Travessia 57 - Janeiro de 2022 - Notícias do São Francisco

Page 1

travessia Notícias do São Francisco

JORNAL DO COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO / JANEIRO 2022 | Nº 57

Aumento da vazão deixa São Francisco em situação de cheias CBHSF busca parcerias para realizar expedição científica por toda a bacia Página 3

Dois dedos de prosa com Pedro Surubim, o artista que luta contra a construção da UHE Formoso Página 8


Editorial A chuva é da natureza, mas a prevenção é do homem O verão chegou e o roteiro é o mesmo há décadas. Temporais provocam alagamentos que paralisam as cidades. As chuvas que atingiram o sul da Bahia, em dezembro, e deixaram um cenário de destruição, afetaram também o estado de Minas Gerais. Rios transbordando sobre as pontes, carros flutuando pelas ruas, cidades alagadas até os telhados de suas casas e o rompimento de duas barragens de armazenamento de água deixaram milhares de famílias desabrigadas. As chuvas na Bahia e em Minas Gerais causaram 31 mortes e colocaram 277 municípios em situação de emergência. O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco se solidariza com os cidadãos e as cidadãs das centenas de municípios baianos e mineiros que chegaram a decretar situação de emergência devido às chuvas que

atingiram os estados. Lamentamos profundamente as mortes decorrentes deste que é considerado o maior desastre que a Bahia enfrentou em toda a sua história. Preocupa-nos também a situação dos ribeirinhos. O nível de água do Rio São Francisco tem aumentado consideravelmente. O Comitê, há três anos, vem fazendo um alerta sobre o perigo das cheias na bacia, realizando seminários e encontros em todas as suas regiões para tratar do assunto. Levando em consideração essa realidade que assola o povo brasileiro ano após ano, em todas as regiões do Brasil, fazendo vítimas fatais, causando perdas materiais, submetendo a população a situações de calamidade, expondo-a a epidemias advindas das condições de insalubridade, da falta

de saneamento básico e do descaso dos governos, afirmamos que é urgente a adoção de medidas estratégicas, principalmente para obras de prevenção, para que os efeitos dessas catástrofes sejam minimizados. O planejamento deve, sobretudo, levar em conta as condições sociais e ambientais necessárias de forma a garantir a preservação das áreas de risco e de proteção ambiental na ocupação demográfica. O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco insiste na necessidade de que o governo incorpore as preocupações socioambientais de fato à sua gestão. Reiteramos que o povo brasileiro não pode mais viver de políticas paliativas ou de ações baseadas apenas no imediatismo.

José Maciel Nunes de Oliveira Presidente do CBHSF

10/01 a 16/05 Prazo para submissão de trabalhos

Abertas as inscrições para o IV SBHSF As incrições para o IV SBHSF já estão abertas e o prazo para a submissão de trabalhos vai até o dia 16 de maio. O IV SBHSF acontecerá entre os dias 24 e 26 de agosto, em Belo Horizonte (MG)

PARTICIPE! 2

sbhsf.com.br


Comitê quer realizar Expedição Científica em todas as regiões da bacia CBHSF busca parceria para ampliar Expedição Científica para as regiões do Alto, Médio e Submédio São Francisco Texto: Mariana Martins | Foto: Edson Oliveira O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), em conjunto com a Agência Peixe Vivo, busca parcerias com universidades para realizar a Expedição Científica nas três regiões fisiográficas em que o evento ainda não acontece. Com o objetivo de dar continuidade às tratativas visando ampliar para outras regiões da bacia a Expedição Científica que é realizada, há quatro anos, no Baixo São Francisco, aconteceu uma reunião, no dia 08 de dezembro, em Salvador (BA), que contou com a participação de representantes da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Universidade Federal da Bahia (UFBA), Universidade Federal do Oeste da Bahia (UFOB), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Unirios Centro Universitário (BA), Codevasf, Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) e Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), além do Ministério Público Estadual da Bahia (MPE-BA) e da Agência Pernambucana de Águas e Clima (APAC).

