Travessia Nº 29 - Setembro 2019 - Notícias do São Francisco

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travessia Notícias do São Francisco

JORNAL DO COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO / SETEMBRO 2019 | Nº 29

Queimadas na Amazônia podem gerar falta de água na Bacia do São Francisco

V Encontro de Afluentes do Rio São Francisco é realizado em Maceió

CBHSF contempla 48 municípios com PMSBs

Páginas 4 e 5

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Editorial

FLORESTA AMAZÔNICA É NOSSO MAIOR PATRIMÔNIO

O mundo inteiro acompanha sobressaltado os incêndios criminosos que a cada minuto, a cada hora, a cada dia estão devastando porções cavalares dos biomas brasileiros, com destaque para a Floresta Amazônica que é, inegavelmente, nosso maior patrimônio natural, bem como daqueles países vizinhos que conosco dividem essa riqueza incomparável e insubstituível. Tal é a grandeza desse fato que em torno do fogo produziu-se um enorme ruído internacional envolvendo atritos diplomáticos, manifestações nas principais capitais do mundo, cobertura de mídia em grande escala, avaliações científicas diárias e, no Brasil, uma movimentação política, de boa ou de má fé, típica das conjunturas que se formam em razão de algum evento nacional crítico. Em tais circunstâncias, quando recai sobre o poder público a principal responsabilidade pela perda de controle de um fenômeno que é indubitavelmente resultado da ação humana indevida, é natural que todo tipo de tergiversação prospere, resultando em uma cortina de fumaça virtual que embaralha os fatos, dificulta seu entendimento, procura isentar de culpa os responsáveis e tenta justificar o injustificável para salvaguardar interesses inconfessáveis. Nesses momentos emerge, portanto, a necessidade de buscar os principais referenciais para uma abordagem correta do problema. E aqui, explicitar a causa do fogo, por mais óbvio que possa parecer, se configura como um bom exemplo sobre quais poderiam ser os pontos de partida, a partir de situações concretas, capazes de levar o Brasil a repensar suas

experiências de governança do território, de modo a vencer o enorme desafio de requalificação do modelo brasileiro de desenvolvimento para evitar que as teorias obsoletas do crescimento econômico desordenado, oportunista e predador comprometam os interesses estratégicos das atuais e futuras gerações de brasileiros e brasileiras. O fogo que destrói a floresta – é preciso que se grite a plenos pulmões – resulta de forma inquestionável dos enormes e sistemáticos desmatamentos que abrem caminho a todo o tipo de ações criminosas, feitas à luz dia e com conivência do poder de Estado, para propiciar venda ilegal de madeira, roubo de terras públicas, garimpo clandestino e toda a vasta sequência de crimes vinculados a tais processos como o tráfico de drogas, trabalho escravo, prostituição infantil, biopirataria, violência contra populações tradicionais e desmoralização do poder público em todos os seus níveis. Portanto, não é preciso descobrir a pólvora para dar um fim ao caos: se os desmatamentos forem coibidos e na sequência dessa ação os demais crimes reduzidos drasticamente, os incêndios diminuirão a uma escala incapaz de ameaçar nossos biomas. No caso da Floresta Amazônica isso é uma verdade elementar visto que, por si só, sua vegetação intacta não pega fogo. Outro ponto crucial para mudar radicalmente os fatores que ameaçam a floresta é entender que ela, em si, é a maior riqueza a preservar e utilizar, desde que a ciência e a tecnologia sejam chamadas para agregar valor a produtos que sejam obtidos de forma sustentável, com capacitação avançada para as populações locais

e desenvolvimento de pesquisas e processos produtivos, como é o caso, para citar apenas duas evidências, das indústrias farmacêutica e de base para cosméticos, as quais possuem alto valor agregado. Imaginar que a saída para produzir o bem-estar dos milhões de habitantes da Amazônia é suprimir a vegetação para implantar atividades de insignificante retorno produtivo, só pode ser fruto de demagogia ou de ignorância, premeditada ou não, sobre os primados da ciência econômica. Finalmente é preciso entender que a grande ameaça geopolítica que hoje paira sobre a soberania brasileira e dos países amazônicos no que se refere à grande floresta, é nada mais, nada menos, do que sua invasão multilateral, já consumada, por grandes hordas de grileiros, madeireiros clandestinos, traficantes de drogas, biopiratas, ladrões de terras públicas e todo o tipo de bandidos correlatos. E é precisamente a impunidade através da qual esses criminosos agem, aquilo que poderá, já em futuro breve, alimentar questionamentos internacionais sobre a nossa capacidade de gerir de forma responsável o nosso próprio território. Portanto, ao invés de combater “moinhos de vento” fruto das recorrentes teorias conspiratórias, vamos já ao que realmente interessa: varrer o crime, proteger nossa floresta e abrir um novo e próspero caminho para seus habitantes. Floresta, gente, ecologia e desenvolvimento não só podem, como devem caminhar juntos para um futuro melhor!

