

ALGARVE INFORMATIVO
22 de fevereiro, 2025








ÍNDICE
UAlg entregou Bolsas de Excelência (pág. 18)
9.ª Mostra Silves Capital da Laranja (pág. 28)
Messines foi palco de prova de Duplo Mini Trampolim e Tumbling (pág. 40)
Teatro Improviso de Intervenção festejou 25.º aniversário (pág. 64)
Marlene Guerreiro (pág. 76)
Colectivo JAT - Janela Aberta Teatro inova com curso de mimo para crianças (pág. 86)
«Não é Amor» de Catarina Branco no Centro Cultural de Lagos (pág. 102)
OPINIÃO
Paulo Cunha (pág. 118)
Mirian Tavares (pág. 120)
Fábio Jesuíno (pág. 122)
Sílvia Quinteiro (pág. 124)












Bolsas de Excelência da Ualg já premiaram 774 estudantes,
totalizando
um apoio de mais
de
626 mil e 560 euros
Universidade do Algarve realizou a 13.ª edição das Bolsas de Excelência, numa sessão pública que decorreu, no dia 6 de fevereiro, no Grande Auditório Caixa Geral de Depósitos, no Campus de Gambelas. No ano letivo de 2024/2025 foram atribuídas 107 Bolsas de
Excelência, que pagam integralmente a propina do 1.º ano de Licenciatura e/ou Mestrado Integrado, fixada em 697 euros. Esta edição contou com a participação de 57 empresas e entidades e um apoio monetário de 74 mil e 579 euros. Desde o seu início, no ano letivo 2012/13, a iniciativa já premiou 774 estudantes, totalizando um apoio de mais de 626 mil e 560 euros.
Texto: Daniel Pina| Fotografia: Universidade do Algarve
Todos os alunos que ingressaram na Universidade do Algarve através do Concurso Nacional de Acesso ao Ensino Superior em primeira opção, com nota de candidatura igual ou superior a 17 valores, foram premiados com uma bolsa de excelência. Nos termos do regulamento, também foram seriados para atribuição de Bolsa os estudantes colocados com a melhor nota, no respetivo curso, que ingressaram com uma nota de candidatura igual ou superior a 15 valores.
Do ponto de vista das entidades e empresas, é muito importante atrair e apoiar o mérito dos alunos. Para Paulo Jorge Evangelista, membro do Conselho de Administração da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo do Sotavento Algarvio, mais do que um apoio financeiro, estas bolsas representam um voto de confiança
no potencial dos estudantes e na certeza de que continuarão a trilhar um caminho de excelência. No seu discurso referiu-se ainda à rede de apoio fundamental que também contribui para este sucesso académico, “a família, os amigos e os professores que ajudaram a moldar estes alunos, instigando a sua curiosidade, o pensamento crítico e a sede de saber”
Paulo Jorge Evangelista deixou “um agradecimento à UAlg que, com eventos como este reforça, o seu compromisso em reconhecer o mérito académico e em fomentar o talento”.
Na sua opinião, “o investimento na Educação não se faz apenas através da transmissão do conhecimento, mas também criando oportunidades, estabelecendo parcerias e oferecendo as ferramentas necessárias aos


estudantes para que se tornem os grandes profissionais de amanhã”. A terminar, destacou o papel crucial das entidades e empresas que, através do seu apoio e investimento, tornam possíveis estas bolsas. “Este contributo não só se reflete na vida dos estudantes, mas também no futuro do mercado de
trabalho e da sociedade, pois apostar na formação de excelência é garantir profissionais altamente qualificados, inovadores e capazes de responder aos desafios do mundo atual”.
Joana Baião, natural de Almada, frequentou a Escola Artística António

Arroio, em Lisboa, e ingressou na Universidade do Algarve, em primeira opção, no curso de Imagem Animada, com 19,22 valores. Na opinião da estudante, “ser aluno de mérito não deve representar apenas boas notas, deve representar o diálogo e compreensão entre colegas, a
dedicação no trabalho e o respeito pelos professores, pelo ensino e viceversa”. Questionada sobre qual a receita para o sucesso académico, considera que os “ingredientes principais são a motivação e a empatia, ou seja, se não houver uma futura profissão, uma vida idealizada, uma paixão como aquela

que eu tenho pela arte, que seja então o próprio facto de aprender e ficar a saber o suficiente para ajudar quem não sabe, colega ou não, o motivo para nos dedicarmos”. “Acredito que a própria partilha de conhecimento é valiosa”, reforça.
No entanto, refere, “não quero de todo passar uma imagem de ingratidão, porque cada apoio e cada bolsa são verdadeiramente valiosos para todos nós, mas isto vai além do sentido financeiro” “Com boa Educação teremos bons profissionais, mas, acima de tudo, bons cidadãos. Por isso é que é extremamente relevante motivar o mérito, nunca esquecendo de o possibilitar a todos, através do respeito mútuo e dos investimentos certos” Numa sessão que premeia o mérito dos estudantes, Joana terminou o seu discurso deixando agradecimentos “à
Universidade do Algarve, que me tem recebido tão bem e que me ofereceu esta oportunidade de discursar, a todos os apoiantes desta bolsa, aos meus professores que nunca duvidaram da minha motivação para o sucesso e que até a protegeram, aos meus amigos que tornam este percurso tão divertido e, acima de tudo, à minha família, a quem devo tudo”
Como o mérito é também o resultado do trabalho desenvolvido pelos professores, desde o ensino básico ao secundário, culminando no universitário, e como a Universidade do Algarve é um parceiro de todos os agentes educativos, Renata Afonso, diretora da Escola Secundária de Loulé, discursou em representação dos diretores dos agrupamentos de escolas. A diretora iniciou o seu discurso mencionando a diversidade geográfica das escolas dos
alunos premiados, o que “confirma a atratividade e o excelente trabalho científico e académico que é realizado nesta casa”. Na sua opinião “é um privilégio poder contar com uma Instituição que tanto colabora com as escolas, que se constitui como um reconhecido polo de desenvolvimento para a região do Algarve”.
A diretora salientou o papel fundamental das Escolas no desenvolvimento destes jovens, que, ao longo de 12 anos de escolaridade, se depararam com alguns obstáculos e adversidades, mas souberam-nos ultrapassar com resiliência, espírito de sacrifício, empenho e dedicação. “A Escola não é apenas um lugar onde se aprendem conteúdos e conceitos, é um ambiente de formação de valores para o crescimento emocional e para a
preparação para o futuro”. Ciente das grandes mudanças que ocorreram com a sociedade digital, onde a tecnologia desempenha um papel de extrema relevância em todos os aspetos da nossa vida, incluindo a Educação, Renata Afonso reconhece que também a Escola, onde o professor era o emissor de conhecimentos, e o aluno um mero recetor da informação, está em mudança, ou já terminou. “O aluno do seculo XXI pertence a uma nova geração que cresceu com as novas tecnologias e apresenta outros interesses e outras formas de aprender. Neste contexto, lidar com a diferença na sala de aula é a regra, não a exceção. O modo como cada pessoa aprende é tão único como a sua impressão digital, pelo que cada um tem as suas necessidades, potencialidades e interesses distintos”.


