travessia Notícias do São Francisco
JORNAL DO COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO / AGOSTO 2020 | Nº 40
XXXVIII PLENÁRIA
ORDINÁRIA DO CBHSF 03 e 04 de setembro de 2020 | 13h30m as 17h
A VIDA AQUÁTICA E OS USOS MÚLTIPLOS
População cria movimento para denunciar impactos da UHE Formoso
Confira a entrevista com José Galizia Tundisi, especialista em gerenciamento de recursos hídricos
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Editorial PANDEMIA E COBRANÇA PELO USO DA ÁGUA BRUTA A Agência Nacional de Águas –ANA, ao atender parcialmente, no início da pandemia, a uma demanda da Confederação Nacional da Indústria relativa à possibilidade de suspensão temporária da emissão de parte dos boletos relativos à cobrança pelo uso da água bruta referentes ao ano de 2020, explicitou um cipoal de problemas que foram parar no Conselho Nacional dos Recursos Hídricos. O primeiro deles é atinente à forma como se deve proceder em apoio aos usuários das águas efetivamente atingidos pelos impactos da pandemia em seus custos operacionais e de produção, visto que uma das propostas apresentadas oficialmente prevê que haja completa suspensão da cobrança no ano em curso e sua transferência para o exercício de 2021, cujos boletos seriam remanejados para 2022, os de 2022 para 2023 e assim sucessivamente, evitando o acúmulo das cobranças nos anos vindouros. Tal solução é vista, entretanto, como possível renúncia de receita apesar da engenhosidade da proposta, impondo-se a busca por alternativas mais moderadas que indiquem claramente os prazos em que as parcelas não cobradas durante o presente ano
irão ser efetivamente quitadas. E aqui, talvez, formas de parcelamento diluído que aliviem parte dos custos dos usuários efetivamente impactados poderão apresentar-se como instrumentos juridicamente mais adequados. Mas, o desafio não será enfrentado apenas com o encontro de uma fórmula legal que atenda aos usuários das águas, visto que o dinheiro da cobrança pelo uso da água bruta é destinado à gestão das águas através dos Comitês de bacias hidrográficas e suas respectivas agências de bacias, que são também os seus braços executivos. Da normalidade da arrecadação oriunda da cobrança depende o custeio administrativo das agências e a execução das centenas de contratos, ações, eventos, obras, pesquisas, estudos, planejamentos, iniciativas que compõem os Planos de Aplicação Financeira aprovados pelos Comitês. Daí que, para mexer na cobrança, é preciso dar uma solução, também, para o funcionamento do sistema que, por sua vez, não pode parar. Há ideias em curso, como aquela que pretende retirar recursos da conta de investimentos para a conta do custeio. Mas como os percentuais de investimento e custeio são previstos em lei, então é preciso
encontrar uma fórmula em que isso seja feito sem lesão ao que está legalmente definido, algo de complexa busca para quem tem pressa em resolver o dilema. Quem sabe uma alternativa viável e rápida para manter o funcionamento das agências de bacias hidrográficas seja o de retirar do orçamento da própria Agência Nacional de Águas –ANA os recursos para o custeio dessas agências de Comitês, dinheiro que voltaria para os cofres da ANA com a futura normalização da cobrança das parcelas que deixarem de ser pagas em 2020, seja por inadimplência, seja por dispensa passageira em função dos impactos da pandemia. O Conselho Nacional de Recursos Hídricos certamente encontrará a melhor solução. E a melhor solução, nos parece, é aquela que atenda a todas as partes garantindo o apoio às atividades produtivas sem penalizar a gestão dos recursos hídricos e sem contrariar qualquer dispositivo legal. Que prevaleça o diálogo e o espírito cooperativo em tempos de inaudita dificuldade, como é o caso da conjuntura atual.