Rádio São Francisco completa 60 edições Na palma da mão ou nas ondas o rádio. O Programa Travessia, podcast criado pelo CBHSF que traz notícias sobre a Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, chega a sua 60ª edição, cumprindo o seu papel de educar, informar e prestar contas do trabalho realizado pelo Comitê. Com acesso gratuito, podendo ser ouvido pelo celular ou transmitido em rádios, webrádios, escolas ou ambientes que promovam momentos de educação ambiental, os programas cumprem o papel de informar a população que vive nas cidades que integram a bacia do rio São Francisco ou qualquer um que tenha interesse em acompanhar as notícias sobre recursos hídricos e meio Escute todos os ambiente que envolvam o Velho Chico. podcasts publicados. Acesse o link Com apoio da Agência Peixe Vivo, os bit.ly/PodcastCBHSF podcasts da Rádio São Francisco estão ou escaneie o QR CODE disponíveis para download gratuito atraao lado. vés do site www.cbhsaofrancisco.com.br. 2

Anivaldo de Miranda Pinto Presidente do CBHSF


Fogo lá, estiagem aqui Queimadas na Amazônia podem impactar ciclo hidrológico de toda região Centro-Sul do país e agravar cenário de estiagem na bacia do São Francisco Texto: Luiz Guilherme Ribeiro Fotos: Victor Moriyama e Fernanda Ligabue / Greenpeace.

Em meados do mês de agosto, após São Paulo sentir os impactos das queimadas que assolaram a Amazônia, com uma névoa espessa que atravessou estados inteiros e fez o dia virar noite na principal cidade do país, o Brasil e o mundo voltaram as atenções para essa região que é considerada de fundamental importância na produção de água, absorção de gases de efeito estufa e regulação do clima de grande parte do planeta. De fato, os dados são devastadores. Segundo o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), o número de pontos de queimada é o maior dos últimos sete anos. Só em 2019, aumentou 83% em comparação com 2018, somando 72,8 mil ocorrências. Mais de 38 mil focos de incêndio – 52% do total – se concentraram na Amazônia. Dados do Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia) mostram também que, em julho de 2019, o desmatamento na Amazônia Legal aumentou 66% em relação ao mesmo mês do ano anterior, com mais 1.287 km² suprimidos. Toda essa devastação é prejudicial não somente para a última grande reserva florestal do planeta, mas para boa parte do Brasil também, incluindo a Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco. É o que aponta o coordenador do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélite (LAPIS) da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Humberto Barbosa. Segundo ele, num cenário de mudanças climáticas,

como a que vivenciamos, a precipitação de modo geral diminui e as temperaturas se elevam. “O aumento de queimadas e desmatamento têm como característica fazer com que essas emissões [gases de efeito estufa] aumentem e isso cria eventos climáticos cada vez mais intensos: secas em algumas regiões, por exemplo como aconteceu em São Paulo em 2015, e redução de chuvas na região Norte. De um modo geral, todo o ciclo hidrológico é afetado”, comenta. Um dos principais impactos à Bacia do Velho Chico poderia ser a falta d’água. “Nesse contexto [das queimadas e desmatamento na Amazônia], os impactos são: redução de chuvas no Centro-Sul, em função dessas emissões de CO2 estarem aumentando, e com isso o sistema hidrológico, principalmente na região Sudeste, é afetado pelas condições climáticas em condições de redução de chuvas. Isso também afetaria [a bacia hidrográfica] o São Francisco por que, principalmente por ele passar pela região de Belo Horizonte, essas chuvas diminuiriam e fariam com que o rio tivesse uma menor vazão”. O pesquisador da UFAL também chama a atenção para o fato de que o Brasil é um dos signatários do Acordo de Paris 2015, que rege medidas de redução de emissão de gases estufa a fim de conter o aquecimento global, e que o não cumprimento dessas metas pode ser extremamente nocivo para estas mesmas áreas do país. “Se a gente não mantiver essa temperatura do

