CULTURA DE BANCADA - NÚMERO 8 - 12 DE DEZEMBRO 2021
1
2
3
EDITORIAL Director J. Lobo Redacção L. Cruz G. Mata J. Sousa Design S. Frias M. Bondoso Revisão A. Pereira Convidados Mickaël Correia Rui Quinta Luís Americo Eupremio Scarpa Tiago Sampaio Ivo Costa Pli Matteo Falcone Ângelo Rega P. Alves
4
Todos as vitórias que celebramos têm um preço e, embora haja quem reconheça a forma como elas são pagas, há também quem não possua a mínima noção sobre como isso é feito e presuma que as mesmas são gratuitas. Que enorme erro. Nada acontece por acaso e essa ignorância, fruto de algum desconhecimento do tema ou não, em nada ajuda para a evolução de uma Cultura. Não é difícil entender as entrelinhas presentes nestas palavras. O difícil é materializar esse entendimento. Não se preocupem, nós fornecemos uma pista: http://adeptosportugal.pt/associa-te-a-nos/formulario-inscricao-online/ Em nome desta equipa, que não esconde a sua proximidade à Associação Portuguesa de Defesa do Adepto, prestamos reconhecimento a todos os que participaram no trabalho conduzido pela APDA, pelo seu empenho e sacrifício. Por aquilo que se iniciou em 2018, quando o cartão ainda era apenas uma figura presente na proposta de alteração à lei, que vigorava à data, até à revogação do cartão. Revogação que se concretizou mas, convém dizer que, manteve-se toda a carga negativa que o envolvia. Por isso aquilo que poderia ser uma vitória tornou-se num golpe baixo de partidos conhecidos por todos, o PS e o PSD. Quem, no passado, conseguia acreditar que os adeptos se poderiam organizar e dar um passo a este nível? Como em tudo podemos ver o lado mau ou o lado bom das coisas mas, sentimos que, a Cultura das bancadas portuguesas vê hoje uma oportunidade de seguir o caminho que tem sido construído. Esperamos que mais queiram abraçar a missão de colaborar na construção do nosso modo de estar no desporto e sonhem com que seja possível atingir o nível das bancadas de outros países, como as alemãs. Será que os egos pesam mais que os valores? Será que preguiça é uma força maior que a vontade? Será que podemos esperar que outros trabalhem sozinhos por nós e pelo nosso futuro? Estamos perante uma janela de oportunidades. Esperamos que seja possível reforçar a, já existente, comunhão de esforços para a manter aberta por muito tempo. Afinal, “Aquele que não luta pelo futuro que quer, deve aceitar o futuro que vier”. Boa leitura e não se esqueçam de partilhar este projecto com os vossos amigos!
APDA Um futuro para os adeptos O 10 de Novembro foi o dia escolhido para a tão esperada discussão, no parlamento, sobre a revogação do cartão do adepto. Fica a memória de há três anos, por estes dias, estarmos a preparar a primeira manifestação de adeptos a nível nacional, que estava agendada para 17 de Novembro de 2018, antes da votação da proposta de lei que traria o cartão dos adeptos para as bancadas nacionais. Nesse dia estiveram reunidos, em silêncio, em frente à Assembleia da República cerca de 100 pessoas. Foi o início de uma luta, e tal como foi dito nessa intervenção que a APDA realizou no final dos 90 minutos em silêncio, a partir daquele dia muito mais adeptos abraçariam esta causa, assim foi. Desta vez não podia ser diferente e a Associação Portuguesa de Defesa do Adepto tratou de organizar um novo protesto direccionando todos os holofotes para o que iria ter lugar na Assembleia da República. Dias antes foram lançados os parâmetros de uma iniciativa que consistia em todos os grupos de apoio nacionais exibirem a mesma frase, no mesmo dia. A frase era simples, “A bancada tem salvação, revoguem o cartão!”, e identificava facilmente os destinatários, os partidos. Era um apelo antigo, curto e directo que procurava chamar à consciência aqueles que poderiam efectivamente fazer cair a vergonhosa sugestão que, em Outubro de 2017, o presidente da Federação Portuguesa de Futebol, Fernando Gomes, levou à audição parlamentar. Não, não foi o Secretário de Estado da Juventude e do Desporto João Paulo Rebelo que “inventou” esta medida, este apenas a defendeu respeitando a agenda política do seu Governo, por outras palavras, do Partido Socialista. Fica registado, para memória futura, que o principal culpado desta medida ter chegado à esfera política foi aquela figura de nome Fernando Gomes. Então, no dia 8 de Novembro, 31 grupos com a adição de mais 2 que se juntariam no dia
seguinte, representando um total de 26 clubes, exibiram a mesma mensagem por todo o país. Deviam ser bem mais, mas “cada cabeça, sua sentença”. Ainda assim as reacções foram muitas e potenciaram que vários clubes se voltassem a manifestar, partilhando a ideia da revogação do cartão. Inclusive Pinto da Costa, presidente do clube com mais adeptos filiados neste cartão, contestou esta medida estéril. Primeiro objectivo alcançado e tinham sido lançados para a mesa praticamente todos os trunfos que os adeptos possuíam. 11 de Novembro, por fim tinha chegado o dia que todos esperavam e havia três propostas em cima da mesa, as quais seriam levadas à discussão. A primeira da Iniciativa Liberal, a segunda do Partido Comunista Português e a terceira do Chega. Ambas tinham em comum a revogação do cartão, destacando-se a do PCP pela ampla revisão que sugeria. A Associação Portuguesa de Defesa do Adepto esteve presente, como não poderia deixar de ser, mas a Cultura de Bancada também se fez representar. Saltou à vista, durante a discussão, um ponto importantíssimo: a maioria dos presentes estava mais preocupada em conversar para o lado do que em ouvir o que havia para dizer. Aquele ruído é algo que fica na minha memória com alguma desilusão. Sobre as intervenções foram várias as que defenderam os adeptos, diga-se a maioria, mas também houve espaço para assistir à estigmatização dos adeptos e dos grupos organizados por parte de partidos como o Partido Socialista. O mesmo partido que em 2008 se opôs à criação de uma lista de pedófilos, argumentando entre outras coisas que esses tinham direito a uma segunda oportunidade. Os mesmos que são a favor de uma lista de milhares de adeptos que, ao contrário dos pedófilos, nunca foram condenados e mesmo assim não têm direito à primeira oportunidade. Constata-se que não se importam de tratar os
5
adeptos e principalmente os grupos organizados como adeptos potencialmente perigosos. Já tive oportunidade de dizer em alguns locais, mas convém repetir para informar todos aqueles que desconhecem ou não se lembram. Exceptuando as raças definidas por lei, até os cães têm direito a ferrar a primeira vez antes de serem tratados com presunção de culpa, ou seja, serem cães potencialmente perigosos. A parte não é o todo, e certamente não é todo o PS, mas foi uma vergonha o que se viu por parte dos Socialistas durante todo este processo e nem no final tiveram a dignidade de reconhecer o seu tremendo erro. No final a proposta da IL tinha passado enquanto as do PCP e do Chega foram chumbadas. Na proposta que passou há um sinal preocupante, a abstenção do PSD e da grande maioria do PS. Devo dizer, em abono da verdade, que foram 8 os deputados que fugiram à disciplina de voto do PS e votaram a favor da revogação, na proposta da IL. Esta abstenção tornava-se perigosa pois, o capítulo da revogação do adepto, ainda não estava fechado. Esta proposta seguia agora para a fase de especialidade. Em tons de conclusão, desta parte, quero referir que a lei que rege, todos os cidadãos, já tinha mecanismos de prevenção e combate à violência suficientes. Muito por culpa da incompetência dos sucessivos governos, e também do IPDJ, a lei não era correctamente aplicada, mas agora está a ser. Não precisavam de inventar mais nada para tentar substituir o cartão! E foi com essa preocupação que saí daquele local após ouvir as intervenções dos
6
deputados do PS e do PSD. Na especialidade tivemos notícias amargas. O cartão tinha sido revogado mas a discriminação iria continuar, desta vez sem ferramentas administrativas, “apenas” com o Cartão de Cidadão. As zonas vão-se manter, assim como o seu propósito anterior, funcionando como verdadeiros guetos para aqueles que são tratados como adeptos potencialmente perigosos. A liberdade de expressão, entre outras, continuava também ferida. Esperava-se mais, muito mais. No final de tudo, aquilo que devia ser uma vitória foi dos adeptos e tornouse uma “facada nas costas” infligida pelo PS e PSD. Jamais iremos esquecer esta atitude! Ainda assim, é importante sublinhar o facto de os adeptos, junto com as suas preocupações, terem alcançado algum espaço e voz junto, de um segmento, do espectro político nacional. Que ninguém duvide, sem o projecto que se iniciou em 2014 e se formalizou oficialmente em 2016, a Associação Portuguesa de Defesa do Adepto, isto não era de todo possível. Um trabalho que deve ser continuado. Por fim digo, hoje enquanto adepto, aprendi da pior maneira mais uma lição. Que ninguém duvide, o nosso caminho só se faz caminhando, com a consciência que teremos inúmeros obstáculos pela frente e, muito provavelmente, sem encontrar atalhos que nos facilitem o alcançar dos nossos objectivos. Que todos façamos os possíveis para garantir que, esta caminhada, não é em vão. “Por vezes ganhamos, por vezes perdemos, mas nunca desistiremos!” Por J. Lobo
7
8
Polónia, um país da Europa central, banhado pelo Mar Báltico. Pode dizer-se que a história deste povo é rica em instabilidade, tal como o mar em dias revoltos. Após vários estados, a partir de 1795 até à independência em 1918, a Polónia desapareceu do mapa. A história diz-nos que em 1815, no Congresso de Viena, as potências decidiram que o território polaco deveria ser dividido entre Prússia, Áustria e Rússia. A liberdade dos nativos foi atacada e os seus costumes foram sendo proibidos, uma vez que o centro da Polónia foi entregue à Rússia e muitos polacos exilaram-se e emigraram. Os resistentes não conseguiram fazer face ao imperialismo, terror e opressão russa. É neste contexto que Henryk Jordan se evidencia. Jordan foi doutor, professor universitário e activista social, tendo se destacado através dos seus estudos, experiência de vida e da vontade de ver as suas gentes evoluírem. Foi pioneiro na implementação da Educação Física nas escolas do país. É pela sua mão que aparece a primeira bola de Futebol em Cracóvia, a primeira a rolar em solo polaco. A prática do jogo foi se difundindo até que, no início do século XX, após vários jogos entre duas equipas casuais de habitantes de Cracóvia e o Czarni Lwow (de Lviv), intensificaram-se os treinos para em Setembro de 1906 surgirem a “Akademicki Klub Footballowy Cracovia” e o “Przodownicy”. Durante o inverno seguinte, ambas as equipas se fundiram sob o nome “Akademicy”, que deu origem ao actual K.S. Cracovia. Os incidentes são algo que “sempre” acompanhou o Futebol daquele país, sendo o primeiro registo de tal situação em 1908. Fosse por falta de condições dos campo e falta de organização, fosse por rivalidade entre adeptos, por invasões de campo, por razões de origem étnica ou religiosa, servem de exemplo os casos de cidadãos polacos que não toleravam outros polacos por serem judeus. O território polaco foi ocupado pelo exército alemão em 1915, durante a Primeira Guerra Mundial. Em 1918 a nação polaca festejou a sua independência. Por essa altura, a média de espectadores na bola era de 2500 pessoas, sendo que os clubes que mais adeptos mobilizavam eram o Ruch Chorzow e o Cracovia.
9
É a partir da década de 1920 que se percebe que o ambiente em torno das quatro linhas podia influenciar o jogo, fosse através de apoio, fosse através de hostilidade para com adversários e para com árbitros. Começam a proliferar as rivalidades, ao passo que em alguns jogos havia deslocações de milhares de adeptos a terrenos adversários, indo de autocarros ou comboios. Na segunda metade dessa década, surgem os primeiros cânticos nas bancadas, sendo os mesmos adaptações de gritos de guerra. Devido à obsessão de Adolf Hitler em aumentar o domínio alemão, a 1 de Setembro de 1939 cerca de 1,5 milhões de soldados germânicos invadem o território polaco. Dá-se início à Segunda Guerra Mundial, uma vez que França e Inglaterra estavam contra a Alemanha e firmaram um acordo com a Polónia. Ao dia 17 do mesmo mês, a União Soviética também invade a Polónia pelo lado este, algo que tinha sido acordado com o governo de Hitler, apesar de ser impensável ao olhos da maioria. O exército polaco não conseguiu evitar a derrota, uma vez que combateu sozinho contra duas potências, fruto da falta de compromisso de franceses e ingleses. A derrota foi consumada a 28 de Setembro, dia em que Varsóvia foi ocupada pelos nazis. Durante seis anos de guerra, morreram cerca de seis milhões de polacos, três dos quais judeus. Após a segunda grande guerra, os clubes e o modelo de competições sofreram alterações profundas, sendo aplicado o modelo soviético. Os clubes viram-se obrigados à alienação a ministérios ou associações comunistas, a mudarem de nome, de símbolo e de cores dos equipamentos. No anos 60 surge o primeiro cachecol relativo a um clube, de um adepto do L.K.S. Lodz. No final dessa década há uma deslocação que se torna histórica. O Polonia Bytow foi jogar a casa do Gornik Zabrze. Um grupo de Bitow apresentou-se todo munido de cachecóis, algo nunca visto. Ao longo do tempo os adeptos do Polonia Bytow foram uma referência. Muitos adversários viajavam para ver a sua performance nas bancadas, uma vez que foi por eles que se deu uma grande evolução no que a cânticos diz respeito tendo também eles introduzido as bandeiras.
10
Confrontos de grande escala entre adeptos tiveram lugar nos 70’s. Era habitual acontecerem nas imediações dos estádios e nas estações de comboio, não só entre adeptos, mas também com a polícia do governo opressor russo. Diversos movimentos políticos desde cedo perceberam que o Futebol era um meio no qual era fundamental implementarem-se, ainda para mais nessas décadas em que o país estava afundado numa grave crise. Todo o ambiente social contribuiu para proliferação do movimento Hooligan, algo que aconteceu nos anos 80 e 90. Os “gitowcow” dominavam as ruas e as bancadas, tendo uma postura de procura constante de confronto com as demais tribos urbanas, como hippies ou punk’s. Um movimento político denominado de “Solidarnosc” foi fundado em Agosto de 1980, o qual combatia o poder russo no seu país. À frente desse movimento estava Lech Walesa, ele que é adepto do Lechia Gdansk. Aconteceu que o povo polaco revoltou-se durante vários anos contra a opressão russa e as gentes de Gdansk acabaram por ser fundamentais na recuperação da independência. Enfrentaram as autoridades russas, elas que castravam a liberdade do povo, servindo de exemplo disso o facto de agredirem, prenderem e torturarem quem se expressasse efusivamente ou quem usasse cachecóis. Devido à união e sentido de missão, os adeptos do Lechia Gdansk fizeram do seu estádio um bastião da luta. Era o local onde as pessoas se sentiam confortáveis para protestar, chegando a alargar esse espaço para as ruas, onde em massa protestavam em cortejo, antes e após a bola rolar. Em 1989, o poder soviético cai e Lech Walesa e os seus formam governo. Nos anos 90, o país foi alvo de uma reestruturação que deixou as ruas sem lei, refém de mafiosos, nas quais eram habituais os confrontos entre gangues. Os grupos aproximados ao Hooliganismo voltam a focar-se nos seus rivais e nos seu ódio às autoridades. Surge então um acordo entre a maioria dos grupos para que o uso de armas de fogo fosse afastado dos confrontos. Até meados dos 90’s, o material de apoio predominante nas bancadas eram bandeiras de pequenas dimensões, grande parte delas com as cores dos clubes e com curtas inscrições. Por essa
11
altura, começam a aparecer as bandeiras de grandes dimensões, como também faixas, estandartes e pequenas coreografias, nada muito sofisticado como é natural. Por sua vez, a pirotecnia era usada, mas não muito, visto que a mesma era acessível somente nas cidades portuárias e era cara. Enquanto isto, a maioria dos grupos hooligans remava para mudar o paradigma do seu movimento. Com mais honra e menos cobardias nos seus actos, reprovavam o uso de qualquer tipo de arma em confrontos. A polícia também evoluiu e os hool’s procuraram estar à vontade. O movimento expandiu-se para fora do âmbito dos jogos, tendo os grupos começado a treinar assiduamente artes marciais e musculação e organizando campeonatos de lutas em florestas e até mesmo em arenas. Além disso, reprovavam a ingerência de álcool e drogas, visto considerarem que essas substâncias prejudicam as suas performances. Tudo isto em soma à capacidade de mobilização e enorme predisposição para se deixarem dominar pela a adrenalina de um confronto, faz do movimento hool polaco um dos mais fortes do mundo, se não o mais forte. Em Cracóvia, cidade de origem do K.S. Cracovia e do Wisla, vive-se uma realidade à parte. O derby entre as duas equipas é apelidado de “guerra santa” e põe em acção duas massas adeptas que nunca aderiram aos pactos de não uso de armas, sendo que as facas são muito usuais no dia-a-dia de ambos os lados, o que proporcionou diversas mortes ao longo de mais de um século de embates. Neste, como em muitos jogos que opõem os rivais, é habitual exibir e queimar cachecóis, faixas, bandeiras ou camisolas roubadas ou conquistadas aos adversários em plena bancada. A partir de 2001 dá-se um crescimento exponencial do número de grupos e elementos ligados à onda Ultra. Passara a haver grupos mais numerosos, como também mais organizados, o que trouxe maior expressão a cada um deles, consequentemente criando mais espetáculo de bancada. O jogo de bancada tornou-se muito mais colorido, deixando de estar tão sujeito às nuvens cinzentas da violência. Com mais pirotécnia, com mais investimento na produção de material coreográfico e do comum material de apoio. Apesar da pirotécnia ser muito usada, a mesma é proibida pelas
12
autoridades. O controlo é apertado, o que levou a que os ultras e hooligans polacos sejam peritos em dar a volta à polícia. Há ainda o facto de alguns grupos de apoio terem acordos com os clubes que contemplam a aceitação do uso deste tipo de artefactos e o pagamento de multas a entidades organizadoras e à policia. Em 2007 fundou-se uma associação que une muitos grupos de apoio. Cerca de quarenta associações de adeptos e demais adeptos singulares dão corpo a esta organização, a qual tem oportunidade de fazer ouvir a voz dos adeptos em reuniões da liga polaca e em sessões parlamentares, como no caso da criação e debate de leis dirigidas aos adeptos, tais como o “cartão do adepto” local, que teve outros moldes em relação ao caso português. Este é um movimento de adeptos de extremos, capaz de ter associações ao crime organizado e, por outro lado, também são capazes de organizar muitos eventos e ações nobres, como doações de sangue e acções de beneficência para com crianças carenciadas. Por L. Cruz
13
GABRIELE SANDRI Sábado à noite, Gabriele estava reunido com os seus amigos do Excalibur, bar conhecido dentro do tifo laziale, onde preparam a ida ao jogo do dia seguinte. De seguida a habitual presença a trabalhar como DJ numa discoteca em Roma até altas horas da madrugada. Mal regressa ao bar, envia a última SMS a Lorenzo de Silvestri (jogador da Lazio): «Força Lò, acabei de tocar mesmo agora. Como é hábito estamos a arrancar para vos conduzir à vitória. Sempre com vocês». Num domingo normal como tantos outros, Gabriele fez-se à estrada com os seus amigos para ver a sua Lazio jogar em Milão com o Inter. Aquando da sua paragem numa estação de serviço em Arezzo, sucedeu-se um confronto com alguns adeptos da Juventus, pertencentes ao Juventus Club di Roma, que ali estavam a caminho de Parma. A polícia stradale (ndr: brigada de transito), presente no sentido inverso da autoestrada, tentou sanar o conflito com disparos. Infelizmente o segundo tiro acertou fatalmente em Gabriele quando este já se encontrava dentro da viatura. A partir deste momento, foi mais um dia longo de confrontos entre ultras e a polícia em vários pontos de Itália e que mudou drasticamente o mundo ultra italiano. As primeiras notícias começam a circular passado algumas horas. Primeiramente, atribuem a morte ao confronto entre adeptos, para depois acrescentarem a ocorrência de tiros entre adeptos violentos. Apenas pelas 13 horas a informação é corrigida e é atribuído o disparo ao agente da polícia. A Federação Italiana, antevendo o que se poderia passar, procedeu praticamente de imediato ao adiamento do Inter x Lazio de modo a tentar pacificar as curvas e, nos outros jogos garante 10 minutos de atraso. Mas, por todo o país, foram despoletados focos de tensão contra as autoridades principalmente em Bergamo onde decorreram longos confrontos entre
14
atalantinos e milanistas contra a polícia até que, finalmente, o jogo foi suspenso. A mensagem dos Ultras era clara: suspender de imediato os campeonatos e jogos como tinha acontecido na morte do inspector Raciti há uns meses atrás. Como isso não foi decidido, a violência foi a forma encontrada para “obrigar” as autoridades a respeitar os Ultras e, sobretudo, o luto pelo assassinato cobarde de Gabriele. Não podia haver mortos de primeira e mortos de segunda! Ao cair da tarde várias esquadras em Roma e Milão foram alvo de ataques e os confrontos prolongaram-se noite dentro. O funeral decorreu 3 dias depois. De toda a Itália vieram centenas de Ultras (no total estiveram cerca de 5000 pessoas no funeral), onde também marcou presença todo o plantel da Lazio, dirigentes, alguns jogadores da rival Roma (nomeadamente o capitão Totti) e o treinador, e outras personagens da cidade e outros clubes. Particular destaque para os ultras da Roma que, embora grandes rivais da Lazio e dos seus ultras, estiveram sempre presentes em grande número no funeral. Após o mesmo, foi realizado um cortejo pelas ruas da cidade com todos os ultras presentes, com o mote e objectivo de reclamar justiça para este caso.
