1
Universidade da Amazônia
Criando Fanzine: o papel da mídia livre na formação crítica dos cidadãos por meio do processo de comunicação participativa. Daniel da Rocha Leite Junior 2014
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Centro de Estudos Sociais Aplicados – CESA da Universidade da Amazônia como requisito para a obtenção de título de bacharelado em Comunicação Social – Jornalismo sob orientação do Prof. Mário Camarão
2 DedicatĂłria
Dedico esse trabalho Ă liberdade.
3 Agradecimentos
Agradeço a todas as pessoas que cruzaram a ponte da existência alguma vez ao meu lado e trocaram impressões e expressões sobre a jornada.
4 Resumo: Esse trabalho experimental tem o objetivo de discutir o papel da mídia alternativa através da plataforma comunicacional fanzine, como articulador de recursos socioculturais na formação crítica do cidadão. Pretendese despertar a consciência sobre o posicionamento no ambiente social, assim como propiciar uma inserção direta dos indivíduos, por meio da atuação participativa no âmbito cultural, artístico, político e social no processo de comunicação local. Para a realização desses direcionamentos analíticos, foram realizadas oficinas de construção de fanzine com jovens, no espaço do MMIB (Movimento de Mulheres das Ilhas de Belém) na Ilha de Cotijuba. A ideia é proporcionar um espaço de debates e incentivar a construção de um pensamento crítico através da realização de produções textuais e visuais que auxiliem no processo de reconhecimento da história da ilha e, também, incentivem o exercício da cidadania e da livre expressão. Com base nesse contexto, mobilizar os paradigmas históricos, sociais e estéticos com a produção de material midiático livre para ser reproduzido e distribuído gratuitamente na comunidade. Palavras-chave: mídia livre – fanzine – comunicação participativa – Cotijuba.
Abstract: This experimental work has the objective of discuss the role of alternative media through the fanzine communication platform, as an articulator of social and cultural resources for criticism education of the citizen. It is intended to raise awareness of the position in the social environment, as well as providing a direct insertion of individuals, by means of the participative action in the cultural, artistic, political and social in the local communication process. To achieve its analytical directions fanzine with young building workshops were held in the space of MMIB (Movement of Women of the Islands of Belém) in Cotijuba Island. The idea is to provide a discussion space and encourage the construction of critical thinking by performing textual and visual productions that assist in the recognition process of the history of the island and also encourage the exercise of citizenship and free expression. Within this context, mobilizing the historical, social and aesthetic paradigms with media production materials free to be reproduced and distributed for free in the community.
5
Keywords: free media - fanzine - participatory communication - Cotijuba.
Resumen: Este trabajo experimental tiene como objetivo discutir el papel de los medios alternativos a través de la plataforma de comunicación fanzine, como articulador de recursos sociales y culturales para la educación crítica del ciudadano. Se pretende sensibilizar sobre la posición en el entorno social, así como proporcionar una inserción directa de los individuos, mediante la acción participativa en el ámbito cultural, artístico, político y social en el proceso de comunicación local. Para lograr sus orientaciones analíticas se realizaron fanzines con talleres de construcción de jóvenes en el espacio de MMIB (Movimiento de Mujeres de las Islas de Belém) en la Isla de Cotijuba. La idea es proporcionar un espacio de discusión y fomentar la construcción del pensamiento crítico realizando producciones textuales y visuales que ayuden en el proceso de reconocimiento de la historia de la isla y también fomenten el ejercicio de la ciudadanía y la libre expresión. En este contexto, la movilización de los paradigmas históricos, sociales y estéticos con los materiales de producción de los medios de comunicación se puede reproducir y distribuir gratuitamente en la comunidade.
Palabras clave: medios libres - fanzine - comunicación participativa - Cotijuba.
6 1. Apresentação: inquietudes e porquês. “Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras” (Artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos).
A comunicação é a essência do comportamento e do ambiente social, habilidade que diferencia o homem dos demais seres vivos, pois é através deste instrumento que o homem influi sobre a realidade, sobre si mesmo e os outros indivíduos, num processo de desconstrução e construção de signos e símbolos. Levando em consideração a necessidade humana de se comunicar de forma democrática, assistimos ao debate sobre a prática de mídia livre ganhar o imaginário da população mundial no século XXI, entretanto é uma prática que veio se construindo na humanidade desde que o ser humano criou plataformas para distribuir informações, buscando a legitimação das suas experiências e expressões como agente transformador do mundo. Não há uma bibliografia que afirme uma data histórica para o nascimento de práticas de produção de informação livre por meio de publicações independentes, mas há registros de produções de informações em outras culturas, como por exemplo, os chineses desde o século VI a.C. com a invenção do papel, os indianos que utilizavam folhas de palmeiras para disseminar conteúdos ou os papiros do egípcios que foram utilizados como espaços de registros históricos da sua cultura, porém há muitos pesquisadores que atribuem a invenção da prensa de Gutenberg, em 1438, como recurso tecnológico, preponderante para a reinvenção do paradigma de produção e de disseminação de informações. A prática de mídia alternativa ou mídia independente existe desde o século XIX, quando contrainformações eram distribuídas por meio de panfletos e folhas avulsas publicadas de maneira independente, que defendiam interesses políticos ou sociais e circulavam nas sociedades que passaram por revoluções sociais e políticas as quais eclodiram na Europa Ocidental e nas Américas nesse período. Essas publicações se posicionavam contra as grandes organizações comunicacionais da época, como por exemplo, os jornais de massa que
7 defendiam interesses políticos, sociais e econômicos exclusivos da camada social dominante e não os interesses da população geral. Na metade do século XX, da década de 60 até os dias atuais, a partir da evolução tecnológica, que proporcionou mudanças nos paradigmas da comunicação com o advento do rádio, da televisão, do computador doméstico e da internet, o homem modificou as formas e a velocidade de produzir e consumir informação. Apesar das maiores possibilidades do consumo de mídia influenciado pelos avanços no campo da tecnologia, ainda é perceptível o descaso das grandes mídias com determinadas temáticas de relevância pública ou espaços de participação coletiva da população dentro das mídias empresariais. A transformação dos veículos de comunicação em grandes empresas colocou a informação como uma mercadoria a ser consumida e não uma invenção socialmente vivenciada por causa da lógica do lucro que passou a ser instituída no processo de produção da informação. O que é relevante para a mídia comercial é da ordem do espetáculo e deixa de lado tudo aquilo que não se adequa aos próprios interesses. A mídia comercial reproduz um sistema que está orientado por indivíduos ou corporações que estão no poder, excluindo categoricamente e estigmatizando grupos marginalizados na sociedade. Nesse sentido, fica exposto que não há lugar para todas as camadas sociais da sociedade civil se expressarem de forma livre dentro do espaço dos veículos midiáticos empresariais de massa. Esses meios de comunicação não procuram reproduzir conteúdos que dialoguem com as várias faces da realidade dos indivíduos dentro de uma sociedade, criando debates que valorizem a cultura e os valores simbólicos, os quais constituem cada ambiente social, pois, normalmente, praticam a difusão de padrões comportamentais, temáticas e conceitos que procuram a domesticação do indivíduo e não a sua libertação por meio do intercâmbio de informações livres no âmbito cultural, artístico, social e político. Algumas organizações sem fins lucrativos ou indivíduos engajados na busca por uma comunicação democrática e integrada com a realidade em que
8 está inserida têm proporcionado práticas e espaços de intercâmbio de comunicação alternativa por todo o mundo - apropriando-se de atividades midiáticas livres para produzir e distribuir informação livre - como, por exemplo, a criação de canais não comerciais e não governamentais de mídia, é o caso dos jornais comunitários, criações de softwares livres, revistas alternativas, coletivos artísticos, televisões independentes, rádios comunitárias, movimentos de valorização cultural, fanzines e outras formas baseadas na busca pelo exercício da cidadania por meio da ação participativa na produção e distribuição de conteúdo livre. Nesse contexto, propõe-se discutir qual o papel da plataforma midiática fanzine como transformador social, tendo como base que ele influencia a formação crítica sobre a realidade na qual estão inseridos seus editores e os influencia a suprir a necessidade de informações externas aos meios mercadológicos e podem ser produzidos com poucos recursos técnicos e financeiros, para, assim, criar uma ferramenta comunicacional livre, participativa e colaborativa com o ambiente social dos indivíduos participantes do projeto. A proposta desse trabalho experimental é resgatar a importância social e a peculiaridade comunicacional do fanzine como recurso de ação participativa e meio eficaz de se levar cultura, arte e informação livres para as pessoas por meio do conceito de copyleft1. Segundo o autor Sergio Amadeu (2004), é necessário inserir a prática no contexto contemporâneo da comunicação social, para, assim, constituir o direito de permissão de cópia de um fanzine por outros indivíduos, tendo como princípio retirar os impedimentos a utilização, cópia, modificação e redistribuição, quebrando os paradigmas dos direitos autorais à aplicação das normas de propriedade intelectual da informação baseada no copyright2.
1
Os termos do copyleft garantem a permissão a qualquer outra pessoa poder intervir no produto intelectual, alterando, reproduzindo, redistribuindo e, por fim, revendendo, a única restrição é que ninguém pode dizer-se dono daquele produto, independentemente de quanto tenha influído na sua geração, equivalendo para a produção de livros, músicas, softwares e imagens. 2 Os termos do copyright garantem direitos autorais à propriedade literária, concedendo ao autor direitos exclusivos de exploração de uma obra literária, artística e científica, proibindo a reprodução por qualquer plataforma comunicacional sem autorização.
9 Como parte do trabalho experimental, foi realizado na Ilha de Cotijuba – município integrante da área metropolitana de Belém desde 1784 – o registro de um projeto experimental de oficina de fanzine aos jovens moradores da ilha no MMIB (Movimento de Mulheres das Ilhas de Belém) entre os meses de outubro e novembro, com o intuito de criar um fanzine ao final do período das atividades de comunicação participativa. Para assim, mesmo que não haja espaço nas mídias tradicionais para as suas vozes, demonstrar e ensinar aos participantes que eles podem criar acessos alternativos simples e de baixo custo de produção para suas ideias e expressões sobre o mundo, reconstruindo, dessa forma, a realidade de que fazem parte, remontando símbolos socioculturais ou artísticos ao se expressarem socialmente por meio da produção de fanzines.
