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ALGARVE INFORMATIVO 5 de novembro, 2022
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FESTIVAL EMRAIZART E DAVID FONSECA EM LAGOS | PESTE & SIDA EM PORTIMÃO ALGARVE INFORMATIVO #362 «CORTES DE JÚPITER» E NBC EM LOULÉ | DIA DE LAGOS | HALLOWEEN EM ALBUFEIRA
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ÍNDICE Dia de Lagos (pág. 24) Compañia Flamenca Jesus Herrera em Lagoa (pág. 38) Halloween festejado em Albufeira (pág. 54) «Cortes de Júpiter» no Cineteatro Louletano (pág. 68) David Fonseca no Centro Cultural de Lagos (pág. 80) NBC no Auditório do Solar da Música Nova, em Loulé (pág. 90) Festival Emraizart em Lagos (pág. 102) Peste & Sida no Teatro Municipal de Portimão (pág. 114)
OPINIÃO Paulo Cunha (pág. 126) Mirian Tavares (pág. 128) Adília César (pág. 130) Dora Nunes Gago (pág. 132)
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DIA DO MUNICÍPIO DE LAGOS VIVIDO COM FORTES EMOÇÕES Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina e Município de Lagos elebrado a 27 de outubro em honra de S. Gonçalo de Lagos, padroeiro da cidade, o Feriado Municipal de Lagos voltou a ser vivido e sentido de forma plena, após dois anos marcados pelas restrições derivadas da pandemia. Entre iniciativas culturais e institucionais, destacou-se o regresso da Sessão Solene no Centro Cultural de Lagos, onde cerca de 31 individualidades, coletividades e entidades públicas foram homenageadas. ALGARVE INFORMATIVO #362
As celebrações arrancaram no dia 26 com o eletrizante espetáculo de David Fonseca no Centro Cultural, uma presença já habitual em Lagos. No dia seguinte, as atenções estiveram viradas para diversas iniciativas programadas sempre com S. Gonçalo de Lagos em mente, até porque se celebra, em 2022, os 600 anos sobre a sua morte. Assim, logo pela manhã, teve lugar a cerimónia de hastear das bandeiras na Praça Gil Eanes, contando com a participação da banda da Sociedade Filarmónica Lacobrigense 1.º de Maio e do Grupo Coral de Lagos e com a presença da 24
Câmara Municipal e Assembleia Municipal de Lagos e das várias associações culturais e desportivas locais. Ainda durante a manhã, e para deleite das dezenas dos participantes, decorreu uma visita guiada sobre a história de S. Gonçalo, tendo sido também celebrada, na Igreja de Santa Maria, uma missa em honra do padroeiro de Lagos presidida por D. Manuel Quintas, Bispo do Algarve. A manhã ficou ainda marcada pela inauguração do busto de homenagem a D. José Sebastião d’Almeida Neto (Cardeal Neto, 1841-1920), antigo Cardeal Patriarca de Lisboa que é natural de Lagos.
pela Presidente da Assembleia Municipal, Joaquina Matos, cerca de 31 personalidades, coletividades e entidades foram homenageadas pelo Município de Lagos depois de deliberadas e aprovadas pela Câmara Municipal e Assembleia Municipal. No caso das medalhas de mérito municipal de grau prata, foram condecorados o Ginástica Clube de Lagos, Hotelagos S. A. e Teatro Experimental de Lagos. Já as medalhas de grau ouro foram concedidas a José Fonseca, António Mariano, Manuel Domingos Borba, Maria da Graça Cabrita, Vítor do Carmo, Maria Antónia Candeias, Manuel dos Santos Lucas e João Francisco Cascada.
