ALGARVE INFORMATIVO #255

Page 1

#255

ALGARVE INFORMATIVO Revista semanal - 4 de julho, 2020

HOTEL EUROPA APRESENTA «AGORA QUE NÃO PODEMOS ESTAR JUNTOS» RE-CRIATIVA REPÚBLICA 14 | 7 MARAVILHAS DA CULTURA POPULAR | TANGO EM OLHÃO «SAUDADE - BACK TO FADO» | FESTIVAL MED 2019 | «PRINCESAS DOS CORAÇÕES PERDIDOS» 1 ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

2


3

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

4


5

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

14 - Reabertura da fronteira entre Portugal e Espanha

22 - Re-Criativa República 14 ALGARVE INFORMATIVO #255

6


OPINIÃO 118 - Paulo Bernardo 120 - Mirian Tavares 122 - Ana Isabel Soares 124 - Vera Casaca 126 - Augusto Pessoa Lima 128 - Nuno Campos Inácio

66 - Princesas no Convento de S. José

106 - Tango em Olhão 92 - «Saudade - Back to Fado»

78 - Recordar o Festival MED

34 - 7 Maravilhas da Cultura Popular 7

52 - Hotel Europa apresenta «Agora que não podemos estar juntos» ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

8


9

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

10


11

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

12


13

ALGARVE INFORMATIVO #255


FRONTEIRA ENTRE O ALGARVE E A ANDALUZIA REABRIU EM CLIMA DE FESTA E ESPERANÇA Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina circulação na fronteira terrestre que liga o Algarve à Andaluzia foi retomada no dia 1 de julho, sensivelmente três meses após ter sido adotada a medida excecional e temporária de controlo nos pontos de passagem entre Portugal e Espanha, integrada no programa de combate à pandemia da covid-19. E, por se tratar de um momento importante, enquadrado na reabertura generalizada das fronteiras com o país vizinho, foi ALGARVE INFORMATIVO #255

organizado pela AMAL – Comunidade Intermunicipal do Algarve e pela RTA – Região de Turismo do Algarve, um encontro, no Posto de Turismo da Ponte Internacional do Guadiana, com representantes dos dois territórios. Na cerimónia marcaram presença António Pina, presidente da AMAL, João Fernandes, presidente do Turismo do Algarve, José Pacheco, vicepresidente da CCDR – Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve, Pedro Valadas, Diretor Regional de Agricultura e 14


António Pina

Pescas do Algarve, e o Coronel Pedro Oliveira, da Guarda Nacional Republicana. Do lado da comitiva espanhola estiveram Eduardo Serra Jorge, cônsul de Espanha no Algarve, Bella Verano Dominguez, Delegada do Governo da Junta de Andaluzia em Huelva, e Maria Angel Muriel Rodriguez, Delegada Territorial de Turismo e Regeneración, Justicia y Administración Local en Huelva. “Há

mais de 30 anos que nos habituamos a viver nestes dois territórios de uma forma tranquila, de tal forma que, às vezes, nem nos apercebíamos que existia uma fronteira entre dois países e duas regiões. O Algarve, a Andaluzia, a Província de Huelva, necessitam das suas fronteiras abertas para 15

continuarmos a viver e a desenvolver-nos em conjunto”, defendeu António Pina, esperando que Portugal e Espanha prossigam no caminho positivo no controlo da pandemia. Recorde-se que Espanha está no top 10 de mercados emissores de turistas para o Algarve, designadamente pela proximidade, tendo sido responsável por 1,13 milhões de dormidas em 2019 na região (+8,7 por cento do que em 2018), segundo o INE. “Para o

Turismo do Algarve é muito importante esta reabertura, não só pelo feliz reencontro entre os dois lados da fronteira, mas porque o mercado espanhol para Portugal tem vindo a crescer nos ALGARVE INFORMATIVO #255


João Fernandes

últimos anos e tem uma expressão significativa no que toca ao Algarve”, confirmou João Fernandes, lembrando que o mesmo sucede com os turistas portugueses no lado da Andaluzia. “Para além dos turistas, é

também muito importante esta reabertura para os visitantes, para aqueles que, não pernoitando no território, têm o hábito de ir comer umas tapas à Andaluzia ou vir comer uma cataplana ao Algarve. Do mesmo modo, muitos espanhóis rumam à Costa Vicentina para praticar surf. E há também cada vez mais residentes no Algarve de nacionalidade espanhola, atualmente mais de 1.300, assim como haverá bastantes portugueses ALGARVE INFORMATIVO #255

a residirem na Andaluzia”, indicou o presidente do Turismo do Algarve. Assim sendo, de acordo com João Fernandes, a par da vertente turística, a reabertura da fronteira entre Portugal e Espanha significa igualmente o reencontro das famílias. No que toca ao covid-19, António Pina e João Fernandes frisaram que o Algarve tem vindo a desenvolver, em estreita colaboração com as diferentes entidades oficiais e o tecido empresarial, um conjunto de medidas extraordinárias adequadas a esta nova realidade, que acautelam a segurança e o bem-estar de todos os que escolhem visitar o Algarve. “A região

encontra-se entre os 21 destinos do velho continente mais seguros para passar férias durante os 16


17

ALGARVE INFORMATIVO #255


Natalia Santos, Francisco Amaral e Conceição Cabrita

próximos meses, de acordo com a European Best Destinations”, recordaram os dirigentes. De realçar ainda que o Algarve desenvolveu um dos primeiros Manuais de Boas Práticas a nível mundial para várias das atividades turísticas, que engloba procedimentos a adotar para as rent-a-car, os golfes, os parques de campismo, as marinas, as praias, o surf, os parques aquáticos, os restaurantes, para além do alojamento turístico, agências de viagens e empresas de animação turística. “Esta região tem

já mais de três mil empresas aderentes ao selo «Clean & Safe» e esteve na linha da frente na implementação de planos de contingência e de protocolos sanitários nas empresas”, sublinhou João Fernandes.

ALGARVE INFORMATIVO #255

Neste contexto da colaboração e vivência transfronteiriça merece igualmente destaque a Eurocidade do Guadiana, projeto nascido em 2013 que une os Municípios de Castro Marim, Vila Real de Santo António e Ayamonte, e que trabalha de forma estratégica o desenvolvimento territorial e o seu património material e imaterial. Como tal, juntaram-se também à ação o presidente da Câmara Municipal de Castro Marim, Francisco Amaral, a presidente da Câmara Municipal de Vila Real de Santo António, Conceição Cabrita, e a Alcadesa de Ayamonte, Natalia Santos. No final das intervenções oficiais, foram distribuídas laranjas algarvias e informação sobre o destino aos turistas que chegaram de Espanha, como forma de agradecimento pela confiança no regresso à região . 18


19

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

20


21

ALGARVE INFORMATIVO #255


RE-CRIATIVA REPÚBLICA 14 REGRESSA COM CONCERTOS DE MÚSICA AO VIVO E SESSÕES DE CINEMA AO AR LIVRE Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina

ALGARVE INFORMATIVO #255

22


23

ALGARVE INFORMATIVO #255


Paulo Franco, Maria João Cabrita e Fernando Júdice, da direção da Re-Criativa República 14

Re-Criativa República 14 retoma os concertos ao vivo no dia 4 de julho, com a atuação, no pátio exterior, das Moçoilas, naquele que se pretende que seja o regresso à normalidade desta associação cultural de Olhão. Uma associação que encerrou portas em ALGARVE INFORMATIVO #255

meados de março, devido à covid-19, mas que foi encontrando outras formas de manter a sua atividade, nomeadamente com o ciclo de concertos online «Porta EntreAberta».

“Têm sido tempos difíceis. As pessoas que estão agora a explorar o bar – o Gato Maltês – tinham começado a trabalhar em janeiro, estava-se a criar uma 24


igualmente aberto uma loja de discos vinil onde atuavam regularmente djs, ao final da tarde, início da noite, às sextas-feiras e sábados, ou depois dos concertos, o que permitiu atrair um público mais jovem. A 15 de março, este processo evolutivo abortou, tendo recomeçado, um mês depois, as aulas de português para estrangeiro, o yoga e a capoeira, ambos em formato online, mas com êxitos distintos. “As aulas

de português por internet permitiram, por exemplo, que alguns sócios as pudessem frequentar mesmo quando não estivessem cá em Portugal, o que foi positivo. Nos outros casos, aulas online não são a mesma coisa que aulas presenciais, não se consegue ter a mesma adesão”, refere Maria João Cabrita. Ora, sem as habituais contribuições dos frequentadores dos eventos culturais, chegou a temer-se o pior para esta associação, mas a situação financeira estabilizou graças aos contributos “significativos” de cinco sócios.

lamenta Maria João Cabrita.

