Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas | Setembro / 2020 | Ano VI - Nº 25
Informativo
Da nascente à foz, Velhas continua a sofrer com problemas de saneamento
Contingenciamento na Bacia do Rio das Velhas agora é objeto de Ação Civil Pública Pág. 5
Entrevista: Vitor Queiroz e o novo Marco Legal do Saneamento Págs. 6 e 7
Editorial O CBH Rio das Velhas e os demais 35 Comitês de Bacias de Minas Gerais foram surpreendidos com a proposta do IGAM (Instituto Mineiro de Gestão das Águas), apresentada na 46ª Reunião Extraordinária da Câmara Técnica de Planos do Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH-MG), que sugere a regionalização do estado em apenas sete Unidades Estratégicas de Gestão (UEGs), em substituição às 36 Unidades de Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos do Estado de Minas Gerais (UPGRHs), estabelecidas na Deliberação Normativa nº 06/2002. No entendimento do CBH Rio das Velhas e do Fórum Mineiro de Comitês de Bacias Hidrográficas (FMCBH), colegiado que reúne os 36 Comitês instituídos no estado, a proposta fragiliza institucionalmente os CBHs e o trabalho que desenvolvemos na gestão dos recursos hídricos em cada território. Revogar a DN CERH Nº 06/2002 significa desmontar a atual estrutura do Sistema Estadual de Recursos Hídricos do Estado de Minas Gerais, retirando dos Comitês as competências nas suas unidades territoriais. Trata-se, portanto, de um equívoco, um erro, uma ilegalidade, uma afronta à história dos Comitês de Bacia de Minas Gerais, sendo assim inaceitável. É importante destacar que UEGs e UPGRHs têm definições territoriais e competências distintas. Tanto a Lei Federal nº 9.433/97, quanto a Lei Estadual nº 13.199/99, definem que os Comitês são instituições para a implantação dos instrumentos de gestão dentro dos territórios das bacias hidrográficas. O próprio CERH, através da DNº 06/2002, estabeleceu as 36 UPGRHs que são as bases territoriais dos Comitês de bacias hoje existentes, referendadas pelo Plano Estadual de Recursos Hídricos. A vinculação das UPGRHs com os Comitês fica explicitada na DN CERH Nº 04/2002, que estabelece diretrizes para a formação e o funcionamento de Comitês de Bacia Hidrográfica: “A criação de Comitês se dará conforme as Unidades de Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos, formalmente aprovada pelo CERH-MG, em Deliberação Normativa específica, observado o disposto no inciso 1° e no § 1° do artigo 250 da Constituição do Estado de Minas Gerais.” No entendimento dos Comitês de Bacias Hidrográficas, portanto, as UEGs não assumem as competências dos Comitês e nem as definições das UPGRHs. Entendemos que as UEGs não podem destruir as Unidades Territoriais de Comitês (UPGRHs) e, sim, conviver com elas.