10 2. Fanzine: reconstruções simbólicas por meio do fazer artístico. 2.1. O que é fanzine? O conceito de fanzine permite diversas interpretações sobre o seu caráter peculiar de não possuir forma ou conteúdo únicos e padronizados, exatamente porque o editorial de um fanzine é baseado na experimentação estética do projeto gráfico e da expressão de ideias de cunho artístico, político ou cultural, com o intuito de integrar as pessoas que compartilham da temática abordada dentro da proposta do fanzineiro 3. O termo “fanzine” foi criado em 1941, por Louis Russell “Russ” Chauvenet, a palavra é resultado da mistura de duas palavras da língua inglesa: fanatic (fanático ou fã) e magazine (revista ou publicação), que unindo o prefixo fan- da primeira e o sufixo -zine da segunda resulta na denominação fanzine, que significa “revista de fã”. Segundo Henrique Magalhães (1993), o fanzine é uma publicação de caráter alternativo e amador, feito sem a intenção de lucro, por um indivíduo ou grupo de pessoas apaixonado por uma determinada temática e que tem o intuito de ampliar o assunto além do que é reproduzido nas mídias comerciais de massa - que não permitem uma interação mais profunda e direta entre os interessados no assunto - ou com o objetivo de difundir e potencializar ideologias ou obras artísticas de indivíduos que não têm acesso a essas mídias, por exemplo: fanzines sobre política, poesia, crônicas, música, quadrinhos, artes visuais, sexualidade, ecologia, cinema e outros. De acordo com Renata Maranhão: Ele pode ser feito individual e/ou coletivamente, contendo textos e imagens autorais ou provenientes de parcerias autorizadas ou não (pode-se capturar imagens e textos já publicados), para compor, como por meio de bricolagem, uma mídia singular, que passeia entre a informação e a arte (MARANHÃO, 2012, pg.89).
Os fanzines passaram por transformações que permitiram a absorção de novas plataformas comunicacionais para a sua elaboração, como por exemplo, a evolução tecnológica, a qual possibilitou que os editores ultrapassassem as margens da folha, como por exemplo, os e-zines 4 , que possibilitaram que os fanzines pudessem se concretizar como plataformas 3 4
Indivíduo que se propõe a produzir um fanzine. Formato digitalizado de um fanzine, que é feito com o objetivo de ser distribuído na internet.
11 multimídias ao permitirem simbioses entre áudio, vídeo, texto e imagem. Esse processo de absorver novas adaptações técnicas no processo de produção de um fanzine é parte da principal característica dessa plataforma comunicacional, que permite aliar a liberdade de intervenção comunicacional com informação livre e possibilidade de expansão do exercício estético. A variedade de formatos editoriais e de gêneros textuais e visuais permite ao fanzine assumir um posicionamento de artefato multifacetado material e imaterial, pois possibilita diversas formas de experimentações com relação ao exercício da estética, da sociabilidade, da temporalidade, da prática midiática, da produção de conteúdos e informações que o fanzineiro buscar produzir e desenvolver. “Podem ser feitos em colagens, execução de desenhos livres, utilização de softwares, combinação de tudo isso ou ainda de outras técnicas inventadas. Possuem formatos diferentes, podendo até mesmo ter o tamanho de 1 cm² ou ser do tamanho de uma folha que caiba em uma máquina de plotagem, por exemplo. Podem ainda ser coloridos ou em preto e branco, sendo diversificada também a possibilidade de escolha do papel impresso. A decisão de coisas como essas, em uma superfície tão repleta de liberdade, depende da combinação de, pelo menos, dois fatores: criatividade do faneditor 5 e disponibilidade de recursos materiais e financeiros” (MARANHÃO, 2012, pg.42).
De acordo com Magalhães (1993), o fanzineiro domina todo o processo de elaboração, de produção e de distribuição. Ele manipula a confecção de todo o projeto editorial, por exemplo: a elaboração da ideia, a pesquisa de informações, montagem gráfica, diagramação textual, composição estética, reprodução técnica e distribuição social do material. Nesse contexto, não há limites para a liberdade estética na produção de um fanzine, pois o fanzineiro é, ao mesmo tempo, editor e gatekepper 6 do conteúdo abordado, talvez o que diferencie um de outro sejam as capacidades técnicas do fanzineiro em manusear aparelhos tecnológicos ou ferramentas artesanais disponíveis para a construção de um fanzine.
5 6
Indivíduo que faz edição de fanzines. Gatekepper ou gatekeeping é um conceito jornalístico para edição, em outras palavras é
aquele que define o que será noticiado de acordo como valor-notícia, linha editorial e outros critérios.
12 Os fanzines divulgam os conteúdos que quiserem, sem as mesmas preocupações do mercado editorial e da venda em massa de publicações, afinal não buscam o lucro, constituindo, dessa maneira, um veículo comunicacional livre de censura. “Sua produção é independente dos circuitos comerciais, sua linguagem discursiva e estética procura ser inovadora e apresenta conteúdo quando não contestatório ao menos com um ângulo raramente enfocado pela grande imprensa. É nos fanzines que circulam as informações que os aficionados por quadrinhos, música e poesia não encontram nas revistas, nos livros e nos jornais institucionalizados” (MAGALHÃES, 1993, pg.14).
A prática de comunicação proposta pelo fanzine permite ao indivíduo fazer um exercício de memória, imaginação e reconstrução de paradigmas comunicacionais por meio da expansão de assuntos e temas que habitam a margem das mídias tradicionais e comerciais, tendo como objetivo construir discursos informativos livres e pautados na necessidade de se dialogar sobre temáticas de interesse coletivo e não tão-somente a busca de alguma forma de lucro financeiro. Nesse sentido, a produção de fanzines possibilita maior participação no processo de comunicação social, por meio da geração de conteúdos que se aproximam da realidade social de seus produtores/editores.
13 2.2. A liberdade criativa dos fanzines: desprendimento estético no uso de recursos tecnológicos e artesanais. Edgard Guimarães (2005) afirma que os fanzines são portadores de narrativas que permitem a abertura da comunicação entre os sujeitos envolvidos (produtores e receptores), pois possibilitam a liberdade estética, ou seja, não possuem nenhuma forma de regra ou restrição para a sua construção, tudo vai depender da capacidade do fanzineiro em dialogar com os recursos técnicos, artesanais ou tecnológicos. Muitos editores de fanzine comentam que a escolha do tema irá orientar a produção do conteúdo a partir da organização dos símbolos e dos signos socioculturais que fazem parte da realidade do fanzineiro. Maranhão (2102) aponta que a liberdade criativa, que faz parte da prática de fanzinagem7, permite projetos experimentais ou profissionais8 com os elementos visuais, mas também na construção do discurso textual, pois é comum encontrar concepções editoriais que jogam com as possibilidades gramaticais e linguísticas de uma língua, buscando experimentações ou até mesmo propondo novos ângulos e formatos de uso da linguagem para a realização de uma comunicação mais direta e incisiva, aproximando-se da realidade dos indivíduos. “Objeto dinâmico e rizomático por natureza, se fez perceber em tantos lugares e foi constituído com origem em tantas linguagens, que seria injusto lhe determinar uma forma. Não cabe tentar dizer o que ele é, mas procurar ver o modo como ele vai assumindo novas formas, liberando novas potências, se tornando um objeto cada vez mais complexo. Para compreender um fanzine, é preciso estar atento ao zine em sua materialidade, como coisa tangível e também com base em uma série de elementos intangíveis, tais como as práticas que se formam em seu entorno e por sua causa” (MARANHÃO, 2012, pg. 41).
Não existem regras padronizadas sobre a edição de um fanzine, apesar de ser uma prática comum serem confeccionados em papel sulfite, no formato A4, normalmente em preto e branco, pois são fotocópias, entretanto é comum encontrar outros formatos e cores. Tudo depende do interesse estético
5
Fanzinagem é um termo que faz referência à prática de produção de fanzines. A possível existência de um profissionalismo na composição de um fanzine faz parte de um comentário sobre fanzines que alcançou um projeto editorial e estético bem elaborado e amadurecido dentro das possibilidades e limites que o uso de recursos artesanais ou tecnológicos permitem para elaboração e divulgação de suas ideias. 6
14 sobre o tema, a disponibilidade de tempo para a elaboração e do orçamento financeiro do seu editor, afinal são produtos bancados pelo próprio fanzineiro, sem ajudas externas de um patrocinador, pois não viabilizam retornos lucrativos para o seu criador, ninguém sobrevive da venda de fanzine, por isso eles ainda se configuram como publicações efêmeras, apesar da sua inserção direta no processo comunicacional do ambiente social em que está inserido. “Mesmo sendo um hobby, era natural que os editores dos melhores fanzines quisessem atingir um público mais abrangente, ainda que alternativo, que sua publicação se autofinanciasse [...] alguns fanzines tinham um projeto editorial bem definido dentro das possibilidades e limites do veículo e de acordo com a disposição de seus editores” (MAGALHÃES, 1993, pg.14).
A principal característica de um fanzine é a informalidade, o diálogo entre os elementos estéticos e a escolha dos temas. Todos esses elementos fazem parte de um processo espontâneo e pessoal. Como já foi comentado, o fanzineiro domina todas as etapas do processo editorial na produção de um fanzine, da coleta do material e na escolha do tema até a impressão e distribuição. Nesse contexto, é possível que o fanzineiro realize qualquer forma de experimentação estética na composição do seu fanzine, buscando ou não alguma espécie de profissionalismo no seu projeto editorial.
15 3.
Observações sobre a simbiose entre as revistas alternativas e os
fanzines. É comum encontrar pessoas que recebem fanzines nas mãos e os confundem com revistas alternativas, assim como o contrário também, portanto, fez-se necessário fazer alguns apontamentos quanto ao conceito e à prática de ambas as plataformas comunicacionais sobre seus espaços de atuação e a forma de produção dos seus conteúdos. Magalhães (1993) afirma que a discussão sobre o fanzine é composta pela comprovação lógica de que o fanzine dialoga com elementos das revistas alternativas, como a reprodução de produções artísticas e, também, acontece o inverso, as revistas possuírem elementos do fanzine, como as matérias jornalísticas, entretanto, é a forma de produção, o espaço de atuação e o conteúdo que vão classificar o caráter que a publicação independente assume. “Denominamos fanzine praticamente toda publicação alternativa. Para tanto, basta que seja independente, tenha uma circulação de mão em mão ou via postal e trate de assuntos pouco abordados pela imprensa comercial” (MAGALHÃES, 1993, pg.12).