“Sem eles, neste momento estávamos a contar os tostões para pagar a conta da luz e da água. Com a generosidade destes dois casais e de mais um sócio, conseguimos manter o núcleo duro dos colaboradores, para além de pagar as despesas correntes do funcionamento do edifício”, confirma a dirigente.

Gato Maltês que, para além de explorarem o bar da República 14, tinham

Empolgados com a chegada à República 14 estavam João Apolónia e

dinâmica muito engraçada e bemsucedida, com exposições e espetáculos, aulas de português para estrangeiros, yoga, uma série de iniciativas, e tivemos que parar tudo por causa do coronavírus”,

25

ALGARVE INFORMATIVO #255


Marco Lampreia quando assumiram a exploração do bar da associação, contudo, os prejuízos estão a avolumar-se e permanece a incerteza no ar de quanto tempo demorará esta «nova» realidade. Gato Maltês que já tinha existido, em 2012, na baixa de Faro, quando Portugal foi afetado por outra crise. “Já

começamos a achar que o problema é do Gato, que atrai crises”, graceja João Apolónia, que possui outros negócios semelhantes em Loulé. “O

projeto assenta numa forte dinâmica cultural, com a componente do vinil, da polaroid e do mobiliário de época e também de uma vertente de cafetaria e gastronomia. Andávamos à procura de um espaço e surgiu a oportunidade da Re-Criativa, que já dinamizava diversos eventos culturais”, explica o empresário.

ALGARVE INFORMATIVO #255

Um conceito que não se prende com modas, aliás, quando Marco Lampreia avançou com a ideia, em 2012, ainda não se vivia a onda de revivalismo em torno do antigo, do vintage. “Na

altura, era a venda de vestuário e calçado que gerava receitas para pagar as contas, mas eram as exposições e outros eventos culturais que mais me interessavam. Pensámos que podíamos complementar as dinâmicas e iniciativas culturais da associação e chamar outros públicos através, por exemplo, da redução dos preços praticados. Notava-se algum afastamento dos clientes locais e estávamos a inverter esse cenário com as sessões dos djs aos fins-de-

26


João Apolónia e Marco Lampreia, do Gato Maltês

semana, sempre em vinil. Fechei a porta em Faro e emigrei, mas fui acumulando material porque a minha ideia era, mais cedo ou mais tarde, reabrir outro espaço semelhante, independentemente do vinil estar ou não na moda”, garante Marco Lampreia. No que toca aos concertos online dinamizados pela República 14 ao longo de várias semanas, a ideia era simples, manter a porta entreaberta da associação e ajudar os artistas a terem alguma fonte de rendimento, já que o público podia efetuar donativos que revertiam na integra para eles. “A atividade musical

parou toda, em Portugal, de uma hora para a outra e as pessoas ligadas ao mundo do espetáculo são 27

uma classe bastante extensa, mas que tem uma existência, do ponto de vista profissional, às vezes muito precária. É uma atividade muito sazonal, apesar de já se trabalhar o ano inteiro, mas foi precisamente quando ia arrancar a época média/alta que surgiu a pandemia”, descreve Fernando Júdice, dirigente da associação e músico profissional. “A associação

não podia ficar parada e queríamos também ajudar os artistas com que nos relacionamos mais e que até já tinham concertos mais ou menos programados para a Re-Criativa. Os concertos não foram em direto por questões tecnológicas, ALGARVE INFORMATIVO #255


optamos por gravar e filmar no salão em multipista, fazer a mistura e edição e depois transmitir online. Os donativos são sempre uma questão sensível, porque quem está a assistir a um concerto esquece-se rapidamente que aquelas pessoas estão a «dar» a única coisa que têm para vender e que é necessário premiá-las de alguma forma”, afirma o entrevistado. ALGARVE INFORMATIVO #255

CLIENTES TÊM QUE MUDAR OS SEUS HÁBITOS Depois de terem funcionado com porta entreaberta durante algumas semanas, no dia 4 de julho regressam então os concertos ao vivo. Uma reabertura que obrigou a algumas intervenções no espaço para que se cumpram com todas as normas de segurança decretadas pela DireçãoGeral de Saúde, como seja a marcação, no chão, de quadrículas com metro e 28


algumas regras. Em meu entender, devia-se dizer, «preto no branco», o que se pode fazer num espaço interior, seja ele qual for, e nos espaços exteriores a mesma coisa. Não percebo, por exemplo, os motivos de, num espaço exterior, ser obrigatório estarmos mais afastados uns dos outros do que num espaço interior”, critica Maria João Cabrita, com Fernando Júdice a concordar que as regras para os espaços exteriores são mais restritivas do que para os interiores. Para João Apolónia, a principal incógnita é mesmo o comportamento das pessoas perante as regras a cumprir em tempos de covid-19, por pecar por ser incerto, inconstante e incoerente. “Nós, deste lado,

meio de lado para garantir o distanciamento adequado dos clientes, que estarão sentados. Existem também circuitos separados de entrada e saída de pessoas, desinfetante à entrada, constante limpeza das mesas do bar. “Na

zona das quadrículas, a lotação é de 96 clientes, todos com um metro e meio de distância, a que se somam mais lugares nas mesas da esplanada. O problema com que nos deparamos é a falta de clareza de 29

estamos a organizar eventos para os clientes, eventos que só são sustentáveis se tiverem público, e as pessoas efetivamente estão em segurança. Aliás, todos os espaços de restauração sempre estiveram preparados para situações destas, o HCCP já existia, é apenas um produto diferente para utilizar e mais um formulário para preencher. Nos espetáculos, sempre se teve cuidado com as questões de segurança, com a organização do espaço para a entrada e saída das pessoas. Não há que ter medo de nada, há que passar uma ALGARVE INFORMATIVO #255


mensagem de esperança e celebrar a vida”, defende João Apolónia. Entrar com cautela no novo ciclo é, entretanto, o que a Re-Criativa República 14 vai fazer ao longo das próximas semanas, gerindo com toda a atenção as expetativas dos clientes e as normas de segurança. “Toda a gente sabe quais

os comportamentos aconselháveis, resta saber se os vão adotar ou não. Os espaços estão cuidados, a segurança está garantida, agora, é preciso que as pessoas se comportem em conformidade”, apela Fernando Júdice. “Vamos começar com as Moçoilas, um grupo muito querido no Algarve e que ainda vive a celebração dos 25 anos de existência. Segue-se o projeto dos Suricata, com o Tércio ALGARVE INFORMATIVO #255

Nanook, Pedro Gil e Paulo Franco, e recebemos, de 15 a 21 de julho, sessões de cinema no âmbito do Festival Internacional de Cinema e Literatura de Olhão. No dia 25 de julho teremos o projeto recente do acordeonista Gonçalo Pescada, com um quinteto de cordas, a tocar música de Piazzolla”, desvenda o dirigente. Dificuldades à parte, a Re-Criativa República 14 será, certamente, um dos espaços mais apetecíveis das noites do Verão algarvio, mercê do seu amplo espaço exterior que permite, então, a realização de concertos de música ao vivo e sessões de cinema ao ar livre.

“Nós criamos as condições para que tudo corra bem, cabe às pessoas fazerem a sua parte, aqui e em qualquer sítio”, frisa Maria 30


João Cabrita. “Na esperança que

chegue setembro e outubro e que as coisas fiquem um pouco mais normais. Sabemos que a vida vai ser diferente para todos, como é que ela vai ser e a forma como vamos reagir a isso, o tempo o dirá. A nossa esperança é que retomemos muitas das atividades que tínhamos e, eventualmente, desenvolver outras que se adaptem à nova realidade”, acrescenta Fernando Júdice. Esperança que é também a nota dominante nos Gato Maltês. “O projeto

já leva muitos anos, não vai mudar a sua traça, e estamos em constante diálogo com a associação para termos ofertas complementares, para que o espaço seja utilizado por todos os adeptos de cultura”, refere

31

Marco Lampreia, admitindo que as sextas e sábados estão em stand-by porque os horários vigentes, neste momento, em Portugal, são pouco convidativos para as sessões de djs que organizavam. “Se não houver

alterações de horários em julho e agosto, o que está planeado é trabalharmos os finais de tarde, com djs ou música ao vivo antes dos concertos principais. E isso implica mudança de hábito das pessoas”, aponta João Apolónia. “Ir a um concerto ou assistir a um espetáculo ao final da tarde, antes de ir para casa, é normal por essa Europa fora, nos países do Sul é que não há essa tradição. Temos que nos habituar à nova realidade”, finaliza Fernando Júdice.

