Editorial
A revista log/CeSIUM não é mais nem menos do que uma revista direcionada a qualquer tipo de leitor, ao contrário do que se possa imaginar. Efetivamente, apesar de esta revista ser escrita por futuros Engenheiros Informáticos, não se foca apenas nessa componente. Na verdade, foca-se em opiniões, descobertas e saberes dos mesmos acerca dos mais variados assuntos. Esta revista nasceu com o intuito de consistir num retrato intemporal do trabalho do CeSIUM, assim como numa mostra do estado da arte da tecnologia, sem descurar de um espaço para a partilha de opiniões da nossa comunidade e, portanto, esta edição não será exceção. Beatriz Rocha
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Diretora Beatriz Rocha
Design Gráfico Maria Pires
Capa e Contracapa Luis Araújo
Colaboradores Jéssica Lemos Miguel Brandão Nelson Estevão Filipe Felício Leonardo Freitas Tiago Soares Catarina Machado Marco Pereira Sofia Santos Carlos Ferreira Rui Armada Ana Sofia Gomes Matilde Bravo Vitor Lelis
Merch by CeSIUM
/ATIVIDADES/ 19 22 23 25 27
SEI’21 Dezembro Solidário CoderDojo Braga em 2021 Periférico Clubes 2021
/CURSO/ 28 29 30
EQUIPA LOG
Martinho Aragão Adelino Costa Francisco Neves
Regresso à normalidade O associativismo A história de Prometeu
/PENSAMENTOS/ 32 34 36
Representatividade nos media 2022 The Year of Linux Gaming O Mundo em 3D
/CULTURA/ 38 40
Memórias do subterrâneo Fantastic Mr. Fox
/LIFESTYLE/ 41 43
A dieta cetogénica (Keto) Desporto na Universidade
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Escrito por Beatriz Rocha
beatrizfr.rocha@yahoo.com
Recentemente, tivemos a oportunidade de entrevistar três pessoas que tiveram um percurso notório no seio do CeSIUM e que, cordialmente, aceitaram responder às nossas questões: Martinho Aragão - antigo Presidente do CeSIUM e atual Chief Product Officer na empresa UTrust Adelino Costa - antigo Vice-Presidente do CeSIUM e atual Software Engineer na empresa Remote - e Francisco Neves - antigo Diretor do Departamento Pedagógico do CeSIUM e atual Team Leader e Product Manager na empresa Nutrium.
Enquanto núcleo de estudantes, procuramos divulgar diferentes perspetivas não só do curso e do núcleo, mas também da realidade empresarial e industrial a todos os nossos leitores. Neste sentido, convidámo-los, enquanto figuras de destaque no centro de estudantes e no contexto de empresas da área da informática, a divulgar as suas experiências e o seu percurso profissional. Com esta entrevista pretendemos, ainda, expor como é que três pessoas da mesma área podem seguir percursos tão distintos.
Sempre soubeste que querias seguir um percurso na área da informática? A resposta é não. Não nasci e Engenharia Informática era o destino. Ainda por cima, na altura, toda a gente tratava aquilo por LEI, então, durante muito tempo, eu achava que se tratava de direito e essa parte eu não queria. Quando era miúdo quis ser polícia e outras coisas do género. Queria ser polícia, porque queria ganhar o dinheiro das multas. Eu sabia que muita gente estacionava mal, então ia ficar rico facilmente. Mas depois, na idade de tomar a decisão, segui um critério (que não é o mais adequado) que consistiu em colocar Engenharia Informática numa gaveta, porque eu já passava demasiado tempo no computador, logo não queria também ter de passar a minha vida profissional em frente a um computador. Para além disso, (como toda a gente em informática) não sabia de facto o que era informática. Sabia que tinha a ver com computadores, mas até pensava que ia aprender a montar um computador e não é bem assim que as coisas funcionam. Portanto, tomei a decisão de colocar aquilo num buraco e pensei “este não rejeito, mas não quero”, então estive quase a ir para Bioengenharia no Porto. Depois, quando fui inteligente e percebi que não gostava de estudar Biologia, mas que em Matemática era muito bom, comecei a mudar de ideias e a primeira opção acabou por ser Engenharia Informática na Universidade do Minho e a segunda opção esse curso (mas obviamente que ia entrar no primeiro, visto que o segundo tinha uma média substancialmente mais alta). Mesmo no 12.º ano, não tirei nada técnico. Escolhi Biologia e Química como opcionais que eram as opções mais importantes para o curso de Bioengenharia, nem sequer pus Física na altura. Isto também veio tudo do facto de o meu pai me ter impingido duas áreas. A minha mãe só queria que eu escolhesse Medicina, mas o meu pai não. O meu pai deu-me duas opções: informática ou cozinha. Ele não sabe cozinhar e eu também não sabia, mas o conceito de que os chefs portugueses são muito requisitados por toda a parte do mundo foi o que lhe deu razão em termos de empregabilidade. De facto, se tu estudares para ser cozinheiro ou chef, consegues ter emprego em qualquer lado. Mas essa parte eu não queria, nunca fui fã de cozinha e não queria ser chef de cozinha. Ainda assim, apesar de ele me ter dito isso, eu tomei a decisão de colocar Engenharia Informática numa gaveta, porque não queria na altura.
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Durante o teu percurso académico, exerceste vários cargos a nível de associações estudantis na Universidade, passando por Presidente do CeSIUM e Vice-Presidente do Departamento de Saídas Profissionais e Empreendedorismo na Associação Académica. Foi acessível conciliar todos estes projetos com os estudos? Quais são as estratégias? Não foi fácil, de todo. Para começar, a questão de ser Presidente do CeSIUM e Vice-Presidente da AAUMinho foi só no final, portanto, houve uma jornada substancial até essa altura. Se pensarmos em termos cronológicos, no 1.º semestre do 1.º ano entrei na Young Minho Enterprise e, a partir de meio desse semestre, tudo era mais interessante do que algumas disciplinas do curso e havia sempre coisas urgentes a responder nos canais de comunicação enquanto as aulas estavam a decorrer. Logo aí, houve uma diferença substancial em termos da minha atenção não a todo o curso em si, porque a parte de programação e informática adorava, mas em relação às aulas teóricas. Todos sabemos que as aulas teóricas não são sempre as mais apelativas, portanto, a partir desse semestre, comecei a descuidar-me um bocado relativamente às aulas que era algo que eu nunca tinha feito antes, porque antes quase não precisava de estudar, na medida em que prestava muita atenção às mesmas. No 2.º ano, atingi o limite, porque foi o ano em que eu estava envolvido em demasiados projetos. Tinha entrado na Nutrium, ainda era Vice-Presidente da YME, tinha entrado no CeSIUM, portanto, estava demasiado sobrecarregado e chegou uma altura em que eu tive de tomar uma decisão: ou continuava com esses projetos ou dizia que não. E eu pensei para mim “Se eu continuar nestes projetos, é bastante provável que as minhas responsabilidades neles subam, mas eu não posso deixar o curso ficar para trás, porque eu gosto do mesmo”. Para além disso, o 3.º ano de Engenharia Informática é o ano mais difícil, mais complexo, com mais projetos a decorrer em simultâneo, em que geralmente as pessoas decidem criar um grupo onde cada um se dedica a uma determinada disciplina. Então, tomei a decisão de sair do Nutrium, de sair da YME e de me focar em informática. A base desta decisão foi o facto de eu já não ter muito tempo para estudar e não me conseguir dedicar a 100% a estes projetos, porque o tempo que eu poderia estar a dedicar à Nutrium (que era uma empresa que estava a ser lançada) também teria de ser dividido pelos estudos, pelo CeSIUM e pela YME, o que não seria fazível. Ainda para mais, no ano seguinte, as minhas responsabilidades poderiam aumentar: se calhar seria Presidente da YME, se calhar no CeSIUM iria subir de cargo (possivelmente para Diretor do CAOS) e a própria Nutrium iria aumentar em termos de trabalho e de escala, visto que os outros fundadores iriam passar a trabalhar a tempo inteiro. Portanto, como disse, no terceiro ano deixei a YME e a Nutrium para trás e decidi focar-me apenas em informática, sendo que passei a Diretor do CAOS, onde pude aprofundar mais os meus conhecimentos na área da informática (uma vez que o CAOS é o departamento encarregue de tratar das plataformas e dos sites), o que me permitiu fazer um terceiro ano em condições. Depois, no quarto ano, passei a ser Presidente do CeSIUM e voltei novamente a descuidar-me nos estudos, porque se tratava de um cargo de enorme importância e responsabilidade. O contexto geral é que, de facto, não foi fácil conciliar. Tive de fazer uma aprendizagem, tive de dizer “não” pelo caminho e, mesmo assim, quando estava no quarto ano, fui afetado por isso. Obviamente mais por organização de tempo e porque é muito mais fácil, para mim, dedicar-me a coisas que são urgentes do que estudar de antemão. Por último, no 5.º ano, foi o único ano em que assumi dois cargos de grande importância: o meu segundo mandato como Presidente do CeSIUM e o cargo de Vice-Presidente da AAUMinho, que começou em janeiro. Na prática, no CeSIUM, de janeiro até maio, trata-se de um período de preparação da próxima geração. A partir de maio já não se faz praticamente nada, o que significa que, a partir de janeiro, o meu foco principal foi a AAUMinho.
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Claro que isto foi uma conciliação ponderada e decidida em conjunto com a restante direção do CeSIUM, porque se trata de uma questão de gerir prioridades e nós não conseguimos estar ao mesmo tempo em 3 sítios diferentes.
De entre os vários projetos que integraste, quais foram os que mais contribuíram para uma melhor experiência no mundo do trabalho e de que forma? Essa pergunta é complicada, porque, para mim, foi tudo. Eu acho que foi tudo uma experiência profissional, foi tudo um progresso e foi tudo uma vantagem à sua maneira. Por exemplo, eu não posso dizer que a Associação Académica tenha sido o melhor sítio, porque se eu tivesse ido para a Associação Académica antes de fazer tudo o resto, não teria tirado o mesmo proveito nem teria dado o mesmo contributo e a mesma coisa se aplica ao CeSIUM e à YME. Portanto, eu acho que consegui extrair coisas positivas de qualquer um dos vários projetos. Por exemplo, na Nutrium, eu consegui extrair várias mais-valias: o que era a fundação de uma empresa, como fazer um pitch, como lidar com investidores, como lidar com a parte de negócio, como fazer uma apresentação aos clientes, etc.. No CeSIUM, também ganhei vários conhecimentos desde a parte de programação, no que toca a desenvolver plataformas e websites, até mesmo à questão dos sistemas de controlo de versões (em particular, git, que não se aprendia no curso). Claro que também aprendi a gerir uma equipa, apesar de já ter gerido uma equipa antes na YME, mas era uma equipa muito diferente com pessoas de vários cursos e com diferentes vontades e especialidades. No CeSIUM também acaba por haver isso, ou seja, apesar de as pessoas serem todas do mesmo curso, umas têm mais interesse na parte de comunicação, outras têm mais interesse na parte de imagem, etc., mas aqui o cerne da questão é que o CeSIUM é uma equipa com outra dimensão. Para além disso, eu só lidei com política e burocracia na Associação Académica. Não é uma coisa interessante, ninguém gosta de lidar com burocracia, mas é uma aprendizagem muito valiosa, porque existe em todo o lado e no CeSIUM não pude adquirir esse tipo de conhecimentos, porque não existe um processo burocrático de tomada de decisão. Ao mesmo tempo a SEI (Semana da Engenharia Informática) é claramente o maior exemplo que eu tenho de organização de eventos e que, para além de me ensinar a gerir tempo e pessoas, também me ensinou a gerir stress e imprevistos, porque durante a SEI há muita coisa que corre mal. O CoderDojo também dá umas bases totalmente diferentes a outros níveis. Por último, o Norte 2020 foi igualmente um grande desafio, na medida em que entrei num departamento com imenso potencial, mas onde estava bastante bloqueado, porque já estava tudo definido a nível financeiro 2 ou 3 anos antes, o que me deu uma bagagem diferente. Portanto, em termos de projetos, acho que destacava esses três.
