1º Curso de Ética Médica para Médicos Residentes do Conselho Regional de Medicina do Estado de Minas Gerais CRMMG
Aplicação dos princípios bioéticos em questões médicas Conselheiro José Carvalhido Gaspar
BH, 24/11/2016
Avanços médicos segunda metade século XX • • • • • • • • •
Engenharia genética Clonagem Pesquisas com células tronco Medicina Genômica e Medicina Preditiva Técnicas de Reprodução Assistida Transplantes de órgãos e tecidos Manutenção artificial de funções vitais Suporte avançado de vida: UTIs Robótica, cirurgias por vídeo, a laser, etc...
Segunda metade século XX • Crescente conscientização dos direitos fundamentais do ser
humano (DUDH). • As pessoas passaram a não mais aceitar a indicação de qualquer procedimento médico, seja diagnóstico ou
terapêutico, sem o seu prévio consentimento livre e esclarecido. • Hans Jonas (1985): “Teremos que colocar o galope tecnológico sob o controle extra-tecnológico.”
Principialismo • 1979: Tom Beauchamp e James Childress descrevem os 4 princípios bioéticos fundamentais a serem observados, inicialmente, nas pesquisas em seres humanos: • Não maleficência • Beneficência
• Autonomia • Justiça ou Equidade. • São considerados “deveres de prima facie”. • Passaram a influenciar os Códigos de Ética Médica.
• Incorporados ao dia a dia do médico.
Bioética Clínica
“Divisão da Bioética, constituindo-se em um espaço de reflexão ética e de diálogo entre as diversas especialidades do conhecimento
científico,
enquanto
esse
conhecimento
é
examinado à luz dos valores éticos e dos princípios morais, a fim de que possam ser incorporados na assistência à saúde humana.” Enciclopédia de Bioética
Bioética Clínica
Prudência: ética das virtudes
Deve acompanhar toda atividade e decisão médica Aristóteles
“Mais vale uma cabeça bem feita do que uma cabeça cheia” Montaigne
Foco no paciente
O mĂŠdico
7
Segunda metade do século XX
Segunda metade
Nova relação médico-paciente
do século XX
-família
Questões de ética médica
Beneficência
Modelo paternalista
O médico é quem resolve
Autonomia Modelo
Necessidade
compartilhado
de TCLE
DecisĂľes
Responsabilidade
compartilhadas
de todos
CompreensĂŁo, prudĂŞncia
Questões de ética médica CEM/2009 - CAP. I - ITEM VI • VI – O médico guardará absoluto respeito pelo ser humano e atuará sempre em seu benefício. Jamais utilizará seus conhecimentos para causar sofrimento físico ou moral, para o extermínio do ser humano ou para permitir e acobertar tentativa contra sua dignidade e integridade. • Princípio da Beneficência
Questões de ética médica CEM/2009 - CAP. IV – ART. 31 É vedado ao médico Desrespeitar o direito do paciente ou de seu representante legal de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de iminente risco de morte. • Princípio da Autonomia (do paciente)
Questões de ética médica
Casos clínicos – temas específicos Objetivo: refletir sobre a postura ética do médico que valoriza a integração dos princípios bioéticos, especialmente Beneficência e Autonomia, para avaliar o risco-benefício, a fim
de decidir qual conduta seguir, diante de um caso clínico real, considerando os valores do paciente. “Aflito perante o conflito, reflito”. (Max Grinberg)
Primeiro tema - Autonomia do Idoso
Homem, 82 anos, lúcido, ativo, procura atendimento médico, queixando-se de fraqueza e fadiga, vômito com sangue e perda de peso não-intencional. Durante exames é detectado câncer de estômago em estágio avançado, sem chances de recuperação.
Médico explica a situação à filha do paciente, dizendo que a quimioterapia poderia até auxiliar, mas só por poucos meses.
Autonomia do Idoso
A filha, casada e que mora na casa do pai, pede ao médico que não informe ao paciente o diagnóstico, alegando que “conhece bem o pai e sabe que a notícia vai apressar a morte dele”. Sugere que os sintomas sejam atribuídos a “uma ulcerazinha.”
Autonomia do Idoso Perguntas:
1. O médico deva acatar o pedido da filha ou explicar ao paciente seu estado, baseado no Princípio da Autonomia?
2. Comunicar a um parente o diagnóstico, antes de comunicar ao próprio paciente, é atitude eticamente aceitável? 3. Idoso capaz deve, obrigatoriamente, ser informado sobre diagnóstico de doença terminal?
