/log/ Editorial /express/ Informática é, sem dúvida alguma, uma área verdadeiramente multidisciplinar, já que abrange todos os setores da nossa sociedade moderna. Deste modo não devemos esperar que aqueles que se especializem em informática sejam menos do que homens e mulheres renascentistas, capazes de discutir arte, cultura e política para além daquilo para o qual foram treinados. Foi para este propósito que trouxemos esta revista, este LogCesium para fora da obscuridade, de modo a dar um escape artístico àqueles que existem dentro desta área essencialmente técnica e de modo a demonstrar à comunidade de que a tecnologia não é nada sem a palavra escrita. As contribuições para a revista são portanto demonstrações de pluralidade dos engenheiros e profissionais do futuro, feitas de forma pública, em apoio à imprensa e à democracia. André Teixeira
Equipa log/ Diretor João Vilaça
Diretores Adjuntos André Teixeira José Nuno Macedo
Capa e Direção Artística Lúcia Abreu
Colaboradores Alexandre Pinto Ana Almeida Bruno Cancelinha Catarina Machado Dinis Peixoto Eduardo Jorge Jéssica Lemos Márcia Teixeira Mariana Fernandes Mariana Fontainhas Susana Mendes Tiago Carvalhais
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Mulheres e Tecnologia
/persona/ 6 Anabela Barbosa
/atividades/ 10 Verão no Campus 12 HeartBits 14 Dezembro Solidário 15 Semana da Engenharia Informática
/curso/ 17 20 22
O Crescimento Insustentável do MiEI Estágio de Verão Universidade - O Choque
/pensamentos/ 23 Informática e o Papel do Engenheiro 25 Mestres da Internet 27 Cultura 28 A Diabólica Moeda de 1 Cêntimo 30 Bitcoin 32 Como Espiar os Espiões 34 Tráfico de Almas
/sátira/ 38 41
Alguém que dê a Trump o Nobel da Paz Ano em Pesquisa
/cultura/ 43 Ryo Fukui e Osamu Kitajima 44 David Foster Wallace - Infinite Jest 48 Game Awards 50 CAUM, para além da música
/internacional/ 52
Mãe, estou no Japão!
A revista /log/cesium é um projecto voluntário sem fins lucrativos. Todos os artigos são das responsabilidade dos autores, não podendo a revista ou o centro de estudantes ser responsável por alguma imprecisão ou erro. Para qualquer dúvida ou esclarecimento poderá sempre contactarnos através do email cesium@di.uminho.pt ou através do 253 604 448.
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/express/ Mulheres e Tecnologia Escrito por Mariana Fernandes mariana_fernandes_27 @hotmail.com
Facilmente se constata que existe uma enorme discrepância entre géneros em todas as áreas STEM( Science, Technology, Engineering and Mathematics). Segundo dados do InfoCursos (http://infocursos.mec.pt/), referentes ao ano letivo de 2015/2016, o Mestrado Integrado em Engenharia Informática da Universidade do Minho é composto por 88% de membros do sexo masculino (percentagem de inscritos em todos os anos). No entanto, se me perguntarem porque não há mais mulheres em STEM, eu não sei responder. Adoro montar e reparar computadores, fazer pequenos projetos em Arduino e salto da cadeira quando encontro o erro que estou a tentar corrigir. Não entendo o porquê de tantas jovens raparigas e mulheres não terem qualquer tipo de interesse na área. O meu interesse não advém de ter familiares na área nem de qualquer iniciativa extracurricular. Simplesmente, assim que tive contacto com computadores, em aulas de TIC (Tecnologias de Informação e Comunicação) no 9º ano, descobri a minha paixão. Felizmente, tem havido um despertar dos responsáveis pelo setor da Educação, no nosso país, no sentido de implementar aulas de programação no 1º ciclo, que permite um contacto mais imediato com a informática, para além de ser muito mais interativo e interessante do que TIC. Há quem culpe o desinteresse pelas STEM na cultura, na educação e/ou nos media. Gostos não se discutem, mas é importante perceber se as crianças e jovens de ambos os sexos têm no seu percurso as mesmas oportunidades de interagir com as diferentes áreas. Quando se opta por comprar apenas bonequinhas para as meninas e legos ou bonecos de ação para os meninos, estamos desde pequenos a criar obstáculos para que a futura escolha da carreira seja o mais ponderada e consciente possível. Acredito que muitas vezes, os pais oferecem o que as crianças pedem mas são eles os responsáveis por adquirir brinquedos e outros objetos que fomentem o crescimento equilibrado dos filhos e abram novos horizontes. É essencial continuar com o trabalho de incentivo à programação, com a partilha de casos de sucesso e a “desmistificação” de que Informática é uma área exclusivamente de homens. 5
/persona/
Anabela Barbosa
Escrito por Susana Mendes a63464 @alunos.uminho.pt
No passado mês de Janeiro entrevistamos a antiga presidente do CeSIUM, Anabela Barbosa, que cordialmente aceitou responder às nossas questões. Anabela Barbosa formou-se em Sistemas da Informação na Universidade do Minho e trabalha agora como Líder de Equipa na Teleperformance Portugal. Foi durante o seu mandato como presidente do CeSIUM que foi fundada a presente revista, na altura sob o nome de info-LESIUM. Enquanto núcleo de estudantes, procuramos divulgar diferentes perspetivas não só do curso mas também do próprio núcleo, a todos os nossos leitores. Neste sentido, convidámo-la, enquanto influência importantíssima na revitalização e dinamização do CeSIUM e do curso, a divulgar a sua experiência na presidência do núcleo. Começando pelos essenciais, o que a levou a ingressar no curso de Licenciatura em Engenharia de Sistemas Informáticos? Engenharia Informática foi uma escolha racional com alguma influência de um primo que na altura frequentava a licenciatura e que terminou no ano do meu ingresso. A grande procura de licenciados no mercado e os valores salariais oferecidos na altura, eram aliciantes. Decidi investir numa licenciatura que me oferecesse alguma estabilidade profissional e retorno pelos anos de estudo. Não foi fácil e ao fim do primeiro ano estive tentada a desistir. Felizmente segui em frente e hoje não me arrependo nada. Há muitas ofertas no mercado para Engenheiros Informáticos e são tão diversificadas que tens sempre novos desafios à tua espera. Quais foram as motivações que a levaram a querer fazer parte do CeSIUM? Foi um projeto de várias pessoas e um desejo de estudantes mais velhos que já tinham conhecido outro CeSIUM e nos incentivaram a renovar a imagem do centro de estudantes. Aceitamos o desafio, foi um trabalho de equipa com muitos desafios e que acabou por nos unir também. 6
/persona/ Quais as lacunas que viu que precisavam de ser colmatadas pelo CeSIUM enquanto núcleo? Sentimos necessidade de dar vida ao CeSIUM. Queríamos que o Centro fosse um ponto de referência para os alunos de LESI (sigla da altura) e que os alunos se identificassem com o Centro. Queríamos ser mais participativos nas atividades do departamento e trazer mais atividades para todos os alunos da licenciatura. Quais, na sua opinião, foram os aspetos que necessitavam de uma mudança quando assumiu a direção? A primeira mudança foi abrir a porta do CeSIUM à comunidade. Quisemos quebrar barreiras e inovar um pouco. Sentiu o apoio por parte da equipa docente e/ou departamento de informática para os projetos que a nova equipa do CeSIUM queria realizar? As memórias já não estão muito frescas, mas tivemos alguma colaboração com o Departamento nomeadamente na organização das JOIN. Tivemos também colaboração no desenvolvimento da área de comunicação com os estudantes.Como também fui delegada de curso, acabamos por reforçar a ligação ao CeSIUM. Que mensagem passa aos alunos quando projetos como as jornadas da LESI não têm apoio suficiente? Não conheço a realidade atual. A minha experiência na altura foi diferente, as JOIN eram muito importantes para o departamento. Acho que as jornadas merecem todo o apoio possível porque são para os alunos a ponte entre o contexto académico e a Indústria e muitas vezes o seu primeiro contacto com as empresas. É bom para os alunos, para o departamento e até mesmo para a Academia.
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/persona/ Ter um jornal totalmente realizado por alunos e para alunos sempre foi um foco quando assumiu a direção do CeSIUM? Se sim, qual a motivação perante tal ideia? Não me recordo se foi o foco logo de inicio, mas recordo-me dos colegas que mais investiram neste tema. Eram estudantes de LESI mas com muita aptidão para as artes gráficas e para comunicação. Ter um jornal nosso é uma boa aposta, mas manter o jornal vivo e interessante é um grande desafio, um esforço contínuo. O departamento pode ter uma participação muito ativa no jornal e enriquecer o mesmo com conteúdos úteis para todo o departamento. Qual foi a aceitação dos alunos aos novos projetos abraçados, como no caso do jornal LESIUM? Na minha memória tenho que no início o Jornal foi um sucesso. A novidade, seja ela qual for, desperta sempre algum interesse no ser humano. Quais os aspetos positivos e/ou negativos de se pertencer a um núcleo de estudantes como o caso do CeSIUM? Pertencer ao núcleo de estudantes é um compromisso. Este compromisso exige tempo de ti, tempo que dedicado ao CeSIUM, não poderá ser dedicado a mais nada. Negativo ou Positivo, depende da perspetiva e do que resulta para cada um. O CeSIUM, enquanto núcleo de estudantes, é uma organização. Uma organização gerida por pessoas, cada uma com a sua responsabilidade. Se levarmos a responsabilidade a sério, com algum profissionalismo, estamos, na prática, num estágio para o nosso futuro. 8
/persona/ É uma experiência que pode produzir resultados muito positivos no nosso crescimento enquanto indivíduos de uma sociedade. Por outro lado, se não conseguires um equilíbrio com a responsabilidade enquanto estudante, estás a comprometer o teu sucesso na licenciatura. Acha que o tempo que teve na direção do CeSIUM mudou de alguma maneira a interação entre CeSIUM e os alunos do curso? Como disse, já não tenho muitas memórias deste tempo com este detalhe. Recordome que no início tivemos muitas visitas na nossa sala. Pedidos de informação, inscrição em eventos, etc. Na altura estávamos em processo de reestruturação da Licenciatura e o CeSIUM teve um papel relevante na divulgação de alguma informação sobre o tema. A organização das jornadas de informática também atraiu muitos alunos ao Centro de Estudantes. Pelo menos no inicio, sim, tivemos uma grande interatividade com os alunos do curso e acho que fizemos alguma diferença. Espero que hoje esteja ainda melhor e os alunos da Licenciatura reconheçam o CeSIUM como o seu Núcleo de estudantes e se identifiquem com o mesmo. Obrigado pela participação nesta entrevista! Para a finalizar, que mensagem gostaria de deixar à atual direção do CeSIUM e aos alunos do curso? Para a direção do CeSIUM e todos os alunos que colaboram convosco os meus parabéns pelo trabalho que realizam. Pode não ser perfeito, mas certamente dão o vosso melhor. Não nos podemos esquecer, que os alunos que investem tempo no núcleo de estudantes e nas suas atividades, o fazem de forma voluntária. O único retorno que têm é a sua realização pessoal e de equipa, por atingirem um objetivo. O melhor retorno que podem ter é a colaboração e o reconhecimento dos alunos e próprio departamento. Para todos os alunos do curso, em especial para os mais novos, não desistam do que vos trouxe a esta licenciatura. Sigam o vosso sonho, o vosso objetivo sem olhar a esforço. São muitas as dificuldades que encontramos pelo caminho mas não há satisfação maior do que superá-las. Tirem o maior partido possível da companhia dos grandes professores que temos no nosso departamento e, em geral, na Universidade do Minho. Não desvalorizem as áreas de que gostam menos, elas podem fazer-vos falta no futuro. O tempo passa rápido e, quando damos conta, já estamos no mundo de trabalho.
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/persona/ /atividades/ Verão no Campus Escrito por Catarina Machado catarinamachado11 @gmail.com
Ter a minha vida organizada e o meu futuro devidamente planeado sempre foi uma prioridade para mim, e por isso, quando ainda frequentava o Ensino Secundário, mais concretamente o 11º ano (2015), procurei alguma atividade que me ajudasse na escolha do curso do Ensino Superior, para assim conseguir tomar uma decisão com consciência. Deste modo, através de algumas amigas conheci o “Verão no Campus”, um programa desenvolvido pela Universidade do Minho que tem como objetivo estreitar os laços entre os mais jovens e a realidade universitária e auxiliar os estudantes que pretendem ingressar no Ensino Superior na escolha de uma área de estudo e trabalho. No programa “Verão no Campus”, as atividades que temos ao nosso dispor são muitas e englobam todas as áreas científicas da oferta educativa da Universidade do Minho. Em consequência disso, optei por aquela que sempre cativou a minha atenção, com engenharia e informática. Assim, a atividade que escolhi foi “Computação Sem Fronteiras”, que residiu no Departamento de Informática no Campus de Gualtar. Foi durante estes dias que tive o meu primeiro contacto com programação, inicialmente com alguns jogos de programação em blocos e, em seguida, com a linguagem de programação “Haskell” (linguagem que, mais tarde, aprendi no 1º ano do curso de MiEI). Conheci o Departamento de Informática e, para além do facto de todos as aulas que tivemos terem sido lá, fizeram-nos também uma visita guiada por todos os pisos e visitamos várias salas e compartimentos, algumas das quais com bastantes torres de computadores, onde se encontram alojados os servidores do Departamento. Tivemos igualmente a oportunidade de entrar nessas salas que possuem sistemas de arrefecimento e regulação de temperatura, e explicaram-nos de uma forma geral como funciona esse sistema. Além disso, tivemos a experiência de contactar com um drone equipado com uma câmara. Este drone sobrevoou todo o Campus e conseguimos, através de um monitor, ver de outra perspetiva o Departamento e as outras escolas da Universidade. 10
/atividades/ Outra das aulas que tivemos foi relativa a Sistemas de informação, onde uma aluna do curso de MiEGSI nos clarificou qual é a essência desse curso, juntamente com a lecionação de alguns tópicos que são abordados no mesmo. É importante referir que em todas as tarefas fomos acompanhados por professores, investigadores e também por alunos da Universidade, que foram os nossos monitores durante esses cinco dias. Estes alunos pertenciam a diferentes cursos da Universidade do Minho, o que nos deu a conhecer diferentes pontos de vista e a estarmos mais próximos daquilo que será o nosso futuro na Universidade. Usufruímos, em conjunto com todos os outros jovens das atividades das restantes áreas científicas, de uma sessão de acolhimento e de encerramento, e também de uma tarde com diversas atividades e diversões (peddy-paper, dança, um jogo do estilo paintball, escalada, entre outras), no Regimento de Cavalaria. Desta forma, fomentamos o espírito de trabalho em equipa, laços de amizade e confiança mútua. Em suma, senti que foi uma experiência bastante enriquecedora uma vez que me ajudou a familiarizar com o local e ambiente onde mais tarde ingressei, criei novas amizades e conheci colegas que agora frequentam o mesmo curso que eu e, mais importante ainda, o meu objetivo inicial foi cumprido, deu-me a certeza final que me faltava na escolha do curso. Aconselho vivamente todos os alunos do Ensino Secundário a aderirem a este programa. Agora, enquanto aluna do Ensino Superior, pondero participar no “Verão no Campus” como monitora, e ajudar os mais jovens nesse processo de seleção do curso e tentar de alguma forma mostrar que a Universidade não é um bicho de sete cabeças, e que é aqui que passamos os melhores anos das nossas vidas.