planeta abaixo de 2°C, isso significa que as condições futuras poderão ser impactadas principalmente pela redução das chuvas no Brasil, sobretudo na região Central e na costa leste do Nordeste”, conclui Barbosa. O presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), Anivaldo Miranda classificou como uma “insanidade” a queima da floresta e do que considera “talvez o maior banco genético do planeta”, em troca de uma produção agropecuária rudimentar e improdutiva. Ele também teme e espera reflexos das queimadas em outras partes do país, como na bacia do Rio São Francisco. “A cobertura vegetal no Brasil está conectada em toda a sua extensão. O que acontece em um bioma tem influência em outro. É sabido que a Amazônia presta serviços ambientais especialmente para o regime de chuvas da bacia do Rio São Francisco, através dos seus rios voadores. Portanto, cada diminuição de floresta na Amazônia impacta esse regime de chuvas”. Mesmo reconhecendo a importância sistêmica da Amazônia para outras partes do mundo, Anivaldo reforça que outros biomas do Brasil são igualmente vulneráveis e impactados. “Embora a Amazônia atraia o interesse da comunidade internacional, é bom lembrar que a devastação no Brasil não se resume a esta região. O desmatamento na Caatinga e no Cerrado é tão ou mais agressivo e impactante em termos proporcionais do que na Amazônia, e acaba ficando invisível”. 3


V Encontro de Afluentes do Rio São Francisco O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) realizou nos dias 21 e 22 de agosto, em Maceió (AL), o V Encontro dos Comitês Afluentes do São Francisco. O evento, que acontece a cada dois anos, tem o objetivo de promover a integração entre os comitês e, este ano teve como tema “Diálogos para o empoderamento dos CBHs”. A programação contou com apresentações diversas. O especialista em recursos hídricos da Agência Nacional de Águas (ANA), Marcos Airton Freitas, apresentou uma perspectiva positiva para o Rio São Francisco em relação ao ano de 2020. O consultor Pedro Molinas fez uma explanação sobre a realidade do Plano de Integração do São Francisco (Pisf), a chamada obra da Transposição. De acordo com Marcos Freitas, a agência federal desenvolveu um mecanismo de acompanhamento das secas, que indica uma boa perspectiva para o próximo ano. “Superamos um período muito crítico, de uma seca severa na bacia. Graças a regulação da defluência, conseguimos passar esse período difícil. Se tivéssemos mantido a vazão de 1.300 m³/s, seria necessário o volume de água equivalente a três reservatórios de Sobradinho para chegar a uma situação confortável”, disse. O engenheiro hídrico e consultor do CBHSF, Pedro Molinas, apresentou o relatório que contém considerações sobre a gestão e operação do PISF. Segundo ele, o projeto foi superdimensionado, para vazões muito superiores às que efetivamente vão escoar. Molinas disse que a falta de capacidade dos estados receptores das águas do Velho Chico para usufruir plenamente do projeto é um dos problemas para a gestão do PISF. “O PISF é, hoje, uma obra inacabada, tanto da perspectiva física, faltando a construção de importantes ramais, como da perspectiva institucional, requerendo uma melhor gestão e controle da obra. Até 2018, o poder público federal agiu como se as obras estivessem concluídas, insistindo em implantar o que denomina de operação comercial”, avalia ele. 4

Cobrança O gerente de projetos da Peixe Vivo, entidade delegatária do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), Thiago Campos, fez uma apresentação sobre a atualização da metodologia de cobrança pelo uso da água bruta do chamado rio da integração nacional. Ele explicou que a medida foi tomada para atingir a meta estabelecida no Plano de Recursos Hídricos da bacia do São Francisco, documento que foi atualizado recentemente e apresenta a perspectiva para a gestão financeira do CBHSF até o ano de 2025. “O Plano prevê uma arrecadação de R$ 500 milhões nesse período e a modificação na metodologia de cobrança é o caminho para chegar a essa meta”, explicou Thiago Campos. Uma das modificações nessa metodologia é a possibilidade de cobrança apenas do que é utilizado pelo usuário. Antes, a cobrança era feita com base na outorga concedida. Apresentações Durante a programação, presidentes e representantes de comitês de bacias hidrográficas apresentaram resultados de estudos, expedições, levantamentos e exibição de vídeos referentes a ações de CBHs de Afluentes das quatro regiões fisiográficas da bacia. Os colegiados das bacias receptoras do PISF e o CBH Tarumã-Açu, do Amazonas, também participaram do evento. Membros do CBHSF e de Comitês de Afluentes participaram do encontro, em Maceió