A tarde do Dia do Município foi muito especial, com o regresso da realização da Sessão Solene no Centro Cultural de Lagos (que este ano festeja três décadas de existência). Foi num ambiente familiar e de espírito comunitário que a cerimónia decorreu com «casa cheia», marcada por emoções fortes, aplausos, sorrisos e até saudade. Depois do discurso de abertura
A cerimónia ficou ainda marcada pela atribuição da medalha de mérito municipal de grau ouro coletiva a todas as entidades envolvidas na linha da frente de combate à pandemia COVID-19, uma forma de agradecer e reconhecer o seu contributo nesta luta que ainda perdura e que uniu toda a comunidade. Esta distinção destacou os Bombeiros
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Voluntários de Lagos, Cruz Vermelha Portuguesa (Delegação de Lagos), Serviço de Proteção Civil e Defesa da Floresta, GNR (Lagos), Polícia Marítima de Lagos, Polícia Municipal de Lagos, PSP (Lagos), agrupamentos de escolas Gil ALGARVE INFORMATIVO #362
Eanes e Júlio Dantas. Segurança Social (Lagos), juntas de freguesia, serviços da Câmara Municipal de Lagos, Instituto Fonte de Vida, Santa Casa da Misericórdia de Lagos, Centro de Saúde 26
de Lagos, Hospital de Lagos e Hospital de Portimão. Hugo Pereira, presidente da Câmara Municipal de Lagos, encerrou a cerimónia com um discurso que enalteceu a feliz 27
retoma da sessão solene para “valorizar
e reconhecer o mérito e os bons exemplos a replicar dos vários elementos da nossa comunidade, mesmo perante adversidades ALGARVE INFORMATIVO #362
como a pandemia, guerra na Europa e crise energética e económica”. Referiu ainda a importância de iniciativas semelhantes para “afirmação
da identidade coletiva lacobrigense”, reconhecendo a força do espírito de união da comunidade. O dia terminou com a inauguração de uma exposição dedicada à vida e obra de S. Gonçalo de Lagos e que pode agora ser visitada no primeiro pisco do Centro Cultural de Lagos. As celebrações do Dia do Município foram ainda mais especiais com as presenças de cidades geminadas e com acordos de colaboração e ALGARVE INFORMATIVO #362
cooperação com Lagos, nomeadamente São Miguel (Cabo Verde), Torres Vedras e Palos de La Frontera (Espanha), cuja geminação celebra presentemente 30 anos de existência. As comemorações desta efeméride prosseguiram depois com mais iniciativas culturais como a sessão «Vozes de mulheres na obra de Saramago», com Joana Manuel, a peça «Elogio da Loucura» pel’A Barraca, atividades com insufláveis no Complexo Desportivo de Lagos, a palestra «A aldeia de Espiche – Aspetos da sua história», Milonga – Arte Tango e o espetáculo «Anos d’Ouro das Big Bands» pela Orquestra Ligeira de Lagos . 28
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COMPAÑIA FLAMENCA JESUS HERRERA ESGOTOU AUDITÓRIO CARLOS DO CARMO Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina
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Compañia Flamenca Jesus Herrera encheu por completo o Auditório Carlos do Carmo, em Lagoa, no dia 29 de outubro, com o fantástico espetáculo de flamenco «DANTZARI – Bailaor». Jesus Herrera começou a sua carreira artística como bailaor flamenco na Compañía Andaluza de Danza, com direção artística de José Antonio, com o qual protagonizou as obras mais importantes deste grande diretor e coreógrafo flamenco: «Latido Flamenco» (Praga e Budapeste), «Perro Andaluz» ALGARVE INFORMATIVO #362
(Espanha), «Encuentros» (França), «Bodas de Sangre» (Granada – Teatro de Los Jardines del Generalife durante julho e agosto e Bienal Flamenca de Sevilla) e «Leyenda» (Espanha). Em 2005 venceu o Concurso Nacional de Baile Flamenco por Alegrias (La Perla de Cádiz). Trabalhou com Cristina Hoyos no espetáculo de «Yerma y al Compás del Tiempo», com o qual estiveram em digressão em 25 teatros do Japão. Depois de uma intensa carreira nestas duas companhias de flamenco, decidiu partir para uma carreira como solista e coreógrafo que teve estreia em Londres e Amsterdão. Viajou também ao Japão e a São Francisco (EUA) como solista na Compañía Yoko Komatsubara. 40
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Em 2009/10 esteve a atuar na cidade de Tóquio (Japão) durante seis meses com o seu cuadro flamenco num dos lugares mais emblemáticos do flamenco fora de Espanha, o «Tablao El Flamenco». Em 2017 apresentou, no Teatro Principal de San Sebastián, o espetáculo «Dantzari – bailaor», tendo como artista convidado o consagrado bailaor flamenco Antonio Canales. Com este espetáculo fez uma tour por diferentes cenários da Europa. Em
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2019, estreou no Teatro Victoria Eugenia de San Sebastián a obra «Hamlet la danza del melancólico», uma combinação entre o flamenco e a música clássica, inspirada na obra de Mussorgsky. Seguiu-se, depois, a tourné de «DANTZARI – Bailaor», que chegou agora a Lagoa, para deleite do público que esgotou o Auditório Carlos do Carmo .
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CENTRO DE ALBUFEIRA VIVEU INTENSAMENTE MAIS UM HALLOWEEN Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina
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ruxas, zombies, cuspidores de fogo, andarilhos, lobisomens e outras personagens assustadoras invadiram o centro de Albufeira e a Avenida Sá Carneiro, na zona da Oura, durante três noites de muitos sustos, horrores e travessuras. De 29 a 31 de outubro, o Município de Albufeira convidou residentes e turistas a juntarem-se ao programa de comemorações do Halloween, numa tradição que, embora não seja de origem portuguesa, vai ganhando cada vez mais adeptos entre miúdos e graúdos. À semelhança de edições anteriores, o Largo Engenheiro Duarte Pacheco, a Rua 5 de Outubro e a Avenida Sá Carneiro 57
estiveram decoradas a rigor, num cenário onde não faltaram o Túnel dos Horrores e muitas personagens assustadoras. O programa integrou concursos, artes performativas, música, dança, pinturas faciais, desfiles fantasmagóricos e uma Spooky Run, entre outras várias surpresas. “Esta é mais uma
iniciativa que confirma que Albufeira tem grande atratividade durante todo o ano e que o Halloween, apesar de não ser uma tradição originalmente portuguesa, veio para ficar”, destacou José Carlos Rolo, presidente da Câmara Municipal de Albufeira, que agradeceu ainda aos comerciantes e restantes parceiros, “sem os quais a
realização do evento não seria possível”. ALGARVE INFORMATIVO #362
Um dos momentos altos do programa foi, no dia 29 de outubro, a performance «O Castelo do Mago» pela Associação Satori, uma adaptação da Lenda das Mouras Encantadas ao espírito do Halloween. No dia 30 de outubro, o palco do Largo Eng.º Duarte Pacheco recebeu um espetáculo cheio de ritmo pelos KIDS – Karen’s International Dance Studios e, no dia 31 de outubro, as celebrações começaram com um desfile fantasmagórico pela baixa da cidade, acompanhado pela Fanfarra dos Bombeiros Voluntários de Albufeira e a Banda Al Fanfare.
