Para a professora com nome de mar que me ofertou todas as maçãs que estavam ao seu alcance e que me incentivou a colher e abocanhar as que estavam mais longe. Aos seus sorrisos generosamente compartilhados e armazenados na nossa maçã de silício.
No começo era uma bagunça...
Pelo menos, é o que diziam aqueles que não entendiam muita coisa sobre AQUI, quer dizer arquitetura
quântica
universal interdimensional.
Mas até que, na verdade, à primeira vista, tudo parecia mesmo um canteiro de obras, daqueles onde nem quem trabalha lá consegue imaginar como é que vai ficar quando o trabalho terminar.
Só faz sentido pra quem planejou, na melhor das hipóteses.
Ainda mais pra quem via assim só um recorte, sem qualquer noção do todo. Nem se poderia dizer que era uma perfeita bagunça, porque aqueles mesmos que não entendiam muita coisa sobre AQUI, diziam que na terceira
dimensão nada é perfeito...
Vamos fingir que acreditamos nisso. Só não podemos esquecer que estamos só fingindo crer nessa idéia absurda!
Depois, começou a parecer um canteiro mesmo, só que desses de jardim... Apenas um pouco desorganizado, aparentemente! Só aparentemente… porque, se vamos fingir que acreditamos que nada é perfeito na terceira
dimensão, vamos começar a
enxergar só a aparência das coisas e não a sua perfeição.
Então, no
miolo
dessa desorganização...
muitas e muitas flores!!! Flores de (quase) todas as cores!!! Com folhas fofinhas e, às vezes, bem verdinhas! Tudo peludo feito veludo! E com perfume...
Perfume que o vento levava pra longe e que chegava antes da gente em qualquer lugar, como o perfume do molho de tomate com manjericão quando a gente tá sentindo fome e que chega bem antes da comida... Depois das flores, naturalmente, vieram as frutas, que no começo se misturavam e não se sabia bem onde acabavam as flores e começavam as frutas...
Mais tarde, alguém resolveu comer algumas e aí começaram a perceber a diferença entre as flores de quase todas as cores e as frutas de quase todos os sabores!
Mais coisas bonitas iam sendo percebidas... (todas tambĂŠm aparentemente imperfeitas!!!)
Coisas com cor, ĂŠ verdade, mas sem perfume e sem sabor. Coisas que brilham e trazem o sol prĂĄ bem pertinho e que guardam todos os segredos de todos os mundos. Cristais e rochas, minerais que levam esse mundo todo nas costas!
Ah! Também tinha água, que também é mineral, mas escorre... Muita água e formas arredondadas tomadas emprestadas dos desenhos e colagens do nublado, brumoso...
Henri Matisse!!!! Mas era escuro,
Aí o Sol apareceu, mas isso era só um começo...
Porque, além das formas arredondadas dos desenhos do
Matisse... mais coisas começaram a ser ser percebidas!
E entรฃo, era uma vez uma sereia que morava numa gota d'รกgua... Numa das muitas que faziam parte de toda aquela รกgua cheia de Matisses.
Naquela gota, essa sereia tinha o Sol e a Lua, estrelas,
planetas e um disco voador que a levava para todo canto, se ĂŠ que uma gota tem cantos (????)...
Com o disco voador ela chega atĂŠ o castelo ela mora...
de coral onde
Esse castelo tem muitos telhados que a protegem das fortes chuvas que sempre caem sobre as gotas d'รกgua
E a chuva pode ser fatal para uma gota d'รกgua e para tudo o que habita essa gota d'รกgua. Isso porque a chuva sempre chove colorida e forte sobre as gotas d'รกgua nas quais moram uma
sereia.
E tambĂŠm chove colorido e forte nas ĂĄguas iluminadas onde dormem aquelas formas arredondadas que parecem... advinha o quĂŞ! Desenhos e colagens do Matisse que foram tingidos pela chuva colorida que choveu forte nas ĂĄguas onde elas moram.