Há pontos de convergências entre fanzines e revistas alternativas, exatamente porque a matéria-prima de ambos é a informação orgânica, como por exemplo: desdobramentos de artigos, entrevistas, matérias jornalísticas, filmes e quadrinhos, que não têm apelo nas mídias tradicionais comerciais e são utilizados pelos editores de fanzines, assim como as revistas alternativas se configuram como plataforma para a produção artística de artistas que não encontram espaços nas editoras comerciais para dar visibilidade a seus trabalhos. Os dois objetos comunicacionais possuem caráter multifacetado, como gênero ou categoria de publicação, pois permitem a reprodução de temas e obras artísticas, assim como de textos jornalísticos ou opiniões ideológicas e estéticas. “O termo fanzine se disseminou de tal forma que hoje engloba todo tipo de publicação que tenha caráter amador, que seja feita sem intenção de lucro, pela simples paixão pelo assunto enfocado. Assim, são fanzines as publicações que trazem textos diversos, histórias em quadrinhos do editor e dos leitores, reprodução de HQs antigas, poesias, divulgação de bandas independentes, contos, colagens, experimentações gráficas, enfim, tudo que o editor julgar interessante. Os fanzines são o resultado da iniciativa e esforço de pessoas que se
16 propõem a veicular produção artística ou informações sobre elas, que possam ser reproduzidas e enviadas a outras pessoas, fora das estruturas comerciais de produção cultural.” (GUIMARÃES, 2000, pg.01).
As revistas alternativas possuem uma prática comercial mais consolidada de que os fanzines, pois procuram alguma forma de lucro em suas edições, enquanto os fanzines são distribuídos gratuitamente, trocados entre os fanzineiros ou, no máximo, são vendidos com o objetivo de recuperar o dinheiro gasto na sua produção. O autor Magalhães (1993) também lembra que, apesar das igualdades e diferenças existentes entre os fanzines e as revistas alternativas no que diz respeito a sua construção estética ou editorial, ambas as plataformas comunicacionais se posicionam ideologicamente como produções pautadas na prática da imprensa livre, seja alternativa ou independente. Segundo Henrique Mazetti: “As práticas de mídia alternativa são, costumeiramente, entendidas como ações que visam a pluralizar as vozes do debate público, ao favorecer temas, ângulos e até mesmo fatos que são obscurecidos, silenciados quando não distorcidos pelos veículos de comunicação hegemônicos, orientados pelo interesse comercial. Assim, as ações de mídia alternativa são majoritariamente articuladas ao modelo da contrainformação, que tem como função desobstruir o acesso à opinião pública para os mais diferentes grupos sociais, políticos, étnicos, religiosos, de gênero e indicação sexual. Pode-se encontrar o modelo de contrainformação na maioria das manifestações identificadas como mídia alternativa, como em jornais populares, rádios comunitárias, experiência com vídeo e cinema, fanzines e publicações impressas de pequena escala” (MAZETTI, 2007, pg.01).
Nesse contexto, as revistas alternativas se configuram como publicações alternativas, afinal não são completamente independentes do meio comercial, pois buscam fazer publicações que objetivam o lucro estabelecendo concorrência com outras publicações nas bancas de revistas ou no mercado editorial, enquanto os fanzines buscam construir publicações independentes dos meios comerciais, não fazendo concorrência a outros gêneros comunicacionais ou a outros fanzines, pelo contrário, procuram o intercâmbio direto ou indireto com outras formas de publicações.
17 4. Considerações históricas sobre a prática da fanzinagem no Mundo, no Brasil e no Pará. Há registros de produções independentes que seguiam os paradigmas constituintes dos fanzines desde o século XIX, é o caso do poeta e pintor William Blake (1757-1827), que distribuía suas obras artísticas em uma publicação independente feita por ele mesmo com o auxílio de sua mulher ou a publicação de revista ou periódico independente produzida no período das revoluções sociais no mundo, entretanto os fanzines começam a ganhar o formato que é reconhecido até hoje a partir da década de 1930 nos Estados Unidos da América. O primeiro fanzine produzido foi o “The Comet”, criado por Ray Palmer e Walter Dennis para o “Science Correspondance Club” em maio de 1930, seguido pelo “The Planet”, de Allen Glasserpara e o “The New York Scienceers” no mesmo ano. A prática de produção de fanzines, que começou nos EUA, influenciou outras nações do mundo a fazerem o mesmo. Outros fãs e pesquisadores sobre ficção científica passaram a produzir seus próprios fanzines também, é o caso de Maurice Handon e Dennis Jacques, que produziram a publicação “NovaeTerrae”, em 1936, na Inglaterra, para o Science FictionLeague.
Figura 01: fanzine “The Comet” editado por Ray Palmer / Fonte: zinewiki.com/The_Comet
Figura 02: fanzine “NovaeTerrae” editado por Maurice Handom / Fonte: fiawol.org.uk/fanstuff/then%20archive/newworlds/NT1.htm
No período entre a década de 1930 e de 1940 era predominante a produção de fanzines de ficção científica. No ano de 1932, os americanos Jerry
18 Siegele e Joe Shuster produzem o fanzine “Science Fiction”, com o conto “The Reign of the Superman”, que apresentava o personagem super-homem e a história contada em quadrinhos, apesar de as publicações independentes sobre ficção serem maioria nessa época, já havia o desenvolvimento de fanzines com projetos gráficos mais bem elaborados e com propostas estéticas vinculadas ao quadrinho, mas ainda com conteúdos sobre ficção.
Figura 03: capa do fanzine “Science Fiction”, editado por Jerry Siegel e o conto “The Reing of Chaos” / Fonte: http://mixhqpodcast.blogspot.com.br/2010/06/biografia-especial-supermanparte-i.html
Com a difusão da mídia livre e independente fanzine pelo mundo, houve um desdobramento da prática da fanzinagem, passando a circular, além das publicações de ficção científica, fanzines sobre quadrinhos de temáticas variadas, crítica musical, produção literária e movimentos políticos. As peculiaridades anárquicas dos fanzines geraram uma grande quantidade de publicações de forma desorientada e desordenada, não havia uma organização de registros das publicações independentes. No ano de 1960, Dick Lupoff, o editor do fanzine “Xero” (que se transformou em “All in Color for a Dime” posteriormente), mantinha uma seção de fórum, na qual trocava informações e ideias com os fãs de quadrinhos, convidando-os a editar suas próprias histórias e a seu unirem. Nesse período, o apelo sobre os fanzines em função da enorme quantidade de publicações independentes que surgiram, ocorreu a fundação da APA – Amateur Publisher’s Association – que funcionava como um espaço de
19 confluência de zines, ou seja, possibilitavam um lugar de registro e distribuição das publicações.
Figura 04: fanzine “Xero” editado por Dick Lupoff / Fonte: efanzines.com/EK/eI32/index.htm
Figura 05: fanzine “All in color for adime” editad por Dick Lupoff e Don Thompson / Fonte: people.uncw.edu/smithms/Ace_pot_5N0.html
Os fanzines franceses tiveram grande importância na história da fanzinagem mundial na década de 1960. Em 1962, surge o primeiro fanzine francês “Giff-Wiff”, como um boletim do Club des Bandes Dessinées, que, depois, transformou-se no Centre d’ Etudes des Littératures d’Exlression Graphiquee, o qual promoveu a criação de outras associações de fanzineiros na Espanha, Suíça e em outros países da Europa. “Giff-Wiff” durou 23 edições e reunia intelectuais, como Alain Renais e Francis Lacassin e configurou-se como uma publicação independente com projeto editorial bem definido pelos seus editores, posteriormente, sendo sucedida pelo fanzine “Phénix”.
Figura 06: fanzine francês “Giff-Wiff” / Fonte: http://ubupopland.com/vintage_comix.htm
Figura 07: capa fanzine “Phénix” / Fonte: O rebuliço Apaixonante dos Fanzines (2003)
20 A prática da fanzinagem começou, no Brasil, na década de 1960, ainda abordando temáticas da ficção científica. A publicação pioneira no país foi o fanzine “Ficção”, de Edson Rontani no ano de 1965, ele havia fundado o Intercâmbio de Ciência-Ficção Alex Raymond para editar e dialogar sobre o universo das histórias em quadrinhos.
Figura 08: primeiro fanzine brasileiro “Ficção”, editado por Edson Rontani / Fonte: O rebuliço Apaixonante dos Fanzines. (2003)
Na década de 1970, os fanzines se consolidaram e ganharam apelo do público nacional, pois se configuravam como espaços para produção e distribuição de quadrinhos. É o caso do “Na era dos quadrinhos”, de Gutemberg Cruz Andrade, diretor do Clube da Editora Juvenil e “Historieta”, de Oscar Christiano Kern, que eram referências importantes para a evolução da fanzinagem como veículo de mobilização cultural e comunicação de massa.
Figura 09: fanzine “Na era dos quadrinhos” editado por Gutemberg Cruz Andrade / Fonte: O rebuliço Apaixonante dos Fanzines (2003).
Figura 10: fanzine “Historieta” editado por Oscar Christiano Kern / Fonte: O rebuliço Apaixonante dos Fanzines. .(2003)
21 O auge da produção de fanzines, no Pará, aconteceu nas décadas de 1970 e 1980, influenciados pelos movimentos de contracultura e efervescência da cultura quadrinhista. Surgiram publicações independentes seguindo a proposta da produção de quadrinhos que acontecia no cenário brasileiro, como por exemplo, o fanzine “O inquilino”, de Marcelo Marat, que possuía um projeto editorial com objetivos bem elaborados e definidos, ele criava os roteiros como contos literários e realizava experimentações com a linguagem e com o projeto gráfico, que sempre passava nas mãos de desenhistas diferentes. Outra publicação importante para a cena paraense foi o fanzine coletivo “Ponto de Fuga”, primeiro grupo da cidade de Belém a se reunir para produzir e dialogar sobre a prática da fanzinagem.
Figura 11: fanzine “O inquilino”, editado por Marcelo Marat / Fonte: Gibiteca da Biblioteca Arthur Vianna.
Figura 12: fanzine “Ponto de Fuga”, editado coletivamente / Fonte: Gibiteca da Biblioteca Arthur Vianna.
A produção de fanzines continua mobilizando recursos socioculturais na cena de diversos países e se configurando como um espaço alternativo para a veiculação de informativos livres em diversos âmbitos do conhecimento humano, além da produção de quadrinhos, como por exemplo, interferências com conteúdo que vinculam política, literatura, questões sociais e movimentos culturais. A pesquisa sobre a história da produção de fanzines ao redor do mundo é importante para orientar o desenvolvimento do projeto, pois funcionará como referências para compreender como os fanzines evoluíram de simples publicações independentes para um mecanismo midiático livre para a produção e distribuição de informação livre.
