Luana Floriani - Moletom: novas possibilidades de uso para um produto de moda

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MOLETOM: NOVAS POSSIBILIDADES DE USO PARA UM PRODUTO DE MODA

Luana Azeredo Floriani¹ Edson Korner²

RESUMO

Este paper descreve a presença da malha de moletom na moda e, através de levantamento bibliográfico, de que forma esse tecido foi apropriado nas diferentes épocas dentro da história do vestuário. Visto que seu uso em desfiles de moda ainda é pequeno e geralmente associado a área esportiva, o estudo tem como objetivo final uma coleção de moda feminina, na qual a partir de estudos e experimentações foram projetados 15 looks para um determinado público alvo. Pensando na valorização do uso desse material, o presente trabalho visa possibilitar maneiras diferentes de se obter uma utilização mais abrangente do que vem sendo feito no mercado atual.

Palavras-chave: moletom; sportswear; moda.

1 INTRODUÇÃO

A malha de moletom, apesar de ser confortável e versátil, demorou a ser considerada um item fashion e ser incorporada dentro de coleções de moda. Atualmente o uso de sportswear (roupas esportivas) fora das academias foi incorporado pelas pessoas, sendo amplamente utilizado. Assim, o tecido que era considerado adequado para ''ficar em casa" por ser de material simples e confortável, ganhou novo status e passou a ser aceito como vestimenta do cotidiano. Com intenção de agregar maior valor e mostrar a versatilidade da malha de moletom, o presente estudo visa explorar, por meio de uma coleção de moda feminina, as possibilidades que esse material tem a oferecer para a moda contemporânea além do uso para práticas esportivas, abordando a utilização do tecido em outras categorias do vestuário.


2 2 O VESTUÁRIO PARA PRÁTICAS ESPORTIVAS

Para garantir bom desempenho na pratica de esporte a escolha do que vestir faz toda diferença, sendo necessário a utilização de um vestuário adequado. A ergonomia e o material utilizado de forma apropriada na confecção das roupas contribuem na qualidade e rendimento do exercício. Na atualidade, as opções de lojas e marcas especializadas em sportswear são bem variadas, no entanto, demorou certo tempo para que roupas dessa finalidade começassem a ser de fato essenciais. Ao final do século XIX, a afinidade das pessoas com os esportes já mostrava a necessidade e preocupação quanto a utilização de vestuário próprio para a prática do esporte, popularizado com o ciclismo. As mulheres, que

usavam

vestidos

muito

grandes

e

volumosos,

precisaram

criar

modificações em suas vestimentas usuais para conseguirem andar de bicicleta com mais facilidade. "Saias divididas eram uma solução, bem como knickerbockers1 largos chamados bloomers". (LAVER, 1989, p. 208). Apesar da importância dada ao uso de uma indumentária mais apropriada, os materiais que se tinham disponíveis deixavam a desejar, principalmente quando se tratava de conforto e mobilidade. Os tecidos eram em geral rústicos e muito pesados, estando longe de serem aptos para qualquer atividade física. No período antecessor a Primeira Guerra Mundial (1900 a 1913), a França vivia um momento marcado pela opulência e pelos altos gastos da nobreza. Os momentos ao ar livre, seja com passatempos ou com práticas esportivas, se mostravam cada vez mais influentes no vestuário do dia a dia. (MENDES; DE LA HAYE, 2003). Com a presença mais frequente do esporte na vida das pessoas e a boa fase econômica parisiense naquele momento, os trajes esportivos ganharam força e passaram a ter um tratamento diferenciado. As roupas eram específicas para cada tipo de atividade. Nos campos de golfe, onde costumava ventar muito, foi adaptado um casaco longo de seda, que fornecia calor e protegia o corpo. "As roupas para lazer e esporte eram projetadas para enfrentar os

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Tradução livre: "knickerbockers" - calças curtas.


