Travessia Nº 39 - Julho 2020 - Notícias do São Francisco

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travessia Notícias do São Francisco

JORNAL DO COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO / JULHO 2020 | Nº 39

Relatório da II Expedição do Baixo São Francisco é entregue ao CBHSF CNRH prorroga mandatos de membros de CBHs interestaduais Página 4

Se aprovada, PEC pode permitir construção de usina nuclear em PE Página 5


Editorial DIÁLOGO QUE FORTALECE A GESTÃO DAS ÁGUAS Os Comitês interestaduais de bacias hidrográficas estão voltando a se rearticular e esse é um dado alentador para a boa gestão das águas de rios e bacias que atravessam ou ocupam territórios de mais de um estado brasileiro. Embora em desenho institucional esdrúxulo ocupem apenas um assento no Conselho Nacional dos Recursos Hídricos (CNRH), eles representam, juntamente a mais de duas centenas de Comitês estaduais, a base ainda não devidamente empoderada do Sistema Nacional de Gerenciamento dos Recursos Hídricos (SINGREH) do Brasil. Apesar de seu número ainda reduzido na esfera federal, visto que a proverbial falta de vontade institucional tem atrasado sua formação em bacias hidrográficas importantíssimas para o país, os Comitês existentes têm sido um fator extremamente positivo para dotar o SINGREH da capilaridade de que ele precisa para, de fato, na ponta, tornar a gestão das águas uma realidade dinâmica exatamente ali onde o uso das águas ocorre em sua verdadeira complexidade e potencial de conflito. Devido às suas características de espaço institucional de novo tipo, afeito so-

bretudo ao desenvolvimento da cultura do diálogo e à construção de consensos entre usuários das águas, sociedade civil e poder público, os Comitês sem dúvida alguma representam a semente promissora de arranjos institucionais muito mais eficientes e preparados para o enfrentamento das adversidades que o Brasil deverá enfrentar na difícil gestão daquele que é o mais decisivo insumo da vida e da economia: a água doce. Na busca do reconhecimento devido a esse papel inovador, previsto na Lei Nacional das Águas, a Lei 9.433/97, os Comitês têm levado para o seio do Sistema Nacional de Recursos Hídricos a agenda de prioridades que a vida está impondo a toda a sociedade brasileira naquilo que diz respeito à urgente necessidade de cuidar da quantidade e da qualidade das águas com a urgência que o século XXI demanda. Na luta para empurrar o poder público na direção da implantação efetiva, em todo o território brasileiro, dos instrumentos da gestão hídrica, sem os quais falar de cuidados com a água é pura retórica, tanto no nível municipal, estadual ou federal, os Comitês fazem o trabalho essencial que a Lei 9.433/97 consagrou, que é o de criar e conso-

lidar na prática a visão de bacia hidrográfica como elemento crucial para uma política atualizada de planejamento e uso inteligente e sustentável dos territórios e seus recursos naturais, em especial, a água. Por isso é animador perceber que, mesmo em meio a uma pandemia desafiadora, os Comitês interestaduais começam a discutir pautas comuns, sobretudo aquelas afetas às discussões do CNRH e suas câmaras técnicas, trazendo propostas e conclusões maduras que muito irão ajudar o avanço de temáticas hídricas nacionais, como é o caso da segurança de barragens, da política de saneamento básico, da interação entre gestão ambiental e gestão dos recursos hídricos, do desafio representado pela ausência de políticas efetivas para gestão das águas subterrâneas e uma miríade de outros assuntos jurídicos, institucionais, administrativos, técnicos e científicos que se acumulam e necessitam de uma sistemática nova para mais rápida solução. O tempo urge!

