DIGESTO ECONÔMICO, número 169, janeiro e fevereiro 1963

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DIGE STO ECONOMICO

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A Imbocllldodo dos "Slogans'

Nolos sôbro ns Roformas Polillco-Elollorais — Miguel Reale

Influôncla da Inilação nos Conlralos — Orlando Gomes

Maior oi Magisira

Oscar Dias CoiTÔa Roberto Campos

Borbosa Lima o sous Idoals Republicanos — Ivan Lins

O Eaiado o a Emprôsa — Tliemístocles Brandão Cavalcanti Carlos Medeiros Silva

A Nova Discriminação do Rondas

As Cravos Docopçoos Comunlsias — EugCnio Gudin

Lol o DIroilo na Coxicopção do Farias Brito — Miguel Reale*

Primado do Direito — Dario do Almeida Magalhães

Controlo do Proços — Maurício Joi^pcrt da Silva

Socialismo o Socialização cm fac© da Encícllca Mater et Magistra —- c«..ea José Pedro

Roberto de 01iveii'a Campos A Situação Real do Brasil

Aspectos do Comércio Extorior do Brasil — Jocão Paulo Arruda

Examo do Consclôncia — Carlos Pinto Alves

Ensino Rural om Minas — Milton Campos

0 DIGESTO ECONÔMICO

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O Digesto Econômico

publicará no próximo número:

CORPORATIVISMO

Galvão de Souza

José Pedro

ORAÇÃO DE PÁRÁNINFO

Oração do Presidente du Associação Comercial de São Patdo, quando parotünfou as turmas de: Carência de Promoção de Vendas; Técnico de Ciiefia c Liderança; Técnico de Treinamento de V.cndedorcs; Psicologia de Vendas c Pesquisa de Mercado — ctirsos ministrados pela Escola Superior de Vendas da Associação dos Diretores de Vendas do Brasil, cm 5-12-62

yiil-HA tradição indica a missão do paraninfo, cm solcnidades, como esta, dc conclusão de cursos. Tem sido, no tempo, aquela de dizer aos jovens, (luc SC formam, numa síntese, o que precisam fazer, como devem enfren tar o mundo, e.scudados cm seus diplo mas, baseados nac|utlo que aprendelam. Rcpetcm-sc, assim, os conselhos, quase sempre dc um mestre j<á idoso aos seus discípulos. A todos excedeu o íírande Ruy, na sua famosa “Oração aos Moços”.

A nossa situação não é bem a mesnia, embora mc tenhais convidado pa ra vosso paraninfo.

I-Iojc, é o presidente da Associação Comercial dc São Paulo o cscolliido para patrono dc seus colegas mens de empresa como êle — que se aperfeiçoam nos vários cursos organi zados pela “Escola Superior de Ven das” da Associação dos Diretores de Vendas do Brasil.

Associação de Diretores de Vendas do Brasil, num momento de tanta so lenidade e dc tamanha importância pa ra os que hoje concluem seus cursos, o pensamento do paraninfo se volve de forma quase inevitável, para a fun ção dos homens dc empresa no mun do moderno.

Mas, como “homem de empresa”, cabe-mc, pela vossa vontade, uma ta refa difícil.

Falando a membros desta notável ho-

Duros, pragmáticos, objetivos, não fomos feitos para considerações teó ricas sôbrc temas especulativos da in teligência. dificuldade, entretanto, não advem da minha posição neste momento em que vos falo. O paradoxo decorre da situação histórica na qual estamos imersos. Quando as coisas co meçam a funcionar mal, não há outro remédio senão recuar para o campo da especulação teórica e praticar o que, vulgarmente, chamamos de “ pau sa para meditação”.

Sou devedor desta grande honra, que me concedestes, e que me confor ta, trazendo-me já, alguns meses ape nas no exercício daquele cargo, recom pensa inestimável, por Conter vosso es pontâneo gesto a crença de estar nêle acertando, e novo alento, para pros seguir na batalha, que venho travan do, cm prol da livre empresa.

Poderiam objetar-mc, com alguma razão, que homens de empresa, como qualquer especialista de qualquer ra mo de atividade, não podem desligarse da engrenagem social, onde repre sentam o seu papel, para fazer dela um campo de observação e análise teórica. Acontece, porém, que, antes de ser especialistas, engajados em afa zeres determinados, os homens são in-

cógnitas estranhas, meros feixes de possibilidades de ação, projetos daqui lo que irão ser na vida prática. Ao realizar decisivamente uma for ma de existência, optativamente esco lhida, nós, empresários, passamos, ge ralmente, a identificar-nos com a fun ção exercida e esquecemos, muitas ve zes, a fonte autêntica de nossa inspi ração — a incorruptível liberdade hu mana. Somos livres, mesmo sem o querer. Somos irremediavelmente li vres. E é nos momentos de perturba ção da máquina social, onde agem co mo peças das mais variadas funções, que os homens, quaisquer que sejam suas configurações sociais, são obriga toriamente levados àquela pausa. Es ta é uma hora de volta a nós mesmos, à nossa condição, não qualificada, de seres livres, para exame dos caminhos de nossa “alteracion”, na expres são de Ortega, caminhos" hoje gravemente pertur bados pelos tremendos desafios históricos com que nos defrontamos.

M ^ O' - C

Devemos, como homens, colocar em análise e julgamento esta nossa con dição contingente de “homens de em presa”. Como um engenheiro que ana lisa o comportamento de uma peça, na máquina por êle montada, nós nos devemos contemplar, objetivados em nossas atividades empresariais.

O empresário, concebido em termos modernos, surgiu como um ríspido ge neral, no Campo de ação econômica, há menos de dois séculos. A história fôra criando condições para o seu aparecimento, através de longo pro cesso.

presença. O cenário estava pronto pa ra um novo ator e êle emergiu da pró pria coerência do drama in.erminávcl. Seus dias de glória foram cantados pelo seu maior adversário. Karl Marx, Manifesto Comunista”, celebra, cm verdade, a titânica ação do ho mem dc empresa, atribuindo-a à classe burguesa que, para ele, se encaminha va para a destruição. “A burguesia, afirmou Marx, após o seu advento de apenas um século, criou forças pro dutivas mais variadas e colossais que no

aO

tôdas as gerações passadas, tomadas em conjunto. A subjugação das forças naturais, as máquinas, a aplicação da química à indústria e à agricultura, a navegação a vapor, as ferrovias, os tearroteamento de légrafos elétricos, o continentes inteiros, a canalização de nascimento de po- nos, o pulaçõcs surgidas da ter ra como por encanto, tu do isso é obra da burgueQue século anterior sia.

suspeitaria que forças se melhantes dormissem no r seio do trabalho social?”

Esta visão sobre as conquistas hu manas, em 1848, parece primitiva e inface do que, hoje, assomOs mentores genua em brados, contemplamos, do processo, porém, não foram simples representante.s de uma classe, mas, sim, homens que escolheram um pro jeto existencial, realizando, na históniodêlo de uma das possibilidaempresário”. Os Estados Unidos, por exemplo, longe de coiistituircm uma sociedade egressa do feudalismo, para novas relações de produção, lideradas por revelam o consenso de todo um povo, altamente individualista, à liderança na, o des humanas, a do uma classe,

dessa configuração humana, no plano sócio-político-cconômico. Para bem ou para mal. a comunidade americana é a da livre associação empresarial.

Longe dc resultar dc uma evolução detcrminística da história, o mundo americano se oferece como um mode lo de conviveuda que pode ser imita do ou repelido, como o demonstram os [)ovos da cortina dc ferro- O que é certo, porém, é que o “ homem de em presa”, com tôdas as suas graves li mitações, conseguiu o fascínio neces sário para seduzir algumas gerações que o consagraram como modelo ideal, não só nos Estados Unidos, como em muitas regiões do mundo ocidental. A organização cia economia do Ocidente, está, ainda, cm grande i>artc, sob sua direção c guarda. figura do empre sário, entretanto, foi repelida em ou tras regiões da terra, muito embora seus métodos sejam imitados por to dos os povos em vias dc industrializa ção.

Plasmado pda sua indomável vonta de dc poder, transferida para o plano econômico, o empresário, sob cuja ás pera sombra cre.sceram e se afirmaram livremente grupos humanos dos mais diversificados interesses, é, no presen te, levado, por contingências históricas não previstas por Marx, a enquadrar todo o esforço ocidental, em defesa (Ic uma expressão cultural riquíssima, que tem sua vida e raiz na liberdade pessoal dos indivíduos nascidos à sua luz.

Está o homem de empresa em con dições de assumir o seu novo papel? Aqui se impõe a tomada de consciên cia que se tem de exigir, principalmen te, daqueles, cuja sobrevivência impor ta na condição de possibilidade da pre-

servação de tôda a estrutura social do Ocidente.

Em profecia genial, Tocqueville, há mais de um século, antevia o choque de dois tipos culturais de sociedade, capitaneados pelos povos americanos c russo. O americano conservou-se tal qual era; o russo viu evoluir o proces so de sua civilização por caminhos doutrinários compatíveis com os de sua formação histórica, conservando, cm essência, mesmo depois da revolu ção comunista, tudo quanto Tocquevil le apontava como característico da Co munidade eslava. “Existem hoje sobre a terra, dizia o autor de “A Democra cia na América”, dois grandes povos <iuc, tendo partido de pontos diferen tes, parecem adiantar-se para o mes mo fim: são os anglo-americanos e os russos. .Ambos cresceram na obscuri dade; c, enquanto os olhares dos ho mens estavam ocupados noutras par tes, colocaram-se, de improviso, na primeira fila entre as nações e o mun do se deu conta, quase ao mesmo tem po, do seu nascimento e da sua gran deza... Apenas êles marcham a passo fácil e rápido, numa carreira cujos li mites o olhar não podería perceber ainda... Para atingir sua meta, o pri meiro apóia-se no interesse pessoal e deixa agir, sem dirigi-las, a fôrça e a razão dos indivíduos-

O segundo concentra num homem, de certa forma, todo o poder da socie dade. Um tem por principal meio de ação a liberdade: o outro, a servidão. O seu ponto de partida é diferente, os seu.s camtnho-s sãn diversos; não obs tante, cada um deles parece convoca do, por um desígnio secreto da provi dência, a de‘er nas mãos, um dia, os destinos da metade do mundo”..

Os Estados Unidos representam ho-

je, o Ocidente; a Rússia, o Oriente. Os dois povos, realmente, se oferecem como modelo para formação do mun do, palpitante, ainda, no seio imprevi sível do futuro. O campeão que assu mir a hegemonia universal traçará ro teiros para os homens de amanhã.

Mas, haverá, no amanhã, lugar re conhecível para os empresários? Se quisermos preservar o que aprende mos a amar, apaixonadamente, em nossa convivência, genèricamente oci dental e especificamente brasileira, é preciso que a resposta seja afirmativa.