A terminar a sua intervenção, frisou a importância de, no mundo em transformação, serem cidadãos ativos e interventivos, e, numa alusão à «Pedra Filosofal» de António Gedeão, dirigiu-se aos estudantes, deixando-lhes em conselho: “Nunca abandonem os vossos sonhos, nunca deixem de sonhar”
Paulo Águas agradeceu aos estudantes a escolha desta Universidade para prosseguirem os seus estudos, recordando que a UAlg tem vindo a recrutar nos últimos cinco anos mais de 1.500 estudantes, na primeira fase do Concurso Nacional de Acesso ao Ensino Superior, ou seja, mais de 90 por cento das vagas disponíveis, apresentando também neste período de tempo uma ocupação superior média nacional, sendo que, no presente ano letivo, 95 por cento das vagas foram ocupadas na primeira fase. Estes resultados são, no seu entender, uma prova da confiança dos estudantes e das famílias.
Dirigindo-se aos estudantes, incentivouos a lutarem pelas suas causas e a não ficarem indiferentes. “Reflitam bem, não deixem de ser jovens, acreditem naquilo que são e no que podem ser, tenham paixão. É muito importante estudar, mas também é muito importante crescer como cidadãos”. Além do estudo, na sua opinião, existem valores que são muito importantes: o humanismo, a integridade e a seriedade. “O mundo é muito competitivo, mas essa competitividade não nos deve impedir de fazer tudo o que é de bom”, defendeu, antes de agradecer, uma vez mais, às empresas, que apoiam este projeto.
A finalizar, apontou o efeito de «contágio» que os estudantes premiados devem ter, impelindo-os a contagiar os seus colegas para o bom desempenho escolar. Mas, acima de tudo, deixa um incentivo: “sejam muito felizes e façam os outros felizes”





Melhor laranja do mundo esteve em evidência em Silves
A 9.ª Mostra Silves Capital da Laranja realizou-se entre 14 e 16 fevereiro com dezenas de expositores, produtores ligados à citricultura, associações locais e entidades regionais a preencherem o recinto da FISSUL.
Durante três dias, quem visitou a mostra saboreou e desfrutou dos melhores produtos locais e regionais, vinhos, gastronomia variada, doçaria, artesanato original, sempre com a presença da melhor laranja, a de Silves. No dia 14 de fevereiro, a par da inauguração oficial, houve lugar à habitual Conferência Laranja XXI, cuja temática em debate era de extrema relevância, «A Água que Une», pretendendo, uma vez mais, dar voz aos
agricultores e a este setor de atividade de especial importância para o concelho de Silves.
Ao longo do fim de semana foram muitas as atividades a decorrer, desde o Concurso Internacional de Cocktails –Silves Capital da Laranja ao debate «Micro, Pequenas e Médias Empresas –Que apoios? Que instrumentos financeiros? Que incentivos?», na qual a Confederação Portuguesas das Micro, Pequenas e Médias Empresas, em parceria com a Vicentina – Associação para o Desenvolvimento do Sudoeste, respondeu a todas estas perguntas. Aconteceu ainda o Seminário «As Alterações Climáticas e a Citricultura», em que a Universidade do Algarve trouxe

Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina


uma visão prática de projetos de agricultura mais eficiente. Como não podia deixar de ser, a 9.ª Mostra Silves Capital da Laranja também registou atuações variadas de música e dança tradicional, pontificando as atuações de Carminho, Os Quatro e Meia e Rouxinol Faduncho, espaços dedicados aos mais pequenos e, ainda, a Marcha dos Namorados, também já uma referência
na região do Algarve. Pelas ruas da cidade de Silves, a laranja foi igualmente a rainha com a realização da 9.ª edição do Fim de Semana com Sabor a Laranja, na qual os restaurantes aderentes apresentaram pratos criativos e diversificados nos quais o sabor principal foi a característica e excecional Laranja de Silves.






















Messines foi palco de prova de Duplo Mini Trampolim e Tumbling
Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina
Pavilhão da Casa do Povo de São Bartolomeu de Messines acolheu, nos dias 8 e 9 de fevereiro, o Torneio de Iniciação, Encontro Territorial Benjamins e Encontro Territorial DMT e TUM, numa organização da Associação de Ginástica do Algarve com o apoio da Casa do Povo de São Bartolomeu de Messines. Num fim-de-semana que serviu também para apurar atletas para os campeonatos nacionais de duplo mini trampolim e tumbling, estiveram em prova largas
dezenas de jovens pertencentes à AGT –Associação Gimnochamps de Tavira, à APAGL – Associação de Pais e Amigos da Ginástica de Loulé, ao CADB – Clube Academia Desporto de Beja, ao CDAPOR – Clube Desportivo AlgarveGym Portimão, ao CEDF – Clube Educativo e Desportivo de Faro, à CPSBM – Casa do Povo de São Bartolomeu de Messines, ao GCLa – Ginástica Clube de Lagos, ao GCLo – Ginástica Clube de Loulé, ao GDCE – Grupo Desportivo e Cultural Enxerim, ao GGC – GimnoFaro Ginásio Clube e ao NSO – Núcleo do Sporting de Olhão.





























































































