JORNAL DO COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO NOVEMBRO 2015 | Nº 36
ENCOB APROFUNDA DEBATE SOBRE CRISE HÍDRICA
Com participação ativa do Comitê do São Francisco, o Encontro Nacional de Comitês de Bacia (Encob) encerrou sua 17ª edição com saldo positivo, sobretudo quanto à ampliação do debate em torno da crise hídrica no País.
Comunidade quilombola comemora entrega de obras Página 3
Direc propõe mais 38 planos de saneamento básico Página 7
2 Foto: Angelo Pontes
EDITORIAL ENCOB EM DESTAQUE
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sta edição do Notícias do São Francisco destaca o Encontro Nacional de Comitês de Bacia (Encob), que aconteceu em outubro, na cidade de Caldas Novas (GO), com participação do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF). Na ocasião, o presidente da entidade, Anivaldo Miranda, debateu o tema “Comitê: indutor da gestão dos recursos hídricos”. Já o vice-presidente do CBHSF, Wagner Soares Costa, foi um dos debatedores da conferência “Segurança Hídrica como base para o desenvolvimento”. A 17ª edição do Encob teve sua programação baseada no debate sobre a crise hídrica que castiga o País, bem como na busca por uma melhor gestão das águas. Como destacou o coordenador do Fórum Nacional de Comitês de Bacias Hidrográficas (FNCBH), Affonso Henrique de Albuquerque, a atual conjuntura só reforça a necessidade de se fazer a tão sonhada gestão sustentável, compartilhada e participativa das águas do Brasil, até então pouco efetivada de acordo com a Lei federal nº 9.433/97, conhecida como Lei das Águas. Na conclusão do evento, o presidente Anivaldo Miranda foi eleito para o cargo de coordenador adjunto da nova gestão do Fórum. O jornal também dá espaço aos resultados da última reunião da Diretoria Colegiada do Comitê, que aprovou a proposta – a ser levada agora à plenária que acontecerá em Salvador, no mês de dezembro – de realização de mais 38 planos de saneamento básico em municípios da bacia do rio São Francisco , no ano de 2016. Leia ainda a entrevista exclusiva de Leonice de Souza Lotufo para o Notícias do São Francisco, primeira mulher a integrar a diretoria do Fórum Nacional de Comitês de Bacias Hidrográficas, eleita no último Encob.
Salvador será a sede da XXVIII Plenária Ordinária do CBHSF
“COMPROMISSOS RENOVADOS” SERÁ O TEMA DA PLENÁRIA EM SALVADOR
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om o tema principal “Compromissos Renovados”, a XXVIII Plenária Ordinária do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco será realizada nos dias 9 e 10 de dezembro, na cidade de Salvador, capital da Bahia. O local foi aprovado na última Plenária, ocorrida no mês de maio, em Petrolina, Pernambuco, e as datas foram definidas pela Diretoria Colegiada do CBHSF, que esteve reunida no dia 23 de outubro, em Maceió. Decisões como os temas dos debates e os palestrantes convidados ainda serão tomadas pela Diretoria Colegiada, mas assuntos urgentes não poderão ficar de fora, a exemplo da grave crise hídrica pela qual toda a bacia está passando, o baixo volume dos reservatórios e o processo de atualização do Plano de Recursos Hídricos da Bacia do São Francisco para o decênio 2016-2025, que está em fase de conclusão pela Consultoria Nemus.
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Outro assunto em destaque diz respeito ao contrato de gestão, documento que norteia o trabalho do Colegiado. A Diretoria do CBHSF já discutiu a minuta, elaborada pela AGB Peixe Vivo, mas a palavra final caberá à plenária. Além dos 62 membros titulares (ou dos suplentes, se houver necessidade de substituição), a Plenária Ordinária do CBHSF, que acontece semestralmente, reúne especialistas e autoridades ligadas à gestão de recursos hídricos e ao meio ambiente, como pesquisadores de universidades localizadas na bacia e representantes do Ministério Público. A Plenária também é uma oportunidade para que a Diretoria Colegiada, a partir dos coordenadores das Câmaras Consultivas Regionais, apresente as ações realizadas em cada região fisiográfica, como obras de recuperação hidroambientais e entrega de Planos Municipais de Saneamento Básico.
