Destaque Rural - Ed. 3

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Editorial

Editora Riograndense

Agronegócio: o motor brasileiro Outrora criticado, o Agronegócio brasileiro fecha o ano de 2013 com ótimos resultados, impulsionando o PIB e demonstrando o potencial competitivo do Brasil. Segundo dados do Boletim Focos, do Banco Central, do crescimento projetado de 2,4% para este ano, o Agronegócio tem influência em mais de um ponto percentual através dos negócios dentro e fora da porteira, assumindo um papel importante no crescimento do PIB com a desaceleração da indústria e do comércio. Para 2014, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos projeta que o Brasil assuma o status de maior produtor e exportador mundial de soja, atingindo 88 milhões e superando os norte americanos em 3 milhões. Estes números são impressionantes, haja vista todas as dificuldades encontradas pelos produtores como falta de políticas agrícolas, problemas logísticos, custos elevados de produção e falta de investimentos por parte do governo. Esta edição traz o caso da família Garcia de Garcia, que vem mudando paradigmas com a integração lavoura-pecuária, um dos tantos exemplos de produtores que apostam na pesquisa e inovam na propriedade, produzindo cada vez mais e com alta qualidade. Isso mostra que o produtor rural brasileiro é diferenciado e, mesmo com todas as dificuldades, faz do agronegócio o motor da economia brasileira. Desejamos que 2014 seja um excelente ano, de muita produtividade e que o Brasil continue no caminho de Destaque na produção de mundial de alimentos.

CNPJ 17.965.942/0001-07 Inscrição Municipal 66829 Endereço Rua Cacilda Becker, 30 - Boqueirão - CEP 99025 490 Diretor Leonardo Wink Jornalista Responsável Luciana M. Quetheman (MTB/RS 11.850) Jornalistas Luciana M. Quetheman, Rosângela Borges. Colunistas Gilberto Cunha Elmar Luis Floss Projeto Gráfico e Diagramação Cássia Paula Colla Revisão Débora Chaves Lopes Impressão Gráfica Tapejarense Site www.destaquerural.com.br Contatos Leonardowink@destaquerural.com.br (54) 9947.9287

Circulação Tapejara

 Santa Bárbara do Sul

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Carazinho Colorado Condor Cruz Alta Erechim Espumoso Frederico Westfalen Getúlio Vargas Ibirubá Ijuí Júlio de Castilhos Lagoa Vermelha Marau Não-Me-Toque Palmeira das Missões Panambi

Passo Fundo Pejuçara Salto do Jacuí Sananduva Santo Ângelo Santa Bárbara do Sul Santa Rosa Sarandi Sertão Selbach Soledade Tapera Tapejara Três de Maio Tupanciretã Vacaria


Índice CAPA

Integração Lavoura x Pecuária Págs 20 a 32.

Coluna

Elmar Luiz Floss

Leite e grãos para aumentar a renda

Lavoura O produtor pensa nos riscos? pág. 14

pág. 6

Helicoverpa Que praga! pág 8

Mercado Mercado internacional: a expectativa pág. 34

Destaque Empresas Tecnologia verde a favor do produtor rural pág. 40

CT&Bio

Gilberto Cunha

Buva: a vilã da produção

Cultivares Trigo duplo-propósito

Entender Darwin ou perseguir miragens

pág. 10

pág. 38

pág. 44

Manejo

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Elmar Luiz Floss Engenheiro Agrônomo e licenciado em Ciências, Dr. em Agronomia, Diretor do Instituto Incia

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Leite e grãos para aumentar a renda

integração da lavoura com a pecuária leiteira é uma importante alternativa para agregar renda às propriedades rurais. No verão há culturas de grande valor econômico (soja, milho) e há necessidade de aumentar a renda da propriedade também no inverno. O crescimento da produção de leite foi significativa nos últimos anos, fazendo do Rio Grande do Sul o segundo maior produtor brasileiro de leite. O RS, de maneira especial a região Norte, apresenta condições de solo e clima extremamente favoráveis à exploração da bovinocultura leiteira, especialmente, quanto ao potencial de produção de forragem, em quantidade e qualidade, durante os 12 meses do ano, e, também, a maior expressão produtiva de vacas de origem europeia. Utilizando os solos apenas no período de meados de outono a meados da primavera, sem prejudicar as culturas de verão, é possível produzir de 5 a 9 t por ha de matéria seca, dependendo da espécie/ cultivar utilizada, das condições de solo e clima e do manejo utilizado pelo produtor. Isso representa um potencial de produção de 4 a 7 mil litros de leite por ha durante esse período, de frio e pouca luz. Atualmente, somente no Planalto Sul-riograndense, são cultivados mais de 2 milhões de ha com forrageiras de inverno (como as gramíneas, aveia preta, aveia branca, azevém, centeio, triticale e trigo forrageiro,e, as leguminosas, ervilhaca comum, ervilhaca peluda, trevo vesiculoso, dentre outras), de forma isolada ou consorciada, em sucessão às culturas de verão. Para cultivo no verão, após culturas de inverno, existem várias alternativas, como o milheto e o sorgo forrageiro. É importante, que o produtor mantenha uma área com pastagens permanentes, como o tifton, a pensacola, o quicuio ou outras, especialmente, para manter os animais no verão, quando as lavouras são ocupadas com as culturas produtoras de grãos. Essas forrageiras são utilizadas nas mais diferentes formas, como pastejo, elaboração de feno ou silagem e a produção de grãos de alguns cereais, visando seu uso de forma suplementar na alimentação dos animais. Considerando a instabilidade climática na região, além do planejamento com forrageiras que cubram a maior parte do tempo, há necessidade da elaboração de feno e silagem para alimentar adequadamente as vacas em períodos de escassez de pasto, devido a geadas ou estiagens. O sucesso da integração lavoura-pecuária exige uma gestão técnica e administrativa cada vez mais moderna, objetivando, ao mesmo tempo, o aumento da produtividade (por área e por vaca), a melhoria da qualidade do leite produzido, enfrentar a competividade internacional

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e obter a sustentabilidade (econômica, social e ambiental) do empreendimento. O mais importante é a rentabilidade da propriedade, que melhore a qualidade de vida da família do produtor e a mantenha produzindo no meio rural. Sob ponto de vista técnico, os principais fatores limitantes ao desenvolvimento da integração da lavoura com a pecuária leiteira é a inadequada alimentação dos animais em determinadas épocas do ano, problemas sanitários e reprodutivos no rebanho, e, a necessidade da melhoria da qualidade do leite produzido, considerando os padrões internacionais. Por isso, nossos índices de produtividade ainda são muito baixos diante do potencial existente. As tecnologias desenvolvidas nas Universidades gaúchas ou introduzidas de outros países e adaptadas às nossas condições de solo e clima, bem como por outras instituições de pesquisa, permitem um salto nos índices de produtividade e qualidade. O esforço dos técnicos da área de nível superior como engenheiros agrônomos, médicos veterinários e zootecnistas, além dos técnicos em agropecuária, tem procurado levar essas tecnologias às propriedades e buscando a sua adoção pelos produtores. Nesse sentido, ainda há um grande vácuo entre os conhecimento/tecnologias existentes e as tecnologias efetivamente adotadas pelos produtores. Por essa razão, há necessidade de esforços continuados, de forma integrada entre a pesquisa e agentes de assistência técnica e extensão rural. As grandes preocupações são ainda: a) escolha de cultivares forrageiras de baixa produção de forragem, especialmente, para uso no início do outono; b) a não adubação das pastagens; c) a colocação dos animais em pastejo antes do tempo (disponibilidade de forragem menor que 1.500 kg/ha); d) a falta de um pastejo rotativo, utilizando cerca elétrica; d) a compactação do solo sob pastejo em dias de chuva e com baixa disponibilidade de forragem; f) a falta de cobertura com palha para a semeadura direta de soja ou milho em sucessão às forrageiras; g) a retirada de feno e silagem, todos os anos, na mesma área, acarretando a perda rápida da fertilidade do solo; h) a não inclusão das pastagens anuais num sistema rotação de culturas. O sucesso econômico da produção de leite já faz com que alguns produtores abandonem a produção de grãos dedicando-se apenas ao cultivo de forrageiras e a produção de leite. Em muitos municípios, o crescimento do setor leiteiro está mudando a matriz econômica, pois ao contrário dos grãos, o leite permite uma entrada mensal de dinheiro na propriedade.


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HELICOVERPA

Praga! Que Medidas de controle para lagarta já existem e os agricultores agradecem

O

que é? Que praga é essa que está atacando as lavouras brasileiras? E que segundo pesquisadores de diferentes instituições já existem formas de controle. Helicoverpa armigera, o nome mais comentado entre agricultores e pesquisadores do Brasil, é uma espécie extremamente polífaga, ou seja, as larvas foram registradas em mais de 60 espécies de plantas cultivadas e silvestres. Este inseto pode causar danos a diferentes culturas de importância econômica como o algodão, sorgo, milho, tomate, plantas ornamentais e frutíferas. Segundo o pesquisador da Embrapa Trigo, o entomologista Paulo Pereira, as lagartas desta espécie podem ocorrer também em trigo, atacando a espiga e alimentando-se do grão.

Origem Helicoverpa armigera apresenta ampla distribuição geográfica, com registros na Europa, Ásia, África, Oceania

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e agora no Brasil, sendo possível a sua disseminação em todo o país, devido a sua capacidade de se desenvolver em ampla gama de plantas hospedeiras. Este é um inseto de metamorfose completa, ou seja, seu desenvolvimento biológico passa pelas fases de ovo, lagarta (larva), pupa e adulto (mariposa). Por ser uma espécie polífaga, além de usufruir das plantas hospedeiras preferenciais, outros hospedeiros presentes nos arredores das lavouras assumem papel decisivo na sobrevivência da praga. Estas características podem ser importantes para a disseminação deste inseto para diferentes regiões de produção agrícola no Brasil.

Descoberta Este inseto foi detectado pela primeira vez no Brasil no início de 2013, atacando cultivos de soja em Goiás e na Bahia e cultivos de algodão no estado de Mato Grosso. Recentemente a sua distribuição foi ampliada para o Paraná. No Rio Grande do Sul a ocorrência de lagartas do gênero Helico-


verpa foi detectada em soja, safra 2012/2013, em diferentes locais da região norte do estado.

similar ao que se observa em outros países onde este inseto ocorre em trigo (como por exemplo, a Austrália). Os ataques existem, mas geralmente as populações do inseto são baixas e os danos não são importantes”, explica o pesquisador. Entretanto, é sempre importante monitorar as la-

vouras de trigo para verificar a ocorrência deste inseto e, caso sejam constatadas altas populações, entrar com práticas de controle no momento correto, ou seja, ao encontrar em média 1,5 lagartas menores que 1,5 cm/m2.