3 rigores específicos de cada atividade. Para andar de barco ou jogar cricket, vestimentas adequadas eram essenciais e os trajes não podiam ser transferidos de um esporte para outro" (MENDES; DE LA HAYE, 2003, p. 38). A chegada da guerra em Paris trouxe muitas mudanças no modo de vestir da sociedade como um todo. Os tecidos ficaram mais sóbrios e restritos, as roupas de alta costura foram perdendo espaço (alto desemprego de costureiros do ramo), as mulheres passaram a ingressar no ambiente de trabalho. Foi um período de restrição e cautela. Para lidar com o cenário corrente, as roupas, principalmente as femininas, tiveram que sofrer adaptações que as deixassem mais simples e fáceis de vestir, sem precisar da ajuda de terceiros (MENDES; DE LA HAYE, 2003). Em 1920, num momento em que as mulheres passaram a desempenhar funções antes exercidas somente pelos homens, uma jovem chamada Gabrielle Coco Chanel, soube exatamente como se apropriar do período de guerra para trazer à tona roupas que transmitissem classe, conforto e praticidade (KASS, 2011). Com um vestuário esportivo inspirado no guardaroupa masculino, Chanel representou um grande avanço na ascensão do sportswear para mulheres, contribuindo com o início de uma revolução no guarda roupa feminino. "As leisure and work became a part of the wider range of women's lives, sportswear gradually became an appropriate form of dressing to reconcile varied activities." (ARNOLD, 2009, p. 24).

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Com o término da guerra, muitas indústrias conseguiram ter um crescimento significativo, e outras surgiram, como a indústria de roupas e artigos esportivos. Em 1925, costureiros também viram espaço para se inserirem nesse meio. Foram abertos departamentos especializados em trajes para atividades esportivas. De acordo com Mendes e De La Haye (2003) o principal deles foi o do estilista Patou, que foi o primeiro a se tornar especialista na criação de roupas para esse nicho. Inicialmente criado para resolver a necessidade de um vestuário adequado para atividades fora de casa, o sportswear não era disponível a

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Tradução livre: "Como o lazer e o trabalho tornaram-se uma parte da variada e ampla vida das mulheres, o sportswear tornou-se gradualmente uma forma adequada de se vestir para conciliar atividades variadas".


4 todos. Apenas membros da elite e pessoas bem sucedidas de Paris tinham acesso às criações dos estilistas. Nos Estados Unidos foi diferente. Quando essa indumentária se destacou, foi apropriada por diferentes classes sociais, ganhando um reconhecimento significativo (KASS, 2011). Tendo em vista tamanha popularidade e relevância que o esporte obteve ao longo do tempo, o culto ao corpo a partir da década de 30 fez com que as atividades físicas se tornassem de fato parte do cotidiano da sociedade. O ideal de ter um corpo esbelto e saudável foi importante para que o segmento esportivo continuasse a crescer (FOGG, 2013). Refletindo um novo padrão de saúde e com a descoberta científica dos benefícios da luz solar, a "moda" de ter um corpo bronzeado trouxe modificações aos trajes de banho, também utilizados para natação, que diferentemente dos anos 20 passaram a ser mais curtos e mostrar mais a pele. A indumentária esportiva estava caminhando, cada vez mais, para uma aceitação fora dos esportes, rompendo com os costumes antigos de diferentes modelos de roupas para cada momento do dia. Segundo Laver (1989), o esporte tênis contribuiu de certa forma para a disseminação do sportswear como um estilo de vestir, já que as tenistas usavam suas próprias roupas de verão para jogar. A segunda guerra mundial (1939-1945), assim como a primeira, trouxe muitas dificuldades e modificações sobre o monopólio da moda parisiense, que procurava alternativas para diminuir custos, deixando de lado atividades de lazer e esportes, o que ofereceu espaço para as criações estadunidenses se destacarem. A entrada tardia dos Estados Unidos na guerra possibilitou que os estilistas americanos criassem sem restrições, ficando à frente com sua indumentária. "Enquanto a Europa levou certo tempo para reativar sua indústria de roupas de lazer, os fabricantes americanos com experiência em roupas esportivas logo produziam novas linhas." (MENDES; DE LA HAYE, 2003, p. 125). Focados em roupas despojadas, mas também acessíveis a todos, os EUA chamavam atenção para a venda de peças em larga escala (prêt-àporter), preferivelmente Nova York, onde o foco na moda esteve predominante, com destaque dentro do segmento sportswear, que na cidade já havia se


