Travessia 58 - Fevereiro de 2022 - Notícias do São Francisco

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travessia Notícias do São Francisco

JORNAL DO COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO / FEVEREIRO 2022 | Nº 58

Retrocesso: PL do Marco Hídrico transforma a água em mercadoria e retira poder dos Comitês Cheias: CBHSF cria sala de monitoramento para informar ribeirinhos

Canal do Sertão Alagoano: consultor do CBHSF explica o modelo de gestão

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Editorial Depois de 12 anos, as regiões do Submédio e do Baixo São Francisco operam com vazões em patamares elevados. O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) decretou o regime de cheia na Bacia do Rio São Francisco e, dessa forma, temos que atuar com regras específicas. No dia 24 de janeiro, as usinas hidrelétricas de Sobradinho (BA) e de Xingó (SE) alcançaram a vazão de 4.000 m3/s. Por isso, para acompanhar a elevação do nível do rio e seus impactos nas comunidades da Bacia, instalamos a Sala de Monitoramento de Cheias, que funcionou entre os dias 21 e 27 de janeiro nas dependências da Agência Municipal de Meio Ambiente de Petrolina, e segue acompanhando as vazões de modo virtual. Esta foi uma iniciativa inédita do CBHSF, que congregou ações de monitoramento e divulgação das vazões, além de emitir alertas às comunidades sobre a importância da não ocupação do leito do Rio São Francisco. O trabalho abriu espaços importantes junto aos veículos de imprensa para que pudéssemos falar sobre as implicações deste momento de cheia do rio São Francisco. Outro assunto que merece destaque é o PL do novo Marco Hídrico. Diante do retrocesso proposto neste projeto de lei, que, além disso, mostra-se inconsistente tecnicamente e juridicamente, por não apresentar regras claras que possam viabilizar as mudanças propostas, o Comitê conclama todas as instituições que se dedicam à gestão responsável das águas brasileiras a se articularem e se mobilizarem, perante a opinião pública e sobretudo junto ao Congresso Nacional, para resistir ao desmonte sem disfarce da política pública dos recursos hídricos, promovendo a rejeição, tanto na Câmara Federal quanto no Senado da República, de projeto de lei tão lesivo ao interesse público e aos objetivos estratégicos da sociedade brasileira. Convidamos as instituições do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos – SINGREH e todos que defendem a gestão descentralizada e participativa das águas a assinar a nota (que pode ser acessada na página do CBHSF ou através do QR Code abaixo) conjuntamente com o CBH São Francisco. Vamos tentar impedir o desmonte da política de recursos hídricos!

José Maciel Nunes de Oliveira Presidente do CBHSF

Acesse o site: bit.ly/CBHSFContraoMarcoHídrico ou escaneie o QR CODE ao lado.

IV SBHSF será realizado em setembro/2022 O IV Simpósio da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco teve sua data alterada e será realizado entre os dias 14 e 16 de setembro de 2022, em Belo Horizonte (MG). O prazo para submissão dos resumos expandidos continua o mesmo: de 10 de janeiro a 16 de maio.

Inscrições e mais informações em: www. sbhsf.com.br

Inscrições e mais informações acesse https://sbhsf.com.br/ ou escaneie o QR CODE ao lado.