Teatro Improviso de Intervenção festejou 25 anos de vida no dia e local onde foi a cena a sua primeira peça
Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina
Teatro Improviso de Intervenção assinalou, no dia 27 de janeiro, na sede do IPDJ –Instituto Português do Desporto e Juventude, em Faro, o seu 25.º aniversário com a apresentação do livro «Nove Dramaturgias para Consumo Sustentável» de Teresa Henriques e Teresa Coutinho. Uma data que coincidiu
precisamente com a ida a cena da primeira peça do Teatro do Improviso, «A tradição já não é o que era», na altura no antigo IPJ, num final de tarde, início de noite, que contou com diversos convidados que partilharam a sua experiência com esta estrutura, incluindo Rogério Bacalhau, presidente da Câmara Municipal de Faro.
A par da leitura de trechos do livro por jovens atores, a apresentação formal da




obra ficou a cargo de Ana Oliveira, presidente da direção da Música XXI e coordenadora de outro projeto emblemático de teatro da região, o Tapete Mágico. “Se o teatro é a arte do efémero, um livro pode ser o guardião das palavras. E se nós, encenadoras, criamos as palavras que se tornam acto, é através do livro que as palavras se regressam à substância transformadora que transparece numa memória coletiva. O livro das autoras Teresa Henriques e Teresa Coutinho é um objeto, não só necessário, como útil para todos os formadores que trabalham com os jovens a partir da arte dramática. Simbólico na forma e no conteúdo, este livro revela-se um sério instrumento pedagógico”, considera Ana Oliveira.
A obra é uma homenagem a todos aqueles que percorreram os labirínticos caminhos do Teatro Improviso de Intervenção. “E a caminhada neste livro
começa com uma muito competente apresentação do comissário do Plano Nacional das Artes, Paulo Pires do Vale, que focaliza o seu discurso na metáfora do grande teatro do Mundo, no qual todos somos autores e espectadores. Na responsabilidade que cada um de nós, enquanto agentes da educação e da cultura, e, consequentemente, promotores de um olhar responsável e comprometido face à sociedade, não pode descartar. Este caminho que se nos apresenta fértil prossegue com uma das vozes mais influentes e interessantes da cultura ao nível nacional. Adriana Freire Nogueira, a última Diretora Regional da Cultura do Algarve, mostra como o grupo de Teatro Improviso de Intervenção transcendeu a condição do contexto escolar, assumindo-se com o estatuto de Associação Cultural num modelo que mais facilmente se alarga a outros públicos que partilham das mesmas e constantes inquietações que os




primeiros dramaturgos da cultura ocidental nos apresentaram”, referiu Ana Oliveira.
A escalada cronológica do livro termina em 2021, com nove peças teatrais que serviram de base aos espetáculos encenados e produzidos no grupo, escritas por Teresa Henriques. “Estas dramaturgias de consumo sustentável são muito mais que meia dúzia de objetivos que entraram no consumo rápido das palavras aplicadas para se conseguir o financiamento para um projeto. Estas dramaturgias descarnam os fios das palavras, provocando o choque que devolve à vida a nossa humanidade moribunda. Dramaturgias sustentáveis para que se refaçam, reciclem e recuperem os valores da igualdade, da dignidade, do afeto. Para que se rejeitem, removam e renunciem as atitudes de violência, desprezo,
intolerância”, sublinhou Ana Oliveira, lembrando que, “para abrir o corpo e a voz à sustentabilidade dos valores esteve a coragem de 65 raparigas e 19 rapazes que, subindo para o palco, na sua grande maioria pela primeira vez, não contiveram o gesto que abria a palavra ao espectador”. “Eles foram os arautos do efémero. O livro guardou as suas palavras para que outros gestos preservem a memória, desta mudança que urge fazer, inquietando novos corações e tornando este mundo num lugar onde apetece viver. É este o simbolismo que se torna presença”, terminou, perante o olhar atento da plateia. E, depois de mais alguns trechos lidos por convidados e partilhas de memórias, ainda houve tempo para se cantar os parabéns e soprar as velas do bolo do 25.º aniversário do Teatro Improviso de Intervenção.













“Os jovens podem, e devem, bater à nossa porta para apresentar as suas ideias e projetos”, afirma Marlene
Guerreiro,
vice-presidente
da Câmara Municipal de São Brás de Alportel
Texto: Daniel Pina|
brasenses, reafirmando o compromisso do Município com a inclusão social e a promoção da igualdade de oportunidades no acesso à formação artística. Até ao momento já foram concedidas perto de uma dezena de bolsas a jovens que se encontram em formação nas áreas da música, canto, dança e artes plásticas, podendo o programa integrar as mais diversas manifestações artísticas, de modo a contribuir para o desenvolvimento de talentos locais e


vezes, é o mais difícil. Na altura, quando um jovem não tinha referências, não estava a gostar da escola, os resultados não eram os desejados, tentava perceber o que é que ele gostava de fazer para além da escola, e muitos admitiam ter curiosidade em tocar uma guitarra ou acordeão, em desenhar ou pintar, em dançar”, conta a vereadora com os pelouros da Juventude, Cultura, Educação e Ação Social, entre outros. “Por vezes faz toda a diferença canalizar a energia para algo que estas famílias não têm possibilidade de proporcionar. Ao estarem a aprender uma arte, as crianças estão bem entretidas naquele período de tempo, vão-se sentir mais integradas e felizes, mais iguais a todos os outros”
De facto, mesmo antes de existir o projeto das Bolsas Artísticas Solidárias, o Município de São Brás de Alportel já concedia apoios desta natureza através do Fundo Social de Emergência e com a colaboração das associações locais que prestam serviços no desporto e cultura. A arte servia, assim, como uma ponte, uma forma de integrar estes jovens, e agora foi possível fazer um upgrade, dar um passo maior, com a ajuda da associação de beneficência Helping Hands e do Rotary Club Estoi Palace International. “Não estamos a falar apenas de casos de grave carência económica, daquelas crianças que estão no limiar de pobreza, que infelizmente existem, e para as quais existem, felizmente, mais apoios, quer a nível do poder central, quer a nível das autarquias. Há cada vez mais famílias da classe média onde o rendimento é contado ao cêntimo,

serve apenas para o essencial, porque o custo de vida e as despesas com a habitação dispararam”, observa a entrevistada. “Não queremos que seja por falta de rendimento económico que um jovem com aptidão para as artes não tenha a desejada formação. Claro que nem todos eles vão depois seguir uma carreira artística, mas esta formação é sempre importante para o seu desenvolvimento pessoal, para se sentirem mais felizes, para terem mais autoestima. E os meninos não são apontados em lado nenhum como tendo esta bolsa, é um processo interno

entre a autarquia e as associações”, esclarece Marlene Guerreiro.
Como é óbvio, há critérios a respeitar para se ter acesso a estes apoios socioeconómicos, nomeadamente o nível de rendimento da família (mas esse limiar é generoso), ser residente no concelho e frequentar essa formação no concelho, embora também possam ser apoiados jovens que tenham aulas fora do concelho se essa atividade não existir em São Brás de Alportel. “A Helping Hands e o Rotary Club Estoi Palace International contribuem com 1.500 euros anuais
para este projeto, toda a verba que exceder é suportada pela autarquia. As nossas bolsas vão desde os 3 anos até aos 25 anos, a pensar naqueles que continuam a viver na sua terra”
Um orgulho imenso no talento local
A qualidade, o talento, o empreendedorismo da juventude sãobrasense, já são bem conhecidas do público em geral, apesar de se tratar de um concelho pequeno e situado em plena