0 tempo heróico do empresário foí, evidentemente, ultrapassado. Já não é necessária a súbita iluminação criado ra que caracterizava o empreendedor, lampejo de gênio que o tornava seme lhante ao general antigo, de cuja in tuição, imediata e insubstituível, de pendia a sorte das batalhas-

Todos os planos da aplicação da in teligência estendem-se, hoje, diante de nós, domesticados por métodos cien tíficos, submissos a cálculos integra dores de suas múltiplas variáveis. O empresário despe sua indumentária de aventureiro da economia para assumir funções definidas, dentro do enquadra mento empresarial. Esta, porém, é sua hora decisiva. Só quando entra em ocaso o fascínio matinal das grandes aventuras, é que se pode reconhecer se uBi modelo de comportamento hu mano surgiu para durar no tempo ou se é o fogo-fátuo brilhante, de rápido momento histórico.

Cabe aos homens de emprêsa de monstrar a necessidade da revalidação do seu passaporte para o futuro. De-

pende de nós tornar evidente qiic a de fatores de produção conjugaçao

deve continuar afeta a homens capade imaginar, como poetas da eco nomia, a melhor forma de coiijugalos. Ninguém negará a importância dos maestros, na execução de grandes sinfonias. Se não c mais o improviso genial que deve caracterizar os capi tães de indústria, nem por perserverante, seu sentido dc na eszes

ISSO sua presença responsabilidade, sua segurança colha de uma equipe de traliulho, sua firmeza na direção geral, é menos in dispensável à livre produção diversifi cada, necessária a sobrevivência das sociedades ocidentais, compHcadameninfinita com- te estruturadas cm sua

plexidade. A economia política do Oci dente não pode prescindir da fig humana do homem dc empresa.

. Há, todavia, um conceito, que deve o espírito do ura penetrar, intimamente,

empresário moderno — o da função social da propriedade c do capital. O período brilhante da improvisação em presarial teve o seu simbólico cnccrsolcne declaração de Hcn- ramento na ry Ford: "Uma indústria só c justifi cada quando serve, quando devolve à coletividade mais do que lhe toma c se uma emprêsa não é um benefício tem o direito de todos, não para existir”.

Tremenda responsabilidade do em presário é a de demonstrar que a pro dução, livremente conduzida, é capaz do que nenhuma outra instituiplano econômico, dc criar consociedade amplie mais çao, no dições para que a cada vez mais as possibilidades de tô das as expressões pessoais de liberda de compatíveis com a dignidade de uma convivência humana, onde mur chem e pereçam todas as formas

odiosas (Ic privilégio. A riqueza con seguida através de uma atividade <iuc seja um "benefício para todos” não é um privilégio, é uma conquista legí tima. O uso (pic SC faz da riqueza, to<lavia, define uma personalidade. Há formas ricas de grandeza humana, na vida de liomcns cconômicamcnte po derosos, e formas miseráveis de mesquinhes. nesse sentido que se defi ne um grande escritor c poeta: “Há ri cos e há pobres, diz êle, os pobres que se fazem ricos exibem uma pobreza luxuosa”. O empresário não tem o di reito de exibir uma pobreza luxuosa; não tem direito à indigéncia moral- A função social da propriedade é um va lor que não se pode apagar da cons ciência da([ucles a quem cabe, hoje, em primeira linha, lutar pela sobrevi vência de uma estrutura social onde a liberdade de produzir condiciona e sus tenta a possibilidade de tôdas as de mais expressões da liberdade pessoal, fundamento dinâmico da cultura do Ocidente.

O empresário incapaz de sentir a responsabilidade de sua função, inapto para assumir seu verdadeiro papel no drama histórico a que assistimos, está traindo o destino do Ocidente. Quando se desfigura, deliberadamente, a ima gem da livre emprêsa, principalmente, em países, Como o nosso, que come çam, apenas, a dinamizar sua econo mia, cabe ao empresário, como um problema operacional do momento, restaurar, na consciência do povo, a

dignidade dessa imagem, alertando-o para os perigos dissimulados nas pro messas enganosas dos que pregam a abolição da emprêsa privada. E como SC complicam as atividades empresa riais, em decorrência dessa premissa de vida ou de morte!

Tudo se torna mais difícil, quer no plano das relações públicas das em presas com a sociedade, quer no das relações humanas, no seio da própria emprêsa. Se o empresário, entretanto, não soulier enfrentar e superar essa nova serie de dificuldades, inevitàvelmente presentes, na hora grave em que vivemos, não será um homem de emprêsa e, como tal, não terá o direi to de existir.

É esta, senhores, a tentativa de aná lise, de um realismo sem transigência, que tentei fazer de um modelo de ati vidade humana, o qual eu mesmo pro curo imitar em minha existência. Não nos esqueçamos, porém, jamais, que ser homem é mais do que ser apenas “homem de emprêsa”. Com todo o mérito que possa ter a função empre sarial, nc"hum de nós a desempenha rá com o desprendimento que a digni fica. se a não mantiver submissa à dis ciplina de uma consciência ética su perior. A imagem do Criador, estam pada em nossa face, não me pode per der na preocupação exclusiva de con jugar fatores de produção ou de acumular um patrimônio de bens ma teriais que, mais cedo ou mais tarde, o sopro do tempo esboroa e dispersa.

REFLEXÕES INCERTAS

(Faleslra realizada na Confederação Nacioiud do C(nnércio)

Eugênio Gtoin

Oonfesso desta vez o meu ^ trangimento em falar diante de vós; o próprio título de minha palesREFLEXÕES INCERTAS”, constra, . denota o quanto estou pouco seguro do que vou dizer.

Pensei entretanto que sendo esta a última reunião do ano, talvez fosse interessante enceiTar êste ciclo de agradável convivência que aqui ti vemos durante dez meses, fazendo uma espécie de introspecção, para vermos um pouco... donde viemos, onde estamos, e para onde vamos..., tanto do ponto de vista político, como do social e econômico.

U

Não me proponho a doutrinar; ao contrário, o que vou dizer destina-se, simplesmente, a estimular o pensa mento dos outros. Seria como que uma -tentativa de proceder a um diagnóstico de nosso tempo”. Se o assunto fôsse de música, eu diría que ia tentar variações sôbre um tema.

Talvez seja interessante começar esta introspecção por uma “visada a ré”, sôbre o mundo üe ontem. 0 sé culo dezenove, de 1815 a 1914, foi para o mundo um longo período de paz. A não ser a Guerra da Criméia e as rápidas guerras de Bismark contra a Áustria, a Dinamarca e a França, o século foi de paz até 1914. De então para cá trouxe-nos o Sé culo XX duas grandes guerras, en tremeadas da maior depressão econô mica do mundo moderno, que domi nou todo 0 decênio dos 1930. Êsses

acontecimento.s tiveram sôbre a hu manidade o impacto de uma grande desolação e de um grande desen canto.

Jules Romains escreveu uma peça intitulada “Grâce pour la terre”, a cuja interpretação pelo ator .Jouvet, tive a felicidade de assistir, aqui no Rio de Janeiro. A reiiresentação não fora permitida em França, se receava ela pudesse exercer sôbre o povo francês durante a Guerra. porque 0 efeito depressivo que

No primeiro ato, Deus aparece sob forma humana com seus ministros tratam de “Vossa Eternidade”. que 0 0 Primeiro Ministro faz uma exposi

ção sôbre a situação da Terra, mencionar a Terra, Deus não se re cordava, a princípio, dêsse astro. Mas depois rememorava e dizia; Ah, sim, a Terra, um pequeno planeta do sis tema solar. Então o Primeiro Minis tro desenvolve considerações para ex plicar a Deus o estado de desespero dos homens que habitam o planeta. Deus então pergunta porque, e o Mi nistro tem dificuldade em explicar as verdadeiras razões dêsse desespêaté ameaça antecipar a data Deus resolve.

Ao ro que do julgamento final,

então, mandar um emissário à Ten-a, São Patrício, para informá-lo da si¬ tuação.

No segundo ato, São Patrício vem à Terra, sob a aparência de um Lor-de Escocês, e procura um homem médio, um homem comum, um senhor Mar-

tin, para indajíar da origem das quei xas dos homens.

mas plicação plausível dos motivos de desespero.

Martin ei‘a um homem que conse guira um certo sucesso na vida, estava aflito porque uma das suas ambições, que era a construção de uma bela casa, estava encontrando grandes dificuldades por parte do construtor, que declarava não poder continuar a obra em virtude da des valorização monetária. Traça então um quadro da inflação que tanto tem afligido a Humanidade neste século.

Por outro lado, enquanto se cons truía a obra, aparecera um Coronel das Forças Armadas advertindo que o local, no alto de uma colina, era impróprio, por constituir alvo fácil para os aviões inimigos. Nessa altura há um diálogo interessante entre Martin e a França, cuja estátua, na praça frontei ra, tinha se movimentado por ordem de São Patrício.

Martin queixava-se de que por duas vêzes a França lhe entrara em casa pe dindo os seus recursos e a vida de seus filhos para sua defesa. Afinal, inquiri do por São Patrício, Mar tin diz que o mal é que os homens foram longo demais, deve ríam retroceder.

Mas, São Patrício fica na dúvida de voltar a Deus com tal conclusão e resolve mandar buscar no Céu os avós do senhor Martin. Com o con fronto entre o senhor Martin e seus avós, verifica São Patrício que os males da Terra não se originavam do avanço excessivo dos homens.

No terceiro ato, vem, Deus êle pró prio à Terra, mas, igualmente não consegue obter dos homens uma ex¬

Quando acabava a segunda grande guerra, o mundo civilizado ainda tava sob a obsessão do espectro da depressão econômica. A “Ttoria Geral do Emprego”, o grande livro de Keynes publicado em 1936, poderia ter sido intitulado “Teoria Geral da Depressão". A crença era de que a depressão ia i’ontinuar nos Es tados Unidos. Na Assembléia de Bretton-Woods, a que assistí, a dele gação inglesa tinha tanta certeza de que haveria nova depressão nos Es tados Unidos, que fêz inserir nos Estatutos do Fundo Monetário Inter nacional o seguinte parágrafo: “...0 Fundo não se oporá à alteração da taxa cambial que fôr fei ta para atender a condi ções domésticas, sociais ou políticas do país mem bro”. Era a porta aberta para que a Inglaterra, ou outros países, pudessem defender-se contra a pro pagação da depressão americana.

Os fatos porém desmen tiram, intogralmente, essa previsão. 0 que se deu foi exata mente 0 contrário. 0 após-guer*ra deu lugar a uma inflação aberta, re sultante da “inflação reprimida” du rante a guerra.

Em termos reais, a Europa não conseguira refazer-se materialmente; havia grande escassez de produção; a guerra destruira o equipamento produtor existente. De Gaulle dizia: “Não posso governai' porque não te nho comunicações; a rede feiTOviária não funciona; o telégrafo também seu es-

não”. A situação da InglateiTa e da Alemanha era a de casa arrasada. A Europa estava à beira do caos.

Conta então Winslon Churchill que, certa manhã, ao fazer a barba, com 0 rádio ligado, ouviu o General Mar shall falar no plano que tomaria o seu nome, e que veio salvar a Euro pa do caos.

A recuperação da Europa com o auxilio do Plano Marshall foi ex traordinária. Menos pelo Plano em si do que pelo fato de que da grande destiniição salvara-se o EUROPEU. O valor de uma nação é o de seus quadi*os humanos.

