Revista CHICO nº11 - Setembro de 2022

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11 REVISTA DO COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO - SETEMBRO 2022

Expediente

Presidente : José Maciel Nunes de Oliveira Vice-presidente : Marcus Vinícius Polignano Secretário : Almacks Luiz Silva

Produzido pela Assessoria de Comunicação do CBHSF, Tanto Expresso Comunicação e Mobilização Social

Coordenação-geral : Paulo Vilela, Pedro Vilela e Rodrigo de Angelis

Coordenação de comunicação : Mariana Martins Edição : Karla Monteiro

Assistente editorial: Luiza Baggio

Textos : Andreia Vitório, Deisy Nascimento, Hylda Cavalcante, Juciana Cavalcante, Karla Monteiro, Leonardo Ramos, Luiza Baggio, Mariana Martins e Maurilo Andréas

Projeto gráfico: Márcio Barbalho

Diagramação : Márcio Barbalho e Rafael Bergo

Fotos: Acervo pessoal Antônio Jackson, Agência Brasil News, Arquivo pessoal Ivete Sangalo, Arthur Nicolato, Arthur Soares, Azael Góis, Bianca Aun, Fernando Piancastelli, Flávio Charchar, Kell Dourado, Leo Boi, Leonardo Ramos, Marcizo Ventura, Michelle Parron, Miguel Aun, Ricardo Cansado, Robson Oliveira, Rodrigo Ferreira, Shutter Stock.

Foto capa: Emerson Leite

Ilustrações : Albino Papa, Clara Valente, Priscila Amoni e Rafaela Ianni

Revisão : Isis Pinto

Impressão : ARW Gráfica e Editora

Tiragem : 3500 exemplares

DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

Direitos Reservados. Permitido o uso das informações desde que citada a fonte.

Secretaria do Comitê : Rua Carijós, 166, 5º andar, Centro - Belo Horizonte - MG CEP: 30120-060 - (31) 3207-8500 secretaria@cbhsaofrancisco.org.br

Atendimento aos usuários de recursos hídricos na Bacia do Rio São Francisco: 0800-031-1607

Assessoria de Comunicação: comunicacao@cbhsaofrancisco.org.br

SUMÁRIO

5 Editorial Tempo analógico 6 Páginas Verdes “Não
temos mais tempo para desperdiçar”
10 Meio Ambiente Um Belo Horizonte em questão 16 Marco Hídrico Bem comum? Instagram: Instagram.com/cbhsaofrancisco Facebook: Facebook.com/cbhsaofrancisco Publicações On-line: issuu.com/cbhsaofrancisco Vídeos: youtube.com/cbhsaofrancisco Fotos: flickr.com/cbhriosaofrancisco Podcasts: soundclound.com/cbhsaofrancisco Acesse o site do CBHSF Utilize o seu celular e acesse o QR Code www.cbhsaofrancisco.org.br Acesse os conteúdos multimídia do CBH São Francisco: Online english version: bit.ly/Chico-Magazine-11
22 Perfil O Velho do Chico 26 Cultura A célebre filha do São Francisco 30 Mulheres Cursos d´água 36 Cultura Foco no Cerrado 40 Turismo Diversão e Arte 44 Expedição Paracatu 52 Ensaio 50 Aconteceu
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ANALÓGICO

A primeira CHICO de 2022 chega repaginada, com projeto gráfico ainda mais inovador. Nosso intento é proporcionar ao leitor, além de informação de qualidade, uma experiência visual. Nos dias atuais, passamos a maior parte das horas em frente a telas, seja do celular ou do computador. Uma revista em papel, com fotografia caprichada e design contemporâneo, torna-se um agradável suspiro no corre-corre do dia a dia.

Nesta edição, ilustrada por Priscila Amoni, Rafaela Ianni e Clara Valente, as mulheres são protagonistas. O debate sobre a representação feminina na gestão das águas ocupa hoje lugar de destaque na agenda internacional para o desenvolvimento sustentável. No Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco (CBHSF), elas já são cerca de 40% dos membros do plenário.

Além de ficar por dentro deste contemporâneo debate, nas próximas páginas, você vai entender os riscos do novo marco hídrico e conhecer a luta dos moradores de Belo Horizonte contra um gigantesco projeto de mineração na Serra do Curral.

Para as Páginas Verdes, entrevistamos o jornalista Sérgio Xavier, integrante do Centro Brasil no Clima e articulador da iniciativa Governadores no Clima. Ele explica porque devemos nos preocupar - e muito - com o futuro.

Tem mais: Ivete Sangalo em Juazeiro, um festival tecnológico na mineira Vila de Santa Bárbara, os segredos da paradisíaca Ilha do Ferro e os casos e acasos do Velho do Rio.

Boa Leitura!

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TEMPO Editorial Arte: Clara Valente

Páginas verdes

“NÃO TEMOS MAIS TEMPO PARA DESPERDIÇAR”

O alerta é de Sérgio Xavier, articulador do Centro Brasil no Clima (CBC) e responsável pelo desenvolvimento do Projeto HidroSinergia, um Laboratório de Inovação e Soluções Sustentáveis para o Semiárido. Em entrevista à revista CHICO, ele detalha o preocupante panorama da questão climática no Brasil. Além disso, discorre sobre a possibilidade de uma economia inclusiva e regeneradora. Segundo Xavier, é preciso agir. E agir rápido.

Por Karla Monteiro Ilustração: Albino Papa
6 Arquivo Pessoal

Como traduzir a questão climática e por que precisamos falar dela?

O clima equilibrado é a condição mais fundamental para o funcionamento das sociedades humanas. A agricultura, as cidades, a economia e as nossas vidas não suportam tempestades extremas, secas intermináveis, extinção de espécies e a quebra dos ciclos biogeoquímicos naturais, como o ciclo das águas, que abastecem as bacias hidrográficas, e o ciclo de carbono, que mantém a temperatura global em níveis adequados para sustentar a biosfera, onde vivemos de forma inseparável com inúmeras outras espécies. Portanto, tratar de mudanças climáticas é tratar de estratégias para assegurar o futuro da humanidade.

Quais as principais barreiras para que possamos avançar na busca por soluções? Como enfrentar esse problema?

Neste momento, o negacionismo climático, a ignorância de líderes políticos e o desmonte de políticas públicas ambientais são os fatores mais preocupantes. O Brasil está destruindo suas mais valiosas riquezas naturais e perdendo a oportunidade de liderar a emergente economia verde do século 21, baseada em energias renováveis e ativos ambientais, como florestas vivas, agricultura ecológica, bacias hidrográficas saudáveis, cidades despoluídas e o novo mercado de captura de carbono, fundamental para conter o aquecimento global que provoca as mudanças climáticas. Com escolas de sustentabilidade e políticas públicas sintonizadas com a ciência é possível gerar empregos e negócios sustentáveis, reduzir a pobreza e acelerar a transição da velha economia degradadora para uma desejável economia inclusiva e regeneradora.

Quando pensamos nos recursos hídricos, e em especial no Rio São Francisco, quais são as principais consequências do descaso com o tema e o que pode ser feito para melhorar esse cenário?

As consequências da crescente degradação do Rio São Francisco são trágicas. Significam futuros colapsos no abastecimento de água, na geração de energia, irrigação, navegação, pesca, turismo, além da inaceitável perda de inúmeras espécies essenciais para o equilíbrio natural da bacia. As soluções, que precisamos com urgência, são possíveis e conhecidas, a começar pelo famoso plano de revitalização, que nunca avançou, apesar dos esforços e das cobranças do ativo CBHSF. Além da revitalização, com obras de saneamento e reflorestamentos, é fundamental formular políticas públicas que impulsionem eixos econômicos que possam, simultaneamente, gerar empregos sustentáveis, fomentar empresas verdes e contribuir com a regeneração hidroambiental. Para estudar potencialidades e acelerar ações nesse sentido, o Projeto HidroSinergia, que envolve o Centro Brasil no Clima (CBC), o Instituto Clima e Sociedade (ICS) e outros diversos parceiros está articulando a criação do Lab de Economia Regenerativa do São Francisco, em Paulo Afonso (BA), nas fronteiras de Alagoas, Sergipe, Bahia e Pernambuco.

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Há boas ações brasileiras que merecem ser destacadas?

Como é hoje essa força-tarefa em prol do clima no Brasil?

Sim. Existem muitas iniciativas interessantes, em múltiplos setores, entretanto, falta um macroplanejamento estratégico para interconectar inúmeras ações, fontes de conhecimento, recursos, instrumentos de gestão, políticas públicas, tecnologias e forças empreendedoras para promover um movimento transformador em larga escala. Hoje, os processos econômicos degradadores prevalecem e os modelos regeneradores estão ainda em tímida e lenta construção. Não temos mais tempo para desperdiçar.

Como aproximar a questão climática do dia a dia do brasileiro?

Água, saneamento, habitação segura, arborização, energia e ar puro são faces do meio ambiente, absolutamente essenciais às nossas vidas, que passam despercebidas se não estivermos atentos e conscientes. Mas as tragédias climáticas, cada ano mais frequentes, começam a acender alertas na percepção da sociedade.

Um dos maiores desafios para mudar essa realidade é despertar e capacitar as pessoas para uma visão sistêmica, para perceberem as conexões entre conservação ambiental e qualidade de vida, saúde, empregos sustentáveis, justiça climática, moradia digna, democracia, educação e economia forte. Sistema educacional e jornalismo profissional são fundamentais nesse processo evolutivo do conhecimento e que devem considerar o protagonismo local.

Qual futuro está se desenhando hoje, no que diz respeito à questão climática no país e sua relação com energia, agronegócio e consumo excessivo? Há algo sendo feito no mundo que possamos incorporar aqui?