Serra do Caldeirão. Uma realidade que deixa Marlene Guerreiro bastante orgulhosa e que é também fruto de São Brás de Alportel estar «no centro do universo», como costumam dizer.
“Temos os são-brasenses de berço, que derivam desta gente de trabalho, com muita fibra e brio na sua terra, mas também temos tido o privilégio de receber muitas pessoas que vêm de fora, que escolhem São Brás para viver. Temos, felizmente, muitos jovens que
nascem dessas famílias são-brasenses de coração e que depois beneficiam de todos estes projetos culturais. O resultado é uma comunidade talentosa, válida e bem preparada para o futuro”, descreve a vice-presidente. “São casos sérios de sucesso, de enorme mérito”, reforça, sorridente.
Perante este cenário, o Município dedica uma atenção especial aos mais jovens, embora tal seja um desafio

exigente quando os orçamentos não são muito elevados. “É como gerir uma casa onde há muita união, solidariedade e fraternidade, mas não há todo o dinheiro que se gostava de ter. Avaliamos as prioridades muito bem e procuramos estar bastante próximos da população para percebermos aquilo que faz mais falta”, assume Marlene Guerreiro. “Apoiamos todas as associações culturais para que estas iniciativas possam surgir, temos uma
escola de música que também é responsável pela banda filarmónica, temos projetos de dança e artes plásticas e o teatro foi a manifestação artística que deu o maior salto nos últimos anos. Tentamos estar sempre ao lado das iniciativas, trazendo grandes vultos a São Brás para ministrar oficinas, e outra chave de todo este sucesso é a proximidade muito estreita que há com o Agrupamento de Escolas, que também está a apostar nas Artes de forma intensa”, enaltece Marlene Guerreiro.
Dá-se formação, dão-se as ferramentas, as oportunidades para aprender, mas dáse também o palco nos grandes eventos que acontecem em São Brás de Alportel, com o maior exemplo a ser a Feira da Serra, onde o palco principal é aberto, todas as noites, por um projeto local, para além de existir um Palco Jovem onde muitos artistas se dão a conhecer pela primeira vez ao grande público. “Na última edição, por exemplo, ouvi falar mais dos grupos com adn são-brasense do que dos cabeças-de-cartaz. As pessoas ficaram verdadeiramente surpreendidas com a qualidade que existe em São Brás”, revela a autarca. “Há grupos e bandas da terra que se preparam o ano todo para lançarem os seus novos trabalhos na Feira da Serra e isso também nos motiva para seguir este caminho. Nós apostamos nos valores da terra e eles fazem questão de apresentar as suas novidades, pela primeira vez, no maior evento que se organiza na sua terra”

O
sonho de uma
Oficina de Artes e de um Auditório
Está visto que matéria-prima não falta, vontade da autarquia em apoiar as novas gerações também não falta, será que faltam equipamentos ou espaços? “Não diria que há carências nessa matéria, mas temos grandes sonhos. Em virtude do crescimento demográfico acentuado que se tem verificado nos últimos anos, estamos a precisar – e temos projetos para tal – de ampliar escolas e construir escolas novas. É algo que nos deixa muito contentes, mas é um desafio enorme. Em termos culturais, vamos reabilitando o nosso Cineteatro de forma faseada, mas a principal sala de cultura do concelho precisa, de facto, de mais algumas intervenções para estar à altura das exigências atuais e futuras”, responde Marlene Guerreiro,
acrescentando que outros sonhos têm estado dependentes da existência ou não de financiamentos públicos. “Temos o projeto para uma Oficina das Artes num antigo lagar de azeite para apoiar um conjunto de artes e ofícios ancestrais que estão em extinção e que teria uma escola de carpintaria e gabinetes para jovens ligados ao design, às artes visuais, ao artesanato. Seria uma vertente mais criativa para complementar os vários espaços de coworking que existem no concelho”, adianta a vereadora.
Para sul do São Brás Cineteatro Jaime Pinto há outro sonho, um quarteirão cultural onde seria construído um auditório médio para acolher várias iniciativas, mas o executivo liderado por Vítor Guerreiro também não esconde a vontade de criar um grande ninho para associações, assim houvesse
oportunidades de financiamento. “Não há grandes carências, mas sim sonhos para estarmos à altura da riquíssima comunidade que temos. Queremos que os nossos jovens cresçam, que tenham formação, e que depois fiquem em São Brás de Alportel para prosseguir os seus sonhos, mas esse é o grande desafio dos tempos atuais”, admite Marlene Guerreiro. “Há jovens que tiram os seus estudos superiores em cidades como Lisboa e Porto e por lá constroem a sua carreira, mas o Algarve também já tem muitas oportunidades que lhes permitem ficar nas suas terras. Neste momento temos dois ou três jovens a fazer formação musical no ensino superior, quando, antigamente, havia um em cada geração. É natural que, em São Brás de Alportel, não consigam todos encontrar uma resposta profissional para uma formação deste gabarito, mas estamos no centro da
região. Outra jovem, por exemplo, tirou formação superior em dança e regressou a casa para dar aulas às suas conterrâneas. É como semear novamente na sua terra aquilo que dela recebeu”, observa a entrevistada. “Num município de média dimensão como o nosso, não podemos esperar que os jovens fiquem cá todos. É perfeitamente normal que voem, façam o seu percurso noutros sítios, e depois voltam a São Brás de Alportel para aqui prosseguirem as suas carreiras. Veja-se o Ricardo Martins, um virtuoso da guitarra portuguesa, que vive apenas da música e já atuou nos quatro cantos do mundo, estando sedeado em São Brás de Alportel. Os jovens podem, e devem, bater à nossa porta para apresentar as suas ideias e projetos. Gostamos de apoiar os nossos artistas, dar-lhes espaço, encaminhá-los para outras oportunidades”



COLECTIVO JAT – JANELA ABERTA COM O PRIMEIRO CURSO DE
Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina