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/atividades/ HeartBits Escrito por Mariana Fontainhas Marianafontainhas @gmail.com
Esta Hackathon, para além de única e especial, foi também a primeira. Tive muitas dúvidas em relação à participação neste grande evento, tendo em conta que o meu curso não é necessariamente informática. Sou finalista do curso de Engenharia Biomédica, mais precisamente do mestrado em Informática Médica. Só estudei informática nestes dois últimos anos, será suficiente para participar? Várias pessoas disseram-me que não interessa se não tenho tantas capacidades como os estudantes de informática, mas, se conseguir acompanhar a equipa, mostrar os meus pontos fortes, dar ideias criativas e interessantes, poderia ser uma mais-valia e, apesar de tudo, esta hackathon serve também para juntar uma equipa multidisciplinar com perspetivas diferentes e criar um ambiente de aprendizagem em grupo. Qual a lógica de não participar, se esta hackathon acaba por juntar os dois mundos para os quais dediquei todo o meu estudo: Saúde e Informática? A verdade é que são duas áreas completamente diferentes, de um lado, temos programadores, capazes de criar aplicações e ferramentas que podem mudar o mundo, porém falta-lhes a noção de como funciona um hospital, noção da quantidade de problemas que existem na prestação de cuidados, o que pode e deve ser melhorado tanto a nível de organização, diagnóstico, bem-estar, farmacêutico etc. Do outro lado, temos os profissionais de saúde que têm a noção completa de tudo que está mal e deve ser melhorado, mas não têm capacidade de conseguir tornar essas ideias reais e informatizadas e, daí, a necessidade de atividades como esta que fomentam a interação e cooperação entre ambas as partes. A maior prova disso foram as fantásticas ideias desenvolvidas durante as 24 horas da hackathon que não chegam, como é óbvio, para transformar todo um projeto num programa final, mas chegam para criarmos um protótipo, explicar a falha que existe no sector da saúde e o como vamos resolver o problema que explicitamos. Ainda assim, as primeiras horas foram complicadas para algumas equipas, “Isso já existe!”, frase que correu todas as mesas durante toda a hackathon quando estávamos na fase de definir a nossa ideia. Já existe tanta coisa, o que mais será necessário melhorar?
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/atividades/ /atividades/
A verdade é que a tecnologia está sempre a avançar. Aos nossos olhos, tudo parece bem à primeira vista, no entanto é preciso procurar e investigar e, eventualmente, começase a perceber que há muitas mais falhas do que se pensava e, por vezes, encontrar essas falhas e arranjar soluções criativas para as resolver é verdadeiramente desafiante e cansativo. Felizmente, tendo noção destas dificuldades, a organização criou alguns pontos para descontrair, ver um filme, jogar um jogo, dormir uma soneca... Somos humanos, não somos máquinas e ficar acordado 24 horas é cansativo e stressante. Gostei da forma como fomos abordados pelos colaboradores, fez-me sentir que estas 24 horas passaram a voar. Para além disso tínhamos imensos mentores, que nos podiam acalmar ou ajudar com problemas em que podíamos estar bloqueados. Esta hackathon abre os olhos aos estudantes. Os alunos de informática têm finalmente um objetivo em mente e uma ideia que pode mudar o mundo, faz-nos sentir úteis de certo modo. Não é apenas um trabalho de grupo em que recebemos uma nota e acabou, fica sem uso e arrumado numa gaveta. É mais do que isso! É a sensação de que podemos realmente aplicar tudo o que aprendemos e mudar vidas. Os estudantes de medicina, por outro lado, têm uma maior noção do que o que é desenvolver um projeto de raiz e como se cria uma plataforma tecnológica a partir da ideia que trazem, é uma altura que podem ser criativos e sentirem-se empreendedores. O mundo está a mudar. Cada vez mais é mais necessário reunir equipas jovens, criativas e multidisciplinares e tirar o melhor de cada elemento de forma a melhorar este grande setor da Saúde que tem tanto a evoluir. No final de tudo, o meu pensamento ao participar na Hackathon Heartbits é que é possível mudar a saúde e as vidas das pessoas e tudo começa com uma equipa coesa e um objetivo definido. Obrigado CeSIUM e ANEM pela oportunidade. Esta experiência fez-me sentir útil e inspirada para novas ideias. Levo comigo novos amigos, o quinto lugar e vontade de mudar o mundo! Recomendo a todos os estudantes de informática e saúde que queiram desafiar-se e sair do quotidiano. 13
/atividades/ Dezembro Solidário Escrito por Dinis Peixoto Dinispeixoto96 @gmail.com
Durante o mês de Dezembro, o CeSIUM tem por hábito organizar a iniciativa “Dezembro Solidário”, um projeto de cariz social cujo objetivo é celebrar a época natalícia através do incentivo à solidariedade por parte dos alunos de Engenharia Informática. Em edições anteriores, a iniciativa consistiu na colocação de uma árvore de Natal no Departamento de Informática, onde poderia ser encontrado um cabaz para recolha de bens alimentares, peças de vestuário ou até mesmo brinquedos. Todas as atividades realizadas pelo CeSIUM durante esse mês estavam devidamente identificadas com o símbolo da iniciativa, encorajando os seus participantes à doação de um bem para o cabaz. Com já múltiplas edições realizadas, o CeSIUM optou este ano por expandir o projeto, convidando Núcleos, Associações e Secções de estudantes de toda a Universidade a contribuir na iniciativa. Deste modo, foram colocadas múltiplas árvores de Natal em posições estratégicas da Universidade, onde poderiam ser encontrados cabazes para qualquer aluno fazer a sua doação, em troca da participação nas diferentes atividades oferecidas pelas diversas associações durante este mês. A iniciativa como um todo foi um sucesso, contando com o apoio de cerca de 20 associações e mais de 10 atividades organizadas por parceiros durante o mês de Dezembro, relembrando que este é um mês de festividades natalícias e solidariedade entre pares, tendo a realização de atividades sido limitada às duas primeiras semanas devido ao período de descanso que se seguiu. O Dezembro Solidário gerou cerca de 200 contribuições refletindo-se em mais de 1 tonelada de bens doados, os quais foram entregues à Cruz Vermelha Portuguesa de Braga e à Fraterna (Centro Comunitário de Solidariedade e Integração Social) em Guimarães. Com o sucesso desta iniciativa podemos ter a certeza que a época Natalícia significa mais do que consumismo descontrolado ou períodos de relaxamento para os estudantes da Universidade do Minho, demonstrando que a compaixão pelo próximo, a consciência social e a solidariedade estão bem presentes nos estudantes da Academia e nas suas instituições. O CeSIUM quer portanto agradecer de forma sentida a todos os parceiros e participantes, assegurando que no próximo ano a iniciativa continuará mais forte que nunca, de modo a tornar um pouco maior este nosso pequeno gesto em comum, uma doação de cada vez. 14
/atividades/ /atividades/ Semana da Engenharia Informática Escrito por João Vilaça
machadovilaca @gmail.com
O CeSIUM organizou de 3 a 11 de Fevereiro de 2018 mais uma edição da SEI - Semana da Engenharia Informática, foram 8 dias cheios de atividades totalmente gratuitas, uma semana intensiva cheia de workshops, palestras, concursos e muitas oportunidades de ganhar prémios! Esta semana é o momento ideal para conhecer oradores nacionais e internacionais como Mike Elsmore, Filipa Lacerda e Job Van der Voort da GitLab e Eugene Petrenko da JetBrains, para contactar com empresas e aprender tudo sobre novas tecnologias e aprofundar temas de destaque no panorama atual da informática, como é o caso da inteligência artificial, moedas digitais ou robótica. Várias empresas de relevo na área também garantiram a sua presença no evento, como a Accenture, exclusive sponsor e um dos pilares fundamentais para o sucesso da semana, todas a competir pela atenção dos participantes, procurando atrair e conquistar os melhores talentos com várias oportunidades de estágio e emprego. Este ano, foi também estabelecida uma parceria com a CP - Comboios de Portugal, que, enquanto travel partner, disponibilizou bilhetes a 2€, ida e volta, nos comboios urbanos do Porto com destino a Braga, linhas de Braga, Marco de Canaveses, Guimarães e Aveiro, apoio que representou uma imensa facilidade de transporte para todos os participantes do evento.
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/atividades/
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Muitos participantes são também atraídos pelos vários desafios, desde concursos de segurança informática a fotografia, uma hackathon e muitos desafios diários, tudo devidamente acompanhado de maravilhosos prémios, entre os quais uma Nintendo Switch e um Drone. Também enquadradas na semana existiram atividades noturnas, já tradicionais, como o Arraial d’Engenharia ou o Rally das Tascas, onde várias equipas tiverão de competir entre si para demonstrar quem possui o verdadeiro espírito universitário.Para terminar em beleza, os Hackathonners, com o apoio do CeSIUM, organizaram a Hacktivate, uma hackathon de 24 horas com tema livre, na qual equipas até 4 elementos devem criar um protótipo da sua ideia e convencer os jurados que são merecedores de algum dos fantásticos prémios que somam uma quantia total de 1000€. Este ano a SEI teve mais de 700 inscritos, um número que tem vindo a crescer de ano para ano, resultado do aumento da qualidade e do empenho na organização do evento que demonstra bem o sucesso que o mesmo tem alcançado.A SEI é um evento de alunos para alunos que ganha cada vez mais destaque no contexto universitário português.
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/curso/ O Crescimento Insustentável do MiEI Escrito por Martinho Aragão
martinhoaragao@gmail. com
Engenharia Informática na UMinho tem sido alvo de um crescimento acentuado ao longo dos últimos 6 anos. Os numerus clausus subiram, faseadamente, de 115 para 160 e, possivelmente contra algumas expectativas, a média passou de 13.58 para 16.12. No entanto, a Universidade do Minho, em particular o Campus de Gualtar, não tem sido capaz de acompanhar suficientemente rápido as necessidades de um aumento tão substancial. Os auditórios não têm mais lugares, não há mais salas, há menos computadores bem como equipamento no Departamento de Informática e os quadros docentes permanecem praticamente inalterados há mais de uma década.Em 2016 e 2017 os novos alunos foram recebidos pela Direção de Curso e pelo CeSIUM em auditórios onde dezenas são obrigados a optar por se encostar à parede, se sentar no chão ou simplesmente ir embora. Infelizmente, este é um problema recorrente que transcende para além da apresentação inicial. É fácil entender a situação, o maior auditório de aulas em Gualtar tem 179 lugares e é muito requisitado, já o segundo maior tem 145. Convém relembrar que, como as taxas de aprovação não são 100%, qualquer UC tem pelo menos 160 inscritos e este número pode ultrapassar os 300. Assim, mesmo que esse auditório seja para uso exclusivo de Eng. Informática, não é suficiente para satisfazer as necessidades. Contudo, é necessário primeiro reconhecer que esta é uma situação que exija medidas. Há um argumento que é frequentemente usado quando se aborda esta situação “Passado umas semanas os alunos deixam de ir às aulas, só afeta temporariamente”. É verdade que ouvi colegas a dizer que já não iam a uma aula porque àquela hora também já não conseguiam entrar ou, que passaram a ir à UC leccionada em LCC. Todavia, é um risco exigir melhores condições e depois elas não serem usadas. Imaginando que foi só um aluno que desistiu devido às condições do auditório, não se justifica na mesma resolver o problema? Se é atualmente difícil alocar espaço para aulas teóricas então vamos falar sobre a logística de avaliação. Tradicionalmente existiam três alternativas: realizar testes ao sábado de manhã, foi implementada durante vários anos, principalmente para os alunos de 2.º ano; à noite, foi utilizada somente para soluções de última hora; usar, por vezes, mais de 10 salas em mais do que um edifício da universidade ao mesmo tempo. Ora para um curso laboral recorrer a horário pós-laboral não é agradável nem para alunos nem para professores, como tal a solução mais usada era a terceira. Sendo que, se as grandes salas do 1.º piso do CP2 estivessem ocupadas, então podiam ser necessárias todas as restantes salas do CP2, o que é quase impossível para a equipa docente porque exigiria ter dezenas de pessoas a supervisionar.