Neste momento exerces um cargo de Chief Product Officer na empresa UTrust. Sendo esta uma posição relacionada com Gestão de Produto, podes-nos falar um pouco acerca do teu percurso profissional, o que fez com que te afastasses de uma carreira como programador e como foi o teu percurso dentro da empresa? Eu acho que não é um afastar, porque eu acho que nós saímos de Engenharia Informática com um mindset demasiado preso a termos de ser programadores e não é o caso. O curso é Engenharia Informática, não é Engenharia de Programação nem nada do género. Quem tira Engenharia Informática tem diferentes opções a nível de carreira: uns podem ir mais para o lado de gestão, outros podem ir mais para o lado da programação e outros podem
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/PERSONA/ até mesmo ser team leads, ou seja, programadores que estão mais focados na parte de gerir a equipa. Eu fiz vários estágios de verão e, ao longo destes estágios, fui-me apercebendo que, se calhar, a área de gestão de produto era interessante para mim, não porque eu não gostava de programação, mas porque gostava de mais para além do que apenas a parte de solucionar um problema. Eu gostava de ligar a parte de negócio, marketing, comunicação, etc., perceber o contexto todo e ajudar a delinear um caminho com base em noções de programação. Eu lembro-me de uma aula de Bases de Dados, onde falamos, pela primeira vez, de alguns conceitos da metodologia Agile. Na altura, ninguém gostou, mas a verdade é que esses conceitos são necessários numa equipa de mais do que 3 pessoas. E eu acho que no meu percurso associativo dentro da universidade acabei por ser sempre líder, na medida em que ajudei a unir todas as vertentes e a definir prioridades. No Projeto em Informática, nomeadamente, fiz isso outra vez, ou seja, acabei por ser o gestor de produto. Em qualquer projeto em que haja mais complexidade, acaba por haver uma ou duas pessoas que ajudam a delinear quais são as tarefas a fazer e a ordem delas. É óbvio que, no início, quando não se tem experiência e dependendo dos grupos, pode haver mais do que uma pessoa a fazê-lo. Mas se essas pessoas estiverem a caminhar em direções diferentes, vão também acabar por fazer coisas totalmente diferentes e depois não vão conseguir uni-las. Ora, o trabalho de um gestor de produto é exatamente isso: descobrir e escolher as melhores abordagens para satisfazer (geralmente) o cliente e agregar tudo isso. Ainda assim, isto foi uma aprendizagem que fui ganhando ao longo dos anos e só aí é que decidi que, no meu último ano da faculdade, queria experimentar esta área. Para isso, candidatei-me a um estágio de verão, mas nunca foi numa premissa de odiar programação, porque o que acontece com muita gente é gostar de programação mas, se calhar, não querem fazer isso a vida toda. E é importante perceber que o curso não é só sobre programação. Programação é a base que permite fazer muita coisa, mas o curso é muito mais abrangente do que isso. É sobre desenvolver produtos e a última disciplina, agora chamada PI, consiste precisamente nisso: identificar o problema, juntar a parte do negócio e agregar as dificuldades dos processos da parte de arquitetura e tudo o resto. Há pessoas que não gostam muito dessa parte e só querem a parte de programação, o que é ótimo, porque significa que vão ser engenheiros informáticos apenas focados na vertente técnica. Depois, há aquelas pessoas que geralmente não se importam de escrever relatórios e acabam por inclinar mais para a área de gestão de programação, ou seja, começam como programadores e depois acabam por assumir a responsabilidade de gerir uma equipa. Por último, as pessoas que tendem mais para a gestão de produto são as que têm interesse em muitas outras áreas e que gostam de falar com os utilizadores e descobrir o que se deve resolver e não apenas como é que se deve resolver. Acho que os alunos saem do curso com as bases, mas sem saber que especialização querem seguir e, na minha opinião, faz falta perceberem aquilo que querem fazer e não esperar que a empresa os agarre, porque a empresa pode agarrá-los, mas pode não ser pelo que querem. Relativamente ao meu percurso na UTrust, eu fiz, então, o Summer Camp da Subvisual no meu último ano da faculdade, só que, na altura, a equipa da Subvisual estava toda a trabalhar na UTrust, portanto, a partir da segunda semana do estágio, passei a trabalhar na UTrust. No fundo, comecei como estagiário na UTrust (se bem que não estava num estágio da UTrust, mas sim num estágio da Subvisual) e, no final do Summer Camp, fui contratado pela UTrust para gestor de produto, sendo que acabei por ser o primeiro gestor de produto da empresa.
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/PERSONA/ Alguma sugestão para os estudantes do nosso curso para uma integração favorável e positiva no mercado de trabalho? Eu acho que a integração é sempre fácil e sempre positiva, mas os 5 anos não precisam de ser gastos só a fazer as disciplinas ou só a fazer cartazes ou eventos. Na minha perspetiva, são 5 anos que devem ser descoberta para além do que o curso disponibiliza, porque o curso não é suposto fazer essa parte, o curso é suposto dar as bases e, portanto, são 5 anos inteiros para descobrir o que é que gostamos de fazer dentro da área. Foi o que eu tentei fazer com todas as atividades em que me envolvi e, com elas, acabei por identificar que o que eu gostava mais era esta parte de gestão de produto, porque as minhas aptidões e os meus interesses batiam certo com esta função. Eu gostaria muito mais de ver pessoas que saíssem da universidade e dissessem “Gosto mais de trabalhar em frontend com este tipo de tecnologias a resolver este tipo de problemas”, por exemplo, em vez de “Quero ser funcionário desta empresa”, coisa que, neste momento, acho que não acontece muito. Acho que não deviam aceitar logo a primeira proposta que vos aparece à frente, mas sim procurar não só a questão da função, mas também uma empresa que se encaixe com os vossos valores e com o que vocês querem fazer. Para além disso, não precisam de ficar presos a um sítio durante 5 ou 10 anos, ficam onde vos derem desafios e onde vos permitirem evoluir. E, no início, vale a pena correr riscos, como trabalhar numa startup durante 2 ou 3 anos, porque é a altura mais fácil para o fazer. É óbvio que não estou a dizer que têm de o fazer, até porque há pessoas que preferem um trabalho mais organizado, mais corporate, no fundo, mas este argumento que dei agora é algo que devem ter em conta e há muita gente que põe logo essa hipótese de lado. Momentos como a SEI ou as JOIN são ótimos para descobrir e falar com as empresas. Não com a pessoa de Recursos Humanos, mas com as pessoas que estão a trabalhar no que vocês querem, porque as pessoas de RH sabem vender, sabem cativar funcionários e agradar. É muito bonito dizer que este sítio tem um puff, aquele dá comida, o outro oferece um computador, etc. mas vocês conseguem ter isso em qualquer lado. Portanto, a primeira coisa que vocês se devem perguntar é “Eu vou gostar do que vou estar a fazer?” e não “Eu vou gostar dos benefícios que me vão ser oferecidos?”, porque se vocês descobrirem o que gostam de fazer, aí já vão procurar os benefícios que fazem mais sentido em função disso. Adicionalmente, também aconselho a não fazer apenas o que está nas aulas, mas sim a ir mais além, porque, na maior parte das disciplinas, não aprendem web, por exemplo, e é propositado ser assim, porque se trata de uma universidade e não de um politécnico. Por isso, o meu conselho final é: procurem e não se deixem ser procurados.
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Sempre soubeste que querias seguir um percurso na área da informática? Mais ou menos. Lembro-me perfeitamente de me perguntarem o que queria ser quando acabasse o secundário, quando eu estava no 10.º ano. Na altura, como gostava muito de música e de fazer coisas em madeira, queria criar uma banda ou ser carpinteiro. Contudo, a minha mãe não aprovava muito a última opção, visto que, na opinião dela, não fazia sentido eu estar a estudar para, no fim, ser carpinteiro. Entretanto, começou a surgir o interesse pela área da informática graças aos jogos, coisa que acho que deve ser bastante recorrente na nossa área. Comecei a interessar-me essencialmente pelo lado da internet, porque queria perceber como é que uma pessoa de outro lado qualquer escrevia um link no browser e, de repente, aparecia uma página. A partir daí, fui pesquisar como é que se construía um website e comecei a ter umas noções de HTML, CSS e JavaScript antes de sequer ter acabado o secundário. Portanto, quando cheguei ao 12.º ano, já tinha mais ou menos uma ideia de como se construíam websites (nada de web apps, só coisas estáticas) e passava o meu tempo livre a pesquisar sobre isso, não só porque gostava de aprender mais, mas também para me entreter. Então, na altura de ir para a universidade, a decisão acabou por ser bastante óbvia. Entrei em Engenharia Informática na Universidade do Minho e confirmou-se que tinha sido a escolha acertada, porque eu sentia-me bastante confortável. Claro que, tal como os restantes colegas, senti o embate inicial aliado à programação funcional, mas lembro-me de achar o tópico bastante interessante e, em vez de me focar no facto de não estar a entender, focava-me em pesquisar mais sobre o assunto, perceber a solução dos problemas, tentar fazer e discutir com os colegas. Foi assim que surgiu tudo isto.
Durante o teu percurso académico, desempenhaste papéis fundamentais dentro do CeSIUM: foste Vice-Presidente e Codiretor do Departamento Pedagógico, sendo que contribuíste bastante no nosso website. Foi acessível conciliar todos estes projetos com os estudos? Quais são as estratégias? Eu diria que foi mais ou menos. Eu acho que é uma constante da vida haver sempre mais coisas para fazer do que aquelas para as quais realmente há tempo. E, no CeSIUM, acho que isso também se aplica, porque temos lá tantas pessoas com tantas ideias que podem ser boas, mas se cada uma andar a tentar fazer a sua, as coisas acabam ou por não sair muito bem ou por nunca acontecer. Lembro-me que, na altura, era um bocado complicado conciliar os estudos e a parte dos trabalhos, especialmente quando chegava a altura das entregas, com o desenvolvimento dos projetos do CeSIUM, mas o que eu fazia era começar a trabalhar nos mesmos logo no início do ano, porque a carga de trabalho e de estudos era menor. Portanto, acho que a melhor sugestão que eu poderia dar a alguém que estivesse na direção do CeSIUM era pensar quais são as atividades que realmente valem a pena realizar, porque se tentarmos fazer tudo, acabamos por nos dispersar um bocado. Para além de perceber quais as atividades que se devem realizar, acho que é importante fazer uma boa distribuição de tarefas por toda a gente, porque uma coisa que acontecia muito na altura da SEI, por exemplo, era o facto de haver só uma ou duas pessoas a fazer o website, o que acabava por ser muito pesado e muito difícil. Ainda para mais, o proveito que nós, enquanto organizadores, tirávamos daquilo acabava por ser mínimo, porque estávamos sempre a correr para adicionar badges, para adicionar imagens, para gerir contas de utilizador, etc., ou seja, basicamente estávamos sempre a dar suporte à plataforma e acabávamos por não tirar proveito do evento em si. Para finalizar e voltando à questão das táticas, acho que é essencial focarmo-nos em duas ou três atividades que sejam mesmo importantes, arranjar
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pessoas que realmente estejam interessadas em ajudar ou em aprender e começar a trabalhar nisso o mais rápido possível.
De entre os vários projetos que integraste, quais foram os que mais contribuíram para uma melhor experiência no mundo do trabalho e de que forma? Em termos profissionais, acho que o projeto mais importante de todos foi o site da SEI. Isto porque, por muito que no curso se acabe por tocar na parte de aplicações web, acho que as aplicações que se fazem, por causa de ser num período de tempo muito curto, acabam por não ser tão profundas e por não dar assim tanta experiência para quando se sai da universidade. Eu preferi mil vezes as cadeiras que me ensinavam a pensar e a tratar os problemas de forma lógica do que as cadeiras que ensinavam a aplicar uma certa framework ou a fazer certas coisas na web, ou seja, preferia mil vezes uma cadeira que me explicasse como é que a web funciona (o que é um pedido HTTP, onde é que as coisas estão nos servidores, como é que aquilo vem por rede, etc.) do que uma cadeira que consistisse em fazer uma web app em Java Spring. Portanto, eu gostei muito de trabalhar no site da SEI, porque pegamos em algo que já estava feito e acho que isso é importante, porque é muito provável entrarem numa empresa e pedirem-vos para atualizar uma determinada aplicação, o que vai fazer com que tenham de aprender a ler código, a navegar nele, tentar perceber o que está a acontecer, mexer nos botões e ver quais são os pedidos que estão a passar de um lado para o outro, etc.. Ora, isso foi uma competência que consegui desenvolver aí e senti que me ajudou imenso quando chegou a altura de entrar no mercado de trabalho. Mesmo hoje em dia, se alguém me pede para fazer alguma tarefa e eu nunca toquei naquela parte do site, eu consigo ir lá, carrego nos botões, vejo o que está a acontecer e sei logo direcionar-me no backend e perceber onde tenho de fazer as minhas alterações, algo que sinto que nunca aconteceu nas cadeiras da universidade. Para além disso, acho que foi interessante perceber como é que funcionam as frameworks da web. Se não me engano, na altura, estávamos a usar Ruby on Rails e foi interessante perceber como é que se processavam imagens, onde é que se guardavam as mesmas, como é que se fazia autenticação de utilizadores e como é que se construíam modelos de bases de dados maiores do que aqueles que se construíam no curso. No fim, acabava por ser uma plataforma que, em termos visuais, podia não estar muito bonita, em termos de codebase, também podia não ser a melhor do mundo, mas foi uma boa experiência, porque, ao mesmo tempo que eu estava a desenvolver a plataforma, tinha outra pessoa a ajudar-me e a rever o meu código e, logo aí, criei o hábito de fazer o meu trabalho o melhor possível, porque havia outra pessoa que ia ver o meu código e podia dar sugestões de melhoria, algo que, hoje em dia, na indústria, é prática comum.
