ANO III NÚMERO 18 RIO GRANDE DO SUL NOVEMBRO | DEZEMBRO | 2017 DISTRIBUIÇÃO GRATUITA
INFORMAÇÃO COM PROPRIEDADE
GESTÃO INTEGRADA
Como aumentar o lucro na lavoura de soja STARTUPS Agronegócio: pioneiro em tecnologia de ponta
REFERÊNCIA
DIRCEU GASSEN
A produção de carne Manejo de soja focado noOutubro Pampa Gaúcho em alta produtividade e Novembro - 2018 | Rio Grande do Sul | Ano IV | nº20 | 1
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EDITORIAL
Um olhar sobre a gestão
#edição 18 #Ano III #Novembro e Dezembro
A
agricultura passa por evoluções constantes e as novas tecnologias de produção desafiam o agricultor a aprimorar a maneira com que se planeja e executa a gestão na propriedade. Saber controlar os custos e planejar os investimentos é tão importante quanto apostar na tecnologia para aumentar a produtividade, independentemente da cultura. O manejo inteligente e a gestão eficaz da propriedade rural são os destaques dessa edição. Mostramos, com o exemplo da família Alessio, de Faxinal dos Guedes/ SC, como é possível aumentar a rentabilidade fazendo as escolhas certas. A opinião e as dicas do professor Elmar Floss e do economista-chefe da Farsul, Antônio da Luz, ajudam a perceber a relevância do assunto para a realidade que vivemos hoje. Além da lavoura, o trabalho nas propriedades leiteiras também exige muita atenção com a gestão, principalmente em um momento em que o mercado não está nada fácil para os produtores de leite. Falamos também nesta edição sobre a história e o trabalho desenvolvido pela Cotrijal, que completou 60 anos em 2017. Nei Mânica, o atual presidente da cooperativa, contou um pouquinho da trajetória da Cotrijal e o do surgimento da Expodireto, hoje uma das mais importantes feiras do agronegócio brasileiro. Temos também, na 18ª edição da Destaque Rural, uma entrevista com Dirceu Gassen sobre os principais fatores que influenciam na produtividade da soja. Afinal, fazer a lavoura render mais por área também é essencial para o produtor de sucesso.
Editora Riograndense CNPJ 17.965.942/0001-07 Inscrição Municipal 66829 Endereço Rua Cacilda Becker, 30 Boqueirão Cep 99010-010 Diretor Leonardo Wink Jornalista Responsável Ângela Prestes (MTB/RS 17.776) Jornalistas: Juliana Turra Zanatta Ângela Prestes Foto de capa Leonardo Wink Projeto Gráfico Cássia Paula Colla Diagramação Ângela Prestes Revisão Débora Chaves Lopes Colunistas Gilberto Cunha Elmar Luis Floss Gerente Comercial Harry Nicolau Johann Impressão Gráfica Tapejarense Contatos leonardowink@destaquerural.com.br redacao@destaquerural.com.br (54) 9947- 9287 Tiragem 8 mil exemplares
Boa leitura! Leonardo Wink
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ESPECIAL
GESTÃO DA SOJA
É PRECISO SENTAR PARA FAZER AS CONTAS
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etanol de milho: novo mercado
startups: revolução na agricultura
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leite: produzir mais, gastar menos
a produção de carne no pampa gaúcho
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dirceu gassen: produtividade da soja
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OPINIÃO elmar@incia.com.br
Elmar Luiz Floss Engenheiro-agrônomo e diretor do Instituto de Ciências Agronômicas - Incia
Rendimento da soja no RS – um desafio!
E
stamos iniciando a implantação de mais uma safra de soja no Rio Grande do Sul (RS), a nossa principal cultura em área, produção, geração de empregos e divisas, no Brasil. Tivemos uma colheita recorde na última safra (2016/17), em produção e rendimentos no Brasil e no Rio Grande do Sul. Mas, esse bom rendimento está muito aquém do potencial da cultura, considerando as condições de solo, clima, potencial dos cultivares e tecnologias de manejo hoje disponíveis Segundo os dados da Conab, nas três últimas safras, o rendimento médio da soja no RS ficou em 11º lugar (safras 2014/15 e 2015/16), e, em 7º lugar na safra 2016/2017, entre os estados produtores de soja do Brasil (Tabela 1). Para um estado que é o berço da soja no Brasil, não é uma situação confortável. Na safra 2014/15, o rendimento médio no RS foi de 47,3 sacas/ha, sendo a média brasileira de 50 sacas/ha. Na safra 2015/2016, o rendimento médio do RS foi de 49,5 sacas/ ha e a média brasileira de 48,3 sacas/ ha. E, na última safra, o rendimento médio do RS e do Brasil foi igual, 56 sacas/ha. O crescimento linear do rendimento de soja no RS, no período 1976/2016, foi da ordem de 37,40 kg/ha/ano, inferior ao crescimento brasileiro, que no mesmo pe-
ríodo foi de 42,05kg/ha/ano, segundo a Conab (1917). Qual a razão desse baixo rendimento? A explicação simplória é de que é por causa das más condições climáticas no RS. Entretanto, nos últimos três anos, com um clima sob influência de El Niño e neutro, tivemos chuvas acima da média no RS, com apenas algumas perdas por veranicos (de 15 a 30 dias sem chuva, dependendo da região) ou por excesso de chuva nas terras baixas, que prejudicou a colheita. Portanto, o rendimento deveria ser maior. Outra razão, que desmente essa explicação apenas pelo clima, é o fato de que em todas as regiões há produtores com médias acima de 60 sacas/ha, na mesma coxilha onde outros estão colhendo menos que 50 sacas/ha. Para exemplificar, na região de atuação da Cotrijal, o rendimento médio da soja, na última safra, foi de 71 sacas/ ha, 15 sacas/ha acima da média gaúcha e brasileira (Tabela 1). Apenas considerando a safra 2016/17, observa-se que o rendimento médio da área da Cotrijal, foi 26,8% superior à média do Brasil e RS, 18% superior à média de Santa Catarina (SC) e 14,5% superior à média do Paraná (PR). O diferencial dessa região de atuação da Cotrijal não é o clima ou solo e sim o resultado da utilização das modernas
Tabela 1 – Rendimento médio de soja em Santa Catarina, Paraná, Rio Grande do Sul, Brasil e área da Cotrijal-RS, nas safras 2014/15 a 2016/17
Regiões
2014/15
2015/16
2016/17
Santa Catarina Paraná RS Brasil Cotrijal
53,3(2º.) 54,9 (1º.) 47,3(11º.) 50,0 66,4
56,5(1º.) 52(7º.) 49,5(11º.) 48,7 65,7
60(2º.) 62(1º.) 56(7º.) 56 71
Adaptado de Conab, 2017; Detec da Cotrijal, 2017.
tecnologias de manejo pelos produtores, mediante uma eficiente assistência técnica aos mesmos. E, se a causa dos baixos rendimentos fosse o clima, o rendimento médio do RS não deveria ser menor que do estado de SC, pois as condições climáticas entre os dois estados são muito parecidas. Na safra 2014/15, o rendimento médio de SC foi de 53,3 sacas/ha (segundo lugar entre os estados produtores); na safra 2015/16 foi de 55,6 sacas/ha (o melhor rendimento nacional) e na safra 2016/17 de 60,0 sacas/ha. No mesmo período, o rendimento médio da soja no PR foi de 54.9, 52 e 62 sacas/ha, respectivamente (Tabela 1). Portanto, nosso rendimento médio também é inferior à média do estado do PR e as principias regiões produtores de soja daquele estado, não diferem de algumas regiões do RS. Infelizmente, se todos aqueles que estiverem envolvidos com a agricultura (gestores, pesquisadores, professores de agronomia, extensionistas/assistentes técnicos e produtores rurais) não se conscientizarem que a razão maior do baixo rendimento não é o clima, o rendimento da soja continuará aquém do potencial existente. Na verdade, o que falta mesmo é tecnologia nas lavouras. Na última safra, tivemos um ano de boa disponibilidade de chuva e baixa incidência de pragas e moléstias, que fez a média ser maior em todas as lavouras. No entanto, aqueles que usaram uma tecnologia mais adequada, colheram muito mais. E, o que é mais importante, com maior rentabilidade. Políticas públicas que desestimulam o uso das modernas tecnologias de manejo da cultura da soja estão condenando ao desaparecimento milhares de propriedades agrícolas nos próximos anos. É só observar a tecnologia usada e a consequente produtividade/rentabilidade de quem está comprando terras e de quem está vendendo suas terras.
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MERCADO MANEJO
Etanol de milho direciona o agro brasileiro para novos mercados Ângela Prestes
Primeira indústria do Brasil de etanol 100% a partir do milho deve fortalecer o preço do grão e dar saída ao excedente de produção
O
cenário da produção de milho no Brasil pode sofrer algumas mudanças nos próximos anos. Em meio a uma realidade de preços baixos e grãos armazenados ao ar livre, surge uma novidade que pode dar um novo fôlego para a cultura. A FS Bioenergia, uma joint venture entre a brasileira Fiagril Participações e a gestora americana Summit Agricultural Group, inaugurou em agosto a primeira usina do Brasil que produzirá etanol exclusivamente a partir do milho. Localizada em Lucas do Rio Verde, no Mato Grosso, a FS Bioenergia investiu R$ 450 milhões na construção da unidade, que tem 250.000 m² de área total — 38.911 m² de área construída, e foi desenhada para que possa ser duplicada. A inauguração da empresa aumenta o leque de opções de destino para a produção de milho, que em 2016/17, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), atingiu um
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volume total de 97,2 milhões de toneladas. Até então, só existiam no Brasil usinas flex, que produzem tanto o etanol de milho quanto o de cana-de-açúcar. Segundo estudo publicado na revista BioEnergy Research, o País é um dos pioneiros na produção de biocombustível. Porém, ainda depende muito da importação, sendo um dos principais compradores dos EUA, segundo a agência de Administração de Informações sobre Energia dos EUA. De acordo com o CEO&Presidente da FS Bioenergia, Henrique Ubrig, a instalação da fábrica pode trazer inúmeros benefícios ao País, além da destinação ao excedente da produção, que não tem espaço para ser armazenado nas condições atuais. Adicionalmente, os mercados domésticos de biocombustíveis e agropecuário também serão beneficiados diretamente pelo produto final da planta. “A cultura está motivada pelos resultados e pela maior segurança na adoção de novas tecnologias e práticas de manejo, o milho está pertencendo a um processo de rápida transformação tecnológica no processo industrial, evoluindo na produtividade, uniformidade, qualidade na lavoura e o mercado aquecido de seus coprodutos (DDGS)”, explica Ubrig. A projeção da Embrapa é de que, em 10 anos, o volume de milho produzido no país deverá superar o de soja. Segundo Ubrig, a FS Bioenergia, por ter o milho como 100% de sua matéria-prima para a produção de etanol e coprodutos, irá operar 12 meses ao ano, uma vez que o milho pode ser estocado por longos períodos de tempo. “Diante dessa expectativa de projeção, automaticamente a competitividade da produção de etanol de milho será maior, poderemos suprir a demanda durante a entressafra do plantio de cana-de-açúcar”.