Paulo Roberto V. da S. Pereira

Entomologia - Embrapa Trigo paulo.pereira@embrapa.br

A probabilidade de Helicoverpa spp. atacar o trigo existe e é considerada alta, dependendo da região e do plantio (sistema de produção adotado), condições climáticas e gama de hospedeiros disponíveis. “A presença deste inseto foi observada nesta safra 2013 (PR, RS), mas não houve registro de danos elevados à produção. Isto é muito

FOTOS: PAULO ROBERTO V. DA S. PEREIRA

Trigo

Manejo da Helicoverpa O monitoramento para a identificação e detecção da lagarta Helicoverpa spp. faz-se necessário para que haja implementação de práticas adequadas para controle deste inseto. Diferentes técnicas de amostragem podem ser usadas para este fim, desde a amostragem de ovos, o uso do pano de batida para a contagem de lagartas até o uso de armadilhas com feromônios para atração de adultos. Salienta-se que é importante compreender que as táticas de manejo de pragas envolvem vários aspectos e um deles é o controle químico. O que devemos fazer para enfrentar este inseto? Monitorar semanalmente a lavoura

com o pano de batida; aplicar inseticidas somente quando a população da praga atingir o nível de ação recomendado, usando apenas inseticidas registrados no MAPA para controle da praga; utilizar preferencialmente inseticidas seletivos a base de vírus e bactérias ou inseticidas reguladores de crescimento, antes de utilizar inseticidas de amplo espectro; efetuar a rotação de inseticidas com diferentes modos de ação a cada aplicação para reduzir a seleção de insetos resistentes; fazer uso de boa tecnologia de aplicação (condições climáticas adequadas, pressão, volume, bico adequado, dose recomendada).

Para maiores informações recomenda-se consultar sites que tratam especificamente deste assunto

Embrapa HTTP://www.cnpso.embrapa.br/helicoverpa/ HTTP://.embrapa.br/alerta-helicoverpa

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MAPA HTTP://.agricultura.gov.br/combatehelicoverpa

Acesse com seu smartphone

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MANEJO

Buva:

Resistente ao glifosato, a planta vem preocupando agricultores por sua germinação rápida

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M

vilã da produção

esmo não sendo recente, a buva, vilã de muitas produções, tem sido cada vez mais resistente ao glifosato, com germinação aumentada em condições adversas. O engenheiro agrônomo da Embrapa Trigo, Leandro Vargas, explica que a buva é uma espécie anual, nativa da América do Sul e uma planta chega a produzir mais de 200 mil sementes, que germinam durante o outono/inverno, as plantas desenvolvem-se durante a primavera/verão e encerram o ciclo no outono. “A germinação é aumentada na presença da luz e em condições de campo as sementes só germinam se estiverem próximas da superfície do solo. A baixa dormên-

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cia faz com que ocorram vários fluxos germinativos, dependendo das condições de clima”, salienta Leandro. O agrônomo destaca que o glifosato vem sendo usado na dessecação pré-semeadura com controle eficiente da buva em diferentes estádios de desenvolvimento há mais de 20 anos no Rio Grande do Sul. “Os resultados de pesquisa obtidos até o momento indicam que as plantas de buva resistentes sobrevivem a doses de glifosato até 10 vezes maiores do que a dose necessária para controlar o biótipo sensível”. O especialista ressalta que as recomendações são no sentido de que as áreas infestadas com buva


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“As recomendações são no sentido de que as áreas infestadas com buva resistente sejam manejadas de forma que os biótipos resistentes não produzam sementes”. Leandro Vargas – eng. agrônomo Leandro Vargas é engenheiro agrônomo, formado pela Universidade de Passo Fundo, Mestre pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Doutor pela Universidade Federal de Viçosa, 2000Matologia (herbicidas, resíduos, alelopatia e resistência a herbicidas).

resistente sejam manejadas de forma que os biótipos resistentes não produzam sementes. “O uso de controle manual, aplicações localizadas de herbicidas e a instalação de culturas para cobertura do solo são algumas alternativas. O controle dos biótipos resistentes é mais eficiente quando realizado durante o inverno, já que a buva é mais sensível aos herbicidas em estádios iniciais de desenvolvimento. O cultivo da área com trigo, centeio ou aveia diminui o número de plantas deste tipo quando comparado com áreas não cultivadas, deixadas em pousio. A implantação de culturas que permitam a colheita de grãos, como trigo ou espécies que possam ser utilizadas somente para cobertura do solo, como aveia, ervilhaca ou nabo forrageiro, entre

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outras, são boas alternativas”. Segundo Vargas, a Brachiaria ruziziensis também é uma boa opção para regiões mais quentes como Paraná e o seu uso pode ser feito no sistema lavoura-pecuária, junto com o milho safrinha ou mesmo apenas para ocupação de área e formação de cobertura morta.

Controle

Segundo o especialista, o controle eficiente de buva tem sido obtido com 2,4-D (1,5 a 2,0 L. ha-1 de produto comercial) ou clorimurom (60 a 80 g. ha-1 de produto comercial) associados ao glifosato (na dose de 1,0 kg ha-1 de equivalente ácido) (Tabela 2). As aplicações sequênciais têm apresentado excelente resultado. Nesse caso, a primeira aplicação realizada com glifosato associado ao 2,4-D ou ao clorimurom e após 10


a 15 dias a segunda aplicação com dicloreto de paraquate (2,0 L. ha-1 de produto comercial) ou dicloreto de paraquate + diurom (1,5 a 2,0 L. ha-1 de produto comercial) ou, ainda, amônio-glufosinato (1,5 a 2,0 L ha-1 de produto comercial), a qual deve ser feita um a dois dias antes da semeadura (Tabela 2). Aplicações sequênciais usando somente produtos de contato como amônioglufosinato, dicloreto de paraquate ou paraquate + diurom (na dose de 1,5 a 2,0 L ha-1 de produto comercial) apresentam alta eficiência, desde que usados em plantas pequenas. Nestes casos, pode ser usado o mesmo produto na primeira e na segunda aplicação ou alternar produtos. Vale destacar que misturas de tanque não são recomendadas, assim, as associações devem ser realizadas aplicando-se os produtos isoladamente. O uso de herbicidas pré-emergentes como o flumioxazin, o diclosulam e o sulfentrazona (Tabela 2) apresentam controle de buva proveniente do banco de sementes do solo. Esses herbicidas, quando utilizados na pré-emergência da soja (semear/aplicar ou aplicar/semear), proporcionam controle residual de 20 dias ou mais, depende das condições de solo e clima. Na

pós-emergência o clorimuron e o cloransulam são as alternativas com eficiência intermediária (abaixo de 80% de controle) e podem resultar

“Os resultados de pesquisa obtidos até o momento indicam que as plantas de buva resistentes sobrevivem a doses de glifosato até 10 vezes maiores do que a dose necessária para controlar o biótipo sensível”.

em fitotoxicidade na soja, dependente da dose herbicida e do adjuvante utilizado. “De forma geral, o manejo dos biótipos resistentes, como azevém e buva, deve ser feito com mecanismos alternativos, não repetindo uso em um mesmo ano de mecanismos de ação, evitando uso dos produtos para os quais os biótipos possuem resistência. Já o manejo de espécies tolerantes, como o leiteiro, corriola, trapoeraba e poaia-branca, deve ser feito em estágios iniciais de desenvolvimento dessas espécies e com uso da dose correta, indicada na bula dos produtos”, finaliza.

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LAVOURA

O produtor pensa nos

riscos O

Perdas e danos na lavoura de trigo por meio de fatores externos

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?

s riscos na hora de plantar não estão apenas associados à produtividade, qualidade e proteção de pragas e doenças. Os fatores externos são os maiores problemas durante o plantio e colheita do trigo. Pode-se citar como os principais a ocorrência de granizo, chuva intensa, secas e “veranicos”, vento intenso, geadas, excesso hídrico e chuva na colheita, associada à germinação em pré-colheita. “O trigo, como outras culturas produtoras de grãos, está sujeito à ocorrência de eventos adversos”, explica João Pires, pesquisador da Embrapa de Passo Fundo, RS. Além dos eventos extremos associados ao ambiente, muitos fatores podem trazer prejuízos à lavoura de trigo. São mais de 40 fatores que afetam o crescimento e desenvolvimento de uma lavoura e, por conseguinte, o rendimento de grãos. Dentre eles, a maioria são manejáveis, direta ou indiretamente, como a escolha da cultivar, época de semeadura, espaçamento entre linhas, população de plantas, adubação, controle de pragas, doenças e plantas daninhas. Segundo Pires, o importante é a realização de um planejamento adequado da lavoura com critérios bem definidos para, primeiramente, construir uma lavoura de bom potencial produtivo, ou compatível ao investimento realizado, verificando as potencialidades de clima e solo da região.


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Malefício: Seca: O pesquisador comenta que a seca pode ser prejudicial com maior probabilidade a partir do Norte do estado do Paraná e no Cerrado Brasileiro, quando o trigo é cultivado no sistema de Sequeiro. Nesta situação podem ocorrer problemas de germinação/emergência das plantas e efeitos negativos no crescimento e rendimento de grãos da cultura. No restante do Sul do Brasil, a seca geralmente não é problema para a cultura do trigo. “Em alguns anos podem ocorrer estiagens de curta duração (veranicos) entre agosto e setembro, que podem causar algum nível de prejuízo”. Calor: “Há maior probabilidade de ocorrência no Cerrado Brasileiro e principalmente quando o trigo é cultivado em baixas altitudes”. Segundo Pires, o calor pode causar redução drástica de ciclo, aborto de flores e redução do rendimento de grãos. No Sul do Brasil, as temperaturas elevadas durante o inverno podem aumentar o risco de danos por geada, pois o espigamento do trigo pode ser antecipado, em época com probabilidade de ocorrência de geadas. Geada: Para João Pires a geada caracteriza-se pela falta de uma regularidade cronológica, dificultando a previsão do fenômeno. Em alguns anos, dependendo da intensidade da geada e, principalmente, do estádio de desenvolvimento do trigo, os danos podem ser elevados. A probabilidade de ocorrência é elevada no Sul do Brasil no inverno e em regiões de maior altitude. “Entretanto, geadas inconvenientes, denominadas tardias, podem ocorrer em todas as regiões”. Granizo: “Já a precipitação de granizo não é rara no Brasil e ocorre principalmente na região Sul”. As regiões de maior altitude estão sujeitas a granizadas mais frequentes, sendo a primavera a estação de maior ocorrência. O trigo, por estar em cultivo nesta estação, apresenta risco de ser danificado por este evento. O padrão de precipitação de granizo está associado a áreas pontuais, não atingindo grandes extensões. Entretanto, onde ocorrem, os danos são severos, com acamamento, queda de folhas, dilaceração de folhas, quebra de colmos e quebra total ou parcial das espigas. “Além de danos diretos, podem ocorrer prejuízos futuros pela destruição da área foliar, rompimento do sistema de circulação de seiva e criação de ambiente favorável à entrada de patógenos causadores de doenças”. Chuva: O excesso de umidade pode ser prejudicial ao cultivo de trigo, predispondo a cultura ao ataque de doenças e tornando-se um dos principais entraves para a cultura na região de clima úmido no Sul do Brasil.“Quando da ocorrência de chuvas no período de colheita, associadas à quebra de dormência do grão durante o período de enchimento de grãos, pode ocorrer a germinação do trigo em pré-colheita, ainda na espiga”. Este fenômeno é mais frequente no Sul do Brasil, principalmente nas regiões mais quentes onde as temperaturas elevadas diminuem a dormência dos grãos. Como na primavera, estas regiões apresentam maior probabilidade de ocorrência de chuvas e o problema pode ocorrer com certa frequência. Segundo o pesquisador, a germinação em pré-colheita pode diminuir o rendimento de grãos, afetar o PH e, principalmente, reduzir o valor comercial do grão pelo efeito na qualidade tecnológica. Muitas vezes os grãos danificados pela germinação em pré-colheita só poderão ser destinados para alimentação animal.