Neste momento exerces um cargo de Software Engineer na empresa Remote, mas a certa altura chegaste a co-fundar uma empresa (CrowdSaver). Podes-nos falar um pouco sobre como é criar uma startup, como é que isso se compara a uma posição normal de developer e quais foram os maiores desafios que enfrentaste? Antes de mais, tenho de frisar que nós não chegamos a criar a startup. Na altura, houve uma hackathon que o CeSIUM organizou em conjunto com o NEMUM, a HeartBits, sendo que o conceito passava por juntar os alunos de Medicina com os alunos de Engenharia Informática para criar um protótipo que solucionasse um determinado problema da área da saúde. Na altura, gostei bastante da hackathon, porque achei interessante estar com
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/PERSONA/ pessoas de outra área que surgiam com os problemas e nós tínhamos de os solucionar, porque, apesar de a área de informática ser muito vasta, as aplicações só são boas quando efetivamente resolvem um problema. Então, nesse ano, eu e outro amigo do curso inscrevemo-nos juntamente com mais 3 rapazes de Medicina e um dos rapazes surgiu com a ideia de desenvolver uma aplicação que permitisse que uma pessoa com alguma certificação de primeiros socorros ou algo do género pudesse chamar diretamente uma ambulância sempre que visse alguém a ter um ataque cardíaco ou de epilepsia. Isto porque a probabilidade de uma pessoa morrer se ficar em coma ou sem atividade cerebral durante 12 minutos é muito elevada e, assim, a aplicação reduziria o tempo de resposta da ambulância, porque toda a gente sabe que uma ambulância chega a demorar bem mais do que 12 minutos. Na verdade, a nossa ideia até foi baseada em algo que já existia noutro país mas para incêndios, ou seja, se alguém visse um incêndio, poderia reportar diretamente aos bombeiros em vez de estar a ligar para o número de emergência. Depois, o facto de termos ganho a hackathon aliado à curiosidade que tínhamos pelas startups fez com que mantivéssemos o contacto uns com os outros e chegássemos a ir ao Porto falar com um senhor que estava ligado a essa área. Contudo, foi aí que eu percebi que não tinha muito jeito para a parte de negócios e para a parte de falar com as pessoas sobre estes assuntos. Eu acho que sou bom a fazer questões e a tentar puxar mais pelas pessoas, mas eu próprio ter de organizar estas ideias e marcar reuniões não é muito a minha área de expertise. Para além disso, aquilo decorreu no fim do terceiro ano, portanto, estávamos cheios de trabalho e, entretanto, lá quebramos a ligação, porque estávamos todos ocupados.
Alguma sugestão para os estudantes do nosso curso para uma integração favorável e positiva no mercado de trabalho? Tenho algumas, sim. Eu diria que talvez o mais importante é as pessoas serem curiosas e, apesar de não saberem determinado aspeto, não terem medo de procurar, mas, ao mesmo tempo, não terem vergonha de pedir ajuda. Para além disso, acho que, quando chegarem ao mercado de trabalho, é importante não viverem isolados em termos de ideias, ou seja, lá porque aprenderam a fazer uma coisa de uma certa forma, não significa que tenha de ser sempre assim ou que é a mais correta. Cada vez é mais comum encontrar pessoas com ideias muito fixas que não são capazes de ceder, porque acham que é assim que deve ser feito e isso é mau ao ponto de eu já ter visto pessoas a ser despedidas por esses motivos. Para além disso, acho que também devem tentar ter uma vida para além da informática. Não criem aquele hábito consistente de ir para casa trabalhar em projetos pessoais assim que saem do trabalho. Isso é bom, mas q.b., porque, sendo honesto, eu era assim e agora estou numa fase em que, mal saio do trabalho, o que não quero ver é computadores à frente. Também acho que adquirir social skills é bastante útil, ou seja, se as pessoas realmente querem ter impacto na organização e naquilo que estão a fazer, é necessário que haja união entre as partes. Claro que é difícil sair da universidade e deixar de ter alguém que nos diga o que fazer, mas, por outro lado, é bom, porque passamos a poder dar o nosso input quando a pessoa de produto nos pergunta se dá para implementar uma certa feature, ajudar a comparar hipóteses de implementação, trocar ideias, fazer uma estimativa de duração e de custo, etc.. Consequentemente, acho que é importante saber comunicar com as pessoas e explicar as coisas sem julgar, porque, às vezes, ficamos com uma opinião negativa acerca de uma pessoa, só porque esta deu uma sugestão menos boa e acho que não deve ser assim, nós devemos saber explicar com calma porque é que achamos que não faz sentido.
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Sempre soubeste que querias seguir um percurso na área da informática? A resposta simples é sim. Eu tive o meu primeiro computador quando tinha os meus 5/6 anos e lembro-me perfeitamente de ter sido paixão à primeira vista. Eu sempre fui muito curioso sobre como é que as coisas funcionam, tanto que, quando era miúdo, comecei por destruir uns carros que davam luzinhas, de forma a tentar perceber o que estava por dentro. No caso dos computadores, a reação foi parecida. Eu não sabia exatamente porque é que aquele ecrã mostrava aquelas coisas nem o que estava a acontecer para tal, mas aquilo entretia-me e desafiava-me imenso no sentido de querer saber mais sobre aquela caixa que estava à minha frente. Para além disso, nunca tive grandes dificuldades a brincar com computadores e essa destreza fez com que eu não tivesse medo de experimentar. A verdade é que isso fez com que eu estragasse esse meu primeiro computador. Na altura, era um Celeron a 400MHz com 4GB de disco e 64MB de RAM, ou seja, uma grande máquina para a época. Ainda assim, apesar de 4GB de disco não darem para muito, cheguei a jogar GTA III, FIFA 99 e GTA: Vice City (aí já começava a notar alguma lentidão). Entretanto, saiu o GTA: San Andreas cuja instalação ocupava exatamente 4GB, logo decidi fazer uma limpeza ao computador. Fui ter à pasta C:\Windows\System32 e comecei a apagar tudo até ter cerca de 3.8GB livres. De facto, consegui instalar o jogo, mas, quando tentei reiniciar o computador, este não ligava, porque tinha ficado sem sistema operativo. À medida que fui crescendo, o interesse pela Internet foi aumentando e acabei por ter acesso à mesma no meu 10.º ano, após muita insistência com os meus pais. Até lá, ia para casa dos meus primos e navegava pelos sites. Logo aí comecei a sentir alguma curiosidade sobre como é que os sites funcionavam e cheguei mesmo a pensar que estaria alguém do outro lado a atualizá-los muito rapidamente com a informação enviada. Quando finalmente tive acesso à Internet, comecei a pesquisar e encontrei um fórum onde conheci uma pessoa mais velha que, na altura, estava a estudar em Viseu e me forneceu 3 ou 4 apontadores para que eu pudesse começar a desenvolver sites, tal como ela. Esses apontadores eram sobre PHP que, ainda hoje, é a minha linguagem favorita e, a partir daí, comecei a explorar. Quanto mais explorava, mais vontade de aprender tinha, até que chegou a um ponto em que eu deixei de jogar jogos, porque preferia dedicar o meu tempo livre a aprender a programar. Portanto, por sempre ter tido uma relação muito próxima com computadores, nunca duvidei que isso pudesse ser o meu futuro, mas tive ainda mais certezas quando aprendi o que estava por trás de todo aquele funcionamento. Sendo assim, quando me candidatei à universidade, todas as primeiras quatro opções foram Engenharia Informática e as duas últimas foram Enfermagem, dado o meu interesse partilhado com a área da saúde.
Durante o teu percurso académico, envolveste-te em vários projetos diferentes: foste Diretor do Departamento Pedagógico do CeSIUM, fundaste os Hackathoners, trabalhaste como docente no Departamento de Informática durante o teu doutoramento e inclusive chegaste a ter alguma responsabilidade numa das residências universitárias. Foi acessível conciliar todos estes projetos com os estudos? Quais são as estratégias? Isso é uma ótima questão, porque é um facto que eu conciliei isso tudo, mas, para ser sincero, não sei que estratégias utilizei para tal. Sem dúvida que esses projetos todos aconteceram, mas eles chegaram em momentos diferentes. Por exemplo, a direção do Departamento Pedagógico chegou ainda na altura do meu mestrado quando eu não tinha Hackathoners, não tinha responsabilidade na parte da residência, nem dava aulas. Depois, no doutoramento, aí sim, juntaram-se as 3. Não todas ao mesmo tempo, por exemplo, a parte da docência chegou apenas há 3 anos, portanto, eu
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/PERSONA/ diria que se juntaram a meio do doutoramento. Nunca senti que pus nada em causa para conciliar
todos estes projetos. Não me lembro de nenhum momento em que estivesse a percorrer o meu percurso académico sem ter algum projeto à parte, ou seja, eu sempre me quis sentir ocupado e não me cingir a uma única responsabilidade, principalmente quando podia fazer mais no meu tempo livre que complementasse o meu percurso académico. Portanto, respondendo à primeira questão, sim, foi possível conciliar. Quanto a estratégias, tal como já referi, eu não defini nenhuma estratégia em concreto, até porque eu não sou uma pessoa muito organizada. O que eu acho que me levou a conciliar as minhas responsabilidades foi o facto de querer mostrar o melhor de mim em todos esses projetos em que eu me envolvi, sentir que não podia desapontar ninguém e que era muito importante para mim vencer esses desafios. No fundo, foi a questão de assumir compromissos e querer cumpri-los da melhor forma e, felizmente, correu tudo bem. Para além disso, acho que, quando estamos a trabalhar em determinada tarefa, é muito importante que nos foquemos totalmente nela, ou seja, é crucial não deixar o percurso académico interferir nos outros projetos e vice-versa. Adicionalmente, à exceção do meu percurso académico, todos os outros projetos consistiram num trabalho de equipa, ou seja, tive sempre uma equipa em quem pude confiar. Portanto, quando temos uma equipa em quem confiamos os nossos objetivos e com quem conseguimos partilhar as nossas preocupações, é meio caminho andado. Às vezes não é preciso estarmos a 100% em cada uma das responsabilidades, mas sim a percentagem necessária para conseguirmos colaborar uns com os outros e levar o projeto a bom porto.
De entre os vários projetos que integraste, quais foram os que mais contribuíram para uma melhor experiência no mundo do trabalho e de que forma? Todos eles contribuíram. Eu diria que os Hackathoners e o CeSIUM tiveram um grande impacto no sentido de organização e liderança. Os Hackathoners contribuíram no sentido de ensinar pessoas mais novas ou passar-lhes conhecimento, na organização de eventos e na gestão de pessoas na vertente de perceber que cada pessoa é diferente. Nós temos que nos adaptar ou perceber o que é melhor e o que faz sentido para cada uma delas e acho que isso é uma das partes mais difíceis e que está mais relacionada, neste momento, com aquilo que eu faço. Portanto, os Hackathoners ensinaram-me muito nessa parte humana, ou seja, a perceber quais são os pontos fortes e os pontos fracos de cada pessoa e como é que conseguimos fazer com que cada uma atinja o seu máximo. Como consequência disso, as pessoas que estiveram nos Hackathoners seguiram a sua vida com sucesso e acho que, pelo menos naquela altura, conseguimos trabalhar o máximo de cada uma delas. Claro que agora cada um de nós tem outros máximos muito maiores do que aqueles que tínhamos, mas esse era o objetivo: subir no patamar. Em termos de organização, liderança e compromisso, o CeSIUM também foi muito importante. Pensando bem, todos os projetos estão relacionados e, em termos de aprendizagem, são muito parecidos. A residência, por exemplo, também acabou por me ensinar bastante em termos de liderança, compromissos e prazos. Resumindo e concluindo, se eu tivesse de escolher dois projetos, diria que os Hackthoners e o CeSIUM foram os mais importantes.