Coordenação geral: Malu Follador Projeto gráfico e diagramação: Yayá Comunicação Integrada Edição: Antônio Moreno Textos: Ricardo Follador, André Santana, Delane Barros, Antônio Moreno e Wilton Mercês Revisão: Rita Canário Este jornal é um produto do Programa de Comunicação do CBHSF Contrato nº 07/2012 — Contrato de Gestão nº 014/ANA/2010— Ato Convocatório nº 043/2011. Direitos Reservados. Permitido o uso das informações, desde que citada a fonte.
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Foto: André Santana
NOTÍCIAS DO SÃO FRANCISCO
Aproximadamente 300 famílias quilombolas foram beneficiadas com o projeto
COMUNIDADE DE RIO DAS RÃS COMEMORA ENTREGA DE OBRAS APROXIMADAMENTE 300 FAMÍLIAS QUILOMBOLAS NO MUNICÍPIO BAIANO DE BOM JESUS DA LAPA COMEMORARAM NO DIA 3 DE OUTUBRO A ENTREGA DAS OBRAS DE RECUPERAÇÃO HIDROAMBIENTAL REALIZADAS PELO COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO (CBHSF). FORAM INVESTIDOS MAIS DE R$ 628 MIL NA BACIA DO RIO DAS RÃS EM OBRAS DE REQUALIFICAÇÃO, A EXEMPLO DA CONSTRUÇÃO DE BARRAGINHAS, CERCAMENTO DE NASCENTES, IMPLANTAÇÃO DE LOMBADAS PARA DESVIO DE ÁGUA DAS ESTRADAS, ALÉM DE FAIXAS DE ROLAMENTO E PALIÇADAS PARA CONTER A EROSÃO NAS VOÇOROCAS.
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as aulas de Ciências da professora Paulina Rodrigues sempre houve espaço para falar sobre o rio das Rãs, importante afluente do São Francisco que dá nome a uma comunidade remanescente de quilombo na região oeste da Bahia. Das inquietações de alunos e professores da Escola Municipal Elgino Nunes de Souza, localizada na comunidade quilombola em Bom Jesus da Lapa (BA), surgiu a mobilização em torno da recuperação do rio, que enfrentava graves problemas de degradação, como perda de matas ciliares e efeitos da erosão. “Em setembro de 2010, fizemos uma caminhada com os estudantes pelos quatro quilômetros do rio, para ver de perto como a situação
comprometia a vida da comunidade”, explicou a professora Paulina, uma das fundadoras da Associação Agropastoril e Quilombola Rio das Rãs, que em maio de 2015 completou 20 anos de atuação. Segundo ela, a atividade permitiu que os estudantes conhecessem a dimensão do rio, suas nascentes e também seus problemas. Fruto dessa mobilização, cerca de 300 famílias da comunidade comemoraram no dia 3 de outubro a entrega das obras de recuperação hidroambiental realizadas pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), em atendimento às demandas levantadas pelos quilombolas. Foram investidos mais de R$ 628 mil na bacia do rio das Rãs, destinados a obras de re-
qualificação como construção de 235 barraginhas, cercamento de nascentes e áreas de proteção ao longo de quase 18 quilômetros, implantação de 136 lombadas para desvio de água das estradas, além de cerca de 20 quilômetros de faixas de rolamento e 48 paliçadas para conter a erosão nas voçorocas. “O projeto nasceu da necessidade de reverter a degradação do rio. Cabe a todos nós, agora, manter o que foi realizado. Somos quilombolas e preservar a natureza faz parte da nossa identidade”, conclamou Ilane Arcanjo Teixeira, uma das moradoras da comunidade contratada pela Localmaq, empresa executora das obras. Além de Ilane, que atuou nas dez reuniões de mobilização comunitária, foram contratados outros 30 trabalhadores da própria localidade. “As reuniões serviram para conscientizar a comunidade da importância das intervenções e ouvir suas contribuições e prioridades”, explicou Ilane. Os moradores também elogiaram os técnicos da empresa, que durante dez meses conviveram na comunidade. No ato da entrega estiveram presentes representantes da Prefeitura de Bom Jesus da Lapa e os funcionários da Localmaq e da
Irriplan Engenharia, empresa responsável pela fiscalização das obras do CBHSF. O coordenador da Câmara Consultiva Regional do Médio São Francisco, Cláudio Pereira, destacou os benefícios trazidos pelo projeto de recuperação hidroambiental, que, além da obra física, incluiu trabalho de mobilização e educação ambiental para conscientizar os moradores quanto à importância de preservar o rio. Pereira convocou a comunidade a ter apreço pelas intervenções, afim de que os resultados alcançados sejam mantidos. “Deixa chover, para vocês verem como esse rio vai ficar uma maravilha, com suas matas florescendo, suas nascentes preservadas brotando. É claro que uma degradação que levou anos não se resolve com apenas um projeto, mas os resultados já serão sentidos”, destacou o coordenador, fazendo um comparativo com outras obras realizadas pelo CBHSF e que já promoveram mudanças significativas em rios da bacia. “O Comitê acredita que, ao fazer intervenções perto das comunidades, além de beneficiar diretamente seus moradores também haverá quem as preserve.”