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ronegócio s
Revolução Ganhar importância em si mesmo não é o único benefício da valorização da cultura. Plantando mais milho, o produtor ajuda a melhorar o solo na rotação de culturas e acaba aumentando também a produtividade da soja. Para Ubrig, a produção de etanol e coprodutos 100% a partir do milho direciona o agronegócio brasileiro para novos mercados, demonstrando que são possíveis a viabilidade financeira e a utilização de matérias-primas que até algum tempo atrás não tinham aproveitamento. “Hoje já podemos acompanhar o reaproveitamento sustentável no seu total. O investimento da FS Bioenergia foi feito na construção de uma planta que produz zero efluentes, tendo um circuito contínuo de água e reutilizando tudo dentro do próprio ciclo de produção, que é fechado. Todo o processo é sustentável e nada é desperdiçado”. O produtor de milho hoje está caminhando conforme a demanda comercial da cultura do grão. “Alguns estocam grande parte de sua produção para agregar valor no fechamento das negociações, isso contando com a eventual falta da matéria-prima na indústria. Se o mercado corresponde com a projeção de aumento no volume da produção de milho, o produtor estará mais seguro para ampliar o seu plantio e consequentemente o preço da saca de milho será mais valorizado”.
A usina A capacidade inicial de produção prevista da planta é de 240 milhões de litros de etanol por ano. A unidade ainda terá potencial para produzir anualmente até 186 mil toneladas de farelo de milho — sendo 125 mil toneladas de farelo com alto teor de fibra e 61 mil toneladas de farelo com alto teor de proteína —, além de 7 mil toneladas de óleo de milho. Já existe o planejamento para a duplicação da planta de Lucas do Rio Verde em 2018, o que gera uma expectativa de aumento em sua produção.
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TECNOLOGIA MANEJO
Agronegócio: pioneiro em Ângela Prestes
Startups ajudam a construir a realidade de inovação e sustentabilidade da agricultura e pecuária brasileiras
M
ariana acompanhou, desde criança, os desafios do dia a dia no campo. Filha de produtores rurais, ela viu de perto as dificuldades e necessidades da plantação. O que Mariana enxergou na propriedade dos pais é realidade em muitas outras pelo país: decisões tomadas na intuição e no conhecimento passado de geração em geração. Não que o aprendizado não possa ser ensinado de pai para filho, mas ela via uma necessidade de fatos, de entender melhor o ambiente para tomar as decisões mais corretas. O perfil de Mariana Vasconcelos, hoje CEO da Agrosmart, é o mesmo de tantos outros jovens Brasil afora. São eles que estão criando uma nova onda de inovação para o agronegócio. Processos mais inteligentes e rápidos, com economia de energia, de água, de tempo, de trabalho. As startups são empresas, geralmente de tecnologia, que estão dando seus primeiros passos no mercado. Hoje são mais de 3 mil funcionando em território nacional, e não somente na área de tecnologia. Segundo o último levantamento da Associação Brasileira de Startups (ABStartups), existem mais de 75 empresas e startups com seu modelo de negócios focado especificamente no agro, sendo que muitas outras empresas também contam com soluções na área ou em áreas correlatas. Em 2015, o mercado de startups voltadas ao agronegócio (alimentos, agricultura e pecuária) alcançaram a incrível marca de US$ 4,6 bilhões, o que equivale a mais de R$ 15 bilhões em conversão direta. O valor 12 |
Foi pensando na flexibilidade que o produtor precisa ter para realizar outras tarefas, enquanto p
notado ultrapassou as previsões dos analistas (US$ 4,1 bilhões) e praticamente dobrou o investimento realizado em 2014 (US$ 2.36 milhões). Os dados concretos dos investimentos em 2016 ainda não foram anunciados, mas espera-se que os valores tenham ultrapassado a marca atingida em 2015. As agtechs seguem os mesmos princípios das demais - empresas inovadoras associadas à tecnologia, com metodologias como lean startup, design thinking e customer development. De acordo com o coordenador do comitê de Agtech da ABStartups, Maikon
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m tecnologia de ponta
“Com nossos sensores não é necessário estar 100% do tempo no campo ou realizar toda a mão de obra operacional e manualmente”, explica Mariana. Assim, ela criou uma plataforma de agricultura digital que hoje é a principal da América Latina para que produtores rurais tomem melhores decisões no campo e tornem-se mais resilientes ao clima, trazendo transparência e sustentabilidade para cadeia de produção de alimentos. A empresa gera recomendações ao monitorar lavouras por meio de sensores e imagens de satélite, interpretando as necessidades da planta em tempo real em relação a irrigação, doenças e pragas. O uso do sistema permite economizar até 60% de água, 40% de energia e aumentar a produtividade em até 15%. Mariana conta que, no início, por mais tecnificados e instruídos que fossem os produtores abordados, poucos eram os que realmente estavam abertos a aceitar algo novo e implantar de fato na fazenda. Porém, a medida em que os mais adeptos à tecnologia começaram a usar o sistema, os mais conservadores passaram a aceitar melhor e se mostrarem abertos. “A era da Agricultura Digital está só começando, é um processo que tende a levar pouco tempo para que se torne algo natural e comum na vida do produtor, eliminando assim o medo e a desconfiança. Diferentemente da agricultura de precisão, que levou quase 20 anos para se popularizar em todo o mundo, com a Agricultura Digital tudo será mais rápido. Isso se deve ao fato de essas tecnologias funcionarem de maneira imperceptível e possuírem um custo de implantação inferior, com uma tendência de cada vez mais se tornar acessível”, acredita ela.
permanece permanece conectado conectado com com aa lavoura, lavoura, que que aa Agrosmart Agrosmart surgiu. surgiu.
Schiessl, o que muda um pouco é o perfil dos empreendedores. A idade média é um pouco acima das demais startups de outro setor. A ideia geralmente nasce na faculdade de um estudo ou pesquisa acadêmica. Além disso, mais de 50% delas são compostas por fundadores que têm pós-graduação. Melhores decisões no campo Foi pensando na flexibilidade que o produtor precisa ter para realizar outras tarefas, enquanto permanece conectado com a lavoura, que a Agrosmart surgiu.
Onde nasce a inovação? As universidades desempenham um papel muito importante quando se trata do assunto. É dentro delas que a maioria das startups são criadas. A Z2S Sistemas Automáticos, por exemplo, nasceu no Parque Científico e Tecnológico da Universidade de Passo Fundo (UPF), no Norte do Rio Grande do Sul. Tudo começou em 2015, quando Elias Sgarbossa, na época acadêmico do curso de Engenharia Elétrica da UPF, procurou um de seus professores com a ideia de desenvolver um sistema para limpeza de ordenhadeiras canalizadas para seu
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A Z2S Sistemas Automáticos, por exemplo, nasceu no Parque Científico e Tecnológico da Universidade de Passo Fundo (UPF)
Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). O projeto levou um ano para ser desenvolvido e devidamente testado na propriedade da família do Elias, produtora de leite há mais de 30 anos. Em março de 2017, junto com outros profissionais, Elias entrou para a pré-incubação na UPF. A empresa Z2S Sistemas Automáticos foi oficialmente criada em julho de 2017 e desde então vem se organizando para produzir e vender os ROV, nome dado ao Sistema de Limpeza para Ordenhadeiras Canalizadas. O feedback dos primeiros produtores que conheceram o produto, segundo Elias, foi excelente. “Estamos produzindo as primeiras unidades do ROV, então, apenas alguns produtores e pessoas relacionadas à produção de leite puderam observar o sistema funcionando na propriedade da minha família. Todos ficaram maravilhados com o produto”. O agronegócio e o desenvolvimento de tecnologias O caminho da agricultura digital não tem volta. Schiessl faz uma relação com o início da internet na década de 90. “Não tem mais como voltar atrás e ficarmos sem internet. É quase impossível pensarmos hoje que um escritório de contabilidade ou uma grande empresa consiga trabalhar sem internet. Na agricultura será a mesma coisa. Será impossível daqui a 5 ou 10 anos imaginarmos em plantar, irrigar ou colher sem a agricultura digital”, explica. Para ele, a grande questão hoje não é se grandes dados (Big Data) podem fornecer maiores rendimentos, mas quando. “Embora o potencial de desenvolvimento 14 |
seja sem dúvida alto, o progresso digital na agricultura tem sido lento. Até agora, o setor está muito atrasado ao se tornar o próximo campeão digital. Eu acredito que a informação deve estar na palma da mão. E acessível a qualquer momento no seu smartphone. E, para isso, já existem tecnologias que permitem essa acessibilidade dos dados e da gestão da fazenda”. Para Mariana, a posição brasileira do agronegócio, em relação a outros países, é pioneira. “Diferentemente da maior parte dos outros setores da economia, a agricultura brasileira sempre foi pioneira no desenvolvimento de tecnologia de ponta. Isto se deve principalmente as nossas condições de agricultura tropical, que são bastante diferentes das condições de clima temperado dos países desenvolvidos como EUA e Europa”. Segundo ela, foi essa a característica que incentivou os produtores brasileiros a desenvolver tecnologia dentro de casa. “Além disso, possuímos um dos maiores potenciais no mundo de recursos naturais para práticas agrícolas. Desta forma, a combinação entre tecnologia e abundância de recursos contribuiu fortemente para os avanços no setor nos últimos 50 anos”. Já Elias acredita que, comparado com outros setores da economia, o agronegócio está carente de inovações. “Alguns setores do meio rural já contam com uma tecnologia avançada, como é o caso da agricultura de precisão aplicada na produção de grãos, a qual tem se mostrado muito eficiente no aumento da produtividade das lavouras brasileiras. Em contrapartida, outros setores do agronegócio ainda se encontram carentes de tecnologia, principalmente nas atividades onde os pequenos e médios produtores trabalham”.
