de fevereiro, 2023 #376
BRÁS
E ALTURA
DIGITAL NOMADS»
UNIVERSIDADE DO ALGARVE ENTREGOU BOLSAS DE EXCELÊNCIA
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CARNAVAL DE LOULÉ, QUARTEIRA, SÃO
DE ALPORTEL
| ALCOOLÉMIA «RURAL
|
ÍNDICE
Universidade do Algarve entregou 95 Bolsas de Excelência (pág. 18)
Rural Digital Nomads (pág. 28)
Carnaval de Loulé (pág. 38)
Carnaval de Quarteira (pág. 64)
Carnaval de São Brás de Alportel (pág. 76)
Carnaval de Altura (pág. 88)
Alcoolémia no «Choque Frontal ao Vivo» (pág. 100)
OPINIÃO
Paulo Cunha (pág. 108)
Adília César (pág. 110)
Dora Gago (pág. 112)
Carlos Manso (pág. 114)
95 alunos da Universidade do Algarve receberam Bolsas de Excelência
Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina e Universidade do Algarve
11.ª edição das Bolsas de Excelência da Universidade do Algarve realizou-se no dia 15 de fevereiro, no «novo» Grande Auditório Caixa Geral de Depósitos, no Campus de Gambelas, tendo premiado um número record de 95 estudantes numa sessão pública que
contou com a presença do presidente da Comissão Executiva da Caixa Geral de Depósitos, Paulo Macedo. Desde a sua génese, no ano letivo 2012/13, a iniciativa já premiou 550 estudantes, num apoio total superior a 470 mil euros que pagam integralmente a propina do primeiro ano de Licenciatura e/ou Mestrado Integrado, fixada em 697 euros, tendo desta feita participado 54 empresas.
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Os estudantes colocados com a melhor classificação no respetivo curso, que ingressaram com uma nota de candidatura igual ou superior a 15 valores, foram seriados para atribuição de Bolsa de Excelência. Foram automaticamente selecionados todos os alunos que ingressaram na Universidade do Algarve através do Concurso Nacional de Acesso ao Ensino Superior, em primeira opção, com nota de candidatura igual ou superior a 17 valores. E, este ano, o apoio da Caixa Geral de Depósitos permitiu a atribuição de 15 Bolsas de Excelência, no valor global de 10 mil e 455 euros. “Do ponto de vista das empresas é muito importante atrair e apoiar as pessoas certas”,
começou por dizer Paulo Macedo, em nome dos empresários e das entidades envolvidas.
Recorrendo à expressão latina «alma mater», que significa mãe criadora ou mãe que alimenta, o presidente da Comissão Executiva da Caixa Geral de Depósitos garantiu que “daqui por uns anos, quando o vosso currículo começar a ter várias páginas –depois passará para muitas páginas – já poderão escrever, com orgulho, «alma mater:
Universidade do Algarve», e vão-se recordar sempre, estou certo, do lema «estudar onde é bom viver»”
Já sobre a colaboração da Caixa Geral de Depósitos com a Universidade do
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Algarve, Paulo Macedo assumiu que “este envolvimento de uma instituição como a nossa – um banco – com uma instituição como a vossa – uma Universidade – énos essencial”.
Recorde-se que a Caixa Geral de Depósitos é o banco que há mais tempo apoia o Ensino Superior em Portugal, 28 anos de uma presença que pretendem manter. “Em 2021 investimos no Ensino Superior 7 milhões e 600 mil euros. Temos uma quota de 50 por cento da população académica portuguesa, contamos com 188 mil clientes universitários”, indicou Paulo Macedo, para quem as bolsas de excelência representam “a justiça e o mérito de quem lutou por um objetivo e, não só o conseguiu, mas também se superou, atingindo a excelência”.
Em relação à dinâmica da Universidade do Algarve, Paulo Macedo constatou que acompanha a realidade de um mundo em mudança. “Uma universidade com espírito nacional, a que se soma o ambiente internacional que aqui se respira. São cerca de dois mil alunos de 80 nacionalidades. Umas
sociedade mais desenvolvida, equitativa e inclusiva, onde cada um de vocês fará a diferença, na certeza de terem em comum a ambição, a curiosidade, a vontade de aprender e de vencer os desafios do dia a dia. Vocês personificam o mérito, o esforço e a resiliência de uma geração que reconhece que a educação e o conhecimento são o seu valor e futuro. Por detrás de vocês estão
, descreveu o presidente da Comissão Executiva da Caixa Geral de Depósitos, acrescentando ainda: “Estou certo da participação de todos os premiados na construção de uma
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«Nações Unidas» em ambiente jovem, à beira da Ria Formosa”
as famílias, os amigos e os professores, e está esta nossa Universidade do Algarve, que dá corpo e solidez a todo este esforço”, concluiu Paulo Macedo.
João Ricardo foi um dos estudantes contemplados com uma Bolsa de Excelência, tendo escolhido, com 19,16 valores, Gestão de Empresas em primeira opção na Faculdade de Economia da Universidade do Algarve. “A atribuição das bolsas de excelência pela
Universidade do Algarve, além de representar a mais calorosa receção aos novos alunos, é reflexo do prestígio, da honra e dos valores desta casa”, afirma João Ricardo, em representação dos alunos. Para o novo estudante da Universidade do Algarve, “premiar o mérito e a excelência figura com uma das mais nobres qualidades humanas, assente na capacidade de reconhecer o esforço
intransigente, o trabalho honesto e a concretização de um objetivo”. “Só assim somos capazes de construir gerações empenhadas, com vontade de procurarem o sucesso. E não haverá maior porta de entrada para uma geração faminta de conhecimento do que esta valorização por parte daquela que será a sua casa por pelo menos três anos”.