Foto: Ricardo Follador
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Seminários, reuniões e mesas-redondas discutiram a eficácia na gestão dos recursos hídricos
COMITÊ COBRA GESTÃO EFICIENTE DOS RECURSOS HÍDRICOS
O COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO (CBHSF) MARCOU PRESENÇA NA 17ª EDIÇÃO DO ENCONTRO NACIONAL DE COMITÊS DE BACIAS HIDROGRÁFICAS (ENCOB), QUE ESTE ANO ACONTECEU NA CIDADE DE CALDAS NOVAS, A CERCA DE 170 QUILÔMETROS DE GOIÂNIA (GO). COM UM ESTANDE DE DIVULGAÇÃO DAS AÇÕES REALIZADAS EM BENEFÍCIO DA BACIA, O CBHSF PARTICIPOU DE MESAS DE DEBATES, NAS QUAIS DEFENDEU UMA MELHOR GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS DO PAÍS. NA OPORTUNIDADE, O PRESIDENTE DA ENTIDADE, ANIVALDO MIRANDA, DEBATEU O TEMA “COMITÊ: INDUTOR DA GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS”. JÁ O VICE-PRESIDENTE DO CBHSF, WAGNER SOARES COSTA, FOI UM DOS DEBATEDORES DA CONFERÊNCIA SEGURANÇA HÍDRICA COMO BASE PARA O DESENVOLVIMENTO.
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Foto: Ricardo Follador
m meio à instalada crise hídrica que castiga o País, a busca por uma melhor gestão das águas norteou a pauta da 17ª edição do Encontro Nacional de Comitês de Bacias Hidrográficas. Já na abertura do even-
to, o coordenador do Fórum Nacional de Comitês de Bacia Hidrográfica do Brasil (FNCBH), Affonso Henrique de Albuquerque, alertou para a necessidade de se fazer a tão sonhada gestão sustentável, compartilhada e participativa das águas do Brasil, até então
pouco efetivada, de acordo com a Lei federal nº 9433/97, conhecida como Lei das Águas. “Não podemos pensar nesse trabalho sem os comitês de bacias, que são a base da pirâmide sobre a qual se ergue o Sistema Nacional de
Recursos Hídricos. Se o papel deles não for amplamente reconhecido, as chances de vencermos a batalha da crise hídrica estarão seriamente comprometidas”, lembrou. Na ótica do diretor-presidente da Agência Nacional de Águas (ANA), Vicente Andreu, a crise tem propiciado um grande aprendizado no que tange à melhoria do processo de gestão das águas. “Constatamos fragilidades dos nossos recursos hídricos diante de eventos climáticos extremos, das mudanças nos padrões de consumo de água da população ou até mesmo da persistência da discussão da dupla dominialidade das águas superficiais do
ANIVALDO MIRANDA NA DIRETORIA DO ENCOB Foi de maneira histórica que terminou a eleição para a diretoria do Encob, referente ao biênio 2016/2018. Pela primeira vez, duas chapas concorrentes se uniram em prol dos organismos de bacia, elegendo dois coordenadores e dois coordenadores adjuntos, entre eles, o presidente do CBHSF, Anivaldo Miranda, que assume uma das vagas de coordenador adjunto. “Esse fórum precisa ser reconhecido, ter voz neste país. Precisamos ser uma organização atuante, que lute pela gestão democrática dos recursos hídricos do Brasil”, conclamou Miranda. Além dele, foram empossados Luiz Carlos Souza Silva (coordenador), Affonso Henrique Albuquerque Jr. (coordenador) e Leonice Lotufo (coordenadora adjunta), que também de forma inédita se tornou a primeira mulher a ocupar um cargo de diretoria no Encob.