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ARTIGO MANEJO
Escore de cocho: técnica conhecid
O
escore de cocho é uma ferramenta bem difundida no meio técnico, porém muito utilizada na pecuária de corte e pouco adotada na pecuária de leite. Assim como o Escore de Condição Corporal (ECC), ou qualquer outro, ele adota a medição através de um grau de variação. Quando falamos que o escore de cocho é pouco utilizado na pecuária de leite, dizemos isso pois o que acompanhamos no campo são propriedades onde os funcionários não conhecem tal protocolo, ou que em sua maioria utilizam de tal procedimento de forma incompleta/ inadequada. É muito comum chegar em fazendas onde os funcionários dizerem “a gente ajusta o trato de acordo com a sobra” ou “tem dia que elas comem mais mesmo”, o fato de se observar a variação de alimento no cocho já é o início de um trabalho. Porém, o que falta nesses casos são as avaliações que causam essas variações e os problemas que podem vir a causar. Alguns pontos devem ser observados quando falamos em variações de consumo ou ingestão de alimentos: – Qualidade dos alimentos fornecidos na dieta. É importante que sejam alimentos dentro dos padrões. – Quantidade fornecida, ou seja, balanceamento dessa dieta de acordo com a exigência dos animais do lote. Aqui levamos em conta quantidade de nutrientes, número de tratos, etc. – Homogeneidade do lote, fator que muitas vezes não é levado em conta dentro de uma propriedade. – Interpretação das variações de consumo e suas implicações práticas. As fazendas, como dito anteriormente, fazem ajuste na quantidade fornecida sem avaliar ou interpretar o que está causando essa variação. Dessa forma, é muito comum que animais neste tipo de sistema apresentem o que chamamos de consumo cíclico, ou seja, alta ingestão hoje e baixa ingestão amanhã e assim sucessivamente. Mas então o que causa tal comportamento?
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Uma possível causa é a adoção de dietas com alta capacidade de elevação da produção de ácidos no rumem, os ácidos graxos voláteis (AGV´s). Sendo assim, deve-se evitar alta ingestão dessas dietas, pois a mesma pode causar queda excessiva de pH ruminal, além de danos ao ambiente ruminal, caracterizando uma acidose subclínica, na maioria dos casos (SCHWARTZKOPF-GENSWEIN et al., 2003). Os animais, utilizam de mecanismos de redução de consumo como forma de “regularizar” os níveis de pH no rumem, ou seja, a redução no consumo hoje leva ao que chamamos de “bem-estar”, e dessa forma o animal tende a voltar a consumir grande quantidade da dieta novamente, o que acaba gerando uma nova queda excessiva do pH, caracterizando o consumo cíclico. Quando falamos da parte econômica, essa avaliação se torna ainda mais importante já que sabemos que a nutrição é fator importante, para não usar a palavra determinante, na produção de leite. Porém, este assunto será abordado com mais detalhe na próxima publicação. Leitura do cocho Mas então, como realizar a leitura das sobras no cocho? Qual medida adotar de acordo com a nota dada na avaliação? Vamos avaliar cada nota e como devemos proceder, lembrando que uma hora antes de realizar o novo trato é a melhor hora para se fazer a leitura de cocho:
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Escore 0: Sem alimento; Escore 1: Alimento espalhado, maior parte do aparente (menos que 5% da quantia fornecida); Escore 2: Fina camada e uniforme no fundo do cocho (5 a 10% da quantia fornecida); Escore 3: Média camada no fundo do cocho (cerca de 25% da quantia fornecida); Escore 4: Grossa camada no fundo do cocho (cerca de 50% da quantia fornecida); Escore 5: Alimento intacto. OBS.: Os níveis das camadas, deve levar em conta o tipo de alimento fornecido, tamanho das partículas desse alimento, principalmente no que diz respeito ao volumoso utilizado. Definimos como fazer a leitura, mas agora precisamos definir o que é preciso fazer com essas informações. O que tem se observado entre os técnicos é que o escore 2 é considerado o ideal. Em situações onde são encontrados os escores 0 e 1, recomenda-se aumento na quantidade de alimento fornecido no cocho pois caracteriza que os animais estão passando por um processo de “sub” ingestão de nutrientes. Esse tipo de escore quando corrigido, possibilita aos animais expressarem seu potencial genético. Quando encontramos escores 3 e 4, conforme Figura 3, é sinal de que a dieta fornecida está “super” estimada para o lote, ou seja, a quantidade é maior do
da, mas pouco utilizada
Figura 1 – Vacas após a ordenha sendo alimentadas com dieta total.
Figura 2 – Sobras encontradas no cocho antes do trato da manhã.
Figura 3 – Dieta superestimada para o lote.
Figura 4 – Baixa qualidade da dieta fornecida aos animais.
Figura 5 – Dieta foi fornecida de forma heterogênea.
que aquela necessária. Outro fator a ser observado nesses casos, assim como no escore 5, é algum problema clínico que o animal possa apresentar que o esteja levando a tal comportamento. Animais com acidose subclínica, claudicação ou até mesmo no CIO tendem a reduzir o consumo. É preciso deixar claro que estamos trabalhando com um parâmetro subjetivo, ou seja, o treinamento de quem fará a leitura do cocho é de suma importância já que é ele quem irá definir os pontos a serem observados e avaliados. Uma recomendação é que seja feito por quem realiza o trato, pois ele está em contato direto com os animais e acompanhamento dos tratos. Quando bem utilizado, o escore de cocho se torna ferramenta eficaz e eficiente para ajudar no manejo nutricional e sanitário da propriedade, além de evitar perdas econômicas com sobras excessivas.
Thiago Pereira Zootecnista pela Universidade Federal de Viçosa, MBA em Gestão de Projetos pela UNIUBE, idealizador do projeto Tecnologia para o Agronegócio.
thiagorp100@gmail.com
De forma prática, são listados abaixo, algumas sugestões para manejo do cocho: - Adequar o tamanho do lote, respeitando o tamanho de cocho disponível. - Quando for realizar o ajuste da dieta, fazer o aumento de forma gradativa. - Reajuste de formulação deve ser feito de forma gradativa e sempre ser atualizado no banco de registros. - Verificar periodicamente o teor de MS da dieta. - Verificar a granulometria dos alimentos, já que o tamanho da partícula tem influência direta no pH ruminal. - Espalhar a dieta fornecida por todo o cocho, e no mesmo horário. - Lembrar que o clima tem influência sobre o consumo de alimentos. - Verificar e estabelecer rotina de limpeza dos bebedouros, disponibilizando água de qualidade aos animais. - Os cochos devem ser limpos diariamente, sobras deixadas por muito tempo são portas para as toxinas. Em resumo, quando realizamos a leitura do cocho de forma correta e rotineira, estamos reduzindo os problemas de acidose e aqueles relacionados a ela, além disso aumentamos a eficiência e reduzimos os custos de produção. Novembro e Dezembro - 2017 | Rio Grande do Sul | Ano III | nº18
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GESTÃO
PRODUTIVIDADE X LUCRATIVIDADE
Quando se trata de gestão da preciso sentar para fazer as c Ângela Prestes Juliana Zanatta
Produzir mais não significa ter sucesso na propriedade. O tempo em que o produtor agia pelo feeling acabou. Hoje, quem não planeja as ações na lavoura de olho nos lucros não consegue manter os negócios
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G
estão eficaz, ou manejo inteligente, são as palavras que regem a propriedade do seu Carlos Alessio, de Faxinal dos Guedes/SC. Os mais de 800 hectares recebem uma atenção que vai além do investimento em tecnologia e eleva a fazenda um outro nível quando se trata de gestão. Quando os processos são pensados e planejados de forma inteligente, cada centavo colocado na propriedade retorna com juros. Corrigir um a um os problemas identificados na produção foi a principal estratégia utilizada pela família para conseguir obter mais rentabilidade. No caso de Alessio, o primeiro passo foi corrigir as deficiências do solo. Foi pensando em uma forma de aumentar a produtividade que em meados de 1980, em um encontro sobre plantio direto em Ponta Grossa/PR, que seu Carlos Alessio teve o contato pela primeira vez com o então desconhecido ‘plantio direto’. Na época, transtornos com erosões no solo ameaçavam a plantação da família que, preocupada, buscava solução para o problema. Depois de uma semana de aprendizado sobre a novidade e decidido a mudar a lavoura, seu Carlos voltou para casa e fez uma proposta aos irmãos: “Nós temos duas opções: ou fazer o plantio direto, ou parar com a lavoura (...). Daquele dia em diante fiz enxerto de terra onde tinha erosão”.
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Assista o vídeo da matéria https://goo.gl/EZCyKc
da a soja, é contas
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ximizaria a produção. Foi aí que os investimenMenos custos, mais rentabilidade Logo vieram os filhos e com eles o desejo tos passaram a ser direcionados a novas técnicas de dar sequência ao trabalho do pai. Rodrigo de melhoramento da qualidade do solo. Com e Diego cursaram agronomia para aprimorar isso passaram a baratear os custos com a lavouainda mais as atividades no campo. Os rapazes, ra, gastando menos com insumos e maquinários, por exemplo. “Não é que você vai com outra visão sobre gestão, deixar de investir na sua lavoura, buscaram uma forma de aumenmas você vai utilizar fontes altertar a rentabilidade da propriedanativas, mais baratas para ter um de, reduzindo custos. Com isso, custeio um pouco mais racional”, passaram a aplicar novas técniconta Diego. cas de manejo ao solo. Não é que você vai Foram realizadas quatro interNo decorrer dos anos, a prodeixar de investir venções para aumentar a quapriedade de 800 hectares acompana sua lavoura, mas lidade do solo e, consequentenhou a modernização da agriculvocê vai utilizar mente, da produção: cloreto, tura e recebeu de braços abertos a chegada da agricultura de pre- fontes alternativas, calcítico, dolomítico e gessagem foram introduzidos na terra. cisão. “Isso nos permitiu corrigir mais baratas, para Além disso, a família inseriu um o solo e uniformizar essas áreas, ter um custeio sistema de palhada, que consisalém de corrigir horizontalmente um pouco mais te no plantio de um mix de culo perfil da lavoura”, explica o filho racional”. turas, como aveia preta, ervilha de seu Carlos, Diego Alessio. Diego Alessio forrageira, tremoço branco, cenOs produtores fizeram as contas teio e nabo, que formam uma coe perceberam que se investissem bertura rica em nutrientes sobre menos em tecnologia, como por o solo, o que o fortifica contra plantas daninhas exemplo, não aplicando fundos em plantadeiras de última geração, e se investissem mais em meios e o enriquece para receber o próximo plantio, para melhorar a fertilidade do solo, isso sim ma- como o de milho, por exemplo. “Com essa ca-
Os filhos Diego e Rodrigo cursaram agronomia e trouxeram para a propriedade da família uma visão sobre gestão focada no aumento da rentabilidade 20 |
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ENTREVISTA
Conversamos com o economista-chefe da Federação de Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), Antônio da Luz, que deu várias dicas sobre gestão de propriedades sojicultoras. Confira, nas próximas páginas, suas respostas.