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Neste momento exerces um cargo de Team Leader e Product Manager na empresa Nutrium. Contudo, podes-nos falar um pouco acerca da tua decisão de continuar o percurso académico, em vez de entrar no mercado de trabalho mal terminaste o mestrado e também sobre quais as vantagens de tirar um doutoramento e como é que isso te conduziu até à tua posição atual na Nutrium? Eu comecei por seguir o percurso académico normal, ou seja, licenciatura seguida do mestrado. Antes de sequer ter ingressado na universidade, já sabia que não queria sair de lá sem fazer o mestrado, porque sentia que podia aprender mais e foi sempre isso que me motivou. Felizmente, no meu primeiro ano de mestrado, tive uma bolsa de investigação e deparei-me com coisas que nunca tinha aprendido nem sequer estava à vontade, o que pode parecer assustador. De facto, foi assustador, mas, como tinha assumido o compromisso, desistir nunca foi uma opção, pelo que, no final, eu teria de sair pela porta grande. Essa minha bolsa de investigação surgiu no âmbito de um projeto Europeu e o problema que me apareceu à frente acabou por ser o problema da minha tese de mestrado. Sendo que já vinha a estudar esse problema antes da tese de mestrado, posso dizer que tudo correu lindamente, gostei muito de fazer o que fiz, tive resultados muito bons, entreguei a tese no primeiro prazo, ainda publiquei um artigo, a defesa correu muito bem, portanto, não tenho nada a apontar no meu percurso de mestrado. Por ter corrido tão bem e por me ter esforçado, o meu orientador, o Professor José Orlando Pereira, perguntou-me se eu não estava a pensar ir para doutoramento. A verdade é que eu nem sequer tinha pensado sobre isso, mas continuava a achar que se escolhesse enveredar por esse caminho, poderia aprender muito e isso foi uma das principais razões que me levou a aceitar. Outra das razões foi o facto de a investigação estar a anos-luz à frente da indústria, ou seja, na investigação pensa-se em problemas que nunca ninguém solucionou o que, por sua vez, é muito desafiante. Para além disso, um último fator que me motivou foi a questão de eu sempre ter tido o desejo de contribuir para a minha área de forma científica. Claro que o facto de me terem convidado para tal também me transmitiu confiança de que eu era capaz de o fazer, porque por iniciativa própria nem sequer poria essa hipótese em causa. Eu preferi seguir este percurso em vez de entrar no mercado de trabalho, porque eu tinha receio de estagnar caso escolhesse a última opção, ou seja, tinha medo de ir trabalhar para um sítio sempre com as mesmas tecnologias. É óbvio que, como em tudo na vida, tirar um doutoramento tem as suas vantagens e as suas desvantagens. Este percurso é um caminho muito cinzento, em que muitas vezes se começa a perder a energia de o percorrer, porque não se sabe para onde é que se está a ir nem se sabe quais são os resultados que é suposto obter. Como é uma zona tão cinzenta, não é algo que consigamos prever a curto prazo, é algo que exige um longo caminho para se começar a prever a curto prazo, porque até lá há muito nevoeiro pela frente. Durante esse percurso surgem desafios a nível técnico, a nível de raciocínio, a nível de procura de conhecimento (nomeadamente, estado da arte) e à medida que vamos percorrendo esse percurso, vamos ganhando alguma resiliência. Isto, por sua vez, faz com que nos tornemos mais fortes relativamente aos desafios que nos aparecem à frente e os desafios da indústria acabam por ser bastante mais simples. Depois, torna-nos mais capazes de perceber melhor os problemas, ou seja, por vezes o problema A e o problema B são o mesmo só que apenas muda um detalhe e já parecem problemas diferentes, portanto, ajuda-nos a aprender a abstrair e a pensar em alto nível. No que toca ao meu trabalho atual na Nutrium, eu tenho uma equipa de Engenheiros bastante bons, capazes de pensar e produzir, mas acho que acaba por ser vantajoso eu trazer-lhes essa visão, ou seja, não pensar no problema a nível de código, mas sim ao nível da solução, o que, por sua vez, permite identificar problemas muito mais rápido e desenhar soluções ainda mais rápido. Acho que essa é a grande vantagem do doutoramento para aquilo que eu faço atualmente.
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Alguma sugestão para os estudantes do nosso curso para uma integração favorável e positiva no mercado de trabalho? Sim, tenho muitas. Acho que é muito importante não se limitarem ao percurso académico (neste caso, ao curso) e investirem noutras áreas, como associativismo, projetos técnicos à parte em que possam lidar com clientes (se for o caso) ou até mesmo grupos de estudantes que até possam ter pessoas mais velhas que vos possam passar algum conhecimento. Tudo isto é um bónus para uma carreira muito mais interessante e bem sucedida, porque o curso apenas nos dá as bases e depende de nós saber o que fazer com elas. O curso não nos ensina a lidar com clientes nem a resolver projetos com as tecnologias do momento, mas dá-nos as ferramentas para que nos consigamos adaptar à realidade que vai mudando de dia para dia. Portanto, a minha grande recomendação é: não descansem nem se acomodem apenas a um tópico da vida e procurem outros caminhos para além do percurso académico.
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/EXPRESS/
Escrito por Jessica Lemos
jessica.andreia96@gmail.com
MERCH by cesium
Este ano ficou marcado na história do CeSIUM pelo lançamento de uma grande novidade, um projeto muito acarinhado e ambicionado por toda a equipa e também muito esperado por muitos dos sócios, bem como alunos de Engenharia Informática. 2021 ficou marcado como o ano em que o CeSIUM lançou a sua primeira coleção de merchandising! A criação e lançamento de merch tem como objetivo dar a oportunidade aos sócios do CeSIUM, e não só, de expressarem o seu apoio ao núcleo e pelo curso de Engenharia Informática perante a comunidade académica em geral. Sendo esta uma das grandes apostas para este ano, procuramos desde o início investir tanto na qualidade dos produtos como num design único e inovador. Este é um projeto de grande dimensão que envolve a gestão de inúmeros recursos e muito planeamento, sendo a equipa dividida entre seleção e encomenda dos produtos, design, desenvolvimento do site e comunicação/imagem. Ao longo de vários meses foi preparada a primeira coleção, composta por uma t-shirt e máscara do CeSIUM, um hoodie de curso e stickers variados tanto do curso como do núcleo. Paralelamente, esteve a ser preparado o design e implementação da loja online para a venda dos produtos. O trabalho destes meses culminou numa sessão fotográfica para a tão esperada divulgação, que aconteceu em abril deste ano. Tal como esperado por toda a equipa, esta coleção teve um grande impacto e feedback não só dos sócios do CeSIUM e alunos de informática, mas também de outros núcleos de estudantes da Universidade do Minho. O alcance como nunca antes visto refletiu-se no número de encomendas realizadas, com centenas de produtos vendidos. Após o enorme sucesso do lançamento da primeira coleção, a equipa do CeSIUM começou a preparação da próxima coleção de merchandising que será lançada em breve. Prometemos, como sempre, qualidade e inovação!
/ATIVIDADES/ Escrito por Miguel Brandão
mickael.a.brandao@gmail.com
SEI’21 “Mas como é que vamos fazer uma SEI online? Foi esta a pergunta que, para nós, definiu a SEI’21. A Semana da Engenharia Informática da Universidade do Minho existe já há uma boa coleção de anos — é até mais velha do que a maioria dos caloiros que entram este ano na UMinho. Nascida em abril de 1997 e batizada “Semana de Sistemas”, a SEI tem vindo a crescer, a adaptar-se e a reinventar-se, produto da dedicação e iniciativa das sucessivas equipas organizadoras, que sempre prezaram deixar uma marca positiva na história da SEI. Nesta edição, o desafio foi inédito. A SEI tem mudado e evoluído, mas todas as edições passadas têm um ponto em comum: o formato presencial. No início do último trimestre de 2020, cerca de meio ano depois da OMS ter declarado a COVID-19 como uma pandemia mundial, Portugal registava mais de 2000 infeções diárias e quase 100000 infetados desde o início da pandemia. Muitas dúvidas havia sobre a progressão da pandemia e as restrições sobre a liberdade de movimento para a sua contenção, mas, para a equipa da SEI, uma coisa era certa: com as estatísticas da pandemia a piorar e sem o fim à vista, pela primeira vez desde a sua primeira edição, a SEI 2021 teria de ser online. “Mas como é que vamos fazer uma SEI online?!” — De facto, tal nunca tinha sido tentado. As perguntas eram muitas: “Como vamos fazer as palestras?”, “Como é que vão ser os workshops?”, “E a animação?”, “E as empresas?”, “E o Rally das Tascas?”, ... “Como é que vamos manter o espírito da SEI?”. Foi esta última que acabou por determinar toda a organização da SEI’21. Como manter o espírito da SEI? Como manter aquele ambiente do átrio do CP2, agitado, jubilante, meio caótico de todos os alunos a falarem com os representantes das empresas, a entrarem nos auditórios para as palestras e a saírem dos mesmos para o lanche, à procura de badges e a pedirem dicas para o CTF? Foi muito o brainstorming e muitas as opções consideradas: Zoom? — “Temos só uma sala para as palestras? E os workshops? E as empresas? Estar a passar entre salas é estranho e não é muito boa UX”; Teams? — “Alguém sabe usar isso?”; Google Meet? — “Mesmos problemas do Zoom e conexões menos estáveis”; Implementar o nosso próprio stream player no site da SEI? — “LOL, como se isso fosse correr bem”; E o Discord? — “Huuuuuummm....”. De facto, desde que começamos a aperceber-nos de que a SEI teria de ser online, o Discord sempre nos pareceu um bom candidato a ser a plataforma da SEI 2021. Sendo o grande objetivo o de manter o espírito, dinamismo e qualidade da SEI, queríamos fazer toda a SEI na mesma plataforma: queríamos que a plataforma fosse um “CP2 online”. O Discord possuía qualidades que o tornavam num candidato ideal: para além de praticamente todo o curso já saber como o usar, é um serviço especificamente feito para conversas em tempo real — seja por texto ou por vídeo/voz — pelo
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/ATIVIDADES/
que, por design, é extremamente fácil de mudar entre vários canais e de entrar ou sair de canais de voz; é quase um análogo digital para as interações no CP2. Para além disso, tem também um ótimo suporte para bots, que seriam um instrumento fundamental para a atribuição de badges e a automatização do check-in. No entanto, tinha um grande problema: o número máximo de participantes num canal de vídeo era de 25 pessoas. Embora suficiente para os “stands” das empresas e as atividades lúdicas, esta limitação inviabilizava o Discord para ser o host das palestras e workshops. Até queríamos pagar para aumentar o limite, mas aparentemente o Discord não gosta de dinheiro.
Teríamos, portanto, de ter alguma separação entre as partes da SEI. Felizmente, o Zoom estava muito mais interessado nos nossos Euros e não teve problema nenhum em nos vender duas contas que suportassem a quantidade de participantes nas palestras e nos workshops. Plataformas decididas, arrancamos para a próxima fase: como dinamizar ainda mais o evento? A SEI já tinha o seu mecanismo de dinamização por gamification: os badges que se convertem em prémios. No entanto, achamos que este sistema já estava datado e tinha alguns defeitos que comprometiam a participação prolongada dos estudantes: após o primeiro dia da SEI, isolavam-se 4 a 5 pessoas no topo da leaderboard que lutariam entre si até ao final do evento. Reconhecendo que este cenário seria desmotivador para a maioria dos participantes, decidimos criar os tokens. A introdução deste novo elemento pretendia adicionar um pouco de estratégia e sorte à corrida aos prémios: o participante poderia escolher guardar os seus tokens e habilitar-se aos prémio diários e finais, gastá-los em prémios garantidos, mas com limite de stock, ou apostá-los — sob a pena de os perder — para ganhar prémios ou, até mesmo, mais tokens, para obter uma vantagem sobre os “oponentes”. E assim, após meses de trabalho com brainstorming constante, a contactar oradores e empresas, a considerar opções para atividades lúdicas (é díficil fazer um Rally das Tascas online), a fazer imagens, animações, bots, frontend (com um novo design!), backend, CTFs, a configurar Discords e Zooms… Começa a SEI. Os participantes entram no Discord e começam a fazer o check-in. O bot funciona. Sessão de abertura. Talks. Pitches. Networking. Workshops. Torneios. Discord Master Race. Google Hashcode. Sessão de encerramento. Entrega de Pŕemios. Hackathon.
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/ATIVIDADES/
Segundo o feedback que nos foi chegando, correu tudo bem; foi incrível, até. Acreditamos que conseguimos ter o evento que desejávamos: um evento online, mas dinâmico e interessante, com um espírito próximo ou igual ao de uma edição presencial. E tudo foi possível pelo esforço incansável de todos os membros da equipa, que por muitas vezes abdicaram de horas de sono e estudo para permitir que este evento fosse o sucesso que foi: 6 dias, 715 participantes inscritos, 14 palestras, 6 workshops, 25 empresas, uma hackathon de 42 horas e 9472 badges e 160330 tokens atribuídos. Para terminar, agradeço aos oradores e aos nossos patrocinadores, que trouxeram o conteúdo de qualidade que define a SEI. Agradeço aos nossos parceiros, que nos apoiaram nas áreas em que não estávamos tão confortáveis. E agradeço-vos, participantes, por se terem envolvido e usufruírem do fruto de todo o esforço e tempo que colocamos na SEI’21; isto foi para vocês. Espero que tenham gostado. Para o ano há mais!