Diante da rápida "ecuperação ame ricana foi-se criando a convicção de que os Estados Unidos tinham um grau de produtividade inatingível pe la Europa. Daí a idéia da escassez de dólares que dominou o ambiente econômico da civilização ocidental durante, talve., oito anos, ou seja de 1947 a 1955. Muitos economistas, até do tope de Sir Dennis Robertson, acreditavam nisso, Essa escassez de dólares era uma ilusão do mesmo gênero da que a CEPAL andou pro pagando na América Latina, ao atri buir aqui a inflação a um fenômeno estrutural.

Na realidade, a escassez de dólares era resultado de dois fatores: Infla ção e falta de produção na Europa. O desequilíbiio não consistia em es cassez de dólares senão em superabundância das outras moedas. À medida que na Europa, a partir de 1953, a inflação era dominada e a produção acrescida, foi desaparecen do 0 desequilíbrio monetário e a si tuação quase que se inverteu. Em vez de escassez de dólares, manifes tou-se progressivamente a escassez

de marcos e de florins e os Estados Unidos eram (e aindu são agoi*a) obrigados a lançar mão de seu es toque ouro para cobrir o déficit de seu balanço de pagamentos.

A angústia de que sofre a Europa e põe em perigo a paz do mundo é mais uma vez o perigo da guerra. Mais uma vez na História, o rio Elba separa, como no tempo dos romanos, a civilização ocidental da barbárie.

A angústia do mundo de hoje vem da extrema gravidade uas conseqüências de uma possível 111.a Guerra Mundial. A recuperação que se veri ficou depois da Segunda muito mais rápida c eficiente aliás do que fôra depois da primeira, impossível depois da Terceira, que 0 planeta ficaria quase tável em grandes extensões por mo tivo dos efeitos secundários das ex plosões atômicas. Podería não ser um fim de mundo, nias seria o fim de uma civilização, que teria assim, durado 6 a 8 mil anos. “Sic transit Gloria mundi... nomo alemão, perguntado recente mente sôbre a possibilidade de comuentendimento com outras outros astros, resGuerra, seria poi— inabiUm ilustre astrô-

nicaçao © civilizaçõqs em

pondeu que isso nada tinha de im possível, mas que a dificuldade era duração das civili/.ações parece do alguns poucos milhares de anos enquanto a duração dos astros é do bilhões,de ano.-s. Donde a pouca probabilidade de coincidência das ci vilizações...

Perdoem-me essas digressões que me desviaram do terna.! Vamos voltar à realidade mais próxima e cuidar do planeta terra, da Civilização atual e, dentro desta, do caso específico do nosso Brasil, que está muito precisaque a ser

do de nossa atenção e do nosso esfôrço.

Vamos procurar iixaminar perfunctòriamentc o caso brasileiro sob seus três aspectos — o econômico, o so cial e o político.

Do ponto de vista ECONÔMICO, pode-se dizer que nada explica as dificuldades e angústias da hora pre sente no Drasil, a não ser as que foram criadas pela incapacidade dos governantes.

Pode-se dizer quo três foram os acontecimentos econômicos marcan tes do após-guerra, no Brasil:

a) a recuperação Jos preços do ca fé, desde sua dírrocada de 1930, acentuando-se a alta a partir de 1949;

b) o fato, pouco perceptível talmais de importância histó rica, de estarmos atingindo uma dimensão de mercado interno estimulante do desenvolvimento ve:’ econômico;

c) uma desenfreada inflação.

Quanto ao café, ao invés de asseposição favorável e gurarmos uma duradoura de preços, que o mercado internacional elevara desde 1949 até 1953, entendemos de promover a alta espetacular dêsses preços, o que deu lugar a sua derrocaua e afinal à li\ mitação de nossas exportações por ^fórça de convênios internacionais, que fomos forçados a aceitar senão a . promover.

Quanto ao segundo acontecimento econômico, o do desenvolvimento re sultante de estarmos atingindo uma dimensão adulta do mercado interno, a verdade é que aj)osar do naciona lismo acanhado e da oposição de in teresses radicados que procuram mo nopolizar os mercados, o grau de pro-

gresso tem sido muito favorável du rante 0 decênio.

Quanto ao terceiro ponto, não fos se a gi‘ave inflação, cuja intensida de e duração só se explica pela me diocridade das classes dirigentes do país, 0 menos que se pode dizer é que ela não só reduziu o ritmo do desenvolvimento econômico, corao te ve sérias repercussões de caráter so cial e político.

É porém sob o aspecto político que mais se faz sentir a nossa deficiên cia em quadros humanos para, de um lado criar um eleitorado esclarecido G de outro formar as elites capazes de governar o país.

Vivemoo desde o Império até o fim da Segunda Guerra Mundial sob re gimes que só ei'ani democráticos em nome. Com raras exceções, não havia eleições verdadeiras. O Império era uma imitação do regime parlamentar inglês; até com dois partidos com os mesmos nomes dos da Inglaterra: li beral e conservador. Não sendo porém um tal regime compatível com a pre cária educação política do país, era preciso introduzir algum corretivo para que êle pudesse funcionar, ao menos aparentemente. Êsse corretivo consistia no chamado “Poder Mode rador" do Imperador, segundo o qual, independentemente de novas eleições, Sua Majestade “aceitava a renúncia" de um ministério conservador, diga mos, e chamava um ministério libe ral, “o qual, já no poder", mandava proceder a eleições que, bem ou mal, confirmavam a mutação governa mental. Ao passo que na Inglaterra a queda de um governo importa em novas eleições “cujo resultado impõe a natureza e composição de novo go verno”. Diga-se porém que o Poder

Moderador era exeivido por um ho mem de altos predicados morais e grande patriotismo.

Na Primeira República também não havia eleições vei’dadeiras. Para mostrar o desinterêsse do povo pelas eleições forjadas, basta dizer que o Presidente Washington Luís foi elei to por setecentos mil votos apenas. Contava-me um deputado amigo, muito chegado ao Presidente Rodri gues Alves, que quanto este deixou o Govêrao de São Paulo para ser Presidente da República pela segunda vez, conversando com os amigos, di zia-lhes: “ficam vocês, agora, com a responsabilidade de dirigir a política de São Paulo, tarefa muito delicada, especialmente no que diz com a escolha do Presidente da República. Porque o Brasil não tem ainda edu cação política para poder suportar pacificamente a luta eleitoral entre candidatos”.

rior sem dúvida à que atualmente resulta das eleições verdadeiras. Mes mo de pequenos E.stados vinham freqüentemente homens de valor. O Rio Grande do Norte mandava Ama ro Cavalcanti, Augusto Severo, Pe reira Reis; a Paraíba Epitácio Pes soa; Pernambuco Anibal Freire; Santa Catarina Lauro Müller etc.

A Capital Federal, onde na realida de já havia contagem de votos, a eleição resultava quase invariavelmen te no domínio da mais reles politi cagem.

A vantagem do sittema estava em que não havendo eleições verdadei ras, não havia nece.ssidade de recor rer aos dois instrumentos que hoje prostituem as eleiçoe.s: a demagogia e a corrupção.

suas os esrep

Na realidade o govênio era exer cido durante a I República por um conjunto de oligarquias estaduais, com predominância das dos grandes Estados, São Paulo, Minas e Rio Grande do Sul. Na escolha dos representantes à Câmara e ao Sena do Federal, essas oligarquias haviam de atender às pressões dos che fes políticos locais (então chamados «coronéis”), mas, de outro lado, os partidos procuravam atrair para fileiras os novos valores que despon tavam no campo estadual. O regime era o de cooptação; chefes ou diretórios de partidos colhiam os novos elementos. E é pre ciso diíer que o faziam menos mal do que o que resultaiúa do voto po pular. A prova está na qualidade dos resentantes da Nação, muito supe¬

A autoridade quase incontrastada do Presidente da República permitia que um homem de valor na presidên cia pudesse realizar um gi’ande go verno, como foi 0 caso de Prudente, Campos Sales, Rodrigues Alves, Afonso Pena.

Não havia naquele tempo dados es tatísticos sôbi*e a Renda Nacional do País. Mas qualquer pessoa que tenha acompanhado o que foi a adminis tração pública do Brasil no docênio 1902-1912 terá a absoluta convicção que em nenhum outro período de sua história, se verificou um ritmo igual de desenvolvimento econômico: Es tradas de Ferro, Portos, Saneamento, Navegação Mercante. Esquadra etc. Só a supressão da febre amarela ao largo de todo o litoi’al brasileiro, in clusive na capital da República, re presentou, êsse sim (e não o do Sr. J. K.) um fato de importância com parável ao da Abertura de Portos por D. João VI.

O Sr. Getúlio Vargas que viera ao poder para restabelecer o império da Democracia, deu-nos uma ditadura de 15 anos, com três apenas de in terrupção.

Atravessada essa fase e votada a Constituição de 1946, passou a haver eleições verdadeiras no Brasil. O Ge neral Dutra manifestou uma certa

surpresa

do aumento pedido. Na Inglaterra, muitos de nós nos recordamos de dois casos (nos últimos oO anos) de mem bros do Governo, que não tendo guar dado absoluta discrição sobre as no vas disposições do Orçamento formu lado pelo Gabinete, ':iveram de aban donar a carreira política.

Tais são os padrões de educação política, em que a democracia pode funcionar satisfatoriamente.

disse que êlc fôra o primeiro pre sidente “eleito” no Brasil. Como de fato foi.

Temos pago, de então para cá, um elevadíssimo, se bem que ine-

quando cu, uma vez, lhe preço vitável, pela aprendizagem de De mocracia, forma de governo, com voto univer sal e secreto e a precaridade da educação política tom dado lugai as maiores vicissitudes. A disparidade entre essa

Assim como Toynbee observava fórmula da “reação propor(the greater the

Do ponto de vista social quais são as mais importantes caracterís ticas do nosso tempo e quais seus as pectos no Brasil?

1) Uma dessas características pa rece-me ser a do espírito de imediatismo. Duas guerras de âmbito mun dial e a maior Depressão Econômica dos tempos modernos abalaram a con fiança no futuro que caracterizava o fim do Século XIX (até 1914).

As novas gerações não confiam no futuro. No plano econômico, os repe tidos exemplos de instabilidade mo netária destroem o espírito de pou pança. ■ Economizar para gastar mais tarde ? Não, porque pode sobrevir que sua cional ao desafio challcnge, the greater the stimulus) de certos limi- só é apBcável dentro tes, assim também a disparidade en tre a forma política adotada para o governo de um povo e o grau de educação política dês.se povo não pode ser excessiva.

Na Suécia aprendi coisas como es sa: os juros e amortização das apó lices emitidas para execução de de terminada obra pública, serviço de águas por exemplo, são providos pela repartição encarregada de sua exeNa Holanda aprendi que ten- cuçao.

do os sindicatos operários solicitado aumento de salários, mas tendo os estudos procedidos pelos economistas do governo mostrado que se o au mento fôsse concedido, as exporta ções holandesas poderíam ser pre judicadas, os Sindicatos desistiram

a inflação ou outi-a guerra e dissipar tudo.

No plano político, se meia dúzia de bombas de hidrogênio podem sar a humanidade, porque sacrifi car-se hoje pelo incerto de amanhã?