Anivaldo de Miranda Pinto Presidente do CBHSF

III SBHSF acontecerá on-line em dezembro e prazo para submissão de trabalhos é prorrogado Texto: Luiza Baggio O III Simpósio da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (SBHSF) será realizado de forma on-line, nos dias 07, 09, 11, 14, 16 e 18 de dezembro com isenção da taxa de inscrição. A ideia é fazer as apresentações em dias alternados, por isso, o evento acontecerá em duas semanas. O prazo final para a submissão dos trabalhos foi prorrogado para o dia 30 de setembro. Poderão também ser submetidos trabalhos sobre outras bacias hidrográficas, além da bacia do São Francisco. O valor pago para inscrições do evento presencial será devolvido o mais rápido possível, pela plataforma de inscrição. “Em vista do momento de incerteza gerado pela pandemia da COVID-19, a equipe do FIENPE decidiu realizar o III SBHSF de forma on-line para garantirmos que o evento ocorra ainda em 2020. Vamos realizar as adequações necessárias na programação, para que consigamos promover o debate, aprendizado e a atualização das informações. Como será on-line, esperamos alcançar um 2

público ainda maior”, diz o coordenador do FIENPE, o professor da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), Renato Garcia Rodrigues. Para a coordenadora do III SBHSF e professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Sílvia Corrêa Oliveira, o momento é oportuno para a realização do evento. “A realização do III SBHSF é de extrema importância já que a ciência e a pesquisa estão sendo colocadas à prova. A proposta do evento é de debater sobre soluções científicas para as questões da bacia do Velho Chico”. O III SBHSF tem como tema “A importância da ciência para o futuro do Rio São Francisco” e é uma realização do Fórum de Pesquisadores de Instituições de Ensino Superior da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco e do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF). Para submissão de trabalhos e atualização das informações, acompanhe o site do sbhsf.com.br.

CIÊN FUTU CIA RO AMBI ENTE III SIMPÓSIO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO

A Importância da Ciência para o Futuro do Rio São Francisco


Comissão Processante debate mediação de conflito pelo uso da água na bacia do Rio Grande Texto: Luiza Baggio / Foto: Edson Oliveira

Os membros da Comissão Processante do conflito pelo uso da água na bacia do Rio Grande (BA) debateram, por meio de videoconferência, no dia 19 de junho, sobre as ações para a mediação. O processo de conflito foi instaurado pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) em agosto de 2019 a pedido do Comitê da Bacia do Rio Grande (CBHG). O relator do processo de conflito, o membro da Câmara Institucional e Legal (CTIL) Cláudio Ademar, explica que o objetivo foi analisar e debater com os membros da Comissão Processante as novidades do processo de conflito. “Enviamos anteriormente ofícios à Embasa [Empresa Baiana de Águas e Saneamento], ao Inema [Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos] e à

Apesar da proximidade com o rio, população sofre com a escassez de água

Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf). O processo ganhou a atenção da Embasa e do Inema que responderam às nossas solicitações e vão nos fornecer dados e auxiliar na mediação do conflito”. Para Moisés Menezes, membro da CTIL, há muito a se fazer. “Ainda temos muito trabalho pela frente. Precisamos conhecer a vazão do Rio Boa Sorte em Barreiras e Catolândia para conseguirmos avançar. Para isso, solicitaremos ao Inema o cadastro de usuários da região e os dados de vazão do Boa Sorte”, disse. Menezes explicou que a compreensão do regime hidrológico estabelecido pelos fluxos naturais de vazões de um rio, assim como as suas variabilidades e as alterações

