Corrente d'escrita 60

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Ano VI Número 60 Mensal: março de 2023 Corrente d’escrita Plantando Cultura * Santa Catarina * Brasil Fundado por Afonso Rocha julho 2017 www.issuu.com/correntedescrita 2017 2023
Francisco Dias Velho Fundador da cidade 1673 2023

Florianópolis

Santa Catarina

Brasil

+55 48 991 311 560 narealgana@gmail.com

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Fundador e diretor:

Afonso Rocha

Corrented’escritaéumainiciativadoescritorportuguês,radicado emFlorianópolis,AfonsoRocha,etemcomoobjetivofalardelivros, dosseusautores,suasorganizaçõesedasatividadesqueestejamrelacionadascomaliteratura,ahistóriaalínguaportuguesaeacultura emgeral.

ChamaremosparacolaborarcomoCorrented’escritaescritorese agentesliterários,aqualquernível,cujacolaboraçãoserágratuitae semqualquercontrapartida,anãoser,ocompromissoparadivulgar, propagaredistribuiresteMagazineLiterário.

Oenvioparapublicaçãodequalquermatéria(textooufoto)implicaa autorizaçãodeformagratuita.Asmatériasassinadassãodaresponsabilidadeexclusivadeseusautoresenãoreflete,necessariamente,a opiniãodeCorrented’escrita.Asimagensnãocreditadassãodo domíniopúblicoquecirculamempúblicosemindicaçãodeautoria.As matériasnãoassinadasãodaresponsabilidadedaredação.

MaisumaapostaeumainiciativadoCorrented’escrita.

Homenageandooaniversario dodistritodeCanasvieiras,na sequenciadolivroCANASVIEIRAS,emabrilserarealizado umevento,abertoacomunidadeescolarederesidentes, ondeaHISTÓRIAeasGENTESdesteladonortedaIlha, estaraoempauta. NoproximonumerodoCorrented’escritatraremosmais pormenoressobreesteimportanteevento.

ESCREVA * DIVULGUE

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Só os textos não assinados vinculam e responsabilizam a Corrente d’escrita e a sua direção; os textos e opiniões assinados responsabilizam exclusivamente os seus autores.

Corrente d’ escrita

Nestenumeroenesteeditorial,queremosgritarbemaltoonossorepudiocontraanomeaçao,comopresidentedaFundaçaoCatarinense de Cultura, orgao maior de gestao cultural e literaria em Santa Catarina, de um homem que nada conhece de Santa Catarina, de sua historia, de sua literatura e cultura, de seu povo, a nao ser, se declarar devoto de CatarinadeAlexandria,sercontraoCarnavaleumolavistaretrogadoconfesso.

Ómalnaoestaemeleseafirmarpaulista,advogadoefilosofo,massim,odepugnarporteorias retrogadas, antinatura, condenadas pelos tempos correntes, pela ciencia e pela experimentaçaocientífica.Umhomemdestequilate,naopodedirigirumaestruturaquemovimentamilhoes, quetemcomogeneahistoriadeumpaísedeumpovo,suastradiçoes,suasmarcascomculturademarcadaeenriquecidaporcontributospluraiselargamentetestadospela vida.

Infelizmente,apesardosprotestos foifeitoumabaixoassinadopormaisde12milpessoasligadasaculturacatarinense o atual governador, que ja tinha sido obrigado a recuar aquando de tentativa de nomear um militar proximo das hostes bolsonaristas, nao tem dado sinais de ponderaçao. Mas,aassimcontinuar,eoEstadoeoscatarinenses,quesaemperdendo.

Bom senso, e o que se pede, quando se esta a frente de um estado,queaoníveldemuitasoutrascoisas,caminhanavanguarda.

Porhojeetudo,boasleituraseateaoproximomes.

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Corrente d’escrita Número 50—fevereiro 2022
Editorial
ESCREVA

Livraria Cultura em seu auge: sempre cheia e repleta de lembranças

Fefito - Colunista do UOL

Cartao postal de Sao Paulo, a Livraria Culturafechousuasportas.Emrecuperaçao judicial desde 2018, a empresa teve sua falencia decretada na ultima quinta-feira (9/2) pelo juiz da 2ª Vara de Falencias e Recuperaçoes Judiciais. Notexto,asentençadizque"enotorio o papel da Livraria Cultura, de todos conhecida. Notoria a sua (ate entao) importancia, e nao apenas para a economia, mas para as pessoas, para a sociedade,paraacomunidadenaoapenas de leitores, mas de consumidores emgeral".

De fato, ha muitas lembranças vividas no lugar que foi considerado por Jose Saramago como uma "catedral de livros".Emseuauge,noConjuntoNacional, na Avenida Paulista, ela chegou a ter quatro unidades - a principal, uma voltadaparaomundogeek,umaexclu-

siva da Companhia das Letras e outra para livros de arte. Em seu teatro, ao longodeanos,umadasmaisbemsucedidas peças da cidade ficou em cartaz, "A Alma Imoral", com Clarice Niskier. Historias de amor começaram e continuaram. Autores foram descobertos e testadosemgrandeslançamentos.

Acolunadecidiuirvercomosproprios olhos. Em seu primeiro dia apos o decreto de falencia, o que se viu foi a grande pressa de editoras famosas para recolher seus livros antes que o espaço fosse bloqueado e lacrado pela Justiça. No terreo, a area dedicada as obras da Companhia das Letras estava completamente vazias. No primeiro andar, caixas e mais caixas da editora Record foram empilhadas e funcionarios do espaço infantil começavam a embalarbrinquedosealmanaques.Em vao, funcionarios tentavam preencher asprateleirasvaziascomoutroslivros.

A ordem era tentar "vender o maximo possível antes do fechamento", afirmouumatendentecomquemacoluna conversou.

Envolvida em acusaçoes de fraude e

alvo de relatos de assedio moral ha alguns anos, a Livraria Cultura, que ja teve unidades em diversas capitais, estava reduzida apenas a Sao Paulo e Porto Alegre. Nesta sexta-feira (10/2), emnadalembravaseusaureostempos. Curiosos passeavam e faziam fotos para se despedir do local, tao cheio de memorias. No lugar de atendentes, na maior parte dos computadores do salao,funcionariasdeTIjatentavammudar o sistema para finalizar pendencias.

Editoras encaixotaram livros antes do fechamento.

Com vocaçao para agitar a cena culturaldopaís,olugarjasedioulançamentos de nomes como Caio Fernando Abreu, Rita Lee, Drauzio Varela e tantosoutros.ParaquementranoConjunto Nacional em busca de livros, uma outra livraria, chamada Drummond, abriu num dos espaços que pertenceu a agora falida empresa. Ó que restam sao as memorias. E a expectativa de que todos os problemas trabalhistas sejamsanados.Eofimdeumaera.

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Para voce que, como eu, acha que Sao Paulo perdeu um enorme pedaço da sua alma com o fechamento da Livraria Cultura,sabia que uns doiskm pra frente, perto da estaçao Brigadeiro, ficam a Livraria Martins Fontes? Sao tres andares de estantes abarrotadas de lindos livros, sendo que no ultimo tem um "saldao". Tem uma cafeteria, sessao infantil. Se livrarias forem negocios rentaveis, elas permanecerao, Entao, da proxima vez que for comprar online ou mesmo quiser tomar umcafezinho,passeporla!

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E publico que Santa Catarina, sobretudo a Ilha com o mesmo nomee grande parte doseu litoralfoi povoado pelos povos que vieram das nove ilhas do Açores, territorioautonomodePortugal.Saíramdasilhasem 1948 e chegaram a Florianopolis, no tempo ainda Desterro, em 6 de janeiro de 1748. Entre este ano e 1756 vieram cerca de 6 mil povoadores, sendo que, cerca de mil e quinhentos demandaram para o Rio Grande.

Este ano, em comemoraçao deste importante evento, ogrupoempresarialNDtomouainiciativaderealizar reportagensdivulgadasnosseusorgaosdecomunicaçao, nomeadamente jornais e tv, bem como elaborou duas publicaçoes (gibi e livreto) que esta a distribuir pelas escolas municipais de todo o Estado. Louvavel açao, ate porque isso permite trazer as crianças no novo olhar sobre as origens do Estado, e em particular de todo seu litoral. Importante tambem para a maioriadosprofessores,queoslevamadebruçarsobre o assunto, que nem sempree das suas preocupaçoes.Corrented’escritaapoia,pois,estasaçoeseducativasetodasquetenhaavercomnossahistoria,nossoscostumesecultuadiversificada.

A23demarço,emFlorianopolis/SC,festejamoso350 ºaniversariodafundaçaodacidade,notempo(1673) denominadaNossaSenhoradoDesterro.

Foifundadapelovicentistaluso-portuguesFrancisco DiasVelho.Em1726mudariadenomeparacidadede Desterroe,nosmeandrosdaRepublica,virianovamenteamudar,numainiciativacriticada,aindahoje, comonomedeFlorianopolis,homenageandoFloriano Peixoto,homemdecarizditatorialquemandariamatardezenasdedemocratasquenaocomungavamde seusideaispolíticos.