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

32


33

ALGARVE INFORMATIVO #255


CONHEÇA OS FINALISTAS DO ALGARVE AO CONCURSO SETE MARAVILHAS DA CULTURA POPULAR Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina

ALGARVE INFORMATIVO #255

34


35

ALGARVE INFORMATIVO #255


esde 2007 que as 7 Maravilhas dão a conhecer e promovem os valores positivos de uma identidade nacional e, em 2020, está-se a celebrar a cultura popular. Porque, de acordo com a organização, das muitas razões que explicam porque Portugal está hoje na moda, uma das mais marcantes é seguramente a sua base cultural e a importância da sua cultura popular. “Fruto do nosso

pela dimensão da sua multiculturalidade, onde a expressão da sua autenticidade se encontra em cada um de nós, em cada aldeia, vila ou cidade. É a manutenção e a afirmação inequívoca desta autenticidade, com manifestações em múltiplas categorias culturais, que queremos homenagear com a eleição das 7 Maravilhas da Cultura Popular”, explicam.

desenvolvimento social e cultural, e ao contrário de muitos países que se renderam às maravilhas da globalização, resultando na indiferenciação e quebra de autenticidade, Portugal afirma-se hoje pelos seus valores únicos e

No início desta edição foram então definidas várias categorias, designadamente: Artesanato; Lendas e Mitos; Festas e Feiras; Músicas e Danças; Rituais e Costumes; Procissões e Romarias; e Artefactos. Foram, entretanto, recebidas 504

ALGARVE INFORMATIVO #255

36


37

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

38


candidaturas, que foram avaliadas pelo Conselho Científico e este acabou por atribuir o selo de Nomeado a 470. Os resultados da avaliação pelo Painel de Especialistas, que corresponde à terceira fase do concurso, foram conhecidos a 7 de junho, tendo sido escolhidos sete patrimónios de cada região, num total de 140 finalistas regionais, que vão participar nas respetivas eliminatórias regionais, a começar no dia 6 de julho. No que toca ao Algarve, os eleitos foram: a destila do medronho (Monchique); a cataplana em cobre (Loulé); as charolas da Bordeira (Faro); a Festa da Espiga (Salir); a Festa da Mãe Soberana (Loulé); a Festa da Pinha (Estoi); e a Procissão da Aleluia, mais conhecida por Festa das Tochas Floridas (S. Brás de Alportel). A candidatura da Destila do Medronho insere-se na categoria «Rituais e 39

Costumes» e é o processo de destilação da aguardente de medronho que se faz em Monchique há vários séculos, entre janeiro e março, constituindo um momento de convívio e de festa entre vizinhos, familiares e amigos. Enquanto os medronhos fermentados são lentamente destilados em alambiques de cobre, passa-se o tempo a conviver, conversando, jogando às cartas e acompanhando as provas da aguardente com chouriço, presunto, pão, filhoses, ou mesmo febras de porco assadas no fogo aberto da caldeira. No local da estila, geralmente pouco iluminado e onde se sente intensamente o cheiro do medronho e do fogo, aquece-se o corpo com a aguardente, soltam-se as línguas, fazem-se despiques e diz-se até que muitas quadras populares aí terão sido transmitidas ou inventadas. ALGARVE INFORMATIVO #255


Muitos afirmam em Monchique que «antigamente a estila era uma coisa para homens», mas há quem refira que as mulheres também participavam, quando queriam. A estila termina com a «diáfa», como ainda alguns designam a grande festa que finaliza todo o processo em que se organizavam bailes ao som da harmónica. A aguardente de medronho faz parte da cultura da Serra de Monchique, onde é comum oferecer um cálice aos visitantes, e tem igualmente reflexos na linguagem e influência na arquitetura rural, onde se vislumbram as pequenas casas sem janelas, onde decorrem as estilas. A cataplana em cobre enquadra-se na categoria «Artesanato» e ganhou uma nova vida por iniciativa da Câmara Municipal de Loulé, mais concretamente através do «Loulé Criativo», projeto de ALGARVE INFORMATIVO #255

desenvolvimento territorial que abrange áreas diversas como o turismo criativo, uma rede de oficinas (Empreita, Caldeiraria, Barro, Relojoeiro e Cordofones) e um laboratório de design. Nesse âmbito, foi inaugurada, em 2017, a Oficina de Caldeireiros, que funciona com um coletivo de artesãos que ali trabalham e vendem os seus produtos de cobre e latão em regime de cooperação. E o desenvolvimento da atividade revestese de especial interesse, uma vez que, após a morte do Mestre Caldeireiro Ilídio Marques, o ofício de caldeireiro estava extinto na cidade. O caldeireiro domina a arte de trabalhar o cobre e o latão para construir ou reparar diferentes artefactos, contudo, esta é uma arte que requer muitos anos de aprendizagem. Algumas das principais 40


peças da caldeiraria são transversais a diferentes épocas e lugares, salientandose a Cataplana, com diferentes dimensões, composta por duas partes côncavas ligadas por uma dobradiça, que se fecha com a ajuda de dois fechos laterais. Cataplana é também o nome dado às mais variadas receitas, confecionadas nesta peça de artesanato. Após selados no seu interior, os alimentos são confecionados com uma cozedura hermética a vapor, de forma lenta e a temperaturas baixas. E a Cataplana acompanhou a história da região e, em particular, da cidade de Loulé, onde se voltaram a escutar os sons do martelar no cobre e no latão. As Charolas de Bordeira inserem-se na categoria «Músicas e Danças» e acontecem num sítio pertencente à freguesia de Santa Bárbara de Nexe e ao

41

concelho de Faro. Mas se Bordeira é pequena em área geográfica, é enorme em cultura, costumes e tradições, sendo berço de inúmeros acordeonistas e poetas. E todos os anos, de 1 a 6 de janeiro, saem às ruas da Bordeira as charolas, grupos que, ao som do acordeão, pandeiros, castanholas e ferrinhos, cantam e versam de improviso. Canta-se a saudade, a amizade, a crítica, a chacota, a honra no passado, o orgulho no presente, o abraço ao emigrante distante, numa tradição centenária que despontou com o findar da Primeira Guerra Mundial e com o regresso dos bordeirenses a casa, onde foram recebidos em festa. Em Bordeira, existem seis grupos do ativo – A Democrata, Juvenil Bordeirense, Juventude União

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

42


Foto: Loulé Criativo

Bordeirense, Mocidade União Bordeirense, Sociedade Recreativa Bordeirense e União Bordeirense – que se reúnem nos últimos meses de cada ano para preparar a sua apresentação, porque há que ensaiar músicas e letras para entrar no ano novo com a lição sabida. No dia 1 de janeiro, as charolas saem à rua e as atuações passam geralmente por quatro momentos: marcha de entrada – que pode ser tocada ou tocada e cantada; estilo – onde o começador canta uma quadra de improviso, seguido pelo restante grupo a cantar o coro e a tocar; a valsa das vivas – onde qualquer membro do grupo ou qualquer pessoa do público pode versar sobre o que quiser; e a marcha de saída – tocada e cantada por todo o grupo. A Festa da Espiga, categoria «Festas e Feiras», celebra-se, em Salir, na Quinta43

Feira da Ascensão (40 dias após a Páscoa), coincidindo com o Dia do Município de Loulé, e é o evento mais marcante desta vila, quer pela sua expressão etnográfica e cultural, como pela mobilização popular das suas gentes. Verdadeiro cartaz turístico do interior rural, a Festa da Espiga ganhou uma dimensão nacional, recebendo milhares de visitantes que ali qui se deslocam para apreciar o cortejo etnográfico, o artesanato, a gastronomia, o folclore, a poesia e toda a animação musical que aprofunda o brilho e a autenticidade deste grande acontecimento festivo. A Festa da Espiga em Salir teve início a 23 de maio de 1968, organizada pela Junta de Freguesia, mais propriamente pelo presidente de então, José Viegas Gregório, um eternamente apaixonado ALGARVE INFORMATIVO #255


pela sua terra natal e um defensor permanente dos anseios e dos sonhos das populações locais. Os intervenientes neste espetáculo ímpar no país preparam com antecedência os seus carros e durante o desfile vão oferecendo alguns dos produtos que transportam. A animação musical, a gastronomia local, o artesanato, e o folclore são a porta de entrada para a Festa da Espiga, onde todos podem apreciar os tradicionais manjares serranos, o vinho e o medronho caseiros e presenciar mais de meia centena de artesãos e produtores locais que vêm até Salir dar a conhecer os seus produtos regionais. O cortejo etnográfico que desfila ao longo da principal rua da vila representa toda a atividade agrícola e artesanal da freguesia, em destilação, apicultura e extração de cortiça, o varejo do figo, parte que se encontra em vias de extinção, desde as sementeiras, mondas,