ocorridas são essenciais para a avaliação dos aspectos da dinâmica fluvial em termos de qualidade e quantidade de água, e para desenvolver um processo de racionalização, conservação e preservação dos recursos hídricos. No mês de março, a Comissão Processante do conflito pelo uso da água na bacia do Rio Grande visitou a região de Catolândia e Barreiras para ouvir as comunidades envolvidas e saber mais sobre a escassez de água na região e as consequências para as famílias atingidas. “Agora precisamos procurar as prefeituras para saber o percentual de pessoas que ouvimos e, assim, definirmos se a amostra que colhemos é representativa”, afirmou João Bastos Neto, que também é membro da CTIL. O coordenador da Câmara Consultiva Regional (CCR) do Médio São Francisco, Ednaldo Campos, esclarece que a população procura a solução do conflito há bastante tempo. “O conflito pelo uso da água existe há bastante tempo na bacia do Rio Boa Sorte e a população procura uma solução. O CBHSF está desenvolvendo um trabalho importante para solucionar o problema na região. Já ouvimos as pessoas que estão a jusante dos barramentos e que estão sofrendo com a escassez de água e precisamos ouvir os que estão a montante para saber o motivo deles estarem represando tanta água e deixando o restante da população nessa situação”. Conflito na bacia do Rio Grande O conflito pelo uso da água na Bacia do Rio Grande acontece mais precisamente na bacia do Rio Boa Sorte, nos municípios de Catolândia e Barreiras, no Oeste baiano, devido a alguns barramentos que foram construídos na região. A agricultura de subsistência é a atividade desenvolvida na região. A produção é destinada a atender as demandas de mercado e a maior parte é para o consumo familiar. O método de irrigação adotado na região é baseado em águas superficiais com irrigação por sulco, um sistema ultrapassado que consome muita água, o que contribui para a diminuição da vazão do Rio Boa Sorte. Historicamente, a região da Bacia do Rio Grande tem casos de conflitos pelo uso da água. Como os Comitês têm um papel de mediador, o CBHSF instaurou o conflito na região e busca a solução no processo de mediação. 3


CNRH prorroga por 1 ano o mandato dos membros e das diretorias dos CBHs Interestaduais Texto: Anivaldo Miranda / Fotos: Ricardo Botelho

O presidente do CBHSF Anivaldo Miranda entre o secretário Lessandro Gabriel (esquerda) e o vicepresidente Maciel Oliveira (direita)

O Conselho Nacional dos Recursos Hídricos CNRH aprovou por unanimidade a prorrogação dos mandatos dos membros titulares e suplentes, bem como das diretorias e demais instâncias dos Comitês interestaduais de bacias hidrográficas, pelo prazo de um ano, a partir do término, que estava previsto ainda em 2020, da gestão atual de vários comitês. A videoconferência foi realizada no dia 29 de junho. A decisão abrangeu os CBHs dos Rios São Francisco, Paranapanema, Verde e Verde Grande, cujos processos de renovação eleitoral foram interrompidos ou sequer iniciados por causa da emergência sanitária provocada pela disseminação da pandemia do Covid-19. Coube ao presidente do CBHSF, Anivaldo Miranda, que é titular da vaga dos CBHs naquele conselho, encaminhar a fun4

damentação da proposta apresentada pela Secretaria Executiva do CNRH. No caso específico do CBHSF, cuja gestão atual se encerraria em setembro do corrente ano, a prorrogação valerá até setembro de 2021, assegurando, assim, que a mobilização eleitoral no vasto território da bacia hidrográfica do Rio São Francisco ocorra em 2021 da forma mais abrangente e democrática possível, sem prejuízo de qualquer dos segmentos que concorrerão às vagas do Comitê. Cobrança pelo Uso da Água O CNRH também aprovou a abertura de um amplo processo de discussão da demanda, formulada pelo setor da indústria, para suspensão da emissão dos boletos de cobrança pelo uso da água bruta durante o ano de 2020 em função dos impactos da pandemia nos custos de produção de vários setores de usuários das águas do Velho Chico. A demanda já havia sido acatada pela presidente da Agência Nacional de Águas, em 15 de abril último, mas será revista por apresentar diversos óbices legais e em função de questionamentos apresentados por Comitês de bacias hidrográficas e suas Agências de bacia sobre os possíveis im-