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Nessa mesma noite, e a partir do Largo Eng.º Duarte Pacheco, realizou-se a Spooky Run, numa organização do Clube Desportivo das Areias S. João, com o apoio da Câmara Municipal de Albufeira e a parceria das Caminhadas ao Luar, LiberMed e Horta da Orada. Mais ou menos pela hora do jantar, a Piri Piri & Co desafiou os participantes para o concurso «Asinhas infernais», após o que atuaram os Diébe Band. Foram três noites recheados de sustos e diabruras protagonizados por várias personagens verdadeiramente assustadoras .
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TEATRO DO ELÉCTRICO TROUXE «CORTES DE JÚPITER» AO CINETEATRO LOULETANO Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina
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Cineteatro Louletano, em Loulé, foi palco, nos dias 28 e 29 de outubro, de «Cortes de Júpiter» pelo Teatro do Eléctrico, uma tragicomédia idealizada por Garcia de Resende para o casamento e partida da Infanta D. Beatriz para Sabóia à razão do seu casamento com o duque daquela cidade. Nesta obra vicentina, a última a ser apresentada ainda em vida de «o venturoso», que faleceria no mesmo ano, a Providência, incumbida por Deus, ordena a Júpiter, rei dos elementos, que faça concertar bons planetas e signos para a viagem ao longo do Atlântico, pelo estreito de Gibraltar e Mediterrâneo, até Sabóia. O mar, os ventos, o Sol (Febo) e a Lua (Diana) são informados da empreitada. ALGARVE INFORMATIVO #362
Os diferentes elementos da Corte, que partiram num pomposo cortejo encabeçado pelo próprio Rei, seguido pela Rainha, o Príncipe e os Infantes, em direção à Sé e, de lá, para a casa da Rainha viúva, D. Leonor, para dela se despedirem, acompanham a frota de D. Beatriz até à foz do Tejo, nadando, metamorfoseados em peixes, umas vinte léguas, até ouvirem do mar alto o canto ameaçador de trinta mil sereias. Perante a ameaça, Marte é chamado e recebe a ordem de proteger a esplendorosa armada de dezoito naus. Como amigo e admirador dos feitos portugueses, Marte recita louvores entusiastas a Portugal. No fim, uma Moura encantada, evocada aos sons de um romance, traz e entrega à Duquesa de Sabóia prendas de condão: um anel, um dedal e um terçado. Assim reza a história desta coprodução do Centro Cultural de 70
Belém, Cineteatro Louletano, Academia Portuguesa de Artes Musicais, Teatro do Eléctrico e Culturproject, com coordenação artística e musicológica do Laboratório de Ópera Portuguesa a cargo de Jenny Silvestre e coordenação científica do Laboratório de Ópera Portuguesa por Luísa Cymbron (CESEM/ FCSH). Mais uma grande obra com encenação e adaptação dramatúrgica do carismático quarteirense Ricardo NevesNeves, cuja música nova foi composta por Filipe Raposo e interpretada, ao vivo, pelos solistas da Alma Ensemble, nomeadamente, Isabel Fernandes, Liliana Sebastião, Rita Filipe, Teresa Projecto, Frederico Projecto, João Barros, Tiago Amado Gomes, Tiago Mota, com direção musical de Filipa Palhares, bem como pelo Ensemble La Nave Va, constituído
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por Catarina Bastos (Violino), Gabriela Barros (Viola), Joana Tavares (Viola), César Gonçalves (Violoncelo), Duncan Fox (Contrabaixo), Débora Bessa (Flautas de bisel), Gonçalo Freire (Flautas de bisel), Stephan Mason (Trompete), Nuno Cunha (Trompa), Richard Buckley (Percussão), Helena Raposo (Alude, Vihuela, Tiorba), Hélder Rodrigues (Trombone) e Jenny Silvestre (Cravo), com direção musical de António Carrilho. O Teatro do Eléctrico é uma estrutura apoiada pela República Portuguesa – Cultura / Direção Geral das Artes, pelo Cineteatro Louletano/Câmara Municipal de Loulé e pela Câmara Municipal de Lisboa / Polo Cultural Gaivotas Boavista.