15
Nota também para o primeiro derby de Roma depois do incidente, onde novamente Francesco Totti acompanhado por capos de dois grupos romanistas e dos Irriducibili foi depositar uma coroa de flores na pista de atletismo em frente à Curva Nord. A somar à morte do polícia Raciti, uns meses antes em Catania, esta morte levou a que a Federação italiana avançasse para a aplicação da Tessera del Tifoso no ano seguinte. Um duro golpe num movimento de milhares de pessoas que se viram impedidas de viajar por este instrumento político. Hoje, após 14 anos, ainda se fazem sentir restrições em jogos de alto risco. Em 2008, Luigi Spaccarotella voltou ao serviço sem que o processo de homicídio estivesse concluído! Apenas em 2012 é condenado a 9 anos e 4 meses de prisão pelo homicídio, dos quais apenas cumpriu 5, tendo-lhe sido concedido regime de semiliberdade, podendo passar o dia fora da prisão e começar a trabalhar. Passados 14 anos, a memória de Gabriele Sandri, vítima do estado italiano, permanece viva em vários grupos e cidades italianas e europeias, que todos os anos o continuam a homenagear com frases, publicações, etc. A nossa homenagem é apenas mais uma. Gabriele Vive! Por M. Bondoso
16
17
À CONVERSA COM MICKAËL CORREIA Hoje o convidado escolhido para participar nesta nossa, já habitual, rúbrica é o Mickaël Correia. Mickaël Correia é jornalista independente e vive actualmente em Paris. É autor de vários artigos que focam movimentos sociais e da cultura popular, e também escreveu o já conhecido livro, entre muitos adeptos, de nome “Uma história popular do futebol”. Desde já queremos agradecer ao Mickaël por ter aceite o nosso convite. Quem é Mickaël Correia e qual a sua relação com o futebol enquanto adepto? Sou jornalista na casa dos trinta anos, nascido no norte de França, de uma família de trabalhadores imigrantes portugueses, originários da Covilhã. Como adepto, sempre gostei muito do Leões da Serra (o meu avô paterno era sócio do clube e foi o responsável pelo desenho das “linhas brancas” do campo de futebol nos anos 60) e do Olympique de Marseille (os anos 1991-1993, e depois fui e ainda sou um grande fã de JeanPierre Papin). Mas eu sou, sobretudo, membro do Collectif Red Star Bauer, que representa o kop do Red Star de Saint-Ouen, um clube de futebol histórico e popular nos subúrbios parisienses. A nossa bancada é conhecida pelas suas raízes sociais neste subúrbio da classe trabalhadora de Paris e também pelo seu empenho anti-fascista e anti-racista. Considera que ser adepto tem importância relevante na sua vida e na sua construção pessoal? Sim, é claro! Paris é uma cidade muito segregada socialmente, e a kop do Red Star é um espaço metropolitano raro onde pessoas de diferentes origens sociais e cores se misturam em torno da mesma paixão. É importante para mim continuar a estar enraizado na realidade social desta grande cidade. E manter o kop, animando o estádio, é também uma forma de lutar contra a
18
gentrificação que está a afastar cada vez mais os pobres dos centros urbanos. Qual é, para si, a importância que o desporto tem numa comunidade? Do meu ponto de vista, como filho de um imigrante, e vendo a importância do futebol para a comunidade portuguesa, os clubes de futebol imigrantes aqui conseguiram recriar e manter os laços entre os exilados que tiveram de deixar Portugal e cujos laços de aldeia ou vizinhança foram explodidos por causa do exílio. Este é um papel social imenso, ainda demasiado subestimado. Mas de uma forma mais geral, o desporto como factor comunitário é sinónimo de solidariedade, identidade colectiva e laços sociais entre gerações. Como falamos na apresentação, o Mickaël é autor de um livro, o que o motivou a escrever? Diz-se sempre que são os vencedores, ou pelo menos os dominantes, que escrevem a história. No caso do futebol, há uma história oficial, marcada pelas grandes competições nas mãos das federações, com as suas lendárias equipas e heróis míticos como Pelé. Esta história destaca o futebol de elite e transmite uma certa visão do futebol, a do simples entretenimento comercial, da cultura de massas, com o mesmo refrão: “O futebol é apenas desporto, não é política.”
Queria olhar para o futebol como um objecto social e cultural, para explorar a sua dimensão política. Escrever uma história popular, uma história do futebol “a partir de baixo”, significava, antes de mais, voltar a dar destaque ao futebol que é jogado todos os dias, em pequenos clubes amadores, bem como na rua, por milhões de jogadores. Consegue resumir, para os nossos leitores, o conteúdo do livro? Em resumo, o meu livro mostra que o futebol sempre foi um espaço de resistência à ordem estabelecida, seja ela burguesa, ditatorial, patriarcal ou colonial. Conto como ao longo da história moderna, o futebol tem sido, e continua a ser um, instrumento de emancipação para diferentes grupos sociais oprimidos ao longo da história: trabalhadores assim como povos colonizados, mulheres assim como jovens precários de bairros de classe trabalhadora. Qual o papel do futebol popular? O futebol popular é, mais do que nunca, um veículo de protesto. Poucas pessoas o sabem, mas os adeptos de futebol desempenharam um papel fundamental durante a Primavera Árabe de 2011, o movimento Gezi de 2013 em Istambul, Turquia, ou o Hirak de 2019 na Argélia. No Egipto, os primeiros slogans hostis ao regime autoritário de Mubarak foram ouvidos nos estádios do Cairo, onde os adeptos sofreram uma repressão policial feroz pelo seu protesto nas bancadas já em 2007. Estes desenvolveram práticas de autodefesa contra a polícia. Quando o movimento revolucionário egípcio irrompeu, em Janeiro de 2011, estes apoiantes tornaram-se o “braço armado” da defesa da Praça Tahrir. Tanto que muitos observadores disseram: “Durante a ocupação de Tahrir, pensámos muitas vezes que estávamos no estádio”. Ainda hoje, as bancadas, especialmente recentemente na Argélia, Chile e Brasil, continuam a ser um dos raros espaços de liberdade para os jovens. Libertos dos grilhões do Estado e da família, são o lugar onde se pode forjar uma verdadeira cultura política e proclamar a aversão ao regime em vigor. Mais genericamente, podemos ver que o
imaginário do futebol popular está gradualmente a irrigar o movimento social. O slogan agora generalizado “ACAB” provém das bancadas inglesas dos anos 80. As palmas e as bombas de fumo, dois atributos da cultura dos estádios, são também cada vez mais utilizados em demonstrações. E como já foi mencionado, o futebol de base, o futebol de bairro, desempenha um papel social importante, uma forma de construir comunidade num mundo cada vez mais atomizado, tecnologicamente supervisionado e digitalizado...
Futebol e política misturam-se? Ou depende bastante do país e da estrutura social do mesmo? Deve haver alguma linha que os separa sob pena de servir de segmentação ao invés de congregar? O futebol é intrinsecamente político, ao contrário do que as instituições do futebol nos querem fazer crer. Um desporto que reúne milhares de milhões de jogadores em campos em todo o mundo e que angaria tanto dinheiro tem em si uma forte dimensão política. O poder político do futebol reside no facto de ser
19
simultaneamente uma linguagem corporal e uma prática muito simples, facilmente apropriada por todos. Na popular ética do futebol, a principal força motriz é o prazer e o desejo de competir com os outros. Mas o prazer é muitas vezes o primeiro passo para a emancipação. Hoje, desde há vários anos, os adeptos portugueses, mas não só, estão privados de manifestarem nas bancadas os seus pensamentos, seja por forma de tarjas ou de outros meios. Esta censura será motivada por questões no âmbito do combate à violência nos estádios, como a apresentam, ou terá outra motivação por trás? Já nos anos 90, na Europa, foi posto em prática um verdadeiro arsenal jurídico para atingir especificamente os apoiantes. Hoje, podemos ver que todas as leis anti-terroristas, todas as leis relativas ao registo generalizado da
população foram testadas, pela primeira vez, em apoiantes a partir de meados dos anos 2000. Os apoiantes têm sido realmente as cobaias destas novas práticas de repressão policial e legal
20
(videovigilância, arquivo, medidas legais muito específicas tais como proibições de estádios) que são actualmente aplicadas a movimentos sociais, particularmente o arquivo de activistas femininas. O que vemos com o cartão de adepto é um passo em direcção a uma vigilância generalizada, mas sobretudo a vontade de livrar os estádios dos seus elementos mais vingativos, a fim de acabar de transformar os estádios em Disneylândia, e o futebol num produto económico vulgar. Os adeptos defendem o futebol popular, enraizado na história social do seu clube. Exigem, entre outras coisas, bilhetes acessíveis e a possibilidade de animar as bancadas com bombas de fumo. Querem ser considerados como jogadores plenamente democráticos na cena futebolística, como sindicalistas em qualquer indústria. E isto não está de modo algum de acordo com a visão dos investidores
do futebol como um produto desencarnado e desmaterializado que pode ser vendido em todo o mundo.
O papel associativo na vida dos clubes tem vindo a perder espaço fruto da transformação do futebol num modelo de negócio. Acredita que os movimentos organizados, sejam associações de adeptos ou grupos ultras, podem ter um papel importante na defesa do interesse do adepto? Acha que ainda é possível reverter os efeitos negativos que o futebol negócio, dos nossos tempos, trouxe para a cultura dos adeptos? Um dos maiores contra-poderes para os excessos comerciais do futebol nos dias de hoje são os adeptos. Tornaram-se verdadeiros actores democráticos na cena do futebol, verdadeiros sindicalistas que defendem as suas exigências e interesses (bilhetes acessíveis, possibilidade de animar as bancadas com bombas de fumo, críticas à hipersegurança dos estádios, etc.). Face aos poderes mercantis, os adeptos continuam a ser os guardiões da história do seu clube e da alma popular do futebol. E estes últimos não hesitam em entrar em greve nas bancadas, invadir o campo ou insultar directamente os treinadores ou jogadores. Tal como cada vez mais pessoas procuram mais democracia directa e horizontalidade, os adeptos querem ter uma palavra a dizer e não deixar o futebol nas mãos de especuladores. Uma das formas de avançar é através das cooperativas de adeptos, que surgiram em Inglaterra no final dos anos 90 como reacção à extrema liberalização económica do futebol no Reino Unido. Os adeptos criaram um sistema de participação popular sob a forma de cooperativa com o objectivo de comprar parte ou mesmo a maioria do seu clube (como o AFC Wimbledon, Exeter City ou Portsmouth FC) e poder estar representados nos órgãos directivos. Outros criaram mesmo o seu próprio clube auto-gerido, tais como os adeptos do Manchester United. Os clubes são, provavelmente, das instituições que movem e congregam mais gente. Como comenta a importância deste facto? Em 1970, Pier Paolo Pasolini escreveu que “o futebol é a última representação sagrada do nosso tempo” e que é “o espectáculo que substituiu o teatro”. O futebol é um jogo muito simples, e durante um jogo (que dura
90 minutos, em média, como a duração de um filme) é possível sentir todas as emoções, desde a raiva a um sentimento de injustiça, bem como de alegria ou humilhação. Poucas experiências o fazem sentir todos estes sentimentos num curto espaço de tempo, o que é um dos factores que explica a popularidade deste jogo. Também vivemos num mundo com cada vez menos grandes rituais colectivos, e o futebol, com as suas épocas, a sua Liga dos Campeões anual, o seu Campeonato do Mundo de quatro em quatro anos, oferece-nos estes grandes momentos de comunhão que são raros nas nossas sociedades capitalistas. Finalmente, à escala de um clube e da bancada, podemos rapidamente convergir: um emblema, cores, canções populares fáceis de recordar, uma história desportiva para partilhar, tudo isto constitui um conjunto de valores, um espaço da comunidade que torna possível que pessoas muito diferentes em termos de origem, classe social, etc., se juntem. Esta é uma das belezas deste magnífico desporto. Em tempos o futebol era um jogo quase exclusivo para homens. Isso mudou? De que forma as bancadas, os campos e os camarotes, na perspectiva da gestão, se têm moldado acompanhando a afirmação do papel feminino na sociedade? Em Inglaterra, durante a Primeira Guerra Mundial, as trabalhadoras das fábricas de armamento aproveitaram a menor dominação masculina - devido à presença de homens na frente de batalha - para se emanciparem. Pediram para serem autorizadas a jogar futebol, o passatempo do seu pai, irmão ou marido. Foram formadas cerca de 200 equipas de mulheres trabalhadoras e futebolistas. Estas pioneiras do futebol feminino tornaram-se extremamente populares: em 1920, mais de 50.000 espectadores assistiram a um jogo entre duas equipas femininas em Liverpool. Esta é uma história que foi completamente varrida para debaixo do tapete. No entanto, alimentou a primeira onda de feminismo, um movimento liderado por activistas sufragistas em particular. Estas mulheres futebolistas mostraram grande persistência e coragem perante o ridículo
21
Como vê a cultura de adepto em Portugal? Não o conheço muito bem e depois há este sistema de sócios em Portugal que não existe em França. Tenho a impressão, à distância, que a extrema direita também está cada vez mais presente nas bancadas dos grandes clubes em Portugal como em França, e que há uma enorme quantidade de trabalho a ser feito na luta contra o racismo e a homofobia nos estádios. Por outro lado, penso que em Portugal existem ainda muitos clubes e associações de bairro que ainda estão muito presentes, mas que devem ser assumidos pelos jovens, caso contrário desaparecerão.
e a relutância dos homens e das federações de futebol. O futebol feminino tornou-se, desde então, um foco de politização. Considerada uma das melhores futebolistas femininas do mundo, a capitã da equipa feminina americana Megan Rapinoe tem sido uma forte defensora dos LGBT+ e dos direitos das mulheres, tornou-se um ícone anti-Trump no período que antecedeu o Campeonato Mundial de Futebol Feminino de 2019, e organizou uma greve de futebol feminino contra a sua federação por “discriminação institucionalizada do género” e ganhou a igualdade salarial. Finalmente, a norueguesa Ada Hegerberg, que foi coroada a melhor futebolista feminina do ano em 2018 e campeã europeia múltipla, boicotou o Campeonato do Mundo de 2019 porque culpa a sua federação pela falta de recursos atribuídos às equipas femininas em comparação com as masculinas. É um enorme sacrifício que não se veria de futebolistas masculinos.
22
Que caminhos aponta para o reforço da cultura do adepto? Penso que é essencial criar ligações entre apoiantes de clubes diferentes, mas com os mesmos valores partilhados. No Red Star, convidámos pessoas da Associação Desportiva e Recreativa “O Relâmpago” (ADRR) em Lisboa, ultras da USM de Argel(da Argélia), e ultras de Potsdam (da Alemanha) para falar sobre a sua história e o que fazem nas suas bancadas e na sua vizinhança. Isto permite-nos partilhar as nossas experiências, organizar-nos colectivamente, reunirmo-nos e sentirmo-nos menos sós face aos excessos do negócio do futebol. O que acha das fanzines enquanto meio de comunicação? Considera que têm importância para o desenvolvimento desta cultura nas pessoas? Sim, é um meio histórico de comunicação da cultura de adeptos que vemos renascer. Como qualquer movimento social, é importante ter os seus próprios meios de comunicação. E a fanzine é também uma forma de criar uma comunidade. Já conhecia a Cultura de Bancada? Sim, graças a alguns amigos portugueses. Uma mensagem final para os nossos leitores? Envolve-te no teu clube local, é aí que a luta começa!
23
AUTOCOLANTES DA BANCADA
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
CRC Quinta dos Lombos x SC Braga/AAUM | 09-10-2021 Cerca de quatro dezenas de braguistas, mais concretamente da Bracara Legion, viajaram até Carcavelos, em Cascais, para incentivar a sua equipa de futsal. Algo muito pouco habitual no nosso país, no que a modalidades diz respeito, principalmente quando se trata de uma fase regular e sem qualquer motivo “especial” no que toca a resultados. Importa dizer que os ultras do Braga têm-se mostrado muito activos no apoio a esta formação, criando bom clima também nos encontros em casa. CF “Os Belenenses” x Sporting CP | 15-10-2021 Uma grande noite de um dérbi voltou a ser vivida no mítico Restelo, vários anos depois da equipa de Belém ter recomeçado das distritais. Muito boa moldura humana, apoio constante a ambos os conjuntos, tensão, fumarada... Os azuis ainda estão no Campeonato de Portugal, mas este jogo a contar para a Taça deixou ainda mais saudades do regresso daquele histórico emblema ao mais alto escalão nacional! FC Oliveira do Hospital x Vitória SC | 16-10-2021 O horário não era o mais convidativo (11h00 de um Sábado), mas muitos adeptos vitorianos fizeram-se à estrada para percorrer os mais de 200 quilómetros que separavam Guimarães do Estádio Municipal da Tábua, local deste jogo. Bom apoio, num encontro típico da nossa taça, que culminou numa passagem “suada” dos vimaranenses.
36
CD Trofense x SL Benfica | 16-10-2021 Grande ambiente de jogo de Taça, numa noite de Sábado na Trofa. Estádio muito bem composto (com excepção das zonas destinadas ao Cartão do Adepto, obviamente), grande ambiente de parte a parte, com pirotecnia à mistura! Nota positiva para os Ultras Trofa, que foram uma agradável surpresa, criando um factor de casa importante para quase impedir a eliminação da sua equipa!
Vitória FC x FC Vizela | 17-10-2021 Duelo interessante entre o histórico Vitória, que se encontra no terceiro escalão nacional, e o Vizela, que atravessa um momento positivo na sua história, tanto desportivamente como de presença por parte dos seus adeptos, em especial da Força Azul. Não foi de estranhar que o ambiente no Bonfim fosse um dos melhores desta ronda da Taça. Bom apoio do fervoroso público da casa, acompanhado por (mais) uma boa deslocação vizelense. Nota para o facto de, ao minuto 29, se ter prestado uma sentida homenagem a José Semedo, que infelizmente viu a sua mulher falecer dias antes. Aí, era possível ler uma mensagem aberta pelo Grupo 1910: “Os nossos não deixamos cair. Força Semedo!”.
SC União Torreense x AD Fafe | 17-10-2021 Embate entre duas das equipas com adeptos que mais se destacam nas suas respectivas séries da Liga 3, sendo evidentemente um dos jogos mais entusiasmantes desta 3ª eliminatória da Taça de Portugal, no que a bancadas diz respeito. Os “justiceiros” fizeram questão de incentivar a sua formação logo na partida do autocarro. Quanto ao encontro, bom apoio de ambos os lados, houve muito drama, com golos nos instantes finais, prolongamento, penaltis, imensos cartões admoestados... No final, a vitória sorriu aos de Torres Vedras, criando um bom clima de festa entre Topo SCUT (e restantes sócios) com os seus jogadores.