Marcus Vinícius Polignano Presidente CBH Rio das Velhas
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1°JAN
1949
JEQUITIBÁ
Entidades aderem à campanha ‘A Cidade e as Águas’ Diversas entidades ligadas ao Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas) e aos seus Subcomitês têm aderido à mais nova campanha institucional de comunicação do CBH, intitulada ‘A Cidade e as Águas’. Com a adesão dos parceiros o Comitê busca destacar ações positivas na gestão das águas que ocorrem na bacia, assim como estimular a adoção de boas práticas – seja com o poder público, o setor produtivo e a sociedade civil organizada. Uma das primeiras entidades a aderir à campanha e a receber o selo ‘Eu cuido das águas da minha cidade’ é a Associação dos Catadores de Materiais Recicláveis de Nova União (Unicicla), que atua nos municípios de Nova União, Bom Jesus do Amparo e Taquaraçu de Minas – e possui cadeira no Subcomitê Rio Taquaraçu. Para o presidente da entidade, Anderson Patrício Viana, a campanha é importante no sentido de destacar uma classe invisibilizada e estigmatizada, mas que desenvolve um papel fundamental à sociedade como um todo. “Acho importante aderir à essa campanha, porque a Unicila vem fazendo um trabalho muito importante na bacia do Rio Taquaraçu. Além de preservar o meio ambiente, o trabalho dos catadores muitas vezes é invisível aos olhos da sociedade. As pessoas desconhecem, ignoram e ainda têm um preconceito muito grande com os catadores. Por isso acredito que
tem que ter visibilidade sim, tem que ser evidenciado, tem que ter respeito”, conta. Anderson também destaca a importância da correta gestão dos resíduos sólidos nos municípios para que tenhamos águas de melhor qualidade nos nossos rios. “Quando as pessoas veem uma temática como essa ‘A Cidade e as Águas’, imagino que logo pensam em saneamento básico, preservar as águas, cuidar do esgoto, saneamento etc. Mas esquecem que por detrás da coleta seletiva, do trabalho dos catadores, a cidade pode ser mais limpa, porque o que mais gera poluição nas águas é material reciclável”. A campanha ‘A Cidade e as Águas’ busca discutir e problematizar a relação e o impacto dos grandes centros urbanos no ambiente, em especial nos cursos d’água. O ponto de partida para essa discussão foram as chuvas do último verão, consideravelmente significativas na Bacia do Rio das Velhas e em todo estado de Minas Gerais. Não preparadas, as cidades sucumbiram, com rastros de destruição e mortes. No entendimento do CBH Rio das Velhas, longe de ser uma surpresa, os números são resultado de políticas urbanas que progressivamente sufocaram os rios da cidade, evidenciando a fragilidade da gestão das águas nesses territórios.
Para saber mais e também aderir à campanha, acesse: cbhvelhas.org.br/acidadeeasaguas
A poucos quilômetros de suas nascentes, Rio das Velhas sofre com esgoto sem tratamento Em São Bartolomeu, distrito de Ouro Preto, a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) está inativa. Inaugurada em 2008, a primeira ETE da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas é ativada manualmente, mas, desde janeiro deste ano, quando a empresa Saneouro assumiu a concessão de tratamento de água e esgoto de Ouro Preto, a estação não tem sido acionada. Dessa forma, todo o esgoto produzido pelo distrito, que é a primeira vila urbana às margens do Rio das Velhas, está sendo lançado in natura no curso d’água. É importante salientar que São Bartolomeu é um dos poucos distritos de Ouro Preto que possuem tratamento de esgoto. Segundo informações do site da própria Saneouro, apenas 0,7% do esgoto da antiga capital mineira é tratado atualmente, dos quais – conforme registrado num estudo de 2018 da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) – 0,4% correspondiam ao esgoto tratado de São Bartolomeu. O distrito fica a cerca de 12km das nascentes do Rio das Velhas, onde a água ainda é cristalina e própria para a balneabilidade. “A construção da ETE São Bartolomeu foi possível graças ao empenho do Projeto Manuelzão e o apoio da Copasa [Companhia de Saneamento
de Minas Gerais]. Uma vez que o tratamento de esgoto na região é precário, penso que a estação possui também uma simbologia importante por estar localizada no primeiro distrito à margem do Rio das Velhas. No entanto, há sete meses, desde que houve a transição do tratamento da SEMAE [Serviço Municipal de Água e Esgoto], da prefeitura de Ouro Preto, para a Saneouro, a estação não opera. Eu fiz uma denúncia no Conselho de Meio Ambiente, mas nenhuma ação foi tomada ainda”, afirma Ronald Guerra, conselheiro dos Subcomitês Nascentes e Rio Itabirito e do CBH Rio das Velhas. Esgoto também na nascente do Velhas Já no bairro São Sebastião, em Ouro Preto, vizinho ao Parque Natural Municipal das Andorinhas, a falta de coleta de esgoto atinge a cabeceira do Rio das Velhas. Embora haja no Morro de São Sebastião uma estação de bombeamento de esgoto com rede coletora, alguns moradias que vertem para a Bacia do Rio das Velhas não estão ligadas à rede, e os efluentes vão desaguar em cinco cursos d’água que formam as nascentes do rio. Os problemas de tratamento de esgoto na região não são novidade. Desde os tempos em que
era chamada de “Vila Rica”, Ouro Preto e seus distritos não possuem tratamento de esgoto adequado e lançam quase a totalidade de seus efluentes diretamente nos rios da região. Ainda segundo Ronald Guerra, a situação impacta não só o Rio das Velhas, mas também a Bacia do Rio Doce no caso do centro histórico de Ouro Preto. A questão, no entanto, parece estar longe de uma solução que efetivamente proteja os cursos d’água naquele local, uma vez que mesmo as informações sobre a real situação do tratamento de esgoto são escassas. A equipe de Comunicação do CBH Rio das Velhas entrou em contato com a Saneouro - empresa que assumiu a concessão do tratamento de água e esgoto de Ouro Preto em janeiro deste ano, após a extinção da SEMAE, pedindo informações sobre a situação da ETE São Bartolomeu, mas não obteve resposta.