No que toca à escolha da universidade, João Ricardo, considera que a Universidade do Algarve faculta um ensino de qualidade e um espaço de excelentes práticas científicas e pedagógicas. Além disso, defende ainda que oferece algo que mais nenhuma universidade pode oferecer: “Uma
excelente qualidade de vida, um tempo maravilhoso, oferece-nos um paraíso. Parece-me a conjugação perfeita de motivos para justificar a escolha desta Universidade”.
A sessão terminou com o discurso do reitor Paulo Águas, que felicitou os familiares e amigos dos alunos premiados, agradecendo publicamente o trabalho desenvolvido pelos professores, desde o ensino básico, ao ensino. “A Universidade do Algarve é um parceiro de todos os agentes educativos. Trabalhamos para isso”, declarou, aproveitando a ocasião para agradecer às empresas que desde a primeira edição apoiaram este projeto, e às que, entretanto, se foram juntando, permitindo que, pelo 11.º ano
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consecutivo, tenha sido possível a entrega das bolsas de excelência. “É um sinal que acreditam nos jovens, que acreditam no futuro”, frisou.
Dirigindo-se a Paulo Macedo, o reitor da Universidade do Algarve destacou ainda a assinatura da terceira renovação de um protocolo firmado entre as duas instituições em 2010, “o qual tem um impacto muito significativo no apoio que proporciona à formação dos nossos estudantes, mas as nossas parcerias remontam a 1995”. Quanto aos estudantes, Paulo Águas assegurou-lhes que fizeram a escolha certa ao dar continuidade aos estudos e à formação. “Vivemos numa sociedade do conhecimento e só
através dele é que conseguiremos construir uma sociedade mais justa, mais inclusiva, mais solidária. É também o conhecimento que nos possibilitará o aumento dos níveis de bem-estar, individuais e coletivos, respeitando o planeta”, avisou o reitor, que apelou ainda à participação ativa na vida académica. A finalizar, Paulo Águas centrou-se na importância de a Universidade contribuir para o cimentar de um conjunto de princípios que deverão acompanhar os estudantes ao longo das suas vidas:
“Integridade, Solidariedade, Humanismo, Busca pela Excelência, Sentido Crítico, Inconformismo” .
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Rural Digital Nomads nasceu no interior do concelho de Loulé, mas quer crescer para o resto do Algarve… e não só
Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina e Bernardo Lúcio - Photography
oi apresentada, no dia 11 de fevereiro, na Escola Profissional Cândido Guerreiro, em Alte, a Rural Digital Nomads, uma plataforma digital para empreendedores que procuram regiões do interior e que atua promovendo o território, através da
criação de conteúdos e eventos sobre as suas potencialidades. O projeto é da responsabilidade de Fábio Jesuíno, com longa experiência profissional nas áreas de marketing e empreendedorismo digital, e tem beneficiado do programa de incubação da QRIAR – Incubadora Criativa do Algarve, dinamizada pela QRER – Cooperativa para o
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Desenvolvimento dos Territórios de Baixa Densidade, no âmbito do projeto Magallanes_ICC.
O Algarve não é só litoral, como bem sabemos, há muitas riquezas para se desfrutar no interior, mas a verdade é que ele está cada vez mais desertificado, observa o alentejano de Mértola que há cinco anos rumou a Loulé, daí ter avançado para a criação desta comunidade de nómadas digitais no interior deste concelho. “Estamos a falar de jovens que trabalham online para grandes multinacionais e que auferem vencimentos acima da média, o que lhes confere um bom poder de compra, e normalmente não se fixam muito
tempo num sítio. Trabalham ao mesmo tempo que fazem turismo e interagem bastante com as populações locais”, explica Fábio Jesuíno, aproveitando para dissipar alguma confusão que possa existir entre os nómadas digitais e quem faz teletrabalho. “Durante a pandemia muitas pessoas foram forçadas a passar pela experiência do teletrabalho e a verdade é que, por gostarem dessa rotina, continuaram a fazê-lo, mas nas suas próprias casas. O nómada digital trabalha em vários locais, nacional ou internacionalmente, anda sempre com a «casa» às costas. Já existem muitos em
Portugal, daí querermos criar uma comunidade que os ajude a escolher os melhores espaços de coworking que existem em cada local, para além dos alojamentos que sirvam as suas necessidades”, aponta o entrevistado.
Nómadas que podem ajudar, então, a aumentar as taxas de ocupação de hotéis, pensões, alojamentos locais ou turismos rurais do interior do Algarve durante a época baixa, para além das despesas que fazem na restauração e comércio local, isto ao longo de várias semanas ou meses, antes de arrumarem a mochila e partirem para outro destino. “São temporadas que podem ir dos 15 dias aos seis meses, às vezes depende dos projetos em que
estão envolvidos e, em 2021, existiam cerca de 35 milhões de nómadas digitais em todo o mundo, que movimentaram mais de 700 mil milhões de euros, de acordo com estudos
internacionais”, indica Fábio Jesuíno, pelo que se percebe rapidamente que não se trata do antigo «turista de pé descalço» que andava um pouco à deriva pela região e sem grandes posses financeiras. “A maioria trabalha na área da tecnologia, estavam habituados a passar o dia enfiados em gabinetes ou em cubículos, e agora querem viver experiências diferentes. Para além disso, têm um estilo de vida sustentável, aqueles que chegam do norte da Europa adoram, por exemplo,
andar de bicicleta, e dão sempre primazia aos produtos locais”.