pactos dessa suspensão da cobrança no funcionamento dos planos de aplicação financeira dos Comitês e na execução dos seus projetos e contratos. A partir de proposta do presidente do CBHSF, Anivaldo Miranda, os Comitês de bacias e seus braços executivos, as agências delegatárias, serão consultados na busca por soluções juridicamente cabíveis, tanto para atender aos usuários efetivamente impactados pela pandemia em seus custos de produção, como para atender à manutenção do custeio das entidades delegatárias das funções de agências de bacias, bem como para garantir o pleno funcionamento dos Comitês. Além disso, os Comitês estarão representados no Grupo de Trabalho que o CNRH criará para encaminhar uma proposta concreta de solução para o impasse da cobrança ainda no mês de julho entrante. Da pauta longa da videoconferência ainda fizeram parte a aprovação do Relatório 2018 de Segurança de Barragens, apresentado pela Câmara Técnica de mesmo nome, e a aprovação da AGEVAP – Agência de Bacias Hidrográfica do Vale do Paraíba para funcionar como Agência delegatária do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Doce.


PEC das Chaleiras Atômicas, que poderá liberar a construção de usinas nucleares em PE, foi pauta de debate on-line Texto: Deisy Nascimento

A PEC nº 09/2019, de autoria do deputado estadual Alberto Feitosa (PSC – PE), modifica o artigo 216 da Constituição de Pernambuco, que permite a instalação de usinas nucleares no estado. Tal projeto tem sido visto como uma ameaça à vida, pois violenta os direitos de populações tradicionais, como quilombolas e indígenas que vivem às margens do Rio São Francisco, onde se instalaria a usina. Para discutir o assunto, foi realizado no dia 04 de julho um debate online com a participação do presidente do CBHSF, Anivaldo Miranda, e do deputado estadual João Paulo Lima e Silva (PCdoB), com a mediação de Alzení Tomáz (coordenadora da Nova Cartografia Social de Povos e Comunidades Tradicionais da Bacia do São Francisco e membro da Sociedade Brasileira de Ecologia Humana), Célio Bermann (professor de pós-graduação em Energia da USP/SP), José Karajá (geógrafo e assessor do CIMI/NE) e Renato Cunha (coordenador do GAMBA – Grupo Ambientalista da Bahia). Segundo o deputado estadual João Paulo, a Constituição de Pernambuco proíbe a instalação de usinas nucleares no estado, e só pode ser alterada por uma PEC. “Sou relator dessa emenda e me posicionarei contra essa PEC. Informo que, por enquanto, ela não será votada dadas as outras demandas ligadas à Covid-19. Porém, é importante deixar a população ciente dessa discussão e levantar o assunto em relação aos impactos econômicos e ambientais para o Rio São Francisco e para todo Brasil”. De acordo com Anivaldo Miranda, o CBHSF já se posicionou sobre o assunto há quase dez anos, quando essa questão veio

à tona e havia vários pontos de localizações possíveis para essa planta nuclear. “Pensaram na região de Cabrobó (PE), Itacuruba (PE), Belo Monte (AL) e em Propriá (SE). Na ocasião, toda essa situação ameaçou desencadear uma corrida e uma briga porque os gestores dos estados queriam instalar em seus territórios as usinas nucleares. Mas, é importante esclarecer a população sobre isso porque muitos dos nossos gestores ainda estão com a mentalidade do início do século 20. Porém, no atual século o essencial é fazer gestão pública de qualidade”, disse. Miranda acrescentou que, enquanto Comitê, não tem nenhum preconceito e nem demoniza qualquer forma de energia, nem hidrelétrica, nem eólica, nem atômica ou nuclear, mas é importante frisar que há vantagens e desvantagens. No caso da energia nuclear, há aspectos positivos como o fato de ocupar pouco espaço e não emitir gases, por exemplo. Entretanto, tem duas questões fundamentais no uso da energia nuclear: a primeira é a geração do lixo nuclear, que até hoje ninguém sabe o que fazer com ele, e o segundo aspecto é o caso de acontecer um acidente. “Nós não temos como lidar com um possível acidente nuclear no Semiárido ou em qualquer região brasileira. Costumo dizer o seguinte: que o Rio São Francisco não tem plano B e essa usina nuclear não é a única ameaça potencial que o rio pode enfrentar, já que em Minas Gerais temos pelo menos dez barragens de rejeitos de minério. Por exemplo, qualquer acidente no Rio Paracatu (MG) atingirá o Rio São Francisco diretamente e milhares