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Os riscos da geada João Pires explica que a sensibilidade do trigo à geada começa a aumenta a partir do início do emborrachamento, atingindo o máximo no florescimento e diminuindo após os estádios de grão em massa mole e dura. Entretanto, as geadas podem causar danos mesmo antes do emborrachamento, principalmente pela queima de folhas. “No emborrachamento, geadas severas podem causar o estrangulamento do colmo, interrompendo a passagem de seiva para as partes superiores da planta (folhas e espigas) fazendo com que a perda seja parcial ou total”, confirma. Já no florescimento pode ocorrer aborto de flores na espiga de forma parcial ou total dependendo da intensidade da geada, do momento em que ocorre (andamento do florescimento) e das condições ambientais antes e depois da ocorrência da geada (aclimatação). Na floração, até hoje, não se conseguiu identificar uma diferenciação genética clara entre cultivares, quanto à sensibilidade à geada. “Portanto, os danos podem ser totais, independentemente da cultivar utilizada, quando a geada ocorre no espigamento/florescimento” comenta o pesquisador.


A geada + neve: danos à lavoura

Excesso de chuva gera prejuízo? Pires destaca dois momentos principais, apesar do excesso de umidade poder comprometer o cultivo durante todo o ciclo, principalmente pelo aumento da ocorrência de doenças. Um seria no espigamento/florescimento pelo aumento do risco de ocorrência de giberela, uma doença que, além de ocasionar redução no rendimento de grãos, está associada à produção de micotoxinas prejudiciais à saúde humana e animal. Em condições ambientais, de elevada precipitação pluvial neste momento do ciclo, mesmo com o uso de fungicidas, o controle da giberela não é total. Outro momento é o período de final de ciclo onde o excesso de chuva predispõe a ocorrência de germinação em pré-colheita com redução de rendimento de grãos, qualidade tecnológica e restrição do uso de trigo proveniente desta lavoura. “Quando a chuva está associada a ventos fortes e/ou quedas de granizo podem ocorrer danos mecânicos às plantas e acamamento sendo prejudiciais, principalmente, quando ocorrem a partir do espigamento/florescimento”.

Segundo Pires a ocorrência de geadas e neve na semana de 22 a 25 de julho de 2013 ocorreu numa estação do ano onde são normalmente esperadas. Talvez a surpresa tenha sido a abrangência, com ocorrência em regiões com menor probabilidade de ocorrência nesta época do ano, por exemplo o Norte do Paraná. “Não podemos nos esquecer que o Sul do Brasil apresenta risco de geadas e neve durante os meses de outono e inverno. Portanto, a época de semeadura utilizada pelos produtores deve respeitar o zoneamento agrícola, fato que em algumas situações não tem ocorrido” salienta ele. Já no Rio Grande do Sul, o maior risco de perda por geadas é quando estas ocorrem no mês de setembro quando, normalmente, a maior parte do trigo já atingiu o espigamento. Outro fato que merece ser considerado é a ocorrência de invernos mais quentes que o normal, ocorrendo aceleração no ciclo da cultura fazendo com que, muitas vezes, o espigamento seja antecipado e ocorra ainda no mês de agosto, ficando a cultura vulnerável a geadas. “Nos anos de 2006 e 2012 ocorreram tais condições, com invernos de temperaturas maiores que o normal e geadas tardias, 4 a 6 de setembro e 26 de setembro em 2006 e 2012, respectivamente, ocasionaram perdas consideráveis nas lavouras de trigo do Rio Grande do Sul”, lembra ele. Já no que se refere à neve, se não ocorre em quantidade que cause danos mecânicos às plantas pelo peso excessivo, é menos preocupante que as geadas. “Cabe lembrar, que em muitas regiões produtoras de trigo no mundo, a cultura permanece por meses em meio a uma camada de neve durante os momentos iniciais do ciclo da cultura, com retomada de crescimento quando do degelo”.

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Prevenção

Perdas x fatores externos No caso da geada é importante esperar entre sete a dez dias após o evento para realmente se ter as reais dimensões dos danos. “É importante a caracterização dos danos neste período, evitando-se a avaliação somente no final da safra com a planta já seca, pois outros fatores que causam perdas podem confundir a avaliação, como as doenças da giberela, viroses, etc”. Segundo o pesquisador quando for granizo, as perdas podem ser avaliadas logo após a ocorrência do evento, pois os danos são mecânicos. “Também pode ser acompanhada a evolução da lavoura para verificar os danos de fatores associados como o aumento de doenças oportunistas”. Já para ventos fortes, causadores de acamamento, deve-se acompanhar a lavoura a partir do evento. Em muitas situações, dependendo do momento do ciclo em que ocorre, a planta pode voltar à posição ereta em alguns dias. “Entretanto, em condições mais severas, não há recuperação e os danos somente poderão ser contabilizados na colheita pela redução no peso do grão, maior quantidade de doenças e a comparação de áreas acamadas e não acamadas”.

Como o trigo é afetado João Pires explica que para geadas a folha apresenta boa resistência, o colmo (principalmente na região dos meristemas de crescimento) e espiga são mais suscetíveis. Para o granizo, podem ocorrer danos em todas as partes da planta com maior probabilidade em folhas e espigas. Na fase inicial de desenvolvimento do trigo (até o afilhamento) as granizadas não causam maiores prejuízos, pois as plantas são pouco danificadas e há capacidade de recuperação pela emissão de novas folhas. Na elongação, no emborrachamento, no espigamento, na fase de enchimento de grãos e, especialmente após a maturação fisiológica, quando não há mais possibilidade de compensação de rendimento de grãos pela planta, os danos por granizo podem atingir níveis vultosos ou até levar à perda total da lavoura. E em caso de ventos fortes causadores de acamamento impactam diretamente no colmo com prejuízos indiretos nas folhas e espigas. O acamamento reduz o potencial produtivo da lavoura e pode reduzir a qualidade tecnológica pelo contato com a umidade do solo.

A principal técnica para se prevenir de eventos extremos é a observação do zoneamento agrícola do MAPA que estabelece as épocas de semeadura com menor risco para cada município. Estas informações estão disponíveis na página do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (http://www.agricultura.gov.br/politica-agricola/zoneamento-agricola) e são atualizadas anualmente. “É importante salientar que nunca haverá “risco zero”, mas o zoneamento tem se tornando uma ferramenta importante para redução do mesmo”. “Escolher cultivares com maior nível de tolerância no período anterior ao espigamento, ou seja, tolerantes a queima de folhas, evitar o cultivo em áreas de baixada e garantir o suprimento adequado de nutrientes são algumas das técnicas que podem auxiliar no que se refere à geada” pontua Pires. Apesar de haver algumas técnicas utilizadas em culturas de elevado valor econômico, como cobertura, aquecimento, emprego de núcleos de condensação (fumaça), estas são praticamente inviáveis em lavouras comerciais de grãos. E para a chuva na colheita associada à germinação em pré-colheita, pode-se escolher cultivares com maior nível de tolerância, respeitar o zoneamento agrícola para o município e organizar a colheita de forma que ocorra o mais cedo possível, após a maturação fisiológica (colheita antecipada) e com menor exposição da lavoura aos fatores causadores da germinação em pré-colheita. “Uma das alternativas para o produtor é a adesão ao seguro rural, com vistas à proteção do investimento contra intempéries”, salienta Pires.

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ESPECIAL

INTEGRAÇÃO LAVOURA X PECUÁRIA Quebrar paradigmas de uma cultura que não acredita na possibilidade de integrar o gado com os grãos ainda é um desafio. Mesmo assim muitos produtores gaúchos já utilizam o sistema de Integração Lavoura-Pecuária e afirmam: as vantagens são inúmeras. Num experimento realizado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), na Fazenda Espinilho, na cidade de Tupanciretã, que antes pretendia avaliar os prejuízos na soja devido ao pisoteio do gado, agora avalia os benefícios da prática para o grão.

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Rosângela Borges ro.borges@terra.com.br

A mudança de conceitos é uma prática pouco comum, principalmente quando falamos em cultura regional. Uma grande parcela de produtores gaúchos acredita que integrar grãos com gado só traz limitações, algo que vem mudando nas últimas décadas. Em Tupanciretã, na propriedade de seu Armando Chaves Garcia de Garcia e filhos, o experimento da UFGRS em 22 hectares de soja acontece há mais de uma década e começa a avaliar os benefícios do pisoteio do gado. No Brasil, é o experimento com maior longevidade numa propriedade privada. Na mesma fazenda, os agricultores disponibilizam mais 300 hectares de lavoura comercial e praticam as mesmas regras do experimento. Francisco Garcia de Garcia, filho de seu Armando, conta que há 12 anos, por intermédio de Paulo Carvalho, hoje professor doutor de Zootecnia da UFRGS, eles aceitaram a proposta de um estudo para integrar gado com grãos. “Achamos interessante a ILP, apoiamos a idéia e disponibilizamos 22 hectares, de forma potreriada. Na integração, a soja era vista como um grão sem grandes problemas, todos sabiam plantar. E nossa família já tinha foco na pecuária. Começamos com o paradigma de que a pecuária iria causar problema na soja e queríamos saber quais era os problemas. Iniciamos para saber qual o nível de problema e agora queremos saber quais os benefícios.


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Como tudo começou Francisco conta que a opção inicial foi utilizar a pecuária no inverno, pois a tradição da família sempre foi a pecuária. “Para nós é um negócio seguro e de fato é. Tínhamos esta vocação e continuamos. Como a soja caminhou para o Plantio Direto, o casamento ficou bom antes do experimento ainda”. A região ainda conta com azevém perenizado, que cai no chão e é ressemeado naturalmente no verão, sem necessidade de plantio. De acordo com o produtor, a proposição do experimento foi fazer cinco tratamentos de inverno, baseados em pressões de pastejo, ou seja, de carga animal por hectare, mantendo o azevém e a aveia a 10 cm, 20 cm, 30 cm, 40 cm e sem pastejo (como a maioria utiliza). “Utilizamos aveia, azevém e trigo como palhada e ainda plantio sem gado. A nossa surpresa foi que vimos que sem pastejo não estava tendo melhora e os resultados positivos estavam no local pastejado”. O experimento começou a utilizar 30 cm e 40 cm para soja, mas com a integração geral, com mínimo prejuízo da soja, se verificou que a pastagem entre 20 cm e 30 cm no terço final era suficiente para ter uma palhada ótima para soja, num nível desejável e, mesmo em anos de seca, cumpriria seu papel de proteção do solo, isolante e de contenção de umidade. “O uso do gado na lavoura já balizou esta utilização feita na propriedade e muitos outros vizinhos também usaram. É preciso quantificar a utilização do gado no inverno e no terço final procurar manter a pastagem, controlando o gado, até 30 cm, garantindo a palhada para soja e a ressemeadura do azevém”. Francisco lembra que outra vantagem, além do custo da ressemeadura, é que o azevém germina um mês antes do prazo normal. “Ganhamos 30 dias de pastejo, temos mais aproveitamento e o gado ganha mais quilos por hectare”. Na propriedade começa-se a pastorejar no inicio do inverno, normalmente em junho e se vai até final de outubro. “Não tiramos o gado antes disso. Quem tira o gado da lavoura é o pulverizador de dessecação, só controlamos o nível da palhada e a altura de pasto até plantar, quando se tira o gado. Não precisa nada para recuperar a pastagem para a soja, o que ocorre no período entre novembro e dezembro. Hoje em dia as plantadeiras são modernas e conseguem quebrar a barreira de compactação do solo”.