Parece, por isso, um turista bastante apetecível e ideal para atenuar a sazonalidade do Algarve, mas, para que tudo isto seja possível, há uma condição imprescindível, o fácil acesso a internet de alta velocidade e estável. “Esse é, de facto, um dos principais problemas com que nos temos deparado ao longo deste ano de trabalho. Felizmente que a Autarquia de Loulé está a apostar forte na conetividade digital no interior do concelho e tem um contrato com uma operadora de telecomunicações que está a instalar antenas de 4G e 5G. Em
Benafim já há 5G, em Alte 4G, e tudo isto está a fomentar a concorrência, ou seja, há mais operadoras a avançar com a internet e redes móveis para o interior do concelho de Loulé. Para além disso, existe a comunicação por satélite com acesso ilimitado à internet a preços razoáveis e com velocidades consideráveis, mesmo em locais onde não há rede fixa ou móvel”, refere Fábio Jesuíno.
É difícil resistir ao interior
Na prática, a Rural Digital Nomads vai ter um diretório para os empresários e estabelecimentos comerciais darem a conhecer os seus produtos aos nómadas
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digitais, vão ser criados conteúdos para divulgar as potencialidades do interior do Algarve, a começar pelo concelho de Loulé, assim como eventos especialmente direcionados para estes turistas especiais para que possam desfrutar das tradições locais. “Vai existir também uma comunidade
digital dentro da plataforma onde os membros podem interagir, fazer e responder a perguntar, partilhar as suas experiências. E queremos ajudar a divulgar alguns eventos locais que, por vezes, não têm o devido impacto mediático”, adianta Fábio Jesuíno.
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O primeiro ano de projeto já passou, dedicado à conceção e consolidação do conceito e à criação de toda a componente tecnológica da plataforma, que é complexa, já estão também disponíveis alguns conteúdos, eventos e artigos de opinião, e o diretório está aberto para todos os interessados, e de
forma gratuita. Para sustentar tudo isto existem os patrocínios, já que é muito difícil cobrar-se uma verba aos nómadas digitais para usufruírem deste serviço, a par das verbas que vieram do Magallanes_ICC. “A nossa ideia de negócio foi incubada na QRIAR da QRER, temos o apoio financeiro e logístico da Câmara Municipal de Loulé, e parcerias com a Escola Profissional de Alte, as Juntas de Freguesia de Alte, Ameixial, Salir e com a União de Freguesias de Tôr/Benafim/Querença. Neste momento estamos fixos no interior do concelho de Loulé, mas o objetivo é expandir e já temos vários interessados. A plataforma está a despertar bastante frenesim, mas é um passo de cada vez”, declara o entrevistado.
Fábio Jesuíno mostra-se, por isso, convicto de que o fenómeno dos nómadas digitais veio para ficar e os dados, nacionais e internacionais, parecem confirmar esta opinião. “Antes de criarmos a plataforma fizemos um estudo exaustivo sobre a matéria, não valia a pena avançarmos com o projeto se estivéssemos perante uma moda passageira. Nota-se um crescimento à escala global e, nos próximos cinco anos, é natural que o número de nómadas digitais passe para 60 ou 70 milhões. Só nos Estados Unidos da América já são 11 milhões, porque as
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empresas tecnológicas são cada vez mais fortes e com maior empregabilidade. Para além disso, é um estilo de vida que atrai bastante as novas gerações. Antigamente, as pessoas queriam comprar uma casa e um bom carro e ficavam o resto das suas vidas no mesmo sítio. Hoje, muitos jovens têm outras prioridades”, frisa.
A terminar, quais são as mais-valias do Algarve para ser bem-sucedido neste nicho de mercado, questionamos. “Todo o interior de Portugal é único e diferente do resto da Europa e do Mundo e tem muitas potencialidades. Uma das principais vantagens dos
portugueses é que sabem receber e, no interior, ainda o fazem de forma mais amigável, praticamente abrem a porta das suas casas aos visitantes”, responde Fábio Jesuíno, não esquecendo ainda as tradições, as festas populares, a qualidade de vida, o sol, o bom tempo que existe na maior parte do ano e a segurança. “Somos também um país pequeno, num instante se vai do interior ao litoral, de uma aldeia pequena a uma grande cidade, e temos o Aeroporto Internacional de Faro a poucos quilómetros de distância. Tem tudo para funcionar e a prova disso é que estamos a receber na plataforma visitantes de todas as partes do mundo” .
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80 mil foliões festejaram o Carnaval de Loulé com muita criatividade e boa disposição
Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina
oi um regresso em pleno, com muita animação, cor, ritmo, samba, sol e uma moldura humana incrível. O Carnaval de Loulé 2023 saiu novamente à rua, nos dias 19, 20 e 21 de fevereiro, atraindo à capital carnavalesca do sul do país cerca de 80 mil visitantes durante três dias de imensa folia. “Estamos muito satisfeitos e o balanço é francamente positivo. Tivemos a Avenida José da Costa Mealha
cheia, naquela que foi talvez das melhores edições de sempre. E não é para menos, foram dois anos sem desfile e todos nós já tínhamos saudades. Mas, a par da componente lúdica, queria destacar o fator económico: este foi um momento bastante importante para a economia local, tendo os visitantes desfrutado, tanto da restauração, do comércio, da hotelaria, como de outros negócios, alavancados nos
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últimos dias por este evento”, referiu Vítor Aleixo, presidente da Câmara Municipal de Loulé, entidade responsável pela organização do corso.