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NOTÍCIAS DO SÃO FRANCISCO
COMITÊ DEFENDE NOVOS RESERVATÓRIOS
Foto: Leandro Nascimento
Durante o encontro, o presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, Anivaldo Miranda, voltou a criticar a forma como os recursos hídricos vêm sendo geridos no País. “Não dá pra falar seriamente em gestão de recursos hídricos, se não tivermos sistemas confiáveis de outorga de água ou se não resolvermos as questões relacionadas à dominialidade das águas; se a exploração de água continuar sendo feita de forma clandestina ou, ainda, se não tivermos cobrança e planos de bacia concluídos. Portanto, se queremos falar em gestão de recursos hídricos, devemos realmente aplicar a nossa lei”, disse, em alusão à Lei federal nº 9.433/97, conhecida como Lei das Águas. Para isso, Miranda reafirmou que os comitês precisam, de fato, passar a existir, e, assim, deixarem de ser encarados erroneamente como
organizações não governamentais. “Eu não tenho dúvida de que os comitês são os grandes atores da gestão dos recursos hídricos. Eles são espaços de discussão e construção de convergências. A própria lei defende que os comitês são a porta de entrada dos conflitos pelo uso da água. Os comitês só não dão as outorgas. Fora isso, todas as atribuições de gestão são feitas por eles”, frisou. Em sua fala, o vice-presidente do CBHSF, Wagner Soares Costa, defendeu a construção de novos reservatórios que beneficiem os usos múltiplos da bacia do São Francisco, indo no sentido contrário das atuais represas instaladas ao longo do rio, que prezam apenas pela geração de energia. “Precisamos trabalhar com reservatórios que façam a retenção de chuvas, para que em períodos de escassez amenizem a situação dos usos múltiplos”, alertou Costa, cuja fala ganha força quando o mais importante reservatório do rio São Francisco, Sobradinho, na Bahia, vive o pior momento de sua história no armazenamento hídrico.
CURTAS CCR DO ALTO LANÇA FOLDER EDUCATIVO Um material informativo denominado Educação Ambiental: nascente da mudança ecológica foi lançado pela Câmara Consultiva Regional (CCR) do Alto São Francisco, instância do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco em Belo Horizonte (MG). Ilustrada com imagens e gráficos, a publicação – fruto de uma parceria com o Rotary Club – explica o que é o Comitê do São Francisco e como ele é composto, além de abordar a divisão fisiográfica da bacia. O folder também traz explicações sobre o Dia Nacional em Defesa do Velho Chico, instituído pelo Comitê e comemorado em toda a bacia no dia 3 de junho.
PERNAMBUCO OFICIALIZA COMEMORAÇÃO Iniciativa do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, o Dia Nacional em Defesa do Velho Chico, comemorado a cada 3 de junho, agora integra o calendário oficial do estado de Pernambuco, de acordo com proposição aprovada por unanimidade pela Assembleia Legislativa do Estado. O projeto, de autoria do deputado Lucas Ramos (PSB), já foi sancionado pelo governador pernambucano, Paulo Câmara (PSB). Com isso, o governo estadual poderá propor e inserir atividades junto a escolas e outros segmentos da sociedade, na data dedicada à preservação do São Francisco.
NOVO SUPERINTENDENTE DA CODEVASF O coordenador da Câmara Consultiva do Médio São Francisco, Cláudio Pereira, reuniu-se no dia 10 de outubro com o engenheiro Prudente José de Morais, novo superintendente regional da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), com sede em Bom Jesus da Lapa (BA). Na ocasião, Pereira apresentou os projetos e as ações de revitalização realizadas pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco. Ex-deputado e prefeito (por dois mandatos) do município de Santa Maria da Vitória, no oeste baiano, Morais iniciou no final de setembro o seu trabalho à frente da 2ª Superintendência Regional da Codevasf.