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CBHSF alinha com UFS proposta de monitoramento da qualidade das águas dos afluentes do Baixo São Francisco Texto e fotos: Luiza Baggio O presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), José Maciel Nunes de Oliveira, se reuniu com representantes da Universidade Federal de Sergipe (UFS) para discutir e alinhar ações para o monitoramento da qualidade das águas dos afluentes da região do Baixo São Francisco. A reunião aconteceu no dia 18 de janeiro, na sede da Agência Peixe Vivo, em Belo Horizonte. A ideia é que a UFS realize o monitoramento dos afluentes da margem direita do Rio São Francisco, localizados no estado de Sergipe. “A proposta é realizar o monitoramento de poluentes orgânicos persistentes. No entanto, o grande diferencial será a utilização de dados de sensoriamento remoto”, explicou o professor da UFS, Carlos Alexandre Borges Garcia. Em julho de 2021, o Comitê assinou um Acordo de Cooperação com a Universidade Federal de Alagoas (UFAL) e a Agência Peixe Vivo, cujo plano de trabalho prevê a implementação de um programa de biomonitoramento de peixes e monitoramento de parâmetros de qualidade da água ao longo da calha do Rio São Francisco. O trabalho da UFAL será realizado desde a foz do rio até 240 quilômetros a montante. Sendo assim, toda a região do Baixo terá a qualidade de suas águas monitoradas de acordo com os mesmos parâmetros, sendo a calha pela UFAL e os afluentes de Sergipe pela UFS. Com essa divisão não haverá sobreposição de trabalho. “Conhecemos a proposta da UFS e, com o auxílio da Agência Peixe Vivo, vamos definir como o CBHSF poderá contribuir no projeto de monitoramento da qualidade das águas do Baixo São Francisco, que será realizado nos afluentes localizados em Sergipe” esclareceu Maciel Nunes de Oliveira, que também disse que uma das prerrogativas de sua gestão é investir na ciência e trabalhar em conjunto com as universidades em prol do Velho Chico. Também participaram da reunião os professores da UFS André Quintão de Almeida e Silvânio Silvério Lopes da Silva Costa, bem como o gerente de Projetos da Agência Peixe Vivo (APV), Thiago Campos e a coordenadora de Projetos da APV, Jacqueline Fonseca.

A reunião contou com a participação da coordenadora de projetos da APV, Jaqueline Fonseca, dos professores da UFS - Carlos Alexandre, André Quintão e Silvânio Silvério - do presidente do CBHSF, Maciel Oliveira, e do gerente de projetos da APV, Thiago Campos

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Marco Hídrico aprofunda questão da água como mercadoria Projeto de Lei não contou com a participação popular e, além de promover o desmonte dos Comitês de Bacias, abre o setor para a iniciativa privada Texto: Luiza Baggio/ Foto: Emerson Leite Mais de 100 entidades, ONGs e personalidades assinaram um manifesto em defesa da Lei 9.433/1997 que estabeleceu a Política Nacional de Recursos Hídricos. Conhecida como “Lei das Águas”, regulamenta o uso da água no Brasil como um bem público. Mas a legislação corre risco de desmonte diante da nova proposta de Marco Hídrico que vem sendo defendida pelo governo federal. O manifesto, de iniciativa do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), pressiona para que o Marco Hídrico seja discutido de forma democrática pela sociedade civil organizada, com transparência. O Marco Hídrico é um projeto de lei que reúne novas normas sobre a Política Nacional de Infraestrutura Hídrica. Uma das novidades é a criação da cessão onerosa, que permitirá a realocação negociada da água. Ou seja, em vez de o governo emitir novas outorgas, quem já tem direito de explorar bacias poderá negociar o uso com quem não tem. O novo Marco Hídrico também estabelece que entidades privadas poderão exercer funções de fiscalização por meio de concessão. O objetivo, de acordo com o Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), é liberar o poder público “para focar

na formulação de políticas públicas voltadas ao setor hídrico”. Outro ponto do projeto de lei propõe que o Conselho Nacional de Recursos Hídricos passe a aprovar os Planos de Recursos Hídricos de bacias de rios de domínio da União. Atualmente, os planos são aprovados pelos Comitês de Bacias Federais. Se a mudança for acatada, os colegiados terão atuação de caráter consultivo. A medida praticamente exclui a possibilidade de diálogo ao retirar dos Comitês a capacidade de intervenção. O que está em jogo Para o vice-presidente do CBHSF, Marcus Vinícius Polignano, na prática, o Marco Hídrico pretende instituir o “mercado da água”. “Esse projeto desfigura completamente a Política Nacional de Recursos Hídricos, que está assentada sob os princípios da descentralização, participação e integração, retirando atribuições deliberativas dos Comitês de Bacia Hidrográfica. Experiências de controle da água pelo setor privado, como a que já ocorre em outros países, beneficia os grandes usuários de água que poderão comercializar as águas. A nossa luta é pela democracia e para que todos tenham acesso a esse bem que é publico”.