5 tornado um estilo de vida e uma característica da mulher moderna, que precisa de conforto e versatilidade para poder ir trabalhar e cuidar da sua família. As the 1930's wore on, sportswear became increasingly significant in both New York's, and by extension America's, search for a recognizable fashion identity that assimilated the period's social, economic and cultural shifts. Sportswear underwent a process akin to the one that New York had undergone earlier in the twentieth century, as "real" and "concept", clothing and image, were imbues with meanings to construct an appropriate "urban identity" for modern 3 women.(ARNOLD, 2009, p. 22)

Uma das estilistas mais influentes para a moda americana foi Claire McCardell. Conforme afirmação de Fogg (2013), foi a estilista que esteve mais envolvida com o estilo de vestir americano, trazendo modernidade em conjunto com a funcionalidade da roupa esportiva. Em 1950, quando os jovens perceberam que já não queriam mais usar roupas semelhantes à de seus pais, passaram a incorporar referências de suas características e do seu eu pessoal na escolha de suas vestimentas do dia a dia. O foco na cultura adolescente, que se proliferou ainda mais na década de 60, acabou ajudando a consolidar a produção em série (prêt-à-porter), trazendo uma moda rápida e barata que atendesse às rápidas mudanças de gosto desses jovens e alimentasse a vontade cada vez mais frequente por itens novos e diferentes. Com baixo custo e mais opções de escolha as roupas se tornaram forma de expressão, e os jovens não precisariam mais se vestir do modo formal como seus pais, poderiam ter escolha própria (MENDES; DE LA HAYE, 2003).

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Tradução livre: "Enquanto a década de 1930 avançava, o sportswear se tornou cada vez mais significativo, tanto em Nova York, quanto por toda a extensão da América, a procura de uma identidade que reconhecesse as mudanças sociais, econômicas e culturais do período. O sportswear passou por um processo parecido ao que Nova York tinha sofrido no início do século XX, como "real" e "conceito", roupas e imagem, estavam imbuídos de significados para a construção de uma "identidade urbana" apropriada para as mulheres modernas".


6 O surgimento de uma moda mais acessível fez fomentar uma forma de "libertação" ao espírito jovem. A partir de então, gostos foram definidos e ao mesmo tempo pessoas com os mesmos propósitos se conectaram. Dessa união surgiram os chamados grupos ou tribos. "Composições autênticas, originárias de subculturas permeadas por todo um estilo de viver, vão, a partir de então, fazer parte das referências de moda". (MESQUITA, 2004, p. 29). Com a intenção de se diferenciar e construir uma identidade, uma das formas pertinentes a ser explorada foi a indumentária. O sportswear, com sua característica informal e despretensiosa, serviu de inspiração e permeou por diversas culturas jovens na década de 70, influenciando a maneira de se vestir. "Algumas modas jovens tiveram origem no sportswear americano, como calças cigarrete até os tornozelos, sapatos baixos em forma de sapatilhas de balé, jeans." (LAVER, 1989, p. 260).

2. 1 O SPORTSWEAR E O TECIDO DE MOLETOM

Com a revolução jovem e a moda se transformando cada vez mais rapidamente, o costume de usar roupas específicas para cada situação perdeu de vez a força. As roupas esportivas, principalmente para os grupos jovens, que queriam tirar a imagem formal que antes tinham com vestimentas semelhantes à de seus pais, tiveram participação nesse processo. O sportswear passou a ser usado como roupa comum do dia a dia e não somente para a prática de esportes, representando uma nova atitude na vida dos adolescentes. O uso do tecido de moletom foi associado aos jovens e seus diferentes grupos, como o dos skatistas. Estes fazem do skate seu meio de transporte diário, praticando manobras e se locomovendo através do espaço urbano. Tinham como item no seu vestuário peças feitas com tecido de moletom que, segundo Pezzolo (2007, p. 311) é um: "tipo de malha aflanelada e quente, de lã, algodão ou poliéster misto, feita com entrelaçamentos flutuantes, que provocam o toque de pelúcia que esquenta. Usado em peças esportivas, infantis e até mesmo para estofamentos domésticos." (PEZZOLO, 2007, p. 311).