Paraquemquiserconhecerempormenorafundaçao dacidadecomachegadadeFranciscoDiasVelho, aconselhamosolivro Sangue Lusitano O sul do Brasil só é brasileiro, porque foi português, donossodiretorefundadorAfonsoRocha.

Alemdetratardafundaçaoedoevoluirdacidadeate achegadadosaçorianos,dasarmaçoesdasbaleias,da construçaodasfortalezas,dainvasaodailhaporparte doscastelhanosem1777, Sangue Lusitano trataem pormenordoromanceedaobradoportuguesAleixo Garcia,naufragodaarmadadeJoaoDiasdeSolis,em 1516,nosuldailhaeque,em1524,iniciariaumaviagempelosertao,ateaoterritoriodosincas,aprocura daprataedoouro.

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Mensal: março de 2023

Maria do Rosário Pedreira vence Prémio Literário, Casino da Póvoa, do Correntes d'Escritas.

Aescritoravenceuopremioliterario pelomaisrecentelivrodepoesia,"Ó Meu Corpo Humano", publicado em 2022. Ó anuncio foi feito ao final da manha desta quarta-feira na Povoa deVarzim.

Maria do Rosario Pedreira nasceu emLisboaem1959eelicenciadaem Línguas e Literaturas Modernas na FaculdadedeLetrasdaUniversidade deLisboa

Ó MeuCorpo Humano, dapoeta Maria do Rosario Pedreira, e a obra vencedoradaediçaode2023doPremio Literario Casino da Povoa. Ó anuncio foi feito ao final da manha desta quarta-feira durante a sessao de abertura do festival Correntes d’Escritas, no Casino da Povoa, que contou com a presença do ministro daCultura,PedroAdaoeSilva.

Adecisaofoitomadaporunanimida-

de pelo juri, este ano composto por FernandoPintodo Amaral, Helena Vasconcelos, Jose Antonio Gomes, Jose Mario Silva e Patrícia Portela, que elogiou a “coerencia tematica e estilística” da obra, “bem como pela sua ousadia na forma como aborda a experiencia do corpo humano nas suas multiplas dimensoes (como o desejo, a memoria, a morte), incluindo arelaçaodoeucomooutro”,citouo Publico.

Publicado em abril de 2022, Ó Meu CorpoHumanoeoregressodeMaria doRosarioPedreiraapoesia,depois de 18 anos de silencio (o anterior livro de poesia, Nenhum Nome Depois, foi publicado em 2004). A sinopsedivulgadapelaeditoraQuetzal descreve-o como “um livro cheio de beleza e iluminaçao, como uma aula de anatomia que procura os segredosdecadarecordaçao”.

Este eo quarto volume depoesia da escritora, que se deu a conhecer como poeta em 1996, com A Casa e o Cheiro dos Livros, que venceu nesse ano o Premio Maria Amalia Vaz de Carvalho. Por essa altura, Pedreira contavacomumromancepublicado, Alguns homens, duas mulheres e eu, ounicodasualongabibliografia,que inclui varios livros infantojuvenis, ensaios e letras de cançoes (sobretudofado).

NascidaemLisboaem1959,aescritora licenciada em Línguas e Litera-

turas Modernas na Faculdade de LetrasdaUniversidadedeLisboaeainda editora de literatura portuguesa nogrupoeditorialLeya.

Esteano,concorremaoPremioLiterario Casino da Povoa obras de A.M. Pires Cabral, Antonio Cabrita, Helia Correia, Luís Filipe Castro Mendes, Margarida Vale de Gato, Regina Guimaraes,RosaAliceBranco,RosaÓliveira,RuiAlmeidaeRuiLaje,segundoaLusa.

Ó Premio Casino da Povoa premeia uma obra editada em Portugal e escrita por um autor de língua portuguesaoucastelhana.Eatribuídonos anosparesaumanovelaouromance e nos anos ímpares a um livro de poesia. No ano passado, o galardao, que tem um valor de 20 mil euros, foi para Luísa Costa Gomes, por “Afastar-se”. Ó ultimo poeta a ser premiado foi Maria Teresa Horta, por“Estranhezas”.

ÓfestivalatribuiutambemoPremio Literario Fundaçao Luís Rainha, que distingue anualmente uma obra literaria inedita cujo tema seja a Povoa de Varzim.A vencedora foiMaria da Conceiçao Braga, com Brisas, refere a Lusa. Ó premio Papelaria Locus, quepremeiaumcontoouumpoema inedito produzido por jovem autor, foi para Jose Pedro Alves, autor de Lençois.

Aediçaode2023doCorrentesd’Escritas,ofestivalliterariodaPovoade Varzim, decorre ate 19 de fevereiro, este domingo. A sessao de encerramento acontece nesse dia, pelas 17h30, na sala principal do CineTeatro Garrett. Ó evento conta este anocomapresençade98autoresde expressaoiberica,de15nacionalidades.

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Mensagem (fictícia) da confreira Dalvina

Meus queridos confrades, meus filhos adotivos, meus amores, como sabem, minha hora de partir, chegou.

Já estou instalada num cantinho onde todos estamos presentes e todos somos iguais. Convosco, criamos esta casa, esta nossa casa, a que chamamos Academia de Letras de Biguaçu.

Para os mais antigos, como o Joaquim, que também já partiu, a Osmarina e o Adauto sabem, não foi obra fácil chegar até aqui.

Mas ela aí está, agora com mais de um quarto de século (27 anos), fresca, ladina e temperada, pronta para os grandes desafios dos anos vindouros.

Vocês, confrades, são o meu orgulho e os continuadores desta obra coletiva maravilhosa, dedicada à formação das pessoas, à literatura, às artes, à propagação da cultura.

Confio em todos vocês: jovens, idosos, menos jovens e menos idosos, mulheres, homens.

E como Estrela, que sempre fui, vos acompanho, dia e noite e vos ilumino.

Estou tranquila.

O meu legado, o nosso legado coletivo, fica em boas mãos.

Vocês são gente boa, gente de fibra, gente porreta.

E a gente um dia se reencontrará, sempre, a qualquer momento, no coração de cada um de nós. É só querem.

Aqui, neste cantinho que me foi reservado, o tempo não conta e as distâncias também

não.

Por isso estaremos sempre juntos.

Salvé, pois, meus amores, meus companheiros de jornada e um forte até sempre.

Vossa Estrela, Dalvina de Jesus Siqueira.

Homenagem póstuma à professora, fundadora e primeira presidente da Academia de Letras de Biguaçu e embaixadora da cultura do mesmo município. In memória, Biguaçu, 23 de fevereiro de 2023.

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Afonso Rocha

Perfil

de comunicaçao com os filhos esta sendo um impacto. Isso vem do vício de entrar numa sociedade naoindígena.Ósmaisnovosficamfocadosnatelevisao,nocelular,enesse entra-e-sai da aldeia para a cidade para receber os benefícios do governo(Bolsafamília,auxíliomaternidadeetc.).

toetermineimeuensinomedioem Manaus.Deiumtemposozinha,por uns dois anos. Queria me sentir sempressao.

E o que você fez nesses dois anos?

FizcursodeadministraçaoetrabalheinaempresaPanasonic,daZona Franca, com japoneses. Me sentia

Nelly Duarte, indígena Marubo

Nelly Duarte

“Sou Marubo,nascinaaldeiaPosto Indígena Curuça, no vale do rio Javari, Amazonas. Surgi dos meus pais, Rane Tupane e Tama Sheta. Cursei Bacharelado em Antropologia na Universidade Federal do Amazonas e hoje sou aluna do curso mestrado no Programa de PosGraduaçao em Antropologia Social do Museu Nacional/UFRJ.Moro em Icaraí–Niteroi/RJ”. Sou neta de Joao Tuxaua, liderança Marubo, considerado um ser especial entre seu povo. Desde que comecei a estudar, a família me cobrou muito para eu ocupar esse lugar de liderança. Quando ingressei na universidade para estudar antropologia,asmulheresdaaldeia souberam disso me pediram ajuda. Aqueixaprincipaldasmulheresea de que seus filhos e filhas nao tem mais tempo para ouvi-las. Para nos,aformadeeducarascriançase sentar com a filha e com o filho, conversar,chamaraatençaodopai para que haja uma conversa entre paiefilho,conversarcomasavose os avos. Esse momento de ruptura

Ainda pequena, meu pai me mandou estudar na cidade com os padres. Para ele, bastavaeuaprender alereescrever,depoismetornaria uma professora ou assistente de enfermagem na aldeia. Nao estava previstoqueeuentrassenauniversidade. Sempre que eu voltava nas ferias para a aldeia, tinha que contar tudo o que eu tinha feito na escola,relatartodaaminhaexperiencia do ano. Ate uma musica que eu tinha ouvido na cidade, meu pai pedia para eu cantar na frente de todo mundo. Ele adoravame expor nafrentedaspessoas.Issomefrustrava e me envergonhava, mas ele queriaqueeutivessedesdepequena um espírito de liderança (kakashavo,emlínguaMarubo).Ele queria que eu fosse uma liderança porque ele nao teve filho homem. Como eu era quem estava aprendendo a situaçao de duas sociedades, para ele, eu seria uma portavoz.Aí,comeceiasentirquenaminha família nao poderia viver normalmente, assim como na outra sociedade tambem nao. Eu ficava me perguntando o tempo todo quemeuera.Depois,saidoconven-

tao livre… ninguem me cobrava nada,erasoeu,naofalavaquemeu era para ninguem. Aí recebi uma proposta para trabalhar em uma organizaçao indígena. Quando cheguei, uma liderança queria que eu fosse dele. Para trabalhar la, eu teria que ser dele. Foi um momento de crise: ao mesmo tempo eu queriaentraraliefazercomquemeus pais me vissem como liderança, mastambemnaoqueriaterdeficar com um homem de quem nao gostava. Acabei me afastando de la, e elecomeçouafalarmaldemim.Foi uma situaçao chata. Eu queria me afastar, mas ao mesmo tempo queria provar que era igual a ele, que nao precisava virar mulher dele paraserimportante.