O Brasil, que já se destaca no cenário internacional com a sua alta capacidade agropecuária e seu enorme patrimônio ecológico, tem todas as condições para desenvolver modelos de biogovernança e bioeconomia, por bioma e bacia hidrográfica, para serem referência e esperança para o mundo. Biogovernar é gerenciar múltiplos processos sociais-culturais-econômicos-políticos-ambientais, com visão sistêmica, em plena sintonia com a conservação da vida em cada ecossistema. Fomentar uma bioeconomia é construir processos econômicos - agroflorestais, energéticos, hídricos, logísticos, industriais e comerciais, circulares e regenerativos - integrados aos ciclos naturais. Ou seja, em vez de incorporar modelos de fora, o Brasil pode ser uma poderosa inspiração para o mundo, baseando-se na sua cultura de mestiçagem, mesclando ciência e sabedoria comunitária, e aproveitando as forças da sua própria natureza.

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UM BELO HORIZONTE EM QUESTÃO

Extrapolando as fronteiras de Minas Gerais, uma intensa mobilização popular pode derrubar projeto de mineração na Serra do Curral. Nas montanhas mineiras, concentram-se as nascentes dos principais afluentes do Velho Chico

Meio ambiente 10
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Nos últimos meses, a Serra do Curral, cadeia de montanhas que cerca Belo Horizonte, virou assunto nacional. Tudo começou na madrugada de 30 de abril. Exatamente às 3h14m, após 18 horas de reunião, o Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) concedeu à Taquaril Mineração S.A. (Tamisa) licença para instalar um complexo minerário na Serra do Curral, cartão postal da capital de Minas Gerais. Conforme a decisão do Copam, a empresa teria o direito de ocupar uma área de 101 hectares, o equivalente a 21 campos de futebol. A população, porém, se levantou contra o empreendimento, ganhando a atenção do país. Afinal a Serra do Curral é o contorno, a muralha que cerca a cidade. Ou seja: o Belo Horizonte.

“A opinião pública ficou em peso a favor da preservação da Serra do Curral”, comentou o arquiteto Roberto Andrés, uma das principais vozes do movimento “Tire o Pé da Minhas Serra”, que, da noite para o dia, juntou ativistas, movimentos sociais e artistas de projeção nacional em defesa do patrimônio local. “Criamos uma onda, que ultrapassou as fronteiras de Minas, tornando-se uma articulação nacional. O debate sobre a necessidade de se

preservar a Serra do Curral furou várias bolhas, com gente de todos os credos apoiando a nossa causa”.

As ações contra o empreendimento, aprovado por oito votos a favor e quatro contra, vieram mesmo de todos os lados. Nomes como Chico Buarque, Milton Nascimento, Gilberto Gil , Caetano Veloso, Samuel Rosa, Fernanda Takai, Paulo Betti e Renata Sorrah logo assinaram um manifesto pedindo ao governo de Minas Gerais a anulação do licenciamento concedido à Tamisa. Ademais, a carta reivindicava o tombamento estadual da Serra do Curral.

Ao mesmo tempo, a prefeitura de Belo Horizonte entrou com uma ação judicial também solicitando a cassação da licença, alegando risco geológico de erosão do Pico Belo Horizonte, risco à segurança hídrica e redução da qualidade do ar.

“Os movimentos ambientais e sociais já vinham, há mais de dois anos, trabalhando pelo tombamento da Serra do Curral, uma referência para os moradores da cidade.

A Serra guarda uma grande biodiversidade, com áreas de Mata Atlântica e campos rupestres”, disse o professor Marcus

Vinícius Polignano, secretário do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas) e vice-presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF). “Parte da Serra do Curral, onde fica o Pico Belo Horizonte, já tem o tombamento do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN – MG).

A fachada também é tombada pelo município. Mas a vertente que vai para Nova Lima não é tombada. E a Serra do Curral não pode ser dividida em pedaços, é um todo. Desde 2017, lutamos pelo tombamento integral”.

A direção da Tamisa discorda. Justamente por não haver o tombamento integral a licença concedida pelo Copam estaria dentro das normas, tendo percorrido o trâmite legal. Segundo a mineradora, o licenciamento foi aprovado “democraticamente”: “A Tamisa considera que a opinião de um grupo organizado, com interesses pessoais e políticos, que vem divulgando informações distorcidas sobre o projeto, não deve inviabilizar um empreendimento regular, em conformidade com a legislação, que beneficia toda a sociedade”, declarou.

A Serra do Curral é Patrimônio da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco)

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Robson Oliveira

Vai e vem

A questão do tombamento está no centro da polêmica. Segundo Polignano, no final de 2020, o estudo para embasar o tombamento ficou pronto, tendo sido aprovado pelo IEPHA. O governo do estado de Minas Gerais, no entanto, teria manobrado para adiar a votação final. E, ao mesmo tempo, supostamente acelerou os trâmites no Copam para liberar a licença para a Tamisa. Para Polignano, não por acaso todos os representantes do governo no Copam foram favoráveis ao empreendimento. O complexo minerário seria instalado no miolo da Serra do Curral, que, de acordo com o vice-presidente do CBHSF, é a parte mais nobre em termos de fauna e flora. Ao todo, a devastação atingiria 42 hectares de Mata Atlântica.

“Sem dúvida, o governo postergou o tombamento. O Conselho Estadual de Patrimônio não deixou a votação acontecer. O processo ficou mais de um ano suspenso”, concordou Roberto Andrés. “Enquanto isto, no Copam, a coisa foi célere”.

Conforme a Tamisa, porém, o Processo de Licenciamento Ambiental transcorreu “absolutamente regular” e fundamentado em estudos técnicos desenvolvidos ao longo de sete anos. Em meio ao debate e à troca de acusações, o governador de Minas Gerais assinou o decreto que reconhece a Serra do Curral como área de relevante interesse cultural de Minas Gerais. A medida deve acelerar o processo de tombamento. “A Serra do Curral será preservada. Temos dialogado para acelerar as ações com toda legalidade”, anunciou o governador pelo Twitter. O decreto abrange os municípios de Belo Horizonte, Sabará e Nova Lima.

“O governo do estado está jogando. Tudo jogo de cena”, disparou Roberto Andrés. “Nós, do movimento Tire o Pé da Minha Serra, detectamos dois movimentos. Primeiro, tentativa de reduzir o perímetro de tombamento, o que excluiria a área pleiteada pela Tamisa. O outro movimento é para dar autonomia para os municípios, o que é o contrário do princípio do tombamento”.

Já Polignano está mais otimista. “O jogo está sendo jogado. Nós fizemos uma grande mobilização entendendo que a Serra do Curral é patrimônio transgeracional. As próximas gerações têm o direito a este patrimônio”, disse. “A Assembleia Legislativa já começou as audiências públicas, com um projeto de emenda constitucional pelo tombamento integral. O governo Romeu Zema mudou de posição, ao assinar o decreto”.

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Bianca Aun Léo Boi Arthur Nicolato Exploração iniciada na década de 1970 gera danos até hoje

Minério X água

Enquanto isto, várias ações estão correndo na Justiça para caçar a licença concedida à Tamisa. O empreendimento gerou questionamentos do Ministério Público Federal, do Ministério Público Estadual, da Prefeitura de Belo Horizonte e até da Unesco. De acordo com o MPF, as licenças são nulas porque foram concedidas sem a consulta prévia, conforme determina a lei, à comunidade quilombola Mango Nzungo Kaiango, que reside na área de influência do complexo minerário. O quilombo é reconhecido pela Fundação Palmares desde 2007.

Para Polignano, a questão, na verdade, vai muito além da Serra do Curral. Cerca de 70% das águas que abastecem o Rio São Francisco proveem de afluentes com nascentes nas serras de Minas Gerais. “Serra da Canastra, Serra da Mantiqueira... todas elas possuem aquíferos importantes que recarregam os afluentes do São Francisco. O quadrilátero ferrífero é também um quadrilátero de aquíferos”, disse. Segundo ele, o solo poroso permite uma intensa absorção das águas das chuvas. “Estes aquíferos fornecem água para o Rio das Velhas, para o Paraopeba, entre outros rios importantes. O que nós temos visto é uma atividade exploratória de minério de forma abusiva e indiscriminada”.

Ou seja: lutar pela Serra do Curral é lutar pela água e pela sobrevivência do Velho Chico.
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Cartão postal de Belo Horizonte, a Serra do Curral é referência das famosas montanhas de Minas

Linha do tempo

30 de abril:

Conselho Estadual de Política Ambiental (COPAM) aprova o pedido de licenciamento da Taquaril Mineradora S.A. (Tamisa) para exploração de minério na Serra do Curral.

10 de maio:

Nasce o movimento “Tire o Pé da Minhas Serra”, unindo ativistas, movimentos sociais, artísticos e organizações da sociedade civil para lutar contra o projeto de mineração na Serra do Curral.

3 de maio:

Prefeitura de Belo Horizonte entra com ação na Justiça Federal para pedir a suspensão do licenciamento concedido à Tamisa. Na ação, a Procuradoria Geral do Município listou os inúmeros impactos para a capital mineira.

5 de maio:

A mobilização popular contra o empreendimento ganha adesões nacionais, com nomes importantes como Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Samuel Rosa, Fernanda Takai, Paulo Betti e Renata Sorrah.

14 de junho:

Após apoiar o empreendimento da Tamisa, governador Romeu Zema muda de opinião e assina decreto que reconhece a Serra do Curral como área de relevante interesse cultural de Minas Gerais.