COMITÊ NO CANAL CURTA COMUNICAÇÃO APRESENTA PROGRAMA A assessora de Comunicação da ANA, Claudia Dianni, e a coordenadora do Programa de Comunicação do CBHSF, Malu Follador, participaram como palestrantes do 9º Seminário de Comunicação e Sociedade, que abriu a programação do Encob. Na ocasião, Malu Follador apresentou as ações da empresa que dirige, a Yayá Comunicação Integrada, voltadas para a divulgação institucional do CBHSF, seus projetos e suas iniciativas em prol da revitalização do rio, através de produtos informativos (jornais, boletins, revista, site), assessoria de imprensa e redes sociais. Entre as ações do programa de comunicação, destaca-se a divulgação da campanha pelo Dia Nacional em Defesa do Velho Chico, realizada anualmente no dia 3 de junho e que alcançou uma enorme mobilização em torno do mote “Eu viro carranca para defender o Velho Chico”.
O Canal Curta apresentou para todo o País, de 22 a 25 de outubro, o programa Bacias Hidrográficas, da série Brasil 2050, em que o CBHSF tem participação especial. Ações de revitalização na bacia do São Francisco, como obras hidroambientais e gerenciamento dos recursos advindos da cobrança pelo uso das águas, são alguns dos temas do programa, que contou ainda com a participação da AGB Peixe Vivo, agência delegatária do Comitê. O programa é uma realização da Miração Filmes em parceria com o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável. As entrevistas foram gravadas nos meses de julho e agosto deste ano, na região do Alto São Francisco, em Minas Gerais.
Foto: Wilton Mercês
Brasil, a fim de que se evitem conflitos entre os estados ou usuários”, explicou.
PERFIL Foto: Delane Barros
Foto: Delane Barros
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PESAR PELA MORTE DO RIO
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articipante da consulta pública que aconteceu no município de Pão de Açúcar, em Alagoas, a ex-secretária de Cultura do município, Leda Lins, tem uma profunda relação com o rio São Francisco. “É imprescindível a sua revitalização”, opinou ela durante o evento, realizado como parte do processo de atualização do Plano de Bacia do Velho Chico. Natural de Maceió (AL), Leda sempre esteve perto do São Francisco e da cultura ribeirinha. Aos 66 anos, recorda com carinho das viagens que fazia com a mãe para Pão de Açúcar, cidade banhada pelo Velho Chico, no Alto Sertão de Alagoas. Os deslocamentos eram feitos para compra de produtos no estado vizinho, Sergipe, e revenda no território alagoano. Dessas viagens, Leda se lembra especialmente de uma em que houve um acidente com a embarcação que levava sua família até o lado sergipano. “O pequeno barco afundou e foi um momento de muita angústia. Mas ninguém morreu”, relata. Nesse momento, a ex-secretária faz uma comparação dos tempos passados com o quadro atual. “Hoje, vemos o rio morrendo, é possível atravessá-lo a pé, de uma margem a outra, praticamente”, descreve com lágrimas nos olhos, defendendo a necessidade de ações de conscientização das crianças ribeirinhas para manter e preservar o rio. “Porque as crianças têm um imenso poder sobre os adultos”, justifica.
Na cidade alagoana de Pão de Açúcar, o início da segunda etapa das consultas públicas
PÃO DE AÇÚCAR SEDIA CONSULTA PÚBLICA
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processo de atualização do Plano de Recursos Hídricos da Bacia do Rio São Francisco, iniciativa do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, prossegue com uma segunda etapa de consultas públicas nas diversas regiões fisiográficas, de acordo com o planejamento da Nemus, empresa contratada por licitação para executar os serviços. Nesta segunda fase, a primeira consulta foi realizada no dia 15 de outubro, no município alagoano de Pão de Açúcar, lotando o auditório da Faculdade São Vicente de pescadores, agricultores, donas de casa, vereadores e representantes do Executivo municipal. Representante da Nemus, o engenheiro Emiliano Santiago conduziu o evento, iniciado com uma explanação sobre as diversas fases do trabalho. “Realizamos mais de 100 entrevistas em órgãos públicos e recorremos a mais de uma centena de publicações na imprensa para traçar a radiografia do rio na atualidade”, explicou ao público. “E
constatamos aumento da demanda e redução da oferta”, disse. Santiago destacou como exemplo desse desequilíbrio entre oferta e procura a redução da vazão do rio, que caiu de 1.850 metros cúbicos por segundo (m³/s), no ano 2000, para os atuais 900 metros cúbicos por segundo (m³/s), em virtude da crise hídrica que atinge várias partes do País. “Além disso, a qualidade da água baixou nos últimos anos”, garantiu o engenheiro, observando que alguns segmentos retiram mais água do que está estabelecido nas outorgas. O secretário executivo do Comitê, Maciel Oliveira, destacou o caráter democrático na construção do documento e ressaltou a preocupação do Colegiado com a preservação e recuperação do rio. “Os recursos arrecadados a partir da cobrança pelo uso da água são aplicados novamente na bacia, a fim de manter a sua recuperação”, considerou. Membro do Colegiado, Jackson Borges explicou que a realidade do Velho Chico não permite maior retirada de água, motivo pelo
qual a população se levanta contra o projeto da transposição das águas do São Francisco.