Aí, apareceu em Manaus um curso de Antropologia Aplicada, atraves do CIMI (Conselho Indigenista Missionario) [1]. Teria gostado de fazer,masaquelaliderançatinhaque me dar uma declaraçao. Resolvi pedir para ele, ele deu, mas logo depois fingiu que nao sabia de nada, nao pagou minha matrícula e aindafalouummontedecoisasabsurdasparaminhafamília.

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Acabei ficando doente. Peguei tuberculosee fiquei 3meses sem ver ninguem no hospital. Nesse tempo tambem perdi meus dois irmaos que morreram de hepatite delta [2].Compreicasanacidadeeacolhi meus pais que estavam sem condiçoes emocionais e mesmo materiaisparaviverporqueosdoisfilhos tinham morrido (uma menina de 14 anos e um menino de 10 anos). Elesentraramemdepressaoevirei mae e pai dos meus proprios pais. Como eles nao sabiam viver na cidade, acabei sendo aquela que resolviatudo.

Entao comecei a trabalhar com os Maristas que davam palestras nas escolas e entrei na faculdade, em Benjamin Constant, na UniversidadeFederaldoAmazonas.

Escolhi estudar Antropologia. A antropologia me chamava a atençaoporquequeriaconhecerarealidade do Óutro, afinal nasci e cresci vendoantropologostransitandoali, entaoafinal,“qualeraacuriosidade que traziaumantropologo ali, qual era o interesse dele em conhecer meu povo, e para que isso?” Ja que os antropologos estudam indígenas, eu queria estudar antropologos.

Foi quando minha mae teve a terceira recaída de cancer, aí tive que cuidar dela mesmo fazendo curso. Masconseguifinalizar.Nessestempos, conheci as mulheres Marubo da aldeia Boa Vista, do Rio Ituí (AM). Elas trabalham com artesanato,edisseramqueninguemmais estava aprendendo sobre isso. Eu trabalhavanaFUNAIdemanhaeia depoisparaocurso,umdiacheguei emcasaanoiteeasmulheresesta-

vam la. Queriam falar comigo. Me deu vontade de fugir. Pediram a minhaajuda:“Ósantropologoscontam tudo errado ! Nos somos as autoras das nossas falas, e queremos que voce conte do jeito que a gente contar para voce. E que voce coloque isso no papel”. Esse pedido das mulheres foi mais forte. Tentei fugir porque essa cobrança era tao forte quanto as cobranças da minha família e as conversas eram sempre bem emotivas: “estamos morrendo, ja estamos acabando e voce nao pode fugir, seu avo foi responsavel pelo povo, vocetemqueteressaresponsabilidadetambem”.

As mulheres querem ter voz através de você, que seus ensinamentos ganhem o mundo …

A tradiçao sempre da a voz ao homem. Ó homem tem que estar na reuniao, tem que falar em pe, as mais velhas tentam ter voz, mas a mulher mais nova nao tem esse momento. Ela acha que tudo o que elavaifalar,otxaivairiroualguem vaiesnobar.

Engraçado que segundo um dos meus parentes homem, as mulheres nao prestam para dar informaçao, tem um machismo incorporadoaí.

Quandoeutrouxeasmulherespara oMuseudoIndioaqui,paraaÓficinadeMiçangas,eledisse:“Paraque que voce leva as mulheres? Elas vao morrer no caminho, nao vao aguentar”. Mas vejo que as mulheres Marubo querem contar. Claro que cada uma tem uma forma de contarhistoria,naohaumahistoria verdadeira, e sempre “a historia

que minha mae me contou”, “a historia que minha avo me contou”, mas para alguns homens, so a historiadeleseaverdadeira.

Nelly, como se sente de estar aqui estudando?

Hoje, estou um pouco sem chao comamortedeminhamae.Mesmo que meu pai tenha ficado com a responsabilidade de me contar as historias,elenaotemmuitapaciencia para explicar. Agora vou reaprenderavivercomaausenciadela. Ela sempre dizia: “voce vai ter queaceitarashistoriasdojeitoque elas sao contadas. Nao ha historia verdadeira. Seus tios dizem isso, mas ser o paje, nao significa ser o dono da historia. Voce tem que valorizarcomoseproduzasituaçao,e qual e o vínculo da pessoa com a historiaecomoqueestaproduzindo.”

Quase desisti do mestrado, mas antes de morrer minha mae segurou na minha mao e disse: “Estou morrendo, mas voce nao vai desistir. Ficarei muito triste sevoce nao continuar. Quero que voce mostre para o seu pai que voce nao precisou ser homem para ser uma liderança.” Entao eu vim, e e por ela queestouaqui.

[

1] Ó Conselho Indigenista Missionario e um organismo vinculado a Confederaçao Nacional dos Bispos (CNBB) que atua em defesadospovosindígenasedeseusdireitos.

[2] A hepatite delta (HVD) e um vírus que dependedapreviaincidenciadahepatiteB para infectar uma pessoa. A regiao amazonica do vale do rio Javari (AM) vem apresentando taxas de mortalidade altíssimas entre indígenas por contaminaçao por HVD.

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Dia23deMarço,Florianopolis,avelhaNossaSenhoradeDesterro,deFranciscoDiasVelho,completa350anos.

Povoada,sobretudoapos1748,porcasaisaçorianos,madeirenseseportugueses dasvariasregioescontinentais,apopulaçaodacidadeganhou,modernamente,otítulode“Mane”ou,maiscarinhosamente,demanezinha. Emsuahomenagem,estetextodomaiormanezinho,dailha.

“Maneeapintadamae!”Eraassim,comumpalavrao cabeludo na ponta da língua, que o nosso homem de beiramar respondiaasprovocaçoesdoilheu urbano, quando vinha na cidade para uma consulta com o doutorBarreto,baterumachapaoufazeruns inzames noDepartamentodeSaudePublica,ouaindacomprar riscadinho na Casa Salma e fazer aquela roupa nova paraaprocissaodoSenhordosPassos.

Entretanto, essa indulgente revolta faz parte de um passado,naomuitodistante,everdade,quandootermo manezinho era visto de uma forma pejorativa: qués o quê, ô istepô! Tás pensando co sô otaro?

Comodecorrerdosanos,oilheusepultouotermoem seusentidopejorativoparaassumiramanezice,oque foi provocado pelo inchaço de sua cidade, caminhandoemritmodemetropole,aoacolherumaavalanche de almas efetivamente dispostas a navegar para a eternidade neste pedacinho de terra docemente perdidonoAtlantico.

HaquemdigaqueessaautoestimacoletivafoiprovocadaapartirdacriaçaodoTrofeuManezinhodaIlha, em1987;entretanto,comocriadordoevento, sou suspeito para fazer uma avaliaçao mais profunda.Masficocomacertezadeque,com a criaçao do Trofeu, o ilheu reconquistou a autoestima e, hoje, a caminho do terceiro milenio,temumorgulhodesgraçadoemseassumirManezinho.

Na verdade, o trofeu Manezinho da Ilha, nao tem a pretensao de resgatar a cultura açoriana; se assim fosse – seria recomendavel premiar milhares de moradores das comunidades praieiras, mas, sim, homenagear pessoas

identificadas com o cotidiano da cidade, com elevado espíritoilheu,comsentimento de orgulho por Florianopolis. Em síntese, ser Manezinho e um estado de espírito.

E,combasenahistoriadotrofeuaolongode11anos, emquejaforamhomenageadasmaisde200personalidades dos mais variados segmentos sociais, meu amigo Chico Amante, manezinho juramentado e com direitoadiploma,umadocefiguraquerespiraFlorianopolisoanointeiro,decideperpetuaramemoriados ManezinhosdaIlhatambememlivro,sobosugestivo título Somos Todos Manezinhos, um incansavel e eficiente trabalho de pesquisa e que revela o espírito festivo de nosso povo, bem como o perfil de mais de duascentenasdefigurasexpressivasdenossacidade eque,dealgumaforma,sedestacaramourepresentaram determinadosegmentodasociedade. Um livro com conteudo historico, que seguramente vai merecer lugar de destaque na estante daqueles queefetivamenteamamFlorianopolis.

