Coleção Património a Norte - Nº 7

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N ยบ 07 . 2020


“Convento de Vilar de Frades: perspetivas de intervenção 19942008” convida o leitor a revisitar o processo de reabilitação de um dos mais icónicos Monumentos Nacionais da região Norte de Portugal. Numa lógica de partilha de experiências, alguns dos seus principais intervenientes são desafiados a expor conceitos, opções e resultados em áreas como História, História da Arte, Arqueologia, Arquitetura e Conservação e Restauro, abordando o percurso feito através das fases de estudo prévio, projeto e restauro de edifícios, azulejaria, pintura e mobiliário. O lugar de referência ocupado por este icónico convento é ainda o pretexto perfeito para uma incisiva reflexão de Paulo Pereira sobre a atualidade do “Património Monástico” enquanto herança cultural – as escolhas do passado e as opções do futuro.



F ICH A T ÉCN I C A

Coleção Património a Norte N.º 07 Título “CONVENTO DE VILAR DE FRADES: PERSPETIVAS DE INTERVENÇÃO

1994-2008” Autores Adriana Amaral ; Alexandre Nobre Pais ; Alfredo Ascensão ; Ana Brito ; António Manuel Borges Pereira ; António Pereira ; Francisco Faure ; Isabel Sereno ; Maria do Carmo Ribeiro ; Paulo Pereira ; Ricardo Erasun Cortés ; Susana Lainho

Edição Direção Regional de Cultura do Norte – Ministério da Cultura Local de edição Porto Data de edição 2020 novembro ISBN 978-989-54871-1-0 Depósito Legal 476441 / 20 Direção António Ponte Coordenação editorial Luís Sebastian Fotografia Adriana Amaral ; Alfredo Ascensão ; António Manuel Borges Pereira ; António Pereira ; Francisco Faure ; Francisco Piqueiro ; Inês d’Orey ; João Ribeiro ; Lídia Lopes ; Luís Ferreira Alves ; Modesto Muñoz Ruiz ; Ricardo Erasun Cortés ; Susana Lainho ; Teresa Laço Ilustração AAPH arquitectos ; Alfredo Ascensão ; António Manuel Borges Pereira ; António Pereira ; Direção de Serviços dos Bens Culturais (DSBC-DRCN) ; Francisco Faure ; Paulo Henriques ; Ricardo Erasun Cortés ; Saudade Correia Design gráfico Companhia das Cores, Lda. Parceria DETALHAR (www.detalhar.pt) ARQUITETURA360 (www.arquitetura360.pt)

Disponível online em www.culturanorte.gov.pt

PA RC E R I A

Os conteúdos dos textos e eventuais direitos das imagens utilizadas são da exclusiva responsabilidade do(s) respetivo(s) autor(es), quando aplicável.


INDÍCE PATRIMÓNIO A NORTE

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EDITORIAL

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PATRIMÓNIO MONÁSTICO

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REFLEXÃO INTERVENÇÃO

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PERCURSO HISTÓRIA

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ESTUDOS ARQUEOLOGIA

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ESTUDOS ARQUITETURA

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PROJETO AZULEJARIA

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ESTUDOS AZULEJARIA

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CONSERVAÇÃO E RESTAURO CADEIRAL DO CORO ALTO

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CONSERVAÇÃO E RESTAURO PINTURA

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CONSERVAÇÃO E RESTAURO ROTEIRO

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PAT R I M Ó N I O A N O R T E O Convento de Vilar de Frades, localizado na freguesia de Areias de Vilar, em Barcelos, terá sido fundado no século VI pelo bispo São Martinho de Dume, tendo sofrido ao longo dos tempos diversos processos de ruina e recuperação, sendo a sua forma atual resultado das alterações do século XVIII. Este é um belo exemplar de arquitetura conventual destacando-se a exemplaridade da sua igreja. Resultado do reconhecimento do seu valor, este monumento foi alvo de um processo profundo de restauro, já neste século, tendo sido experimentadas várias tecnologias de conservação neste processo.

A intervenção no Convento de Vilar de Frades é um exemplo da necessidade absoluta de articulação de várias disciplinas científicas, sociais e naturais. Foi essencial a equipa técnica pluridisciplinar para dar resposta adequada a todas as necessidades que o monumento apresentava. Foi num processo de avanços e recuos que chegamos ao estado atual. Mas a intervenção em património cultural é feita destas dificuldades e sucessos. Porquê um número da coleção PATRIMÓNIO A NORTE dedicada a um único monumento? Pela sua exemplaridade, outros se sucederão, porque é essencial fixar os processos de investigação e restauro dos monumentos para que se perpetuem os trabalhos executados e os mesmos possam servir de exemplo a outros bens patrimoniais. Porque antes de todos os outros valores reconhecidos, para o património cultural importa reforçar o valor cultural e patrimonial deste monumento, promover a sua valorização educativa e científica e ainda potenciar a sua fruição turística cultural.

António Ponte Diretor Regional de Cultura do Norte

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TO N GO BR I GA : CO L ETÂ N EA D E ES T UD O S CO M EM OR ATIVOS DE 4 0 A NOS DE INV E STIGAÇÃO


EDITORIAL O N.º 06 da coleção editorial PATRIMÓNIO A NORTE é pela primeira vez dedicado a um só imóvel, classificado como Monumento Nacional e, inevitavelmente, monumento histórico, arquitetónico e conjunto artístico. Focando-se no processo contínuo de reabilitação a que este imóvel tem vindo a ser sujeito desde 1994, não descura a obrigatória perspetiva histórica de “longa duração” a que esta reabilitação, afinal, “apenas” dá continuidade, somando-se-lhe como a mais recente de muitas fases de uma vida já secular. Procurando como sempre levantar questões e provocar a reflexão e o debate em torno não só das técnicas, métodos e materiais, mas igualmente dos conceitos e das razões – o quê, porquê, para quem, como? -, segue-se a já habitual abordagem “intimista” de desafiar alguns dos principais intervenientes a descrever “na primeira pessoa” o trabalho realizado, as ideias por trás das opções, o processo e consequentes resultados. Inevitavelmente, a inerente interdisciplinaridade deste tipo de intervenção de reabilitação patrimonial leva-nos para áreas como História, História da Arte, Arqueologia, Arquitetura e Conservação e Restauro, permitindo perceber as diferentes fases de estudo prévio, projeto e restauro de edifícios, azulejaria, pintura e mobiliário. O lugar de referência ocupado por este icónico convento é ainda o pretexto perfeito para uma incisiva reflexão de Paulo Pereira sobre a atualidade do “Património Monástico” enquanto herança cultural, da extinção das Ordens Religiosas em Portugal em 1834 à atualidade, relembrando as escolhas do passado e questionando as opções do futuro. Já recorrente em vários números da coleção editorial PATRIMÓNIO A NORTE, contamos uma vez mais com a parceria do gabinete DETALHAR (www.detalhar.pt), através do seu projeto ARQUITETURA360 (www. arquitetura360.pt), permitindo ao leitor “visitar” virtualmente através de fotografia 360º os espaços intervencionados, considerados essenciais à compreensão dos textos, impondo-se mais uma vez o agradecimento ao Arq. Carlos Sousa Pereira e à sua equipa

Luís Sebastian Coordenador editorial (coleção PATRIMÓNIO A NORTE)

TO N G O B RI GA : CO L ETÂ NE A DE E STUDOS COM E M OR ATIVOS DE 4 0 A NOS DE INV E STIGAÇÃO

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1 PATRIMÓNIO MONÁSTICO

R EFLEXÃO


Paulo Pereira Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa pjgp@netcabo.pt Paulo Pereira é Historiador de Arte, Mestre em História de Arte pela Universidade Nova de Lisboa e Doutor em História da Arquitetura pela Faculdade de Arquitetura da Universidade Técnica de Lisboa (FAUTL). Participou como conferencista convidado em diversos seminários, palestras e congressos em Portugal, Espanha, França (CNRS), Alemanha, Itália, Croácia, EUA e Brasil e colaborou em diversos catálogos relativos a temas da disciplina. Organizou diversas exposições em Portugal e no estrangeiro. Foi Vice-Presidente do Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR) entre 1995 e 2003. Dirigiu a “História de Arte Portuguesa”, em 3 volumes, do Círculo de Leitores. Publicou a obra, em 8 volumes “Lugares Mágicos de Portugal”, no Círculo de Leitores, 2004-2005. Foi codirector da exposição “Neue Welten” (“Novos Mundos”), mostrada no Deutsche Historisches Museum, de Berlim. Publicou o volume “Arte Portuguesa. História Essencial” (Temas & Debates, 2011). Publicou também a coleção “Decifrar a Arte Portuguesa” (Círculo de Leitores, 6 volumes, 2014) e a coleção “Arte e Ciência” (Círculo de Leitores, 5 volumes, 2019). É professor auxiliar da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa e membro do Centro de Investigação em Arquitetura, Urbanismo e Design (CIAUD).


Mosteiros: anamorfoses e metamorfoses O s mosteiros e os conventos fazem parte da paisagem rural e urbana do país e congregam fatores identitários dada a sua perenidade e, muitas vezes, atendendo à sua monumentalidade. O apego a estas estruturas que a dado momento foram desafetas, não se manifestou de igual forma nem ao mesmo tempo em todos os lugares, mas deixaram as marcas de uma dominação territorial fértil e, em alguns casos, marcas não apenas de caracter produtivo, mas também ecológico, demográfico e, muito em especial, espiritual.

O papel das ordens religiosas mais antigas (sec. XI-XII) - como os Beneditinos ou os Cistercienses - na fixação da população nos campos e na amplificação da revolução rural medieval deu origem a um senhorialismo (se não mesmo a um feudalismo) monástico. No século XIII-XIV, as ordens ditas mendicantes, de São Francisco e São Domingos, aproximaram-se da cidade, com o intuito de a recristianizar e de exercer aí um trabalho catequético. O comércio a longa distância e o deslaçamento religioso seria um risco e a combatê-lo se dedicaram estas congregações, como mais tarde a Companhia de Jesus, animada agora por um zelo missionário face à primeira globalização que o mundo veio a enfrentar, a partir de inícios do século XVI.

No que respeita à sua presença física no espaço vivencial, pode

dizer-se que as ordens mais antigas de feição rural procederam a um exercício de governo da paisagem, enquanto as segundas procuraram criar um disciplinamento urbano e um processo de ensinamento que perdurasse nos valores do cristianismo e do catolicismo. Permaneceram: e essa permanência tem a ver com o papel que nunca deixaram de desempenhar, exceto quando para tal foram interditados. Por exemplo, os beneditinos e cistercienses acompanharam a “revolução do milho” no Norte de Portugal e com isso enriqueceram, tornando-se os abades figuras maiores da sociabilidade das elites, enquanto a humildade inicial de franciscanos e dominicanos dava origem a grandes empreendimentos, enriquecidos por esmolas generosas e patrocínios da aristocracia. A sorte da manutenção destes grandes edifícios variou em função do lugar que ocupavam: isolados ou afastados das urbes, os mosteiros acabaram, nem sempre, mas muitas vezes, por concitar em seu redor núcleos urbanos: os conventos, com o crescimento das cidades extramuros acabaram absorvidos por essas cidades e prosperaram no meio urbano e já com eles fazendo “cidade”.

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O ANO INFAUSTO: 1834 Porém, uma mudança drástica, que mais não foi do que ecos do Iluminismo - que vira já a expulsão da Companhia de Jesus de Portugal no tempo do Marquês de Pombal (1759) e a ocupação e reaproveitamento para reuso dos estabelecimentos próprios à congregação (casas-professas e colégios) -, iria ter lugar em 1834. Um decreto do governo de Joaquim António de Aguiar (17921884), então Ministro dos Negócios Eclesiásticos e da Justiça (1834-1836), publicado a 30 de Maio, extingue as ordens religiosas masculinas e integra os seus bens na Fazenda Nacional. Colocados em hasta pública, reservando o Estado para si próprio alguns destes bens para reaproveitamento e reutilização, os mosteiros e muito em especial os que se encontravam isolados, foram comprados e usados para apoio à agricultura, o amplo sector primário que determinava a riqueza do país, ainda, e por então, longe de uma Revolução Industrial. Foram também depauperados até parcialmente destruídos, aproveitando-se as mais das vezes as pedras, alvenarias e madeiramentos para construção corrente nas imediações. Ou o tempo se encarregou de os arruinar, mesmo sem o concurso dos homens… O acervo, parte dele foi colocado à ordem das dioceses ou a uso nas igrejas dos próprios conjuntos monásticos/conventuais que persistiram com culto, mas secularizadas. No entanto, grande parte dele foi disperso, apenas contando, em casos pontuais, o valor antropológico do objeto, que pôde ser reinvestido de carga espiritual no âmbito da liturgia. A inexistência nesses tempos de uma “ideologia do património” levou a que perdas importantes ocorressem. Só a partir de cerca de 1850 se dá um movimento reativo que vai procurar resgatar esses conjuntos monástico/conventuais - e de entre eles, só alguns… -, como Lugares de Memória. Com efeito, já em 1840, se abria esta frente de combate que pugnava pela preservação de edifícios, muitos deles medievais, que só agora começavam a ser valorizados esteticamente no quadro da sensibilidade romântica. Eram estes os monumentos não já comemorativos, mas “rememorativos”, nos quais se inculcara a ideia de monumento Pátrio, porque associativamente se havia neles incorporado momentos simbólicos da nossa história, agora que assistíamos ao nascimento do conceito do Estado-Nação. Foi este facto que levou os poderes políticos a empreender as primeiras obras de restauro, sensivelmente por volta de 1842, na Batalha ou em Alcobaça, no Convento de Cristo ou nos Jerónimos e também em castelos, símbolos da soberania. Os ciclos de restauro dos mosteiros durante o século XIX só poderia ser seletivo, como se percebeu já. Outro fenómeno se consolidou, porém: o da “reutilização”, mas uma reutilização do domínio estritamente utilitário e sem considerações de ordem cultural. Aproveitados, convertidos, reconvertidos e ocupados: foi esse o destino encontrado para as mutações que deviam ter lugar de modo a que o edificado fosse útil do ponto de vista social, extinta agora a sua vocação inicial. Em termos de posicionamento geográfico e da relação com a paisagem natural e humanizada ou com a paisagem urbana, tenho por hábito classificar os mosteiros consoante “conjunturas”, todas elas testemunháveis:

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i) Mosteiro/convento: objeto singular e isolado, incluindo a sua cerca próxima, mais ou menos preservada na sua extensão; ii) Mosteiro singular, com preservação apenas da sua construção nuclear e perda do entorno imediato ou cerca, entretanto urbanizado ou peri-urbanizado; iii) Mosteiro/convento fazendo parte do património urbano; iv) Casa religiosa de vocação congregacional inserida no tecido urbano. Se uso este tipo de classificação é porque serão estes os casos que determinaram distintas reutilizações e, inclusivamente, perdas patrimoniais mais ou menos avultadas. Será também em parte esta classificação que, embora muito mais tarde, levaram a escolhas de política cultural/patrimonial, impendendo sobre cada um destes conjuntos soluções substancialmente diferenciadas e até contraditórias. Nos casos, em que a proximidade da vila ou cidade ou a absorção do mosteiro pelo aglomerado urbano se iniciara já no século XVII e que continuaria pelo século XVIII, acabou por imperar a sua apropriação para diversas funções mistas com a sua consequente fragmentação. Já o mosteiro completamente integrado num aglomerado por via do crescimento da vila verá a sua cerca cada vez mais rateada e apropriada: mantem-se a estrutura, também ela gradualmente ocupada por serviços do Estado ou das próprias autarquias, senão mesmo por fundações locais ou agremiações diversas, dando um destino final aos espaços, destino esse heterogéneo e, por vezes, incoerente.

O facto é que podemos muito bem reconhecer um “metabolismo” dos espaços urbanos na sua relação com conventos e mosteiros, aqui usando a justíssima expressão de Jorge Gaspar, mas aplicando-a ao espaço monástico. Atentemos ao facto de que num mosteiro ou convento estamos perante um composto organizado, dotado de um programa rígido, de grande homogeneidade e com uma distribuição funcional universal ou quase. Jorge Gaspar lembrava precisamente este tipo de reutilizações, e o elenco é amplo. É até relativamente fácil fazer um exercício ilustrativo deste tipo de reutilizações, pelo que contabilizamos, o mosteiro-hospital, mosteiro-quartel, o mosteiro-fábrica, o mosteiro-prisão, o mosteiro-villa operária/” ilha” e o mosteiro-hotel/pousada. Os casos em se operaram maiores transformações no pré-existente decorreu da adaptação para hospital, quer através de modificações drásticas do edificado, quer pela ocupação da cerca com estruturas pavilhonares. Mas é entre as fábricas, ou unidades produtivas do período paleotécnico, com a instalação de manufaturas com ou sem maquinaria, que se testemunham alterações de monta, em alguns casos com importantes perdas patrimoniais.

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Já os exemplos de mosteiros/conventos transformados em quartéis constituem um caso particular, mas que afetou igualmente as pré-existências. Casos houve, em que pelo contrário foi precisamente esta reutilização que resultou num conjunto de intervenções que, mesmo sem caracter patrimonial, mantiveram em boas condições o edifício ou a parte dele que estava ocupada (o caso de Mafra com a EPI, ou do Convento de São Bernardo de Portalegre com a GNR).

A AÇÃO DA DGEMN O primeiro processo de reabilitação e restauro dos mosteiros com planeamento coerente ficou a dever-se à Direção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais (DGEMN). Com efeito, no quadro do regime ditatorial de Salazar - o Estado Novo -, é criada em 1929 aquele organismo que inicia, de uma forma competente e sistemática um conjunto de restauros no âmbito do serviço das obras públicas, cujos “anos de ouro” situo entre 1930 e 1950. As intervenções eram pautadas por uma cultura de trabalho que concediam ao técnico restaurador - ao arquiteto, ao engenheiro – uma gestão flexível dos trabalhos no estaleiro. Desde então até à sua extinção em 2007, a DGEMN foi um alfobre de restauradores, constituindo um corpo altamente especializado, com muitos agentes de primeira categoria como Baltazar de Castro (1897-1961), Raul Lino (1879-1974), Luís Benavente (19021993) ou Rogério de Azevedo (1898-1983), para destacarmos apenas alguns dos que contribuíram com reflexão crítica e ação, especialmente após a receção das ideias veiculadas na Carta de Atenas (1931) e das propostas de “restauro científico” de Camillo Boito. Uma linha ética atravessou, também, o quadro de atividade da instituição com recurso à crítica interna. Se recorremos aos arquivos da DGEMN e não apenas aos seus preciosos Boletins onde se contabilizam 9 igrejas anexas a mosteiros e apenas 5 conjuntos monásticos integrais, constatamos obras continuadas em outros grandes conjuntos como o Mosteiro da Batalha, o Convento de Cristo e, sobretudo, o Mosteiro de Alcobaça, aqui com um trabalho extenso de décadas. A DGEMN a partir dos anos 60 do século passado assistiu, porém, à modificação dos seus serviços de “Edifícios” (o famoso “E” do acróstico/abreviatura DGEMN) Por sua vez, manteve-se ativo e “em campo” o segmento dos “Monumentos”.

O CICLO DAS POUSADAS Em 1980 era criado o Instituto Português do Património Cultural (IPPC), com responsabilidades na salvaguarda e emissão de pareceres em áreas e objetos classificados ou protegidos e na gestão dos mais importantes monumentos nacionais, a que acrescia a promoção das grandes obras de conservação e restauro dos principais monumentos nacionais, asseguradas, de início, pela DGEMN. O IPPC veio a apetrechar-se de modo a assegurar a intervenção em obra por volta de 1990. Assinalo que os critérios de restauro tinham mudado e, muito em especial, a existência das fontes de financiamento oriun-

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das da CEE, primeiro com o período de vigência dos PIDR e depois com a adoção dos quadros plurianuais, que viriam a assumir a figura de Quadros Comunitários de Apoio (QCA). A necessidade imperiosa de centralizar os processos de gestão financeira para obtenção de fundos para obras com comparticipação europeia, bem como a autonomia financeira e administrativa do IPPC e depois do IPPAR (que lhe sucedeu), definiram um novo quadro de trabalho. Tendo em conta o binómio cultura/turismo dessas primeiras candidaturas, um dos formatos escolhidos pelo então IPPC para proceder a trabalhos de restauro foi a instalação de unidades hoteleiras, ou seja, a adaptação de mosteiros/conventos a Pousadas do Estado, na altura sob gestão da ENATUR. Neste novo âmbito e já em plena vigência da Carta de Veneza e das lições do Restauro Critico, a opção passou pela realização nos conjuntos monástico/conventuais não apenas de trabalhos de recuperação e restauro, mas também pela construção de ”obra nova”, seguindo as recomendações em vigor, distinguindo esta intervenção de ”obra nova” através da sua absoluta contemporaneidade. Trata-se do período a que costumo chamar o “ciclo das pousadas” de iniciativa estatal. Tratou-se de harmonizar obra nova de raiz e obra antiga, uma vez que os programas de afetação dos monumentos a pousada eram quase sempre incompatíveis com a realidade física das pré-existências. Assim, para respeitar o monumento, foi quase sempre necessária a construção de adições dotadas de uma linguagem contemporânea. Naturalmente que os resultados foram desiguais. O protótipo deste tipo de intervenção ficaria a ser pouco conhecido e raras vezes é mencionado. Refiro-me à instalação da Pousada no Castelo de Vila Nova de Cerveira ou Pousada de D. Dinis (Arqs. Alcino Soutinho, Octávio Lixa Figueiras e R. Torgo: 1977- inaugurado em 1982) em que se experimentou o caldeamento cultural da reabilitação da aldeia com a instalação de novas valências de linguagem neomoderna. Onde mais vivamente se encontra bem resolvida esta relação crítica com a modernidade é na Pousada de Santa Marinha da Costa em Guimarães (projeto do Arq. Fernando Távora), uma das primeiras pousadas do “novo ciclo” e que deu o “timbre” para outras intervenções. Ficaram bons exemplos de uma prática de reabilitação “obra nova” de que se destacam o Mosteiro do Loios de Arraiolos (projeto do Arq. João Paulo Santos, 1993-1998) e o Mosteiro de Santa Maria do Bouro (projeto dos Arqs. E. Souto Moura e Humberto Vieira em 1989; construção em 1996-1999). Neste, as galerias ou quadras do claustro nas partes respeitantes ao circuito público ficaram “abertas” como ruína consolidada. Para manter o valor visual do conjunto sem contrariar a sua antiga marcação na paisagem, os projectrista optaram por instalar uma cobertura em placa, totalmente lisa e “corbusieriana”, sobre a qual dispôs vegetação, memória do destelhamento do bloco monástico quando abandonado. Outro facto a salientar foi aquilo a que chamo o “regresso do património” à esfera pública (já duas polémicas tinham estalado, duas polémicas mais suaves e disciplinares: a do restauro reabilitação/reconstrução da Casa dos Bicos (projeto dos Arqs. Manuel Vicente, Daniel Santa Rita e Formosinho Sanches com a colaboração de A. M. Miguel, em 1983) e do Complexo das Amo-

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reiras de Tomás Taveira, este por várias razões, uma das quais a proximidade do Aqueduto das Águas Livres e a mudança do “skyline” da cidade de Lisboa. A polémica sem precedentes que despontou com inaudita virulência foi a da valorização do monumento de Sagres (Arq. João Carreira). Patrimonialistas, arquitetos e ambientalistas encontravam-se profundamente divididos. Este problema instaurou uma nova discussão: o da reutilização dos monumentos e o da compatibilidade da “obra nova” com a memória recente ou longínqua.

A filosofia geral das intervenções em espaços monásticos/conventuais foi alterada; e dos poderes centrais a solução passou a ser a da reabilitação e reuso tanto quanto possível através da musealização dos espaços, e da criação de colaborações com instituições culturais locais e universidades, interessadas em poder dispor de polos de hospedagem e de estudo, ou lugares vocacionados para a realização de workshops. A “vinculação ao facto cultural”, com abertura para outras valências de carácter sustentável, incluindo a própria agricultura, viria a orientar as intervenções no ciclo seguinte. Também a palavra “intervenção”, mais do que a palavra “obra” ou “obra de restauro”, foi de algum modo imposta nos documentos oficiais de maneira a distinguir a especialização científica e ponderada de um verdadeiro trabalho de reabilitação face à habitual designação, que mostrava uma maior ligação à construção civil ou à tradicional “obra pública”. Ainda se passou a consagrar, até em termos legislativos, outro termo que veio a entrar na gíria do estatuto e reabilitação: a de “património integrado”, forma mais simples de referência ao património móvel imobilizado por destino: a pertença de uma peça a um mosteiro/convento (ou a qualquer outro espaço) deveria continuar a fazer parte dele como elemento absoluto e indissociável, como elemento definidor do monumento… O quadro financeiro foi, também ele, objeto de alterações francamente positivas e o setor do planeamento assumiu, no âmbito do investimento e do processo de empreitada especializada, incluindo os trabalhos arqueológicos, um papel decisivo. No domínio das intervenções foi possível planificar a médio prazo todas as ações a incluir no III QCA. Este planeamento permitiu uma maior descentralização do investimento, uma maior variabilidade e cobertura territorial e uma amplificação das tipologias a intervencionar. No âmbito do programa “Recuperação de Mosteiros”, integrado no Programa Operacional de Cultural (POC) criado durante o consulado do Ministro Carrilho à frente do Ministério da Cultura, foram levadas a cabo intervenções de diferente teor nos Mosteiros. Em boa medida lançou-se uma perspetiva de longo prazo, ou seja, um programa faseado de intervenções que passou por dois QCA’s e se estendeu até hoje (2020) sob uma distinta “arquitetura” institucional.

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O usufruto ritualizado e a preservação conatural dos monumentos e envolvente através do seu uso foi a meta eleita para estas grandes intervenções. E este índice constituiu-se como baliza de controlo e de informação do próprio projeto de conservação. Por sua vez, atendendo às oportunidades de financiamento e tendo em atenção a redução drástica de comparticipações para intervenções nas regiões de Lisboa e Vale do Tejo, houve uma necessária e aliás, urgente, deslocação dos focos de intervenção para a região Norte, com planeamento de novos estaleiros em Mosteiro de Vilar de Frades, Mosteiro de Pombeiro, Mosteiro de Tibães (reforço), Mosteiro de Rendufe, Mosteiro de São Pedro de Cete, Mosteiro de Grijó (consolidação das fundações), Mosteiro de Arouca (museu da RIRSM) e Mosteiro de Tarouca, entre os mais importantes. E houve casos de exemplares que se vieram a tornar casos de estudo. Assumindo que a reutilização como pousada deveria ficar em “espera”, o objeto ou meta utópica foi a da reafectação à antiga função de uso ou tão próximo funcionalmente quanto possível dessa original condição, o que se veio a revelar um gesto cuidadoso. No Mosteiro de Tibães era objetivo final explorar as suas diversas potencialidades de reutilização e reativação em conjugação com a comunidade local. Assim, conseguiu-se tratar da igreja (aberta ao culto, com o respetivo espólio integrado devidamente restaurado), instalar uma Casa Paroquial (19931995) (com a sua vertente social e de serviço, para acompanhamento da atividades religiosas), promover a refundação da comunidade monástica, com a realização de obra no antigo Noviciado, instalar o Museu (1993-2010); criar (ou recriar) uma Hospedaria em “obra nova” (1996-2010) e restaurar integralmente a Cerca monástica (projeto do Arq. João Carlos Santos). Tratou-se de um projeto que integrou a vivência do “natural” e do “construído”, promovendo o encontro da paisagem associada. Mais recentemente, no restauro do Mosteiro de São Bento de Castris, em curso, vale a pena testemunhar o desejável progresso através do programa “Sphera Castris”, no qual se procura, igualmente, por em prática um programa de reutilização que passa pela valência de hospedaria (e não de pousada) e a reafectação do espaço (ou parte dele) à função monástica com a receção de monjas que, tal como em Tibães, visam a fixação de uso o mais próximo possível da função original. Por sua vez, a DGEMN continuou intervenções de considerável dimensão em antigos conventos como o Convento/Palácio das Necessidades, sendo os trabalhos financiados pelos ministérios e instituições envolvidas, mas asseguradas tecnicamente pelo corpo especializado daquela entidade, aliás com

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resultados ótimos. A própria DGEMN, durante este período, para além das obras “sob encomenda”, continuou um profícuo trabalho de intervenções menores de consolidação e restauro, que motivaram grandes melhorias com recursos mais limitados em partes de monumentos ou mesmo em trabalhos com completamento.

“REVIVE”(R)? Porém uma nova frente de reaproveitamento turístico foi recentemente aberta. Trata-se do programa REVIVE, uma vez mais contando com oportunidade política e financeira oferecida pelo incremento da procura turística em Portugal (neste preciso momento, completamente paralisada) e pela canalização via Ministério da Economia de avultadas verbas para estes desideratos, mas muito em especial, de capital privado através de concursos em regime de concessão. Antes já, o Grupo Pestana havia tomado a posição da ENATUR - que foi extinta -, passando aquele grupo privado a gerir as Pousadas que eram antes do Estado. Embora não exista posse efetiva dos monumentos e tão só um processo concessional, manifestaram-se vozes discordantes quanto a esta solução, adotada já neste milénio. O mesmo se pode dizer do programa REVIVE, que terá que ser monitorizado com redobrada atenção por parte dos organismos públicos, já que não só exigirão “obra nova” como também importantes trabalhos de reabilitação e restauro. Como não poderia deixar de ser e tendo em conta as tipologias em presença, dos 30 monumentos selecionados, 10 são mosteiros (São Fins de Friestas, Forte e Convento da Ínsua (Caminha), Santo André de Rendufe, São Salvador de Travanca, Santa Clara de Vila do Conde, Santa Clara-a-Nova de Coimbra, São Francisco de Portalegre, Colégio de São Fiel em Castelo Branco, Convento de São Paulo (Elvas), “ex-convento”/Quartel da Graça e “ex-convento”/Quartel do Carmo) mas, também, embora não conste nas listas oficiais, o Claustro do Rachadoiro do Mosteiro de Alcobaça, um desafio enorme pela área que envolve e pela sua articulação com uma escala urbana que conta para mais com a fortíssima componente paisagística corporizada no chamado Jardim do Obelisco.