CONSULTA POPULAR Desde o início de 2015, a Nemus realizou outras atividades com o objetivo de envolver a comunidade no trabalho de atualização do Plano. No total, foram realizadas 12 consultas públicas (três em cada região fisiográfica), além de oficinas setoriais, divididas por segmentos, entre os quais comunidades tradicionais; hidroeletricidade, navegação, pesca, turismo e lazer; indústria e mineração; agricultura; e saneamento. De acordo com Emiliano Santiago, foram contabilizados mais de dois mil participantes nas atividades. O Plano de Bacia do Velho Chico traça as diretrizes de aproveitamento integrado da água para os próximos dez anos, conforme estabelece a Lei federal n.o 9.433/97, a chamada Lei das Águas, e representa o instrumento técnico e político da bacia, após aprovação pelo Comitê.
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NOTÍCIAS DO SÃO FRANCISCO
Foto: Divulgação
Foto: Delane Barros
FLUVIAIS
STAND UP PADDLE NO VELHO CHICO Direc definiu metas do Comitê para 2016
MAIS 38 MUNICÍPIOS GANHARÃO PLANOS DE SANEAMENTO BÁSICO
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Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco deverá contemplar 38 novos municípios com planos de saneamento básico em 2016. A decisão foi tomada na última reunião da Diretoria Colegiada (Direc), realizada no dia 23 de outubro, no escritório do colegiado, em Maceió (AL). A ordem de prioridade será definida de acordo com alguns critérios, a exemplo dos municípios mais próximos do rio e aqueles que lançam esgoto sem tratamento diretamente no Velho Chico. O secretário executivo do Comitê, Maciel Oliveira, informou que devem ser investidos mais de R$ 8,5 milhões nessa rubrica. Apesar de ter sido inserido no planejamento orçamentário para 2016, caberá à plenária do Colegiado referendar ou não a proposta. “O edital para essa contratação será lançado no início do próximo ano”, explicou Maciel. Até agora, o Comitê realizou e entregou planos de saneamento básico para 16 municípios localizados nas diferentes regiões fisiográficas. Foram concluídos e entregues seis planos de saneamento básico na região do Alto São Francisco, no total de R$ 1,2 milhão; outros três no Submédio, que somam R$ 750 mil; e mais sete no Baixo São Francisco, com desembolso de R$ 1,2 milhão. O investimento total do Comitê na elaboração desses docu-
mentos é de R$ 3,1 milhões. Também estão em execução outros nove planos, que devem ser concluídos até janeiro do próximo ano e, juntos, somam quase R$ 2 milhões. A diretoria do CBHSF tem priorizado oferecer os planos de saneamento para os municípios que demonstram interesse na elaboração do documento e não têm condições de construí-lo por conta própria. O ganho com a iniciativa é o combate ao lançamento de esgotos no rio, conforme destaca o presidente do Comitê, Anivaldo Miranda.
ORÇAMENTO Para 2016, o Comitê terá um orçamento aproximado de R$ 135 milhões. “Prioritariamente, o dinheiro será aplicado na realização de projetos hidroambientais, planos municipais de saneamento básico e em diversos outros programas inseridos no Plano de Aplicação Plurianual (PAP)”, informa Maciel Oliveira. Também na pauta da última reunião, a Direc recebeu a proposta de alteração no Regimento Interno. A modificação altera o funcionamento de algumas câmaras técnicas que integram a estrutura de funcionamento do CBHSF. O assunto, porém, só será definido na reunião plenária, a última de 2015, que acontece em dezembro na capital baiana.