ALGARVE INFORMATIVO #255

ceifas, debulhas, fabricação de pão, apanha do medronho e amêndoa e alfarroba, artesanato de linho, lã, palma, esparto, cestaria de verga. Uma das particularidades da Festa da Espiga é que a população tem ainda a possibilidade de deixar uma mensagem, em forma de poema ou quadra preparada ou apenas de improviso, às entidades governativas presentes, para pedir ou agradecer as obras feitas na terra. Aliás, os executivos da Câmara Municipal de Loulé aproveitam este dia para inaugurar uma estrada, uma escola, uma obra de saneamento básico ou um equipamento de carácter social, contribuindo assim para abrilhantar ainda mais as festividades. Mas quando essas obras não se concretizam, as críticas em tom de brincadeira são

44


45

ALGARVE INFORMATIVO #255


lançadas aos responsáveis governativos do município e da região. A Festa da Mãe Soberana, na categoria «Procissões e Romarias», é celebrada em Loulé há quase cinco séculos nos domingos de Páscoa durante 15 dias. Aliás, a festa da padroeira da terra, Nossa Senhora da Piedade, é considerada a maior manifestação religiosa do culto mariano a Sul de Fátima e decorre em dois momentos distintos, no Domingo de Páscoa (Festa Pequena) e passados 15 dias (Festa Grande). A Festa Pequena envolve a descida da imagem da Mãe Soberana em procissão para a igreja de S. Francisco, acompanhada pela Banda Filarmónica Artistas de Minerva. Uma descida feita em marcha acelerada, uma tradição profana aqui mesclada com a tradição religiosa, ficando duas semanas na Igreja

ALGARVE INFORMATIVO #255

de S. Francisco para vigília e veneração dos fiéis. A Festa Grande, no terceiro domingo da Pascoa, é caracterizada pelo emotivo regresso da imagem de Nossa Senhora da Piedade à ermida do cimo do Cerro da Piedade, em marcha rápida ao som de música criada especificamente para o evento. É o adeus da Padroeira à sua terra e o regresso à sua pequena ermida que, a poente, se ergue sobranceira a toda a cidade. Na aldeia de Estoi, concelho de Faro, tem lugar a Festa da Pinha, a concurso na categoria de «Festas e Feiras». Todos os anos, nos dias 2 e 3 de maio, celebra-se nesta aldeia uma tradição que, segundo fontes orais, remonta a mais de dois séculos. Na sua génese podemos encontrar uma vertente religiosa e outra de carácter pagão e terão sido os almocreves os prenunciadores desta festa. As viagens

46


dos almocreves efetuadas por caminhos hostis e perigosos tinham como meio de transporte as carroças puxadas por mulas ou cavalos e eram efetuadas entre o Algarve e o Alentejo, tendo como finalidade a permuta de produtos regionais. Aquando destas viagens, eram confrontados com inúmeros obstáculos que punham em risco as suas vidas. Segundo rezam os mais antigos, a génese da festa remonta a tempos imemoriais, quando um grupo de almocreves numa das suas viagens de regresso à aldeia pernoitou num acampamento, sendo aqui cercados por uma alcateia de lobos. Desesperados, rezaram à Nossa Senhora do Pé da Cruz suplicando-lhe auxílio. A súplica foi atendida e em agradecimento concretizaram uma festa em homenagem a Nossa Senhora do Pé da Cruz, a cuja ermida chegaram já noite cerrada à luz de archotes. Aí, acenderam uma fogueira 47

como forma de gratidão para com a sua padroeira. Desde então, a festa passou a fazer parte de uma tradição que perdura até aos dias de hoje. O derradeiro finalista algarvio é a Procissão da Aleluia de São Brás de Alportel, na categoria de «Procissões e Romarias». Referência incontornável do roteiro turístico da região, a Festa das Tochas Floridas eleva a identidade são-brasense presente numa tradição secular única, de beleza ímpar, que conta com o envolvimento e participação de toda a comunidade. Manifestação cultural enraizada na vivência são-brasense, atinge o seu auge na Procissão de Aleluia, onde os andores dão lugar às flores e os cânticos a Cristo Ressuscitado ecoam nas ruas pela voz dos homens da terra, que empunham majestosas tochas artísticas de flores naturais. ALGARVE INFORMATIVO #255


O circuito da procissão, desenhado por um tapete florido, ao longo de mais de um quilómetro, deleita quem passa com cores vibrantes e aromas primaveris de flores naturais, apanhadas e trabalhadas para embelezar a passadeira. Nas ruas da procissão, as varandas engalanadas deixam esvoaçar bonitas colchas tradicionais em louvor a Cristo Ressuscitado. Um trabalho moroso e intenso que envolve centenas de voluntários, desde associações à comunidade em geral, que durante uma semana recolhem verdura e flores do campo, sob coordenação da Câmara Municipal de São Brás de Alportel, da Associação Cultural Sambrasense e da Paróquia local. Nos dias que antecedem a procissão, a verdura é processada, as flores preparadas e separadas por cores. A elaboração da passadeira tem início às ALGARVE INFORMATIVO #255

três da madrugada de Domingo de Páscoa e conta com o trabalho de cerca de uma centena de voluntários. Durante a procissão, divididos por grupos e em duas alas, os homens dão voz à fé em Cristo Ressuscitado. Um elemento do grupo proclama: “Ressuscitou como disse!” e o grupo responde “Aleluia! Aleluia! Aleluia!”. E assim sucessivamente ao longo da procissão. Seguem-se as crianças e jovens acompanhados por símbolos litúrgicos e de evangelização; o Pálio com o Santíssimo Sacramento ladeado por tochas ou lanternas e a Confraria do Santíssimo Sacramento; o acompanhamento musical pela Banda Filarmónica de São Brás de Alportel; por último, a comunidade e/ou visitantes . 48


49

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

50


51

ALGARVE INFORMATIVO #255


HOTEL EUROPA APRESENTA «AGORA QUE NÃO PODEMOS ESTAR JUNTOS» Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina

ALGARVE INFORMATIVO #255

52


53

ALGARVE INFORMATIVO #255


artindo de um desafio do Primeiro-Ministro António Costa para conceber uma obra em vídeo para as tradicionais comemorações do 46.º aniversário do 25 de abril, que este ano se realizaram em formato online devido à pandemia da covid-19, a companhia de teatro documental Hotel Europa produziu «Agora Que Não Podemos Estar Juntos», com curadoria artística de Elisabete Matos (Teatro Nacional de São Carlos), Nuno Cardoso (Teatro Nacional São João), Sofia Campos (Companhia Nacional de Bailado) e Tiago Rodrigues (Teatro Nacional D. Maria II). Os objetivos propostos foram alcançados e percebeuse que o projeto poderia ir mais além após o desconfinamento, daí que André Amálio, responsável pelo texto, ALGARVE INFORMATIVO #255

dramaturgia, investigação e recolha de testemunhos, e Tereza Havlíčková, que teve a seu cargo o movimento, decidiram avançar com a sua adaptação para os palcos do teatro, com a primeira ida a cena a acontecer, no Festival Internacional de Teatro de Setúbal, a 26 de agosto. Foi o ensaio dessa peça que o Algarve Informativo teve oportunidade de assistir durante a residência artística que a companhia fez no CAPa – Centro de Artes Performativas do

Algarve, em Faro, “um espetáculo que celebra o 25 de Abril através das histórias reais de pessoas que lutaram e resistiram contra a ditadura, com o foco a incidir sobre o amor e as relações amorosas que nasceram no seio 54


55

ALGARVE INFORMATIVO #255


da luta antifascista, analisando como é que estas relações foram capazes de sobreviver à perseguição do Estado Novo, ao mesmo tempo que estavam na base da sustentabilidade dessa mesma luta política”, explica André Amálio. Um espetáculo de teatro, música e dança protagonizado por André Amálio, Cheila Lima, Ricardo Machado, Tereza Havlíčková, Pedro Salvador e Joana Guerra, estes dois últimos que tiveram também nas suas mãos a criação e interpretação musical. E, a par da interpretação dos testemunhos recolhidos, os intérpretes falam também da estranha experiência que foi produzir ALGARVE INFORMATIVO #255

o documentário em vídeo, numa altura em que Portugal estava em Estado de Emergência, em que praticamente não se podia sair de casa. Das peripécias de filmar em espaços públicos e dos cuidados a ter na interação da equipa até às preocupações de com quem deixar os filhos menores durante as filmagens. «Agora Que Não Podemos Estar Juntos» recorda, então, os últimos tempos do Estado Novo, o início da Guerra Colonial, a vida de quem combatia o regime opressor na clandestinidade, de quem tinha que «dar o salto» para fugir à PIDE, mas também daqueles que foram mesmo 56