7 O espírito de individualismo da década de 80, de acordo com Mönnich (2015), mostrava que as pessoas podiam ser quem elas quisessem, e o advento da cultura pop em diversas áreas de comunicação como filmes, itens de consumo, música e moda repercutiram cada vez mais num estilo único. O filme “Flashdance”, que estreou em 1983, foi um grande sucesso para a moda na época. Muitos itens esportivos usados pelas personagens tiveram êxito, mas um dos estilos que chamou atenção do gosto popular foram os off-theshoulder tops (blusas caídas que deixavam o ombro a mostra), que eram feitos de tecido de moletom. "Women cut wider necklines in their shirts and sweatshirts in order for the top to drape off the shoulder". 4 (KASS, 2011, p. 30). A malha de moletom também teve grande repercussão dentro da cultura Hip Hop, nascida em 1970. Em sua origem não foi um movimento presente na moda, provavelmente por estar relacionado com uma parcela da população ligada a grupos excluídos e à margem da sociedade, onde as questões sociais eram o pano de fundo (RIBEIRO, 2006). A indumentária era vista como forma de diferenciação, de expressão dos sentimentos, de comunicação e protesto. Um casaco amplo com capuz e zíper denominado nos Estados Unidos como Hoodie (ver figura 1), segundo Wilson (2006), era item frequentemente utilizado como forma de isolamento contra os problemas vivenciados. E antes de se tornar popular entre os jovens do movimento Hip Hop, o Hoodie era usado para proteger trabalhadores nos armazéns congelados de Nova York e agasalhar atletas contra as instabilidades climáticas. A partir do momento em que os jogadores de futebol começaram a emprestar seus casacos para suas namoradas usarem, este se tornou um item típico do dia a dia. O tecido também se fez presente pelo forte impacto que os esportes causavam dentro da cultura. Em 1990 no basquete, por exemplo, os grandes jogadores eram negros, e o estilo e as roupas que eles usavam exerciam grande influência sobre os jovens que faziam parte desses grupos.

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Tradução livre: "Mulheres cortavam decotes mais amplos em suas camisas e blusas de moletom para que caíssem fora do ombro."


8 FIGURA 1 - CASACO COM CAPUZ (HOODIE)

FONTE: The New York Times (2006).

Com o passar do tempo o tecido de moletom popularizou-se, não ficando somente relacionado ao esporte. O conforto passou a se inserir no mundo da moda, revelando que a roupa além de ser bonita e interessante precisa ser agradável ao vestir. O fenômeno do sportswear trouxe novas oportunidades para a moda, abrindo espaço para que as criações não foquem somente na estética, mas também no bem estar das pessoas como um todo. Um exemplo desse momento de maior inclusão de bem estar nos dias atuais é a moda chamada de Normcore, que tem como característica trazer o básico como foco principal na construção de vestimentas para o dia a dia. Muito mais que uma simples tendência, normcore é a maneira de pensar a construção do visual que transcende recursos específicos de styling ou a escolha de determinadas peças de roupa e acessórios. (MIGLIORI, 2014, p. 83).

O normcore, com seu estilo próprio busca passar a idéia de ser elegante sem se preocupar com grife ou cor, o que importa é o estado de espírito e a individualidade. Na atualidade, a malha de moletom que, segundo Fischer (2010), é uma malha por trama e feita pela estrutura de Jersey simples, é utilizada de forma abrangente e não somente no meio esportivo, conforme explicitado no presente estudo. Apesar de ainda ser pequena, sua utilização está disseminada nos diferentes setores do vestuário, e também foi incorporada por grandes nomes da moda, podendo ser vista nos eventos em que eles apresentam suas


9 coleções. Foi incorporado na malha de moletom o uso de diversos tipos de materiais e customizações, propiciando a sua valorização e abrindo espaço para novas possibilidades. Alguns nomes tiveram grande importância na ascensão da malha de moletom por utilizarem esse material na moda de uma forma mais criativa e original. Nesse cenário destaca-se Norma Kamali, diplomada no Fashion Institute of Technology, se diferenciava pela criação de peças nas quais abordava maneiras inusitadas de se apropriar da malha de moletom. "Em 1982, para o Jones Apparel Group, Kamali levou o humilde moleton das pistas para a alta moda, com sua influente série de abrigos em preto, cinza, rosa e azulpálido." (MENDES; DE LA HAYE, 2003, p. 255).