Um grupo de 21 amigos da cidade de Salvador (BA) escolheu como cenário o rio São Francisco para praticar stand up paddle. Parte da equipe já havia percorrido o rio em 2014 e este ano juntou-se a outras pessoas que tinham o objetivo de experimentar as águas do rio e desfrutar das belezas naturais e da culinária do povo ribeirinho, já que até então só remavam nos mares. A viagem pelo São Francisco foi dividida em dois dias, com percurso de 15 quilômetros/dia, saindo da Marina do Vale, no Iate Clube de Petrolina (PE), e chegando em Lagoa Grande, também em Pernambuco. No caminho, o grupo aproveitou para doar cerca de 200 kits com roupas e brinquedos para as crianças que moram às margens do rio.
INVENTÁRIO CULTURAL DO RIO Um trabalho realizado durante três anos por uma equipe do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais, em parceria com a Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes) e o Ministério Público do Estado, possibilitou o levantamento dos lugares, celebrações, formas de expressão, saberes e fazeres mais representativos para as comunidades ribeirinhas do rio São Francisco. Para fazer o inventário, os responsáveis percorreram 17 cidades mineiras, partindo de Pirapora, com destino a Manga. O resultado foi a publicação Caderno do Patrimônio Imaterial: Inventário Cultural do Rio São Francisco, lançada no mês de outubro, em Belo Horizonte (MG).
QUEIJO CANASTRA PARA EXPORTAÇÃO Produtores rurais da fazenda Instância Capim, em São Roque de Minas (MG), receberam o primeiro registro de queijaria artesanal na região da Serra da Canastra com adesão ao Sistema Brasileiro de Inspeção de Produtos de Origem Animal (Sisbi/POA), obtido por meio do Programa de Apoio à Regularização da Agroindústria Familiar de Pequeno Porte. O documento foi concedido pelo Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA) e regulariza a produção do queijo Canastra, permitindo, inclusive, que os produtores exportem o produto. Em todo o estado de Minas Gerais, mais de 100 queijarias estão em processo de regularização para obter o mesmo registro.
BALNEABILIDADE EM ALAGOAS Uma equipe da Gerência de Laboratório do Instituto do Meio Ambiente (IMA) colheu amostras de água de praias do litoral norte e do litoral sul de Alagoas, no intuito de verificar a qualidade dos recursos hídricos da região até a foz do rio São Francisco e, com isso, produzir o relatório de balneabilidade que indica os trechos próprios e impróprios para banho na região costeira do estado. O monitoramento será feito semanalmente, nos trechos entre as cidades de Piaçabuçu e Penedo, e também na região da foz. Um dos objetivos da medida é atrair cada vez mais turistas para essas regiões, atendendo à Resolução nº 274 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), que define os critérios de balneabilidade em águas brasileiras.
ENTREVISTA
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LEONICE DE SOUZA LOTUFO
Foto: Acervo Pessoal
FÓRUM GANHA UM OLHAR FEMININO
PRIMEIRA MULHER A COMPOR A DIRETORIA DO FÓRUM NACIONAL DE COMITÊS DE BACIAS HIDROGRÁFICAS, LEONICE DE SOUZA LOTUFO FALA NESTA ENTREVISTA EXCLUSIVA SOBRE OS PROPÓSITOS DA ENTIDADE E AS PERSPECTIVAS QUE PODERÃO TRAZER UM OLHAR FEMININO À SUA NOVA ADMINISTRAÇÃO. PARA ELA, FAZ-SE NECESSÁRIO CRIAR MOTIVAÇÕES QUE AMPLIEM AS PARTICIPAÇÕES DE TODOS OS SEGMENTOS QUE COMPÕEM UM COMITÊ, INCLUINDO A PROMOÇÃO DE CURSOS COM TEMAS MAIS AVANÇADOS, ALÉM DOS BÁSICOS.TAMBÉM DEFENDE A IMPORTÂNCIA DO ENVOLVIMENTO DA IMPRENSA NA DIVULGAÇÃO DAS AÇÕES EXITOSAS EM RELAÇÃO À GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL.