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/curso/
Surgiu então uma nova solução que é hoje a norma, testes na cantina. Lamentavelmente nem a cantina é sempre suficiente como tal são utilizadas simultaneamente algumas salas em CPs. Apesar de não existir uma alternativa melhor, esta tem obviamente desvantagens como fracas condições de luz para provas, barulho dos funcionários a arrumar e um cheirinho à ementa do dia. Não convém esquecer, este é um curso com uma componente prática muito acentuada. Apesar de existirem, por vezes, mais de dez turnos práticos, estes não cabem nas salas do Departamento de Informática. Assim, as aulas práticas são frequentemente leccionadas nos Complexos Pedagógicos em salas normais ao invés de laboratórios de informática. É um facto que, atualmente, o DI tem menos computadores do que quase qualquer outro edifício da universidade pois andamos com os nossos portáteis mas, pelo menos, tem condições de tomadas e de internet. É recorrente alunos virem pedir ao CeSIUM uma extensão, mas são precisas cerca de 10 por turno e com pelo menos 5 turnos por disciplina prática por ano… Bem, são necessários ajustes urgentes nas salas de forma a estarem equipadas para turmas de informática, assunto esse que já foi contemplado aquando a passagem a mestrado integrado, desde então poucas dessas obras foram iniciadas. Por outro lado, os trabalhos práticos também exigem uma gestão por si só. Os grupos tendem a ser de 2 a 4 elementos, ou seja podem existir mais de 80 grupos para serem avaliados sendo que, por vezes há várias entregas distintas para além de testes teóricos numa só disciplina. Torna-se difícil avaliar com o mesmo nível de exigência sem alterações significativas na equipa docente.
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/curso/ É inegável o esforço que os Professores têm dedicado, em particular das Direções de Curso e de Departamento, aulas teóricas foram divididas, mais turnos práticos foram abertos, os horários passaram a ser atribuídos de forma mais justa e com maior simplicidade para os estudantes, novas disciplinas foram abertas no Mestrado, as especializações foram separadas das complementares. Estas alterações só foram possíveis graças a um apoio por parte da Escola de Engenharia e uma compreensão dos demais serviços da universidade. Muito do que se tem conseguido corrigir é graças a esta sensibilidade por ser um curso com 160 novos alunos por ano. No entanto, estes ajustes não só não são suficientes como são precisamente remendos postos em ação anos após já se ter identificado a existência de problemas. Isto compromete a qualidade do ensino. É preciso mais uma vez parar e avaliar a situação, deve-se continuar a aumentar as vagas de um curso que está a rebentar com as costuras da infraestrutura do campus? O segundo curso com mais alunos por ano é Medicina (120), que tem um edifício exclusivo para as suas necessidades, Direito é o terceiro e quase não tem aulas práticas. Ambos os casos acontecem diretamente em Escolas e não em departamentos, ou seja têm mais independência de gestão.Vários são os casos em que para além de serem identificados problemas pela direção de curso/departamento, estes têm depois de seguir para a Escola de Engenharia que alberga dezenas de cursos, podendo por vezes ser necessário obter aprovação por parte da reitoria. Para perceberem a complexidade de gerir um curso como este, recomendo a qualquer um ver os nossos horários, em particular do 1.º ano. Mas então porque se continua a aumentar os numerus clausus? Atualmente, o número de graduados não consegue preencher sequer um terço da ofertas de emprego só na cidade de Braga. Por outro lado a universidade assumiu como objetivo atingir os 25 000 estudantes até 2025. Já em 1996, se cantava “O rapaz estuda nos computadores. Dizem que é um emprego com saída”, a responsabilidade nesta gestão está sob a reitoria e nos últimos anos a decisão tem sido recebida com alguma surpresa e pouca antecedência tanto por parte dos docentes como dos alunos. É este o trabalho do CeSIUM, o Centro de Estudantes de Sistemas e Informática da Universidade do Minho, auscultar os alunos e trabalhar em conjunto com a equipa docente e funcionários de forma a minimizar os impactos negativos, procurando evitar problemas como os ocorridos na passagem de LEI para MiEI. Há poucos dias ocorreu a Reunião Geral de Alunos de Eng. Informática, organizada pelo CeSIUM. Nesta foi precisamente apontado por quase todos os alunos presentes a preocupação com este crescimento insustentável. Urge fazer com que estas decisões com impacto tão abrangente no curso sejam acompanhadas imediatamente não só por alguns dos órgãos mas sim por uma relação simbiótica entre os alunos, o núcleo, a direção de curso, o departamento, a escola e a reitoria.Hoje a luta é pela melhoria das condições nos Complexos Pedagógicos para que, amanhã, consigamos dizer com mais convicção que este ainda é o melhor curso de Engenharia Informática do país.
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/curso/ Estágio de Verão Escrito por João Vilaça
machadovilaca @gmail.com
Os estágios de verão são universalmente aceites como uma das mais importantes experiências de preparação para o mercado de trabalho, não só devido a toda a aprendizagem e método de trabalho que deles advém mas sobretudo por ser um factor de diferenciação num mundo profissional cada vez mais competitivo. Assim, sensivelmente por volta de março de 2016, enquanto frequentava o 1º ano de Engenharia Informática, entrei em contacto com a Eurotux Informática, enviando a minha candidatura espontânea para, tal como lhes comuniquei na altura, “conseguir encontrar um estágio de verão na área dos sistemas de informação e informática, para desenvolver as minhas capacidades e ganhar experiência profissional”. Depois de duas entrevistas, concordamos num estágio para os meses de julho e agosto, de segunda a sexta-feira, das 9 às 17 horas, no departamento de investigação e desenvolvimento. Estava assim dado o primeiro passo para o que seria a minha mais importante experiência profissional. No geral, o ambiente de trabalho era fantástico, a sala era dividida com o departamento de operações e suporte e, todos os dias, eram, sem excepção, sempre bastante animados e divertidos. Para além disso, gosto sempre de referir as já enraizadas tradições como os aniversariantes que têm sempre de preparar um lanche e trazer bolo ou a Odisseia, o evento anual da empresa em que na parte da manhã se realizam um conjunto de apresentações, seguidas de um almoço e, durante a tarde, um momento exclusivo de convívio, por exemplo, em 2017, foi uma sessão de Laser Tag no Viva Park, em Guimarães. Apesar de tudo, nos primeiros tempos, é sempre complicado começar a trabalhar em projetos com outra dimensão, a um ritmo e rigor totalmente diferentes mas, felizmente, tive oportunidade de trabalhar com um grupo de 5 pessoas sempre disponíveis em me orientar, discutindo comigo métodos e ideias. Tudo fica realmente facilitado quando toda a gente se entreajuda e é capaz de apontar os erros que estamos a cometer e a sugerir outras opções. Obviamente, também uma das primeiras coisas que nos apercebemos durante os estágios, é a diferença entre trabalho e a universidade, quais as vantagens e a desvantagens de cada um deles em relação ao outro. Por exemplo, apesar de, pelo menos no meu estágio, se trabalhar imensas horas todos os dias, o que geralmente não acontece na universidade, e que se torna algo cansativo, principalmente quando não se está habituado a esse ritmo mais elevado. Há algo que realmente nos motiva a esse trabalho, algo que não se compreende nos projetos da universidade, o sentimento de trabalhar em prol de algo para ser usado em produção, algo que terá utilidade no mundo real, algo significativo.
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/curso/ Para além disso, uma das principais conclusões a que cheguei foi a diferença entre o “saber usar” e o “saber aprender”. Durante o estágio, foram-me dados alguns projetos, para serem desenvolvidos com recurso a ferramentas que não sabia usar ou que até nem conhecia e ninguém me ensinou como utilizá-las. Ao início, foi, sem dúvida, um pouco complicado começar a mostrar trabalho e avançar, mas a pouco e pouco, fui percebendo como me deveria orientar e trabalhar por mim mesmo, aprender a utilizar as ferramentas com recurso à sua documentação e exemplos. Hoje compreendo que esta foi a melhor lição que o estágio me deu, ser capaz de trabalhar autonomamente, não ter nenhum guião sobre como atingir o objetivo final, mas, com a minha aprendizagem, ser eu próprio a construir esse guião. Resta-me apenas aconselhar, todos que tenham disponibilidade para tal, a procurar e a fazer um estágio de verão, ganharão uma nova perspetiva do mercado de trabalho e do dia-a-dia numa empresa para além de aprender imenso sobre área, desde métodos a ferramentas de trabalho, que nunca conhecerão na universidade e demais instituições de ensino. As oportunidades, apesar de tudo, são muitas, veja-se os exemplos da Semana da Engenharia Informática ou das Jornadas de Informática, em que são as próprias empresas a vir à nossa procura, é nosso dever e nossa obrigação aproveitá-las.
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/curso/ Universidade - o Choque Escrito por Ana Almeida ana_almeida23 @outlook.com
Era uma vez uma pequena caloira que chegou a uma grande universidade sem saber (mesmo) o que a esperava. Parece assustador não é? Nem imaginam o quanto, ou se calhar até imaginam… Pois bem esta caloira decidiu juntar-se aos seus novos companheiros na luta diária que é a universidade, no curso que todos conhecemos como MiEI. Ao início as coisas até não estavam a correr mal, apresentações, palestras, poucas aulas e algo “leves”, conhecer pessoas novas, viver quase como um “mini-adulto”, quase como diriam os ingleses: “so far so good”. O problema é que eventualmente passaram as rosas e vieram os espinhos: as matérias a virem todas ao mesmo tempo, o trabalho a acumular, o primeiro contacto com programação (nunca te esqueceremos, amigo Haskell) e projetos em grupo, tantas, tantas, mas tantas coisas que não tenho página suficiente para enumerá-las… É muito difícil a adaptação: pensar constantemente em desistir do curso ou, até ir mais ao extremo, da universidade em si! Mas já diz a sabedoria popular “se não podes vencê-los, junta-te a eles!” Sim, passei por isto tudo (e ainda passo), mas também estou aqui para vos dizer que é passageiro. Confiem em mim, “primeiro estranha-se, depois entranha-se”. Neste momento, não me vejo a fazer outra coisa da minha vida! Mas certamente não teria aguentado este tempo todo sem a ajuda de vários amigos meus e, por isso, queria agradecer-lhes, por tudo (principalmente pela paciência em me explicar 500 vezes o que faz um void). Querem um conselho? Não se comparem aos outros, principalmente ao “melhor” aluno, é um erro que muitos cometem e contribui para a falta de ânimo. Há pessoas que podem entrar no ritmo mais rápido que nós e até parecer que percebem mais, mas também há outras que demoram mais a entender. O importante a reter é que não há melhores ou piores, há diferentes ritmos de trabalho e aprendizagem e cada um tem o seu. Todavia, não posso acabar sem uma mensagem, sei que o choque inicial é grande, mas deixo-vos esta receita: com 1 amigo ao vosso lado, 2 doses de força de vontade, 1 dose de otimismo e doses q.b. de trabalho em casa, o resultado só pode ser um: encontramo-nos na formatura!
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/pensamentos/ Informática e o Papel do Engenheiro Escrito por André Teixeira andre.f.teixeira @outlook.com
A informática mudou o mundo. Ninguém colocaria objeções a esta afirmação, mas poucos se apercebem de quão profundamente as tecnologias de computação a que nos temos vindo a habituar modificaram os pilares da sociedade. As pessoas relacionam-se de modo diferente, estando em constante estado de contacto e proximidade. Conversas não mais têm de parar, apenas se pausando aquando da troca de dispositivo. Locais de partilha e armazenamento de conhecimento são cada vez mais digitais, sendo cada vez menos aqueles que frequentam bibliotecas e investem em volumes físicos. Empregos intocáveis desabam sobre o peso imenso da automatização, surgindo, no entanto, novas carreiras baseadas na exploração das nossas crescentes necessidades de realização social. Trocamos perfis de redes sociais em vez de números de telefone, investigamos a vida e relações de quem nos interessar. Tomamos as nossas notícias de mil e uma fontes não verificadas, em vez do jornal da freguesia. Falamos com as nossas cozinhas enquanto estas fazem o jantar e vemos filmes recém-lançados no cinema sem sair do sofá. Planeamos leis para automóveis que andam sozinhos e discutimos impostos para robôs.Sim, o mundo mudou, e a mudança provocada pela informática é entusiasmante e assustadora, como mudar sempre foi. Cabe aos informáticos assegurar que com esta mudança de paradigma do funcionamento da sociedade não perdemos, no entanto, coisas valiosas. Cabe aos informáticos responsabilizar-se pelo sonho para o qual estudam e trabalham. Porém, nem sempre esta responsabilidade é vista como consequência natural do seu trabalho. Observo muitas vezes um certo nível de desconexão entre aqueles que procuram ocupações mais técnicas e aquilo que as suas criações influenciam. Muitos engenheiros, não apenas informáticos, acreditam que por se ocuparem da máquina, do desenvolvimento matemático e físico de sistemas e soluções, não têm de se ocupar com o fator humano da utilização das mesmas. Ora isto não pode ser. A noção de que o cientista e o artista, o humanista e o engenheiro são obrigatoriamente seres diferentes é uma ideia retrógrada a ser ativamente combatida. Nesta nova era da conexão entre tudo e todos não nos podemos dar ao luxo de permitir estas diferenças. O informático em particular encontra-se na posição única de ter de compreender na sua totalidade o problema que deseja resolver através da sua intervenção, permitindo que acumule conhecimento relativamente a inúmeras áreas que nada têm a ver com a sua, o que é simultaneamente um fardo e um privilégio. A ideia de que o matemático deve ser também filósofo vem já da antiguidade, mas foi deixada para trás por muitos na procura de especialização aprofundada nas suas áreas.