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/ATIVIDADES/ Escrito por Jéssica Lemos
jessica.andreia96@gmail.com
DEZEMBRO SOLIDÁRIO
Num ano marcado pela pandemia de COVID-19, ao longo de todo o mês de dezembro, o CeSIUM, juntamente com vários Núcleos, Delegações e Secções da Universidade do Minho, organizou, por mais um ano consecutivo, a iniciativa “Dezembro Solidário”. Este é um projeto de cariz social cujo objetivo é fomentar um maior espírito natalício e também de entreajuda no seio de atividades direcionadas à comunidade da Universidade do Minho. Em edições anteriores, esta atividade consistia na colocação de cabazes em locais estratégicos dos Campi da Universidade para a recolha de contribuições sob a forma de bens alimentares, peças de vestuário e brinquedos em troca da participação nas atividades no âmbito deste projeto, mas, devido às restrições causadas pela pandemia, este ano foi necessário inovar e adaptar a iniciativa à nova normalidade. Nesta edição, tendo em conta que a maioria das atividades passou a ser online, para além de serem colocados vários cabazes nos Campi da Universidade para recolher bens, também incentivamos a doação por MB Way ou transferência bancária para uma instituição de solidariedade à escolha. Apesar de todas as restrições, a comunidade académica uniu-se em força, o que permitiu que esta iniciativa fosse um sucesso, contando com 12 organizadores e parceiros com mais de 11 atividades, resultando na angariação de centenas de bens entre os quais alimentos, brinquedos, livros e roupa, bem como dezenas de contribuições monetárias a diversas instituições de solidariedade portuguesas, tais como Operação Nariz Vermelho, Banco Alimentar, Liga Portuguesa Contra o Cancro e Cruz Vermelha de Braga. Todos os bens recolhidos no Campus de Gualtar foram entregues no Centro Cultural e Social de Santo Adrião, em Braga, enquanto os do Campus de Azurém foram entregues no Centro Juvenil de S. José, em Guimarães. Numa época natalícia completamente diferente, o espírito de solidariedade, de entreajuda e união não deixaram de estar presentes, o que permitiu que todos juntos tenhamos ajudado quem mais precisava e que esta iniciativa tenha sido um sucesso. Portanto, o CeSIUM agradece a todos os organizadores, parceiros e participantes. Continuaremos a marcar a diferença no próximo ano!
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/ATIVIDADES/ O CoderDojo é um movimento global, aberto e sem fins lucrativos de clubes de programação onde crianças e jovens dos 7 aos 17 anos aprendem a programar, construir websites, desenvolver aplicações ou jogos num ambiente informal, criativo e divertido. Fundado em 2011, este movimento conta com quase 2 mil Dojos (clubes) dispersos por 93 países. Em 2013, estudantes de engenharia informática, pertencentes ao CeSIUM, juntaram-se e criaram o CoderDojo Minho, na nossa cidade de Braga. A 3 de março de 2021, o nosso Dojo, agora com o nome CoderDojo Braga, celebrou 8 anos de existência. Este dia foi comemorado com sessões especiais realizadas remotamente em que todos os ninjas (jovens participantes) se encontravam no conforto das suas casas, acompanhados dos mentores espalhados por diversos pontos do globo (desde o Brasil à Finlândia). As sessões, que tiveram sempre uma forte componente social de interação entre diferentes ninjas e mentores, foram forçadas a entrar num formato online e, com isto, muitos desafios surgiram. Os nossos ninjas são extremamente curiosos, seja pelo que for. Essa é uma das melhores características deles, mas num mundo virtual em que existem tantas coisas para explorar, garantir que os ninjas estão focados no desenvolvimento dos projetos e na resolução dos problemas à frente deles foi o que nos levou a adotar o modelo 1 para 1. Cada ninja passou a ter o seu próprio mentor e deixou de precisar de partilhar a atenção dele com mais ninjas. Isto, apesar de no início ter significado um decréscimo das vagas, foi colmatado com o dobro das sessões por mês para que pudéssemos, com os mesmos mentores, receber praticamente o dobro dos ninjas. Enquanto não conseguimos angariar mais mentores, foi necessário um esforço maior de toda a equipa de voluntários. Felizmente, novos mentores juntaram-se rapidamente, tornando mais fácil esta gestão.
CODERDOJO BRAGA EM 2021
Escrito por Nelson Estevão
nelson@estevao.org
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/ATIVIDADES/
Uma das coisas que mais ajuda a ter um forte espírito de grupo é o facto de nos reunirmos num espaço comum e passarmos o tempo da sessão uns com os outros. A presença dos mentores e dos restantes ninjas, num mesmo espaço, faz-nos sentir parte de uma comunidade e isso é algo muito importante em grupos de voluntários como o nosso. A criação de um servidor no Discord onde mentores e ninjas podiam conversar, tirar dúvidas e partilhar tudo o que achassem interessante, divertido e relevante para o grupo teve esse mesmo objetivo. Ainda mais notável, esse servidor permitiu que com cada um na sua sala individual (com nomes temáticos), pudesse ver todos os outros presentes e até espreitar o que cada um estava a fazer. Na sessão especial do Dia das Bruxas, por exemplo, reunimo-nos todos no Castelo Assombrado no início da sessão e cada ninja foi para uma sala com o seu mentor, entre as quais, a Casa Abandonada, o Cemitério de Esqueletos, o Quarto dos Palhaços, a Loja dos Doces, o Parque dos Zombies, etc.. Os ninjas (e nós também) através das sessões tiveram sempre a oportunidade de fazer novos amigos com o mesmo gosto por tecnologia e programação. Às vezes, a timidez não ajudava muito, mas sempre haviam ocasiões onde isso era mais provável, como o lanche a meio da manhã. O que optamos por fazer foi condensar o tempo de trabalho e utilizar o final para que todos os ninjas apresentassem os seus projetos uns aos outros. Estas apresentações, que já não fazíamos há algum tempo, mostraram-se muito gratificantes para os ninjas que se esforçaram sempre até ao último minuto para acertar aquele pormenor de personalidade que os ia deixar ainda mais orgulhosos dos seus resultados. Além dos novos desafios, existem outros que sempre existiram e, à medida que o CoderDojo Braga foi crescendo, as dificuldades de gestão também. O bom funcionamento do Dojo sempre se baseou na capacidade de organização dos seus voluntários que se entregam de corpo e alma à causa e o nosso lado preguiçoso de programador sempre nos leva a procurar uma solução em que tenhamos de trabalhar o menos possível. A ideia de construir uma plataforma que facilitasse ao máximo a gestão das sessões, mas também centralizar os registos do progresso de cada ninja surgiu há muito tempo e tentativas anteriores existiram. No entanto, só este ano foi possível e em simultâneo lançamos a primeira versão do nosso website que continuará a ser melhorado ao longo do tempo, assim como a plataforma, através do desenvolvimento colaborativo pelo GitHub. Esta plataforma, além de centralizar o registo dos ninjas e as suas inscrições, traz também um sistema de crachás que os ninjas poderão colecionar ao longo do seu percurso no Dojo. A plataforma está dividida em dois repositórios (ambos públicos e acessíveis na página da organização do CoderDojo Braga no GitHub), o Shuriken e o Bokken, nomes inspirados em armas japonesas utilizadas por ninjas, contendo o frontend e a API de suporte à plataforma, respetivamente. Esta será a base para o regresso às sessões presenciais de que tanto sentimos falta.
/ATIVIDADES/ Escrito por Filipe Felício
PERIFÉRICO
filipe.felicio.1999@gmail.com
No ano que agora termina, o Centro de Estudantes de Engenharia Informática da Universidade do Minho decidiu relançar o seu podcast - Periférico - com dois anfitriões estreantes: eu, Filipe Felício, e o Nelson Estevão. Nesta temporada, alteramos a metodologia dos 8 episódios que gravamos e convidamos pessoas relevantes da indústria informática e/ou da comunidade académica para uma conversa relaxada sem tópico definido que passou sempre pela paixão conjunta pela tecnologia, assim como o trabalho notável e percurso único de cada um dos convidados. Tivemos um espetro variadíssimo de convidados, entre os quais: - Um ex-aluno do nosso curso que trabalha em Londres; - O criador da linguagem de programação Lua, professor universitário e investigador na PUC Brasil; - O criador da linguagem de programação Elixir, que tirou a licenciatura no Brasil, o mestrado em Itália e hoje vive e trabalha na Polónia; - Um amante de Linux lisboeta que criou o maior wrapper de um package manager de uma distro: um projeto inicialmente inofensivo para aprender uma linguagem de programação e que hoje tem 6,8k de estrelas no GitHub. Adicionalmente, durante o seu percurso académico no técnico de Lisboa estudou em intercâmbio em Seoul. Hoje vive em Paris; - Um game dev minhoto que trabalha na Epic Games em Londres.
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E muitos outros, todos eles pessoas fantásticas com histórias de sucesso incríveis. Se quiserem saber mais, fiquem atentos ao lançamento dos episódios desta temporada. Um facto curioso foi que, apesar de todos os episódios terem sido gravados na língua lusa, os fusos horários entre os participantes praticamente nunca estiveram sincronizados. Em primeiro lugar, porque durante a maior parte das gravações eu estava na Finlândia de Erasmus e, em segundo, porque os nossos convidados estavam espalhados pelo mundo. De todas as atividades em que tive a oportunidade de participar e contribuir no Centro, esta foi aquela que destaco como a que me enriqueceu mais pessoalmente. Foi incrível ter a oportunidade de conhecer e aprender com indivíduos tão bem sucedidos nesta área, através desta plataforma. O sucesso desta iniciativa é fruto, também, da qualidade do trabalho de todas as pessoas que contribuíram para o CeSIUM, ao longo dos nossos 26 anos, e que dele fizeram algo conhecido e influente. Através de cada história pessoal que fui conhecendo ao longo dos episódios, apercebi-me o quão universal são as experiências das pessoas que trilharam o caminho que cada um de nós está a fazer. Apercebi-me, também, que somos enormemente sortudos pela área em que estamos, onde existem muitas oportunidades para cada um fazer, tendo em conta os nossos objetivos singulares, caminhos de sucesso naquilo que mais gostamos. Não posso terminar este resumo sem deixar um enorme agradecimento aos dois colegas que trabalharam diretamente comigo no projeto: o Nelson Estevão (que já mencionei) e o Francisco Lira (que contribuiu e produziu os episódios), assim como toda a fantástica equipa do CeSIUM que ajudou em todas as fases. Recomendo vivamente conhecer cada uma destas histórias e fiquem atentos, porque brevemente vamos começar a gravar a próxima temporada!
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/ATIVIDADES/
CLUBES
2021
Quarta-feira, dia 23 de junho, o Departamento Recreativo do CeSIUM inaugurou os clubes. Por definição, um clube é compreendido como uma sociedade criada por um grupo de pessoas que partilham certos interesses levando a cabo atividades culturais, recreativas ou desportivas. Os clubes apresentados pelo departamento tendem a seguir essa definição abordando áreas de interesse desde anime, desenho, eletrónica, gaming a assuntos relacionados com a comunidade LGBTQIA+, entre outras. Por terem surgido numa era de pandemia, os eventos realizados pelos clubes tiveram de ser restringidos e todas as atividades a realizar teriam de decorrer online através do Discord do Núcleo.Atualmente existem 9 clubes em funcionamento. No entanto, há sempre a possibilidade de serem inaugurados novos desde que exista um número mínimo de membros. É permitida a todos os membros já inscritos num clube a inscrição em qualquer um dos restantes, visto que não há exclusividade entre clubes. As inscrições são ilimitadas, oferecendo a oportunidade de todas as pessoas pertencerem a um clube em qualquer momento. A cada clube encontra-se associado um responsável do Departamento Recreativo de forma a garantir que o mesmo e as atividades associadas funcionem conforme o desejado. No que diz respeito ao bom funcionamento dos clubes foram criadas, pela organização, um conjunto de regras que visam o respeito entre membros. Destaca-se a proibição relacionada com ataques pessoais, qualquer tipo de discriminação, discursos de ódio e a partilha de conteúdos menos adequados. Todas as regras podem/devem ser consultadas, mesmo antes de qualquer inscrição em qualquer um dos clubes existentes. Por último, é importante destacar a criação e introdução de um bot exclusivo no servidor que facilita a gestão e aprovação das inscrições dos membros no clube. Esta deveu-se a alguns membros da organização, o que demonstra empenho na realização desta atividade. O objetivo dos clubes inclui aumentar as relações interpessoais e criar uma integração segura e saudável não só entre pessoas pertencentes ao Centro de Estudantes de Engenharia Informática da Universidade do Minho, como também a pessoas que pertençam simplesmente à comunidade académica. Apesar da reduzida atividade e da falta de eventos nos clubes, a organização espera que esta fase, em que tudo funcionou à distância, não passe mesmo disso (apenas uma fase) e que se possa ver o crescimento dos clubes, assim como o crescimento do núcleo, com a realização de todas as atividades dos diversos departamentos.
