há oficialmente mais de 11 mil residentes chineses em Portugal (Serafim, 2014, para. 3), portanto devido a esta permanência e ao facto de os chineses terem filhos em território nacional, bem como ao facto de continuarem a incentivar os amigos e familiares a emigrarem para Portugal, é de esperar Catarina Costa
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que estes números aumentem. Um facto ainda não referido, que justifica a escolha de Portugal como país de acolhimento, para além do ambiente agradável e da segurança oferecida, deve-se ao modo fácil de estes se legalizarem (Rodrigues, 2012 como referido em Pires, 2012).
Assim sendo, devido a todos estes factores de “auto-exclusão” por parte de uns chineses, mas também ao facto de outro grupo, da mesma comunidade, sentir que já está integrado e que vive de acordo com os hábitos e costumes portugueses, é de voltar a questionar: “Português ou Chinês? Processo de Assimilação ou Etnicização?” Esta é uma questão complexa de se responder, uma vez que não há um consenso entre a comunidade de imigrantes. Todos os dias nos deparamos com um considerável número de indivíduos desta etnia e não nos apercebemos das suas tentativas, ou não, de se integrarem. É de assumir que parte da responsabilidade desta indecisão, face à sua integração na sociedade portuguesa, é nossa. De acordo com muitos relatos analisados as opiniões, dos jovens chineses, sobretudo, são diversas quando a questão é: “sentem-se mais portugueses ou chineses?”. Tendo em conta o facto de, a maioria dos jovens chineses, já ter nascido em Portugal e de toda a sua educação ser baseada em modos portugueses, à excepção das ocasiões circunscritas ao lar, em que os progenitores zelam para que se mantenha uma certa tradição chinesa, é de assumir que estes se consideram portugueses, uma vez que a maioria dos seus amigos são portugueses e que são orientados desde cedo para seguir esta cultura, devido, essencialmente, a pressões da sociedade. Porém, outra análise possível é o facto de estes não saberem o que devem responder, considerando-se tanto ocidentais (portugueses) como chineses, uma vez que lidam com as duas culturas diariamente (Shu, 2008 como referido em Salvador, 2008). Por outro lado, apesar de estes aprenderem o mandarim, em escolas próprias para o efeito (se bem que, em parte dos casos, estes abandonam o estudo da língua) – “Quando fui à China, há dois ou três anos, as pessoas perceberam logo que eu tinha um sotaque estranho e perguntaram-me se era turista” (Lin, 2008 como referido em Salvador, 2008) – e de serem forçados a lidar com a cultura chinesa, como por exemplo, tendo refeições com pratos tipicamente chineses, quando visitam a China sentem que existe um choque cultural, apesar de a cultura lhes agradar. Porém sentem dificuldade em acompanhá-la da melhor forma estando num país diferente e sofrendo pressões para Catarina Costa
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se regerem de acordo com outra que apresenta características muito distintivas (Lin, 2008 como referido em Salvador, 2008). Ainda assim, o facto de estes a apreenderem, torna possível um largo conhecimento sobre o modo como se deve lidar com as diferentes culturas (Shu, 2008 como referido em Salvador, 2008). Um outro aspecto que já foi explanado anteriormente prende-se com o conhecimento sobre o português. De acordo com os estudos realizados, quanto maior o conhecimento da língua, mais fácil é interagir com os portugueses e consequentemente integrar-se. Assim sendo, os jovens chineses apresentam uma maior facilidade no que diz respeito à forma como interagem com os portugueses (Salvador, 2008, para. 1)