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/pensamentos/ Apesar de esta especialização ser valiosa até certo ponto não podemos deixar que o homem seja transformado na máquina que tanto se esforçou por criar, capaz de apenas pensar dentro de certos limites, de realizar um pequeno conjunto de tarefas com um alto nível de eficiência, de apreciar apenas um pequeno grupo de estímulos. Não. O engenheiro não é e não pode aspirar a ser um autómato. Deve possuir vasto conhecimento sobre o seu campo e muitos outros, deve interessar-se por cultura e literatura e música, deve ter intervenção cívica e ideais políticos, deve existir para além da sua função imediata de técnico. À medida que a tecnologia se entranha cada vez mais nas profundezas das nossas comunidades, aqueles que a mantêm e expandem devem fazer o mesmo, adotando o exemplo de grandes figuras da indústria e tomando o palco nos grandes debates dos nossos tempos. Há também que enfrentar o problema das relações e comunicação entre pessoas, assim como o do fascínio em excesso pela tecnologia. Os novos meios de comunicação maravilharam o mundo com a sua acessibilidade e eliminaram a noção de distância como impedimento ao contacto entre pessoas, e no entanto parecemos estar a tomar parte destes meios para nos desligarmos uns dos outros, criando distância mental onde antes existia distância física. As novas tecnologias de comunicação não devem servir para dividir as pessoas, para espalhar desinformação, para nos retirar a necessidade de sairmos e interagimos uns com os outros, mas para unificar e abrir horizontes. A rede permite que o café de discussão de outrora passe a ser aberto a todos, em todo o lado, abrindo novas e entusiasmantes possibilidades para discutir e conversar e nos relacionarmos, mas não podemos esquecer que esse mesmo café ainda existe e em valor. O equilíbrio entre o mundo virtual e o físico é necessário para que a nossa sociedade de moedas minadas computacionalmente não expluda numa bolha que todos ajudamos a criar. Tecnologia é uma ferramenta que o homem possui para melhorar a sua vivência e solucionar problemas que o apoquentam, não um fim em si próprio. Falhar em reconhecer os perigos do desenvolvimento tecnológico descontrolado e desregrado é aceitar o eventual aparecimento de uma realidade semelhante aos grandes épicos futuristas algo distópicos de Herbert e Asimov. Não estou com isto a dizer para negarmos as tecnologias, até porque tal não seria nem possível nem desejável, mas antes para as abraçarmos com a determinação necessária para enfrentar os problemas que estas levantam. É urgente discutir e legislar, de modo a prever impactos que revoluções em campos como transportes, energias e medicina possam ter nas nossas vidas. É nesta posição que o informático de hoje se encontra, na posição de quem tem o poder e o dever de ajudar a sociedade a melhorar-se através das maravilhas que ajudou a criar. O homem sempre quis emular Deus, e hoje estamos mais próximos do que nunca da nossa visão clássica da divindade, muito graças à engenharia. Mas não podemos esquecer que mesmo os deuses erram, que a caixa de Pandora está no canto da sala esperando ansiosamente por ser aberta, e que sem arte e poesia mesmo a engenharia não serve de muito. Temos finalmente todas as ferramentas para tornar o mundo um lugar de sonho, onde tempo e espaço são barreiras que pertencem a um passado distante. Resta apenas ousar saltar, e meter mãos à obra. 24
/pensamentos/ Mestres da Internet Escrito por Bruno Cancelinha Bruno.MS.Cancelinha @gmail.com
A concentração de poder em poucas empresas tem sido uma tendência há vários anos, mas talvez em mais nenhum lado esta moda seja tão severa como na Internet. Segundo o site Alexa, os três sites mais visitados globalmente são, por ordem decrescente, Google, YouTube e Facebook. Sendo que o YouTube pertence à Google, esta lista revela, certamente sem surpresas, que a Internet é, principalmente, a Google e o Facebook. A Web deixou de ser um mundo diverso e independente que outrora foi para agora ser controlada por dois grandes nomes, “Google” e “Facebook”. O principal modo de aceder à Internet deixou de ser o computador e passou a ser o smartphone. Sendo assim, faz sentido não só falar dos sites mais populares, mas também das aplicações mais populares. Segundo a SimilarWeb, as 9 apps da Play Store mais utilizadas em Portugal são, por ordem decrescente: Facebook; Messenger; Google; Google Chrome; Google Play Services; YouTube; WhatsApp; Instagram e Gmail. Destas 9 aplicações contam-se as mesmas duas empresas, Google e Facebook. Relembro que o Facebook comprou o Instagram em 2012 e o WhatsApp em 2014. Continuando no mercado dos smartphones, é importante reparar que não existe competição nos sistemas operativos móveis, estando os consumidores obrigados a escolherem entre duas grandes empresas, Google e Apple. Não há uma alternativa livre como acontece no caso dos computadores, onde é possível optar por sistemas open source como o Linux. A consolidação de empresas e os monopólios são agora tão comuns no mundo, que é tentador pensar nelas como algo trivial e irrelevante. Mas esta concentração de poder tem consequências reais na sociedade, especialmente quando se trata de controlo sobre os meios de comunicação que são tão facilmente utilizados como armas de propaganda e como forma e controlo social. Neste campo a Internet é vastamente superior aos meios de comunicação tradicionais. Em 2014, o Facebook admitiu conduzir uma experiência para alterar as emoções de alguns dos seus utilizadores sem o seu consentimento. 25
/pensamentos/ No decorrer da experiência, o Facebook dividiu alguns utilizadores aleatoriamente entre dois grupos, um dos grupos receberia mais posts positivos, enquanto o outro mais posts negativos, resultando no primeiro grupo publicar mais posts positivos que o segundo grupo. O estudo concluiu que foi possível alterar as emoções e comportamentos dos utilizadores, manipulando o feed. Isto provou publicamente o que é fácil de teorizar, o poder controlador que esta plataforma tem sobre as emoções e pensamentos daqueles que a utilizam. Não só consegue controlar as emoções e pensamentos, mas também o acesso à informação. É cada vez mais comum receber notícias pelo Facebook, mesmo que seja seguindo páginas de jornais respeitáveis, o que deixa o Facebook numa posição de controlo sobre o que aparece, ou não, nos “feeds de notícias”. A Google também partilha esta posição de controlo, a qual até já foi usada para tentar destruir competição. Em 2015 começou a censurar resultados para um serviço de e-mail concorrente, o ProtonMail, que oferece um serviço de e-mail encriptado. Esta ação da Google resultou, segundo o ProtonMail, numa redução de 25% da sua taxa de crescimento mundial ao longo de 10 meses. Isto, novamente, revela os perigos de um poder centralizado numa só entidade e a forma como esse poder é regularmente utilizado em prol de qualquer agenda que essas instituições estão a tentar avançar. Não esqueçamos também qual é o negócio principal destas empresas, a recolha massiva de informação para venda a anunciantes, e esta aglomeração só pode ajudar nesse sentido. Com este monopólio sobre as nossa vidas, é fácil para estas organizações observarem o nosso comportamento em vários contextos. Temos visto iniciativas por parte da União Europeia para tentar controlar a maneira abusiva como a Google tem usado o seu poder, é preciso haver mais ações deste género de vários governos. Mas o poder dos governos é limitado, e a única real maneira de quebrar monopólios é apoiar alternativas. Existem tentativas de criar redes sociais mais descentralizadas que não obrigam os utilizadores a pertencerem todos ao mesmo serviço para comunicar. Estas plataformas funcionam como o e-mail, e dão ao utilizador a liberdade de escolher o serviço que quiser usar. São o caso do Mastodon e da Federação. Existem também inúmeras alternativas aos serviços da Google, mas é necessário haver uma alternativa fiável ao sistema operativo Android. É urgente haver mais consciência acerca do facto de a Internet e a Realidade estarem cada vez mais interligadas, e como esta concentração de poder está a reduzir a nossa liberdade nesses dois mundos. É necessário haver uma maior ação para contrariar esta moda. 26
/pensamentos/ Cultura Escrito por João Vilaça
machadovilaca @gmail.com
A cultura, pouco a pouco, tem vindo a cair no esquecimento dos portugueses. Cada vez eles leem menos, vão menos ao cinema, visitam menos galerias, museus e outros espaços culturais. Uma possível causa para a diminuição destes números poderá ser a evolução tecnológica e a crescente facilidade que temos de acesso a estes conteúdos, cada vez mais temos o mundo nos nossos dispositivos e neles podemos fazer quase tudo. No entanto, Portugal está nos últimos lugares da Europa no que diz respeito à taxa de participação em atividades culturais, terão de haver então outras causas para a diminuição do interesse na cultura por parte do povo lusitano. A verdade é que nesta área Portugal reúne todas as condições para que isto aconteça. Comparativamente aos restantes países europeu, o investimento em“recreação, cultura e religião” sempre foi muito baixo, segundo dados do Eurostat, em 2015, Portugal apenas investiu 0,8% do PIB nesta área, o que se traduz em cerca de 130€ euros anuais por habitante, sendo a média da União Europeia, 299 euros. Aliado a este facto, a grave crise financeira de 2008 que teve grandes consequências socioeconómicas em Portugal, veio apenas contribuir negativamente para este investimento público na cultura mas, também, para a capacidade das famílias poderem gastar dinheiro nesta área. Ainda assim, tal como referido anteriormente, existem outros modos de poder usufruir da cultura, através dos meios digitais, muito museus e galerias têm já versões digitais das suas peças, a maioria dos obras de cinema estão disponíveis online e também existem diversas versões digitais de livros e obras poéticas. Apesar de tudo estar disponível, os portugueses não fazem uso da maioria destes serviços, com exceção apenas dos filmes e séries de televisão. A verdade é que passam a maioria do seu tempo nas redes sociais. Este é um grave problema social em Portugal que urge ser resolvido, a cultura é um dos mais importantes motores para o desenvolvimento da sociedade, quer em termos de criatividade, quer da capacidade de diálogo, de discutir ideias e opiniões.A cultura representa a evolução do ser humano, todas as suas façanhas e méritos mas também todos os seus erros. A cultura é das mais importantes fontes de conhecimento e desenvolvimento do ser humano daí a sua importância e a necessidade de ser preservada.
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/pensamentos/ A Diabólica Moeda de 1 Cêntimo Escrito por José Nuno Macedo ze_nuno_eu @hotmail.com
Desde miúdo, sempre fiquei intrigado com a minha coleção cada vez maior de moedas de 1 cêntimo. Amontoavam-se os desprezíveis trocos no fundo da minha carteira assim como se amontoavam as dúvidas na minha mente quando me surgiu, qual ser iluminado, uma ideia de em que conspiração estávamos todos envolvidos: os preços eram definidos assim para obrigar à circulação dos trocos, das moedas pequenas, e não vivermos num mundo só com moedas de 50 cêntimos, 1 ou 2 euros. Na altura, a ideia pareceu-me fazer sentido, mas anos de experiência de vida levaram-me a repensar esta e muitas das minhas outras crenças, e ainda me acontece frequentemente de evoluir enquanto criatura pensante, uma revelação de cada vez. Agora, quanto ao problema das moedas de 1 cêntimo, este só o estudei a fundo recentemente. De facto, consegui conjurar a resposta certa quando repensei o problema, mas depois o tio Google explicou-me o resto que eu nunca teria visão para entender. Obviamente, não, o senhor Vítor do mercado da esquina não está preocupado com que os preços terminem por .99 cêntimos para fazer as moedas circular. O senhor Vítor não está preocupado com garantir a circulação da moeda, ele só quer é que as pessoas lhe comprem os produtos, e obrigá-las a procurar os trocos no fundo da carteira para pagar não é propriamente uma ideia que atraia clientes. Na verdade, uma pequena procura por “Psychological pricing” na única fonte de informação correta do mundo, a Wikipédia, revela que um um produto à venda por 1.99€ tende a ser visto como um produto com um preço de “1 euro e tal” em vez de “2 euros”, efetivamente parecendo mais barato do que realmente é. Claro, isto é tudo uma teoria, mas com muito estudo por trás a comprovar que a coisa funciona, para nos levar a nós, os consumidores, a ver preços mais baratos dos que os há. Eu podia elaborar muito mais no contexto do “psychological pricing”, mas há tanto a dizer que o leitor ficaria entediado antes de conseguir ler tudo. Em vez disso, falemos agora daqueles momentos em que acompanhamos outras pessoas nas suas visitas às lojas, não porque temos interesse, mas porque o mundo conspira para que tal aconteça. E o que é que a tia Maria adora? Descontos! Leve 3 e pague 2, compre uma mesa e leve uma cadeira grátis, 70% de desconto exclusivo neste fim de semana! Compre, compre já que a oferta é limitada! Nunca fui apreciador de descontos, e cada vez mais percebo porquê, bastou mentalmente trocar a palavra “desconto” por “vigarice”. Pensem bem, porque é que haveria o senhor Vítor de querer, só durante este fim de semana, ser bastante simpático para com todos os clientes? Se ele está a fazer desconto, ou é aldrabão ou caridoso, e eu nunca o vi a dar dinheiro aos pobres.
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/pensamentos/ De facto, produtos consumíveis costumam entrar em desconto perto do fim do prazo de validade. Stocks limitados raramente são assim tão limitados, mas criam a ilusão de que se não comprar agora, o consumidor está a perder algo. Alguns descontos podem ser uma aldrabice: em vez do senhor Vítor, baixar o preço de 10€, simplesmente escreve 15€ ao lado e mete um traço encima. Assim, parece que houve uma redução de 5€ quando na verdade ficou igual, mas ninguém andou a decorar os preços para poder realmente saber se é um desconto a sério ou só aldrabice. Na verdade, há descontos 100% legítimos, que até podem trazer prejuízo ao comerciante, mas eles servem como isco, para trazer o cliente para a loja, e lá dentro ele vai ter de percorrer a loja inteira para pegar no produto em desconto, e pelo caminho repara que realmente precisa de comprar a comida de gato e os cereais para o miúdo. Reparem que os bens mais procurados geralmente estão longe da entrada da loja, para obrigar as pessoas a passar por todas as aliciantes ofertas de quinquilharia inútil que há pelo caminho. Enfim, este é um tópico que não tem fim. A lição nisto tudo é que se deve pensar bem no que estamos a comprar e no porquê de algumas ofertas aliciantes que encontramos por aí. Se parece uma teoria de conspiração, é porque de facto o é: uma conspiração em que o consumidor é o alvo. Mas como há estas, há muitas outras, e para nos prevenirmos, haja senso comum!