37
SL Benfica x FC Bayern München | 20-10-2021 Destaque inteiramente para a tarja dos adeptos alemães, mais concretamente por parte do grupo Munich’s Red Pride, com a mensagem “Não ao Cartão do Adepto!”. Não foi a primeira vez que os ultras bávaros mostraram solidariedade em lutas nacionais, uma vez que em 2018 já tinham exibido a seguinte frase: “Basta de repressão e discriminação para os adeptos portugueses”. Quanto ao resto, um estádio bem composto, bom ambiente dos grupos de ambos os conjuntos e sectores destinados ao cartão totalmente vazios. Imagem que deveria de fazer corar de vergonha quem pensa que o cartão é a solução e quer criar visibilidade internacional ao futebol português! Ludogorets x SC Braga | 21-10-2021 Mais de quatro dezenas de apoiantes da formação bracarense presentes na cidade búlgara de Razgrad, na maioria, elemendos da Bracara Legion, digno de destaque. Uma excelente deslocação que foi coroada com uma importante vitória na luta pela passagem à fase seguinte da Liga Europa. CD Santa Clara x FC Famalicão | 23-10-2021 Representação dos Fama Boys na ilha açoriana por mais de uma dezena de elementos, que se fizeram mostrar com o seu material (o possível, tendo em conta o facto de boicotarem o Cartão do Adepto) e com um apoio à sua equipa ao longo do jogo, conseguindo ajudá-la a alcançar a primeira vitória do campeonato. SC Salgueiros x SC Espinho | 24-10-2021 Encontro entre dois históricos do futebol nacional que contou com um excelente ambiente, digno de primeira liga. Neste caso, o encontro era “apenas” a contar para o... Quarto escalão nacional! Alma Salgueirista a comandar as tropas no apoio à formação da casa, enquanto que os Desnorteados viajaram até ao Complexo Desportivo de Campanhã para incentivar o Espinho. No final, a vitória sorriu à equipa da Cidade Invicta, que segue bem encaminhada na luta para seguir à fase de subida...
38
FC Vizela x SL Benfica | 24-10-2021 A equipa vizelense contou com um excelente ambiente, ficando apenas as zonas exclusivas para detentores do Cartão do Adepto sem público. Para os menos habituados ao que se passa fora das quatro linhas, o apoio caseiro foi motivo de surpresa, e quase evitou a vitória encarnada, mas o público daquele emblema minhoto já tem vindo a provar estar ao nível do primeiro escalão neste regresso! Boavista FC x B SAD | 25-10-2021 Jogo que não teria algo de grande destaque, caso não fosse uma decisão surreal proporcionada pelos polícias que se encontravam numa das entradas do Estádio do Bessa. Alegadamente ofendidos por algum cântico entoado por alguns boavisteiros que se preparavam para entrar no recinto, decidiram que um grupo de entre trinta a quarenta adeptos seriam identificados e proibidos de entrar, mesmo com bilhete. Um “castigo” sem qualquer critério e pouco legítimo num Estado de Direito. Debate sobre o Cartão do Adepto em Guimarães | 29-10-2021 Foi na bancada sul do estádio em que habitualmente joga o Vitória SC, contando com uma plateia improvisada e também em directo no Facebook do próprio clube vimaranense, que se assistiu a um debate sobre o Cartão do Adepto. Presença de um moderador (deputado do PSD na AR) e com representação por parte da APDA, da APCVD, da Liga de Clubes e do Vitória SC. A par das intervenções destes últimos também houve tempo para ouvir o Oficial de Ligação dos Adeptos do Vitória, um elemento dos White Angels e um simples sócio do Vitória. Algo inédito em Portugal, tendo em conta os moldes, e que serviu para se trocar argumentação sobre algo que muito tem afectado o público no nosso país. FC Porto x Boavista FC | 30-10-2021 Sempre especial o Dérbi da Invicta, embora este não contasse com o melhor dos ambientes, típico da altura em que foi jogado e das condicionantes existentes (em que o Cartão do Adepto é o maior responsável). Presença razoável de boavisteiros, que foram apoiando a sua equipa, pese embora o resultado negativo que se foi avolumando, sendo também afectados com algumas identificações feitas pela polícia presente. Do lado dos da casa, os ultras portistas estiveram dispersos por vários grupos em diferentes bancadas, com cânticos de incentivo e também com uma tarja (de um dos grupos que boicota o Cartão do Adepto) onde afirmavam que “a Invicta é azul e branca”.
39
Leça FC x SC Salgueiros | 31-10-2021 Tempo chuvoso que não impediu um bom apoio a ambas as formações, já habituadas a isso, tendo em conta o escalão que ocupam. Destaque para presença salgueirista na curta deslocação até Leça da Palmeira, ficando na bancada visitante descoberta. O Elvas CAD x CF “Os Belenenses” | 01-11-2021 Uma visita dos adeptos do emblema da Cruz de Cristo até ao Alentejo é evidentemente motivo de destaque para todos os admiradores da história do futebol nacional, fazendo reviver aquilo que se vivia há algumas décadas atrás. Jogo digno do futebol popular, sem restrições de material, com muito público e, acima de tudo, com uma liberdade de apoiar pouco habitual no nosso país actualmete. Excelente ambiente, com direito a claques de ambos os conjuntos. No final, a vitória sorriu à formação do distrito de Portalegre. FC Bayern München x SL Benfica | 02-11-2021 Pese embora o resultado negativo para os encarnados, nota para o apoio que se foi sentindo na bancada visitante, que ainda deu para ser escutado, por vezes, durante a própria transmissão televisiva. Vários benfiquistas marcaram também presença no encontro da Youth League, que ocorreu durante o dia em Munique. Sporting CP x Besiktas JK | 03-11-2021 Um dos encontros com mais destaque internacional dessa ronda europeia, sobretudo pelos incidentes ocorridos em Alvalade na noite anterior ao encontro. Cerca de duas a três dezenas de turcos foram até às imediações do estádio, entrando em confrontos com os ultras sportinguistas que lá se encontravam à sua espera. O dia de jogo foi, portanto, tenso, com um forte dispositivo policial na cidade lisboeta. Bom ambiente durante a partida, com os adeptos leoninos a ajudarem a sua equipa numa vitória expressiva. Do lado visitante, nota ainda para alguma pirotecnia aberta por parte dos ultras do Besiktas.
40
AC Milan x FC Porto | 03-11-2021 Finalmente um jogo fora de casa europeu em que foram permitidos oficialmente adeptos portistas, sendo que estes corresponderam às expectativas. Boa presença azul e branca em Milão, com destaque para os cânticos, no exterior e interior do estádio, à famosa frase contra as reformas da UEFA (“Stop UCL reforms: Football for millions of fans, not billions of euro”), e para o pano conseguido por parte dos Casuals Porto aos ‘milanistas’. Salientamos esta deslocação dos ultras portistas num artigo especial neste número da fanzine! FC Paços de Ferreira x Sporting CP | 07-11-2021 Estádio Capital do Móvel muito bem preenchido. Centrais com muitos adeptos do clube da casa, enquanto que as bancadas atrás da baliza estavam ocupadas pelos sportinguistas. Nota mais para o apoio destes últimos, que se foram empolgando com novo resultado favorável para a sua equipa. Antes do início do encontro, nota para um protesto que contou com a Brigada Ultras Sporting e com os próprios ultras pacenses, juntos, a entoar cânticos contra o cartão e contra os governantes. SL Benfica x SC Braga | 07-11-2021 Nota para o facto de parte do primeiro anel do topo sul encarnado ter voltado a receber público, depois da direcção do Benfica ter encurtado a limitação das zonas exclusivas para detentores do Cartão do Adepto. Os No Name Boys apoiaram tanto no nível inferior como superior da bancada, chegando a abrir um pote de fumo no próprio primeiro anel. Deram um bom espectáculo, empolgados pela goleada da sua equipa. Cartão levado à Assembleia da República | 10-11-2021 A discussão e votação aconteceu nesse dia 10 de Novembro, mas os grupos, numa iniciativa feita pela APDA, deram o mote nos dias precedentes, através de uma mensagem simples e directa: “A bancada tem salvação. Revoguem o cartão!”. No Parlamento, o cartão teve finalmente o destino merecido, a sua revogação. Isso foi conseguido através de uma proposta da Iniciativa Liberal. Por outro lado, as propostas (com o mesmo intuito, mas com outras particularidades) do PCP e do Chega foram chumbadas.
41
CD AvesTermolan x RC Cannes 17-11-2021 A secção de voleibol feminino avense estreou-se nas competições europeias e logo contra uma das equipas mais reputadas a nível mundial, sendo a que tem mais títulos em França. O CD Aves tinha cumprido o seu aniversário cinco dias antes deste jogo, mas foi aqui que a Força Avense festejou essa data de uma forma especial, aproveitando também o simbolismo do encontro em questão. O grupo elaborou e apresentou uma enorme coreografia, com 10 metros de comprimento e 21 metros de largura, que se estendeu pela bancada. Em baixo, podia ler-se a seguinte mensagem “91 anos a elevar a grandeza de uma vila”. Sporting CP x Varzim SC 18-11-2021 Jogo a uma 5ª feira à noite, um horário nada convidativo para uma deslocação desde o Norte do país até Lisboa, mas os adeptos do emblema poveiro contrariaram esse deprimente obstáculo e estiveram em bom número no sector visitante de Alvalade. Um bom apoio, comandado pelo grupo Os De 1915, que contribuiu para uma boa prestação da equipa varzinista, que quase levava o encontro pelo menos até prolongamento. No final, esse esforço dos jogadores foi brindado com um bom momento entre adeptos e jogadores. Portimonense SC x Eléctrico FC 20-11-2021 Actividade interessante no campeonato de futsal, por parte dos adeptos do clube de Portimão. O grupo Orgulhe 1914 decidiu promover este encontro durante a semana de maneira especial. Para além de terem preparado uma pequena coreografia e elaborado várias bandeirinhas (mais concretamente 70 pretas e 70 brancas), espalharam vários ‘flyers’ pelas escolas da sua cidade a anunciar o jogo em questão, de maneira a atrair os mais jovens. No tão aguardado dia, a claque do Portimonense foi até ao pavilhão em cortejo, desde a sua sede, numa distância de cerca de um quilómetro, que levou perto de uma hora a ser percorrida, por parte de aproximadamente quatro dezenas de elementos. O ambiente foi logicamente muito acima da média para uma partida de futsal, com uma boa afluência nas bancadas e a exposição de tudo aquilo que fora preparado nos dias anteriores. Nota, mas não menos importante, para o facto de, na véspera, a sua equipa de futebol ter ido jogar a Penafiel, num encontro a contar para a Taça da Liga, e ter contado com a presença de um jovem elemento do próprio grupo Orgulhe 1914. Na 6ª feira à noite, desde o Algarve até ao Norte do país, houve alguém que assegorou a representação da sua claque, aventurando-se através da compra de viagens de bilhetes de autocarro...
42
Moreirense FC x Vitória SC 21-11-2021 Como habitualmente nas visitas do Vitória SC a Moreira de Cónegos, os seus apoiantes aproveitam o curtíssimo trajecto para invadir o estádio e, desta vez, não foi excepção, neste encontro a contar para 4ª eliminatória da Taça de Portugal. Mais de um milhar de bilhetes vendidos, pese embora o facto dos sectores destinados aos portadores do Cartão do Adepto restringirem parte da lotação máxima. Ainda assim, o número foi tão elevado, que as autoridades locais até decidiram colocar vários vitorianos (sem cartão) nessas mesmas zonas. Também, como habitualmente, ambas as bancadas centrais tinham adeptos visitantes. No final, venceu o Moreirense, que seguiu em frente na competição. Enorme alegria e a devida festa entre Green Devils e outros simpatizantes dos locais com a sua equipa. Em contraste, muita contestação dos ultras do Vitória para com a sua formação. FC Barcelona x SL Benfica 23-11-2021 Jogo importante para os encarnados que, num grupo complicado, vão disputando até ao fim as aspirações de passagem à fase seguinte. Não foi de estranhar, portanto, que muitos benfiquistas se tivessem deslocado até Barcelona. Destaque para a presença de vários grupos ao longo do dia, e também na véspera, pela Catalunha. Uma turma dos No Name Boys, acompanhados por croatas da Torcida Split, atacou mesmo um bar, supostamente pertencente e onde se encontravam elementos dos Boixos Nois. Já no interior do mítico Camp Nou, não faltou apoio vindo do sector visitante, que foi entoando cânticos, chegando também a abrir pirotecnia, em condições atmosféricas não muito agradáveis, onde não faltou chuva... Cannes x CD AvesTermolan 24-11-2021 Segunda mão do tal encontro da equipa avense de voleibol feminino para a Taça Challenge e destaque absoluto para a presença da Força Avense em território gaulês! Como o grupo fez questão de anunciar, foi a sua primeira deslocação europeia na história. A derrota (tal como no primeiro jogo) surgiu de forma natural, dada a diferença de qualidade e de poderio das formações, mas nas bancadas os olhares voltaram-se para aquele pequeno grupo que apoiou ao longo dos vários sets.
43
Liverpool FC x FC Porto 24-11-2021 Idas do Porto a Inglaterra normalmente são sinónimo de invasão e esta não foi excepção. Sector visitante de Anfield muito bem composto e, também como é habitual, o apoio constante dos ultras portistas foi o centro das atenções fora das quatro linhas. Apesar da derrota sofrida, no final do jogo houve ambiente de harmonia entre jogadores e público azul e branco.
Sporting CP x Borussia Dortmund 24-11-2021 Mais uma vitória europeia sportinguista no seu estádio e com um grande ambiente, com a particularidade de confirmar a passagem aos oitavos de final! A festa foi, portanto, enorme, acentuando-se com o desenrolar favorável do marcador (o resultado final foi de 3-1). Destaque também para os vários momentos de pirotecnia em diferentes bancadas. Antes do início do jogo, uma boa tochada na bancada norte de Alvalade. No lado oposto, onde se localizam as tradicionais claques, também houve, salientando-se um momento protagonizado pelo Directivo Ultras XXI. Relativamente aos visitantes, houve episódios de violência entre os mesmos e a PSP na véspera do encontro, quando os alemães aproveitavam a noite no Bairro Alto. Segundo relatos dos próprios, um ultra do Dortmund fez uma pequena pintura numa parede com um spray, a polícia quis detê-lo e, a partir daí, surgiram vários incidentes. Vários polícias feridos e adeptos alemães detidos.
FC Midtjylland x SC Braga 25-11-2021 Terceiro encontro forasteiro do clube bracarense nesta fase de grupos europeia e terceira menção, provando a consistência e a regularidade dos seus adeptos, em particular dos ultras. Cerca de uma centena de elementos braguistas estiveram no sector visitante, com ambas as claques representadas, fazendo-se ouvir (e bem) na transmissão televisiva. Depois do jogo, nota para os incidentes entre Red Boys e ultras locais no centro da cidade dinamarquesa de Herning.
44
Aniversário do Leixões SC 28-11-2021 O Leixões cumpriu o seu 114º aniversário num Domingo, o que significava que não faltavam eventos desportivos das suas equipas para os seus adeptos acompanharem num dia especial. Durante a tarde, houve jogo contra o Trofense no Estádio do Mar. Dois clubes separados por uma curta distância, o que logo por aí fez com que houvesse boa afluência dos dois lados. Bom ambiente, com uma bancada central praticamente cheia, com a presença dos Ultras Trofa e restante público visitante. Depois de terminar, muito do público leixonense deslocou-se até ao pavilhão onde habitualmente jogam as suas formações de voleibol, ao lado do próprio estádio, criando mais um ambiente extraordinário naquele espaço, como vem a ser regra esta época, num encontro entre a sua equipa de voleibol feminino contra o PV 2014 [conhecido como Porto Vólei]. Os ultras do Leixões abriram pirotecnia e uma tarja, em que era possível ler “Viva o Leixões”. No final, mais um momento de grande festa com o seu conjunto. SC Braga x FC Vizela 30-11-2021 Jogo numa 3ª feira à noite, com muito frio, mas nem isso impediu uma deslocação em massa dos vizelenses no curto trajecto até ao Municipal de Braga. O jogo dentro de campo não correu, nem de perto nem de longe, de feição para a formação azul e branca, que perdeu por 4-1. Porém, isso não impediu um forte apoio, vindo da superior nascente, onde ficam os visitantes, fazendo-se ouvir na grande maioria do encontro. A sua equipa e o seu treinador agradeceram essa mesma presença. Dando ainda mais relevo e crédito à prestação da Força Azul e restantes adeptos do Vizela, foram as declarações de... Carlos Carvalhal, treinador do Braga. Uma palavra para os adeptos que estiveram a dar apoio e também para os adeptos do Vizela que estiveram em grande número e a apoiar, efusivamente, mesmo com um resultado desfavorável. É de saudar ver estas atitudes nos estádios portugueses.