Plantio de um mix de culturas forma uma cobertura rica em nutrientes sobre o solo
mada de palha, até com o corretivo do solo tu consegue ser mais rentável. Não precisamos utilizar, por exemplo, 10 ou 15 toneladas de gesso. A gente viu aqui que com duas toneladas estamos com raízes a quase dois metros. O negócio é levar carbono para baixo e é só com raiz que isso acontece”, relata Diego. Até com as cultivares os produtores passaram a economizar. Nas últimas safras, a produtividade passou de 60 sacas por hectare para 83, número que a família também atribui ao potencial genético das cultivares. Os híbridos de milho são mais recentes, mas cultivares de soja são as que foram lançadas em 2006/2007. “A gente tem que saber trabalhar com a cultivar. O que foi melhorado foi o manejo, a correção e o entendimento das plantas. Se eu mudar o híbrido, tenho que aprender tudo de novo. Então partimos dessa premissa que é mais interessante você entender o cultivar velho, o híbrido mais antigo, do que ficar se apegando a lançamentos em que você ainda tem que aprender a dominar”, explica Diego. O produtor acredita que para ter uma produção de sucesso, tudo se restringe a gestão e ao manejo. Entender a propriedade, identificar onde não é lucro investir, propiciar uma condição boa para a planta e entender os elementos que ela precisa são condições que irão maximizar a rentabilidade da lavoura, que passará a
Destaque Rural u Quais os principais desafios dos produtores quando se trata de gestão da soja? Antônio da Luz u O maior desafio é ter a consciência que gestão é muito importante e que em média esse é um assunto desprezado. Os povos latinos, de maneira geral, acreditam que ser bom ou mau gestor vem de berço, da genética. Uma habilidade inata, portanto. Os povos anglo-saxões, por outro lado, tratam esse tema como algo que é adquirido através do conhecimento e, desde a tenra idade, as crianças já começam a ter contato na família e na escola com os principais conceitos de finanças e economia. O principal desafio, portanto, é romper com as certezas de que sabe tudo e que faz tudo o que pode. Fazer o que pode não significa suficiência. O segundo desafio é entender que chegou em um nível de gestão da produção fantástico, mas que há um mundo para evoluir na parte econômico-financeira. O terceiro é ser maximizador de lucro e não de produção e o quarto é comandar seu negócio por indicadores e não por “feeling”. Quando os produtores olharem para a gestão econômico-financeira com seriedade eles vão sentir a mesma coisa que os produtores que viram os fertilizantes, químicos e máquinas pela primeira vez.
Solo com palhada recebendo plantio de milho
produzir mais, gastando menos. São alternativas de investimentos mais baratas, mas que não deixam a qualidade de lado. “Aqui em nossa propriedade, os investimentos são primeiro no solo, depois nas máquinas. A gente tenta promover um ambiente para a planta se desenvolver o melhor possível. Nós entendemos que a partir do momento em que você instala um sistema assim você consegue atacar em várias frentes”.
“Não adianta ter produtividade e não sobrar dinheiro no bolso” A gestão aliada a uma produtividade de sucesso é a soma de diversos pequenos fatores. A afirmação acima é do professor e engenheiro agrônomo Elmar Luiz Floss. “Eu poderia pegar uma propriedade com alta fertilidade e em um ano colocar menos adubo. Nesse caso, como o solo tem uma reserva alta de nutrientes, poderia realmente colher muito bem. Mas se fizesse isso de novo no próximo ano, seria evidente que a produtividade e a lucratividade cairiam. Então por isso é importante ter rentabilidade de forma permanente”. É importante o produtor anotar tudo o que entra e sai da propriedade e colocar na ponta da caneta. Só aí ele vai saber se realmente está tendo retorno de todo o seu investimento. Para Floss, um dos maiores erros na sustentabilidade econômica de uma propriedade é quando se gas22 |
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Destaque Rural u Como equilibrar os custos de produção na cultura da soja? Investir mais é sinônimo de mais produtividade? Antônio da Luz u Com certeza, investir em tecnologia aumenta a produtividade. Com certeza! Mas quem disse que maior produtividade significa sempre mais lucratividade? É exatamente esse o cerne da questão da maximização da produção x maximização do lucro. O que você quer maximizar? Produção? Então invista tudo o que puder em tecnologia. Mas se seu negócio é lucro, então tem que fazer contas para ver qual o nível e qual o tipo de tecnologia eu devo adotar. É algo que nós economistas chamamos de custo e receita marginal, ou seja, o custo para eu produzir um saco a mais, ou um quilo, ou litro no caso da pecuária, em comparação com a receita que terei a mais. Se o custo para produzir uma unidade a mais for maior do que a receita que essa unidade trará, não faz nenhum sentido econômico buscar essa unidade. O que eu vejo de forma geral são produtores tentando maximizar produtividade sem se preocupar se isso faz sentido do ponto de vista econômico. Muito estão botando dinheiro fora.
ta demais no investimento e se economiza no custeio da lavoura. Nesse caso deveria ser ao contrário: se o produtor tem dívidas de terra ou de máquinas, ele precisa fazer uma lavoura melhor para poder ter uma lucratividade maior, e com essa pagar as contas. “Aquele produtor que capricha na tecnologia, aumenta a produtividade e aumenta a lucratividade, está comprando terra daquele que não investe na propriedade. Tem que haver uma diferença grande entre custo e investimento. Tecnologia boa é tecnologia que sobra dinheiro no bolso. Tecnologia cara é a tecnologia que não me dá retorno”, complementa. Floss explica que o produtor não pode continuar todos os anos usando a mesma fórmula de adubo, se em função do clima ou em função da variedade, a produtividade varia. “O produtor tem que estudar qual a melhor cultivar adaptada para aquela conEu costumo dizer que dição de clima, a melhor o agricultor tem que tecnologia, solo, época de olhar mais para a sua semeadura; o melhor fertiterra e menos para lizante, inseticida, e fungia terra do vizinho. cida para aquele patógeno. Dessa maneira, ele pode Porque aquela terra resolver o problema com é sua, e é ali que você custos menores, fazendo tem que melhorar”. um uso mais adequado da Elmar Floss Pesquisador tecnologia (...)”, explica. “E aí aumentando a renda pela produtividade”, complementa o agrônomo. São poucas as diferenças que separam os produtores de alta produtividade, dos produtores de baixa produtividade. “Eles praticamente usam os mesmos insumos, as mesmos cultivares. Só que o produtor com baixa produtividade não investe. Ele não tem custo com a propriedade, mas também não tem retorno porque não é bem feito”, – explica Floss, que finaliza – “Como sempre digo, a melhor precisão é a precisão do capricho”.
Destaque Rural u É possível investir na propriedade com alternativas mais baratas, sem deixar de lado a qualidade? Onde o produtor pode economizar sem prejudicar a produção? Antônio da Luz u Essa é uma questão muito interessante, mas que não pode ser respondida sem analisar um caso concreto, pois cada propriedade é única e deve ser analisada individualmente. Entretanto, ouvi numa palestra de um agrônomo, o Paulo Pires, presidente da Fecoagro, algo que me fez pensar muito e depois conversando com outro brilhante agrônomo, o Hamilton Jardim, as coisas fizeram sentido na minha cabeça. Eles disseram que está se fazendo pouca agronomia e muito pacote. Ou seja, as pessoas estão esquecendo da técnica que há por detrás do ambiente biológico, climático, etc. que torna cada unidade produtiva única e se está indo para o caminho simples de aceitar que aquilo que ocorreu no experimento deve funcionar exatamente na minha propriedade. Não é assim. O trabalho do agrônomo é singular, não se pode querer produzir como se estivesse fazendo um bolo.
LEITE
Produzir Produzir mais, mais, gastar gastar m
Produzir alimento mais barato e com qualidade para o gado leiteiro em momento de baixa no preço é um desafio para os produtores 24 |
Juliana Zanatta
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astar menos não é sinônimo de não investir, mas de remanejar os gastos. É isso que muitos produtores de leite estão fazendo: em época em que o preço do litro não está animador, o jeito é produzir alimento mais barato para o gado, mas que não diminua a produção. O problema é que nem sempre os produtores acertam na hora de cortar os custos de alimentação sem prejudicar o sistema. Conforme o coordenador do departamento
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menos menos
colha das cultivares e tratar o solo de maneira veterinário da Cotrijal, Alan Rahman, existem adequada. Permitir o acesso de água para as vasistemas viáveis de produção, como o semicas, não apenas durante as ordenhas, mas tamconfinado, onde as vacas podem retirar 50, 60 bém durante o pastejo é outra alternativa. “89% e até 70% daquilo que elas precisam consumir do leite é composto por água então as vacas tem via pastagem. Os outros 30, 40 ou 50%, vão deque tomar água. Uma vaca que produz muito pender da variação do sistema, entre silagem e leite toma muita água. Vacas que produzem no ração, por exemplo. Alan explica que esse sisteverão uma média de 35 litros ma é viável porque o produtor de por dia, podem consumir não precisa investir muito em até 140 litros de água por dia”, galpão ou em máquinas. Já no explica. “Então, ao invés do prosistema confinado, o produtor dutor investir um horror de dipode ter um sistema de custo nheiro em um galpão, ele pode baixo, desde que tenha o redar acesso a água para as vacas banho muito bem manejado e nos piquetes. Água de qualidacom produtividades altas. “Nesde tem que ser potável”, complese sistema, o produtor tem um ta o veterinário. custo alimentar maior do que No período do ano em que é no semiconfinado, porém tem mais quente, o ideal é que o prouma produção maior porque as dutor evite levar o gado pastar vacas têm melhores condições das 10h até às 17h. Isso porque de conforto. Elas ficam só deio calor causa estresse térmico ao tando e levantando o dia inteigado. Rahman explica que esse ro. Por conta disso, conseguem estresse é influenciado por dois entregar mais leite”, explica A vaca tendo motivos: a umidade e a tempeRahman. mais conforto, ratura. “Quanto mais úmido Mas para que o sistema de produção faça a diferença na consequentemente está o ambiente menos as vacas propriedade é preciso ter uma vai entregar mais dissipam calor. Quando as vacas boa gestão. “Eu posso ter um leite”. se esquentam porque está muito quente ou porque a umidade rebanho de baixo custo tanto Elmar Floss Pesquisador está muito alta, elas reduzem o no semiconfinado quanto no consumo de alimento e quando confinado. Não é o sistema isso acontece produzem menos leite. O ambienque vai definir isso, é quem está fazendo a te também vai interferir em outras coisas como operação, quem está comandando a gestão” reprodução e qualidade dos cascos, isso porque explica Rahman. O ideal é que o produtor quanto mais estresse calórico sentir a vaca, mais tome decisões baseadas nos números de sua tempo ela fica de pé. E aí o produtor também vai propriedade, e não a partir de exemplos de ter que pensar em sombra e essa sombra pode outras propriedades. ser artificial com sombrite, ou com árvore”. No sistema semiconfinado o produtor tem Além de fornecer sombra o produtor pode diversas alternativas para melhorar a produção, resfriar as vacas. Rahman explica que durante como escolher pastagens de alta qualidade, meas ordenhas do dia, ou no momento em que as lhorar o manejo do pasto, fazer uma melhor es-
Preço baixo menos lucro por litro necessidade de aumento na produção mais litros, maior rentabilidade
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Conforto para vaca não é supérfluo, éo mínimo que ela precisa para produzir”.