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DAVID FONSECA ENCHEU CENTRO CULTURAL DE LAGOS COM CONCERTO DE APRESENTAÇÃO DO DISCO-FILME «LIVING ROOM BOHEMIAN APOCALYPSE» Texto: Ricardo Coelho| Fotografia: Ricardo Coelho
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avid Fonseca subiu ao palco do Centro Cultural de Lagos, a 26 de outubro, para apresentar o concerto do seu mais recente disco-filme, «Living Room Bohemian Apocalypse». O artista tornou a ultrapassar todas as expectativas com o espetáculo da sua nova digressão, onde demonstra as suas competências cénicas aliadas à perfeição e a uma enérgica performativa a que os seus fãs já se habituaram. Com um alinhamento que passou pelas músicas mais recentes, mas também pelos grandes êxitos, ouviu-se «Chasing The Light» logo na abertura, a que se seguiram ALGARVE INFORMATIVO #362
«Someone That Cannnot», «Live It Up», «Oh My Heart», «Gotta Learn How To Let You Go», «Not You», «Lullaby», «Kiss Me», «É-me Igual», «Love Me Or Leave Me», «Futuro Eu» mashup com o clássico «Running Up That Hill» de Kate Bush e «What Life Is For». O encore foi feito ao som de «All That I Wanted», «Falling Out Of Love», «In The Zone» e a encerrar «The 80's». David Fonseca, acompanhado por Sérgio Nascimento na bateria e Paulo Pereira nos teclados e programações, mostrou mais uma vez que os seus concertos não se fazem só de canções. De facto, nesta digressão destacam-se as projeções muito criativas e bem conseguidas, dando quase a sensação 82
de assistirmos a vários videoclips ao vivo e criando uma dinâmica ainda maior entre o artista e o público que cantou, aplaudiu e até se levantou para dançar. À saída era evidente a satisfação nos rostos daqueles que presenciaram um grande espetáculo e as palavras mais ouvidas nos comentários foram fabuloso, magnífico e espetacular.
David Fonseca, o disco-filme contou com a colaboração de André Tentúgal na realização em dois dos sete capítulos, destacando-se ainda a participação de nomes ligados às mais diversas áreas, como Filomena Cautela, Joaquim Monchique, Pedro Almendra, Libra, Sofia Grillo, Raquel Henriques ou Filipa Peraltinha, entre outros .
Recorde-se que «Living Room Bohemian Apocalypse» foi totalmente concebido por
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AUDITÓRIO DO SOLAR DA MÚSICA NOVA RECEBEU UM DOS PIONEIROS DO HIP-HOP EM PORTUGAL Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina
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Auditório do Solar da Música Nova, em Loulé, acolheu, no dia 30 de outubro, NBC, um dos fundadores do movimento hiphop em Portugal e um artista bastante apreciado pelas suas peculiares performances ao vivo com crossover entre o Soul, R&B, Drum and Bass, Rock e Eletrónica, nas quais comprova ser dono de uma enorme versatilidade para transformar e criar versões acústicas. Nascido em 1974, em São Tomé e Príncipe, com a influência das suas raízes africanas, Timoteo Tiny é uma das vozes Soul mais acarinhadas de Portugal e autor de temas como «Segunda Pele», ALGARVE INFORMATIVO #362
«NBCioso», «Homem», «Neve», «DOIS» ou «Espelho». Com a sua discografia já participou em várias bandas sonoras de filmes e telenovelas portuguesas e pisou os palcos de festivais como o NOS Alive, Super Bock Super Rock, Meo Sudoeste, Festival F, bem como as salas mais icónicas de Portugal, entre elas o Coliseu de Lisboa, Casa da Música ou Hard Club. O seu disco, editado em finais de 2016, «Toda a gente pode ser tudo», foi considerado um dos melhores do ano pela imprensa nacional. Pelo caminho conta com a edição de um EP, «Epidemia» (2013) e mais dois discos, «Afrodisiaco» (2003) e «Maturidade» (2008), também ele aclamado como o melhor álbum do ano e considerado como um dos melhores 92
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álbuns contemporâneos. Já fez tournées com a banda GNR e, em 2015 e 2018, viveu uma temporada no Brasil onde passou por lugares como Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre, Curitiba, Florianópolis ou Belo Horizonte. Em 2019 concorreu ao Festival da Canção com a canção «Igual a Ti» e, com uma atuação e interpretação cheia de alma, conquistou o segundo lugar. Em 2020 criou «Fight With Love», o seu primeiro poema escrito na língua inglesa. Depois, continuou a sua saga de EPs, desta
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vez com o título «EPiderme» (2021), onde assumiu toda a criação, gravação e produção dos temas, que nasceram dentro da sua casa, na altura pandémica. Dos seus trabalhos mais intimistas e altamente criativos, este EP abriu portas para o mais recente tema «Eternamente», editado no mesmo ano e, no final de 2022, fez parte da digressão de Natal de Cais Sodré Funk Connection, com o projeto «Cotton Xmas», tendo integrado a banda, até à atualidade, como novo frontman .