Texto: Delane Barros Fotos: Edson Oliveira

No encerramento do encontro, uma mesa-redonda expôs as dificuldades dos colegiados e a necessidade de uma redefinição do modelo do Fórum Nacional dos Comitês de Bacias Hidrográficas (FNCBH), a fim de refletir a representatividade dos órgãos colegiados. Também foi apresentada uma carta aberta contendo as posições do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) em relação a alguns dos tópicos discutidos no evento. O presidente do CBHSF, Anivaldo Miranda, ao lado do vice-presidente, Maciel Oliveira, disse que o encontro mostrou a dificuldade dos demais comitês em garantir a representatividade e a falta de apoio para que isso aconteça. Ele deixou clara a sua posição contrária ao modelo do FNCBH, porque não reflete a realidade dos comitês, condição que se torna cada vez mais evidente em cada edição do Encontro Nacional de Comitês (Encob), promovido pelo Fórum Nacional. Miranda aproveitou a oportunidade para falar sobre a realidade da gestão das águas na região Norte do País. “Sugiro que o próximo Encob seja realizado no Pará, que juntamente com o Amazonas, representa quase a metade da disponibilidade hídrica do País e não conta com a atenção oficial”, disse o presidente do CBHSF, atraindo os aplausos e o apoio da plateia participante do evento em Maceió. Para a cobertura completa e as apresentações de cada CBH de Afluente, acesse www.cbhsaofrancisco.org.br.


Carta Aberta Ao final do Encontro, a plenária aprovou a carta aberta em defesa do Rio São Francisco, dos rios afluentes e dos estados receptores das águas da Transposição, apresentada

Rio Salitre, afluente do Velho Chico

Represa de Três Marias (MG)

Rio Paracatu, afluente do São Francisco

A transposição da águas do São Francisco beneficia quatro estados: Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco

pelo presidente do CBHSF, Anivaldo Miranda e que representa a posição do colegiado aos pontos apresentados e discutidos durante os dois dias do evento. Leia na íntegra:

Velho Chico clama por revitalização O V Encontro dos Comitês de Rios Afluentes do Rio São Francisco, evento anual promovido pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) com o objetivo de expandir e consolidar o princípio da gestão participativa, compartilhada e descentralizada das águas franciscanas, encerra os seus trabalhos, depois de dois dias seguidos de intensa atividade em Maceió, fazendo uma conclamação pública a todas as instâncias dos poderes executivos, judiciários e legislativos da União e dos estados ribeirinhos para que o Programa da Revitalização do Velho Chico e de suas bacias afluentes seja efetivamente implementado depois de mais de uma década e meia de promessas e planejamento jamais executados. Esse chamamento está apoiado também pelos comitês de bacias hidrográficas dos estados que, embora não estejam no território da bacia hidrográfica do São Francisco, como é o caso do Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba, serão, no entanto, receptores das águas do Velho Chico através dos canais do Projeto da Transposição, cujo Conselho Gestor precisa ser urgentemente reativado com a participação dos comitês, para que, finalmente, os grandes dilemas da Transposição possam ser resolvidos e um modelo de gestão sustentável dos seus canais implementado. Os comitês reunidos no V Encontro durante os dias 21 e 22 de agosto de 2019, expressam sua legítima preocupação para com o futuro da gestão dos recursos hídricos no território brasileiro e para tanto apoiam a ideia de construção de um grande Pacto das Águas na Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, pacto este que leve a União e os Estados ribeirinhos a, de fato, promoverem a urgente aceleração da implementação dos instrumentos da gestão das águas, tais como planos de bacias, cadastramento de usuários, cobrança pelo uso das águas, sistemas de outorga e empoderamento dos comitês a todo o grande território banhado pelo Velho Chico e seus afluentes, uma dimensão que representa nada menos do que 8% do território brasileiro. O V Encontro manifesta também seu apoio à retomada imediata da proposta desenvolvida pelo IBAMA durante o ano de 2018 para uso dos recursos oriundos da conversão de multas ambientais na implementação de projetos, já explicitados, de recarga de aquíferos e recuperação hidroambiental nas bacias dos rios São Francisco e Parnaíba, como forma de reverter o intenso processo de degradação dos biomas, dos solos e das águas. Pensando no Velho Chico, que representa 70% da disponibilidade hídrica da Região Nordeste e ainda atende ao Norte de Minas Gerais e a todo o semiárido brasileiro, o V Encontro manifesta viva preocupação para com o estado deplorável da gestão e fiscalização das barragens de rejeitos industriais e de minérios e alerta ao país que medidas rigorosas e urgentes devem ser adotadas para recrudescer a segurança das barragens que representam risco e potencial de dano aos afluentes e às águas franciscanas, porque se o rio São Francisco sofrer um crime ambiental nas proporções daquele que atingiu os rios Doce e Paraopeba, o Brasil simplesmente "quebra pelo meio.” O V Encontro volta a ter preocupações, também, com as ideias mirabolantes e fantasiosas recorrentemente apresentadas para supostamente resolver os problemas da escassez hídrica da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, notadamente as ideias relativas à uma pretendida transposição do Rio Tocantins ou à implantação de usinas nucleares no submédio São Francisco. Embora não alimentem preconceitos em relação a nenhuma obra hídrica em específico ou conceitualmente a qualquer forma de geração de energia, os comitês reunidos em Maceió consideram, no entanto, despropositadas, quaisquer novas transposições de águas ou projetos nucleares, principalmente se forem turbinados por novos processos autoritários que não discutem com a sociedade a concepção, conveniência ou justificação de obras de grande porte e impacto o que têm causado enormes prejuízos ao país. Finalmente, o V Encontro dos Comitês de Rios Afluentes do Rio São Francisco reitera seu compromisso para com o fortalecimento do Sistema Nacional de Recursos Hídricos e do Sistema Nacional de Meio Ambiente, como elementos determinantes para a gestão sustentável das águas brasileiras, ao tempo em que desaprova todas e quaisquer medidas tendentes ao enfraquecimento desses sistemas e ao desmonte da notável política pública ambiental que o Brasil há meio século vem desenvolvendo como um dos fundamentos estratégicos para a economia, o bem estar social e o futuro do nosso país. Maceió, 22 de agosto de 2019 5