Após várias análises e observação de inúmeros testemunhos de jovens chineses e adultos dessa mesma etnia muitas poderiam ser as conclusões relativamente ao processo cultural que encontramos (assimilação ou etnicização). Pode-se considerar que, a maioria da comunidade chinesa, se encontra perante um processo de assimilação, uma vez que facultam à descendência uma educação baseada em costumes portugueses e, também, tendo em conta os testemunhos, a convicção de permanência em Portugal. Para além disso, é de relembrar a definição de assimilação, ou seja, esta não se prende com a eliminação das características da cultura da comunidade imigrante, nem com a da comunidade de acolhimento, mas sim com a mudança de certos aspectos em ambas as culturas para que se encontre um todo harmonioso. Assim sendo, é de ter em conta este processo, uma vez que certos aspectos culturais chineses, têm sido aceites pelos portugueses, como é o exemplo da gastronomia e, por outro lado, aspectos como o hábito de trabalho do povo português começa a ser aceite pelos jovens chineses, que desejam seguir o seu estilo de vida de acordo com esses hábitos. Por outro lado, é também possível falar em etnicização, uma vez que, parte dos chineses adultos, apesar de desejar perpetuar em Portugal, continuam a reger-se pela sua cultura, sendo que, em certos casos, a língua portuguesa está muito mal aprendida. Porém, este grupo começa a ser cada vez mais restrito, não se verificando uma grande discrepância entre a comunidade imigrante e a comunidade de acolhimento. De acordo com o estudo de Cabecinhas, não existem em Portugal grandes contrastes entre a população portuguesa e as comunidades imigrantes, neste caso a comunidade chinesa. Esta situação deve-se ao facto de a comunidade chinesa não apresentar grandes diferenças relativamente à comunidade portuguesa no que diz Catarina Costa
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respeito, simultaneamente, a nível sócio-económico e situação residencial. Isto deve-se ao facto de parte da comunidade portuguesa ter condições económicas e sociais tão desfavorecidas como as dos imigrantes (Cabecinhas, 2002, p.103, como referido em Miranda, 2001).
Por fim, é possível falar da questão da identidade europeia. Sabe-se que a sua história não é linear, uma vez existir constantemente contradições, conflitos e descobertas, sendo que isto propicia a um aumento dos individualismos e dos egoísmos colectivos ou individuais (Moura, 2013, p. 21). Derivada da herança cultural1, surge a cidadania, sendo que as representações da mesma dizem respeito à pertença do cidadão a uma comunidade política, que aceita um determinado sistema de valores (Moura, 2013, p.19). Não obstante esta noção de cidadania, é de realçar o interesse do individuo no que diz respeito à sua capacidade de adaptação a novas situações culturais. No caso abordado no presente ensaio, requer-se uma predisposição para a comunidade imigrante assimilar a cultura do país de acolhimento e vice-versa, para que se possa viver num todo harmonioso e evitar os conflitos culturais ou, simplesmente, o surgimento de mitos. Em suma, é possível afirmar que é necessário, em todo o caso, um processo de assimilação aquando da emigração, uma vez que “a unidade europeia só poderá ter êxito se conseguirmos realizá-la no quadro da diversidade cultural e linguística” (Moura, 2013, p. 83). Assim sendo, a comunidade chinesa em Portugal participa num processo de assimilação que nos leva a considerar um possível êxito no que respeita à unidade europeia, uma vez que a cultura portuguesa já é, e continuará a ser, influenciada por hábitos orientais, sem que se verifiquem conflitos. E, por outro lado, os chineses que habitam em Portugal começam, cada vez mais rápido, a desenvolver hábitos tipicamente portugueses e a perpetuá-los à sua descendência, mesmo que se verifique uma herança cultural chinesa. Assim sendo, apesar de muitas serem as opiniões, estes nunca serão totalmente portugueses ou totalmente chineses. Contudo, a verdade, é que já ninguém o é, devido a toda esta diversidade cultural existente na Europa e, mais especificamente, em Portugal. 1
“A herança cultural é o conjunto de elementos que permitem a um determinado grupo reconhecer-se como portador de uma identidade própria e comunicar ao longo do tempo, quer no interior desse grupo quer pela marcação de uma diferença fora dele.” (Moura, 2013, p.38) Catarina Costa
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