de pessoas serão prejudicadas”. O presidente do CBHSF falou do potencial da energia solar no Brasil. “É uma energia que pode ser usada sem a necessidade de construção de grandes linhas de transmissão. Há também a energia eólica, da qual duvidavam muito, mas estão percebendo seus benefícios”. O deputado estadual João Paulo Lima e Silva pontuou alguns encaminhamentos acerca da pauta sobre energia nuclear. “Em princípio sou contra a instalação da usina nuclear. Ressalto aqui que a iniciativa do abaixo-assinado ‘Chaleiras Atômicas Não’ foi muito importante. Ele vai abrir para as pessoas a possibilidade do início de um diálogo. Se o Comitê tomar um posicionamento contra a instalação da usina nuclear já será um avanço, politicamente”. Anivaldo Miranda ressaltou que o Comitê já se posicionou acerca da possível instalação de uma usina nuclear e considera que essa pauta não é prioridade e nem é recomendável para a bacia do Rio São Francisco. “Como essa questão voltou à tona nós fomos demandados inclusive pelos nossos colegas da comunidade indígena Pankará, já que temos uma relação muito boa com eles, que possuem representantes com assento no Comitê. O CBHSF voltou a tratar desse assunto com os ministérios que têm implicação direta nessa questão. O Ministério das Minas e Energia nos respondeu alguns questionamentos e a partir de agora iremos conhecer melhor do assunto para poder deliberar algumas ações. Vamos discutir e acompanhar tudo para em breve trazer novidades”, finalizou.

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Relatório da II Expedição Científica realizada no Baixo São Francisco traz resultados importantes Texto: Deisy Nascimento / Fotos: Edson Oliveira Em novembro do ano passado, foi realizada a II Expedição Científica no Baixo São Francisco, que contou com o apoio do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF). Uma equipe composta por mais de 50 pesquisadores e técnicos de 16 instituições de ensino percorreu cerca de 500km com o objetivo de analisar as águas e todo o ecossistema do Velho Chico e propor ações com a finalidade de mitigar os problemas no rio. Como resultado do trabalho, um relatório de 540 páginas com um levantamento detalhado da região. Foram dez dias de expedição, onde foram analisados a qualidade da água, educação ambiental, ictiofauna, além da saúde e condições socioeconômicas das comunidades ribeirinhas. Dividido em quatro eixos temáticos (Ictiofauna; Água; Educação Ambiental e Socioeconomia e Tecnologia e Inovações), o relatório irá nortear propostas de manejo e auxiliará instituições, bem como prefeituras, nas tomadas de decisões com embasamento científico atual e detalhado, segundo o coordenador da expedição, professor Emerson Soares, da Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Em relação à ictiofauna, constatou-se pouca diversidade de peixes. “Apenas seis espécies representam 80% das capturas na região. A diminuição da vazão, pesca com métodos não permitidos, represamento da água, desmatamento da vegetação ciliar, assoreamento, poluição por efluentes e agrotóxicos, aliados à diminuição do regime de chuvas, vêm prejudicando a reprodução dos peixes, afetando as migrações reprodutivas de espécies de piracema e esgotando os estoques pesqueiros” explicou Soares Também foi detectada a presença de metais nos peixes analisados. “O ferro foi o metal mais abundante, seguido do zinco, no tecido muscular dos peixes estudados. As concentrações de mercúrio, cádmio e chumbo encontradas nos peixes não apresentam risco à saúde humana, associado ao consumo dessas espécies, com base nos Limites Máximos de Tolerância (LMT) prescritos pela Agência Nacional da Vigilância Sanitária (ANVISA)”, afirma o coordenador da expedição, Emerson Soares. Água Os resultados demonstraram que a água de todos os pontos de coleta encontra-se fora dos padrões de potabilidade recomendados para consumo humano. “Com a variação da vazão na região do Baixo São Francisco, a qualidade das águas também é afetada. Diante disso, foi observado que as 6