«Ó Zé… Já viste o Algarvensis?» foi a pergunta que deu corpo ao cortejo no qual 14 carros alegóricos, nove grupos de animação, três escolas de samba, gigantones e cabeçudos e mais de 600 animadores desfilaram nos três dias. O rei deste corso foi, então, o Metoposaurus algarvensis, um anfíbio extinto semelhante a uma salamandra gigante que viveu há 227 milhões de anos e que serviu de base a esta candidatura a geoparque. No centro encontra-se o geossítio da Penina, onde se deu o achado paleontológico que inspirou este projeto intermunicipal que tem como um dos seus principais objetivos a
dinamização deste território, com um património geológico de grande relevo para contrariar a desertificação do interior da região.
Nos três dias de entrudo, a ideia foi fazer deste assunto uma paródia e transportar para um evento fortemente enraizado na vida louletana, cartaz turístico de excelência, um projeto que marcará o futuro, não só de Loulé, Silves e Albufeira, mas de toda a região e do próprio país. Tal como nos anos anteriores, a sátira política, social ou desportiva voltou a estar presente no desfile e os assuntos que têm sido notícias nos últimos meses e os seus protagonistas foram magistralmente retratados. A crise socioeconómica que está a afetar a vida do «Zé Povinho», as mexidas no Ministério da Saúde com a
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saída de Marta Temido e entrada de Manuel Pizarro ou o empenho de Portugal na neutralidade carbónica, com o Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa a surgir ao lado da ativista Greta Thunberg num pequeno barco a limpar a costa portuguesa, numa pescaria aos plásticos, foram alguns dos episódios em destaque.
Mas não é só da atualidade portuguesa que se faz o Carnaval de Loulé, pelo que os grandes temas do mundo marcaram igualmente presença no «sambódromo louletano». A guerra da Ucrânia, naturalmente, com Zelensky e Putin como tripulantes de um carro decorado com cereais, a disputa entre os «dinossauros» Lula e Bolsonaro, este
último a ser pontapeado da cadeira do poder, ou os novos governantes britânicos, Charles III e Rishi Sunak, deram vida aos carros alegóricos, onde imperou a qualidade artística da sua execução. Destaque ainda para as 10 associações sociais, desportivas e recreativas do concelho que se juntaram ao desfile, numa iniciativa de forte envolvimento da comunidade, mantendo vivo um evento que faz parte da própria essência de todos os louletanos. Foram elas a Existir, JS Campinense, Algarve Gym, GD Barreiras Brancas, As Tradições de Loulé, Motoclube de Loulé, Associação Satori, TUALLE – Tuna Universitária Afonsina de Loulé, AGAL –Associação Grupo dos Amigos de Loulé e Associação Fénix .
Festa do Carnaval voltou a Quarteira
Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina uarteira voltou a encher-se de alegria, música e animação nos dias 18, 19 e 21 de fevereiro, para receber o Carnaval este ano com o tema «Natureza em Festa». Foram três dias de desfile numa Avenida Infante de Sagres repleta de gente e com a praia como pano de fundo.
A preservação da natureza, por um planeta melhor, foi o mote para esta grande festa, com nove carros alegóricos, cinco grupos carnavalescos, três pontos
de exibição, música, cor e muita animação à mistura. Antes disso, houve lugar à festa da pequenada, no dia 17 de fevereiro, com o corso infantil sobre o mesmo tema que contou com a participação dos alunos das escolas e IPSS da freguesia. Depois, no dia 22 de fevereiro, assistiu-se ao Enterro do Entrudo, uma tradição quarteirense nascida há quase três décadas e que envolve a comunidade local.
O Carnaval de Quarteira foi uma organização da Junta de Freguesia de Quarteira com o apoio da Câmara Municipal de Loulé .
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São Brás de Alportel viveu tradicional «Farra» Carnavalesca
Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina
oa disposição, criatividade, tradição e originalidade foram os ingredientes do Entrudo Algarvio que se viveu mais uma vez em São Brás de Alportel, abrilhantado com o empenho dos são-brasenses e das suas associações. A edição carnavalesca sãobrasense arrancou, na manhã do dia 17, com o Desfile de Carnaval das Crianças, preparado por centenas de crianças e educadores das escolas do concelho, que encheram de boa disposição e brincadeira a Avenida da Liberdade. No
sábado à tarde, os mais novos foram convidados a criar as suas máscaras de Carnaval no ateliê criativo «A Crescer e a Aprender», na Biblioteca Municipal Dr. Estanco Louro.
O domingo de Carnaval começou com a mais divertida Marcha-Corrida do ano, que nesta edição convidou a conhecer a zona serrana, tendo início no Miradouro da Ameixeira. A manhã foi também de folia numa edição especial de Carnaval, no Mercadinho de Jardim, com produtores e artesãos, no Jardim Carrera Viegas, onde uma divertida oficina de máscaras de Carnaval aguardou pelas
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crianças e suas famílias. Ainda durante a manhã de domingo, as crianças participaram no «Carnavalar na Natureza», no âmbito da iniciativa «São Brás para as crianças» que o Ninho de Amor dinamizou no Parque das Amendoeiras.