45
ENTRE O CÉU E O INFERNO LEIRIA
A Fundação União Desportiva de Leiria, instituição com pouco mais de meio século de vida mas com uma história rica junto de um dos clube mais representativos do futebol nacional. Foi fundada a 6 de Junho de 1966, na cidade de Leiria, por um grupo de funcionários do Banco Nacional Ultramarino e resultou da fusão de dois clubes: o Sporting Clube Leiriense e o Colipolense. Iniciou a sua actividade com 1028 sócios, sendo a sua sede social e campo de actividades o Estádio Municipal Doutor Magalhães Pessoa, estádio esse, que foi remodelado em 2004 para o europeu de futebol. Logo no ano imediato à sua fundação conseguiu o primeiro título de campeão distrital. Na época de 1978/79 alcançou, pela primeira vez no seu historial, o escalão máximo do futebol português. Na sua estreia na 1.ª Divisão ficou em 13.º lugar, baixando novamente de divisão. Em 1981, surgiu o primeiro título de campeão da 2.ª Divisão Nacional, feito repetido em 1998. A melhor classificação alcançada pelo União de Leira na 1.ª Divisão Nacional foi o 5.º lugar nas épocas de 2000/01 e 2002/03. Competições nacionais Na sequência de prometedoras prestações no campeonato nacional da segunda
46
divisão, o União acabou por conseguir em 1978/79 aquilo que pretendia: a subida ao escalão maior do futebol português. Mais uma vez, a festa transbordou do estádio para a cidade e para a região. José Mourinho Félix foi o técnico vitorioso de uma acesa disputa com o União de Lamas. Na equipa que conseguiu mais este feito para o clube, brilharam então Dinis, Figueiredo, Delfim, Espírito Santo, Tomé, Araújo, Álvaro, Nando, Pereira, Paixão, Paiva, Orlando, Leitão, Germano, Vítor Amaral, Ferro, Trindade, José Luís e Rosário. A primeira participação da União de Leiria no campeonato nacional da primeira divisão aconteceu então em 1979/80, estreandose com uma derrota na Póvoa do Varzim (2-4), a 26 de agosto, e uma vitória caseira frente ao Boavista (3-1), a 2 de setembro. Infelizmente, a descida nessa temporada foi inevitável, mas, no ano seguinte, sagrando-se campeão nacional da segunda divisão, o clube ainda voltaria ao escalão maior. Dirigidos pelo técnico Manuel Pedro Gomes, estiveram outra vez nesse êxito os jogadores Dinis, Germano, Araújo, Espírito Santo, Paixão e Tomé, acompanhados pelos reforços Freitas, Nascimento, Varela, Vítor Manuel, N’Habola, Pereirinha, Miguel, Carlos Alberto, Cremildo, Álvaro, Padrão, Nelson Moutinho, Arnaldo José e Vítor Pontes. Mas ainda não seria desta que o clube se afirmaria no escalão maior. No final da época
de 1981/82, foi o despertar para dura realidade: o regresso à divisão inferior era acompanhado de uma crise diretiva sem precedentes. Durante as épocas seguintes, a União Desportiva de Leiria, passando por alguns sobressaltos classificativos e crescentes dificuldades financeiras, permaneceria na segunda divisão nacional. Até que, em 1989, algo mudou. Candidata-se a presidente da direção e é eleito um seu antigo sócio fundador, João Alberto Amado Bartolomeu. Começou desde logo um período de recuperação do estatuto que o clube tinha perdido e assim, em 1994, a União de Leiria, conseguindo ultrapassar todas as barreiras que lhe surgiram no percurso, conquistou o segundo lugar no então já chamado Campeonato Nacional da 2ª divisão de honra e assegurou a subida de escalão, iniciando aí um período de quase duas décadas no topo do futebol nacional. Na taça de Portugal o clube teve o seu ponto alto na época de 2002/2003, tendo perdido a final com o FCPorto por 1-0. União de Leiria na Europa Na época de 1994/95, o brilhante sexto lugar conseguido com o treinador Vítor Manuel justificou desde logo o início da aventura europeia que se seguiu: a disputa da Taça Intertoto. Defrontando as equipas do Heerenveen (Holanda), Naestved (Dinamarca), Tom Pentre (País de Gales) e Bekescsaba (Hungria), o clube terminou o seu grupo sem derrotas, falhando o apuramento para a fase seguinte por muito pouco. A estreia aconteceu contra o clube húngaro, a 24 de junho de 1995, ficando para a história o empate a dois golos e a participação nesse jogo de Ferreira, Hugo Barbeiro, Crespo, João Armando, Paulito, Nuno Alexandre, Michael Kimmel, Telmo Pinto, Frederico, Pinha, Bambo, Moisés e Ricardo Machado No início da época de 2002/03, o União recomeçou a sua participação nas competições europeias, de novo na Taça Intertoto, com uma eliminação inglória por utilização irregular de um jogador, que se sobrepôs às duas vitórias conseguidas no terreno de jogo. Mas, na época seguinte, fruto da
presença na final da Taça de Portugal, a equipa estreou-se na Taça U.E.F.A., despachando o Coleraine (Irlanda do Norte) na pré-eliminatória e saindo eliminada na primeira ronda pelo Molde (Noruega). Na campanha do verão de 2004, num regresso à Taça Intertoto, com Vítor Pontes ao leme, depois de ultrapassados Shinnick Yaroslav (Rússia) e Genk (Bélgica), o União de Leiria seria derrotado pelo Lille (França) numa das finais da competição que só se decidiu no prolongamento do jogo da segunda mão. No ano seguinte, a presença na Taça Intertoto repetiu-se, mas o fortíssimo Hamburgo (Alemanha) não se deixou ultrapassar. Seria na temporada de 2007/2008 que o União, sob o comando de Paulo Duarte, concluiria esta sua participação europeia, atingindo o total de vinte e quatro jogos. Desta vez, afastou o Hajduk Kula (Sérvia) na segunda eliminatória da Taça Intertoto e o Maccabi Netanya (Israel) na pré-eliminatória da Taça UEFA., saindo honrosamente derrotado pelo Bayer Leverkusen (Alemanha) numa primeira ronda desta competição europeia renhidamente disputada. A formação História - 11 de novembro de 1971 O início do Futebol Juvenil Fiel ao princípio de que todos os clubes devem manter em ação as categorias mais jovens, a União Desportiva de Leiria, nessa época inicial, não podia alhear-se de tal facto e assegurou desde logo a colaboração de João Fernando Rodrigues Peres, treinador de reconhecida competência nessa área que acabaria por ficar
47
indelevelmente ligado a sucessivas gerações de jogadores. E assim, a equipa de juvenis nasceu igualmente com o clube, ficando para história os nomes de Afonso, Álvaro Moita, Augusto, Bandeira, Brites, Carlos Alberto, Caseiro,
pelo departamento de futebol juvenil, durante quase quarenta anos. A solução provisória, então encontrada, de utilização de um campo pelado na freguesia vizinha de Santa Eufémia, acabou por passar a definitiva. O esforço e a dedicação de um grupo
Claudino, Costa Ferreira, Crispim, Cunha, Dídaco, Ervilha, ”Fred“, Godinho, Mário, Paulo, Portela, Quinta Lopes e Rui Curto. O escalão de juniores surgiu apenas um ano mais tarde, o de iniciados em 1973/74 e, finalmente, os infantis dez épocas depois destes. Entretanto, foi a 11 de novembro de 1971 que aconteceu a primeira internacionalização de um atleta do União de Leiria. Carlos Manuel Lopes jogador formado no clube, jogou pela seleção nacional júnior contra a equipa representativa da Suíça. A União de Leiria sempre manteve uma assinalável presença nas competições de futebol das camadas jovens. Praticamente desde a sua fundação, sucessivas gerações de jovens leirienses foram passando pelo vulgarmente conhecido como Campo de Treinos do Estádio Municipal. Mas, com a reformulação desta infraestrutura para o Euro-2004, desapareceram as instalações usadas
de trabalho fez nascer, em Novembro de 2007, a Academia de Futebol Juvenil da União Desportiva de Leiria. Foi aí que, numa atividade diária sucessivamente aprimorada, se foram formando os melhores futebolistas da região. Não sendo o mais importante, os resultados desportivos obtidos, com uma permanência persistente no grupo dos maiores clubes nacionais, atestam a validade do trabalho desenvolvido.
48
Modalidades A União Desportiva de Leiria além do futebol sénior, sempre competiu ao mais alto nível na sua formação e Para além do futebol, este clube desportivo contou também com várias modalidades como o Futsal, Andebol, Paintball, E-sports, Basquetebol, Futebol praia e Bilhar. Nos dias de hoje, apenas as 3 últimas mantém atividade.
A porta do inferno Em Maio de 2008, o Comité Disciplinar da liga portuguesa de futebol profissional abriu um processo paralelo ao apito dourado chamado Apito Final, o UD Leiria perdeu três pontos e o seu presidente, João Bartolomeu, foi condenado a uma suspensão de um ano. No ano de 2010, as já tensas relações da “União Desportiva de Leiria, SAD” com a Câmara Municipal de Leiria, levaram a uma ruptura total, com a Empresa Municipal Leirisport, gestora dos equipamentos desportivos camarários de Leiria, a acusar a SAD de dever largas dezenas de mihares de euros por utilização do Estádio Municipal. Devido a este conflito, a União Desportiva de Leiria, SAD abandonou o estádio e mudou de cidade jogando em campos emprestados, inicialmente em Marinha Grande e de seguida em Santa Catarina da Serra. No decorrer da conturbada época desportiva de 2011/2012, a União Desportiva de Leiria deixou de pagar os ordenados aos seus jogadores da equipa principal e, no dia 27 de Abril, a maior parte desses jogadores rescindiu o contrato. No decorrer desta situação, a presença da União de Leiria nas últimas 3 jornadas da Liga Portuguesa de Futebol esteve ameaçada e no jogo contra o Feirense, a equipa entrou mesmo em campo com apenas 8 jogadores, sendo goleada em casa por 0-4. Na jornada seguinte, a UDL inscreveu os juniores para jogarem contra o Benfica. Em pleno Estádio da Luz, essa equipa demonstrou muita garra perdendo apenas por 1-0. Uma Lista de créditos relativa ao pedido de insolvência da SAD incluía 107 credores, que reclamavam o pagamento de uma divida que ascendia a €13,5 milhões. O Estado é o maior credor da União de Leiria SAD, com um quarto daquele valor, pouco mais de €3 milhões por dívidas em sede de IRS e IVA, além dos respectivos juros. O Estado português acabaria por abster-se de exigir uma dívida de mais de € 3,6 milhões. Perante as dificuldades da União de Leiria SAD, atolada em dívidas e incumprimentos fiscais, o tribunal decretou a sua extinção em Julho de 2013.
Das cinzas… Julho de 2012 Ressurgimento de Futebol Sénior A crise de 2012, com o consequente divórcio entre a União Desportiva de Leiria e a sua S.A.D. à beira da extinção, levou os dirigentes a procurar uma alternativa que evitasse o previsível desaparecimento do clube. Assim, na nova temporada de 2012/13, enquanto a Sociedade que ainda transportava o nome de União de Leiria se fazia representar na última edição do campeonato nacional da segunda divisão B, o clube inscrevia-se na Associação de Futebol de Leiria para disputar a divisão inferior dos campeonatos regionais. Junho de 2015 Uma nova SAD Em 2015/16 a União Desportiva de Leiria cria uma nova SAD, que é assumida por Alexander Tolstikov. A equipa Unionista iria disputar por quatro anos consecutivos a Fase de Subida à 2ª Liga, sem nunca ter conhecido o “sabor” da subida de divisão. Para a história ficam dois jogos memoráveis pela negativa: Dado o formato do Campeonato de Portugal, disputado numa 1ª Fase e depois numa fase a eliminar, a UD Leiria acabou eliminada na meia final pelo CD Mafra, em 2017/18, sem nunca ter sofrido uma derrota nessa temporada. Dois empates (0-0 e 1-1) ditaram a eliminação, e a passagem do CD Mafra à final e consequente subida de divisão. No ano seguinte, a UD Leiria iria chegar novamente à meia final, frente à UD Vilafranquense, onde perderia nas grandes penalidades (1-1 nos dois jogos e 5-4 nas grandes penalidades). Em 2019/20 a UD Leiria termina num dos piores lugares classificativos (12º lugar) e a SAD presidida por Alexander Tolstikov é vendida no ano seguinte. Um novo rumo A 4 de outubro de 2020, os associados da União Desportiva de Leiria, em assembleia geral, aprovaram a entrada de novo investidor na SAD, que é agora presidida por Armando Marques.
49
Em 2020/21 a UD Leiria terminou o Campeonato de Portugal com a subida à nova Liga 3, e chegou à Fase de Acesso à Liga 2, onde terminou no 4º lugar, atrás de CF Estrela da Amadora, SCU Torreense e Vitória FC. Contexto actual visto por um adepto Considero que a nossa instituição ficou manchada com o seu passado, infelizmente. Tínhamos todas as condições para ser um clube, para impor respeito a nível nacional, mas porque é que isso não acontece? Temos uma cidade com uma dimensão relativamente grande, com cerca de 130 mil habitantes e uma qualidade de vida muito a cima da média onde vive muita gente que não nasceu em Leiria, mas aqui se instalou à procura de melhores condições de vida. Isto faz com que as pessoas tenham poucas raízes nesta terra e nas suas instituição, além deste factor, vivemos num país onde a cultura do “bate-boca” de café se impõe ao próprio desporto. Para o cidadão comum, não faz sentido apoiar um clube que perde, mas sim acompanhar os clubes que ganham. País de “estarolas” que não sabem dar valor ao que é nosso e a tudo o que as nossas raízes representam. País onde é preferível apoiar os clubes da capital, onde os próprios filhos são formatamos para serem quadrados como os próprios pais. Chegamos ao cúmulo de assistir a discussões de acéfalos onde a essência do tema é “o teu clube é mais corrupto que o meu” e tudo isto é dito com orgulho. Vejo todos este cenário nos últimos anos com um sentimento de tristeza dentro de mim, mas dentro deste contexto olho para os nossos sabendo que quem está é por amor. Honra a todos os verdadeiros que apoiam os clubes da sua terra, que defendem com unhas e dentes as suas raízes, a sua identidade! Do campo para a bancada A União Desportiva de Leiria, também nas bancadas, teve representação e o movimento ultra acompanhou boa parte da sua vida. Nos 54 anos de história também nas bancadas esta instituição teve o seu marco no panorama ultra
50
nacional. Na década de 90 os Ultra Fantasmas, nos primórdios do anos 2000 a Frente Leiria e, actualmente, conta com a Armata Ultra reerguida em 2014. Entre o céu e inferno Deixo a pergunta no ar. No mundo do futebol, o que podemos nós definir como céu ou inferno? Depois de estar habituado a correr os principais palcos do país, inteirei-me de uma realidade completamente diferente. Nos primeiros tempos a adaptação foi muito difícil, era uma realidade nova e desconhecida, num dia o clube disputava o acesso a competições europeias, no outro jogava na distrital. Mas o inferno trouxe algo que ninguém esperava, que eu não esperava. A essência do futebol. Se for feita uma análise fria, o futebol em Portugal está podre, é sujo e corrupto. Muitos jogos são ganhos nos bastidores, sem mérito, e dentro do negócio instaurado quem menos importa é o adepto. Toda a comunicação social manipula o espectáculo à procura do sensacionalismo, da notícia que vende e chama a atenção. Perde o desporto, perde o espetáculo. Nas distritais voltamos a ver a essência daquilo que era o futebol, jogadores que amam o desporto e não o dinheiro, todos os intervenientes entram em campo para ganhar, pela instituição, pelos sócios e adeptos. Tudo é em torno de um símbolo e de quem o acompanha, pois são estes que conseguem manter o clube vivo. Arrisco-me a dizer que quanto mais a gente sobe, mais o verdadeiro futebol desce. É com tristeza que recordo o passado do meu clube em processos que mancharam a instituição, considero que a separação do clube e da SAD de Bartolomeu e regresso às distritais um castigo duro, mas necessário e justo. Mas depende de todos nós mostrar também que a justiça não pode ser esquecida e que o futebol é do povo, o futebol é de quem o vive na sua essência. Por Rui Quinta
História dos Grupos Organizados Leiria
Ultra Fantasmas Grupo icónico, fundado a 1991. Durou até 1997, e se hoje continuasse no activo teria mais de 30 anos. Motivados por uma União de Leiria em ascensão os Ultra Fantasmas acabaram por ser uma referência a nível nacional. A história ultra na cidade teve na Juve Branca uma referência. A claque chegou a juntar centenas de pessoas e era formada por jovens dos escalões de formação. Depois, apareceram os Anjos Brancos, mas o nome não era suficientemente agressivo para um grupo de tiffosi e, uma semana depois, lá apareceram mascarados de Ultra fantasma. São várias as histórias de quem viveu a realidade da altura. Tochas compradas aos pescadores de Peniche, extintores abertos em plena bancada, sempre composta com um grande número de ultras que acabava por criar grandes momentos de apoio no velhinho Magalhães Pessoa, tornando este um palco hostil para quem o visitava. As deslocações
épicas de norte a sul do país ajudaram a construir a fama dos UF. Dado que na altura não existia internet ou computadores, as informações são poucas e ficam as memórias de quem por lá passou. De salientar que foram os Ultra Fantasmas a organizar um congresso de claques nacionais em 1996. Um passo muito importante no movimento ultra português, mesmo que o hotel onde tenham ficado os intervenientes tenha sido destruído.
51
Frente Leiria A Frente Leiria foi fundada em setembro de 2001 por um grupo de jovens adeptos que tinham em comum uma genuína paixão pelo clube e a vontade de criar um grupo organizado, que servisse de catalisador para aproximar as faixas etárias mais jovens ao clube. Fruto da espetacular campanha da União de Leiria em 2001/2002, impulsionada sobretudo pelo efeito Mourinho, o grupo conheceu um crescimento muito rápido, atingido os 250 elementos até ao fim de 2002. A FL marcou presença em todos os jogos nessa época, incluindo Madeira e Açores, efetuando excelentes transfertas e mobilizando vários jovens em torno da vida ativa do clube.
marcar presença com cerca de 300 elementos e realizar uma coreografia que envolveu todo o sector unionista. O final de 2003 marca o regresso a Leiria. A nova direção do grupo não conseguiu capitalizar esse facto, e nem o entusiasmo devido à realização do Euro 2004, que se sentia na comunidade, contribuiu para o crescimento do grupo. Viveram-se duas épocas marcadas pela desorganização e falta de coesão do grupo. Nesse período, pela primeira vez, a FL não marcou presença em alguns jogos fora. Ainda assim, em agosto de 2004, o clube atingiu a final da Taça Intertoto frente ao Lille. Nesse jogo, a FL faz a sua maior coreografia de sempre: um fantástico mosaico a preencher todo o seu setor.
Devido às obras para a construção do novo estádio, a União de Leiria viu-se obrigada a procurar uma “nova casa” e, durante um ano e meio, foi a Marinha Grande que acolheu os jogos do clube. Num grupo ainda jovem e com pouca experiência, o facto de todos os jogos serem fora de casa, acrescido pelo facto de o seu líder fundador ter abandonado o grupo, abalou a toada do grupo que, até então, tinha sido de crescimento. Em 2003 todos os sacrifícios foram recompensados com uma fantástica presença na final da Taça de Portugal. O grupo conseguiu
Em 2005, a FL faz o seu primeiro “on tour” europeu, marcando presença em Hamburgo e dois anos depois, em Leverkusen. O período entre 2005 e 2007 foi muito ativo na bancada e fora dela. O grupo, já com nova liderança, ganhou novo fôlego e conseguiu regenerar-se. Começou a aparecer muito material na Curva e um sentido de identidade mais forte. Em 2006 registaram-se os primeiros grandes confrontos fora do estádio em que a FL se envolveu, em particular com os Panteras Negras e Mancha Negra. Motivado pelas boas campanhas da União
52
2013, marcando o fim da Frente Leiria como grupo de apoio da União Desportiva de Leiria. Uma palavra de apreço especial às nossas duas grandes amizades: os Auri Negros de Aveiro e os Furacões Sadinos de Setúbal.
de Leiria nessas duas épocas, o grupo assumiuse de vez demonstrando coesão, organização e mentalidade. Mesmo jogando na segunda liga, o grupo nunca esmoreceu e continuou a apoiar a equipa até ao seu regresso à primeira divisão em 2009. Depois da festa da subida e de uma época memorável, o entusiasmo da população voltou a esmorecer e o grupo também se ressentiu disso mesmo. Entretanto, o clube enfrenta uma grave crise financeira, culminando com a humilhação de jogar apenas com oito jogadores de início, numa partida do campeonato nacional. Com a SAD de então a arrastar o nome do clube para a lama, o clube forma uma equipa sénior para disputar a Distrital de Leiria. Foi um regresso às origens e à essência daquilo que é o futebol. Este momento trouxe novas pessoas para o apoio à União de Leiria e o mesmo tornou-se mais espontâneo, mas também menos organizado. Como grupo pequeno que sempre foi, a FL não resistiu à saída de muitos dos seus membros mais antigos e a geração seguinte não conseguiu aguentar o grupo. Por fim, decidiu-se arrumar a faixa pela última vez em meados de
Armata Ultra Grupo organizado de adeptos, não legalizado, que apoia na actualidade a União Desportiva de Leiria. Poucos conhecem a sua história, A data da verdadeira fundação aconteceu em 2007 como um núcleo da Frente Leiria. Numa altura em que os núcleos regionais ganhavam alguma influência dentro do próprio grupo, houve uma necessidade crescente de alguns membros se unirem, não pela zona de cada um, mas pela grande amizade que tinham em comum fora da bancadas. Os núcleos funcionavam em harmonia e havia uma certa competitividade entre todos eles, que levava ao crescimento natural do grupo. Os “roubos”, disputas internas e competição faziam com que todos quisessem dar o melhor em prol do apoio à União Desportiva de Leiria. Foi um contexto diferente da actualidade e, enquanto jovens que éramos, conseguimos absorver muito da verdadeira mentalidade dos membros mais activos. Verdadeiras enciclopédias do movimento ultra nacional e internacional. Obviamente que o movimento que mais interesse e admiração despertava era o Italiano e acabou por ser sempre a fonte de inspiração para o futuro do núcleo. Com a extinção da Frente Leiria, o pequeno grupo manteve-se unido. Vários membros da Armata continuaram a apoiar a equipa na distrital e, em 2014, os membros da fundações reuniram-s. Dada a ausência de qualquer grupo de apoio organizado, começamos a trabalhar até criar todas as condições para erguer novamente o grupo, desta vez como grupo principal. Inicialmente com pouca organização, pois tratava-se apenas de um pequeno grupo de amigos, mas com o crescimento e aparecimento de novos membros no sector tornou-se essencial
53
formar um direção efectiva. Perdemos muitos membros experientes, a velha guarda acabou por se afastar do futebol em prol da vida privada, mas a mensagem foi sendo sempre transmitida e, desde 2014 para cá, estivemos sempre representados em todos os jogos da União Desportiva de Leiria. Nestes poucos anos, o grupo já teve vários altos e baixos. Na melhor fase do clube conseguiu ter mais de duas centenas de membros no sector e garantir um apoio incansável e incondicional à equipa. Além das amizades pessoais que transitaram naturalmente de anos passados entre ultras Leirienses e ultras de outros grupos nacionais, a única amizade oficial a nascer nestas divisões inferiores é com a turma do TOPO SCUT. Rivalidades também surgiram naturalmente, mas essas dispensam tempo de antena. Armata Ultra e o cartão do adepto Apesar de disputar os campeonatos inferiores, onde a repressão é um pouco menos sentida a Armata Ultra sempre se manteve firme na luta contra o cartão do adepto. Desde o primeiro dia que assumiu a sua posição e esteve disposta a levar essa luta até ao fim. Esteve sempre presente de forma activa em todas as ações de luta contra esta medida altamente repressiva e discriminatória. Não podia deixar de dar uma palavra de apreço a todos os ultras que marcaram presença nas reuniões nacionais e que foram activos em todas as ações de luta. Foi a prova viva de que unidos conseguimos fazer mais em prol do movimento nacional, foi a prova de que por vezes temos de esquecer as nossas rivalidades e unir esforços em prol de um bem comum. A luta está longe de terminar, mas a vitória será daqueles que nunca desistem. Por Rui Quinta
54
55
ULTRAS COM HISTÓRIA LUÍS AMÉRICO Para continuar a secção, Ultras com história, decidimos convidar um adepto cuja importância é inegável, para o desenvolvimento do movimento de apoio organizado no Futebol Clube do Porto. Trouxemos então até aos nossos leitores, o Luís Américo, um dos fundadores dos Super Dragões. Obrigado ao Luís por ter aceite o nosso convite. É com muito gosto que o convidamos a fazer parte deste nosso registo que se irá imortalizar no tempo. Quem é o Luís Américo? Gosto de pensar que sou apenas um Ser Humano, como todos somos, alguém que vive uma vida que merece ser vivida, uma vida dedicada às emoções, ao amor e, infelizmente, a alguma responsabilidade que é inerente ao facto de ter 5 maravilhosos filhos para criar e a toda uma componente social que isso implica. Sou um criativo, nunca tive horários e sempre tive reconhecimento, vivi várias vidas facilmente identificáveis e, uma delas, foi ter sido um Ultra de Alma e coração! Hoje dedico-me à cozinha e essencialmente a desenvolver conceitos nesta área focando-me na capacidade que esta forma de vida tem de proporcionar emoções aos outros. Valorizo cada vez mais a família e agradeço ao universo todos os dias a felicidade que tenho em cada momento do dia-a-dia! Como começou a tua ligação com o Porto e com o movimento de apoio? Eu nasci ligado ao F C Porto por via do meu pai ter sido sempre um elemento ativo da direção do futebol profissional do clube. Com o movimento de apoio julgo que ficará claro nas próximas respostas.