Anivaldo de Miranda Pinto Presidente do CBHSF
XXXVIII Reunião Plenária Ordinária do CBHSF: a vida aquática e os usos múltiplos Nos dias 3 e 4 de setembro de 2020, das 13h30m às 17h, será realizada a XXXVIII Plenária Ordinária do CBHSF, por meio de videoconferência. A Plenária terá em sua pauta assuntos como a Resolução ANA nº18/2020 que dispõe sobre o adiamento da cobrança pelo uso de recursos hídricos de domínio da União como medida emergencial de enfrentamento dos efeitos causados pela pandemia de COVID-19, e a Resolução CNRH nº 213/2020 que prorroga, por um ano, o mandato dos membros dos Comitês de Bacias Hidrográficas nos rios de domínio da União. Serão discutidos ainda o Pacto das Águas nas instâncias do Comitê, a possível instalação das usinas UHE Formoso e Usina Nuclear Itacuruba na bacia do Rio São Francisco, o processo de conflito de uso na Bacia Hidrográfica do Rio Grande (BA), as condições do Rio Paraopeba após o desastre da VALE e o status do Projeto SIGA São Francisco.
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MP recomenda suspensão de edital que não previa diretrizes de saneamento básico em Paramirim Texto: Juciana Cavalcante / Marcos Domicio e Bianca Aun
Sem considerar eixos importantes contidos em um plano de saneamento básico, o município de Paramirim (BA), localizado no Médio São Francisco, lançou o edital de convocação e regulamento para a realização da consulta pública sobre a revisão do plano setorial de abastecimento de água e esgotamento sanitário. O presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica dos Rios Paramirim e Santo Onofre, Anselmo Barbosa Cayres, solicitou, por meio de ofício, ao Ministério Público da Bahia, a invalidação do processo. Entre os pontos destacados, além de o município não ter o plano de saneamento, documento obrigatório para execução de obras de infraestrutura, o edital pretendia a renovação de contrato por mais 30 anos com empresa concessionária para operar o sistema de água e esgoto do município, sem dar um prazo adequado para participação popular, já que o edital dava apenas cinco dias para manifestações através de e-mail. “Sem ninguém saber, o Decreto 076 de 10 de julho de 2020 convoca a população para construir a renovação do plano setorial de saneamento básico, dando um prazo pequeno e por e-mail, ao qual muitas pessoas não têm acesso. Então, os prejuízos são incalculáveis diante de um processo como esse, que pretende renovar a concessão de água e esgotamento, sem elaborar o plano municipal de saneamento básico”, destacou Anselmo. No último dia 15 de julho, o Ministério Público do Estado da Bahia (MPBA), através do Promotor de Justiça Jailson Trindade Neves, recomendou à prefeitura de Paramirim a suspensão do edital enquanto durar a pandemia da Covid-19, considerando também a impossibilidade da realização de reuniões e audiências presenciais. A recomendação do MP orienta ainda que, ao final da pandemia, seja estabelecido um prazo de 30 dias para que a população possa avaliar o plano sanitário que deve ser disponibilizado para consulta pela internet e por meio físico. Além disso, o Ministério Público considerou que o Plano Setorial não contempla todos os serviços básicos de saneamento exigidos na Lei 11.445/2007, que são: abastecimento de água potável; esgotamento sanitário; limpeza urbana; administração de resíduos sólidos; e drenagem e manejo das águas pluviais urbanas. O edital faz menção somente aos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário. “Não justifica o município que tem a concessão estadual, ao expirar a validade do contrato, renovar por mais 30 anos sem saber o que a população quer e se está sa-
tisfeita”, enfatizou o membro do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco e participante das ações do CBHSF para a elaboração dos PMSB na bacia, Almacks Luiz. PMSB’s financiados pelo Comitê O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco já financiou a execução de 63 Planos de Saneamento Básico em municípios da Bacia, e outros 48 planos já foram licitados para atender às quatro regiões fisiográficas, além de quatro em andamento no Submédio São Francisco. Os PMSB’s são financiados integralmente pelo CBHSF através dos recursos oriundos da cobrança pelo uso da água, reforçando o compromisso do Comitê em fortalecer as ações de preservação e manutenção dos afluentes inseridos na bacia, minimizando as cargas de poluição lançadas nos cursos d’água. Na região do Médio São Francisco serão executados 12 planos nas cidades de Oliveira de Brejinhos, Sítio do Mato, Paratinga, Boquira, Formosa do Rio Preto, Uibaí, Campo Alegre de Lourdes, Pilão Arcado, Morro do Chapéu, São Gabriel, João Dourado e Iuiú. A previsão é de que os trabalhos para elaboração dos planos sejam iniciados no mês de agosto deste ano. “Em 2016 aconteceu a caravana do saneamento básico que cumpriu o objetivo de, através de oficinas, orientar e incentivar os municípios a elaborar, de forma participativa, seus planos municipais de saneamento. Isso tudo em um esforço conjunto para reforçar a extrema importância do plano de saneamento que garante aos mu-
nicípios planejamento em seu crescimento, respeitando os rios e o meio ambiente como um todo”, lembrou o coordenador da Câmara Consultiva Regional do Médio São Francisco, Ednaldo Campos. A caravana foi realizada pelo Ministério Público do Estado da Bahia, em parceria com o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), a Agência Peixe Vivo, a Articulação Popular do São Francisco e demais órgãos integrantes do Programa de Fiscalização Preventiva Integrada (FPI). A ação passou pelos municípios de Andorinha, Campo Formoso, Jacobina, Jaguarari, Miguel Calmon, Mirangaba, Morro do Chapéu, Ourolândia, Umburanas, Várzea Nova, Barreiras, Bom Jesus da Lapa, Guanambi, Paramirim, Paulo Afonso, Santa Maria da Vitória, Irecê, Xique-Xique e Juazeiro.