A tarde esteve reservada para o tradicional Desfile de Foliões e de Carros Alegóricos que saiu à rua na Avenida da Liberdade, transformada neste dia em «Avenida do Carnaval» são-brasense. A defesa das tradições do Entrudo renasce todos os anos neste Carnaval tipicamente português, num apelo à folia e à criatividade, com animação popular com uma pitada de brejeirice e recheio de sátira política e social como ingredientes que aguçam a imaginação dos participantes que se apresentam com disfarces, adereços, coreografias e carros
alegóricos que brilham e convidam à brincadeira.
A iniciativa é promovida pelo Município de São Brás de Alportel, com o apoio das associações locais e grupos informais. Com este objetivo, e para estimular a participação da comunidade, a Câmara Municipal atribui um apoio monetário às associações participantes que pretende ajudar a custear as despesas com a concretização dos carros e dos trajes. Entretanto, houve também bailes e concursos de máscaras na sede do Futebol Clube da Cabeça do Velho, no Museu do Traje e no ZD Disco Club. O programa de Carnaval de São Brás de Alportel encerrou na Terça-Feira de Carnaval com o tradicional Chá Dançante especial de Carnaval que a Junta de Freguesia promove no Pavilhão Municipal.
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Vencedor do Big Brother foi o Rei do Carnaval de Altura
Texto: Daniel Pina| Fotografia: Município de Castro Marim
Carnaval de Altura 2023 voltou a fazer-se conhecer como o cortejo mais autêntico do sotavento
algarvio, num regresso marcado pela grande afluência de visitantes e pela enorme criatividade que cada um dos foliões entregou ao evento. Muita cor, criatividade e recurso ao fantástico, inspirados pelo tema central que era o Cinema, foi assim que as dezenas de foliões se apresentaram ao público nos dias 18 e 19 de fevereiro, em dois desfiles
que contaram com a especial, efusiva e genuína participação do vencedor da última edição do Big Brother, Miguel Vicente.
O Carnaval de Altura assenta no esforço e o empenho de toda a população e associativismo local, o que se traduz num evento diferenciado, com brilho próprio e muita autenticidade. Esta tem sido a linha matriz deste evento, que cresce de ano para ano, e que teve agora a maior afluência de sempre, com as bancadas da avenida completamente lotadas. Foram nove carros alegóricos e 11 grupos de
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animação, que representaram as Juntas de Freguesia de Altura e Castro Marim, o grupo de Amigos do Bairro Quente, Grupo de Zumba, Amigos da Arrancada, Grupo de Amigos de Altura, Clube Recreativo Alturense – grupo de dança
ARUTLA, Associação Amendoeiras em Flor e Casa do Povo do Azinhal, a Associação Cegonha Branca e o Centro de Cultura e Desporto da Câmara Municipal de Castro Marim.
A 20.ª edição do Carnaval de Altura foi
uma organização da Junta de Freguesia de Altura e do Município de Castro Marim, com o apoio do Supermercado Corvo e a colaboração das associações e comércios locais. A organização endereça ainda um especial reconhecimento à segurança do evento, à GNR, aos Bombeiros Voluntários de Vila Real de Santo António e Castro Marim e a todos os funcionários do Município de Castro Marim, sem os quais não seria possível o sucesso deste evento .
ALCOOLÉMIA ESGOTARAM
TEATRO MUNICIPAL DE PORTIMÃO EM MAIS UM «CHOQUE FRONTAL AO VIVO»
Texto: Daniel Pina| Fotografia: Vera Lisa
s Alcoolémia festejaram, em 2022, 30 anos de uma carreira
durante a qual lançaram seis álbuns, venderam milhares de discos e deram mais de mil concertos, o que os torna uma das referências do rock cantado em português. Não admira, por isso, que os bilhetes para mais uma sessão do «Choque Frontal ao Vivo», para o dia 16
de fevereiro, no TEMPO – Teatro Municipal de Portimão, tenham esgotado num ápice.
O programa de rádio gravado ao vivo, da responsabilidade de Ricardo Coelho e Júlio Ferreira, da Alvor FM, já se tornou uma referência deste equipamento cultural e a noite informal com os Alcoolémia, com muita música e conversa à mistura, foi mais um excelente exemplo desta fórmula de sucesso .
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alvez por lecionar Educação Musical a alunos numa fase etária entre os dez e os quinze anos, recordo o que pensava e como agia quando tinha a sua idade. Daí, muitas vezes, lembrar as minhas reflexões familiares e posições coletivas nos anos posteriores ao 25 de abril de 1974. Tentando fazer o paralelo sobre a forma como eu então opinava e hoje os atuais alunos o fazem, dou por mim a dar-lhes tempo para falarem do que lhes mais aprouver. E o mais interessante é que, por vezes, me surpreendem pela positiva.
Tendo o pipo (válvula de regulação) da panela de pressão em que se transformou o Ensino começado a girar e a apitar, dando à sociedade portuguesa o sinal de que os operários da Educação, após tantos anos a serem ignorados e vilipendiados, atingiram já o seu limite da tolerância e da paciência, não há órgão de comunicação social que não veicule as opiniões dos funcionários escolares, ministério da tutela, associações de pais, encarregados de educação e comentadores de serviço. Mas o que referir em relação à opinião dos alunos… Quem é que lhes dá, em última instância, o direito à palavra? Obviamente, não será por serem demasiado novos que não
terão opinião, sendo eles os principais visados!