Autonomia do Idoso - Estatuto do Idoso (EI)
Pontos a serem considerados Art. 17 (EI): “Ao idoso, que esteja no domínio de suas faculdades mentais, é assegurado o direito de optar pelo tratamento de saúde que lhe for reputado mais favorável.”
Art. 4º (EI): “Nenhum idoso será objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação, violência, crueldade e opressão...”
Autonomia do Idoso
Código Civil: idosos lúcidos, psicologicamente saudáveis, não-
alcoólatras, não viciados em drogas, ou pródigos, não são considerados incapazes à vida civil.
Por pressão da família, surge muitas vezes, para o médico, o dilema: dizer ou não a verdade aos pacientes idosos?
Autonomia do Idoso – Estatuto do Idoso
Na realidade, o dilema não é revelar a verdade, mas, sim, qual a forma mais adequada de comunicá-la? A não revelação da verdade pode impedir o paciente de tomar decisões importantes sobre seu tratamento e sua vida pessoal. Eticamente, não revelar trata-se de conduta não recomendável.
Autonomia do Idoso
O paciente também tem o direito de não saber, caso manifeste expressamente essa sua vontade. Cabe ao
médico respeitá-la. Deve ser solicitado ao paciente que indique uma pessoa de sua confiança para ser o interlocutor com o médico.
Autonomia do Idoso - Código de Ética Médica
É vedado ao médico:
Art. 24: Deixar de garantir ao paciente o exercício do direito de decidir livremente sobre sua pessoa ou seu bem-estar, bem como exercer sua autoridade para limitá-lo. Art. 31: Desrespeitar o direito do paciente ou de seu representante legal de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em casos de iminente risco de morte.
Autonomia do Idoso - Código de Ética Médica
É vedado ao médico: Art. 34: Deixar de informar ao paciente o diagnóstico, os riscos e os objetivos do tratamento, salvo quando a comunicação direta possa lhe provocar dano, devendo,
nesse caso, fazer a comunicação a seu representante legal.
Autonomia do Idoso ou de outro Paciente 1. E se o paciente fosse um jovem com câncer gravíssimo e seus pais pedissem para que não fosse revelada a ele sua condição? 2. É possível determinar os riscos/benefícios de uma revelação
desse tipo? 3. Caso o médico fornecesse apenas ao paciente o diagnóstico
de morte iminente, a família poderia processá-lo, depois do falecimento do paciente?
Autonomia do Idoso ou de outro Paciente 4. E se houver conflitos entre os irmãos sobre informar ou não ao pai ou mãe o diagnóstico? Como resolver? 5. Eticamente, omitir o diagnóstico é o mesmo que mentir?
6. Pode-se mentir? 7. Pode-se omitir?
Autonomia do Idoso (ou do Paciente) Recomendações 1. Saber ouvir o paciente e também os familiares, agindo com paciência e prudência. 2. Estar atento às sinalizações do paciente, procurando captar o quanto de paternalismo ou de autonomia ele deseja, não lhe causando, assim, outros danos. 3. Não retirar os direitos do paciente de saber, quando este for o seu desejo.
Autonomia do Idoso ou do Paciente Recomendações
4. Trabalhar em equipe, podendo recorrer a outros profissionais, se for o caso.
5. Procurar o melhor modo de dizer a verdade que o paciente se permite a ouvir. 6. Respeitar o direito do paciente quanto ao segredo médico. 7. Registrar tudo no prontuário médico do paciente.
Segundo tema – algumas situações
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová 1. Infartado, 45 anos, necessita de transfusão de sangue (TS) urgente.
Por ser Testemunha de Jeová, ele, estando consciente, e sua família, recusam a transfusão de sangue. Médicos resolvem sedá-lo e transfundem escondido, estabilizando o quadro. 2. Familiares de paciente Testemunha de Jeová acidentado, grave, permitem que ele receba sangue, à revelia de sua opinião. Assim que
melhora, paciente decide processar parentes, hospital e médicos.
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová 3. Paciente, 50 anos, chega a hospital inconsciente, grave, necessitando de transfusão de sangue. Ao trocá-la de roupa,
enfermeira encontra em seu bolso documento registrado em cartório, afirmando que não aceitaria, em hipótese nenhuma, receber transfusão de sangue, por ser Testemunha de Jeová. Como estava inconsciente, médicos ficam em dúvida quanto à realização ou não da hemotransfusão.