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FESTIVAL EMRAIZART VOLTOU A ANIMAR O COTIFO, EM LAGOS Texto: Daniel Pina Fotografia: Marta Belo/Teatro Experimental de Lagos
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Festival Emraizart regressou ao Cotifo, no concelho de Lagos, para uma segunda edição que decorreu de 17 a 23 outubro, envolta pelo ambiente mágico que no ano passado surpreendeu miúdos e graúdos. Dirigido à infância e juventude, o Emraizart é uma aposta artística no circo contemporâneo e teatro, procurando vincular o desenvolvimento sustentável das cidades com a natureza. “Um cruzamento
dos universos urbano e rural através das artes que nos leva a refletir sobre a relação que as pessoas estabelecem com o território”, descreve o Teatro Experimental de Lagos, responsável pela organização.
primeira edição, os dias de semana foram reservados a grupos escolares e o fim de semana ao público geral. O público escolar teve igualmente a oportunidade de participar em workshops de Permacultura, Circo, Artesanato e Música. Este ano a programação contou com «Solo de Dos», pelo Duo x Caso (Itália/Áustria), um espetáculo de circo acrobático, palhaço e teatro gestual com marionetas; e «Sin Medidas», da Companhia CorrequeteJano (Espanha) um misto malabarismo, acrobacia, comédia e teatro participativo. No sábado foi ainda apresentada «A História do Circo» pelo Circo Vagamundo, e no domingo «Catadupa», de Rita Rodrigues. O Festival Emraizart foi organizado pelo Teatro Experimental de Lagos e contou com o apoio da Câmara Municipal de Lagos e da Direção Regional de Cultura do Algarve .
Mantendo a mesma estrutura da 105
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PESTE & SIDA AQUECERAM HALLOWEEN DO TEATRO MUNICIPAL DE PORTIMÃO Texto: Daniel Pina| Fotografia: Ricardo Coelho
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TEMPO – Teatro Municipal de Portimão acolheu, no dia 31 de outubro, noite de Halloween, os carismáticos Peste & Sida. A rockar desde 1986, a banda é uma referência da música nacional com temas como «Sol da Caparica», «Paulinha», «Chuta cavalo», «Gingão», ALGARVE INFORMATIVO #362
«Bule bule», entre outros, sendo que, neste mês de novembro, será lançado o seu novo disco. O concerto de Portimão foi, por isso, uma oportunidade para várias gerações cantarem em uníssono os clássicos da banda ao vivo e para ouvirem algumas das novas músicas da responsabilidade de João San Payo, João Alves, Sandro Oliveira e Ricardo Barriga . 116
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Utopia vs Distopia Paulo Cunha (Professor)
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les não sabem que o sonho / é uma constante da vida / tão concreta e definida / como outra coisa qualquer, (…)” – nestes quatro primeiros versos do sublime poema «Pedra Filosofal» de António Gedeão está admiravelmente sintetizado o significado da expressão que muitos proferem ao longo da vida: “O sonho comanda a vida!”. Tal como muitos de vós, acredito que almejar o (aparentemente) impossível e/ou o (aparentemente) irrealizável dá-nos a sensação de sonharmos acordados, uma vez que o desejo se sobrepõe à racionalidade e dá-nos o ensejo e estímulo para caminhar para o incerto.
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Sabendo que a utopia é a ideia ou o ideal duma sociedade imaginária em que tudo está organizado duma forma superior, ideal e perfeita, muito provavelmente tal não será concretizável. Qualquer pessoa pragmática e «terra-a-terra» dirá que a utopia é uma fantasia, uma quimera, um mito e uma ficção… logo irrealizável. Quase que nos apetece então questionar se desejarmos uma sociedade justa e com políticas públicas igualitárias poderá classificar-nos como seres utópicos. Se assim é, obviamente, sou-o! Em 1516, Thomas More escreveu o universalmente célebre romance políticosocial «Utopia», uma das obras-primas do Renascimento. Na primeira parte do livro o autor apresentou e criticou o quadro ALGARVE INFORMATIVO #362
sociopolítico da Inglaterra e de outros estados europeus de então, verberando o despotismo das monarquias, o servilismo dos cortesãos, a venalidade dos altos funcionários, o luxo e a injustiça dos nobres e dos monges. Na segunda parte, em vez de propor dogmaticamente as reformas que considerava necessárias, Thomas More preferiu imaginar concretizada numa terra longínqua a organização ideal da sociedade, oferecendo-nos, deste modo, uma descrição magnífica do que poderíamos chamar o estado socialista e democrático perfeito – a utopia. Se a utopia é desejável, mas tem sido inconcretizável, a distopia, não sendo desejável, está a tomar conta do planeta (mudanças climáticas causadas pelo homem, regimes fascistas, desigualdade social, falta de esperança, vigilância constante e diversos fatores que causam sofrimento). George Orwell, Aldous Huxley, Kurt Vonnegut, Margaret Atwood, Anthony Burguess e Ignácio de Loyola Brandão são autores de obras literárias de ficção que narram um futuro não muito distante de uma sociedade que vive em sofrimento, sob o comando de um regime autoritário, sem perspetiva de um cenário melhor. Basicamente, os autores escreveram sobre uma realidade ficcionada que, com o passar do tempo, se está a tornar realidade. A distopia, no grego antigo, significa literalmente «lugar ruim». A palavra é usada para descrever um lugar, uma época, 126