Mas, chuvas à parte, de lá de dentro do seu castelo de coral a
sereia imagina se existe um mundo diferente e mais seco lá fora... Um mundo com cidades maravilhosas!!!
Um lugar onde numa hora é dia e na outra hora já é noite...
E imagina como seriam as coisas desse lugar...
Seriam as casas mais fantรกsticas do que os castelos de coral que moram em gotas d'รกgua???
Sem dúvida que sim!!! Teriam, também, jardins? Estariam lá as flores de (quase) todas as cores???
JĂĄ tinha ouvido falarem de peixes do outro mundo, tambĂŠm.
Mas de uns bem diferentes, que nadavam no ar, que nĂŁo tinham escamas, mas penas...
E para onde nadariam??? Imaginou se eles já tinham visto algum peixe da água quando esses, às vezes, pulam para fora dela e imaginou se algum daqueles que nadam no ar alguma vez já tinha arriscado um mergulho... Tinha lido no seu livro predileto que é dessa forma que
Universos totalmente diferentes conseguem se encontrar sem colisão ou tragédias! É quando o morador de um mergulha no outro e vice-versa, mas nenhum dos dois sabe direito que o outro existe porque nunca moraram um tempo lá no outro Universo... Mas isso não se sabe bem ao certo. Então, melhor imaginar que, se nadam no ar, deve ser em direção a algum…
jardim…
…ou que vão para alguma floresta encantada...
buscando e encontrando seres tĂŁo especiais e fantĂĄsticos feito ela!!!
De tanto imaginar, gasta muita energia e fica com fome, então também pensa em comida japonesa porque a comida japonesa usa muito daqueles peixes da água e algas que ela conhece bem.
Pensa em temakis de ovo frito e de flor de lótus que um amigo muito especial lhe falou que existe em algum lugar que não se sabe ao certo onde fica.
Pensa em outros temakis porque é uma palavra gostosa de comer e de falar… temakis que nem esse amigo deve saber, mas que são feitos da luz da Lua quando ela tá cheia lá no Japão. Ou, talvez ele até saiba porque é um amigo muito esperto e sensível que faz programas de computador e constrói interfaces para a comunicação entre os Universos paralelos dos humanos e dos computadores.
Também pensa em comida ocidental... afinal já está na hora de pesquisar a geladeira!!! Um jantar à luz de velas, talvez. Isso vem bem a calhar para acender o jantar num castelo de coral dentro de uma gota d'água!!!
Mas não sabe bem em que comida ocidental pensar e pensa meio confuso, confuso como quem tomou remédio para perder o apetite!!!!
E porque esse pensamento vai precisar de legenda, lá vai: Pensa em peixes taoístas yin e yang... pensa no pecado da fome, em corações partidos e maçãs mordidas e que o cozinheiro é um motorista de gôndola que colocou uma máscara e foi pro carnaval de Veneza!
Então, resolve pular essa parte... e começa a pensar no por que das coisas, na força da criação, na polaridade yin e yang e em seu sentido...
Que o sentido de ter um coração partido é ajudá-lo a se abrir.
Que sobremesa de maçã é tudo de bom e nas 4 maçãs que mudaram o mundo. A da Eva que abriu um portal para o mundo
dual…
A maçã pós medieval, cuja trajetória em queda livre disparou todo um sistema físico oficial e o pensamento
racional…
A maçã verde que só faz sentido aqui se for preta, plana e musical. Poesia sintética de vinil cuspida de um submarino que não polui.
Pop nadando em círculos de acordo com acordes que se propagam no vácuo de um castelo pop de coral.
Navegação em luz via maçã além do real que abriu portais para o
virtual…
Isso tudo é tão empolgante e fora de controle que durante a sobremesa do jantar à luz de velas ela pensa em milhares de aviõezinhos de papel levados pelo vento levando junto com eles, todas as suas reflexões quando pensa no sentido da vida e, é claro, em peixes taoístas, maçãs mordidas e corações partidos também.
Silencia a mente um pouco para regar as plantas do castelo de coral porque é incrível como elas secam rapidamente, elas, as plantas que enfeitam o castelo de coral e que também vivem numa gota d'água, só que dentro de vasos...