Aliás, 0 advento da Previdência So cial generalizada transfere ao Es tado os encargos do espírito de vidência que incumbia ao indivíduo. 2) Outra característica parece-me ser a da erosão da autoridade pater na na formação das novas gerações Adquiriu foros de doutrina o princí pio de que a educação não deve i terferir ou prejudicar a formação da personalidade da criança ou do adoarraprein-

lescente. O princípio parece ter tido suas raízes nos E.U.A. e sofrido vá rias deformações e exageros em sua transplantação para outros povos. A idéia de que a criança é um pe queno animal bravio e destruidor que precisa ser domado pela educação e de que a vida na sociedade exige li mitações da liberdade do indivíduo para que se possa respeitar a liber dade dos demais, parece ter-sc torna do obsoleta,

Na medida em que a liberdade con ferida aos jovens não ultrapassou a que era necessária para contrabalan çar 0 excesso da autoridade ou seve ridade paterna do Século XIX, e’a foi um bem. Levada porém ao exa gero que se tem visto, ela é respon sável pelo grave problema da juven tude delinqüente, pelo afrouxamento dos laços familiares e pela desordem política que decorre da autoridade conferida à juventude, que passa a mandar antes de aprender e de es tudar.

3) Uma terceira característica pa rece-me ser a da mutuação do am biente tecnológico, assim designando 0 advento do cinema, do rádio, da te levisão, do avião, dando lugar ao que se tem chamado de efeito de demons tração, quer dizer a facilidade com que os habitantes áe países menos desenvolvidos temam conhecimento (cinema, rádio, televisão ou viagens de avião) dos modos superiores de

vida prevalescentes nos países mais ricos.

Daí resulta o sentimento da incon formidade, que leva ao descontenta mento e à revolta. Os anseios desper tados pela vista e o conhecimento dos padrões de vida alheios, crescem mais rapidamente do que a produção que tendería a atingi-los.

Não é difícil compreender os efei tos dessas caracterísricas sôbre a for mação de novas gerações e sôbre o desentendimento entre cada geração e a que lhe sucede.

No Brasil esses efeitos se têm feito sentir em tôda a sua plenitude, agra vados ainda: a) pela inflação que há mais de vinte anos agita, perverte e deteriora o ambiente social do país e que se traduz nas expressões imo rais de “golpe" e de “defesa”; b) pe lo fato daquelas mutações sociais co incidirem com a transformação do ambiente político resultante da expe riência, que se faz desde 1946 de um sistema efetivo de representação po pular, através de eleições verdadei ras por um eleitoraílo despreparado. Queiram os ilustres colegas relevar o desatavio dessas considerações, um tanto acacianas de um lado, incertas de outro. Elas só se justificam pela intenção que as ditou, a de estimular 0 vosso pensamento, neste marco de nossa evolução, para saber: Onde estamos? mos? E para onde va-

Á IMBECILIDADE DOS "SLOGANS //

HÁ dois ou três anos popularizouse no Brasil a “teoria tipográ fica do desenvolvimento econômico”. Confundia-se a criaç.ão de moeda com criação de riqueza, imaginava-se pos sível impulsionar o desenvolvimento econômico simplesmente imprimindo papel-moeda “para lins produtivos”. A teoria era gostosa demais. Aca bamos tendo mais inflação e menos desenvolvimento do que seria possí vel alcançar se fôsse menor a inge nuidade de nossos po'íticos.

Agora passamos à teoria “slogâmica

Cunha¬ do desenvolvimento. qualquer, preferi- slogan se um velmente de sabor popular, e alcan ça-se duplo sucesso: descobre-se a do subdesenvolvimento e arpopularidade política. Agofatos são teimosos, a causa ranja-se ra, como os Nação sofre... , ^ „

Um exemplo da teoria “slogamica nossa pobreza ao espoliativo” dos capitais Debaide se demonsoausada pelos ao remeterem é atribuir-se a “processo estrangeiros. trará que a capitais estrangeiros dividendos, juros e presenta meio por cento do produto nacional, ao passo que a atividade desses capitais gera direta ou indi retamente dez por cento da nossa produção anual. Debalde se dirá que do nosso dispêndio anual de divisas importação de bens de serviços

sangna royalties” recom a cêrea de trinta por cento estão sen do financiados por contribuições es trangeiras, sob a forma de emprés timos, “swaps” ou Investimentos, ao

passo qe as remessas feitas por êsses capitais não atingem senão 6 por cento do nosso dispêndio anual de divisas. Debalde... os partidá rios da teoria espoliativa já têm sua teoria e não querem ser incomodados pelos fatos. Mesmo quando êstes são próximos e gritantes. Por exem plo: o Estado de São Paulo, espolia do por enorme co.ncentração de ca pitais estrangeiros, deveria ser po bre: 0 Piauí, por êlt'5 intocado, deve ria ser rico. A Holanda tem absor vido vastas doses de capital estran geiro e prossegue cm rápido cresci mento; a Albânia r.ão os absorve, e continua miserável. Uma variante dessa teoria, muito em moda entre os nossos esquerdistas, é atribuir-se nosso subdesenvolvimento ao impe rialismo norte-americano. Mas o Bra.sil, ao longo de todo o século XIX, desenvolveu-se muito lentamen te (subdesenvolveu-se em termos re lativos), numa época em que os Es tados Unidos importavam, ao invés de exportar capitais. A Mongólia Exterior e o V^iet-Minh não recebem capitais americanos espoliativos e são paupéndmos, Canadá, Holanda e o Estado de São Paulo absorveram í^astos capitais ianques e se desen volvem aceleradamente. Imagino que se uma explosão atômica destruísse a bomba de sucção noi’te-americana, não ficaríamos por isso mais ricos. Apenas os nossos políticos de es querda teriam de encontrar um novo “slogan” para explicar o subdesen volvimento.

IOutro exemplo da teoria “slogâmica' é diier que a causa única do

subdesenvolvimento é o colonialismo. Mas então a Tailândia e a Abissínia, independentes há milhares de anos seriam mais ricas que a Nova Zelân dia e a Austrália, colônias até pou cos lustros atrás. Ê indiscutível que esforço de desenvolvimento requer tal mobilização passional de energias do povo que melhor se pode realizar num ambiente de independência que de servidão. É indiscutível, também, que o colonialismo envolve humilha ção e às vezes espoliação e cruel dade humana, e deve ser abolido da face da terra. Mas o seu desapa recimento, por si só, não eliminará 0 subdesenvolvimento, pois este tem causas mais complexas. Os indoné sios, por exemplo, imagina vam que, escorraçados os holandeses, ingressariam numa era de riqueza. Entre tanto, empobreceram...

Há quem pretenda que o processo democrático é in compatível com 0 rápido desenvol vimento econômico. Faz-se necessáo

ria a disciplina totalitária para re primir 0 -consumo e arregimentar mão-de-obra. Essa doutrina era pre gada pelos naiistas e hoje o é pelos comunistas. Mas o autoritarismo de direita deixou Portugal subdesenvol vido e a Argentina estagnou sob a ditadura peronista. A Itália progride hoje em regime democrático, em rit mo jamais alcançado na era facista. A Alemanha Oriental, sob um tota litarismo de esquerda, fica humilhan temente atrás da Alemanha DemoPolônia e lu- crática e capitahsta. goslávia, sujeitas litária de esquerda, vivem a solicitar à disciplina tota-

auxílio norte-ameriacno e têm um ritmo de desenvolvimento em nada superior ao do Japão, ao da Holanda e ao da Itália, países que operam em regimes capitalistas e democrá ticos. Donde, nem o socialismo nem o totalitarismo serem necessários para o desenvolvin-ento.

Outro “slogan” atraente é imagi nar que 0 desenvoI'Mmcnto econômi co é função dos recursos naturais. Porém a Noruega, o Japão e a Suíça são países altamenl.e desenvolvidos, a despeito da escassez de recursos naturais; o Brasil, a Colômbia e Indonésia são ricos e, entretanto, po bres... Nem as raças ou o.s trópicos explicam o subdesenvolvimento, criação da matemática o da grande arquitetura realizada pelos egípcios e gregos exigiu muito maior poder criador do que a ab sorção da tecnologia moder na necessária ao desenvol vimento. n A Não há porque

postular que essas raças se jam hoje incapazes de re¬ petir a façanha.

Nenhuma dessas explicações sim plistas ou “slogãmicas” resiste a qualquer análise. Mas são exata mente encantadoras para comícios de arrabalde. E a popularidade de algumas dessas explicações (parti cularmente as que lançam a culpa sobre fatores externos ao País) entre os nossos políticos revela o baixo grau de educação técnica, o desamor à investigação científica e a propen são ao animismo pré-lógico. Em certo sentido, fizemos algum pro gresso, já que passamos do fetichismo concreto (a saúva e o amarelão como causas do subdesenvolvimento) para o animismo abstrato (fôrçaa

ocultas, processos espoliativos, capi tais predatórios). Mas o diabo é que nem “slogans” nem exorcismo nos salvarão da pobreza.

A explicação mais aceitável do de senvolvimento econômico é que êle é função do nível e composição dos investimentos em capital físico e da qualidade do capital humano. Ainda que é perigoso ser simplista.

Mais impoilante ainda é o aperfei çoamento do capital humano através da educação e tecnologia. Pesquisas recentes, quer na União Soviética quer nos Estados Unidos, revelam que menos da metade do incremento de produtividade resulta de investi mentos físicos em usinas, indústrias, A maior parte tem de estradas,

A Argentina peronista e a Itália facista mantiveram, por prolongado alto nível de investimento período ser explicada pelo melhoramento qua litativo do fator humano, através de educação, treinamenbu e pesquisa. É aí, e não no perfilhar “slogans” reside nossa salvação. fáceis, que , (acima de 20 por cento do produto nacional), com magro resultado desenvolvimentista. É que grande par dos investimentos se desper diçou em consumo suntuário e desmilitaves improdutivas. cela Não pesas

Pois o desenvolvijnento econômico tem várias e complexas causas e seus remédios são variáveis e difíNessa matéria, como eni ou- ceis. tras, vale o conselho de Whitehead: “Buscai a simplicidade; mas descon- É preciso in- basta investir muito. fiai dela”. vestir bem.

NOTAS SÔBRE ÁS REFORMAS

POLÍTICO-ELEITORAIS

Contribuição apresentada em 5 de dezembro do ano próximo passado ao “Congresso para definição das Reformas de Base”, sob o patrocínio do “Correio da Manhã” e “Fôlha de São Paulo”.

Miguel Reale

Sugestões para a reforma constitucional no tocante ao regime

I cente empreguismo, de desordem n;i \ ida econômico-financcira da Nação, com progressivo desprestígio do Poder Legis lativo.

1. Está previsto na chamada emenda Valadares-Capanema, cuja inconstitucionalidade , que, se o resultado do plebiscito fôr n favorável ao presidencialismo, tal como r infelizmente se prevê, — caberá ao no vo Congresso processar a revisão do Es tatuto de 1946, adaptando-o ao pronun ciamento popular.