Escrito por Leonardo Freitas
leonardo1924miei@gmail.com
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/CURSO/
REGRESSO À NORMALIDADE O “regresso à normalidade” é umas das expressões mais utilizadas nos últimos tempos, com a devida razão. Ninguém diria que um vírus oriundo do Oriente iria entrar em voga pelo mundo inteiro e, com ele, trazer um rastro de consequências negativas. Não foi fácil estar um ano e meio condicionado e restrito de muitas das nossas liberdades, mas enfrentamos o problema da melhor forma que soubemos e tudo se foi amenizando. Hoje, podemos estar perante a luz ao fundo do túnel. Esta nova etapa é insólita para todos nós. Não nos atiramos de cabeça, vamos molhando os pés na água bem devagarinho e avançando com naturalidade, até ao ponto de já não nos recordarmos da sensação inicial. Aos poucos, as máscaras irão desaparecer, os cumprimentos serão suavizados e o contacto, inerente ao ser humano, voltará em força. A chamada “vida normal” reaparece. Tudo o que envolve a vertente social das nossas vidas florescerá novamente. Podemos esperar talvez uma euforia inicial, misturada com a estranheza dos velhos costumes. As saudades apertam, o cansaço mental de tanta restrição já é sentido e os sorrisos cobertos estão ansiosos por se libertarem. Para todos os estudantes, haverá uma revolução. Não é que as ferramentas utilizadas para substituir o ensino presencial tenham sido totalmente ineficazes, aliás, em alguns casos, foram tão bem sucedidas que vieram para ficar. Mas o ensino presencial é diferente e, em muitos casos, imprescindível. A intuição do professor em perceber pela expressão facial ou linguagem corporal o entendimento do aluno é também ela insubstituível. Para os mais pequenos, a diferença já foi notada: estão com mais problemas de comunicação e mais atrasados no desenvolvimento. Este regresso vem, portanto, em boa hora. A vida académica em geral foi totalmente destroçada no último ano. Felizmente, o espírito dos estudantes mantém-se e, com ele, certamente não demorará muito para que todos os campi estejam vivos e alegres novamente. No trabalho, encontraram-se soluções viáveis à distância e essas soluções vão moldar o comportamento futuro. Se já se antecipava um crescimento desta forma de trabalhar, a pandemia só a veio impulsionar. Estilos de vida como o nomadismo digital já não são uma miragem, existem e multiplicam-se cada vez mais. Aumentando a popularidade, é possível mudar completamente o conceito do trabalho. Apesar disso, a tendência por agora é para a tal “normalização”, a retoma dos velhos hábitos. No entanto, aquele que vive o presente e planeia o futuro nunca será completo se não revir o passado. É importante, neste regresso, manter bem acesas as dificuldades pelas quais a pandemia nos fez passar e adaptar o nosso pensamento. Eventos tão ou mais impactantes podem voltar a ocorrer e é importante estar mais preparado do que anteriormente. Podemos também ter, agora, mais presentes pequenos comportamentos de contenção de infeção. Desinfetar as mãos mais regularmente ou usar uma máscara para conter uma doença não são invenções da era Covid, são apenas práticas que se associaram à mesma. Manter algumas delas em contextos específicos permitirá a manutenção de uma população saudável. O mais importante é, contudo, aproveitar esta nova etapa com responsabilidade, valorizando ainda mais tudo aquilo que nos foi retirado forçadamente neste espaço de tempo. Escrito por Tiago Soares
xtiagosoares@gmail.com
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/CURSO/ Escrito por Catarina Machado
catarinamachado11@gmail.com
A entrada na Academia Minhota proporciona-nos uma nova realidade. É uma nova etapa, um novo local, novas pessoas, novos horários, novas experiências, novas rotinas. Deparamo-nos com um mundo novo repleto de desafios onde nos concerne apenas a nós próprios usufruir ao máximo desta jornada. Temos agora um curso superior para realizar, “trabalhoso”, como todos dizem, que necessita de muita dedicação e esforço. Contudo, vamos sair todos da universidade com o mesmo curso. Como é que eu me posso diferenciar? Porque é que as empresas me devem escolher a mim e não a outros colegas? Será que posso fazer algo mais para além do curso? Que vantagens a nível pessoal e profissional é que isso me poderá trazer? É aqui que entra o Associativismo: Núcleos de Estudantes, Júnior Empresas, Associação Académica, Secções de Estudantes, Voluntariado, Grupos Culturais, entre várias outras iniciativas que existem na Universidade do Minho. Quando integras uma destas comunidades, um mar de experiências ficam agora à tua mercê. É a oportunidade perfeita para fazeres algo pelo próximo e pela sociedade - o sentimento de nos sentirmos úteis. É a oportunidade perfeita para desenvolveres as tuas capacidades de relações interpessoais, as tuas capacidades de comunicação e a capacidade de lidar e contactar com pessoas dos mais diversos perfis. Num curso com uma componente técnica tão acentuada e onde as hard skills são o principal foco, é o teu momento para desenvolveres as tuas soft skills. No associativismo, podes e deves pensar de forma diferente, podes organizar eventos e ter o desafio de gerir pessoas e liderar equipas. Aprendes inevitavelmente a gerir melhor as tuas tarefas e o teu tempo e podes, ainda, descobrir capacidades e valências sobre ti que desconhecias. O tempo é limitado, é verdade. Mas a forma como tu aproveitas o teu percurso académico vai marcar e muito o resto da tua vida. Estes projetos têm imensa procura por colaboradores interessados. Normalmente, no início de cada ano letivo, estes núcleos, secções e delegações publicam formulários de recrutamento e estão sempre disponíveis por e-mail, onde te poderão indicar quais as oportunidades que têm em aberto. Tal como na Matemática, se só te ensinarem a somar, tu só vais saber, no máximo, somar. Mas se te ensinarem a somar, subtrair e multiplicar, os teus horizontes estarão mais alargados. Mesmo que não fiques a saber todas essas operações, as possibilidades aumentam e “somar” fica a ser o mais simples, não o limite dos teus conhecimentos. Na vida real acaba por ser semelhante. Porquê só somar as cadeiras feitas quando podes multiplicar todas as tuas skills? Que desperdício!
O ASSOCIATIVISMO 29
A HISTÓRIA DE PROMETEU
/CURSO/ Escrito por Marco Pereira
marcopereiravpa@gmail.com
Antes da existência do Olimpo, tudo era governado por titãs e não pelos deuses que conhecemos, como Zeus, Hades e Poseidon. A titanomaquia, guerra entre os deuses e os titãs, foi a última grande guerra pelo poder total. Os titãs eram controlados por Kronos, o lorde dos titãs, enquanto os deuses eram liderados pelo seu filho, Zeus, o deus dos céus e do trovão. Esta guerra foi ganha pelos deuses e tal foi apenas possível devido aos esforços de Prometeu, o titã de fogo, que traiu os seus companheiros aliando-se a Zeus. Após esta guerra, Zeus, aborrecido ao ver a Terra vazia, decidiu pedir ajuda a Hefesto, o deus da forja, e Prometeu para povoar a Terra com várias criaturas dando a cada uma, uma característica especial que a diferenciasse das outras. Prometeu concebeu as ideias e Hefesto usou a sua forja e barro para criar as várias criaturas. Às aves foi dada a possibilidade de voar, aos peixes a possibilidade de respirar debaixo de água, às tartarugas uma carapaça para se protegerem, etc.. Após todas as criaturas serem criadas, Prometeu decidiu criar os humanos, no entanto, já tinha garantido todas as características especiais às criaturas anteriores e, por isso, os humanos foram criados sem asas, guelras ou carapaça. Por esta razão, Prometeu sentiu uma grande responsabilidade de cuidar deles e de os ajudar a ser bem sucedidos. Prometeu ajudou os humanos de duas formas diferentes que levaram à sua queda. Os humanos haviam sido chamados por Zeus para este decidir que tipo de oferenda queria que fosse feita em sua honra, de um lado estava a carne dos animais e de outro estavam os ossos e a gordura. Prometeu, sendo símbolo de previsão, sabia que Zeus ia escolher a carne, por isso, antes do encontro, ele modificou a aparência da gordura e dos ossos, de modo a que estes fossem brilhantes e mais apelativos do que a carne apresentada. Zeus foi apanhado pela artimanha e escolheu a gordura e os ossos que não tinham grande utilidade para os humanos (esta é a justificação dada para as oferendas aos deuses terem sido maioritariamente ossos e gorduras). Zeus veio mais tarde a saber disto e ficou bastante descontente com o engenho que enganou o Rei dos Deuses e, por isso, decidiu proibir os humanos de utilizar o fogo, obrigando-os a comer a carne crua como castigo. Prometeu não conseguiu ficar imparcial ao ver isto acontecer e decidiu agir, mais uma vez, a favor dos humanos, enganando os deuses e roubando o fogo do Olimpo para oferecer à sua criação. Algum tempo passou, mas Zeus acabou por descobrir o que tinha sido feito por Prometeu e, como tal, decidiu castigá-lo. O castigo de Prometeu foi a condenação a uma eternidade agoniante acorrentado a uma pedra (como visto na estátua à entrada da Universidade), sendo que, todos os dias, uma águia aparecia e comia o seu fígado. Contudo, como este é uma divindade, o seu fígado regenerava mesmo a tempo do dia seguinte, fazendo com que tudo se repetisse dia após dia. A nossa história podia terminar aqui com Prometeu a sofrer, mas este acaba por ser salvo, após muitos anos, pelo herói grego mais conhecido, Hércules/ Héracles, durante uma das suas aventuras. Mas isso é uma história para outra altura, talvez até mesmo para um outro artigo…
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Após analisarmos a história de Prometeu, podemos ver que este possui algumas semelhanças com Jesus Cristo, o salvador da religião cristã. Ambos com ligação a um Deus se sacrificaram para a continuação da espécie humana, pela qual tinham um especial carinho, e acabaram por renascer. A estátua de Prometeu que vemos à entrada da Universidade está lá como um símbolo de perseverança e de confronto com os “Zeus” deste mundo na defesa dos ideais que consideramos corretos. O fogo que vemos na mão da estátua representa a fome de conhecimento e a incessante procura pelo mesmo que se estende a todos os estudantes da mui nobre academia minhota. Apesar de ser uma referência metafórica existe uma teoria conhecida como “expensive gut hypothesis” que dita que parte da razão pela qual os seres humanos desenvolveram um cérebro tão poderoso foi a diminuição da energia gasta na digestão de comida, diminuição esta que advém de a comida ter passado a ser cozinhada, o que facilitou bastante a ingestão dos bens alimentares.
REPRESENTATIVIDADE NOS MEDIA
Escrito por Sofia Santos
sofiarsantos31@gmail.com
Um Capitão América Negro, uma equipa feminina de Ghostbusters, uma Cinderela latino-americana… Estes são apenas alguns exemplos recentes de alterações de personagens em relação às suas versões originais por uma questão de “diversidade”. Coloco esta expressão entre aspas, pois, para muitos, não passa de uma tentativa dos grandes estúdios de Hollywood de ganhar dinheiro, reciclando velhas histórias para uma audiência mais moderna. Se isso é mesmo verdade ou não é uma conversa para outra altura. Agora, eu quero falar sobre a importância da representatividade, nomeadamente nos media. Mesmo que seja apenas consequência do capitalismo e não uma decisão intencional, não podemos ignorar a sua importância, principalmente para as crianças e jovens que não se encaixam na categoria de homem branco, hétero e cis. Quando digo isto, não é de forma maliciosa nem insultuosa. Aliás, eu passei a minha infância a pensar que me encaixava nestas quatro categorias, daí reconhecer o “privilégio” que tive neste aspeto. Contudo, este privilégio levou a que eu demorasse anos a descobrir quem era, já que o meu conhecimento de pessoas fora da “norma” era praticamente nulo. Podia culpar o nosso sistema de ensino, que se poderia focar mais em questões sociais, ou podia culpar os meus pais, por nunca terem falado comigo sobre estes temas, e provavelmente não estaria errada, mas ignorar o papel dos media nisto tudo é subestimá-los. O seu papel no meio disto tudo é muito maior do que parece. Quando as crianças dizem que querem ser médicos, astronautas, polícias, etc. não é porque viram estas pessoas a trabalhar ao vivo ou porque fizeram um teste vocacional… Não, eles apenas viram pessoas com estas profissões num filme, numa série ou num videojogo e acharam que era a coisa mais incrível de sempre. É verdade que uma grande parte acaba por escolher outra carreira, principalmente aqueles que dizem que querem ser o próximo Cristiano Ronaldo, mas isso não significa que estes sonhos não valham para nada.