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A lavoura comercial

Nos 300 hectares de lavoura comercial são utilizadas as mesmas técnicas do experimento, no mesmo período de 12 anos, e a cada ano os agricultores recebem mais informações positivas do experimento. Francisco diz que anualmente os resultados são parecidos, o que traz segurança. “Acredito que o gado no inverno é um seguro para a soja. Quando a soja vai bem o agricultor vai bem, quando a soja vai mal ele também vai bem porque tem o gado, não depende só de um ramo de atuação. Escutamos de muitas pessoas que em período onde o clima não contribui para a soja, quem acaba salvando eles é a meia dúzia de gado. E mesmo assim tem preconceito de utilizar a ILP. Mas o experimento quebrou este paradigma. Se deixar o pasto a 20 cm ou 30 cm no terço final não terá prejuízo na soja, do que se deixar com mais centímetros ou sem gado, ele realmente não atrapalha a soja. Há milhares de hectares de muitas propriedades que é de aveia para palhada. Ela poderia ter sido comida pelo gado, gerado renda e circulando. O experimento agora quer ver o que o gado ajuda para a soja. O que começou com uma investigação do que iria atrapalhar agora mudou de perfil, queremos saber as vantagens e os benefícios que está trazendo para a cultura da soja”.


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O gado A propriedade de seu Armando utiliza gado de corte, com dois tipos de diferentes finalidades. O primeiro é o cruzamento industrial, que seria o zebuíno com europeu. Com há misturas em alguns lotes, também há cruza de Jersey com Holandês. “Procuramos, num cruzamento comercial a cruza de zebuíno com europeu onde fizemos comercialização para frigoríficos do Estado”, conta Francisco. O segundo tipo é dos animais 75% europeus, numa parceria com a JBS/Friboy. “A carne tem qualidade superior, semelhantes ao encontrado em países como Argentina e Uruguai. Estes animais saem com até 400 quilos e viajam três dias para São Paulo. Lá entram em confinamento da JBS, ganham cem quilos e posteriormente são abatidos. A carne é a Swift Black, linha que somente este gado produz. A procura é grande e quase não se abastece a demanda, o que é bom para o sul do país, que é único que tem este tipo de gado”, lembra o produtor de Tupanciretã. A Fazenda Espinilho comercializa cerca de 1.500 bois europeus anualmente e a intenção é dobrar o volume em até três anos.Francisco ressalta que entre as vantagens deste tipo de bovino está a economia no acabamento final, que teria o maior custo. “Mandamos direto para estas indústrias e assim não tem este ônus. O animal sai mais rápido, pagam preço de boi gordo e para nós é um excelente negócio. Procuramos aumentar cada vez mais o número de animais para esta comercialização”.

O novo paradigma

Com a comprovação, por meio do experimento, de que o pisoteio do gado contribui no desenvolvimento da soja, surge a sociedade emergente com a integração do gado. “Seria um cinergismo. Hoje um mais um dá muito mais, é uma simbiose. Os dois juntos – gado e soja - ajudam para o gado com o azevém em cima da soja, na resteva de soja ideal para o gado, mostrando que o pastejo, a ciclagem de nutrientes com o gado comendo o pasto, estercando e urinando, traz benefícios para o cultivo da soja. Um mais um agora é mais que dois”.

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“Quem trabalha com gado no inverno tem um seguro para a soja”. Francisco Garcia de Garcia


UFSM

Além da UFRGS, a Universidade Federal de Santa Maria(UFSM) começa a fazer a análise de solo georreferenciada, que começou na metade do mês de novembro. Alunos do curso de Agronomia, que integram o Projeto Aquarius – agricultura de precisão - farão a análise periódica da terra utilizada na ILP. A intenção é saber quantificar os nutrientes e outros componentes que acabam por diferenciar esta terra, dando ainda mais credibilidade ao uso do gado com o grão.

“Quando viajei para Nova Zelândia, fui a uma estação experimental e lá uma placa me chamou a atenção. Ela dizia: “Todo conhecimento gerado aqui e que não for levado ao campo não tem valor algum”. Isto demonstra que precisamos acreditar e apostar em novas possibilidades e estamos fazendo isto”. Armando Chaves Garcia de Garcia

A família

Seu Armando tem três filhos homens que cuidam de diferentes propriedades da família. Além da Fazenda Espinilho (conhecida também como Granja do CBT), de cinco mil hectares em Tupanciretã, administrada por Francisco, há lavouras de arroz, próximo a Porto Alegre e mais 6 mil hectares no Uruguai, com gado. Em Tupã, a fazenda é herança da matriarca da família, dona Suzana Pereira Garcia de Garcia. Foram os pais dela há 100 anos, que adquiriram estas terras, antes administradas pelo pai Teófilo Pereira, e pelo tio, Otaviano Pereira.

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O experimento

Informações e dados fornecidos pelo SIA – Serviço de Inteligência em Agronegócios, empresa especializada na elaboração, implantação e monitoramento de projetos e soluções para o setor agropecuário no sul do Brasil foi construído em 13 anos de experimento, 12 anos de resultados e 11 dias de campo A Revista Destaque Rural buscou algumas respostas no intuito de mostrar aos produtores que o sistema, se bem programado, com o suporte necessário, pode garantir sucesso na lavoura. Trouxemos como modelo, o experimento conduzido desde maio de 2001, por um grupo de professores e alunos da UFRGS, orientados pelos professores Paulo César de Faccio Carvalho, Departamento e Plantas Forrageiras e Agrometeorologia e Ibanor Anghinoni, Departamento de Solos , em uma área pertencente à Fazenda do Espinilho, localizada no município de Tupanciretã, região do Planalto Médio. O boletim técnico foi elaborado, baseado em estudos realizados durante os primeiros 10 anos de experimento, copilando tanto os resultados da pastagem, desde acúmulo de massa, raízes, ganho animal, diário

e por área e todas as avaliações de solo, tanto físicas como químicas, bem como os resultados da soja. A publicação buscou quantificar os benefícios agronômicos, econômicos e ambientais da integração lavoura-pecuária e ajustar o sistema permitindo a otimização dos efeitos induzidos por suas combinações, adaptando-as na prática ao dia-a-dia na propriedade.

Lavoura e Pastagens As questões relacionadas à associação entre lavouras e pastagens, com sistemas mistos de produção animal e vegetal, representam interesse na maior parte das regiões do mundo, segundo o estudo. Nele estão focadas as diferentes possibilidades de ocupação do solo, de tipos de pastagens e de culturas em nível espacial e temporal permitem alcançar níveis elevados de produtividade e minimizar os impactos ambientais negativos, ligados à intensificação agrícola. Segundo os especialistas que integraram a pesquisa, isto ocorre em razão das pastagens permitirem melhor ciclagem de nutrientes, o que reduz os fluxos de perda para at-

mosfera e para a hidrosfera, além de incrementar a biodiversidade vegetal, animal e microbiana, que participam da dinâmica da matéria orgânica e mantém a qualidade do solo. Além de seus efeitos positivos diretos sobre o ambiente e a biodiversidade, as pastagens têm seus efeitos indiretos em diminuir os impactos ambientais negativos ligados à intensificação das culturas com as quais estão associadas. Entre os efeitos os pesquisadores pontuam a redução de fertilizantes minerais e de risco de poluição associado ao controle das plantas daninhas e a redução do uso de herbicidas, ao controle de pragas e doenças e redução do uso de inseticidas e fungicidas. Para eles é possível afirmar que, para um mesmo nível de intensificação, os impactos ambientais dos sistemas integrados de lavoura-pecuária, pelas interações espaciais e temporais entre as pastagens e as culturas, sejam menores. A expectativa é que os resultados desta publicação possam estar orientando soluções operacionais, demonstrando a eficiência econômica e ambiental do sistema de integração lavoura-pecuária.

As perspectivas em nível global para a ILP também são promissoras. A FAO reconhece o potencial dos sistemas ILP como via sustentável para se atingir o objetivo de alimentar nove bilhões de pessoas em 2050. Novembro e Dezembro - 2013 Rio Grande do Sul - Ano I - nº 3

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Como o sistema acontece? A Integração Lavoura-Pecuária (ILP) refere-se a uma associação entre cultivos agrícolas e produção animal que se faz em diferentes partes do mundo, com os mais diferentes propósitos. AILP não é uma tecnologia nova; seus conceitos há muito estão em uso. Porém, recentemente retoma força no país e no mundo, pela ineficiência dos atuais modelos pecuários e agrícolas. A pecuária, por exemplo, não tem sido hábil em transformar em renda os amplos espaços que ocupa e ainda tem sido responsabilizada por impactos que contribuem para o aquecimento global. Já a agricultura tem sido notabilizada pelo alto risco operacional dos sistemas baseados na monocultura e pelos temores am-

bientais e econômicos trazidos por uma atividade que é, de forma geral, intensiva, descompromissada com os impactos ambientais e de baixa diversificação. Nesse contexto, a integração lavoura-pecuária tem sido reconhecida como opção singular de sistema de produção na qual se pode almejar, de forma concomitante, intensificação e sustentabilidade. O pilar conservacionista do sistema é o Plantio Direto, as boas práticas de manejo e a utilização da pastagem em intensidades de pastejo moderadas. A diversificação é aportada pelas rotações agrícolas, associada a uma fase pastagem, cujo arranjo sinérgico recicla melhor os nutrientes e diminui a incidência de pragas e doenças. A eficiência,

em nível de propriedade, é trazida pelo melhor aproveitamento dos nutrientes, pela maior eficiência no uso de maquinário e pessoal, pela maior liquidez financeira, pelo incremento de renda na mesma unidade de área e pela diminuição do risco da operação agrícola. O resultado final, em nível de sistema é maior que a soma das contribuições das tecnologias individuais; um sinergismo que resulta em benefícios econômicos e ambientais, produção de alimentos seguros e sustentabilidade na produção. Nesse sentido, a percepção vigente é a de se tratar de um raro sistema de produção, no qual o dilema produção versus conservação tem solução compatível com as atuais demandas da sociedade.