RESISTIR

Afirmei há já algum tempo que a tarefa do arquiteto é a de um operador social e simbólico. Com efeito, nenhuma obra de arquitetura sobrevive se não integrar estas duas vertentes, intimamente ligadas à vida humana - e à vida humana em comunidade. No entanto, o mundo mostra-nos como este imperativo é tantas vezes esquecido, ou impossível de assegurar devido a situações de emergência, como a das catástrofes naturais, mas, especialmente, pela situação que hoje atinge praticamente todo o mundo com o imenso fluxo de refugiados, naquilo que é uma das maiores migrações humanas em massa de toda história (e da pré-história, e não estou a exagerar…).

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O chamado “drama dos refugiados” tem sido encarado com especial cinismo pelas sociedades e comunidades ocidentais – i.e., o mundo desenvolvido - sendo que têm sido países com distribuição de renda desigual ou mais pobres, ou regiões periféricas de países mais ricos, a suportar o impacte dos refugiados e a construir essa nova subcategoria de urbanismo a que chamamos “campos de refugiados”. Vale a pena debruçarmo-nos sobre esta realidade extrema para também avaliarmos os limites das disciplinas que nos interessam (a arquitetura, o urbanismo, o planeamento e até o design), de modo a interrogarmo-nos se não estamos perante uma mutação social profunda e estrutural e não apenas face a um processo determinado por fatores conjunturais... O facto é que existem propostas, concretas e bem delineadas, por parte do Alto Comissariado para os refugiados (ACNUR/ UNHCR) e até um “Manual para Emergências”, que responde de forma correta aos constrangimentos dos campos de refugiados. O desrespeito pelas instruções ali contidas, leva a situações desesperantes e à transformação gradual do “campo de refugiados” em “campos de concentração” – no sentido literal - em que a função da permanência e do habitar é colocada em segundo plano. Mesmo assim, é possível estabelecer, como fizeram recentemente, num pequeno artigo, Theo Deutinger e Thomasz Swietlik (“Mark”, nº 57, pp.52-53), as tipologias de campos de refugiados (Ifo 2 e Kakuma no Quénia, Azraq na Jordânia, Melkadida na Etiópia, Sharagab e Dora no Sudão, etc.), junto a cidades ou longe delas, com sistemas de autovigilância e segurança internas anticonflito e equipamentos básicos - mesmo os de caráter sociocultural. São, no entanto, exceções. A mobilidade dos refugiados, a existência em regime “de passagem” destes homens e mulheres “nus” (parafraseando o filósofo Giorgio Agamben), seres humanos errantes, sem destino, que se nos apresentam como uma realidade dura das sociedades contemporâneas, constitui hoje um dos desafios mais difíceis de vencer e para o qual os arquitetos, urbanistas e designers se encontram convocados.

Este paradoxo leva-me a refletir sobre uma possibilidade, que pode não passar do domínio da utopia: acaso o refugiado encontre um lugar de paz, será que o património, mesmo o património eventualmente mais vulgar, marginado até, ou porque não, o mosteiro/convento abandonado e desprezado, não poderá beneficiar da vontade de “ficar” de alguns e de os trazer para uma ordem social e económica, dando-lhes em troca “casa” (não se trata de “abrigo”!), permanência, qualidade simbólica, ao mesmo tempo levando a cabo um trabalho de resgate desse património desafeto, tão característico de sociedades pós-industriais?

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MOSTEIROS, CONVENTOS E CONFINAMENTO

Por fim não poderei, deixar passar em claro o fenómeno que no pre-

ciso momento em que escrevo assola a humanidade. A humanidade inteira: o novo coronavírus, Covid 19. Uma das formas de resistir ao vírus, aliás numa tradição que remonta à Idade Média (pelo menos) tem sido o confinamento. Sem qualquer ponta de ironia - muito pelo contrário - relembro que o confinamento foi a pedra de toque da maior parte das instituições monásticas e conventuais, e em alguns casos, esse era um confinamento absoluto e de caracter intransponível.

Esta reflexão leva-me a perguntar se esse modelo – o modelo

monástico - se encontra efetivamente esgotado. A contenção num espaço regulado por uma ordem interna de disciplina total remete-nos subitamente para os tempos em que, por escolha (nem sempre, mas quase), os homens e as mulheres optaram pelo confinamento, com um objetivo religioso, bem entendido, e com um horizonte cujo desiderato era a Salvação. A condição soteriológica ganhava assim nessas tais “fábricas de oração”, uma dimensão espiritual que transcendia a salvação individual para se situar no domínio do Humano. E outras religiões continham padrões idênticos e idênticas metas espirituais. O

exemplo monástico, mesmo que olhado deste

ponto de vista utópico e idealista, reativo (e, também sim: irrealista!) conduz-nos a outra interpelação, de resistência: ora não sei se o mundo vai mudar mais do que mudou, mas por isso falei, há muito tempo já, na existência de um “património atmosférico”, isto é, de um “património metafísico”, feito de vibrações, de sons, de ar e cheiros, de sensações, pelo que nesta conjuntura pode acontecer termos que enfrentar os “restos” arruinados de uma ordem económica pretérita ou os “espaços ocos do capitalismo” como diria Ernst Bloch: aqui, temos uma radiografia, simplista é certo, mas instantânea, da modificação do tecido social e económico do Mundo, com todas as consequências que daí advierem para a gestão do património a que acresce a rápida desindustrialização da Europa. E o lugar dos mosteiros, qual será? Acabo com uma nota de esperança. Haverá, por certo, um regresso da intimidade.

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2 INTERVENÇÃO

P ERCURSO


Isabel Sereno Direção Regional de Cultura do Norte – Direção de Serviços dos Bens Culturais isereno@culturanorte.gov.pt Isabel Maria Sampaio Sereno, natural do Porto, inicia o curso de Arquitetura na Escola Superior de Belas Artes do Porto e licencia-se em 1986 pela Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto. Em 1984 inicia colaboração no atelier do Arq. Manuel Botelho e exerceu atividade como profissão liberal no atelier do Arq. Manuel Reis. Desde 1989 desempenha funções no Ex- IPPC na área da salvaguarda e apreciação de projetos em imóveis classificados e nas zonas de proteção e integra o Setor das Classificações de 1993 a 1995. Desde 1995 até à presente data trabalha na área das Obras, Conservação e Restauro de monumentos. Ingressa em 1999 na Direção Regional do Porto do IPPAR exercendo atualmente a sua actividade na Direção de Serviços dos Bens Culturais (DSBC) da Direção Regional de Cultura do Norte (DRCN). O trabalho que desenvolve traduz-se no diagnóstico de patologias do património edificado, acompanhamento e gestão de obras, projetos, cadernos de encargos e candidaturas a fundos comunitários para a conservação de monumentos classificados.

Adriana Amaral Direção Regional de Cultura do Norte – Direção de Serviços dos Bens Culturais amaral@culturanorte.gov.pt Adriana Amaral, Licenciada em História, Variante Arqueologia, pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto (1986). Bolseira do Instituto Nacional de Investigação Científica (1987-89). Docente dos Cursos de Alfabetização de Adultos e do Ensino Preparatório e Secundário (1989-94). Técnica Superior do Mosteiro de São Martinho de Tibães - Ministério da Cultura, sendo responsável pelo Serviço Educativo (1991-1992). Técnica Superior do Centro de Conservação e Restauro de Tibães desempenhando as funções de coordenadora das atividades desenvolvidas e coordenadora geral dos cursos de formação de Técnicos Auxiliares de Conservação e Restauro nas áreas da Talha e do Azulejo (1993-1999). É autora, no âmbito das áreas e funções desenvolvidas, de várias publicações. Ingressou, em 1999, no quadro de pessoal da Direção Regional do IPPAR. Exerce, na atualidade, a função de Técnica Superior da Direção de Serviços dos Bens Culturais da Direção Regional de Cultura do Norte na área das Obras, Conservação e Restauro de Monumentos.


Convento de Vilar de Frades: Registos de uma intervenção A «Dvas legoas da cidade de Braga pera a parte do Occidente, e hua acima da villa de Barcellos, junto ao rio Cadavo, em lugar fresco e abundante de agua está fundado o mosteiro de S. Salvador de Villar»1. Assim descreve, em 1644, Frei Leão de São Tomás a localização deste Mosteiro de Lóios classificado, em 1910, como Monumento Nacional e afeto à Direção Regional de Cultura do Norte.

A data da sua fundação tem suscitado diversas interpretações provocadas quer pela carência de fontes fidedignas, quer pelas adaptações revivalistas ocorridas em inícios do século XIX. A tradição faz remontar a fundação do mosteiro, então beneditino, ao tempo de São Martinho de Dume, no ano de 566. Terá permanecido sob a Regra de São Bento até 714, altura em que terá sido destruído na sequência das invasões muçulmanas. Reconstruído no século XI, facto confirmado pela existência de alguns elementos arquitetónicos pré-românicos, permanecerá, até 1425, beneditino. Nesta data, e no âmbito da reforma pastoral e monástica levada a cabo por D. Fernando da Guerra, arcebispo de Braga, o mosteiro passará a Casa-mãe da Congregação dos Cónegos Seculares de Vilar de Frades denominados, a partir de 1461, Ordem dos Cónegos Seculares de São João Evangelista. A transferência da sede para Lisboa, em Santo Elói, resultará numa outra denominação, Ordem dos Lóios. Esta Congregação portuguesa seguiu os cânones dos cónegos de São Jorge de Alga, em Veneza. De traça erudita, o conjunto constituído pela capela-mor, transepto e pórtico axial, datados da primeira década de quinhentos, poderá ser atribuído ao célebre arquiteto biscainho João de Castilho e ao mecenato de D. Diogo de Sousa, arcebispo de Braga.

Portal principal e perspetiva da fachada do Convento de Vilar de Frades (2009, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d´Orey).

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Abóbada da capela-mor (2011, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d´Orey).

Nave da igreja e capela-mor (2011, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d´Orey).

Extinto pelo Decreto de 28 de maio de 1834, permaneceu como património de Estado a igreja, destinada ao culto religioso, a ala nascente do edifício e o claustro. Todo este conjunto, incluindo o espólio integrado, chegou à década de noventa do século XX num estado de quase ruína. Esta realidade de recorrente perda iminente na história mais recente do monumento é já denunciada em 1919 reclamando-se como “inadiável” e “urgente” 2 obstar a uma derrocada da abóbada da capela-mor.

Portal da Igreja (2011, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d´Orey).

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Capela-mor antes da intervenção (1997, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Luís Ferreira Alves).

Capela lateral antes da intervenção (2000, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Luís Ferreira Alves).

Galerias do claustro antes da intervenção (2006, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d´Orey).

Ruína do edifício e espólio integrado (1997, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Luís Ferreira Alves).

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Claustro após a intervenção (2011, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d´Orey).

A intervenção no corpo físico do monumento – realizada no âmbito do III Quadro Comunitário de Apoio – Programa Operacional da Cultura (POC) 3 – iniciou-se na igreja (1997-2004) e culminou na reabilitação do piso térreo das galerias do claustro e da ala nascente do ConIgreja após intervenção (2011, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d´Orey).

vento (2007-2008). Subjacente à reabilitação do conjunto de Vilar de Frades está um projeto global de arquitetura da autoria dos arquitetos Alfredo Ascensão e Paulo Henriques. Aquele, encomendado pelo entretanto extinto Instituto Português do Património Cultural (IPPC), teve como ponto de partida a elaboração de um relatório diagnóstico que serviu de base à discussão do programa de intervenção e respetivas prioridades de ações a implementar. A intervenção começou no corpo da igreja, atendendo às necessidades inerentes a este espaço como local de culto, profundamente arruinado e com patologias expressivas ao nível dos elementos estruturais, humidades nos paramentos e pavimentos 4 e ainda degradação generalizada do espólio integrado, fatores que obrigaram a um processo de intervenção lento, sistemático e estreitamente coordenado, face à complexidade dos trabalhos a desenvolver 5.

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Capela-mor. Micro-organismos nas paredes e pavimento (1997, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Luís Ferreira Alves).

Micro-organismos nas nervuras e paramentos de uma das capelas (1999, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Adriana Amaral).

Capela lateral antes da intervenção (1997, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Luís Ferreira Alves).

Sacristia. Degradação do edificado e recheio integrado (2011, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d´Orey).

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Entre os trabalhos realizados ao nível do espólio artístico merecem destaque os painéis de azulejos alusivos aos padres da Congregação, o cadeiral seiscentista do coro alto e as pinturas referentes aos quatro Evangelistas localizadas na sacristia do mosteiro. Micro-organismos nos elementos construtivos do claustro (2011, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d´Orey).

Fendas, fraturas e deformações na entrada da Sala de Exposições (2011, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d´Orey).

PAINÉIS DE AZULEJO ALUSIVOS A PADRES DA CONGREGAÇÃO A igreja do Convento de Vilar de Frades possuía, no início da intervenção, painéis de azulejos tipologicamente diferenciados.

Localização cronológica dos painéis alusivos a padres da Congregação (2010, Direção Regional de Cultura do Norte©, ilustração de Direção de Serviços dos Bens Culturais).

Capela-mor: 1706 (?) Capela do transepto e capelas laterais: 1754 Sala de Exposições: 2008

1m

Planta do piso térreo

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As capelas de Nossa Senhora da Conceição e das Almas, localizadas na nave da igreja, no lado da Epístola, apresentam revestimentos integrais, da autoria de Bartolomeu Antunes e de Nicolau de Freitas. São azulejos azuis e brancos, de temática figurativa, assinados e datados, respetivamente, de 1736 e 1742, que têm merecido, por parte de especialistas, particulares referências motivadas pela sua qualidade artística e autoria 6. Na Capela das Almas encontra-se representada, no registo superior do lado da Epístola, Santa Rita assistida pelos anjos e, no registo inferior, uma cena de caça, com a inscrição «Nicolau de Freitas a pintou». No lado do Evangelho surge, ao centro, o martírio de Santa Quitéria no ato da degolação e, no registo inferior, a caça ao lobo, contendo a inscrição «Bartholomeu Antunes a fés em Lix.a no anno de 1736». Na Capela de Nossa Senhora da Conceição está representada, no lado do Evangelho, a adoração dos pastores e, no da Epístola, a Adoração dos Magos sobre rodapé centrado por simbologia mariana contendo a inscrição «Bartholomeu Antunes a fés em Lixa. Nas olarias no anno de 1742».

Revestimento azulejar da Capela de Nossa Senhora da Conceição após a intervenção (2011, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d´Orey).

Um outro grande conjunto de azulejos revestia, até cerca de 1,80 m de altura, as paredes laterais das três capelas da nave da igreja e, sob a forma de um lambril, a capela do Santíssimo, localizada no transepto 7. Estes azulejos foram sempre secundarizados tendo, no entanto, merecido a atenção de Santos Simões que os considerou como tendo “um tipo de fabricação bastante curiosa, provavelmente do norte dos inícios do século XVIII...” ilustrando um género que pode ser considerado de bastante raro 8. Este conjunto era composto por oito painéis figurativos, azuis e brancos, com cercadura barroca e temática maioritariamente alusiva aos padres da Congregação, com exceção dos revestimentos localizados na capela do transepto, subentendendo-se, numa análise mais atenta, uma unidade condutora. No início da intervenção no imóvel verificou-se, relativa-

Capela lateral da igreja: painel de azulejo alusivo a um padre da Congregação (1997, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Luís Ferreira Alves).

mente a estes azulejos: mau estado de conservação generalizado; inexistência de um dos painéis numa das capelas 9; unidades em risco de queda iminente; unidades destacadas na sequência quer da existência de argamassas disfuncionais, quer de problemas estruturais que propiciaram, nomeadamente, a entrada de raízes que se alojaram entre a parede e as argamassas de suporte; unidades azulejares em falta; unidades azulejares colocadas aleatoriamente; presença de azulejos de padrões estranhos ao conjunto; presença, numa das capelas, de assentamentos com argamassas de cimento tipo “Portland”.

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O estado de conservação debilitado, quer do revestimento, quer da estrutura de suporte, conduziu numa primeira fase à realização de ações de emergência por parte de técnicos da Direção Regional de Cultura do Norte. No entanto, face à gravidade das patologias diagnosticadas, optou-se pela remoção da totalidade dos azulejos, com o objetivo inicial de se melhorar a sua leitura 10. A montagem realizada a partir das marcações alfanuméricas originais existentes no tardoz dos azulejos permitiu concluir que este conjunto, inicialmente constituído por painéis de azulejos independentes distribuídos por quatro capelas, integrava dois extensos planos divididos em dois registos, com uma dimensão original aproximada de 14 m de comprimento por 3,5 m de altura. O painel do lado da Epístola ostenta, no registo superior, três padres pertencentes à Congregação em Portugal (António da Conceição, Afonso Nogueira e João Roiz) e no registo inferior uma representação única, com cerca de 8 m de comprimento 11. O painel do lado do Evangelho possui representados, no registo superior, três padres ligados à Congregação em Itália (Lourenço Justiniano, Gregório Sumo pontífice e António Corario), tendo restado apenas do registo inferior elementos pertencentes à cercadura. A dimensão dos painéis indiciava como proveniência provável a capela-mor. As fontes escritas confirCapela do transepto: lambril de azulejo (1997, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Luís Ferreira Alves).

mam que entre as principais obras realizadas em 1754 pelo reitor do convento, o Padre Francisco de Santa Maria, constava a transferência do azulejo da capela-mor para a capela colateral do lado do Evangelho, a do Santíssimo Sacramento, e para as outras capelas laterais «para assim melhor as ornarem» 12. Esta informação foi materialmente confirmada, após a desmontagem do cadeiral da capela-mor, pela existência de vestígios de argamassa de assentamento com a estereotomia do azulejo e de um pequeno fragmento da cercadura.

O conjunto terá certamente integrado a decoração barroca executada para a capela-mor na década de 90 do século XVII, tentando-se executar o ideário pós-tridentino, e que se traduziu na execução do retábulo-mor e respetiva tribuna, em 1696, e na execução de 22 painéis em talha, em 1698, que revestiam as paredes daquele espaço, obras da autoria do grande mestre entalhador António Gomes, da Escola do Porto, em parceria com Domingos Nunes. O conjunto azulejar poderá corresponder ao contrato de assentamento de azulejo realizado pelos padres lóios com Dionísio António em 15 de março de 1706, pago, um ano depois, por todo o trabalho realizado para o convento. Perante estes novos elementos houve que repensar a abordagem a efetuar ao conjunto azulejar. A montagem realizada em atelier permitiu perceber a originalidade destes azulejos, confirmando o caráter raro notado já por Santos Simões, apresentando-se agora com uma escala e uma lógica completamente diferentes. A reposição dos azulejos nas 4 capelas da igreja,

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além de constituir uma perda de informação importante que presidiu à original conceção do conjunto, nunca permitiria a leitura de uma sequência ordenada mesmo considerando isoladamente cada um dos painéis, nomeadamente por razões de natureza arquitetónica, como a existência de portas de ligação entre capelas e de paredes com dimensões completamente diferentes dos painéis azulejares. Verificava-se, por outro lado, a impossibilidade de retorno do conjunto à capela-mor, quer devido à existência de um cadeiral, quer devido à redução da profundidade deste espaço, o que originou o avançar do retábulo-mor aquando das obras ocorridas na década de trinta do século XX 13. Face à problemática em presença entendeu-se proceder à musealização dos azulejos, em dois painéis expositivos, paralelos, pré-fabricados, de cor cinzenta, fixos em estrutura metálica.

Painéis expositivos onde é possível observar a organização original dos azulejos (2011, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d´Orey).

O único espaço existente no imóvel que se adequava às novas exigências e que apresentava as dimensões aproximadas do conjunto, quer em termos de comprimento de cada um dos painéis existentes, quer da distância entre os mesmos, era uma sala localizada no piso térreo da ala nascente do convento que se destinava, em projeto, a Sala de Exposições Temporárias 14. Tal facto obrigou a uma alteração do projeto inicial passando esta a Sala de Exposição Permanente. Este espaço encenado sugere a largura da anterior capela-mor, resgatando-se e restabelecendo-se este raro conjunto que, conquanto incompleto, mantém uma força intrínseca e possibilita uma nova leitura até aqui desconhecida.

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Projeto da Sala de Exposição Permanente (2008, Direção Regional de Cultura do Norte©, ilustração de Alfredo Ascensão e Paulo Henriques).

1m 2m

CADEIRAL SEISCENTISTA DO CORO ALTO Data de 1682 o contrato celebrado entre os cónegos Lóios do Convento de Vilar de Frades e o mestre ensamblador António João Padilha, da cidade do Porto, para a realização do cadeiral do coro alto, cuja execução deveria durar cerca de um ano. Esta obra insere-se no grande ritmo construtivo que atingiu o convento durante o século XVII e que procurou responder, quer a uma comunidade em crescimento, quer à doutrina emanada do Concílio de Trento. Um terceiro fator foi também preponderante: o enorme temporal que arruinou grande parte do edifício, nomeadamente a igreja, que ficará registado como a tormenta de São Sebastião, dado ter ocorrido no dia da celebração deste santo: 20 de janeiro de 1616. O referido contrato incluiu ainda as grades do coro e tribuna do órgão, substituídas pelas atuais na segunda metade do século XVIII, e a estante. O novo cadeiral, cujas cadeiras deveriam ser executadas de acordo com as do Convento da Serra do Pilar, em Vila Nova de Gaia, substituirá um anterior, datado de 1541. Constava de cinquenta e quatro cadeiras, atualmente cinquenta e duas, com seu respaldo em «pao de jacaranda e foiquia(sic) amarello e o targelim vermelho» 15.

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As várias campanhas de obras levadas a cabo pelos Lóios estão na origem de algumas alterações deste conjunto. Assim, o jogo de embutidos que o cadeiral ostentava e os contrastes das diferentes madeiras utilizadas e documentadas pelo contrato seiscentista, foi encoberto, em época posterior, pela aplicação de fingidos de madeira e de douramento a mordente. É provável que tal intervenção tenha ocorrido aquando da obra revivalista realizada nesta área do edifício em finais de setecentos, inícios de oitocentos, tendo sido integrados entre os vãos da fachada dois novos elementos em madeira policromada, de características Cadeiral do coro alto antes da intervenção de conservação e restauro (1997, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Luís Ferreira Alves).

neoclássicas, pretendendo-se, com o tratamento dado às superfícies, uma uniformização do conjunto. A expulsão da ordem ditou o fim das necessidades litúrgicas inerentes ao quotidiano da comunidade monástica, conduzindo à decadência do coro alto e das peças que o integravam. A ausência de função provocou, mais do que o abandono, a delapidação e saque do acervo aí existente. Na década de noventa do século XX o cadeiral apresentava-se em adiantado estado de degradação, com inúmeras peças em falta, nomeadamente as misericórdias, peças deslocadas, violento ataque de xilófago, particularmente de térmitas, provocado por infiltrações pluviais e uma grande quantidade de sujidades acumuladas.

Pavimento original aparecido após o desmonte do cadeiral (1997, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Luís Ferreira Alves).

Perspetiva do cadeiral do coro alto após a intervenção (2011, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d´Orey).

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A necessidade de execução da obra estrutural do coro obrigou ao desmonte integral do conjunto em 1999, facto que permitiu descobrir, sob a estrutura do cadeiral, um soalho anterior, em madeira de castanho, em avançado estado de degradação, que não foi abrangido pelas campanhas de obras efetuadas pela Direção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais (DREMN) em meados do século XX. Dessa intervenção resultou a substituição do soalho nas áreas acessíveis, por um outro em madeira exótica. Este revestimento foi mantido na intervenção ocorrida neste espaço, dado encontrar-se em bom estado de conservação. No decurso dos trabalhos de conservação e restauro do cadeiral foram colocados a descoberto alguns dos embutidos localizados no espaldar. Este facto, associado à qualidade artística dos mesmos, à raridade do conjunto e ao mau estado e má qualidade da policromia existente, levou a que se optasse pela sua remoção integral colocando-se à vista o jogo de embutidos concebidos, há cerca de trezentos anos, pelo mestre António João Padilha.

PINTURAS DA SACRISTIA ALUSIVAS AOS QUATRO EVANGELISTAS A reabilitação da Sacristia do Convento de Vilar de Frades integrou-se na empreitada de Reabilitação do Convento-2ª fase, realizada entre 2007-2008 e realçou a excecionalidade da sua arquitetura, quer pela escala do espaço, proporção e axialidade, quer pela qualidade do património integrado. Verifica-se aqui um entrosamento perfeito entre a arquitetura e as peças do recheio artístico que integra talha, portas policromadas, pinturas sobre granito, pinturas de cavalete, arcazes em pau-santo, tremó, pavimento em lioz e ardósia, teto em estuque e mesa em brecha da Arrábida. A originalidade deste espaço e a comprovação da existência na sua matriz de um projeto cuidado e global é confirmada, para além das fontes escritas, pela existência no tardoz das quatro pinturas e do único tremó remanescente (eram inicialmente seis) de um rebaixamento no reboco, de alguma profundidade, impercetível ao observador, pois coincide com a dimensão de cada uma das peças, apenas preenchido nas áreas correspondentes aos cinco tremós desaparecidos. Tal como na Igreja, os trabalhos de isolamento das humidades ascensionais na sacristia implicaram Sacristia do Convento de Vilar de Frades após intervenção (2011, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d´Orey).

o levantamento do lajeado em granito em todo o perímetro do espaço para inserção de um canal de ventilação forçada. A natureza desta intervenção implicou uma apertada articulação entre os diferentes intervenientes e a remoção da quase totalidade das peças.

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Sacristia do Convento de Vilar de Frades no decurso da intervenção (1997, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Luís Ferreira Alves).

Tremó da sacristia após intervenção de conservação e restauro (2011, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d´Orey).

As pinturas a óleo sobre tela alusivas aos quatro Evangelistas localizam-se sobre um dos arcazes da sacristia e encontram-se em exata correspondência com os quatro janelões da sala. Atribuídas a Pedro Alexandrino, inserem-se na nova sacristia cujo risco foi encomendado pelo reitor Manuel de São Tiago e Silva em 1796-1797 e concluída no final do mesmo século. A sua qualidade artística é já referida em 1919 pelo Padre Manuel Aguiar Barreiros aludindo às «tellas de impeccavel desenho e de óptimo effeito» 16.

Pintura alusiva a São Mateus, após a intervenção de conservação e restauro (2011, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d´Orey).

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A título conclusivo, poderemos acrescentar que os trabalhos realizados resultaram da ação de uma equipa interdisciplinar que adequou a intervenção, sempre que necessário, aos desafios ocorridos no terreno. Apoiaram-se em investigação histórica, bibliográfica e arquivística que permitiu um conhecimento mais profundo de um conjunto frequentemente adulterado. O projeto de arquitetura foi sendo, sempre que necessário, adaptado quer às exigências do edificado, quer do património integrado. De entre as inúmeras intervenções efetuadas ao nível do recheio artístico, integralmente intervencionado, destacam-se os trabalhos efetuados nos azulejos da igreja, no cadeiral do coro alto e nas pinturas da sacristia que, em grande parte, retratam os desafios constantes de uma intervenção em património histórico que frequentemente resulta na necessidade de se repensarem novas soluções.

FICHA TÉCNICA Coordenação da intervenção Direção Regional de Cultura do Norte (DRCN) – Direção de Serviços dos Bens Culturais (DSBC) Coordenação geral: Isabel Sereno, arquiteta Coordenação do restauro do património móvel e móvel integrado: Adriana Amaral, licenciada em História, variante arqueologia Isabel Dias Costa, conservadora restauradora Coordenação da intervenção arqueológica: Anabela Lebre, arqueóloga Conservação e restauro Helena Cardoso e Victor Gonçalves

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BIBLIOGRAFIA

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Porto: [s.n.], 1984

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da Congregação dos Cónegos Seculares de São João Evangelista (Lóios) à

mento da humidade ascensional. Uma Igreja do norte de Portugal. Pedra &

extinção do convento, 1425-1834. Barcelos: Edição do autor, 1998.

Cal. Lisboa. 35 (2007) 23-27.

NOTAS

intervenção nos revestimentos localizados na Capela de São Bento, assentes com

1 Página 402 de SÃO TOMÁS, Frei Leão de – Benedictina Lusitana. Introdução

argamassas hidráulicas, trabalho que foi adjudicado e realizado pela empresa Regra

e notas críticas de José Mattoso. Tomo I. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da

de Ouro, Lda., no ano de 2004.

Moeda, 1974.