Na última semana, roubando um pouco de tempo às aulas, resolvi questionar se algum dos meus cerca de duzentos alunos tinha alguma opinião sobre as greves dos funcionários da Educação que ultimamente têm vivenciado. Referi-lhes que não iria comentar nem avaliar as suas opiniões, pois o único intuito da minha questão era saber se já tinham pensado no assunto e se, sobre o mesmo, tinham alguma opinião. Fundamentando e consubstanciando a minha questão, referi-lhes a importância de questionar, debater e refletir sobres os assuntos que dizem respeito à sociedade onde vivemos, pois isso é exercer a cidadania que a democracia nos proporciona.
Confesso que fiz algum esforço para manter o meu semblante neutro e inalterável depois de ouvir algumas «pérolas» do género: “É fixe a escola fechar, pois assim podemos conviver mais uns com os outros… sem adultos por perto”; “Independentemente das greves, os contínuos (auxiliares de ação educativa) e os professores deviam faltar mais. É bom termos mais oportunidades e tempo para curtir uns com os outros”; “Os professores e os restantes funcionários fazem bem em faltar, pois
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A importância de estimular a livre opinião e o sentido crítico
Paulo Cunha (Professor)
precisam de descansar… principalmente de nós!”. A sinceridade, acima de tudo, sempre!
Sendo alunos do segundo e terceiro ciclos de escolaridade, naturalmente, esperava mais participação e intervenção por parte dos mesmos em relação a um assunto que lhes diz diretamente respeito. Não escondo que fiquei um pouco surpreendido e desiludido por, apenas, cerca de um terço manifestarem uma opinião, fosse ela qual fosse. Como seria de esperar, alguns reproduziram as
apreciações ouvidas nas suas casas, refletindo a natural preocupação pelo atraso provocado por «tantas greves» na aprendizagem dos conteúdos letivos programados para o seu ano escolar. Tendo em conta a quantidade de alunos que me questionaram a razão de ser das constantes greves dos funcionários educativos a que eles e as suas famílias têm sido sujeitos, facilmente entendi a sua diminuta solidariedade com uma «luta» que, apesar dos pesares, não conhecem. Aliás, como será possível compreender algo que não se conhece a origem?!
Por isso, muito profissionais continuam e continuarão a ser sempre os «maus da fita», sempre que, lutando pelos seus direitos, colocam os direitos dos outros em causa. Enquanto não conseguirmos colocarmonos na pele dos outros e entendermos que todo o efeito surgiu em função de uma causa - várias vezes, digna, respeitável e válida -, atribuiremos a quem não merece o ónus do nosso prejuízo imediato.
Talvez por ser pai e já ter sido professor da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento pense que é importante os nossos alunos raciocinarem e opinarem. E porque tudo na vida tem uma razão de ser, cada vez mais, acredito nos seres com razão! .
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Foto: Daniel Santos
Alda Lara:
A eternidade dura apenas um instante
Adília César (Escritora)
“Ah! Vida que eu apeteci Estreitar nos braços, De encontro ao peito, E que perdi…
A!... Vida que eu não vivi!...”
Alda Lara, in Poemas (1984)*
lda Ferreira Pires Barreto de Lara e Albuquerque (1930 – 1962) foi uma poetisa conhecida como Alda Lara, com colaboração dispersa em vários jornais de Portugal, Angola e Moçambique. Nasceu em Benguela, na então colónia portuguesa de Angola, no seio de uma família de comerciantes considerada como branca, de acordo com o sistema racial colonial. Foi casada com o escritor Orlando de Albuquerque, de quem teve quatro filhos, alguns dos quais envolvidos, posteriormente, na Luta de Libertação Nacional.
A sua obra de poesia, encontrada através de intensa procura nos seus papéis pessoais, foi publicada, postumamente, pelo marido, que tão bem revela o que lhe parece mais importante relativamente ao espírito da escritora: “A sua poesia caracteriza-se por uma intensa angolanidade implícita e, sobretudo, por um extremo amor e
carinho, quase ternura, pelos outros. Ternura de menina-mulher, que sofria com os sofrimentos alheios, que vibrava com as desgraças da sua terra – Angola –e com as infelicidades dos seus filhos, que eram todos quantos sofriam”**.
Alda Lara expressava-se através de um estilo rico e fluente, e era uma declamadora de notáveis recursos, tendo divulgado a poesia negra que quase ninguém conhecia na época, em numerosos recitais em Lisboa e Coimbra, onde estudou medicina. Ela ficou vinculada à Geração Mensagem, percebendo-se na sua poesia o exílio, a saudade da sua terra natal e dos lugares da infância; foi sempre notória a vontade de intervir no futuro como mensageira da sociedade civil, através da sua poesia, onde se percebia uma intervenção política implícita, embora do foro sentimental. Nesses poemas, percebe-se o “contexto histórico em que viveu, com assuntos sobre a sua infância; sua identidade nacional e racial; a vida como angolana no exílio em Portugal; seus desejos como mulher, mãe e cidadã;
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dificuldades da vida diária sob o colonialismo; ambições emocionais; alegrias e prazeres simples da vida”***.
Não há poetas felizes. Também a vida de Alda Lara foi preenchida por sacrifícios, renúncias, muito trabalho e pouco tempo livre. E, todavia, os seus poemas trazem-nos não mensagens de desespero, mas sim anúncios de esperança. Uma mulher confiante, ao serviço da humanidade. Tudo era razão para tomar uma atitude, uma forma intensa de cumprir os seus deveres para com o outro. E, todavia, a solidão andava por perto.
Todas as mãos se estenderam, Nenhuma se me estreitou.
Todas as bocas disseram, Nenhuma se me calou.