22 5. Entrelinhas da mídia livre: liberdade, conscientização e participação. 5.1. Interação para transformação As mídias tradicionais, comerciais e hegemônicas orientam o grau de noticiabilidade das suas pautas a partir da sua linha editorial, que, normalmente, é influenciada por interesses de conglomerados econômicos e grupos políticos que detêm um grande poder na sociedade. É comum perceber matérias jornalísticas superficiais e distantes da realidade do seu ambiente social, quando encontramos questões irreais ou sem funcionalidade crítica no desenvolvimento de suas pautas, descaracterização de construções coletivas e experiências populares de camadas que se encontram à margem da cadeia social ou a falta de espaços de diálogo abertos para todos os indivíduos de uma sociedade, independentemente do seu posicionamento financeiro, político, social, religioso ou cultural. Nesse contexto, as mídias tradicionais de massa foram progressivamente abandonando os critérios mínimos para a atuação jornalística e social, deixando de exercer o papel democrático de participação popular, mesmo que, em muitos casos, estejam atuando por meio de concessões públicas. As mídias livres ou independentes, que atuam pelo mundo, reconhecem a comunicação como um direito social da humanidade, um bem comum, que é socialmente vivenciado pelos indivíduos. Acreditam na ação participativa na produção, desenvolvimento e distribuição da informação estimula não só a prática crítica dos envolvidos sobre temáticas políticas, sociais, culturais e econômicas, como também se consolida como outra opção de plataforma comunicacional para grupos que não têm acesso às mídias tradicionais de massa, estimulando, dessa maneira, a transformação social por meio da produção de informação livre e compromissada com assuntos de relevância pública, seja em uma microesfera ou macroesfera dentro de uma sociedade e possibilitando o diálogo aberto e direto com todas as camadas sociais. Deve-se criar um amplo e diversificado sistema público de comunicação, produzido pelo público, para o público, com o público. Um sistema que ofereça à sociedade informação jornalística e programação cultural-educativa para além da lógica do mercado,
23 sintonizadas às várias áreas do conhecimento e à valorização da produção regional e independente (MANIFESTO DA MÍDIA LIVRE, 2008 pg.01).
A luta pela democratização das comunicações, objetivada pelos espaços de midialivrismo9, é um movimento que procura afirmar a liberdade de expressão como uma necessidade e um dever do indivíduo social, não mais só um direito “concedido” por uma plataforma comunicacional tradicional controlada por conglomerados empresariais ou pela ação do Estado, ao ceder concessões públicas para esses espaços. A comunicação livre proposta por movimentos que dialogam sobre a importância da mídia no jogo social possibilitam a transformação social por meio da construção de conteúdos informacionais livres, desenvolvidos através de propostas que envolvam coletividade, conscientização, autonomia, troca de informações livres do jogo comercial e do protagonismo social por meio dos recursos disponíveis para a atuação como agentes multimídias, como por exemplo, o uso da internet, de jornais comunitários, de fanzines, de rádios comunitárias e de outras plataformas comunicacionais. De acordo com Lorne Craner: A presença da imprensa livre é essencial para que surja uma democracia verdadeira e completa. Somente uma imprensa livre pode oferecer aos eleitores as informações de que necessitam para escolher os melhores líderes. Com frequência, os governos usam a mídia controlada pelo Estado para apresentar uma série de fatos distorcidos. Do mesmo modo, sem proteções, os governos podem coagir a mídia privada a publicar ou não informações vitais. Em resumo, a mídia livre garante que os governos representarão os interesses dos seus cidadãos e que os cidadãos atribuam responsabilidades a seus governos. No discurso público, uma imprensa livre permite a expressão de diversas opiniões editoriais e propagandas comerciais. Este ambiente é um "mercado de ideias" onde cidadãos e consumidores escolhem e apoiam aquelas ideias que são melhores do que as outras. Tal sistema garante o melhor resultado sem silenciar nenhum ponto de vista. (CRANER, 2003, pg. 06).
A busca por uma prática comunicacional horizontal possibilita o reconhecimento de que a informação não é mais um produto comercial, mas sim, um elemento socialmente vivenciado que estimula o cidadão a ter acesso sobre
9Midialivrismo
é um movimento recente que ainda está em fase de desenvolvimento conceitual, ainda não há uma definição científica sobre o termo, mas muitos agentes atuantes em mídia livre consideram ser um movimento realizado por indivíduos que atuam como cidadãos multimídia, ou seja, são capazes de produzir, replicar, distribuir e compartilhar informações por meio do uso de ferramentas e plataformas comunicacionais livres.
24 assuntos importantes no âmbito mundial, nacional ou regional e assim escolher seus posicionamentos ideológicos a partir da interação livre das vozes multifacetadas das mídias livres ao lado das práticas comunicacionais das mídias tradicionais. Um Estado democrático precisa defender a verdadeira liberdade de expressão e de acesso à informação, em toda sua dimensão política e pública. Um avanço que acontece, essencialmente, quando cidadãs e cidadãos, bem como os diversos grupos sociais, têm condições de expressar suas opiniões, reflexões e provocações de forma livre, e de alcançar, de modo equânime, toda a variedade de pontos de vista que compõem o universo ideológico de uma sociedade. (MANIFESTO DA MÍDIA LIVRE, 2008, pg. 01).
Acredita-se que o exercício da cidadania é concretizado quando o indivíduo consegue atuar em diversos âmbitos públicos da sociedade. Portanto, é papel do cidadão procurar se expressar democraticamente, debatendo de forma atuante sobre qualquer assunto de sua realidade, intervindo de forma construtiva nas decisões políticas, sociais ou econômicas, mesmo que a ele isso seja negado nos espaços comunicacionais tradicionais ou que o Estado não possibilite outras maneiras e formas de ser alcançado esse objetivo por todos os cidadãos.
25 5.2. Articulando recursos socioculturais por meio da comunicação participativa. Existe uma multiplicidade cultural e social que envolve uma comunidade e seus indivíduos, nesse sentido, todos têm a necessidade de expressar suas ideias e expectativas sobre a realidade social em que vivem. Para isso, é necessário que exista um diálogo democrático dentro dos espaços midiáticos tradicionais, ou seja, que seja defendida a participação e opinião de todas as camadas que compõem a sociedade – sobre seus posicionamentos dentro da política, economia, educação, cultura e em outros ambientes públicos. As possibilidades que são dadas aos indivíduos de fazer intervenções diretas nesses espaços são desiguais e indiferentes, pois a mídia comercial não permite que pessoas as quais se encontram à margem no processo da cadeia social façam uso dos seus espaços midiáticos para legitimar sua sobrevivência por meio da afirmação de suas particularidades culturais, sociais, financeiras, políticas, sexuais e religiosas. No século XXI, a tecnologia emergiu com novos aparelhos tecnológicos e plataformas comunicacionais inovadoras que possibilitaram uma pequena abertura nos processos comunicacionais das mídias tradicionais de massa, como por exemplo: pedir que uma rádio comercial toque uma música pela internet ou por mensagens de texto de celular, propor sugestões de pautas para jornais, opinar em debates promovidos por empresas que realizam práticas de feedback com o consumidor, conceder entrevistas para programas de televisão e outras formas de participação nas mídias de massa. Entretanto, ainda é pouco para contemplar as várias vozes e discursos de minorias e de comunidades que estão distantes do processo de produção da notícia, pois a participação do indivíduo permanece mediada por processos estruturais – linha editorial, gatekepper, posicionamento político, entre outros – que orientam a atuação comunicacional das mídias comerciais. Lawrence Lessing reflete que: O fato que as grandes firmas tradicionais acham racional ignorar novas tecnologias revolucionárias que competem com o seu core business10. A mesma análise pode ajudar a explicar porque as grandes empresas 10A
tradução de core business é negócio central, é um termo da administração de empresas que significa o principal negócio da instituição comercial.
26 tradicionais da mídia acham racional ignorar novas tendências culturais (LESSIG, 2004, pg. 150).
As mídias tradicionais constroem o seu discurso a partir um único ângulo factual
que consideram como a
verdade
sobre determinado
acontecimento ou temática. Não permitem a mobilização de recursos socioculturais para possibilitar que um indivíduo desenvolva criticamente uma tradução sobre a realidade em que vive dentro do seu ambiente social. É perceptível o descaso com as diferentes realidades de uma sociedade, por exemplo: a televisão insiste em reproduzir símbolos distorcidos da realidade como referências para os indivíduos, é o caso de programas televisivos que desenvolvem uma ideia de juventude, completamente distante da realidade de um jovem que vive à margem da pirâmide social, mas que deve ser o ideal a ser seguido. Essas práticas comunicacionais não possibilitam uma participação comunitária no processo de produção da comunicação, pois não se permite dialogar – escutar e dar voz dentro dos espaços midiáticos tradicionais de massa – com as diferentes microrealidades que existem dentro da cultura e da sociedade de um país – nesse caso específico, no Brasil. Nesse contexto, é necessário refletir sobre outras formas e maneiras de o cidadão atuar se expressando e desenvolvendo ideias livres procurando as possibilidades comunicacionais que apresentam liberdade de censura. Portanto, a atuação comunicacional que melhor se encaixa nessa proposta é a comunicação comunitária, pois promove uma participação integral no processo de produção e recepção de conteúdos informativos, como por exemplo: as rádios coletivas na internet ou em “boca de ferro” 11, jornais comunitários, fanzines, eventos de intercâmbio cultural e coletivos artísticos, o qual Cicilia Peruzzo afirma que: [...] se caracteriza por processos de comunicação baseados em princípios públicos, tais como não ter fins lucrativos, propiciar a participação ativa da população, ter propriedade coletiva e difundir conteúdos com a finalidade de desenvolver a educação, a cultura e ampliar a cidadania. Engloba os meios tecnológicos e outras modalidades de canais de expressão sob controle dos movimentos e organizações sociais sem fins lucrativos. Em última instância, realiza“Boca de ferro” é um termo que denomina os empreendimentos radiofônicos que faziam suas transmissões em caixas de alto-falantes penduradas em postes. 11
27 se o direito à comunicação na perspectiva do acesso aos canais para se comunicar. Trata-se não apenas do direito do cidadão à informação, enquanto receptor – tão presente quando se fala em grande mídia –, mas do direito ao acesso aos meios de comunicação na condição de emissor e difusor de conteúdos. E a participação ativa do cidadão, como protagonista da gestão e da emissão de conteúdos, propicia a constituição de processos educomunicativos, contribuindo, dessa forma, para o desenvolvimento do exercício da cidadania (PERUZZO, 2006, p.9-10)
A prática da comunicação comunitária permite que os produtores possam desenvolver uma identificação cultural do conteúdo informacional com a comunidade, afinal eles são moradores do espaço, portanto a geração dos conteúdos vai ser aproximar das particularidades socioculturais do lugar, pois o indivíduo irá produzir informações concebidas e elaboradas com eles, por eles e para eles, pois como atesta Ioneide Nascimento: “Além de conduzir o aprendente a uma nova percepção de mundo, permitirá o contato com o texto e imagens, impulsionando-o a compreender os elementos constitutivos de sua cultura e, por sua vez, ver-se inserido como sujeito integrante de sua formação. Portanto, o fanzine funciona como elemento de percepção sócio-histórico-cultural do indivíduo em ambiente coletivo” (NASCIMENTO, 2010, p. 121).