2. Partindo do pressuposto da ado ção do regime presidencial é que pas so a examinar o problema constitucional, sugerindo algumas modificações deter minadas pela experiência presidencial brasileira, notadamente após a queda do Estado Novo, pois, ninguém desconhece que a concentração excessiva de pode res nas mãos do Presidente da Repúbli ca tem propiciado um clima de perma nente inquietação, .de transformações brusens, de servilismo político, de cresdispenso de demonstrar. me

3. Não me parece conveniente pri\ ar 0 Presidente da República, — se é que se quer manter fidelidade ao regime pre sidencial, — da atribuição de nomear e exonerar livremente os ministros do Estado.

Não é demais dizer que me parece absurda a tese do atual Ministro da Jus tiça que, na hipótese de referendo fa vorável ao regime presidencial, preten de seja êste restabelecido incontinenti, quando, na realidade, o País deverá con tinuar subordinado aos preceitos do Ato Adicional até que o Congresso proceda à revisão da Carta de 1946.

É aconselhável, e mesmo necessário, no entanto, que o Congresso Nacional possa pronunciar-se sôbre a ação político-administrativa de cada um ou de todos os ministros, não só pela faculda de de convocá-los para dar explicações sôbre pontos determinados dc .suas ati vidades, mas também pela possibilidade de negar-lhes confiança. Assim sendo, se a Câmara dos Deputados — visto co mo tão sòmente a ela deverá caber tal função política, — entender prejudicial ao País 0 rumo seguido por um ministro de Estado, fazendo-o pelo pronuncia mento da maioria absoluta de seus mem bros, deverá êle ser considerado automàticamente dispensado de suas funções, cabendo ao Presidente da República darlhe incontinenti o seu substituto.

Com essa medida, haverá maior ontrosamento entre a política do Presiden te as diretrizes da Câmara popular, es tabelecendo-se um sistema de controlo e de limitação aos atos presidenciais, prevenindo-se fatos graves como os ora

5. Ainda no capítulo das reformas indispensáveis ao regime presidencial, surge a necessidade dc dar à Câmara e ao Senado, notadamente a este, incum bência mais clara e positiva para a fisocorridos, da responsabilidade do Minis tro da Marinha e do Ministro do Tra balho, este ontem exonerado pelo PriMinislro Hermes Lima. mciro

Qualquer observador superficial há dc reconhecer que o que falta ao país é calização e o controle da política finanunidade de direção, sendo tolice atri- ceira governamental, como por exemplo buir-se esta grave lacuna ao Ato Adicio- com referência ao problema das emisnal, pois a mesma desconlinuidadc c .a sões. mesma fragmentariedade continuam a existir mesmo quando entre o Presiden te da República c o seu Conselho de Ministros houve a mais absoluta identi-

dade política...

O que é impossível, todavia, é que o Executivo nacional procure governar conflito com a maioria das fôrças partidárias da Nação, pretendendo impor as suas preferências pes soais, que nem sequer SC conciliam muitas vezes com as de to dos os deputados de próprio partido.

A primeira reforma política de base é esta: governar com a maioria e não à custa dela.

fortalecimento se estabelede tute-

4. Para que Iiaja o dos partidos políticos, que constituem a base da estrutura democrática vigente, torna-se indispensável que ça na Constituição um processo la, de fidelidade dos deputados às agre miações a que pertencem.

Seria princípio salutar o de conside rar extinto o mandato do deputado que abandonar a legenda sob a qual se ele geu, cabendo à legislação ordinária dis ciplinar o processo de cassação, o qual não poderá ficar a critério exclusivo das Comissões diretoras, devendo-se prever, também, o pronunciamento das conven ções partidárias. em seu

6. A experiência tem demonstrado que a adoção apressada da representa ção proporcional teve consequências ca lamitosas para a Nação, propiciando o aparecimento de partidos políticos inex pressivos e impedindo a formação de verdadeiros partidos nacionais. Os que possuimos são, Ha dc regra, cada qual uma federação de partidos estaduais, não se notando a unidade de direção que só po de ser o resultado do estabelecimento um plano político-administrativo, objetiva mente estruturado, ou de uma opção ideo lógica claramente determinada.

Como não estamos aqui fazendo obra acadêmica, devemos reconhecer que se ria inviável

Ção proporcional, a qual se transformou num mito, num instrumento de agitação demagógica, da qual souberam se pre servar as duas maiores democracias con temporâneas: a Grã-Bretanha e os Es tados Unidos da América.

Os tratadistas do assunto já o fize ram ver, — e eu neste ponto me repor to ao que escreví em um ensaio sôbre 0 Presidencialismo e a representação proporcionai, publicado em meu Ii\'ro “Nos Quadrantes do Direito Positivo”, — já demonstraram, à saciedade, que a falta de conhecimento objetiyq do rq-. de supressão da representa-

Igime presidencial, assim como finalída,, cunho eleitoral levaram os nos sos políticos a transladar, do parlamentan^o europeu, processos eleitorais que nao podiam ter outro resultado aparecimento de legendas partidárias pu ramente formais, dada a inexistência rre nós de diferenciações programáticas Ou ideológicas.

senao o eni re-

básica dos serviços públicos, como, por exemplo, a “Lei da Organização Judi ciária”; tais leis só devem scr aprecia das por maioria absoluta do.s membros do Congresso, não podendo os .seus arti gos ser revogados sem se atingir igual "quorum”.

Dêsse modo, será possível preservarse maior continuidade c estaliilidadc às leis básicas, evitando-sc os melancólicos episódios de reformas oea.sionnis, nproveitando-se a solércia de alguns deputa dos de momentos propícios à consecu ção dc seus “desiderata”.

No texto constitucional dever-se-ia

Na impossibilidade de evitar-se í presentação proporcional, devemos pro curar minorar os seus efeitos maléficos, estabelecendo-se, mediante reforma cons titucional, que só terão direito a repre sentação nas Comissões da Câmara e do enado (Constituição Federal, artigo prever a categoria das leis paraconsti-

> § único e artigo 53, § único) os tucionai.s caracterizadas por uin dos dois partidos que elegerem o mínimo de lOX requisitos seguintes r serem complcmenas cadeiras de um e de outro ramo do tares da con.stituição ou pertinentes à Congresso, excluída a possibilidade de estruturação fundamental dos serviço.s coligação de legendas para a obtenção públicos, desse “quorum”.

J- E evidente, porém, que a própria

Camara dos Deputados e o Senado pre cisam passar por uma revisão, a fim de evitar-se a babel legislativa em que nos encontramos.

8.

Por outro lado, torna-se necessá rio infundir ao Congresso elementos de técnica legislativa já comprovados na experiência constitucional mais recente. Refiro-me, notadamente, à necessidade de fortalecer-se o poder das Comissões

primeiro lugar, todos começam a técnicas: se nelas, por exemplo, fôr aprofeconhecer que a discriminação clássica vado, pelo mínimo de 2/3 dc seus mement

Em re leis constitucionais e leis ordinárias bros, um projeto de lei, não poderá o nã corresponde plenamente às nossa.s mesmo sofrer emenda.s cm plenário a necessidades, sendo indispensável a con- não ser mediante aprovação da maioria S o agração constitucional de uma tercei- absoluta dos deputados ou senadoro.s. ra categoria de lei, as que denominei Esta medida cresce dc ponto com n ^is paraconstitucionais, conforme termi- verificação ainda recente da introdução, nologia adotada em meu livro “Parla- feita de afogadilho e com a maior immentarismo Brasileiro”, a cujas conside- prudência, de preceitos, aparentemente rações me reporto e que contaram com inócuos, mas que redundam em total 0 inteiro apoio do eminente dosembar- comprometimento de textos legislativos gador e professor José Frederico Mar- cuidadosamente elaborados através do Ques. estudo dos órgãos técnicos do Governo L e a participação dos parlamentares mai.s afeitos ao trato da respectiva matéria.

9. Outra modificação aconselhável é

eis paraconstitucionais são aquelas destinadas a complementar a Constitui ção, como, por exemplo, a Lei Eleito ral, ou então destinadas à organização quanto à possibilidade de delegação le-

gislativa, que por equívoco se julga pró pria do regime parlamentar. A curta experiencia do instituto no Brasil, com todos os abusos conhecidos, — quando a Iv.bilitação legislativa foi reclamada co mo regra preparadas, no meio dc agitações adrede — exige, todavia que se Congrc.sso dc poderes maiores

derativo, a votação deverá ser feita por distrito, mas a apuração e a classifica ção final dos eleitos só poderá lizada com base na totalidade do colé gio eleitoral de cada Estado, mento a tomada de votos é que liza por distrito. ser rca-

cerque de controle das leis delegadas, afim de sc evitarem abuso.s do Executivo legi timadas pelo .simples decurso dc tem po de impiignaçõe.s. fácil será ao governo, mesmo com uma minoria dedicada, recusar “quorum” pa ra a revogação dos decrctos-lcis promulconflilo com delegação reSem tal cautela. gados em gios eleitorais.

cebida.

S' otas sâhre a reforma eleitoral

1 A primeira proposta que me pa rece prudente fazer é relativa ao voto distrital, já considerado no projeto Mile sôbre o qual já tive a em eston Campos, oportunidade dc manifestar-me tudos anteriores.

Como todas as soluções de caráter político, esta tom seus pró e seus contra, mas cu creio que as vantagens prevaleNão há dúvida que o impacto sencem. do poder econômico poderu fazer-se tir mais violcntamcnte, à medida que se área de interferência, delimita¬ restringir mas a sua não 6 menos certo que ção das circunscrições recerá os candidatos dotados de menores correspondôneloitoral eleitorais favorecursos, permitindo uma cia mais íntima entre o corpo e aquôles que, por suas atividades re gionais, já sc tomaram conhecidos e me recedores de sufrágio.

Para atendimento da Constituição, e, no fundo, para respeito ao princípio fe-

Tão-sòse rea-

também terá a \antasobre\'ivência Esta exigência gem de tornar difícil de partidos marginais, pois de nada va lerá a votação obtida por uni candida to num distrito sc a sua legenda não demais colé- lograr apoio bastante nos

2. Ainda em matéria de votação dis trital, entendo que o Código Eleitoral não deve descer a minúcias, confiandoà Justiça Eleitoral de cada Estado a incumbência de proceder à discrimina ção dos distritos, tendo em consideração todos os fatores que caracterizam uma região geo-econômica no seio de cada un.dade federativa.

Em regra, devem-se evitar colégios eleitorais minúsculos, destinados à elei ção dc um único deputado. Tal proce dimento revertería na criação paulatina de feudos, com uma revivescência do an tigo coronelato.

3. Ainda no concernente à reforma eleitoral, existem questões que envolvem a revisão constitucional e que passo a e.xaminar, visto como no item l.o deste trabalho ine limitei apenas a apreciar as normas pertinentes ao regime presi dencial que, segundo se diz, virá a pre valecer a 6 de janeiro.

Dado êsse esclarecimento, penso que a representação popular no Brasil será fraudada até c enquanto não se alterai 0 disposto no artigo 58 da Constituição de 1946, a qual estabeleceu uma absur da desigualdade entre os brasileiros ha bitantes dos grandes e pequenos Estados. Nada justifica a criação de critérios di-

versos para a fixação do número de deputados, devendo prevalecer um úni co índice para todo o território nacional (o de 150.000 habitantes).