águas do São Francisco, nos municípios de Piaçabuçu (AL) e Brejo Grande (SE) encontram-se em processo de salinização. Essa mudança de água doce para água salobra provoca alterações também na biodiversidade e, consequentemente, interfere nas atividades socioeconômicas dos ribeirinhos”, pontuou Emerson Soares. O relatório aponta alto índice de poluição das águas do Velho Chico. “Foram observados valores altos de cianobactérias e elas estão tipicamente associadas às condições eutróficas (poluídas). Assim, a água do manancial oferece riscos à saúde pública”, ressaltou’. Comunidades e educação ambiental O extrativismo de frutas nativas é a principal fonte de renda para muitas famílias da região da foz do rio São Francisco. Isso contribui para sua manutenção e para a conservação ambiental. A integração da produção extrativista ao mercado turístico pode ser uma estratégia adotada, considerando o potencial do município estudado e do estado de Alagoas. A principal política pública acessada pelos pescadores é o Seguro Defeso (cerca de 90% possuem carteira de pesca e recebem o benefício), seguido do bolsa-família com 50%, e aposentadoria (25%). “Com relação à renda média mensal familiar é bom destacar que nenhuma família possui rendimentos acima de um salário mínimo, evidenciando a baixa remuneração pela atividade”, citou Soares. “Assim como verificado na I Expedição Científica do Baixo São Francisco, em 2018, é possível constatar que a educação ambiental nas comunidades ribeirinhas e escolas visitadas ainda é tratada de forma superficial, seja no dimensionamento de projetos pedagógicos ou na falta de políticas públicas com estímulos e recursos oficiais (federal, estadual e municipal) para desenvolvê-las de maneira efetiva. As poucas ações isoladas realizadas não apresentam conexão clara e efetiva com os problemas enfrentados pelas comunidades ribeirinhas”, finalizou. O relatório pode ser acessado na integra no site do CBHSF em: bit.ly/30AILut

Ouça a entrevista com o coordenador da expedição, Emerson Soares em: bit.ly/PodTrav81 ou escaneie o QR CODE ao lado.


Diálogo entre a SUDENE e o CBHSF poderá diminuir carga de esgotos no rio São Francisco Texto: Deisy Nascimento

Há cerca de três anos, a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) e o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) iniciaram uma conversa para estabelecer uma estreita colaboração entre as duas instituições. E os resultados começam a aparecer e são alentadores, sobretudo no esforço conjunto para execução do Plano de Gestão de Recursos Hídricos da bacia, aprovado pelo Comitê, e das metas do Plano de Desenvolvimento do Nordeste, de responsabilidade da Sudene. No dia 17 de junho, em reunião remota, a Sudene anunciou que está previsto um montante de R$ 40 bilhões para aplicação na Bacia do São Francisco em ações de saneamento básico, geração de renda e desenvolvimento regional, como parte de um planejamento estratégico que terá um horizonte de dez anos para ser executado. Os quatro pontos críticos da calha do São Francisco para priorização da coleta e tratamento de esgotos (Três Marias, Petrolina/Juazeiro, Lago de Itaparica/Lago de Xingó e Propriá, onde fica a captação de água para abastecimento humano da região metropolitana de Aracaju), levantados pelo CBHSF, foram incorporados nos planos da Sudene. O presidente do CBHSF, Anivaldo Miranda, agradeceu o retorno dado pela Sude-