57

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

58


presos e torturados pela polícia política, até se chegar, finalmente, ao 25 de Abril de 1974. Sempre com o amor como pano de fundo, as vivências dos casais que lutavam na sombra, muitos deles afastados das suas famílias, dos filhos, para não os colocar em perigo. “É

também a primeira parte de um espetáculo futuro onde não serão os atores a incorporar os testemunhos recolhidos, mas sim os 59

próprios entrevistados a contarem as suas histórias”, adianta André Amálio. Ficamos então à espera, porque aquilo que se assistiu foi, de facto, impactante e comovente e porque urge falar mais do 25 de Abril, da ditadura do Estado Novo, sem vergonha, para que as novas gerações, aquelas que já nasceram em total liberdade, saibam que nem sempre foi assim a vida em Portugal . ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

60


61

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

62


63

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

64


65

ALGARVE INFORMATIVO #255


PRINCESAS DE MARGARIDA PALMA GOMES EM EXPOSIÇÃO NO CONVENTO DE S. JOSÉ Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina

ALGARVE INFORMATIVO #255

66


67

ALGARVE INFORMATIVO #255


s celas conventuais do Centro Cultural Convento de S. José, em Lagoa, acolhem, até 21 de agosto, a exposição «Princes as dos Corações Perdidos», de Margarida Palma Gomes. Nesta mostra a autora, com recurso ao barro, leva-nos a viajar por diversos mundos que nos remetem para a infância, herança cultural, esoterismo, entre tantos outros… ALGARVE INFORMATIVO #255

As visitas podem realizar-se de segunda a sexta-feira, das 10h às 13h e das 14h às 18h e, aos sábados, no período das 14h às 18h. O Centro Cultural Convento de S. José está aberto ao público, de acordo com as normas indicadas pela Direção-Geral de Saúde no combate à disseminação da covid-19, cumprindo todas as diretrizes de segurança e distanciamento, promovendo desta forma uma visita segura à exposição . 68


69

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

70


71

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

72


73

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

74


75

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

76


77

ALGARVE INFORMATIVO #255


Recordar o Festival MED em tempo de pandemia Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina

ALGARVE INFORMATIVO #255

78


79

ALGARVE INFORMATIVO #255


om a pandemia da covid-19 sem fim à vista, o Festival MED integrou o conjunto de eventos que foram cancelados um pouco por todo o país. Mas a sua grandiosidade permanece na mente de todos, pelo que aqui recordamos a edição de 2019, que atraiu à cidade de Loulé, de 27 a 30 de junho, muitos milhares de visitantes, a que se juntaram, claro está, outros tantos milhares de algarvios, para uma verdadeira maratona cultural. Um excelente cartaz, diversos palcos, entre eles o novíssimo Chafariz, animação de rua constante a cargo de grupos locais e internacionais, perfizeram uma ampla oferta a que nem faltou a poesia, o teatro ALGARVE INFORMATIVO #255

e o cinema, porque o MED não se faz apenas de world music. A 16.ª edição do MED encheu de cor, alegria e magia a Zona Histórica de Loulé e a única falha que se pode apontar ao festival é algo que não lhe pode ser diretamente imputável e que nunca será colmatado, isto é, a impossibilidade humana de se poder apreciar tudo o que ele tem para oferecer. Porque, apesar da área geográfica do MED estar perfeitamente delimitada e até ser relativamente fácil – apesar da multidão que enche as ruas – ir de um palco para o outro, simplesmente não conseguimos estar em dois lugares ao mesmo tempo, o que nos obriga a fazer escolhas. Escolhas que se tornam mais complicadas de fazer porque a 80


81

ALGARVE INFORMATIVO #255


qualidade é bastante homogénea, ou seja, não se pode dizer que haja artistas ou grupos de primeira, segunda ou terceira categoria, são todos bons, cada um dentro do seu estilo. Resta assim a nós, comuns mortais, enquanto não se desenvolver, no mundo real, a tecnologia dos clones humanos, fazer as nossas opções, decidir a que concertos vamos assistir, e o melhor é nem pensar naquilo que está a acontecer a poucos metros de distância, no coração de uma cidade onde a herança islâmica está bem presente e onde se respira um ambiente verdadeiramente mediterrânico. E, segundo dados da organização, havia, de facto, imenso por onde optar. Ao todo foram 80 horas de música em 10 palcos, com artistas vindos de paragens tão distintas como os estreantes Haiti e Trindade e Tobago, ou ALGARVE INFORMATIVO #255

dos repetentes Níger, México, Turquia e Cabo Verde. Destaques naturais para nomes mais conhecidos como o brasileiro Marcelo D2, o cabo-verdiano de Quarteira Dino D’Santiago, o tobaguenho Anthony Joseph, o francocongolês Tshegue, as sonoridades mariachi da Orkesta Mendoza, a melodia lusitana de Ricardo Ribeiro, a beleza artística de Camané e Mário Laginha novamente juntos num palco de Loulé, ou a irreverencia dos Cais do Sodré Funk Connection. Mas outros menos mediáticos constituíram agradáveis surpresas, numa cataplana de culturas e linguagens musicais que continuam a fazer as delícias dos adeptos do MED. O MED Classic voltou a levar agrupamentos de música clássica ao interior da Igreja Matriz, para 82


83

ALGARVE INFORMATIVO #255


satisfação do público mais apreciador deste estilo erudito. O Palco Calcinha juntou música e poesia, pelo Palco Bica passaram projetos inovadores da região, sobretudo na área do indie, e os fadistas algarvios tiveram um lugar cativo no MED Fado. Nas ruas eramos surpreendidos por dezenas de artistas da Satori, Rhakatta e Al-Fanfare, de grupos de cante alentejano ou de ranchos folclóricos do concelho, mas também a gastronomia e o artesanato fizeram parte dos aliciantes da Zona Histórica de Loulé por estes dias. E uma das novidades de 2019 foi o Cinema MED, com curadoria de Rui Tendinha, curtas-metragens e a estreia de «Gabriel e a Montanha», de Fellipe Barbosa. Não admira, por isso, que Vítor Aleixo, presidente da Câmara Municipal de Loulé, faça um balanço extremamente positivo ALGARVE INFORMATIVO #255

daquela que foi, provavelmente, a edição mais concorrida de sempre da história do MED. “Vimos

espetáculos maravilhosos nos diversos palcos, sempre com grandes assistências. A festa num país e num festival mediterrânico, com noites destas, só pode atrair as pessoas e fazê-las felizes”, afirmou o autarca, que sublinhou ainda a preocupação ambiental da parte da autarquia que esteve bastante presente em 2019, com ações como o copo ecológico, os bebedouros com água da rede pública, as papeleiras inteligentes e compactadoras ou os painéis solares que deram «energia limpa» às tasquinhas da restauração .

84


85

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

86


87

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

88


89

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

90


91

ALGARVE INFORMATIVO #255


Simplesmente maravilhoso a Saudade do Quorum Ballet Texto: Daniel Pina | Fotografia: Daniel Pina

ALGARVE INFORMATIVO #255

92


93

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

94


oi uma noite mágica, simplesmente maravilhosa, a combinação perfeita entre o Fado, Património Imaterial da Humanidade, e a dança contemporânea. Não é comum, pelo menos em terras algarvias, um espetáculo de dança esgotar salas, mas foi isso que aconteceu no dia 9 de novembro de 2018, com a vinda do Quorum Ballet ao Cineteatro Louletano e a apresentação de «Saudade – Back to Fado», com direção artística e coreografia do prestigiado Daniel Cardoso. E os vários minutos em que o público, de pé, ovacionou os artistas, foi uma clara demonstração de que tão cedo não esquecerão uma noite que, diga-se mais uma vez, foi realmente mágica. Saudade, essa palavra tão portuguesa, que dizem não ter tradução literal para mais nenhuma língua, é a dor de uma ausência, o desejo de algo ou de alguém de que se está privado. “É nostalgia, 95

melancolia, lembrança de pessoas ou coisas distantes ou até extintas, e o grande desejo de tornar a elas. É uma palavra que está na essência do povo português que sempre partiu por diversas razões, seja por heroísmo, descoberta, sobrevivência, deixando sempre uma parte de si na sua terra e a vontade de a ela regressar”, descreve a sinopse da mais recente produção do Quorum Ballet. Um trabalho, de facto, singular e também inspirado na obra literária de Luís Vaz de Camões. Por isso, «Saudade – Back to Fado» pretende voltar à origem, numa mistura de sentimentos, pedaços de dor, alegria, solidão, amizade, desamparo e amor. E tudo isto deixando-nos levar pelas 12 cordas de uma guitarra portuguesa. Sem dúvida, um excelente prolongamento do espetáculo «Saudade», que o Quorum Ballet já tinha apresentado, em 2012, neste mesmo Cineteatro Louletano . ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