Anselmo Cayres, presidente do CBH dos Rios Paramirim e Santo Onofre Vista aérea do município de Paramirim
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UHE Formoso ameaça o Velho Chico e sua população ribeirinha Ambientalistas e população criam movimento para denunciar impactos da obra e defender a região
A região mineira de Pirapora e Buritizeiro foi pega de surpresa com o anúncio da construção de uma nova usina hidrelétrica no Rio São Francisco. A decisão tem causado indignação da população local e de ambientalistas por ter sido tomada sem consulta pública. Eles temem que outra barragem contendo as águas do Rio São Francisco possa piorar a já grave falta de água na região. Além disso, o projeto não leva em conta que esta é uma área que necessita de preservação e proteção. Pirapora e Buritizeiro já ficam consideravelmente próximas à hidrelétrica de Três Marias, uma grande barragem, que represa parte das águas que vêm da cabeceira do Velho Chico e de seus afluentes. Esta construção, por sua vez, influencia constantemente nos níveis de água. Como resposta, houve a criação de um movimento unificado, de olho nos efeitos que a obra possa ter na cultura, economia e meio ambiente. O movimento “Velho Chico Vive”, formado pelos povos tradicionais quilombolas, indígenas, comunidades pesqueiras, vazanteiras, geraizeiras, que vivem e preservam o Velho Chico, junto com 60 entidades, tornou pública uma nota para denunciar a construção da Usina Hidrelétrica do Formoso, em Minas Gerais. O documento, publicado no dia 22 de junho, destaca que “o autoritarismo e as manobras para acelerar o processo de licenciamento ambiental marcam a tentativa de implantar o projeto”. Segundo as comunidades, as informações apresentadas pela empresa Quebec Engenharia ao IBAMA para adquirir o licenciamento ambiental, não condizem com as reais condições ambientais da região, da bacia do rio, e também afirmam não terem sido realizadas as consultas a nenhum setor da sociedade. Outro alerta diz respeito ao fato de, so4
mente na área de impacto declarada pela empresa, existirem mais de 60 sítios arqueológicos registrados, inúmeros cursos d’água, bens patrimoniais tombados pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA), Áreas de Preservação Permanente, regiões de várzea, veredas, remanescentes de Mata Atlântica e espécies de flora e fauna ameaçadas de extinção. O deputado federal Padre João (PT - MG) alerta que não vê razões para esta construção. Ele pedirá explicações ao governo acerca do projeto e dos impactos ambientais ao rio e à população. “Querem construir mais uma barragem no Velho Chico. A iniciativa não leva em conta a opinião do povo, pois não houve consulta pública. Não respeitam a cultura e a tradição local, os povos ribeirinhos e tradicionais que vivem ao longo das margens do São Francisco”, denuncia o parlamentar. Acordo SEMAD e IBAMA No dia 05 de agosto de 2020, foi publicado no Diário Oficial da União (DOU), o Acordo de Cooperação Técnica entre o IBAMA e a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais (SEMAD). A SEMAD informa por meio de nota que o acordo acompanha o que estabelece a Instrução Normativa IBAMA nº 8, de 20 de fevereiro de 2019, que trata da delegação de competência para licenciamento ambiental dos processos de licenciamento ambiental cuja competência originária seja federal, conforme previsto na Lei Complementar 140, de 8 de dezembro de 2011. “A partir de sua eventual assinatura serão seguidos os trâmites impostos pela legislação mineira aos processos de licenciamento ambiental,