A promoção do intercâmbio de signos socioculturais dentro de ambientes de comunicação comunitária permite o exercício da cidadania de forma direta, sem intervenções estruturais, que possam delimitar o espaço de atuação social, cultural e política, isso acontece porque essa prática comunicacional permite a participação efetiva dos indivíduos no processo de produção e
distribuição
da
informação. Deste modo, estimulando a
transformação da realidade e do pensamento crítico dos indivíduos ao mobilizarem mudanças por meio do reconhecimento, da mobilização e da expansão de recursos socioculturais que fazem parte da formação da identidade cultural e social.
28 6. Impressões sobre a oficina realizada no espaço do MMIB na Ilha de Cotijuba. 6.1. Onde fica a ilha de Cotijuba e o que é o MMIB? Para a realização deste trabalho, foi necessário realizar uma “Oficina de Fanzine” no período do fim de outubro até o início de novembro de 2014, nas seguintes datas 23/10, 30/10 e 06/11 na ilha de Cotijuba, no espaço do MMIB, a qual teve uma carga horária de 12 horas – 4 horas por dia de oficina – com o objetivo de desenvolver um projeto experimental por meio do exercício de comunicação participativa com os jovens moradores da ilha. Nesse contexto, é importante ressaltar informações sobre a história da ilha de Cotijuba e onde ela se localiza, assim como também sobre o espaço do MMIB, quais são os seus objetivos e eixos de atuação dentro da comunidade.
Figura 13: folder de convocação para a oficina que foi anexado no espaço do MMIB / Fonte: acervo do projeto.
O nome “Cotijuba” foi dado pelos primeiros habitantes da ilha, os índios Tupinambás, e na linguagem tupi significa “trilha dourada” e faz referência à terra que tem um contraste amarelada-avermelhada. A ilha começou a sua integração à área metropolitana da cidade de Belém no ano de 1784, a partir da comercialização do arroz que era cultivado no engenho que ficava na área da Fazendinha. Após, a desativação das atividades do engenho, Cotijuba passou por um processo de habitação por famílias caboclas.
29 Com o declínio na comercialização da borracha, a região amazônica passou por um período de estagnação econômica, o qual fez com que várias mazelas sociais surgissem nas principais cidades da região. A cidade de Belém, capital do Estado do Pará, sofreu com o aumento da criminalidade, especialmente a infanto-juvenil, nesse contexto, no ano de 1933, foi inaugurado, na ilha de Cotijuba, o Educandário Nogueira de Faria, com o objetivo de abrigar os jovens infratores que eram direcionados da metrópole belenense para a reclusão na ilha. Entretanto, durante a ditadura militar, o espaço e as instalações do educandário receberam presos políticos, por um período, coexistiram presídio e educandário. No ano de 1968, com a construção definitiva de uma penitenciária na cidade, o educandário foi extinto de Cotijuba e a ilha ganhou o estigma de ilha-presídio, símbolo que ainda habita o imaginário sobre o local. Em 1977, a Colônia Penal de Cotijuba encerrou seus trabalhos e foi desativada definitivamente com a inauguração da Penitenciária Estadual de Fernando Guilhon, na cidade de Americano, no interior do Estado do Pará. A cidade de Cotijuba passou a despertar o interesse por causa da sua biodiversidade e riquezas naturais e, também, pelo fato da ilha ser próxima da capital paraense, nesse contexto, a ilha de Cotijuba passou para o domínio municipal de Belém a partir da Constituição Brasileira de 1988. Cotijuba foi transformada em Área de Proteção Ambiental em 1990, por meio de Lei Municipal, estabelecendo a ilha como patrimônio a ser preservado.
Figura 14: localização da Ilha de Cotijuba / Fonte: http://www.florestaaguadonorte.com.br/ilhas-da-amazonia/cotijuba/.
30
Figura 15: mapa da cidade de Cotijuba / Fonte: florestaaguadonorte.com.br/ilhas-da-amazonia/cotijuba/.
Figura 16: praça das ruínas do Educandário Nogueira de Faria na chegada da Ilha de Cotijuba / Fonte: acervo do projeto.
O Movimento de Mulheres das Ilhas de Belém (MMIB) é uma associação sem fins lucrativos, que se localiza na cidade de Cotijuba e atua nas ilhas do entorno de Belém, promovendo vivências que possibilitam a capacitação educacional, social, política, financeira e cultural das comunidades por meio de projetos e oficinas que buscam a melhoria na qualidade de vida, o desenvolvimento
sustentável,
a
preservação
ambiental, a
capacitação
educacional, a inclusão digital e a participação social de todos os agentes da sociedade. O MMIB é coordenado exclusivamente por mulheres, os homens têm
31 direito a voto e voz, mas não podem concorrer a cargos eletivos dentro da associação. A Associação de Produtores da Ilha de Cotijuba (APIC) era uma associação sem fins lucrativos, voltada exclusivamente para a agricultura familiar e formada quase que unicamente por homens, as mulheres que participavam eventualmente eram as esposas dos agricultores e não propriamente associadas. Em 1998, algumas mulheres adentraram a APIC com a intenção de se associarem e a partir delas surgiu o Grupo de Mulheres da Associação de Produtores da Ilha de Cotijuba (GMAPIC) com, aproximadamente, 10 mulheres que sentiram a necessidade de participar das discussões e começaram a receber capacitação em produção de doces de frutas tropicais, aulas de alfabetização e orientação política e partidária. O grupo foi se fortalecendo e em 1999 uma mulher assumiu a presidência da associação da APIC, fortalecendo a participação das mulheres e incluindo agora os jovens no projeto “Frutos da Ilha” em parceria com a Comunidade Solidária do Governo Federal, onde atendeu 50 adolescentes da ilha de Cotijuba, capacitando-os em produção de papel reciclado e construção de instrumentos musicais com materiais da floresta. Em 2001, o GMAPIC decidiu deixar a (APIC) e fundar um novo grupo, o MMIB – Movimento de Mulheres das Ilhas de Belém (Relato Experiência do MMIB, 2013, pg. 1-2).
O MMIB conta com 40 mulheres que participam do espaço como orientadoras ou coordenadoras e participantes dos projetos e das oficinas disponibilizadas pela própria associação ou por institutos e voluntários que realizam pesquisas ou atuam como ativistas culturais na comunidade. O Movimento de Mulheres das Ilhas de Belém funciona de terça-feira à quinta-feira entre às 09:00 e 17:00h.
Figura 17: espaço do Movimento de Mulheres das Ilhas de Belém (MMIB) na Ilha de Cotijuba / Fonte: acervo do projeto.
32 Os principais projetos em execução nos espaços do MMIB são: 1. O plantio de sementes de priprioca: é um projeto que existe há oito anos em parceria com a empresa Natura e beneficia 13 famílias diretamente; 2. Centro de Inclusão Digital (CID): é um empreendimento que existe há três anos em parceria com a fundação Bradesco e tem como objetivo disponibilizar formação básica em informática e acesso à internet para a comunidade; desde a sua inauguração, já possibilitou a inclusão digital de, aproximadamente, 200 pessoas; 3. Sala de Leitura: é um espaço para incentivar a leitura na comunidade, atualmente, conta com um acervo de 400 livros, conseguido por meio de doação e é o único espaço de leitura e empréstimos de livros no complexo de ilhas ao redor da cidade de Belém – ilha de Cotijuba, de Jutuba, de Paquetá, de Urubuoca e Ilha Nova; 4. O serviço de turismo de base comunitária (TBC): é um projeto
que
oferece
a
grupos de
institutos,
escolas,
universidades e visitantes o acompanhamento no espaço da ilha e o relato de experiências do MMIB, a partir da concepção de turismo sustentável e, assim, desenvolver na comunidade o sentimento de “ser/pertencer às ilhas de Belém”; 5. Produção de papel artesanal e biojoias: é um projeto que existe desde 1999 em parceria com o Instituto Paêbiru, Mapinguari Design e Bovespa Social, que disponibilizaram um espaço exclusivo para a produção artesanal, maquinários específicos e capacitação profissional para possibilitar a produção e comercialização de papel reciclado e artesanal feito com a fibra da pripioca, assim como outros produtos, como blocos, agendas, cadernos de anotações, embalagens e biojoias feitas em oficinas e cursos promovidos no espaço; 6. Projeto Vida e Companhia: é um projeto que existe há um ano com recursos provenientes da ‘”Repartição de Benefícios
33 da Natura” e funciona como um Centro de Convivência da 3ª idade na ilha de Cotijuba e tem como objetivo disponibilizar um espaço de convivência com lazer, cultura e troca de experiências entre os idosos da comunidade. A definição desses espaços para a realização da oficina permitiu uma inserção direta com a comunidade e com as questões que envolvem a realidade da ilha, assim como um contato com as impressões íntimas de cada participante sobre as temáticas abordadas.
34 6.2. Linhas de ações e planejamento estratégico da oficina. Para a realização da oficina, foram feitas pesquisas bibliográficas e voltadas para a cena da fanzinagem nacional e regional a fim de definir os elementos necessários que compõem um fanzine e, assim, funcionar como base de referência nos debates propostos na oficina e que determinaram a orientação do conteúdo a ser abordado e a forma de como abordá-lo na produção de material escrito e visual que possibilite esse espaço de diálogo e auxilie na ressignificação do sentido das mídias. O primeiro passo para se fazer um fanzine é escolher o assunto que se quer abordar: músicas, cinema, quadrinhos, ficção científica etc. Dentro de um tema escolhido, faz-se necessário também definir o enfoque para o trabalho. Como o fanzine é um trabalho feito por paixão, cujo lucro é a troca de informações e o enriquecimento do universo em estudo, é importante escolher um gênero pelo qual se tenha verdadeiro interesse, de modo que não seja um sacrifício o tempo e o dinheiro empregados em sua elaboração (MAGALHÃES, 1993, pg. 63/64).