A Fazenda Espinilho

conta com

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hectares da mata nativa


Compromisso

Tal tecnologia gera enorme interesse, inclusive em nível político. Por exemplo, o governo brasileiro se comprometeu em reduzir entre 36,1 e 38,9%, as emissões nacionais de CO2-equivalente até 2020. Dentre as várias iniciativas nesse sentido, está o fomento à adoção de sistemas ILP no Brasil, com o comprometimento governamental de incrementar em, pelo menos, quatro milhões de hectares as áreas operando nesse tipo de sistema. Iniciativas de fomento, com crédito para a adoção de sistemas de ILP dentro de Programas como o ABC (Agricultura de Baixo Carbono), já se encontram disponíveis no sistema financeiro e tudo indica que sejam ações de longo prazo.

Uma via sustentável

As perspectivas em nível global para a ILP também são promissoras. AFAO reconhece o potencial dos sistemas ILP como via sustentável para se atingir o objetivo de alimentar nove bilhões de pessoas em 2050.

A experiência

Após a colheita da soja, o experimento foi iniciado em maio de 2001, com a implantação das espécies forrageiras de inverno: aveia preta em adição ao azevém. A área experimental total é de aproximadamente 22 hectares, com divisão em 12 parcelas,

em áreas que variam de 0,8 a 3,6 hectares, aproximadamente, em função dos tratamentos aplicados. Os motivadores originais do experimento podem ser exemplificados por duas questões principais. A primeira, qual a intensidade de pastejo se pode utilizar no pasto de modo a não compactar o solo e não prejudicar a implantação da soja, em semeadura direta na sequência; e a segunda, quanto de pasto há que se deixar para que o rendimento da soja não seja afetado? Em outras palavras, qual o manejo que se deve dar ao sistema de integração para a sustentabilidade do sistema Plantio Direto. Além dessas perguntas, relacionadas ao uso das áreas no inverno, questões relativas à aplicação e

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a dinâmica do calcário, em situações onde o solo não é revolvido e a vegetação é submetida à pastejo (com efeito direto da desfolhação e de excrementos), também foram postuladas. Para responder a esses questionamentos, os tratamentos foram constituídos de pastos manejados sob diferentes intensidades de pastejo, representadas por alturas de manejo. O sistema consta da produção integrada de bovinos de corte em pastejo no inverno, e soja no verão, em plantio direto. Foram utilizados bovinos jovens, com

idade ao redor de dez meses (na entrada da pastagem), machos, castrados, oriundos de cruzamentos entre raças. De forma geral, os animais iniciam o ciclo de pastejo na primeira quinzena de julho, o qual se estende até a primeira quinzena de novembro, totalizando 110 dias de pastejo, em média. Em dezembro, procede-se a semeadura da soja, com sementes inoculadas na dose recomendada para o produto. A soja é colhida em maio do ano seguinte. A partir do outono de 2002 e até o presente momento repetiu-se o mesmo

A integração soja-pecuária no sul do Brasil No sul do país, a ILP é divulgada como alternativa às rotações que usam cereais de inverno e para o uso eficiente da terra no período entre sucessões de lavouras de verão, diversificando a propriedade, diminuindo o risco da lavoura e melhorando o solo. Na safra 2010/2011, as áreas com soja, milho e arroz ocuparam 6,35 milhões de hectares no RS. Elas sucederam 0,93 milhões de hectares de lavouras de inverno, as quais se constituíram de lavouras de trigo (0,8 milhão de ha), na sua quase totalidade. Estimativas das áreas de lavoura de verão que são ocupadas com pecuária no inverno são dúbias e, normalmente, giram em torno de 1,0 (um) milhão de ha. Isto significa, no mínimo, a existência de milhões de ha que ficam em pousio no inverno ou, mais frequentemente, com cobertura vegetal visando à produção de palhada para as lavouras de verão. Palha que poderia ser convertida em renda, por exemplo, carne e leite, sem prejuízo à lavoura, como demonstram vários resultados de pesquisa. Nisto, reside a principal oportunidade da tecnologia ILP ser aplicada no RS. Corrobora para tanto, o fato de que essa cobertura vegetal, produtora de palhada, seja na maioria das vezes, constituída por plantas forrageiras de excelente valor nutritivo, como a aveia e o azevém.

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procedimento na implantação da pastagem e manejo dos animais, seguidos da implantação e condução da cultura da soja.

A quebra de paradigma

O professor Ibanor Anghinoni menciona o surgimento de novas propriedades, ditas “emergentes, advindas desse ciclo virtuoso. Ou seja, o gado ao invés de atrapalhar o sistema, está promovendo-o, uma vez que muitos efeitos positivos têm surgido em sua integração com a soja. Há algum tempo estamos utilizando, na propriedade, os ensinamentos advindos dessa parceria. Trata-se de um grande experimento e uma grande experiência, conduzida por esse longo tempo dentro da rotina da propriedade. Visando potencializar o sistema pecuário através da ILP, Francisco Garcia procurou a SIA - Serviço de Inteligência em Agronegócios para a elaboração de um projeto de financiamento junto ao Programa ABC - Agricultura de Baixa Emissão de Carbono. A equipe técnica da SIA visitou as áreas da Fazenda Espinilho e propôs a recuperação de 800 ha de pastagens perenes de verão, que aliadas às pastagens de inverno nas


O papel do trigo

Não pensando apenas na soja, mas no modelo agrícola, a alternativa de composição de sistema mais frequente tem sido o trigo, gerando o conhecido binômio trigo/soja do Planalto Médio do RS. O trigo registrou 16 frustrações nas 34 safras do mesmo período analisado para a soja, o que aliado às instáveis políticas de preços e de comercialização tornam essa, uma atividade que tem atraído poucos agricultores, com extensões quase sempre abaixo de um milhão de ha. O resultado é que a maioria das propriedades voltadas ao plantio da soja não têm opções de rotação no inverno e usam coberturas, nesse período, para produzirem palha para a lavoura em sucessão. Com isso, têm pouca diversificação e o fluxo de caixa é reflexo integral da colheita da soja; mais um elemento de ineficiência e risco.

áreas de soja irão oportunizar a seqüência de ganho de peso dos novilhos após o primeiro inverno, evitando a necessidade de comercialização em outubro, quando os preços não estão favoráveis. O projeto já foi aprovado junto ao Banco do Brasil e os recursos já estão sendo aplicados.

Sustentabilidade

Foi realizada uma avaliação de risco em sistemas de produção que incluem a soja, com plantas de cobertura sem pastejo (situação mais comum no RS) e pastejadas, a partir dos dados do protocolo experimental. Na comparação entre

os sistemas, moderadamente pastejado e não pastejado, verificase apenas diferenças mínimas na produtividade da soja. No entanto, quando se insere o animal no sistema (produção de carne), o mesmo passa a ter acréscimos em torno de 77% em relação às áreas sem a presença do animal. Verifica-se também que os anos de 2006 e 2007 foram os piores em relação ao preço da soja e que, nesses mesmos anos, ao utilizar a produção integrada houve um aumento em 120 e 240%, respectivamente, na produção total por área. Esses resultados, além de surpreendentes pela magnitude, são importantes para garantir o sustento e a ma-

nutenção do “homem do campo”, especialmente nos anos em que a produtividade da lavoura de verão, neste caso soja, sofre com as instabilidades climáticas.

Resultados Os resultados do experimento tiveram sucesso em responder aos questionamentos que originaram essa proposta. Os dados colhidos, ao longo desses anos, foram convincentes em apontar que o pastejo (moderado ou leve) não afeta negativamente a lavoura de soja. Muito pelo contrário, a integração da engorda de novilhos com a lavoura de soja duplica os rendimentos do produtor na mesma unidade de área. Ademais, esse benefício é maior em anos de frustração de safra, diminuindo o risco da operação agrícola. O sistema se torna mais rentável, e mais estável. Em áreas sem pastejo não se produz mais soja do que nas áreas pastejadas. A calagem superficial tem sua dinâmica de reação melhorada, mais eficiente, mais rápida e profunda, sob ação do pastejo. Não há relação direta entre a quantidade de palha deixada após o ciclo da pastagem e o rendimento da lavou-

Retorno A pesquisa estima que, se em cada hectare de cobertura de inverno, não contando as áreas de trigo e outras lavouras dessa estação, se colocasse apenas 1 (um) animal jovem para passar o seu primeiro inverno com pasto abundante, o rendimento equivalente em ganho de peso poderia atingir cifras impressionantes, ao redor de 660 milhões de toneladas de peso vivo, apenas no ciclo hibernal.

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ra de soja na sucessão. Porém, os resultados de longo prazo indicam que não se deva almejar conduzir a altura de manejo dos pastos em situações abaixo de 20 cm, pois inúmeras variáveis que inferem sobre a sustentabilidade do sistema são negativamente afetadas. O solo é a “memória do sistema”, o componente centralizador de todos os efeitos que as ações de manejo provocam. O animal em pastejo é o “catalizador” desses processos, tanto podendo afetá-los de forma positiva quanto negativa. Em última análise, não é o animal que o faz, mas o homem, ao definir a intensidade de pastejo empregada no sistema. O “bom pastejo” melhora a qualidade do solo para a lavoura. Vários atributos químicos, físicos e biológicos são potencializados pela ação do pastejo moderado. A compactação do solo somente ocorre de forma expressiva quando os pastos são manejados em alturas de 10 cm, “pasto rapado”. E quando ocorre, é um impacto superficial e logo revertido pelo ciclo da lavoura. A melhor condução de misturas de aveia+azevém, na forma que mais traz benefícios ao sistema integrado, corresponde ao manejo da altura em 20 cm. Nesse sistema, a produção de soja diminui em 3 sacos/ha, mas se produz 420 kg/ha de peso vivo. Em última análise, a produção pecuária equivale a uma produção de soja de 32 sacos/ha. Portanto, é como se essas áreas produzissem 81 sacos de soja/ha. Em outras palavras, é como ter 2 safras de soja por ano. Os conhecimentos adquiridos ao longo desses 10 anos, no que diz respeito ao impacto dos tratamentos nos diferentes compartimentos do sistema, podem assim ser sintetizados.

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Produção do pasto O conhecimento dos principais fatores que condicionam o desenvolvimento e o crescimento das culturas é fundamental para nortear práticas de manejo. Em sistemas de integração lavoura-pecuária, essa tarefa torna-se ainda mais desafiadora, pois há necessidade de conciliar a produção do pasto e a do animal em pastejo, além da lavoura em sucessão.

A publicação buscou quantificar os benefícios agronômicos, econômicos e ambientais da integração lavourapecuária e ajustar o sistema permitindo a otimização dos efeitos induzidos por suas combinações, adaptando-as na prática ao dia-a-dia na propriedade. Objetivo fundamental numa região do mundo, onde a agricultura se transforma muito rapidamente, com tendência a especialização de sistemas de produção e de uniformização na forma de ocupação do solo em escala de território.

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Dia de Campo Ocorre uma vez ao ano, sempre na primeira sexta-feira de outubro, quando há uma média de público de 300 pessoas.


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Tiago Dalla Corte, Chefe de Mesa de Operações de Bolsa de Valores e Futuros.