Texto: Luiza Baggio / Foto: Léo Boi
excetuando-se os atos privativos dos demais entes federados, como outorga de uso de recursos hídricos em rio federal, que é da ANA, ou declarações de conformidade municipais, que deverão ser emitidas por cada município atingido pelo empreendimento. De modo geral, se preveem no acordo as condições necessárias ao bom andamento da parceria, tais como o fornecimento de informações entre os entes, a disponibilização de treinamento, a apresentação de relatórios anuais de atividades etc”, esclarece a SEMAD. Para o presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), Anivaldo Miranda, o acordo entre IBAMA e SEMAD revela uma ótica equivocada em um empreendimento que terá reflexo em toda a bacia. “A construção da UHE Formoso levará impactos a toda a população a jusante de Pirapora, de Minas Gerais até a foz do Rio São Francisco. Portanto, o licenciamento deveria ser conduzido pelo IBAMA em condições de total transparência, além de ouvir e interagir com os demais estados que compõem a bacia do São Francisco”. Anivaldo Miranda esclarece que o CBHSF é contrário à construção da UHE Formoso. “O Comitê considera que no contexto do estudo do impacto ambiental seja respeitada a análise da não construção da UHE Formoso, por todas as desvantagens que ela representa. No fundo é um retrocesso, é uma visão que remete a bacia para o século passado, visando atender interesses que são minoritários. Não tem sentido construir mais um barramento no São Francisco. A nova hidrelétrica contraria a vocação cada vez mais forte do Velho Chico para atendimento aos usos múltiplos e vai agravar a crise ambiental profunda que vive o ecossistema da bacia”.
Geração de energia e os impactos no meio ambiente Texto: Luiza Baggio Nascido em Minas Gerais, o Rio São Francisco também percorre e abastece os estados de Goiás, Bahia, Pernambuco, Sergipe e Alagoas. Dele vem boa parte das águas que os povos dessas regiões usam para a sobrevivência, mas todo o Brasil também se beneficia com sua riqueza, pois o Velho Chico provê água que é transformada em energia elétrica. Somente em sua calha encontram-se nove Usinas Hidrelétricas: uma localizada em Três Marias (MG) que pertence a Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG) e outras oito pertencem à Companhia Hidrelétrica do São Francisco (CHESF), as usinas de Paulo Afonso I, II, III e IV (BA), Sobradinho (BA), Luiz Gonzaga (PE), Moxotó (AL) e Xingó (SE). De acordo com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), cerca de 60% da energia gerada em todo o país é hidráulica. Essa energia é gerada pela correnteza dos rios, que faz girar turbinas instaladas em quedas d’água. A geração de energia elétrica sempre provoca algum efeito na natureza, mas cada processo tem suas particularidades. O professor aposentado da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e doutor em Energética pela Université d’Aix-Marseille III, Heitor Scalambrini Costa, esclarece que não existe fonte de energia denominada limpa. “Todas, tanto aquelas provenientes de recursos fósseis (petróleo e derivados, carvão mineral, gás natural) e de minérios radioativos, como aqueles de recursos da natureza (sol, vento, biomassa), geram problemas e impactos no meio ambiente”.