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vacas fazem o ‘lanche’, é importante molhá-las e ventilá-las de 30 segundos a 1 minuto. “Dessa forma elas vão se esfriando e com isso vão comer mais, vão deitar mais. As vacas tendo mais conforto, consequentemente vão entregar mais leite. Tudo isso pode ser feito em um galpão semiconfinado, não precisa ser no confinado”. Ainda, quem tem rebanho a pasto deve se preocupar com manejo de corredor. Se onde o corredor está tem muito barro, deve ser mudado, colocado em um local mais adequado, onde que não vá acumular muita água. Custos A gestão de custos é a base em qualquer negócio. O produtor precisa ter os números da propriedade para saber onde deve cortar os gastos e onde é vantagem investir. Muitas vezes ele acredita que seu sistema é ruim, porque produz pouco. Mas será que o sistema produz pouco porque é ruim ou porque está sendo mal gerido? Em um momento de preços baixos no leite é preciso agir com segurança. Se ele cortar custos nos lugares errados, pode perder na produção e, consequentemente, perder dinheiro também. De janeiro a maio deste ano, o preço médio do
litro de leite no Rio Grande do Sul ficou em R$ 1,20. Neste segundo semestre, o preço médio baixou, variando de R$ 1,00 a R$ 1,05. “Então se o produtor estava entregando 10 mil litros mensais, ele estava recebendo 12 mil reais. Hoje se entrega 10 mil litros, recebe 10 mil reais. Se ele cortar na alimentação, as vacas vão produzir menos. Isso quer dizer que se já está sobrando menos da margem líquida porque o preço final dele baixou, se perder leite, além de perder margem ele vai perder escala” – exemplifica – “a realidade é que quanto menor é o preço do leite, mais é preciso produzir, porque a margem é menor, então eu preciso ter mais escala, por isso que na maioria dos países que estão com bacia leiteira desenvolvida os rebanhos são enormes”, complementa o veterinário. “O produtor é empreendedor. É importante entender de gestão de custos, porque ele tem que saber o que é um negócio bom e o que é um negócio ruim”. Rahman conta que em momentos passados, muitos produtores estavam tendo margem de lucro de até 30% na produção. Ele considera esse um excelente negócio, mas atenta que é preciso saber comparar essa margem com outros negócios que estão no mercado. “O mer-
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cado do leite é feito de altos e baixos, sempre foi assim e sempre vai ser. Por isso o produtor tem que criar um sistema de produção em que consiga produzir o máximo que puder com os recursos que ele tem, para quando tiver nesses momentos ruins, ainda continuar com renda. Também é preciso saber quanto é a sobra de sua renda, porque sabendo esse valor, ele vai saber até onde pode dar o passo; saber onde investir e onde vai ter retorno o investimento”. Existem vários investimentos na propriedade que são necessários, no entanto tem aqueles que, para Rahman “não geram um litro de leite”. Ele dá como exemplo a compra de um novo trator. Vai requerer menos gastos com concerto, mais conforto no trabalho. Mas aí vem a questão: quantos litros de leite esse trator vai proporcionar a mais por dia? “É preciso ter prioridade de bem-estar ela não vai produzir; é preciso dar nos investimentos. Quando sobra mais eu posso condição de produção”, explica o Rahman. me dar o luxo, mas quando não sobra eu tenho “A fertilidade do solo também deve ser prioque ter prioridade”, completa Rahman. ridade. Tudo que ele vai produzir depende do O produtor precisa identificar o que é priorisolo: as pastagens, silagem, feno, independendade em sua propriedade. Além disso, perceber o temente do sistema. Segundo: manejo dos anique está deixando a produção decair. Uma quesmais é muito importante porque tão que interfere na produtividade se ele tiver o rebanho atrasado do rebanho é quanto ao manejo com a reprodução ele não vai conreprodutivo. Rahman explica que seguir médias produtivas altas”. sempre vai ter no rebanho aquela Quando o produtor for escolher vaca que produz mais e aquela que matérias para produzir alimento produz menos, mas o produtor O produtor é em casa, seja pastagens, silagens, não pode ter discrepância, ou seja, empreendedor. deve escolher sempre o que tiver a ter vacas que produzam 40 litros e É importante produtividade mais alta. Na escooutras 10 litros. Isso pode ocorrer entender de gestão lha da cultivar ele precisa ser criporque elas demoraram para emprenhar e a curva de lactação já de custos, porque terioso, isso vai afetar diretamente está indo para o final; o produtor ele tem que saber no custo de produção. Antes do produtor optar por não emprenhou ou demorou para o que é um negócio fazer uma mudança na sua proemprenhar e aí ele não quer secar bom e o que é um priedade ele deve avaliar bem a porque elas ainda produzem. Por negócio ruim”. realidade que está no momento. isso o manejo reprodutivo tem Independentemente do sistema que estar em dia. é importante reconhecer quais Quanto mais a vaca produz, mas são as dificuldades. Se precisar de um auxílio exigências ela tem. Conforme a genética é mede um técnico para isso, que ele procure para lhorada, é preciso melhorar também as condiavaliar a situação. Importante saber quais são ções que o produtor entrega para ela. “Tem que os principais custos que estão interferindo na oferecer conforto. E quando se fala em conforto propriedade e quando for pensar em investimuitas pessoas acham que é dar algo supérfluo mento, tentar pensar no menor investimento a elas. Conforto para vaca não é supérfluo, é o pelo maior retorno, porque a longo prazo isso mínimo que ela precisa para produzir. Temos vai interferir muito. que lembrar que se a vaca não tiver o mínimo Novembro e Dezembro - 2017 | Rio Grande do Sul | Ano III | nº18
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REFERÊNCIA
FOTO: CACO ARGEMI
A produção de carne no
Nos campos Sul-brasileiros são produzidos animais com alto padrão genético, que conferem à carne o reconhecimento que a difere de outros estados
Pesquisas apontam que sistema alimentar do rebanho é um dos principais fatores na diferenciação da carne produzida na região 28 |
Graciela Freitas
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abor, suculência, maciez. Essas são algumas das características atribuídas pelo mercado internacional à carne brasileira, que garante - com sua qualidade - importante espaço comercial, embora, ainda, com volumes pequenos destinados à exportação. A Região Sul do país é considerada o celeiro dessa produção. Nos campos Sul-brasileiros, berço das raças britânicas, como Hereford e Angus, são produzidos animais com alto padrão genético, que conferem à carne o merecido e destacado
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o Pampa Gaúcho
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FOTO: GABRIEL BONILHA
reconhecimento que a difere de outros estados brasileiros. Ainda que o Rio Grande do Sul, como um todo, leve o título de produtor de uma das melhores carnes do Brasil, existe uma região do Estado responsável por essa titulação. É no Bioma Pampa que a boa adaptação das raças e suas cruzas, somada a base de alimentação a pasto, dão origem a esta carne diferenciada. A Embrapa Pecuária Sul, localizada em Bagé/ RS, tem se dedicado há mais de 40 anos a pesquisas relativas à importância das pastagens naturais e cultivadas na alimentação dos rebanhos bovinos. De acordo com a pesquisadora da unidade de pesquisa, Cristina Genro, a grande diversidade de espécies forrageiras nativas disponíveis no pasto, produz uma carne com sabor diferenciado, o qual pode ser chamado do “tempero da carne” (terroir). “Resultados de trabalhos de pesquisa desenvolvidos pela Embrapa e seus parceiros nos mostram que o potencial produtivo e o valor nutritivo das pastagens naturais são muito bons e que, com um manejo adequado, é possível, no caso de animais em terminação, abater bovinos com até 18 meses de idade em campo nativo”, explica ela, que ressalta a importância do reconhecimento do campo nativo. “É importante salientar que quando falamos de campo nativo, estamos nos referindo a um bioma tão importante quanto a Mata Atlântica ou a Floresta Amazônica”, salienta Cristina. No Brasil, campo nativo é conhecido como campos sulinos e/ou pastagem natural/nativa; são as áreas que compõem o Bioma Pampa. A pesquisadora Elen Silveira Nalério, responsável por projetos de pesquisa no âmbito da qualidade da carne, comenta que animais criados e terminados em campo nativo, em geral, apresentam uma carne de coloração mais avermelhada, a gordura, por sua vez, é mais amarela, devido aos carotenóides encontrados nas pastagens, e, além
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disso, essa gordura é mais benéfica à saúde do que a que é produzida por animais criados em sistemas de confinamento. “O tipo de alimentação do animal interfere na produção de gordura da carne, e isso recai diretamente sobre a aparência, aroma e sabor. Os animais criados em campo nativo não produzem uma carne com tanta gordura. O percentual é de 3% a 4%, o que é considerado saudável. Essa gordura é medida no contrafilé, sem a gordura subcutânea. Outra característica é o tipo de ácido graxo produzido
a partir dessa dieta, baseada em forragens, cuja presença de ômega-3 é observada em maior quantidade, assim como a relação de ômega-3 para ômega-6, que, de acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), deve ser abaixo de quatro para um, quando constatamos que nestes animais a relação é de dois para um”, afirma a pesquisadora. Outro fator bastante importante a destacar quanto à interação ambiente-animal, é que a produção pecuária auxilia na preservação do
FOTO: MANUELA BERGAMIM
O tipo de alimentação do animal interfere na produção de gordura da carne, e isso recai diretamente sobre a aparência, aroma e sabor. 3 300| |
Elen Silveira Nalério Pesquisadora da Embrapa | Outubro eeNovembro | Novembro Dezembro--2018 2017 || Rio Rio Grande Grande do do Sul Sul || Ano Ano IV III || nº20 nº18 Pecuária Sul