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová
4. Mulher, Testemunha de Jeová, com leucemia, deixa claro que não pretende, em hipótese alguma, receber sangue. Internada em estado grave, recebe hemotransfusão, porque marido fica em dúvida em permitir ou não a realização do procedimento. Mesmo assim, morre, mas antes lamenta o fato e afirma que “sua alma havia ficado maculada pelos profissionais que dela cuidaram”.
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová 5. Criança de três anos, em estado grave, necessita de transfusão de sangue urgente. Seus pais pedem para não transfundi-la. Equipe médica resolve contrariá-los, transfunde a criança, salvando-lhe a vida.
6. Grávida de 24 semanas, Testemunha de Jeová, apresenta complicações que levam a sangramento intenso. Durante atendimento, recebe hemotransfusão compulsoriamente, já que
intensivistas consideram que sua autonomia não supera o direito da criança.
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová Pergunta base
O que é eticamente mais adequado? Realizar o procedimento indicado, à revelia do paciente ou Respeitar a vontade dele?
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová Fundamentação religiosa dos pacientes Testemunha de
Jeová Gênesis 9:3-4
Todo animal movente que está vivo pode servir-vos de alimento. Como no caso da vegetação verde, deveras vos
dou tudo. Somente a carne com sua alma – seu sangue – não deveis comer.
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová Fundamentação religiosa dos pacientes Testemunha de Jeová
Levítico 17:10 Quando qualquer homem da casa de Israel ou algum residente forasteiro que reside no vosso meio, comer qualquer espécie de sangue, eu certamente porei minha face contra a alma que comer
o sangue, e deveras o deceparei dentre seu povo.
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová Código de Ética Médica – É vedado ao médico Art. 31- Desrespeitar o direito do paciente de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de iminente risco de morte. Art. 24- Deixar de garantir ao paciente o exercício do direito de decidir livremente sobre sua pessoa ou seu bem-estar, bem
como exercer sua autoridade para limitá-lo.
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová
Vários pareceres caminham para a tendência ao respeito à autonomia do paciente, desde que plenamente capaz. A CF Brasil/88 assegura o “direito à vida” e não “o dever à vida”. O médico deve procurar todos os recursos técnicos e científicos para proteger a saúde do paciente, sem contrariar sua vontade expressa.
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová
Os autores Fortes e Munhoz destacam que: “A autonomia não deve ser convertida em direito absoluto; seus limites devem ser dados pelo respeito à dignidade e à liberdade dos outros e da coletividade”.
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová
Criança ou adolescente filho(a) de Testemunha de Jeová
Não se aplica o princípio da autonomia dos pais. Caso proíbam realização de transfusão de sangue no filho(a), em situação de urgência, o médico deve denunciar a situação ao Conselho Tutelar/Promotoria da Infância e da Juventude/Vara da Infância e Adolescência, que pode, com base no ECA, destituir os pais do pátrio poder, para que a transfusão de sangue possa ser feita.
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová Criança ou adolescente filho(a) de Testemunha de Jeová Art. 17 do ECA: “o direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, ...”
Art. 13 do ECA: classifica essa atitude da família como maus tratos, já que impede um direito garantido por lei, que é o acesso à saúde.
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová
Segundo o Prof. Genival V. França, o respeito ao desejo do paciente de não receber sangue só é válido enquanto não houver risco de morte iminente associado ao estado daquela pessoa.
Nesta situação o médico estaria autorizado, eticamente, a transfundir, mesmo contra a vontade do atendido, com base no princípio da Beneficência.
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová
O argumento utilizado é o de que a vida é um bem maior, tornando a realização do procedimento um dever prima facie, sobrepujando-se ao princípio da autonomia. Em tese, essa conduta encontra respaldo no CEM (artigo 31).
Entretanto, para o Prof. Diego Gracia, o paciente capaz deve poder exercer a sua autonomia plenamente, mesmo perante risco iminente de morte.
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová
Existem três condutas não recomendáveis à beira do leito do paciente Testemunha de Jeová, a respeito de hemotransfusão: 1. Transfusão de sangue clandestina. 2. Mentir sobre a natureza do sangue administrado. 3. Desrespeitar o compromisso firmado com o paciente.
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová Para a tomada de decisões diante de paciente TJ, sob o ponto de vista bioético, vale o checklist: 1. Qual a prioridade da transfusão de sangue ? Eletiva, urgência, emergência? 2. Há normatização institucional? Foi explicada ao paciente/família?