21 de junho:

Ministério Público Federal (MPF) entra com mais uma ação civil pública contra o estado de Minas Gerais e a Tamisa.

11 de julho:

A justiça proibiu a mineração na Serra do Curral, até, pelo menos, a realização de uma audiência pública para discutir os impactos da atividade na região.

13 de julho:

A justiça mineira bateu um recorde. Em apenas oito minutos, o juiz Rogério dos Santos Abreu leu a ação de 24 páginas e suspendeu a proteção provisória da Serra do Curral.

26 de julho:

Conciliação na Justiça de MG suspende mineração na Serra do Curral até fim das discussões sobre o tombamento da Serra do Curral.

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BEM COMUM?

Projeto de lei que institui novo marco dos recursos hídricos abre brechas para a privatização da água, além de engessar a gestão do setor, podendo trazer sérios prejuízos para a população mais vulnerável

Por Hylda Cavalcante Ilustração: Albino Papa
Marco Hídrico 16

Ambientalistas, parlamentares, especialistas em recursos hídricos, acadêmicos e entidades diversas da sociedade civil tentam desarmar uma grande “bomba relógio” que foi montada no Congresso no final do ano passado. Trata-se do Projeto de Lei nº 4.546/21, do Poder Executivo, que institui uma Política Nacional de Infraestrutura Hídrica, revogando a atual legislação sobre o tema.

Na prática, o texto – que tramita na Câmara – atualiza as regras para exploração e prestação dos serviços hídricos no Brasil, mas está sendo visto como um “desmonte” da regulamentação existente hoje, deixando-a mais engessada, com aniquilamento das decisões obtidas com apoio da população. Além disso, retira da água o papel de “bem totalmente público” no país.

Elaborada pelo Ministério de Desenvolvimento Regional (MDR), a proposta vem sendo chamada pelo governo federal de “novo marco hídrico”, mas na avaliação de especialistas comprometidos com o setor, apresenta muitas falhas. Foi produzida sem discussão popular e tem, por trás, um problema que pode ser muito sério: a privatização da água. Prevê instrumentos para definir padrões de referência de consumo para os diversos setores da economia e usuários, além de máquinas e equipamentos, à semelhança do que acontece no setor elétrico.

Para o governo, a nova política demandará investimentos da ordem de R$ 40 bilhões até 2050, liberados por meio de parcerias entre Executivo federal e iniciativa privada. Além disso, favorecerá o “gerenciamento eficiente da água no Brasil”, principalmente em bacias críticas, e ampliará a participação da iniciativa privada no financiamento e na exploração das infraestruturas hídricas, como barragens e canais de água para usos múltiplos. Para acadêmicos, especialistas e representantes do setor, contudo, não é bem assim.

O principal instrumento da nova política serão os chamados Plano Integrado de Infraestruturas e Serviços Hídricos e o Plano de Gestão de Infraestrutura Hídrica. O primeiro terá de estabelecer um planejamento de infraestruturas e serviços hídricos ao longo de 30 anos – a ser elaborado pelo MDR em parceria com governos estaduais. Precisará apresentar um inventário nacional de todos os reservatórios disponíveis para os diversos usos da água (como geração de energia, irrigação e abastecimento urbano), adequálos à demanda atual e às necessidades futuras para que esses dados possam alimentar o Sistema Nacional de Informações sobre Infraestruturas e Serviços Hídricos. O segundo plano ficará responsável pelo gerenciamento de uso de cada infraestrutura hídrica do país e estabelecerá parâmetros de operação.

É aí que começa um dos grandes problemas, vez que um dos pontos mais polêmicos do PL está na criação, determinada no texto, da cessão onerosa. Da forma como se encontra a matéria, o detentor do direito de uso de um recurso hídrico (por exemplo, um açude ou lago) poderá cedê-lo a outro, mediante contrato e pagamento. E essa cessão será regulamentada e fiscalizada pelo órgão outorgante (União ou estado).

Enquanto a questão é vista como “perigosíssima” por profissionais do setor, o governo argumenta a necessidade de cessão onerosa como “uma forma econômica de otimizar o uso da água em situações de escassez, principalmente em locais sem condições de atender todas as demandas”. Outro item do PL que também tem levado a críticas é a mudança da responsabilidade para análise de planos de recursos hídricos de bacias de rios de domínio da União. A proposta retira o poder dos Comitês de Bacias federais, que atualmente são os que aprovam tais planos, e repassa a missão para o Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH).

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Mobilizações

Desde dezembro, mais de 100 entidades, organizações não-governamentais (ONGs) e personalidades diversas estão se mobilizando contra a matéria. Inicialmente, eles promoveram um abaixo-assinado em defesa da Lei nº 9.433/97, que estabeleceu a Política Nacional de Recursos Hídricos (em vigor atualmente) e pediram que a elaboração da proposta fosse debatida “de forma democrática, com transparência e tempo privilegiado para ser enviada ao Legislativo”. Mas não foi o que aconteceu.

“É uma reforma preocupante. A população corre risco”, alertou o geógrafo Wagner Ribeiro, professor de Geografia do programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental da Universidade de São Paulo (USP). Como se não bastassem as mudanças em si ele criticou o esvaziamento da possibilidade de diálogo com a população, já que será retirada dos Comitês de Bacias Hidrográficas a capacidade de intervenção.

“O Conselho Nacional de Recursos Hídricos, único órgão que será mantido, não tem representação dos estados brasileiros, ao contrário dos Comitês, formados também pela sociedade civil e pelos municípios que compõem cada bacia”, explicou. De acordo com Ribeiro, os brasileiros estão assistindo a uma grande centralização em gestão de água. Segundo ele, o que está em jogo “é a possibilidade de quem detém a outorga da água hoje poder oferecer o uso do recurso para quem pagar mais”.

O especialista lembrou que o modelo é um pouco parecido com o que foi adotado pelo Chile e tem sido objeto de muitas reclamações pela população daquele país. “Imagine uma situação de escassez. Só quem puder pagar mais vai garantir o acesso à água e obter o que está na própria Lei nº 9.433, que é a garantia da dessedentação humana e de animais”, ressaltou.

Ribeiro também viu como desconhecimento por parte dos elaboradores da proposta uma das justificativas de que a mudança vai proporcionar segurança hídrica às regiões mais deprimidas do semiárido. “Tomemos como exemplo uma empresa de bebidas, qualquer que seja. Ela tem uma necessidade fundamental de água e pode eventualmente pagar mais pela água que uma pequena prefeitura que não tenha capacidade de arrecadação e uma concessão de água”, afirmou.

“Essa prefeitura não vai conseguir concorrer com uma empresa dessa ordem. E poderemos vir a ter essa grande empresa captando água para manter sua produção de um lado, e de outro, uma população desassistida para o uso fundamental da água”, informou. “De um modo geral, a impressão de que o governo federal passa é que pretende repetir o que também foi feito com o marco do saneamento básico do país, elaborado sem participação democrática”, acrescentou.

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Parecer negativo

Em outra frente, um parecer elaborado por organizações técnico-científicas, inclusive representantes da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES), destacou que o processo de construção da proposta deveria ter sido mais participativo e que alguns pontos precisam ser devidamente aprofundados porque impactam na política atual de recursos hídricos.

“A cessão onerosa de direito de uso equivale a um mercado de água, pode criar profundas desigualdades no acesso à água e exigirá grande ação do Estado para sua regulação. Ou seja, impactará fortemente o processo de alocação da água e dificilmente trará os benefícios anunciados com o envolvimento da iniciativa privada”, enfatizou o documento.

Na mesma nota, as entidades acentuaram que “a experiência internacional evidencia sérias distorções dos mercados de água quando não há forte regulação do Estado; ou seja, além de aumentar sobremaneira o risco de desigualdade e injustiça no acesso à água (em função do poder econômico mais forte, assimetria de informações etc.), a cessão onerosa não diminuirá custos para a sociedade.

“A ABES reconhece a necessidade de melhorias na política e de implantação efetiva dos seus instrumentos de gestão em todo o território nacional, mas isso tem que acontecer com a construção das melhorias por todos os importantes atores do setor”, frisou o documento em outro ponto.

Nota dos Comitês de Bacias

O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), em conjunto com o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas) e outras mais de cem entidades divulgaram nota contrária à proposta. Na avaliação dessas entidades, o texto “foi elaborado de forma antidemocrática, uma vez que não passou por discussão em nenhuma instância dos Comitês de Bacias Hidrográficas federais e estaduais, tampouco no Conselho Nacional de Recursos Hídricos”.

Além disso, consiste num projeto “que impacta substancialmente a gestão das águas do país”. “Apresenta inconsistências técnicas e jurídicas por não apresentar regras claras que possam viabilizar as mudanças sugeridas, gerando preocupante insegurança por privilegiar o interesse privado em detrimento do interesse geral e público”, diz o documento.

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Deputados da base do governo que defendem o PL afirmaram que ele “resgata o papel dos recursos hídricos no desenvolvimento do Brasil”, conforme disse o deputado Evair Vieira de Melo (PP-ES). “A cada dia mais a gente percebe que, ao longo da história, a infraestrutura brasileira não levou em consideração o percurso, o circuito natural das nossas águas, assim mesmo como seu uso”, afirmou ele, para quem a proposta beneficia o semiárido, “que vai dispor de instrumentos para gerir as suas águas”.

O coordenador da Frente Parlamentar Mista em Prol do Semiárido, deputado General Girão (União-RN) é outro defensor da matéria. Para ele, as ações de infraestrutura e de governança previstas no novo marco legal são “uma oportunidade para a região Nordeste, que poderá ter um melhor gerenciamento das suas bacias, alavancando a produção agrícola”. “Além de termos o sol e o solo, temos e teremos as melhores condições logísticas para que a produção de alimentos possa escoar para os maiores mercados consumidores de alimentos do mundo”, afirmou.