O grande problema ambiental e também social causado pelas hidrelétricas é a necessidade de represar os rios. Vastas regiões são alagadas, o que provoca não só a retirada das populações humanas do local, como alterações no ecossistema. Heitor Scalambrini faz uma relação mais detalhada dos impactos socioambientais causados pela construção de hidrelétricas. “Podemos mencionar além das inundações de áreas agricultáveis e de florestas, o deslocamento e a perda dos modos de vida das populações situadas nas áreas alagadas; mudanças na dinâmica hidrológica dos rios e afluentes; diminuição da biodiversidade; emissões de gases de efeito estufa (principalmente o metano) pela decomposição de matéria orgânica existente nas áreas alagáveis; alteração do ambiente, prejudicando espécies de seres vivos, pois interferem, por exemplo, na migração e reprodução de peixes; alteração na paisagem das margens pela propagação de atividades humanas ligadas a presença dos reservatórios; o represamento do rio diminui o nível da água abaixo da represa, desabrigando pessoas e animais e provocando a salinização da água (no Semiárido) e alterações climáticas que comprometem a fauna e flora que não se adaptarão a essas mudanças”. Nova usina Francisco
hidrelétrica
no
Rio
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“Em nome do desenvolvimento foi anunciada a construção de mais uma hidrelétrica no Rio São Francisco, na região mineira de Pirapora e Buritizeiro. A área onde a barragem seria construída é de suma importância para o Cerrado norte mineiro, com suas veredas e mata virgem, afetando os ciclos de vida do Cerrado (Pai das Águas),
influenciando no regime de chuvas e cheias do rio, impactando, inclusive, lençóis freáticos. Caso seja construída, prejudicará todo o ecossistema da região. Pirapora, que já sofre com a ausência de peixes como o pocomã e o surubim, pode se preparar para não ver certas espécies nunca mais”, esclarece Heitor Scalambrini. Usina nuclear em Pernambuco A decisão do Governo Federal de estabelecer o Plano Nacional de Energia até 2050, reacendeu no estado o sonho da instalação, em Itacuruba (PE), no Sertão de Itaparica, de uma usina nuclear no Rio São Francisco com até seis geradores. O investimento em energia atômica vai na mão contrária da tendência mundial, além de ameaçar o meio ambiente e a vida na aldeia indígena Pankará. “O Brasil, para garantir a segurança energética não precisa da energia nuclear, diante da enorme diversidade de fontes renováveis existentes. O risco de vazamento de material radioativo acarretaria uma catástrofe nunca antes vista em nosso país. Ainda mais com proposta de construírem na beira do Rio São Francisco. Além, obviamente, do alto custo de geração (5 vezes maior que as fontes solar e eólica) que seria repassado para a conta do consumidor”, esclarece Heitor Scalambrini. Questionado sobre qual a alternativa energética para o Brasil, Heitor Scalambrini afirma que uma matriz energética sustentável seria aquela que usasse diversos recursos renováveis e que se complementassem entre si. “Aquela que preserva o meio ambiente, que combata as emissões de gases de efeito estufa, pouco impactante para as populações atendendo assim o interesse da maioria da sociedade brasileira. Discutir a matriz energética implica, em primeiro lugar, refletir a serviço de quem estará esta nova matriz e levar em conta
A energia eólica é uma alternativa às hidrelétricas e às usinas nucleares, porém também causa certo impacto ao meio ambiente
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Reunião entre diversos órgãos no Médio SF aponta novas demandas para a Lagoa de Itaparica Texto: Juciana Cavalcante / Foto: Cincinato Oliveira A Câmara Consultiva Regional do Médio São Francisco realizou, no dia 29 de julho, reunião ordinária com pauta única. O objetivo do encontro, que aconteceu de forma virtual, foi debater em conjunto com entes das esferas Municipal, Estadual e Federal, a situação da Lagoa de Itaparica para elaborar estratégias de ações que visem sua proteção. Após secar por completo em 2017, provocando a morte de milhares de peixes e gerando grande impacto para os moradores no seu entorno, a Lagoa de Itaparica voltou a atingir a totalidade de sua carga hídrica no início deste ano. No intervalo, entre a seca e sua recuperação, diversos órgãos, entre eles o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, Ministério Público da Bahia, prefeituras municipais de Xique-Xique e Gentio do Ouro, uniram esforços para executar ações de mitigação dos impactos da seca através do plano SOS Itaparica, onde foram pontuadas demandas a