3. Houve diálogo franco antes do procedimento?
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová 4. Médico e paciente sentiram-se esclarecidos e chegaram a um acordo? 5. Ficou claro o compromisso do médico/equipe, em respeitar os valores do paciente? 6. O paciente TJ em questão tem grande possibilidade de vir a necessitar de TS? Foi explicado a ele/família? 7. A TS foi devidamente analisada com respeito ao prognóstico clínico?
Transfusão de sangue em paciente Testemunha de Jeová
8. Existem outros recursos científicos visando a prevenção ou o tratamento da anemia, aplicáveis às circunstâncias, a fim de evitar a transfusão de sangue? 9. Métodos para permitir a convivência com a redução crítica dos níveis de hemoglobina são viáveis na situação clínica? 10. Atitudes previstas e/ou condutas realizadas foram registradas no prontuário da paciente transfusão de sangue?
Terceiro tema
Sigilo médico e adolescentes em situações de risco Gravidez • Abuso de drogas • Não adesão a tratamentos necessários • Doenças graves • Realização de procedimentos de alguma complexidade ou risco: cirurgias com anestésicos gerais • Risco à vida ou à saúde de terceiros •
•
Maus- tratos: violência, abuso sexual, etc...
A criança, a famĂlia e o pediatra
O direito da criança e do adolescente ao sigilo CEM/2009 É vedado ao médico: Artigo 73 - Revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente.
O direito da criança e do adolescente ao sigilo É vedado ao médico
Artigo 74 - Revelar sigilo profissional relacionado a
paciente menor de idade, inclusive a seus pais ou responsáveis legais, desde que o menor tenha capacidade de discernimento, salvo quando a não revelação possa acarretar dano ao paciente.
Manter o sigilo!
Sigilo médico e adolescentes
•
Nas situações de risco, torna-se necessária a participação e consentimento dos pais/responsáveis.
•
Quebra do segredo por motivo justo.
•
Informar esta decisão ao adolescente
Caso clínico : maus- tratos
Violência doméstica
Abuso sexual
Caso clínico: abuso sexual
Adolescente, 14 anos, gênero feminino, foi hospitalizada com diagnóstico de “depressão”. Na enfermaria, encontrava-se sempre deitada, não se alimentava, não conversava, não tinha interesse em participar de atividades recreativas (jogos, TV, etc.), mostrava-se apática durante todo o período de internação.
Caso clínico: abuso sexual
Sua irmã, de 18 anos, procurou espontaneamente o pediatra assistente e informou-lhe que as duas, ela e sua irmã, eram vítimas de abuso sexual pelo companheiro da mãe e que, por esse motivo, ela havia saído de casa aos 16 anos.
Caso clínico: abuso sexual
A mãe, chamada ao hospital, foi novamente entrevistada pelo pediatra da menor, juntamente com a assistente social, ocasião em que os profissionais informaram-lhe a respeito do relato da filha, ao que ela respondeu: “ Não quero levar esse assunto para frente.”
Caso clínico: abuso sexual
Segundo a mãe, “se os dois outros irmãos delas souberem que o meu ‘marido’ abusava das meninas, poderiam matá-lo, e eu não quero assassinos em casa.” Informou ainda que: “Ele é muito bom para mim.”
Caso clínico: abuso sexual
Após várias reuniões da equipe com a mãe, informando-lhe da gravidade da situação e dos perigos que sua filha estava exposta, caso medidas não fossem tomadas para evitar que esses abusos continuassem ocorrendo, a mãe continuou negando o consentimento para a notificação do caso aos órgãos competentes (Conselho Tutelar).
Caso clínico: abuso sexual A equipe decidiu, então, fazer essa notificação ao Conselho Tutelar, avisando à mãe da decisão tomada, e que membros desse Conselho iriam procurá-la naquele mesmo dia para ver, juntos, quais seriam as medidas mais adequadas para esse caso específico.
Maus- tratos É preciso quebrar o silêncio !
Abuso sexual: conclusões • No caso do dilema ético entre notificar maus-tratos e achar que violou o sigilo, refletir: o objetivo da comunicação e consequente quebra do sigilo, tem como alvo direto o bemestar do paciente beneficência). • Quebra do sigilo por motivo justo: item II do cap. I e artigos 25 e 73 do CEM/2009.
• Quebra do sigilo por dever legal: ECA: arts. 5º, 13 e 18.