11 Ressalvamos o excelente trabalho desenvolvido pela técnica da DRCN/DSBC,

2 Páginas 4-5 de BARREIROS, Manuel Aguiar – A egreja de Villar de Frades no

Helena Cardoso, cujas conclusões conduziram a uma reavaliação do trabalho em

Concelho de Barcellos. Porto: Edições Marques Abreu, 1919.

curso. Atendendo à dimensão dos painéis azulejares remanescentes, cerca de 12

3

Note-se que, no âmbito do III Quadro Comunitário de Apoio- Programa

m de comprimento, solicitou-se ao Centro Português de Fotografia, instalado na

Operacional da Cultura (POC), é exigido um planeamento físico e financeiro

antiga Cadeia da Relação do Porto, a cedência de um espaço para a montagem

detalhado dos diferentes intervenientes envolvidos em cada ação, tendo como

integral do conjunto.

objetivo enquadrar num período de seis anos a reabilitação da construção em

12 Página 230 de VINHAS, Joaquim Alves, A igreja e Convento de Vilar de Frades:

causa e respetivo recheio.

das origens da Congregação dos Cónegos Seculares de São João Evangelista

4

(Lóios) à extinção do convento, 1425-1834. Barcelos: Edição do autor, 1998.

O problema das humidades ascensionais na igreja foi alvo de artigos da

especialidade publicados no nº 3 da revista “Estudos/Património” que apontava

13 Aquando das obras efetuadas pela DGEMN/DREMN, em 1937, foi realizada

soluções a implementar no edifício e no nº 35 da Revista Pedra & Cal, agosto-

a demolição do acrescento da capela-mor, construído em 1697 para receber a

setembro 2007, sobre a intervenção realizada.

novo estrutura retabular. Tal operação originou quer o encurtamento do retábulo e

5 Sobre este esforço de trazer até aos nossos dias Vilar de Frades e o lugar

novas soluções de acesso à tribuna, quer um avanço da referida estrutura.

dos Frades Lóios, foi já abordado no nº 4 da revista “Estudos/Património” a

14 Os referidos painéis expositivos não têm a dimensão original do revestimento

especificidade do ato de intervir na peça construída e no seu recheio artístico, ou

azulejar quando colocado na capela-mor. Assim, o painel correspondente ao

seja, o ciclo que eternamente retorna – construir, reparar, consolidar, reconstruir.

lado da Epístola apresenta 12,2 m x 3,7 m e o painel correspondente ao lado

6 Páginas 58-59 de MECO, José – Azulejaria Portuguesa. Lisboa: Bertrand

do Evangelho, 9,4 m x 3,7 m. Há que referir, no entanto, que estas medidas

Editora, 1985.

correspondem ao comprimento total dos painéis azulejares remanescentes.

7 Os painéis localizavam-se em três capelas da nave da igreja: Capela de Santo

15

António, Capela do Senhor dos Passos e Capela São Bento e na capela do

Ensamblagem e Pintura na Cidade e Diocese do Porto. Documentação I, Séculos

Santíssimo localizada no transepto.

XV a XVII. Porto: [s.n.], 1984.

8 Página 96 de SIMÕES, João Miguel dos Santos – Azulejaria em Portugal no

16 Página 230 de VINHAS, Joaquim Alves, A igreja e Convento de Vilar de Frades:

século XVIII. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997.

das origens da Congregação dos Cónegos Seculares de São João Evangelista

9

(Lóios) à extinção do convento, 1425-1834. Barcelos: Edição do autor, 1998.

O referido painel foi encontrado amontoado numa sala localizada na ala

Página 551 de BRANDÃO, Domingos de Pinho – Obra de Talha Dourada,

nascente do edifício após desmonte ocorrido em 1956.

17 Página 402 de SÃO TOMÁS, Frei Leão de – Benedictina Lusitana. Introdução

10 Os trabalhos de remoção dos azulejos, e parte das fases sequentes, foram

e notas críticas de José Mattoso. Tomo I. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da

realizados por técnicos da DRCN/DSBC. Excetuam-se desses trabalhos a

Moeda, 1974.

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3 HISTÓRI A ESTUDO S


Maria do Carmo Ribeiro Instituto de Ciências Sociais da Universidade do Minho mcribeiro@uaum.uminho.pt Maria do Carmo Ribeiro (Soure, 1973) é professora do Departamento de História do Instituto de Ciências Sociais da Universidade do Minho e investigadora do Laboratório de Paisagem, Património e Território (Lab2PT) da UMinho. Desempenha atualmente as funções de Vice-Presidente e Presidente do Conselho Pedagógico do Instituto de Ciências Sociais. A sua investigação tem-se centrado em questões diacrónicas relacionadas com o urbanismo e a transformação morfológica dos espaços urbanos, bem como com o edificado na perspetiva da história da construção.

António Pereira LAB2PT / Universidade do Minho aammpsp@gmail.com António Pereira (Barcelos, 1985) é investigador do Laboratório de Paisagens, Património e Território (Lab2PT) e doutorando em Arqueologia na Universidade do Minho, encontrando-se a desenvolver um projeto intitulado “A construção monástico-conventual no noroeste da Península Ibérica: Uma abordagem multidisciplinar da História da Construção desde a época medieval até à atualidade”, sob orientação da Professora Doutora Maria do Carmo Ribeiro. O seu campo de investigação tem-se centrado em áreas como a Arqueologia da Arquitetura, História da Construção, Morfologia Urbana, Evolução da Paisagem e Património Cultural.


O complexo monástico-conventual de Vilar de Frades OS ANTECEDENTES MEDIEVAIS: DE MOSTEIRO A CONVENTO

A origem do complexo monástico-conventual de Vilar de Frades permanece ainda envolta em algumas incertezas, inserindo-se na complexa história do fenómeno monástico do Noroeste da Península Ibérica. Se por um lado, a historiografia tradicional atribui a fundação de Vilar de Frades a São Martinho de Dume, no século VI, tendo por base os relatos de Frei Leão de São Tomás1, e posteriormente veiculados pelos cronistas lóios2, por outro, as evidências documentais com maior fiabilidade situam-na no século XI. De facto, atualmente, a tese da fundação dumiense levanta sérias dúvidas, não só pela autenticidade da fonte invocada por Frei Leão de São Tomás, mas também pela ausência de outras evidências que a sustentem3. É certo que o monaquismo peninsular remonta à disseminação do cristianismo neste espaço, com evidências deste modo de vida desde o século IV4, e que a fundação de mosteiros nos séculos subsequentes por prelados como São Martinho de Dume e São Frutuoso de Montélios tiveram um papel fundamental na sua propagação5. Todavia, é somente a partir do século XI que as fontes manuscritas permitem começar a desvendar a história de Vilar de Frades de forma sustentada e situar a sua fundação em data anterior a 10596. Sabe-se, assim, que paulatinamente, a partir do patronato de nobres como D. Godinho Viegas e seus parentes, ainda no século XI, e, posteriormente, com a atribuição de carta de couto por D. Sancho I, possivelmente em 1202, a pedido de D. Pedro Salvadores7, Vilar de Frades vai adquirindo importância regional8, constituindo-se no século XIII como cenóbio bene-

São Martinho de Dume Vilar de Frades

São Frutuoso de Montélios

ditino. Deste complexo faria parte uma igreja românica, datada dos séculos XIII-XIV, cujos dados arqueológicos têm sustentado como pertencente à tipologia de planta basilical,

Mosteiros Medievais

importada do “esquema beneditino”, com uma

século VI século VII século XI distritos

cabeceira com capelas absidais, corpo de três naves e ocasionalmente um transepto na transição da cabeceira para o corpo9.

Localização dos mosteiros medievais fundados por São Martinho de Dume, São Frutuoso de Montélios e Vilar de Frades (2019, Ilustração de António Pereira©).

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Deste edifício conservam-se ainda vários vestígios remontados no século XIX na torre sul da atual igreja. No piso térreo subsiste um portal, onde sobressai a decoração geométrica, zoomórfica e antropomórfica, enquanto no piso superior, um segundo portal exibe igualmente decoração expiatória, zoomorfos e enxaquetados.

Portal da igreja românica remontado na parte superior da fachada do século XIX da torre sul (2016, fotografia de António Pereira©).

O século XIV marca a entrada em decadência do mosteiro beneditino. Por volta do ano de 1425, dado o estado de abandono do espaço, o arcebispo de Braga D. Fernando da Guerra procede à sua extinção e reduz o mosteiro a abadia secular10. Porém, no mesmo ano, o referido arcebispo cede Vilar de Frades a um grupo de religiosos com aspirações reformadoras11, liderado pelo Mestre João Vicente, que ali fundam o primeiro convento da Congregação dos Cónegos Seculares de São João Evangelista. Nos primeiros anos, os cónegos lóios ter-se-ão limitado a ocupar o casco devoluto do extinto mosteiro, utilizando o claustro como “cortes de gado” e a igreja como adega e celeiro12. No entanto, na segunda metade do século XV, no reitorado do Padre João da Nazaré13, já teriam iniciado a construção da nova “igreja gótica” que incluiu nomeadamente correções da nave e o prolongamento do coro14.

Base de coluna e embasamento (século XV?), exumados na intervenção arqueológica dirigida por Lídia Lopes no ano 200015 (2015, fotografia de António Pereira©).

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Vista exterior da igreja de Vilar de Frades (2018, fotografia de João Ribeiro©).

A IGREJA As intervenções do século XV não terão conseguido corresponder ao crescimento da congregação na transição da centúria. O contexto de crescimento, prestígio e sobretudo de aproximação do prelado de Braga à congregação de Vilar de Frades, irão desencadear a renovação total do edificado nos inícios do século XVI. A empreitada da igreja terá sido inicialmente assumida por D. Diogo de Sousa, encomendando a traça e patrocinando a obra da capela-mor e do transepto16. Um programa que se previa erudito, ambicioso e arquitetonicamente enquadrável no período do gótico tardio e sob a forma portuguesa

Pormenor do interior da capela-mor da igreja do século XVI (2018, fotografia de António Pereira©).

do estilo “manuelino”17. Segundo o Padre Jorge de São Paulo, a construção da igreja terá sido dirigida pelo mestre pedreiro João Lopes de Guimarães18. No entanto, as investigações mais recentes revelam que a erudição da traça, as abóbadas e a participação do arcebispo bracarense na empreitada, suscitam a possibilidade de o projeto da igreja pertencer a João de Castilho19, ainda que executada por João Lopes20. Provavelmente o primeiro espaço a ser edificado, a capela-mor, materializa uma estrutura robusta, de planta retangular, definida por paredes duplas de aparelho regular, cuja simplicidade é apenas quebrada pelos frisos interiores e exteriores, pelos janelões com decoração tipicamente manuelina e pela abóbada nervurada, que permite a grande amplitude do espaço interior21. A abóbada, estruturalmente divida em três tramos, é realizada por um conjunto de nervuras principais e secundária, com liernes a formar losangos centrais intercalados por combados, reminiscentes das abóbadas de João de Castilho22. As aduelas principais e secundárias, exibem motivos vegetalistas e heráldicos dispostos numa rede de nervuras convergentes para as mísulas localizadas nas paredes laterais e para os contrafortes lancetados do exterior23. Assente nas nervuras, a abóbada é concretizada por painéis graníticos

Abóbada da capela-mor quinhentista de Vilar de Frades com as pedras de arma de D. Diogo de Sousa VI (2016, fotografia de António Pereira©).

dispostos de forma modular, originalmente selados pela parte superior com detritos e argamassa24.

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Ainda parte da primeira empreitada de construção da igreja, o reduzido transepto estabelece a continuidade arquitetónica da capela-mor. É constituído por um espaço central e duas capelas funerárias privativas nos braços, que terão sido edificadas por duas sobrinhas do arcebispo D. Diogo de Sousa, designadamente D. Teresa de Mendonça (sul) e D. Leonor de Lemos (norte). Para além do recurso a paramentos regulares, frisos e abóbadas nervuradas, é pelo sistema portante que este espaço se distingue. Um sistema direcionado para a construção em altura que conjuga contrafortes, arcos enxalços e mísulas para viabilizar a coexistência de paredes altas e finas com grandes vãos e tetos abobadados.

Paramento interior norte e interior sul do transepto do século XVI (2019, fotografia de António Pereira©).

Abóbada do cruzeiro do transepto (2019, fotografia de António Pereira©).

Abóbada da capela do braço norte do transepto (2019, fotografia de António Pereira©).

Nas capelas dos braços, destacam-se as abóbadas de combados de desenho circular, planta central e perfil rebaixado, de construção e conceção indissociáveis da obra de João de Castilho25.

Abóbada da capela do braço sul do transepto (2019, fotografia de António Pereira©).

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O corpo da igreja apresenta uma organização espacial de nave única ladeada por capelas laterais, conferindo à igreja um esquema criptocolateral26. Todavia, a sua construção no século XVI terá correspondido a uma empreitada distinta da capela-mor e do transepto, na sequência da cessação de financiamento por D. Diogo de Sousa. Cabendo aos padres custearem a construção do corpo a partir de então, a obra terá sofrido graves patologias ao nível dos muros, cuja espessura não permitia sustentar mais do que um forro em madeira27.

Perspetiva das capelas laterais do corpo da igreja do século XVII (2018, fotografia de António Pereira©).

Abóbada seiscentista do corpo da igreja (2016, fotografia de António Pereira©).

No século XVII, regista-se uma renovação de fundo no corpo através da reconstrução de paredes, bem como da introdução de uma abóbada de nervuras ao estilo da abóbada da capela-mor e de abóbadas nervuradas nas capelas laterais28. Por sua vez, o frontispício da igreja de Vilar de Frades constitui um exemplo paradigmático da forma como os edifícios históricos resultam de adições, renovações e supressões que ocorrem na sua diacronia. A fase mais extensa, oitocentista, englobou a renovação da parte central da fachada e da inacabada torre sul29, provavelmente construída entre 1468 e 148330. Uma intervenção pensada para o exterior do edifício, de pendor neogótico e neorromânico, onde se observam sacadas com pseudo colunas decoradas, janelões de arco quebrado com enxaquetados e uma rosácea. Abrigado por um nártex exterior, o portal da igreja data ainda do século XVI31. Um portal de arco abatido tipicamente manuelino e invulgarmente decorado com motivos vegetalistas e renascentistas, tais como grotescos e “troncos esgalhados”32.

Portal do século XVI da igreja (2014, fotografia de António Pereira©).

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No lado norte, ergue-se outra torre de planta quadrangular com frontão e ameias decorativos. A sua construção envolveu várias empreitadas entre 1540 e 1600 e pedra de cantaria trazida do Mosteiro de Manhente e de uma torre antiga da quinta de São Martinho (Airó, Barcelos)33.

Fachada da igreja de Vilar de Frades (2017, fotografia de António Pereira©).

O CLAUSTRO SUL As menções, ainda que escassas, a espaços edificados nas imediações da igreja recuam, pelo menos, até ao século XV, como ao claustro degradado e transformado em cortes de gado pelos lóios aquando da sua chegada34. Todavia, na segunda metade do século XV terão decorrido ações de construção, reorganização e reparação dos espaços claustrais35. Exemplo disso, será a parede sul da igreja, pertencente a um edifício erigido em finais do século XV ou inícios do século XVI36, onde agora ressaltam acréscimos construtivos fruto da renovação quinhentista. No século XVI, porém, a implantação da nova igreja gótica terá gerado grandes alterações topográficas e a necessidade de renovação do claustro37. As obras ter-se-ão iniciado antes de 1520 e perdurado até final do século38. Acerca deste claustro subsistem maioritariamente fontes documentais, que fornecem

Interpretação da evolução construtiva da parede sul do claustro (2016, ilustração e fotografia de António Pereira©).

informações sobre a função e localização, assim como cronologias e detalhes construtivos do espaço.

elementos arquitetónicos do edifício anterior ao claustro quinhentista elementos do claustro quinhentista e posteriores

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A ala nascente terá sido edificada antes de 1520 e reformulada ainda nos finais do século XVI39. As restantes alas prosseguiram com a construção do dormitório poente (1523), do dormitório de “vale de cavalinhos” (1543), do dormitório “grande” da ala sul (década de 40) e do dormitório da “varanda” (1572)40. Das referidas empreitadas, apenas persistem visíveis reminiscências da ala sul, nomeadamente as mísulas, um arco enxalço, uma porta no piso superior, assim como duas portas no piso inferior, uma delas epigrafada na zona do lintel, possivelmente já a intercetar com a ala poente do claustro41.

Perspetiva geral da parede sul do claustro (2016, fotografia de António Pereira©).

Pormenor de um dos portais da parede sul do claustro (2016, fotografia de António Pereira©).

Pormenor do arcossólio da parede sul do claustro (2016, fotografia de António Pereira©).

Com pontuais intervenções, o claustro quinhentista manteve-se edificado até finais do século XVIII, momento em que se projeta e inicia outra renovação42. Concretizam-se, assim, as alas norte e nascente, com arcadas de oito e dez arcos de volta perfeita, que fazem antever um espaço retangular de arquitetura pragmática43.

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A ala norte, provavelmente levantada de raiz nesta intervenção44, consiste num espaço de ligação entre a igreja e os dois claustros. Além da função orgânica, destaca-se por possuir uma arcada com um sistema de abóbadas de arestas de tijolo intercaladas com arcos abatidos, possivelmente do mesmo material45. Uma estrutura possivelmente pensada para conferir maior capacidade portante ao edifício da igreja. A ala nascente foi implantada no alinhamento do transepto da igreja, sobrepondo-se ao braço sul. Construtivamente, as paredes estruturais só se desenvolvem para os dois primeiros Perspetiva geral da fachada da ala nascente do claustro dos séculos XVIII-XIX (2019, fotografia de António Pereira©).

pisos, sendo o dormitório construído em tabique dividindo o corredor, a capela e as celas. A heterogeneidade da sua construção resulta possivelmente do reaproveitamento de elementos construtivos ou da integração de estruturas pré-existentes46.

Perspetiva geral da fachada da ala nascente do claustro dos séculos XVIII-XIX (2019, fotografia de António Pereira©).

Pormenor de silhar com moldura reaproveitado na construção da ala nascente do claustro dos séculos XVII-XIX (2006, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d’Orey). Pormenor das abóbadas da galeria da ala norte do claustro dos séculos XVII-XIX (2006, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d’Orey).

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Excecionalmente, conserva ainda elementos dos tetos, pavimentos e vigamentos. Por cima do teto em estuque da sacristia, desenvolve-se um complexo sistema de vigamento e botaréus, executado com vigas de grande espessura que preservam a forma dos troncos. O restante vigamento do pavimento, todavia, apresenta-se bastante mais transformado, com vigas regulares de pouca espessura.

Perspetiva das divisões em tabique da galeria do piso superior da ala nascente do claustro dos séculos XVII-XIX (2016, fotografia de António Pereira©).

Pormenor do vigamento por cima do teto da sacristia da ala nascente do claustro dos séculos XVII-XIX (2016, fotografia de António Pereira©).

O CLAUSTRO SUDOESTE O claustro localizado a sudoeste da igreja é, atualmente e juntamente com a cerca, um espaço privado decorrente da extinção das ordens religiosas em Portugal. A sua edificação teve início no século XVII, com o intuito de expandir o espaço conventual. Todavia, devido à intervenção seiscentista do corpo da igreja, a sua conclusão apenas se deu no século XVIII47. Pormenor do restante vigamento do piso superior da ala nascente do claustro dos séculos XVII-XIX (2016, fotografia de António Pereira©).

Assim, entre 1619 e 1620, é edificado um muro de frontaria com duas portas principais que passa a definir pelo poente o adro da igreja e o novo espaço claustral48. Um muro que, entre 1700 e 1701, foi integrado na obra da “emenda da frontaria” que consistiu na edificação da ala poente49. Nas primeiras décadas de seiscentos terá sido construída a ala norte do

claustro e implantados os alicerces da ala sul, cuja construção viria apenas a ser continuada em 169850, numa empreitada afetada por patologias construtivas e repetida em 170251. Da análise deste conjunto sobressaem as fachadas voltadas para o pátio central, onde se observam elementos tão dissonantes quanto agregadores. Na ala norte, o maior volume deste espaço, observa-se a existência de dois edifícios adossados, sendo evidente a separação ao nível dos telhados, dos paramentos e das aberturas.

CO N V E NTO DE V IL A R DE FR A DE S: PE R SPE TIVA S DE INTE RV E NÇÃO 1 9 9 4 -2 0 0 8

49


A ala nascente corresponde a um edifício de grande dimensão distintamente marcado por elementos do século XVIII, onde a simetria é apenas abalada pelas três janelas de sacada no alçado coincidente com a ala sul. No piso térreo desenvolve-se uma galeria com a respetiva arcada de cinco arcos de volta perfeita e teto em abóbada de aresta. Na parte superior regista-se um conjunto de janelas de sacada com pormenores renascentistas ao nível do lintel e da consola. Perspetiva do alçado sul da ala norte do claustro (2018, fotografia de João Ribeiro©).

A ala poente, como já referido, resume-se a uma ala funcional de ligação do circuito claustral, quase em simetria com a ala contrária devido às janelas de sacada do piso superior e diferindo pela inexistência da galeria inferior. A ala sul consiste num edifício profundamente alterado por um incêndio ocorrido nos finais do século XIX, na sequência do qual terá sido reconstruída, mais rebaixada e descaraterizada52. Esta reedificação

Perspetiva do alçado poente da ala nascente do claustro (2018, fotografia de João Ribeiro©).

contemplou a adição das janelas de sacada nos alçados das alas nascente e poente e, consequentemente, uma quebra na harmonia arquitetónica da disposição dos vãos das sacadas.

Perspetiva do alçado nascente da ala poente do claustro (2018, fotografia de João Ribeiro©).

Perspetiva do alçado norte da ala sul do claustro (2018, fotografia de João Ribeiro©).

50

CO N V E N TO DE V I L A R D E F RA D ES : P ERS P ET I VA S DE INTE RV E NÇÃO 1 9 9 4 -2 0 0 8


NOTAS 1 Página 402 de TOMÁS, Frei Leão de São – Beneditina Lusitana. Introdução e

8 Página 147 de MAURÍCIO, Rui – O Mecenato de D. Diogo de Sousa Arcebis-

notas críticas de José Mattoso. Lisboa: Imprensa Nacional Casa da Moeda, 1974.

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9 Páginas 23-24 de FONTES, Luís Fernando Oliveira; MOREIRA, Ana Alexan-

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10 Página 147 de MAURÍCIO, Rui – O Mecenato de D. Diogo de Sousa Arce-

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bispo de Braga (1505-1532): Urbanismo e Arquitectura. Volume I. Leiria: Magno

los: Areias de Vilar, 2001.

Edições, 2000.

Páginas 9-10 de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o convento de Vilar de Fra-

11 Uma congregação do tipo conventual, cujo modo de vida se diferenciava da

des. Das origens da Congregação dos Seculares de São João Evangelista (Lóios)

clausura monástica pelo «egresso e regresso» (página 31 de FONSECA, Teotónio

à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia de Areias de

da – O Concelho de Barcelos Aquém e Além-Cávado. Volume

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13 Em 1467 encontrava-se em Vilar de Frades um construtor, de nome João Vaz,

nedictinización. Antigüedad Y Cristianismo. [em linha]. Murcia. III (1986) 235–

mestre das obras do convento e o possível responsável pela obra da igreja gótica

259. atual. N.a. [Consult. 10 Out. 2019].

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6 Documento nº420 da Diplomata et Chartae. Portugalie Monumenta Historica.

século XVI, analogamente semelhante às fases coevas da catedral de Salamanca e

A saeculo octavo post Christum usque ad quintundecimum. Olissipone. Typis Aca-

da Catedral de Tui (página 94 de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o convento

demicis, 1869.

de Vilar de Frades. Das origens da Congregação dos Seculares de São João Evan-

Página 21 de FAURE, Francisco Guilherme Cunha Líbano Monteiro – Casa de

gelista (Lóios) à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia

Deus e de Homens: uma leitura arqueológica do Convento de S. Salvador de

de Areias de Vilar, 1998).

Vilar de Frades. Porto: Universidade Fernando Pessoa, 2012. Dissertação de Mes-

18 Fólio 356 do Epílogo e Compêndio…, ADB – FMC, Ms 924.

trado em Arqueologia (policopiado). atual. Dez. 2019

19 A presença de mestres biscainhos na diocese e na cidade de Braga encontra-se

7 Página 32 de FAURE, Francisco Guilherme Cunha Líbano Monteiro – Casa de

documentada, pelo menos, desde 1496. Todavia, é durante a governação de D.

Deus e de Homens: uma leitura arqueológica do Convento de S. Salvador de

Diogo de Sousa que a sua atividade conhece um aumento exponencial nesta área

Vilar de Frades. Porto: Universidade Fernando Pessoa, 2012. Dissertação de Mes-

geográfica (páginas 157-158 de RIBEIRO, Maria do Carmo; MELO, Arnaldo Sousa

trado em Arqueologia (policopiado).

– A mobilidade dos artistas Biscainhos nas construções medievais portuguesas. Estudo preliminar. In I Congresso Histórico Internacional. As Cidades na História:

CO N V E NTO DE V IL A R DE FR A DE S: PE R SPE TIVA S DE INTE RV E NÇÃO 1 9 9 4 -2 0 0 8

51


População, 2012. Volume 2. Guimarães: Câmara Municipal de Guimarães. 2013.

34 Página 93 de PORTALEGRE, Padre Paulo de – Novo Memorial do Estado

pp. 154-176).

Apostólico. Lisboa: Roma Editora. Ed. SOBRAL, Cristina, 2007.

20 Páginas 75-79 de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o convento de Vilar

35 Páginas 41-48 de FAURE, Francisco Guilherme Cunha Líbano Monteiro – Casa

de Frades. Das origens da Congregação dos Seculares de São João Evangelis-

de Deus e de Homens: uma leitura arqueológica do Convento de S. Salvador

ta (Lóios) à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia de

de Vilar de Frades. Porto: Universidade Fernando Pessoa, 2012. Dissertação de

Areias de Vilar, 1998.

Mestrado em Arqueologia (policopiado).

21 Joaquim Vinhas destaca que a abóbada da capela-mor, suprimindo subdivisões

36 Página 91 de FAURE, Francisco Guilherme Cunha Líbano Monteiro – Casa

e libertando as paredes para a abertura de vãos, rompe com os sistemas constru-

de Deus e de Homens: uma leitura arqueológica do Convento de S. Salvador

tivos dos edifícios religiosos do século XV (página 92 de VINHAS, Joaquim Alves

de Vilar de Frades. Porto: Universidade Fernando Pessoa, 2012. Dissertação de

– A igreja e o convento de Vilar de Frades. Das origens da Congregação dos

Mestrado em Arqueologia (policopiado).

Seculares de São João Evangelista (Lóios) à extinção do convento. 1425-1834.

37 Página 92 de FAURE, Francisco Guilherme Cunha Líbano Monteiro – Casa

Barcelos: Junta de Freguesia de Areias de Vilar, 1998).

de Deus e de Homens: uma leitura arqueológica do Convento de S. Salvador

22 Páginas 44-45 e 48 de GENIN, Soraya - As Abóbadas da Igreja Do Mosteiro

de Vilar de Frades. Porto: Universidade Fernando Pessoa, 2012. Dissertação de

de Vilar de Frades. Análise Histórica e Arquitetónica in MASCARENHAS-MATEUS,

Mestrado em Arqueologia (policopiado).

João - História da Construção em Portugal. Consolidação de uma disciplina. Lis-

38 Página 113 de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o convento de Vilar de Fra-

boa: By the Book, 2018. pp. 43-58.

des. Das origens da Congregação dos Seculares de São João Evangelista (Lóios)

23 Páginas 93-94 de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o convento de Vilar

à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia de Areias de

de Frades. Das origens da Congregação dos Seculares de São João Evangelis-

Vilar, 1998.

ta (Lóios) à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia de

39 A história documental desta intervenção encontra-se documentada e estudada

Areias de Vilar, 1998.

por Joaquim Vinhas (páginas 118-127 de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o

24 Página 3 de WILLIS, Robert – On the Construction of the Vaults of the Middle

convento de Vilar de Frades. Das origens da Congregação dos Seculares de São

Ages. London: Longman, 1842.

João Evangelista (Lóios) à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de

25 Páginas 52-54 de GENIN, Soraya – As Abóbadas da Igreja Do Mosteiro de Vilar

Freguesia de Areias de Vilar, 1998).

de Frades. Análise Histórica e Arquitetónica. In MASCARENHAS-MATEUS, João –

40 Fólio 362 do Epílogo e Compêndio…, ADB – FMC, Ms 924.

História da Construção em Portugal. Consolidação de uma disciplina. Lisboa: By

41 Todavia, pela dimensão e forma das molduras, estas portas deverão resultar de

the Book, 2018. pp. 43-58.

reformulações posteriores da ala poente quinhentista.

26 Páginas 93-94 de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o convento de Vilar

42 Página 268 de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o convento de Vilar de Fra-

de Frades. Das origens da Congregação dos Seculares de São João Evangelis-

des. Das origens da Congregação dos Seculares de São João Evangelista (Lóios)

ta (Lóios) à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia de

à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia de Areias de

Areias de Vilar, 1998.

Vilar, 1998.

27 Fólio 357 do Epílogo e Compêndio…, ADB – FMC, Ms 924.

43 Joaquim Vinhas descreve a arquitetura da reformulação do claustro como um

28 Páginas 149-152 de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o convento de Vilar

“classicismo frio e austero” (páginas 268-270 de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja

de Frades. Das origens da Congregação dos Seculares de São João Evangelis-

e o convento de Vilar de Frades. Das origens da Congregação dos Seculares de

ta (Lóios) à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia de

São João Evangelista (Lóios) à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta

Areias de Vilar, 1998.

de Freguesia de Areias de Vilar, 1998).