serem executadas por todos esses agentes como forma de recuperar os principais canais que levam água para a lagoa e desassorear esses trechos, incluindo a própria lagoa de Itaparica. A promotora de justiça da Bahia, Luciana Khoury, destacou, durante a reunião, que graças às chuvas do início deste ano, associadas a esforços conjuntos, a lagoa recebeu grande volume de água. “Precisamos continuar trabalhando para que a situação vivenciada em 2017 não se repita e, para isso, a realização de uma fiscalização alternada entre os órgãos envolvidos poderia dar conta não só da manutenção da carga hídrica, como também do combate à pesca predatória. O município de Xique-Xique tem feito grande esforço nesse sentido, iniciando já o trabalho de fiscalização. Mas entendo que outros órgãos podem se unir a esta ação como forma de garantir a sua continuida-
de”, destacou a promotora lembrando que, na ocasião da seca, o MP abriu inquérito civil para apurar a situação da lagoa e possíveis responsáveis sobre a mortandade de peixes. De acordo com o secretário de Meio Ambiente de Xique-Xique, Rivelino de Souza Rocha, desde 2017 as ações previstas vêm sendo realizadas na medida das possibilidades. “No início de março noticiamos que a lagoa tinha atingido sua carga hídrica total e começamos um levantamento da quantidade de água e peixes. Em junho, estava com 2,80 metros de profundidade em grande parte da sua extensão. Instalamos boias de localização de medição e, ao final do mês, contava 2,64 metros, o que é uma boa média já que ela tem muito sedimento acumulado ao longo dos anos”, informou o secretário. Após a conclusão da dragagem do canal do Guaxinim, está prevista a limpeza do canal de Itaparica que deve acontecer em novembro, quando deve estar seco. “Realizamos o monitoramento da lagoa em uma ação piloto, demonstrando sua viabilidade. A ideia é que a fiscalização aconteça por pelo menos 10 dias de cada mês a partir do início do período de defeso, porque até mesmo agora, ao concluirmos essa primeira etapa, já vimos os prejuízos de não ter a fiscalização em andamento”, afirmou Rivelino. No período de fiscalização, 24 pescadores foram abordados dentro da lagoa para análise do tamanho da malha da rede, que deve ser de 14mm, de acordo com o que preconiza o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Redes de menor espessura podem capturar espécies de pequeno porte ainda em fase de desenvolvimento, prejudicando a reprodução e o crescimento dos peixes. Ainda, 500 metros de rede de malha pequena foram retiradas da lagoa e cerca de 70
pessoas abordadas para conscientização. De acordo com o relatório da fiscalização, 60% da água está coberta por vegetação que vai possibilitar a reprodução das espécies de peixes. A fiscalização foi realizada sob a coordenação da Secretaria de Meio Ambiente de Xique-Xique com apoio do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, através da Câmara Consultiva Regional do Médio São Francisco. Mais ações Em setembro de 2019, foi elaborado pelo CBHSF o “Estudo de viabilidade da implantação do plano de ações e intervenções da Lagoa de Itaparica”, que aponta 26 pontos de observação e intervenção para a promoção de ações como educação ambiental, desassoreamento, revitalização, fiscalização e monitoramento das lagoas marginais da região. “Como resultado de audiências públicas, o Comitê fez o diagnóstico, apresentando um trabalho completo disponível no site do CBHSF”, informou o coordenador da CCR do Médio São Francisco, Ednaldo Campos. Ainda está prevista a elaboração de projeto executivo de engenharia para a realização da limpeza da lagoa. O Ato Convocatório 012/2020 está na sua terceira fase, que é a abertura dos envelopes com as propostas. A previsão é que esta etapa aconteça no mês de agosto, mas devido à pandemia, a data pode ser modificada. Quanto à parceria para a realização da alternância na fiscalização, o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Bahia (INEMA) informou que, após realizar reunião interna, vai informar quais os equipamentos e com que periodicidade de fisA Lagoa de Itaparica voltou a atingir a totalidade de sua carga hídrica no início deste ano
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III SBHSF acontecerá on-line em dezembro e prazo para submissão de trabalhos é prorrogado Texto: Luiza Baggio