96


97

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

98


99

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

100


101

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

102


103

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

104


105

ALGARVE INFORMATIVO #255


TANGO ARGENTINO LEVOU AUDITÓRIO MUNICIPAL DE OLHÃO AO RUBRO Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina ALGARVE INFORMATIVO #255

106


107

ALGARVE INFORMATIVO #255


Auditório Municipal de Olhão recebeu, a 13 de outubro de 2018, uma fantástica noite de tango argentino com o espetáculo «La Porteña Tango & Eugenia Giordano», que colocou em palco os insuperáveis músicos Alejandro Picciano, Federico Peuvrel, Matías Picciano e a quente voz de Eugenia Giordano. Com uma longa carreira na qual pontificam quatro discos e um DVD, produzidos pelo destacado músico ALGARVE INFORMATIVO #255

argentino Litto Nebbia, o grupo já atuou em mais de 20 países de quatro continentes, sempre com espetáculos de enorme beleza visual e sonora numa inesquecível homenagem a um dos géneros de música e dança mais belos e universais – o tango. O concerto de Olhão contou com a participação especial da cantora argentina Eugenia Giordano e do par de bailarinos Amira Luna e Damián Roezgas, que fundem magistralmente o tango cénico com o tango de salão. E foi, sem dúvida, uma noite de grande emoção, em cima do palco e na plateia . 108


109

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

110


111

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

112


113

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

114


115

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

116


117

ALGARVE INFORMATIVO #255


OPINIÃO Mas o Algarve, Senhor, porque lhes Dás tanta dor… Paulo Bernardo (Empresário) poema de Augusto Gil a «Balada da Neve», que descreve o sofrimento das crianças num Portugal antigo, e que tinha uma parte que dizia - “Mas as crianças, Senhor, porque lhes Dás tanta dor, porque padecem assim?”, inspirou-me para criar o título deste artigo. O Algarve encontra-se neste momento abandonado a caminhar pela neve da crise, como a criança que Augusto Gil descrevia e, tal como a criança que ninguém via, o mesmo se passa com o Algarve, está só e abandonado nesta tempestade que é a Covid-19. Desde a Páscoa, primeiro ponto de inversão na faturação da maioria das atividades regionais, que o Algarve entrou em sofrimento e, chegando a julho, não se vislumbra que este ano aconteça alguma coisa de extraordinário. Já não tivemos Páscoa e também não vamos ter Verão. À data de hoje, o Aeroporto está quase parado, basta ver que as lojas ainda se encontram fechadas. Albufeira, ALGARVE INFORMATIVO #255

barómetro do nosso Verão, dizem-me que está quase deserta. E então, o que vai ser do Algarve durante os próximos meses? Não consigo ver nenhuma medida para diferenciar o Algarve, pois esta crise é mais nossa do que noutra qualquer região. Podem-me dizer que temos alguns apoios às empresas. Ter temos, mas não servem o Algarve, os apoios funcionam para quem estava a trabalhar em março, e os outros?... Onde se enquadram as pessoas que trabalham apenas na época dita alta? Onde se enquadram os trabalhadores dos bares e discotecas, atividade de muitos jovens durante as férias, para complementar o rendimento familiar? Onde se enquadra o café de bairro, que os clientes não surgem, pois também a eles lhes falta o rendimento? Muitos tem atividades ligadas ao turismo, jardineiros, limpezas, manutenção, se não há atividade, como pode haver trabalho para estas atividades? Podem e bem dizer-me que a culpa é do Algarve, que não se adaptou, que não mudou a estratégia, etc., etc., etc., 118


contudo, e por experiência própria, a maior parte dos fundos que chegaram a Portugal para mudar a nossa economia no Algarve quase só tinham uma enquadramento, turismo. Lembra-me bem de quando trabalhei na área da formação, os cursos que eram facilmente aprovados para o Algarve eram de cozinha, restaurante/bar e jardinagem, quando se tentava fazer algo diferente dificilmente era aprovado. Mesmo hoje, o Algarve é visto como turismo e ponto. Basta olhar para os projetos que Lisboa aprova, dos fundos para o Algarve, inovação muito próximo do zero e não é por falta de empresas inovadoras. Estou bastante preocupado 119

e não vejo qualquer manifestação de preocupação, quer pelos agentes locais, quer públicos como privados, quer pelo governo central. O Algarve é mais importante que a TAP ou que a Efacec, para essas duas empresa olha-se de uma forma, para a grande indústria do turismo nacional bem mais valiosa que a AutoEuropa. Assim, espero que ainda se consiga minimizar alguns dos prejuízos, mas cada dia que passa é um seculo. Adaptando uma frase de Emiliano Zapata, “se não há justiça para o Algarve, que não haja PAZ para o governo” . ALGARVE INFORMATIVO #255


OPINIÃO #paraolivro# Mirian Tavares (Professora) preciso escrever porque viver, como sabemos, não é preciso. é incerto. inseguro. é fatal. um texto que me salvasse. amulherdolado

á mais de 20 anos comecei a minha travessia oceânica – entre dois países cuja língua é a mesma e tão diversa. Entre formas tão diferentes de estar e de pronunciar a letra L. E outras tantas que, mesmo passado o tempo, continuo a dizê-las como aprendi na tenra infância, do lado de lá do Atlântico. Meu L soa como um U breve e a prosódia do meu acento, que é um mix de todos os lugares onde vivi, adapta-se à sintaxe do país que me abrigou, do país em que escolhi, dentre tantos possíveis, ficar. Fincar os pés, criar raízes, assentar. No começo tive dúvidas – largar uma vida inteira e começar tudo de novo, já não tinha 20 anos. Um amigo então me disse: Vai. E escreve um livro. Aproveita o tempo em que vais estar à margem para ver tudo e registar cada coisa. Conta as histórias que vais viver, fala de ti, dos teus medos, da tua condição de estrangeira, dos amores e dos desamores, quando a hora deles chegar. ALGARVE INFORMATIVO #255

Eu vim. Vivi tudo com intensidade, e nunca escrevi o livro. Durante 5 anos alimentei um blog, quase diariamente, com textos que dariam uns quantos livros. Não sei se seriam daqueles livros que se vendem, ou daqueles que as pessoas gostam de ler. Mas havia matéria e substância para encher muitas páginas. O problema é que só sei escrever sobre aquilo que conheço um pouco melhor – eu mesma e os que me rodeiam. Na verdade, não escrevo exatamente sobre os que me rodeiam, mas sobre como eu os vejo e sinto. Como eu os leio e interpreto. No fundo, são mais palavras sobre mim mesma e não me acho, para os outros, um tema assim tão interessante. Mas, por mais únicos que sejamos, somos semelhantes e vivemos muitas coisas que são pertença comum: amores, desamores, solidão, medo, alegrias… Quando era adolescente, escrevia poesia e dei-me conta de que os poemas preferidos das minhas amigas eram os que as faziam dizer: podia ter sido escrito por mim. Porque, de facto, no fundo, andamos sempre à procura de 120


Foto: Victor Azevedo

nos vermos no outro, nas suas palavras, nos seus sentimentos. Somos patologicamente narcísicos e gostamos de ver o nosso reflexo em qualquer superfície. Mesmo que essa superfície seja o outro e as suas palavras. Deixei o blog e comecei a escrever no Facebook. Textos mais curtos, menos íntimos, mas igualmente pessoais. Uma amiga, que gosta do que escrevo, criou um hashtag para que meus textos não se percam e eu possa recuperá-los no dia em que me decidir a escrever o bendito livro. “Está escrito, no grande livro da sabedoria popular, que primeiro se deve viver que é para depois poetar (…)”, cantava sabiamente Ednardo, um músico da minha terra natal. Meus 121

poemas eram precoces, mal tinha vivido o primeiro amor e já tinha um livro pronto. Que para a minha sorte, nunca foi publicado e perdeu-se. Perderam-se páginas e páginas de poemas datilografados numa máquina de escrever Remington 12, amarela, que me acompanhou muitos anos. A máquina, não os poemas. Faltava vida naquelas palavras. Hoje faltam-me os poemas. E o livro, que eventualmente escreverei. Talvez mais tarde. Ou mesmo nunca. Mas carrego-o comigo, como arrastei a Remington portátil, na sua caixa amarela, pelos muitos lugares onde vivi até trocá-la por um computador . (Dedicado à Adriana Nogueira)