Aldírio Simoes de Jesus no prefacio do livro Somos todosManezinhos,deFranciscoHegídioAmante,lançadopelaEditoraPapa-livro.Florianopolis,1998.

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Moçambique – Dialeto Local

So quem viveu em Lourenço Marques, atual Maputo, iraentenderestedialectoLANDIM.

Boanoite,meusirmaoLaurentinos(naturaisdeLM).

Aqui,doMafalala,falaoCanganhiça(preguiçoso)para os seus mulungus (brancos) que estao a viver no (Puto) Portugal, pra lembrar as coisas xonguilas (bonitas) que acontece no nosso Maputo (desculpa, nossoLM).

Nooutrodia,pegastenaminhaburra(bicicleta)todo xonguila (bonito) e foste no Man Kay pra compraros comida, mas nao tinha maningue male (muito dinheiro)eassimtinhaqueprocurarcoisamaisbarata.

Visteunspacotesquedizia"PeitosdeFrango"!

Disseramqueerambomparafazerumpratoquechama "Estraga o inhofe". (queria referir-se a comida strogonoff) xai wena eu nunca ouviste falar que as galinha tem peito!!! E tambem estraga o inhofe ( traseiro, rabo, cu)! Wa hemba mufana! (Estas a mentir, rapaz)!

Chiça, se eu falar minha tombazana ( moça, rapariga jovem,)ouminhamamana(mulhermaisvelha)oque eu viste, vais arranjar timaca (problemas) e elas vao me bater, xicuembo xanhaca (jura)! Ó melhor e ir no xitolo (loja) comprar coisa pra fazer "Caril de Amendoim"ou"Matapa"ouainda"Peixe"acompanhadode "ChimadeArroz"ou"PapadeMandioca".

Depois vai no mercado do Xipamanine comprar uns vegetal, passas no padaria Serrano na Rua Irmaos

Roby(AltoMae)pralevarpao.

Hojechega,minavainofamba(vouembora)masnao vai de mova (carro) que so pega de tchova (empurrao),vainomachimbomboateaomeupalhota.

(casa)

Paraobomcomidadojantar,mina(eu)eomeubhava ( pai) nos vai beber uns Catembe ou Tricofaite ou Penalti.

Kanimambo (obrigado) por me aturarem e hambanine(tchau)eintemezuco(atemaislogo).

Passopa mulungus, (cuidem-se brancos) ouvi dizer queestamuitofrioaínoPuto.

Autordesconhecido

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Numa das ruas de Montevideo

Ano VI Número 60 Mensal: março de 2023 de 2022

Mais uma obra do escritor Afonso Rocha

Um romance baseado em fatos, que nos obriga a adentrar no âmago da história de Portugal e das guerras coloniais em África, para entender os áridos e dolorosos caminhos trilhados por

Maria das Acácias e Mário Jorge

pré-venda já disponível

Para divulgar (grátis) seus trabalhos no Corrente d’escrita

Envie-nosseustextos(maximo:4miltoquesparacronica,contoouensaio).

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março de
á

Ano VI Número 60 Mensal: março de 2023

No Mundo dos livros

Vocecertamentejapensounapossibilidadedeterseu livronavitrinedasprincipaislivrariasdopaís.Infelizmenteesteeumsonhodistantedarealidadedamaioria das editoras no Brasil. Concorrer com best-sellers nacionais e internacionais de grandes editoras pode dar uma sensaçao de desanimo, mas nao desanime! Voce nao esta sozinho e grandes escritores tambem naoestaonavitrinedaslivrarias.

Primeiro e preciso entender que sao lançados milharesemilharesdelivrostodososanosnoBrasilenao hacomoumalivraria,emumespaçode4metrosquadrados, expor todos os bons títulos. Entao deve estar se perguntando: Como as pessoas encontrarao o meu livro? Continue acompanhando nosso blog e conheça formasdedivulgarseulivrosemsairdecasa.

Óutrofatorimportanteparaentendermaissobredistribuiçaodelivrosesaberquenaohacomoalivraria saber se seu livro vendera muito ou pouco, por isso, normalmenteseulivroevendidoprimeironositeantes de serem solicitados exemplares em consignaçao. Portanto,estarnalojafísicajaeumgrandeavanço.Ó espaçoemshoppings,centroscomerciaisetc.costuma ser caro para as livrarias e estocar livros de todos os autoresquepublicamejapublicarameimpossível.

A livraria é soberana na sua política de compra e venda, por isso, nenhuma outra empresa pode garantir colocar o seu livro na loja física e muito menos na vitrine.

Existemalgunscasosemqueoautordeveinvestirem livrarias. E o caso de autores que ja possuem um publico avido pelo seu livro. Palestrantes, autoridades religiosas,escritoresquefazemumtrabalhodedivulgaçao forte etc. Ainda assim, aconselhamos que usem a livraria da editora ou a propria para vender o seu livro.

Na Editora Albatroz cobramos apenas uma parte do valor da venda do livro para fins administrativos e o autorficacomamaiorparte.Casooautorprefiravender todos os exemplares sozinho ele fica com 100% dos lucros da venda. Em contrapartida, as livrarias costumam cobrar ate 55% do preço de capa, fora o valordofrete.

Por fim, a ultima das consideraçoes que fazemos e com relaçao aos acertos. A livraria pode levar ate 60 diasparafazeroacertodeumavendaeagranderealidade do mercadodelivros eque epreciso serinsistente nas cobranças e ter um forte controle sobre os livros consignados, pois muitos ficam meses sem seremvendidoseporvezesalivrariaacabadevolvendo amercadoria.

Conte com a Editora Albatroz para tirar qualquer duvidasobrevendaedistribuiçaodelivrosemlivrarias!

NR Abstivemo-nos de comentar questoes publicitarias. Este texto e meramente indicativo de autoria da editora referida.ACorrented’escritanaoindicaestaouaquelaeditora.Eumaescolhabempessoal.

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CASOS & GENTE com História

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terofrutodoseupropriotrabalho, umdoslemasdoMarxismo.

Para garantir esse direito surgiu a cerca, a propriedade individual e a frase“estaterraeminha”.

Nessesentido pre-agrícola, o Brasil eraumaterradeninguem.

conheciam.

Tema recorrente do Enem, “ apenas 13,8% de todas as terras do Brasil sao reservadas aos povos originarios”.

É da discussão que nasce a luz

O Brasil não era dos índios

A narrativa que aprendemos nas escolas afirma que o Brasil pertencia aos Indios e por violencia o tomamosdeles.

Imaginem o Brasil de 1500, com 30.000aldeiasindígenas.

Seriam 30.000 pontinhos minusculos, mais um raio de 2 dias caminhando a pe em volta, menos que 50quilometros.

Óu seja, eram tres milhoes de indígenas, que ocuparam 0,1 do nosso territorio,o restosemantevevazio por400anoseimprodutivo.

Sim, nos descobrimos terras, que ateosíndiosdesconheciam.

AnarrativaqueCabralviuumíndio na praia e disse "vamospara as Indiasporqueessaterrajaestatomada",eridícula.

“Tomar” na nossa cultura, e tornar a terra produtiva e nao depreda-la e mudar de acampamento de tempos em tempos, como faziam os índios.

Propriedade privada surgiu com a agricultura, o direito do plantador

Ós proprios índios nao tinham o conceito de propriedade privada, “viviamdacaça,dapescaedaagricultura de subsistencia, mudando periodicamente a instalaçao das aldeias conforme a exaustao dos recursos naturais disponíveis no entorno”.

Queosíndiossaoopovooriginario, como muitos dizem, tambem e falso.

Nossos indígenas sao da Asia,onde alguns poucos atravessaram o estreito de Bering 15.000 anos atras, e chegaram no Brasil 5.000 anos depois.

Ate hoje 23% das terras sao devolutas,ouseja,naopertencemaninguem.

Pertencera aqueles que acharem umafunçaosocialparaaterra.

Manter 13% do nosso territorio porque 168 tribos nomades “poderaoumdiaprecisardele”nao condiz com o princípio de terra produtiva.

Óu seja, e uma narrativamentirosa que nos roubamos o Brasil dos índios.

Ós portugueses descobriram sim terras novas, que os proprios índios, a maioria no Amazonas, des-

Comose100%dasterrasdevessem pertencer aos povos originarios, que na realidade nem sao, e nos brancos somos crueis usurpadores deterras.

Etotalmentefalsaaideiadequeos tresmilhoesdeíndiosqueexistiam em 1500 eram “donos” do Brasil. Tres milhoes cabem na cidade de Salvador,com0,01%daareanacional.

Eles eram uma parte muito pequena do Brasil, o resto eram terras naoprodutivassemdono.

Em1800continuamosasersomente tres milhoes de brasileiros e índios quando surge a imigraçao de italianos,polonesesealemaesmorrendodefome.

Que os portugueses e brasileiros roubaramaterrabrasilisdosíndios queaquiestavamnaoebemassim. Haviaespaçoparatodos,comoainda tem. 1.000 brasileiros possuem 43km2,CoreiadoSul1.000Coreanosvivemem2,6km2.