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/pensamentos/ Bitcoin Escrito por Catarina Machado catarinamachado11 @gmail.com
A Bitcoin é a mais famosa criptomoeda da atualidade. Esta moeda virtual foi criada em 2008 pelo programador Satoshi Nakamoto (pseudónimo), com o intuito de revolucionar as negociações online. O objetivo final é que consigamos efetuar, de forma muito mais simples e rápida, qualquer compra online, desde jogos, livros ou até servidores virtuais, transferências de dinheiro interpessoais, entre outros. Este processo funciona, em síntese, de uma forma até bastante simples de entender, as transações financeiras são verificadas por todas as máquinas da rede Bitcoin, e posteriormente gravadas num banco de dados distribuído chamado “blockchain”, uma lista pública onde as transações ficam registadas. Além disso, o próprio código da Bitcoin é open source e pode ser consultado por qualquer pessoa em https://github. com/bitcoin/bitcoin. A primeira transação no mundo real foi a compra de duas pizzas, a dia 22 de maio de 2010. Laszlo Hanyec postou num fórum de discussão sobre bitcoin um pedido para comprar duas pizzas, e em troca pagaria 10.000 bitcoins. A compra efetivamente sucedeu-se quando outro utilizador aceitou a proposta. Atualmente, essas duas pizzas valeriam cerca de 159 milhões de euros. Esse dia ficou conhecido como o “Bitcoin Pizza Day” e há até um twitter com esse nome onde todos os dias é feita uma publicação com o valor atual das pizzas. Mas qual é então a vantagem da utilização desta moeda? O Bitcoin tem várias características que a diferenciam relativamente ao dinheiro que utilizamos no nosso dia-a- -dia, sendo que, para alguns, certas peculiaridades são interpretadas como aliciantes vantagens enquanto que, para outros, representam problemas. O sistema permite ao utilizador ter carteira virtual, que funciona como uma conta bancária comum, em que podemos consultar o saldo facilmente, mas, ao contrário desta, é totalmente anónima, ou seja, não há requisitos para a criar e pode ser usada em qualquer país. 30
/pensamentos/ As transações entre as carteiras virtuais são muito convenientes pois são instantâneas, não tem custo associado, e não podem ser anuladas. O valor da moeda em si obedece às leis de procura e oferta de mercado, sendo portanto extremamente volátil, e bastante aliciante a investidores. Existem, no entanto, muitos hackers e invasores que tentam burlar o próprio sistema Bitcoin para roubar moedas aos outros utilizadores. Porém, isso é cada vez mais difícil de acontecer. Devido à forte adesão de utilizadores e de maneira a garantir a fiabilidade do mesmo, os níveis de segurança são bastante elevados. E talvez a mais importante característica é que não existe uma autoridade central ou instituição financeira que controle a moeda e as transações - é uma rede descentralizada o que dificulta a sua regulamentação e a sua legalidade. Assim, a circulação de Bitcoins é livre e nada nem ninguém é capaz de controlar ou seguir as suas pisadas. Como as transações não são controladas, a sua utilização torna-se muito apelativa no que diz respeito ao mercado negro e também a pedidos de resgate de hackers. Nunca ninguém esperou que esta moeda completamente digital fosse fazer tanto sucesso e passasse a ser um bem cobiçado pela maioria, nem o seu próprio criador. Tendo em atenção os números, isto é, a cotação da moeda, denotamos que, aquando da sua criação (2008), um bitcoin valia menos de 0,0001€. No final de 2011, tinha o valor de 3,70€, em 2013, valia cerca de 150€ e, em 2015, chegou aos 364€. No final de 2016, atingiu os 813€ e, em 2017, teve um crescimento exponencial valendo, a 22 de dezembro, 10901.13€. Posto isto, conseguimos ter uma melhor noção do quanto esta moeda se encontra “em alta” no mercado. Há inclusive pessoas que a veem como uma forma de investimento devido à valorização exorbitante que se tem vindo a verificar de dia para dia e há quem pondere até fazer empréstimos. No entanto, temos que ter em consideração que, de um momento para o outro, o seu valor pode cair exatamente na mesma proporção. Hoje em dia, existe até uma empresa japonesa que dá a opção aos funcionários de receber o salário, ou parte do mesmo, em bitcoins. Outra curiosidade é que se sabe que alguém possui 900 mil bitcoins, cerca de 10 mil milhões de euros, especulando-se que seja o seu próprio criador. Não sabendo ainda se o futuro passará pela utilização deste tipo de moeda virtual, a verdade é que a mesma vai se tornando cada vez mais popular. Contudo, um facto realmente incontornável é que cada vez mais os pagamentos do nosso dia-adia são efetuados de forma “digital” (seja utilizando cartões de débito ou crédito, PayPal, QR code, telemóvel, entre outros meios), sem recurso efetivo a dinheiro “físico”. Deste modo, acredito que, num futuro muito mais próximo do que o que imaginamos, a realidade será mesmo essa - cada vez menos “papel” a circular. E tudo isto é devido ao facto, obviamente, de nos encontrarmos na era digital.
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/pensamentos/ Como espiar os espiões Escrito por Eduardo Jorge herulume @protonmail.com
Vivemos numa época onde o xadrez mundial passou a ter uma nova dinâmica. Geopolítica, relações históricas, guerras económicas, fazem todas parte do passado. Introduz-se então, o factor digital. Cada vez mais presente no nosso quotidiano, cada vez mais assumindo um papel fulcral na estrutura da sociedade, seria impensável para certos governos ignorar uma área tão crítica e tão vasta. Malware (software malicioso) tem sido uma constante que afeta utilizadores comuns da Internet. Normalmente, este utilizadores são apenas danos colaterais, visto o alvo das campanhas de malware serem empresas, ou até mesmo indivíduos, de alta importância. Aparentemente de difícil atribuição, estas campanhas de malware abrem assim as portas para um novo tipo de guerra. Stuxnet, Duqu, Flame, APT 28, The Dukes, Equation Group, já ouviram falar? Os 3 primeiros nomes são malware da mesma família (partilham grande parte do código/métodos), os últimos 3 são nomes de vários grupos, patrocinados por governos, que orquestram estas campanhas. Para conseguirmos relacionar uma operação destas, com os responsáveis, temos que entender como funciona a sua infraestrutura digital. De forma a controlar os computadores infetados precisamos de, pelo menos, um servidor normalmente chamado de C2 (abreviatura de Command and Control) e é o ponto em que nos vamos focar para espiar o espiões. Tal como qualquer servidor é bastante provável que este contenha elementos únicos e portanto passíveis de serem monitorizados. É necessário obter uma amostra do malware em questão. Este passo é mais simples do que parece visto haver uma comunidade muito ativa e várias empresas publicam relatórios de análise a malware regularmente, com amostras. De seguida, ou tentase fazer reverse engineering estática (processo no qual se analisa o comportamento do malware através do código em assembly) ou corre-se o malware numa máquina virtual analisando o tráfego de rede do mesmo. Encontra-se assim um (ou com sorte, vários) servidor C2. Tendo o endereço IP do servidor é altura de o estudar a fundo. Analisar os portos abertos, as respostas dadas pelo servidor a um pedido inválido, ver se existe algum web banner único. Nesta fase o importante é encontrar algo único (ou quase) e entender como o servidor se comporta. Após termos encontrado esse algo é procurar pela Internet por mais servidores iguais “if it looks like a duck, quacks like a duck, swims like a duck, it must be a duck”.
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/pensamentos/
Tem um padrão estranho na URL? Cria-se um google dork (filtro para pesquisa no google) para utilizar o Google a nosso favor.Tem um serviço a correr num port estranho? Utiliza-se o masscan (software utilizado para fazer scan a servidores) para procurar por toda a Internet servidores com o mesmo comportamento. Web banner único? Procura-se no Shodan (motor de busca de computadores ligado a internet, suporta vários filtros) e se quisermos ter a certeza que apanhamos todos, masscan outra vez. Agora, o próximo passo seria fazer experiências com os servidores deles, mas isso não é legal. De facto, contra-atacar os nossos atacantes é, estranhamente, algo pelo qual podemos ser castigados. Neste ponto, o melhor rumo de ação seria documentar o que descobrimos até agora e expor para toda a Internet. Com alguma sorte seria possível relacionar com outras campanhas associados a algum governo, chegamos então a um checkmate.
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/pensamentos/ Tráfico de Almas Escrito por Bruno Cancelinha Bruno.MS.Cancelinha @gmail.com
Quando, em 1989, Tim Berners-Lee inventou a internet, ninguém sabia no que ela se poderia tornar. Ao longo dos anos 90, foram surgindo websites em nada como os de hoje, despidos de CSS, desprovidos de anúncios, e repletos com gifs de pouca qualidade. Era o começo de uma nova era: uma de informação livre, onde a voz de todos era ouvida por igual. Foi, para muitos, uma utopia social. O primeiro motor de busca foi o Yahoo!, em 1994, que prontamente precisou de financiamento e investidores. Introduziu anúncios, aposta arriscada numa altura em que a internet ainda estava a formar a sua identidade, mas a aposta valeu a pena: o negócio cresceu rapidamente à custa de publicidade intrusiva, pop-ups com jogos, prémios, apostas, e tudo mais. É nesta altura que a internet se transforma: começam a esquecer-se os seus ideais fundadores, de partilha de conhecimento e comunicação humana, para se tornar num portal de entretenimento, como um gigante parque de diversões alimentado por publicidade. Foi neste contexto que, em 1998, apareceu a Google com a promessa que ia manter um site limpo, focado na pesquisa, e livre de anúncios intrusivos. Durante dois anos a empresa foi sustentada apenas por investidores privados; depois desse período, começaram a colocar links patrocinados no topo dos resultados de pesquisa. Mas na génese da estratégia sempre esteve a suposição de que aquilo que procuramos num motor de busca é indicativo dos nossos interesses pessoais. Com o avanço tecnológico dos anos seguintes, esta ideia alimentou uma indústria enorme baseada na recolha de dados pessoais. Hoje em dia, através de algoritmos especializados, são construídos perfis de interesses, que se adaptam a cada indivíduo; e, no centro deste cartel de almas, estão empresas como a Google e o Facebook. O PREÇO OCULTO Hoje em dia, quase tudo na internet é gratuito. Praticamente toda a gente está no Facebook e usa os serviços da Google. Todos estes serviços são inteiramente gratuitos e vêm de empresas jovens e simpáticas. Empresas que existem com a missão de “aproximar todo o mundo” e de nos ajudar a conhecer pessoas novas e a criar amizades. Mas quem paga por estes serviços? Como é possível que a Google e a Facebook, empresas tão grandes e poderosas, ofereçam de livre vontade o seu produto? Para responder a esta pergunta, temos de abandonar a ideia de que o Facebook é uma plataforma de comunicação para juntar amigos e partilhar conteúdos. O propósito do Facebook é recolher toda a informação de todos os indivíduos - os seus interesses, as suas conexões pessoais, os seus desejos mais secretos - e distribuir publicidade projetada para melhor atingir o utilizador com base nesses interesses. Toda a plataforma é desenhada de maneira a nos viciar a consumir o eterno 34
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feed mesmo quando não estamos completamente atentos; quando estamos só a matar tempo ou, melhor dizendo, quando queremos propositadamente desviar a nossa atenção e não pensar em certos assuntos. É aí, nesses momentos zombie, que o Facebook nos encontra mais vulneráveis e manipula a nossa experiência digital. Desta maneira, o Facebook vende o produto: o produto somos nós, a nossa atenção e a nossa informação. A Google segue os mesmos princípios, todos os seus serviços são idealizados para recolher informações acerca dos utilizadores que deles usufruem. Estas empresas não recolhem informação apenas nos seus próprios serviços, muitas vezes perseguem-nos pela internet e registam todos os sites que visitamos. Desta forma, constroem um perfil com os nossos interesses mais profundos, para depois vender esta informação a outras empresas ou entregá-la a governos. Estes são os chamados trackers que vivem na maior parte das páginas web e se disfarçam de botões de partilha e de “like”. Não é necessário clicar no botão “like”, por exemplo, para o Facebook saber que visitamos aquele website, e pouco importa se estamos a navegar em modo “incógnito” ou se limpamos os cookies e o nosso histórico. Mesmo não tendo uma conta, o Facebook cria um perfil do utilizador, recolhendo já os seus interesses para que, quando chegar ao dia de se juntar à grande rede social, possa já ser bombardeado com publicidade à qual está mais vulnerável. 35
/pensamentos/ O VALOR DA INFORMAÇÃO Vendo tudo isto a acontecer, é natural perguntarmo-nos o que podemos fazer. Há quem apele por mais transparência por parte destas empresas. Seguindo esta ideia, a Google tem até várias páginas dedicadas à informação que tem sobre nós, recomendo a toda a gente que visite myactivity.google.com, google.com/maps/ timeline e adssettings.google.com. A Google revela alguma informação que tem sobre nós, mas não revela com que entidades partilha esta informação. Além disso, ter mais transparência não implica ações concretas para limitar esta recolha massiva, apenas que esta deva ser divulgada. O próprio funcionamento destes serviços recai na colheita de informações e na sua posterior venda; o problema fundamental é que este negócio sujo é o sangue vital destas empresas, sem ele não podem operar. Em suma, podemos pedir mais transparência, mas o problema mantém-se. Existe também quem sugira que devia ser o governo a proteger os seus cidadãos destes negócios. Esta sugestão assenta na noção de que os governos existem para proteger os seus cidadãos, algo que pode ser contestado, especialmente depois das revelações de Edward Snowden em 2013, que expõem a forma como o governo americano - mais especificamente a NSA (Agência Nacional de Segurança) - força essas empresas a entregar todas as informações que têm acerca dos utilizadores. As mesmas revelações mostram ainda como o governo americano colabora com outros governos mundiais, incluindo o governo português, na partilha e recolha de informação. Em 2017 é aprovada uma lei no parlamento que garante um “especial acesso a dados de telecomunicações e Internet” de todos os portugueses, às secretas portuguesas como a SIS e a SIED. Estes dados podem incluir, por exemplo, uma lista de todos os sites acedidos por qualquer português, novamente, não importa que este limpe o histórico ou navegue em modo “incógnito”.