ALGARVE INFORMATIVO #255


OPINIÃO Do Reboliço #91 Ana Isabel Soares (Professora) linha do horizonte está difusa. O que muitas vezes acontece, quando sobe ao socalco para olhar para longe (ao acordar, para farejar o dia, a direção do vento, o som dos pássaros que vêm ao figo e ele terá, que maçada..., de afugentar; no final do dia, para conhecer que cara terá o dia seguinte, se a lua já nasceu, que tamanho tem), é o Reboliço ver nela um traço distinto, a marca da desunião de terra e céu, sinal da identidade de cada um e da verdadeira distância que entre ambos se entrepõe. Nesses dias de limpidez – que não os há só porque não há as nuvens, mas porque o vento, desde as praias atlânticas, terá vindo até ao Moinho Grande a varrer qualquer pó, qualquer gota de humidade, névoa alguma que quisesse flutuar –, virado a Sueste, o bicho vislumbra o recorte da serra maior que para aqueles lados se demora com os séculos, os altos da Fóia, Monchique. De Verão, porém, raro é o dia em que a vê: o calor traz também marcas, tem presença sem ser só de sentir na pele, mostra-se com forma evidente: sobre o horizonte, a figura estival é um véu semidiáfano, modifica as silhuetas da distância, inscreve no ar ondulações insuspeitadas, engana os sentidos – e ALGARVE INFORMATIVO #255

impede que a serra se mostre a quem a procure desde o socalco do moinho. (O Reboliço não foi sozinho inspecionar o ar: quando o moleiro acordou e o chamou, levou o corpo mínimo até ao umbral da porta do quarto de dormir, sentou-se sobre a tijoleira gasta pela passagem e esperou que o dono lhe dissesse que já ali tinha o biscoito para ele: ainda deitado o moleiro, tirou do pacote de bolacha maria que leva à noite para a mesa de cabeceira a segunda daquelas horas (a primeira, ao deitar, é para si mesmo; a segunda para o canito) e estendeu o braço, baixando-o, que é alta a cama. Quase sem se dar por ele (a mulher do moleiro anda pela divisão, abrindo e fechando gavetas à procura do que pôr para o dia, abrindo e deixando aberta a portada da janela para deixar o dia entrar, passando sobre os olhos, para os abrir, a ponta da toalha embebida em água das malvas), o Reboliço chegou-se ao vão debaixo da cama e, mordendo-a, levou, para a saborear na cozinha, a bolacha. No quarto, o moleiro levantou o máximo corpo, fazendo alavanca com o cajado, que de noite pendura, preso nos ferros da cabeceira da cama, suspirou fundo, já com os pés no chão, como para os fincar com maior força para as horas que se vão seguir, levantou-se, usou a água das flores. Poucos instantes depois, 122


Foto: Vasco Célio

ouvia-se a mulher noutro lado da casa: abria gavetas e fazia soar os talheres, abria o lume do fogão e fazia ouvir o tinir da cafeteira cheia sobre a grade, abria o saco do pão e fazia sair dele o perfume da peça central do desjejum, razão de ser do lugar onde todos estavam. O moleiro veio do corredor, passou frente à lareira limpa, ao negro sazonalmente abandonado da 123

panela de ferro, pegou no chapéu, abriu a porta da casa. “Anda já comigo, Preguiçoso. Anda ver como está hoje o tempo”) . * Reboliço é o nome de um cão que o meu avô Xico teve, no Moinho Grande. Escrevo a partir desse olhar canino.

ALGARVE INFORMATIVO #255


OPINIÃO Sabiam que Deviam Escrever com a Mão Esquerda? Vera Casaca (Argumentista e Realizadora de Cinema) onhecem as «TED Talks»? Se não, fica aqui a dica: vejam e mergulhem neste mundo TED (Technology, Entertainment, Design). Criada por Richard Saul Wurman em 1984, surgiu inicialmente como uma conferência, contudo, anos mais tarde, as palestras começaram a ser gravadas e os vídeos tornaram-se disponíveis online. Oferecem-nos assim, de forma gratuita, palestras curtas sobre os mais diversos tópicos. A plataforma tornou-se num império de partilha de conhecimento, agora também com livros, podcasts e programas de rádio. Isto para vos contar que no outro dia fiquei fascinada com um episódio do podcast «TED Radio Hour». Contaram a história de um pianista que se preparava para uma grande noite de espetáculo, quando se apercebeu que o piano não era o correto: tinha trazido outro piano por engano. Depois de um pânico justificado com uma recusa em tocar, o pianista agarrou o touro pelos cornos.

ALGARVE INFORMATIVO #255

Não apenas tocou, mas encantou. Deu o seu melhor concerto de sempre. Também contaram como Brian Eno, músico, compositor e produtor, que já trabalhou com famosas bandas como os U2, Coldplay, entre outros, os ajuda a reinventarem-se. Reza a lenda que fez com que Phil Collins apenas tocasse bateria, e este, num acesso de raiva, atirou garrafas de cervejas contra as paredes do estúdio. Histórias à parte, a verdade é que Brian Eno gosta de quebrar o processo criativo dos músicos de várias formas, incluindo pedir que troquem de instrumento. Porque o faz? Simplesmente para que saiam da sua zona de conforto, fazendo com que os seus cérebros e espíritos criativos se expandam. Muitas vezes isto só acontece quando nos deparamos com alguma resistência quando experimentamos coisas novas. Podemos não gostar da sensação, mas não quer dizer que não nos faça bem. Embora não haja consenso, existem teorias que propõem que usar a mão esquerda (para os destros; e a mão 124


direita para os esquerdinos ou canhotos – sem conotação pejorativa), faz com que as conexões neuronais se adensem. Usarmos a mão que não usamos habitualmente é difícil, não é? Mas é através do desconforto que enquanto crianças aprendemos a atar os cordões, a pintar, a escrever, etc. Lembram-se dos nossos cadernos da primeira classe com as letras do alfabeto? Aqueles «A»s mais tortos que uma casa feita de papel? Pois, a nossa caligrafia não foi sempre uma obra de arte, mas conseguimos melhorar os seus traços e a rapidez com que escrevemos. A verdade é que isto da mão esquerda pode ser literal ou metafórico, mas desafiar o nosso cérebro a fazer coisas novas, obriga-nos com certeza a aguçar o engenho e quem sabe, com sorte, até 125

podemos inovar a nossa panóplia de ferramentas para uma maior criatividade. ALGARVE INFORMATIVO #255


OPINIÃO Somos o que comemos Augusto Pessoa Lima (Cozinheiro, Consultor e Formador) efinitivamente, somos o que comemos e nunca a frase foi tão aceite como verdadeira!

Gosto – de bem produzir Gosto – conseguido pelas boas práticas Gosto – conseguido pelo tempo necessário Amar a Terra é amarmo-nos

Comer, hoje, encerra uma forma de fazer política e de fazer agricultura. Produzir produtos agrícolas deveria sempre ser um acto Gastronóm

Sabemos, contudo, ser uma tarefa árdua por variadíssimas questões, como práticas assassinas, escravas do capitalismo desenfreado e do aumento exponencial da população.

Longe vai o tempo em que o que se comia era irrelevante para o meio ambiente e em nada o afetava. A explosão do comércio e indústria, a cavalo da revolução industrial, deu início também à fuga das gentes do interior e do trabalho árduo ligado à agricultura para as grandes cidades com os seus brilhos, confortos e lazeres.

Os cozinheiros do ainda hoje, devem ser o exemplo dos cozinheiros do futuro. Está nas nossas mãos manter a tradição, na sua vertente positiva, mas de forma sustentável. Não precisamos de ter em todos os menus e ementas, camarão, salmão, atum, por exemplo, ou ainda carne de vaca, em tornedós, ou rack de borrego, com corte francês, obrigatoriamente. As possibilidades de criação de pratos saborosos, nutritivos e bonitos, não dependem apenas da imaginação, mas da vontade de tomar para nós, a rutura com a tradição na vertente negativa, que nos «obriga» a ter/fazer, isto e aquilo. Os cereais e leguminosas são tão, tão cativantes, como a confecção de um ossobuco ou de um tomahawk, tão na moda, e os coloridos e versáteis legumes possibilitam aventuras gastronómicas em torno de todas as técnicas culinárias.