ne às ideias e propostas encaminhadas pelo Comitê e reiterou que a finalidade do Plano de Recursos Hídricos da bacia hidrográfica é se transformar em instrumental efetivo para uso concreto de todas as instituições públicas, governos, empresas dos setores público ou privado, organizações, entidades e similares que tenham real interesse em viabilizar o desenvolvimento harmônico do enorme território que cerca o Velho Chico e seus afluentes. A Sudene informou também que haverá investimentos para o Rio Parnaíba. “Podemos aproveitar os estudos já realizados pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco para fomentar financeiramente os esgotamentos sanitários. Aproveitar o rio e fazer iniciativas viáveis em torno do esgotamento e da irrigação. Todos os investimentos serão feitos através de parcerias público-privadas (PPPs) e o Ministério de Desenvolvimento Regional estará trabalhando nisso. Serão coletadas informações para a construção do plano estratégico que dará o norte dos próximos encaminhamentos do que será feito nos próximos dez anos”, contou o superintendente da Sudene, Evaldo Cruz. O vice-presidente do CBHSF, Maciel Oliveira, disse que há intervenções a serem

priorizadas e o saneamento é um ponto importantíssimo. “Temos um caderno de planos do Comitê onde há o detalhamento das ações realizadas na Bacia do São Francisco. Há diversos projetos ligados à sustentabilidade, às questões econômicas, ao povo Pankará, bem como reivindicações das comunidades ribeirinhas. São muitas ações estratégicas de futuro para a recuperação hidroambiental com atividades de sustentabilidade para beneficiar os que moram no entorno do Rio São Francisco”. Para Thiago Campos, gerente de projetos da Agência Peixe Vivo, é uma grande satisfação saber que a SUDENE demonstrou interesse em investir em ações para a bacia hidrográfica do Rio São Francisco. “Em nosso caderno de investimento há seis eixos importantes, são eles: Eixo I – Governança e Mobilização Social, Eixo II – Qualidade da Água e Saneamento, Eixo III – Quantidade de Água e Usos Múltiplos, Eixo IV – Sustentabilidade Hídrica no Semiárido, Eixo V – Biodiversidade e Requalificação Ambiental e Eixo VI – Uso da Terra e Segurança de Barragens. Cada eixo tem um plano e orçamento para serem investidos e tais investimentos ajudarão a colocar em prática os projetos”, finalizou.

7


Dois

Há seis anos participando ativamente de temas sobre o uso da água, para você quais os debates mais importantes já pontuados ao longo desse período? Sou tão ligado aos problemas do rio que não consigo fazer distinção do que é mais importante ou menos importante nas discussões em defesa da bacia sanfranciscana. Para mim tanto faz estar na menor cidade da bacia fazendo uma discussão sobre a necessidade do PMSB – Plano Municipal de Saneamento Básico ou estar em Brasília discutindo com o Ministro do Meio Ambiente ou outro ministério qualquer. Porém, me sinto melhor quando estou conectado ao rio. Tenho necessidade de estar conectado com o rio e com o povo do rio.

dedos de

prosa

Recentemente você foi escolhido para representar os comitês na Câmara Técnica de Segurança de Barragens. Qual a importância de ocupar essa cadeira e qual o seu posicionamento sobre essa temática? Fazer parte dos 17 membros titulares da CTSB – Câmara Técnica de Segurança de Barragens do CNRH – Conselho Nacional de Recursos Hídricos, composta por representantes de ministérios, membros dos órgãos gestores de recursos hídricos dos estados, membros do setor elétrico, da mineração e Associação dos Engenheiros de Segurança de Barragens, e apenas dois membros da sociedade civil, é o meu maior desafio, porque talvez seja a câmara mais técnica do CNRH. Mas eu fui trazendo outro olhar, e apresentei o rio como um ser vivo que, ao ser barrado, muda o seu comportamento hídrico. E assim, comecei a levar a ideia de humanização quando se trata de segurança de barragens. Em contrapartida, levo as questões técnicas para o povo do rio, antes invisíveis aos olhos da segurança de barragens.