Querer manter 99% do territorio porque os índios ainda sao nomades, seria imoral com tantos europeus passando fome, e precisando de muito menos terras por serem agricultores.

ÓBrasildodescobrimentonarealidade era uma terra despovoada,

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nao havia cidades como em Portugal, nem estradas, nem aquedutos comoemRoma.

Nossos índios ainda tateavam na area da agricultura desenvolvido 12.000 anos atras na Europa, e por isso precisavam enormes espaços parasobreviver.

Porseremnomadesnemoconceito de propriedade tinham, muito menos de cultivar e cercar a terra e construircasaspermanentes.

Por serem ainda nomades, mudavam de tempos em tempos, abandonandoterrasquehaviamesgotado.

ManterosíndiosnaIdadedaPedra, ausentes de tanto conhecimento adquirido desde entao, e uma maldade politicamente correta que fazemoscomosíndios.

Felizmente, 30% dos índios brasileiros ja assimilaram e vivem nas cidades.

Mas foram com essas mentiras que Óngs, a maioria estrangeiras, conquistaram 13% do territorio nacional, para somente 100.000 famílias índiasaindaexistentes.

Quandosomos50milhoesdefamíliasaotodo.

Em vez de terras indígenas, o que deveríamosterfeitoeosíndiosexigido, que ensinassemos a tecnologiadaagricultura.

Óu profissoes uteis, que de fato 300.000 índios aprenderam e hoje vivem nas cidades com 1/1000 do espaço

* Prof. Stephen Kanitz, in Facebook.com/Roberto Costa, 2022/05/20

MAR SALGADO,

Mais que mar salgado, sou um mar doente, morto.

Sou, o fundo do que não presta; do que está imundo; do que está podre; daquilo que os humanos não se servem mais.

Sou, o depósito das fezes e do mijo; dos pneus gastos; dos vossos combustíveis; dos eletrodomésticos sem conserto; dos colchões e mantas rotas; do calçado velho e gasto; dos canudinhos, caixas, sacos e dos outros plásticos descartáveis; das camisinhas do prazer de mil cores e dos frascos de cheiros e dos cotonetes.

Sou, a tumba dos doentes terminais, dos assassinatos, dos mortos; dos tresloucados; dos bêbados e dos entorpecidos; dos irresponsáveis e das crianças espavoridas ainda sem tino.

Sou, fonte de sal; de vida, das vidas que geram dentro de mim; dos prazeres acalorados; de aventuras merecidas.

Sou, poço de sofrimentos; de lamentos; de aflições.

Sou, fruto de irresponsabilidades humanas, a solução para todos os vossos males e crimes.

Um dia, também eu, tratado assim, irei morrer...

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d’escrita
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construçaodovastoimperioportugues, que englobou os cinco continentes e remonta a “entidade políticaportuguesa”,iniciadanoseculo XI como um dos primeiros países domundo.

O Condado Portucalense

Entre os anos de 1087 e 1091, o cavaleiro frances Henrique de Bor-

atingisseamaioridade.

Ela começou a se autodenominar rainha, mas foi seu filho, depois de derrota-la no campo de batalha, que viu sua reivindicaçao reconhecida e pode se intitular rei de Portugal.

A primeira expansão do reino de Portugal

Breve história de Portugal

Uma breve história do gigantesco império português contada por um espanhol

Óinício:Aposderrotarsuamaeem batalha, D. Afonso Henriques conquista terras ao Sul, dobrando o territorio do Condado Portucalense, no sec. XI. Ó início da formaçao doimperioportugues.

EmartigoparaoGeografiaInfinita, o filologo espanhol Bernardo Ríos, notaque,quandoseviajaparaPortugal, dependendo do lugar que se visita e aguçando um pouco mais os sentidos, percebe-se duas grandes obsessoes da ideologia nacionalcultivadacuidadosamentetanto pelasinstituiçoesoficiaisportuguesasquantopelapopulaçao.

A primeira, o mar, compreensível dadaasualocalizaçaogeografica.A outra,aepocadasgrandesexploraçoes, tambem compreensível dada suahistoriae,maisumavez,consequencia da sua localizaçao geografica.

Apartirdaí,Ríostraçaahistoriada

gonha chegou ao Reino de Leon (atualEspanha)paraajudarnaluta contra os muçulmanos. Casou-se comTeresa de Leon, filha do rei Afonso VI, erecebeuo Condado Portucalense.

Este nao deve ser confundido com outro Condado Portucalense fundado no seculo IX e bem menor. Quando Henrique morreu, Teresa governou o condado ate que seu filho, D. Afonso Henriques,

D. Afonso Henriques, chamado o conquistador, deixou como legado um reinocomo dobrodotamanho que havia recebido (veja imagem Página

*
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doaltodapagina).

Em 1249, foi concluída a Reconquista portuguesa, com aexpansao para o extremo sul, a chegada ao Algarve e a expulsao dos mouros, definindoasfronteirasdopaíspraticamenteaoslimitesqueseconhecematehoje.

Em 1415, Ceuta, no Marrocos, foi conquistada, marcando o início de expansao do imperio portugues. Decidiu-se explorar a costa africana, ao sul e, em menor escala, a oeste.

Em 1418/19, Portugal chega a ilha daMadeirae,em1427,aoarquipelago dos Açores, no meio do Óceano Atlantico, a meio caminho da America do Norte [em verdade, as duasilhasmaisaoestedoarquipelago(CorvoeFlores)encontram-se ja sobre a placa tectonica norteamericana,emborasejamterritorio europeu].

Em 1471, um posto comercial foi estabelecido no Golfo da Guine, na

costa africana. Ó objetivo era chegar as Indias para dominar o comerciodeespeciarias.Em1488,os portugueses cruzaram o Cabo da BoaEsperança,naAfricadoSul.

A primeira etapa do império português

AposachegadadeColomboaAmerica e a divisao do mundo entre Portugal e Espanha pelo Tratado de Tordesilhas, a India foi alcançadaem1498eoBrasil,em1500.

Em1510,foifundadooEstadoPortugues da India, com capital em Goa.Em1511,Malacafoifundadae as Molucas, as apreciadasilhas das especiarias, foram alcançadas. Macaufoifundadaem1557eNagasaki,noJapao,em1570.

De longe, a parte mais importante do imperio portugues era o Brasil. De 1500 a 1530, a presença portuguesa parece ter se limitado a expediçoes de coleta de pau-brasil, arvore da qual era feira uma tinturadeboaqualidade.

Acolonizaçaocomeçou,defato,em 1534, quando D. Joao III organizou o territorio em 12 capitanias hereditarias. Mais tarde, em 1549, o modelo mudou e foi incorporado um governador geral para toda a colonia.

Uma boa data para estudar a colonizaçao de Angola e 1575, quando a atual capital, Luanda, foi fundada com o objetivo de dominar o comerciodeescravos.

Quanto a Moçambique, o controle daareajaeraefetivoem1530,emboraaameaçadoscorsariosturcos fosseconstante.

Após a independência da Espanha

Apos a independencia da Monarquia Espanhola, em 1640, Portugal viveu guerras contínuas com a Holanda e com a Espanha. Com a primeira, por manter seu imperio colonial,comasegunda,porsuaindependencia.

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AultimaedefinitivapazcomaHolandafoiseladacomarecuperaçao dos territorios que ela havia tomado no Brasil, mas tambem com a perdademuitoslugaresasiaticos.

As primeiras perdas ocorreram cedo, ja no seculo XVII, para a Inglaterra,naIndia,easjamencionadascontraaHolanda.

Ao longo do seculo XVIII, os conflitos com a Espanha na America foramconstantese,noiníciodoseculo XIX, foi fundado o Reino Unido doBrasil,PortugaleAlgarve.

Este estado transformou Portugal em uma província, embora nao do Brasil, mas de um país cuja capital era o Rio de Janeiro e cujo territorio mais importante erao sul americano.

A independência das colônias

Portugal teve que reconhecer a independencia do Brasil em 1825. Apos essa enorme perda, o país se concentrouemexpandirseusterritoriosemAngolaeMoçambique.

Em 1961, a India invadiu militarmente Goa e o resto dos enclaves do subcontinente. Em 1975, ocorreuaRevoluçaodosCravos,pondo fim a ditadura de Salazar. Ó novo governo republicano rapidamente concordou em reconhecer a independencia dos dois países africanosedoTimorLeste,oarquipelago indonesio.

Ó ultimo enclave colonial portugues foi a atual cidade chinesa de Macau,entregueaogiganteasiatico em20dedezembrode1999.

Para Ríos, que considera Portugal “uma autentica joia e uma maravilha”,opaístemafamadeseraterradatristeza,dasvozesmelancolicas do fado agitando as roupas penduradas nas janelas, dos intrepidos marinheiros que navegavam pelosmaresdetodooglobo,deEça de Queiros, Jose Saramago e do enorme, insubstituível e inimitavel FernandoPessoa.

Mas, sobretudo, segundo Ríos, “Portugal vive com a cabeça voltada para a nostalgia ou, melhor, para a saudade de um passado pesado demais para umas costas tao pequenas”.