CBHSF firma parceria com o governo do Estado da Bahia para avançar no cadastramento de usuários na Bacia do Rio Corrente Texto: Andréia Vitório/ Fotos: Manuela Cavadas

Secretário de Meio Ambiente da Bahia, João Carlos Oliveira, presidente do CBHSF, Anivaldo Miranda, diretora do Inema, Márcia Telles e vice-presidentet do CBHSF, Maciel Oliveira

O presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), Anivaldo Miranda, o secretário estadual de Meio Ambiente, João Carlos Oliveira, e a diretora do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), Márcia Telles, assinaram no dia 01 de agosto, em Salvador, um Acordo de Cooperação Técnica para o levantamento de usuários de recursos hídricos em trechos da Bacia Hidrográfica do Rio Corrente. “O Comitê e o governo da Bahia fizeram uma carta de intenções em 2018 e agora estamos dando desdobramento prático a isso, fazendo o primeiro termo de cooperação em torno de uma ação concreta que vai ser essa, a de melhorar o cadastro de usuários lá na região da Bacia do Corrente, o que é fundamental para avançarmos com a gestão hídrica daquela área. É uma gran6

de conquista do Comitê, que tem buscado estreitar o diálogo com os estados para alcançar resultados efetivos em prol do São Francisco”, explicou o presidente do CBHSF, Anivaldo Miranda. Para ele, a relação do CBHSF com os governos dos estados da Bacia é imprescindível e ações conjuntas que possam aproximar o plano de gestão da bacia do Rio São Francisco dos planos estaduais de recursos hídricos são as mais indicadas para criar uma sinergia produtiva, sobretudo, no que diz respeito à implementação e à universalização dos instrumentos de gestão. O secretário de Meio Ambiente, João Carlos Oliveira, falou sobre a relevância do objeto dessa parceria: “esse levantamento significa um grande avanço para a gestão da Bacia do Rio Corrente, localizada numa região muito importante, que é o Oeste Baiano e que vive, historicamente, uma história de conflitos pelo uso da água. Com este acordo, assumimos o compromisso de conhecer melhor a Bacia para de fato fazermos uma gestão mais justa, com a qual todos tenham suas demandas pelo uso da água atendidas de forma sustentável”. O prazo de vigência do acordo será de 24 meses e, nesta primeira fase, será feito um levantamento da área pela equipe técnica do Inema, preferencialmente, tomando como prioridade as áreas mais críticas da Bacia Hidrográfica do Rio Corrente – ex-