O movimento Slow Food, a sua prática, crédito e expansão a nível mundial veio trazer algumas e mui importantes alterações à forma como agíamos e pensávamos. Uma delas é a certeza, hoje, de que jamais poderemos ter gastronomia separada do gosto e ambas sem a preocupação com a sustentabilidade do planeta e a biodiversidade, onde o homem se deve incluir.

ALGARVE INFORMATIVO #255

126


O rabo de boi, as papas, todas, ou as favas, chícharos e feijocas, por exemplo, são hinos à tradição e mais sustentáveis. Os molhos à base de tomate, cebola e alho, ou de legumes, e o abuso do uso de especiarias ervas frescas tornam tudo tão mais descomplicado e aromático. Deveria ser de uso obrigatório, para quem abrisse uma simples casa de pasto ou um restaurante chique, a feitura de um jardim de cheiros e que, na cozinha, estivesse bem à vista um piano de frascos de especiarias. Comprar produtos nacionais deveria ser uma questão dogmática em todos 127

nós, em vez de campanhas populistas sem vontade. A utilização de produtos regionais, os vinhos incluídos, uma obrigatoriedade, por imposição de lei. Por isso, digo que comer deveria ser um acto político também. Deveriam os governos se preocupar com a terra ao abandono, em vez de autoestradas, da tradição das regiões, em vez da regionalização, das sementes usadas, em vez dos pesticidas milagrosos, dos mercados em vez dos outlets e por aí adiante. Somos o que comemos, por isso deveríamos ser o que produzimos . ALGARVE INFORMATIVO #255


OPINIÃO O novo populismo Nuno Campos Inácio (Escritor e Editor) As eleições não se ganham… Perdem-se! inda que a ideia base para a elaboração do presente artigo de opinião não tenha surgido desse facto político, a renúncia do Presidente da Assembleia Municipal de Loulé, Professor Adriano Pimpão, precipitou a elaboração do mesmo, na medida em que despertou a opinião pública para um problema político em crescendo, que, atingindo uma dimensão planetária, também está presente na nossa região: o surgimento de um novo populismo. O populismo sempre fez parte da vida política. Quando se diz que as eleições não se ganham, antes perdem-se, tal tem por premissa o facto irrefutável de que os governantes (a nível local, regional, nacional ou internacional), no exercício do poder, têm uma visibilidade acrescida e a vantagem de mostrar obra feita, enquanto a oposição, na maior parte das vezes, pouco mais tem ao seu alcance do que o exercício retórico. O governante tem de convencer o eleitorado pelo trabalho realizado e pela forma como exerce o poder; o opositor tem de atacar o trabalho realizado, ALGARVE INFORMATIVO #255

tentando demonstrar, com recurso a exercícios retóricos, que poderia fazer mais e melhor. Deste jogo político nascem as promessas dos governantes de que «pretendem dar continuidade ao trabalho realizado e aos projectos iniciados»; e as promessas dos opositores de que, se forem eleitos, muita coisa mudará, iniciando-se um novo rumo, uma nova política, uma nova proximidade, evitando-se erros cometidos. Realizado o acto eleitoral, muitas vezes os governantes mais antigos cimentamse no poder, aumentando a soberba e os desvios de poder. Paralelamente, alguns governantes recém-eleitos, postos à prova, demonstram que tudo o que tinham para dar eram promessas e retórica, desiludindo os eleitores. Esta forma de organização política, que se manteve inalterada em praticamente todos os sistemas democráticos desde o Século XIX, sofreu uma alteração profunda nas últimas duas décadas. A falta de lideranças, o monopólio partidário na actividade política e governativa, o olhar para a política como uma profissão e não como uma missão, o aumento de novos movimentos sociais 128


com o desenvolvimento das redes sociais e a criação de pequenos partidos que começam a colocar em risco a obtenção de maiorias absolutas, deram origem a uma nova forma de populismo: o populismo dos governantes. Cada vez mais, os governantes abdicam da realização de uma boa governação, optando antes pela propaganda. Deixou de interessar o alcance das medidas, das decisões, a utilidade das obras, o benefício colectivo e os sacrifícios para o futuro; o que importa é a imagem que passa para o eleitorado a cada instante, medida a medida, anúncio a anúncio, o cativar permanente das bases eleitorais. É o noticiar que vai fazer obra, que a obra vai ser orçamentada, que vai ser aprovada, que vai a concurso público, que vai ser lançada, que vai ser executada, alimentando durante meses ou anos o foguetório vazio de algo que ninguém vê, mas fica com a esperança de um dia ver. Mas, ainda pior do que a publicidade enganosa, é ver governantes a descerem à lama putrefacta da pior retórica, proferindo ameaças, calúnias e insultos contra os seus opositores. Esta nova forma de populismo governamental, exercido pelos detentores do poder, tem como consequência a radicalização do discurso das oposições e o extremar de posições. A continuar assim, as eleições passarão a ser ganhas por aquele que conseguir ir mais longe na demagogia e no populismo, tornando-se independentes das ideologias e criando cenários de 129

instabilidade política. Os partidos procurarão colar a si o maior número de pessoas da sociedade civil com boa imagem pública, não para que elas realizem um bom trabalho, mas apenas para descartá-las a seguir às eleições, depois de garantirem a manutenção do poder. Se nada for feito para travar este novo populismo, os sistemas democráticos entrarão em falência, sendo substituídos por movimentos absolutistas. Não é uma inevitabilidade, mas é preciso que tenhamos consciência de que a salvação do sistema democrático está na mão daqueles que exercem o poder, a nível local, regional e nacional. Se os próprios perderem essa noção…. ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

130


131

ALGARVE INFORMATIVO #255


DIRETOR: Daniel Alexandre Tavares Curto dos Reis e Pina (danielpina@sapo.pt) CPJ 3924 Telefone: 919 266 930 EDITOR: Daniel Alexandre Tavares Curto dos Reis e Pina Rua Estrada de Faro, Vivenda Tomizé, N.º 12P, 8135-157 Almancil SEDE DA REDAÇÃO: Rua Estrada de Faro, Vivenda Tomizé, N.º 12P, 8135-157 Almancil Email: algarveinformativo@sapo.pt Web: www.algarveinformativo.blogspot.pt PROPRIETÁRIO: Daniel Alexandre Tavares Curto dos Reis e Pina Contribuinte N.º 211192279 Registado na Entidade Reguladora para a Comunicação Social com o nº 126782 PERIODICIDADE: Semanal CONCEÇÃO GRÁFICA E PAGINAÇÃO: Daniel Pina FOTO DE CAPA: Daniel Pina A ALGARVE INFORMATIVO é uma revista regional generalista, pluralista, independente e vocacionada para a divulgação das boas práticas e histórias positivas que têm lugar na região do Algarve. A ALGARVE INFORMATIVO é uma revista independente de quaisquer poderes políticos, económicos, sociais, religiosos ou culturais, defendendo esse espírito de independência também em relação aos seus próprios anunciantes e colaboradores. A ALGARVE INFORMATIVO promove o acesso livre dos seus leitores à informação e defende ativamente a liberdade de expressão. A ALGARVE INFORMATIVO defende igualmente as causas da cidadania, das liberdades fundamentais e da democracia, de um ambiente saudável e sustentável, da língua portuguesa, do incitamento à participação da sociedade civil na resolução dos problemas da comunidade, concedendo voz a todas as correntes, nunca perdendo nem renunciando à capacidade de crítica. A ALGARVE INFORMATIVO rege-se pelos princípios da deontologia dos jornalistas e da ética profissional, pelo que afirma que quaisquer leis limitadoras da liberdade de expressão terão sempre a firme oposição desta revista e dos seus profissionais. A ALGARVE INFORMATIVO é uma revista feita por jornalistas profissionais e não um simples recetáculo de notas de imprensa e informações oficiais, optando preferencialmente por entrevistas e reportagens da sua própria responsabilidade, mesmo que, para tal, incorra em custos acrescidos de produção dos seus conteúdos. A ALGARVE INFORMATIVO rege-se pelo princípio da objetividade e da independência no que diz respeito aos seus conteúdos noticiosos em todos os suportes. As suas notícias narram, relacionam e analisam os factos, para cujo apuramento serão ouvidas as diversas partes envolvidas. A ALGARVE INFORMATIVO é uma revista tolerante e aberta a todas as opiniões, embora se reserve o direito de não publicar opiniões que considere ofensivas. A opinião publicada será sempre assinada por quem a produz, sejam jornalistas da Algarve Informativo ou colunistas externos. ALGARVE INFORMATIVO #255

132


133

ALGARVE INFORMATIVO #255


ALGARVE INFORMATIVO #255

134


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.