29 As últimas intervenções construtivas em Vilar de Frades na fachada e no claus-

44 As paredes, tal como os pilares, aparentam possuir o mesmo tipo de aparelho.

tro sul foram interrompidas e abandonadas em 1834, na sequência da extinção das

45 Com exceção para os arcos no término das alas, executados em granito.

ordens religiosas em Portugal (página 9 de BARREIROS, Cónego Manuel de Aguiar

46 Esta possibilidade foi já suscitada por Joaquim Vinhas, todavia em referência

– A Egreja de Villar de Frades. Porto: Marques Abreu. 1919).

aos portais e à escadaria a sul da ala nascente do claustro (página 269 de VINHAS,

30 Páginas 40 e 47 de FAURE, Francisco Guilherme Cunha Líbano Monteiro -

Joaquim Alves – A igreja e o convento de Vilar de Frades. Das origens da Con-

Casa de Deus e de Homens: uma leitura arqueológica do Convento de S. Salva-

gregação dos Seculares de São João Evangelista (Lóios) à extinção do convento.

dor de Vilar de Frades. Porto: Universidade Fernando Pessoa, 2012. Dissertação

1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia de Areias de Vilar, 1998).

de Mestrado em Arqueologia (policopiado).

47 Páginas 135-137 de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o convento de Vilar

31 Páginas 98-99 de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o convento de Vilar

de Frades. Das origens da Congregação dos Seculares de São João Evangelis-

de Frades. Das origens da Congregação dos Seculares de São João Evangelis-

ta (Lóios) à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia de

ta (Lóios) à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia de

Areias de Vilar, 1998.

Areias de Vilar, 1998.

48 Página 137 de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o convento de Vilar de Fra-

32 Páginas 102-103 de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o convento de Vilar

des. Das origens da Congregação dos Seculares de São João Evangelista (Lóios)

de Frades. Das origens da Congregação dos Seculares de São João Evangelis-

à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia de Areias de

ta (Lóios) à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia de

Vilar, 1998.

Areias de Vilar, 1998. 33 Fólios 359-360 do Epílogo e Compêndio…, ADB – FMC, Ms 924.

52

CO N V E N TO DE V I L A R D E F RA D ES : P ERS P ET I VA S DE INTE RV E NÇÃO 1 9 9 4 -2 0 0 8


49 Páginas 200-207 de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o convento de Vilar

51 Este processo e a sua história documental, na qual se incluem os contratos

de Frades. Das origens da Congregação dos Seculares de São João Evangelis-

das empreitadas, encontram-se estudados por Joaquim Vinhas (páginas 189-198

ta (Lóios) à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia de

de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o convento de Vilar de Frades. Das ori-

Areias de Vilar, 1998.

gens da Congregação dos Seculares de São João Evangelista (Lóios) à extinção

50 Páginas 139-140 de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o convento de Vilar

do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia de Areias de Vilar, 1998).

de Frades. Das origens da Congregação dos Seculares de São João Evangelis-

52 Página 35 de FONSECA, Teotónio da – O Concelho de Barcelos Aquém e

ta (Lóios) à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia de

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4 ARQUEOLOGIA ESTUDO S


Ricardo Erasun Cortés Arqueólogo, Sócio Gerente da ARQUEOGES, Arqueologia e Gestão de Património, Lda geral@arqueoges.com Ricardo Erasun Cortés, Madrid, 1973, é licenciado em Geografia e História (especialidade em Pré-História e Arqueologia) pela Facultad de Filosofia y Letras da Universidad Autónoma de Madrid (1998). Mestrado em Gestión de Património Cultural no Centro Superior de Estúdios de Gestión, Análisis y Evaluación da Universidad Complutense de Madrid (2000). Doutorando em Arqueologia, Historia da Antiguidade e Ciências e Técnicas Históricas no Departamento de Arqueologia da Universidad de Santiago de Compostela. Mestrando no Mestrado Integrado em Arquitectura e Urbanismo na Escola Superior Gallaecia ESG da Escola Superior Universitária. Desenvolveu funções de direção científica e técnica para o Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR) nas intervenções arqueológicas efetuadas no Convento de Vilar de Frades (Barcelos) e Mosteiro de Pombeiro (Felgueiras) entres os anos de 1999 a 2006. Desde 2007 desenvolve funções de direção científica em diversos projetos de âmbito público e privado.

Francisco Faure Arqueólogo francisco.faure@gmail.com Francisco G. C. Líbano Monteiro Faure é licenciado em História, variante de Arqueologia, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre em Arqueologia pela Universidade Fernando Pessoa. Presentemente frequenta o Doutoramento em Estudos do Património – Arqueologia, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Desde 1999 participou e dirigiu diversos trabalhos arqueológicos para instituições públicas e privadas, alguns deles em imóveis classificados, nomeadamente no Convento de São Salvador de Vilar de Frades. Entre 2002 e 2018 exerceu funções de arqueólogo na Câmara Municipal de Guimarães, quer no Gabinete do Centro Histórico quer na Divisão de Projetos e Planeamento Urbanístico.


Escavações Arqueológicas no Convento de Vilar de Frades INTRODUÇÃO

O Convento de São Salvador de Vilar de Frades foi alvo de diversas intervenções arqueológicas entre 1995 e 2012, as quais estiveram, frequentemente, enquadradas no programa de reabilitação do imóvel promovido pela Direção Regional de Cultura do norte e organismos que a precederam. O facto de, não poucas vezes, as sondagens arqueológicas, sobretudo aquelas localizadas no interior da igreja e sua periferia norte e este, terem sido condicionadas pelo progresso da obra ou tentarem responder às suas necessidades específicas, mais do que a um programa científico, faz com que o conhecimento que possuímos sobre São Salvador de Vilar de Frades seja, ainda, um pouco fragmentário. Não obstante, o conjunto de trabalhos que foram levados a cabo, sobretudo entre 1998 e 2004, mesmo que continuando a levantar mais dúvidas do que a dar respostas, permite-nos fazer uma ideia sobre o desenvolvimento do edifício desde a Idade Média até à Época Contemporânea. Nestes trabalhos incluem-se, desde logo, os de Teresa Laço e Rita Bernardo1 em 1998, que consistiram em acompanhamento de obras e realização de diversas sondagens, nas quais destacamos, desde logo, as sondagens 10 a 10C, implantadas a norte da Igreja e as sondagens 12 e 12A, localizadas no adro em frente à torre sul. Numa segunda campanha, sob a direção de Lídia Lopes2, que decorreu durante o primeiro semestre de 1999, foram igualImplantação das principais estruturas abordadas neste texto (Adaptado de Erasun Cortés [et al.], 2000, Faure, 2012 e Fontes [et al.], 2003)

mente feitos acompanhamentos de obra e sondagens, sobretudo no interior da igreja e no seu exterior, a norte e este.

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Daremos aqui principal relevo aos resultados das sondagens 21, 22 e 23, localizadas na nave da igreja. Os trabalhos de 1999 prosseguiram, durante o segundo semestre, sob a direção de Ricardo Erasun e colaboração de Francisco Faure3, sendo aqui de reter em especial os resultados das sondagens 24, 25, 30 e 12A2. Interrompida temporariamente a obra, entre 2000 e 2001 decorreram sondagens, dirigidas por Francisco Faure, localizadas maioritariamente na zona sul e oeste do Claustro. Destes trabalhos consideraremos aqui os dados das sondagens 31, 35A a 35D, 36 e 41. Os trabalhos prosseguiram, de 2002 a 2003, sob a coordenação de Luís Fontes e a direção técnica de Alexandra Moreira e Anabela Duarte4, também eles maioritariamente centrados no claustro e dos quais destacaremos os resultados da Sondagem 34. Durante esta campanha foi ainda realizada uma sondagem dentro da igreja, na segunda capela lateral sul, a Sondagem 43, que também interessa aqui abordar. Finalmente, Ricardo Erasun5 realizou trabalhos diversos em 2008 e 2012, nomeadamente na ala conventual este, que também analisaremos no presente trabalho.

UM CONVENTO AINDA DESCONHECIDO: VILAR DE FRADES DAS ORIGENS AO SÉCULO XV A tradição atribui a edificação de São Salvador de Vilar de Frades a São Martinho de Dume, por volta do ano 566, chegando mesmo a dar uma afiliação original do mosteiro à Ordem de São Bento. Se é impossível, à luz do que conhecemos atualmente, precisar a data da sua fundação, é certo que a ligação aos monges negros não poderá ser do Muro transversal à nave da igreja (1999, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Ricardo Erasun).

século VI, devendo o convento enquadrar-se nas instituições de pendor "fructuosiano" ou "rosendiano" características do Noroeste Peninsular. Pouco se sabe, contudo, deste período inicial alti-medieval para além da informação transmitida pelos cronistas beneditinos e lóios, datando, a primeira notícia documental referente a Vilar de Frades, de 1059 6. É deste período, entre os séculos X e XI, que conhecemos os primeiros elementos arquitetónicos provenientes de Areias de Vilar. Trata-se de um conjunto de fragmentos já estudados por Mário Barroca7 e, mais recentemente, por Luís Fontes e Belisa Pereira8, que se encontram depositados no Museu Pio XII, em Braga. Deste conjunto fazem parte um fragmento de cancela9, uma placa decorada10 e um fragmento de ajimez11. Entre os séculos XII e XIII, Vilar de Frades terá sido alvo de uma reforma românica, da qual subsistem ainda hoje, para além de alguns elementos arquitetónicos dispersos, o pórtico e a janela que se encontram integrados na torre sul. O pórtico tem sido considerado de elevado interesse e, nas palavras de Carlos Alberto Ferreira de Almeida, a sua terceira arquivolta é “a arquivolta românica portuguesa mais historiada e de maior interesse iconográfico”12. A janela, por seu lado, deveria ser originalmente uma das portas laterais do templo românico. Se não nos parece haver grandes motivos para duvidar da originalidade destes elementos, também é certo que eles deverão ter sido ali colocados já em pleno século XIX, durante o período de reformulação da fachada levado a cabo pelos Lóios em 1804/05. De facto, não só o aparelho que enquadra estes elementos é semelhante ao da obra oitocentista como, por outro lado, sabemos que a porta foi aberta já em pleno século XX, durante os trabalhos de reabilitação levados a cabo pela Direção-Geral de Edifícios e Monumentos Nacionais.

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Os poucos elementos claramente românicos até hoje identificados encontram-se, portanto, descontextualizados e, por essa razão, à semelhança do que acontece com o templo pré-românico, não é possível ter uma ideia correta da implantação do convento e igreja deste período. A única estrutura que aqui poderíamos enquadrar corresponde ao muro identificado na nave da igreja, com uma orientação norte-sul, do qual restavam vestígios a partir da terceira capela lateral sul da nave da igreja e que terá sido destruído aquando da implantação dos alicerces da nave no lado norte. Além deste muro, podem apresentar-nos algumas pistas as cistas polilíticas, típicas de enterramentos desta época, e que se distribuíam por uma área que, sensu lato, ocupa mais de 1.600m2, desde a zona a norte da igreja até ao claustro, a sul, e desde a nave da Igreja, a este, até à zona superior do adro, a oeste. As cotas da implantação destas cistas parecem apontar para a existência de três patamares de ocupação de todo o espaço: uma área a este do muro, identificada dentro da igreja, onde as cotas das paredes das cistas se encontram a cerca de 22,55m; uma segunda área a oeste deste muro, dentro da igreja e a norte desta, onde as cotas das cistas se encontram a cerca de 22,00m e, finalmente, uma terceira área, a oeste e sul, isto é, no adro e no claustro, na qual as cotas das cistas rondam os 21,20m. Não é possível compreender a funcionalidade destes espaços. Uma cista identificada no perfil este da sondagem 26B, no patamar superior, encostaria ao muro e, como tal, é possível encontrar entre as duas estruturas uma relação de ocupação e cronológica. Contudo, mais nenhuma informação possuímos a este que nos permita qualquer interpretação. Já as duas cistas identificadas a norte da igreja, por seu turno, em especial a cista da sondagem 10A, permitem-nos ver que o segundo patamar ocuparia uma área que ultrapassava os limites do templo atual.

AS REFORMAS DOS LÓIOS DURANTE O SÉCULO XV Fruto da crise religiosa dos séculos XIV e XV, São Salvador de Vilar de Frades terá chegado a um nível de abandono tão grande que originou uma intervenção drástica por parte por parte do arcebispo D. Fernando da Guerra. Assim, em 1425 o convento é reduzido a igreja secular, perdendo qualquer relação com a Ordem de São Bento e, ato contínuo, é entregue aos Cónegos Seculares de São João Evangelista, vulgarmente conhecidos como Lóios.

Sondagem 23, embasamento entre a terceira e quarta capelas laterais do lado sul (1999, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Lídia Lopes).

Sondagem 21, embasamento entre a quarta e quinta capelas laterais do lado sul (1999, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Lídia Lopes).

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Pouco tempo após tomarem posse do Convento de Vilar de Frades, os Lóios deram início a um plano de reconstrução da igreja e dos espaços monásticos, para os quais possuímos registos quase constantes a partir da segunda metade do século XV13. Assim, durante o reitorado do Pe. João da Nazaré (1460-1471) foi construída, sob a direção do mestre de obras João Vaz, uma nova igreja e, muito provavelmente, a torre velha, isto é, a torre sul, para a qual havia sido obtida a pedra em 1468. Não sabemos muito sobre este templo gótico, mas é possível que dele fizessem parte os alicerces das arcadas das duas últimas capelas laterais do lado sul. Ao contrário dos demais alicerces da nave da igreja, este, realizado com silhares graníticos de formato retangular rejuntados com argamassa de cal, estendia-se desde a torre velha até ao muro que atravessava a igreja, isto é, até à terceira capela lateral. Os dois muros encontravam-se, mas a zona onde se uniam estava parcialmente destruída, razão pela qual não era possível ver como se articulavam. Contudo, durante a escavação da Sondagem 27, aberta na terceira capela lateral, constatou-se que o alicerce das arcadas era mais recente do que aquela outra estrutura que temos vindo a considerar românica. Adossados a esta nova estrutura encontravam-se dois embasamentos de colunas de forma paralelepipédica, o primeiro junto à parede que dividia a terceira e a quarta capelas laterais e o segundo um pouco à direita da divisória entre a quarta e quinta capelas laterais.

Em concordância com este alicerce e os embasamentos de colunas, encontrava-se um piso argiloso onde, com enorme frequência, apareciam numismas do século XV, nomeadamente ceitis de D. Afonso V e D. Manuel. Este piso estendia-se por toda a nave da igreja, a oeste do muro transversal, e inclusivamente para fora desta, a norte, correspondendo àquele patamar intermédio que, como anteriormente referimos, se encontrava delimitado a este pelo muro transversal à nave da igreja. Continua a ser impossível identificar o tipo de ocupação deste espaço, para a qual não temos outras evidências, mas no exterior da igreja, a norte, foram identificadas quatro tampas de sepultura in situ Sondagem 10/10A, a norte da igreja (1998, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Teresa Laço).

e com orientação norte-sul.

Ora, a orientação destas sepulturas não poderia estar

relacionada com a igreja atual, cuja construção é mais tardia e, por isso, achamos que este segundo patamar se encontraria perfeitamente delimitado, pelo menos no seu lado este e norte. É importante referir, finalmente, que durante a regularização levada a cabo para o assentamento do piso foram destruídas, parcial ou totalmente, as cistas polilíticas pré-existentes. Assim, no caso da sondagem 25, foram retiradas as pedras que correspondiam à tampa, subsistindo as que conformam as paredes da sepultura, ao passo que na sondagem 30 somente encontramos os negativos das cistas na rocha base. No que respeita à área da igreja, merece especial atenção a sondagem efetuada na segunda capela lateral da nave, ainda no lado sul. Aqui, a equipa liderada por Luís Fontes identificou um alicerce que corresponderia “à abside lateral Norte da cabeceira da igreja Medieval”14, a qual se desenharia numa planta poligonal. Este alicerce arranca perpendicularmente ao muro no centro da igreja e, tal como se constatou durante a campanha de 1999, ser-lhe-á posterior.

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Este facto, associado à planta poligonal, leva-nos a pensar estarmos perante um templo gótico, mais do que um templo românico. Desta forma, a proposta de implantação da igreja medieval realizada por Luís Fontes e colegas corresponderia, muito provavelmente, à igreja construída por João Vaz e, portanto, da segunda metade do século XV. Já na área do claustro, possuímos uma estrutura singular, a parede sul, que terá as suas origens neste período. Mantém os estigmas de diversas fases construtivas e, fruto da interrupção das obras oitocentistas, acabou por sobre-

Parede sul do claustro (2012, fotografia de Francisco Faure©).

viver até aos nossos dias. Na face norte desta parede é possível identificar, desde logo, que ela comportou sempre dois pisos. Interessam-nos, neste momento, os elementos que se poderão associar ao século XV. Nesta fase mais antiga de ocupação, como se constatou pela campanha de escavações de 2000/2001, o nível de circulação do primeiro piso encontrava-se a uma profundidade de cerca de 1,80m abaixo da cota atual do claustro. Aqui foi identificada uma camada de saibro e argamassa com os negativos de um piso em tijoleira, disposta ora em fiadas perpendiculares à parede, na área que lhe

Levantamento parcial da parede sul do claustro, plano e reconstituição do piso do século XV e da porta seiscentista (2001 e 2008, Direção Regional de Cultura do Norte©, ilustração de Francisco Faure, Ricardo Erasun e Saudade Correia).

estava mais próxima, ora em espinha, na zona mais afastada. O elemento mais significativo da parede é, sem dúvida, o arcossólio, do qual hoje podemos ver a parte superior. À sua esquerda, isto é, do lado norte, havia uma janela. A sul encontra-

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Sondagem 35D, vendo-se o murete adossado à parede sul (2000, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Francisco Faure).

Sondagem 35B com piso do século XV (2001, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Francisco Faure).

Reconstituição da parede sul do claustro durante o século XV (2012, ilustração de Francisco Faure©16 ).

vam-se duas janelas e uma porta, da qual foi possível identificar, apenas, o arranque da ombreira do lado esquerdo. A janela que se encontra inserida no arcossólio não deveria ser original mas um acrescento. Ao longo da parede encontravam-se os vestígios de um murete alto argamassado, interrompido na zona do arcossólio e antes da porta. No que diz respeito ao andar superior, ele está claramente marcado pelos entalhes para a colocação do travejamento do chão, que seria em madeira15. Aqui podemos encontrar uma porta ladeada por duas pequenas janelas e outas três janelas, uma delas em sacada, que deveriam corresponder a celas do dormitório. Pela análise das características construtivas é claro que, nesta fase inicial, a face norte desta parede corresponderia a um espaço interior e a face sul a um espaço exterior. Não conseguimos identificar o limite norte destes espaços. Na sondagem 31, localizada no centro do claustro, apareSondagem 41, vendo-se o muro medieval e, ao fundo, o alicerce do claustro do século XVI e conduta de escoamento de água (2001, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Francisco Faure).

ceram dois muros paralelos a este. Mas a distância de cerca de 11 metros entre a parede sul e o alicerce que lhe está mais próximo forma um vão demasiado grande para o tipo de travejamento presente. A parede poente, por seu turno, é perpendicular à parede sul e é possível que fossem da mesma época. Mas o facto de algumas alterações posteriores terem adulterado muito esta esquina sudoeste, não permite uma correta compreensão da forma como as duas estruturas se conjugavam. Como limite este tem sido proposto um muro identificado na sondagem 41, que não é perpendicular à parede sul, mas que a encontraria na sua esquina. Trata-se, aliás, de um muro com muito bom aparelho.

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OBRAS DO SÉCULO XVI E XVII Nos inícios do século XVI, antes de 1513 e sob os auspícios de D. Diogo de Sousa, é dado início à construção da capela-mor de uma nova igreja. Trata-se do templo manuelino que hoje conhecemos. Como se sabe, o conflito entre os Lóios e o Arcebispo de Braga levou a que esta obra fosse interrompida e, como tal, o projeto inicialmente idealizado nunca foi terminado. O programa manuelino terá sido implementado apenas até ao transepto e à primeira capela lateral do lado norte, tendo o resto da estrutura da igreja sido construída com menos sumptuosidade17. A exceção está no pórtico manuelino, que os Lóios decidiram mandar construir de forma a manter a dignidade pretendida para o edifício no projeto inicial.

A construção desta nova igreja teve, como grande consequência, uma subida das cotas de utilização de todo o conjunto. Aquele patamar intermédio ao qual aludimos anteriormente, e que tinha as suas origens, eventualmente, nos séculos XII ou XIII, deixa de existir e é colocada uma camada de aterro para elevar esta zona Sondagem 35A, vendo-se a conduta de escoamento de água do claustro, à esquerda, e a pequena conduta de escoamento de água da galeria, à direita (2000, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Francisco Faure).

até à cota do piso da nave da igreja. Como consequência, gera-se um grande desnível entre o nível de circulação da igreja e os edifícios da área conventual.

De forma a resolver este problema de cotas, em 1555, dá-se início à construção do claustro. Para tal, foi construído um alicerce que se levantava acima do antigo nível de circulação e implantado um sistema de escoamento de águas nas esquinas, o qual foi identificado a sudeste e sudoeste em 2000/2001.

Posteriormente, toda a área foi sujeita a um forte aterro. Na parede sul

encontramos, quer no seu lado norte quer no alçado sul, os vestígios desta intervenção. Em primeiro lugar, aquele que seria o seu lado interior passa, agora, a dar diretamente para o claustro e o antigo lado exterior, isto é, a face sul, passa a ser a parede interior do novo refeitório e dormitório. Todas as antigas aberturas, quer portas quer janelas, são entaipadas e, na face norte, são colocados os cachorros que suportavam o madeiramento da varanda. Na zona correspondente ao novo rés-do-chão encontram-se agora duas portas: uma daria acesso ao refeitório e a outra, na esquina sudoeste, levaria ao primeiro andar. Já no final do século XVI são feitas reformas na ala este do espaço conventual. Corresponderá a esta reformulação a “nitreira” identificada na zona nordeste do claustro pela equipa de Luís Fontes18.

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REFORMA DO SÉCULOS XVIII-XIX

Entre o final do século XVIII e o início do século XIX dá-se início a um novo conjunto de obras que irão dar ao convento o aspeto que, genericamente, hoje conhecemos. Ater-nos-emos apenas a alguns pormenores que têm, sobretudo, a ver com as soluções arquitetónicas utilizadas. Na descrição do convento feita em 1697 pelo Pe. Francisco de Santa Maria é dito que a sacristia era pequena e tinha uma janela19. Esta não corresponderia à atual sacristia, a qual deverá ter sido construída na segunda metade do século XVIII, provavelmente após 1777. Não é possível obter uma cronologia muito fina para este programa de obras, quer porque as fontes nem sempre são claras, quer porque, como sempre aconteceu em Vilar de Frades, uma obra começada era frequentemente interrompida. É nesta altura que é aberta a porta que permite a passagem da capela de D. Teresa de Mendonça, no lado sul do transepto, para a sacristia20. Desta área provêm duas peças em louça preta de Prado, datáveis do século XVII. Inicialmente, uma vez que o novo piso estava mais baixo do que a cota da igreja, havia um pequeno degrau. Posteriormente, ele foi elevado, permitindo a passagem ao mesmo nível entre a igreja e a sacristia. Quando, antes de 1523, foi construído o pórtico manuelino, este não foi implantado no eixo da igreja, mas com um ligeiro desvio, de cerca de 1 m para norte, que terá resultado da vontade de aproveitar a torre velha para criar o futuro nártex. Tal facto não teria muito impacto visual, nem interior nem exteriormente. Todavia, como a parede da torre velha é muito espessa, quando foi construído o coro alto, de forma a manter a simetria interior e acompanhar o pé-direito das arcadas das capelas laterais, foi necessário retirar quase 1,5 m à espessura da parede norte daquela torre. Não é possível saber o resultado desta solução na fachada até à ao século XIX, pois não há nenhuma descrição pormenorizada.

Vasilhame de mesa de cerâmica de Prado, século XVII (2012, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Ricardo Erasun).

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Entre 1804 e 1805 procede-se à reforma da fachada e as três janelas de sacada do coro-alto, em estilo neogótico, foram construídas de forma a manter a simetria interior. De facto, dentro da igreja é quase impercetível o desvio da porta face a todo o conjunto. O resultado exterior é, contudo, totalmente distinto. As pseudo-colunas que “suportam” a varanda rebatem, em planta, de forma distinta a norte e a sul. Como a parede da torre velha é muito espessa, a coluna cai dentro do seu alçado, mas a do lado da torre nova acaba por cair fora do seu alinhamento e, por esta razão, obrigou à criação de um acrescento que, conjugado com o novo arco abatido, retira a simetria ao nártex. A solução, ainda que engenhosa, transmite uma enorme sensação de distorção. Como resultado desta reforma, com exceção da torre manuelina, todo o trabalho da pedra é bastante homogéneo. Deverá ser desta altura, como anteriormente referimos, a colocação na torre sul da porta e “janela”

Panela do século XVII (2012, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Ricardo Erasun).

românicas.

PRÁTICAS SEPULCRAIS Como frequentemente acontece neste tipo de monumentos, eles constituem-se como uma grande área cemiterial, pelo menos, até ao século XIX. Concretamente em Areias de Vilar, o antigo convento serviu de local de enterramento até março de 188621. A decisão sobre onde enterrar os mortos não era, de maneira nenhuma, caótica e regia-se por regras que conseguimos descortinar na documentação e registos de óbitos. Assim, o interior da igreja encontrava-se destinado a um conjunto de pessoas ilustres que aí possuíam direitos de sepultura. Conhecemos alguns destes casos, mas curiosamente, são antigos e muito limitados. Os registos de óbitos apenas indicam 13 indivíduos enterrados no interior da igreja. Sabemos que haveria mais, pois alguns daqueles que ali estão enterrados faleceram fora e, como tal, o seu nome não se encontra nos assentos de Areias de Vilar. Além disso, ainda que relativamente poucos, foram encontrados enterramentos na nave da igreja e, portanto, posteriores ao século XVI. Uma das hipóteses levantada é de que se trataria de membros da comunidade monástica. Não descartando outras razões, é possível que o formato do piso da igreja, em pequenas lajes dispostas em diamante, tornaria trabalhosa a ação de abrir sepulturas. O claustro foi a grande área de preferência de enterramentos a partir da segunda metade do século XVIII e também ele se encontrava dividido em duas áreas distintas: a ala poente estava destinada aos membros da comunidade e as demais alas a leigos. A modulação do claustro quinhentista deveria comportar um total de 96 sepulturas: 27 nas alas oeste e este e 21 nas alas sul e norte. Os indivíduos sepultados na galeria oeste encontravam-se depositados no sentido oeste-este, os da galeria sul, no sentido sul-norte e os da galeria oriental no sentido este-oeste. Não foi possível determinar como se procederia aos enterramentos na galeria norte, mas é possível que seguissem o padrão da galeria sul. A construção do claustro neoclássico teria levado, caso tivesse sido terminado, a um aumento da capacidade de sepulturas para, numa modelação ideal,

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um total de 162. A galeria norte foi preparada para receber um total de 45 sepulturas orientadas oeste-este, dispostas em 3 fiadas de 15 sepulturas. Apenas existem 6 destas sepulturas, no canto nordeste, mas a abertura de valas nesta ala permitiu comprovar a existência dos pilares destinados a suportar as guias das restantes. Na ala este, conforme se comprovou pela escavação da sondagem 38, os enterramentos começaram a fazer-se no sentido sul-norte. É possível que as galerias poente e sul viessem a seguir as modelações das galerias este e norte, respetivamente, mas, como a obra nunca foi terminada, os enterramentos aí realizados mantiveram a disposição anterior. O adro estava dividido em 3 zonas. A zona norte destinava-se ao enterramento dos paroquianos de São João de Areias e a zona sul aos de Santa Maria Madalena. A entrada da igreja, por seu turno, era o local de enterramento das crianças. O espólio associado a estes enterramentos é, por norma, relativamente pobre, sendo o mais frequente as contas de rosário em madeira que, naturalmente, aparecem junto às mãos dos defuntos. Outro elemento quase sempre constante são os alfinetes utilizados para fechar a mortalha. Excecionalmente aparece outro tipo de espólio, como as medalhas votivas, os crucifixos e, como aconteceu num enterramento no adro da igreja, um anel.

Medalha (2012, fotografia de Ricardo Erasun©22).

Crucifixo (2012, fotografia de Ricardo Erasun©23).

As formas de enterramento dos defuntos praticadas em Vilar de Frades

podem dividir-se em 4 grandes grupos. Em primeiro lugar, as cistas polilíticas medievais presentes praticamente por toda a área do monumento, quer se tratem Anel (2012, fotografia de Ricardo Erasun©24).

de cistas feitas com recurso a pedras irregulares ou aquelas formadas já por silhares reaproveitados. Em seguida, as sepulturas abertas na terra, mas possuindo uma tampa em granito, tal como as que apareceram nas sondagens 10, 10A e 10B25, às quais podemos associar, igualmente, as sepulturas existentes no interior da igreja, de período moderno, como a do Bispo D. Francisco de Santa Maria e a da família Vilas Boas, entre outras. Em terceiro lugar, as sepulturas ordenadas em torno do claustro, durante a idade moderna e contemporânea. Finalmente, os sepultamentos, aparentemente desorganizados, identificados maioritariamente na zona do adro.