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/pensamentos/ Estas ações são sempre tomadas em nome da “defesa nacional”. Mas defesa de quê? Quem é que o estado está a defender ao vigiar massivamente e indiscriminadamente todos os seus cidadãos? Estas ações parecem servir apenas para defender o estado da sua população, algo que um bom governo não deveria temer. A vigilância em massa por parte dos vários governos mundiais mostra como o interesse nas informações pessoais é bem maior que puramente comercial. CONCLUSÔES Depois de revelado todo este enredo, penso que seja compreensível porque decidi chamar a este artigo “tráfico de almas”, as “almas” referem-se à nossa informação, que é vendida incontroladamente a entidades que nos são completamente alheias. Não devíamos estar a tolerar isto. Em relação aos trackers, pequenos pedaços de software que nos perseguem pelos sites, podemos simplesmente bloqueá-los com extensões para browsers como o Disconnect e o PrivacyBadger. No entanto, em relação aos serviços que são desenhados especificamente para recolher a nossa informação falo de serviços como o Facebook, Instagram, WhatsApp, Google, YouTube, Twitter, entre outros - devemos ter mão firme, e não nos deixar tornar nos seus súbditos. No seu ensaio publicado em 1849 intitulado Desobediência Civil, Henry David Thoreau critica aqueles que, vendo os problemas na sua sociedade, “ficam sentados, de mãos nos bolsos, e dizem não saber o que fazer, e nada fazem”. Embora a realidade de Thoreau seja bastante diferente da nossa realidade do século XXI, as suas críticas continuam a ser relevantes. Devemos lembrar-nos que, sempre que usamos estes serviços, estamos a patrocinar ferramentas usadas para nos explorar. Se não concordamos com os termos de serviço nem com as políticas de privacidade (textos escritos propositadamente para que ninguém os leia), a única maneira de proteger a nossa privacidade é sair desses sistemas. Mas, fundamentalmente, temos de confrontar a degradação de que a Internet tem vindo a sofrer e lutar para ter uma Internet livre e igual. Uma Internet para todos e que respeita os nossos direitos e liberdades. Uma Internet que não seja controlada pelos interesses económicos das grandes empresas e os seus exércitos propagandistas, isto é, a indústria publicitária, nem pelos governos mundiais. Uma Internet onde a partilha de informação e conhecimento é realmente livre e independente.
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/sátira/ Alguém que dê a Trump o Nobel da Paz Escrito por André Teixeira andre.f.teixeira @outlook.com
Ontem, em comunicação acidental ao Correio da Manhã, um cavalheiro com poucos dentes que estava a passar na Rua de Barros declarou que Donald Trump era o favorito na corrida para o prémio Nobel da Paz deste ano. Esta notícia causou furor nas duas pessoas que por acaso ouviram as declarações, nomeadamente eu e um pobre coitado que trabalha no pasquim matinal. Sendo esta uma fonte muito mais credível do que o CM costuma ter, a veracidade das suas afirmações estava para lá de dúvida. Porém, antes de colocarmos a face amarelada de Trump nas nossas estantes ao lado de Buda e Ghandi é importante analisarmos as suas contribuições para a paz mundial. Não é como se os nossos amigos nórdicos escolhessem os vencedores destes prémios segundo uma série de regras absurdas e sem qualquer nexo lógico. Se assim fosse ouviríamos histórias de músicos a ganhar prémios de literatura, ou políticos a acumular medalhas douradas por prometerem coisas bonitas. Toda a gente sabe que apenas mérito ganha prémios Nobel, não necessidade de projeção mediática ou amizades subversivas. Portanto, que fez Trump para ganhar esta honra? Para começar, creio que podemos afirmar sem margem para dúvida que graças a este maravilhoso primata conseguimos hoje em dia fazer uma diferenciação muito melhor entre nós e eles. A composição de ambos estes grupos é irrelevante, sendo que o importante é que exista uma divisão binária óbvia que nos permita valorizar muito mais o que nos separa daquilo que nos une. Sempre soube que os amantes de kizomba eram malignos, e agora posso partilhar esta minha crença com o mundo certo de que em breve manifestações para que estes sejam expulsos do país irão proliferar como cogumelos venenosos.
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/sátira/ E podemos aplicar esta divisão da sociedade a virtualmente tudo, tomando como base genitália, palidez corporal, gosto culinário, coordenadas geográficas aquando do momento de saída do útero materno, opinião sobre o governo do Passos Coelho, cor preferida, etc. Uma ferramenta de discórdia ideal. Trump também atacou um dos pilares do conservadorismo, a família clássica. Não quero com isto dizer que contribuiu para a normalização de relações do mesmo sexo ou questões de género, isso iria contra grande parte do seu eleitorado e contra os seus apoiantes sexualmente reprimidos dentro do Partido Republicano. Não, Trump teve a coragem de finalmente tornar aceitável a apreciação de relações incestuosas, a compra de esposas em países eslavos, os casos extraconjugais com estrelas pornográficas e a traição à pátria em troca de fetiches envolvendo urina. Este desafio à ordem estabelecida é certamente revolucionário, assim como o é a sua política interna relativa à educação, que apenas pode melhorar se todos os professores possuírem espingardas automáticas para finalmente se defenderem e calarem os putos.
A sua posição face à imprensa, que é obviamente falsa e controlada pelos interesses liberais, deu origem à diminuição da credibilidade dos grandes agentes noticiosos e ao aumento da importância dos pequenos conspiradores neofascistas, tão esquecidos nas últimas décadas. Já a sua utilização das novas tecnologias é sem inovadora no facto de que nenhum presidente anterior havia utilizado o Twitter para perseguir ativistas, ameaçar outras nações com guerra nuclear e estabelecer relações de amizade com rappers. A palavra inovação estará para sempre emparelhada com o nome Donald.
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/sátira/ Já na política externa o seu brilhantismo ultrapassa-nos a todos, especialmente aos especialistas em política externa e relações internacionais, cuja experiência e anos de trabalho diplomático não permitem apreciar as heterodoxas medidas americanas. A sua saída do acordo de Paris foi emblemática, demonstrando verdadeira independência face aos interesses de outras nações e de todos os seres humanos necessitados de oxigénio para manter funções vitais. A sua aposta no carvão limpo demostra extrema capacidade de projeção futura já que levará a uma injeção de vitalidade na economia americana, que precisará de muitas mais lavandarias porque aquilo mancha muito, quer na roupa quer na atmosfera. Logo aqui se vê a criação de empregos prometida aos eleitores. No que toca à eliminação de guerras, o chefe de estado americano conseguiu trazer os norte-coreanos para a mesa de discussão após ameaçar durante meses iniciar um apocalipse nuclear, num desafio calculado pelo seu desejo de paz e de provar que o seu botão vermelho é maior do que o de Kim. Apesar de não ser apenas uma questão de tamanho Trump tem também o maior coração da américa do norte, dando finalmente aos iranianos a hipótese de investirem em armamento nuclear após anos de triste desnuclearização. E mais ninguém fez uma contribuição maior do que Trump para a criação de uma Europa unida, finalmente liberta da ideia de que estaria protegida pelos americanos. Sem esta rede de segurança nós europeus apenas podemos unir-nos e militarizarnos, já que senão somos invadidos pelos russos enquanto os americanos ficam a ver. O grandioso guru laranja possui relações de amizade com todos os líderes europeus de qualquer modo, portanto Mácron continuaria a fazer-lhe visitas mesmo que a NATO vá à vida. Visitas necessárias para manter o seu estado de espírito alegre e pacifista, face aos desafios do médio oriente e à recusa de Melania em lhe dar a mão. Enfim, após tão aprofundada análise apenas posso perguntar-me porque é que nunca lhe deram o prémio antes. Espero honestamente que as ambições deste grande homem não sejam destruídas por alguém com bom senso, já que todos dormiríamos mais felizes e descansados sabendo que DonaldTrump ficaria na história como alguém com qualquer tipo de contribuição positiva para a humanidade, em vez de simplesmente um borrão de descafeinado na história da política americana. Apenas o tempo dirá se tudo isto foi profecia ou se o cavalheiro que anunciou isto estava drogado. Podemos felizmente contar com o Correio da Manhã para nos avisar caso esta vitória ocorra. Agora basta irmos verificando à vez, já que ler aquilo todos os dias é cruel demais para uma só pessoa.
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/sátira/ Ano em Pesquisa Escrito por Tiago Carvalhais tiago.carvalhais.1995 @gmail.com
O relatório “Ano em Pesquisa” da Google, que indica o ranking das tendências de pesquisa neste motor de busca, revelou que Salvador Sobral foi quem liderou as preferências de procura em 2017. Recorde-se que o cantor comemorou o centenário das aparições de Nossa Senhora de Fátima ao vencer o Festival Eurovisão da Canção 2017 (também conhecido como o Festival Internacional de Circo de Monte Carlo 2.0), concurso que este ano decorreu em Kiev, na Ucrânia, e onde países europeus, como Austrália ou Israel, tentam impressionar uma audiência de cerca 200 milhões de pessoas e um conjunto de indivíduos que se autointitulam de “pessoas que até percebem de música”. Salvador Sobral venceu o concurso com a pontuação record de 758 pontos e deu a Portugal a primeira vitória em 53 anos de participações, o que nos retirou o estatuto de “País que participa há mais tempo sem qualquer vitória”, passando esse título para Chipre. Muitos parabéns, cipriotas! Certo é que este triunfo fez com que portugueses de várias gerações se sentissem emocionados, mesmo com muita gente ainda a pensar que o festival já tinha terminado há uns 20 anos, como os Jogos sem Fronteiras… Para quem há uns anos disse que “Portugal não é a Grécia”, esta vitória veio provar o contrário, uma vez que os gregos já haviam vencido o festival em 2005, numa edição realizada precisamente na capital ucraniana, um ano após vencerem o Europeu de Futebol, ao derrotarem na final o país anfitrião… Portugal. Certo é que, 12 anos depois, o nosso país repetiu a façanha, no ano seguinte à vitória do Europeu, onde derrotou na final, também o anfitrião… França. Os franceses, de resto, já estão a preparar a organização do Festival Eurovisão em 2030, após vencerem a edição de 2029, realizada em Kiev. Bom trabalho, França! Por cá, a vitória de Salvador traduz-se em algo inevitável: Portugal tem de organizar a 276ª edição do festival, em 2018! Mas, como em tudo na vida, isso traz custos. Convém relembrar que, em 2012, o Azerbaijão gastou mais de 56 milhões de euros em galões de petróleo. Já a Suécia, em 2016, com o seu famoso rigor financeiro, gastou apenas cerca de 14 milhões de euros em utensílios do IKEA. Como nós não temos poder sobre o IKEA, nem temos (ainda) petróleo, temos de pagar o festival com cortiça, pastéis de nata e vinho do Porto. Ora, por esse motivo, um dos diretores da RTP já confirmou que este será um “festival low-cost, mas elegante”.
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/sátira/ O local escolhido para sediar o evento foi a Altice Arena (antigo MEO Arena, Pavilhão Atlântico e Pavilhão da Utopia), no Parque das Nações, em Lisboa. Contudo, esta era apenas a segunda opção, visto que a escolha da RTP recaiu inicialmente no Pavilhão dos Bombeiros Voluntários de Curral de Moinas, mas como a estação de televisão mais tarde descobriu que se trata de um local imaginário, tiveram de se contentar com a Altice Arena… Certo é que a primeira rodada de venda de bilhetes para a final do festival, marcada para o dia 12 de maio de 2018, voou em poucos minutos. A apresentação do concurso já está entregue e, para espanto de todos, o apresentador do Preço Certo, Fernando Mendes, não foi escolhido, isto porque ele reclamou 75% dos pastéis de nata disponíveis no orçamento para aceitar o cargo de apresentador, algo que a RTP não aceitou. Uma pena, pois havia condições para um evento de grande escala! Tiago Carvalhais escreve este texto em 2017, numa versão mista e portanto mais democrática do acordo ortográfico.