56
Como viveste os anos que precederam a fundação dos Super Dragões? É importante relembrar que eu na altura da fundação dos SD (30 de Novembro de 1986) tinha 14 anos... Nunca tive uma paixão incrível pelo futebol. O meu pai, Luís César, era um alto dirigente do FCP e, por essa via, o futebol era algo que fazia parte do meu dia-a-dia, mas por ser “filho do meu pai”, aliás eu cheguei a ser apanha-bolas com 11 – 12 anos de idade... Pinto da Costa, José Maria Pedroto, António Morais, Domingos Pereira, Reinaldo Teles e outros dirigentes eram amigos de casa, era normal estar com eles. Hoje entendo a “Magia” que esses seres humanos traziam ao FCP, o clube era vivido com uma paixão diferente. Na realidade, o momento em que “a minha vida mudou” foi no dia 16 de Maio de 1984. Tive o privilégio de assistir ao vivo à primeira final europeia do FCP em Basileia, na Suíça, contra a Juventus. Na altura a claque da Juventus chamava-se “Fighters”, mas eu nem sabia o que era uma claque. Não é possível transcrever em palavras a “loucura” daqueles momentos, eu entrei para o estádio 4 horas antes do jogo e já as bancadas transbordavam de emoção! É impossível ficar indiferente a tanta energia humana, eu não sabia que existia algo parecido. Mal cheguei ao Porto, percebi que o F. C. Porto tinha um grupo organizado de adeptos, na altura
liderado pelo Alexandre Pinto da Costa chamado “Força Azul” que, pouco depois, deu origem aos “Dragões Azuis” um movimento altamente dependente do clube do qual eu tinha enorme orgulho de fazer parte por ser o mais próximo de um “movimento Ultra”. Os fumos eram feitos com pó químico tingido com anilina e expelido por extintores. O fogo de artifício era palha-de-aço incandescente que queimava tudo e todos. Era incrível e era um privilégio poder ter acesso a um extintor ou uma gaiola-de-rede com palha-de-aço dentro.
Porque fundaram os Super Dragões? Já referi isto várias vezes mas, nunca é demais relembrar que eu apenas fiz parte da primeira direção dos SD, e, por essa via ser considerado fundador... Na altura, o meu pai tinha a Loja Azul (loja que vendia merchandising do F C Porto), onde os Dragões Azuis tinham tido a sua primeira “morada”, que, agora estava livre. Foi só por isso que eu fui convidado para fazer parte da direção fundadora, não por ser o Luís Américo mas por ser o filho do Luís César. Os SD nasceram porque ninguém se entendia na direção dos Dragões Azuis, que, na altura eram patrocinados pelas Sapatarias Beleza e mais pareciam uns “Meninos do Coro” “domesticados” pelo facto de lhes serem concedidas entradas gratuitas e pouco pelo amor que sentiam ao clube... Outros tempos! Na Superior Sul do Estádio das Antas existia
uma outra claque denominada “Os Pedrotos” liderado pelo (mítico) Manuel Malheiro também ele fundador dos SD e, também, uma ala mais radical completamente espontânea apelidada de “Tribunal”. Foi então que um grupo de dissidentes dos Dragões Azuis, decide fundar uma nova Claque localizada na Superior Sul denominada Super Dragões. Na altura eu apenas tinha a paixão dentro de mim, mas, a minha voz era muito pouco ouvida, embora guarde recordações fantásticas desses dias.
Como vivias um derby nos teus primeiros tempos dos Super Dragões? Nos primeiros tempos eu dava tudo para que me ouvissem, queria ter a maior bandeira, queria que fossemos sempre “mais fortes” do que os Dragões Azuis era o único objetivo. Eramos tão poucos mas com tanta alma, é por isso que sempre que me junto aos SD nos dias de hoje a malta da Velha Guarda sempre me diz: “No nosso tempo é que era”! Eu até entendo, mas ainda bem que foi possível criar um “ADN” para sermos o que somos hoje, sempre foi o meu objetivo. Os derbies no fundo eram os “momentos das verdade”. Passávamos semanas a pensar coreografias.
57
Nos dias de hoje, ainda se vive da mesma maneira? O que mudou? Mudou muita coisa, mas na sequência do que acabei de dizer, foi possível criar um ADN, não é fácil explicar isto, mas, o momento atual é mais do que eu na altura achei possível. Assistir a um jogo de futebol no coração de uma claque de futebol como os SD ou estar simplesmente no meio de adeptos “Normais” é algo que não tem comparação, e isso sempre foi assim, há uma sintonia energética que muda tudo. A grande mudança acabou por se dar ao nível do modelo de “negócio” . Passou de “associação sem fins lucrativos” para um modelo empresarial, não deixa de fazer algum sentido, desde que todos entendam o que se passa e todo o trabalho que está por trás de uma organização que movimentava umas centenas de elementos e passou a movimentar uns largos milhares. O espírito que se vive na SD hoje é fantástico e o Fernando Madureira (Macaco) é um grande líder, como não há igual. Pelo menos até agora. Quais as deslocações e episódios que te marcaram mais? Há várias deslocações míticas... A primeira vez que fechamos a 2ª circular em direção à Luz com 1800 Ultras... Deslocações a Alvalade em que no dia anterior jantávamos com a direção da Juve Leo. A deslocação a Guimarães que “Imortalizou” a “Bela da Ribeira” e que nos fez a todos pensar se valeria a pena morrer num estádio. Contudo, as deslocações que mais me marcaram, foram duas: 1 – Pelos motivos óbvios, a deslocação a Viena de Áustria em 87 onde fomos Campeões Europeus. Os SD tinham 1 ano de idade e eu 16! 2- A deslocação a Génova, para defrontar o Sampdória, em 94 com vitória do F.C. Porto por 0-1 . Esta história é maravilhosa, foi o meu último ano como líder dos SD e, acima de tudo, eu estava num momento de grande envolvência no movimento ultra italiano, nomeadamente com amizades numa ala dos “Boys San” do Inter de milão (Snakes), Eagles Supporters da Lazio (já não existem) e com os Viking da Juve (grupo ultra da
58
Juventus em Milão). A minha cidade de eleição era Milão seguida de Turim. Em Milão existia uma loja denominada “Boteca del Tifo” onde acabei por criar amizade e fazer alguns “negócios”, principalmente em relação à importação de tochas e fumos difíceis de arranjar em Portugal na época. Isto para contextualizar um episódio maravilhoso em que eu e mais dois amigos dos SD nos deslocamos de Génova a Milão para ir até à loja, não imaginando que iríamos ter o privilégio de receber os membros dos No Name Boys que também tinham tido conhecimento da mesma. O Benfica jogava
com o AC Milan um dia antes de nós em Génova e foi com um orgulho que só os Ultras entendem que colocamos a nossa Faixa, dos SD, junto à da Fossa dei Leoni e assim fizemos história! Regressados a Génova, no mesmo dia onde preparei o plano “mais recordado” da nossa história, com a colocação de 100 tochas no Luigi
Ferraris. Comprei 100 baguetes, 5 kg de fiambre fatiado, 2 kg de alface e 2 rolos de película aderente. Fizemos 100 sandes de tochas que passaram todas pela revista dos carabinieri! Mais interessante do que isso, foi a receção dos Utras Tito Cucchiaroni antes de tudo acontecer. Fomos recebidos à entrada do estádio com um panfleto escrito em português que dizia: “Bem-vindos à nossa casa Ultras do F C Porto”. Juntamente com o panfleto entregavam-nos um sumo e um bolo tipo queque. Foi, sem dúvida, a grande imagem daquilo que faz sentido entre dois grupos rivais que partilham as mesmas emoções e uma forma de estar neste espetáculo que é o futebol. Ficou uma amizade que dura até aos dias de hoje! Os ultras do Sampdória, foram recebidos nas Antas de igual forma, no fundo uma imitação daquilo que tinham feito por nós mas, mais do que o que lhes foi dado, o que mais marcou foi o nosso reconhecimento e agradecimento! Quais são as coisas que mais valorizas dentro de um grupo? As claques de futebol são o melhor exemplo do que eu valorizo num grupo. A verdadeira capacidade juntar todo o tipo de seres humanos... Brancos, negros, asiáticos, gordos, magros, novos, velhos, ricos, pobres, de esquerda, de direita, católicos, ateus... Todos juntos por amor a um bem maior, neste caso um clube de futebol! Esta é a magia de um grupo, indiferente a modas, tendências e estados de espírito. Isto é o que todos deveriam ver e não veem. Somos todos Seres Humanos que nascemos e, a única coisa que temos a certeza é que um dia morreremos, não há como alterar o ciclo. No geral, como avalias o movimento Ultra nos anos 80 e 90? Nesse intervalo temporal, há uma claque que temos que separar de todas as outras: Juventude Leonina. Não há comparação possível entre a dimensão da Juventude Leonina nos anos 80 e tudo o resto, mesmo no contexto mundial. É por isso que eu falo em ADN, a JL tinha um ADN próprio e acima de tudo tinha “Os Rochas” com carisma e dinheiro.
Eu participei no 3º Congresso Nacional de Claques em Coimbra e realmente a JL era “Outro Campeonato”, basta ver imagens dos anos 80 para entender o que estou a dizer, principalmente quando estavam na Ponta Sul. Lembro-me que era uma grande dificuldade envolver os restantes adeptos nas coreografias. Distribuía balões e as pessoas em vez de os encherem levavam para casa. O mesmo se passava com os rolos de papel, era um desconsolo. Contudo, foram anos de grande crescimento ao nível de mentalidades e acabaram por ser o grande “berço” dos dias de hoje.
E nos dias de hoje, como avalias? Hoje em dia há muita informação, cada vez é mais difícil criar impacto, os lugares com cadeiras deram origem às mais incríveis coreografias. Atualmente, o que conta é a “inteligência de bancada”, o subliminar, a antecipação, o humor e a surpresa! É esse o caminho que eu mais gosto e sempre defendi. Acho, sinceramente que estar sempre preocupados em “insultar” o adversário não traz qualquer vantagem, aliás só nos traz Karma (para quem acredita nisso). Deveria haver um foco maior no apoio “aos nossos” e deixar completamente de lado o ódio pelo outro. Como comparas a repressão policial que existia no passado com a que vai acontecendo no presente? Não tem comparação! Na altura as claques eram um assunto a prazo, ninguém se preocupava
59
em estudar “comportamentos de grupo” e “Psicologia de Multidões”. Não havia prevenção, apenas reação... Hoje há todo um know how que foi construído a partir de 1998 aproximadamente quando o ministério da Administração Interna decidiu olhar para as claques com outros olhos e, acima de tudo, com pro-atividade e vontade de resolver a questão sem recurso à repressão mas sim à compreensão do fenómeno e à prevenção. Quais são, para ti, os melhores grupos que existiram em Portugal? Sem dúvida que a Juventude Leonina foi a grande claque de Portugal. A Mancha Negra teve um papel importante nos anos 80 assim como os Diabos Vermelhos. Os No Name Boys relançaram o movimento de certa forma. Os Insane Guys foram um exemplo mais recente de identidade mobilizadora sem paralelo. Os SD são o grande exemplo de evolução com inteligência, ADN e liderança, não há comparação com esta realidade, não é melhor nem pior, só vivido por dentro. É a minha opinião que vale muito pouco! Quais foram as tuas maiores influências no contexto das bancadas? Fighters – Juventus Eagles Supporters – Lazio Fossa dei Leoni – AC Milan Juventude Leonina – Sporting CP Ultras Sur – Real Madrid Ultras Tito Cucchiaroni – Sampdoria Mais recentemente: Os ultras do Borussia de Dortmund Ao fim de tantos anos, o que significa para ti a palavra Ultra? Ultra significa simplesmente Amor. Hoje, ao recordares o teu passado, o que é que te deixa mais orgulhoso? Acima de tudo, deixa-me orgulhoso continuar a ter tantos amigos do tempo em que eu “vivia na curva”. Esta ligação às pessoas que viveram comigo todos aqueles anos (momentos) continua
60
presente. É algo que transcende aquilo que tu és enquanto ser de uma sociedade, é algo que continua a ser originário do coração, indiferente a mil e uma máscaras que cada um possa usar no seu dia-a-dia. É este tipo de amizade e de valores que se torna cada vez mais raro e que o mundo ultra te pode dar. Tu és TU. Se actualmente um pequeno jovem portista for ter contigo, dizendo que pretende juntar-se a um grupo, davas-lhe algum conselho em especial? Claro! Segue o teu coração. Também tu tiveste o teu tempo de autor, queres abrir o livro sobre os trabalhos sobre as claques que fizeste nos jornais? Eu tive a possibilidade de trabalhar como Jornalista para o Jornal Record e Fundar a “Voz das Claques”, uma página a cores (a última do Jornal), editada todas as quartas-feiras. Foi uma porta que se abriu graças ao meu pai (Jornalista de outros tempos) e também à visão do Jornal Record. O Record viu a sua edição das quartas-feiras vender quase o dobro e durante quase um ano foi um sucesso sem precedentes. Nasceram os No Name Boys, cresceu o universo ultra e, como consequência, as pressões para acabar com a página, alegando como “motivo” o crescimento repentino do fenómeno das claques e a incapacidade das autoridades no seu controle. Eu até entendo, mas é triste que tenha sido assim. Foi um trabalho marcante e importante, assim quero acreditar! O que significam as fanzines para ti? As fanzines foram (são) a forma mais real de divulgar uma visão (micro) das claques, sem filtros relativamente aos ideais de quem as publica(va). Uma forma de financiar núcleos ou simplesmente de passar o tempo numa visão que alimenta o ego e faz, a quem as publica, ter um sentimento de missão. Há uma linguagem própria e muitas vezes é viciante ler fanzines. Qual a tua opinião sobre o nosso projecto? Como já conseguiram perceber, eu estou há muito afastado da “Curva”, honestamente,
projetos como este, com tanto conhecimento, honestidade e “experiência de bancada” são um grande motivo de celebração. Quando encontramos alguém que fala “a mesma língua” é motivo de grande alegria. Acima de tudo, sinto que tudo isto é maior do que nós, é uma inexplicável forma de vida (de ser), tão genuína e tão relevante na sua essência! Uma mensagem para os nossos leitores a pensar no futuro do movimento. Ser Ultra é uma forma de Vida (há tempos havia uma fanzine com esse nome), significa que há uma relação de Amor para com o nosso clube de coração. Um clube é uma instituição que está para além das pessoas que o representam num determinado momento, é algo intangível que só se sente e não se explica. É por isso importante que sejamos parte ativa nesse processo através da expressão do nosso sentimento mais puro, o amor. Se decidires fazer parte de um grupo ultra, claque, como é denominado no nosso país, decide com o coração, não há outra forma, ou nunca entenderás a verdadeira essência do que estamos aqui a falar. A importância de viver o presente é algo essencial para todo o Ser Humano, fazer parte de uma claque é viver o presente da forma mais maravilhosa... Rodeado de pessoas que querem e sentem o mesmo que tu!
61
O CANTONA DO BELENENSES
25 de janeiro 1995: durante o jogo entre o Manchester United e o Crystal Palace, reagindo às provocações de um adepto do Crystal (“volta para França com a p... da tua mãe, bastardo!”), Eric Cantona pontapeou o dito espectador com um golpe de karaté que ficou famoso e icónico até aos dias de hoje. Agora imaginem a mesma cena mas recuem no tempo até o dia 27 de Fevereiro de 1983: não estamos na Inglaterra mas no campo de jogo em Sacavém: não é Premier League mas 2ª Divisão Portuguesa, Sacavenense-Belenenses. Estamos na época 1982-1983, pela primeira vez na sua história, depois de uma traumática despromoção, o CF “Os Belenenses” jogava no segundo escalão do futebol luso. Não foi um ano fácil, os azuis de Belém não tiveram a vida facilitada, numa época que acabou sem a desejada promoção. Foi um grande ano para a segunda divisão e para os clubes que recebiam os Belenenses: campos cheios, entusiasmo A MIL. Mais de 30 anos depois será assim também
62
na epopeia dos Azuis no campeonato Distrital em 2018-2019, após o consumar do divórcio da SAD tendo sido inscrito no último escalão do futebol português com todos os campos dos distritais a abarrotar de gente. Voltamos aquele dia de fevereiro: Campo do Sacavenense completamente cheio; tarde de sol com temperatura ótima para a prática do futebol; Mais uma vez, “encheuse” de pessoas e escudos o campo e o clube visitado. Minuto 43: o jogador Jorge Silva, jovem avançado belenense de 19 anos foi substituído por Carlos Alberto e na altura que se aprestava para abandonar o campo e (como conta o Record neste relato) “depois de ter respondido verbal e gestualmente às provocações da bancada, foi agredido com um soco num olho que o deixou negro. Pouco depois voltou a
ser atingido com um pontapé nas costas e de seguida ele próprio respondeu à agressão”. Instaura a confusão geral: Suplentes do Belenenses, directores de uma e outra equipa e espectadores a envolverem-se “em cenas nada dignificantes para o futebol” sublinha o ”censor” Record. Estranha-se como é possível que nenhuma força de segurança (GNR) não impede alguém de entrar no campo, correr mais de 20 metros “à vontade”, passar por ela e agredir o jogador. Saudosos campos sem grades e redes de proteção, que afastam o público mas…impedem combates de boxe,
karate, taekwondo (com hastes de bandeiras) etc. etc.! Pela crónica, o jogo prosseguiu como se nada fosse, o árbitro ignorou completamente o que se passava e o embate acabou 0-0. Jorge Silva irá continuar a jogar no Belenenses até o final dos anos 80. O seu legado (e o seu pontapé) ficou imortalizado muitos anos depois com um autocolante da Claque da Fúria Azul. Por Vintage Football City Tours Eupremio Scarpa
63
ORIGENS DO FUTEBOL PORTUGAL A mais antiga referência ao “jogo da bola” de que há registo em Portugal, remonta ao século XVI, mais propriamente ao reinado de D. João III, por via duma notícia que relatava a detenção de um grupo de carpinteiros, que se divertiam a jogar numa horta. Receberam ordem de prisão pelo facto de estarem a disputar uma partida durante um dia de semana quando, por lei, só o poderiam fazer ao domingo, dia de descanso estabelecido e única altura em que era permitido à populaça dedicar-se à pratica de actividades de lazer.