ABERTA TEATRO INOVA DE MIMO PARA CRIANÇAS


stão a decorrer, até meados de março, na sede do Gimnásio Clube de Faro, as aulas do primeiro curso de mimo para crianças dinamizado pelo
Colectivo JAT – Janela Aberta Teatro, dedicado aos mais jovens com o intuito de estimular o desenvolvimento das suas habilidades expressivas através de jogos teatrais, técnicas do mimo e criação de personagens. Mimo, Pantomima, Mimo Corporal Dramático e exercícios de expressão corporal servem de base para criar personagens e situações, usando unicamente o corpo, sob as indicações das jovens atrizes Catarina Sagreira e Daniela Veiga.
Diana Bernedo e Miguel Martins Pessoa, diretores do JAT, com mais de 20 anos de
carreira e um sólido percurso na área da docência em território nacional e internacional, assumem a direção artística deste novo curso, que vem complementar e enriquecer a oferta formativa em teatro no Algarve e afirmar a posição da companhia como a única «Escola» de teatro na região que proporciona ininterruptamente, desde 2017, dois cursos regulares, um de Teatro Físico e outro de Formação de Atores, para além de muitos outros pontuais, em diversas disciplinas do teatro. “Já tínhamos feito alguns cursos de mimo em Lagos, Loulé e Vila Real de Santo António, a convite dos agrupamentos de escolas, e ficámos com a sensação de que seria uma boa aposta, porque há muita procura para esta formação. A linguagem do teatro físico e do mimo é facilmente dominada pelas crianças, pela natureza do jogo e da brincadeira,







pela expressão física, pelos desenhos animados que assistem. A linguagem da voz e do texto é mais elaborada e exigente nestas idades, enquanto o mimo tem o mundo do sonho que as crianças adoram”, refere Miguel Martins Pessoa.
O primeiro curso de mimo para crianças do JAT está a ser frequentado por jovens que, alguns, até já tinham um relacionamento com esta estrutura teatral, devido aos muitos espetáculos que organiza com grupos da comunidade. Outros, porém, eram perfeitamente desconhecidos, e Diana Bernedo admite que foi arriscado abrir um curso em janeiro, já com o ano letivo a decorrer. “Sabemos que, nesta altura, muitas crianças já têm as suas atividades extracurriculares, seja nas artes ou no desporto, mas é preciso formar novas gerações, não só de atores, mas até de públicos. Os miúdos entram muito bem nesta poética de interpretar metáforas
através do corpo, embora o mimo não seja uma arte ou linguagem infantil. E os próprios adultos sentem-se bastante conectados com esta expressão, é um vínculo visceral absolutamente extraordinário”, observa a atriz e encenadora. “No mundo do teatro, onde o espaço está vazio, tudo é possível, e assim acontece com o mimo. O saltar espaços, o avançar depressa ou lentamente, o interpretar em câmara lenta, é, de facto, quase como desenhos animados, daí os jovens se identificarem tão depressa com o mimo”, acrescenta.
Com cursos abertos para Teatro Físico ou Formação de Atores a partir dos 14 anos, o mimo é, precisamente, uma das disciplinas ministradas no primeiro, aliás, é a linguagem troncal, e os responsáveis do JAT verificavam que poucos formandos chegavam já com ela no corpo. Daí nasceu a necessidade de preparar a «canteira», como se diz no




futebol, mais cedo, para que ganhassem essa bagagem. “Como é um curso de apenas três meses, não há tempo para abarcar outras linguagens como a máscara, o grotesco ou a commedia dell’arte, algo que seria genial com crianças, optamos por escolher a mais universal, o mimo”, explica Miguel Martins Pessoa, adiantando que escolher Catarina Sagreira e Daniela Veiga para formadoras foi algo natural e intuitivo. “O JAT tem muitas atividades e nós os dois estamos envolvidos em todas elas, seja como encenadores, atores ou produtores, e o projeto tem vindo a crescer imenso nos últimos anos: é o Festival MOMI, o Teatro Comunitário, os nossos espetáculos profissionais que andam constantemente em digressão pelo mundo. Ao mesmo tempo, queríamos dar uma oportunidade a estas duas jovens para se integrarem no mercado de trabalho a nível da
formação, porque fazem parte da companhia, já realizaram imensas formações connosco e porque estão também no último ano do curso de Artes do Espetáculo da Tomás Cabreira”, indica Miguel Martins Pessoa. “Para além disso, ao serem jovens, têm uma maior empatia e conexão com as crianças”
“Eles têm que brincar, jogar, experimentar, e, se gostarem, então que continuem no teatro”
Mimar é imitar e, como Diana Bernedo salienta, as crianças são, por natureza, «profissionais da imitação», carecendo apenas de ferramentas para que tenham uma maior consciência do que estão a fazer. “As medidas, a proporção, a dimensão dos gestos, a projeção do corpo, tudo tem energias e técnicas
especificas. Aqui, estão a aprender tudo isso de forma lúdica e a desfrutar da experiência”, nota a entrevistada. “Claro que nem sempre é fácil porque, depois de estarem o dia todo na escola, os miúdos querem é ser selvagens, e nós aproveitamos essa genuinidade para os orientar, seja para o mimo, a pantomima, o lirismo ou a ação do movimento. Trabalhamos com eles individualmente, mas como grupo também, porque é fundamental saberse trabalhar com outras pessoas, em equipa”
Apesar de ser um curso de iniciação, a verdade é que, à semelhança do que acontece nos outros cursos ministrados pelo Colectivo JAT, haverá um espetáculo final, um objeto artístico para apresentar às famílias. “É um momento quase obrigatório, apesar de não ser o objetivo primordial de uma formação com estas características. No entanto, a
criação de um espetáculo, o processo de encenação, o estar à beira do ensaio geral, a estreia, tudo isso faz parte desta caminhada. O teatro é feito para um público, não para estarmos numa sala a efetuar uma série de exercícios”, frisa Miguel Martins Pessoa. “As aulas têm uma componente de técnica, outra de jogo, e outra de criação, porque, no JAT, temos a premissa de que formamos atores/criadores e não apenas atores/executantes. A Catarina e a Daniela têm estado a provocar uma série de criações, as crianças vão montando várias cenas, eu e o Miguel vamos supervisionando”, descreve Diana Bernedo. “No fundo, haverá muita encenação por parte da Catarina e Daniela, com base na criação dos miúdos e miúdas, porque todos temos a capacidade de ser criativos, de imaginar, sejamos adultos ou crianças. Elas vão recolher essa imaginação e ordená-la poeticamente, e já têm uma