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/cultura/ Ryo Fukui e Osamu Kitajima Escrito por
José Nuno Macedo ze_nuno_eu @hotmail.com
Nos momentos em que desejo ouvir algo mas não sei o quê, o YouTube é a plataforma que eu uso para fazer descobertas. Visitar recomendação após recomendação é a chave para encontrar várias pérolas que, de outra forma, nunca me iria lembrar de encontrar. E suspeito que não seja a única pessoa a fazer isso - muita gente reconhece o nome Mariya Takeuchi por causa deste sistema semi-funcional de recomendações... mas isso é outra história. Destas minhas aventuras, quero passar ao leitor as minhas duas melhores descobertas. Vamos começar com Ryo Fukui, um pianista Japonês que infelizmente faleceu há dois anos atrás. Segundo a fonte de informação mais genuína ao nosso dispor, a Wikipedia, Ryo Fukui começou a aprender piano por si só aos 22 anos, e uns míseros seis anos depois, lançou Scenery, que é a minha primeira recomendação. Este é um álbum que mistura um piano, um baixo e uma bateria, e chega e sobra bem para se produzir uma peça da arte incrível. Destaco a versão deste artista da música “Autumn Leaves”, nome que talvez soe familiar, já que há versões de Frank Sinatra, Eric Clapton, Edith Piaf, Bob Dylan, Chet Baker, Miles Davis, enfim, muito artistas de renome. A mestria do senhor Ryo no piano é incrível, pelo menos para um asno musical como eu, e fiquei completamente mesmerizado com este álbum. O resto dos álbuns dele também são interessantes, mas considero este o seu melhor. O outro nome que vos trago é Osamu Kitajima. Quando nos perguntamos de que género falamos aqui, a Wikipédia graceja-nos com Electronic (electronic rock), instrumental, newage, rock (progressive rock, psychedelic rock), world (traditional), e eu fico na mesma. Deste podemos não gostar de um álbum, e ouvir o próximo e gostar, pois não são necessariamente do mesmo género. Talvez um fio condutor entre estes seja instrumentos clássicos japoneses, como o shamisen, ou talvez a insanidade de Osamu seja o fio condutor, o facto é que a música deste homem tem um charme que nunca encontrei em mais lado nenhum. Recomendo, por esta ordem, ouvir o Benzaiten, Masterless Samurai e o Dragon King, os três incríveis. Benzaiten foi o primeiro álbum publicado por este artista sob o seu nome, em 1974. Citando a Wikipedia, que curiosamente dispõe alguma informação contraditória nas versões portuguesa e inglesa da página, “O lado instrumental de música eletrônica do álbum é rico em melodias e se constitui como uma mistura de rock progressivo e música tradicional Japonesa.” Se tivesse de caracterizar os outros dois, Masterless Samurai é mais agressivo e Dragon King é mais funky. Para relaxar há também o The Source, que difere dos outros pois é muito mais calmo, e menos energético. Se os outros são fúria e intensidade, este é reflexão e descanso. Fico-me por aqui em termos de música, embora fique sempre com vontade de deambular mais pelos abismos musicais. E para isto não ser completamente unilateral, encorajo-vos, prezados leitores, a devolverem um e-mail com recomendações musicais interessantes para eu explorar. Obrigado pelo minuto de atenção, e que tenham uma boa aventura musical! 43
/cultura/ David Foster Wallace - Infinite Jest Escrito por
Alexandre Pinto alex.mpj44 @gmail.com
Não me recordo da primeira vez que ouvi falar de Infinite Jest, o titânico e hermético livro publicado no final do sec. XX - não foi assim há tanto tempo, 1996 - nos Estados Unidos da América. São cerca de mil páginas em letra miúda, que a edição original da Little, Brown and Company reúne num objeto grosseiramente adequado à leitura casual; na sua capa, uma fotografia de belos exemplares de nuvens que contrastam o azul do céu e lhe conferem uma aparência sóbria e digna; a sua natureza e propósito são parte stock photo, parte meditação existencial. Infinite Jest - ou A Piada Infinita, com uma excelente tradução e edição no nosso português pela Quetzal - desdobra-se em significados a que alude o seu título: uma história irónica e levemente humorística, cíclica e enciclopédica, em mordaz comentário à estranha América dos nineties. O seu autor, David Foster Wallace, é recordado pelo estilo cínico e estranhamente cerebral, capaz de um distanciamento descritivo notável. Pois bem, a sua carreira edificou-se não no registo de romance mas no domínio do ensaio, onde, desse período, há textos que se emanciparam da restante obra, por exemplo, um que escreveu sobre o apelo estético do jogo de Roger Federer (o ténis era uma das obsessões do autor), ou até o famosíssimo discurso na universidade americana Kenyon College, This is Water, dirigido aos alunos que graduaram no ano de 2005: uma miríade de conselhos para uma vida melhor, sob a forma de parábolas e hipotéticas situações quotidianas, inserida no contexto socioeconómico americano. Neste discurso, entretanto editado num formato de livro de bolso, a reflexão começa em torno da conversa entre dois peixes: “como está a água?”, pergunta um a seu amigo. A pergunta assalta-o, pela sua estranheza, e prontamente é desbloqueada uma torrencial linha de pensamento sobre uma necessária consciência para tudo o que constitui a nossa vida imediata, passada agora entre centros comerciais, urgências temporais, e experiências que são profundamente alienantes em relação à nossa natureza humana. Todas estas preocupações estão resumidas num excerto do texto que sintetiza várias dimensões da preocupação fosteriana: 44
/cultura/ “None of this is about morality, or religion, or dogma, or big fancy questions of life after death. The capital-T Truth is about life before death. It is about making it to thirty, or maybe fifty, without wanting to shoot yourself in the head. It is about simple awareness — awareness of what is so real and essential, so hidden in plain sight all around us, that we have to keep reminding ourselves, over and over: “This is water, this is water.”” É a conclusão de uma amálgama de considerações estranhamente prescientes do geist do presente século, pese embora todas as pistas dadas por uma modernização tecnológica da qual Foster Wallace foi testemunha: sentiu o poder hipnótico e voyeurístico da televisão (uma atração que entretanto se transladou para as redes sociais); foi a tempo de viver a internet - embora não a internet na qual essa primeira se transformou; e estudou, com desconfiança e distanciamento, a necessidade de apaziguamento consumista da cultura ocidental. Acima de tudo, identificou com perspicácia o tédio moderno, e a indústria do entretenimento como um vício nefasto para o suprimir. Aquando do seu lançamento, Infinite Jest prontamente caiu no goto dos seus tempos e foi assimilado tanto pela crítica como pelo seu público. Os boards da internet elevaram-no a um estatuto de objeto mitológico, e foi amplamente dissecado, relido e discutido à luz de uma tradição literária carregada por Thomas Pynchon e pelo irlandês James Joyce. É certo que a obra adopta alguns traços do pós-modernismo literário — como sejam a abstração de uma temporalidade linear, ou a multiplicidade de pontos de vista narrativos e informação concatenada — mas é na própria estrutura que reside a sua mais proeminente característica, porventura uma influência da embriónica internet: a exagerada (e frequentemente frustrante) hipertextualidade, cuja função é unir uma miríade de ideias justapostas sem necessária linearidade consequencial, e que remete num qualquer dado momento para vários outros pontos da obra.
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/cultura/ Neste exercício de abundante produção literária, Foster Wallace chegou a ideias especialmente prescientes e reveladoras tanto da natureza humana que lhe era contemporânea, como de uma natural evolução que se deu nos últimos anos. A dada altura na obra, descreve com pormenor um sistema de videochamada recentemente implementado neste universo; a tecnologia e hábitos da sua utilização chegam-nos narrados na sua característica prosa coloquial; e escalando lenta e assertivamente o nível de absurdidade - embora, para nós infelizmente, ainda distante da inverosimilhança -, relata de que forma o sistema evoluiu e e seguidamente implodiu, munido da força analítica e meticulosa que lhe conhecíamos dos seus ensaios. Descreveu, em 1996, toda a influência da obsessão com a nossa representação digital, a propagação de avatares, a crescente alienação da imagem do eu. Esta é uma obra, como disse, perpassada por ironia e cinismo, como se todas as vidas fossem representadas sob a sombra de uma latente melancolia existencial. Neste universo, declaradamente distópico e absurdo, habita um rol de personagens densas e tridimensionais, grande parte delas dependente de algo e virtualmente todas a braços com as vicissitudes da vida contemporânea. A sociedade do consumo e do entretenimento é palco de fundo para Hal Incandenza, um adolescente exímio no ténis mas viciado em erva; para Don Gately, um intimidante ex-criminoso entretanto frequentador dos Alcoólicos Anónimos; para Joelle Van Dyne, uma jovem radialista cuja face é tão impressionante que a cobre de um véu opaco para que nunca lha possam ver. Aqui, os Estados Unidos já não existem — toda a América do Norte passa a ser uma enorme federação —, os anos deixam de se contar pela ordem gregoriana porque são agora patrocinados por grandes empresas, e há um diabólico grupo terrorista, de pretensões separatistas em relação ao Quebéc e a mencionada federação, que aterroriza a ordem geopolítica e planeia alienar toda a população americana com uma mortalmente eficaz forma de entretenimento: um vídeo tão absurdamente cativante que retém ad aeternum a atenção de quem o vê — uma megalómana maquinação à qual Infinite Jest, no fundo, não é totalmente alheia. Mas há ainda um aspeto relevante para explicar uma relativa perenidade da obra, e das ideias do seu autor, nos cânones literários: a relação formal com as correntes que o precedem, das quais assinalo especialmente o pós-modernismo, um género de escrita largamente característico do século XX e do qual podemos tomar como exemplo Slaughterhouse Five, de Vonnegut, ou Catch-22, de Joseph Heller (que comungam na representação da guerra). Foster Wallace identificou o sentimento irónico que perpassa grande parte desta produção literária, e que sustenta o distanciamento quanto às (frequentemente absurdas) agruras da vida; mais ainda, apontou a nossa dependência da ironia como forma de lidar com a vida. Num seu ensaio de 1993, “E Unibus Pluram: Television and U.S. Fiction”, escreveu: “The next real literary “rebels” in this country might well emerge as some weird bunch of anti-rebels, born oglers who dare somehow to back away from ironic watching, […] who treat of plain old untrendy human troubles and emotions in U.S. life with reverence and conviction. Who eschew self-consciousness and hip fatigue.”
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/cultura/ É à luz desta ideia que podemos reconsiderar a sua obra: o eu fragmentado, existencialmente fatigado, amplamente explorado na literatura pós-moderna como desajustado do sentido da vida, existe em Infinite Jest não como um indivíduo repartido e desagregado, mas como um conjunto de individualidades validadas por si só, especiais e únicas, singularmente afirmadas e enredadas numa imperfeita tapeçaria humana. O distanciamento emocional dá lugar a uma arrebatadora sinceridade. Foster Wallace preconizou, então, um possível futuro para a arte que reflete e reage em função de um paradigma existencial que se alterou nas últimas décadas. Vivemos mais depressa, e mais deslocados. Consumimos e deixamo-nos consumir. Reagimos com distância emocional, e rodeamo-nos de muletas significantes que nos auxiliam e toldam a perceção e interação com o mundo (o vaporwave, por exemplo, permitiu-nos chegar a termos com a experiência consumista em massa; os memes envolvem-nos em meta-referências que nos recordam, a todo o momento, da transversalidade das ideias cibernéticas; as redes sociais permitemnos, finalmente, controlar a percepção exterior de nós próprios). Recuperamos This is Water, e é evidente a pouca ortodoxia e o pessimismo latente do discurso do autor aos recém-graduados; há a sempre presente preocupação não com a forma de viver a vida, mas como suportar a vida. O fardo da consciência é um dado inescapável; cabe-nos a nós saber lidar com as suas imposições. E é assim que, neste caminho alternativo a Infinite Jest, damos de caras com esta espécie de tragédia da consciência moderna - uma à qual, em última instância, Foster Wallace renunciou.
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/cultura/ Game Awards Escrito por Tiago Carvalhais tiago.carvalhais.1995 @gmail.com
Decorreu no passado dia 7 de dezembro, a 4ª edição dos The Game Awards, cerimónia que se encarregou de premiar aquilo que melhor se fez durante o ano, no mundo dos videojogos. A gala decorreu no Microsoft Theater, em Los Angeles, facto que não impediu que uma das grandes concorrentes da companhia que lançou a Xbox e o tão aclamado Internet Explorer fosse a grande vencedora da noite. Falo da Nintendo, que viu o seu “menino”, The Legend of Zelda: Breath of the Wild arrecadar três galardões: Jogo do Ano, Melhor Direção e Melhor Jogo de Ação/Aventura. De resto, o jogo já havia recolhido um sem número de elogios desde que foi lançado, em março de 2017, obtendo um dos maiores scores agregados de sempre, 97/100 no Metacritic, para a Nintendo Switch. Outro título desta consola, Super Mario Odyssey, também foi um dos destaques da noite, ao ser nomeado para seis categorias, vencendo apenas o título de Melhor Jogo Familiar. Aliás, o nosso canalizador de confiança não se pode queixar de falta de apreço, pois a sua aliança com os Rabbids, em Mario + Rabbids Kingdom Battle, valeu à consola e à Ubisoft o galardão de Melhor Jogo de Estratégia. A noite também não correu nada mal para a StudioMDHR, que viu Cuphead vencer três das cinco categorias para as quais estava nomeado: Melhor Direção de Arte, Melhor Jogo Independente e Melhor Estreia de Jogo Indie. Parece que o sentimento nostálgico em relação aos cartoons da Disney dos anos 30 pesou na decisão… Com o mesmo número de vitórias e nomeações, esteve Hellblade: Senua’s Sacrifice, da Ninja Theory, que foi premiado com os galardões de Melhor Design Áudio, Jogos para Impacto e Melhor Performance, ganho por Melina Juergens, como Senua, a personagem principal do jogo. 48
/cultura/ Também a Blizzard Entertainment viu o Jogo do Ano 2016, Overwatch, arrecadar os prémios de Melhor Jogo eSports e Melhor Jogo Ongoing. Contudo, a grande derrotada da noite acabou por ser a Guerrilla Games, com o seu Horizon Zero Dawn, que estava nomeado para seis categorias, incluindo Jogo do Ano, acabando por obter um total de zero estatuetas. Apesar de todos os esforços de Aloy para salvar o mundo da ameaça de HADES, parece que isso não foi suficiente para evitar que os seus criadores fossem para casa de mãos a abanar. Mas, apesar de tudo, a Guerrilla Games só tem motivos para celebrar o ano de 2017, pois viu a sua fraca reputação ser esfumada com os fortes elogios a Horizon Zero Dawn, nomeadamente na beleza gráfica e do argumento. Convém notar que, sendo um jogo de mundo aberto, com um mapa vasto, possuir uns gráficos deste calibre não é para todos e a boa avaliação agregada no Metacritic, de 89/100, comprova isso mesmo. Do lado dos fãs, a escolha do Jogo Mais Antecipado recaiu em The Last of Us Part II, da Naughty Dog. A continuação da aclamada aventura de Joel e Ellie parece estar a aguçar o apetite dos jogadores. Convém relembrar que, aquando do seu lançamento, em junho de 2013, The Last of Us obteve um score agregado de 95/100 no Metacritic, o que contribuiu para um fecho com chave de ouro da geração anterior das consolas. O jogo ainda não tem data de lançamento, mas muitos esperam que esta seja ainda em 2018. Certo é que o segundo trailer saiu a 30 de outubro de 2017, na Paris Games Week, o que poderá ser um indício de que teremos fumo branco para muito breve… Cá aguardamos, com expectativa!