irmãos Pinto Basto, que tinham regressado de Inglaterra, aonde tinham residido e frequentado uma das célebres Public Schools, local aonde tomaram contacto com o jogo. Para esta primeira experiência foram “convocados” diversos amigos dos irmãos, vários deles ilustres figuras da aristocracia portuguesa, e o evento foi eternizado através de uma fotografia em que aparecem todos os participantes. Esta chegada a Portugal do “jogo inglês” dá-se, curiosamente, no ano em que pela primeira vez se disputou em Inglaterra uma Liga
Este jogo de cariz popular que os carpinteiros praticavam estava bem distante do jogo que se pratica nos dias que correm, e que se desenvolveu nas Public Schools inglesas, entre os finais do século XVIII e a primeira metade do século XIX. É difícil determinar com exactidão o momento em que pela primeira vez se jogou o futebol da era moderna em Portugal, existindo uma série de relatos, nomeadamente o da prática do jogo na Camacha, Ilha da Madeira, em 1875, embora não estejam devidamente sustentados por documentos que provem inequivocamente a veracidade destas histórias. O “nascimento oficial” do futebol em Portugal, registou-se em Outubro de 1888, em Cascais, num «ensaio» organizado pelos três
Profissional de Futebol, em que participaram apenas equipas do Norte Operário, uma vez que as equipas compostas por aristocratas do Sul rejeitavam liminarmente o profissionalismo, que acreditavam desvirtuar a essência do jogo, contenda essa que se viria a sentir também em Portugal, embora muitos anos mais tarde. Meses depois do primeiro «ensaio», Guilherme Pinto Basto, figura tida como o “pai do futebol português”, organizaria um novo encontro com o auxílio dos irmãos, desta vez já com as equipas devidamente equipadas e
64
conscientes das regras basilares do jogo. O final do século XIX foi uma fase embrionária do futebol em Portugal e, por esta época, a disseminação do jogo esteve umbilicalmente ligada às comunidades inglesas residentes no nosso país, nomeadamente em Lisboa e no Porto, pois nas ilhas britânicas o fenómeno já desfrutava de grande popularidade, estava num estágio evolutivo muito mais avançado. Contudo, durante o ano de 1890, uma disputa por territórios coloniais em África levou o governo da Rainha Vitória a fazer um Ultimato ao governo português. Esta ameaça de guerra motivada pela apresentação do célebre Mapa Cor-de-rosa levou ao exacerbar dum forte sentimento patriótico e de rejeição por tudo o que fosse britânico, e fez com que a prática futebolística sofresse um forte revés nestes tempos. O trilho da afirmação do futebol em Portugal abrandou, mas a marcha era imparável e o tempo encarregar-se-ia de o provar. Foi quatro anos mais tarde, em 1894, que se disputou o primeiro troféu em solo lusitano, num jogo que opôs um conjunto de Lisboa, composto por jogadores Club Lisbonense, Ginásio Clube Português e Carcavellos Club, a um outro do Porto, aonde militavam praticantes do Foot-Ball Club do Porto e do Oporto Cricket Club. A Cup D’el Rey foi vencida pela formação lisboeta, e contou com a presença do Rei D. Carlos convidado a
65
assistir ao encontro pelo influente Guilherme Pinto Basto, que já tinha por esta altura fundado o Club Lisbonense, que viria mais tarde a dar origem ao Club Internacional de Foot-Ball (CIF). O CIF foi o primeiro clube português a realizar um «match» em solo internacional, mais propriamente em solo espanhol em 1907, contra o Madrid Foot-Ball Club, clube precursor do todopoderoso Real Madrid. O encontro terminaria com uma vitória da formação lusa por duas bolas a zero. Por esta altura também (época 1906/07) iniciou-se a primeira competição de regularidade disputada em Portugal, o Campeonato de Lisboa, que foi dominado nas primeiras três edições pelos ingleses do Carcavellos Club. O futebol estava a disseminar-se e a chegar gradualmente às camadas populares. No ano de 1911, num Benfica-Sporting foram pela primeira vez cobrados ingressos a quem quisesse assistir ao jogo, situação que originou um grande alarido e indignação dentro de determinadas camadas privilegiadas da população que, tal como tinha sucedido em Inglaterra ,defendiam que o jogo se deveria manter propriedade dos cavalheiros. No ano de 1914 viria a surgir a União Portuguesa de Futebol, organização que em 1926 seria rebatizada de Federação Portuguesa de Futebol. Em 1921 foi a vez da Selecção Nacional se estrear num encontro disputado em Espanha,
66
que “nuestros hermanos” venceriam por 3-1, com o golo português a ser apontado por Alberto Augusto. Este elenco era maioritariamente composto por «gansos», jovens que eram assim apelidados por terem passado pela Casa Pia, instituição que teve um importante papel para a difusão do jogo entre as camadas populares. Um desses «gansos» foi Cândido de Oliveira, homem que capitaneou a selecção nesse primeiro encontro e que se viria a tornar na figura maior das primeiras décadas do futebol português, e que seria também o responsável pela estreia da equipa nacional numa competição internacional de monta, nos Jogos Olímpicos de Amesterdão em 1928, competição essa em que a equipa das quinas alcançou os quartos-de-final, depois de ter deixado pelo caminho o Chile e a Jugoslávia. Cândido de Oliveira foi também um dos fundadores do jornal desportivo A Bola, em Janeiro de 1945. Foi no ano seguinte à estreia da selecção, que se disputou o primeiro Campeonato de Portugal, que contou apenas com os vencedores dos campeonatos regionais de Lisboa e do Porto, e que foi vencido pelo FC Porto. O FC Porto, que se sagraria também vencedor da primeira edição da Liga Portuguesa na temporada 1934/35, é o clube nacional mais antigo em actividade. Foi fundado em 1893 por iniciativa de Nicolau de Almeida, comerciante de Vinho do Porto que, fruto das suas constantes deslocações a Inglaterra para tratar de negócios, se viria a apaixonar pelo
jogo e a trazer uma bola para a terra natal. O Campeonato de Portugal, competição disputada através de um sistema de eliminatórias, foi substituído na temporada 1938/39 pela Taça de Portugal e, nesta edição inaugural, a equipa vencedora seria a Académica de Coimbra. O período entre as duas guerras mundiais consagrou o futebol como desporto rei no nosso país, e foi na década de 1940 que se deu início ao processo de profissionalização, embora o profissionalismo fosse legalmente proibido por lei, fruto da desconfiança com que os responsáveis pelo Estado Novo olhavam para o fenómeno. Ao contrário do que é comumente veiculado, o regime fascista português nunca olhou com bons olhos para o futebol, uma vez que a natureza “efervescente” da “bola” chocava com o ideal de pacatez e ruralidade patrocinado por Oliveira Salazar. Só na década de 60 a profissionalização se consolidou e foi legalizada, período que
coincidiu com uma época dourada do futebol português, marcado pela conquista de duas Taças dos Campeões Europeus pelo Benfica, e pela primeira participação e consequente melhor resultado (3º lugar), até aos dias de hoje da selecção nacional num Campeonato do Mundo de Futebol em 1966. Entre os «magriços» despontavam figuras como Eusébio ou Coluna, que são ainda hoje recordados como sendo dos melhores futebolistas de sempre do futebol luso. Desde o «ensaio» realizado num pacato domingo de Outubro de 1888 em Cascais, muita coisa mudou, mas a espiral imparável de afirmação do futebol alcançou patamares inimagináveis à época, e é hoje uma actividade de destaque primordial, dominando as atenções mediáticas e “hipnotizando” semana após semana boa parte dos portugueses. Por J. Sousa
67
ASSOCIAÇÃO DE ADEPTOS DESPORTIVO DAS AVES Fundada em dezembro de 2014, a associação que representa todos os adeptos do Aves e sócios do clube, em especial os agregados à Força Avense pois é no seio do grupo que surge a ideia e se parte para a consumação da sua criação. Os motivos essenciais que nos levaram a isto prendiam-se essencialmente com a falta de um espaço que proporcionasse a reunião e convívio entre os adeptos do clube, e com o aumentar das ideias repressivas sobre os grupos organizados de adeptos. Desde 2003 que a Força Avense teve acesso a um anexo no estádio, que serviu de sede do grupo até 2012. O clube tem um estádio que faz 40 anos este dezembro, é um estádio antigo, que só tem uma bancada coberta e, desta forma, tem muitas infiltrações, tornando degradado o espaço que tantas histórias e episódios nos proporcionou, a ficar ao ponto de não garantir o propósito que até então serviu. Decidimos então criar a AADA 1930, registada em notário como associação sem fins lucrativos, e consequentemente abrir, um espaço no centro da vila, junto a outros cafés e bares para que a visibilidade fosse maior, e assim conseguisse agregar os jovens junto do clube da terra. Foi também forma de desmistificar um pouco a opinião generalizada sobre as claques, abrindo um espaço ao público, em que todos são bem-vindos, e onde podemos mostrar que não somos todos arruaceiros, delinquentes e que temos capacidade de organização em prol do Clube Desportivo das Aves! Amparamos muitas vezes, quase diariamente, muita malta com realidades de vida difíceis, pessoas que têm dificuldade em integrar-se na sociedade, um café e uma cerveja sempre os ajuda a não cair na necessidade de roubar! A reboque disto, começaram a surgir as obrigatoriedades dos registos dos grupos organizados. Consultamos o advogado do grupo, que nos aconselhou a enviarmos já a lista existente dos corpos diretivos da AADA 1930 (obrigatório na
68
constituição das associações), e assim conseguirmos de certa forma ludibriar a lei, principalmente nos jogos em casa sendo que, em muitos estádios aos quais nos deslocávamos, sabíamos de antemão que nada em que constasse o nome Força Avense ou Ultras poderia entrar, bem como tambores. Conseguimos manter muitas vezes a presença de faixas na bancada desta forma não constando mesmo assim, o nome do grupo, pois não era a Força Avense que estava registada como G.O.A.. A Força Avense sempre existiu como marca registada de roupa. A adesão e a visita à “nova sede” trouxeram benefícios, principalmente no que toca a aumentar
o número de pessoas que seguem o Aves e, consequentemente, a tornarem-se sócias do clube. Por outro lado, tornou-se um sustento financeiro importante referente ao grupo, proporcionando deslocações mais baratas, ocasionalmente a proporcionar deslocações a todos os adeptos do Aves de forma gratuita, precisando só de adquirir o bilhete. Ajudas em custos judiciais de elementos menos favorecidos que por vezes são apanhados nas malhas da repressão policial. Ajuda às associações locais, desde orfanatos, a associações de animais, bombeiros, e mais recentemente ao nosso grande amor, o Clube Desportivo das Aves que, desde que caiu nos distritais, e por mil e um problemas, já contou com mais de 6000€ de ajudas desde agosto de 2020, uma ajuda concertada entre a AADA 1930 e a Força Avense, com a agravante de ser em tempos pandémicos. E não ficará por aqui… Já organizamos dois festivais de música, com bandas emergentes, desde Bed Legs a Paraguaii, e com muitas bandas locais. E já organizamos duas apresentações do plantel sénior, num evento com música à mistura. Temos o objetivo de começar a implementar o modelo alemão no que toca a deslocações de todos os adeptos do clube, e criar espaços como fan/ zones nos locais onde o clube se vai deslocar. Temos o propósito de criar multidões de adeptos que nos ajudem a sair dos distritais o mais rápido possível! Este dezembro festejaremos o sétimo aniversário, no dia 18, estão todos convidados, temos por norma receber malta de outros clubes, num espirito saudável de convívio e troca de ideias. Apareçam. Viva o Aves! Por Tiago Sampaio
69
3.0 “Quando volta a Liga dos Últimos? A pergunta é-nos feita vezes sem conta por todo o país. A equipa que realizou, ao longo de vários anos, o programa (marcante para uma geração de telespetadores) é, frequentemente, convidada a reviver junto dos mais saudosistas os inesquecíveis episódios. A Liga dos Últimos: um clássico e uma marca. É, para mim, a melhor forma de definir o conceito que sobreviveu ao tempo e atingiu sem
excepção os portugueses. Ao ser um clássico tornou-se imortal, intemporal. Ao ser uma marca é, não raras vezes, alvo de tentativas de replicação que têm acabado sempre por resultar em algo diferente e distante da mística inicial. Isto acontece, não por mérito único e irrepetível de quem fez o programa mas, essencialmente, porque o panorama televisivo mudou e o país também. Quando me perguntam se a “Liga” (como carinhosamente lhe chamamos) pode voltar eu, normalemnte, digo que não. Aquela “Liga”, não. E é bom que não volte. Não só porque
70
viveu (e sobreviveu) mais do que era expectável em antena, mas também porque aquele é um retrato rico, por ser irrepetível. Grande parte dos campos pelados (se quisermos agarrar desde logo na marca essencial da imagem do programa) já não existem... felizmente. Mesmo os clubes mais remediados têm hoje condições que há uma década pareciam impossíveis. Os que não chegaram até aí, acabaram por desaparecer. Há dezenas de clubes que foram personagens principais na Liga dos Últimos e foram extintos. Eles e as figuras que lhes enchiam a alma. Ao olhar para trás, não tenho dúvidas de que o arquivo da Liga dos Últimos é um retrato sociológico fiel do que foram aqueles anos no país. Cada reportagem tinha como princípio um jogo de futebol (ou outro evento desportivo), mas ninguém sabia onde podia acabar. Quando encontrei o mítico “Wally do Alentejo” (benfiquista e comunista de trás-os-montes) a vaguear pelas ruas de Évora vestido como a mítica personagem de BD, estava apenas em busca das
raízes do futebol na região; quando encontrei o famoso “Celestino, o Rei da Selva” (homem que chorava sempre que ouvia um árbitro ser insultado sem piedade) estava apenas em busca do presidente do Gerês num dia de jogo grande; quando saí do Estádio do Algarve após retratar a angústia de um Farense mergulhado no Distrital, jamais imaginava que, enquanto mirava a estrada de regresso ao Porto, veria pendurado numa ponte um adepto que não procurava colocar fim à vida, mas antes “esticar as costas” num gesto que repetia diariamente perante a indiferença de amigos e vizinhos. As pequenas histórias que moravam dentro da grande história de cada jogo eram o nosso tesouro. E, por ele, tivemos de lutar muitas vezes horas a fio. Quando há dias, após um fora-de-jogo mal assinalado na Liga Portuguesa, vi nas redes sociais uma alusão ao famoso “Vitor do Poste” (homem que via o jogo de futebol atrás de um poste para, dessa forma, avaliar o posicionamento dos jogadores - numa espécie de VAR do tempo da pedra) percebi que uma viagem
a qualquer rede social nos mostra o seguinte: a Liga dos Útimos é hoje um foco de nostalgia para quem o viu na televisão, mas sobretudo uma descoberta infinita para novas gerações que o fitaram apenas pelas plataformas digitais onde está depositado grande parte do arquivo do programa. Esse novo olhar sobre a Liga dos Últimos é um enorme abraço do tempo a quem palmilhou o país em busca de todos aqueles retratos, mas
sobretudo uma nova perspectiva que interessa avaliar. A forma como as personagens se reinventam à luz da actualidade e o modo como os mais novos olham (com espanto) a realidade do país há pouco mais de dez anos deve conduzir-nos à nova vida da “Liga”. A tal Liga dos Últimos 3.0. Não tenho dúvidas de que será intemporal. Como não duvido do orgulho que sentem, desde logo, o Daniel Deusdado (criador do conceito), o Sérgio Sousa (repórter e coordenador do programa) ou todos os jornalistas que, como eu, andaram pelo país. Sendo o Ricardo Amorim a figura que mais vezes vejo associada à essência da Liga dos
71
Últimos, conseguindo com a ajuda do repórter de imagem (e editor) Hugo Matos, transportar para novas reportagens uma linguagem (estética e formal) que começou na Liga. A ausência pesada do Professor “Bitaites” Hêrnani Gonçalves - que um dia me definiu à mesa de um café no Foco, na cidade do Porto, “bitaite” como um “sweet nothing-, é tantas vezes lembrada pelo mítico Álvaro Costa e é também uma das razões pelas quais a Liga é única e um processo fechado no tempo. Um tempo que guarda para sempre as míticas palavras do Capitão Moura: Justo, Honesto, Coerente e Imparcial. Por Ivo Costa
72
73
JOGADOR ADEPTO PLI
O meu nome é António Pedro Peixoto, mas na minha modalidade (Futsal) todos me conhecem por Pli. Muitos também me conheciam por ser aquele guarda redes maluco que em pleno jogo cantava com os adeptos. Se acho isso normal? Não sei. Mas uma coisa sei, e tenho a certeza de que os verdadeiros adeptos aqueles que vibram mal vêm o seu clube a jogar, vão concordar comigo… Será que há sentimento melhor do que ter a sorte de poder representar e defender em campo o símbolo pelo qual somos loucos de paixão??? A resposta para mim e para muitos é fácil, claro que não! Imaginem que têm a sorte de poder entrar em campo com um pavilhão cheio, a entoar aqueles cânticos que tu tão bem conheces pois segues o teu clube para todo lado a cantá-los. Imaginem que podem, em campo, fazer tudo para engradecer o teu clube. Imaginem que olhas para bancada e vês os malucos como tu, e que sabes muito bem o que é estar ao lado deles a saltar e vibrar. Imaginem que em campo o cantar esses cânticos te dão uma força extra de motivação para fazer tudo o que podes e não podes como forma de elevar o teu clube e fazer vibrar os teus adeptos. Imaginem o que é saber que esses adeptos, tal
74
como tu, não te pedem a vitória, mas sim que honres o teu símbolo em campo, dando tudo que tens sem vedetismos. Para aqueles que não conseguem imaginar tudo isto, e muito mais, apenas digo que é uma sensação inexplicável onde o estar em pele de galinha em campo já é normal e ouvir aquelas vozes interiores a dizer-nos “VAMOS CR….” dãonos uma força que parece que somos uns gigantes imbatíveis de 3 metros. Por isso aqueles que não sabem a força que os adeptos dão aos clubes e respetivos atletas, ou não gostam do desporto competitivo ou são daquele grupo que apenas gosta de dizer mal pois fica bem…. Saudações desportivas a todos. Por Pli
75
ERA UMA VEZ A SPORT PEOPLE
Contar a aventura editorial da “Sport People” significa também contar um pedaço de história do movimento ultra italiano, uma história crucial tendo em conta os episódios que aconteceram neste período de tempo. Parece que passaram inteiras eras geológicas desde que o primeiro número viu a luz do dia em novembro de 2003. Era o dia seguinte a uma manifestação organizada pelo Movimento Ultra em frente à sede da Liga de Futebol Italiana, em Milão, para protestar contra o futebol moderno e todos os seus defeitos: preços elevados, pay-tv, leis repressivas, etc. Movimento Ultras, para que conste, era uma espécie de associação informal de grupos organizados, reunidos para abordar problemáticas comuns que, entretanto, se dividiu em duas realidades, uma minoritária que continua o mesmo percurso, ainda que não utilize o mesmo nome, e outra maioritária que criou a Basta Abusi, uma rede semelhante nas intenções, mas que escolheu outros caminhos para as colocar em prática. No que nos diz respeito, desde o início quisemos acompanhar de perto e atentamente esta e qualquer outra iniciativa ultra, nos estádios e nas ruas, quer concordássemos ou não, fosse qual fosse o grupo ou equipa, da Serie A até às divisões inferiores, de Norte a Sul. Desde esse primeiro momento conseguimos obter uma forte adesão à realidade sobre a qual escrevíamos, isto porque, como redação, o nosso passado era exatamente o mesmo das pessoas sobre as quais falávamos e que imortalizávamos nas nossas fotos: na grande maioria tínhamos todos um passado de militância dentro de uma Curva por isso, a nossa postura não era uma observação participativa como
76
poderá ser a dos sociólogos mas, como dizia Jello Biafra dos “Dead Kennedys”, uma forma de “nos tornarmos os nossos próprios repórteres”, sem perder tempo a odiar inutilmente os outros órgãos de comunicação social ou deixar que continuassem a dizer mentiras a nosso respeito. Por fim, mas não menos importante, fomos também motivados pela falta de reconhecimento para com o movimento ultra que deu tanto de si em termos de experiências humanas e formativas e, ao qual decidimos retribuir, à nossa maneira, procurando equilibrar a informação cheia de preconceitos e clichés. É óbvio que esta riqueza de experiências condicionou a nossa atividade de um ponto de vista ideológico: para publicar uma revista em pleno respeito pelas leis italianas, tivemos de criar uma associação onde optamos por um modelo “sem fins lucrativos”, que, por estatutos, nos impede de lucrar nada com as nossas atividades. Não é por acaso que não temos qualquer publicidade no nosso site, não vendemos merchandising como outros, não imprimimos material, em suma, é como se fossemos ultras mesmo quando escrevemos, não especulamos em nenhuma forma sobre os nossos ideais e os dos outros. E s t a m o s convencidos de que este facto é também um problema, na medida em que, particularmente nos últimos anos, as instituições do futebol e políticas italianas introduziram cada vez mais obstáculos aos pequenos jornais como nós: para poderes fotografar a Serie A e B deves obter uma
