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APRESENTAÇÃO
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Ter o livro, nosso Livro Vivo, porque os antigos, quando surgiu doença, se preocuparam em se transformar em ervas para socorrer o seu povo. Como o primeiro pajé, que descobriu como se transformar em ervas dos grupos Dua, Banu, Inani e Inu, para socorrer os Huni kuĩ, assim eu também me preocupei em deixar esta mensagem de conhecimento para o meu povo, meus fi lhos e netos; para toda a comunidade e para os que vão ver esse documento da identidade e do conhecimento do nosso povo antepassado. A gente se preocupou em fazer essa documentação para os alunos entenderem como é que a gente vivia antes do contato e como a gente vem vivendo depois do contato. Por que eu tive essa experiência de escrever este livro? Estou com 66 anos de idade e venho estudando desde anos atrás, pesquisando as ervas, ouvindo as histórias tradicionais, que são o documento de nossa identidade, de nossa biodiversidade. O povo ia perdendo tudo. Para não acabar com esses conhecimentos, eu me preocupei em escrever este livro e documentar o nosso conhecimento da origem da história de nosso povo. Naquele tempo da origem, as ervas se encontravam com os espíritos das doenças, faziam reunião e mandavam esses espíritos embora, então, por isso, elas se transformaram em quatro grupos de ervas, com as 352 espécies que conhecemos. Como eu venho trabalhando como pajé, conhecendo essas ciências, eu tinha que documentar, que publicar este livro. Eu pesquisava sozinho na minha aldeia, e meu primo, o Pajé Dua Busã, na aldeia dele, onde estudava há muitos anos com seu pai. Para não dividir esse trabalho, que é o saber do mesmo povo Huni kuĩ, eu o convidei para apresentar sua pesquisa junto, para deixar seu conhecimento dentro do Livro Vivo, porque esse livro vai ser um grande professor para todas as comunidades que vão ler sobre a vida dos seres Huni kuĩ. E, para publicar, eu tive
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que chamar também os jovens pajeres, para eles entenderem também as coisas de antigamente. Então, eu fui convidar meus companheiros, que são os novos pajeres, para poderem entender qual é mesmo a função deles e das ervas medicinais: por que a gente usa as ervas medicinais? Para o que servem? Quem são elas? E o Livro Vivo não é para acabar mais nunca, porque eu quero deixar herança para o meu povo, já que fi quei muito preocupado, porque muitos de nossos parentes do Brasil não estão conhecendo a realidade que é a nossa cultura, porque os pajeres que estão chegando agora ainda não sabem de onde a gente veio. Por isso a gente apresenta aqui o saber, o conhecimento de nossa cultura. Isso é uma coisa que pensei para o trabalho que fi z de minha vida até agora, para deixar uma última herança da inspiração da minha vida, do conhecimento do surgimento da vida e da transformação das doenças e do surgimento da morte. Por que Livro Vivo? Porque a natureza está viva, as ervas que se transformaram estão vivas e os pesquisadores estão vivos, e os autores deste livro, que tiveram a experiẽncia de fazer esta documentação. Enquanto eu tiver a minha vida, estarei aqui presente. E, além disso, estamos fazendo o fi lme, para apresentação não só da história escrita, mas também da imagem, para ver. E tem os parques: tem essa quantidade de famílias de plantas, que são essas 352 espécies no parque que eu criei. Então o Livro Vivo é também o parque onde mora nosso povo ancestral, que são as famílias de ervas que se transformaram. Meu sonho de realizar este Livro Vivo é para deixar uma mensagem de conhecimento do povo Huni kuĩ, para meus fi lhos e netos, para toda a comunidade, todas as escolas, para entenderem a vida dos seres Huni kuĩ, de onde viemos e as histórias desde as origens do início do princípio do mundo. O livro é a história da criação e é para os alunos entenderem que a primeira vida que recebemos de Yushibu era uma vida longa, sem doenças, sem ter morte, sem problemas, então, para conhecer essa his-
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tória, tivemos que escrever este livro, de onde vieram as doenças, por que nasceu a morte e por que os antigos se transformaram em ervas. Esta é minha preocupação, deixar um documento para o meu povo e para todos entenderem quem nos deu o primeiro conhecimento das ervas medicinais, que foi Yushã Kuru. (Pajé Agostinho Manduca Mateus Ika Muru)
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