O presidente do CBHSF, Maciel Oliveira, destacou a importância da realização da Expedição Científica em toda a bacia. “Nosso desejo é que todas as instâncias possam se apropriar dos estudos para, com base neles, buscar soluções para a melhoria da qualidade da água e de vida do povo da bacia do Rio São Francisco. Estamos aqui em busca de parcerias com as universidades para ampliar a expedição para outras regiões. Ressalto que precisamos de pessoas que realmente estejam dispostas a levar o projeto adiante, visto que quem executa é a universidade. O Comitê entra com apoio financeiro”, afirmou. O coordenador da Câmara Consultiva Regional do Submédio São Francisco, Cláudio Ademar da Silva, acredita ser necessário estender a expedição para as outras regiões do Velho Chico em razão da diversidade e das especificidades de cada uma delas. “Estamos trabalhando para realizar a expedição na região do Submédio ainda em 2022. É preciso levar em conta questões como a navegabilidade do rio, pois a região

tem muitos barramentos”, disse. O coordenador da Expedição Científica do Baixo São Francisco e professor da UFAL, Emerson Soares, participou do encontro para compartilhar a sua experiência e disse que a realização do evento só é possível graças às parcerias firmadas, das quais o CBHSF é um dos maiores investidores. “Em 2022 foi realizada a 4ª edição da Expedição Científica do Baixo São Francisco. A cada edição aprendemos e aperfeiçoamos as questões logísticas, buscamos mais parcerias e ampliamos o raio de pesquisas. Hoje, temos 35 linhas de pesquisa, que vão desde análises da qualidade da água até estudos da situação socioeconômica e de saúde das comunidades ribeirinhas por onde passamos”, explicou Emerson Soares, que também destacou outros benefícios trazidos pela expedição, como o seu grande alcance midiático, que também impulsiona o turismo nas cidades por onde passa, gerando renda e emprego para a população.

3


2021: um ano de intenso trabalho no CBHSF

Confira o balanço das ações ao longo da bacia do Rio São Francisco no último ano Texto: Luiza Baggio | Fotos: Azael Gois, Manuela Cavadas, acervo DHF Engenharia e divulgação PAC

O ano de 2021 terminou com um balanço positivo para o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF). Foram arrecadados com os recursos da cobrança pelo uso da água cerca de R$ 32 milhões e o Comitê investiu aproximadamente R$ 27 milhões em programas, ações e obras em prol da bacia. 2021 foi o ano de maior investimento desde o início da cobrança pelo uso da água na bacia do Rio São Francisco. Foram 146 ações com destaque para os instrumentos de gestão de recursos hídricos, saneamento básico, monitoramento de qualidade e quantidade das águas, melhoria da oferta de água no semiárido, requalificação ambiental, dentre outras. Vejamos a seguir as principais ações do CBHSF em 2021: PDRH e enquadramento O CBHSF investiu na elaboração do Plano Diretor de Recursos Hídricos (PDRH) para a bacia dos Afluentes do Alto São Francisco e da proposta de enquadramento de corpos de água para a região do Alto São Francisco, da nascente até a região da represa de Três Marias. Tanto o PDRH quanto o enquadramento visam fundamentar e orientar a 4

gestão dos recursos hídricos na bacia, de forma a identificar os principais problemas e conflitos relacionados aos usos de água, propor alternativas de compatibilização entre disponibilidade e demanda, metas de qualidade da água, programas e projetos a serem implementados. Sistema de abastecimento de água A aldeia indígena Kariri Xocó, localizada no município de Porto Real do Colégio, em Alagoas, recebeu as obras do CBHSF para garantir o abastecimento de água potável em quantidade e qualidade para toda a comunidade indígena, estimada em quatro mil habitantes. As obras foram iniciadas em 2021 e tem a previsão de serem encerradas em junho de 2022. Antes do projeto, o fornecimento de água potável na aldeia era feito por um sistema que atendia parcialmente a comunidade, fazendo com que a população utilizasse água imprópria, sem condições mínimas de higiene, ou até mesmo ficando sem acesso à água por alguns períodos. O abastecimento público de água potável na aldeia Kariri Xocó compete ao Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Alagoas – Sergipe.