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/PENSAMENTOS/ As crianças que querem ser astronautas, por exemplo, têm um grande interesse pelo espaço que, mais tarde, pode levar a que escolham ir para um curso nas áreas STEM, tal como as crianças que sonham em ser médicos, muitas tornam-se pessoas mais empáticas, com o desejo de ajudar outros, mesmo que não acabem a trabalhar num hospital. Vemos assim que os media nos moldam desde a nossa infância e com este grande poder vem uma ainda maior responsabilidade. Quando eu era criança, o conceito de “transgénero” não existia, a coisa mais próxima que havia era “travesti”, que se resumia à última página do Correio do Minho (um jornal cuja última página é dedicada a anúncios de prostituição). Eu sabia que era diferente das outras crianças, principalmente dos outros rapazes, mas, sem o vocabulário exato, era impossível descrever exatamente em que sentido. Foi só em 2013, com a Casa dos Segredos, que descobri que era possível “mudar de sexo”. Um dos concorrentes era um homem trans e, quando o seu segredo foi revelado, foi como se uma alavanca tivesse sido puxada na minha cabeça. Finalmente comecei a perceber quem eu era! Apesar disso, não contei a ninguém, nem à minha família. O que é que seria da minha vida se fosse em frente com esta transição? Na minha cabeça, as pessoas trans estavam destinadas à prostituição ou a aparecer em reality shows, nunca seriam nada mais do que atrações de circo. Ainda para mais, o meu curso de sonho era Engenharia Informática, um curso “de rapazes”, como é que eu poderia ser uma rapariga e querer ir para um curso destes?! Uns anos mais tarde, comecei a ver uma série da Netflix chamada Sense8. Sem dar muitos spoilers, é uma série sobre um grupo de 8 pessoas que ganham uma ligação telepática, passando assim a conseguir comunicar e sentir o que os outros membros do grupo sentem. Um dos membros deste grupo é uma mulher trans, a Nomi. Contudo, ela é muito mais do que isto: ela é uma hacktivist, uma blogger e uma namorada. Por outras palavras, ela não se resume à sua transexualidade, algo que eu nunca tinha visto antes. Foi graças a ela que eu ganhei a confiança para iniciar a minha própria transição. Eu podia ser mais do que um adjetivo! Eu podia ser uma mulher e engenheira informática! Eu podia ser eu! Se eu tivesse sido exposta a personagens como a Nomi mais cedo na minha vida, tenho a certeza que teria descoberto quem era antes de ter vivido uma adolescência cheia de dor e sofrimento. Muitas vezes, o conteúdo que nós vemos reflete quem somos, sentimo-nos naturalmente atraídos a personagens com as quais nos conseguimos identificar, é como se estivéssemos a olhar para um espelho. O problema ocorre quando o espelho está vazio. Se nem sequer conseguimos ver o nosso próprio reflexo, como é que é suposto sabermos quem somos? Felizmente, tem-se visto cada vez mais diversidade nos media. Ainda temos um longo caminho a percorrer, principalmente no que toca à representação de pessoas neurodivergentes, por exemplo, mas o progresso feito nas últimas décadas tem sido impressionante, mesmo que tenha sido, na sua maioria, consequência da ganância dos milionários. Os jovens trans dos dias de hoje têm acesso a séries como Supergirl, Euphoria, Chilling Adventures of Sabrina, entre muitas outras, onde podem ver alguém como eles, personagens com mais do que uma dimensão, com as quais se conseguem identificar e admirar, por muito que isso possa irritar uma certa parte da população. Um último ponto que quero salientar é que muita gente usa a diversidade como bode expiatório para más histórias. Sempre que um filme ou série é menos bom e inclui pelo menos uma minoria, a culpa cai sempre na “inclusão”. Sim, é possível que uma história seja menos boa por causa de uma personagem, ninguém está a dizer que não, mas na grande maioria dos casos o problema está no guião e em argumentistas que não sabem como verdadeiramente representar certos tipos de pessoas. É, assim, importante que também haja mais diversidade por detrás do ecrã e deixar de a usar como desculpa para um filme ou série ser mau. Infelizmente, vão sempre existir filmes que dão vontade de sair da sala de cinema, com ou sem diversidade, mas qualquer tipo de representatividade é melhor do que nenhuma e para uma criança que está a tentar descobrir quem é faz um mundo de diferença!
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/PENSAMENTOS/
2022 THE YEAR OF
LINUX GAMING No dia 25 de agosto, a comunidade Linux celebrou o 30.º aniversário do seu sistema operativo preferido! Durante muitos desses anos, a mesma comunidade tem vindo a brincar sobre o Ano do Linux Desktop, afirmando sempre que “este” será finalmente “o ano”. Sabemos que isso ainda não se tornou realidade e não parece que tal marco seja atingido em breve, mas 2022 poderá ser o Ano do Linux Gaming! Para muitos, a única razão que os impede de mudar para o Linux é a incapacidade de jogar os seus jogos favoritos facilmente e com bom desempenho. Algo que tem sido difícil e, não há muito tempo, praticamente impossível, devido a software anti-cheat e DRM, más implementações de Linux ou simplesmente nenhuma implementação de Linux, entre outras razões. Há muito a acontecer para fazer do Linux um sistema operativo sério para jogos, mas a Valve, uma empresa desenvolvedora, editora e de distribuição digital de videojogos, tem sido definitivamente quem está a empurrar os limites do Linux Gaming. Gabe Newell, o Presidente da Valve, saiu da Universidade de Harvard para trabalhar para a Microsoft, em 1983. Lá, trabalhou durante 13 anos, servindo como produtor dos três primeiros lançamentos do Windows. Também ajudou a fazer do Windows uma plataforma de jogos viável quando liderou o desenvolvimento de uma implementação de Doom para Windows 95. Agora, ele e a sua empresa estão a trabalhar no sentido de também fazer do Linux uma plataforma de jogos viável. Com a chegada do Windows 8, em 2012, a Microsoft Store apresentou uma ameaça para a loja Steam da Valve. Gabe Newell também expressou o seu descontentamento com o Windows 8 e com a estratégia da Microsoft de “fechar” a plataforma (algo que não parece mudar, mesmo no próximo Windows 11). Por conseguinte, a Valve abraçaria o Linux como uma “estratégia de cobertura” concebida para compensar alguns dos danos que o Windows 8 iria provavelmente causar. A Valve começou por desenvolver o SteamOS e criar as Steam Machines, uma série de gaming PCs de pequeno formato pré-construídos. Mas, em 2015, era evidente que as Steam Machines tinham falhado. Isto deveu-se à falta de disponibilidade de jogos no Linux em combinação com a imaturidade geral da plataforma. Escrito por Carlos Ferreira
carloshsf3899@gmail.com
/PENSAMENTOS/
Sendo assim, depois de não conseguir impulsionar os jogos em Linux com uma distribuição dedicada e uma série de computadores, o que faria de 2022 o Ano do Linux Gaming? A resposta é o Steam Deck. Um computador de mão para jogos, desenvolvido pela Valve, que deverá ser lançado em dezembro de 2021. Mas, mais uma vez, como poderia ter sucesso onde as Steam Machines falharam? A resposta é SteamOS 3.0, Proton e suporte para soluções anti-cheat. Com SteamOS 3.0, SteamOS já não será baseado em Debian, mas sim em Arch. Onde o Debian visa a estabilidade sobre o software atualizado, as atualizações contínuas do Arch permitem à equipa da Valve um desenvolvimento mais rápido. Proton é uma camada de compatibilidade para que jogos Windows corram em sistemas operativos baseados em Linux. É desenvolvido pela Valve em cooperação com programadores da CodeWeavers sob contrato. É baseado num fork de Wine e inclui vários patches e bibliotecas para melhorar o desempenho e a compatibilidade com jogos Windows. Finalmente, a Valve está a melhorar o suporte para soluções anti-cheat, trabalhando diretamente com os fornecedores e espera-se que o Easy Anti Cheat e o Battleye sejam finalmente suportados em Linux. Com tudo isto, a Valve pretende aproximar-se o mais possível da cobertura total dos mais de 10.000 jogos vendidos na Steam até à altura do lançamento do Deck. Isto é, então, o que poderá trazer mais jogadores para o Linux, mas os números já estão a aumentar! Em agosto de 2021, o Linux ultrapassou a quota de 1% de utilizadores na Steam, resultando num aumento constante que, em setembro do mesmo ano, ainda não desceu.
/PENSAMENTOS/
3D
O MUNDO EM
Encontro-me há cinco anos no curso de Engenharia Informática e, durante todo esse tempo, foi-me possibilitado o acesso a várias facetas do ramo que podemos vir a seguir assim que concluirmos o curso. A meu ver, sempre houve uma maior divulgação de certas áreas da informática do que outras. Dito isto, hoje vou falar de uma área da informática pela qual tenho um grande fascínio e na qual tenho alguma experiência, sendo esta a área da modelagem 3D. Alguns irão discordar com a afirmação “Modelagem 3D faz parte do ramo da informática” mas, na minha opinião, essas pessoas estão erradas. A modelagem 3D requer alguns conhecimentos de computação gráfica, uma cadeira lecionada no terceiro ano do curso, e é geralmente utilizada na indústria de videojogos. Porém, esta componente da computação gráfica não se encontra presente apenas na indústria de videojogos. Grandes empresas de animação, tais como a Disney e Dreamworks, investiram no desenvolvimento da indústria 3D, mesmo antes dos avanços tecnológicos que nos facilitam trabalhar nesta área. Num exemplo mais extremo, a franquia Matrix foi o verdadeiro veículo que catapultou a popularidade e o desenvolvimento da indústria 3D e da computação gráfica. Por outro lado, a modelagem 3D também é muito utilizada no marketing de empresas e publicidade. Numa pequena introdução, comecei a trabalhar com modelagem 3D quando instalei um software chamado Blender, no qual comecei a fazer alguns pequenos projetos, como fazer uma scene de um doughnut com um bule de chá ao lado ou de uma mesa rodeada por quatro cadeiras. À medida que fui avançando, reparei no enorme potencial que esta área traz e, aos poucos, fui tentando ensinar-me a mim mesmo através da documentação online e de alguns vídeos na internet. Passado alguns meses, notei o quão complexo o processo de fazer um modelo e conseguir utilizá-lo num game engine é. Neste artigo, irei abordar superficialmente alguns aspetos deste processo, para demonstrar o que vos espera se pretenderem seguir esta área.
Escrito por Rui Armada
ruifparmada@gmail.com
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/PENSAMENTOS/ Usando uma qualquer ferramenta de modelagem (Zbrush ou Blender, por exemplo), é possível gerar um modelo detalhado. Porém, um bom artista 3D é capaz de manter esse detalhe, após transformar o modelo de alta resolução num modelo de baixa resolução. Para explicar melhor este último ponto, é importante mencionar que todos os objetos 3D são criados a partir de quadrados e triângulos e cada um destes conjuntos de quadrados ou triângulos é denominado por “polígono”. É aqui que alguns conhecimentos de computação gráfica entram em jogo - os game engines da atualidade são extremamente avançados e têm muita potência, contudo, estes ainda apresentam dificuldades em renderizar em real time um modelo de alta resolução, isto é, um modelo com um elevado número de polígonos. Em modelagem 3D um bom artista é aquele que consegue construir objetos detalhados utilizando poucos triângulos/quadrados para que o engine tenha facilidade no real time render que tem de efetuar durante o jogo/animação. Em suma, quantos mais triângulos/ quadrados existirem numa scene, pior será o desempenho do engine. Com isto, é necessário encontrar outras abordagens para evitar este problema. Felizmente, as ferramentas disponíveis atualmente possuem uma funcionalidade incrível que é a transferência de detalhes de um modelo para o outro. Assim, o método adotado pela comunidade consiste em primeiro fazer um modelo de alta resolução, para depois criar uma cópia do mesmo e refazer a estrutura dos polígonos à mão (existem vários softwares para tal, mas pessoalmente uso o 3DS Max). Após refazer a estrutura do objeto, é efetuada uma subdivisão do modelo (divide-se o interior do polígono por quatro). “Mas isso não é a mesma coisa que ter um modelo de alta resolução?” perguntam vocês. De certa forma, a resposta é sim. O que se pretende fazer com a subdivisão é encontrar o número mínimo de polígonos que o objeto precisa para manter o detalhe. Feita a subdivisão, efetua-se a transferência dos detalhes de profundidade (basicamente o height map do modelo de alta resolução é transferido para o modelo de baixa resolução). Após a conclusão deste processo, iremos possuir um modelo com uma estrutura de polígonos mais acessível, para animar o objeto ou para o renderizar num engine, mantendo todo o detalhe de um modelo de alta resolução. Alguns de vocês podem pensar que todo este processo é aborrecido para simplesmente apresentar um objeto a ser renderizado em real time, mas acreditem que vale a pena quando veem aquela personagem em que vocês tanto trabalharam ganhar vida e começar a correr e a realizar outras ações dentro do engine. Após o processo de modelagem, é necessário criar as texturas e os mapas UV (basicamente transformar o objeto 3D num objeto 2D para aplicar as texturas) ou construir animações que o objeto possa executar. Como podem imaginar, o processo não é assim tão simples quanto fazer um objeto no Blender e colocá-lo no engine; é preciso considerar muitos aspetos e aplicar vários conhecimentos da área da informática. Concluindo, a modelagem 3D é uma das inúmeras facetas que o ramo da informática possui e, felizmente, uma que se tem tornado extremamente popular nos últimos anos. Espero que tenham aprendido algo com este artigo e espero ver alguns de vós a seguir esta área, tal como eu pretendo seguir, assim como ter a possibilidade de mostrar muito mais à comunidade de LEI+MEI.