Todas as cruzes se ergueram, nenhuma crucificou.
Todas as vidas viveram, E a minha vida ficou…
A vida é uma ronda, uma dança, uma viagem. Alda Lara viveu durante um instante. Poetisa, ensaísta, médica, ativista política. Mulher. Mas o que se sabe sobre a sua vida vem dos seus poemas, que leremos com a mesma convicção com que ela os escreveu, num contexto em que tomavam forma os movimentos de libertação na África Portuguesa. Desconhecemos qual a influência da sua poesia na literatura revolucionária angolana, mas não há dúvida que a escrita poética de Alda Lara se constituiu como instrumento de
desenvolvimento intelectual e conhecimento de si.
Faleceu em Cambambe, com apenas 32 anos, devido a complicações médicas desconhecidas. Em reconhecimento pelo seu trabalho, a Câmara Municipal de Sá Bandeira instituiu o Prémio Alda Lara para Poesia.
Ler Alda Lara é fazer justiça ao instante que durou a sua vida. Ternura e coragem são exigidas nesta viagem literária .
* In Poemas (1984, Editora Vertente, obra póstuma)
** Nota editorial à obra Poemas (Poemas (1984, Editora Vertente, obra póstuma), redigida por Orlando de Albuquerque.
*** In Biografias de Mulheres Africanas (site: https://www.ufrgs.br/africanas/alda-lara-19301962/)
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Dora Gago (Professora)
ecordo uma canção da banda Xutos e Pontapés, já com uns bons anos, intitulada «voar» que começa assim: “Eu queria ser astronauta/o meu país não deixou”. Com efeito, sobre esta questão poder-se-ia dissertar longamente, contemplando o modo como as sociedades limitam as liberdades individuais, encarregando-se de destruir os sonhos, de os arrancar, por vezes, pela raiz. Isto não é surpresa nem novidade nenhuma, pois de um modo ou de outro, já todos o sentimos na pele, cada um ao seu modo particular. Contudo, há um outro nível, aquele em que os tentáculos da burocracia nos bloqueiam ou sugam a um outro nível mais elementar, mais básico, o do quotidiano, das escolhas da forma de viver, de nos relacionarmos com os outros.
Sem dúvida, em Portugal, seria possível encontrar muita matéria para expor e discutir sobre este tema. Todavia, regresso novamente a Macau, onde nos últimos anos me deparei com alguns episódios sui generis. É que, quando a burocracia portuguesa se mescla com a chinesa, usufruindo ainda do tempero da desconfiança, da suspeita, o resultado é único. E neste caso, refiro episódios que presenciei de portugueses, no percurso exigido para a obtenção do BIR, o cartão de residente de Macau. Neste contexto, as situações foram as mais diversas: uma
colega que, por ser divorciada e não se encontrar munida da correspondente certidão de divórcio ficou inscrita com o estado civil de «indefinido» – aquele cúmulo da indecisão, culminando em não se saber se se é solteira, viúva, casada ou divorciada. Porém, o mais caricato é que, naquela terra, não são apenas as certidões de nascimento ou de divórcio que perdem a validade, pois até com as de óbito pode suceder o mesmo…
Contudo, um caso verdadeiramente curioso é o modo como são abordadas as uniões de facto, no que toca aos pedidos para obtenção do BIR. Assim, um dos documentos essenciais a entregar é uma «declaração de não casados» que deve ser solicitada num cartório notarial. E isto é extraordinário por todas as hipóteses que abre, pois mesmo que sejamos casados com uma pessoa, somos não casados com o resto do mundo, exceptuando o que sucede em sociedades poligâmicas.
Inevitavelmente, este facto lembra-me sempre a conhecida anedota de um casal de meia-idade com mais de vinte anos de namoro. Um dia, ele enche-se de coragem e pergunta-lhe: “Olha lá, Maria, não achas que devíamos casar?”. Responde ela: “Acho que sim, Manel, mas com esta idade, será que alguém ainda quer casar com a gente?”.
Regressando ao ponto principal: essa «declaração de não casamento» é entregue nos serviços de emigração, aos quais o «casal não casado» se deve dirigir na
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Das uniões de facto aos tentáculos burocráticos
presença de duas testemunhas, cuja função é prestar declarações comprovativas de que eles não são mesmo casados, mas que vivem juntos e se conhecem há mais de dois anos (isso é o elemento fulcral, a questão do tempo, não pode ser mais, nem menos). Convém ainda frisar que o facto de haver filhos em comum não constitui prova de que eles se conheçam. Por outras palavras, o sentido bíblico do verbo «conhecer» esvazia-se de significado. Num dos casos em que testemunhei, havia dois filhos de oito e quatro anos que não provavam nada. Até podiam, inclusive, ter sido concebidos in vitro, por inseminação artificial, encomendados a uma cegonha vinda de Paris, ou, de forma mais moderna, através uma aplicação no Taobao ou no Aliexpress. Por conseguinte, por vezes, além das declarações das testemunhas, os Serviços de Imigração ainda podem solicitar aos membros do casal que descrevam, em documentos separados, sem trocarem impressões, as suas «histórias de amor» (que depois serão comparadas) ou responder a questões tão complexas como de que lado da cama cada um se deita…
Por seu turno, paralelamente a esta situação, emerge o modo pragmático como são encarados os casamentos. Um episódio emblemático foi o de uma doutoranda minha, oriunda da China continental, que, após o primeiro confinamento devido à pandemia, surgiu no meu gabinete de aliança cintilante no dedo. Perguntei-lhe se tinha casado, felicitei-a. Respondeu, sorrindo: “Sabe, professora, houve um colega do liceu que me foi visitar, no início do Ano Novo Chinês. Entretanto, apareceu a pandemia, o lock down, ele já não conseguiu regressar à sua casa. Passaram uns dias, como os meus pais gostaram dele, já era tempo de eu casar, ele estava para ali, casámos”. Por outras palavras: o que se pode fazer com um visitante que fica confinado na nossa casa, a encalhar, assim tipo emplastro? Ora, pois, vamos dar-lhe alguma utilidade e casar com ele, obviamente! Claro que depois a jovem esposa regressou a Macau para prosseguir o doutoramento, enquanto o marido ficou na China, em casa da família dela, até porque, convenhamos, quem gostava mesmo do moço eram os pais. Portanto, lá ficaram, sendo felizes juntos.