O ex-presidente do CBHSF e coordenador da Câmara Consultiva Regional do Baixo São Francisco, Anivaldo Miranda, reforça a posição contrária ao Marco Hídrico. “O que está em jogo é ainda a possibilidade de quem detém a outorga da água hoje poder oferecer o uso do recurso para quem pagar mais. Imagine uma situação de escassez: quem puder pagar mais vai garantir o acesso à água e obter o que está na própria Lei 9.433, que é a garantia de abastecimento humano e dessedentação animal. Então, essa reforma que o governo está propondo é muito preocupante”. Anivaldo Miranda destacou ainda que o projeto permitirá que obras estruturantes para impulsionar a indústria e a agricultura irrigada possam ser feitas com aporte de capital privado. “O governo federal propõe o Marco Hídrico como uma forma de proporcionar segurança hídrica às regiões mais deprimidas do semiárido. Essas obras convencionais já se mostraram insuficientes para garantir segurança hídrica e para que os eventos extremos sejam amenizados causando menor impacto na escassez e com as chuvas intensas”, finalizou.

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CBHSF coloca em funcionamento Sala de Monitoramento de Cheias Texto e fotos: Juciana Cavalcante Diante da condição de cheia na Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, foi iniciada, no dia 21 de janeiro, a operação da Sala de Monitoramento de Cheias do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF). O objetivo é monitorar o processo de cheias na bacia, com foco na região fisiográfica do Submédio e alertar o poder público dos municípios e população ribeirinha sobre os possíveis impactos. A Sala de Monitoramento funcionou até o dia 27 de janeiro, nas dependências da Agência Municipal de Meio Ambiente de Petrolina (PE), e segue operando virtualmente. No dia 12 de janeiro, a Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf) iniciou, de forma gradativa, a elevação das vazões das usinas hidrelétricas de Sobradinho (BA) e Xingó (SE) até alcançarem a vazão de 4.000 m3/s, no dia 24 de janeiro. Já a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) abriu as comportas da Usina Hidrelétrica de Três Marias, no dia 14 de janeiro. O aumento das vazões no Rio São Francisco ocorreu em decorrência do grande volume de chuvas nos estados da Bahia e Minas Gerais, que acontecem desde dezembro de 2021. Acompanhando a situação de perto, o CBHSF pode auxiliar no envio de informações corretas para os canais de comunicação e para a sociedade. O trabalho congrega ações de monitoramento e divulgação das vazões, além de emitir alertas às comunidades sobre a importância da não ocupação do leito do Rio São Francisco. “O objetivo da sala de monitoramento é integrar as informações, uma das missões do Comitê. Então, buscamos integrar os dados e socializar com todos os ribeirinhos, seja poder público municipal, sociedade civil, comunidade de agricultores familiares, pescadores, comunidades quilombolas, indígenas, piscicultores, enfim, buscamos informar todos utilizando o apoio da imprensa e promovendo o compartilhamento das informações. Acredito que o objetivo da sala de monitoramento, que pode servir como modelo para outras experiências em outras regiões, foi alcançado e foi de fundamental importância. Agora, vamos continuar com a sala de monitoramento online”, afirmou o coordenador da CCR Submédio São Francisco, Cláudio Ademar. Além de emitir comunicados às cidades ribeirinhas, associações e entidades diversas, a comitiva composta pelo secretário do CBHSF, Almacks Luiz Silva, o coordenador da CCR Submédio, Cláudio Ademar e o diretor de Comunicação do CBHSF, Paulo Vilela, se dividiu em atividades de coleta de imagens, entrevistas com as

comunidades e concessão de entrevistas aos veículos de comunicação das cidades de Petrolina, Juazeiro (BA), Cabrobó (PE) e Abaré (BA), além de veículos das regiões do Médio e do Baixo São Francisco. A comitiva realizou visitas à hidrelétrica de Sobradinho, às localidades atingidas pela cheia, como a comunidade do Rodeadouro e o bairro Angary, onde vivem pescadores artesanais que precisaram deixar suas casas após o alagamento causado pela subida do rio – que hoje está em 4.000m³/s e segue neste patamar até o dia 28 de fevereiro.