Sistema de abastecimento de água na aldeia Kariri Xocó


Canal do Sertão Há décadas, o Canal do Sertão é cercado por polêmicas que perpassam gestões estaduais e federais. Uma das questões fundamentais versa sobre a melhor forma de gerir o empreendimento. Em vista disso, o CBHSF contratou, em 2021, a elaboração do Plano de Gestão de Uso do Canal do Sertão Alagoano, modelo responsável pelo êxito da obra a médio e longo prazo. O objetivo do Canal do Sertão Alagoano é levar as águas do Rio são Francisco ao sertanejo, impulsionando a economia local, abrindo portas para diversas modalidades de empreendedorismo, entre os quais a agricultura familiar e a pecuária.

PMSB Em 2021 o CBHSF continuou fazendo jus ao seu papel de maior investidor na elaboração de Planos Municipais de Saneamento Básico (PMSBs) em toda a Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, com a elaboração do documento para 51 municípios ao longo do ano. O PMSB é fundamental para a saúde ambiental dos municípios brasileiros. A partir da lei federal 11.445/2007, a existência do PMSB passou a significar, para o município, a possibilidade de garantir verbas federais para aplicação em ações como tratamento de efluentes domésticos e resíduos sólidos e oferta de água tratada, melhorando a qualidade de vida da população,

minorando e/ou eliminando os problemas de saúde ambiental de forma sistêmica e contínua no território municipal. Sustentabilidade Hídrica do Semiárido Outra importante ação de 2021 foram os projetos de Sustentabilidade Hídrica do Semiárido. Correspondendo a aproximadamente 11% do total do território brasileiro e 50% do território da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, o semiárido tem características próprias: baixa ocorrência de chuva, altas temperaturas e longos períodos de estiagem. Por isso, o CBHSF contratou oito projetos voltados à sustentabilidade hídrica no semiárido, sendo dois por região fisiográfica.

Viveiro de Mudas de Patos de Minas O sistema de irrigação do viveiro de mudas, localizado em Patos de Minas, foi mais uma ação finalizada pelo CBHSF. O viveiro, pertencente ao Instituto Estadual de Florestas (IEF), ganhou força com os investimentos do CBHSF e pôde aumentar a produção de mudas. O projeto foi fruto de uma parceria entre o Comitê, o IEF e a Prefeitura de Patos de Minas (MG). O objetivo do viveiro é favorecer a recuperação de matas ciliares, nascentes, áreas degradadas, recarga hídrica e programas de educação ambiental para as comunidades rurais, visando à conservação do solo e, consequentemente, à produção de água na bacia do Rio São Francisco.

Sistema de irrigação é implantado no viveiro de mudas de Patos de Minas

5


Aquífero Urucuia é tema de debate Grupo de Trabalho se reúne em Salvador para apresentar resultados do estudo sobre os usos da água do Urucuia Texto e foto: Andréia Vitório O Grupo Técnico de Acompanhamento (GT) Urucuia, do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), se reuniu para assistir à apresentação do relatório final relativo aos estudos dos usos das águas na região do Aquífero Urucuia, localizado no Médio São Francisco. O encontro foi realizado em Salvador (BA), no dia 08 de dezembro. O conteúdo do relatório final abordou, entre outros pontos: a compilação de estudos e dados existentes sobre a região de interesse; a situação da gestão das águas superficiais e subterrâneas na área de estudo; os bancos de imagens e mapas de uso do solo, com foco no uso das águas; os resultados dos estudos de demanda e disponibilidade hídrica (superficial e subterrânea) e, por fim, algumas recomendações para o uso sustentável do Aquífero Urucuia. Carlos Bortoli, diretor da Profill Engenharia, empresa responsável pelo desenvolvimento da pesquisa denominada Entendimento da utilização das águas na área de influência do Aquífero Urucuia e Aquífero Cárstico na Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco fez um balanço do trabalho. “Acredito que conseguimos agregar conhecimento sobre o Aquífero e o uso do solo na região por onde ele se estende”, disse Bortolli que acrescentou que o projeto se debruçou fortemente sobre o imageamento de satélite e sobre o mapa de uso do solo, mostrando como a superfície é usada – pela agricultura, pelas áreas urbanas e pela mata nativa, por exemplo. “A gente consegue perceber que existem algumas arestas do ponto de vista da gestão, até mesmo da água superficial, que precisam avançar, a exemplo do enquadramento. Sobre a redução das vazões dos afluentes do São Francisco dessa região do Aquífero Urucuia, sabemos que elas são muito influenciadas