*EdmilsonM.VolpieengenheirocartografoeeditordapaginaCuriosidadesCartograficas noFacebookeInstagram
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Depois,costumodefinirosgrandes momentos de acçao numa linhacronologica.

Uma vez definidos os momentos,coloco-osemcartoesamarelosquecolocom“bostik” na paredeparameguiar. Assim, posso ir alterando a or-

Como escrever um livro?

Muitos tem a ideia de que, para escrever um livro, o autor se senta a uma mesa, contempla o horizonte e começa a despejar palavras ao sabor da inspiraçao. Naoeverdade.

Escrever e um trabalho arduo, muitas vezes frustrante, raramente pago e que requer algum metodoedisciplina.

A ideia geral ate pode surgir de formaromantica,nummomento em que as musas passaram e nos segredaram ao ouvido. Mas depois, e preciso estruturar a narrativa, caracterizar muito bem as personagens, criar um fiocondutor.

Eupessoalmentegostodecomeçarporfazerumaarvoregenealogica da personagem principal ou,casoafamílianaosejamuito relevante, um genero de organigramaondeestabeleçoarelaçao entreasdiferentespersonagens.

dememquequeroquesurjame acrescentando novos momentos amedidaqueahistoriaeaspersonagens se entranham. E que naoemitoqueoslivrosganham vida enquanto estao a ser escritos e o autor e empurrado para episodios ou desfechos que nao tinhainicialmenteplaneado.

Depois de varias semanas (ou melhor,meses)aprepararoenredo, posso finalmente sentarme a escrever, volta e meia olhandoparaoscartoesnaparede.Claroquetambemepossível começar logo a escrever alguns capítulos quando a historia ainda nao esta totalmente estruturada,paratestarotomeoestilo donarrador.Muitosdessescapítulos escritos inicialmente podem ate acabar por figurar na obrafinal.Masparamimedifícil escrever sem ter estas bases. E meio caminho andado para incongruencias ou repetiçoes, que

so vao fazer com que a revisao dolivrosejamuitomaisdifícil. Tambem gosto de ir parando e relendo.Haautoresquenuncao fazem e que preferem escrever tudoaeito.Mascomonaoposso dar-meaoluxodeapenasescrever romances, isto e, tenho de ter outras ocupaçoes que me permitem sobreviver, alem de doisfilhospequenos,eimperativo fazer pausas e abandonar o manuscrito durante dias a fio, pelo que, a releitura dos capítulos anteriores e essencial para manterotomeoritmo.

Nofinal,haoutrareleituracompleta (a revisao) antes de dar o manuscritoaleraoutraspessoas.

So depois disso e enviado ao meu editor. Nesta fase, ja estou comolivropeloscabelos,janao quero saber daquelas personagens, achoque nada faz sentido, preciso de me afastar. Mas so entaocomeçaoparto,quecomo qualquer parto, e muito doloroso.

Ó editor le, faz comentarios, sugere alteraçoes. Ó autor aceita (eu sempre, outros nem por isso),corrige,acrescenta.

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PARA BEM CRIAR...

Óeditorvoltaaler.Podeounao fazer outras sugestoes. Quando ambos concordam que aquela e amelhorversaopossível,olivro e vendido pelo editor a quem decide dentro de uma editora que livros serao publicados. Tudoistodurasemanasesemanas. Quandofinalmentehaluzverde, otextopassaparaorevisor,volta ao autor para que reveja as revisoes e so entao vai para a paginaçao, em seguida para a

grafica ate um dia chegar as maos de quem o criou, prontinhoeencadernado,brilhanteea cheiraranovo.

Tal como num parto, em que passamos horas de sofrimento ate nos colocarem o nosso bebe no colo, aquele bebe que imaginamos durante meses, mas que nunca vimos, a chegada de um livro as nossas maos e um momento magico. Ó momento em que o livro se materializa e pas-

sa a ser real. Nesse instante, esquecemos os meses de angustia criativa, de duvida, de vontade de desistir. Esquecemos a ansiedade daesperaporumaresposta. Esquecemos tudo e temos a certeza, se bem que fugaz, de queescreverumlivroeamelhor coisa do mundo, o nosso proposito na Terra, o unico trabalho que verdadeiramente nos faz feliz.

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cas. E era “um livroitinerario espiritual”, que ela lia em voz alta em diferentes localidades, o que o tornouperigosamentepopular.

Para as autoridades, a mensagem era que o amor a Deus poderia ser expresso sem a necessidade de um clerigo estabelecido como mediador.

suaobra.

Durante o julgamento, Porete negou-se a prestar o juramento de dizer a verdade perante a Inquisiçao, que considerava uma instituiçaoinjusta. Ela tambemse negoua receber a absolviçao sacramental porfaltasque,segundoela,naohaviacometido.

Quem eram as beguinas?

Quem eram as beguinas, mulheres que viviam em comunidades sem homensnaIdadeMédia?

BBC (01/03/2023)

Ó movimento das beguinas estendeu-se pela Alemanha, Italia e Espanha. Ilustraçao de uma beguina do livro ‘Des dodes dantz’, impresso por Matthaus Brandis em Lubeck, na Alemanha (1489) Foto: GERMANISCHES NATIÓNALMUSEUM

Em 1° de junho de 1310, na Place deGreveemParis,na França,MargueritePoretefoiqueimadaviva.

Ela havia sido condenada a essa morte angustiante por haver escrito uma obra mística, chamada Miroir des Simples Ames (“Ó espelho das almas simples”, em traduçao livre) – um dialogo entre o Amor, a Razao e a Alma, escrito emcercade1300.

Ela havia escrito o livro na sua língua nativa do norte da França, o picardo, e nao em latim, como determinavam as normas eclesiasti-

Essa ideia de democratizar a fe ameaçava reduzir o poder nao so doclero,mastambemdoreiFelipe 4° da França, que estava tentando estabelecer-secomodefensordafe catolica.

Por estes e provavelmente por outros motivos, o bispo de Cambrai, na França, declarou Ó Espelho das AlmasSimplesumaobra“heretica” na cidade francesa de Valenciennes, anos antes da condenaçao a morte da sua autora. Ó bispo mandou queimar publicamente uma copiadaobranaPlaced’Armes,em Paris.

Porete buscou o conselho de clerigos holandeses e contou com o apoio de uma figura eclesiastica iluminada:o ex-professorde teologiadaUniversidadedeParisGodofredodeFontaines.

Talvezimaginandoqueatempestade terminasse com o passar do tempo,eladecidiu,nofimde1308, ler seu tratado em publico, mas foi presa e entregue ao tribunal da Inquisiçao. Ó confessor do rei, Guilherme de Paris, interrogou-a por umanoemeio,enquantoumgrupo de 21 teologos avaliava trechos da

Ós inquisidores a consideraram herege reincidente. Marguerite Porete e seu livro foram condenados juntos.

Ó relato do cronista Guilherme de Nangis, que narrou a execuçao, conta que Porete demonstrou sinais de penitencia “nobres e devotos”, que partiram o coraçao dos espectadores.

Seu caso colaborou paraa elaboraçao de um canone do Concílio de Viena (1311-1312), condenando por heresia o movimento das beguinas, da qual Marguerite Porete eraumadasfigurasmaisimportantes.

Ómovimento

As beguinas foram parte de uma eradeforteflorescimentoespiritualduranteaIdadeMedia.

Nessa epoca, as mulheres cristas nao tinham muitas opçoes. Elas podiamcasar-secomDeusetornar -se freiras enclausuradas com votos de obediencia, castidade e pobreza, ou casar-se com um homem e viver semiconfinadas nos seus lares, com votos de obediencia e fidelidade.

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doc.com

Comisso,asmulheresquenaoquisessem se casar ou nao encontrassem um marido, devido a grande mortalidade dos homens nas Cruzadas, nao tinham espaço definido para viver, podendo usufruir de alguma independencia. Ó mesmo acontecia com as viuvas e ate com algumasmulherescasadas.

Assimsurgiu, no seculo 12, o estilo devidasemirreligiosodasbeguinas na regiao de Flandres (hoje ocupada por parte da França, Belgica e Holanda),queserviudeterceiravia paramulheresdetodasasclassese condiçoesfinanceiras.

Elas nao pertenciam a nenhuma ordem religiosa, o que as permitia criar suas proprias regras. Dependendo dessas normas, elas podiam vivercomoitinerantessolitariasou ate em comunidades de clausura, com grande variedade entre esses doisextremos.

Comadiversidadeeafaltadeuma administraçaocentralizada,edifícil determinaronumerodebeguinas.

UmacartadopapaJoao22aobispo de Estrasburgo, na França, indica que, em 1321, existiam cerca de 200 mil beguinas no oeste da Alemanha. Cinco decadas depois,calcula-sequeviviamemBruxelas, na Belgica, cerca de 1,3 mil beguinas, representando mais de 4% dos seus 30 mil habitantes da epoca.

Estima-se ainda que, no auge da sua expansao, o movimento contava com um milhao de beguinas em toda a Europa, mas nao existe documentaçao que confirme este numerocomsegurança.