4. Outro ponto para o qual desejo chamar a atenção é o da necessidade de abandonar-se a norma absoluta da eleição direta para a composição dos órgãos de govêmo, tal como se encon tra consagrado no artigo 134 da Carta Maior.

Em verdade, se o voto deve ser sem pre secreto, nada justifica que o sufrá gio deva ser sempre universal e direto. Para dar um exemplo, creio que seria altaraente vantajosa para a administra ção dos municípios a eleição indireta do Prefeito, pois a experiência tem demons trado que o povo só dá atenção ao voto majoritário, e, votando por preferência pessoal, acaba por eleger ramos de ad ministração incompatíveis entre si, com prefeitos sem qualquer apoio nas edilidades, o que provoca os decepcionantes episódios de conflitos que se eternizam, ou, então, de concessões e abdicações em prejuízo do bem comum. Tal ma téria deve ser confiada ao critério do legislador constituinte estadual.

Notas sôbre a estrutura dos partidos políticos

ria, uma outra dc caráter c-conòniico, a realizar-sc através das cnlicladc.s sindi

cais dc grau .superior, com puderes re.stritos a assuntos pertinentes a providên cias que recaiam dirctamente no âmbito das atividades produtivas, rém, assunto que dei.xo cm suspenso, por requerer maior elucidação.

E’ êste, puvSua

Bastaria, no entanto, que se dessem ao Conselho Nacional dc Etonnmia maio res atribuições, combinando-fc; estrutura governamental cem uma outra de caráter eletivo, em consonância coin as entidades representativas da econo mia nacional.

Tal como se acha estruturado no ar tigo 205 da Constituição Federal, o Conselho Nacional de Economia é uni órgão mais decorativo do que eficiente, porquanto destituído dc qualquer atua ção válida e vinculante no proce.sso le gislativo do País, mesmo quando cm jôgo e em debate assuntos de sua estri ta competência.

O Consellio Nacional dc Economia ouvido em devia ser obrigatòriamentc determinados assuntos, só podendo as conclusões ser repelidas por um em ambas as suas “quorum” qualificado casas do Congresso.

A legislação do mundo contemporâ neo reclama uma pluralidade dc procesórbitas de interêsse e aptidões técnicas sos, segundo as segundo também as III

1. No regime constitucional contem porâneo prevalece a tese de que a de mocracia tem os seus esteios naturais nas agremiações partidárias, as vias me diante as quais se processa e se positi va a manifestação da opinião pública. Essa tese, embora predominante, não me parece absolutamente verdadeira, porquanto é possível conceber-se, ao lado da representação político-partidá-

exi

:;:igidas pela complexidade dos proble mas que devemos afrontar.

2. Uma questão de fundamental im portância é a pertinente à estrutura e funcionamento dos partidos políticos. Causa deveras estranheza que, sendo os partidos os iastrumentos essenciais da democracia, poucos sejam os precei tos constitucionais aos mesmos pernnentes.

Como a lc*gislaç,'ão eleitoral, jK>r outro lado, também se mostra omivSsa, os par Ninguém ignora que no Brasil existem partidos ditalorialmentc cstniturados, não passando as convenções de simulade atos formais destinados apea dar aparência de legitimidade a escolhas de caráter i>uramente pessoal, democracia seja nascedouro, por inccros ou nas

Para evitar que comprometida no tidos se nniUiplicam como entidades ar tificiais, aparecendo em função de “qucstiimculas personalísticas” tíndo muitas \'êzes graças ao prestígio de um ou outro líder, sem representa rem uma eoiminhão de idéias ou de pro pósitos situados no alto plano dos interêsses públicos.

Assim sendo, torna-se indispensável clevar-sc, para, no mínimo, 500.0(10 eleitores a exigênua de apoio eleitoral p;ira o registro de qualquer nova agre miação partidária.

c persisxistir liberdade de representação no seio dos p:rtidos que a condicionam, ó indispcnsá\el que a Ici eleitoral con tenha dispositivo.s disciplinando a rea lização das convenções partidárias, sob a fiscalização de juizes eleitorais, com normas sôbrc a sua composição, os j>.oderes do plenário, a discriminação dos atos dclcgáveis ou não aos diretórios, ctc. Sòmcnte assim haverá uma esco lha dc candidatos mais correspondente à vontade partidária, assim como haverá mais estímulo na participação à vida política efetiva.

3. Quanto aos partidos ora c.xistcntes, deve-se estabelecer também uma serie dc providências legislativas ten dentes a reduzir o excesso de legendas. Nesse sentido, como a legislação só prevê a existência de partidos nacionais, toma-se necessário definir, com ab.soluta precisão, o que se deva entender por PABTIDO NACIONAL, fixando-se o mínimo de representação por Estados que possibilite a continuidade da agre miação: não partido de representação pelo menos 1/4 dos Estados federados, convenções deverão optar por sua integração cm um dos partidos exis tentes, i.sto a começar das eleições ge rais dc 1966, pois mod.ficaçõcs dessa na tureza devem ser feitas progressivamente, assegurando-sc aos atuais grêmios partidários a oportunidade dc reexame de sua.s respectivas situações eleitorais, fundindo-sc cm entidades homogêneas disputa do próximo pleito.

dispondo, por exemplo, o federal em as suas para

011

4. O fortalecimento dos partidos exios mesmo.s libertos dos clãs ge sejam das ind;vidualid.,des prestigiosas que os dominam.

Na realidade, atualmente, os partidos só existem às vésperas das eleições, na iminência da colheita dos votos, cerran do-se as suas portas e suspendendo-se as suas atividades, em regra, no dia se guinte ao da apiiração dos sufrágios, quando então os deputados ou senado res eleitos já pensam em assumir a di reção dos partidos, dos quais se julgam os senhores incontestes. . . mesmo

O certo é que, ou os partidos passam a ser entidades dc caráter permanente, baseados cm discriminações ideológicas, dotados de quadros para estudo técnico e objetivo dos problemas brasileiros, ou então, como resultado natural e inevitá vel, Câmara e o Senado continuarão a ser órgãos de atividade intermitente, muito embora sc invoquem as dificulda des de Brasília para se justificarem as ausências crônicas dos representantes do povo.

influência da inflação nos Contratos

W ' 1. Ninguém ignora a influência perturbadora da deterioração da moeda 1"^ sobre as relações patrimoniais que se travam sob a forma contratual. Para quem sabe que o contrato é o instru mento por excelência da vida econô mica, não surpreende a observação de TRaSBOT ao considerá-lo, do ponto de vista jurídico, a grande vítima da instabilidade monetária.

IÉ compreensível. Além de ser um instrumento de apreciação econômica, a moeda é um reservatório de valor. E ê esta última função que, como assi nala DOUCET, lhe dá sua dimensão no tempo, constituindo-se em base de todo 0 direito de crédito e fonte de poupança. Nessa função, é que sofre com a depredação. A inflação preju dica 0 exercício dessa função, atingin do em cheio os negócios jurídicos de execução continuada ou deferida,' e subverte o princípio da comutatividatle, que é uma exigência da Justiça.

Enquanto o processo inflacionário í se mantém em ritmo lento e modera do, os princípios básicos do direito contratual resistem a seus efeitos. Do momento, porém, cm que se acelera, ésses princípios vacilam, transformando-se, alguns dêles, em obstáculos a que muitos contratos continuem a ser instrumentos de aplicação da justiça comutativa.

valéncia, rcsi<le a estatnlidade désses contratos. Destruído o cc|UÍlíbrio con tratual pela depreciação monetária, a atingir todas as situações contratuais que lhe sofrem a influência, instaurase a insegurança no comércio jurídicoA desconfiança no valor da moeda ‘ contamina o pró|)rÍo instrumento ju rídico das relações econômicas, visto que deixa de oferecer a segurança de sejada ou que legitima prejuízos in justos, não satisfazendo, numa pala vra. às exigências da e<jüidade.

no

r É sabido que os contratos onerosos, > consistentes que são na troca de van tagens patrimoniais, realizam-se pressuposto da equivalência de presta ções, nas quais alguns enxergam a sua própria causa (M.^URY). Nessa eqm-

2. A influência perturbadora da de preciação monetária se faz sentir prin cipalmente nos contratos de execução deferida e nos de duração. Nos pri meiros, o adiamento da obrigação dc dar a coisa prometida para data dis tante da conclusão do contrato, cria, para o devedor, uma situação desfa vorável, visto que deve entregar um bem que se valorizou e pelo qual acha muito mais alto do que o ajus- preço tado. Como credor do preço, sofre as conscqüêncías da depreciação da moe da. Rompe-sc, na execução, o equilí brio contratual da formação. Nos con tratos de duração, assim entendidos os que geram obrigações com prestações contínuas ou periódicas, também se verifica, com o decurso de tempo, o desequilíbrio contratual, em detrimen to do credor de quantia certa. Quem quer, poi.s, que, por íôrça do contraio, seja credor dc uma obrigação que tem por objeto uma prestação pecuniária, recebida durante certo espaço a ser de tempo ou em momento deferido, sofre os efeitos da depreciação mone-

tária, deixando dc receber, na reali dade, o equilvalentc do que deu ou do deve dar.

Nos paiscs onde a depreciação torum mal crônico, como no nosdescqiiilibrio patenteia-se, soque nou-sc so, esse bretudo, nos contratos de venda a Cré dito ou a prestações, arrendamento, empreitada, empréstimo, seguro, e nos dc trabalho e de renda cons- contratos tituída sóbre um capital. Em todos o cnmprimcnlo da obrigação dc antia devida deixa de corcles, pagar a qu responder, após o decurso dc certo valor real do bem recebido. tempo, ao ou do serviço prestado.

Naqueles que têm por objeto a en trega dc uma coisa, de venda e o como o de empreitada, verifi ca-se sensível desproporção entre o preço ajustado c o valor do bem no momento em deve ser pago que aquele ou entregue es te. Quem compra um exemplo. objeto, por automóvel, pagaiiiniediatamente preço pedido pelo vendedor be seis meses após, ou quem o recebe SC obriga a pagá-lo decorrido êsse -I, sabe, de antemão, que, por for ça da inflação galopante, não o com praria pelo mesmo preço se houvesse de pagá-lo contra entrega ou que, ao pagá-lo, o obteve por preço inferior ao que deveria pagar, se o estipulasse momento. Nessa última hipóte se, o vendedor, a crédito, — credor do preço, — está vendendo por menos do que vale a mercadoria no momenO mesmo ocorre nas vendas a prestação. A obrigação contraída peum Ü do e o receprazo nesse to.

lo comprador, não raro onerosa ao celebrar o contrato, logo se torna su portável c por vezes insignificante e sempre desproporcional ao valor que o bem vai incorporando em conseqücncia da deterioração da moeda.

Nas empreitadas, notadamente nas que têm por objeto a construção de edifícios de apartamentos, de estradas ou outras obras de grande porte, os efeitos da inflação se fazem sentir mais dramaticamente. Não raro, o empreiteiro se ve na contingência de suspender a obra, na impossibilidade de prossegui-la, levado que pode ser à ruína, se persiste no propósito de entregá-la para rece ber o preço conven cionado. Como tem que comprar materiais para empregá-los na obra e os preços se ele vam constantemente em razão da deprecia ção monetária, o dese quilíbrio contratual lo go se objetiva.