Abuso sexual: conclusões •Em casos de suspeitas bem embasadas de maus-tratos contra crianças e adolescentes, a opção por manter o sigilo em desfavor da denúncia poderá colocar o paciente em risco. CEM – Art. 25 - É vedado ao médico: Deixar de denunciar prática de tortura ou de procedimentos degradantes, desumanos ou cruéis, praticá-las, bem como ser conivente com quem as realize ou fornecer meios, instrumentos, substâncias ou conhecimentos que as facilitem.
Maus-tratos : conduta do pediatra e equipe • Situação complexa, grave, capaz de causar graves danos. • Estar atento para a suspeita ou comprovação dos maustratos.
• Registro detalhado no prontuário. • Sigilo e confidencialidade.
• Notificação oportuna ao Conselho Tutelar ou outra autoridade judicial. • Postura: maximizar benefícios e minimizar os prejuízos.
Maus-tratos : conduta do pediatra e equipe • Compromisso ético, social e legal que o pediatra tem para com o princípio da beneficência do paciente.
• Como dar alta e expor a criança a novos maus-tratos? Necessidade da prevenção de novos danos. • Considerar os dispositivos do CEM/2009: itens II e VI do cap. I; artigos 21, 25 e 73. • ECA: artigos 5º, 13 e 18.
Quarto tema
Questões éticas ao nascimento
Assistência ao prematuro extremo Progressos da neonatologia possibilitaram: • Aumento da sobrevida de RNs cada vez mais imaturos e outros com más-formações complexas e muito graves.
• RNs com grande potencial de comprometimento neurológico grave.
Assistência ao prematuro extremo Questão: qual a extensão e a complexidade do tratamento a ser feito?
Decisão: envolver equipe, pais, familiares, Comitê de Bioética institucional.
Assistência ao prematuro extremo
• Questão: recém- nascidos nos quais todos os recursos terapêuticos já foram utilizados sem sucesso:
• Justifica-se
continuar
o
uso
indevido
tecnológicos? Por que ? • Apenas para prolongar a vida? • Manter todo os cuidados paliativos.
dos
avanços
Assistência ao prematuro extremo Recomendações:
• Ideal: discutir previamente ao parto quais condutas serão tomadas pelo pediatra/neonatologista na sala de parto, no momento do nascimento.
• Envolver pediatra, equipe, pais, familiares, Comitê de Bioética, se houver. • Buscar solução consensual.
Assistência ao prematuro extremo
• Cada serviço deve conhecer seus recursos, seus limites, suas taxas de sobrevida e de mortalidade conforme idade
gestacional (IG) e peso de nascimento. • Repassar informações para os pais. • Ponderar que a evolução de cada recém-nascido é, muitas vezes, individual e imprevisível.
Assistência ao prematuro extremo
• Anotar tudo no prontuário: riscos para o RN, riscos para
a mãe, etc... • Termo de Consentimento Livre e Esclarecido • Avisar que, se no momento do nascimento, houver novos
dados,
neonatologista.
a
decisão
final
competirá
ao
Caso clínico
Malformação congênita incompatível com a vida
• Durante a primeira gravidez da senhora A, foi constatado que sua filha era portadora de anomalia congênita incompatível com a vida extrauterina (Síndrome Tanatofórica) • Após a confirmação do diagnóstico em serviço de referência, o casal reuniu-se algumas vezes com a equipe de perinatologia, ocasião em que foram fornecidas todas as informações referentes à síndrome, inclusive o prognóstico.
Por consenso, foi decidido que imediatamente após o nascimento, o recém-nascido deveria receber cuidados paliativos. No dia programado para a cesárea (eletiva), o casal procurou o neonatologista e solicitou que fossem realizados todos os procedimentos possíveis para a manutenção da vida da filha, inclusive que a recém-nascida fosse colocada em ventilação mecânica, argumentando que sua filha poderia ser uma exceção e sobreviver, o que foi aceito pelo neonatologista e assim realizado.
A recém-nascida foi encaminhada à UTI neonatal, onde recebeu todos os cuidados. Dias depois foi transferida, ainda em ventilação mecânica, para a enfermaria de cuidados intermediários, recebendo todos os cuidados, tendo o óbito ocorrido aos quatro meses de idade.
Os pais acompanharam a filha durante todo o período de internação, tiravam fotos, levavam brinquedos, pegavam no colo, conversavam com ela.
Mostraram-se satisfeitos com a conduta da equipe que cuidou da menina e afirmam que cresceram muito, no sentido emocional, com todo o desenvolvimento do caso e que estariam muito mal psicologicamente se tivessem tomado outra decisĂŁo.