MERCADO

Mercado internacional: a expectativa

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formulação de estratégias de comercialização de commodities agrícolas e seus derivativos transformou-se numa das ações mais comuns no dia-a-dia das mesas de operações das grandes empresas ligadas ao mercado agrícola no mundo. Muitas teorias e modelos surgiram com o intuito de maximizar o retorno e minimizar o risco nessas operações. Este estudo tem por objetivo construir um cenário base para análises dos preços da soja. Para sua elaboração foram utilizados posições de fundos de investimentos em commodities, relatórios do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) e os dados históricos do PIB de 41 países e o agregado da União Europeia (27 países). Após a aplicação de ferramentas, podese verificar que a maior correlação entre os ciclos econômicos dos países e os ciclos de preços da soja acontece com a China. Logo, serão utilizados os dados do desempenho

econômico chinês para a elaboração do cenário. A elaboração de cenários sobre expectativas e antecipação do futu-

O “boom” da economia chinesa também tem papel destacado no cenário de comportamento de preços da soja.

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ro não é algo novo. Segundo o livro do Gênesis, na Bíblia, o Faraó do Egito sonhou certa noite com sete vacas gordas e sete vacas magras. José, seu sacerdote, decifrou o sonho como prenúncio de sete anos de prosperidade e sete anos de fome. Graças a isto o povo pode armazenar alimentos no tempo de fartura para enfrentar os anos de seca, fome e peste. Não fosse José, o povo egípcio teria sucumbido nos sete anos de adversidade. Pode-se estabelecer este relato como sendo o primeiro registro de um ciclo econômico. Como os preços da soja no mercado são formados pela interação entre a oferta e a demanda do produto, deve-se observar a projeção de oferta e demanda dos preços da


soja. O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) apresenta um relatório mensal sobre a projeção de oferta e demanda de soja (entre outros produtos agrícolas). O quadro abaixo resume os principais itens relacionados no relatório. No relatório de outubro de 2013 a projeção para a safra americana fica em aproximadamente 88,6 milhões de toneladas. Somando o estoque inicial, a produção e as importações, consegue-se estimar a oferta total de soja nos EUA. Para a safra 2013/2014 a oferta total de soja está projetada em aproximadamente 92,9 milhões de toneladas. No que se refere à demanda total, a projeção para a safra 2013/2014 está em 88,2 milhões de toneladas. Essa demanda está dividida entre os componentes de moagem, exportação e sementes. Assim, o estoque final projetado fica em aproximadamente 4,6 milhões de toneladas. Esse valor fica abaixo do reportado pelo relatório de agosto de 2013 pelo USDA, no qual as projeções apontavam um estoque final de

aproximadamente 5,9 milhões de toneladas. Essa redução no nível de estoque final acarretou na elevação de 5,38% na projeção dos preços médios ao produtor na safra 2013/2014, passando de US$11,53 por bushel no relatório de agosto (2013), para US$12,15 por bushel no relatório de outubro (2013). O “boom” da economia chinesa também tem papel destacado no cenário de comportamento de preços da soja. Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) o PIB chinês avançou a taxas surpreendentes nas últimas três décadas, com percentuais acima de dois dígitos em alguns anos. Só entre

1992 e 2008, último período das reformas econômicas no país, o crescimento anual médio foi de 10,36%, com destaque para os 14,2% de 1992. A média do crescimento anual dos últimos 30 anos é de 9%, incluído o recorde de 15,2% de 1984. Esse processo alavancou o comércio mundial de commodities. Para a safra 2013/2014 o USDA projeta um volume de importações de soja pela China de 69 milhões de toneladas. O gráfico abaixo demonstra a taxa acumulada em quatro trimestres do PIB Chinês (a preços de mercado) e a taxa média de crescimento em quatro trimestres dos preços da soja na bolsa de Chicago. Pode-se observar então como o desempenho do PIB Chinês pode ser utilizado para construir estratégias que permitam identificar a tendência para o preço da soja. De acordo com o relatório de outubro do Fundo Monetário Internacional (FMI) as projeções para o PIB da China foram reduzidas. O documento diz que o país asiático terá nos próximos anos um ritmo menos intenso de crescimento do que vinha registrando. Em 2013, a previsão de crescimento da eco-

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nomia baixou de 7,8% para 7,6%. Para 2014, a previsão de crescimento da economia foi reduzida de 7,7% para 7,3%. Vale destacar que estas taxas de crescimento ficam abaixo da taxa média de crescimento anual de 9% verificada nos últimos 30 anos e observada pelo IPEA. Ainda, o presidente da China, Xi Jinping, acredita que um crescimento de 7% é suficiente para se atingir a meta de dobrar o PIB e as receitas per capita para 2020. No entanto, reconheceu que os desafios enfrentados pela economia de seu país (que incluem uma queda na demanda externa, um excesso de capacidade de produção e o endividamento dos governos locais) são “especialmente difíceis”’. Porém é importante destacar, que mesmo com uma acomodação na economia chinesa para 2013 e 2014 e com as dificuldades destacadas, a projeção de importação de soja chinesa é de 69 milhões de toneladas. Esse volume representa uma elevação de 15,97% em relação ao volume de importação chinesa registrada na safra 2012/2013.

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Ainda, a partir da crise financeira de 2008 os fundos de investimento aumentaram sua participação no volume de negociação de commodities agrícolas. Logo, não seria ideal traçar cenários sobre comportamentos de preços ignorando a posição dos fundos de investimento em commodities. No gráfico abaixo pode ser observada posição dos fundos em soja na CBOT. Os dados observados demonstram que a correlação entre a posição dos fundos e a variação de preços é relevante. Até o início de outubro os fundos mantinham uma posição de 10,88% no total de contratos abertos. A média da posição dos fundos de investimentos na CBOT (em % dos contratos em aberto) de 2010 até início de outubro de 2013 é de 9,42%. A maior participação ocorreu no dia primeiro de maio de 2012,

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onde os fundos foram responsáveis por 20,21% da posição dos contratos em aberto. Papel destacado também tem a onda de biocombustíveis no mundo, o clima e o crescimento populacional. No que se refere à onda de biocombustíveis no mundo, esta tem criado uma nova demanda por produtos agrícolas. É importante observar que a área agricultável nos EUA já está ocupada. Para aumentar a área de produção de uma cultura há necessidade de diminuir a área de produção de outras


culturas. Essa relação é conhecida como efeito cruzado entre culturas. Assim, para a produção de biocombustíveis nos Estados Unidos, observou-se um aumento de aproximadamente 80 milhões de toneladas de milho entre 2001 até 2009. A prioridade dessa elevação na produção de milho é a fabricação de etanol. O consumo de milho para produção de etanol é, aproximadamente, duas vezes a safra de milho brasileira. Assim, ao longo do período, a área de milho nos Estados Unidos aumentou em 18,8% e tem tomado lugar da soja, que apresentou uma redução de 9,2% na área de produção e do algodão que teve uma redução de área de cultivo de 16,4%. Outro forte fator para sustentar os preços da soja vem do crescimento da população mundial. De acordo com a ONU, em

De acordo com o relatório de outubro do Fundo Monetário Internacional (FMI) as projeções para o PIB da China foram reduzidas. 2010, pela primeira vez a população urbana superou a população rural. A população mundial apresenta um crescimento médio de 213.000 pessoas por dia. Mantendo esse nível de crescimento, em 2050 o planeta terá que abrigar 2,4 bilhões de humanos a mais. Em 2050, a população mundial será estabilizada em 9,2 bilhões de habitantes com uma expectativa de vida de 75 anos e com 70% da população concentrada em zonas urbanas. Assim, apresentam-se os elementos necessários para construção de um cenário sobre o comportamento dos preços da soja. Esse cenário pode ser utilizado como base para formulação de estratégias de comercialização. É importante lembrar também que existem variadas hipóteses e metodologias de análise de comportamentos de preços que podem ser adaptadas e transformadas em cenários para os preços de soja. Par-

tindo deste cenário, com essas variáveis, cabe ao agente interessado aprofundar a conclusão e facilitar o processo de tomada de decisão sobre sua negociação. Como observado ao longo do artigo, pode-se afirmar que o cenário para o comportamento dos preços da soja está inserido em sua maior parte no mercado internacional. Também, fica claro que os fundamentos seguem estáveis para demanda encontrando condições favoráveis no crescimento da população mundial, no aumento da renda e do consumo chinês (embora apresentando crescimento econômico mais moderado), entre outros fatores abordados, que no momento estão provocando pressão sobre os preços da soja. Nesse sentido, parece coerente o aumento na projeção de preços médios feitos pelo USDA no relatório de outubro de 2013 em relação a agosto. Lembrando que para o USDA a tendência de preços médios para soja na safra 2013/2014, no momento, é de US$12,50 por bushel com algum viés de alta até o final de 2013, com claro destaque para a redução nas projeções dos estoques finais de soja.

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CULTIVARES

TRIGO DE DUPLO-PROPÓSITO Versatilidade nos sistemas de produção

A

região sul-brasileira compreende dois biomas, a Mata Atlântica e o Pampa. O clima predominante é o subtropical, com estações bem definidas e chuvas bem distribuídas ao longo do ano. A maior parte das terras da região sul-brasileira situa-se na transição entre a zona tropical e a temperada, com possibilidade de duplo cultivo, de verão e inverno. Segundo Renato Fontaneli, engenheiro agrônomo da Embrapa Trigo de Passo Fundo, neste contexto, desenvolvem-se sistemas integrados, de lavoura-pecuária (agropastoris), lavoura-floresta (silviagrícolas), pecuária-floresta (silvipastoris) ou lavoura-pecuáriafloresta (iLPF- agrosilvipastoris). Eles permitem grande versatilidade ao sistema de produção, permitindo que componentes culturais, econômicos e ambientais sejam considerados na adequação com a realidade regional.

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Uso atual da terra Fontaneli explica que o uso atual da terra divide-se basicamente em duas partes, em função do tipo de solo e topografia:

Terras Altas Cultiva-se no verão, soja e milho, no inverno trigo, cevada, aveia, triticale, centeio e canola. Entretanto, de cada 5,0 ha cultivados no verão, apenas 1,0 ha é cultivado para produção de grãos no inverno, havendo ociosidade de terras, mão de obra, máquinas e equipamentos.

Terras Baixas A maior parte situa-se no bioma Pampa (Campos Sulinos) que abrange principalmente a metade sul do Rio Grande do Sul, cuja base forrageira da bovinocultura é pastagem nativa, composta por espécies estivais (primavera-verão), havendo falta de forragem no fim de outono e inverno. Cultiva-se arroz irrigado em rotação com pastagens cultivadas, compostas por azevém-trevo branco-cornichão, com aumento de cultivo da soja na áreas bem drenadas, também em rotação com pastagens cultivadas.

Cultivares de trigo de duplo-propósito (DP) são 100% da Embrapa Trigo O produtor sul-brasileiro conta com cultivares de trigo com dupla aptidão, para pastagem e posterior colheita de grãos, cujas principais são BRS Umbu e BRS Tarumã, trigos de ciclo tardio, que pode chegar a mais de 160 dias da emergência à maturação. Os trigos de duplo-propósito entram mais cedo na lavoura que os cultivos destinados somente a produção de grãos (vide tabela 1).