FIGURA 2 - ROUPA DE MOLETOM POR NORMA KAMALI

FONTE: Mendes; De La Haye; (2003, p. 256).

3 O TECIDO DE MALHA

Caracterizado pelo conforto, pelas propriedades de elasticidade e por se adaptar tão bem ao corpo, o tecido de malha, assim como qualquer outro, passa por alguns processos essenciais em sua confecção. A primeira etapa e


10 elemento básico na produção de qualquer têxtil é o tipo de fibra utilizada, que pode ser natural ou sintética. As naturais podem ser de origem animal (como a lã), mineral ou vegetal, como é o caso da fibra de algodão que é muito utilizada na malharia. As sintéticas ou manufaturadas são feitas a partir de processos químicos como, por exemplo, a fibra de poliéster e a de elastano (PEZZOLO,2007). As fibras vão para um processo chamado de fiação, onde serão torcidas originando como produto final fios e linhas. De acordo com a forma que se é torcido e a quantidade de fios combinados, podem apresentar diferentes propriedades e efeitos. "O fio pode ser torcido com força, produzindo um fio duro e forte; ou pode ser torcido levemente, dando volume, maciez e menos força, mas boas propriedades isolantes." (SISSONS, 2012, p. 15). Para se tornar um tecido de malha, os fios são encaminhados para indústrias de malharia, e pelo tear se iniciará o processo de construção através de laçadas. "O entrelaçamento e a formação contínua de novas laçadas produzem os tecidos de malhas." (MENDES; SACOMANO; FUSCO, 2010, p. 36). Existem três tipos de classificação para um tecido de malha: malharia por trama, na qual é utilizado apenas um tipo de fio para alimentar todas as agulhas do tear, formando laçadas que cruzam o tecido transversalmente (carreiras); malharia por urdume, que usa um dado fio para cada agulha, conferindo laçadas que vão à direção do comprimento do tecido (colunas); ou a malharia mista, na qual um fio de trama é inserido num de urdume, caracterizando um tecido mais resistente. Para a construção de um tecido de malha são utilizados diferentes tipos de máquinas, de acordo com sua classificação. As máquinas retilíneas, conforme Pezzolo (2007) podem ser por trama ou por urdume, e nelas qualquer tipo de tecido de malha é produzido, inclusive punhos e golas prontas para camisas polos e agasalhos. Além do tear retilíneo, a malharia por trama também possibilita o uso de máquinas circulares, que produzem tecidos tubulares de grande ou pequeno diâmetro. A maior resulta na produção contínua de tecidos de malha, podendo produzir vários itens como camisetas, e a menor se destina a fabricação de meias.


11 A

malharia

por

urdume,

na

qual

o

entrelaçamento

é

feito

longitudinalmente, produz tecidos com propriedades lisas, sendo utilizados na confecção de forros, toalhas de mesa, tecidos elásticos e rendados, muito utilizados pela moda íntima. Após o término da confecção da malha, podem-se identificar algumas características que a diferem de um tecido plano. Pelo fato de ter uma elasticidade natural, tendendo a esticar com mais facilidade no sentido da largura, possui bom caimento e boa adaptação em contato com o corpo, marca registrada dentro do mercado de roupas íntimas e esportivas, pela qual é amplamente aceita. "O tecido de malha, devido à sua elasticidade, molda-se às formas do corpo com naturalidade, ao contrário do tecido plano que necessita de ajustes com recortes e pences concebidos na modelagem." (MENDES; SACOMANO; FUSCO, 2010, p. 36). Além do vestuário, esse tipo de tecido atende também a diversos outros setores, como na área de decoração de casa e até na medicina, para a confecção de acessórios e vestuários de compressão. Tendo uma superfície mais aberta, as malhas tendem a "respirar" conferindo propriedades de isolamento que protegem o corpo humano nos dias frios. Um aspecto importante de um tecido de malha é o fator de encolhimento. "Devido à forma de entrelaçamento os tecidos de malha sofrem um esticamento durante a fabricação, mesmo que a força de esticamento seja pequena; ao terminar a força do esticamento o tecido de malha lentamente retorna ao seu estado original." (SILVA, 2008, p. 14). Por esse motivo é essencial que as confecções deixem que o tecido descanse pelo menos 48 horas antes de se começar a produção.