Casas construídas de forma irregular na beira do rio foram invadidas pelas águas

Últimas ações presenciais Encerrando as atividades presenciais, o secretário Almacks Luiz, acompanhado do presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Lago de Sobradinho (CBHLS), Francisco Ivan de Aquino, esteve na barragem São Geraldo, em Juazeiro, local onde deságuam todas as águas pluviais da cidade e se encontram com o rio São Francisco. Neste mesmo espaço, assim como os canais urbanos de boa parte das cidades brasileiras e municípios da Bacia, também deságua parte do esgoto da cidade, sem tratamento. Com a elevação do volume, as comportas da barragem São Geraldo precisaram ser fechadas a fim de impedir que a água do rio invada a cidade, já que o município é cortado por canais. No local foram instalados equipamentos que realizam o trabalho de bombeamento do canal. Já em Petrolina, o aumento da vazão do Rio fez com que ele voltasse a ocupar áreas a que originalmente pertence, e com isso, poços da Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa) ficaram submersos gerando uma alta pressão em outra parte da tubulação próxima ao rio. “A criação da sala de monitoramento foi uma ação positiva que teve o apoio de todas as instâncias do Comitê, o que possibilitou um trabalho coordenado entre a CCR, a diretoria do CBHSF e do nosso setor de comunicação, que abriu espaços importantes junto aos veículos de imprensa para que pudéssemos falar sobre as implicações deste momento de cheia do rio São Francisco. Com essa experiência, acredito que podemos avançar no sentido de pensar na criação de um grupo de trabalho de monitoramento de vazão para tornar essa linguagem fácil e acessível para todas as populações”, concluiu o secretário do CBHSF, Almacks Luiz.

O secretário do CBHSF, Almacks Luiz, concede entrevista à TV Grande Rio

Veja o vídeo acesse: bit.ly/CheiasSF2022 ou escaneie o QR CODE ao lado.

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Brumadinho: três anos depois, recuperação do Paraopeba segue a passos lentos e insegurança de barragens persiste em Minas Texto: Luiza Baggio / Foto: Léo Boi Após três anos da maior tragédia humanitária do país, em Brumadinho, na paisagem devastada, a vida teima em seguir. Na época, 270 pessoas morreram soterradas pela lama tóxica deixada pelo rompimento da barragem da mina de Córrego do Feijão, da mineradora Vale. Nove em cada dez bombeiros de Minas Gerais trabalharam no resgate das vítimas. Eles, que foram os primeiros a chegar, continuam na missão até hoje. Agora, o desafio é localizar as seis pessoas – chamadas de joias – ainda não encontradas. Para além das vítimas, os reflexos da tragédia podem ser sentidos ao longo de toda a bacia do rio Paraopeba, importante afluente do Rio São Francisco, que foi inundado pelos rejeitos de minério de ferro da barragem. De 2019 até hoje, pouco se fez pela recuperação do rio desde o desastre. No acordo bilionário entre a Vale e o governo de Minas, firmado em 2021, a empresa se comprometeu a custear as ações de reparação, estimadas em R$ 5 bilhões. No entanto, até hoje, não há previsão de conclusão nem de como será feita essa recuperação. Para o vice-presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), Marcus Vinícius Polignano, a falta de ações práticas e transparência a respeito da recuperação do Paraopeba é outro trágico capítulo do desastre. “É de se lamentar que, do ponto de vista do rio, não temos praticamente nada pronto. Alguma coisa tem sido feita na região que foi destruída. Mas, o que percebemos é que a situação do Paraopeba permanece a mesma, com poucas ações de reparação e recuperação”, lamenta. Segundo o Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema), desde 2019, a dragagem removeu 82.871 m³ de rejeitos do rio, pouco perto dos 13 mi-