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Para produção animal 1 Manejo em pastejo “O trigo DP deve ser pastejado por bovinos de corte ou de leite quando as plantas estiverem com aproximadamente 25,0 cm de altura, o que normalmente ocorre entre 45 e 60 dias após a semeadura (cerca de oito semanas após a emergência das plântulas). Ao pastejar, devem ser preservadas as estruturas para o rebrote, limitando o pastejo até 5,0 a 10,0 cm de altura durante o período vegetativo. O ideal é usar o método de pastejo rotacionado que propicia maior controle de oferta de forragem e pressão de pastejo, diminuindo o risco de erros de manejo, superpastoreio. Os dias com excesso de umidade, frequentes durante o período frio, devem ser evitados para minimizar o adensamento do solo, que pode comprometer as vantagens de geração de renda durante o inverno. Não esquecer de aplicar o fertilizante nitrogenado após a saída dos animais, conforme discutido na seção anterior. O pastejo deve ser finalizado quando for observada a formação do primeiro nó, variável de ano para ano, mas em Passo Fundo, ocorre geralmente no final de julho a início de agosto”.

2 Manejo de forragem Fontaneli ressalta que os cereais de inverno, incluindo o trigo, podem ser manejados exclusivamente para produção de grãos ou para compor pastagens, ou ainda como duplo-propósito (pastagem e grãos), também podem ser colhidos e armazenados na forma de feno ou de silagem.

3 Fenação Já para a obtenção de feno, indica-se o corte no início da emissão das inflorescências, na qual, compatibiliza-se boa produção de biomassa e bom valor nutritivo. A forragem deve ser enfardada somente quando estiver com menos de 20% de umidade, pois do contrário permitirá o desenvolvimento de microrganismos que comprometem a qualidade do feno. Entretanto, pela dificuldade de secagem da forragem para feno, têm-se preferido a ensilagem, que pode ser de planta inteira ou pré-murchada.

Tabela 1. Época de semeadura indicada para cultivares de trigo de duplo-propósito (DP), para pasto e grãos do rebrote, em comparação com a indicada para cultivares tradicionais, somente grãos, na região Sul-brasileira. Exemplo para: Passo Fundo, RS Época indicada Início: 01 de junho

Cultivares de trigo tradicionais (somente grãos)

Semear: 10 dias antes Antecipar para 20 maio Cultivares de trigo de DP ou para Grão

BRS Umbu para grão

Semear 20 dias antes Antecipar para 10 de maio

BRS Umbu para DP

Semear 20 d antes (10 de maio) AntAntecipar para 10 maio

BRS Tarumã para Grão

Semear 40 dias antes Antecipar para 20 de abril

BRS Tarumã para DP

“Assim, o diferencial no uso de cultivares para duplo-propósito está no manejo da cultura. A densidade, recomenda-se, pelo menos 350 sementes aptas por metro quadrado, que representa de 100 a 140 kg de sementes/ ha, dependendo do valor cultural (germinação e pureza) e peso de mil sementes. Na adubação, diferencia-se na cobertura nitrogenada, fundamental para recuperação das plantas após a desfolha pelos animais. Indica-se reposição de 30 kg N por hectare a cada ciclo de pastejo, onde estima-se remoção de 1.000 kg de forragem seca (MS) por hectare”.

Tabela 2. Potencial de produção animal com trigo BRS Tarumã como duplo-propósito (pasto/grãos) no Sul do Brasil. Produção

Ganho diário (kg/animal)

Lotação (animal/ha)

Rendimento (kg/ha)

Carne

0,7 a 1,65

1 a 3

100-500

Leite

15 a 20

1 a 2

Grãos

-

-

1.500-4.000 1.500-4.500

Renato Serena Fontaneli Professor titular de Pastagens na Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária na Universidade de Passo Fundo (UPF) e pesquisador da Embrapa Trigo, unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, desde 1989. Obteve os títulos de mestre, em 1986 e de Ph.D, em 1999, na área de Fitotecnia, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, RS e na Universidade da Flórida, em Gainesville, nos Estados Unidos da América, respectivamente.

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BSBIOS: TECNOLOGIA VERDE A FAVOR DO PRODUTOR RURAL A BSBIOS é detentora do Selo Combustível Social e adquire no mínimo 35% de toda sua matéria prima da agricultura familiar Por Luciana Quétheman

História

A BSBIOS foi fundada por seu atual presidente Erasmo Carlos Battistella e em seguida recebeu novos sócios como Antônio Roso, Arlindo Paludo, Mário Wagner e Paulo Montagner, que juntos acreditaram na ideia lançada pelo fundador e transformaram o projeto

em uma das maiores empresa do segmento de biodiesel do Brasil. Nascida em 15 de abril de 2005, com finalidade de produzir biodiesel, a BSBIOS instalou uma moderna planta localizada estrategicamente em Passo Fundo/ RS, junto da produção de soja e canola suas matérias primas utilizadas para produção de biodiesel, e em 12 de junho de 2007 teve início oficialmente a produção de biodiesel. A unidade tem

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capacidade de produção de 169 milhões de litros de biodiesel/ano. Em 2009 mais uma vez a BSBIOS demonstrou acreditar no programa de Biodiesel e comprou a segunda unidade de produção, localizada na cidade de Marialva, estado do Paraná, a qual foi inaugurada e iniciou a produção de biodiesel em maio de 2010. Esta unidade possui uma capacidade


Projeto Linha Verde

de produção de 183 milhões litros/ano e utiliza como mátrias primas a soja, canola, gordura animal e óleo de algodão. O ano de 2010 foi um ano muito importante na história da BSBIOS, pois além de iniciar a produção de biodiesel no estado do Paraná também inaugurou uma nova unidade de processamento de soja, localizada junto a sua unidade produtora de biodiesel no município de Passo Fundo. Esta unidade possui uma capacidade de processamento diário de 2.500 ton/dia de soja, que equivalem a 900 mil ton de soja/ ano processada. Dois grandes diferenciais desta unidade são sua tecnologia de ponta e a sua grande capacidade de armazenagem de soja e de produtos acabados que superam as 200 mil toneladas.

BSBIOS e PETROBRÁS

Ainda em 2010, a BSBIOS construiu uma joint venture (união de empresas) de destaque internacional associando-se a Petrobrás Biocombustível (PBIO) e firmando uma parceira muito importante para a produção de biodiesel. Esta parceria foi consolidada em duas etapas: em 2010 para Unidade de Marialva e Junho de 2011 para toda companhia. Atualmente a estrutura societária

Em agosto de 2009, Curitiba/PR adotou a utilização de B100 em coletivos urbanos, o biocombustível é fornecido com exclusividade pela BSBIOS. Os ônibus circulam no trecho urbano da BR-476, na capital Paranaense. Esta foi à primeira iniciativa do Brasil operando 100% com biocombustível em ônibus urbanos. Em março de 2011, Curitiba passou a contar com o maior ônibus do mundo em comprimento, com 28 metros e capacidade para 250 passageiros. O coletivo é movido a biodiesel fornecido com exclusividade pela BSBIOS. Outros 32 ônibus articulados movidos com 100% de biodiesel também rodam por Curitiba/PR. Em junho de 2012, a BSBIOS juntamente com a prefeitura de Curitiba, Volvo e a Marcopolo lançaram durante a Conferência Rio+20 o Hibribus, ônibus híbrido movido a biodiesel e eletricidade. “Se comparado aos veículos Euro 5, obrigatórios no mercado brasileiro a partir deste ano, o Hibribus emite até 50% menos material particulado, 50% menos óxido de nitrogênio e 35% menos gás carbônico. São 30 veículos Hibribus circulando em Curitiba/ PR, com biocombustível fornecido com exclusividade pela BSBIOS” .

é composta por 50% de participação da Petrobrás e 50% de participação da BSPAR, holding dos sócios fundadores. A partir de 2011, a BSBIOS passa a ter também mais investimentos em unidade de recebimento de grãos ampliando sua capacidade de recebimento e construindo um relacionamento comercial junto a agricultores, comercializando fertilizantes e defensivos e adquirindo toda sua produção. Em fevereiro de 2013, a BSBIOS anunciou a aquisição de 14 unidades de recebimento de grãos, localizadas no norte do Estado do Rio Grande do Sul. Ainda foi adquirida uma unidade de produção de sementes, no município de Lagoa Vermelha (RS). Juntas as unidades tem capacidade estática para armazenar 240 mil toneladas de grãos. Elas estão localizadas no Valinhos em Passo Fundo, Água Santa, Três Pinheiro em Sananduva, Muitos Capões, Capão Bonito do Sul, Lagoa Vermelha, Esmeralda, Tapejara, Capo-Erê em Erechim, Sertão, Charrua, Rio Telha em Ibiaça, Engenho Grande em Água Santa e Vila Lângaro. “A usina também produz reflexos no campo, pelo menos 35% de toda a aquisição de grãos é fruto da produção de cerca de quinze mil agricultores familiares, produtores de soja e canola nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná”, comenta Battistella.

Exportação

Em 25 de junho de 2013, a BSBIOS tornouse a primeira e única empresa do Brasil a exportar Biodiesel com destino final à Europa. Isto foi uma grande conquista para essa jovem empresa, pois foi a BSBIOS de Passo Fundo que inseriu o Brasil no mercado internacional de Biodiesel. “Um dos pontos chaves para essa conquista foi à qualidade do seu biodiesel. Atualmente a companhia possui 600 colaboradores, gera mais 2.500 empregos indiretos e também compra produção de mais de 15 mil famílias de agricultura familiar”, salienta o presidente.

Diferencial

“A BSBIOS é uma indústria que prima pela qualidade dos seus produtos, por isso os processos empregados são de alta tecnologia, o que assegura elevado padrão em seus processos e produtos” . A BSBIOS possui um laboratório de ponta, onde é feito o controle de qualidade de toda a matéria prima e dos insumos utilizados. Segundo Battistella nele é realizado o controle e monitoramento de todos os parâmetros que interferem na qualidade do produto e seu rendimento durante o processo de produção. O laboratório da BSBIOS, certificado pela ANP, é responsável pelo controle final

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e que tenham em seus processos sustentabilidade baseada no tripé econômico, ambiental e social.