Ex-ministro do Desenvolvimento Regional (deixou o cargo em abril para ser candidato ao Senado nestas eleições) e coordenador do grupo que elaborou o PL, Rogério Marinho, contesta as críticas e tem afirmado que a proposta é “moderna, indutora de investimentos para o setor e vai garantir segurança hídrica, principalmente nas regiões que mais sofrem com a falta de água”.

“Chegou a hora de modernizar essa legislação, trazê-la ao tempo presente, permitir que outros atores se associem nesse desafio, que é deste país e do mundo”, disse. O argumento dele é que o setor hídrico precisa de investimentos da ordem de R$ 40 bilhões até 2050, em projetos como construção de barragens, canais e adutoras. E o poder público não consegue suportar essa demanda sozinho. “Para cada R$ 1 investido no aumento da segurança hídrica, estima-se que R$ 15 são gerados em benefícios econômicos”, frisou.

A fala do ministro, no entanto, não convenceu os que acompanham há décadas a atual política. “É uma proposta que coloca em risco o direito humano fundamental de acesso à água. Se for aprovado, favorecerá o domínio das águas pela força da riqueza e aumentará a exclusão, afirmou o sociólogo da Universidade de Brasília e estudioso da gestão de recursos hídricos no Brasil, Fernando Siqueira.

Mudanças climáticas

Para o deputado Rodrigo Agostinho (PSBSP), que atua na Câmara no setor de Meio Ambiente, a proposta precisa ser rediscutida no Legislativo. “As mudanças climáticas vão fazer com que a gente tenha períodos de seca cada vez mais prolongados e de chuvas muito intensas cada vez maiores, como já estamos vendo. Vamos precisar ter um programa grande de recuperação das nascentes, recuperar áreas de mananciais que estão ocupadas, retirar as famílias que moram nessas áreas por meio de ações técnicas, sociais e programas habitacionais. E o PL, da forma como se encontra, é muito preocupante”, afirmou.

No âmbito da Comissão de Integração Nacional, Desenvolvimento Regional e da Amazônia da Câmara, o presidente, deputado João Daniel (PT-SE), já adiantou que trabalhará para que, ao menos no colegiado, a matéria não tramite de sopetão: vai ouvir os integrantes dos Comitês de Bacias Hidrográficas e órgãos gestores de recursos hídricos para saber mais detalhes sobre a polêmica. “Quero o tema bem debatido e tentaremos evitar que a ‘orientação política’ do governo para o meio ambiente, que tira a proteção das populações indígenas, dos posseiros e das comunidades tradicionais prevaleça nessa questão específica”, frisou.

O presidente do CBHSF, Maciel Oliveira, adotou o mesmo tom. “Esse projeto, na verdade, destrói tudo que foi construído nos últimos anos. É o caos. Todo o direito que a sociedade (comunidades, empresas, municípios e estados) tinha para decidir sobre o uso da água será jogado no lixo”, acentuou. De acordo com ele, o PL abre tantas brechas que um empresário rural, por exemplo, pode pedir uma outorga (direito de uso) de 80m³ de águas de determinado rio para uso próprio e ‘revender’ como bem quiser o excedente.

“Resgate”
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Regulamentação dos recursos hídricos no Brasil:

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Até 1970: o que existia no Brasil era um modelo de administração de recursos hídricos marcado por decisões centralizadas e verticais de comando e controle.

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A partir de 1980: houve uma evolução global apoiada por entidades como a Organização das Nações Unidas (ONU), o Banco Mundial e a União Europeia, que estabeleceu um consenso para a gestão de recursos hídricos, sob o princípio de que “a escassez e o mau uso da água doce são fatores de grande e crescente risco ao desenvolvimento sustentável do meio ambiente.”

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1988: a partir da discussão no país sobre a governança integrada das águas, ligada à governança ambiental, a Constituição Federal consagrou, no seu artigo 21, como obrigação da União “instituir um sistema de governança de recursos hídricos”. A mesma Constituição consolidou que “todas as águas brasileiras são um bem público inalienável, inexistindo a sua propriedade privada”.

04

1997: foi sancionada a Lei Federal nº 9.433/97, que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos e criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos ( SINGREH ).

A lei estabelece que a gestão descentralizada e participativa dos múltiplos usos das águas deve ser democrática e organizada por bacia hidrográfica, definida como a unidade de planejamento e gestão de recursos hídricos. Dentro dessa concepção, foram montados 165 Comitês de Bacias Hidrográficas, com participação do poder público, dos usuários e da sociedade civil.

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O VELHO DO CHICO

Aos 75 anos, Antônio Jackson Borges Lima, fundador do Museu Ambiental Casa do Velho Chico, tem muito caso para contar. Olhando em perspectiva, dedicou a vida a cuidar do companheiro de infância, o Rio São Francisco

MonteiroPerfil 22
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Fernando Piancastelli

Quando menino ele não morava à beira do Rio São Francisco. Sua cidade natal, Igreja Nova, município de Alagoas, ficava distante da margem cerca de 40 quilômetros. Na temporada de chuva em Minas Gerais, porém, o Velho Chico vinha bater à porta. A visita saía de longe, da Serra da Canastra. Se chovia muito na cabeceira, o rio engrossava e, milhares de quilômetros depois, invadia o Boacica, o riacho que cortava o quintal da casa de Antônio Jackson Borges Lima, hoje um dos mais reconhecidos defensores do São Francisco.

“Foi assim: eu conheci o rio no meu quintal. O São Francisco enchia lá em Minas Gerais e inundava a nossa várzea em Alagoas. Agora pensa a força que tinha esse rio?”, perguntou Jackson. “O processo acontecia todos os anos, a gente já esperava. Igreja Nova chegou a ser reconhecida pela grande produção de arroz por conta desse fenômeno”.

A relação de Antônio Jackson com o Velho Chico seguiu vida afora. Aos 75 anos, olhando para trás, ele pode dizer que dedicou grande parte do tempo a cuidar do rio que o visitava na infância. Pela dedicação incansável, já recebeu vários prêmios, entre estes o de Cidadão Sergipano, concedido pela Assembleia Legislativa de Sergipe (Alese). Sua maior obra franciscana talvez seja a fundação do primeiro e único museu do São Francisco, fruto de uma coleção que inclui objetos que contam a história ribeirinha, como uma máquina de lavar de madeira e um liquidificador à corda.

“O museu hoje tem 25 painéis, 18 deles dedicados às questões ambientais, onde retratamos todo o processo de degradação ao longo dos anos”, comentou. “O Museu Ambiental Casa do Velho Chico nasceu de uma exposição, que montei para os 500 anos do descobrimento do rio. Agora já ultrapassamos 150 mil visitas”.

Durante a longa existência, Antônio Jackson nunca se desligou do São Francisco, nem mesmo nos anos em que morou em Maceió, entre 1977 e 1998. Ainda na infância, os pais se mudaram para Penedo e ele, pela primeira vez, morou na beira do rio. Adolescente, foi estudar em Salvador. Assim que concluiu os estudos voltou a Alagoas e se instalou noutra cidade ribeirinha, Pão de Açúcar. Como era bancário, vivia, na verdade, pulando de lugar em lugar. Após Pão de Açúcar, residiu em Gararu, no Sergipe, e Traipu, em Alagoas, onde se apaixonou e se casou com a franciscana Jacira Machado Lima, com quem teve três filhos.

24 Fotos: Acervo Pessoal
Ambientalista Militância Infância Sindicalista

A luta ambiental começou solitária. Em Pão de Açúcar, no fim dos anos 60, ninguém nunca tinha ouvido falar em ecologia, preservação do meio ambiente ou nada parecido. A população tinha por hábito jogar o lixo no São Francisco. Antônio Jackson não se conformava com aquilo e, após o expediente no banco, saía catando o que podia da praia, que ele considerava a mais bonita do Velho Chico. “As casas davam fundo para o rio justamente para ficar fácil de jogar o lixo. A sujeira me incomodava muito e eu saía recolhendo o que podia. O pessoal achava que eu era doido”, relembrou. “Em 1968, fui para Gararu e continuei trabalhando assim, por minha conta, sempre catando lixo”.

No início dos anos 80, já morando com a família em Penedo, Antônio Jackson comprou o primeiro barco. Navegando rio acima e rio abaixo, fazia sua campanha de preservação, proseando com os ribeirinhos que encontrava no caminho. “Meu foco continuava sendo o lixo. Ninguém questionava esgoto, desmatamento, queimadas. Não se falava disso”, disse, ao rememorar uma passagem triste de sua trajetória: “Um câncer me obrigou a mudar para Maceió para ficar perto do tratamento. Mesmo assim, eu fugia qualquer feriado para Penedo. Era uma grande saudade do São Francisco”.

Na capital, Antônio Jackson se engajou na luta sindical, chegando à diretoria do Sindicato dos Bancários de Alagoas. “Fui diretor do sindicato entre 1990 e 1998. Sinto muito orgulho de ter sido sindicalista”, comentou. “Mas hoje, para mim, a luta ambiental resume todas as lutas do ser humano. Se você defende o planeta está defendendo tudo. Falamos muito em democracia. Mas é uma democracia para os seres humanos, enquanto escravizamos outras espécies. Precisamos lutar por democracia ampla, para que tudo que é vivo possa sobreviver”.