campo nativo, conforme explica a pesquisadora Cristina Genro. “O campo nativo é um ecossistema natural pastoril e, como tal, sua manutenção com a pecuária representa a melhor opção de uso sustentável para a produção de alimentos, desde que manejado adequadamente”, salienta ela, que comenta que dentre as principais ameaças para a degradação do campo nativo, está a utilização de altas cargas animais no pasto. “A principal recomendação para se preservar a pastagem natural, e, ainda, aumentar a produção animal, é o ajuste de carga animal em relação à disponibilidade de pasto na área. O cálculo utilizado é que se disponibilize pelo menos 12 Kg de matéria seca de forragem para cada 100 Kg de peso vivo de animal na área onde está o rebanho. Uma forma mais fácil para o produtor avaliar a quantidade ideal de alimentos é manter a altura da área de pastagem nativa utilizada entre 11 e 15 centímetros”, sugere ela. Rentabilidade com sustentabilidade Os animais criados em campo nativo, cuja alimentação é composta, em grande parte, pela variedade dos pastos naturais, dão à carne qualidade nutritiva, que, por sua vez, oferecem elementos benéficos à saúde do homem. Pensando nisso, os consumidores, de acordo com pesquisas já realizadas, estão dispostos a comprar e pagar mais por produtos saudáveis, produzidos de forma sustentável. A fim de atender essa demanda, sem fugir do seu objetivo principal, que é a conservação da biodiversidade do Bioma Pampa, foi fundada em 2006 a Alianza del Pastizal – hoje, com sede
em Lavras do Sul/RS - uma organização voltada para a produção animal de forma rentável e sustentável, que conta, atualmente, com 140 propriedades associadas, que produzem carne, respeitando e preservando o campo nativo. Conforme seu coordenador, Marcelo Fett Pinto, com base nessa iniciativa foi criado um programa para a comercialização da carne produzida por estas propriedades. O selo indica que o processo de produção contribui para a conservação dos campos nativos do Bioma Pampa e de sua biodiversidade. “Hoje, a carne com selo Alianza del Pastizal é vendida com exclusividade pela rede Carrefour, inclusive com comercialização em São Paulo, e está sendo muito bem aceita pelos consumidores”, afirma o engenheiro agrônomo. Marcelo comenta que a intenção é oferecer os produtos provenientes das propriedades associadas, que conservam a vegetação nativa, para mercados dispostos a pagar um valor diferenciado, valorizando o tipo de produção, que alia, de acordo com ele, qualidade à conservação do meio ambiente. Reconhecendo os diferenciais Além do exemplo da Alianza del Pastizal, algumas associações brasileiras de raças investem em programas de certificação da carne, a fim de agregar valor ao que é produzido por seus associados. A gerente do Programa Carne Pampa, da Associação Brasileira de Hereford e Braford, Fabiana Freitas, explica que existe uma série de requisitos que devem ser obedecidos para que
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FOTO: KEKE BARCELOS
Animais criados e terminados em campo nativo produzem carnes mais benéficas à saúde FOTO ANA VIRGÍNIA GUTERRES - ABHB
Sabor, suculência e maciez são algumas das características da carne produzida nos campos nativos
os animais enquadrados no programa de certificação possam receber o selo de qualidade CARNE CERTIFICADA HEREFORD. O primeiro deles é o padrão racial, seguido da idade do animal, o qual tem de ser jovem, possuir de zero a quatro dentes, e ter uma cobertura de gordura, no mínimo, mediana (3 mm a 6 mm). Por ser um programa de certificação com quase 20 anos de atuação, o pioneiro no Brasil na Certificação de Carcaças, a entidade conta com frigoríficos parceiros em outros estados brasileiros. Contudo, Fabiana ressalta as diferenciações da carne produzida no Rio Grande do Sul, em sistema de alimentação a pasto. “Tem uma diferença na coloração da gordura, que é mais amarelada, em função da ingestão de betacarotenos, que no sistema de alimentação de grãos não há. O sabor também é um diferencial. No Estado, cerca de 95% dos animais abatidos pelo programa possuem essa dieta, e não há como negar que isso implica nas características da carne produzida”, diz a gerente, reforçando as pesquisas realizadas pela Embrapa, que destacam os benefícios da carne produzida pelos animais criados em campo nativo.
FOTO: ZZN PERES
Peculiaridades do Pampa
Carnes produzidas em campo nativo já levam selo de qualidade próprio e são comercializadas para outros estados FOTO: ZZN PERES
No Brasil, o Pampa está restrito ao Estado do Rio Grande do Sul, onde ocupa uma área de 176.496 Km2 (IBGE), o que corresponde a 63% do território Estadual, e a 2,07% do território nacional. Na América do Sul, o bioma se estende por uma área de aproximadamente 750 mil Km2, compartilhada também por Uruguai, Argentina e Paraguai. De serras a planícies, de morros rupestres a coxilhas, com a presença de matas ciliares, matas de encosta, matas de pau-ferro, formações arbustivas, butiazais, banhados, afloramentos rochosos, etc., suas paisagens são variadas, e se caracterizam pelo predomínio dos campos nativos. Desde a colonização ibérica, a criação de gado sobre o Pampa tem sido a principal atividade econômica da região, muito devido ao importante valor forrageiro das plantas que o recobrem. Além de proporcionar resultados econômicos importantes, a pecuária tem permitido a conservação dos campos e ensejado o desenvolvimento de uma cultura mestiça singular, de caráter transnacional representada pela figura do gaúcho. A criação de gado nessas áreas, inclusive, retrata uma das mais simbólicas imagens de representação da cultura do Rio Grande do Sul. Fonte: Embrapa Pecuária Sul
Mais de 90% dos animais abatidos por programas de certificação são criados em sistemas de alimentação a pasto
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CT& Bio
Gilberto Cunha
gilberto.cunha@embrapa.br
Pesquisador do Laboratório de Meteorologia Aplicada à Agricultura - Embrapa Trigo
As plantas e o clima
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ão seria surpresa para ninguém e nem se poderia falar em algo inédito, que dois professores titulares da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), depois de quatro décadas dedicadas ao ensino, na graduação e na pós-graduação, um certo dia, resolvessem, figurativamente, ditar testamento, escrevendo um livro sobre tópicos das suas especialidades. Foi o que fizeram Homero Bergamaschi e João Ito Bergonci, com a obra AS PLANTAS E O CLIMA – Princípios e Aplicações, que se configura como um legado valioso deixado por esses exímios professores às futuras gerações de estudantes. A escritura de um livro como AS PLANTAS E O CLIMA – Princípios e Aplicações, ainda que não aparente, exige que se tenha experiência em ensino (didática forjada na pratica em sala de aula), pesquisa (geração de conhecimento inédito) e extensão (transferência de tecnologia) por parte de quem se aventurar a tamanha empreitada. Em obras desse vulto, não basta compilar informações de outras fontes, apresentar teorias ou comentar exemplos e estudos de caso, como sói acontecer com muitos livros que são indicados como textos de referência por alguns professores universitários sem a menor análise crítica que dê sustentação a essa recomendação. A realidade das coisas tem que ser mostrada como ela é, mas de forma
clara, inteligente e compreensível, como fizeram Homero Bergamaschi e João Ito Bergonci, para que o leitor, tendo o entendimento de temas complexos facilitado, possa se sentir um “gênio” e não um “perfeito idiota”, incapaz de qualquer apreensão do que está lendo. Há, sim, lugar de honra, reservado nos catálogos de editoras e nas prateleiras de estudantes e de profissionais das ciências agrárias, biológicas, atmosféricas e ambientais, para obras como AS PLANTAS E O CLIMA – Princípios e Aplicações. E os motivos para isso são muitos: informação de qualidade e com origem conhecida reunida em um único volume; exemplos e aplicações relacionados com a realidade brasileira; excelência dos autores que lhes é conferida pela vasta experiência em ensino, pesquisa e extensão; e, na minha visão, o lado mais nobre desse livro, que reside no desprendimento dos professores Homero Bergamaschi e João Ito Bergonci, ao sistematizarem e tornarem público o melhor do seu conhecimento, e, com isso, ainda que indiretamente, dando continuidade ad aeternum ao exercício da nobre missão de professores que um dia abraçaram na UFRGS. É Importante frisar, que o colunista, que teve o privilégio de assinar o prefácio da obra, conhece os autores do livro AS PLANTAS E O CLIMA – Princípios e Aplicações, Homero Bergamaschi e João Ito Ber-
gonci, desde há muito tempo. Mas, isso não significa o endosso incondicional a essa obra, sem qualquer análise crítica dos conteúdos e dos autores, tanto nos aspectos profissionais quanto pessoais. Por exemplo, conheci Homero Bergamaschi nos idos de 1978, quando ele, paralelamente, exercia os cargos de professor na Faculdade de Agronomia da UFRGS e de pesquisador no antigo Instituto de Pesquisas Agronômicas (IPAGRO); instituição e ano que o colunista começou a sua carreira profissional. Depois, tive o privilégio de ser seu orientado, Mestrado (1986-1988) e Doutorado (1988-1991) em Agrometeorologia, na Faculdade de Agronomia da UFGRS. Então, não é sem razão, que, pela proximidade, com o profissional, o professor, o orientador e o ser humano Homero Bergamaschi, posso, sem hesitar, dar o meu aval à qualidade desse livro, pois, nos últimos 38 anos, vi, e bem de perto, o esmero com que, diuturnamente, boa parte dessa obra foi sendo construída. A obra, AS PLANTAS E O CLIMA – Princípios e Aplicações, é uma projeção da imagem pessoal e profissional de Homero Bergamaschi e João Ito Bergonci materializada na forma de textos, figuras, fotografias e tabelas. E isso, por si só, é, de antemão, um selo de qualidade. O livro, publicado pela Agrolivros, pode ser adquirido no site da editora: http:// www.agrolivros.com.br/
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DESTAQUE EMPRESAS
Cotrijal: 60 anos de agronegócio
Expodireto Cotrijal inaugurou na região um novo formato de feira, focada no fechamento de negócios
Cotrijal Cooperativa Agropecuária e Industrial de Não-Me-Toque/RS tem grande destaque com a Expodireto, feira de agronegócio que conquistou nível internacional 34 |
Juliana Zanatta
A
história da Cotrijal começa com 11 produtores rurais de uma cidade no Norte do Rio Grande do Sul, a pequena Não-Me-Toque. Eles plantavam trigo, mas não tinham um local para armazenar os grãos colhidos. Foi quando se reuniram e tiveram a ideia de construir um armazém. Para tanto foi preciso buscar um financiamento. E assim, no dia 11 de setembro de 1957, nasce a então Cooperativa Tritícola Mista Alto Jacuí LTDA, denominada desde 2006 Cotrijal Cooperativa Agropecuária e Industrial.