4 DESENVOLVIMENTO DA COLEÇÃO

4.1 PROPOSTA

O desenvolvimento dessa coleção teve como principio a busca por uma nova abordagem no uso do tecido de moletom, propiciando sua utilização em diferentes ambientes e ocasiões. Para que essa ideia fosse concretizada a


12 escolha do público-alvo foi essencial e contribuiu para a viabilização da coleção. A proposta da coleção foi atender um público que estivesse pronto para ousar e utilizar o tecido de moletom de outra forma. Nesse sentido buscou-se pensar num perfil feminino refinado, com personalidade e forte interação com o mundo da moda. Ao analisar, por meio das redes sociais, o estilo de vida e o dia a dia dessas mulheres, foi possível observar que, independente da idade, elas possuem bom gosto e prestam muita atenção aos detalhes, o que foi fundamental para a definição do conceito da coleção. Para a escolha de um tema que melhor atendesse as necessidades desse público realizou-se uma pesquisa de tendências, que teve como foco o dia a dia dessas mulheres. Concluiu-se que a coleção teria como inspiração as paredes do cotidiano, baseando-se nas características, tanto internas como externas, presentes nas paredes. Do ponto de vista interno remete à ideia de lar, conforto, memórias e intimidade, contrapondo com o externo que faz referência a questões como liberdade expressada por meio de diferentes intervenções do homem e pelo desgaste natural da ação do tempo. Com as tendências também foi possível definir a cartela de cores que representou a coleção. Tons como rosa e verde foram utilizados de forma mais opaca e sóbria, remetendo a ideia das paredes "de dentro" e "de fora" e contrastando com a estação de inverno. Mesmo mais neutras, as cores trouxeram vivacidade e um ar de descontração para a coleção.

4.2 EXPERIMENTAÇÃO

Na busca por criar uma coleção que fosse elegante, moderna e que ao mesmo tempo fizesse sentido com o tema apresentado, a fase prática da geração de alternativas teve vários aspectos que foram considerados. Para representar a ideia de estrutura e rigidez que é característico de uma parede foi utilizada a técnica de dublagem, que consiste na colagem entre dois tecidos por meio de um papel colante. Dentro da coleção, essa técnica também foi utilizada num tecido mais fino de organza estampado, como na jaqueta (ver figura 4), na qual a organza foi colada por cima do tecido de


13 moletom, resultando num caimento estruturado e uma aparência translúcida. Dessa forma, foi possível trabalhar com o tecido de moletom de uma maneira diferente

e

também

de

explorar,

através

da

moulage

(modelagem

tridimensional), novas possibilidades (ver figura 3). Pode-se obter um caimento rígido e elegante que proporcionou a criação de peças com corte e acabamento de alfaiataria.

FIGURA 3 - TESTES EM MOULAGE (MODELAGEM TRIDIMENSIONAL)

FONTE: A autora (2015)

Para remeter à ideia de acolhida e conforto de um lar foi utilizado o matelassê, e uma espuma foi colocada entre dois tecidos e depois costurada criando uma textura almofadada. Um dos aviamentos de destaque dentro da coleção foi um vivo de veludo, utilizado como elemento de estilo nas peças. Esse material faz referência ao rejunte utilizado nas paredes e que tem como funcionalidade a junção das partes. No acabamento, além do básico feito com a máquina de overlock, também se utilizou o viés de cetim (ver figura 4), que proporcionou uma finalização de alto padrão e agregou maior valor aos produtos confeccionados.


14 FIGURA 4 - CALÇA DE MOLETOM COM ACABAMENTO EM VIÉS

FONTE: A autora (2015).

Foram desenvolvidas duas estampas que fizeram parte dessa coleção. Uma com mais apelo visual, feita sobre malha de moletom e também sobre uma organza, na qual se utilizaram elementos geométricos, vazados, cores marcantes e referências a retratos familiares, deixando clara a percepção de parede interior que criamos em nosso lar. A outra enfatizou a ideia de diferentes texturas encontradas nas paredes, que foi obtida por meio da técnica de serigrafia com tinta puff, criando um efeito de relevo para a peça. Ela foi aplicada sobre uma lã fina, conferindo maior firmeza ao tecido.