Após se aposentar, em 1998, Antônio Jackson retornou a Traipu, onde instalou o seu museu. Membro do Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco (CBHSF) desde o início da luta para a implantação dos Comitês de Bacia, ele não tem medo do futuro: “Espero que as pessoas tomem consciência, que acariciem o Velho Chico com o mesmo amor que eu tenho por ele. Mas o São Francisco é teimoso, vai sobreviver. Imagina que o Velho Chico é o único rio brasileiro que resolveu subir e não descer. Pegou o rumo do Nordeste e veio molhar essa terra seca”.

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Edson Oliveira Casamento Secretário de Meio Ambiente Primeiro barco Residência em Pão de Açúcar

A CÉLEBRE

Ao completar 50 anos, Ivete Sangalo voltou a Juazeiro para festejar com seus conterrâneos.

A revista CHICO conversou com amigos e vizinhos que viram a estrela nascer

“A filha do São Francisco chegou”, gritou Ivete Sangalo, ao adentrar o colorido palco armado às margens do Velho Chico, na orla de Juazeiro, na Bahia. Mais de 20 mil pessoas a aguardavam, dispostas a levantar poeira, como manda um de seus mais famosos hits. “Eu vim comemorar os meus 50 anos com vocês”, ela avisou, ao iniciar um emocionante show no dia 27 de maio, de mais de três horas, com transmissão ao vivo pela Rede Globo. O evento também contou com participações especiais, entre estas Preta Gil e o filho primogênito da cantora, Marcelo Sangalo. Por certo, Juazeiro jamais viu festa igual.

Cultura
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SÃO FRANCISCO

FILHA
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Em 27 de maio de 1972, bem ali, na lendária Juazeiro, que também dera ao Brasil João Gilberto, nascia a estrela. Segundo a antiga vizinha, Maria Wilma Rosa Dias de Andrade, “é todinha a mãe dela”. O pai, Alsus Almeida de Sangalo, era comerciante de joias. A mãe, Maria Ivete de Sangalo, professora. A família inteira gostava de música. Com os irmãos Mônica, Cynthia, Marcos, Jesus e Ricardo, a caçula “Veveta” compunha a “trupe do seu Sangalo”, conforme se lembra dona Maria Wilma. Muito nova já tocava percussão nos famosos saraus promovidos pelos pais em sua casa. Um evento familiar disputadíssimo na cidade.

“As crianças todas do bairro queriam assistir, ver as apresentações do seu Alsus”, contou o colega de Ivete, Edilson Gonçalves Borges Júnior. “Era uma diversão, nós adorávamos sentar no chão, muitas crianças, e ouvi-los”.

Naqueles tempos, Dona Wilma, esposa do coronel aposentado Geraldo Dias de Andrade, dirigia a Escola Estadual Joca Oliveira, onde a mãe de Ivete também lecionava. “Veveta me lembra muito a mãe dela. Maria Ivete também era assim, muito engraçada, doce, não tinha tempo ruim com ela”, recordou. “Lembro que teve um show aqui na cidade do Nelson Gonçalves, e ela foi de resguardo da menina”. O marido de dona Maria Wilma era parceiro de boemia de seu Alsus. “Sempre juntos nas noitadas. O Alsus gostava de fazer poesia, tocava violão muito bem. Maria Ivete cantava. A Veveta cresceu neste ambiente, vendo todo este movimento”.

Os irmãos Sangalo são lembrados pelas travessuras. De acordo com dona Maria Wilma, a pequena Ivete gostava de tomar banho de chuva. “Ela tinha uma relação muito forte com água. Muito por conta do São Francisco, eu acho. Nos fins de semana ia com os irmãos nadar no rio”, comentou. À época, as prainhas do Velho Chico ficavam cheias de lavadeiras, de famílias, de crianças. “Veveta era boa de briga, viu? Costumava encarar os meninos. Só havia uma dupla que não enfrentava, dois coleguinhas gêmeos. Dizia que se batesse em um o outro vinha defender. E aí não dava para ela”. Na casa de dona Maria Wilma, até hoje, tem sempre uma escada na árvore de fruta do conde. “Quando ela vem a Juazeiro, passa aqui para subir no pé”.

O bairro onde Ivete viveu sua infância, o Country Clube, surgiu com as primeiras 50 casas construídas para professores e servidores públicos. Sua localização privilegiada, às margens do Velho Chico, facilitava as brincadeiras e os banhos na prainha. “Eu tenho muito do Rio São Francisco, esse lugar me fez gigante. Minha cidade tão amada, que tenho máxima gratidão e, acima de tudo, respeito, porque acredito muito na mulher que me tornei e devo isso ao lugar de onde venho”, disse Ivete, que faz questão sempre de se intitular “filha do São Francisco”.

O cantor e compositor juazeirense Maurício Dias lembra dos primeiros passos da cantora. Desde garoto ele tocava com seu Alsus e viu a menina despontar. “Depois de algum tempo, seu Alsus montou uma loja, a Sangalo Joias, e lá ele também vendia instrumentos musicais, foi onde eu comprei meu primeiro violão fiado. Eu me recordo muito que Ivete gostava de acompanhar os encontros musicais, ficava batucando nos violões. Tempos depois, com uns 17 anos, já cantava. Cantou no São João da cidade, uma das primeiras vezes que se apresentou para um grande público, e a partir daí foi crescendo, e se tornou o fenômeno que é hoje”.

Com mais de 30 anos de carreira, Ivete Sangalo ganhou notoriedade cantando na Banda Eva e depois seguiu carreira solo. Hoje, totaliza mais de 300 músicas, sem contar as participações especiais. Vendeu mais de 18 milhões de cópias e recebeu mais de 150 prêmios nacionais e internacionais, entre eles o Grammy Latino e Shorty Award. Numa votação no site BillBoard Brasil foi eleita pelo público como a artista mais completa do Brasil. Cantora, compositora, atriz, apresentadora, a filha do São Francisco, definitivamente, ganhou o mundo.

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Fotos: Acervo Pessoal

“Tenho o maior respeito pela Ivete, principalmente pelo fato dela continuar lembrando e valorizando suas raízes.” Átila Cauã do Santos Mesquita

FALA

POVO

“Ivete é uma potência, acredito muito que ela ainda vai muito mais longe do que já foi. No início da sua carreira, pude acompanhar alguns dos seus passos e vê-la se tornar hoje o fenômeno que é.” Maurício Dias (Mauriçola)

O
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MULH

Incorporada à agenda internacional para o desenvolvimento sustentável, a representação feminina na gestão das águas já é uma realidade no Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco

Nascida no quilombo Caraíbas, em Sergipe, Xifroneze Santos aprendeu muito cedo o significado do verbo lutar. Aos 16 anos já era militante, engajada nas infinitas batalhas contra o racismo e o machismo. Segundo conta, aos poucos, no entanto, foi entendendo que sua missão ia além: “A mulher quilombola é sinônimo de resistência permanente. Lutamos não somente pelas nossas vidas, mas também por territórios, direitos, saúde e educação”. Entre esses direitos, um direitos, um que é fundamental: a água.

Para Suzana Montenegro, presidente da Agência Pernambucana de Água e Clima (APAC) e membro do Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH), água e gênero são hoje temas indissociáveis. “A água é uma palavra feminina. Se a gente quer discutir o direito à água, temos que discutir o feminino”, diz ela, que se tornou uma potente voz no Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF).

“É preciso buscar nos Comitês de Bacias a equidade de gênero, tratando as mulheres com igualdade, porém, com respeito às diferenças”, comentou Suzana Montenegro. “A presença das mulheres é importante para a gestão e preservação das águas, e esse olhar da igualdade de gênero está em

consonância com a diversidade e com a democracia que se espera dos espaços de representação política”.

No CBHSF, a representação feminina já é uma realidade: 37% dos membros do plenário são mulheres.

O protagonismo da mulher na CTIL

Na Câmara Técnica Institucional e Legal (CTIL) do CBHSF, a participação feminina representa 40% dos membros titulares. Larissa Cayres foi uma das primeiras coordenadoras da CTIL e atua nessa instância desde a criação do Comitê. “O CBHSF nasceu com mulheres muito fortes a frente, fazendo as coisas acontecerem. Agora estou na CTIL e é lindo de ver a nossa força. Somos acostumadas a ir à luta pelos nossos direitos e com os recursos hídricos não é diferente. Seja na imagem da mulher com a lata na cabeça que vai buscar água para abastecer a família ou nas que lutam pelos recursos hídricos e meio ambiente, somos fortes e vamos à luta”. A composição da CTIL nos mostra que cada mulher da bacia hoje pode enxergar que aquele espaço é para ela também”, conta Larissa Cayres.

O lugar da mulher é onde ela quiser

E o futuro aponta para o crescimento dessa participação, levando-se em consideração o fato de que água e igualdade de gênero são atualmente temas incorporados à agenda internacional para o desenvolvimento sustentável. O debate vem de longe, desde a Conferência de Dublin, em 1992, pouco antes da realização da célebre Rio92, quando a Organização das Nações Unidas (ONU) recomendou a inclusão da mulher na gestão das águas. Na Agenda 21, um dos desdobramentos da Rio-92, o Item 3 dos Objetivos do Desenvolvimento do Milênio focava a mulher como fator determinante para a gestão sustentável da água e do meio ambiente. Após a Rio+20, realizada também no Rio de Janeiro, a Agenda 2030 e os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) preconizaram a Igualdade de Gênero (ODS 5) que, alinhada ao ODS 6, Água Potável e Saneamento, garantiriam a participação da mulher na gestão dos recursos hídricos. Apesar de todos esses avanços, a verdade é que ainda falta muito. As mulheres ainda ocupam um número muito menor de cargos que os homens nos órgãos oficiais que cuidam da preservação e do acesso à água.