lhões de metros cúbicos espalhados pelo rompimento. Somente na área do córrego Ferro-Carvão, onde a ação foi concentrada, a estimativa é de que ainda existem entre 300 e 350 mil metros cúbicos de rejeitos. Em outubro de 2021, foi apresentada proposta de teste para dispor o material dragado na Estação de Tratamento de Águas Fluviais 1, com previsão de início em fevereiro. O presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Paraopeba, Ednard Tolomeu, reclama da falta de participação nas discussões e da falta de foco do governo no Comitê. “Há uma preocupação do governo sobre as obras que serão feitas com o dinheiro da Vale, mas não há nenhuma prioridade para a questão ambiental até agora. O CBH do Rio Paraopeba é uma instância que poderia ajudar e muito no processo de recuperação e, infelizmente, não foi acionado em momento algum para as discussões do pós tragédia”, aponta. A Vale informa, sem estipular prazos, que os recursos para restauração do manancial no rio Paraopeba estão garantidos. “O Acordo de Reparação Integral prevê que este Plano seja custeado pela Vale, sendo acompanhado e validado pelos órgãos competentes e auditorias ambientais até sua conclusão, de forma a garantir a reparação ambiental nos termos do que foi previsto pelo Acordo …. O processo de recuperação teve início em 2019, logo após o rompimento em Brumadinho, e que já estão em andamento a contenção e remoção dos rejeitos no ribeirão Ferro-Carvão, os monitoramentos da qualidade da água, solos e sedimentos e os estudos e ações de preservação da flora e fauna locais”, alegou a mineradora, por meio de nota.

Insegurança de barragens O Brasil ainda possui 65 barragens de rejeitos a montante. Minas Gerais tem a maior quantidade delas, 46, das quais 31 são estruturas classificadas em nível de emergência — três delas no maior patamar de risco. O excesso de chuvas, que assolou cidades mineiras nos últimos dias, aumenta a preocupação com o rompimento de barragens já classificadas em nível de emergência, por conta dos efeitos da água no solo. Somente na região do entorno da captação de água de Belo Horizonte – Bela Fama – existem hoje 11 barragens. Três dessas estruturas estão em nível 3 de alerta de rompimento: Forquilha I e III e o sistema Mar Azul que é a B3/B4. São barramentos que têm uma quantidade muito grande de sedimento, somando os três são uns 30 milhões de metros cúbicos de rejeitos. O vice-presidente do CBHSF afirma que é urgente uma revisão do modelo minerário no estado, uma fiscalização efetiva das estruturas e a atuação real do governo estadual no acompanhamento desses empreendimentos. “Riscos de danos em barragens e estruturas de contenção em minas aumentam no período chuvoso, como o caso do dique da mina Pau Branco, da Vallourec, e o muro da Vale que inundou Macacos agora em janeiro. Nesse cenário, falta fiscalização e sobra poder para as mineradoras. É preciso rever com urgência o processo de fiscalização e segurança dessas barragens. Esse modelo de hoje gera muito mais insegurança, transtornos e complicações do que lucro, benefício e bem-estar social. A sociedade, o Estado e o setor de mineração têm que repactuar uma nova relação. A gente vai pagar o preço por isso e as outras gerações muito mais”, destacou Marcus Vinícius Polignano.

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Primeira Expedição Científica do Submédio São Francisco tem comissão organizadora definida Texto: Juciana Cavalcante/Foto: Emerson Leite Em reunião realizada no dia 19 de janeiro foram definidos os integrantes da comissão organizadora da I Expedição Científica do Submédio São Francisco. A previsão é que ela seja realizada no segundo semestre de 2022. “A execução de expedições científicas é de indiscutível relevância para a gestão dos recursos hídricos na bacia do Rio São Francisco, na medida em que possibilita a condução de diagnósticos e estudos essenciais para o planejamento dos usos e de programas de revitalização, em uma região fortemente antropizada e com conflitos que podem comprometer a sustentabilidade futura dos diversos usos”, explicou o coordenador da Expedição e secretário da Câmara Consultiva Regional do Submédio São Francisco, Abelardo Monteiro. Considerando as particularidades da região, a expedição visa possibilitar uma maior aproximação da comunidade acadêmica e científica lotada na região, fomentando a articulação entre pesquisadores e técnicos em torno de ações de desenvolvimento sustentável. Além disso, pretende contribuir para a formatação de uma rede cooperativa entre universidades e institutos dos estados diretamente envolvidos, como Pernambuco e Bahia, ao mesmo tempo agregando contribuições e parcerias de outras instituições que se disponham a colaborar. Além das atividades científicas e de extensão utilizando embarcações, estão previstas ações por terra que devem contemplar desafios ambientais e sociais enfrentados por usuários, populações ribeirinhas e comunidades tradicionais. A primeira expedição terá abrangência da região do Submédio São Francisco desde o entorno da calha principal em trechos prioritários navegáveis, como Paulo Afonso – Moxotó, Petrolândia – Barra do Tarrachil e Petrolina/Juazeiro – Sobradinho.