pelo uso da terra, pela irrigação, especialmente. Mas, ela também sofre com a interferência do regime de precipitações”, frisou. Instrumentos de Gestão: o que precisa avançar Entre os destaques do relatório final estão a sinalização dos importantes avanços que ainda precisam ser alcançados do ponto de vista dos instrumentos de gestão das águas. Além da questão do enquadramento, que é um gargalo importante, o relatório aponta, por exemplo, que é necessário concluir os planos das bacias Grande e Corrente. Sobre o Sistema de Informações, destaca que é preciso melhorar a uniformização das bases e das informações para tomadas de decisões. Em relação à cobrança, sinaliza que ela precisa ser implantada inteiramente na porção baiana e em boa parte da porção mineira. Outro ponto abordado foi a necessidade de integração entre águas superficiais e subterrâneas no âmbito da gestão. Dados levantados pelo estudo apontam também ser muito provável que as outorgas não representem o volume real de água sendo efetivamente utilizado nas bacias. GT fala Johan Gnaldlinger, da Câmara Técnica de Planos, Programas e Projetos (CTPPP), reforçou que o Urucuia é a caixa d’água do São Francisco e que é importante conhecê-lo cada vez mais para fortalecer sua preservação. Para ele, é importante que as conclusões do estudo tenham essa perspectiva, para que seu uso possa contribuir para a sustentabilidade da região. Também sobre o projeto, Samara da

Silva, da Câmara Técnica de Outorga e Cobrança (CTOC), frisa que ele traz uma contribuição grande, pois identifica e localiza os usuários de água das bacias analisadas, bem como o quanto eles estão usando de água subterrânea e superficial, numa região marcada por conflitos de uso de água, que é o oeste baiano. “Os dados consolidados nos permitem fazer projeções, bem como uma avaliação sobre disponibilidade e demanda, o que possibilita saber quanto o São Francisco vai receber de água dessas regiões, levando-se em conta a importância do Urucuia para a calha do rio”, concluiu. A proposta do estudo O estudo foi contratado pelo Ato Convocatório 022/2020, atendendo a uma demanda da Câmara Técnica de Águas Subterrâneas (CTAS) frente à falta de informações sobre a dinâmica da interação entre as águas superficial e subterrânea, o que dificulta a proposição de ações assertivas. Esse diagnóstico tem a proposta, portanto, de trazer à tona informações sobre a disponibilidade hídrica e os diversos usos das águas na região das bacias hidrográficas dos Rios Carinhanha, Corrente e Grande, especificamente nos trechos dos domínios dos Sistemas Aquíferos Urucuia e Bambuí (cárstico). O aquífero Urucuia ocupa uma área de 126 mil km² e abrange seis estados brasileiros: Maranhão, Piauí, Tocantins, Bahia, Goiás e Minas Gerais. O oeste baiano tem a maior área de exposição, com 82 mil km², correspondente a 65% da área total – incluindo os territórios das Bacias Hidrográficas dos Rios Carinhanha, Corrente e Grande, afluentes do Rio São Francisco e principais rios inseridos na porção territorial do aquífero Urucuia. Reunião de apresentação do relatório final sobre o estudo das águas do Aquífero Urucuia, em Salvador

6


Aumento da vazão do Rio São Francisco causa cheias na bacia Até o dia 24 de janeiro a vazão chegará a 4.000 m³/s, volume só visto em 2009 Texto: Luiza Baggio | Foto: Emerson Leite