Por Luiza Baggio e Andréia Vitório Arte: Priscila Amoni
Recursos Hídricos
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ERES

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Profissionais da água

Segundo a ecóloga Rúbia Mansur, mais do que nunca, as mulheres precisam se aprimorar, buscando formação sólida para enfrentar os desafios. Gerente de Integração da Agência Peixe Vivo, onde atua há 12 anos, ela não renuncia à formação continuada: “Já fiz e sempre busco fazer vários cursos, desde os básicos, que trazem conhecimentos sobre Comitês e Agências de Bacia, instrumentos de gestão, planos de recursos hídricos e comunicação nesse contexto, a outros mais específicos sobre qualidade da água, por exemplo.”

Rúbia já concluiu um MBA em Gestão de Projetos, é discente da Universidade Federal de Minas Gerais no curso de pós-graduação em Recursos Hídricos e Meio Ambiente e mestranda do ProfÁgua (Programa de Mestrado Profissional), pela Universidade Federal da Bahia.

Izabel Gonçalves Nogueira segue o mesmo rumo. Há nove anos, trabalha desenvolvendo atividades de geoprocessamento, mobilização social e educação ambiental para o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas. Graduada em Geografia com ênfase em Geoprocessamento, é pós-graduada em Gestão de Recursos Hídricos e Georreferenciamento de imóveis rurais, além de ser mestranda no Programa de Pós-Graduação em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos do ProfÁgua.

“O profissional que se propõe a atuar com as águas deve estar atento às mudanças de legislação e ao aprimoramento do Sistema Nacional de Recursos Hídricos”, avaliou Izabel.

“Além disso, é preciso saber que o comportamento hídrico vem mudando ao longo dos anos, bem como sua relação com o clima e as atividades

de interferência humana. Isso, sem dizer da preservação ambiental e do desenvolvimento sustentável”.

O caminho é mesmo esse, conforme defende Renata Rozendo Maranhão, coordenadora de capacitação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH) e do setor do saneamento da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA). De acordo com ela, os desafios futuros são imensuráveis: “Temos que estar preparadas para a tomada de decisão, para a gestão de conflitos, para uma visão crítica sobre os desafios da gestão e regulação e para a busca de soluções inovadoras, individuais e coletivas”.

Rúbia Mansur, Gerente de Integração da Agência Peixe Vivo Izabel Nogueira, Mobilizadora Social do CBH Rio das Velhas
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Michele Parron Bianca
Aun

Como se formar

A Agência Nacional de Águas (ANA) oferta diversos cursos de capacitação que miram na gestão das águas no Brasil. Hoje são mais de 80, realizados de forma compartilhada entre instituições públicas e privadas e instâncias de participação social. Todos gratuitos, nas mais diferentes modalidades: presencial, semipresencial, EAD, com ou sem tutoria.

A entidade mantém parceria com 56 universidades por meio de programas desenvolvidos junto à Capes. São dois mestrados profissionais - ProfÁgua e ProfCiAmb, coordenados pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp) e Universidade de São Paulo (USP), respectivamente. Além disso, apoia 12 projetos em rede por meio do Pró-Recursos Hídricos.

Hoje são mais de 500 alunos matriculados desenvolvendo pesquisas sobre gestão e regulação de recursos hídricos por meio do ProfÁgua, que é um curso de Mestrado Profissional em Rede Nacional em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos. Ele é integrado por 15 universidades, a exemplo das Universidades Federais da Bahia e de Pernambuco.

O ProfCiAmb, por sua vez, é o curso de Mestrado Profissional em Rede Nacional para Ensino das Ciências Ambientais e conta com nove universidades associadas. As Universidades Federais de Sergipe e de Feira de Santana (BA) estão entre elas. Já foram capacitadas pelos cursos da ANA cerca de 215 mil pessoas desde 2001. Nos últimos tempos, foram uma média de 30 mil alunos por ano. Os cursos mais procurados são o de Lei das Águas e Hidrologia Geral.

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Fotos:
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FOCO NO CERRADO

Já na sua segunda edição, o Cerrado Mapping Festival, realizado na bucólica Vila de Santa Bárbara, no norte de Minas, surgiu para chamar a atenção para a necessidade urgente de se preservar a savana brasileira

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Quando o tema é preservação ambiental logo vem à cabeça a Amazônia, a Mata Atlântica ou o Pantanal. Raramente o Cerrado ganha protagonismo. Segundo maior bioma do país, a savana brasileira está silenciosamente desaparecendo. No último dia de 2021, o Instituto Nacional de Pesquisas Especiais (Inpe) divulgou um dado alarmante. Em um ano, o bioma perdeu mais de oito mil quilômetros quadrados de vegetação original, quase seis vezes a área do município de São Paulo. Se a velocidade da devastação seguir nesse galope em duas décadas o Cerrado terá atingido um ponto de não retorno.

Já na segunda edição, o Cerrado Mapping Festival surgiu justamente para chamar a atenção para essa tragédia anunciada. Com o intuito de enfatizar a importância da preservação do Cerrado, o evento acontece a cada dois anos na paradisíaca Vila de Santa Bárbara, distrito de Augusto de Lima, em Minas Gerais. O festival é pioneiro em vídeo mapping no estado, levando aos participantes a combinação de tecnologia, arte e tradição.

“A intenção é ressaltar a sustentabilidade, a ecologia, enfim, conceitos que trazem reflexões sobre a crise hídrica que vivenciamos no Brasil e no mundo, que é consequência, vamos dizer, de um abuso de todo esse crime ambiental que presenciamos de desflorestamento e queimadas”, comentou Bernardo Caldeira Brant, um dos idealizadores do evento. “Queremos retomar essa discussão, desses crimes ambientais no Cerrado e as consequências disso, que é a crise hídrica e outras questões, como o aumento de temperatura e mudanças no clima”.

O local escolhido para a realização do Cerrado Mapping Festival é uma atração à parte. A bela Vila de Santa Bárbara, com cerca de 230 habitantes, foi fundada em 1889, no contexto da industrialização do Brasil, abrigando atividades têxteis. O prédio da velha fábrica de tecidos é hoje uma ruína, onde são realizados eventos culturais e coorporativos. A ideia do festival é criar narrativas que dialoguem com o patrimônio, a arquitetura e a memória do vilarejo situado na Serra do Espinhaço, nas imediações do Parque Nacional das Sempre-Vivas.

“É um lugar tão bacana e tão pouco conhecido em Minas Gerais e no Brasil. Então, vi a oportunidade de criar um projeto que pudesse dar visibilidade para a história da região, para a memória das pessoas daquele lugar e, também, uma forma de valorizar o Cerrado, o sertão mineiro”, comentou Caldeira Brant.

A primeira edição, em 2020, levou para a Vila de Santa Bárbara o trabalho de alguns dos maiores VJs do mundo. Este ano, entre os dias 23 e 25 de junho, instalações lumínicas e fotográficas, programação musical e um festival gastronômico de comidas do Sertão Mineiro e de produtos do Cerrado proporcionaram lazer e cultura para a população. O festival aconteceu nas ruínas da velha fábrica do século 19. O monumento foi realçado por artistas que trabalharam em torno da temática do cordel e do Movimento Armorial, vertente surgida na década de 70 para valorização das artes populares nordestinas.

O que é o Mapping?

Video mapping ou mapeamento de vídeo é uma técnica visual que consiste em projetar imagens sobre superfícies, na maioria dos casos edifícios, para criar efeitos e animações tão impactantes que parecem ganhar vida.

O Cerrado Mapping Festival também apresentou projeções de trabalhos dos fotógrafos brasileiros Fabiana Figueiredo, Nair Benedicto, Fausto Chermont, Celso Brandão, além do francês Pierre Devin. As fotos pertencem ao acervo da “Missão Rio São Francisco” (MRSF).

A MRSF questiona as mutações do território, da paisagem e a vida da população da bacia do rio, da sua nascente até a foz. A missão é uma cooperativa de autores, fotógrafos, artistas visuais, poetas, escritores, pintores, chefs de cozinha, videomakers etc. que se uniram em torno de um objetivo comum: colocar em evidência o território ameaçado da bacia do Rio São Francisco.

“É urgente nos unirmos aos organismos existentes que trabalham com seriedade na luta pela sobrevivência do Velho Chico e pela preservação da cultura e da memória social dos ribeirinhos e das comunidades da bacia do Rio São Francisco”, diz o manifesto dos autores da Missão Rio São Francisco.

O evento foi realizado na centenária fábrica de tecido, localizada em Augusto de Lima, que faz parte da Bacia do Rio das Velhas, afluente do Rio São Francisco

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O festival faz um alerta para a preservação do Cerrado, um dos ecossistemas mais ameaçados de todo o planeta

Os segredos da savana

Considerado o segundo maior bioma da América do Sul e o segundo maior do Brasil, o Cerrado abrange cerca de 22% do território brasileiro, ocupando a região central do país, incluindo Minas Gerais. A fauna e flora locais são reconhecidas como as maiores do mundo em biodiversidade. O dia 11 de setembro foi regulamentado, em 2003, como data oficial para comemorar e alertar sobre a importância da preservação desse bioma.

Os primeiros colonos do Cerrado o consideravam um deserto estéril, mas isso estava longe de ser uma verdade. Além de se tratar da savana tropical mais biodiversa do planeta, o bioma concentra nascentes de importantes bacias hidrográficas, sendo fundamental para a sobrevivência do Rio São Francisco. O equívoco sobre a importância do Cerrado talvez se deva, em parte, pelo desconhecimento. “Para a maioria dos brasileiros, o Cerrado é a floresta ‘feia’, pois não conhecem ou não sabem a importância desse bioma”, concluiu Brant.