Nas locações, obser va-se, do mesmo mo do, essa desvantagem para o credor da prestação pecuniária. O aluguel ajustado logo se torna desproporcio nal ao valor do bem locado, passando a ser inferior ao que se obtém, mais adiante, pela locação de prédio menos valioso-

No contrato de trabalho, o salário a que faz jus o empregado sofre cons tante desgaste no seu poder aquisiti vo, incumbindo-se o tempo de apro fundar a desvalorização do salário real.

E, assim, nos demais contratos nos quais há uma prestação pecuniária a

ser satisfeita por uma das partes, a prazo ou que se prolonguem no tera-

3. Dêsse estado de coisas decorrem importantíssimas conseqüências para ordenamento jurídico, a mais grave das quais é a deOadéncia do contrato, impedido como fica, em razão da depreciação monetária, de preencher suas funções jurídicas e econômicas, na justa observação de NOIREL (in “Influence de la depréciation monetaire sur Ia vie juridíque privée, estudos de direito privado sob a direção de PAUL DURAND, pág. 93). Mas, como outro instrumento há para a autodeterminação dos in teresses particulares, o contrato sub siste desprovido da sua função bási ca de estabilizar situações jurídicas e prevenir, pela sua fôrça obrigatória, os riscos normais, procurando adaptarse à instabilidade do meio monetário. Observa o proprio nao o mesmo escritor que, em face das ameaças que a perda do lor da moeda faz^ pesar sôbre o equi líbrio contratual, a prática reagiu de dois modos, um negativo e o outro positivo. (Trab. cit., pág. 114).

como decorrência da vontade das par tes, como o dc compra e venda, c pos sível a prevenção contra os efeitos da depreciação monetária desde que o vendedor só venda à vista e receba o preço dc uma vez, lanlo que feita a venda- Mas a venda dc mercadorias não comporta uma atitude rígida des se teor, não só a venda a comercian tes como, para grande número de ar tigos, aos próprios consumidores. Até mesmo a venda de imóveis se realiza hoje, as mais das vezes, sem o paga mento integral do preço. Nestas con dições, o processo preventivo da da à vista, conquanto capaz de elimi nar os efeitos da deterioração da moe da, encontra dificuldades de aplicação na prática.

A reação negativa consiste, segun do êle, em suprimir radicalmente perigos da depreciação monetária, eli minando do contrato o fator tempo, ou, pelo menos, reduzindo-o ao míni mo (trab. cit. loc. cit.). A reação posi tiva, através das cláusulas de reajus tamento, dentre as quais sobreleva a cláusula de escala móvel.

A primeira forma de reação é insu ficiente e insatisfatória. Insuficiente, porque inaplicável aos contratos de trato sucessivo, isto é, àqueles em que a duração é inerente à sua fun

ção econômica,

Nos que podem ter

Daí, a preferência que se vem dando às soluções que tendem a adaptar as prestações pecuniárias às variações do valor da moeda. A depreciação crôni ca da moeda gerou, na prática, a fi gura do contrato de conteúdo mone tário variável, que se caracteriza pe la existência de cláusula permissiva do reajustamento das prestações pe cuniárias ao valor da moeda. venpo.

çxecução continuada ou deferida, más vaos

Tornou-se habitual, porém, o empre go de meio preventivo por parte dos industriais no despacho dos pedidos que recebem para execução que não c imediata. Consiste essa prática em não dar o preço firme, reservando-se o vendedor o direito dc alterá-lo, ou, quando menos, o de só sustentá-lo até certa data. Evidente que o uso dêsse expediente dificulta as transações e sacrifica a função de previsão que os contratos devem normalmente desem penhar, mas, em verdade, tais precau ções se justificam em face das brus cas oscilações de preços a que está sujeita uma economia inflacionada.

4. Mas a reação positiva à depre ciação monetária não se manifestou, dc logo, sob essa forma. Iniciou-se através dc processos destinados a pos sibilitar a revisão do contrato, em deO conteúdo terminadas condições, permanecia fixo, mas se, no curso da execução, ocorria o desequilíbrio em condições c.xccssivamcnte desvantajo sas para uma das partes, a revisão de veria ter lugar. A princípio, a altera ção das condições contratuais com vistas à sua atualização era tentada amigàvelmentc. Os tribunais não a admitiam, me.smo cm excepcionais, e a lei não a autorizavà. Imperava, circunstâncias tôda plenitude, a regra cm pacta sunt servanda”. Mas a revisão por mútuo acordo das partes só se ve rificava òbviamente naqueles contranota TRASBOT tos em que. como

(Trab. cit., pág. 164), coincidia com o interesse comum dos contratantes e era mesmo por cies desejada, como contrato dc seguro- Nos casos em que interessava unicamente a um dos con tratantes, a revisão amigável tornavaimpraticável pela recusa sistemátido outro, acastelado no princípio da força obrigatória dos contratos, para aproveitar a vantagem-

5. Mas, a depreciação monetária, em muitos países, teve principal a guerra. Em consequência, o desequilíbrio contratual passou a ser atribuído a um acontecimento extraorNão era um no se ca como causa dinário e imprevisível, fato normal, ou ao menos corrente, determinava. Eram circunstân- que o cias inesperadas que apanhavam conalteravam proíundacomutatividade das prestaPara corrigir a anormalidade. tratos em curso c mente a çÕes.

bus”, dos canonistas medievais, admi tindo-se (lue estava implícita em todo contrato ciue tivesse trato sucessivo e dependesse do futuro. Por força despresunção, a mudança das circuns tâncias que rodearam a celebração do contrato justifica a sua revisão, se não podia ser prevista- e dela resultasse prejuízo considerável, extraordinário, para uma das partes. Na linha desse pensamento esboçou-se, na França, a célebre teoria da imprevisão. A possi bilidade da revisão judicial dos contra tos foi admitida para a restauração do equilíbrio contratual sempre^ que este fôsse destruído em consequência de acontecimentos imprevistos que dearruinamento do devesa tcrminas?cm o

dor, caso devesse cumprir a obrigação a palavra empenhada. para honrar Mas êsse suporte doutrinário da revijudicial dos contratos trazia a marca do tempo. Era, com efeito, uma construção teórica elaborada sob o impacto de situações criadas pela guerra. 0 reequilíbrio das prestações, necessário em face da depreciação mo netária e da elevação brusca e violen ta do custo de vida, se devia legitimar por que era consequência de fatos ex traordinários que as partes não po diam prever ao celebrarem o contrato. A impossibilidade de prever constituía, em última análise a tiva da liberação do devedor ou da alteração compulsória do conteúdo do contrato. Evidente, assim, que o prin cípio não podería ter cunho de gene ralidade. A lei Faillot, de 1918, que o consagrou, permitindo a resilição ju dicial dos contratos, confirma, expreso caráter excepcional do

sao razão definisivamente,

pensou-se, a princípio, na restauração da famosa “clauaula rebua »ic slantiprincipio, ao frisar as condições de sua aplicabilidade, pondo o acento na ne cessidade de um acontecimento anor-

nial e na imprevisão. A libera ção do devedor pelo Juiz, nessa lei, foi admitida nos casos em que, “por motivo da guerra, o cumprimen to das obrigações de um dos contra tantes acarretasse encargos ou lhe causasse um prejuízo cuja importância ultrapassasse de muito as previsões que podiam ser feitas razoavelmente na época da convenção”. Mesmo com essas limitações, temia-se que a acei tação do princípio concorresse para enfraquecer o dogma da fé jurada, criando um clima de insegurança. Até então o princípio da fórça obrigató ria dos contratos era considerado in tocável, no pressuposto de que consti tuía, na sua extensão absoluta, uma das vigas mestras do Direito dos Con tratos, pelo que se justificava a insen sibilidade dos tribunais à sorte do de vedor-

6- Mas, essa teoria da imprevisão, evidentemente circunstancial, nucleou a reação à inflexibilidade do princípio da fôrça obrigatória dos contra, desastrosamente passou a servir de fundamento doutrinai à revisão dos contratos quando se manifestasse o desequilíbrio contratual, independente mente da ocorrência de acontecimen tos extraordinários e eliminada a con dição de impossibilidade. No desdo brar dessa tendência, pretendeu-se aplicá-la às situações de desequilíbrio resultantes da depreciação monetária. No entanto, o campo de sua aplicação restringe-se a certos contratos e, como observa NOIREL, a teoria encara o problema do ângulo muito estreito da execução de uma prestação ra” que se tornava rumosa para o de vedor (Op., cit., pág. 99). Estendê-la a tôdas as situações de superveniente desequilíbrio contratual significa a sua

os e U!in natu-

negação, visto que a idéia da impre visão, sôbre que descansa, afasta a possibilidade da revisão do contrato tóda vez que o desequilíbrio seja pre visível, ou não resulte de aconteci mento extraordinário. Ora, nos casos de desequilíbrios consequentes à de preciação monetária, c impossível jus tificar a intervenção judicial na eco nomia do contrato sol> o fundamento da imprevisão. Quem quer que contra te num país que sofre do mal crônico da inflação sabe que o dcsc<|uilíbrio verificará inelutàvclmcn c se a prestação pecuniária houver de ser sa tisfeita algum tempo depois da cele bração do contrato. O desequilíbrio é, por conseguinte, previsível, pclo que à part/ que irá sofrc-lo cabe acautelarse. Demais disso, a de.sproporção sultante da perda do valor da moeda não é conseqüência de evento ordinário onde a depreciação é um fa to constante. Nem se pode dizer, afi nal, por mais brusca que seja a tle.svalorização, que a prc.stação pecuniária do devedor se torne insuportável, a ponto de criar uma verdadeira possibilidade econômica”. Em tôclas as hipóteses de desequilíbrio contra tual decorrente da depreciação mone tária não liá como justificar corretamente o reajustamento das prestações com base na teoria da imprevisão.

Entretanto, doutores e juizes, entre nós, costumam invocá-la para funda mentar a alteração das prestações pe cuniárias, quer contratuais, quer não. Assim é que muitos a invocam para justificar a majoração das pensões ali mentares, dcsnecessàriamente aliás, a elevação das que constituem objeto de obrigação por ato ilícito e, aié, do reajustamento no contraio dc emprei tada (Cf,PAULO CARNEIRO MAIA, se re¬ extra«● : im-

não o elevando à condição simples mente pela suposição de que já ocor reu ou por que considerem certo seu acontecimento no futuro (Introduccíón al Derecho Civil, pág. 305). Se O íatO desaparece ou não ocorre, o interessa do no negócio terá o direito de denun ciá-lo ou promover a sua resolução, pois 0 negócio seria contrário à von tade e aos interêsses das partes (Op. cit., pág. 305). base do negócio vem como c.xpresso cm a scr, em suma

no

Da cláusula rebus sic stantibus, e os escritores que cita na nota 3ó7, inserta ao pé da pág. 236). Outros vão mais longe ao cnicndercm que a teo ria da imprevisão penetrou cm nosso direito positivo através de leis espar sas, cntie as (piais alinham a de usura, a da cláusula-onro, a dc luvas c a de economia popnl.ir (Cf- NEHEMIAS GUEIROS, A justiça comutativa nos contratos, MAIA, op. cit.). Km verdade, porém, cm nenluim dêsses diplomas legais, co mo, dc resto, nas aplicações da juris prudência, pode-sc lobrigar a discipli na de situações que se enquadrem na teoria da imprevisão propriamente di ta. No caso da empreitada, por exem plo, o reajustamento readmitido pelos tribunais decorre nianifestamente do reconhecimento dos efeitos da depre ciação monetária sôbre tal contrato. Manifestação legislativa concreta dêsse reconliocimento cncontra-se

D«creto n. 309, de 6-12-61, que esta belece normas para a revisão dos pre ços nos contratos de obras ou servi ços do Governo Federal.