O III Simpósio da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (SBHSF) será realizado de forma on-line, nos dias 07, 09, 11, 14, 16 e 18 de dezembro com isenção da taxa de inscrição. As apresentações serão feitas em dias alternados, por isso, o evento acontecerá em duas semanas. O prazo final para a submissão dos trabalhos foi prorrogado para o dia 30 de setembro. “Em vista do momento de incerteza gerado pela pandemia da COVID-19, a equipe do FIENPE decidiu realizar o III SBHSF de forma on-line para garantirmos que o evento ocorra ainda em 2020. Vamos realizar as adequações necessárias na programação, para que consigamos promover o debate, aprendizado e a atualização das informações. Como será on-line, esperamos alcançar um público ainda maior”, diz o coordenador do FIENPE, o professor da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), Renato Garcia Rodrigues. A conferência máster será apresentada no dia 07 de dezembro pela manhã e abordará o tema “A importância da Ciência para o futuro do Rio São Francisco”. A palestra
será apresentada pelo professor aposentado da Universidade Federal de São Paulo (USP), José Galizia Tundisi, um dos maiores especialistas brasileiros em gerenciamento de recursos hídricos. Ele ajudou a solucionar crises hídricas em mais de 40 países – como Japão e Espanha – e acompanhou de perto a escassez de água em São Paulo. Os temas estratégicos que serão trabalhados sob a perspectiva científica são relacionados com o Plano de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (PRH SF). São eles: 1) Governança e Mobilização Social, 2) Qualidade da Água e Saneamento, 3) Quantidade de Água e Usos Múltiplos, 4) Sustentabilidade Hídrica do Semiárido, 5) Biodiversidade e Requalificação Ambiental e 6) Uso da Terra e Segurança de Barragens. A programação do evento contará com apresentações orais, palestras e mesas-redondas. Nomes como Anivaldo de Miranda Pinto (presidente do CBHSF), Vicente Andreu Guillo (ex diretor-presidente da Agência Nacional de Águas), Emerson Soares (Universidade Federal de Alagoas), Yvonilde Medeiros
(Universidade Federal da Bahia), Chang Hung Kiang (Universidade Estadual Paulista), Renato Garcia Rodrigues (Universidade Federal do Vale do São Francisco), Abelardo Montenegro (Universidade Federal de Pernambuco) já estão confirmados na programação. Para a coordenadora do III SBHSF e professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Sílvia Corrêa Oliveira, o momento é oportuno para a realização do evento. “A realização do III SBHSF é de extrema importância já que a ciência e a pesquisa estão sendo colocadas à prova. A proposta do evento é de debater sobre soluções científicas para as questões da bacia do Velho Chico”. O III SBHSF tem como tema “A importância da ciência para o futuro do Rio São Francisco” e é uma realização do Fórum de Pesquisadores de Instituições de Ensino Superior da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco e o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF). Para submissão de trabalhos e atualização das informações acompanhe o site do sbhsf.com.br.
Comitê lança novo vídeo institucional Proteger, preservar e revitalizar – esses são os três maiores desafios para aqueles que cuidam do meio ambiente. E, no caso do Velho Chico, é um sonho que se torna realidade através do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco. O novo vídeo institucional do CBHSF traduz esse esforço. Resultado de três anos de trabalho, que envolveu uma grande equipe de produção, captação, direção, edição e finalização, com equipamentos de ponta, o vídeo representa a missão, visão e os valores do Comitê, trazendo uma mensagem transparente e fazendo com que o público se identifique com a causa do Rio São Francisco. O nível da produção é exemplar, com uma linguagem mais cinematográfica, que respeita a identidade da marca do Comitê e design sofisticado.
Assista ao novo vídeo em youtu.be/jj4QJ0HmkA4 ou escaneie o QR CODE ao lado.
“Parte da missão do Comitê é sensibilizar a população sobre a importância de se preservar o Rio São Francisco. Produzimos esse vídeo com o objetivo de ilustrar a essência da entidade e transmitir uma mensagem de cunho emocional e educativo”, afirmou Pedro Vilela, diretor da empresa TantoExpresso, que realiza os serviços de comunicação do CBHSF. De acordo com ele, o material não é feito apenas para o público externo. “É também para os membros do Comitê, valorizando assim os esforços de cada um. Buscamos ilustrar o esforço conjunto que está por trás do planejamento, dos projetos e da execução das ações do colegiado em defesa do Rio São Francisco e de seus afluentes”, completou. O vídeo possui uma versão mais longa e completa, de cerca de seis minutos, e uma versão menor de 2,30 minutos. As duas já estão disponíveis
no site do Comitê e no canal do CBHSF no YouTube, que pode ser acessado em youtube.com/user/cbhsaofrancisco.