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Tipos de sepulturas identificadas em Vilar de Frades. A – cistas polilíticas; B – tampas de sepultura do século XV, anepígrafas; C – tampas de sepultura com epígrafe; D – Sepulturas em campa térrea (2020, Direção Regional de Cultura do Norte©, ilustração de Ricardo Erasun e Francisco Faure26).

CISTAS O tipo de sepultura estruturada mais antiga que foi possível constatar em Vilar de Frades é formado pelas cistas de caixa pétrea27, polilíticas, com cobertura de lajes múltiplas, coetâneas às sepulturas de fossa simples entre o século X e o século XIV. São estruturas “casuais” levantadas com pedras avulsas ou elementos construtivos reutilizados assentes a seco, cuja única intencionalidade é a de delimitar o corpo inumado, mas longe do preciosismo dos sepulcros monolíticos, com nenhuma estanqueidade, pelo que estas estariam cobertas de terra, com algum tipo de marcador vertical para a sua localização. Ao contrário do que sucede em sepulturas mais tardias28, não nos aparecem em Vilar de Frades cistas com cabeceira mais evoluída evidenciando algum antropomorfismo. No entanto, na UE29 [2] da Sondagem 24, observa-se o uso de pedras e telhas à volta da cabeça para conter o crânio e mantê-lo na sua posição após o descaramento. É comum encontrar no terço inferior da base pequenos buracos alongados escavados no solo, contendo, por vezes, vestígios de ossos longos, facto que aponta para a sua utilização como ossários. É possível que a presença deste tipo de ossários, assim como depósitos simples de crânios ou ossos longos30, indique algum grau de familiaridade entre aqueles que ocuparam estas sepulturas, podendo falar-se, então, de monumentos destinados a constituir-se como panteão familiar31. Apesar de estas sepulturas serem anónimas, a presença de espólio associado á inumação pode apontar para, pelo menos, o status social e a ocupação do indivíduo, como no caso da sondagem 30, aberta no ano de 1999 na face interna da fachada principal, onde foram exumadas um conjunto de 4 esporas que, apesar de se encontrarem descontextualizadas devido à destruição das cistas, pertenceriam a um número indeterminado de cavaleiros32.

Espora (2000, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Ricardo Erasun).

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TAMPAS MONOLÍTICAS As primeiras sepulturas com tampa formada por uma só laje granítica, com ou sem qualquer tipo de inscrição, aparecem-nos, em Vilar de Frades, a partir do século XV. Como já tivemos oportunidade de mencionar, são datáveis deste período as sepulturas identificadas nas sondagens 10, 10A e 10B. Este segundo tipo é aberto na terra e possui, nalguns casos, apenas uma preparação lateral de pequenas pedras que permitem suportar a tampa. Deste conjunto, apenas uma tampa possui decoração, concretamente uma cruz ocupando praticamente toda a peça e desenhada com recurso a duas linhas paralelas para o seu traço vertical e outras duas para o traço horizontal.

É com o século XVI que nos aparecem as poucas tampas epigrafadas indicando aqueles a quem se destinavam, distinguindo-se as tampas simples com epígrafe, podendo ter, ou não, moldura formada por linha simples e as tampas epigrafadas com moldura rebaixada. Este tipo de peças encontram-se, no caso de Vilar de Frades, apenas no interior da igreja, sendo de notar o facto de, pelo menos em três casos, o ano patente na inscrição se revestir de um carácter simbólico, mais do que um identificador do ano de enterramento de uma pessoa concreta33.

SEPULTURAS NO CLAUSTRO Com exceção dos poucos vestígios de cistas polilíticas medievais existentes na galeria norte do claustro, a grande maioria dos enterramentos que aqui conhecemos eram feitos diretamente na terra e, uma vez que a construção do claustro quinhentista levou a um grande aterro, sem necessidade de escavação na rocha. A utilização de caixões é mais frequente nos enterramentos identificados na galeria norte e poente, correspondendo aos enterramentos mais recentes, isto é, a partir de meados do século XIX, à semelhança do que acontece com o único indivíduo estudado na galeria este do claustro atual. O enterramento com recurso a simples mortalha seria, portanto, o mais frequente.

Tampa de sepultura de Diogo de Vilas Boas Caminha (2012, fotografia de Francisco Faure©).

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Não sabemos como se procedia à delimitação ou identificação destas sepulturas. Conforme já foi referido acima, o programa de reforma neoclássica previa a colocação de guias para suporte das tampas da sepultura, que seriam formadas por três elementos pétreos, como se pode constatar pelos 6 únicos exemplares finalizados, localizados na esquina nordeste do claustro. Não sabemos como seria feita a delimitação das sepulturas antes desta reforma, mas não obstante, as escavações realizadas nas galerias antigas permitiram chegar à conclusão de que os enterramentos no claustro eram, em geral, bem organizados. A disposição do lajeado do claustro deveria, portanto, prever a distribuição dos enterramentos.

Sepulturas de Época Moderna no claustro - Sondagem 41. (2001, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Francisco Faure).

Sepulturas do século XIX no claustro. (2012, fotografia de Francisco Faure©).

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SEPULTURAS EM CAMPA TÉRREA SEM ELEMENTOS DISTINTIVOS NO ADRO É no adro da igreja que podemos encontrar um último tipo de enterramentos, que designamos como campas térreas. Trata-se de sepulturas abertas na terra e que não possuem qualquer elemento que as identifique. Na grande maioria dos casos, estes enterramentos eram realizados sem caixão, sendo o corpo depositado diretamente na terra, envolto apenas num lençol ou, mais raramente, em hábito religioso. Durante os trabalhos arqueológicos apareceram, com alguma frequência, vestígios de pregos que não estarão, pelo menos na maioria dos casos, associados a urnas em madeira. Os registos paroquiais referem muito poucas vezes a existência de caixões e é o facto de referirem esta prática que nos leva a pensar que tal menção corresponderá mais a uma afirmação da raridade do que a um preciosismo ocasional do autor do assento.

Ao contrário da área do claustro, os enterramentos no adro têm, por vezes, uma disposição que parece ser caótica, na qual os corpos se podem sobrepor de forma relativamente desordenada. Este facto parece indicar a ausência de elementos identificadores das sepulturas à superfície.

Sepulturas no adro (2012, fotografia de Ricardo Erasun©).

70

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NOTAS 1 LAÇO, Teresa; BERNARDO, Rita – Convento de Vilar de Frades. Inter-

Vilar, 1998. Focando sobretudo os séculos XVI a XIX e FAURE, Francisco –

venção arqueológica. 1998. Relatório. Relatório de trabalhos arqueológicos

Casa de Deus e de Homens. Uma leitura arqueológica do Convento de S.

apresentado ao Instituto Português do Património Arquitectónico, 1999.

Salvador de Vilar de Frades. Porto: Universidade Fernando Pessoa, 2012.

2 LOPES, Lídia Maria dos Santos – Convento de Vilar de Frades (Barcelos).

Dissertação de Mestrado em Arqueologia (policopiado), do qual destacamos

Relatório. Intervenção Arqueológica 1999. Relatório de trabalhos arqueo-

a descrição das obras levadas a cabo durante a segunda metade do século

lógicos apresentado ao Instituto Português do Património Arquitectónico,

XV.

2000.

14 Página 23 de FONTES, Luís; MOREIRA, Alexandra; DUARTE, Anabela –

3 ERASUN CORTÉS, Ricardo; Faure, Francisco G. C. Líbano Monteiro – Re-

Trabalhos Arqueológicos no Mosteiro de Vilar de Frades (Barcelos). Cam-

latório de Escavações Arqueológicas. Convento de Vilar de Frades (Barce-

panha de Julho a Dezembro de 2002. Relatório de Trabalhos Arqueológicos

los). 2ª campanha de 1999. Relatório de trabalhos arqueológicos apresenta-

apresentado ao Instituto Português do Património Arquitectónico, 2003.

do ao Instituto Português do Património Arquitectónico, 2000.

15 Para uma análise pormenorizada do sistema de travejamento deste piso

FONTES, Luís; MOREIRA, Alexandra; DUARTE, Anabela – Trabalhos

veja-se PEREIRA, António – Wood and building construction in the Convent

Arqueológicos no Mosteiro de Vilar de Frades (Barcelos). Campanha de

of Vilar de Frades (Barcelos, Portugal): the beam system of the 16th century.

Julho a Dezembro de 2002. Relatório de Trabalhos Arqueológicos apresen-

Estudos do Quaternário. Braga. 16 (2017) 87-98.

tado ao Instituto Português do Património Arquitectónico, 2003.

16 Página 92 de FAURE, Francisco – Casa de Deus e de Homens. Uma

FONTES, Luís; MOREIRA, Alexandra; DUARTE, Anabela – Trabalhos Ar-

leitura arqueológica do Convento de S. Salvador de Vilar de Frades. Porto:

queológicos no Mosteiro de Vilar de Frades (Barcelos). Relatório Final.

Universidade Fernando Pessoa, 2012. Dissertação de Mestrado em Arqueo-

Relatório de trabalhos arqueológicos apresentado ao Instituto Português do

logia (policopiado).

Património Arquitectónico, 2007.

17 Toda a estética do arco da primeira capela lateral do lado do evangelho,

5 ERASUN CORTÉS, Ricardo – Convento de Vilar de Frades. Escavação

desde as colunas aos capitéis com figurações eróticas, apontam para que

Arqueológica e Acompanhamento Arqueológico de Obra. Relatório de tra-

esta capela ainda tenha respeitado o programa original (página 80 de FAU-

balhos arqueológicos apresentado ao IGESPAR, IP, 2010.

RE, Francisco – Casa de Deus e de Homens. Uma leitura arqueológica do

6 Página 91 de COSTA, P. Avelino de Jesus da – O Bispo D. Pedro e a Orga-

Convento de S. Salvador de Vilar de Frades. Porto: Universidade Fernando

nização da Arquidiocese de Braga. Vol. II. 2ª edição refundida e ampliada.

Pessoa, 2012. Dissertação de Mestrado em Arqueologia (policopiado).

Braga: Irmandade de S. Bento da Porta Aberta, 2000.

António Pereira e Maria do Carmo Ribeiro levantaram, recentemente, a hi-

7 BARROCA, Mário Jorge – Contribuição para o Estudo de Testemunhos

pótese de o projeto inicialmente previsto contemplar uma igreja de três

Pré-Românicos de Entre-Douro-e-Minho. 1. Ajimezes, Gelosias e Modilhões

naves (Páginas 140-141 de PEREIRA, António; RIBEIRO, Maria do Carmo

de Rolos. In Actas do Congresso Internacional do IX Centenário da Dedi-

Franco – A evolução construtiva da igreja do Convento de Vilar de Frades:

cação da Sé de Braga, vol. I – O bispo D. Pedro e o ambiente político-reli-

abordagem preliminar do corpo seiscentista. In PÓVOAS, R. F. e MATEUS, J.

gioso do século XI, Braga: Universidade Católica Portuguesa/Faculdade de

M – 2º Congresso Internacional de História da Construção Luso-Brasilei-

Teologia – Braga e Cabido Metropolitano e Primacial de Braga, 1990. pp.

ra. Culturas partilhadas. Vol. I. Porto: Centro de Estudos de Arquitectura e

101-145.

Urbanismo, Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, 2016. pp.

8 FONTES, Luís; PEREIRA, Belisa – Colecção de Epigrafia e Arquitectura

129-142), contrariando a tese de Joaquim Alves Vinhas de que estaríamos

Medievais (séculos IX a IV). Vol. I. Braga, Instituto de História e Arte Cristãs

perante uma igreja-salão (página 98 de VINHAS, Joaquim Alves – A Igreja e

– Museu Pio XII, 2009.

o Convento de Vilar de Frades. Das origens da congregação dos Cónegos

9 MPXII.LIT.597

Seculares de S. João Evangelista (Lóios) à extinção do convento. Barcelos:

10 MPXII.LIT.598

Junta de Freguesia de Areias de Vilar, 1998).

11 MPXII.LIT.599

18 Páginas 8-9 de FONTES, Luís; MOREIRA, Alexandra; DUARTE, Anabe-

12 Página 154 de ALMEIDA, Carlos Alberto Ferreira de – História da Arte

la – Trabalhos Arqueológicos no Mosteiro de Vilar de Frades (Barcelos).

em Portugal. Lisboa: Edições Alfa, 1986.

Campanha de Julho a Dezembro de 2002. Relatório de Trabalhos Arqueo-

13 Para uma melhor compreensão das obras levadas a cabo em Vilar de

lógicos apresentado ao Instituto Português do Património Arquitectónico,

Frades pelos Lóios, consultar:

2003.

MAURÍCIO, Rui – O mecenato de D. Diogo de Sousa Arcebispo de Braga

19 Página 378 de SANTA MARIA, Frei Francisco de – O Céu Aberto na Ter-

(1505-1532). Urbanismo e Arquitectura. Leiria: Magno Edições, 2000. Em

ra. História das sagradas congregações dos Cónegos Seculares de S. Jorge

especial a documentação publicada no volume II, sobretudo para o período

em Alga de Veneza e de S. João Evangelista em Portugal. Lisboa: Officina

do século XV e XVI;

de Manoel Lopes Ferreyra, 1697.

VINHAS, Joaquim Alves – A Igreja e o Convento de Vilar de Frades. Das

20 Páginas 115-116 de MATOS, Sebastião – Areias de Vilar e o seu Pa-

origens da congregação dos Cónegos Seculares de S. João Evangelista

trimónio. Areias de Vilar – Barcelos: Edição do Autor, 2001.

4

(Lóios) à extinção do convento. Barcelos: Junta de Freguesia de Areias de

CO N V E NTO DE V IL A R DE FR A DE S: PE R SPE TIVA S DE INTE RV E NÇÃO 1 9 9 4 -2 0 0 8

71


21 Para uma resenha do processo de edificação do cemitério de Areias de

28 Página 303 de BARROCA, Mário Jorge – Necrópoles e sepulturas me-

Vilar veja-se páginas 280-394 de MATOS, Sebastião – Areias de Vilar e o

dievais de Entre-Douro-E-Minho (Séc. V a XV). Porto: Faculdade de Letras

seu Património. Areias de Vilar – Barcelos: Edição do Autor, 2001.

da Universidade do Porto, 1987. Dissertação para Provas Públicas de Capa-

22 Página 146 de FAURE, Francisco - Casa de Deus e de Homens. Uma

cidade Científica e páginas 28-29 de DORDIO, Paulo – Projecto de estudo

leitura arqueológica do Convento de S. Salvador de Vilar de Frades.

histórico e arqueológico da Sé do Porto – o cemitério. Património – Estu-

Porto: Universidade Fernando Pessoa, 2012. Dissertação de Mestrado em

dos, 8 (2005) 26-34.

Arqueologia (policopiado).

29 Unidade Estratigráfica.

23 Página 149 de FAURE, Francisco - Casa de Deus e de Homens. Uma

30 Páginas 302-303 de BARROCA, Mário Jorge – Necrópoles e sepultu-

leitura arqueológica do Convento de S. Salvador de Vilar de Frades. Porto:

ras medievais de Entre-Douro-E-Minho (Séc. V a XV). Porto: Faculdade de

Universidade Fernando Pessoa, 2012. Dissertação de Mestrado em Arqueo-

Letras da Universidade do Porto, 1987. Dissertação para Provas Públicas de

logia (policopiado).

Capacidade Científica.

24 Página 150 de FAURE, Francisco - Casa de Deus e de Homens. Uma

31 Página 88 de ERASUN CORTÉS, Ricardo; Faure, Francisco G. C. Líbano

leitura arqueológica do Convento de S. Salvador de Vilar de Frades. Porto:

Monteiro – Relatório de Escavações Arqueológicas. Convento de Vilar de

Universidade Fernando Pessoa, 2012. Dissertação de Mestrado em Arqueo-

Frades (Barcelos). 2ª campanha de 1999. Relatório de trabalhos arqueo-

logia (policopiado).

lógicos apresentado ao Instituto Português do Património Arquitectónico,

25 LAÇO, Teresa; BERNARDO, Rita - Convento de Vilar de Frades. Inter-

2000.

venção arqueológica. 1998. Relatório. Relatório de trabalhos arqueológicos

32 ERASUN CORTÉS, Ricardo; FAURE, Francisco – Um conjunto de espo-

apresentado ao Instituto Português do Património Arquitectónico, 1999.

ras medievais provenientes do Convento de S. Salvador de Vilar de Frades

26 Ilustração B adaptada da página 45 de LAÇO, Teresa; BERNARDO, Rita

(Barcelos). Portvgalia. Porto. Nova Série, XXIX-XXX (2008-2009) 179-192.

- Convento de Vilar de Frades. Intervenção arqueológica. 1998. Relatório.

33 Páginas 115-128 de FAURE, Francisco – Casa de Deus e de Homens.

Relatório de trabalhos arqueológicos apresentado ao Instituto Português do

Uma leitura arqueológica do Convento de S. Salvador de Vilar de Frades.

Património Arquitectónico, 1999.

Porto: Universidade Fernando Pessoa, 2012. Dissertação de Mestrado em

27

Ver, sobre este tipo de sepulturas, páginas 299-306 e 323-335 de

Arqueologia (policopiado) e FAURE, Francisco – Datas em questão. Proble-

BARROCA, Mário Jorge – Necrópoles e sepulturas medievais de Entre-

mas de três epígrafes funerárias de Vilar de Frades. Portugalia. Porto. Nova

-Douro-E-Minho (Séc. V a XV). Porto: Faculdade de Letras da Universidade

Série, 39 (2018) 279-305.

do Porto, 1987. Dissertação para Provas Públicas de Capacidade Científica. A cronologia destas estruturas é bastante larga podendo, nalguns casos, atingir épocas tão tardias como o século XVI (página 29 de DORDIO, Paulo – Projecto de estudo histórico e arqueológico da Sé do Porto – o cemitério. Património – Estudos, 8 (2005) 26-34).

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Convento de S. Salvador de Vilar de Frades. Porto: Universidade Fernando Pes-

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da congregação dos Cónegos Seculares de S. João Evangelista (Lóios) à extinção do convento. Barcelos: Junta de Freguesia de Areias de Vilar, 1998.

FONTES, Luís; MOREIRA, Alexandra; DUARTE, Anabela – Trabalhos Arqueológicos no Mosteiro de Vilar de Frades (Barcelos). Campanha de Julho a Dezembro de 2002. Relatório de Trabalhos Arqueológicos apresentado ao Instituto Português do Património Arquitectónico, 2003.

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73


E FRADES


5 ARQUITETURA P ROJ ETO


Alfredo Ascensão AAPH, arquitectos, Lda. aaph.arq@gmail.com Alfredo Ascensão, Licenciado em Arquitetura pela Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto. Em 1996, conjuntamente com o arquiteto Paulo Henriques, funda o atelier AAPH, arquitectos, Lda. A sua prática profissional neste gabinete tem sido reconhecida através da atribuição de vários prémios individuais e coletivos dos quais se destacam o primeiro lugar no Concurso Internacional Europan 5 em 1998, com o projeto habitacional de Ponte de Anta em Espinho, o segundo lugar no Concurso de Ideias para o Centro Empresarial Sanjotec em São João da Madeira em 2009 e o Prémio João de Almada em 2010, atribuído pela Câmara Municipal do Porto à melhor recuperação de um imóvel no biénio 2008/2010, pela Reabilitação do Palácio das Artes, no Largo de São Domingos, na zona histórica da cidade. Em 2014, o projeto de Reabilitação do Convento de Vilar de Frades integrou a seleção das 10 obras finalistas do Prémio Internacional AR&PA, apresentado na cidade de Valladolid, Espanha.


Convento de Vilar de Frades: intervenção arquitetónica RELATÓRIO DIAGNÓSTICO

Em 1994, por solicitação do extinto Instituto Português do Pa-

trimónio Arquitectónico (IPPAR), iniciou-se a elaboração do “Relatório Diagnóstico” do Convento de Vilar de Frades, uma vez que eram reportados àquele Instituto frequentes pedidos de ajuda para a sua manutenção e relatos preocupantes da degradação do edifício. O

conjunto edificado, classificado como Monu-

mento Nacional em 1910, é composto pelo adro, a igreja, a ala conventual e um claustro incompleto.

O único acesso público ao mo-

numento faz-se a partir da Rua Central (EM 558), através do adro, uma vez que a restante área envolvente é propriedade privada da Ordem Hospitaleira de São João de Deus, a quem pertence o edifício confinante a sul, a Casa de Saúde de São José e a totalidade dos terrenos agrícolas da área envolvente.

A falta de investimento na con-

servação e manutenção nas últimas décadas e o “abandono” em que o edifício se encontrava configuravam uma situação insustentável, não se podendo adiar por muito mais tempo uma intervenção preventiva.

Vista geral do coro alto (2014, fotografia de Inês d’Orey©).

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Vista aérea do Convento de São Salvador de Vilar de Frades (2020, GoogleMaps©)

A

complexidade e dimensão dos problemas

detetados implicaram a constituição de uma equipa pluridisciplinar capaz de abranger todas as áreas de intervenção. Para além da necessidade urgente de se proceder a trabalhos de restauro do acervo artístico e do mobiliário, eram visíveis danos estruturais importantes e graves problemas de infiltrações no edifício, que ameaçavam a destruição parcial do imóvel.

Constatou-se ainda que o convento não possuía a maior parte das

infraestruturas necessárias para o seu normal funcionamento. O edifício tinha uma ligação precária de energia elétrica e não tinha redes de saneamento, drenagem de águas pluviais, proteção contra incêndios e telecomunicações.

O relatório diagnóstico, composto por um levantamento fotográfico e

por uma descrição dos principais problemas detetados, revelou-se um documento de trabalho essencial na definição de uma estratégia concertada para a reabilitação do imóvel e definição das prioridades da intervenção.

Apesar da degradação, o Convento de Vilar de Frades, sendo utili-

zado como Igreja da Paróquia de Areias de Vilar, nunca esteve verdadeiramente desocupado. Contrastando com o aparente “abandono”, o monumento albergava uma comunidade que utilizava regularmente a igreja para as suas cerimónias de culto e algumas das restantes áreas para outras atividades.

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Em 1994, a paróquia de Areias de Vilar possuía cerca de duzentas

crianças a receber formação de catequese, bem como um agrupamento de escuteiros, entre outras associações, que utilizavam regularmente o conjunto edificado.

Com a deterioração do imóvel, a comunidade foi-se adaptando às

condições existentes. A catequese era lecionada em vários locais da igreja e do claustro, a sala de rés-do-chão da torre sul era utilizada como capela mortuária, parte do segundo andar era ocupado pelo agrupamento de escuteiros e as restantes áreas, onde ainda era possível aceder, eram utilizadas para arrumações diversas.

O edifício albergava ainda a “habitação” permanente do Sr. Manuel

Pinheiro Ferreira, sacristão (1922-2012) e da sua esposa. A sua “casa”, que ocupava parte do primeiro andar da ala conventual, era constituída por duas salas localizadas junto ao corpo central da igreja e pela antiga cozinha, localizada na outra extremidade do primeiro andar do claustro. Não havia casa de banho.

O Senhor Manuel “sacristão”, como era conhecido, revelou-se funda-

mental em todo o processo de levantamento e inventariação das anomalias do edifício, pois possuía um conhecimento muito preciso do estado de degradação do imóvel e tinha testemunhado todas as intervenções e ações de reabilitação que a igreja tinha sofrido ao longo das últimas décadas. Foi ainda através do seu conhecimento que se pode aceder, por entre “escombros”, a algumas áreas aparentemente inacessíveis.

SITUAÇÃO DO EDIFÍCIO À ÉPOCA DA ELABORAÇÃO DO RELATÓRIO DIAGNÓSTICO

O estado de degradação do convento, do ponto de vista ar-

quitetónico, era à época bastante preocupante. Sem o apoio de outros estudos, que se vieram a desenvolver posteriormente, foram de imediato registadas várias anomalias graves, das quais se destacavam as humidades e os problemas estruturais.

A presença de humidades ascensionais verificava-se em todos

os pavimentos e paredes da igreja em contacto direto com o solo.

As coberturas permitiam uma entrada descontrolada de águas

pluviais no edifício, à exceção da cobertura da capela-mor, que tinha sido reconstruida no final dos anos 30 pela Direção-Geral dos Monumentos Nacionais (DGEM/DRMN). A situação era particularmente grave na cobertura lateral da ala norte, uma vez que o telhado e um contraforte tinham ruído parcialmente.

Como consequência da entrada de água no interior e da pre-

sença constante de áreas húmidas, as paredes da nave central e do transepto encontravam-se repletas de musgos e líquenes, apresentando uma tonalidade esverdeada 1.

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Vista geral da nave central da igreja (1994, AAPH arquitectos©, fotografia de Alfredo Ascensão).

Vista geral da fachada Norte (1994, AAPH arquitectos©, fotografia de Alfredo Ascensão).

Pormenor de pilar do aro toral da igreja (1994, AAPH arquitectos©, fotografia de Alfredo Ascensão).

Os azulejos, presentes na maioria das capelas laterais, bem como

todos os elementos de madeira, em particular a talha do período barroco, encontravam-se bastante degradados e em perigo de sofrerem danos irreversíveis.

Para além da situação anteriormente descrita no interior da igreja,

os líquenes e eras eram presença constante nas fachadas do edifício. A situação mais gravosa verificava-se no alçado norte, que já se encontrava parcialmente coberto por densa vegetação.

À exceção da capela-mor, foram identificados danos estruturais

em todas as paredes da igreja, bem como nas abóbadas neomanuelinas da nave central. A situação já era conhecida, uma vez que a partir dos anos 70 tinham sido colocados “selos” de gesso nas principais fissuras, com o fim de monitorizar a evolução da situação.

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À data da elaboração do Relatório Diagnóstico, a quase totalidade

destes “selos” encontravam-se fissurados, concluindo-se assim que a maioria das anomalias ainda estavam “ativas”.

Assumia particular relevância uma enorme fissura que percorria de

alto a baixo a segunda parede/contraforte da nave sul da igreja, bem como algumas das pedras das nervuras do teto da nave central, que apresentavam espaçamentos de alguns centímetros.

O plano da parede lateral da ala sul da igreja possuía um desapru-

mo significativo, particularmente visível no pilar esquerdo do arco toral, junto à capela-mor. Esta anomalia teve implicações diretas na estrutura de toda a igreja. A inclinação deste plano para o exterior “empurrou” literalmente a arcada da ala do claustro, cujos pilares apresentavam um desaprumo de 14 cm na sua verticalidade 2.

Muito provavelmente, como consequência dos problemas estrutu-

rais, o arco abatido do coro alto encontrava-se separado do apoio no lado esquerdo, colocando em risco a sua sustentabilidade.

A torre sineira tinha sofrido alterações significativas no seu inte-

rior. O acesso entre os vários pisos era assegurado por escadas improvisadas em madeira e uma escada em betão armado encastrada na parede norte. Esta escada não possuía guarda nem patamar de chegada, uma vez que o último degrau coincidia com o plano da parede do último piso.

O pavimento do último andar fora substituído por uma laje pré-es-

forçada, suportada por uma viga de betão armado de enormes dimensões, Parede/contraforte da nave central da igreja (1994, AAPH arquitectos©, fotografia de Alfredo Ascensão).

cujo peso agravou os danos estruturais visíveis nas paredes exteriores da fachada norte e poente da torre.

A ala conventual encontrava-se parcialmente abandonada, sendo

visíveis todos os problemas e patologias identificados no corpo da igreja.

O acesso aos pisos superiores era feito com grandes limitações,

uma vez que os pavimentos de soalho de madeira se encontravam bastante degradados e a escada de acesso ao último andar estava em ruína iminente.

As últimas celas, com paredes divisórias em taipa, localizadas no

topo sul da ala conventual, foram demolidas na sequência de uma derrocada ocorrida no pavimento. Como medida de precaução a Direção-Geral dos Monumentos e Edifícios Nacionais introduziu uma laje pré-esforçada do tipo “pateal” como forma de estabilização e travamento das paredes exteriores 3.

Antiga escada de acesso à torre sineira (1994, AAPH arquitectos©, fotografia de Alfredo Ascensão).

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OBRAS DE CARÁTER URGENTE

Em 1997, após a elaboração de um levantamento topográfico ri-

goroso e com base nas prioridades identificadas no relatório diagnóstico, foi iniciada a primeira fase da intervenção.

As coberturas foram integralmente reparadas. Na ala norte das

capelas laterais, onde se verificava a situação mais grave, foi colocada uma nova cobertura de acordo com o seu desenho original e nas restantes coberturas procedeu-se à reparação dos elementos estruturais de madeira e à substituição integral das telhas 4.

O reforço e reparação das estruturas foi uma ação fundamental

para a estabilização do imóvel. Foram efetuadas intervenções pontuais nas fachadas norte e sul do corpo da igreja, bem como a colocação de tirantes metálicos para tracionar a parede da ala norte do claustro e assim estabilizar o seu desaprumo.

A reparação das fissuras das paredes e das abóbadas da igreja

foi efetuada com recurso à introdução de resinas epoxi, aplicadas metodicamente em profundidade. O acabamento superficial foi executado com argamassas “pobres”, com incorporação de saibro, de forma a reproduzir as tonalidades cromáticas da cantaria.

Para solucionar em definitivo o problema das humidades ascen-

sionais, o pavimento da igreja e da sacristia foi integralmente removido e recolocado, com a introdução de um canal ventilado em todo o perímetro interior da igreja. As pedras originais destes pavimentos foram “mapeadas” e colocadas no mesmo local, depois de tratadas e retificadas 5.