Embora fossem geralmente muito

piedosas e levassem uma vida de devoçao religiosa, as beguinas nao eram obrigadas por votos permanentes. A castidade, por exemplo, era valorizada enquanto permanecessem na comunidade, mas elas tinham liberdade para sair e casarse.

Asbeguinasviviamembeguinarios, que eram grupos autossuficientes de casas individuais, frequente-

mente cercadas e congregadas ao lado de uma igreja, em ambientes urbanos. Elas atendiam pobres e enfermosemhospitaiseasilospara pacientes de hanseníase ou em suaspropriasenfermarias.

Elas ganhavam a vida graças a florescente industria textil europeia, lavando la bruta ou lençois e confeccionando rendas e tecidos. Óutras trabalhavam em residencias,

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granjasejardins.

Porisso,suavidacotidianaerauma mistura incomum de elementos religiosos– como a oraçao e a busca mística – e laicos: individualidade, independencia institucional e trabalhoremunerado.

Graças a estes, elas podiam entrar na cidade a vontade, regressando aos beguinarios ao anoitecer. Isso oferecia um grau excepcional de independencia, desconhecido pelas suas contemporaneas da era medieval

Luzesombra

Nadadissopassariadespercebido. As chamadas mulieres sanctae, ou mulieresreligiosae(“mulheressantas ou religiosas”, em latim), mais tarde beguinas (termo de origem desconhecida), contavam com o apreço dos beneficiarios das suas obrasdecaridadeeaadmiraçaode personalidadespoderosas.

Para o abade e escritor alemao Cesario de Heisterbach (1180-1240), porexemplo,“emboraessasmulheres, que sabemos que sao muito numerosas na diocese de Liege [Belgica], vivam entre as pessoas, elassuperammuitosenclausurados emseuamoraDeus.”

“Elas vivem a vida eremítica entre as multidoes, o espiritual entre o mundano e o virginal entre os que procuramoprazer.Quantomaiore asuabatalha,maioreasuagraçae maior a coroa que as espera”, afirmouoabade.

Ó pregador, historiador e líder da igreja catolica Jacques de Vitry (1180-1240)trabalhouparaqueas beguinas fossem reconhecidas pelasautoridadeseclesiasticas.

DeVitryteveprofundarelaçaocom Maria d’Óignies (1177-1213), que renunciouafortunadafamíliapara levarumavidaapostolicaeconverteu-seemuma“santaviva”.

Depois da morte de d’Óignies, De Vitry escreveu Vita Marie de Óignies (1216), compilando quase tudo o que se sabe sobre sua vida. Foitambemoprimeirorelatodesta novaformadeespiritualidadefeminina.

Para o historiador, mulheres como ela poderiam salvar o cristianismo daheresia.Masoestilodevidadas beguinastambemdespertoureceio. Sua autonomia e autossuficiencia logo desagradaram a muitos, particularmente aos homens medievais – embora o movimento tambem tenha inspirado um ramo masculino,conhecidocomoosbegardos.

A castidade voluntaria, sem votos vinculantes, convidava a malícia. E o fato de as beguinas estarem fora do controle da Igreja tambem irritouasautoridadeseclesiasticas.

Como algumas comunidades beguinarias mantinham estreita associaçao com freis dominicanos e franciscanos e algumas comunidades e indivíduos cultivavam intensas formas de misticismo, muitas pessoas suspeitavamquehouvesse tendenciashereticas.

Por tudo isso, as beguinas foramobjetode preconceito e de leis restritivasaolongodo

seculo13.

QuandoopapaClemente5ºacusou o movimento de heresia e o proibiu, a perseguiçao obrigou muitas beguinas a ingressar em ordens mendicantesemonasticasreconhecidas. Algumas resistiram, mas, quando a ordem de dissoluçao foi finalmente extinta, o movimento beguinario ja havia sido drasticamentereduzido.

Apesardareduçaoedasoutrasrestriçoes impostas, algumas comunidades de beguinas sobreviveram ate o seculo 20. Mas, no seculo 21, seu numero podia ser contado nos dedos das maos. A ultima beguina, Marcella Pattijn, morreu em um domingodeabril,10anosatras,em Cortrique,naBelgica.

Mas a obra de Marguerite Porete sobreviveu a sua execuçao. Ó texto originalseperdeu,masumaversao emfrancesdoseculo15foiusadae traduzida para o ingles, italiano e latim.

Ó livro permaneceu em circulaçao como obra anonima, muitas vezes assinada por um homem como se fosse o autor. Mas, como escreveu outra beguina, Matilde de Magdeburgo (c. 1207-1282), “ninguem podequeimaraverdade”.

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Fotos com História

Quandoascartasvinham“doalto”.Umaserviçalrecebendoocorreio.

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A omissão da consoante -s antes do pronome -nos (e de mais nenhum!)

Nonossodia-a-dianaofalamosde termos como «conjugaçao pronominal» ou «conjugaçao pronominal reflexa», masa verdade e que todos nosasusamosdiariamente.

A «conjugaçao pronominal» e o conjunto de formas flexionadas de um determinado verbo em associaçao aos pronomes pessoais atonos (tambem chamadosclíticos):-me,-te,-lhe,-o,-a, -nos,-vos,-lhes,-os,-as,-se.

Vejamosalgunsexemplos:

1) «Ele tinha um carro antigo. Ó meu paicomprou-o.»

o e complemento directo (substitui «umcarroantigo»)

2)«Elevendeu-nosa casaportaopouco.»

nos e complemento indireto (a quem se vendeu)

3)«AMariacomprou uns lindos brincos e ofereceu-mos.»

mos e complemento directo (substitui «uns lindos brincos») e indireto (a quem foram oferecidos).

4) «Pedimos-vos que ficassememcasa…»

vos e complemento indireto (a quem se pediu).

Quando o complemento directo ou indireto e a mesma pessoa/objeto que funcionacomosujeitodafrase vejase o que dizem Celso Cunha e Lindley Cintra na sua Nova Gramatica do Portugues Contemporaneo isso e expresso por um pronome reflexivo ou recíproco,istoe,umverboemque:

a) o objeto da açao e o proprio sujeito (como se ele se olhasse ao espelho e visse, claro, o seu reflexo) e a que se podem acrescentar expressoes como «a mim mesmo», «a ti mesmo», «a si mesmo»,etc.

1) «Eu dou-me ao trabalho de te acordartodososdias.»

Istoe,douamimmesmoessetrabalho.

2) «Ó Joao magoou-se enquanto carregavaamaladeviagemdaInes.»

Istoe,magoou-seasimesmo.

b)seexpressareciprocidadeentredois ou mais sujeitos, isto e, uma açao que afeta os sujeitos «mutuamente», que elesaplicam«umaooutro».

1)«Ósmeuspaisamam-semuito»

Istoe,amam-seumaooutro.

2)«AElsaeeuajudamo-nosmuito.»

Isto e, ajudamo-nos muito mutuamente.

Dito isto, ha uma regra que, quando utilizamos estes pronomes atonos (qualquerquesejaoseuvalor),provocaerrosfrequentes…

Pois e: na 1.ª pessoa do plural (nos), a ultimasílabaperdeo<-s>finalquando surge seguida pelo pronome atononos.

Óquesignificaquedizemos«nosvestimo-nos»e«nosfalamo-nos».

Isto acontece porque, com a evoluçao da língua, ocorreu uma assimilaçao desse <-s> pelo som nasal [n] ou, melhordizendo,haumaressonancianasal entre o <-m> da sílaba -mos e o <-n> do pronome -nos que torna a sequen-

cia de sílabas muito «dura de ouvido» para os falantes (que, portanto, se resolveram livrar dela). Note-se, contudo, que se o pronome vier em posiçao pre-verbal (em proclise), isso ja nao acontece: «nos nao nos vestimos» e «nosnaonosfalamos.»

Mas alem de ser muito frequente vermos este <-s> final em formas da 1.ª pessoa do plural com pronome -nos pos-verbal, tambem e muito comum que, os que sabem a regra, cometam o erro(umahipercorreçao)deomitiro< -s> tambem da desinencia das 2.ª pessoa do plural (vos). Reparem, ate nos escorregamos na casca de banana. Segueaprova:

Mas nao. Enquanto e certo dizer-se «vestimo-nos»e«falamo-nos»,eincorreto dizer-se «vesti-vos» e «falamovos».

Por isso, em «falamo-nos» deixamos cairo<-s>masem«falamos-vos»mantemo-lo porque esta ultima forma respeita a regra do pronome pessoalvos que nao da lugar a eliminaçao da som [s] anterior porque o fonema [v] nao e nasal (e nao leva a ressonancia dequeacimavosfalamos).

Ficouclaro?

Pois e,na Escrivaninha falamos-vos de erros matreiros (ate daqueles que cometemos). E, sempre que temos duvidas,ajudamo-nosumaaoutra.

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Ano VI Número 60 Mensal: março de 2023
Minha língua, minha pátria.
Corrente d escrita

Na Antiguidade, nao se usavam habitualmentesinaisdepontuaçao e nem sequer espaços. Por exemplo, neste manuscrito do seculo IV (Vergilius Augusteus) nao vemos nemespaçosnempontuaçao.