Almacks Luiz Silva Entrevista: Juciana Cavalcante Foto: Bianca Aun O tecnólogo em Gestão Ambiental com especialização em Gestão de Bacias Hidrográficas e Saneamento Básico, Almacks Luiz Silva, foi presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Salitre por seis anos e hoje é secretário da Câmara Consultiva Regional do Submédio São Francisco. Membro titular do CBHSF, também integra o Grupo de Acompanhamento do Contrato de Gestão e é membro titular da Câmara Técnica de Segurança de Barragens do Conselho Nacional de Recursos Hídricos.

Também secretário na Câmara Consultiva Regional no Submédio São Francisco, como avalia a atuação e importância das CCRs no panorama de preservação da Bacia Hidrográfica e quais os desafios e cami-

travessia Notícias do São Francisco

Presidente: Anivaldo de Miranda Pinto Vice-presidente: José Maciel Nunes Oliveira Secretário: Lessandro Gabriel da Costa

Secretaria do Comitê: Rua Carijós, 166, 5º andar, Centro - Belo Horizonte - MG - CEP: 30120-060 (31) 3207-8500 - secretaria@cbhsaofrancisco.org.br - www.cbhsaofrancisco.org.br Atendimento aos usuários de recursos hídricos na Bacia do Rio São Francisco: 0800-031-1607

Comunicação

8

Apoio Técnico

nhos para atuações ainda mais efetivas? Temos 500 anos de impacto na bacia e o Comitê foi fundado em 2001 e, há bem pouco tempo, foi implantada a Cobrança pelo Uso da Água. Os recursos são pequenos em relação aos impactos que precisam ser mitigados, mas, ainda assim, o CBHSF tem atuado com a realização de projetos demonstrativos, para dizer aos governos estaduais e municipais que, mesmo com poucos recursos, é possível fazer alguma coisa pelo rio. A minha avaliação é de boa para ótima no programa de preservação da Bacia. O nosso maior desafio é o Pacto das Águas, onde questionamos que quantidade e que qualidade de água o estado de Minas Gerais entrega a Bahia, a Bahia entrega a Pernambuco etc, até a foz, em Piaçabuçu, no estado de Alagoas. Em 2018 você realizou a expedição fotográfica ‘Olhares do Velho Chico’ que na sua primeira etapa passou por 11 municípios. Como nasceu o projeto e com que objetivo? Dos 505 municípios da bacia conheço 285, e queria conhecer e fazer um registro fotográfico das 57 cidades que ficam na calha do rio, para ver como esse povo vive. As fotos selecionadas são inéditas. Serão publicadas no final da fase II da expedição, que está prevista para entre os meses de setembro e dezembro. Porém, outras fotos podem ser vistas no meu Instagram @almacksluizsilva ou através do QRCode ao lado. Como este trabalho contribui com a região da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco? Na realidade entendo que contribui e muito, porque ao chegarmos nessas cidades fazemos palestras sobre meio ambiente e recursos hídricos. Temos o apoio dos membros do CBHSF Antônio Eustáquio (Tonhão), que me acompanha no Alto São Francisco, Ednaldo Campos no Médio e Antônio Jackson, que me acompanha em todas as regiões fisiográficas, além do Baixo São Francisco.

Produzido pela Assessoria de Comunicação do CBHSF – Tanto Expresso comunicacao@cbhsaofrancisco.org.br Coordenação Geral: Paulo Vilela, Pedro Vilela, Rodrigo de Angelis Edição e Assessoria de Comunicão: Mariana Martins Textos: Anivaldo Miranda, Deisy Nascimento, Iara Vidal e Luiza Baggio Diagramação: Sérgio Freitas Fotos: Azael Gois, Bianca Aun, Edson Oliveira, Ricardo Botelho e Shutterstock Impressão: ARW Gráfica e Editora Tiragem: 5.000 exemplares Direitos Reservados. Permitido o uso das informações desde que citada a fonte. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

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