Este ano, artistas apresentaram trabalhos sobre as tradições das comunidades indígenas e negras, no Brasil, ligadas ao direito à ancestralidade, à terra e às formas de resistência

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DIVERSÃO

Por Deisy Nascimento
E ARTE Turismo 40

À beira do São Francisco, Ilha do Ferro, em Alagoas, tornou-se polo da cultura popular do Nordeste.

As casinhas coloridas do povoado abrigam ateliês abertos ao público

Fotos: Azael Gois e Edson Oliveira
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O ponto de partida é a cidade alagoana de Pão de Açúcar. Percorrendo cerca de 15 quilômetros de estrada de terra ou navegando o São Francisco, chega-se à Ilha do Ferro, povoado que entrou no mapa do turismo nacional como polo da cultura popular do Nordeste brasileiro. Dos cerca de 500 moradores, pelo menos 100 são artesãos. Animais fantásticos, esculturas coloridas, gaiolas inusitadas, bonecas de pano e muitos bordados fazem parte da paisagem local, adornada pela beleza do Velho Chico.

Até bem pouco tempo desconhecida, a Ilha do Ferro é hoje considerada uma joia rara por apreciadores da arte popular. Abertos ao público, os ateliês ocupam as casas dos moradores. Além de conhecer os trabalhos dos artistas locais, que já ganharam galerias nacionais e internacionais, o turista tem a oportunidade de adentrar a simplicidade acolhedora da vida ribeirinha.

Um dos principais ateliês ocupa a antiga casa de Fernando Rodrigues Souza, o Seu Fernando, falecido em 2009. Nascido em 1928, ele começara a bulir com a madeira ainda criança, na oficina do pai, o sapateiro da ilha que não é ilha. Ao longo da vida, labutou na roça, sem nunca abandonar sua arte. Aos 40 anos, fez a primeira grande peça, uma espreguiçadeira. Daí em diante, passou a expor suas criações em mostras país afora. Agora, os filhos e netos dão continuidade à obra do celebrado ribeirinho.

“O ateliê é o espaço onde mantemos o meu avô vivo”, comentou Matias de Souza, de 34 anos, que, aos 10, aprendeu a esculpir a madeira. Assim como o avô, Matias se inspira na natureza para encontrar suas formas: “Nas minhas andanças pelo mato, encontro troncos caídos, pedaços de pau etc. Muitas das esculturas que faço são exemplos do que vejo na natureza, daí trago as representações para o meu trabalho, buscando beleza sem perder a essência”.

Para o presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), Maciel Oliveira, a valorização desta cultura local é fundamental para a preservação do Velho Chico. “O povoado Ilha do Ferro tem uma herança incrível deixada pelo Seu Fernando, que nasceu no município de Pão de Açúcar e levou o nome do povoado para o mundo”, comentou.

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A Ilha do Ferro é uma galeria de arte às margens do São Francisco

Boa Noite

Com tradição de mais de um século, o bordado Boa Noite é uma das principais atividades econômicas da Ilha do Ferro. A Cooperativa Art-Ilha reúne as bordadeiras. Entre linhas e agulhas, elas vão tecendo peças únicas, que retratam o cotidiano do Velho Chico. Segundo contam, o nome do bordado surgiu para homenagear uma flor da região, a Boa Noite. O trabalho demanda, sobretudo, paciência e delicadeza.

A técnica consiste em desfiar o tecido e recompô-lo em faixas com motivos que podem ser os mais diversos. Na Cooperativa Art-Ilha, por exemplo, as peças criadas com as faixas bordadas são as mais variadas, como almofadas, toalhas de mesa e de lavabo, jogos americanos, guardanapos, colchas, cortinas e marcadores de livros. Um detalhe importante do bordado é que é rigorosamente geométrico e segue a trama dos tecidos.

“Buscamos sempre manter a tradição do Bordado Boa Noite”, comentou Dan Lessa, representante da Cooperativa Art-Ilha, que hoje abriga 14 bordadeiras. “Os produtos são feitos com muito carinho, dedicação e capricho”.

A bordadeira Evânia Sandes gosta de se sentar na porta de casa para tecer. Olhando para o São Francisco, fica mais inspirada. “A tranquilidade do povoado, o ambiente acolhedor, cheio de paz, facilita a produção. Bordar requer atenção, tempo, dedicação para que sua finalização seja perfeita”,

Museu de Arte Popular

Além dos ateliês, os visitantes da Ilha do Ferro têm também ao seu dispor o Museu de Arte Popular. Gestado pela Universidade Estadual de Alagoas (UFAL), o espaço é ligado ao Núcleo de Pesquisa em Literatura e Artes Visuais (NUPLAV). Fora idealizado pelo professor Jairo José Campos da Costa.

O Espaço de Memória Artesão Fernando Rodrigues dos Santos está sob a responsabilidade da museóloga Carmen Lúcia Tavares Almeida Dantas e seu objetivo é fomentar o ensino, a pesquisa e a extensão, por meio do recorte ligado à cultura popular alagoana, produzida no Baixo São Francisco, em Alagoas.

Assista ao vídeo da Ilha do Ferro em: bit.ly/3LvyTJE

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PARACATU

Texto e Fotos: Leonardo RamosExpedição 44

Realizada há cerca de 30 anos, a “Expedição Rio Paracatu – 2022” percorreu cerca de 370 quilômetros, até o encontro com o Velho Chico. Foram cinco dias e quatro noites de navegação

Heráclito, um dos principais filósofos gregos pré-socráticos e precursor do pensamento dialético, defendia a impermanência da natureza, onde tudo muda o tempo todo. Num de seus aforismas mais famosos, disse ser impossível se banhar duas vezes no mesmo rio, já que, entre uma e outra imersão, nem a pessoa nem o rio são mais os mesmos.

Há quase três décadas, a “Expedição Rio Paracatu”, capitaneada por Antônio Eustáquio Vieira, conhecido como Tonhão, percorre o Paracatu, um dos mais importantes tributários do Velho Chico. E, seguindo a lógica de Heráclito, a cada empreitada, encontra um rio diferente.

Se em 2019, ano em que participei pela primeira vez da expedição, o Paracatu tinha grandes bancos de areia, este ano encontramos um rio mais cheio, com menos obstáculos para a navegação. A cheia é decorrente das fortes chuvas que atingiram a região entre dezembro de 2021 e janeiro de 2022.

Mas nada garante que essa condição vá perdurar, e o objetivo da expedição foi justamente verificar qual a situação do rio após as chuvas e como garantir que ele permaneça cheio. Foram cinco dias e quatro noites de navegação por mais de 370 quilômetros do “Rio Bom”, tradução da palavra tupi-guarani “Paracatu”. Em cada parada, novos encontros, novas descobertas, novos rios.

Primeiro dia: 23 de maio

O dia começou cedo na casa de Tonhão, em Paracatu. Um café e um dedo de prosa para celebrarmos o reencontro. Em seguida, partimos para a ponte da BR-040, o local marcado para o início da expedição.

Na parada para o almoço, no Brasília Country Clube, Tonhão demonstrou, através das réguas de medição da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), quão cheio está o rio. “O rio hoje está com 1,98m de água nesta régua. No dia 25 de maio do ano passado, estava com 1,29m, e em outubro de 2017, com 98 cm e o rio praticamente seco daqui para baixo”, recorda Tonhão.

Segundo dia: 24 de maio

Dormi tão cedo na noite anterior que acordei de madrugada. Um pouco antes do sol nascer, o companheiro José Maria Lacerda, um dos fundadores do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Paracatu (CBH Paracatu), se juntou a mim na espera da aurora.

No café da manhã, a presença de Marcelo da Fonseca, diretor-geral do Instituto Mineiro de Gestão das Águas ( IGAM ), deu início ao primeiro debate. José Maria lembrou que, todo ano, precisa parar a captação local porque a vazão, em tempos de seca, é menor do que a outorga permite captar (6500l por segundo). “Nos 130 quilômetros que viajamos ontem, vimos três afluentes na margem direita e cinco na esquerda, e esses cinco estão intensamente irrigados. Se não cuidarmos desses tributários, vamos ter problema na calha do Paracatu e no abastecimento do São Francisco. Então, precisamos fechar uma parceria nesse sentido e, além disso, precisamos de informação”, cobrou.

Assista ao vídeo da Expedição do Rio Paracatu em:

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Expedição percorre o Rio Paracatu desde 1993. Há quase 30 anos diferentes expedicionários buscam verificar as condições desse que é o maior dos afluentes do Rio São Francisco

Marcelo declarou que informação é fundamental na sua gestão à frente do IGAM : “Assinamos o contrato do Plano Mineiro de Segurança Hídrica, que vai levantar quais são as áreas estratégicas de Minas Gerais para intervenções em revitalização e recuperação de ecossistemas. A proposta é que em 15 meses tenhamos esse diagnóstico”.

Após a conversa, Marcelo embarcou conosco na descida do rio. No caminho, paramos na colônia de pescadores de Brasilândia de Minas. “Este ano a quantidade de peixe melhorou bastante por causa das chuvas. Há mais de 20 anos não vejo enchente igual, mas estamos preocupados com as lagoas marginais, que estão secando”, disse o pescador José dos Reis, o Zé Rajado, presidente da cooperativa. Segundo ele, as lagoas são importantes berçários de peixes.

No mesmo local, estava também o prefeito de Brasilândia de Minas, Oséias Cardoso Queiroz. Com ele, seguimos para a Câmara dos Vereadores, onde houve um encontro com a população. Na ocasião, Antônio Jackson, diretor do Museu Ambiental do Velho Chico, sugeriu a criação do Dia Municipal de Preservação do Rio Paracatu, ideia aplaudida por todos e colocada em prática pelo prefeito.