cetuando-se a sub-bacia do Rio Arrojado. Serão consideradas a disponibilidade hídrica da Bacia, as outorgas já liberadas e as que já foram demandadas e estão sob análise do órgão. “É com o cadastro de usuários que a gente conhece quem utiliza o recurso hídrico, seja ele o usuário regular, que tem outorga, ou quem está captando mesmo que não tenha regularidade do ato autorizativo. Isso, aliado ao plano de bacia que já está sendo desenvolvido (para o Rio Corrente), é uma ferramenta poderosa de gestão”, destacou a diretora do Inema, Márcia Telles. O vice-presidente do CBHSF, Maciel Oliveira, o diretor de Águas do Inema, Eduardo Topázio, a assessora técnica da SEMA, Larissa Cayres, e a gerente de integração da Agência Peixe Vivo, Rúbia Mansur, também participaram do ato de assinatura. Rio Corrente O rio Corrente possui aproximadamente 120 quilômetros (Km) de extensão entre a confluência dos seus formadores, os rios Formoso e Correntina, e a sua foz, no rio São Francisco, entre Bom Jesus da Lapa e Sítio do Mato. A sua bacia hidrográfica possui aproximadamente 35 mil km² e está localizada inteiramente no estado da Bahia, entre as bacias do rio Carinhanha e do rio Grande.


CBHSF subsidia nova captação de água em Pirapora Trecho do Velho Chico próximo a Pirapora

A prefeitura de Pirapora (MG), através do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE), assinou, no dia 12 de agosto, em Belo Horizonte, a Ordem de Serviço para execução das obras de implantação da nova Estação de Captação de Água do município, projeto que foi aprovado e subsidiado pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF). A nova estação, denominada Captação de Água II, terá um custo total de R$ 2,6 milhões e atenderá a população da parte alta da cidade e as empresas instaladas no Distrito Industrial. Preocupados com as reduções das vazões no rio São Francisco e com a diminuição do nível de água, o SAAE-Pirapora apresentou, em agosto do ano passado, para a Agência Peixe Vivo, um projeto de uma nova captação no Velho Chico, que vai beneficiar e

Texto: Tiago Rodrigues / Foto: Fernando Piancastelli

abastecer 60% da população de Pirapora. De acordo com o gerente de projetos da Agência Peixe Vivo, Thiago Campos, “o Comitê prontamente aprovou a demanda do SAAE e posteriormente, em outubro de 2018, foi assinado um Termo de Cooperação Técnica, na cidade de Pirapora. Em meados de janeiro, a autarquia repassou à Agência Peixe Vivo o projeto executivo da obra, que consiste na implantação de uma captação flutuante no rio, no Distrito Industrial do município, e a construção de uma adutora de aproximadamente um quilômetro, que levará água bruta até a Estação de Tratamento de Água II (ETA), para tratamento e distribuição” O diretor-geral do SAAE, Esmeraldo Pereira, explicou que a obra será totalmente financiada pelo CBHSF. “O SAAE entrou com o projeto e com a fiscalização. A execução será

feita pela Agência Peixe Vivo, responsável pela administração dos recursos do Comitê”, disse. De acordo com o diretor, a obra, que está prevista para começar no início de setembro, terá duração de cerca de seis meses. “Será uma captação nova, moderna, com bombas reserva e com todo sistema de subestação elétrica. Substituirá a captação antiga, que tem aproximadamente quarenta anos e está bem sucateada e obsoleta”, pontuou Esmeraldo. O Comitê executará a obra com os recursos provenientes da cobrança pelo uso da água. “Todos os grandes usuários de água, as companhias de saneamento, os irrigantes e as mineradoras, pagam pelo uso da água e, esse dinheiro, retorna em benefícios para bacia do São Francisco. Essa obra em Pirapora é um bom exemplo disso”, lembrou o gerente da Agência Peixe Vivo.