O nome, o editorial do fanzine e o público-alvo foram concebidos em diálogos com os participantes, foi proposital a intenção de anular particularidades de gatekepper no papel do oficineiro-facilitador, pois o objetivo do laboratório era dialogar e demonstrar as possibilidades deles como indivíduos multimídia e propor a reunião das suas impressões em um fanzine construído e compartilhado de forma comunitária – todos que participassem das oficinas poderiam ter seus textos publicados. A oficina teve a participação de 12 jovens, entre adolescentes e adultos de 11 a 20 anos de idade, todos são moradores da ilha de Cotijuba e para entender melhor quais são as principais plataformas midiáticas a que eles têm acesso, foi feita uma pesquisa com cada um deles e um debate em grupo sobre a participação efetiva de suas expressões dentro desses espaços, por exemplo, se eles têm acesso à rádio comunitária da ilha ou se na cidade há um jornal comunitário que reproduz a realidade socialmente compartilhada pela comunidade e se em ambos os casos eles têm espaço para contribuir com os conteúdos produzidos, sugerindo pautas, dando entrevistas, oferecendo músicas ou com outras formas de participação midiática.
35 Na tabela abaixo, estão o registro dos participantes com nome, idade, escolaridade, as principais mídias consumidas por eles e uma palavra escolhida aleatoriamente: Tabela I
Fonte: acervo do projeto.
A pesquisa, na cena da fanzinagem nacional e regional, permitiu com que os participantes pudessem visualizar e dialogar com temáticas, reflexões e expressões de pessoas que produzem fanzines e, a partir dele, desenvolverem ângulos de experimentações estéticas e de conteúdo. Sendo assim, foi apresentado a eles o seguinte banco de dados: 1. Dor de dentes de tubarão – Abílio Dantas; 2. Ex-iste em mim – Affonso Romano de Sant’anna;
36 3. Toda via ilhas – Antonia Nayane Muniz; 4. Divagação – Elton Galdino; 5. Gambiarra Vol.1 – Luciana Gouveia; 6. Alguém para quem – Daniel Leite Jr; 7. Alguém para quem Vol.2 – Daniel Leite Jr; 8. Pelo menos poema – Jorge Andrade; 9. Delirium Tremens – Sem nome do autor; 10. Fanzine Megafone #4 – Megafone Publicações; 11. Fanzine Megafone #6 – Megafone Publicações; 12. Manifesto Partido Cãomunista – Sem nome do autor; 13. Da primeira vez era cidade #1 – Lara Vasconcelos; 14. Febre num sábado de maio de 2014 – Diversos autores; 15. Potências e limites – Errico Flores Jensen (tradução de Hurrah – Célula Anarquista Anti-Civilização e Instituto Bonnotiano de Terrorismo Teórico) ; 16. O amor prevalece – Eduardo Santos; 17. Amazônia em Chamas – Coletivo Amazônia em Chamas; 18. Terra do meio zona de guerra – Relato Poélítico; 19. Lilith N.01 – Informativo Aperíodico do C.A.F (Coletivo AnarcoFeminista) ; 20. Isto é meu – Coletivo Vacas Profanas; 21. Pintosa – Tiago Arrais; 22. O inquilino n.01 – Marcelo Marat; 23. O inquilino n.02 – Marcelo Marat; 24. O inquilino n.03 – Marcelo Marat; 25. O inquilino n.07 – Marcelo Marat; 26. O inquilino n.11 – Marcelo Marat; 27. Será o Benedito? – Marcelo Marat; 28. Boca suja n.04 – Fanzine Coletivo (reunião de vários autores); 29. Boca suja n.14 – Fanzine Coletivo (reunião de vários autores); 30. Boca suja n.15 – Fanzine Coletivo (reunião de vários autores); 31. Barra Pesada n.01 – MaylsonLivio Santos; 32. Ponto de Fuga 12 – Quadrinhistas Associados (PA);
37 33. Dor divina número zero – GDC; 34. Fuga para o azul – NorivalBottos Júnior; 35. A verdade só-mente para mim – Luana Weyl. A reunião desses fanzines compõe variadas temáticas nos âmbitos sociais, culturais, políticos, comportamentais, literários e manifestos artísticos experimentais. O banco de dados oferecido na oficina é resultado de uma pesquisa realizada com produtores independentes de fanzines, registros disponíveis na gibiteca da biblioteca Arthur Vianna e fanzinotecas12 digitais e pessoais. A intenção de compartilhar esse material é parte do objetivo de demonstrar a produção realizada em outras regiões e, assim, despertar o olhar crítico sobre o que outros indivíduos estão pensando, desenvolvendo, organizando e distribuindo como informação livre e, também, o interesse em produzir um fanzine comunitário com espaços para expressões sobre si mesmo e o espaço em que vivem. É possível crer que a experiência de se dar ao diálogo com outros mediante a prática zínica, exista antes mesmo da produção de um exemplar. Desde o momento em que um faneditor lê um texto para realizar um zine, é estabelecido um diálogo entre ele e o autor do texto lido. Isso porque, todo ato de escrita, assim como de leitura, é, sempre, um ato dialógico. Quando se escreve, o que quer é comunicar com alguém. Quando alguém lê, essa comunicação se efetiva (MARANHÃO, 2012, pg.66).
O fanzine foi demonstrado a eles como uma ferramenta que disponibiliza um espaço sem as amarras da censura e que incentiva a livre expressão de ideias em qualquer âmbito do conhecimento humano, portanto, influenciando-os para o fato de que todos os indivíduos e grupos sociais têm algo para dizer e maneira particulares para realizar a sua expressão. O objetivo principal da oficina é despertar, nos participantes, o desejo de produzir informação livre por meio do fanzine, reacender neles a vontade de demonstrar suas expressões estéticas, literárias, sociais, culturais e políticas, mesmo que isso seja negado a eles nas mídias tradicionais de massa, afinal a necessidade de comunicar é humana e ela tem que ser exercida socialmente.
12
Fanzinoteca é uma biblioteca de fanzine.
38 5.3. Comentários sobre o processo experimental desenvolvido na produção de conteúdo escrito e visual para a construção do fanzine. A realização do fanzine foi dividida em cinco propostas de produção escrita e visual para serem realizadas nos três dias em que ocorreu a oficina, todas elas procuram estabelecer relações entre identidade-lugar e imagináriocultura nas representações sociais e, assim, auxiliar no desenvolvimento da formação crítica dos participantes e gerar questionamentos quanto ao papel da mídia na realidade do ambiente em que vivem e de si mesmos como cidadãos do mundo, que têm opiniões e expressões para ser compartilhadas socialmente. Os cinco eixos de produção são: 1. Exercício de memória: foi realizado um debate sobre identidade e intercâmbio cultural, por exemplo, qual a suas atividades preferidas e qual o papel social que eles assumem no cotidiano da comunidade em que vivem, após esse momento de troca de informações, eles realizaram a produção de um texto escrito – livre na escolha do gênero textual – a partir da palavra que haviam dado no registro para a oficina; 2. Pesquisa histórica: para entender a história e se aproximar da realidade de Cotijuba, foi necessário fazer uma reunião de pauta e dialogar sobre os principais elementos históricos do espaço e um debate sobre os problemas que atingem a ilha para a produção de um texto dissertativo a fim de, dessa maneira, ter acesso aos diversos ângulos que compõem a cidade e compreender melhor o olhar do habitante da ilha sobre a história e a realidade do lugar onde vivem; 3. Exercício de estética poética: os participantes da oficina fizeram produções literárias construindo haikais 13 e poemas a partir do sorteio de palavras para orientar o tema e oferecer um horizonte simbólico com o objetivo de que pudessem exercitar a liberdade estética e a formação de novos ângulos para eles reconstruírem
13
Haikai é um gênero poético que tem origem no Japão e se caracteriza por valorizar a concisão e a objetividade.
39 símbolos culturais e comportamentos que envolvem a existência na ilha; 4. Registro e adaptação de discurso: nesse momento, foi realizado um exercício da prática jornalística, os participantes fizeram entrevistas com moradores da ilha com o objetivo de dialogar com outros olhares sobre a ilha, registrar o discurso e ressignificar as informações em textos escritos que se aproximem da realidade socialmente compartilhada pela comunidade; 5. Construção de informação visual: foram realizadas produções de colagens com revistas, jornais, quadrinhos e fotografias para anexar aos textos produzidos na oficina. A oficina buscou desenvolver intercâmbio, diálogo, reconhecimento da importância em realizar interferências em espaços midiáticos e, assim, participar do processo comunicacional não só como receptores, mas também como produtores, ou seja, canais de informação livre, nos quais a realidade do ambiente socialmente compartilhado, no caso específico a ilha de Cotijuba, é ressignificada por meio da comunicação participativa que a produção de um fanzine possibilita.
40 5.4. Intercâmbio de experiências. A realização de uma oficina de fanzine requer um planejamento que abrange: determinação de lugar, horário, pesquisa bibliográfica e de publicações independentes, organização de objetivos, aquisição de material, formatação e captação de público-alvo, orientação de atividades e debates para o desenvolvimento dos exercícios que foram propostos em cada encontro realizado nos espaços do MMIB, na ilha de Cotijuba. No primeiro dia da oficina, 23/10, foi realizado o registro dos participantes e diálogos sobre os meios de comunicação. Após isso, foi apresentado para eles o conceito de fanzine e alguns exemplares que fazem parte do banco de dados da pesquisa realizada para o projeto. Eles puderam entrar em contato com as publicações independentes e tirar dúvidas sobre o processo de produção. Nesse momento, foram compartilhadas considerações históricas sobre a prática da fanzinagem, eles puderam escolher um exemplar de zine para levar para casa e foram entregues as anotações oficiais 14 da oficina e as anotações auxiliares15 A – verificar a seção de apêndices – para guiá-los quando eles fossem realizar as atividades. Também, definimos que o nome do fanzine seria “Trilha Dourada” em alusão a tradução da palavra Cotijuba, o público alvo (a comunidade) e linha editorial que orientaria a produção do conteúdo escrito e visual. Foi realizado um exercício que consistiu na produção de um texto – livre na escolha do gênero textual, a partir da palavra que eles deram no registro para a oficina – verificar tabela I – essa atividade procurou desenvolver a memória como uma prática de construção de identidade a partir das impressões que cada palavra remonta simbolicamente neles. Assim como, também, a produção de informação visual por meio de colagens em revistas, livros, jornais e quadrinhos que dialoguem com a proposta do fanzine. Ao final, cada participante comentou sobre os problemas estruturais e sociais que existem em
14Principal 15Texto
apostila para orientar a compreensão sobre o que significa a prática de fanzinagem. auxiliar sobre gêneros de textos.
41 Cotijuba e a história da ilha, o que haviam ouvido de seus parentes sobre a construção da cidade, nesse instante, ficou decidido pautas para eles desenvolverem, até o último dia da oficina, sobre os seguintes temas: Tabela II
Fonte: acervo do projeto.