A verdade é que, ao longo do tempo, vários amigos e conhecidos cederam ao matrimónio para evitar tanta burocracia: a saga das certidões, das testemunhas tem de repetir-se com alguma frequência até ser ultrapassada a barreira dos sete anos de residência no território. No entanto, houve sempre uma minoria que resistiu a esses «tufões burocráticos», permanecendo fiéis aos seus princípios. Mesmo assim, os Xutos e Pontapés, se passassem por Macau, podiam forjar uma nova letra, mais pragmática, inspirada nessa realidade: “Eu queria viver em união de facto/ a RAEM não deixou” .
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Falta-nos noção da realidade?
Carlos Manso (Economista e Membro da Direção Nacional da Ordem dos Economistas)
omeço pela conclusão para o caso de não terem paciência para ler o artigo até ao fim. Somos uma sociedade com falta de noção da realidade e onde essa falta de noção condiciona a resolução dos problemas e faz com que não tenhamos uma estratégia de desenvolvimento sustentável para o futuro.
Segundo o dicionário, a realidade é a característica ou particularidade do que é real (que apresenta existência verdadeira), que existe verdadeiramente, pode ser uma circunstância ou situação real. Do ponto de vista filosófico, a realidade é tudo o que se consegue perceber através da acuidade espiritual, sensorial, física e tecnológica.
Podíamos fazer imensos texto sobre o conceito de realidade para cada um de nós, mas a razão que me levou a escrever sobre este tema, restringe-se ao conceito de realidade social. A realidade social pode ser vista como uma construção simbólica desenvolvida por uma sociedade determinada, sendo diferente de sociedade para sociedade devido aos diversos fatores que a condicionam e a envolvem, sendo entendida pela generalidade das pessoas como as
condições de vida a quem um grupo de pessoas estão sujeitos.
Mas existe uma diferença entre a realidade objetiva, que existe independentemente do observador, e a realidade subjetiva, que é construída de acordo com a perspetiva individual. Sem querer aprofundar esta matéria, acreditase que numa sociedade com uma base organizacional boa e onde os seus membros desfrutem de um elevado bem estar, é uma sociedade que redistribui a sua riqueza de forma justa.
O inverso, a existência de sociedades que vivem em precariedade por conta da divisão desigual das suas riquezas criam um fosso social entre os seus membros, criando assim duas realidades sociais distintas. O problema está na perceção dessa realidade e nas diversas forças cujos interesses que defendem pretendem que essa perceção não seja reconhecida pelos membros dessa sociedade e, se possível, defendem estratégias e decisões que até são contrárias a uma redução desse fosso social e porventura à melhoria do bemestar social.
Nos agentes que condicionam essa perceção da realidade, podemos encontrar os meios de comunicação social massificados nacionais e mesmo os
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meios de comunicação social regionais e locais, fala-se cada vez mais da influência das redes sociais, a religião, a política e os políticos, entre muitos outros.
Uma das formas da nossa perceção da realidade estar mais perto da realidade em si, é o conhecimento (não é informação) e capacidade crítica bem informada por forma a que a nossa manipulação seja mais difícil de concretizar.
Todo este texto serve para concluir que durante muito tempo vivemos numa espécie de metaverso, que não sendo real (pelo menos por enquanto) fez com que a sociedade portuguesa (nacional e regional) estivesse distante da realidade, em diversos temas como a perda do poder de compra e respetivo empobrecimento da população, na crise da habitação, na crise no Serviço Nacional de Saúde, na crise da violência contra migrantes e, porque não, na violência em geral que tende a aumentar,
na crise da Igreja Católica com o casos de abuso sexual de menores, entre outras matérias.
Essa distorção da realidade não resolveu problema nenhum, nem permitiu encetar as discussões necessárias para a definição de uma estratégia de longo prazo que nos permita uma real melhoria de condições de vida para a nossa sociedade no futuro.
Muitas dúvidas e questões se colocam, como, por exemplo, as pessoas com responsabilidade ninguém sabia nem tinham noção do que estava a acontecer? Quem ganha, vai ganhar e ganhou com esta falta de noção da realidade? Resolvemos os problemas reais da nossa sociedade com esta estratégia? Qual a razão de não haver uma discussão séria sobre os vários temas?
Já agora alerto que nos próximos 20 anos vamos ter um problema sério de envelhecimento da população com todas as consequências que daí virão, já que se prevê que em 2050 vamos ser o quarto país mais envelhecido do Mundo. Pensem nisto .
Nota: Este artigo de opinião apenas reflete a opinião pessoal e técnica do Autor e não a opinião ou posição das entidades com quem colabora ou trabalha.
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