Ouça o podcast em bit.ly/esgoto-nascente ou escaneie o QR Code
Bairro São Sebastião, em Ouro Preto, é vizinho ao Parque das Andorinhas, que abriga as nascentes do Rio das Velhas.
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Subcomitê solicita implantação de ETEs para tratamento de esgoto de Taquaraçu de Minas e Nova União O CBH Rio das Velhas, por meio do Subcomitê Rio Taquaraçu, enviou um ofício para a Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e de Esgoto Sanitário no Estado de Minas Gerais (ARSAE-MG) solicitando a construção da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) no município de Taquaraçu de Minas e o funcionamento da ETE de Nova União pela Copasa (Companhia de Saneamento de Minas Gerais). O ofício foi encaminhado com cópia para a companhia, o Ministério Público do estado de Minas Gerais e para as prefeituras de Taquaraçu de Minas e Nova União.
Contaminado pelo esgoto dos dois municípios, rio Taquaraçu é um importante afluente do Médio Rio das Velhas.
Conselheiro do Subcomitê, Jânio de Lima busca solução para o esgotamento local.
O conselheiro geral do Subcomitê Rio Taquaraçu, Jânio de Lima Marques, esclarece que os municípios de Taquaraçu de Minas e Nova União não possuem tratamento de esgoto. “O rio Taquaraçu é um importante afluente do Rio das Velhas e suas águas ainda estão enquadradas na Classe 1. No entanto, hoje o principal poluidor das águas do Taquaraçu são os esgotos dos municípios de Taquaraçu de Minas e Nova União, que não possuem nenhum tipo de tratamento, sendo lançados in natura no curso d´água. A única forma de solucionar esse problema é instalando as ETEs nos dois municípios, o que também vai melhorar a qualidade das águas do Rio das Velhas”, esclarece. Os rios de Classe 1 são classificados como águas que podem ser destinadas ao abastecimento para consumo humano, após tratamento simplificado; à proteção das comunidades aquáticas; à recreação de contato primário, tais como natação, esqui aquático e mergulho. O prefeito de Taquaraçu de Minas, Alcides Hipólito Assunção Ferreira Filho, explica que já solicitou a construção da ETE no município para fazer o tratamento do esgoto. “Estamos há alguns anos solicitando à Copasa a implantação da ETE em Taquaraçu de Minas. Nós temos o Plano Municipal
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de Saneamento Básico que foi financiado pelo CBH Rio das Velhas e temos tentado buscar recursos para a melhoria do saneamento na nossa região”. O prefeito Alcides esclarece ainda que Taquaraçu tem contrato com a Copasa vigente até 2042. “O contrato com a Copasa prevê a implantação da ETE em Taquaraçu de Minas entre os anos de 2018 e 2019. No entanto, as obras de implantação de interceptores e a construção da ETE não foram realizadas, o esgoto é lançado nos cursos d’água que cortam o município e no rio Taquaraçu. Constata-se, também, que não foram elaborados projetos e nem definido um local para construção da ETE”. A Copasa informa que o local de propriedade da ArcelorMittal, onde estava prevista a construção da ETE Taquaraçu, foi impossibilitado pela empresa por se encontrar em área de risco, caso haja rompimento de barragem, sendo que a recusa se deu em 29 de março de 2019. Desde então, estão realizando estudos para definir um novo local. Nova União Já no município de Nova União, a estrutura da ETE já foi construída e a prefeitura precisava fazer a instalação elétrica para em seguida a Copasa iniciar as obras necessárias para o funcionamento da ETE, que foi construída pela gestão anterior, de 2013/2016. O secretário de Meio Ambiente de Nova União, Wanderson César Soares, esclarece sobre a situação do saneamento. “A prefeitura solicitou à Copasa a operação da ETE de Nova União no final do ano de 2019. O objetivo do município é avançar no saneamento e estamos alinhando com a Copasa as ações possíveis para tal. No entanto, temos esbarrado em entraves financeiros, devido à atual situação financeira dos municípios”.