Terceiro dia: 25 de maio

Partimos bem cedo, e o prefeito Oséias continuou a jornada conosco, levando em sua embarcação outro expedicionário eventual, Antônio Neto, também conhecido como Toninho, paulista de Ribeirão Preto que se mudou para a região há cerca de 35 anos. Ele é proprietário de ranchos e pousadas ao longo do rio.

A gente enxergou aqui que o peixe vivo tem mais valor que o peixe morto. Procuramos transformar o pescador em guia de pesca, para fazer com que as pessoas que vêm aqui à procura de turismo possam também trabalhar pela preservação do rio”, conta Toninho.

Também o prefeito Oseias expressou a importância da atividade turística. “O turismo tem um potencial alto nesta região. Estamos vivenciando um período pós-pandemia e podemos retomar as atividades, como a pesca esportiva e o caiaque. Temos uma visão ampla das potencialidades do rio para a nossa população”.

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Adutora nas margens do Paracatu, cenário comum ao longo do curso do rio, para irrigação e abastecimento das cidades

Após o almoço, o prefeito retornou para Brasilândia. Seguimos, e eu notei que muitas áreas que fotografei queimadas em 2019 estavam praticamente regeneradas. O rio tinha muita vida. Aves voando de uma margem a outra, antas e capivaras nadando nas águas, muitos pescadores. A viagem terminou quase no cair da tarde, em Curralinho.

Quarto dia: 26 de maio

Antes de sairmos, o companheiro de expedição Altino Rodrigues Neto, Coordenador da Câmara Consultiva Regional do Alto São Francisco (CCR Alto/CBHSF), apontou um bom diagnóstico: “Constatamos que o Paracatu está com qualidade excepcional de água após essa enchente, o que vemos como um fator positivo de renovação do rio. O nosso objetivo aqui é fazer uma grande integração entre as pessoas, as suas necessidades, e construir um Rio São Francisco mais forte.”

O trajeto do dia foi bastante curto: antes do almoço já estávamos em Remanso do Fogo, um vilarejo do município de Santa Fé de Minas. Ao lado de Tonhão, Altino

foi peça chave na articulação com o poder público. Em reunião com o prefeito Glebson Júnior e seu vice Cláudio Bento, ambos reforçaram o convite para que representantes da cidade participem das reuniões do CBH Paracatu.

Quinto dia: 27 de maio

No último dia, partimos para a última perna do Paracatu. Impressionante como o anseio pelo Rio São Francisco vai crescendo conforme a descida: “Tu vens, eu já escuto os teus sinais”. O encontro dos dois rios é um grande encantamento.

Já na margem do Rio São Francisco, Ciro Coelho, Coordenador da Unidade Regional de Gestão das Águas do Noroeste de Minas (URGA NOR), do IGAM , reiterou o valor de se verificar as condições do Rio Paracatu e seus afluentes através dessa jornada e relembrou a importância daquelas águas para as populações ribeirinhas.

No mesmo local, Danilo Dias, do Instituto Estadual de Florestas (IEF), também refletiu que a experiência é essencial para um diagnóstico que não seja meramente técnico. “Foi gratificante participar mais uma vez dessa expedição. Pudemos conversar

com os ribeirinhos e os representantes do poder público, e mostrar para essas comunidades que há pessoas que se preocupam com o rio e lutam por ele.”

Da foz, rumamos para a cidade de São Romão, já em águas franciscanas, para os últimos momentos de encontro com o poder público e a comunidade local. Fomos recebidos pelo vereador Valter Barroso, que nos levou ao encontro do prefeito da cidade, Marcelo Meireles, com quem almoçamos.

Logo após, os expedicionários foram à Escola Municipal Presidente Tancredo Neves, onde as crianças participaram de um momento de educação ambiental, música e poesia. “Este encontro é uma riqueza para a nossa história. Parabéns a todos vocês, na pessoa do Tonhão. E com certeza vocês, crianças, vão crescer com muito mais consciência ambiental graças a esse trabalho”, celebrou o prefeito Marcelo.

Ao fim, volto para casa com a certeza: ninguém se banha no mesmo rio duas vezes.

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Altino Rodrigues, coordenador da CCR Alto São Francisco, e Marcelo da Fonseca, diretor-geral do IGAM, celebram a boa fase do Rio Paracatu Em São Romão, Antônio Vieira, o Tonhão, conversa com as crianças sobre educação ambiental

O Rio Paracatu tem 485 km de extensão, nasce no município de Lagamar, no oeste de Minas, e deságua no Rio São Francisco, entre as cidades de Santa Fé de Minas e Buritizeiro

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Arthur
Soares

Aconteceu

Coletiva de Imprensa

Em coletiva de imprensa realizada no dia 18 de maio, em Ouro Preto (MG), membros do CBHSF puderam divulgar a campanha “Eu viro carranca para defender o Velho Chico”, a Expedição Científica do Baixo São Francisco e o IV Simpósio da Bacia Hidrográfica do São Francisco. Na ocasião, foram tratados assuntos como a mineração na Serra do Curral, localizada em Belo Horizonte, e o PL 4.546/2021. Compareceram à coletiva jornalistas de toda a bacia.

XLIII Plenária Ordinária do CBHSF

Com o tema central “Em defesa da Lei das Águas”, foi realizada, nos dias 19 e 20 de maio, em Ouro Preto (MG), a XLIII Reunião Plenária Ordinária do CBHSF. No encontro, os membros do Comitê, representantes do poder público e da sociedade civil puderam acompanhar debates que incluíram a apresentação de estudo voltado à situação de barragens na bacia, o trabalho do GT do Novo Marco Hídrico e um debate e votação de moção a respeito da situação da mineração na Serra do Curral.

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Fernando Piancastelli
Fernando Piancastelli

Viramos Carranca

Depois de dois anos sem atividades presenciais, devido à pandemia da Covid-19, a campanha “Eu viro carranca para defender o Velho Chico” realizou, nas cidades de Pirapora (MG), Ibotirama (BA), Glória (BA) e Gararu (SE), eventos em comemoração do Dia Nacional em Defesa do Rio São Francisco (03/06). Com o tema “O Velho Chico são muitos”, a campanha lançou um olhar sobre os múltiplos territórios que integram a Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco. A campanha contou com o apoio de diversas entidades da bacia e teve uma grande repercussão na mídia.

100 PMSBs entregues para a bacia do Velho Chico

O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco ultrapassou a marca de 100 Planos Municipais de Saneamento Básico concluídos e entregues em 2022. Executados nas quatro regiões fisiográficas, ao todo já foram concluídos 26 planos no Alto São Francisco, 31 no Médio, 19 no Submédio (5 em fase de conclusão) e outros 27 foram concluídos no Baixo São Francisco (6 em fase de conclusão). Com isso, o Comitê investiu, no total, R$ 16.765.137,62.

Até 2025, o CBHSF prevê investimentos, em todas as linhas de atuação, que devem atingir a casa dos R$ 278 milhões, no total. Os PMSBs são financiados com recursos advindos da cobrança pelo uso da água do Rio São Francisco.

IV SBHSF

A 4ª edição do Simpósio, realizada em Belo Horizonte entre os dias 14 e 16 de setembro, contou com a participação de pesquisadores e acadêmicos de todo o Brasil, que trouxeram o que há de mais relevante e atual nas temáticas apresentadas. Promovido pelo CBHSF em parceria com o Fienpe, o IV SBHSF teve como tema central “Gestão Hídrica no Rio São Francisco: desafios e soluções”. As palestras e mesas-redondas estão disponíveis no canal do CBHSF no youtube (www.youtube.com/cbhsaofrancisco).

51 Flávio Charchar Bianca Aun

Ensaio

VELHO CHICO. MUITOS OLHARES

Não existe rio sem povo. Não existe povo sem rio. O São Francisco é assim, múltiplo, porque é de todos, de muitos jeitos, com muitas histórias e olhares.

Um rio feito de afluentes e de culturas diferentes, que chegam de todos os cantos e criam algo único. Alto, Médio, Submédio, Baixo, inteiro São Francisco.

Pra ver o Velho Chico inteiro, de verdade, tem que enxergar com o coração. A arte tem que brilhar na retina, a economia tem que vibrar, a vida tem que pulsar. O Velho Chico das águas, da fauna, da flora, da cultura, da oportunidade, das pessoas e dos sonhos. Múltiplo, diverso, infinito. Um rio que transborda trabalho, esperança, novas histórias e novas realidades.

Porque o Velho Chico é uma contradição: ao mesmo tempo em que está sempre mudando, que é sempre novo, nunca deixa de ser o mesmo em sua essência, em sua força.

Por isso, cuidar do Velho Chico, é cuidar do eterno e também do efêmero. É perceber que as águas são o começo, mas que existe muito mais além do que a vista alcança.

Porque o São Francisco tá nos olhos, tá nas mãos, tá na memória, tá no sangue de todos nós. E agir pelo rio, é agir pelas pessoas. É agir pela vida e pelo futuro.

E é por isso que eu digo, com a certeza de quem é um pouco Velho Chico também, que o Velho Chico são muitos. E se a gente cuidar, vai ser cada vez mais.

O Velho Chico são muitos. Que Velho Chico é você?

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Veja toda exposição “Velho Chico. Muitos Olhares” em: bit.ly/expo-virecarranca-2022 Texto: Maurilo Andréas
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Kell Dourado
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Kell Dourado
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Miguel
Aun
56 Bianca Aun
Léo Boi
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Azael Gois Bianca Aun
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59 Bianca Aun
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