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/cultura/ CAUM, para além da música Escrito por Márcia Teixeira filipa.teixeira98 @gmail.com
O Coro Académico da Universidade do Minho, criado em 1989, assumiu-se desde o primeiro momento como grupo cultural de referência pelas variadíssimas iniciativas realizadas no contexto da academia. Desde então, como convidado ou como anfitrião, sempre tem primado por não deixar ninguém indiferente à sua presença, interpretações e realizações. A paixão pelo canto e pela música é um aspeto que perpassa todos os elementos do grupo à qual acresce uma forte atitude proativa perante causas sociais de que, em colaboração com outros Grupos Culturais, resultam invariavelmente iniciativas e festivais que, mais do que fomentar a partilha de objetivos e união de esforços entre os participantes, deslumbram pelas coreografias e desempenhos, deixando de coração cheio todos quantos assistem ao espetáculo. Dando um especial toque musical a cada momento partilhado, o CAUM é muito mais do que um Coro Académico, é, para cada um dos seus elementos, um símbolo de união e uma acolhedora zona de conforto. É também um porto de abrigo para todos quantos com o grupo partilham, e conjuntamente constroem, momentos sempre especiais. A música, porque frequentemente subestimada no dia-a-dia de muitos de nós, nem sempre contribui, como poderia, para que a vida tenha a cor e o brilho da felicidade. A música faz falta, para alguns em pequenas doses e em momentos específicos, para outros em grandes quantidades e sempre que possível.
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O Coro Académico da Universidade do Minho atende a essas necessidades, com o bónus de dar a oportunidade para a criação de laços entre pessoas que, de outro modo, nunca teriam ocasião de descobrir gostos comuns, pessoas que provavelmente continuariam a cruzar-se na rua e, comungando da mesma paixão sem o saberem, seguiram caminhos separados. O Coro, tal como sempre tem sido, é uma segunda casa para todos aqueles que decidem aderir, é um lar acolhedor onde há sempre uma brincadeira a fazer, uma aventura nova a seguir, uma descoberta a efetuar, mas acima de tudo, uma música para cantar e sentir. Cada momento é um momento perfeito para cantar… Para quem tem amor à música, cada momento é o momento perfeito para ser feliz, num lugar que não é físico, numa casa imaterial, num lar que se alonga e alarga em cada um dos mais de sessenta corações que compõem este grupo Cultural que não para de crescer. Para quem gosta de música, para quem acha que falta aquele pedacinho de musicalidade na repetitiva rotina do dia-a-dia, para quem quer abrir horizontes, o Coro é o lugar perfeito para encontrar um pouco de todas estas coisas, e muito mais. O Coro Académico é muito mais que música, muito mais que um traje com o brasão no braço esquerdo. São dezenas de corações… num coração só.
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/internacional/ Mãe, estou no Japão! Escrito por José Nuno Macedo ze_nuno_eu @hotmail.com
Desde já há vários anos que sinto uma atração enorme pela cultura japonesa. Sempre quis visitar os recantos mais obscuros da electric town, Akihabara, perderme nas ruas movimentadíssimas de Shinjuku, visitar os belos templos de Kyoto, relaxar nas termas de Hakone, enfim, muita coisa que não passava de um sonho. O prato de ramen ocasional ainda se encontra em Portugal e, com isso, me fui contentando enquanto pensava: “Quando eu inevitavelmente for o próximo Elon Musk, talvez um pouco menos insano, vou viajar até ao Japão e vingar todos estes meus sonhos.” Por isso, quando o meu orientador sugeriu a mim e a um colega que havia uma oportunidade de ir fazer um internship em Tokyo, a minha primeira reação foi ligar a minha poker face e concentrar-me ao máximo para agir normalmente. Lá consegui responder de maneira normal que estava bastante interessado e achava que era uma excelente oportunidade para mim. Vários meses depois, ainda nem acreditava bem no que se tinha passado, já a burocracia toda arrumada, já as malas feitas a acompanharem-me no aeroporto. Chegados a Tokyo, éramos dois pacóvios portugueses, atirados no meio de um aeroporto enorme, cheio de gente a correr de um lado para o outro, sem dados móveis, e com dificuldades a ligarmo-nos à rede do aeroporto. As linhas de metro em Tokyo são extremamente eficientes, mas confusas. Após um pedido de ajuda a um funcionário do aeroporto, entramos numas das linhas e chegamos a Nihombashi, creio, talvez tenha sido Kayabacho, eu não estava a carburar 100% na altura. Sabíamos que a nossa casa era em Kayabacho e tínhamos uma imagem de mapa, mas mesmo assim demoramos 1 hora e vários pedidos de ajuda até
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/internacional/ um polícia conseguir demorar 5 minutos a consultar um outro mapa e nos indicar o sítio. Chegamos a casa, entramos no nosso quarto e adormecemos, completamente exaustos desta viagem enorme para um mundo tão desconhecido. Os próximos dias passaram a uma velocidade alucinante. Descobrimos que a estação de Kayabacho, a mais próxima da nossa casa, tem 12 saídas, e por isso andamos meios perdidos nos primeiros dias. Todas as estações têm várias saídas, descobrimos nós no dia seguinte, ao chegar a Takebashi e não sabermos em qual sair. No entanto, rapidamente nos encaixamos no esquema japonês de andar nas ruas, que é, encostados ao lado esquerdo, quase como se a rua fosse uma estrada. Assim ninguém colide com ninguém, salvo os turistas que andam completamente perdidos e não alinham no esquema. Encontramos o National Institute of Informatics, com 4 meses de trabalho pela frente com o nosso orientador de estágio, um professor chinês. Conversas futuras revelaram-me que alguns dos orientadores de outros meus colegas são menos simpáticos, alguns mais exigentes e outros mais desinteressados. Muita coisa é muito diferente, a mais óbvia é a escrita, há 3 alfabetos: o hiragana, o katakana e o kanji. Aprendi o hiragana e o katakana (muita dificuldade para aprender a distinguir シ, ツ, ソ e ン, que se pronunciam, respetivamente, shi, tsu, so e n), e falta-me o kanji. O hiragana são cerca de 50 caracteres usados nas construções mais simples, o katakana tem os mesmos sons que hiragana e portanto são também cerca de 50, mas são usados para estrangeirismos, e o kanji passa de 2000 caracteres diferentes, é adaptado do alfabeto chinês, e é usado para tudo o resto. Só sei um par de kanji mas interessa-me aprender mais. Há sempre coisas engraçadas a descobrir todos os dias, por exemplo, uma maneira japonesa de dizer mel (honey em inglês), é ハニー, que se pronuncia “ha-ni-ii”, ou seja, é praticamente a palavra inglesa mas com pronúncia japonesa. Restaurante (restaurant em inglês) é レストラン, que se pronuncia “re-su-to-ra-n”. Há mil e uma palavras que são muito semelhantes ao inglês, ao ponto que numa altura em que precisávamos de dizer de onde éramos, eu disse “Portugal” com pronúncia inglesa e não entenderam, mas quando o meu colega disse “Porutugaru” com pronúncia japonesa, já perceberam.
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/internacional/ Os restaurantes são bem diferentes - não sei se sou eu que sou atraído por esse tipo de sítios ou se eles simplesmente abundam, mas a maioria dos sítios com preços razoáveis são muito pequenos e mais caseiros em vários aspetos. Entra-se, e o staff cumprimenta-nos com “イラッシャイマセ”, que se pronuncia “irasshaimase”, algo do género “bem-vindo”. Quando se sai, vão dizer “ありがと ご ざいました”, que se pronuncia “arigato gozaimashita” e é basicamente um “muito obrigado”. A bebida é água ou chá, dependendo do sítio, não há refrigerantes às refeições. Tens sempre uma jarra com água ou chá para re-encher o copo, assim como um stock de molhos, palitos e chopsticks, conforme a necessidade. As maneiras à mesa são um pouco diferentes, ainda não percebi bem, mas creio que tirando um pequeno grupo de ações rudes, podes fazer o que quiseres que ninguém leva a mal. É muito comum ouvir-se gente a chupar a massa, coisa que me recompensava com um sermão quando era miúdo mas é perfeitamente normal no Japão. As ações rudes incluem falar demasiado alto ou imitar gestos que se fazem em funerais com os chopsticks, portanto é mesmo o básico do senso comum. Outra diferença óbvia são supermercados no Japão e em Portugal. No Japão existe um ou outro supermercado disperso e depois existem lojas de conveniência, às dezenas, lojas mais pequenas que vendem só os essenciais, são mais caras e estão abertas 24 horas por dia. Outra coisa que não se encontra em Portugal é o bento, uma refeição completa numa embalagem de plástico, vendem-se em supermercados, lojas de conveniência e até nas farmácias (onde também se vendem sumos e snacks). Numa cidade tão conhecida por as pessoas ocuparem demasiado tempo com trabalho, comprar uma refeição completa, pronta a comer, com chopsticks e tudo incluído, não é uma coisa estranha.
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/internacional/ Há gente que os compra por preguiça, há quem os compre por não ter tempo para ir comer a um sítio decente ou a casa e há gente que os compra para levar para piqueniques ou afins, seja qual for a motivação, por volta das 13h, já se foram a maioria deles das prateleiras. A maioria das pessoas opta pelos transportes públicos, e passam metros de 5 em 5 minutos em Kayabacho e 2 em 2 minutos em Shinjuku. Eu sigo na linha Tozai, aonde entro em Kayabacho, passo por Nihombashi, Otemachi e saio em Takebashi. A viagem de metro é sempre interessante, pois vê-se homens e mulheres, jovens ou idosos, a jogar jogos de telemóvel, a ler livros ou manga, ou simplesmente encostados a dormir. Li algures que a estação de Shinjuku é a mais movimentada do mundo. Nesta há um conjunto de lojas e corredores tão grande que envergonha qualquer centro comercial em Portugal, o que é absurdo para uma estação de metro. Shinjuku em si, enquanto sítio, também é muito interessante. As poucas ruas pelas quais passei estavam pontuadas por lojas de tudo e mais alguma coisa mas principalmente roupa, sítios para comer, e vários ocais de pachinko e karaoke. Estes últimos são grandes nomes em termos de entretenimento. O karaoke é simples, pago à hora, para estar numa sala onde existe um microfone e música para cantar, geralmente uma atividade de grupo. Pede-se alguma comida para a sala e passa-se uma excelente tarde a berrar ao microfone com os amigos. O pachinko é a maneira que as pessoas arranjaram para contornar as leis anti-apostas. Em vez de apostarem dinheiro, compram bolas de metal com dinheiro, apostam bolas de metal, que depois podem trocar por dinheiro. O sítio mais estranho do Japão é, sem dúvida, a famosa electric town, Ahikabara. Todos os amantes de tecnologias, anime, jogos e coisas nessa onda tem a obrigação de visitar, e vão ficar apaixonados por qualquer loja que encontrem. Logo à beira da estação encontra-se a Shosen Book Tower, que tem 9 pisos de livros para todos os gostos e feitios. Mais um par de passos e encontra-se um McDonalds, um Burger King e um maid café. Um maid café é um café onde as empregadas seguem o estilo das empregadas domésticas victorianas inglesas, e os visitantes do café são os seus chefes. Isto só se encontra em Akihabara, claro, e é uma das coisas pela qual esta zona é bem conhecida, porque este tipo de cafés estão em todo o lado. Basta passar dez minutos a passear pelas ruas que se encontra alguém vestido assim a distribuir panfletos. Também há outros tipos de cafés, como os cafés de gatos, em que há gatos por todo o lado e se pode brincar com eles, mas também de outros animais como corujas ou ouriços-cacheiros. Há posters e música de anime em todo o lado. Nas ruas principais abundam as lojas de material de anime, desde posters a porta-chaves e figuras de personagens, passando por tudo e mais alguma coisa que se consiga imaginar e, terei de admitir, que não resisti a fazer uma ou outra aquisição nas lojas mais baratas. Lojas de material deste género mas também de livros em segunda mão também as há muitas, sempre com multidões de gente a passar por corredores apertadíssimos.
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/internacional/ Sítios belos a visitar não faltam, e eu pude assistir ao florescer das árvores sakura, em que as árvores ficam absolutamente belas e é bem pensado passar horas a passear pelos sítios onde estas mais as há. Fomos num passeio com os meus colegas do laboratório e adorei a experiência de conhecer os parques cor-de-rosa com pétalas a voar à minha volta. Tirei algumas fotografias mas não sou um perito na área e não é como se as fotografias pudessem substituir a experiência. Deixo apenas a recomendação de procurar fotografias online, que se encontram facilmente e são bastante agradáveis. No meio disto tudo, tenho trabalhado a um bom ritmo no que vim fazer para aqui, mas falar de trabalho é aborrecido. Resta-me apenas desejar um bom dia a todos os leitores, e convidar-vos a ir visitar o belo país que é o Japão!
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