População de Jequitibá participa de audiência sobre Plano de Saneamento financiado pelo CBH Os moradores do município de Jequitibá, que compõe a bacia hidrográfica do Rio das Velhas, participaram da 2ª Audiência Pública sobre o Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB), ao final de julho, de forma virtual. O objetivo foi apresentar o prognóstico, programa, os projetos e as ações referentes ao PMSB, e permitir a participação popular com sugestões e esclarecimento de dúvidas. O documento é desenvolvido pelo CBH Rio das Velhas com recursos da Cobrança pelo Uso da Água na bacia.
Poliana Valgas, Secretária de Meio Ambiente de Jequitibá e SecretáriaAdjunta do CBH Rio das Velhas
Encontro do Ribeirão Jequitibá e o Rio das Velhas, no município de Jequitibá.
Durante a audiência, o prefeito de Jequitibá, Humberto Reis, destacou que o PMSB trará muitas melhorias para o município. “Agradecemos a todos que estão colaborando no processo e ao CBH Rio das Velhas pelo financiamento. O Plano é um ganho que buscamos há muito tempo e que vai nortear o planejamento e as execuções de futuras obras que trarão melhorias para a população. O PMSB é de fundamental importância para conseguirmos recursos para essas obras”, afirmou. Secretária de Meio Ambiente municipal e secretária-adjunta do CBH Rio das Velhas, Poliana Valgas também participou da audiência pública, sanando dúvidas sobre as áreas do saneamento básico. Ela esclareceu que a bacia do Rio das Velhas é grande e que, além dos PMSBs, o Comitê investe em outras ações para a revitalização e preservação dos cursos d’água. “O PMSB é um importante documento que deixamos para as próximas gestões, que devem se empenhar para colocar as ações em prática”.
Assista à audiência pública em bit.ly/pmsb-jequitiba ou escaneie o QR Code
Contingenciamento na Bacia do Velhas agora é objeto de Ação Civil Pública Por ordem do Promotor de Justiça Dr. Flávio Alexandre Correa Maciel, o contingenciamento de valores provenientes da Cobrança pelo Uso de Recursos Hídricos na Bacia do Rio das Velhas tornou-se objeto de análise da uma Ação Civil Pública (n.º 502810-3-27.2017.8.13.0024). A dívida em questão diz respeito aos recursos retidos pelo estado de Minas Gerais entre os anos de 2018 e 2019.
Cabe lembrar que, anteriormente a esse período, o mesmo Ministério Público Estadual havia encaminhado um Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC) que determinou o pagamento da então dívida com o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas). Foram mais de R$ 20,5 milhões referentes aos anos de 2016, 2017 e 2018. A Ação Civil Pública encontra-se em fase recursal, com interposição de Recurso de Apelação pelas partes do processo.