48 municípios da Bacia do São Francisco serão contemplados com PMSBs Texto: Mariana Martins / Foto: Edson Oliveira O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco vai promover contratação de Planos Municipais de Saneamento Básico em 48 municípios da Bacia do Velho Chico. A resolução foi aprovada em reunião ordinária da Diretoria Colegiada, ocorrida no dia 14 de agosto, em Paracatu, Minas Gerais, e é resultado do Chamamento Público CBHSF 01/2019. Serão contemplados 12 municípios em cada uma das regiões fisiográficas (Alto, Médio, Submédio e Baixo). Os Planos serão financiados por meio de recursos financeiros oriundos da cobrança pelo uso das águas da Bacia Hidrográfica do rio São Francisco, previsto no Plano de Aplicação Plurianual do Comitê (2018-2020) e a sua contratação deverá ser realizada pela Agência Peixe Vivo. Os Planos Municipais de Saneamento Básico –PMSB’s tornaram-se o foco de uma das ações mais importantes do Comitê da Bacia do Rio São Francisco. Por decisão institucional, o CBHSF resolveu auxiliar os municípios localizados na bacia no que diz respeito ao financiamento dos seus planos de saneamento básico, reforçando, assim, o compromisso do colegiado em fortalecer as ações de preservação e manutenção dos afluentes inseridos

na bacia, minimizando as cargas de poluição lançadas nos cursos d´água. A partir da lei federal 11.445/2007, a existência do PMSB passou a significar, para o município, a possibilidade de garantir verbas federais para aplicação em ações como tratamento de efluentes domésticos e resíduos sólidos e oferta de água tratada, melhorando a qualidade de vida da população, minorando e/ou eliminando os problemas de saúde ambiental de forma sistêmica e contínua no território municipal. Os municípios são selecionados de acordo com sua situação ambiental, quer seja pela necessidade de ampliação do sistema de abastecimento de água; a urgência de novos mananciais de abastecimento; o lançamento de esgoto sem tratamento à montante da captação; além da ocorrência de inundações ou alagamentos em áreas urbanas, entre outros critérios. Vale observar que, uma vez criado, a execução do plano de saneamento ficará a cargo das prefeituras ou por concessões privadas ou públicas. O plano atende a perspectiva dos próximos 20 anos com revisão a cada quatro anos. A lista dos municípios contemplados pode ser acessada no site do Comitê.

Falta de saneamento básico afeta a grande maioria dos municípios brasileiros Ouça o podcast com mais informações no nosso site. Acesse o link bit.ly/48Municipios ou escaneie o QR CODE ao lado.

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Dois

dedos de

prosa

Marcelo Ribeiro Marcelo Ribeiro é advogado e membro da Câmara Técnica Institucional e Legal (CTIL) do CBHSF. Especialista em Direito Ambiental, já foi Procurador-chefe do IBAMA em Alagoas e hoje atua como consultor jurídico de prefeituras na área ambiental, além de ser membro da Comissão de Meio Ambiente da OAB/AL e representante da OAB no CBH do Rio Piauí/AL. Nessa entrevista, Marcelo divide conosco um pouco de seu vasto conhecimento.

Texto: Mariana Martins

A grande questão ambiental atualmente são as mudanças climáticas, especialmente o aquecimento global. O que é esse fenômeno e de que forma impacta na sociedade, na economia e na vida do planeta? O final da II Guerra Mundial é um marco histórico na mudança comportamental da humanidade, em que padrões de consumo foram drasticamente alterados e o chamado estilo americano de vida (american way of life) tornou-se hegemônico no Ocidente, transformando a sociedade em uma sociedade de consumo, o que resultou em profundo impacto nos recursos naturais do planeta. Desde então, o uso de combustíveis fósseis vem alterando o equilíbrio climático, resultando no efeito estufa, em que gases, principalmente metano e dióxido de carbono, encapsulam a radiação solar e impedem a sua dissipação no espaço, tal como ocorria há milhões de anos. Isso vem provocando o aumento da temperatura na Terra, cujos efeitos vão desde a perda da biodiversidade, elevação do nível dos oceanos em função do derretimento das calotas polares, perda de solos agricultáveis, ondas de calor nas megalópolis, aumento no movimento migratório decorrente dos refugiados ambientais, ocorrência cada vez maior de eventos climáticos extremos como furacões, enchentes, secas severas, tudo isso provocado por ações antrópicas (do homem). Estes efeitos atingem principalmente as pessoas de menor poder aquisitivo, com menos condições de resiliência frente a um mundo hiperpovoado e dotado de poucos recursos naturais para atender à crescente demanda, especialmente por água, alimentos e moradia digna. De acordo com dados do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens e Satélites (LAPIS), ligado à Universidade Federal de Alagoas (Ufal), 12,85% do semiárido brasileiro enfrenta o processo de desertificação. O que vem causando esse fenômeno? Entende-se por desertificação a degradação da terra nas regiões áridas, semiáridas e do subúmido seco decorrente de ações antrópicas. No Brasil, uma imensa faixa territorial que abrange os nove estados nordestinos, além do Norte de Minas e do Espírito Santo, está susceptível à desertificação. Este fenômeno vem sendo estudado desde a década de 50, no Nordeste. Todavia, com a crescente perda da cobertura vegetal nativa, substituída por culturas agrícolas e pastagens, o processo de desertificação se acentuou no Brasil, acompanhando uma tendência mundial de perda das áreas florestadas, deixando os solos expostos à radiação solar, potencializando os efeitos provocados pelas mudanças climáticas.