Reanimação de recém-nascidos portadores de másformações complexas - Recomendações • Atualmente, é possível o diagnóstico fetal dessas másformações congênitas com grande precisão . • Em casos de má-formação incompatível com a vida recomenda-se que:
• a) A equipe reúna com os pais, esclarecendo-os sobre o prognóstico.
Reanimação de recém-nascidos portadores de másformações complexas • b) Seja indicada a via de parto mais adequada para a
gestante
e
• c) Havendo consenso, oferecer suporte básico com cuidados paliativos para o RN, sem realizar procedimentos invasivos. • d) Consentimento escrito dos pais.
Reanimação de recém-nascidos portadores de másformações complexas
• e) Se o diagnóstico não estiver bem definido ou se não
houve oportunidade para discutir o caso com a família, deve-se:
• f) De início, tomar uma atitude mais ativa, realizando todas as medidas de reanimação e suporte de vida.
Reanimação de RNs portadores de más-formações complexas
• g) Esclarecido o diagnóstico e o prognóstico, a equipe deve reunir novamente com os pais, fazer nova reavaliação e decidir conduta a ser adotada: • i) Instituir cuidados paliativos nos casos incompatíveis com a vida, se houver consentimento dos pais; ou • J) Demais casos ou se não houver consentimento dos pais: manter suporte avançado de vida
Reanimação de RNs portadores de más-formações complexas • k)Lembrar que suspender suporte avançado de vida é muito diferente que não instituí-lo. • l)Toda a equipe envolvida no atendimento do RN deve discutir o assunto com os pais e/ou Comitê de Bioética da instituição. • m)Havendo consentimento por escrito dos pais, pode-se
suspender o suporte avançado de vida e oferecer cuidados paliativos.
Questões éticas: considerações finais
• Os conflitos de valores na assistência à saúde humana estão cada vez mais graves e frequentes. • A solução de dilemas e conflitos éticos do dia-a-dia passa necessariamente pelo respeito à dignidade do ser humano.
• As verdades que embasam tais soluções são sempre transitórias, nunca definitivas.
Questões éticas: considerações finais • As decisões devem ser consensuais, tomadas com prudência e tolerância ao pluralismo moral atual da
sociedade. • A solução adequada e justa dos dilemas éticos cotidianos humaniza e melhora muito a qualidade da assistência à saúde prestada pelas instituições.
Que futuro vamos construir? Uma constatação “É um fato comprovado que quando a autonomia é levada ao extremo, converte-se num princípio absoluto e sem exceções, conduzindo a aberrações não menos menores do que as do paternalismo beneficientista. O paternalismo está para a beneficência, como o anarquismo para a autonomia. O bem comum exige limites às decisões livres dos indivíduos!” Prof. Diego Gracia
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Que futuro vamos construir? “Por isso, só com o princípio da autonomia não se pode construir uma ética coerente. A razão, as vezes está do lado da beneficência e não do lado da autonomia. E, muitas outras vezes, encontra-se entre estes dois princípios, entre a pura beneficência e a pura autonomia. Daí a necessidade de um terceiro princípio que, qual novo Salomão, faça a mediação entre ambos. Este princípio é o da justiça.” Professor Diego Gracia – Fundamentos de Bioética, p.259
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Tomada de decisão Immanuel Kant “Em toda tomada de decisão, cabe o imperativo de nos perguntarmos: Quero? Posso? Devo? Porque nem tudo o que quero, posso; nem tudo que posso, devo; e nem tudo que devo, quero”.
Questões éticas: considerações finais • É importante a existência de Comitês de Bioética
institucionais para análise de questionamentos éticos.
• Existem vários métodos bioéticos de análise de dilemas éticos que em muito contribuem, visando sugerir soluções prudentes e adequadas.
Fundação São Francisco Xavier Hospital Márcio Cunha - Ipatinga- MG
Comitê de Bioética
Grupo interdisciplinar e multiprofissional, composto por profissionais de saúde e de outras áreas, assim como de representantes da comunidade, na maioria das vezes usuários de instituições de saúde...,
Continua
Comitê de Bioética ... que tem por objetivo auxiliar na análise de dilemas morais
que surgem na atenção individual a pacientes, na prestação de consultorias e no ensino. Além de sugerir normas e/ou condutas institucionais para assuntos que envolvam questões éticas. Kipper, D.J. et al, 2002
“Mire, veja: o mais importante e bonito do mundo é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas-
mas que elas vão sempre mudando, afinam ou desafinam. Verdade maior. É isto que a vida me ensinou. Isto me alegra, montão.” Guimarães Rosa, 1984