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DESTAQUE EMPRESAS Registros dos 60 anos mostram que as grandes questões discutidas no Conselho da Cooperativa nessa época giravam em torno da produção, venda, compra de sacaria para armazenagem, compra de adubos e fertilizantes destinados à cultura do trigo. Na maioria das assembleias, a questão do preço do trigo estava presente, principalmente no que se refere ao baixo preço e a retenção do percentual para integralização do capital junto à Cooperativa, assunto às vezes polêmico entre os conselheiros. A soja foi introduzida na região da Cotrijal no início da década 60, época em que a Cooperativa já começava a mostrar força, prestígio e credibilidade suficientes para obter altos empréstimos junto ao Banco do Brasil, com o intuito de adquirir adubo e repassar aos associados. Além da expansão física da cooperativa, os anos 70 marcaram uma época em que a mecanização também entraria para valer na vida do produtor da região, com a chegada das primeiras automotrizes e a intensificação do uso de insumos agrícolas nas lavouras. A Cotrijal, nesse período, também se modernizou internamente, adotando o uso de computadores. A cultura entra no contexto de modernização, iniciado na década anterior com o trigo. O plantio direto provocou uma grande “revolução” no campo a partir dos anos 70, quando agricultores mais ousados decidiram não arrancar o mato nem arar a terra para o plantio. Ao assumir a cooperativa a partir de 1995, quando foi eleito pela primeira vez para o cargo de presidente, Nei César Mânica, passou a traçar novos rumos, destinados a permitir que a Cotrijal pudesse acompanhar as transformações impostas pela era da globalização e da supremacia dos mercados. Dentro do processo de modernização colocado em prática a partir de 1995, com o início da gestão de Nei César Mânica, a maneira de administrar a Cooperativa ganhou um novo formato. Foram criadas unidades de apoio, com o objetivo de melhor qualificar as receitas e despesas próprias de cada segmento existente na Cooperativa.
Nei Cézar Mânica, presidente Cotrijal
No decorrer dos anos a Cotrijal foi se expandindo para outros municípios, como Colorado, Victor Graeff, Tio Hugo, Lagoa dos Três Cantos, Vista Alegre, Carazinho, e Santo Antônio do Planalto. No total são 32 municípios que fazem parte da área de abrangência da Cotrijal. “Fomos evoluindo e chegamos no dia de hoje com uma ampliação de área de ação em mais de 600 mil hectares. Dessa caminhada muitas inovações aconteceram. Uma delas foi em outubro de 1999, quando nós idealizamos a Expodireto Cotrijal”, conta o atual presidente da Cotrijal, Nei Cézar Mânica. A cooperativa também investiu em uma fábrica de ração moderna, com capacidade de atender boa parte do Rio Grande do Sul. “Nós conseguimos uma unidade de beneficiamento de sementes mais moderna da América Latina, inaugurada em 2016, porque é pela semente que o produtor vai começar a ter um resultado melhor lá no final”, explica Mânica. Em 2016, o faturamento total da cooperativa foi de R$ 1,531 bilhão, valor que em 2020 está previsto para alcançar R$ 2,705 bilhões. Participação do produtor Atualmente com 6.700 associados, Nei destaca que poder fazer a diferença na vida de cada produtor é muito gratificante, mas que há uma grande responsabilidade por trás de tudo isso. “Os produtores que são sócios há muitos anos confiam mui-
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to na cooperativa; eles trabalham com a cooperativa, participam dos eventos da cooperativa (...). E aí eles contam que a cooperativa já está fazendo a diferença na sua propriedade, na sua comunidade. Isso nos deixa felizes porque nós temos a certeza que vamos ter condições de colaborar com a comunidade e com os produtores para a geração de empregos e o aumento da produtividade. Eles olham hoje para a Cotrijal como um modelo de cooperativa. Pela tradição dela, pelo nome que a cooperativa tem, pelas pessoas que trabalham na cooperativa, pela confiança. Isso é muito gratificante. Então eu sempre digo: nós não temos o direito de errar. A gente é uma referência, mas a gente tem que ter humildade de saber que tem muita coisa pra fazer ainda para melhorar”. Fazem mais de 30 anos que a família de Teodora Lütkemeyer é associada na Cotrijal. A produtora destaca que a cooperativa oferece vantagens e benefícios aos produtores, justamente por conseguir oportunizar a realização de bons negócios, além valorizar o papel da mulher produtora rural. “Através do seu quadro técnico, a Cotrijal oferece uma estrutura de apoio ao agricultor. Hoje, para você trabalhar com qualidade e produtividade na lavoura, você precisa ter uma estrutura técnica de apoio” – conta – “A Cotrijal também é inovadora na atenção a mulher cooperada. Enfoca muito bem essa questão da mulher estar acompanhando o desenvolvimento da propriedade, justamente porque a mulher tem o perfeccionismo, a sensibilidade e olhar mais amplo e diversificado”, completa Teodora. Expodireto: potência consagrada A Cotrijal teve um crescimento expressivo a partir do ano 2000, quando começou a ter um destaque maior pela Expodireto. Com isso, se consagrou como uma potência no agronegócio brasileiro, isso porque as empresas que participam na Expodireto trazem o que é de melhor e mais moderno em tecnologia. “Naquele momento, para realizar a feira, em março de 2000, não se tinha nem noção para onde nós iríamos”, lembra Mânica. Juntamente com a comissão organizadora da feira, visitou várias exposições no Brasil e no exterior, até chegar à conclusão de que a Expodireto deveria ser di-
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Teodora Lütkemeyer, associada Cotrijal
ferenciada, sendo um modelo que ficasse focado em tecnologia, inovação e oportunidade de negócios, sem venda de bebida alcoólica, com horário de início às 8h e término às 18h. “Na primeira Expodireto tivemos muitas críticas, constatações, por empresas que queriam expor com outros produtos que não eram ligados ao agronegócio”, comenta o presidente. Ao longo das edições, a área onde a feira é realizada passou de 41 hectares para 84. Consequentemente o número de expositores também aumentou: de 100 foi para 530. Mânica conta que a Expodireto começou como uma feira regional e aos poucos passou a nível estadual, nacional, Mercosul e nos últimos anos está a nível internacional, onde participam mais de 70 países por ano.
Projetos sociais Buscando incentivar a permanência dos jovens na agricultura, e inserir a mulher no processo cooperativo, a Cotrijal conta hoje com projetos sociais que visam levar tecnologia às casas dos produtores, além de trabalhar a sucessão com as famílias. “O grande desafio nosso é manter o homem no campo, mas com a sucessão na propriedade. Muitos saíram do campo, mas nós queremos que dentro da área de ação da Cotrijal saia o menor número possível de pessoas”, explica Mânica.
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MEIO AMBIENTE
Energia limpa ganha espaço na Serra Gaúcha
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energia solar vem ganhando espaço em vários países e a tendência é de que seja uma das principais fontes de energia do futuro. Diferente do combustível fóssil (que é um recurso finito), os painéis são uma tecnologia cuja eficiência aumenta e o valor diminui com o passar do tempo. No Brasil, conforme a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), apenas 11 mil propriedades têm o sistema instalado. No agronegócio, a tecnologia está se expandindo na agricultura familiar, em função da linha de crédito incentivada pelo Pronaf Eco, Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar, direcionado para o financiamento de energia renovável e sustentabilidade ambiental. Para atender a demanda, o Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA) vem cadastrando e credenciando empresas que fornecem sistema de energia solar fotovoltaica, e a principal exigência é a utilização de tecnologia nacional. Na Serra gaúcha, no município de Bento Gonçalves, o produtor orgânico Gilmar Cantelli instalou o sistema fotovoltaico em agosto deste ano e já sente os benefícios dessa alternativa de energia. Em sua propriedade, que também faz parte do roteiro turístico Caminhos de Pedra, Cantelli produz hortifrutigranjeiros, como radite, rúcula, alface, morango, cebolinha, repolho e beterraba, para abastecer a Feira Ecológica da cidade. Há 20 anos nesta atividade, ele decidiu optar pela energia fotovoltaica tanto na sua residência quanto na área destinada ao plantio. “Coloquei um sistema de aquecimento da água via placas solares. Faço o reaproveitamento das águas da chuva que vão para um reservatório e também o reaproveitamento do sol para gerar energia elétrica, assim fica uma propriedade um pouco mais limpa, não sendo apenas consumidora, mas também geradora de energia que vai para a rede e é distribuída para as outras propriedades. E quando falta energia, puxamos da rede e vamos consumindo”, explica. Segundo Cantelli, a energia gerada pelo sistema fotovoltaico passa por um medidor de entrada que vai definir o que está sendo gerado e consumido. Salienta que o sistema foi instalado para gerar uma potência média anual de 700 quilowatts mês, que é o consumo médio da propriedade, portanto, praticamente o consumo durante o ano ficaria zerado. “O meu consumo médio, nesta época do ano, é em torno de 600 quilowatts por mês, e desde o dia 17 de agosto, quando o sistema foi instalado, até agora, gastei
em torno de 40 quilowatts. Então o benefício é a questão financeira. Por exemplo, em setembro paguei R$ 170,00 de luz, e em outubro o valor ficou em R$ 25,00”, destaca. Cantelli investiu R$ 48 mil para a instalação das placas fotovoltaicas, realizada pela empresa catarinense Solar Inove. Do município de Tubarão, a empresa atende Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina e é tradicionalmente voltada ao setor agrícola, sendo que 95% dos seus clientes são produtores. Também é uma das cinco empresas cadastradas junto ao MDA para o fornecimento do sistema de energia solar fotovoltaica. “Para ser cadastrado tivemos que atender diversas exigências e certificações, por isso, temos um produto diferenciado que pode ser financiado em até 10 anos com juros de 2,5% ao ano. O retorno do investimento ocorre em, aproximadamente, sete anos”, afirma Fernando Ronchi, diretor da empresa. Além do benefício econômico do sistema fotovoltaico, Cantelli também afirma que na hora de utilizar qualquer equipamento elétrico a consciência não fica pesada porque sabe que o consumo está se transformando em energia. “A cabeça fica mais tranquila porque você está gerando a sua própria energia. Por exemplo, posso deixar o ar condicionado ligado na hora de almoçar para ficar um pouco mais fresquinho sabendo que estou gerando energia lá fora. O sol bate nas placas, transforma a energia dos raios em energia elétrica e depois vem a energia térmica, resfriando a cozinha, sem consumir energia gerada de fora. É a mesma coisa quando você vai consumir um prato que preparou com produtos da sua horta e fica com um estado de espírito leve ao pensar que produziu aquilo para si mesmo, e isto é muito bom”, garante.