Aolongodotempo,lafomosinventandoosespaços,ospontos,asvírgulas. Estes sinais começaram por assinalar pausas e entoaçoes, para ajudar na leitura em voz alta, mas tambem passaram a mostrar como se organizam os textos e as frases, ajudandoaleremsilencio.

A pontuaçao e muito parecida nas varias línguas da Europa, mas ha alguns pontos em que as línguas seguiramcaminhosdiferentes.Basta pensar nos pontos de interrogaçao e exclamaçao ao contrario que vemos no início de muitas frases em castelhano: tambem ja existiram em portugues, mas perderamseaolongodoseculoXX.

Ó uso dos sinais tambem vai mudando ao longo do tempo: por exemplo, se formos ver livros publicados no seculo XIX, encontramos muito mais vírgulas, mesmo entresujeitoepredicado(ogrande pecadodapontuaçaoactual).

Nao sei porque, mas gosto muito destessinais.Quandoconversamos uns com os outros, usamos a voz,

mas tambem o resto do corpo: a cara, os olhos, as sobrancelhas, as maos A propria disposiçao do corpo ajuda-nos a transmitir a mensagem e,asvezes,atetransmite mais do que queremos. Óra, quando escrevemos, estamos a conversar sem que nos vejam. A pontuaçaoajuda-nosasubstituiras maos, a cara, o corpo. Nao chega, masajudamuito.

Nosdiasdehoje,escrevemosconstantemente, provavelmente mais doqueemqualqueroutraepocada historia. Conversamos por escrito, namoramos por escrito, zangamonosporescrito.

Óra,apontuaçaoajudaquemnosle a compreender-nos melhor, mas tambem ajuda quem escreve, ao obrigar a pensar onde por a vírgula, onde usar um travessao, onde deixar reticencias Ajuda-nos a conversar melhor, ajuda-nos a vivermelhor.

Podemos nao acertar sempre: ninguem acerta sempre. Podemos discutir esta ou aquela vírgula. Podemos exagerar neste ou naquele sinal. Mas, se pensarmos na pontuaçao que usamos, mostramos que nos preocupamos com quem nos le.

Ha tambem um certo encanto nestes sinais, do simples ponto tao final ao arrogante travessao a riscar a linha e a ocupar o espaço de uma palavra passandopelomusi-

cal ponto de interrogaçao e pela caprichosavírgula.

Paraladasregrasedasproibiçoes, a pontuaçao da-nos varias opçoes. E um excelente sinal do grau de proximidade que queremos demonstrar… E ainda um piscar de olhos no papel. Mesmo numa mensagemrapida,cadasinal(ouafalta desinal)transmitemensagensdiferentes:

Beijo.

Beijo

Beijo!

Beijo!!!

Ó beijo com ponto parece-me mais formal ou mais seco que o beijo sem nada. Ó beijo com ponto de exclamaçao e um beijo ligeiramente mais premente Ja o beijo com uns excessivos tres pontos de exclamaçao revela um entusiasmo que talvez decorra da personalidade da pessoa ou da vontade de beijar.

(Excerto do livro Pontuação em Português, de 2019.)

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Ano VI Número 60 Mensal: março de 2023

Escritor

Divulga as tuas obras e as obras de teus confrades.

Não vivas numa masmorra, isolado do mundo e da vida. Teus escritos não foram criados para viverem numa gaveta ou na memória de teu computador.

Página 30 Ano VI Número 60
Mensal: março de 2023

Se tens uma crônica, um conto, um poema, um ensaio que queiras partilhar com nossos leitores, envia para narealgana@gmail.com e dependendo do espaço e de identificação com nossos propósitos, poderás ter teu trabalho aqui divulgado.

Página 31 Ano VI Número 60
Mensal: março de 2023

Agora,emsegundaediçao,ampliada,revistae melhorada,CANASVIEIRASestadevolta.

Naodeixedeleresteexcelentelivrosobreum dosmaisantigosereferenciaisdistritosdeFlorianopolis,que“viu”oassaltodospiratasaopovoado,em1686;ainvasao doscastelhanosdeZeballos,em1777,eatransformaçaodeumpequeno lugarejo,numdistrito pujante,querecebeupor sinadogovernadorHercílioLuz,em1910,odese transformarnofaroldo turismo catarinense,sobretudo,daquelequenos visitadospaísesdoSul dasAmericas.

Peloaumentocolossal dasmateriasprimasedas graficas,temosdeodisponibilizarporR$35.00, maisR$10,00paraofrete,seforenviadopelos correios.

Aceda ao nosso site e inscreva-se: será sempre avisado quando tivermos novidades www.issuu.com/correntedescrita

Página 32 Ano VI Número 60 Mensal: março de 2023 Divulgue Partilhe Leia
Corrente d’escrita

CANASVIEIRAS 270 anos, retrataahistoriaeasgentesquefundaram este distrito de Florianopolis/SC. Criado oficialmente a 15 de abril de 1835, o povoado ja existia desde os primordios da fundaçao do arraial Nossa Senhora do Desterro, em 1673, por Francisco Dias Velho. Recebeu um grande incremento populacional com a chegada dos primeiros açorianos em 1748. No tempo, o povoado estava integrado na freguesia de Santo AntoniodeLisboadesde1750.

Óseunomederivadaexistenciana regiaodeumgrandecanavial(cana -do-rei, ou simplesmente cana).

Muitos escritores, particularmente Virgílio Varzea escreveram sobre Canasvieiras.

Afonso Rocha da-nos, com este seu recente trabalho, um novo olhar e umaprevisaofuturistadobalneario maisfamosodeFloripa.

Livros à venda, direto do autor

Impressos: R$ 35,00—E-book/Pdf: R$ 5,00

Qualquer título

Pedidos a: narealgana@gmail.com

OUTONO, uma forma de pensar a vida.Quandoseatingetresquartos de um seculo, a vida tem outros horizontes, outros prazeres, outros estadosdealma.Óstemasdasconversas sao diferentes, as preocupaçoessaooutras,mas,esobretudo,a experiencia e as liçoes da vida sao muito mais enriquecedoras e valorizadas.

MOMENTOS, quepoderiamserde amargura, de tristeza, de sofrimento, mas tambem de alegria, de comemoraçao,decomemoraçao,mas, embora possam ser tudo isso, sao, sobretudo,MÓMENTÓS depoesiae dereflexao.

Afonso Rocha mistura poesia com pensamentos de cariz fisiologico, mas sobretudo, de pensamentos refletivos tomados ao longo das vivenciadoquotidiano.

Foi isso que o autor quistestemunharcomesteÓUTÓNÓ cronicas &arrufos,umconjuntode75narrativas uma por cada ano, que tomamaformadecronicas,contos, ensaios, reportagens. Umas mais longas, outas mais curtas; umas mais distantes, outras mais recentes, mas todas com endereço e nome.

Sao testemunhos de vidae de estadosdealma.

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As mulheres, os homens, as crianças e os idosos; a comunidade LGBT;os negros, os índios, osciganos, os imigrantes e todos os demais desprotegidos, sao perseguidos, violentados, agredidos e estuprados...

Nesta obra intimista, Afonso Rocha passeia-se pela sua propria experiencia, mas tambem a de todos nos, como comunidade, para que se dinamizeereforceaformadecombaterestasmazelas,estescrimesbarbaros (a pedofilia, estupro), ja considerados como o holocausto do seculoXXI.

SANGUE LUSITANO, atraves de estorias imperdíveis, Afonso Rocha leva-nos ate 500 anos atras, quando os portugueses chegaram aosul doBrasil,ondecriaramfamília,cultivaram tradiçoes e culturas que viriam a “marcar” a cultura catarinense.Aolongodostempos

SangueLusitanoeahistoriadoRio Grande do Sul e de Santa Catarina, de suas vilas e cidades e de seus povos (indígenas, portugueses, negros e outros que se lhes juntaram posteriormente). Umlivroanaoperder.

Olhos D’Água Historiasdeum tempo sem tempo, relata-nos as vivencias do povo portugues entre 1946 e 1974 e a sua resistencia a ditadura e ao fascismo do regime salazaristadeentao.

Poroutrolado,configuraumaautobiografia do autor (Afonso Rocha) nas suas andanças pelo período escolar,peloserviçomilitar;aguerra colonial em Africa; a emigraçao emFrança;aresistencia,atearevoluçaodoscravos.Em25deabrilde 1974.

Um livro a nao perder, sobretudo paraquemgostadehistoria.

Trovas ao Vento, e uma coletanea de poemas e outros pensares, enriquecida com o contributo de outros poetas convidados naturais do Brasil, Portugal, Cabo Verde, Moçambique, Angola e da Galiza, como expressao do pensar lusofono.

Um encontro de expressoes diferentes, manifestadas pela língua comum que nos cimenta e faz pensarportugues.

Livros à venda—impressos & E-book/Pdf narealgana@gmail.com
Página 34
Página Corrente d’ escrita Número 37 - setembro 2020 INÉDITOS na amazon.com

Na casa dos livros

Corrente d’ escrita

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