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/CULTURA/
RECOMENDAÇÃO LITERÁRIA
MEMÓRIAS DO SUBTERRÂNEO “Eu sou um homem doente… Sou um homem mau. Sou um homem nada atraente. Penso que sofro do fígado. Aliás, não percebo patavina da minha doença nem sei ao certo de que é que sofro. Não me trato e nunca me tratei, embora respeite a medicina e os médicos.” Começa assim “Memórias do Subterrâneo”, uma das maiores obras de toda a literatura russa e um dos primeiros livros existencialistas da autoria do sensacional Fyodor Dostoevsky, em 1864. Não obstante, mais atual que nunca, a apostila, dividida em duas partes, em pouco mais de 100 páginas, consiste numa coletânea de memórias e reflexões por parte de um narrador sem nome, um oficial público reformado ressentido, melancólico e amargurado que vive num quarto nauseante no extremo de São Petersburgo - embebido na nojeira do “submundo” - onde é evidenciado o contraste entre a recém industrialização da cidade e o majestoso coração imperial da autocracia czarista. O primeiro terço deste fragmento, intitulado de “Subterrâneo”, consiste num monólogo introdutório à tese do narrador, começa com uma contemplação sobre sofrimento e o irracional prazer em sofrer e evolui para uma crítica viciosa e brilhante dos valores que estavam em ebulição na sociedade russa no final do século XIV, tais como Determinismo, Utopismo, Coletivismo e Racionalismo, que levaram à revolução bolchevique em 1917: “Em suma, pode-se dizer tudo acerca da história mundial, tudo o que pode ocorrer à cabeça da imaginação mais desordenada. Só há uma coisa que não se pode dizer - que ela é racional. A própria palavra fica presa na nossa garganta.” A segunda parte da história - “Por causa da Neve Húmida” - é um conjunto de memórias onde o “homem do subterrâneo” aprofunda estas ideias através de experiências da sua vida. Trata-se de uma leitura transformadora, transtornante e arrepiante no inevitável paralelismo e auto identificação na dor, sofrimento e ressentimento do protagonista, assim como no diagnóstico assustadoramente intemporal que marcou escritores e intelectuais desde a sua publicação, particularmente Friedrich Nietzsche. Escrito por Filipe Felício
filipe.felicio.1999@gmail.com
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/CULTURA/ Face a isso, trago a sua obra não como recomendação, mas sim como receita para uma academia de almanaques e “tabelas logarítmicas”. Uma universidade de axiomas matematicamente calculados e provados mentiras que não passam de máscaras para pseudo moralistas que desejam inserção social e mútua bajulação acima do diálogo pela verdade e do espírito crítico. Um corpo estudantil e docente “diverso” sem diversidade de pensamento. Que se considera prepotentemente superior, através da sua moral e do seu intelecto, face aos que os sustentam. Inútil, criando e satisfazendo necessidades, muitas vezes inexistentes, para benefício próprio, simultaneamente incapaz de satisfazer insuficiências reais, perpetuando uma sociedade falsa e pobre com vícios de cima a baixo e de dentro para fora: “(...) surgem continuamente na vida umas pessoas morais e sensatas, uns sábios e amigos da espécie humana, que têm precisamente como seu objetivo comportarem-se o mais possível de maneira moral e sensata, (...). E então? Sabe-se que muitos amantes da sensatez, mais cedo ou mais tarde, para o fim da vida se traíram a si mesmos, engendrando uma qualquer anedota por vezes até das mais indecentes. Agora pergunto-lhes: o que se pode esperar do homem como ser dotado de tão estranhas qualidades? Cubram-no de todos os bens terrenos, mergulhem-no de cabeça na felicidade, de modo tal que só algumas bolhas de felicidade venham à superfície; (...) deem-lhe abastança económica para que ele não tenha de fazer nada a não ser dormir, comer bolos e ocupar-se com a continuação da espécie - e ele, o homem, mesmo assim, só por pura ingratidão vos fará uma patifaria. Arriscará até os bolos e de propósito quererá o mais nocivo dos absurdos, o disparate mais antieconómico, apenas para misturar a essa sensatez positiva o seu nefasto elemento fantástico. Desejará conservar precisamente os seus sonhos fantásticos, a sua mais vulgar estupidez, unicamente para confirmar a si mesmo (como se isso fosse assim tão necessário) que as pessoas ainda são pessoas e não teclas de piano (...) mesmo no caso de o homem se mostrar uma tecla de piano, se isso lhe for provado pelas leis da natureza e da matemática (...) fará de propósito alguma coisa contra, apenas por ingratidão (...) inventará a destruição e o caos, inventará diversos sofrimentos e persistirá na sua!” Para mim trata-se de uma leitura obrigatória, sobretudo no clima em que vivemos. Assim termino de “despejar do oco para o vazio”.
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/CULTURA/
FANTASTIC MR. FOX Fantastic Mr. Fox é uma longa-metragem de animação em stop-motion, lançada em 2009, que nos convida a embarcar numa viagem deslumbrante pelo imaginário de Roald Dahl através da lente inconfundível de Wes Anderson! Esta conta com um elenco extraordinário que inclui George Clooney e Meryl Streep, bem como Bill Murray, Owen Wilson e Jason Schwartzman. Apesar de ter arrecadado duas nomeações para os Óscares nas categorias de melhor filme de animação e melhor banda sonora, acabou por não levar para casa nenhuma das estatuetas douradas. O filme conta-nos a história de Mr. Fox, uma raposa com um espírito indomável, a partir do momento em que descobre que vai ser pai. Surpreendido com a notícia, este, a pedido da sua companheira, compromete-se a deixar ficar no passado as suas aventuras perigosas e a arranjar um trabalho seguro. Passados 12 anos, Mr. Fox, deixando-se levar pelo seu instinto, decide quebrar a sua promessa e engendra o seu último golpe: um ataque às quintas dos malvados agricultores Boggis, Bunce e Bean. Apesar de ser baseado no livro infantil de Roald Dahl com o mesmo título, publicado em 1970, o enredo consegue criar uma harmonia que combina, de forma astuta, momentos cómicos e adoráveis com esporádicas reflexões sobre existencialismo e episódios de violência. Quem está familiarizado com a filmografia de Wes Anderson sabe que este tem um estilo único, principalmente no que toca à composição visual das suas obras cinematográficas. Do meu ponto de vista, é aqui que se encontra grande parte da magia do seu trabalho. Todos os seus filmes são um verdadeiro deleite visual e este não é exceção! Nesta longa-metragem somos presenteados com cenários incrivelmente detalhados onde nada é deixado ao acaso. É de realçar a presença praticamente constante da simetria na miseen-scène e a magnífica paleta de cores, duas das imagens de marca do realizador.
Escrito por Ana Sofia Gomes
sofiamgomesgomes@gmail.com
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/CULTURA/
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As escolhas artísticas de Anderson, além de deliciarem os espectadores, são inacreditavelmente intencionais. Por exemplo, o esquema de cores utilizado é maioritariamente outonal (foco nos amarelos, laranjas e castanhos), descartando praticamente a utilização de cores como verde e azul. Contudo, uma das personagens possui uma camisa azul de modo a enfatizar o facto de esta ser uma visitante temporária. A acrescer a isto, diversos cenários possuem homenagens visuais a Roald Dahl, como é o caso do escritório de Mr. Fox que não é nada mais nada menos do que uma réplica exata do escritório do autor. Fun Fact: Foram utilizados algodão e película aderente para recriar fumo e água, respetivamente. Se neste momento estás a pensar: “Mas afinal quem é Wes Anderson mesmo?”. Well… Esta é a tua deixa para fazeres uma taça de pipocas, sentares-te à frente da televisão e deixares-te envolver pelo seu universo extraordinário!
A DIETA CETOGÉNICA (KETO) A dieta cetogénica é uma dieta que consiste no consumo elevado de gordura e muito baixo em hidratos de carbono. Curiosamente, surgiu em 1920 para tratar epilepsia em crianças e continua a ser bastante utilizado no tratamento desta doença. Contudo, ao longo dos anos, ganhou muita adesão devido à sua eficácia na perda de peso. Isto provavelmente levanta algumas questões: “Mas então gordura não engorda?”, “Mas os hidratos são a fonte principal de energia, como posso eu deixar de os consumir?”. Espero que este artigo contribua para o esclarecimento destas dúvidas. Sempre nos disseram que os hidratos de carbono são essenciais e são a fonte principal de energia do nosso corpo. Mas será que é mesmo verdade? Sim e não. É incontestável que o nosso corpo sabe usar os hidratos de carbono, mais propriamente a glicose, como energia e o faz geralmente, mas o que acontece se não os consumirmos? Será que ficamos sem energia ou o nosso corpo é mais inteligente que isso? Aí está a parte central da questão. Sem dúvida que o nosso corpo usa primariamente glicose, com um pequeno senão. Se o corpo estiver a realizar um mecanismo designado por Cetogénese (Ketosis), a fonte principal de energia deixa de ser a glicose, pois esta não está presente. Mas afinal o que é Cetogénese? Cetogénese é um processo que ocorre na ausência de hidratos de carbono suficientes para produzir energia. Consequentemente, passamos a utilizar corpos cetogénicos. Esses corpos são produzidos pelo fígado através da metabolização da gordura e, depois, podem ser utilizados como energia pelo corpo. A dieta cetogénica permite que o corpo esteja sempre a realizar a cetogénese, mas não é apenas através desta dieta que este fenómeno ocorre. Qualquer pessoa realiza este fenómeno na ausência de hidratos de carbono, o que inclui períodos de jejum ou exercício prolongado. Posto isto, fica mais claro como é que alguém que realiza esta dieta não se anda a arrastar pelo chão. Os corpos cetogénicos são bastante energéticos e grande parte das pessoas diz ter mais energia e claridade mental durante a realização desta dieta. São imensas as vezes que alguém diz “Eu não conseguia fazer essa dieta. Fico cheio/a de fome se não como hidratos”. Isto é certamente verdade durante a fase de adaptação. Para quem está habituado a consumir hidratos, quando não os consome, fica com valores de glicose no sangue bastante baixos e sente necessidade de comer mais.
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/LIFESTYLE/ Essas variações de glicose no sangue provocam fome, tonturas, cansaço e muitos outros sintomas desagradáveis. Sentimos que se não comermos, vamos desfalecer. Na minha opinião, não sentir nada disto ao longo do dia é uma das maiores vantagens da dieta cetogénica. Não ter flutuações abruptas nos níveis de açúcar e sentir saciedade durante o dia inteiro, mesmo não comendo há horas, é um conforto dificilmente atingível por outras dietas. Durante a fase de adaptação é normal sentir falta de energia e fome excessiva, mas, após este período, designado por Keto Flu, os benefícios da dieta passam a ser percetíveis. Realizar esta dieta implica dizer adeus ao arroz, à massa, à batata, ao pão, à aveia e qualquer alimento com bastantes hidratos de carbono. Os melhores amigos passam a ser carne, ovos, laticínios, azeite, abacate, coco, peixes gordos, frutos secos, etc.. Claro que fruta e legumes, salvo aqueles muito elevados em hidratos de carbono, como a banana, continuam a fazer parte da alimentação. Keto é de fácil adesão para a maior parte das pessoas, uma vez que não se sente praticamente fome nenhuma, ao contrário da maior parte das dietas, e é possível comer alimentos que são “proibidos” por estas. Claro que, para quem gosta mesmo de comer um arroz de tomate e uma torrada com manteiga, pode ser mais difícil de aderir, mas, pelo menos, o tomate e a manteiga podem-se comer! Algum nível de ceticismo é certamente esperado, uma vez que esta dieta parece contrariar tudo o que ouviram até agora sobre nutrição. Contudo, os benefícios a curto e longo prazo desta dieta estão bastante fundamentados com investigação que poderão consultar.
Escrito por Matilde Bravo
matildeopbravo@gmail.com
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/LIFESTYLE/
O DESPORTO NA UNIVERSIDADE A prática de atividades físicas sempre esteve presente na minha rotina, quer fosse a ida semanal ao ginásio ou ocasionais jogos de futebol com amigos. No entanto, foi apenas aos 15 anos, quando tive o meu primeiro contacto com o desporto competitivo ao começar a praticar a natação, que pude perceber, na prática, todos os benefícios que o desporto traz, para além dos evidentes benefícios à saúde. Quando se fala em benefícios do desporto, vem logo à cabeça: gestão de tempo, disciplina, trabalho em equipa, entre outros. E, de facto, todos eles estão presentes na vida de um atleta. A natação realmente contribuiu para que eu desenvolvesse melhor foco, disciplina, comunicação com a minha equipa, entre muitos outros. Mas também me proporcionou benefícios menos óbvios para os olhos de quem não pratica o desporto. Um desses benefícios para mim passa pela perceção/inteligência corporal, visto que, por se tratar de um desporto de desempenho, tenho sempre que estar atento aos pequenos pormenores que afetam a qualidade do nado. Essa perceção refletiu-se também na minha vida académica, na medida em que consigo identificar e tirar proveito e/ou corrigir os erros que eventualmente cometo durante o estudo.
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Outra perspetiva é que, na natação, é comum termos provas que exigem um balanço entre esforço e descanso. Por exemplo, numa prova de 100m no estilo crawl, o atleta não pode dar o seu máximo nos primeiros 50m, mas também tem que manter um ritmo suficientemente rápido. Um semestre na universidade ocorre da mesma forma. Se no início do semestre dermos o nosso máximo, no final já estamos cansados demais para os exames. Mas se também não mantivermos um ritmo de estudo, no final ficamos sobrecarregados e não corre nada bem. É uma questão de encontrar o ritmo ideal que seja um equilíbrio entre tempo de estudo e tempo de descanso. Em suma, para além de foco, disciplina e trabalho em equipa, o desporto proporciona outras habilidades que também contribuem muito para um universitário. Ao encontrar um desporto de que se gosta, torna-se muito mais do que apenas uma atividade física: torna-se um momento de lazer e distração para o estudante.
Escrito por Vitor Lelis
vitorll909@gmail.com