O aumento da vazão de água nas hidrelétricas de Sobradinho e Xingó vai provocar inundações em regiões ribeirinhas da Bahia, de Pernambuco, Alagoas e Sergipe. O alerta foi dado pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco (CBHSF), por meio de nota publica, divulgada no dia 11 de janeiro. O presidente do CBHSF, José Maciel Nunes de Oliveira, explicou que o Rio São Francisco atingirá vazão não vista há 12 anos. “De acordo com informações do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) e da Companhia Hidrelétrica do São Francisco (CHESF) as vazões defluentes serão elevadas de forma gradual, entre 12 e 24 de janeiro, nas barragens de Sobradinho e Xingó, até alcançar 4.000 m3/s. Vazão como

essa só foi observada no ano de 2009 no Velho Chico”, informa. Além disso, as comportas da Usina Hidrelétrica de Três Marias foram abertas no dia 14 de janeiro, o que aumentou ainda mais o nível do Rio São Francisco. O presidente do CBHSF ressaltou ainda que, em 2018, o Comitê realizou audiências públicas sobre as cheias no Velho Chico. “Realizamos audiências públicas em todas as cidades ribeirinhas para estimular a formação de comissões de Defesa Civil. Mas, infelizmente, nem todos seguiram as orientações, ou há aqueles gestores que criaram os grupos, mas não lhes deram estrutura necessária”, revelou Maciel. Segundo a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), foi constatado

volume de chuva acima da média esperada para dezembro de 2021, formando condições de umidade do solo e aumento do escoamento e vazão da bacia. “Nessas condições, caracterizada a necessidade de operação para controle de cheias, Cemig e Chesf, agentes responsáveis pelas principais hidrelétricas do São Francisco, identificam a necessidade de aumentar as vazões defluentes praticadas com o objetivo de preservar os volumes de espera dos reservatórios. Os volumes de espera são projetados para suportar as ondas de cheia e proteger as populações e estruturas abaixo das barragens contra inundações”, informou a agência.

7


Dois

Como surgiu a ideia de criar o Coletivo Velho Chico Vive?

O Coletivo surgiu em julho de 2020, a partir da inclusão do projeto da UHE Formoso no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) da Presidência da República, que ocorreu em maio do mesmo ano. Então, nós, os artistas da região, nos unimos a ribeirinhos e a alguns movimentos sociais para denunciar os impactos da construção da hidrelétrica e defender o Rio São Francisco. O nosso objetivo é defender o Rio São Francisco, atuando em equilíbrio com o meio ambiente, respeitando os modos tradicionais e originários de vida à beira do rio, em defesa dos direitos dos povos e das comunidades ribeirinhas. Entendemos que proteger o Rio São Francisco é defender a existência da população. É importante destacar que a UHE Formoso coloca em risco a sobrevivência de inúmeras comunidades tradicionais que vivem não só na região, mas em toda a bacia, como povos indígenas, comunidades quilombolas, pescadoras, vazanteiras e pequenos agricultores. O empreendimento vai acabar com o Rio São Francisco, sobretudo, entre a região de Pirapora e Três Marias.

dedos de

prosa

A decisão do governo federal de avançar com o projeto de construção da UHE Formoso em Pirapora teve consultas públicas?

O autoritarismo e as manobras para acelerar o processo de licenciamento ambiental marcam a tentativa de implantar o projeto. Nesse processo, não houve consulta prévia com a população. Além disso, as informações apresentadas pela empresa para o IBAMA (para iniciar o licenciamento ambiental) não condizem com as reais condições ambientais da região e da bacia. Outro ponto é que somente na área de impacto declarada pela empresa existem mais de 60 sítios arqueológicos registrados, inúmeros cursos d’água, bens patrimoniais tombados pelo IEPHA (Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais), Áreas de Preservação Permanente (APP), regiões de várzea, remanescentes de mata atlântica, espécies de flora e fauna ameaçadas de extinção, entre outros.

Pedro Melo Pedro Melo, mais conhecido como Pedro Surubim, é um artista barranqueiro, produtor musical e ambientalista, nascido e criado em Pirapora. Ele representa o movimento Coletivo Velho Chico Vive, que luta contra a construção da Usina Hidrelétrica (UHE) Formoso pela falta de transparência e pelos seus incontáveis impactos socioambientais, hídricos, econômicos, turísticos, arqueológicos, histórico-culturais, entre outros. O projeto da UHE Formoso compreende a construção de uma estrutura com capacidade de geração hidrelétrica de 306 MW, entre os municípios de Pirapora e Buritizeiro, no Norte de Minas Gerais, a 110 km da hidrelétrica de Três Marias. Trata-se de um projeto antigo, reativado em 2017, que é de responsabilidade da empresa Quebec Engenharia (Construtora Quebec S/A) Tractebel Engeneering Suez e SPE Formoso.