E tenta não pensar no que será dos peixes (de todos eles... e são tantos, taoístas ou não!!!) na Era
de Aquário...
Como a gota não é lá uma gota king size ou tamanho egg (extra GG), ela regou tudo até que bem depressa, mas sem pressa porque estava treinando ficar no AGORA e isso requer que as coisas sejam feitas com mais atenção e cuidado e prestando muita atenção na respiração!
Respirando com a mente sossegada, cantarolou distraída e se lembrou das bandas
de rock!
Porque… que lugar melhor para ficar no agora do que num show de rock??? Bandas em shows que encantam e enfeitiçam muito mais gente que todas as sereias jamais conseguiram com seu canto... Multidões ligadas dançando e cantando em campos de futebol, imagine! Era o que ela ouvira dizer, embora não soubesse bem o que seria um campo de futebol, já que na gota d'água não tinha nenhum. Mas, cantar e dançar, isso ela sabia bem o que era. E até arriscava dançar diferente porque não tinha as pernas que se costuma ver dançar do lado de fora de uma gota d'água.
Gostava de dançar em mysterious
ways!!!
Por isso, ela pensou na banda cujo nome foi inspirado por um navio velho afundado, que nรฃo era um submarino amarelo, mas estava por ali nas andanรงas dela e ela acabou tropeรงando nele.
A banda não afundou... e prega mensagens de amor e convivência pacífica, que entram por um ouvido e poderiam ficar na cabeça.
É claro, também, que as mensagens e a simbologia variam de turnê pra turnê, mas a essência é a mesma, como uma coisa que significa uma coisa só, mas que pode ser dita em muitos idiomas, até na língua encantada do canto das sereias. Para os entendidos em comunicação, seria a mesma mensagem divulgada em diversas linguagens. Mas ela não entendia muito dessas teorias de comunicação, então pensa daquele jeito mais simples. Aí pensou que seria muito melhor substituir a cruz cor de rosa do desenho por um pinheiro verdinho com bolas brilhantes cheias de sol e calor, de cor, de vida e de luz... afinal, as duas coisas fazem parte de uma mesma viagem.
Mas, de repente compreendeu que, se nĂŁo fosse por causa da cruz, talvez ela e as outras sereias nunca entenderiam bem as cores, a vida e a luz.
Então, imaginou maçãs mordidas, mas não naquela do pecado da fome que a deixou perturbada com os peixes taoístas e tal... Maçãs
encantadas, mas também não daquelas da Branca de Neve que fazem a gente ficar inconsciente e dormir.
Depois tudo bem... aparece o príncipe e tal e parece que tudo dá certo, mas não é bom perder a consciência e muito menos ficar impotente esperando que nos ajudem a recuperá-la... Tampouco é saudável permanecer acordado sonhando os sonhos de outras pessoas!
Então, pensou em todos que morderam a maçã e, com isso, ajudaram Universos diferentes se encontrarem sem colisão nem tragédias.
Universos de sereias que visitam a Terra e Universos
de pessoas que encontram
sereias que moram em um castelo de coral dentro de uma gota
d'água...
ou em memórias de maçãs mordidas.
Fim! mas é só o começo…
Sereia em série... A série da Sereia “Metade o busto de uma deusa Maia Metade um grande rabo de baleia” Paralamas do Sucesso / Gilberto Gil
Sobre a autora
Claudia Schmidt, artista visual, frequentou a pintura clássica na adolescência, mas profissionalmente trilhou os caminhos da engenharia eletrônica onde se familiarizou com a criação de conteúdo via software, explorando a animação de formas geométricas e a agregação de fotos e cores. Dessa familiaridade nasceu o impulso de se manifestar artisticamente por meio dessas ferramentas.
Suas ilustrações iniciais lhe inspiraram reflexões corriqueiras que, reunidas, deram origem à Sereia e sua série. https://cschmidt303.wixsite.com/ilustras reúne o seu trabalho visual e um blog.