Benefícios do Biodisel

que certifica a qualidade de toda produção. O biodiesel comercializado pela BSBIOS possui certificado próprio que garante seu padrão. A empresa está preparada para atender os certificados das especificações nacionais e internacionais. Em 2010 a BSBIOS buscou normas internacionais que fornecessem diretrizes para assegurar a Segurança Alimentar do farelo de soja produzido, visando satisfazer os seus futuros clientes nesse novo mercado. No ano de

2011, a empresa recebeu a certificação GMP+B2 e GMP+B3, que atesta o atendimento dos requisitosinternacionais relacionados à Segurança Alimentar na sua cadeia de produção e comercialização. Destaque Inovação em Engenharia, em outubro de 2012, a Sociedade de Engenharia do Rio Grande do Sul (SERGS) reconheceu através do Prêmio Destaque Inovação em Engenharia 2012 às empresas empreendedoras que atuam como pioneiras em inovação sustentável,

Qualificação Profissional A BSBIOS estimula a qualificação interna de seus profissionais, principalmente nos processos produtivos da empresa, devido à especificidade da tecnologia/informatização das plantas. Atualmente o mercado regional, onde atua, não oferece mão de obra qualificada para necessidade operacional da empresa. Segundo Battistella os treinamentos técnicos voltados às demais áreas também são oferecidos. Além dos treinamentos técnicos a empresa desenvolve seus colaboradores através de treinamentos sistemáticos voltados ao desenvolvimento das competências comportamentais. “A BSBIOS procura alinhar a qualificação de seus colaboradores com as estratégias do negócio” explica. O projeto Trainee também foi adotado pela empresa nesse ano e a primeira seleção esta em andamento nesse mês de agosto. Segundo Erasmo Battistella, foi recebido o Prêmio Top Ser Humano, em outubro de 2012, a BSBIOS foi agraciada com o prêmio Top Ser Humano promovido pela Associação Brasileira de Recursos Humanos, seccional Rio Grande do Sul (ABRH-RS), com case“A Implantação do Plano de Carreira com Foco em Competências”.

“O biodiesel é um combustível menos poluente que os de origem fóssil (petróleo e derivados), produzido a partir de fontes renováveis, como óleos vegetais e gorduras animais. O biodiesel pode substituir total ou em partes o óleo diesel mineral em motores ciclo diesel automotivo (caminhões, tratores, caminhonetes, automóveis) ou estacionários (geradores de eletricidade, calor). Ao substituir o óleo diesel parcialmente, o biodiesel é empregado como combustível complementar, que ajuda a reduzir as emissões de gases poluentes” A mistura dos dois combustíveis é conhecida pela letra B seguida pelo número correspondente ao percentual de biodiesel adicionado. Por exemplo, uma mistura com 5% de biodiesel é chamada de B5, e assim sucessivamente, até o biodiesel puro, denominado B100. Segundo ele o biodiesel é um lubrificante muito melhor do que o diesel de petróleo, pois tem mais viscosidade e desgasta menos o motor. Ele também tem um índice de cetano mais alto o que significa que é um melhor combustível dando aos motores mais torque. “A produção do biodiesel se dá por meio de uma reação química denominada transesterificação de triglicerídeos com álcool metanol ou etanol. A glicerina é um subproduto do processo” comenta.

Transesterificação

Battistella explica que nesse processo o óleo vegetal é neutralizado ou pré-tratado e, posteriormente, irá reagir na transesterificação, juntamente com o metanol e o metilato de sódio. A glicerina formada na reação é separada por decantação e purificada para retirar traços de metanol e umidade. Depois de separado do glicerol ou glicerina, o biodiesel é purificado. Finalmente o biodiesel é filtrado e está pronto para o uso, tanto puro como misturado ao

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DESTAQUE EMPRESAS óleo diesel, sem necessidade de modificações no motor do veículo ou equipamento. Todo o processo de fabricação leva cerca de 15 horas. “A BSBIOS utiliza tecnologia americana da Crown Iron Company para a produção do biodiesel, o que garante atender as especificações tanto nacionais quanto internacionais (ANP, ASTM D 6751-06 e EM 14214). Além de produzir um biodiesel diferenciado, com alto padrão de qualidade, essa tecnologia também garante aos subprodutos esse mesmo padrão”.

Sustentabilidade e Responsabilidade “Nosso negócio em si gira em torno da sustentabilidade. Além de produzirmos um combustível que evita a emissão em 57% de gases de efeito estufa na atmosfera, conforme estudos da FGV (Fundação Getúlio Vargas) e da Fipe e, com isso, gera redução de 11 mil internações hospitalares e 1,8 mil mortes por problemas respiratórios, também transformamos o sebo bovino – um antigo passivo ambiental – em matéria prima (unidade Marialva) e ainda reaproveitamos ao máximo o que podemos dentro de nosso processo industrial. Realizamos, por exemplo, na unidade de Marialva o plantio de árvores em nosso próprio terreno, e fazemos a irrigação por meio de um sistema que utiliza água do próprio processo industrial, após tratamento. Temos também lagoas específicas para o tratamento físicoquímico e biológico dos resíduos gerados na indústria e uma equipe destinada para acompanhar os tratamentos de efluentes”, explica Battistella. Segundo ele os resíduos Aromáticos e Halogenados do Laboratório de Passo Fundo, são doados à empresa Recycling – Reciclagem Industrial Ltda, localizada em Caxias do Sul/RS, para recuperação de solvente.

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Reaproveitamento de madeira da indústria moveleira na geração de vapor. Com a produção do biocombustível além de se gerar energia limpa e renovável, também gera alimento e agrega valor na pauta de exportações de produtos industrializados. “A cadeia do biodiesel é ampla, pois resultante do processo de esmagamento das oleaginosas também produzimos farelo, que é matéria prima para fabricação de ração animal de bovinos, aves, suínos. Assim, o segmento também contribui para a produção de proteína animal, o que possibilita exportar produto pronto e, não somente matéria prima aumentando emprego e renda em todo

Erasmo Carlos Battistella, presidente da BSBIOS

o Brasil”. Além disso, do ponto de vista social, a BSBIOS apoia financeiramente entidades que auxiliam a crianças, jovens e adultos. (APAE, Projeto Transformação em Arte, Lar Emiliano Lopes, Lar da Criança de Marialva, Instituto Vicentino do Brasil e Projeto Som da Banda).

BSBIOS e produtores rurais A BSBIOS é detentora do Selo Combustível Social e adquire no mínimo 35% de toda sua matéria prima de agricultura familiar por meio de cooperativas que possuem a DAP Jurídica, que é o instrumento que identifica as formas associativas dos agricultores familiares organizadas em pessoas jurídicas devidamente formalizadas. Segundo dados publicados recentemente pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), a agricultura familiar faturou R$ 2 bilhões com a venda de matéria prima para a produção de biodiesel em 2012. A Região Sul é a área com mais participação da agricultura familiar, representando 35% de toda capacidade nacional. Em seguida, estão as regiões Nordeste e Sudeste, com 30%, seguida por Centro-Oeste e Norte, com 15%. A soja e a canola estão entre as culturas mais adquiridas. Segundo Battistella, a BSBIOS fomenta a cultura da canola e garante a compra da produção a preço semelhante ao de soja.

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CT& Bio

Entender Darwin ou perseguir miragens

GILBERTO R. CUNHA Pesquisador do Laboratório de Meteorologia Aplicada à Agricultura - Embrapa Trigo

O

u entendem Darwin e as implicações da seleção natural na evolução das espécies ou os biólogos moleculares, especialmente no que tange à inovação tecnológica em agricultura, continuarão a gastar recursos perseguindo miragens. Essa é a opinião do professor R. Ford Denison, da Universidade de Minnesota/EUA, em exaustiva análise sobre a complexidade das trocas, as limitações e as possíveis oportunidades de exploração, via avanços tecnológicos nos sistemas cultivados, em que, perceptivelmente ou não, se sobressai uma “agricultura darwiniana”. Uma questão científica relevante em agricultura é como aperfeiçoar a exploração dos recursos do ambiente. Mais especificamente, como manejar a competição de plantas, tanto individual quanto coletivamente. No caso dos cultivos destinados à produção de grãos, quem sabe se mostre mais interessante, por exemplo, a produção total de grãos por unidade de área que por cultura isolada. Em termos sistêmicos, pode-se buscar, via adequação de ciclos, mais cultivos por ano, embora se saiba que cultivos de menor ciclo, em geral, são menos produtivos. Esse é um dos tantos tipos de troca que, em nome do todo, pode ser mais vantajoso abrir mão de parte do potencial de rendimento num programa de melhoramento genético vegetal. É importante o entendimento dos fatores que limitam o rendimento dos cultivos para que sejam feitas intervenções com base científica, mais que tentativas e erros. No caso da soja, por exemplo, sabe-se que, mesmo havendo a fixação biológica de nitrogênio atmosférico, o rendimento dessa oleaginosa é limitado pela disponibilidade desse nutriente (especificamente no caso de rendimentos elevados). Uma estratégia para elevação do potencial de rendimento da soja poderia ser baixar o teor de proteína dos grãos. Uma questão de escolha, em que, tomando-se o caminho inverso da evolução, que, via seleção natural, favoreceu a competição individual, priorizando rendimento de sementes e conteúdo de proteína, busca-se favorecer a comunidade. Mesmo que muitas intervenções e prioridades dos programas de melhoramento genético de plantas cultivadas sejam marcadas pelo caráter de efemeridade, não deixam de ser relevantes. É o caso típico da resistência a insetos-pragas e organismos causadores de doenças (fungos, nematóides, bactérias e vírus, por exemplo), cuja seleção natural desses organismos e o surgimento de novas raças, numa espécie de luta darwiniana, exige ganhos acelerados de rendimento para compensar a evo-

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lução de pragas e patógenos. A elevação do potencial de rendimento dos cultivos agrícolas requer mudanças em processos fisiológicos básicos. A questão de resistência a herbicidas e a insetos-pragas, os grandes marcos de inovação tecnológica em agricultura, obtidos via técnicas de transformação genética, mesmo sendo impossível ignorar os seus méritos em possibilitar ganhos de rendimento e/ou redução de custos nas lavouras, podem ser vantajosos apenas temporariamente, até que as plantas daninhas (tome-se como exemplo a buva) e os insetos, darwinianamente, evoluam em resistência. O professor Denison considera uma fantasia dos biólogos moleculares, por exemplo, a proposta de melhoria de eficiência da enzima rubisco pela redução da fotorrespiração; caso típico das chamadas plantas C3, cujo exemplo bem conhecido é a soja. Os defensores dessa ideia valem-se da maior especificidade da rubisco por CO2 (relativo ao O2) em algas, comparativamente às plantas terrestres. Segundo ele, via seleção natural, no caso das espécies terrestres, houve compensação entre especificidade da rubisco por CO2 e a taxa de reação. Portanto, não sendo esperável qualquer ganho em produtividade (pelo menos significativos) a partir dessa estratégia de transformação genética. O argumento da perenização dos cultivos anuais como caminho para a elevação de rendimento também tem que ser visto com reservas. Mais que o total de biomassa, no caso de espécies destinadas à produção de grãos, interessa a partição dos assimilados. Evolutivamente, as espécies perenes alocaram menos recursos para as estruturas reprodutivas que as anuais. Isso significa que há espaço para melhoria nesse quesito nas espécies perenes, mas não se pode criar expectativas exageradas com a perenização de espécies anuais como o trigo e outros cereais, por exemplo. Entender Darwin, pelo que parece, é requisito para a entrada da ciência, sem expectativas fantasiosas, na era da engenharia genética e da biologia sintética. É inconcebível que, por um lado, não ignoramos a importância da química e da microbiologia em aplicações relacionadas com a ciência do solo, enquanto, por outro lado, deixamos de considerar a teoria da evolução, Darwin por suposto, em melhoramento genético.


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