A promessa de geração de emprego e renda tem animado a população da região?

Como todo grande empreendimento existe realmente essa promessa de geração de emprego e renda. O Norte de Minas é uma região pobre, com alto índice de desemprego, com prefeituras que necessitam de recursos para executar obras de infraestrutura, enfim uma região escassa de investimentos. Por isso, um empreendimento desse porte divide bastante as opiniões. Mas, o que percebemos é que ao aprofundar sobre o assunto, a população que antes era a favor do empreendi-

Entrevista: Luiza Baggio Foto: Bicho Carranca

travessia Notícias do São Francisco

Presidente: José Maciel Nunes Oliveira Vice-presidente: Marcus Vinícius Polignano Secretário: Almacks Luiz Silva

Secretaria do Comitê: Rua Carijós, 166, 5º andar, Centro - Belo Horizonte - MG - CEP: 30120-060 (31) 3207-8500 - secretaria@cbhsaofrancisco.org.br - www.cbhsaofrancisco.org.br Atendimento aos usuários de recursos hídricos na Bacia do Rio São Francisco: 0800-031-1607

Comunicação

8

Apoio Técnico

mento passa a ser contrária, pois compreende que a geração de emprego e renda será provisória e não justifica os impactos sociais, culturais e, principalmente, para o meio ambiente, pois o melhor seria o desenvolvimento sustentável.

Quais providências já foram tomadas pelo coletivo para a não construção da UHE Formoso?

Temos o cuidado de levar o diálogo sobre a UHE Formoso tanto para a população urbana quanto rural, principalmente das áreas que serão alagadas. Ao mesmo tempo estamos em constante contato com os órgãos de Justiça, como o Ministério Público Federal e Estadual (de Minas Gerais/ MPMG) e com a Defensoria Pública Estadual para que justiça seja feita nesse caso, em que ocorrem muitas violações. Também nos juntamos ao Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco para ampliar o debate sobre o tema na luta em defesa pelo Velho Chico. O Coletivo Velho Chico Vive está do lado da comunidade ribeirinha e luta para que os direitos das comunidades tradicionais e do meio ambiente sejam preservados.

E o que ainda poderá ser feito?

O próximo passo do coletivo é se aproximar ainda mais dos órgãos de Justiça para evitar que os direitos da população e do meio ambiente sejam violados. Também vamos intensificar as campanhas de conscientização com a população, principalmente das regiões atingidas, com a cautela que o momento em que vivemos exige, com todos os cuidados sanitários. Não podemos deixar o assunto esfriar e os trâmites legais da UHE Formoso se desenvolverem sem a participação da sociedade. O nosso enfrentamento será o diferencial contra esse empreendimento.

O que o Rio São Francisco representa para você como artista e barranqueiro?

Costumo dizer que o São Francisco está consubstanciado com a minha vida! Por toda a minha infância e adolescência ele estava ali presente no meu cotidiano, me dando bom dia, boa tarde e boa noite! O São Francisco é a alma do povo barranqueiro. O Velho Chico é uma inspiração como artista, mas sobretudo, é o que me dá vida como cidadão do Norte de Minas, é o que me confere identidade! Ouça o Podcast da entrevista. Acesse: bit.ly/PodTrav117 ou escaneie o QR CODE ao lado.

Produzido pela Assessoria de Comunicação do CBHSF – Tanto Expresso comunicacao@cbhsaofrancisco.org.br Coordenação Geral: Paulo Vilela, Pedro Vilela, Rodrigo de Angelis Edição e Assessoria de Comunicão: Mariana Martins Textos: Andréia Vitório, Luiza Baggio e Mariana Martins Fotos: Andréia Vitório, Azael Gois, Bicho Carranca, Edson Oliveira, Manuela Cavadas Diagramação: Sérgio Freitas Impressão: ARW Gráfica e Editora Tiragem: 5.000 exemplares Direitos Reservados. Permitido o uso das informações desde que citada a fonte. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

Acompanhe as ações e os projetos do CBHSF por meio do nosso portal e redes sociais

cbhsaofrancisco.org.br

Realização


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.