Desde 2010, todo o trabalho desenvolvido pelo CBH Rio das Velhas só foi possível graças à Cobrança pelo Uso dos Recursos Hídricos. A cobrança viabilizou inúmeras ações e projetos, apoios e eventos. Entre eles estão a execução de Projetos Hidroambientais, a elaboração dos Planos Municipais de Saneamento Básico, de ações de mobilização, comunicação social e educação ambiental e promoção de conhecimento técnico-científico.
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Entrevista: a privatização dos serviços de saneamento garantirá a universalização do acesso à água e ao esgoto no Brasil?
O Governo Federal sancionou, em julho, o novo Marco Legal do Saneamento Básico (PL 4.162/2019), que estabelece como meta o acesso de 99% da população à água potável e de 90% à coleta e tratamento de esgoto até dezembro de 2033. Para atingir esse objetivo, a proposta é ampliar a concessão da prestação dos serviços para a iniciativa privada e diminuir a participação direta do estado no setor. No entanto, não há consenso no debate público sobre se essa é a melhor forma de abordar o problema. Defensores e críticos da proposta têm polarizado as discussões, o que expõe as muitas questões para as quais não há respostas simples: a universalização é mesmo executável no prazo estipulado? Privatizar o serviço garantirá o seu acesso a quem hoje não o possui? É possível concluir pelo sucesso ou fracasso da proposta a partir de experiências semelhantes ao redor do mundo? Levamos essas questões ao engenheiro civil e especialista em saneamento, meio ambiente e recursos hídricos, Vitor Queiroz. Com vasta experiência em políticas públicas e gestão de saneamento e recursos hídricos, Vitor explica quais seriam os possíveis ganhos trazidos pelo novo Marco Legal, bem como reflete sobre suas fragilidades. 6
O novo marco do saneamento básico, que amplia o espaço para as empresas privadas, foi aprovado com o discurso de que, a partir dele, o país alcançará a universalização até 2033. Essa meta é factível? Há três pontos importantes a se destacar. Em primeiro lugar, o fato de incluir metas em leis ou decretos não é garantia de que elas serão cumpridas. Ao contrário, temos exemplos de que não é bem assim: o próprio decreto regulamentador da Lei nº 11.445/2007, que define a elaboração dos Planos Municipais de Saneamento e que foi sendo sucessivamente prorrogado porque não era cumprido, assim como o fim dos lixões na Política Nacional de Resíduos Sólidos, que também vai sendo sucessivamente prorrogado… O mais adequado é estipular essas metas num instrumento de planejamento, como são os Planos Diretores, onde é possível definir as estratégias – ou seja, como as metas vão ser atingidas, quem serão os responsáveis por elas, quais os recursos, quais os financiamentos. No caso do saneamento, essas metas foram definidas pelo PLANSAB (Plano Nacional de Saneamento Básico) em 2013, com 20 anos para que fossem cumpridas. Estamos em 2020 e pouco avançamos. Mas, ainda mais
importante do que incluí-las nos planos é garantir a execução dos próprios planos: utilizar os recursos disponíveis, a capacidade institucional dos órgãos das diferentes esferas. Não basta ter meta, ter um plano bonito, se não for tirá-los do papel. Um segundo ponto são as metas que foram colocadas na atualização do Marco para os contratos de serviço: isso também não garante que toda a população seja atendida. Atualmente, a maioria dos contratos – quer sejam os contratos de programa, que são os contratos com as estatais, quer sejam os contratos de concessão, que são com os operadores privados – raramente inclui as áreas rurais e certas parcelas dos municípios. Nesse sentido, surge um debate com diferentes interpretações da lei: de um lado há quem diga que o contrato pode até não abranger todo o município, mas a própria lei expressa que o poder público deve viabilizar a universalização fora do contrato, o que dificulta a regulamentação; de outro, há quem entenda que essa abrangência está vinculada apenas à área de serviço. Dessa forma, podemos chegar a 2033 atingindo a meta e, ainda assim, com parte da população sem atendimento. Essa é uma questão fundamental: a interpretação da lei. Por último, para se universalizar o acesso ao saneamento, o setor como um todo precisa