cessamento, flora e macrófitas, educação ambiental e comunicação social. “Definida a comissão organizadora e as linhas de pesquisa, vamos conseguir avançar em todos os outros requisitos necessários à montagem da estrutura para a Expedição Científica. Com isso, o grupo passa a se reunir periodicamente a fim de cumprir os prazos previstos para que a expedição aconteça no segundo semestre deste ano”, explicou o coordenador da Câmara Consultiva Regional do Submédio São Francisco, Cláudio Ademar. A exemplo do que já acontece na região do Baixo São Francisco, a Expedição do Submédio será realizada pelas Universidades e contará com o apoio e parceria do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco. A ação deve cumprir ainda

os objetivos científicos de promover o monitoramento e diagnóstico socioambiental, estabelecimento de uma rede de monitoramento permanente, fomento à formação de rede cooperativa, proposição de ações de conservação e revitalização, publicação de artigos científicos em periódicos indexados, elaboração de livro científico sobre a expedição, formação de recursos humanos de alto nível, ampliação do conhecimento e banco de dados disponíveis sobre o Submédio e fortalecimento do sistema de informações do São Francisco. Ao final da primeira Expedição deverão ser elaborados dois relatórios parciais e um relatório final, além de um livro que deve ser concluído em dezembro de 2022.

Rio São Francisco, em Juazeiro (BA)

Planejamento Inicialmente está previsto o envolvimento de aproximadamente 22 pesquisadores de universidades e institutos dos estados da Bahia e Pernambuco distribuídos em equipes multidisciplinares atuando diretamente no monitoramento da região. O grupo deve atuar em quase 30 áreas de pesquisa que envolvem a qualidade da água e reuso, ictiofauna, geoprocessamento uso e ocupação, climatologia, administração/geração de renda, educação ambiental, saúde única, ecotoxicologia, ecologia vegetal, educação ambiental, saúde humana, taxonomia, biologia/biota aquática, pesca carcinofauna, antropologia, sociologia, arqueologia, pedagogia, direito, limnologia e fitoplancton, fauna, flora, ecologia, geopro-

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Dois

Em 2019, a SEMARH-AL cadastrou 712 usuários, com objetivo de conceder autorizações de uso da água e regularizar a situação das captações para pequenos irrigantes. Agora, está sendo realizado um cadastramento complementar com previsão de novos 500 usuários de pequenas propriedades rurais. A grande maioria tem como finalidade a irrigação. Há também cadastros com a finalidade de abastecimento humano, perfazendo hoje um total de 580 l/s, notadamente abastecimento público pela CASAL. Ademais, estima-se, em média, 600 caminhões-pipa por dia para o atendimento de comunidades rurais em cerca de 15 municípios.

dedos de

prosa Rodrigo Flecha

Qual a importância do Canal do Sertão Alagoano? O Canal Adutor do Sertão Alagoano é a maior obra de infraestrutura hídrica de Alagoas e uma das maiores do país, maior inclusive do que o Eixo Leste do Projeto de Integração do rio São Francisco. Ele foi projetado para uma vazão de 32 m3/s, com previsão de 2 m3/s para abastecimento público, e 30 m3/s para irrigação e demais usos. No total, serão 250 km, abrangendo 42 municípios, de Delmiro Gouveia até Arapiraca. Isto significa água para os usos múltiplos, como abastecimento público e irrigação, ao longo de toda sua extensão, contemplando o Sertão e o Agreste alagoanos. Os trechos de 1 a 4, em um total de 123 km, já estão em operação. As obras do trecho 5, totalizando 27 km, têm previsão de início para o primeiro trimestre de 2022. Atualmente, a água é utilizada para irrigar sobretudo pequenas propriedades rurais e para o abastecimento público, principalmente pela Companhia de Saneamento Básico de Alagoas (CASAL).