4.3 RESULTADO

Com a coleção finalizada e as peças prontas (ver figura 5) foi possível observar que mesmo ainda sendo utilizado com maior frequência para meios esportivos, o tecido de moletom também pode ser incorporado em outras categorias do vestuário e parecer sofisticado. O desafio a partir da escolha do público-alvo, este sempre atento às novidades da moda, foi um fator que influenciou para testar novas alternativas e criar itens de vestuário em que esse material não é tão presente, criando uma coleção elegante, mas ao mesmo tempo divertida e confortável.


15 FIGURA 5 - PEÇAS CONFECCIONADAS

FONTE: A autora (2015).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante o processo de criação da coleção, a definição do público-alvo foi um passo importante e abriu possibilidades para o progresso das demais etapas. O limite definido na proposta da coleção de utilizar a malha de moletom tornou-se um grande desafio na medida em que limitou a diversidade de materiais. Por outro lado, foi uma oportunidade de criar propostas diferentes demandando a busca por um maior desenvolvimento criativo. Ao concluir a coleção verificou-se a potencialidade do uso dessa matéria-prima a partir da elaboração de diferentes combinações conforme objetivos propostos para o trabalho. O aprendizado obtido com a realização do estudo, a partir do desenvolvimento de uma coleção, permitiu experimentar na prática a realidade vivenciada por um profissional que atua nessa área.


16 6 REFERÊNCIAS ARNOLD, R. The American Look. Estados Unidos: I.B TAURIS, 2009. FERLA, Norma Kamali Is Playing Dress-Up With Sweatshirts, The New York Times, 27 nov. 2013, p. E3. Disponível em: http://www.nytimes.com/2013/11/28/fashion/norma-kamali-is-playing-dress-upwith-sweatshirts.html?utm_source=Subscribers&utm_campaign=df949b79ed&utm_medium=email&utm_term=0_d2191372b3-df949b79ed416943737&_r=3&. Acesso em: 13 abr. 2015. FISCHER, A. A construção de vestuário. Porto Alegre: Bookman, 2010. FOGG, M. Fashion The whole history. Londres: Thames & Hudson Ltd, 2013. KASS, A. The 20th Century Of American Fashion: 1900 - 2000. Estados Unidos, 2011. 36 f. Curso de Jornalismo. LAVER, J. A roupa e a moda. São Paulo: Companhia das Letras, 1989. MENDES, F.; SACOMANO, J.; FUSCO, J. Rede de empresas - A cadeia têxtil e as estratégias de manufatura na indústria brasileira do vestuário de moda. São Paulo: Arte & Ciência, 2010. MENDES, V.; DE LA HAYE, A. A moda do Século XX. São Paulo: Martins Fontes, 2003. MESQUITA, C. Moda contemporânea: quatro ou cinco conexões possíveis. São Paulo: Editora Anhembi Morumbi, 2004. MIGLIORI, Normcore: a montação cede espaço para o cool e o confortável, Vogue Brasil, 16 out. 2014, p. 83. Disponível em: http://vogue.globo.com/moda/noticia/2014/10/normcore-montacao-cedeespaco-para-o-cool-e-o-confortavel.html. Acesso em: 14 jun. 2015 MÖNNICH, J. Get into the groove the eighties. Sportswear International, Frankfurt, n. 266, p. 71, mar. 2015. PEZZOLO, B. D.Tecidos histórias, tramas, tipos e usos. São Paulo: Editora Senac, 2007. RIBEIRO, C. A cidade para o movimento hip hop: jovens afro-descendentes como sujeitos políticos. São Paulo, 2006. 27 f. PUC-Campinas. SILVA, M. Malharia - Bases de Fundamentação. Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas, UFRN, 2008. SISSONS, J. Malharia. Porto Alegre: Bookman, 2012.


17 WILSON, A Look Under the Hoodie, The New York Times, 23 dez. 2006. DisponĂ­vel em: http://www.nytimes.com/2006/12/23/opinion/23wilson.html?_r=1&. Acesso em: 14 jun. 2015.


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