Estes canais de ventilação forçada, colocados ao nível das funda-

ções das paredes periféricas do monumento, foram idealizados e desenvolvidos pelo Prof. Eng. Vasco de Freitas e revelaram-se uma solução altamente eficaz na estabilização das humidades ascensionais e na resolução definitiva do problema 6.

As argamassas de cimento que revestiam as capelas laterais foram

substituídas por novos rebocos, onde se privilegiou a incorporação de cal e saibro para se obter um revestimento mais “elástico” e com melhor comportamento mecânico.

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N -5

0

10

Planta do piso térreo (2020, AAPH arquitectos©).

PROJETO

E m

2004 foi concluído

o projeto de arquitetura com base num programa de reabilitação e numa ideia de funcionamento e ocupação do monumento. N -5

0

10

Planta do 1º andar (2020, AAPH arquitectos©).

O projeto, cujos trabalhos ainda

não foram concluídos, tem por base um 23

programa de utilização do imóvel onde

23

se preserva a sua condição de igreja paroquial e se criam condições para a sua abertura e fruição pública, prevendo a construção de um local de acolhimento e a definição de um percurso de visita, capaz de possibilitar a interpretação do monumento do ponto de vista histórico e arquitetónico.

Sem esquecer as necessidades

da paróquia, facto que sempre se considerou ser fundamental para a sua reabilitação, o projeto incluiu também o aproN -5

0

10

Planta da torre sineira e coberturas (2020, AAPH arquitectos©).

veitamento de alguns dos espaços até então indisponíveis, de forma a garantir a coexistência das duas valências.

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CENTRO DE ACOLHIMENTO - RECEÇÃO

Numa primeira fase, a receção de visitantes foi feita

no espaço de transição entre a igreja e a sacristia. Foi projetada uma pequena estrutura de madeira e vidro, com o objetivo de possibilitar a permanência de um rececionista e a colocação de material informativo e de divulgação do monumento.

Após a “libertação” do espaço até então ocupado

pela capela mortuária, o local definitivo para o acolhimento ao visitante foi projetado no piso de rés-do-chão da torre sul. Esta sala, de planta quadrangular, com um pé-direito bastante Receção provisória (2009, fotografia de Inês d’Orey©).

elevado, revelou ser o local ideal para o início do percurso de visita, uma vez que possui um acesso direto a partir do adro, através da antiga porta românica.

O espaço foi organizado com

a introdução de um balcão de atendimento e a colocação de algumas vitrinas expositivas. Tirando partido da exígua dimensão em planta, mas da generosa altura disponível, foi projetada uma área de arrumo elevada, materializada pela introdução de um volume em chapa de aço corten, assente sobre um vigamento metálico a 2,2 m do pavimento.

Receção / Centro de acolhimento a visitantes (2014, fotografia de Inês d’Orey©).

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TORRE SINEIRA

A intervenção na torre sineira consistiu na reformulação

do seu sistema de acessos e na requalificação do seu espaço interior.

A escada pré-existente em betão armado foi demolida e

em sua substituição foram introduzidas novas escadas, projetadas utilizando novos materiais, como ferro, aço inox e o aço corten, restabelecendo-se assim um acesso condigno e em segurança entre os vários pisos.

Os tetos do primeiro e segundo andar foram revestidos

a chapa de aço corten, ocultando-se assim os elementos de betão armado 7.

A estanquidade dos compartimentos dos pisos inferiores

foi assegurada pela introdução de vidros e caixilharias em aço inox e bronze e a colação de um alçapão para acesso ao último piso. Nova escada de acesso à torre sineira (2009, fotografia de Inês d’Orey©).

CLAUSTRO A ala nascente do claustro encontra-se “interrompida” por uma fachada pré-existente do convento, com cerca de 8,2 m de altura. Esta fachada poderá ter resistido à sua demolição por servir de limite da propriedade e muro de contensão de terras 8. Apesar de serem visíveis várias portas e janelas, algumas delas com ombreiras e padieiras em pedra ornamentada, nunca terá sido dada grande relevância a este elemento como parte integrante do conjunto arquitetónico. A totalidade dos vãos encontravam-se fechados com alvenarias de granito e no seu lado sul foram adossados vários anexos, onde se inclui o posto de transformação elétrica do hospital, com cerca 10 metros de altura.

Vista aérea do claustro (2013, FotoEngenho©, fotografia de Francisco Piqueiro).

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A coexistência do claustro e da antiga fachada

foi entendida como um fator a valorizar e integrar no circuito de visita, como peça arquitetónica do conjunto. Após a elaboração de levantamento rigoroso, procedeu-se à sua limpeza, estabilização estrutural e desentaipamento de alguns dos seus vãos, de forma a que esta parede readquirisse novamente o seu caráter de fachada. Vista geral do claustro – alçado nascente (2014, fotografia de Inês d’Orey©).

Para reforçar a importância da coexistência da-

quele elemento, o projeto prevê ainda a introdução de um passadiço metálico, com o traçado em falta do pavimento do claustro, possibilitando assim completar o seu percurso “original”. A concretização desta ideia será possível com a abertura de duas portas da antiga fachada, cuja localização permitem o atravessamento desta parede no local adequado.

A introdução do passadiço,

cuja obra ainda não foi concretizada, permitirá também ao visitante percecionar a envolvente sul do monumento e observar a área agrícola dentro da cerca, outrora propriedade do convento 9.

Esta “recriação” de elementos sobrepostos, cor-

respondentes a diferentes momentos construtivos, inVista geral das galerias do claustro (2014, fotografia de Inês d’Orey©).

cluirá a introdução de um painel/parede no local exato onde deveria ter sido construída a fachada da ala poente do claustro. Este painel, cujo desenho não pretende ter qualquer referência formal aos alçados do claustro, terá também uma função expositiva, uma vez que se prevê aí colocar algumas das peças encontradas nas escavações arqueológicas e que atualmente se encontram depositadas naquele espaço.

Claustro, ala nascente (2014, fotografia de Inês d’Orey©).

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Claustro, alas nascente e norte (2014, fotografia de Inês d’Orey©).

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N

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0

2

Planta do claustro (2020, AAPH arquitectos©).

CONVENTO DE VILAR DE FRADES

-1

0

2

Corte do claustro, alçado da ala nascente (2020, AAPH arquitectos©).

-1

0

2

Corte do claustro, alçado do painel da ala poente (2020, AAPH arquitectos©).

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INSTALAÇÕES SANITÁRIAS

Em 1994, o monumento não possuía instalações sanitárias para

visitantes. Sob o patamar das escadas de granito da ala conventual fora improvisado um pequeno “WC” para apoio ao serviço paroquial. O acesso, feito a partir da sacristia e sala do cartório, não facilitava o uso por outras pessoas, uma vez que teriam de atravessar essas áreas de uso restrito.

De forma a solucionar este problema, o projeto, para além de

incluir a requalificação desta instalação sanitária, criou novas instalações para apoio aos paroquianos e visitantes.

Foram projetados dois blocos sanitários, com acesso direto a

partir do claustro, sendo um deles preparado para receber pessoas com mobilidade condicionada.

Tratando-se de uma nova função, foram também utilizados no-

vos materiais construtivos, tais como o vidro pintado para o revestimento de paredes e estruturas de ferro revestidas a placas cimentícias para as paredes divisórias, soluções pouco “intrusivas”, que não implicaram demolições ou alterações estruturais para a sua concretização.

Antiga instalação sanitária (1994, AAPH arquitectos©, fotografia de Alfredo Ascensão).

Instalação Sanitária após a obra de reabilitação (2009, fotografia de Inês d’Orey©).

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SALA DE EXPOSIÇÃO PERMANENTE

A sala localizada no topo sul do piso térreo da ala conventual foi

inicialmente projetada para exposições temporárias. Pretendia-se aí instalar um programa expositivo, com o espólio artístico e documental existente no monumento.

O projeto viria a ser totalmente refor-

mulado após a descoberta dos antigos azulejos que revestiam a capela-mor. Com efeito, na impossibilidade de recolocar o conjunto de azulejos no seu lugar original, uma vez que as paredes se encontram agora preenchidas com o cadeiral, foram projetadas duas estruturas de ferro, revestidas a painéis cimentícios, para expor os referidos azulejos. As duas estruturas foram colocadas à mesma cota e com o mesmo afastamento que os painéis de azulejos tinham quando se encontravam nas paredes laterais da capela-mor, permitindo assim ao visitante ter uma perceção aproximada da situação original. Vista da sala de exposições permanente, antes da intervenção (2006, fotografia de Modesto Muñoz Ruiz©).

Vista da sala de exposições permanente, após a intervenção (2009, fotografia de Inês d’Orey©).

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SALAS LATERAIS

Sobre cada uma das capelas laterais da ala

norte e sul da igreja existe um conjunto de salas, comunicantes entre si através de pequenas portas “recortadas” nos contrafortes da igreja.

As salas da ala norte, acessíveis através do

coro alto e do primeiro andar da torre sineira, encontravam-se sem cobertura e repletas de escombros. As salas da ala sul não tinham uso, uma vez o seu acesso fora “cortado” pela introdução de uma nova escada em posição perpendicular ao corpo da igreja, à qual se acedia a partir da galeria do claustro.

Na reabilitação do monumento pretendia-se

reutilizar estes compartimentos para o uso da paróquia, nomeadamente na criação das salas de catequese. Para concretizar esta ideia foi projetada uma nova escada, no local primitivo anterior à construção do claustro, executada com uma estrutura metálica e degraus em madeira de forma a não sobrecarregar as abóbadas das capelas laterais.

Sala de catequese, ala norte (2009, fotografia de Inês d’Orey©).

MOBILIÁRIO E ILUMINAÇÃO

O projeto incluiu o um conjunto de peças de

mobiliário e de iluminação específicas para determinados locais. Destaca-se a introdução de um novo altar e ambão para a igreja, cujo desenho “minimalista” teve como objetivo não interferir na perceção espacial da nave.

Atendendo à dificuldade de introduzir novos

elementos de iluminação nas capelas laterais, com abóbadas nervuradas e paredes revestidas a azulejo e talha dourada, foram desenhados candeeiros de pé para assegurar a iluminação destes compartimentos sem qualquer interferência com as pré-existências.

O mobiliário para as salas de reunião e de ca-

tequese foram objeto de um projeto específico, de forCabide da sala de catequese, pormenor de mobiliário (2009, fotografia de Inês d’Orey©).

90

ma a garantir unidade e escala adequada a cada compartimento.

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FUTURAS INTERVENÇÕES

SALA DE EXPOSIÇÕES TEMPORÁRIAS

A antiga cozinha, localizada no primeiro andar da ala

do claustro, será reabilitada para ser um espaço polivalente onde se possam efetuar exposições temporárias e outras atividades de carácter esporádico.

Vista geral da sala de exposições temporárias (2006, fotografia de Inês d’Orey©).

Pormenor da lareira da sala de exposições temporárias (2006, fotografia de Inês d’Orey©).

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CAPELA DO NOVICIADO E CELAS CONVENTUAIS

A reabilitação da capela do noviciado e das celas con-

ventuais, a que corresponde a quase totalidade do último piso da ala conventual, será essencialmente um trabalho de restauro das estruturas existentes, assumindo-se o topo desta ala como espaço amplo. Pretende-se, no entanto, manter a memória do convento pela manutenção da sua estrutura e reabilitação do existente. Com efeito, apesar de despidas de mobiliário, ainda é possível imaginar a ocupação e a “atmosfera” daqueles compartimentos, testemunhando as inúmeras inscrições pintadas nas cantarias dos vãos e gravadas nas portadas interiores de madeira, com o nome e a data em que os monges “tomaram a parca” 10. Por esta razão, a reabilitação deste piso terá um carácter mais “museológico” do que as restantes intervenções, considerando-se a sua inclusão no circuito de visita como fundamental para uma melhor compreensão histórica do convento e da sua ocupação monástica.

Vista geral da capela do noviciado (2006, fotografia de Inês d’Orey©).

Teto da capela do noviciado (2006, fotografia de Inês d’Orey©).

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ADROS

O projeto prevê a reformulação completa do adro para

que este readquira a sua função de espaço de transição entre a via pública e o monumento. A concretização desta obra será feita pela sua requalificação, propondo-se para tal a substituição integral dos pavimentos e canteiros pré-existentes e a interdição do espaço ao acesso automóvel.

O novo pavimento será executado em saibro compac-

tado, delimitado por guias de granito, com uma métrica paralela à fachada da igreja. O “ritmo” do percurso entre a porta de entrada e o edifício será marcado pela introdução de bancos, árvores e armaduras de iluminação, de forma enfatizar a perspetiva do monumento.

Vista geral do adro (2006, fotografia de Inês d’Orey©).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesar da existência de um projeto global,

temos hoje a noção que a intervenção arquitetónica no Convento de Vilar de Frades é a soma de “pequenas” intervenções, que se foram adaptando e alterando com o conhecimento do edifício e da discussão de novas ideias e programas de ocupação. O prolongamento temporal da intervenção, bem como a falta de recursos para avançar com uma intervenção global, teve a vantagem de possibilitar a reflexão e a procura constante de soluções alternativas, bem como a experimentação de novas soluções construtivas. Na ausência de informação sobre a configuração original de alguns dos espaços reabilitados, ou quando houve necessidade de introduzir uma nova valência programática, o projeto privilegiou a utilização de uma linguagem contemporânea, com soluções de fácil reversão, evitando falsos “mimetismos” ou interpretações erráticas da época da intervenção. A s obras e as alterações agora introduzidas são entendidas como a continuidade natural da evolução histórica e arquitetónica do monumento, uma vez que se podem identificar diversas intervenções e formas construtivas desde o pré-românico ao século XX.

Ficha Técnica Coordenação da intervenção Instituto Português do Património Cultural (IPPC) Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR) Direção Regional de Cultura do Norte / Direção de Serviços dos Bens Culturais (DRCN/DSBC) Coordenação geral : Isabel Sereno, arquiteta Levantamento e Diagnóstico ao Estado de Conservação Alfredo Ascensão, arquiteto Projeto Geral Projeto de Arquitetura Alfredo Ascensão & Paulo Henriques, arquitectos Lda. Projeto de Fundações e Estruturas Mateus Gomes, engenheiro Projeto de Redes de Águas e Esgotos Technikós Projetos de Engenharia Lda. Projeto de Eletricidade, Segurança e Incêndio Alves de Sousa Engenheiro Eletrotécnico Projeto de Tratamento de Pavimentos e Paredes Face à Humidade Prof. Eng. Vasco de Freitas Levantamento Desenhado T.A.M. Lda.

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NOTAS

6

1

Na sequência desta intervenção foi publicado um artigo na Revista Estudos/

As paredes laterais da ala central da igreja terão sido rebocadas no período

Património com toda a informação técnica sobre o sistema: FREITAS, Vasco

barroco. Com a intervenção dos anos 30/40, o reboco foi retirado bem como

Peixoto de [et al.] – Tratamento da humidade ascensional na Igreja de Vilar de

algumas janelas da nave central, cujos vestígios ainda se podem encontrar no

Frades. Estudos/Património. Lisboa. 3 (2002) 54-62.

claustro. Por essa razão, grande parte da superfície da alvenaria de granito das

7

paredes encontra-se picada, contribuindo assim para a retenção das humidades e

integral da laje de betão introduzida na torre poderia agora agravar o problema

na proliferação dos musgos e algas.

estrutural, uma vez que as paredes exteriores se encontravam “atirantadas” por

2

aquele elemento.

Desaprumo verificado “in loco”, medido da cota do pavimento térreo à cota

De acordo com os cálculos efetuados pelo Eng. Mateus Gomes, a demolição

do pavimento do primeiro andar da ala norte do claustro. Em estudo posterior,

8

baseado em sondagens geológicas, verificou-se que os graves problemas

pavimento do claustro.

estruturais poderiam ter sido provocados por assentamentos seculares causados

9

por solos de composição diferenciada entre as fachadas norte e sul.

Ordem dos Lóios, proprietária dos terrenos confinantes, que no decorrer do

3

Laje pré-esforçada executada com vigotas pré-fabricadas e alvenarias de tijolo

processo mostrou a sua disponibilidade e abertura para a implementação da ideia.

encobertas por argamassa, muito utilizada nos anos 70 do século XX pela sua

De resto, atualmente, parte das construções precárias adoçadas a esta fachada

pouca espessura e o seu baixo custo.

já foram demolidas, restando unicamente o posto de transformação elétrica cuja

4

deslocação está prevista pela sua integração na estrutura do próprio passadiço.

Na reparação das coberturas foi fundamental a colaboração e aconselhamento

A cota natural do terreno a sul encontra-se cerca de 1,6 m abaixo da cota do

A concretização futura deste percurso será possível graças à anuência da

do Professor Engenheiro Vasco de Freitas na definição da metodologia e materiais

10 Parte das portadas com inscrições e desenhos foram retiradas do local para

a utilizar.

serem objeto de trabalhos de restauro. Após a reabilitação deste piso, será feita a

5

sua exibição no local como parte do espólio a visitar no âmbito do circuito de visita.

Na tentativa de “estancar” este problema, o pavimento da igreja, composto

por um lajeado quadriculado de granito, fora intervencionado pela picagem e refundamento das juntas para possibilitar a colocação de uma argamassa à base de cimento. Esta intervenção, não só não resolveu o problema como o terá agravado pela retenção prolongada de humidade e pela degradação da argamassa introduzida.

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6 AZULEJARI A ESTUDO S


Alexandre Nobre Pais Museu Nacional do Azulejo – Direção-Geral do Património Cultural apais@mnazulejo.dgpc.pt Alexandre Nobre Pais é doutorado em Arte Decorativas pela Universidade Católica Portuguesa (2012), com o tema da produção de faiança portuguesa entre o final do século XVI e meados do século XVIII. A sua experiência profissional tem estado maioritariamente ligada ao Museu Nacional do Azulejo (21 anos), ao Instituto José de Figueiredo (5 anos) e ao Palácio Nacional da Pena, em Sintra (7 anos). Tem também alguma experiência na área do ensino, tendo lecionado na Escola das Artes, da Universidade Católica Portuguesa, na Escola Superior de Artes Decorativas da Fundação Ricardo do Espírito Santo e na Escola Profissional de Recuperação do Património, Sintra. Possui diversos trabalhos publicados nas suas áreas de estudo: azulejos, cerâmica e escultura em terracota, nomeadamente presépios.


O revestimento azulejar da capela-mor de Vilar de Frades1

O Convento de Vilar de Frades foi a casa-mãe da Congregação dos Cónegos Seculares de São João Evangelista ou Congregação dos Lóios, a partir de 1425. Esta fundação portuguesa, concedida cerca de 1420, recebeu aprovação pontifícia em 1427 sob a denominação de Cónegos de São Salvador de Vilar de Frades e diretrizes para “viverem segundo o uso e costume dos Cónegos de S. Jorge em Alga 2, de Veneza” 3. A alteração para Cónegos Seculares – por não fazerem votos perpétuos - de São João Evangelista ocorreu a pedido de D. Isabel, esposa de D. Afonso V (reinou entre 1438-1481), de quem D. João Roiz, 2º Geral da Ordem, foi confessor.

A igreja do convento tem uma planta em cruz latina, com transepto reduzido e a cabeceira orientada para nascente, esta ampliada em 1697. Deverá ter sido na sequência dessa campanha de obras que se terá optado pelo azulejamento deste espaço, pois para os anos de 1706-1707 há a menção a «huma partida de azoleijo»4 feita a um oficial de azulejaria, Dionísio António. O conjunto, pintado a azul de cobalto sob vidrado estanífero, valeu de João Miguel dos Santos Simões a afirmação de se tratar de “um tipo de fabricação bastante curiosa, provavelmente do norte dos inícios do século XVIII ilustram um tipo que se pode considerar de bastante raro”5. Trata-se, de facto, de um projecto iconográfico complexo e que visava ilustrar a génese da Ordem, enunciando os seus representantes mais importantes. Curiosamente, durante o mandato do reitor Francisco de Santa Maria, entre 1752-1754, foi mandado “transferir o azulejo da capela-mor para a capela colateral do lado do Evangelho, a do Santíssimo Sacramento, e para as outras capelas laterais “para assim melhor as ornarem” 6. O conjunto ficou, assim, truncado e profundamente alterado na sua lógica e concepção, até à recente campanha de obras levada a cabo pela Direção Regional de Cultura do Norte, sob a coordenação da Dr.ª Adriana Amaral e da Arq.ª Isabel Sereno.

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Com a remoção dos azulejos das capelas onde haviam sido colocados em meados do século XVIII e a definição do seu posicionamento relativo, através do código alfanumérico que se encontra no seu tardoz, foi possível reunir de novo o programa iconográfico deste notável revestimento . Os painéis correspondem a uma estrutura característica da azulejaria portuguesa do primeiro quartel do século XVIII. A sua concepção, semelhante a uma tapeçaria, dispõe-nos em dois registos, estando as diversas cenas e as margens da composição enquadradas por uma barra de volumosas folhas de acanto. No registo inferior, numa larga composição, surgem eremitas numa densa paisagem florestal, pontuada por grutas e cabanas. Esta composição só é hoje visível no conjunto que se situava no lado da Epístola (direita do observador), pois no painel que lhe estava em face poucos azulejos foram encontrados, concentrando-se estes ao nível das barras. Pormenor do registo inferior, com eremitas, colocado no lado da Epístola (direita do observador), outrora na capela-mor da igreja (2020, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d’Orey).

No registo superior, dividido em quatro composições, também o revestimento que se situava do lado do Evangelho (esquerda do observador) se encontra mais completo, faltando em ambos a maioria das peças que formavam o painel colocado no extremo do conjunto e a partir do qual deveria ser feita a sua leitura iconográfica. Dos seis quadros remanescentes, três para cada lado da capela-mor, é percetível a organização que presidiu à sua encomenda. As cenas foram pensadas como se de retratos se tratassem, estando nelas representadas seis figuras identificadas através de uma legenda narrativa colocada num dos lados inferiores da composição. A sua leitura permite compreender a estruturação subjacente, assinalando que no lado do Evangelho estão personalidades estrangeiras, nomeadamente italianos, relacionadas com a fundação da Ordem, e no lado da Epístola surgem figuras importantes para a afirma-

Conjunto azulejar outrora colocado no lado da Epístola (direita do observador), outrora na Capela-mor da Igreja (2020, fotografia de Inês d´Orey ©).

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ção dos Lóios em Portugal.


Conjunto azulejar outrora colocado no lado do Evangelho (esquerda do observador), outrora na capela-mor da igreja (2020, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d’Orey).

A escolha das personalidades colocadas no lado do Evangelho e que remete para a afirmação da Ordem fora do território nacional é, aparentemente, desconcertante. Aí surgem, a partir do início narrativo: D. Antonio Corario 7, o Papa Gregório XII 8 e São Lourenço Justiniano 9. Se este último não será surpreendente, pois constituí uma das primeiras figuras associadas à Congregação a ser canonizada, em 1690, pelo Papa Alexandre VIII, a presença dos restantes é menos clara. O Papa Gregório XII, cujo nome secular foi Angelo Corer ou Corario, teve um pontificado que durou oito anos (1406-1415) e que decorreu em pleno Cisma com Avinhão. O Concílio de Pisa (março-junho de 1409) determinou a deposição de ambos os Papas, Gregório XII de Roma e Bento XIII de Avinhão, tendo o primeiro abdicado em definitivo em 1415, acabando por falecer em 1417. A presença deste Papa, neste programa iconográfico, deve-se, conforme anuncia a própria legenda, a ter sido um dos fundadores da Congregação de São Jorge em Alga, em Veneza, cuja regra serviu de modelo para os Lóios. Foi nessa mesma Congregação que ingressou o Cardeal António Corario (1369-1443), aristocrata veneziano, parente de Gregório XII.

Papa Gregório XII, pormenor do registo superior do lado do Evangelho (esquerda do observador), outrora na capela-mor da igreja (2020, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d’Orey).

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Por sua vez, São Lourenço Justiniano (1380-1456), figura emblemática do Convento de Vilar de Frades - uma sua imagem encontra-se num nicho sob a portada de acesso ao adro - sendo diácono, ingressou em 1404 no Mosteiro de São Jorge em Alga, em Veneza, contribuindo pelo seu esforço reformador para o seu reconhecimento como uma Companhia de Cónegos Seculares. Em 1409 foi eleito superior da comunidade e, em 1451, foi consagrado primeiro patriarca de Veneza pelo Papa Nicolau V. Assim, o que parece ser o denominador entre estas figuras é a sua passagem pelo Mosteiro de São Jorge em Alga, em Veneza, cujos “usos e costumes” serviram de modelo para os Cónegos Lóios portugueses. Torna-se, portanto, percetível que subjacente à encomenda não se encontrava unicamente uma intenção narrativa de carácter histórico, que justificaria a presença dos Papas que reconheceram e concederam privilégios à Ordem, mas uma vontade de acentuar o carácter excepcional da casa veneziana, que abrigou Santos, Papas e Cardeais. Nesta perspectiva, é provável que a figura que se encontrava no painel em falta fosse Eugénio IV (Papa entre 1431 e 1447). Muitas vezes associado ao importante apoio concedido a Vilar de Frades, a provável presença desta figura, em detrimento de Martinho V (Papa entre 1417 e 1431) que concedeu aprovação pontifícia à Ordem portuguesa, prendia-se com o facto de Gabriele Condulmer (1383-1447, que assumiu o nome de Eugénio IV), ter sido, juntamente com Lourenço Justiniano e António e Angelo Corário, das figuras mais importantes de entre os Cónegos de São Jorge em Alga no início do século XV. A acreditarmos na sua presença no conjunto de personalidades representadas nestes azulejos, seria acentuada a relação directa entre os Lóios e os Cónegos da Ordem veneziana.

Pormenor de estrutura arquitetónica no painel incompleto no registo superior do lado da Epístola (direita do observador), outrora na capela-mor da igreja (2020, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d’Orey).

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Paralelo a este conjunto, no lado da Epístola, as figuras selecionadas, a partir do altar-mor e porque a primeira personagem desapareceu, são: o padre António da Conceição 10, o padre Afonso Nogueira 11 e o padre João Roiz 12. A primeira figura, hoje em falta, poderia ser, aparentemente, o Mestre João Vicente, que junPadre Afonso Nogueira, pormenor do registo superior do lado da Epístola (direita do observador), outrora na capela-mor da igreja (2020, Direção Regioal de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d’Orey).

tamente com Martim Lourenço e Afonso Nogueira foram os fundadores da Ordem em Portugal. Desse painel, muito incompleto, subsiste ainda uma parte onde se pode observar a estrutura arquitectónica de uma igreja com torre, que poderia simbolizar, de forma esquemática, a fachada do próprio Convento de Vilar de Frades, a casa-mãe dos Lóios 13. Se a escolha do padre António da Conceição não parece muito evidente, tendo em conta a ação desempenhada por outros Cónegos ao longo da História do convento, já a presença dos padres Afonso Nogueira e João Roiz parece clara. Ao primeiro ficaram os Lóios a dever o hábito que os caracterizava 14 e que, de acordo com a legenda, fora concedido por intercessão da Virgem; ao segundo ficou a dever-se a proteção régia de D. Afonso V, um dos reis portugueses que, com diversos privilégios e isenções, trouxe dos maiores beneficios à Ordem, e a Vilar de Frades em particular. Conhecendo a lógica das figuras, a sua presença no local torna-se mais clara. Assim, no lado do Evangelho, espaço onde decorre o ponto alto da liturgia da Palavra, situam-se aqueles que ajudaram a criar a Regra de São Jorge em Alga, a qual era seguida pelos Cónegos Lóios 15; do lado da Epístola, espaço onde se liam versículos das passagens dos Apóstolos, encontravam-se

A conjugação do remanescente dos extensos painéis azulejares recriando o programa que outrora preenchia as paredes da capela-mor da igreja (2020, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d’Orey).

as personalidades dos portugueses que deram à Ordem a sua feição nacional.

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O que permanece surpreendente na encomenda destes painéis é a ênfase dada à relação existente entre os Lóios e a Ordem de São Jorge em Alga, suprimida pelo Papa Clemente IX, a pedido da república veneziana, em 1668. Ainda que a Regra permanecesse a mesma, é o reiterar desta filiação que parece excessivo numa encomenda realizada pouco mais de trinta anos após esta ocorrência. Por outro lado, também o tempo que o conjunto permanece no espaço a que se destinava é curto, para a dimensão financeira e iconológica da sua produção. Um programa tão complexo e que implicou um grande investimento no revestir de um espaço de dimensão razoável não deveria ter estado colocado durante um período tão curto de tempo, cerca de quarenta e cinco anos. A razão poderia prender-se com uma nova orientação estética do espaço ou com o facto da ingenuidade marcante da pintura dos azulejos poder ser pouco apetecível para os religiosos. Outro factor poderia ser o crescente aumento de títulos eclesiásticos que D. João V (reinou entre 1706-1750) adquiriu, como o de Patriarca para o capelão da Capela Real (1716), cargo mais tarde assumido pelo arcebispo residencial de Lisboa (1740) 16. Teria esta mercê, cujo único rival era o Patriarca de Veneza, título que pertencera a duas das figuras representadas nos azulejos – Lourenço Justiniano e Angelo Corario, futuro Gregório XII – algo a ver com a decisão de apear os painéis? Relativamente à qualidade pictórica, o conjunto sobressai mais pela monumentalidade do discurso do que pelo virtuosismo do seu autor. A ingenuidade do desenho parecia apontar para um artista local ou da zona do Porto ou Coimbra, como referira Santos Simões, de acordo com o que se conhecia então 17. No entanto, do que hoje se sabe da azulejaria do inicio do século XVIII, nomeadamente a partir das dissertações de doutoramento de Rosário Salema de Carvalho, para a produção de Lisboa, e de Diana Gonçalves dos Santos, para aquela que foi produzida em Coimbra, parece evidente que o revestimento da capela-mor da igreja de Vilar de Frades não terá tido origem nas oficinas desta última região, como inicialmente se acreditava, mas ser fruto de um autor ignorado, ativo em Lisboa no final do século XVII e inicio do século XVIII. Eventualmente, poderia ser este o já mencionado oficial de azulejaria Dionísio António, referenciado entre 17061707 como tendo para aqui enviado «huma partida de azoleijo». Ao pintor destes painéis do Convento de São Salvador de Vilar de Frades devem-se ainda, entre outros, os revestimentos da sala do Consistório da Irmandade da Ordem Terceira do Convento de São Francisco em Évora e a capela do Palácio dos Arciprestes em Linda-a-Velha, encontrando-se em ambos a mesma figura de eremita que integra o revestimento presente em Vilar de Frades. Dele, Rosário Salema de Carvalho aponta ainda a autoria dos painéis de azulejos das capelas colaterais da Igreja da Misericórdia da Vidigueira. A complexidade do tema, por envolver retratos, deverá ter forçado o pintor a recorrer a fontes diversas que lhe permitissem caracterizar as personagens, pelo que a sua identificação se torna muito difícil. No caso do Papa 18 e de São Lourenço Justiniano a iconografia das figuras poderia ser mais simples, mas as restantes apresentam alguma inconsistência no modo de trajar, com o Cardeal António Corario e o Padre Afonso Nogueira 19 com hábitos que poderiam ser interpretados como sendo os da Ordem.