No segundo dia da oficina, 04/11, foram realizadas entrevistas organizadas em grupo com moradores da cidade de Cotijuba, nesse momento, foi entregue para os participantes as anotações auxiliares16 B – verificar a seção de apêndices – essa atividade tem o objetivo de incentivar o diálogo dos
16
Texto auxiliar sobre técnicas de entrevista.
42 participantes com outros olhares sobre a ilha e registrar esses discursos em uma matéria informativa que disponibilize espaço para a voz da comunidade: Tabela III
Fonte: acervo do projeto.
No segundo momento, foi proposta a produção de textos poéticos, haicais ou poemas, baseados em palavras aleatórias que foram sorteadas para oferecer uma temática e orientar a produção estética dos participantes; nessa atividade, foi possível demonstrar a versatilidade da palavra como construção de outros mundos e mundos íntimos: Tabela IV
43
No terceiro dia de atividade, 06/11, realizamos o projeto gráfico, definindo o tipo de papel, cor, quantidade de exemplares para serem feitas xerox, definição do número de folhas e tipografias a serem usadas nos textos. Feito isso, decidimos realizar o processo da diagramação por meio de recorte e colagem, definindo que os espaços serão livres para a composição do fanzine. Após a realização da diagramação manual do fanzine, definimos fazer uma tiragem de 100 exemplares para serem distribuídos na comunidade no dia 20/11 pelos participantes da oficina. No final da oficina, todos comentaram sobre com foi ter participado da criação do fanzine comunitário “Trilha Dourada” e a importância de ter um espaço de comunicação participativa para que eles possam realizar interferências na comunidade.
44 5.5. Anotações sobre o conteúdo produzido. As produções dos conteúdos realizados na oficina de fanzine na ilha de Cotijuba se basearam em símbolos ou temas que fazem parte do espaço, para que os participantes pudessem mobilizar cada elemento a partir de um ângulo crítico e pessoal e, assim, propor a recriação do lugar e da memória. Por exemplo, os textos poéticos e as crônicas que foram produzidos demonstravam o sentimento de busca, admiração, alegria, tristeza e outros:
Figura 18: reunião dos haicais e poemas produzidos/ Fonte: acervo do projeto.
45
Figura 19: reunião das crônicas produzidas / Fonte: acervo do projeto.
Os textos produzidos por eles e para eles assimilam elementos e recursos que são partes do que é compartilhado socialmente nas vivências na ilha e, também, são observações silenciosas sobre a autoestima da comunidade, seus sonhos, decepções, medos, esperanças e opiniões, representadas de forma lúdica ou baseadas em pesquisas informativas com os agentes sociais da comunidade, como as matérias e as imagens que foram produzidas em conjunto
46 e individualmente a partir de alguns conceitos da prática jornalística na produção de textos e do processo de colagem para a produção visual, como demonstrado abaixo:
Figura 20: reunião das matérias produzidas / Fonte: acervo do projeto.
47
Figura 21: reunião das imagens produzidas / Fonte: acervo do projeto.
Nesse sentido, não houve censura quanto a escolhas de gêneros textuais e as construções visuais, a intenção era demonstrar que para a expressão íntima não há barreiras que delimitem a margem do que dizer? Ou como dizer? Desenvolvendo, dessa maneira, com eles, contextos e espaços para proporcionar visibilidade as suas expressões e impressões íntimas sobre si mesmo e sobre o mundo que os contorna.
48 6. Expectativas finais: o projeto continua. Produzimos o fanzine “Trilha Dourada” com o objetivo de demonstrar as possibilidades comunicacionais que esse espaço midiático livre permite. Sendo assim, foi possível reconhecermos, no conteúdo produzido pelos participantes, as suas impressões íntimas sobre a realidade da ilha de Cotijuba e o posicionamento deles como moradores do espaço. A intenção não era avaliar o conteúdo produzido, e sim, analisar as possibilidades do fanzine como recurso metodológico efetivo na participação no processo de comunicação, não somente como receptores, mas, também, produtores e emissores de conteúdo informativo livre. A abertura comunicacional proporcionada pela ausência de censura no processo de produção de conteúdo permite que os fanzines sejam portadores de narrativas que materializam vivências, impressões íntimas, ideologias, posições políticas, percepções estéticas, representações simbólicas sobre a identidade-lugar de quem produziu o fanzine, portanto, essa plataforma comunicacional livre permite que o indivíduo assuma papéis sociais fundamentais no processo comunicação em oposição aos processos globalizantes que impõem cada vez mais a homogeneização cultural e social da população. O conteúdo se aproximou da realidade da cidade, pois foram produzidos pelos próprios moradores, ou seja, criados por eles e para eles. Auxiliando, dessa maneira, no processo de reconhecimento de identidade e da sua representação social dentro da comunidade, portanto a ilha de Cotijuba foi representada simbolicamente de maneiras diferentes e distintas, cada uma com a peculiaridade nos modos de se expressar de cada participante, exercendo, portanto, uma comunicação participativa, na qual todos puderam ter espaço para produzir informação livre por meio do processo de comunicação participativa que o fanzine possibilita. O fanzine “Trilha Dourada” começou como um projeto piloto para despertar o interesse da comunidade na participação em espaços midiáticos e foi absorvido e compreendido na oficina como uma proposta possível de ser
49 realizada e ampliada em outras edições. Nesse contexto, não é um trabalho que termina em um único volume, pois foi compartilhado pelos participantes o desejo de manter o projeto como uma publicação independente que disponibilizará um espaço de comunicação participativa para aqueles indivíduos da comunidade que quiserem compartilhar de impressões sobre a realidade da ilha e exercerem o papel de agentes sociais participativos do processo de comunicação. Junto com a proposta do laboratório de fanzine, também, demonstramos a possibilidade de montar uma fanzinoteca dentro da “Sala de Leitura” – lugar onde funciona uma biblioteca que possui o registro de 400 livros – do espaço do Movimento de Mulheres das Ilhas de Belém (MMIB) com proposta inicial de registro de 36 fanzines para serem anexados no espaço. O projeto da fanzinoteca foi aceito pelos organizadores do espaço que, ao final da oficina, realizaram a abertura da sala para as publicações independentes de fanzines. A mídia fanzine é um valioso recurso comunicacional de mobilização e divulgação sociocultural capaz de agregar valores em um mesmo espaço comunicacional, sem distinção ou barreiras para produção de conteúdo informativo, pois se configura como uma publicação que apresenta proposta gráfica
e
editorial que
permite
um
exercício
de
liberdade
estética,
proporcionando aos seus editores uma produção autônoma e livre a partir da descentralização da produção de informação, configurando-se, portanto, como uma mídia transformadora de elementos socioculturais. Até o próximo fanzine...
50 7.Referência Bibliográfica BELLONI, Maria Luiza. O que é mídia-educação. Campinas: Editora Autores Associados, 3ª Ed., 2009. CARLOS, Ana Fani Alessandri. O lugar no/do mundo. São Paulo: Labur Edições, 2007. florestaaguadonorte.com.br/ilhas-da-amazonia/cotijuba/ forumdemidialivre.org/?tag=manifesto GALVÃO, Demetrios Gomes. Juventude e fanzine: a cartografia de uma prática subversiva. Apud in: MATOS, Kelma Socorro Lopes de. (Org.). Jovens e crianças: outras imagens. Fortaleza: Edições UFC, 2006. GUIMARÃES, Edgard. Fanzine. João Pessoa: Marca da Fantasia, 2005. _________, Edgard. Algo sobre fanzines. Texto feito para a revista “Literatura” da Editora Komedi, 2000. LORNE, W. Craner. Promovendo uma mídia livre e responsável: Uma parte integral da política externa dos EUA. Apud in: Questões Globais. Revista eletrônica do Departamento de Estado dos EUA, Fevereiro de 2003, Volume 8, Número 1. MAGALHÃES, Henrique. O que é fanzine. São Paulo: Editora Brasiliense, 1993. _____________, Henrique. A mutação radical dos fanzines. João Pessoa: Marca de Fantasia, 2005. _____________ Henrique. O rebuliço apaixonante dos fanzines. João Pessoa: Marca da Fantasia, 2003. MARANHÃO, Renata Queiroz. Fanzines nas escolas. Editora Uece. Fortaleza, 2012. MAZETTI, Henrique Moreira. Mídia alternativa para além da contrainformação. Trabalho apresentado ao GT de Mídia Alternativa, do V Congresso Nacional de História da Mídia, Facasper e Ciee, São Paulo, 2007.
51 NASCIMENTO, IONEIDE SANTOS. Da marginalidade à sala de aula: o fanzine como artefato cultural, educativo e pedagógico. Apud in: Muniz, Celina (org.). Fanzines, autoria, subjetividade e invenção de si. Edições UFC, Fortaleza, 2010. PERUZZO, participação
Cicilia
M.Krohling.
popular
e
Direito cidadania.
à
comunicação Artigo
comunitária,
aprensentado
no
CELACOM/ENDICOM 2004 (VII Colóquio Internacional sobre a Escola LatinoAmericana de Comunicação / V Encontro de Ensino e Investigação da Comunicação nos Países do Mercosul), realizado de 29 a 31 de março de 2004 na Universidade Metodista de São Paulo, Bernardo do Campo. Promoção da Cátedra Unesco / Umesp de Comunicação regional/UMESP, 2004). SIQUEIRA, Joanne Oyama. O fanzine como fator de identificação cultural. 2003. Monografia (Graduação em Comunicação Social) – Faculdade de Comunicação Social,Universidade de Fortaleza, Fortaleza, 2003. VYGOTSKY, L.S. A formação social da mente. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1988.
52 Seção de apêndices 1. Anotações oficiais Oficina no MMIB – Produção de Fanzine Oficineiro/Facilitador: Daniel Leite Jr 1 – Apresentação O fanzine é uma publicação independente e livre censura que pode ser feita por qualquer pessoa que tenha como proposta abordar alguma temática, isto é, feita com pouco dinheiro e com extensa liberdade para a produção de conteúdos, podendo ser impresso ou virtual. Basta querer e se esforçar para produzir conteúdo. O que torna o fanzine especial é a sua exclusividade e a sua importância política. Em um contexto social no qual as pessoas não se sentem representadas pelos grandes veículos de comunicação, observamos que os fanzines ganham ainda mais força. Um exemplo disso, é que ele foi amplamente utilizado em momentos históricos como a Revolução de 68, na França e no Brasil, durante os anos 80, quando a Ditadura Militar dava seu último suspiro. Desde o início do ano passado, observamos um acentuado interesse da juventude pela produção de fanzines, por causa das possibilidades que ele propõe para a produção de informação livre, relaciona-se também com a revolução de costumes e produção literária individual – a exemplo dos avanços das lutas dos movimentos gays, feministas, negro, indígena, de desmilitarização da polícia etc – que costumeiramente não encontramos nos espaços de mídias de massa. A seguir, vamos ver tudo o que é necessário para a produção do seu fanzine. 2 – Características do Fanzine Um só tema – Geralmente, os fanzines se concentram em um só tema. Dificilmente você vai ver publicações ecléticas, que falam sobre vários assuntos.