Entrevista: Luiza Baggio Rodrigo Flecha é o consultor responsável pela elaboração de um Modelo de Gestão do Canal Adutor do Sertão Alagoano, estudo contratado pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF). A obra, que utiliza água do Rio São Francisco para abastecer a área rural de 42 municípios de Alagoas, quando finalizada beneficiará um milhão de pessoas. O estudo é realizado no âmbito do Acordo de Cooperação Técnica no 01/2019 celebrado entre a Secretaria de Estado do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos (SEMARH-AL), o CBHSF e a Agência Peixe Vivo, sendo financiado com recursos da cobrança pelo uso da água da bacia hidrográfica do Rio São Francisco. Rodrigo Flecha é consultor na HidroBR, empresa contratada por licitação para desenvolver o projeto. Ele é formado em Engenharia Civil e especialista em Engenharia Sanitária e Ambiental pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e Mestre em Ciências e Técnicas do Meio Ambiente, Paris/França. Com vasta experiência nos setores público e privado, atuou por 20 anos na Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) como Superintendente de Apoio à Gestão de Recursos Hídricos e Superintendente de Regulação.

O volume de recursos hídricos disponível no Canal do Sertão Alagoano é suficiente para atender a todos os usuários que necessitam da água? A demanda atual do Canal do Sertão Alagoano é da ordem de 1 m3/s, muito aquém da capacidade atual instalada na Estação Elevatória de Água Bruta, da ordem de 2,67 m3/s.

travessia Notícias do São Francisco

Presidente: José Maciel Nunes Oliveira Vice-presidente: Marcus Vinícius Polignano Secretário: Almacks Luiz Silva

Secretaria do Comitê: Rua Carijós, 166, 5º andar, Centro - Belo Horizonte - MG - CEP: 30120-060 (31) 3207-8500 - secretaria@cbhsaofrancisco.org.br - www.cbhsaofrancisco.org.br Atendimento aos usuários de recursos hídricos na Bacia do Rio São Francisco: 0800-031-1607

Comunicação

Apoio Técnico

Em que consiste o modelo de gestão do Canal do Sertão Alagoano? Quais são os desafios? O Modelo de Gestão é um importante instrumento de planejamento integrado e participativo que buscará assegurar a sustentabilidade econômico-financeira da administração, operação e manutenção do Canal do Sertão Alagoano, garantindo o uso múltiplo da água de forma racional e sustentável em benefício da comunidade alagoana do Sertão e do Agreste. Com desafios que vão desde a sua construção até a implantação de projetos de desenvolvimento e atividades produtivas locais e regionais, é incontornável estruturar um modelo de gestão eficiente, eficaz e efetivo, para que a administração, operação e manutenção do Canal sejam sustentáveis e assegurem a viabilidade das atividades socioeconômicas e a geração de emprego e renda. De quem é a reponsabilidade de gerir e operar o Canal do Sertão Alagoano? Desde 2015 existe um Comitê Gestor do Canal Adutor do Sertão Alagoano formado pela SEMARH-AL, Secretaria de Estado da Infraestrutura de Alagoas (SEINFRA-AL) e Secretaria de Estado da Agricultura, Pecuária, Pesca e Aquicultura (SEAGRI-AL), que tem como função tratar de assuntos relativos à administração, operação, manutenção, fiscalização e regularização de usos da água e funcionamento do Canal. Em 2019 foi criado o Grupo de Trabalho da Gestão do Canal Adutor do Sertão Alagoano, constituído pela SEMAR, SEINFRA, SEAGRI, EMATER e CASAL.

Produzido pela Assessoria de Comunicação do CBHSF – Tanto Expresso comunicacao@cbhsaofrancisco.org.br Coordenação Geral: Paulo Vilela, Pedro Vilela, Rodrigo de Angelis Edição e Assessoria de Comunicão: Mariana Martins Textos: Juciana Cavalcante e Luiza Baggio Fotos: Emerson Leite, Juciana Cavalcante, Léo Boi e Luiza Baggio Diagramação: Rafael Bergo Impressão: ARW Gráfica e Editora Tiragem: 5.000 exemplares Direitos Reservados. Permitido o uso das informações desde que citada a fonte. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

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Realização

cbhsaofrancisco.org.br

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