A senhora foi a primeira mulher a assumir uma das vagas da Coordenadoria do Fórum Nacional de Comitês de Bacias Hidrográficas. O que muda com isso? Creio que, com o tempo, ocorrerão muitas mudanças. O tempo fará muitas mudanças, vai mudar o olhar, a forma de ver as coisas, de pensar... Nós, mulheres, somos mais coração do que razão. Essas mudanças vêm acontecendo paulatinamente, pois muitas mulheres já estão nos comandos dos Comitês de Bacias Hidrográficas e a percepção é de uma postura mais social e coletiva. Como dizem algumas das nossas guerreiras da água, a água é feminina e ninguém melhor que a mulher para compreender os caprichos da natureza. Historicamente, a mulher administra o lar pensando no coletivo, na família. Podemos usar essa experiência para cuidar do nosso líquido precioso, que é a água. Também de forma inédita, duas chapas concorrentes se uniram em prol dos organismos de bacia do Brasil. Como a senhora enxerga essa nova composição? É uma nova composição para o Fórum, mas a gestão das águas já é feita dessa forma. Já existe uma gestão compartilhada, participativa, integrada e descentralizada. A bacia geralmente é composta de mais de uma unidade federativa, estadual e municipal, a exemplo da bacia do São Francisco ou do rio Paraguai, onde os estados e municípios compartilham suas estratégias de administrar por consenso, com respeito e crescimento mútuo, levando em consideração as características regionais, culturais etc. É o que acontece entre Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, para cuidar do nosso Pantanal, uma bacia transfronteiriça, de interesse internacional. Esse modelo funciona, desde que seja realmente democrático.
Muitas críticas vêm sendo feitas à metodologia da programação do Encob, que, segundo os comitês de bacias, encurta sua participação e fala. Há pretensão de mudar esse panorama? Tornar as demandas dos comitês mais efetivas? Essa é uma verdade já identificada nos últimos eventos. Faz-se necessário criar motivações para ampliar a participação de todos os segmentos que compõem um comitê. Observa-se a oportunidade de promover cursos com temas mais avançados, além dos básicos. Sentimos falta, também, de um tempo para que os estados que compartilham bacias e ainda não contam com seus CBHs possam se articular, expressar interesses comuns, partilhar ansiedades, perceber que têm os mesmos problemas administrativos e buscar soluções com apoio coletivo. Precisamos lembrar sempre que não podemos lutar sozinhos, a nossa união nos dá força e aprendizado. Saliento que as experiências exitosas são um ponto alto dos nossos encontros. Em sua fala, o presidente do CBHSF, Anivaldo Miranda, destacou que os comitês de bacias são a base da
"ACREDITO QUE A IMPRENSA É A JANELA QUE DARÁ VISIBILIDADE À GESTÃO, CUMPRINDO TAMBÉM UM PAPEL IMPORTANTE PARA A EDUCAÇÃO E A MUDANÇA DE HÁBITOS DA POPULAÇÃO".
pirâmide da gestão de recursos hídricos do País. A senhora concorda com essa afirmação? Não vejo o Sistema de Gerenciamento de Recursos Hídricos, nem estadual nem federal, como uma pirâmide, mas, sim, como um círculo, onde cada entidade tem o seu papel e a sua importância. Nenhum órgão ou colegiado é mais importante que outro. Precisamos do “macro e do micro”, do poder federal e do estadual, das grandes empresas e também dos representantes municipais, além dos pequenos produtores, usuários e da sociedade local. Um depende do outro, para que a gestão seja efetiva e realista. Em Mato Grosso, trabalhamos muito com a sociedade local e o poder público municipal, de onde deve vir a força do Comitê, mas, com certeza, o CBH é a base da democracia da gestão integrada, descentralizada e participativa da bacia. O que falta para que esse Fórum se torne reconhecido e atuante na luta pela gestão democrática dos recursos hídricos do Brasil? O apoio da imprensa. Tivemos o Encob em Caldas Novas e pouco se ouviu falar ou foi transmitido para a população sobre o evento e as temáticas discutidas. Entretanto, a crise e a falta de água ou eventos catastróficos são notícias massificadas pela mídia. Acredito que a imprensa é a janela que dará visibilidade à gestão, cumprindo também um papel importante para a educação e a mudança de hábitos da população. Ela é capaz de sensibilizar e mobilizar novos integrantes para os comitês de bacias. A gestão das águas é notícia boa, agrada a todos, e informação é primordial para a qualidade de vida. A importância da água deve ser discutida. O caos do dia a dia tende a piorar, se não houver mudanças na educação e na cultura do desperdício, que contribui para a crise hídrica. Isso tem que mudar, e precisamos da imprensa para nos dar voz.