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Padre António da Conceição, pormenor do registo superior do lado da Epístola (direita do observador), outrora na Capela-mor da Igreja (2020, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d’Orey).

Padre João Roiz, pormenor do registo superior do lado da Epístola (direita do observador), outrora na Capela-mor da Igreja (2020, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d’Orey).

No caso deste último é possível que a imagem, na base da figura nos azulejos, possa ter sido a a gravura com representação do hábito do "Chanoine Régulier et Hospitalier de l'Ordre du St. Esprit en France, en habit de Choeur", que ilustra a obra de 1714 de Pierre Helyot, "Histoire des Ordres Monastiques...". Os restantes padres, António da Conceição e João Roiz 20, surgem com indumentárias diversas que poderão acusar a origem das imagens, parecendo este Pormenor da representação do padre Afonso Nogueira e possível modelo retirado da gravura “Chanoine Régulier et Hospitalier de l’Ordre du St. Esprit en France, en habit de Choeur”, imagem 49, página 195, Tomo II, da obra “Histoire des Ordres Monastiques” de Pierre Helyot, de 1714 (2020, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d’Orey | ilustração a partir de).

ter sido inspirado noutra imagem da mesma obra de Pierre Helyot, aquela que ilustra o hábito do “Ancien Chanoine Régulier de la Cathedrale d’Usen”. Relativamente aos quatro eremitas que se conseguiram ainda encontrar e que integravam o registo inferior, dois são baseados na obra “Sylva anachoretica Aegypti et Palaestinae”, com gravuras de Abraham Bloemaert e publicada em Antuérpia em 1619. Destas, uma das imagens é a que acompanha a página de rosto da publicação e a outra terá tido como base a folha 21 da mesma publicação, representando “S. Ammon Nitriota”. Um terceiro eremita terá tido como possível inspiração a gravura 30 de uma outra obra, de 1585-1586 e representando Santo Helenum, intitulada “Solitudo sive vitae patrum eremicolarum”, com gravuras de Johann Sadeler I a partir de desenhos de Maarten de Vos.

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Conjunto complexo e cuja história permanece ainda pouco consistente, o revestimento que outrora ornamentou a capela-mor da igreja de Vilar de Frades Pormenor da representação do padre João Roiz e possível modelo retirado da gravura “Ancien Chanoine Régulier de la Cathedrale d’Usen”, imagem 114, página 398, figura II, Tomo II, da obra “Histoire des Ordres Monastiques...” de Pierre Helyot, de 1714 (2020, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d’Orey | ilustração a partir de).

encontra-se de novo reunido, dentro do que subsistiu da ação humana, compondo um todo mais ou menos coerente. Com base nele, podemos repensar melhor o discurso iconológico que os Cónegos azuis procuraram estabelecer quando encomendaram para o espaço principal da sua igreja um vasto conjunto azulejar, uma galeria de retratos, cuja paleta empregue acentuava, talvez de forma não casual, a cor do seu hábito.

Pormenor de representação de eremita e possível modelo retirado da gravura “S. Ammon Nitriota”, folha 21, da obra “Sylva anachoretica Aegypti et Palaestinae” de Abraham Bloemaert, de 1619 (2020, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d’Orey| ilustração a partir de).

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Pormenor de representação de eremita e possível modelo retirado da página de rosto da obra “Sylva anachoretica Aegypti et Palaestinae” de Abraham Bloemaert, de 1619 (2020, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d’Orey| ilustração a partir de).

Pormenor de representação de eremita e possível modelo retirado da gravura 30, representando Santo Helenum, da obra de 1585-1586 intitulada “Solitudo sive vitae patrum eremicolarum”, com gravuras de Johann Sadeler I a partir de desenhos de Maarten de Vos (2020, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d’Orey| ilustração a partir de).

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108

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NOTAS

11 O * P * AFONSO * NOGEIRA * HUM * DOS * N PROS * FUNDADORES * O

1

O presente texto foi originalmente redigido em 2010 no âmbito das obras

QUAL * FOI A ROMA E ALCANÇOU O HABITO DE QUE * HOJE * UZAMOS

de requalificação do Convento de Vilar de Frades de que resultou a reunião do

* DIVINALMENTE * DADO * PELA * VIRGEM * MA * S * NOSA * E NOSAS *

revestimento azulejar da primitiva capela-mor, entretanto disperso por várias

CONSTITUISOIS * BPº * DE COIMBRA E ARSEBPº * DE LISBOA

capelas, trabalho que permitiu conhecer o que resta do programa iconográfico

12 O * P * IOÃO * ROIZ * 2º GERAL DESTA * CONGREGAÇÃO * QUE * NÃO

original presente neste local. Respeitando o contexto em que foi redigido, nesta

* ASEITOU * O BPDO * DE COINBRA * POR SUA * MTA HUMILDADE * SENDO

publicação optou-se por manter o texto original, admitindo apenas pontuais

* PROMOVIDO * NELE * POR EL REI * D * AFONSO * 5 * DE QUEM HERA *

atualizações.

CONFESOR * EDA RAINHA D * IZABEL * SUA * MOLNER *

2

San Giorgio in Alga é uma ilha localizada junto a Veneza. No final do século XIV

13 É de realçar que em todos os painéis é naqueles que reportam a fundadores

foi aí fundada a Ordem dos Cónegos Regulares de São Jorge em Alga que tiveram

que surgem estruturas arquitetónicas em segundo plano (Gregório XII e o Cardeal

um papel fundamental no movimento reformista religioso das primeiras décadas

António Corario). Ainda que a legenda de São Lourenço Justiniano o refira como

do século XV, envolvendo-se na corrente espiritual da «devotio moderna», tendo

fundador ele foi, de facto, um reformador. Nos restantes, o enquadramento

sido suprimidos em 1668.

arquitetónico assume uma dimensão teatralizada, abrindo para o exterior, onde se

3

observam paisagens.

Página 150 de TAVARES, Pedro Vilas Boas – Lóios - In AZEVEDO, Carlos

Moreira (direção) - Dicionário de História Religiosa de Portugal, J-P. Mem

14 Os Lóios eram também conhecidos por Cónegos azuis, devido à cor do seu

Martins: Círculo de leitores, 2001.

hábito, também ela associada ao manto da Virgem Maria. Esta era, igualmente, a

4

Página 216 de VINHAS, Joaquim Alves - A Igreja e o Convento de Vilar de

Frades Barcelos: Junta de Freguesia de Areias de Vilar - Barcelos, 1998. 5

Página 95 de SIMÕES, João Miguel dos Santos - Azulejaria em Portugal no

15 O sucesso da congregação em Portugal, no que diz respeito à prossecução dos objetivos que se propunha atingir, levou o Papa Pio V (1566-1572) a enviar frades Lóios para disciplinarem os Cónegos de São Jorge em Alga.

século XVIII. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1979. 6

cor do hábito dos Cónegos de São Jorge em Alga.

Página 231 de VINHAS, Joaquim Alves - A Igreja e o Convento de Vilar de

16 Página 394 de BARBOSA, David Sampaio Dias – Patriarcado. In AZEVEDO,

Frades Barcelos: Junta de Freguesia de Areias de Vilar - Barcelos, 1998.

Carlos Moreira (direção) - Dicionário de História Religiosa de Portugal, J-P. Mem

7

Martins: Círculo de leitores, 2001.

A legenda colocada no painel refere: D ANTONIO * CORARIO * CARDEAL * P * GREGORIO * 12 P * POR SUA MUITA *

17 Páginas 160-161, Volume I, de CARVALHO, Maria do Rosário Salema Cordeiro

VIRTUDE * E SANTIDE * DEIXOU * O PALÁCIO DE ROMA * E SE METEO * NA

Correia de - A pintura do azulejo em Portugal [1675-1725]. Autorias e biografias

NOSSA * CONGREGAÇÃO *

- um novo paradigma. Volume I-II. Lisboa: Departamento de História da Faculdade

* OSTIENSI * NEPOTE * DO S

MO

8 A legenda aposta no painel anuncia: GREGORIO * 12 * SUMMO * PONTÍFÍCE

de Letras da Universidade de Lisboa, 2012. Dissertação de Doutoramento em

* CHAMADO * ANTE SANGELOCOTS * HU * DOS PR

História, especialidade em História da Arte (policopiado).

OS

FUNDADORES * DA

NOSSA * CONGREGAÇÃO DE S * JORGE * DALGA EM VENEZA

18 A imagem deste, curiosamente, surge segurando uma filactera, atributo

9

normalmente associado a São Dâmaso, por exemplo.

Na legenda do painel surge: NOSO * P * S * LOURENSO IUSTINIANO *

PATRIARCA * DE VENEZA * HUM * DOS NOSOS * FUNDADORES * DE * S *

19 Página 195, imagem 49 de HELYOT, Pierre – Histoire des Ordres Monastiques.

JORGE * EM ALGA * EM ITALIA *

Religieux et Militaires. Et des Congregations seculieres de l’un & de l’autre sexe,

10 O * V * P * ANTONIO DA CONCEICÃO NAL * DA VILA * DO PONBAL *

qui ont été établies jusqu’à present…. Tomo II. Paris: chez Jean-Baptiste Coignard,

QUE * SERVIA A NOSO * SNOR * NESTA * SAGRADA * CONGREGAÇÃO * POR

1714.

ESPAÇO DE 50 ANNOS * FANECEO * DE IDADE * DE * 80 ANOS * A * 12 * DE

20 Página 398, imagem 114, figura II de HELYOT, Pierre – Histoire des Ordres

MAIO DE * 16º2 ESTA * SEPULTADO * NO CONV

Monastiques. Religieux et Militaires. Et des Congregations seculieres de l’un &

XABREGAS

TO

* DE * S * BENTO * DE

de l’autre sexe, qui ont été établies jusqu’à present…. Tomo II. Paris: chez JeanBaptiste Coignard, 1714.

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7 AZULEJARI A CON SERVAÇÃO E R ESTAURO


Susana Lainho Vertentes de Cor – Lda. susanalainho@gmail.com Susana Lainho, licenciada em Conservação e Restauro, pós-graduada em Química Aplicada ao Património Cultural, foi uma das sócias fundadoras da empresa Vertentes de Cor – Lda. Atualmente lançou um novo projeto, a Susana Lainho – Unipessoal Lda., onde se dedica a diagnóstico, projeto e obra de conservação e restauro de bens artísticos integrados em edifícios (azulejos, estuques, pinturas, madeiras…). É também membro da direção da APRUPP – Associação Portuguesa para a Reabilitação Urbana e Proteção do Património, uma associação sem fins lucrativos que se dedica à sensibilização para a salvaguarda do edificado de interesse histórico e patrimonial.


Conservação e restauro dos azulejos da igreja do Convento de Vilar de Frades

Os painéis de azulejo atualmente presentes na Sala de Exposição Permanente do Convento de Vilar de Frades, localizado na freguesia de Areias de Vilar, concelho de Barcelos, são típicos dos inícios do século XVIII – azulejos historiados onde os diversos personagens são captados em plena ação e em que as cenas representadas são envolvidas por cercadura barroca.

São azulejos monocromáticos, pintados a azul sobre fundo branco, executados inicialmente com o propósito de revestirem as paredes da capela-mor da igreja do convento. Nas obras que ocorreram no século XVIII terão sido retirados do seu local original e readaptados às paredes das capelas laterais da nave da igreja. Entre 2002-2007, numa intervenção coordenada e realizada pela

Direção de Serviços dos Bens Culturais (DSBC) da Direção Regional de Cultura do Norte (DRCN), os azulejos, devido ao seu mau estado de conservação, foram alvo de trabalhos de emergência que inicialmente constaram de desmontagens de unidades em queda, estabilização, faceamentos e, por fim, remoção integral. Ao longo deste período variou o grau da intervenção. Apenas dois painéis sofreram trabalhos de restauro que constaram, genericamente, de integrações volumétricas e cromáticas. Todo o conjunto foi armazenado nas instalações da Direção de Serviços dos Bens Culturais. Em finais de 2008 estes painéis foram transportados para o nosso atelier e iniciou-se o tratamento de conservação e restauro, o qual seguidamente apresentamos.

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OBJETIVO DA INTERVENÇÃO

O objetivo da intervenção foi proporcionar ao conjunto em causa um tratamento adequado que assegurasse a sua preservação e permitisse uma leitura global e melhorada. Não seria possível a reposição dos azulejos no seu local de exposição original, pelo que estava definido em caderno de encargos a sua musealização em dois painéis expositivos, localizados na ala nascente do claustro, na Sala de Exposição Permanente, para usufruto dos visitantes. De forma a cumprir esse objetivo, foi feita à obra uma análise exaustiva do seu estado de conservação, incluindo a avaliação dos tratamentos previamente realizados, de modo a delinear uma intervenção compatível, coerente e uniforme não só com o conjunto azulejar original, como com os materiais estranhos à peça, resultantes de preenchimentos, colagens e outras operações anteriores.

EXAME PRÉVIO

A importância da observação atenta e cuidada da obra antes da intervenção prende-se diretamente com a definição de uma metodologia de trabalho que se adeque não só à obra de arte em si, mas também ao ambiente em que está inserida e à sua preservação futura. Só pela análise do estado de conservação da peça e do ambiente que a rodeia podemos definir os tratamentos adequados aos danos existentes, cumprindo o objetivo de a fazer prevalecer no tempo.

Estado de conservação inicial (2008, Vertentes de Cor – Lda. ©, fotografia de Susana Lainho).

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Estado de conservação inicial (2008, Vertentes de Cor – Lda. ©, fotografia de Susana Lainho).

Os azulejos chegaram para tratamento acondicionados em contentores, pelo que foi necessária a sua montagem para análise do estado de conservação. Esta operação possibilitou a observação dos danos, que constavam, sobretudo, de azulejos fraturados, com muitas lacunas, não só a nível de vidrado como também da chacota; vidrados em destacamento; sujidades e manchas; e inúmeras unidades azulejares em falta, circunstância resultante da decisão de se montarem os azulejos de acordo com a sua lógica inicial, respeitando as marcações alfanuméricas originais.

TRATAMENTO EFETUADO

A intervenção estava previamente definida em caderno de encargos e tinha sido já iniciada numa primeira fase em alguns dos painéis. Tal facto, considerando os princípios vigentes em conservação e restauro de património, em particular os princípios da intervenção mínima e da compatibilidade, limitou um pouco as escolhas dos materiais neste trabalho. De modo a reduzir os riscos de incompatibilidade optou-se por dar continuidade aos materiais escolhidos na primeira fase de intervenção. Após montagem dos painéis em estaleiro, foi revista a marcação numérica colocada nos azulejos entre 2002-2007, uma vez que se encontrava apagada em muitas unidades. Procedeu-se à limpeza do tardoz dos azulejos, que ainda apresentavam argamassas de assentamento, com o auxílio de espátulas, sendo posteriormente escovados para remoção de poeiras.

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O vidrado foi limpo com água e detergente neutro, sendo as sujidades mais agregadas removidas com o auxílio de um bisturi. Pontualmente, sobretudo para remoção de vestígios da fixação, recorreu-se a limpeza química com solventes orgânicos (acetona, álcool etílico). A fixação dos vidrados em destacamento foi revista, sendo efetuada com Paraloid® B72 diluído a 15% em acetona nas zonas onde se observavam destacamentos. As colagens foram realizadas com o mesmo produto, em concentração superior (50%). Realização de preenchimento volumétrico (2008, Vertentes de Cor – Lda. ©, fotografia de Susana Lainho).

Os preenchimentos volumétricos, à semelhança dos realizados na primeira fase da intervenção, foram efetuados com uma resina epóxida – Ikosit® K101, à qual se adicionou uma carga e um pigmento- sílica fumada e pigmento branco de titânio. A adaptação dos painéis às capelas laterais, ocorrida no século XVIII, originou o corte das unidades colocadas na última fiada, que foram alvo, nesta intervenção, de reconstituições volumétricas. Unidades que não possuíam as marcações originais, e cuja localização exata se desconhecia, foram introduzidas nos painéis em zonas de lacunas, desde que permitissem uma leitura coerente do conjunto. Tal opção ficou devidamente identificada em relatório.

Pormenor do painel antes da reintegração cromática (2009, Vertentes de Cor – Lda. ©, fotografia de Susana Lainho).

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Após nivelamento dos preenchimentos foi realizada a integração cromática, com pigmentos aglutinados em verniz acrílico. A reconstituição pictórica só foi efetuada por união de linhas, nos locais onde era possível a sua leitura. A integração foi protegida pela aplicação final de um verniz de proteção. As unidades azulejares foram colocadas nos painéis expositivos com adesivo Metylan® 891196, da Henkel®, colocado em quatro pontos de colagem por unidade. O adesivo aplicado em cada um dos cantos do tardoz do azulejo foi separado por um filme de resina Pormenor de reintegração cromática (2009, Vertentes de Cor – Lda. ©, fotografia de Susana Lainho).

acrílica. A montagem dos azulejos nos dois painéis expositivos e a intervenção realizada permitiram, apesar das inúmeras lacunas existentes e resultantes das alterações que o revestimento sofreu ao longo dos séculos, uma leitura global e melhorada de uma composição de natureza invulgar.

Aplicação de verniz de proteção (2009, Vertentes de Cor – Lda. ©, fotografia de Susana Lainho).

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8 CADEIRAL DO CORO ALTO

CON SERVAÇÃO E R ESTAURO


António Manuel Borges Pereira Arte e Talha, Lda. antoniombpereira@hotmail.com António Manuel Borges Pereira é Licenciado em conservação e restauro pela Universidade Portucalense desde julho de 2011. Foi professor do Departamento de Ciências de Educação e do Património da Universidade Portucalense até janeiro de 2013. Mestrando em Conservação e Restauro na Universidade de Coimbra. Gerente da empresa de conservação e restauro, Arte e Talha, em Santa Comba Dão, Viseu, desde outubro de 1998. Tem uma experiência de 32 anos em intervenções relevantes de conservação e restauro nos principais monumentos portugueses.


O cadeiral do coro alto do Convento de Vilar de Frades: regresso às origens

INTRODUÇÃO A história da humanidade é, de um modo geral, influenciada por diferentes fatores, dos quais se destacam os políticos, sociais, religiosos e económicos. Os bens culturais são também fortemente dominados por tais fatores, o que leva a intervenções que os transformam, muitas vezes não só estética como funcionalmente.

Numa intervenção de conservação e restauro nem sempre é fácil estabelecer em que medida essa transformação é uma forma de desvirtuar a obra, pelo que é difícil a opção entre preservar as intervenções posteriores, aceitando-as como marcas ocorridas ao longo da sua história, ou devolver a originalidade. A intervenção de conservação e restauro desenvolvida entre 2003 e 2007 no cadeiral da igreja do Convento de Vilar de Frades 1, que sucintamente aqui se relata, é disso testemunho.

O CADEIRAL – BREVE HISTÓRIA E DESCRIÇÃO Na sua obra sobre o convento e a igreja de Vilar de Frades, Joaquim Alves Vinhas faz referência ao cadeiral: “O cadeiral do coro que hoje encontramos na igreja, num estado deplorável, data de 1682, uma obra levada a cabo pelo mestre ensamblador residente no Porto, António João Padilha (…)” 2. Numa transcrição do contrato são especificadas as características solicitadas para a realização do cadeiral: «(…) a saber hum choro de sinquenta e coatro cadeiras com seu respaldoque he de ter nove palmos de alto fora os remates as quais cadeiras e respaldos hão de ser de pão de jacaranda e foiquia (sic) amarello e targelim vermelho asi e na forma das cadeiras do convento da Serra (…)». Atualmente, o conjunto integra cinquenta e duas cadeiras em madeira de sucupira, interligadas entre si. A planta é em U e a disposição em fila dupla, sendo que a de trás se encontra num plano mais elevado. Os assentos são móveis e têm pequenas mísulas no lado inferior - misericórdias com a forma de máscaras fantasiosas de rostos humanos, sátiros e animais, características dos cadeirais da segunda metade do século XVII e do primeiro quartel do século XVIII 2.

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Esquema de representação das cadeiras (2020, Arte e Talha, Lda.©, ilustração de António Manuel Borges Pereira).

A estrutura do cadeiral foi executada em madeira de sucupira (dominante), castanho e uma espécie de mogno brasileiro, enquanto as decorações embutidas e a estrutura das almofadas foram elaboradas em pau-santo e pau-cetim. O espaldar é composto por vinte e seis painéis com duas almofadas cada, em madeira de pau-santo com embutidos em pau-cetim. Os motivos destes embutidos são vegetalistas estilizados e dois painéis representam uma águia com tinteiro, símbolo da Ordem dos Lóios, Pormenor de misericórdia (2007, Arte e Talha, Lda.©, fotografia de António Manuel Borges Pereira).

a que pertencia o antigo convento. Na cimalha estão representadas taças com uma espécie de obelisco rematado por uma esfera. As cadeiras encontram-se separadas verticalmente por uma pilastra entalhada, sendo o remate de cornucópias e um pináculo com gomos de madeira em dois tons, clara e escura, de forma alternada.

ESTADO DE CONSERVAÇÃO

Antes da intervenção de conservação e restauro o suporte encontrava-se enfraquecido, devido ao envelhecimento natural das madeiras, ao ataque por insetos xilófagos, nomeadamente térmitas, e à proximidade com as paredes. Verificavam-se igualmente desníveis e afastamentos. Como lacunas volumétricas registavam-se a falta de algumas misericórdias, bem como alguns embutidos, tendo estes últimos sido substituídos por massas. Os elementos metálicos encontravam-se enfraquecidos devido à oxidação. A estrutura do estrado apresentava-se deteriorada devido à fraca qualidade das madeiras utilizadas. A superfície apresentava-se totalmente repolicromada, com numerosas lacunas, áreas em risco de destacamento Aspeto geral do cadeiral antes do seu desmonte (2005, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Luís Ferreira Alves).

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e zonas de grande desgaste. Em muitas áreas era possível observar parcialmente os embutidos subjacentes. Por fim, existia um depósito alargado de sujidade e poeiras.

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Aspeto geral do cadeiral antes do seu desmonte (2007, Arte e Talha, Lda.©, fotografia de António Manuel Borges Pereira).

A INTERVENÇÃO DE CONSERVAÇÃO E RESTAURO

São do conhecimento geral as controvérsias que uma intervenção desta envergadura traz, bem como a consequente discussão provocada pelas diferentes correntes e suas interpretações. Manter as marcas do tempo? Devolver a originalidade? Neste caso, e apesar do amplo número de técnicos envolvidos, foi possível alcançar consenso quanto à opção de se proceder ao levantamento dos marmoreados. Para tal contribuiu a fraca qualidade técnica dos mesmos, aliada à quantidade e qualidade de embutidos subjacentes, presenciados através da abertura de janelas de observação. Dada a complexidade das diferentes fases necessárias para um procedimento tão rigoroso como este, e para um melhor conhecimento das diversas etapas, descrevemos de forma detalhada a intervenção. No passado, devido às obras que viriam a decorrer no convento, o conjunto havia sido desmontado, encontrando-se devidamente acondicionado. Antes de se efetuar o desmonte, aparentava estar em razoável estado de conservação. No entanto, no decurso dos trabalhos, verificou-se que as estruturas do estrado estavam bastante deterioradas. Após o desmonte procedeu-se à estabilização física do suporte, iniciando-se com a limpeza mecânica da contra face dos elementos. A madeira com falta de coesão foi consolidada com resina acrílica em solvente aromático. Nos elementos das estruturas de união e de sustentação em que a consolidação não se mostrou viável, devido a não apresentarem garantias de funcionalidade e a estarem fortemente degradados, procedeu-se ao seu reforço e/ou substituição. Os assentos das cadeiras, bastante degradados e com madeira de essência diferente da original, foram substituídos

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por novos. O mau estado em que se encontravam as madeiras originais do estrado revelou a necessidade da execução de um novo, incluindo as escadas, respeitando as medidas assinaladas nos esquemas realizados aquando da desmontagem. Na execução da sua estrutura foi utilizada madeira de Izombé, adesivo vinílico, cavilhas de madeira e/ou parafusos em aço e pregos zincados. Os elementos em destacamento, destacados ou fraturados, foram fixos com adesivo e/ou cavilhas de madeira. Nesta situação incluem-se algumas misericórdias destacadas, que foram recolocadas após se averiguar o seu lugar através da observação de fotografias antigas e pela comparação das marcas dos orifícios de cavilhas dos assentos. As fendas estruturais que não sofreram desvio das fibras que constituem a madeira foram unidas e coladas, enquanto aquelas que sofreram desvios das fibras nas extremidades foram eliminadas com a aplicação de segmentos em madeira da mesma essência da original. As lacunas do suporte foram colmatadas com madeira. Em todos estes processos de fixação foi utilizado um adesivo vinílico e cavilhas de madeira. Fez-se uma desinfestação preventiva e curativa contra o ataque de agentes xilófagos, com recurso a um fungicida-inseticida. Foram tratados todos os pregos, elementos de articulação dos assentos e apoios metálicos, tendo-se empregue: na limpeza, lã de aço extra fina e lixa para metal; na neutralização da oxidação e proteção, um conversor de óxido. Os pregos e cavilhas metálicas que perderam a sua função, e que colocavam em risco a estabilidade dos elementos por eles unidos, foram substituídos por parafusos de aço e cavilhas de madeira. Os elementos de articulação dos assentos (dobradiças) que não se encontravam funcionais foram substituídos por elementos novos executados na mesma liga de metal (ferro) e com desenho idêntico. Pormenor do restauro do suporte (2007, Arte e Talha, Lda.©, fotografia de António Manuel Borges Pereira).

Para uma melhor leitura e compreensão da unidade estética do conjunto, e desde que existissem evidências que o legitimassem, realizaram-se integrações volumétricas com madeira. O mesmo se aplicou aos embutidos que se encontravam incompletos, com pequenas falhas ou áreas com massas aplicadas. Optou-se então por realizar uma decapagem mecânica e manual, uma vez que se pretendia que a cor da madeira subjacente não alterasse e não existisse reação química com os embutidos. Assim, a remoção da policromia foi realizada por meio de máquinas de pequeno porte e de abrasão controlada, enquanto nas áreas mais pequenas e de difícil acesso foram usados raspadores de marceneiro e lixas para madeira. A decisão de devolver ao espaldar o estilo original não abarcou os dois painéis executados aquando das obras da fachada, por se tratar de elementos posteriores mas em estado original e sem embutidos, tendo sido simplesmente submetidos a uma limpeza mecânica com aspirador e trinchas macias e a uma limpeza química com solvente e detergente neutro.

Reprodução de elementos volumétricos (2007, Arte e Talha, Lda.©, fotografia de António Manuel Borges Pereira).

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Ainda em oficina foi realizada uma pré-montagem do cadeiral. Na montagem dos diversos módulos foram empregues parafusos de aço e na união de alguns deles usaram-se elementos metálicos em forma de “L”.

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A fixação do conjunto à parede fez-se por aplicação de elementos em barra de inox em “L” de diferentes dimensões e espessuras de acordo com a função a desempenhar. Fixaram-se à parede com varão roscado e buchas metálicas e à contra face das peças do conjunto com parafusos de aço. Na montagem do soalho do estrado aplicaram-se pregos zincados. A madeira do soalho foi furada com uma broca nos sítios de inserção, a fim de se criar um espaço entre a madeira e os pregos, para que não entrasEmbutidos: pormenor de substituição de massas por madeira (2007, Arte e Talha, Lda.©, fotografia de António Manuel Borges Pereira).

sem sob pressão e provocassem fendas. Esta opção de colocar pregos em detrimento de parafusos deve-se ao facto dos primeiros serem mais flexíveis, evitando a sua fratura com a movimentação das madeiras. Sempre que se procedeu à substituição de madeiras foram utilizadas outras da mesma essência da original e devidamente estabilizadas. Uma vez que o conjunto ficou com as madeiras visíveis, a integração cromática consistiu simplesmente na utilização de velaturas de diversos tons, a fim de proporcionar uma leitura harmoniosa. Na proteção final das madeiras do cadeiral, respetivo espaldar e soalho do estrado, utilizou-se cera natural de abelha para soalhos e peças de mobiliário. A aplicação foi realizada à trincha e lustrada com escova de nylon e pano macio de lã.