grande bagagem para o fazer, não só a aprender connosco, mas também com os professores da Tomás Cabreira, onde realizam muitas peças. Nós damos as nossas opiniões, algumas orientações, e o produto final será mais um espetáculo com o carimbo JAT”, declara Miguel Martins Pessoa.
Sem pressão nem colocar a fasquia muito alta, simplesmente aprender e desfrutar da experiência, assim tem sido a postura do Colectivo JAT – Janela Aberta Teatro neste primeiro curso de mimo para criança. “Eles têm que brincar, jogar, experimentar e, se gostarem, que continuem no teatro. É normal que haja miúdos com maior aptidão natural do que outros, mas isso não significa que, daqui a três, quatro ou cinco anos, esses miúdos sejam atores e que os outros, por oposição, não se tornem atores devido ao seu empenho e dedicação. Este curso de
três meses é o ano zero, abrimos a meio do ano letivo, não queremos criar demasiadas expetativas”, aponta Miguel Martins Pessoa, lembrando que, casos estas crianças e jovens queiram continuar a fazer teatro com o JAT, podem fazer a transição para os grupos de teatro comunitário existentes em Faro e Quarteira.
Importante é também criar novos hábitos nas crianças, afastá-las das consolas, das televisões e telemóveis, alerta Diana Bernedo. “Os problemas de saúde mental são cada vez mais frequentes nas jovens e aquilo que o mundo do teatro lhes proporciona é muito mais intenso e gratificante do que qualquer jogo de telemóvel ou consola, ou qualquer coisa que vejam na televisão”, garante a atriz e encenadora. “O teatro é uma arte milenar, segura, em que podemos confiar, e os miúdos acabam por ser




também os nossos mestres. Ou estão a cem ou a zero, e precisamos disso, porque o teatro também vive de extremos. Com estes cursos aprendem a jogar em equipa, para o bem comum, e a ultrapassar obstáculos que aparecem de forma imprevista. É a peripécia do herói que faz parte da vida e está a correr muito bem. A Catarina e a Daniela são estupendas, estão connosco desde que tinham 13 anos, confiamos imenso nelas para dar estas aulas, que, para os formandos, são aulas normais, mas, para mim e o Miguel, são autênticas masterclasses. Estamos a aprender com todos eles”, destaca Diana Bernedo.
O balanço está, por isso, a ser positivo, a edição deste ano do Festival MOMI deverá ter, pela primeira vez, workshops para crianças, e o curso de mimo para crianças é para manter, se bem que a sua planificação ainda não esteja fechada.
“Como o MOMI vai acontecer no início de novembro, não sabemos se vamos conseguir abrir o novo curso logo no arranque do ano letivo 2025/26, mas ele vai ser realidade. A história do mimo é milenar e sentimos uma necessidade enorme de transmitir esta linguagem e forma de atuar”, confessa Miguel Martins Pessoa. “Há que preparar o corpo para entrar no mundo poético e, acima de tudo, combater o rótulo de que o mimo é aquele senhor com cara branca, luvas brancas e camisola às riscas que está fechado numa caixa. O mimo é uma linguagem, uma arte, não é uma personagem”, distingue. “O mimo permite utilizar mil e uma personagens diferentes, contar mil e uma histórias, cómicas, dramáticas, trágicas, simbólicas, poéticas, elevadas, trenais, do subsolo”, concluem os diretores artísticos do Colectivo JAT – Janela Aberta Teatro.






«NÃO É AMOR»,

NO DIA
Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina

Auditório Duval
Pestana do Centro Cultural de Lagos assinalou o Dia dos Namorados, 14 de fevereiro, de forma especial, com a apresentação de «Não é Amor», de Catarina Branco. Trata-se de um projeto de criação artística em dança que pretende abordar o tema da violência de género, considerando outros marcadores que acentuam a desigualdade de género.
“Pretende-se explorar o corpo como um acumulador de memórias, dando lugar à (re)escrita da dramaturgia do corpo e à possibilidade de (re)inventar a sua
matéria e cartografia”, descreve a coreógrafa.
Em parceria com a CIG – Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género e a APAV – Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, procura-se integrar mulheres sobreviventes de violência doméstica num processo criativo conjunto com artistas, para uma maior abertura à inclusão social, cultural e a diferentes métodos de criação artística. Este projeto pretende valorizar a diversidade humana, promover a igualdade de género e combater a discriminação étnico-racial na sociedade atual. Em palco, «Não é Amor» foi protagonizado de forma intensa e impactante por Bárbara Hoerlle Vasconcelos e Deivid Correia.
































Os surdos também cantam!
Paulo Cunha, professor
o longo dos vinte e cinco anos em que lecionei Educação Musical a alunos surdos, nunca tive nenhum que, para além de não ouvir, também não falasse. Por isso mesmo, sempre estranhei grande parte das pessoas se referirem aos meus alunos como se fossem surdos-mudos, como se ser surdo implicasse necessariamente ser mudo. Infelizmente, o facto de ver os surdos a comunicarem através de gestos e de não os ouvir, induz o senso comum a acrescentar a mudez à surdez.
Sendo a voz um dos meus maiores recursos para ensinar música, desde logo comecei a tentar experimentar o uso da mesma por parte dos alunos algarvios que não tinham sido bafejados com o sentido da audição. Desde o início, tal aspiração revelou-se uma tarefa trabalhosa e árdua, tendo em conta a anterior falta de estímulo para o uso da sua voz.
Para desenvolver a fala é essencial a exposição aos sons da dicção desde a infância. Consequentemente, as pessoas que nascem surdas ou que perderam a audição numa idade precoce não têm esse contacto fundamental, podendo a privação auditiva afetar também o desenvolvimento neurológico relacionado com a linguagem. É por isso uma tarefa difícil, mas gratificante, acrescentar ao
uso da Língua Gestual Portuguesa a descoberta da voz como mais uma forma de comunicação.
O tempo de trabalho e convívio com a comunidade surda ensinou-me que a acessibilidade linguística (seja ela qual for) é fundamental para garantir que as pessoas surdas possam participar plenamente na vida social, educacional e profissional. Por isso, sem imposições, nem pressões, estímulo e incentivo os meus alunos surdos a expressarem-se através da música, cantando com a voz, com as mãos (LGP) ou com ambas. Não tendo tido nenhum aluno surdo que não quisesse desfrutar do prazer de produzir e interpretar música, tive alguns que superaram, através da sua entrega e empenho, as minhas melhoras expetativas.
Com enorme orgulho e satisfação, li as seguintes palavras do encenador do concerto teatral «Quis saber quem sou», Pedro Penim (Teatro Nacional D.ª Maria II), sobre o meu antigo aluno surdo Vasco Seromenho: “… corajosamente, decidiu concorrer e enviou um vídeo a cantar a sua versão do «E Depois do Adeus»… e o facto do Vasco ter concorrido começou imediatamente a transformar o próprio espetáculo… E por isso, sem nenhuma cedência nem nenhuma espécie de paternalismo, o Vasco conquistou esse lugar dentro do espetáculo e, ao mesmo tempo, revolucionou-o”.