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Em poucas palavras, que mensagem você passaria para os nossos leitores sobre a importância da luta contra as alterações climáticas? Deixo a mensagem de que, se os negacionistas das mudanças climáticas tiverem razão, e que não haja de fato aquecimento global e que tudo faz parte de um processo natural de variação da temperatura, afirmo que, mesmo assim, comungo da tese do “no regret” (sem arrependimento), na medida em que não causará prejuízo algum à humanidade agir de forma cautelosa em relação à pegada ecológica. Reduzir o consumo de bens materiais e, por consequência, o extrativismo dos recursos naturais, muitos deles finitos e indispensáveis à sobrevivência humana, adotar práticas sustentáveis, diminuir a produção de resíduos e incentivar a reciclagem, buscar a cooperação mútua e abdicar do individualismo, são algumas atitudes essenciais para que possamos manter o equilíbrio ecológico e evitar o colapso da vida em todas as suas formas. Afinal fica a pergunta: se de fato não existe mudança climática, que prejuízo teremos em incorporar os Princípios do Desenvolvimento Sustentável em nosso cotidiano?

Presidente: Anivaldo de Miranda Pinto Vice-presidente: José Maciel Nunes Oliveira Secretário: Lessandro Gabriel da Costa

Coordenação Geral: Paulo Vilela, Pedro Vilela, Rodrigo de Angelis Edição e Assessoria de Comunicão: Mariana Martins Textos: Andréia Vitório, Delane Barros, Luiz Guilherme Ribeiro, Mariana Martins, Michelle Parron, Tiago Rodrigues Diagramação: Sérgio Freitas Fotos: Edson Oliveira, Fernando Piancastelli, Manuela Cavadas, Victor Moriyama e Fernanda Ligabue (Greenpeace), Impressão: ARW Gráfica e Editora Tiragem: 5.000 exemplares

Produzido pela Assessoria de Comunicação do CBHSF - Tanto Expresso

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O que o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco vem fazendo em relação a isso? O Plano de Bacia do Comitê do São Francisco dedicou uma atenção especial ao semiárido, justamente por reconhecer a sua importância estratégica enquanto parcela maior da bacia sanfranciscana, e vem atuando fortemente em projetos voltados ao uso sustentável dos recursos hídricos, construção de cisternas superficiais e subterrâneas de acumulação das águas das chuvas, recuperação de nascentes, incentivo ao plantio de vegetação nativa, educação ambiental, apoio na construção de políticas públicas locais voltadas à variável ambiental, capacitação de atores locais, a fim de que os instrumentos legais possam ser utilizados em benefício da coletividade. O CBHSF incorporou a filosofia de que é impossível combater a seca. O que se pretende é o convívio sustentável com as inevitáveis secas, de tal forma que os impactos provocados pela falta de chuvas regulares sejam mitigados mediante o uso racional da água. O desafio é imenso e complexo, proporcional ao tamanho da bacia do Rio São Francisco e os milhões de seres vivos que dele dependem para sobreviver, mas temos a certeza de que estamos no caminho certo e os bons frutos deste trabalho já podem ser colhidos em diversas comunidades que foram beneficiadas pelo trabalho do Comitê, cujas ações, repita-se, são demonstrativas em razão dos parcos recursos que dispõe comparado à magnitude dos problemas.

Secretaria do Comitê: Rua Carijós, 166, 5º andar, Centro - Belo Horizonte - MG - CEP: 30120-060 (31) 3207-8500 - secretaria@cbhsaofrancisco.org.br - www.cbhsaofrancisco.org.br Atendimento aos usuários de recursos hídricos na Bacia do Rio São Francisco: 0800-031-1607 Assessoria de Comunicação: comunicacao@cbhsaofrancisco.org.br Comunicação

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