de capacidade institucional – recurso financeiro é fundamental, mas não é o único fator. Outros recursos são necessários: desde empresas de engenharia, que elaborem bons projetos e executem as obras, como também mão de obra qualificada nos diferentes níveis para operar e manter os sistemas de água e esgoto, além de dotar o setor público de capacidade institucional para regular e fiscalizar (há poucos quadros que fazem isso no Brasil). O município também tem um papel importante e também precisa ser capacitado, que seja para acompanhar um contrato delegado a um terceiro ou a regulação de uma agência estadual ou intermunicipal. Isso não se resolve do dia para a noite. Parece-me muito difícil, ainda que haja recurso financeiro, que a gente consiga atingir a meta até 2033. Espero estar enganado, mas se a trajetória do setor for alterada e for direcionada rumo à universalização com avanços progressivos, está ótimo. Na sua opinião, o novo marco traz algum real avanço na universalização do saneamento básico? As várias discussões levantadas pelo Novo Marco podem representar tanto ameaças como avanços, a depender do seu desenrolar. O ponto que talvez seja mais positivo é o seguinte: quer você goste ou não do marco regulatório proposto pelo atual governo, o fato é que o saneamento foi colocado em discussão na agenda pública – talvez como nunca Vitor Queiroz é engenheiro civil e especialista em saneamento, meio ambiente e recursos hídricos.
tenha sido antes. Entendo que isso já foi um grande avanço. Mas, ao mesmo tempo, essa discussão foi posta, em sua forma e conteúdo, de forma problemática, rasa, sem entender as principais questões do setor. A premissa inicial, basicamente, foi: “Temos um grande problema de saneamento – 35 milhões de brasileiros sem acesso a água e 100 milhões sem acesso a esgoto (o que, inegavelmente, é uma tragédia) – e a prestação desse serviço é majoritariamente pública; logo, temos de entregar o saneamento para a iniciativa privada”. No entanto, não é o tipo de prestador que vai determinar se o serviço será prestado de forma satisfatória ou não: o diagnóstico é multifatorial. Além disso, foi dado pouco espaço para os críticos da atualização. Houve uma discussão na grande mídia que, em geral, foi dominada pelas vozes favoráveis a essa atualização do marco regulatório. Mas, no setor, a divergência é grande, e quem é contra foi taxado de “corporativista” ou “a favor do status quo”, o que não é verdade. É possível ser crítico da atual situação e, ao mesmo tempo, entender que essa alteração proposta para o marco regulatório pode não ser exatamente o que o setor precisa. De qualquer forma o avanço ou retrocesso dependerá de diversas questões ainda não respondidas. Em meio às discussões sobre o novo marco, foram apresentados casos no mundo em que as privatizações não geraram os resultados esperados e os serviços acabaram sendo reestatizados. Você acredita que esse pode ser o futuro dos municípios brasileiros? É importante nos atentarmos para o fato de que o acesso à água e ao esgotamento sanitário são direitos humanos fundamentais, e o Estado necessariamente tem um papel essencial na garantia desses direitos, ainda que não seja prestando o serviço diretamente. Sobre as privatizações que foram revertidas no mundo: cada caso é muito particular e há diversos fatores envolvidos nas remunicipalizações. De qualquer forma, no caso brasileiro, o nosso déficit de saneamento, que é grande, reflete as desigualdades existentes: quem está excluído do acesso à água e ao saneamento são as mesmas pessoas que estão excluídas do acesso a outros serviços - populações nas áreas rurais, nas periferias de grandes cidades, em municípios muito pequenos e sem capacidade institucional. Então, a crença de que a privatização, por si só, vai resolver o problema do saneamento é controversa. É pensar que basta entregar o serviço nas mãos da iniciativa privada, sem observar a capacidade de pagamento