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Dois
José Galizia Tundisi
dedos de
Entrevista: Luiza Baggio
prosa
Qual é o papel da Ciência para o futuro das bacias hidrográficas? A Ciência tem um papel fundamental para o futuro da água, pois pode resolver inúmeros problemas relacionados com o tratamento, o reuso e o controle da poluição. O que a crise hídrica que vivemos nos últimos anos revela sobre o sistema a hídrico brasileiro? O sistema hídrico brasileiro está sob constante pressão devido aos usos múltiplos se acelerando, à urbanização que hoje tem 80% da população do Brasil e que consome muita água. Além disso, existe uma extensa e variada contaminação que deteriora águas superficiais e águas subterrâneas. A gestão das águas é um grande desafio. O que é preciso para avançarmos no Brasil nessa questão? A gestão das águas deve ser feita por bacias hidrográficas. Os usos da água nas áreas urbana devem ser estritamente controlados. A utilização da água na produção dos alimentos deve ter tecnologias mais avançadas. Se a gestão for bem executada em nível de bacias hidrográficas, pode-se assegurar um controle mais efetivo às reservas de águas e maior eficiência no uso.
José Galizia Tundisi é um dos maiores especialistas brasileiros em gerenciamento de recursos hídricos. Ele apresentará a palestra magna do III Simpósio da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (SBHSF) que terá como tema “A importância da Ciência para o futuro do Rio São Francisco”, no dia 07 de dezembro. O evento será realizado nos dias 07, 09, 11, 14, 16 e 18/12, de forma on-line. Bacharel em História Natural, pela Universidade de São Paulo, Tundisi é mestre em Oceanografia, pela Universidade de Southampton, Doutor em Ciências, pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente é professor titular aposentado da USP.
A revitalização do Rio São Francisco é uma ação que demanda urgência. Na sua opinião, o que precisa melhorar na bacia para que seja assegurada a segurança hídrica do Rio São Francisco? Em primeiro lugar, o tratamento de esgoto precisa avançar na bacia do Rio São
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Presidente: Anivaldo de Miranda Pinto Vice-presidente: José Maciel Nunes Oliveira Secretário: Lessandro Gabriel da Costa
Secretaria do Comitê: Rua Carijós, 166, 5º andar, Centro - Belo Horizonte - MG - CEP: 30120-060 (31) 3207-8500 - secretaria@cbhsaofrancisco.org.br - www.cbhsaofrancisco.org.br Atendimento aos usuários de recursos hídricos na Bacia do Rio São Francisco: 0800-031-1607
Comunicação
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Apoio Técnico
Francisco. Os municípios da bacia precisam investir em tratamento de esgoto para que o rio não receba tanta carga poluidora. Em segundo lugar, é preciso uma recuperação efetiva da vegetação, especialmente das áreas que fornecem água, por meio de águas subterrâneas, para o São Francisco. Como exemplo podemos citar as veredas que estão sendo devastadas para o plantio de soja. A segurança hídrica do Velho Chico está centrada em dois aspectos fundamentais: o primeiro é a quantidade de água que está diminuindo pela falta de segurança hídrica e pela perda de áreas de recarga e das águas que chegam ao rio. O segundo é a qualidade de água: é preciso controlar a contaminação da água, pois se a mesma estiver muito contaminada fica muito caro tratar, impossibilitando o uso dessas águas. O senhor acredita na revitalização da bacia do Rio São Francisco? Sem dúvida nenhuma acredito na revitalização do Rio São Francisco! Se essas medidas que citamos anteriormente forem tomadas por meio de um projeto de Ciência bem fundamentado e de um processo contínuo de monitoramento do rio, de sua qualidade e quantidade, capacitação de técnicos e de cientistas trabalhando pela revitalização, além do envolvimento dos municípios na gestão da bacia.
Ouça o Podcast com a entrevista: spoti.fi/2DSU4H7 ou escaneie o QR CODE ao lado.
Produzido pela Assessoria de Comunicação do CBHSF – Tanto Expresso comunicacao@cbhsaofrancisco.org.br Coordenação Geral: Paulo Vilela, Pedro Vilela, Rodrigo de Angelis Edição e Assessoria de Comunicão: Mariana Martins Textos: Anivaldo Miranda, Luiza Baggio e Juciana Cavalcante Fotos: Bianca Aun, Cincinato Oliveira, Léo Boi e Marcos Domício Diagramação: Sérgio Freitas Impressão: ARW Gráfica e Editora Tiragem: 5.000 exemplares Direitos Reservados. Permitido o uso das informações desde que citada a fonte. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA
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