Embutidos: pormenor de substituição de massas por madeira (2010, Direção Regional de Cultura do Norte ©, fotografia de Inês d’Orey).

Aspeto geral do processo de montagem (2007, Arte e Talha, Lda.©, fotografia de António Manuel Borges Pereira).

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Aspeto do cadeiral após montagem (2010, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d’Orey).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O trabalho realizado, que reputamos como sendo de boa qualidade, teve como principal preocupação devolver estabilidade, originalidade e leitura ao conjunto, proporcionando desta forma a sua utilização com segurança e possibilitando ainda acessos que facilitem a deteção de futuras patologias. Nesse sentido, em todas as fases descritas teve-se sempre presente o respeito pelos materiais e técnicas originais, pelo que todas as intervenções realizadas foram precedidas de um exame metódico e rigoroso, visando a compreensão do objeto, nomeadamente no que diz respeito à sua história, estrutura, componentes e estado de conservação dos seus materiais.

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BIBLIOGRAFIA ARTE E TALHA – Relatório técnico de intervenção do cadeiral, respetivo espaldar e estrado do coro alto da Igreja do Mosteiro de Vilar de Frades. Santa Comba Dão: [s.n.], 2010.

SMITH, Robert C. – Cadeirais de Portugal. Lisboa: Livros Horizonte, 1968.

VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o convento de Vilar de Frades. Das origens da Congregação dos Seculares de São João Evangelista (Lóios) à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia de Areias de Vilar, 1998.

NOTAS 1 A intervenção de conservação e restauro do cadeiral do coro alto da igreja do Convento de Vilar de Frades foi realizada pela empresa Arte e Talha, Lda., tendo como técnico responsável o autor e contado com a colaboração de Cláudia Gonçalves na área da superfície cromática. 2 Página 261 de VINHAS, Joaquim Alves – A igreja e o convento de Vilar de Frades. Das origens da Congregação dos Seculares de São João Evangelista (Lóios) à extinção do convento. 1425-1834. Barcelos: Junta de Freguesia de Areias de Vilar, 1998.

Aspeto do cadeiral após montagem (2010, Direção Regional de Cultura do Norte©, fotografia de Inês d’Orey).

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9 PINTURA

CON SERVAÇÃO E R ESTAURO


Ana Brito Conservadora-Restauradora, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda. a_brito@portorestauro.com Ana Brito nasceu no Porto no ano de 1965. Sócia Gerente da Empresa Porto Restauro, Lda. que fundou em 1998. Doutoranda do curso de Conservação de Bens Culturais – Especialização em Pintura, da Escola das Artes da Universidade Católica Portuguesa, no Porto, entre 2010 e 2018. Investigação CITAR, FCT. Mestre em Técnicas e Conservação de Pintura, pela Escola das Artes da Universidade Católica Portuguesa, no Porto, com apresentação da dissertação intitulada “Abel Salazar, estudo técnico e material” (2006-2009). Bacharel em Conservação e Restauro pela Escola Superior de Conservação e Restauro, em Lisboa (1989-1993). Bacharel em pintura pela Escola Superior de Belas Artes do Porto (19861989). Participação em projetos de investigação sobre técnicas pictóricas e polícromas, maioritariamente relacionados com intervenções de conservação e restauro em obras de arte, que resultaram em publicação de artigos e comunicações em congressos nacionais e no estrangeiro. Coordenação e participação, desde 1994, em trabalhos de conservação e restauro em obras de arte provenientes de imóveis classificados, museus e igrejas, assim como de peças que integram exposições temporárias ou que constituem coleções, quer de instituições, quer de particulares.


Estudo técnico e histórico das intervenções de conservação e restauro das pinturas a óleo sobre tela alusivas aos quatro Evangelistas, pertencentes ao Convento de Vilar de Frades

INTRODUÇÃO A intervenção nas pinturas alusivas aos quatro Evangelistas, (São Mateus, São João, São Lucas e São Marcos), atribuídas a Pedro Alexandrino (1729 – 1810), pertencentes ao espólio da sacristia do Convento de Vilar de Frades, inseriu-se na candidatura do imóvel ao III Quadro Comunitário de Apoio – Programa Operacional da Cultura (POC) ” que decorreu em 2005.

Pintura de São Marcos: fotografia do espetro visível, antes do tratamento (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

Pintura de São Marcos: fotografia do espetro visível, depois do tratamento (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

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Neste contexto, efetuou-se a recuperação das quatro pinturas e respetivas molduras, assim como ao estudo técnico, material e histórico de duas das pinturas: São Marcos e São João. As pinturas a óleo sobre suporte em tela apresentam, entre si, características análogas no que se refere à técnica e materiais utilizados. Será nos estados de conservação e intervenções anteriores que encontramos algumas diferenças.

GRADES

As grades, com cerca de 3,15 m (altura) x 1,56 m (largura) são em madeira e apresentam uma construção muito particular, nada comum no nosso território. De formato retangular e com as partes superiores arredondadas, são de sistema fixo, sendo as assemblagens bastante apertadas, de caixa e respiga, não se notando a presença de pregaria ou cavilhas. As grades são reforçadas por uma travessa central, da mesma espessura e largura das restantes réguas. Do seu meio e das diagonais partem quatro travessas mais finas que encaixam, pelo mesmo sistema, ao meio dos dois quadrantes, nas travessas verticais, formando no total dez pontos de força, tornando a estrutura bastante robusta. A parte arredondada encaixa em dois pontos da régua superior pelo sistema de taleira interna. As grades não são chanfradas e os veios da madeira orientam-se no sentido mais longo, contudo, numa mesma grade podem ser encontrados diferentes tipos de corte - longitudinal e tangencial -, o que originou a ocorrência de alterações específicas e bastante notórias em alguns dos estratos das preparações e das camadas pictóricas, nomeadamente na formação de diferentes tipos de malhas de estalados (fig. 4). De forma geral, os cortes das madeiras são regulares. Este tipo de construção de grade, com travessas internas oblíquas, parece ser incomum em Portugal. Já nos séculos XVI a XVIII em Espanha foi recorrente a execução de grades reforçadas por travessas aplicadas nas diagonais com o fim de reforçar as estruturas 1. Tipologia de grade utilizada nas pinturas São Mateus, São João, São Lucas e São Marcos (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

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Do lado em contacto com as telas, nas zonas redondas, foram manuscritos, a tinta preta, os títulos de cada obra e executados diferentes símbolos nos locais de união ( [ ; ϒ; ] ; Ѵ ; etc.).

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Pintura São Lucas: malha de estalados na camada pictórica em contacto com a madeira da grade (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

As pinturas foram fixas através do uso de pregos em ferro forjado, que podem atingir os 2,5 cm de comprido, variando o diâmetro das cabeças entre 6 a 7 mm. Na grande maioria, embora apresentem oxidação, a forma muitas das vezes já não corresponde a um círculo perfeito, porém ainda desempenhavam a sua função e não é notória a substituição ou adição de outro tipo de prego ou sistema de união. Em geral as madeiras encontravam-se muito atacadas por insetos xilófagos, reconhecendo-se áreas bastante frágeis. Tal obrigou à total substituição das grades, repetindo-se o modelo original, agora chanfrado e amovível, podendo-se regular a tensão das telas por meio de extensores em aço inox.

Pintura São João: pregos em ferro forjado utilizados na fixação da pintura à grade (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

SUPORTES

Os suportes em tela de estrutura em tafetá, composta por fio grosso e trama meio apertada, são constituídos por dois panos. As costuras abertas foram cosidas por ponto atrás. Umas vezes encontram-se sobre o lado direito da composição (São Lucas e São Marcos) outras do lado esquerdo (São João e São Mateus). Embora não se tenha efetuado a análise laboratorial ao tipo de fibra, levanta-se a hipótese de se tratar de linho ou de cânhamo, quer pela observação direta, quer pelo comportamento aos testes de humidade ou mesmo no tipo de envelhecimento. Em geral, a trama e teia formam ângulos retos, denotando-se o cuidado de evitar deformações.

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No que se refere ao estado de conservação, encontramos situações diversas, notando-se níveis de degradação diferenciados, quer entre as várias pinturas – São Marcos e São João acham-se em pior estado -, quer entre si, apresentando-se mais degradados os quadrantes superiores. A degradação resulta de um conjunto de fatores, nomeadamente decorrentes da técnica utilizada, com preparações contendo óleos secativos 2; intervenções anteriores; negligência humana; condições ambientais adversas com percentagens de humidade relativa instáveis, predominando picos muito elevados; desenvolvimento de microrganismos; e elevada presença de luz 3. Podemos dizer que muitas das ruturas do tecido se situam em áreas onde os estalados das pinturas têm presença acentuada, deixando as fibras a descoberto, adquirindo um tom bastante escuro, revelando reações de oxidação e hidrólise da celulose. Os rasgos orientam-se principalmente na vertical, notando-se maior fragilidade nos fios que se encontram na horizontal, concluindo-se serem estes mais frágeis e poderem corresponder à trama do tecido 4. Todas as pinturas apresentavam grande quantidade de sujidade depositada entre as telas e as grades. Numa intervenção anterior, que não foi possível datar com rigor, todo o conjunto foi ainda impregnado pelo reverso com uma substância vermelha, mas apenas nas áreas deixadas a descoberto Pintura São Marcos: pormenor de uma zona do suporte da pintura bastante afetada pela ação de fungos, oxidação e hidrolise. As fibras foram mudando de cor, desintegrandose, e a costura abriu (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

pela grade. A análise efetuada na amostra recolhida no reverso da pintura São João, mediante as técnicas de SEMEDXS e FTIR, revelou a presença de terras vermelhas, carbonato de cálcio e mínio em baixa proporção (b.p.), assim como dos seguintes aglutinantes: poli(acetato de vinilo) 5 e óleos secativos (b.p.). A análise efetuada à amostra da pintura São Marcos, apenas utilizando a técnica SEM-EDXS, revelou a presença de mínio. Com exceção da pintura São Lucas, todas apresentavam a aplicação de uma gaze que foi introduzida entre a tela e a grade, sem haver desmontagem das pinturas. Pelas caraterísticas apresentadas, julgamos que a intervenção iniciou-se através da introdução das gazes, que por serem mais estreitas, foram sobrepostas cerca de 7 cm nas uniões e encaixadas entre a tela e a grade. Só depois foi aplicada a mistura vermelha, com a função de aderir os dois suportes.

Pintura São Lucas: pormenor, pelo lado da pintura, da costura dos panos do suporte de tela (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

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Pintura São Marcos: pormenor de pequeno rasgão que caracteriza a tipologia de rasgões mais comuns presentes nestas pinturas (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

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Pintura São Marcos: pormenor de área com vário pequenos rasgões no suporte da pintura (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

Pintura São Lucas: pormenor da tela de cor clara que, protegida pela grade, não ficou impregnada pelo material vermelho responsável por aderir a gaze de reforço, aplicada em intervenção anterior (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

Pintura São João: pormenor de acumulação de sujidade nos cantos entre a tela e a grade (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

Pintura São João: pormenor da gaze introduzida entre a grade e a tela original, sobre a qual foi aplicado o material vermelho em intervenção anterior. Esta operação foi feita sem desmontar as pinturas da grade (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

Durante o processo de restauro levado a cabo em 2005, através da limpeza mecânica dos reversos, ou quer pela observação de algumas das lacunas da camada pictórica, ficou claro que a penetração da substância vermelha não foi homogénea nos suportes originais, criando áreas da tela com graus de rigidez distintos (envelhecimentos diferenciados), assim como a migração de manchas até à superfície da camada pictórica. Das várias amostras recolhidas, apenas uma estratigrafia revelou a presença de uma primeira camada de impregnação que continha mínio 6, que poderá advir da camada vermelha aplicada no verso.

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Pintura São Marcos: limpeza mecânica do verso da pintura (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

Pintura São Marcos: pormenor da superfície do lado da pintura. As duas lacunas deixam ver que o material vermelho não impregnou a estrutura da tela de modo uniforme (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

PREPARAÇÕES

Todas as preparações são brancas e estendemse até aos limites das telas, o que favorece a conservação dos bordos e das fibras em contacto com a pregaria. Comparativamente

com

os

estratos

pictóricos

das

amostras estratigráficas analisadas, podemos classificar as preparações como espessas. Embora em algumas zonas seja clara a textura dos suportes, parece-nos legítimo dizer que o artista pretendia obter uma superfície bastante lisa para executar a sua pintura. As análises efetuadas às pinturas São Marcos e São João evidenciaram que as duas preparações não são exatamente iguais. A primeira é composta por carbonato Pintura São João: pormenor onde é possível ver as nódoas na camada pictórica provocadas pelos aglutinantes presentes na mistura vermelha – poli(acetato de vinilo) e óleos secativos (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

de cálcio e branco de chumbo em baixa proporção (b.p) e à segunda acresce o ocre vermelho em muito baixa proporção (m.b.p.). Como aglutinante, ambas revelaram a presença de um óleo secativo. Identificaram-se dois tipos de massas resultantes de intervenções anteriores: uma branca e dura e outra mais amarelada à base de cera, que a análise química revelou ser cera de abelha. Havia dois tipos de destacamentos: entre o suporte e as camadas sobrejacentes e entre a preparação e a camada pictórica. O mesmo confirmaram as estratigrafias observadas da pintura São Marcos, que apresentam ligeiras fraturas e falta de coesão.

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CAMADA PICTÓRICA

O estudo analítico identificou alguns dos pigmentos que foram empregues pelo artista 7, nomeadamente o branco de chumbo, amarelo de Nápoles, ocres laranja, amarelo e vermelho, vermelhão, laca vermelha, terra de sombra e azul da Prússia. Este último pigmento aponta a data de execução das pinturas a partir do séc. XVIII. Pintura São Marcos: pormenor de massa de preenchimento de cera de abelha feita em intervenção anterior (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

Com exceção da túnica da pintura São João, que foi obtido pela mistura de duas cores - o azul da Prússia e o amarelo de Nápoles para formar o verde, as restantes cores partiram da cor direta do pigmento. Para os mantos vermelhos, na pintura São João, foi usado o vermelhão, enquanto na pintura São Marcos empregou-se uma laca vermelha com um pouco de vermelhão. Na túnica deste último evangelista foi ainda usado o amarelo de Nápoles e o ocre amarelo e, na carnação, pouco vermelhão e pouco amarelo de Nápoles misturados no branco de chumbo.

O branco de chumbo está sempre presente nas misturas analisadas, tal como o carbonato de cálcio, provavelmente foi usado como extensor. O artista executava as misturas na paleta e aplicava-as directamente na tela, numa só camada. As pinceladas eram expressivas, umas mais opacas e outras mais translúcidas, tirando partido da preparação branca. Coincidente com os suportes, o estado de conservação das camadas pictóricas é variável quer de pintura para pintura, quer em distintas zonas da mesma obra. Na generalidade, os quadrantes superiores apresentavam piores estados, o que se associa à enorme deposição de poeiras que, como material higroscópio, tiveram certamente uma forte responsabilidade na degradação das obras, e à presença de partículas metálicas ou de esporos, desencadeando reações. Simultaneamente, é nessas zonas que surge uma maior quantidade de estalados, formando em alguns dos casos malhas densas em forma de concha que se foram destacando do suporte e ocasionando perdas pontuais. Muitas das formações das malhas de estalados têm uma relação direta com a morfologia da grade e o tipo de corte das madeiras da grade em contacto com o suporte. É interessante comparar a tipologia do estalado e sua orientação com o tipo de corte das madeiras, mas também com as zonas que não estão em contato.

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Contrariamente, as partes inferiores apresentavam maior coesão, ainda que com bastantes desgastes, por terem sido sujeitas ao longo dos tempos a limpezas abrasivas. A título de exemplo, pode ser referido que na zona onde foi recolhida a amostra da carnação no pé da pintura São Marcos, composta por branco de chumbo, vermelhão (b.p.) e amarelo de Nápoles (b.p.), havia desgaste com perda parcial da pintura original. Os estudos analíticos confirmaram a presença de algumas zonas de integração cromática, correspondentes a intervenções antigas, feitas sobre a camada Pintura São Lucas: pormenor da grande quantidade de deposição de sujidade na superfície da pintura. Na parte inferior da imagem a superfície já havia sido limpa pela ação mecânica (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

de verniz (ex. amostra retirada da zona mais escura do manto de São

Pintura São Lucas: pormenor da malha de estalados numa zona da tela em contato com a grade (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

Pintura São Lucas: pormenor da malha de estalados na superfície da pintura numa zona em contato com a madeira da grade e noutra não (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

Marcos), produzidas com branco de chumbo e ocre vermelho - quando a cor original era feita pela mistura de branco de chumbo, laca vermelha e vermelhão (b.p) -, e ainda no fundo branco, com repinte a branco de chumbo, que escondia o verniz e a pintura original feita pela mistura

Pintura São Marcos: corte estratigráfico da amostra do manto na zona mais escura (200x). O retoque foi feito sobre o verniz (camada 3). A cor original era feita pela mistura de branco de chumbo, laca vermelha e vermelhão (b.p) (camada 2). O retoque feito com branco de chumbo e ocre vermelho (camada 4) (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

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Pintura São Marcos: corte estratigráfico do fundo branco (500x). O repinte a branco de chumbo (camada 4), escondia o verniz (camada 3) e a pintura original feita pela mistura de branco de chumbo, ocres e um pouco de azul da Prússia (camada 2) (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

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de branco de chumbo, ocres e um pouco de azul da Prússia. A mesma amostra confirmou a adição de outros materiais, provavelmente consolidantes, mas já sem função. Também uma das amostras da pintura São João validou a presença de intervenções anteriores, em que se identificaram integrações cromáticas pontuais realizadas diretamente sobre o suporte original, confirmando ter havido momentos distintos de intervenção. De um modo geral as integrações cromáticas alteraram drasticamente o original. O forte desvanecimento sofrido pelas cores das tintas que compõem este conjunto de quatro pinturas, Pintura São Marcos: o mesmo corte estratigráfico do fundo branco (200x), mediante observação com luz UV (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

Pintura São Marcos: pormenor de zona com alterações acentuadas das integrações cromáticas anteriores (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

resultado da ação da luz que invade a sacristia do Convento de Vilar de Frades através dos seus janelões, é outro fator importante que acumula às alterações irreversíveis já referidas.

Pintura São João: pormenor de mancha mais escura correspondente a uma zona de integração bastante alterada (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

Pintura São Lucas: pormenor de desvanecimento das cores nas margens comparativamente às tintas nas margens que estavam protegidas pela grade (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

CAMADA DE PROTEÇÃO Como material de proteção final das obras o estudo analítico identificou duas soluções: uma de mistura de resina triterpénica e cera de abelha (São João) e outra apenas de cera de abelha (São Marcos). Contudo, podemos dizer que nestas duas pinturas esta camada de proteção encontrava-se amarela, pouco transparente e por vezes com uma textura estranha, desfigurando a leitura da obra e dificultando a compreensão de certas zonas, nomeadamente em casos nos quais havia dúvidas acerca da presença

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de repinte ou de alterações da camada superficial. Estas camadas de proteção estavam em desagregação, pelo que numa primeira fase a sua remoção foi feita por ação mecânica. As composições eram grandemente prejudicadas pelas manchas que migraram até à superfície, mais evidentes na pintura São João e que tiveram origem na mistura vermelha aplicada no reverso das obras, assim como pela perfusão de excrementos de morcego.

Pintura São Marcos: pormenor de verniz bastante amarelecido (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

Pintura São Marcos: pormenor do aspeto estranho da camada de proteção (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

Pintura São Lucas: Limpeza mecânica do verniz (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

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Pintura São Lucas: antes do tratamento (2005, Porto Restauro – Conservação e Restauro de Objectos de Arte, Lda.©).

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BIBLIOGRAFIA

NOTAS

BERGEAUD, Claire; HULOT, Jean-François; ROCHE, Alain – La dégradation des

1 Páginas 273-274 de BRUQUETAS GALÁN, Rocío – Técnicas y materiales de

peintures sur toile – Méthode d’examen des altérations. Paris : L’Ecole national

la pintura española en los siglos de oro. Madrid: Fundación de Apoio a la Historia

du patrimoine, 1997.

del Arte Hispánico, 2002.

BRUQUETAS GALÁN, Rocío – Técnicas y materiales de la pintura española en los siglos de oro. Madrid: Fundación de Apoio a la Historia del Arte Hispánico, 2002.

2 Exames efetuados pelo laboratório Arte Lab, Madrid, 2004, sob a responsabilidade de Andrés Sánchez Ledesma e Maria Jesús Gómez Garcia. 3 De frente para as pinturas situam-se quatro janelões orientados a nascente, havendo sempre uma quantidade significativa de luz na sacristia, favorecendo as

HORIE, C.V. – Materials for conservation: organic consolidants, adhesives and

reações fotoquímicas.

coatings. 2ªedição. Cornwall: Butterworths 1990.

4 Páginas 15-18 de BERGEAUD, Claire; HULOT, Jean-François; ROCHE, Alain – La dégradation des peintures sur toile – Méthode d’examen des altérations.

GETTENS, J. Rutherford; STOUT, George L. – Painting materials: a short encyclopedia. New Tork: Dover Publications, 1966.

5 A primeira notícia da aplicação PVAC em conservação e restauro foi em 1932,

VALGAÑON, Violeta – Biologia aplicada a la conservación y restauratión. Madrid: Sintesis, 2008.

Paris : L’Ecole national du patrimoine, 1997.

utilizado como adesivo de um “facing” empregue na trasladação de um fresco. Página 92 de HORIE, C.V. – Materials for conservation: organic consolidants, adhesives and coatings. 2ªedição. Cornwall: Butterworths 1990. 6 Amostra 1, verde da túnica da pintura São João. É formada por três camadas: 1ª impregnação que contém mínio; 2ª preparação que contém carbonato de cálcio, branco de chumbo em baixa proporção e 3ª camada pictórica (verde) contém branco de chumbo, azul da Prússia e amarelo de Nápoles em baixa percentagem. 7 No total foram analisadas sete microamostras para o estudo técnico e material das duas pinturas, quatro na pintura São João e três na pintura São Marcos. As restantes análises relacionaram-se com as intervenções anteriores.

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A3

A28

IC28

Ponte da Barca

A27

N103

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Convento de Vilar de Frades

Barcelos, Braga GPS 41° 32’ 25”, -8° 33’ 23”

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1

Braga

Barcelos

A11

A11

Guimarães

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Porto

Porto Porto

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Marco de Canaveses


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Chaves N103

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Vila Real

ROTEIRO

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Peso da Regua

São João da Pesqueira

Lamego

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Tarouca

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N

Visita virtual através de fotografia 360º (2020, DETALHAR©).

planta geral

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3.4

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3

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3.4

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3.6

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3.2

5

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6 4

10

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8

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piso terreo

9

1

Adro - 1º nível

4

Claustro

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Átrio

Igreja

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Sacristia Cartório

3

3.1

Torre Norte

7

3.2

Receção/Loja

8

Sanitário

3.3

Pia Batismal

9

Sala de Exposição Permanente

3.4

Capelas Laterais

10

Galeria Térrea do Claustro

3.5

Transepto

11

Parede Medieval

3.6

Capela-mor

(2014, Direção Regional de Cultura do Norte©, vídeo de Hugo Amaral e Nuno Loureiro).


16

4º piso

16 3º piso

16

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2º piso

12

12

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12

Salas de Catequese

18

Capela do Noviciado

13

Sala de Reuniões/Catequese

19

Cela

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Coro Alto

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Sala da Memória

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Galeria Superior do Claustro

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Cozinha

16

Salas de Escuteiros

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Corredor/Àrea de Exposição

19

1º piso

2º piso


COL ECÇ ÃO

Património a Nor te Edição da Direção Regional de Cultura do Norte (DRCN), PATRIMÓNIO A NORTE é uma coleção monográfica, numerada, sem periodicidade fixa, disponível em versão impressa e digital, acessível gratuitamente online (www.culturanorte.gov.pt). Destinada a técnicos e público generalista, aborda variados temas dentro do amplo universo de atuação da DRCN, da reabilitação patrimonial à conservação e restauro, da investigação histórica, arqueológica e etnológica à salvaguarda, das artes à museologia.

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Nº 01

Nº 02

“10 anos de reflexão sobre Casasmuseu em Portugal” reúne 7 textos de sete autores, que tentam sintetizar 9 encontros de reflexão e debate sob o tema Casas-museu, realizados em Portugal desde 2010 sob a égide do ICOM - International Council of Museums – Portugal e o DEMHIST International committee for historic house museums. Decorridos em 9 espaços de referência do atual panorama museológico português, estes encontros constituíram uma oportunidade privilegiada de reunir profissionais das mais variadas especialidades dentro do universo museológico, não só português, mas igualmente internacional. Indo para além do clássico formato de atas, tenta no seu conjunto trazer reflexões atuais sobre o tema, diversificando abordagens, experiências e perspetivas.

“A Pintura Mural no Museu de Alberto Sampaio” apresenta com rigor cientifico e de forma acessível a coleção de 10 pinturas murais de século XVI hoje integradas no Museu de Alberto de Sampaio, em Guimarães. Sendo possível ao público apreciar 8 destas pinturas murais na “Sala dos Frescos” do Museu de Alberto de Sampaio, este estudo inclui ainda pinturas menos conhecidas, conservadas nas reservas do museu. Inicialmente pintadas em paredes de igrejas e casas religiosas, o destacamento destas pinturas murais dos seus locais originais e posterior integração no Museu de Alberto Sampaio, enquanto peças museológicas, é o mote para uma abordagem ampla aos seus contextos de proveniência e à sua integração no panorama geral da pintura mural no Norte de Portugal, abordando técnicas, estilos, oficinas, encomendadores e as lógicas religiosas e de poder por trás da sua produção e do seu significado.

Nº 03

Nº 04

“Centros Interpretativos: técnicas, espaços, conceitos e discursos” reúne textos de apresentação de alguns dos mais significativos centros interpretativos do Norte de Portugal. Espaços estruturados de apoio à interpretação, medeiam objetos tão diversificados como monumentos, territórios, vivências, tradições, fenómenos socioculturais, acontecimentos históricos ou personalidades. Aqui explicados na “primeira pessoa” pelos decisores e equipas técnicas responsáveis pela sua conceptualização, desenho e materialização, disponibiliza numa só publicação uma síntese de saberes e experiências, tão pertinente quanto necessária, num período em que este tipo de espaço de interpretação se impôs já como modelo privilegiado nas mais diversas temáticas na área da Cultura, Património, Artes e Turismo-cultural.

“Pintura Mural: intervenções de conservação e restauro” reúne um excecional conjunto de intervenções de conservação e restauro sobre pintura mural realizadas no Norte de Portugal e Espanha. Inseridas em igrejas, capelas e ermitérios de ambos os lados da fronteira, os aspetos simbólicos, técnicos e formais destas pinturas murais expõem um fenómeno transversal aos dois “reinos” ibéricos, com especial expressão junto à “raia”, revelando um mundo de partilha onde artífices itinerantes levam consigo práticas e gostos, ignorando fronteiras. Aqui descritas na “primeira pessoa” pelos técnicos de conservação e restauro responsáveis, partilham-se problemáticas, conceitos, materiais e técnicas em ambas as línguas ibéricas.

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Nº 05

“Mediação Cultural: objetos, modelos e públicos” reúne textos de alguns dos mais significativos equipamentos culturais da região Norte de Portugal, que aqui são desafiados a apresentar, “na primeira pessoa”, a sua atuação na área da mediação cultural. Espaços, meios, estratégias, equipas e públicos são abordados numa lógica de partilha de experiência e conhecimento, versando áreas de aplicação tão diversas quanto História, Arte Antiga, Contemporânea ou Rupestre -, Território, Arquitetura, teatro ou Ciência. Procurando partilhar tanto quanto provocar o debate, o diálogo é desde logo aberto com um acutilante texto de reflexão por Guilherme d’Oliveira Martins: “Todas as pessoas têm o direito de se implicar e de participar na valorização do património cultural, segundo as suas escolhas, como modo de assegurar o direito a tomar parte livremente na vida cultural. Daí a importância da mediação cultural, ou seja, de promover e aprofundar a participação dos cidadãos na gestão e preservação do património”.

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Nº 06

“Tongobriga: coletânea de estudos comemorativos de 40 anos de investigação” reúne um conjunto de treze contributos de dezasseis autores que, agrupados em três grandes áreas de atuação (“Investigação Científica”, “Formação Profissional” e “Mediação Cultural”), celebram as principais vertentes de atuação do serviço que a Direção Regional de Cultura do Norte tem instalado na Área Arqueológica do Freixo (Marco de Canaveses), classificada como Monumento Nacional desde 1986. Quatro décadas decorridas sobre o início, em agosto de 1980, da investigação que, desde logo, proporcionou e justificou o desenvolvimento das outras duas áreas preferenciais de ação, os contributos aqui reunidos estão naturalmente focados nos anos mais recentes e assumem diferentes formas e distintos conteúdos: da síntese histórica à perspetiva futura, da experiência vivida à projeção de um horizonte distante, do discurso expositivo à expressividade da imagem, do relato sobre aquilo que foi feito à expressão do desejo de concretizar o muito que ainda está por fazer.



PA RC E R I A

DISPONÍVEL ONLINE www.culturanorte.gov.pt


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