Sabendo que este novo conceito de concerto teatral passaria pelo Teatro das Figuras, em Faro, resolvi acompanhar todos os alunos surdos e intérpretes LGP do Agrupamento de Escolas onde leciono para com eles poder desfrutar de um momento que se antevia marcante e único. Assim foi! Com grande emoção e orgulho senti-me representado quando, eu e mais quinhentos alunos e professores, vimos e ouvimos o nosso Vasco a iniciar o concerto, cantando a senha «E Depois do Adeus». A tal senha que, simbolicamente, nos devolveu a liberdade.
A mesma liberdade que alguns adolescentes que assistiam a um momento que se pretendia de respeito, de
orgulho e de agradecimento, usaram para rir e troçar em voz alta quando o seu excolega se exprimia, cantando e falando com a «voz que Deus lhe deu», mas que por ser diferente da deles mereceu o escárnio e o desdém. Foi, por certo, um dos poucos momentos em que fiquei contente por alguém não ouvir. Ouvimos nós por ele, a falta de solidariedade, de respeito e de reconhecimento. E não gostámos!
Uma das reações mais positivas que os surdos podem encontrar é a compreensão e a empatia. Felizmente, muitas pessoas ao compreenderem que alguém é surdo esforçam-se por comunicar de forma clara e eficaz, utilizando gestos, escrita ou outras formas de comunicação não verbal. Assim se cria uma atmosfera de inclusão e de respeito, facilitando a interação e o entendimento mútuo.
Infelizmente, nem todas as reações à diferença são positivas. A falta de entendimento e o preconceito ainda são comuns. Algumas pessoas podem reagir com desconforto, impaciência ou até mesmo ignorar os surdos, o que pode levar a sentimentos de isolamento e exclusão. Este comportamento é frequentemente resultado de uma falta de educação sobre a surdez e de uma falha em reconhecer a plena capacidade e potencial das pessoas surdas.
Prezados leitores, filho de uma mãe que ficou cega e que não se resignou à sua triste sina, também eu não me resignarei à sina de ter de aceitar a ignorância e a falta de respeito e solidariedade com que alguns pretendem tratar quem é diferente. Espero que vós também não!
Foto: Daniel Santos
Emguarda – Exposição de Edgar Massul
Mirian Tavares, professora
á artistas que evocam em nós poesia, cuja delicadeza de cada imagem remete-nos a poemas e não a teorias, que tentam, sem grande sucesso, abarcar os sentidos e não-sentidos da Arte. A obra de Edgar Massul e, em particular os seus desenhos, brotam como musgo, plantas e coisas que crescem à margem dos rios e que se transformam em matéria-prima que deixa rasto sobre o papel, ou outra superfície, que se tornam depositários de uma ligação profunda com o território e com sua dimensão cósmica.
Os desenhos que compõem esta exposição podem ser organizados em grupos que se agregam à volta da água, da terra, e do calor. Há ainda a série dos alvos, que é feita com técnica diversa e com maior controle do artista sobre o resultado. Durante um longo período, e o tempo é essencial na sua obra, Massul percorreu o país pelos grandes rios que o atravessam. No caso do Algarve, não um
É tão diversa da tua fronte descuidada. Tateio. E a um só tempo vivo
E vou morrendo. Entre terra e água
Meu existir anfíbio. Passeia Sobre mim, amor, e colhe o que me resta: Noturno girassol. Rama secreta.
Hilda Hilst
rio, mas uma ria, a Formosa. Daí surge uma série à volta da água. Rio Douro, Tejo, Mondego e Ria Formosa forneceram os materiais – lama, plantas, musgo, rasto de coisas, que foram se transformando em desenhos, ou mais que desenhos, em fragmentos de si impressos, amalgamados em papeis diversos. Desenhos que representam e que são. O ser do desenho é a sua capacidade de conter em si um microcosmo de cada rio e do seu entorno. Umberto Eco explorava a ideia de um super-signo, dum mapa que ocupasse o próprio território, sendo ao mesmo tempo signo e superfície; representação e existente. É nessa ambiguidade entre o signo, que representa, e a coisa que é, ontologicamente, fragmento e compósito do real, que cada imagem surge. E o verbo surgir é aqui bem aplicado: cada desenho surge da sua relação com o mundo, sem que o artista tenha o controle dessa aparição. O artista tem o poder de escolher uma e outra forma, de retirar aquelas que mais se parecem com o desejado ou com o inadvertidamente alcançado, mas o


desenho é um improviso da natureza. O artista é um ser que busca e que encontra, e se encontra, com as imagensfragmentos, rastos de um real que, graças a sua arte, permanecerão. Um permanecer que é efémero, pois a coisa viva continua a transformar-se, a transmudar-se, a negar a sua existência como um fait accompli.
As texturas ocupam um lugar de destaque e, apesar da delicadeza, da fragilidade de muitas das obras, é com os dedos que devemos conhecê-las: sentir a terra sobre o papel ou outra superfície que absorve e, ao mesmo tempo resiste. E o que fica no papel são os restos, aquilo que sobra. Mas os restos são ainda muita coisa, como previu Walter Benjamin, os restos são aquilo que fica.
Os desenhos são criados também pelo devir do artista que vagueia pelo
território, colhendo, em cada um, sua especificidade invisível aos olhos, mas palpável, sensível, única e dificilmente a mesma. Percorrer a exposição é deparar-se com esse velho-novo território, com esse mapa-signo, com a imagem e o existente.
Há ainda outra série, mais diversa, em que Edgar Massul pinta alvos que se sobrepõem e que repousam sobre um fundo azul difuso. Os alvos são índices, apontam uma direção, dirigem para si o olhar, são lugares de chegada. E, nesse caso, o lugar do controle. Aqui o artista prevê a imagem, por mais que experimente, consegue, metaforicamente, indiciar o resultado.
Entre aquilo que controla e aquilo que surpreende, Edgar Massul cria delicadeza. Apresenta-nos uma coleção de sombras, de fragmentos, de restos. São obras-coisa. E a coisa, no sentido Heideggeriano, é aquilo que precisa ser explicado, definido, determinado, mas é também aquilo cujo domínio pode revelar a verdade do ser.
Emguarda é uma palavra-coisa criada pelo artista. Com múltiplos sentidos, revela-nos uma intenção e um gesto – o de reconhecer que as suas obras permanecem porque estão guardadas, abrigadas por colecionadores, coleções, amigos. Por aqueles que encontram, e admiram, a beleza do efémero, a poesia que nasce da relação telúrica de Edgar Massul com o território.
Foto: Isa Mestre
Como a arte digital está redefinindo a criatividade
Fábio Jesuíno, empresário
arte digital é uma das principais impulsionadoras da criatividade no século XXI, Através da capacidade de combinar tecnologia com expressão artística, ela abre caminhos para novas formas de comunicação e inovação.
Possibilitando aos criativos explorarem novos meios de expressão, desde a criação de obras visuais imersivas até realidades virtuais e aumentadas, desafiando constantemente as fronteiras do que antes parecia impossível.
Um dos aspetos que mais me impressiona é a capacidade da arte digital de democratizar o acesso à criação artística. Através de ferramentas digitais cada vez mais intuitivas, ela possibilita que um número crescente de pessoas explore seu potencial criativo, independentemente da sua formação tradicional em artes. Essa democratização, não apenas enriquece as perspetivas no mundo da arte, mas também promove uma cultura de experimentação e colaboração inédita.
Outro aspeto que destaco é a convergência entre a arte digital e a inteligência artificial, permitindo novos
caminhos para a criatividade. Algoritmos de aprendizagem de máquina estão a ser utilizados para gerar obras de arte únicas, compor músicas e até mesmo poesias. Esta associação entre a criatividade humana e a tecnologia está redefinido os limites do que é possível na arte, desafiando as noções tradicionais de originalidade e autoria. É um verdadeiro convite a repensar o próprio conceito de criatividade na era digital.
A arte digital está a redefinir a criatividade profundamente. Ao juntar tecnologia e expressão artística, democratizar o acesso à criação e explorar as fronteiras da inteligência artificial, esta forma de arte está a moldar um novo paradigma criativo para o século XXI.
Este novo horizonte criativo promete, não apenas transformar o mundo da arte, mas também influenciar profundamente a forma como interagimos e nos expressamos na sociedade contemporânea. A arte digital é um movimento transformador que está a redefinir o próprio tecido da criatividade.