carteira de jornalista e fazer todos os anos cursos de atualização. Também é obrigatório um seguro para poder entrar em campo sem contar com o dinheiro para as deslocações e nunca é certo que o gabinete de imprensa do clube te dê credencial para o jogo, porque claramente, um jornal que fala de adeptos nem sempre é tão popular como aqueles que se dirigem aos patrões do futebol. Em suma, torna-se cada vez mais difícil acompanhar, sobretudo as categorias maiores e se, para nós, é inaceitável a ideia de fazer lucro, é preciso procurar um equilíbrio num futuro próximo para poder, no mínimo, nos equilibrarmos com as muitas despesas que continuamos a suportar. Desde o tempo da nossa fundação, quando a Internet ainda não era acessível como hoje e os jornais em papel ainda estavam de relativa boa saúde, a única escolha possível para nós era a de digitalizar completamente os conteúdos. Uma escolha elitista nos primeiros anos, mas que a longo prazo se revelou certa e bastante antes do tempo em relação ao que aí veio, até ao aparecimento e boom das redes sociais que quebrou completamente as barreiras de comunicação ultras, aumentado substancialmente o interesse pelas publicações, onde, entretanto, a nossa se tinha tornado ponto de referência, quanto mais não seja pelos anos de serviço. É também verdade que esta hipertrofia da comunicação deu origem a um excesso, muitas vezes enjoativo ou inútil, como os muitos comunicados de muitos grupos ultras que essencialmente não dizem nada de importante. Nesse sentido, o debate e as críticas internas ao mundo ultras, que frequentemente condena o uso e sobretudo o abuso da internet, não é injustificado, ainda que essas observações devam ser direcionadas justamente porque o problema não é a própria rede social, esta ou aquela outra página do Facebook, mas precisamente o uso que dela é feito. De nossa parte, como sempre fizemos, limitamos ao máximo as fotos em close-up e, não raro, evitamos por completo a publicação de fotos de jogos em que estivemos
presentes, nos quais houve confrontos entre ultras e que poderíamos ter explorado para fazermos uma casa cheia de contactos. Por exemplo, num dos mais recentes Avellino-Paganese preferimos sempre o respeito das pessoas envolvidas a clicarem numa fotografia e que os eventuais julgamentos ocorram apenas em tribunal e não online onde, entre outras coisas, o material que poderia constituir novas provas
incriminatórias em favor dos investigadores. Ao mesmo tempo, seria um crime subestimar as poderosas possibilidades de fornecer informações por meio de canais tão imediatos e difundidos: alguns eventos como o espancamento da polícia contra os adeptos da Atalanta em Florença na Taça da Itália, a triste história de Luca Fanesi de San Benedetto del Tronto e a verdade incalculável de Antonino Speziale sobre a morte do Inspetor Raciti jamais teriam cruzado as portas das suas respetivas curvas. Claro que o equilíbrio de forças é sempre desproporcional e a opinião pública continua muito convencida, por exemplo, da culpa de Speziale na morte de Raciti, mas pelo menos uma pequena pedra foi atirada para o lago e mais do que alguém, entre jornais e programas de televisão, não relacionado ao mundo do tifo, nós falamos sobre essa verdade alternativa e introduzir o principio da dúvida na cultura de massa já é uma grande conquista. Por Matteo Falcone, Sport People
77
Evolução das leis contra a violência no desporto
Nos dias de hoje é cada vez mais evidente o aumento do número de adeptos portugueses interessados em intervir nos vários assuntos que rodeiam as bancadas. Torna-se então importante, para que seja possível elevar o nível das nossas discussões, que exista uma ampla divulgação de informação que sirva de suporte para percebermos todo o percurso histórico dos vários temas relacionados com os adeptos e, assim, conhecer melhor tudo aquilo que os rodeia de forma a obtermos uma visão mais alargada e profunda do contexto que o envolve. Este texto irá centrar-se num tema em particular, a evolução da lei no âmbito da segurança no desporto ao longo dos anos, tanto na Grã Bretanha como em Portugal. É pelo peso que as várias legislações tiveram, nas mudanças ocorridas nos espectáculos, que também faz sentido possuir uma leitura de todo um caminho, de modo a podermos avaliar se os resultados e os detalhes da lei são coincidentes ou paralelos às intenções da mesma. Nas linhas que se seguem irei aproveitar uma parte importante do trabalho realizado pelo Doutor João José Rodrigues Afonso, no livro “A Segurança em Espetáculos de Futebol”, publicado em 2020 e escrito com intenções de abordar o tema do ponto de vista sociológico, técnicopolicial e jurídico. Começando pelo exemplo da Grã Bertanha, uma região com uma enorme tradição desportiva e ao mesmo tempo, de incidentes de violência, é preciso recuar até 5 de Abril de 1902. Nesta data marcada pelo colapso de parte de uma bancada, repensou-se a forma como as bancadas passariam a ser construídas. Assim, para evitar desabamentos idênticos ao ocorrido por aquela altura, as bancadas passariam a ser assentes em taludos, ao invés da prática habitual utilizando suportes de madeira. Pouco mais de vinte anos depois, em Abril de 1923, num jogo a contar para final da Taça da Football Association entre Bolton
78
Wanderers e o West Ham United, estiveram cerca de 200.000 adeptos num estádio que apenas suportava 125.000. Muitos entraram sem bilhete e com as bancadas a abarrotar, um número considerável de adeptos acabaria por se acomodar no próprio relvado. A polícia não estava preparada para tal cenário e, perante tamanho descontrolo, exigia-se uma resposta que previnesse situações semelhantes no futuro. Fruto deste acontecimento, em 1924 surge o relatório Committee on Crowds que apontou a importância dos clubes seguirem os pareceres das forças de segurança relativamente ao número de elementos policiais necessários para alcançar uma boa gestão das multidões de adeptos. Acrescentaram também que os clubes que não seguissem esses “conselhos”, deveriam sofrer sanções pesadas. Segundo o autor da obra consultada para a construção deste texto, até perto dos anos 70 a actividade da segurança era conduzida de um modo informal entre os clubes e as forças de autoridade. No fundo, os clubes pagavam os agentes necessários e praticamente ficavam por aí. Pelo ano de 1968 surge um novo relatório, o Harrington Report in Soccer Hooliganism. Nele vem espelhada a preocupação das autoridades pelo facto de, em geral, só estarem preparadas para controlar os incidentes em jogos nos quais já
existisse um historial e, por isso, tornava-se mais fácil de prever possíveis actos de violência. Na
verdade havia incidentes em vários jogos que, à partida, não pareciam dar grandes problemas, com os mesmos gerados de forma quase espontânea sem que ninguém os pudesse prever. No mesmo documento era referido que policiamento elevado e ostensivo, dentro de campo, prejudicava a visão aos espectadores e ao invés de prevenir episódios, menos positivos, exercia um efeito contrário com os adeptos menos tolerantes. Assim, uma das soluções para este último ponto era a construção de um fosso entre a bancada e o terreno de jogo para evitar a presença da polícia e controlar possíveis invasões do terreno de jogo. No ano seguinte, em 1969, é publicado The Long Report, que estabeleceu um rácio para calcular o número de efectivos em função da avaliação do nível de risco. Convém sublinhar que, mesmo assim, o número de polícias era reduzido na medida que, mesmo existindo uma força crescente de actos associados ao Hooliganismo, em geral não existiam grandes problemas. É também nestes últimos anos da década de 60 que a polícia começa a colocar-se entre os adeptos de clubes rivais. Ao chegar aos anos 70 já se pode ver mais algumas adaptações nas forças de autoridade como a criação de pequenas unidades de intervenção, mais musculadas, e a separação dos adeptos adversários no exterior dos recintos desportivos. Em 1983, a Polícia inglesa e a Liga de Clubes expressaram um novo acordo, através de um memorando, onde ficava o compromisso de uma comunhão de esforços no planeamento de segurança, no que dizia respeito à separação de adeptos adversários no interior dos recintos e ao acompanhamento de grupos de adeptos até ao recinto. Em meados dos anos 80 o rácio de polícias por adeptos já tinha sofrido um enorme aumento e começam-se a criar os primeiros registos de Hooligans que serviriam de base para o sistema de CCTV. A década de 80 ficou ainda marcada, inclusivé na comunidade internacional, por episódios de violência como a tragédia de Heysel Park, que iria despoletar um conjunto de reacções que se traduziram em políticas de combate à violência (na vertente security). Por outro lado,
foi também nestes anos que ocorreu o desastre de Hillsborough potenciado por uma actuação desmedida das autoridades e de falhas na segurança do recinto, como a ausência de saídas de emergência nas vedações que separavam as bancadas do recinto. Fruto deste último episódio, foi criado, em janeiro de 1990, o Taylor Report que, entre várias coisas, evidencia a falta de preparação da Polícia para a gestão de multidões. Este documento abre portas para o reconhecimento da importância da vertente da proteção dos adeptos (safety) na gestão dos espectáculos desportivos. Várias medidas foram acolhidas pelos clubes procurando corresponder às conclusões do relatório, como a obrigatoriedade dos adeptos permanecerem sentados e a promoção da presença dos stweards nos recintos. Como diz João José Rodrigues Afonso no seu livro: “Estavam lançadas as sementes para as bases da segurança no desporto, assente na trindade safety, security & service”. Entendese por service “a hospitalidade/acolhimento e comodidades do espectadores”. A partir daí assistiu-se a uma forte mudança nas bancadas Inglesas, que acabariam por influenciar a visão de muitos países europeus e não só.
79
No ano de 1989 já havia sido criada a Sports Ground Safety Authority, actuando actualmente como uma autoridade administrativa. Seguiu-se a criminalização de vários comportamentos, removeram as barreiras de separação, evoluíram o sistema de gestão de espectadores nos recintos, proibiram o consumo de álcool nas bancadas, instalaram o sistema de CCTV. Por cá, em terras Lusas, no que diz respeito à violência no desporto estivemos, durante vários anos, afastados das realidades que existiam noutros países europeus. Ainda assim, em 1927 surge o primeiro Decreto que trata a imposição de algumas condições técnicas e de segurança em espectáculos e desporto em geral. Anos mais tarde, em 1959, o Decreto é actualizado a par da criação de um regulamento associado às condições técnicas e de segurança nos recintos de espectáculo, onde a presença da polícia e dos bombeiros continuava a ser obrigatória. Após o 25 de Abril de 1974, mais concretamente em 1979, foi publicado o DecretoLei nº 94/79 o qual ditou que a presença do policiamento apenas deveria existir no caso do promotor do espectáculo ou divertimento público o requisitar. No ano seguinte, em 1980, um novo Decreto anuncia o primeiro conjunto de medidas de prevenção à violência nos recintos desportivos. Entre as várias medidas, incluídas neste último diploma, podemos encontrar que, no caso de acontecerem episódios de violência, o promotor ficava obrigado a construir vedações à volta da área de competição e um túnel de acesso aos balneários. Também os recintos construídos a partir desta data eram obrigados a conter essas mudanças. No que diz respeito à penalização pelos actos de violência, o ónus recaía sob os clubes promotores do evento e não sob os adeptos que os protagonozivam. Em 1985 uma Portaria acrescenta que no topo das vedações deveria existir três filas de arame farpado. Em 1989 é dado um passo significativo. Na segunda revisão constitucional ficou presente a responsabilidade do Estado português na prevenção da violência no desporto. Como consequência o estado aprovou, no mesmo ano, um novo decreto com várias alterações
80
significativas. É muito interessante o apontamento, do autor do livro consultado, quando refere que este decreto é aprovado cerca de quatro meses depois do desastre de Hillsborough, após morrerem 96 adeptos esmagados contra as redes, e nem assim o legislador suprimiu as vedações. Entre várias coisas, esta lei fica marcada pela
imposição progressiva de lugares sentados e numerados. Mais tarde, em 1996, numa final da Taça de Portugal, morre um adepto, atingido por um very light que havia sido lançado por um adepto do clube rival. Um acontecimento que iria marcar, pela negativa, a forma como a violência seria vista pelo poder político em Portugal. É então aprovada uma nova Lei (nº 8/97) na qual é estabelecida a criminalização de “condutas suscetíveis de criar periogo para a vida e integridade física decorrentes do uso e porte de armas e substâncias ou engenhos pirotécnicos no âmbito de realizações (...), desportivas. Esta lei é seguida de outra (nº 38/98) que determina medidas preventivas e punitivas a adoptar em caso de manifestações de violência associadas ao desporto. Por curiosidade, deixo a informação que, é na Lei nº 38/98 que aparece a primeira menção sobre os grupos organizados se constituirem enquanto associação. Isso vem explícito no artigo que decreta aos promotores do espectáculo
desportivo a limitação de apoiar apenas os grupos de adeptos que estivessem constituídos como associações e registados na federação ou na liga da respectiva modalidade, e também possuíssem um registo organizado e actualizado dos seus filiados. Também é nesta lei que nasce a obrigação dos recintos, onde se realizem eventos de competições profissionais, disporem de um sistema vigilância e controlo por circuito fechado de televisão a fim de permitir o controlo visual de todo o recinto desportivo. Durante os anos que se seguiram tornouse evidente que muitos dos promotores ainda não estavam sensibilizados, o que os mantinha despreparados, para alguns tipos de fenómenos associados à gestão de multidões e da violência no desporto. Até que eclode no cenário português um evento, o Euro 2004, que iria transformar a forma como as bancadas portuguesas viviam. Surge assim a Lei 16/2004 que vem actualizar todo o quadro legal e sistematizar as condições de acesso e permanência dos adeptos. Os grupos de adeptos que tivessem intenções de serem apoiados pelos clubes mantinham a condição da Lei nº 38/98, mas com uma alteração, estavam agora obrigados a constituirem-se como associações e registarse no Conselho Nacional contra a Violência no Desporto (CNVD). No ano de 2009, surge a Lei nº 39/2009 que iria contar com três alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 114/2011, pela Lei nº 52/2013 e pela Lei nº 113/2019. A alteração que mais marcou foi, sem dúvida, a última de 2019. O legislador procurou dar uma maior celeridade processual que seria acente numa transferência de poderes do IPDJ para a APCVD. Esta iria tratar dos processos administrativos, como o IPDJ nunca o fez, levando à interdição de um elevado número de adeptos se comparado aos anos anteriores. Foi imposta a criação de zonas com condições especiais de acesso e permanência para adeptos do clube visitado e visitante, nos recintos que recebam competições profissionais ou não profissionais de risco elevado. Para aceder a estas zonas é criado o cartão de adepto. A 26 de Novembro o parlamento aprovou o Decreto de Lei que extinguiu o cartão do adepto mas, por acção preversa do PS e do PSD, manteve
todas as suas práticas, o que basicamente vai dai dar ao mesmo. Resta-nos, enquanto adeptos, estarmos preparados e informados para não permitir que nos continuem a usar como “projecto piloto” para o teste de novas medidas de controlo social, típicas de sistemas políticos totalitaristas. Houvesse a mesma vontade, que se vê no palco desportivo, para acabar com a corrupção e outros problemas que afectam com maior intensidade a população do nosso país e, certamente, que hoje haveria um declínio de outros problemas sociais. Só que não, iremos continuar a servir de bode expiatório que ajuda a afastar as atenções de problemas muito mais prejudiciais ao nosso país. Por João Lobo
81
O NOSSO CLUBE, O REFLEXO DA NOSSA GENTE Leixões, o coração de uma Cidade que bate cada vez mais moribundo. Este é o reflexo da mudança dos tempos no fenómeno desporto, da mudança identitária de um povo, de uma Cidade, onde as novas gerações não conseguem vestir a camisola da mesma forma que tantos o souberam fazer. Este já não é o jogo pelo jogo, onde todos tínhamos oportunidade de ser estrelas, onde um Clube e uma Cidade se fundiam. Hoje os “sobreviventes” são uma espécie de pobre alma, contudo nobres e aguerridos, na esperança de um futuro ao nível do passado, do Leixões como era, de sentimento e pertença ao seu legado. A nostalgia desta introdução é alicerçada pelo conhecimento da natureza simbiótica da relação entre o Clube e a Cidade noutros tempos, para tentar promover uma compreensão mais aprofundada da influência que o Leixões exerceu em Matosinhos. POR UM PASSADO COM FUTURO Apesar das nossas peripécias e façanhas desportivas de que tanto nos orgulhamos, na verdade, nunca fomos um Clube que primasse pelas presenças constantes na primeira divisão. Portanto, quando dizem que o lugar do Leixões é aqui ou ali… o lugar do Leixões é o mesmo de sempre. Dentro de nós! Aquilo que nos distinguia era a nossa força e mobilização enquanto povo do mar. A nossa força em construir um Leixões à nossa própria imagem, independentemente da divisão. Alimentarmo-nos do nosso melhor peixe pois nele residia a força revitalizante para mais uma
82
semana de faina. A Cidade a respirar vermelho e branco. O “jogo” repetia-se, domingo após domingo, ano após ano, décadas… mais do que um século. Isto era o elementar: um Clube totalmente ligado e focado nas suas pessoas. O único catalisador para a real força do Clube. E nós seguíamos cegamente atrás. O fenómeno “mobilizador” que o Leixões tinha devia-se essencialmente a três aspetos. Em primeiro lugar, pelo nosso legado familiar, em segundo lugar porque o Clube personificava exatamente o ADN das Pessoas e consequentemente da Cidade, por último, as pessoas acreditavam no sentimento de empatia e união ao Clube. De certa forma com o passar do tempo se tudo foi esvanecendo. Entre a mudança da genética da Cidade, a crise geracional em que o Clube está envolvido, a evolução péssima do fenómeno futebol e a forma “sofisticada” do Clube passar a (não) comunicar com a sua massa crítica, indo atrás do que os outros fazem, aliado à perda de referências ao nível de infraestruturas para trabalhar novos “Bebés”, de alguma maneira a corrente cortou-se e a ligação entre PessoasClube-Cidade foi desaparecendo. Aquilo a que temos assistido ultimamente é uma morte lenta, quase que anunciada, de um grande Clube. Não no sentido em que este corra o risco de deixar de existir, embora a realidade seja penosa, mas porque corremos o risco de nos tornarmos um Clube “banal”, totalmente desvirtuado dos valores e génese da sua criação, assim como dos pergaminhos da história. Aliado
a isto, uma Cidade que também não acredita na visão de um Leixões forte e vibrante. A ambiguidade do termo passado e futuro na mesma frase leva-me para aquilo que é central. Perpetuar a história e valores do nosso Clube em gerações vindouras. Para que eles próprios também sintam que vale a pena ir atrás de um legado. O futuro do Leixões passa por uma inversão do paradigma. Voltar à base, estar no coração da Cidade. Estar no coração da Cidade é ter a possibilidade ser mais e melhor vivido. Para nós é importante pensar numa nova centralidade do Leixões na Cidade de Matosinhos para inverter esta espiral negativa. Como eixo condutor desta estratégia permanece ainda em aberto a possibilidade de reivindicar o último diamante em estado bruto no coração da Cidade. Este espaço que gostaríamos de reivindicar para a Cidade e para o Clube, assume uma forma geométrica de um retângulo de jogo, está em terra batida e é um local que faz parte da nossa História – O (Antigo) Campo de Santana. CAMPO DE SANTANA O Campo de Santana, que antecedeu o Estádio do Mar, foi a casa do Leixões entre o final da década de 30 e o início da década de 60. Desde que o Leixões saiu deste local, este espaço não teve qualquer utilidade ou mereceu destino nobre. Foi, provavelmente, neste campo que se viveram as décadas de maior esplendor enquanto clube. Foi neste estádio que ficou célebre uma das maiores remontadas das competições europeias, assim como foi o berço do nascimento dos “Bebés”. Um traço genético que ainda hoje é colado ao Leixões. Na verdade, único. Presentemente o Campo de Santana situa-se nas imediações da Câmara Municipal, e estrategicamente situado perto de inúmeras unidades escolares que albergam crianças e adolescentes dos três aos dezassete anos. Reivindicar um “Novo Santana para Matosinhos” faz sentido? Trazer as pessoas para rua tendo como objetivo sensibilizar as forças vivas do ímpeto Leixonense faz sentido? E sensibilizar
para não olhar para aquele local mítico com a perspetiva de mais uma fantástica empreitada ao estilo de Matosinhos faz sentido? A resposta será sempre sim! A estas questões e a muitas mais. Serve para preservar o legado de uma geração que já não é, na grande maioria, a nossa, bem como a identidade de um povo, de uma Cidade, ao mesmo tempo que pensamos no futuro. Apesar de considerar que Matosinhos já não é dos Matosinhenses, o Leixões ainda continua a ser das poucas instituições do Concelho que alberga os valores e o sentimento do que é ser verdadeiramente Matosinhense – o Orgulho Peixeiro, o Orgulho nas Origens. E apesar das enormes dificuldades, ainda consegue transmitilo a novas gerações. Vamos então criar condições para que o fenómeno cresça.