uma comunidade ou uma sociedade em que se vive sob o domínio de um regime autoritário, de forma precária, resignada e desesperada. Existe distopia quando há falta de liberdade, baixa qualidade de vida, desigualdade, condições ambientais adversas e desumanização. A tecnologia pode também ser inserida nesse contexto distópico por representar uma forma de vigilância e controlo social por parte do Estado ou de grandes corporações. A distopia é assim o inverso, o antónimo de utopia. Segundo o escritor e filósofo Alexey Dodsworth: “Se uma história é contada pelo ponto de vista da classe privilegiada pode ser considerada uma utopia. Do ponto de vista de quem é explorado para sustentar essa classe privilegiada é uma distopia. O mundo distópico é um lugar de baixa qualidade de vida, marcado pelo 127
autoritarismo, opressão e desespero, pela ausência de perspetiva de mudança. Tem um elemento de resignação, havendo poucas pessoas a revoltarem-se, porque uma das coisas fundamentais da sociedade distópica é que ela se vende como a única realidade possível. Ela aniquila o sonho. O habitante de um mundo distópico não consegue imaginar um mundo que não seja aquele”. Foi a pensar numa pergunta retórica que a minha mulher fez, que resolvi escrever sobre esta dicotomia entre a utopia e distopia. Foi de tal forma incisiva e contundente que me colocou a pensar sobre “Onde é que isto vai parar?”. Espero – sinceramente – que à pergunta se valerá a pena colocar filhos no mundo para depois virmos a assistir ao seu sofrimento, a utopia vença, dando aos vindouros a possibilidade de sonhar também! . ALGARVE INFORMATIVO #362
Da humanidade Mirian Tavares (Professora) Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz Onde houver ódio, que eu leve o amor Onde houver ofensa, que eu leve o perdão Onde houver discórdia, que eu leve a união Onde houver dúvida, que eu leve a fé Oração de S. Francisco ma amiga brasileira, muito querida, está a viver um momento difícil. Ela sente que já não encontra o seu lugar num país dividido, quase que rachado ao meio, sente-se pressionada por amigos da esquerda que se radicalizaram e sente-se mal com o que aconteceu nos quatro anos de desgoverno que assolaram o país. Eu tentei encontrar palavras de consolo, pois reconheço que houve, de facto, excessos de ambos os lados. Que mitificar alguém, seja quem for, nunca resulta – basta ver a História e o rasto de mortos que alguns destes mitos deixaram pelo caminho. Mesmo com alguns excessos, e desvios, nunca vi tanto ódio a grassar pelo país. Ódio que para mim é uma palavra forte, ódio que é algo que reservamos para os nossos piores inimigos – aqueles que fazem mal a quem amamos. O ódio, nesses últimos anos, cresceu pelo país como uma erva daninha, que se arranca e volta a nascer com raízes mais profundas. Ódio entre as famílias, entre os amigos, ódio servido ao café da manhã e à ceia. Ódio cuspido na cara dos que não pensam igual, dos que divergem, dos que pensam, simplesmente. Não consigo ALGARVE INFORMATIVO #362
perceber como alguém pode escolher o ódio que nos consome em fogo brando, que nos destrói lenta e profundamente, que nos afasta dos outros e dos princípios fundamentais que nos tornam o que somos – seres humanos. Penso no samba de uma nota só que se cantou pelo país, e que ainda se ouve: não vamos eleger um ladrão. Mas elegeram e gostariam de voltar a eleger um ser abjeto, sem escrúpulos, sem empatia e, a cereja no topo do bolo, incompetente. Tão incompetente que não cumpriu o que prometeu, como acabar a violência com mais violência. O Brasil, durante muitos anos, foi o país do «jeitinho»: das cunhas, do favoritismo, do tirar vantagem em tudo. Tentou-se reverter esta narrativa e criar um país de jeito, o prometido país do futuro. De um futuro que se espera há muito e que parece nunca chegar. Quando eu encontrei e apaixonei-me pelo Patrick, não sabia quase nada dele nem ele de mim. Um dia, andando pelas ruas de Faro, de mãos dadas, ele olha para mim a sorrir e pergunta: és comunista? Quase como uma constatação. Eu disse que não era, mas simpatizava profundamente com os princípios. E ele, que não é comunista, não largou a minha mão e continuamos a caminhar juntos, com nossas diferenças 128
Foto: Vasco Célio