E agora, José?
Sílvia Quinteiro, professora
escobri recentemente um prazer novo: o bilhar. Jogo diariamente. É divertido, relaxante e uma excelente desculpa para passar mais tempo com a família. Ando tão entusiasmada que relevo o facto de ser derrotada na quase totalidade das partidas e não desisto.
No início, achava que o mal era a falta de pontaria, o que seria estranho, considerando que até acerto nas bolas. Depois, pensei que o problema poderia estar no taco. Era fraquinho. Troquei-o por um bom. Lindíssimo, com um toque maravilhoso. Mas a beleza também não impressionou as bolas nem os adversários. E foi com grande pena minha que tive de admitir que, provavelmente, o meu marido estava certo quando dizia que o meu problema era a falta de estratégia.
Estratégia é, pois, a palavra de ordem. Como tal, desenhei a minha: passo um — e único até agora — treinar sozinha para os apanhar de surpresa. E foi num destes momentos que, tendo ligado a televisão para me fazer companhia, entrou sala adentro uma execrável personagem cor de laranja. Mudei de canal, mas fiquei a pensar na figura. Procurei voltar a concentrar-me no jogo, mas a pergunta não me saía do pensamento:
- Como chegámos até aqui? Como é possível estarmos nesta situação?
Quando, na minha adolescência, deixei registada num livro de visitas a um lugar de memória do nazismo a pergunta “Como foi possível?”, estava longe de imaginar que um dia iria perceber exatamente como. Era uma pergunta velha, de outros tempos, cria eu.
Na época, culpei apenas o mau da fita. Presentemente, tenho mais dificuldade em apontar o dedo apenas aos que dão a cara pelas atrocidades. Acredito que boa parte da responsabilidade pela loucura em que o mundo está mergulhado se deve à educação. É, portanto, de todos nós. Iludidos com a ideia de que, no mundo ocidental, a democracia era um dado adquirido, de que os avanços em termos de direitos humanos eram uma conquista definitiva, descurámos há muito a necessidade de educar a sério. De garantir que todos os cidadãos têm acesso a uma educação de qualidade que lhes permita, mais do que encontrar um empregozinho, desenvolver-se enquanto seres humanos.
Desvalorizou-se, desde logo, a importância de ter valores. Depois, a de saber ler. Não de ir à escola, porque a fachada, essa existe e está de boa saúde, mas de saber realmente ler, interpretar, debater. O mundo ocidental preocupou-se com estatísticas e com parecer bem. O importante é dizer que todos os cidadãos cumprem a escolaridade obrigatória, que a frequência do ensino superior é elevada, mesmo que os diplomados não consigam interpretar um texto elementar ou formular uma ideia. Até porque as letras são tretas e as humanidades uma coisa de que se

ocupam os menos dotados intelectualmente.
Confrontados com momentos delicados, com crises sucessivas que afetaram diretamente as condições de vida destes seres, o que achámos nós que iria acontecer? Como poderíamos esperar que agissem com discernimento e que não seguissem os populistas como carneirinhos aos saltos a caminho do matadouro?
Em que pensaram — e pensam — aqueles que promovem sistemas de ensino assentes no facilitismo, na pressão das estatísticas, em avaliações que não medem mais do que a capacidade de papaguear o que foi decorado no dia anterior? Qual foi, qual é, a estratégia?
Dizem-me que não pode ser assim tão mau; afinal de contas, essas pessoas trabalham, são úteis. Mas dizem-me também que o professor de Português disse aos alunos para não lerem Os Maias porque é uma seca e ele também não leu, que o dentista tirou o dente errado, que o diretorgeral pediu à Inteligência Artificial para
escrever uma mensagem de pêsames e, como nem se deu ao trabalho de ler, enviou as duas sugestões da máquina à família do falecido.
Pequenas pérolas. Insignificantes, dir-meão. Mas multipliquemo-las por milhões e as pequenas anedotas reais perdem a graça. A falta de empatia e de respeito, o insurgir-se contra o absurdo cumprimento de horários, de regras, e o nunca assumir a responsabilidade são hoje virtudes necessárias para singrar.
Diz o ditado que “em terra de cegos, quem tem um olho é rei”, e os reizinhos alimentam-se desta miséria. Do alto de tronos dourados, brilham, rodeados por quem não tem argumentos para os afrontar. Tristes alforrecas, sem ossos nem alma, manipuladas às claras, à vista de todos.
Uma sociedade, pensada a curto prazo, em que a esperteza é o valor maior. Um esquema de pirâmide condenado a implodir.
Andámos décadas a mentir a nós próprios. A fingir que não víamos para onde estávamos a caminhar. Não nos preparámos. Não preparámos as gerações mais jovens. Cada um jogou à bola que tinha mais perto. Recusámo-nos a olhar para a disposição das restantes, a avaliar as consequências de uma tacada dada em função do imediato. Faltou-nos definitivamente estratégia.
Hoje, olhamos à nossa volta e percebemos que a festa acabou, mas não fazemos a mínima ideia de como agir perante o fedor a anos 30 do século passado que paira no ar.
Como diria Drummond de Andrade: E agora, José?


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