MARCHA UM NOVO SANTANA PARA MATOSINHOS Um grupo de adeptos Leixonenses pegou neste tema do Campo de Santana e refletiu sobre como este poderia ser trabalhado de forma a que todos se sentissem envolvidos. Apesar do Campo de Santana ser exclusivamente uma bonita passagem da história do Leixões, pegou-se no tema “Santana” e tornámo-lo maior do que ele realmente é. Pensamos num “Novo Santana Para Matosinhos”. Um local que sirva para usufruto do Leixões, mas que, acima de tudo, esteja ao serviço dos Matosinhenses. Se já é mais ou menos unânime que naquele espaço deverá nascer um parque de estacionamento subterrâneo, dúvidas
83
permanecem sobre o que poderá ser viável construir à superfície. O que nós propomos é a construção de um Parque Desportivo. Um Parque Desportivo pensado de forma estratégica e que honre a memória do nosso Timoneiro Vítor Oliveira. Este é, de resto, um dos nossos desígnios e objetivos enquanto movimento. O outro é pegar na génese identitária do local e proporcionar condições para voltarmos a dignificar a história e tradição dos “Bebés de Matosinhos” com a criação de uma Escola de Formação que pode voltar a ser referência no desporto de formação nacional. Desta forma teríamos os “Bebés” a treinar diariamente no centro da cidade, perto das escolas… uma visão promissora de que o retorno deste investimento seria em capital humano. Adicionando esta infraestrutura às atuais que estão ao serviço do Leixões, ficaríamos com as camadas jovens exclusivamente no coração da Cidade. Os escalões de base no Bairro dos Pescadores, um dos últimos baluartes do sentimento peixeiro, passaríamos a contar então com o Campo de Santana para os escalões de formação dos onze aos quinze/dezasseis anos, sendo que as últimas etapas do percurso da formação seriam feitas no Complexo Óscar Marques, nas imediações do Estádio do Mar. Este movimento ganhará expressão aquando da “Marcha pelo Novo Santana de Matosinhos” que será realizada no âmbito da celebração do 114º aniversário do Leixões Sport Club (28 de Novembro). O Objetivo é que possamos contar com a mobilização de todos os escalões de formação do Clube, independentemente da modalidade, e que todos juntos possamos
84
caminhar pela Cidade em direção ao Campo de Santana. Um momento onde a vitória será proporcionar aos mais novos, essencialmente para eles, um momento único daquilo que é a mística Leixonense, assim como podermos contribuir com uma intervenção única para os livros de história do Clube. CONSIDERAÇÕES FINAIS Na nossa casa existe um monumento que foi erguido em memória de todos “Aqueles Que o Souberam Ser”. Inicialmente colocado no Campo de Santana, está agora colocado no Estádio do Mar. Este é o mote para atuais e novas gerações que vivem e respirem Leixões. Estarmos sempre à altura da nobreza do Clube. Mas para que isso aconteça, temos que ser mais participativos em todos os momentos da vida do Clube. Um Clube que se caracteriza pelas suas pessoas. Um Clube que, nas suas belas passagens históricas, contou sempre com a ajuda das suas gentes para se erguer. Um grande exemplo disso é a construção do Estádio do Mar. Hoje uma obra de arte que está totalmente retalhada e a ser tratada sem o mínimo respeito tendo em conta valor cultural e social que o espaço tem. Urge refletir que as vitórias vão muito além de se a bola entra na baliza do adversário mais vezes do que aquelas que entra na nossa. Acho que seria muito produtivo haver uma maior cultura clubística, mas também um novo paradigma do padrão de consumo do futebol e maior dinamismo na vivência do dia a dia do Clube. Estamos sempre ao ataque em busca de um futuro promissor e super revelador do desenvolvimento saudável das competições e dos clubes, mas negligenciamos o mais básico e elementar: que o futebol é um fenómeno de pessoas para pessoas. Deve ser mais humanizado, menos restritivo e evitar transformar tudo isto num padrão de consumo, onde somos tratados como “personas” ou fazer disto tudo uma matrix. Acredito que a força e potencial dos clubes está na sua capacidade mobilizadora
das pessoas, assim como na capacidade de se construírem novas gerações à imagem das matrizes históricas e identitárias dos mesmos. Acredito numa nova proposta de valor que os clubes podem apresentar aos seus associados. Mais sentido crítico e experiências que nos façam sentir o fenómeno como antigamente. Em dia de jogo, no estádio e não só. Claro está que o fenómeno modernização tem que estar presente e eu percebo isso. Mas sinceramente de que me vale ter um Clube embebido numa competição para ser consumido num “domingão” qualquer sentado no meu sofá, quando aquilo que eu mais sinto falta é o pai e o avô ao meu lado, estádio cheio e bola a rolar. A mística faz-se, transforma-se e passase através de um estádio cheio. Depois existe um conjunto de iniciativas que nos fazem respirar as nossas cores. O Leixões, como tantos outros Clubes, cada um à sua dimensão, dá que pensar… Por Ângelo Rega
85
PELA EUROPA FORA MILÃO
Depois de um ano e meio sem poder viajar, a juntar à proibição dos adeptos portistas irem a Madrid ver o Porto contra o Atlético, esta era uma deslocação muito aguardada pelos Ultras Porto. Viajaram cerca de 2000 adeptos com variadíssimos meios de transporte, tendo em conta a grande mobilidade dos núcleos no estrangeiro. Um dia especialmente chuvoso a acentuar todos os aspectos de uma Milão sempre cinzenta e sombria. Apenas aterrados em Bergamo, esperavanos um almoço com os amigos da Sampdoria que não puderam marcar presença no jogo devido ao protesto que ainda decorre de todos os grupos da Gradinata Sud só entrarem quando estiverem reunidas condições para todos. Findo este almoço bem regado, dirigiamo-nos ao sitio da concentração portista quando nos deparamos com um acidente na autoestrada e uma fila de alguns kms. Mudança rápida de planos e seguimos directos para o estádio onde pudemos estacionar no sector visitante pela módica quantia de 35euros. Por volta das 15h45 o grosso dos adeptos portistas, que se encontravam juntos no centro da cidade, partiram de metro em direção ao estádio. Começaram aqui os problemas da organização do jogo. Numa troca de linha o cortejo ficou fracturado em 2 o que originou um atraso na entrada do primeiro grupo, que entretanto chegara ao estádio onde já estavam outros adeptos a aguardar a entrada. A polícia alegou que só iriamos entrar quando chegassem todos os adeptos à entrada visitante. A chuva não abrandou e as condições começaram a deteriorar-se. Tendo em conta que nada disto ocorreu na primeira volta, não se compreendeu o ocorrido, e só a entrada à força permitiu começarem os controlos covid e 2 zonas de revista.
86
Os primeiros adeptos começaram a entrar na bancada às 18h, sendo que os últimos entraram já com 20 minutos de jogo. Inadmissível tratamento para um jogo de liga dos campeões onde o bilhete teve o custo de 39 euros. Dentro do estádio, uma coreografia simples da curva sud mas com belo impacto visual. Cachecóis individuais em plástico, com a mesma frase em versão gigante, a ocupar toda a largura da curva. Do lado portista de assinalar a frase aberta no início do jogo contra as mudanças previstas para a UCL, um protesto organizado pelos grupos alemães em que foi solicitada a nossa participação. STOP UCL REFORMS, FOOTBALL FOR MILLIONS OF FANS, NOT BILLIONS OF EURO. Apoio dos Ultras Porto forte e contínuo na primeira e segunda parte com algum declínio mais para o final. O oposto da curva sud, onde se mantiveram praticamente inaudíveis na primeira parte, mas com um bom crescendo na segunda. A prova de que um estádio todo a cantar em uníssono consegue mudar resultados e carregar uma equipa às costas. No final do jogo, uma saída tranquila do estádio. Na viagem de metro um furto de um pano por parte dos SD motivou uma caça ao homem por parte dos milanisti que terminou com a conquista de dois panos. Por M. Bondoso
87
CULTURA DE ADEPTO Por P. Alves e M. Bondoso
“A narração tem uma função essencial para os humanos, um acto social que demonstra a nossa identidade partilhada. Contamos histórias não só para entretenimento mas também para partilhar os nossos valores e a nossa história criando uma memória cultural ao fazê-lo.”
88
GATE 13 Internacional Autor: N/A Equipa: Panathinaikos Ano: 2006 Páginas: 254 Preço: N/A O Futebol grego pode não ser o mais interessante a nível de competição, mas quando falamos sobre os seus Ultras, então a realidade é bem distinta. O Gate 13 é provavelmente o grupo Helénico mais famoso. O que poucos sabem é que é igualmente um dos grupos mais antigos do Mundo no activo, cujas origens remontam ao ano de 1966. Foi precisamente para comemorar os seus 40 anos, que este grupo icónico do Panathinaikos decidiu editar o seu livro comemorativo. Ao longo de quase 20 capítulos, infelizmente t odos em Grego, são recordadas as várias épocas deste grupo. É dado ênfase às suas coreografias, aos seus confrontos com os rivais mais directos, incluindo as muitas, e por vezes mortíferas, batalhas com a polícia. Há ainda secções dedicadas às amizades com outros grupos, aos graffitis espalhados por toda a Europa, ao destaque que a imprensa dá e, ainda, uma secção dedicada a alguns elementos que foram mortos enquanto defendiam o grupo.
89
Juve Leo - 35 anos de glória Nacional Autor: Nuno Lobito Equipa: Sporting CP Ano: 2011 Páginas: 130 Preço: 25eur Mais do que um livro da história do grupo, este livro é um compêndio de várias entrevistas a ex-presidentes bem como de inúmeros antigos jogadores do clube. Começam por falar João Rocha e João Rocha Júnior fundadores da claque. Por entre os testemunhos de Manuel José, Acosta e Iordanov são colocadas fotos variadas dos 35 anos de actividade, embora sem legenda nem ordem cronológica. Outra particularidade do livro é a tradução em inglês a pensar no mercado de coleccionadores internacionais. Também conta com três testemunhos de membros do grupo: Fernando Mendes, Samico e Musta, e termina com uma mensagem do presidente, à época, Godinho Lopes.
90
Gate 13
Juve Leo - 35 Anos de glória
91
MUNDIAL 2 EM 2 ANOS
O futebol, ou devo dizer a ganância no futebol, não para de nos surpreender. A Federação Internacional de Futebol (FIFA) propôs a realização do campeonato do mundo de futebol, em séniores masculinos, de dois em dois anos. A ideia surgiu através do treinador Arsène Wenger e foi levada a votos, no 71.º congresso da FIFA, em Maio de 2021, por indicação da Federação da Arábia Saudita. Esta proposta seria aprovada com o voto favorável de 166 federações, enquanto que outras 22 votaram contra. Gianni Infantino, presidente da FIFA, comentou a proposta da seguinte forma: “É uma forma de promover o futebol, temos que estudar maneiras de estimular ainda mais esta modalidade e devemos ter a mente aberta. Sabemos o que representa um Mundial de futebol e agora temos de ver se há forma de encaixar esta fórmula no calendário internacional, ver jogos e classificações. Os adeptos querem ver os grandes jogos e, por isso, a prioridade será a vertente desportiva e não a comercial”. Aqui bate logo de frente com uma realidade que mostra desconhecer. A realidade dos adeptos que, na sua grandiosa maioria, não consegue suportar mais jogos no seu calendário “financeiro” e de disponibilidade.
92
Após a aprovação da proposta, a mesma seria alvo de estudos, por parte da FIFA, para se perceber a viabilidade da sua aplicação. Mais recentemente, a 9 de Setembro, Arsène Wenger, actual diretor de desenvolvimento de futebol mundial da FIFA, voltou à carga em Doha, no Qatar, com uma proposta para a reformulação do calendário internacional masculino de futebol já a partir de 2028, classificando o actual calendário como “antiquado” e garantindo que o desejo da FIFA é “formar o futebol do amanhã”. E que futebol é esse? O que, sem olhar a meios, tentar potenciar os lucros provenientes do seu negócio? O que ainda exige mais dos seus adeptos, tentanto cobrar mais a quem já tanto paga? Continuando, foram várias as vozes que se levantaram a favor desta proposta. Ronaldo, “fenómeno”, acha que o intervalo de quatro anos entre os campeonatos do mundo é “muito grande”. A par deste, também participaram na reunião e apoiaram a proposta o Peter Schmeichel, Roberto Carlos, Sami Khedira, David Trezeguet, Marco Materazzi, Tim Cahill entre outros nomes do futebol mundial. Também foi o caso de Nuno Gomes, ex-internacional português, que também se mostra a favor de uma mudança
no actual modelo. Não se fizeram esperar reações contrárias a esta ideia e à cabeça dessa oposição esteve a UEFA, na pessoa do seu presidente. Aleksander Ceferin reagiu à proposta de forma negativa chegando mesmo a dizer que tal medida irá “matar o futebol”. Já em comunicado, a UEFA informou que se opõe “firme e unanimemente a quaisquer propostas para organizar um Mundial da FIFA a cada dois anos” e que tenciona “trabalhar com outros agentes” para impedir que “as entidades reguladoras” do futebol “tomem decisões unilaterais que prejudiquem o futebol doméstico”. Numa entrevista, concedida ao jornal britânico The Times, o presidente da UEFA ainda completou dizendo: “Podemos decidir não o disputar. Tanto quanto sei, os sul-americanos sentem o mesmo. Por isso, boa sorte com um Mundial desses. Penso que nunca irá acontecer, dado que vai tanto contra os princípios básicos do futebol. Jogar, todos os verões, um torneio de um mês iria matar os jogadores. Se for de dois em dois anos, irá coincidir com o Mundial feminino e com o torneio olímpico de futebol. O valor da prova deriva do facto de se realizar a cada quatro anos. Espero que ganhem noção, porque não vejo a abordagem apropriada de consultar todos menos as confederações, de não falar connosco. Não se encontraram connosco, não nos ligaram, não nos escreveram uma carta, nada. Só leio na comunicação social.” Das várias preocupações da UEFA podemos listar as seguintes: -A diluição do valor do evento nº1 mundial do futebol, cuja ocorrência quadrienal lhe confere uma mística com a qual cresceram gerações de adeptos; -A erosão das oportunidades desportivas para as selecções nacionais menos poderosas, substituindo jogos regulares por torneios finais; -O risco para a sustentabilidade dos jogadores, forçados a participar em competições de alta intensidade no Verão, todos os anos, em vez de terem intervalos de recuperação mais longos, em anos alternados; -O risco para o futuro dos torneios femininos, privados de espaços temporais exclusivos e ofuscados pela proximidade dos principais
eventos masculinos. No dia 14 de Setembro, a UEFA e as suas 55 federações membro solicitaram à FIFA que organizasse uma reunião especial conjunta para poderem expressar as suas preocupações sobre o impacto de tais planos. Em Portugal também houve reações ao novo projecto da FIFA. A Federação Portuguesa de Futebol, a Liga Portuguesa de Futebol Profissional, o Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol, a Associação Nacional de Treinadores de Futebol e a Associação Portuguesa de Árbitros de Futebol manifestaram-se contra a intenção de aumentar a periodicidade do Mundial alegando a “sobrecarga dos calendários e a saúde física dos atletas” que teriam que lidar com a sobreposição de Jogos Olímpicos e Mundiais de futebol, para
93
além da “sobreposição de provas continentais e intercontinentais masculinas e femininas nos mesmos anos, o que retira impacto ao futebol feminino”, e do impacto nas competições dos clubes. Apesar desta intenção da FIFA ter levantado muitas vozes, as reações a este cenário não vieram só do mundo do futebol. Também a União Europeia manifestou a sua preocupação num modelo de competição realizado de dois em dois anos. Para Margaritis Schinas, vicepresidente da Comissão Europeia, deve-se pôr em consideração o impacto que esta medida terá nos calendários das competições nacionais, no bem estar dos jogadores e nos interesse dos adeptos. Na suas palavras, não se deve respeitar apenas os interesses comeciais. Por sua vez, também os adeptos se mostraram contra as pretensões da FIFA. Num comunicado colectivo, assinado por 63 organizações de adeptos de todo o mundo, onde se incluiu a Associação Portuguesa de Defesa do Adepto, começam por refutar a declaração de Arsené Wenger: “é o que os adeptos querem”. Afirmam em seguida que as mudanças pretendidas “ameaçam destruir o já frágil equilíbrio entre competições e calendários locais, nacionais, continentais e internacionais”. Para estas organizações de adeptos “o futebol enfrenta actualmente
94
problemas e desafios significativosgrande desigualdade dentro e entre ligas e federações, custos crescentes para os adeptos e infraestruturas inadequadas. O jogo precisa mudar. Mas precisa mudar para melhor.” A sua vontade é notória e prendese em “Ligas nacionais mais fortes e competitivas e emocionantes competições continentais. Queremos uma gestão mais justa e sustentável em todos os níveis. Queremos que os jovens tenham dinheiro para assistir aos clubes e seleções que amam. Queremos que todos tenham oportunidades iguais de jogar e assistir ao jogo num ambiente seguro e acolhedor.” Também contrariando Arsené Wenger surge uma pesquisa realizada pela FIFA, em setembro deste ano, onde os adeptos de futebol dizem preferir o calendário de quatro anos. Pessoalmente sou contra esta proposta de transformar o modelo dos mundiais de seleções. Consigo identificar que a grande vantagem a retirar , deste formato, é o objectivo aumento das receitas proveniente das competições, mas até que ponto a saturação do mercado, dos direitos televisivos e comerciais, vai ser positiva no futuro? Até que ponto o aumento da frequência da realização dos mundiais não vai banalizar o interesse nesta competição que ainda nos é especial? Até que ponto os nossos clubes, jogadores e adeptos estão
protegidos com esta mudança? São questões muito importantes para refletir antes de ser tomada uma decisão final. E, sem dúvida, é demasiado importante ouvir todos os agentes desportivos mas também OS ADEPTOS. Este últimos, no mínimo, por serem aqueles que financiam a base de todo o investimento no desporto e tornam o espectáculo mundial! Afinal, sem os adeptos o jogo era só uma prática. Resta esperar que esta intenção não passe disso mesmo, uma intenção. Este plano, inicialmente, foi proposto pela Arábia Saudita e apoiado pelo ex-técnico do Arsenal Arsène Wenger,
obtendo também o apoio das federações nacionais de África e da Ásia. Contudo, no início deste mês, a confederação sul-americana de futebol juntouse às vozes de oposição manifestando-se também contra o novo plano da FIFA para o Mundial, e o presidente da UEFA, Aleksander Čeferin, disse que os países europeus poderiam boicotar o evento. Avizinham-se tempos estranhos para o futebol ou será isto apenas a constatação do caminho que o futebol tem seguido? Por J. Lobo
95