ideológicas, mas não de princípios. Ele é das pessoas mais gentis e naturalmente boas que conheço. Ajuda a quem precisar, mete-se à frente, dá-se aos outros, mesmo a quem ele não conhece. Outro dia eu estava no Western Union a enviar dinheiro para o filho e tinha uma grande fila lá fora de senegaleses, paquistaneses e mais outra variedade de pessoas que, como eu, têm parentes longe. Quando eu saí, já estava o Patrick a falar em francês e inglês, em amena cavaqueira, a responder a algumas questões, a partilhar sua experiência de estrangeiro a viver noutro país. Pode parecer um exemplo tolo, mas para mim é esse tipo de pequeno gesto que nos torna melhores. Não é pelo ódio que encontramos os outros, só o amor pode, 129
verdadeiramente, nos salvar. E foi o que eu disse a minha querida amiga. Não se sinta dividida, não se sinta estrangeira no próprio país. Dê uma hipótese ao amor, pois o ódio já fez muito dano. E precisa ser extirpado para que as gerações futuras floresçam e para que possamos, com tudo o que infelizmente o amor não consegue resolver, dormir em paz com a nossa consciência. Porque escolhemos o lado humano da História. O que se compadece, o que chora os seus mortos. Frágil, cheio de imperfeições, mas também de esperança. Não sei se o que escrevo, e penso, pode consolá-la, mas a mim me conforta ouvir a palavra amor em vez de tornar a (d)escrever o ódio . ALGARVE INFORMATIVO #362
Sylvia Plath - Only let down the veil, the veil, the veil Adília César (Escritora) ma coisa sentada por baixo da mesa, sem se alongar no gesto do dia. Cai e não se levanta, fica assim em estátua sob o tampo de mármore. Dizes ser uma harmonia a cantar-me o tempo que agora parou, em teu redor, em meu redor, pontos finais como filhos de grãos de onde nascem as flores do sopro, irradiando para as margens lascadas da folha de papel. Pequenas sementes eclodidas pelas sucessivas leituras das pupilas, onde as pálpebras tombadas inventam a fala muda de não se falar de coisa alguma, nada. O silêncio com a palavra por baixo chora na tristeza de um vento por todos os lados; para cima fogem os olhos, mas não vêem. Há outros filhos de leite que também não têm companhia; outros hermafroditas. Dir-se-ia algo já fúnebre de tanta quietude. Dizes que eu sou a tua amada Sylvia. Isto de fazer poesia carece de fundamentos abonatórios e realistas, obedece a palavras escritas com erros, como sulidão; submete-se às alucinações quebradas nas letras, deusas de uma simplicidade indescritível e inexplicável; debaixo da mesa é o seu altar, onde as disponho sobre espaços em branco do meu corpo, enquanto tento perder de ALGARVE INFORMATIVO #362
vista a porta aberta do forno, esse olho magnânimo e assombroso. Paira o tempo sobre um trono antigo de fazer-me velha e cansada, um episódio francamente incomodativo de só. E se eu dançasse por estas voltas que fazem como se tudo me fosse um apenas erro ao longe, que me olha de longe, um apenas erro quase a tombar no acidente quando imagino a cabeça aberta pela música, sopros de erros na voz, palavras imaginadas, animais a galope que me fogem da garganta, letras em atropelo; a coisa sentada debaixo da mesa, surda e muda. Enquanto tu não chegas. E agora é a mesa que dança, a sulidão é um erro, a sulidão está tão cansada como a palavra que faz o gesto do seu nome, um sino pesado a querer levantar-se sozinho. O tempo a querer-se de uma cor de luz ilustre, clara, alva, tão linearmente límpida como a transparência química de uma lágrima, a imagem melancólica de um pássaro caído do ninho a fazer companhia a outro pássaro caído do bando. Enquanto os nossos filhos dormem e sonham; talvez vivos e também mortos. Mas a poesia não é uma questão de asas. Abro o coração, são agora dois, jorra o sangue debaixo do tampo de mármore, como raízes de uma flor acesa. É mais difícil dançar assim sobre o visco 130
vermelho que não é uma cor, parece uma fábula imperdoável, um outro sonho que só havia de vir quando eu já fosse muito velha, a boiar no rio do tempo, sem me alongar no gesto da noite. Mas esse sangue fala e constrói, empilha as palavras e as coisas, inventa uma noção poética fluida e carregada de sinais que ainda não é poesia. A consciência de tudo, a atmosfera metafórica, o trabalho lexical, a performance semântica, o forno tão aberto e convidativo. A cabeça deitada dentro do testamento destinado aos herdeiros que dormem no quarto ao lado desta pequena-grande tragédia. Apesar da pronúncia correcta nos sons oferecidos ao poema, o poeta é um erro colossal, não sabe quem é, não consegue aprender a coreografia das mãos que escrevem, ensaiada pelos deuses. Debaixo da mesa é o seu túmulo solitário de onde observa a dança perfeita dos outros, o caderno onde os demais erros se perpetuam numa linha contínua de hipóteses: sulidão, puema, fius de sangue. Sinais verdadeiros da morte que se morre de cada vez que os outros tentam escrever o poema perfeito, o tal poema que não consigo alcançar. A confissão que espreitas por cima do meu ombro, quando chegares. Only let down the veil, the veil, the veil, digo, my beloved Ted*. Junta-te a mim, está na hora de preenchermos os espaços 131