53 Os tipos mais comuns são fanzines sobre poesia (autoral), música (rock, na maioria), sobre feminismo (para mulheres), política (crítica as políticas sociais do governo), quadrinhos (artistas visuais que fazem experimentação de linguagens) e cultura (informações sobre a história de um ambiente ou espaço, etc). Conteúdo Exclusivo – Esta é a principal característica do fanzine. A produção de conteúdo próprio, autoral, livre e criativo. O que importa aqui não é o resultado final ou o ser feio ou o bonito e sim você expor suas ideias e fazer com que elas circulem. O conteúdo exclusivo é também o grande desafio do fanzine, pois é difícil fazer com que eles tenham vida longa. A maioria deles não dura mais de um ano. Baixo orçamento – A ideia principal do fanzine é fazer a informação circular para o seu público-alvo. Inicialmente, não é necessário um grande investimento, sendo a xerox a parte mais cara. Leitura rápida – Atualmente, com o nosso tempo corrido, no qual precisamos nos dividir entre várias tarefas, o ideal é que o leitor não perca mais do que 1 hora para ler o fanzine. Então matérias extensas, de várias páginas, que exigem grande capacidade de concentração, são ideais para revistas – não para o fanzine. Linguagem direta e informal – Como na maioria dos casos o fanzine se dirige a um público específico, não é necessário que o texto seja em linguagem culta. Ao contrário, muitas publicações tentam desconstruir a Língua Portuguesa. Gírias, neologismos, ilustrações, colagens, escrita livre são mais que permitidas – são desejáveis. 3 – Como planejar o seu fanzine: Aqui, vamos ver um modelo clássico de Projeto Editorial simples de Fanzine: Escolher um nome: Deve estar relacionado ao conteúdo que será publicado . Exemplo: Vacas Profanas (Feminista), Amazônia em Chamas (Política local), Gambiarra (Poesia). Objetivo: Por que estou criando este fanzine? O que pretendo conseguir com ele? Quem quero atingir?
54 Exemplo: Fanzine Gambiarra, de poesia. Criado para a divulgação de poesias autorais durante um sarau em abril de 2014, com a pretensão de mostrar as poesias para os participantes do mesmo. Público-alvo: O fanzine merece uma atenção especial neste quesito. Quanto mais ele se aproxima do público proposto, mais sucesso terá. Exemplo: Fanzine de quadrinhos geralmente são distribuídos em feiras de animes e mangá, os de poesia em saraus ou encontros literários, os sociais e políticos em eventos alternativos, mas todos podem ser distribuídos aleatoriamente em alguma comunidade sem a necessidade de espaço ou momento específico. Política Editorial: O que esta publicação me permite dizer? O que ela vai acrescentar para o público-alvo? Exemplo: Um fanzine feminista dificilmente vai ter uma posição contrária ao bem-estar das mulheres, por mais polêmica que ela seja. Por isto, suas autoras geralmente são a favor do aborto, do lesbianismo, do amor livre etc. Um fanzine político sempre vai ser contra o governo. Não que seus autores não possam apreciar as ações do governo, mas aquele espaço é destinado à crítica, a discussão dos aspectos que devem ser aperfeiçoados. Leva-se em consideração que o governo já possui muitos canais de comunicação com o povo para mostrar o seu lado positivo. A política editorial é uma espécie de personalidade da sua publicação. Linguagem: Qual nível de linguagem deverá ser usado? Como posso me aproximar mais do meu público? Exemplo: Um fanzine feminista não vai usar expressões do hip hop. Se você desenha um fanzine de quadrinhos, não faz sentido fazer uso de textos escritos. Seções e números de páginas: Dificilmente um fanzine impresso vai ultrapassar 20 páginas. Como você pretende organizar seu fanzine? Ele vai ter seções fixas, a exemplo de uma seção para eventos, ou para crítica de arte, para contos, ou para a opinião de colaboradores?
55 Periodicidade: Os fanzines geralmente são mensais ou trimestrais. Tudo depende da sua disponibilidade em produzir. Muitos deles não têm periodicidade fixa, ficando atrelada à realização de eventos. Tiragem: Qual é o seu orçamento para as xerox? Os fanzines têm a tiragem bastante restrita, não ultrapassando os 100 exemplares na maioria dos casos. Por isso, uma estratégia é manter sempre uma plataforma digital, que tenha um alcance maior que a edição impressa. A mais utilizada na internet é a ISSUU – Digital Publishing Platform for Magazines (www.issuu.com). Preço: Cobrar ou não cobrar? Fica ao seu critério, mas não espere ter lucros, pois não é esta a proposta do fanzine. Exemplo: O fanzine Via Ilhas custou R$ 2 para que a poeta pudesse recuperar a despesa que teve na impressão do material. Já o Gambiarra foi distribuído gratuitamente e a sua doação para outros leitores foi estimulada. Distribuição: Em quais locais a publicação poderá ser encontrada? Como a minha mensagem vai chegar até o meu público? Por isso, vale repetir, é importante ter presença virtual, em quantas vocês forem capazes de manter atualizadas. Exemplo: Nos show de rock do Xani Club e do bar Coelho Verde, em Icoaraci, há a distribuição de fanzines produzidos pelos fãs de rock.
56 2. Anotações Auxiliares A – Gêneros Textuais O que são? Os gêneros textuais são a forma que orientará a construção do que será escrito. Qual é a melhor maneira de se transmitir as informações coletada? Não há resposta certa, o importante é que estas modalidades sejam exercitadas. Estes são alguns formatos: Artigo – Texto no qual uma pessoa dá a sua opinião sobre algum fato que teve repercussão na sociedade. Possui estrutura argumentativa. Crônica – A crônica se inspira em fatos do cotidiano, mas é mais literário que jornalístico. Crítica – Texto de opinião em que se avaliam algum objeto, pessoa ou lugar. Entrevista – É o formato pergunta-resposta que é com um breve texto de introdução e com as respostas do entrevistado publicadas na íntegra. Enquete ou Fala-povo – É um conjunto de opiniões ou testemunhos breves acerca de um assunto da atualidade, que seja de relevância para a comunidade. Matéria – É o mais comum dos gêneros textuais. É um texto informativo, curto, escrito em uma linguagem clara e concisa. As notícias das matérias devem ser verdadeiras, relevantes e estarem inseridas em um contexto interessante para a comunidade. Nota – Texto curto, no máximo 10 linhas, que traz informações básicas sobre algum fato, sem aprofundamento. Perfil – O perfil é uma narrativa sobre uma pessoa, com descrições, histórias de vida e relatos. Concentra-se apenas em alguns episódios marcantes e em aspectos específicos da trajetória do indivíduo, portanto, é um texto curto. Poesia – Texto livre escrito com o uso de figuras de linguagem demonstrando as impressões do escritor sobre determinado assunto, pessoa, coisa, lugar, sentimentos e outros.
57 Reportagem – Vai além do factual, aprofundando o fato. Podemos dizer que é uma matéria ampliada, enriquecida com uma investigação mais cuidadosa, dados exclusivos ou informações privilegiadas. Testemunho – Quando o indivíduo faz um relato direto do que aconteceu, por ter estado presente na hora do fato, é costume ser enriquecida com entrevistas de outras pessoas que estiveram no local também.
58 3. Anotações Auxiliares B – Técnicas de Entrevista Agora que já definimos nossas pautas, vamos para as entrevistas! Estas são algumas dicas para você ter o máximo de aproveitamento na sua jornada em busca da informação de qualidade: ANTES -Anote as perguntas que você gostaria de fazer aos entrevistados (de 5 a 10 perguntas). -Ponha-se no lugar do outro: Em sua opinião, o que os demais membros da sua comunidade gostariam de saber sobre o assunto que você está investigando? -Elabore perguntas que a resposta vá além do “sim” e do “não”. Abuse de perguntas que começam com “como” e “por que?”; -Faça uma checagem de tudo o que você vai precisar para a hora da entrevista: Há papel suficiente para as anotações? As canetas estão funcionando? As perguntas estão legíveis no papel? Estas perguntas são básicas para se livrar de dificuldades no decorrer da entrevista? -Leia as perguntas que você vai fazer, para ficar mais autoconfiante e prestar melhor a atenção no que o entrevistado fala. DURANTE -Explique ao entrevistado os objetivos da matéria que está sendo produzida, tire suas dúvidas e explique a importância da participação dele. -Anote o nome completo do entrevistado e a idade antes de começar a fazer as perguntas; -A entrevista é como uma conversa informal. Mantenha o contato visual. Não se atenha nas anotações, tente entender o que o entrevistado fala; -Tente não interromper o entrevistado quando ele estiver falando. Caso ele fale demais e estiver repetindo as informações, agradeça o empenho dele e diga que já está satisfeito com a resposta dada.
59 DEPOIS -Priorize as informações mais importantes dentro do assunto da pauta; -Opte por frases curtas e palavras simples; -Cuidado com os adjetivos: Use com moderação ou não use; -Priorize o uso de “Ele”, “Ela”, “Eles”, “Elas” e “Nós”. Evite usar “Eu”, a não ser que o seu gênero jornalístico seja o testemunho; -Use aspas “” para separar a fala dos entrevistados da sua; -Quando o seu texto estiver pronto, dê para seu colega revisar. Se ele entender, é porque todos da sua comunidade também vão entender. Esta prática é muito utilizada nas redações, quando há tempo. -Você é o autor do texto: Assine sua matéria.
60 Seção de Anexos
Anexo A – Capa e contracapa.
Anexo B – editorial, participantes e primeira página.
61
Anexo C – segunda e terceira página
Anexo D – quarta e quinta página.
62
Anexo E – sexta é sétima página.
Anexo F – oitava e nona página.
63
Anexo G – décima e décima primeira página.
Anexo H – décima segunda e décima terceira página.
64
Anexo I – décima quarta e décima quinta página.
Anexo J – décima sexta e décima sétima página.
65
Anexo K – décima oitava e décima nona página.
Anexo L – décima oitava e décima nona página.