dessas populações ou a necessidade de subsídios tarifários ou governamentais. Quem não tem esse acesso, em geral, é uma população que também não tem recurso financeiro. Portanto, se essa privatização for feita massivamente, sem que se observem essas questões, podemos assistir a uma série de devoluções de contratos pela iniciativa privada ou mesmo uma retomada do serviço pelo poder público. Mesmo que eu seja um pouco cético ainda com a aprovação do novo marco - até por não acreditar que legislação por si só resolva os nossos problemas -, penso que as questões estão em aberto, e teremos muito trabalho de articulação a ser feito para que consigamos atingir de fato a universalização. 7
Assista à 108º Plenária em bit.ly/plenaria108 ou escaneie o QR Code
CBH Rio das Velhas realiza primeira plenária on-line Os membros do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas realizaram, no início de agosto, por videoconferência, a 108ª Reunião Plenária, que contou com transmissão ao vivo à toda a sociedade pelo YouTube. O encontro teve como objetivo deliberar sobre questões importantes para dar continuidade à gestão dos recursos hídricos da bacia, mesmo em momento de isolamento social devido à COVID-19. “Lamentamos ter que fazer a Plenária de forma on-line, embora seja a única possibilidade no momento. Infelizmente, estamos passando por uma pandemia que vem se alastrando pelo mundo, o que não nos deu alternativa. Estamos aprendendo a utilizar novas ferramentas de comunicação e a nossa intenção foi que a Plenária acontecesse de forma participativa”, afirmou Marcus Vinícius Polignano, presidente do Comitê. Por meio de votação, a Plenária do CBH Rio das Velhas aprovou a criação da Comissão Eleitoral para renovação da Diretoria do Comitê para o mandato 2020-2022. Compete à Comissão Eleitoral a prática de todos os atos de coordenação, de análise e decisão de cadastramento/inscrição, julgamento de recursos e impugnações, de direção das reuniões, de apuração de resultados, entre outros pertinentes à condução do processo.
A eleição da nova diretoria acontecerá em reunião Plenária no dia 23 de setembro. O edital do processo eleitoral pode ser acessado no site do CBH Rio das Velhas. Os membros do Comitê também aprovaram, na ocasião, o pedido de outorga da mineradora Gerdau Açominas – para implantação de pilha de estéril na Mina Várzea do Lopes, localizada em Itabirito – com a recomendação para o empreendedor elaborar e implementar um programa de recuperação ambiental em 14 nascentes na bacia do Rio Itabirito, garantindo a recuperação e manutenção das características ambientais e hidrológicas das nascentes pelo período de atividade do empreendimento.
defasado. O que propomos é uma atualização no valor. A metodologia de cobrança será a mesma, visto que o Conselho Estadual de Recursos Hídricos está formulando uma nova proposta de metodologia de Cobrança pelo Uso da Água aos CBHs mineiros”, esclareceu. Outra importante deliberação foi referente ao contrato de gestão. Os membros do CBH Rio das Velhas manifestaram, por meio de votação, pela manutenção do Contrato de Gestão nº 03/2017 de 31 de dezembro de 2017, para vigência até 31 de dezembro de 2022.
A Plenária também aprovou o reajuste do Preço Público Unitário (PPU) proposto pela Agência Peixe Vivo. O estudo foi realizado em conjunto com o Grupo de Trabalho (GT) criado com o objetivo de aprimorar a Cobrança pelo Uso da Água. O gerente de Projetos da Agência Peixe Vivo, Thiago Campos, informou que hoje a bacia do Rio das Velhas tem o menor valor de PPU para captação de água bruta dentre as bacias. “Fizemos uma proposta de reajuste visto que o valor cobrado atualmente foi instituído em 2009 e se encontra
Plenária contou com transmissão ao vivo no YouTube.
INFORMATIVO CBH Rio das Velhas. Mais informações, fotos, mapas, apresentações e áudios no portal www.cbhvelhas.org.br Diretoria CBH Rio das Velhas Presidente: Marcus Vinícius Polignano Vice-presidente: Ênio Resende de Souza Secretário: Renato Júnio Constâncio Secretária-adjunta: Poliana Valgas
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