Produtor orgânico de hortifrutigranjeiros já sente no bolso os benefícios em utilizar o sistema de energia solar fotovoltaico
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ENTREVISTA MANEJO
O segredo da produtividade Ângela Prestes
Clima, aplicação de fungicidas, doenças, pragas. São muitos os fatores que podem prejudicar o desenvolvimento de uma lavoura de soja. Entretanto, é no momento da implantação que o produtor define um dos principais objetivos de quem semeia o grão: a produtividade. As decisões tomadas aqui influenciarão nos resultados lá na frente. É preciso planejamento e conhecimento para utilizar a técnica certa e garantir máxima produtividade e qualidade. Confira, abaixo, a entrevista com o pesquisador Dirceu Gassen sobre o assunto. 38 |
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Destaque Rural u Quais são os principais componentes de produtividade na cultura da soja? Dirceu Gassen u A qualidade da semente aliada com a qualidade da semeadura são os processos de manejo mais importantes na definição de metas de produtividade de soja. Dois eventos determinaram profundas mudanças na genética predominante da soja no Brasil e definiram novas estratégias de manejo para a cultura. O primeiro foi a introdução da biotecnologia RR, no fim da década de 1990, viabilizando cultivares de ciclo precoce com 100 a 110 dias. A segunda foi a incorporação de genes de juvenilidade, que viabilizaram a soja em ambientes tropicais, alterando a indu-ção floral por genes de juvenilidade, que deram origem às cultivares de hábitos de crescimento indeterminado, sem resposta ao fotoperíodo. Essa combinação de tecnologias embarcadas nas sementes, determinou a possibilidade de semeaduras antecipadas, com crescimento vegetativo normal e completar o ciclo em períodos muito mais curtos do que nas cultivares que eram usadas no passado. Isso facilitou o controle de doenças e viabilizou a realização de duas safras de verão, na mesma lavoura. A ocorrência da ferrugem da soja, a partir do início dos anos 2000, determinou profundas mudanças no manejo da soja, semeaduras antecipadas e cultivares com ciclo curto. Como consequência, o Sul do Brasil, com temperaturas mais frias e chuvas intensas na primavera, exige maior qualidade nos processos de semeadura para estabelecer lavouras produtivas. Outubro e Novembro - 2018 | |Rio Grande dodo Sul | |Ano IVIII| |nº20 Outubro e Novembro - 2017 Rio Grande Sul Ano nº18
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Destaque Rural u Como o arranjo espaDestaque Rural u Qual arranjo aprecial das plantas influencia na produtivisenta melhores resultados? dade da soja? Dirceu Gassen u A planta intercepta enerDirceu Gassen u Cada cultivar de soja tem gia solar através das folhas e bebe nutrientes características de arquitetura de plantas, com através das raízes, todos os dias. Assim, a lódiferentes distâncias entre nós, elevado núgica é de distribuir as plantas de tal forma que mero de ramos laterais, tamanho e forma de consigam transformar energia solar e água folhas. em glicose armazenada nas folhas. No passado predominavam cultivares de ciA população e a distribuição de plantas declo longo, com mais de 150 vem ser determinadas dias entre a semeadura e a copelas características de arlheita. Tamanho grande com quitetura (ramos, tamanho mais de um metro de altura. de folhas, distância entre As cultivares atuais tem cinós...) de cada cultivar e a clo curto e tamanho menor. fertilidade do solo. Também não respondem Cultivares de ciclo longo mais ao fotoperíodo para e abundância de ramos lainício de floração. Predomiterais, como as usadas nos nam cultivares com hábitos Estados Unidos, podem de crescimento indetermiser semeadas com espanado, entre nós curtos e meçamento de 76 cm entre nor número de ramos. São linhas. No Brasil, com clicultivares de ciclo curto, tama tropical, muita chuva e Cada planta deve manho menor e produtivas. necessidade de ciclo curto, ocupar espaço para Algumas cultivares apresenpor causa da ferrugem, o interceptar energia tam nastias, que são moviespaçamento entre linhas solar e ocupar área mentações diárias de folhas. deve ser menor do que 50 de solo para beber Posicionam as folhas superiocm. Algumas cultivares nutrientes todos os res de forma vertical, permimodernas deveriam ser sedias. tindo a infiltração de ra-diameadas com espaçamento Dirceu Gassen ção solar e melhor penetração de 35 ou 25 cm entre linhas. Pesrquisador de produtos fitossanitários aplicados na parte aérea. Destaque Rural u Uma Cada cultivar deve ter a população e a distrinova modalidade de arranjo de plantas buição de plantas ajustada para as característié o cultivo de soja com semeadura em cas de área foliar e produção de ramos laterais. “covas”, com sementes agrupadas. Qual Algumas cultivares podem ser semeadas com a opinião do profes-sor sobre isso? população inferior a 15 plantas/m2 e outras Dirceu Gassen u O Plantio cruzado, linhas com mais de 40 plantas/m2, de acordo com o pareadas, ou plantas agrupadas não atendem ciclo e a arquitetura de cada cultivar. as necessidades de cada planta como unida-
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de de produção. Cada planta deve ocupar espaço para interceptar energia solar e ocupar área de solo para beber nutrientes todos os dias. Com base na fisiologia vegetal a distribuição entre plantas deveria ser a mais uniforme possível para garantir a disponibilidade de água e nutrientes no solo, e energia solar igual para todas as plantas. Destaque Rural uComo a qualidade da semente e da semeadura influenciam na produtividade? Dirceu Gassen uA qualidade da semente é a referência para o vigor e o potencial de produção de cada planta. A qualidade da semeadura compreende o fechamento do sulco e a distribuição vertical e horizontal das sementes. Ou seja, a profundidade e a distribuição entre plantas na linha. É melhor semear bem e atrasar alguns dias, do que semear mal na melhor época de semeadura. A velocidade é uma tentação e o clima é uma angústia que leva a apressar e perder qualidade no processo de semeadura. A semente contém a vida, a genética e a tecnologia embarcada. A semente precisa ser germinada, no processo de embebição (50% de água), de-pois emergir do solo (profundidade e crostas na superfície) e estabelecer plântulas vigorosas para interceptar energia solar e se tornar autotrófica por meio da fotos-síntese. Em 24 horas 50% do volume em água para germinar. (Na semeadura envolver a semente com solo úmido). Cinco dias para emergir (qualidade de semeadura, com profundidade, cobertura de solo e sulco fechado, sem formar torrões e crostas).
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SEMENTE PIRATA
O Rio Grande do Sul é um dos três estados brasileiros com o maior número de ocorrências de compra, venda e uso de sementes piratas, juntamente com a Bahia e o Mato Grosso. Consequentemente, também tem sido um dos estados que tem dado maior trabalho à fiscalização do MAPA, que atua contra o comércio de sementes ilegais, ato considerado crime.
DESTAQUES
IRRIGAÇÃO I
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Estudo divulgado esta semana pela Agência Nacional de Águas (ANA) mostra que o Brasil está entre os dez países com a maior área irrigada do planeta. O chamado Atlas Irrigação: uso da água na agricultura irrigada mostra que o país tem 6,95 milhões de hectares (Mha) que produzem alimentos utilizando diferentes técnicas de irrigação.
IRRIGAÇÃO II
O mapa considerou dados levantados pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). A parceria entre as duas instituições existe desde 2015 e acaba de ser renovada por mais 30 meses. Segundo o levantamento, a Região que apresenta a maior extensão de área irrigada é o Sudeste, com 2.709.342 hectares (há), seguida por Sul, 1.696.233, Centro-Oeste, 1.183.974 e Nordeste, 1.171.159. A Região Norte, com 194.002 há, vem por último.
PLANTAS DANINHAS
Estudo realizado pela Embrapa nas principais regiões produtoras do País avaliou que os custos de produção em lavouras de soja com plantas daninhas resistentes ao glifosato podem subir, em média, de 42% a 222%, principalmente pelo aumento de gastos com herbicidas e pela perda de produtividade da soja. Os valores sobem, em média, entre 42% e 48% para as infestações isoladas de buva e de azevém, respectivamente, e até 165% se houver capim-amargoso resistente. Em casos de infestações mistas de buva e capimamargoso, por exemplo, o aumento médio é de 222%.
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ESTIMATIVA
A estimativa de intenção de plantio para a safra 2017/2018 de grãos aponta para uma produção entre 224,1 a 228,2 milhões de toneladas, o que representa um recuo entre 6 e 4,3% em relação à safra passada, de 238,5 milhões de toneladas. Os números estão no 1º Levantamento da safra 17/18, divulgado pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Condições climáticas altamente favoráveis contribuíram para a safra passada alcançar recorde histórico. Tais condições dificilmente se repetirão, por isso a expectativa de redução produtiva. Com relação à área plantada, espera-se a manutenção ou um aumento de até 1,8% sobre a safra 2016/2017, podendo atingir números aproximados de 61 a 62 milhões de hectares, graças ao aumento do plantio de algodão e, sobretudo, da soja.
PIB
A sustentação do PIB Brasileiro nos primeiros sete meses do ano foi possível, novamente, pelo agronegócio, conforme indicam pesquisadores do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), da Esalq/USP. A safra recorde no campo estimulou a atividade também de outros segmentos, impactando no crescimento de 5,81% no PIB-volume do agronegócio na avaliação de janeiro a julho de 2017. Desse modo, o desempenho positivo da agropecuária pôde amenizar o efeito das retrações da indústria e dos serviços sobre o PIB nacional. Segundo o IBGE, o PIB brasileiro recuou ligeiro 0,04% na comparação do primeiro semestre de 2016 com o mesmo período deste ano – queda que seria bastante superior não fossem os resultados da agricultura.
Tudo que o Brasil perdeu com a operação Carne Fraca já conseguiu recuperar”. Ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Blairo Maggi, dos países que estão comprando carne brasileira, 33 estão com o comércio regular e 56 mantêm inspeção reforçada.
CENSO AGRO
Com mais de 20 mil recenseadores e supervisores em atividade, o mês inicial da coleta do Censo Agro 2017 foi um período de ajustes, mas cumpriu as expectativas, superando o primeiro milhão de estabelecimentos visitados por todo o Brasil. A tendência é que o ritmo de trabalho aumente nos próximos meses, com mais agentes em campo e aprimoramentos nos processos da operação.
“Vai faltar muito trigo no Brasil neste ano”
O cenário da cultura do trigo no Brasil é mais uma vez desanimador. A safra 2017 deve registrar baixa produtividade e qualidade. Confira a entrevista com o Luiz Carlos Pacheco, analista da Trigo & Farinhas, sobre o assunto. Assista no link: goo.gl/dwUZYz
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