em branco de todos os corpos, de descobrir a pétala favorita da rima, a seiva do símbolo, o céu da proximidade discursiva. Está na hora de esconder os indícios das intenções fracassadas, de corrigir os erros de todas as traduções. My beloved Sylvia, dizes. E a respiração enfraquece no domínio do instante. Our solitude, so annoying and so hopeless . *Verso do poema Um Presente de Aniversário, de Sylvia Plath (1932-1963), in Ariel, Relógio D’Água (1966): Deixa somente cair o véu, o véu, o véu (tradução de Maria Fernanda Borges). ALGARVE INFORMATIVO #362
Dora Nunes Gago (Professora) “A literatura faz o mesmo que um fósforo aceso no campo, no meio da noite. Um fósforo não ilumina quase nada. Mas permite-nos ver quanta escuridão existe ao redor”. William Faulkner ançado no passado dia 21 de Outubro na Biblioteca do Palácio Galveias, em Lisboa, «Misericórdia» é a mais recente obra da escritora algarvia Lídia Jorge, uma das vozes mais singulares e proeminentes, não apenas no contexto
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da literatura portuguesa, mas também da europeia. Neste livro, guiados pela protagonista, Maria Alberta Amado ou Dona Alberti, entramos no Hotel Paraíso, Lar da Terceira Idade onde reside, convertido num microcosmos da nossa sociedade actual, marcada pela multiculturalidade, mas também pelas relações laborais frágeis, pela solidão, pela discriminação, pelos vários graus de respeito ou cuidado para com o Outro (sobretudo quando se encontra num estado de fragilidade extrema), por um quotidiano onde se extinguiu, por exemplo, a conexão tão importante com a natureza. E é pelas palavras de Dona Alberti, num romance a mesclar, harmoniosamente, diário, crónica, poesia, que mergulhamos na vida em múltiplas dimensões. Parte-se, por conseguinte, da perspectiva do confinamento num corpo que se deixa de comandar, ao qual se parece ter deixado de pertencer pois tal como refere: “aqui onde me encontro nenhum canto é meu, nenhum objecto me pertence, até mesmo o meu corpo não é mais um recanto privado da minha alma como antes era” (p. 70). Porém, a partir daí, há 132
todo um mundo, toda uma vida em interrelação com outras vidas que se abre, se expande através da sabedoria, de uma curiosidade perante o mundo circundante, de uma força indomável, da evocação das memórias, da memória: “Mas ainda assim, recorro à memória para sair destes muros e triunfar sobre o meu estado de reclusa” (p. 120); “Preencho a minha alma com as visitas sem fim que faço ao mundo que lembro como se de novo possuísse a Natureza que está longe. A tudo isto, eu, Maria Alberta Nunes Amado, designo por minha vida” (p. 121). Neste contexto, também a literatura, o poder da palavra emerge, por exemplo, no capítulo intitulado «a leitura», no qual um rapaz ligado a uma Associação lê para dona Alberti. O jovem que, no início, parece muito feio, lê um conto intitulado «Salve, professor Galvez» de Luís Sepúlveda (o nome do autor não é referido, mas percebemos a intertextualidade e a intenção de homenagear este escritor também vitimado pela COVID em 2021. Com efeito, este é um conto também de esperança, no âmago da infelicidade, pois “na sua leitura sobre desgraças nada era desgraçado, porque todas as palavras se encaminhavam para aquele momento em que o professor acorda e tem os dedos cobertos de pó de giz” (p. 43). Neste caso, após o acto de leitura, o jovem que era feio parece investido de beleza, pois “a sua voz tinha tido o poder de revelar a beleza escondida da figura do leitor” (p. 42). Aliás, a beleza, a par da sabedoria, do amor, da curiosidade, exerce um poder salvífico que transparece na obra. 133
Em suma, «Misericórdia» é uma daquelas obras do âmago das quais não regressamos como entrámos. Ela tem o dom de nos abalar, convulsionar, desconstruir estereótipos referentes à velhice, às vivências num Lar da Terceira Idade, ao modo como tantas vezes a beleza das pequenas coisas, a importância da compaixão, do respeito pelo outro são relegadas para segundo plano. Deste modo, nas entranhas da noite mais escura (e a noite é a entidade com quem a protagonista se debate constantemente), para além de um fósforo na escuridão (referido por Faulkner) este romance exerce plenamente o que Lídia Jorge, no discurso da abertura da Cátedra com o seu nome na Universidade de Genève, proferido a 15 de Setembro de 2021, designou como grande potencial da literatura: a abertura de «clareiras de luz». ALGARVE INFORMATIVO #362
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