7. Posição cicntificainente mais correta, na qual se tenta resolver o problema encarado com maior ampli tude, foi assumida por escritores ger mânicos, dentre os quais se destacam OERTMANN c LARENZ.

A OERTMANN, como se sabe, de ve-se a introdução do conceito de base do negócio como elemento integrante do contrato, assim tido, como condição expressa ou tácita do mesmo. Segun do suas próprias palavras, verifica-se a pressuposição bilateral no niomcnto ou nas ocasiões em que as pa tes, de maneira perceptível, querem apoiar os efeitos do contrato exclusivamente sô bre a base de um fato determinado,

deCisão judicial, na Alemanha, a uma representação mental das partes so bre a existência e a permanência de certas circunstâncias sôbre as quais SC baseia a vontade negociai, circuns tâncias que, sem ter chegado a formar parte do contrato, foram consideradas ambos os contratantes, ou por um por só délcs, não as repelindo o outro. A principal objeção feita a essa teoria dirige-se ao seu subje.ivismo. Mas, LARENZ a retomou para tentar obje tivar o conceito de base do negócio, definindo-a como o conjunto de cir cunstâncias cuja existência ou persis tência o contrato pressupõe, saibam ou não os contrastantes, circunstâncias que, SC não persistirem, o contrato não pode ser mantido, pois o seu fim não será alcançado, nem atingido o pro pósito das partes contratan es (Base dei negocio jurídico y cumplimiento de los contratos, pág- 37).

Dentre os casos nos quais a base objetiva do contrato desaparece está o da destruição da relação de equiva lência. Nos contratos comutativo* “a contraprestação é, a juízo de cada parte, o exato equivalente de sua pró pria prestação” (LARENZ, Op. cit,, pág. 130). É certo que a relação de equivalência não se mede em função de uma escala objetiva e geral, mas,

Isim, pela valoração que cada parte fa2 da sua necessidade. Assim, mesmo que a contraprestação seja iníerior ao va lor da prestação, há de ser considera da como equivalente pelo que faz. Caso contrário, o contrato não será comutativo, eis que a relação de equivalência é da sua essência. Nestas condições, sempre que a relação de equivalência

lação de equivalência nos termos era que é considerada como causa cio de saparecimento da base do contrato-

a satisaltera em conscqüên- se cono ensinapor outras prestapos-

Nestas condições, a teoria de LA RENZ, apesar de sua amplitude e objetividade, não se apresenta como suporte doutrinário idôneo a justificar a revisão dos contratos nas hipóteses dc desequilíbrio ocasionado pela dete rioração do valor da moeda.

cia da modificação das circunstâncias, o contrato perde seu sentido c caráter originários, e, nessa hipótese, há de afirmar-se que a sua “base” desapa receu (LARENZ, Op. cit,. pág. 131).

A vantagem dessa teoria sóbre a da imprevisão reside, menos era sua ob jetividade, do que em sua generalida de. Serve, com efeito, para justificar a pretensão de reajustamento em todos os casos nos quais a relação de equi valência entre as prestações se acha destruída, qualquer que seja a cansa. Mas, uma simples perturbação nessa relação não basta para atestar o de saparecimento da “base” do negócio, Se assim fôsse, não haveria seguran ça jurídica. Pequeno desequilíbrio tratual, resultante da elevação de pre ços, de salários, de fretes ou de im postos, não destrói a relação de equi valência, pois SC acha compreendido no risco contratual. A base do contra to só desaparece, conforme mento de LARENZ, quando uma per turbação da relação de equivalência é de tal magnitude que ela fica totalmente destruída; quando, palavras, o desequilíbrio das ções seja tão grande que não se sa falar de uma contraprestação, de um equivalente (Op. cit-, pág. 147).

Ora, a depreciação monetária por efeito de inflação íncontrolável jamais poderá determinar a destruição da re¬

A investigação cm busca da solução do problema não deve ser orientada, pois, nem para a teoria da imprevisão, nem para a teoria da base do nego cio, seja a de OERTMANN, seja a de LARENZ.

Há que buscá-la, por conseguinte, em outros princípios, examinando os meios técnicos dc que sc tem valido a prática para corrigir o.s efeitos da ninhos da depreciação monetária.

8. O recurso à cláusula-ouro ou seus sucedâneos, — divisas estrangei ras ou valores-divisas, cesso apto a evitar o desequilíbrio em certos contratos. Mas, como as estipulaçõcs désse teor recusam ou res tringem, nos seus efeitos, o curso for çado da moeda, são geralmcnlc proi bidas. Entre nós, não sc permitem. O decreto n. 23.501, dc 27 de novembro de 1933, alterando o art. 947, § l.o, do Código Civil, declara nula qualquer cstipulação de pagamento cm ouro, ou em determinada espécie de moeda, ou por qualquer meio tendente a frustrar 0 curso forçado de nossa moeda, ex cluídas, evídçntemente, as obrigações contraídas no exterior cm moeda es trangeira para serem cumpridas no país.

9. Para fugir a essa proibição, as partes começaram a inserir, nos con tratos, cláusulas pelas quais a quantia a ser paga é fixada em função das vasena um pro-

riaçücs (Ic determinado índice econô mico. ce mo, por c.xcmplo, o dc custo de vitla ou do .'salário mínimo. A essas cláusulas de indexação, deu-sc a deno minação de cláiisulac de escala móvel. L)a sua validade, duvidou-se, a prin cípio. proibição do pagamento em outro era medida <lestinada a assegu rar o cur.sü forçado da moeda- Qual quer meio leiulente a frusirá-lo deve ria incidir na mesma proibição. As sim, de.sde (luc as partes contratantes manifestassem exprcssamcnlc, através de uma cláusula de escala móvel, a in tenção de se precaverem contra a de preciação monetária estariam, do mes mo modo, frustrando o princípio do curso forçado da moeda. No fundo, realmcnle, tal cláusula possui <a mesma natureza das cláusulas monetárias, co mo demonstrou HAMEL no estudo que ao assunto dedicou (Les causes d’cchelle mobile et le droit monetaire français). Tanto faz, com efeito, que o índice de referência seja o ouro, a moeda estrai;geira ou o salário míni mo.

Mas a realidade pode mais do que a lógica jurídica. Admitir a nulidade dc tal cláusula cra refrear, senão pa ralisar, os negócios, tornando impos síveis o crédito a longo prazo e a con clusão de contratos de execução su cessiva (NOIREL, trab. cit., pág. 123). Na França, onde esses escrúpulos ló gicos conduziam os tribunais a negar validade às lacunas de escala móvel, a jurisprudência começou por distinguir artifidalnientc cláusula monetária de cláusula econômica, abandonando a distinção em seguida para admitir, com fundamento na liberdade de con tratar, que as partes têm o direito de inserir no contrato tal cláusula, por isso que, assim procedendo, não estão

íerindo a ordem pi'iblica econômica, ou monetária. E, dc fato, sua validade passou a .ser admitida pelos tribunai.s. .\ lei coníirmou-a em matéria de loca ção, tanto para o arrendamento dc prédios rústicos como para a locação de prédios para fins comerciais.(MA-. ZEAUD e MAZEAUD', Leçons de Droit Civil, t. II, n. 879).

Razão não há, em verdade, nem ali nem nos países que proibem o paga mento em ouro, para recusar .valida de às cláusulas de indexação.’

lü. CoiUimiam, porém, a ’ suscitar controvérsias t.o que toca à sua impo sição legal. Sc são os próprios inte ressados que, de comum acordo e com rcciiM-oddade, adotam a escala móvel, nada que objetar, uma vez que preva lece a tendência para considerá-las válidas- Mas, se é a lei que a estabe lece, inserinclo-a coalivamente no con teúdo de certos contratos, a genera lização e a obrigatoriedade tornam-na discutível. O problema deixa de ser de validade para se transformar numa questão dc política legislativa. Deve o legislador assegurar expressamente a faculdade de reajustamento de pres tações pecuniárias ou, mesmo, deterniinà-lo em relação a c’ertos contra tos?

Como sc vê. dê.sdoIn'a-se a-questão. Prcconiza-se, de um lado, a adoção de uma di.sposição dc caráler geral que faculte aos interessados o pedido de revisão do contrato para o reajusta mento das prestações desequilibradas pela depreciação monetária, e, do ou tro, que a própria lei determine o rea justamento automático, em função, de variações previsíveis.

Em qualquer das hipóteses, a gene ralização obriga a examinar o proble ma da utilidade ou da conveniência da

escala móvel. Nesse passo, o jurista eve pedir luzes aos economis..as. Mui tos dés.es sustentam que a cláusula e escala móvel lem caráter inilat.ionario, Q que as torna inconvenieni

,e3 precisamente por que agravam a cauprincipal da depreciação monetária a sua prática se generaliza, pas sam a Constituir um obstáculo ao reequilíbrio dos preços, diíicul.ando, por conseguinte, o combate á inilação. Outros, porém, colocam-se em posição contrária, vendo na cláusula de escala móvel um dos meios de coibir a infla ção. Os reajustamentos que enseja eli minam 0 proveito que pode ser tirado da inflação, refreando, assim, a práti ca dos negócios que só se rea.izam pelo atrativo da vantagem proveniente da deterioração da mceaa. O raciocí nio dos que percebem a perda do va lor da moeda pela elevação

Aponta-se, todavia, um perigo na sua ai.oÇtio pcia leu li, con.o as..inala TRASBOT (trab. cit., pág. 176), o do êrro nas previsões, c;pecialmeul<i quando se tomam, como base, certos índices-

ou se venna re-

sa Se constante preços é que todo o dinheiro deve ser imediatamente aplicado na aquisi ção de quaisquer bens, notadamente se o preço deve ser pago em presta ções. A valorização, — ilusória, é ver dade — do bem adquirido estimula dos tais operações, não raro desnecessártas e, até mesmo, feitas inicialmcnte com sacrifício para os adquirentes. A ésse estímulo se deve, entre nós, co mo ninguém ignora, a increraentação dos loteamentos de terrenos e da cons trução de edifícios de apartamentos, de que resultou desenfreada especula ção imobiliária. Se generalisada fôsse a prática do reajuste do preço êste pudesse ser majorádo pelo dedor mediante indexação prevista lei, certamente tais negócios se trairíam deixando de concorrer para a aceleração do rtimo inflacionário. Lon ge, pois, de ser inconveniente, a escala móvel seria útil.

Apesar das controvérsais e dos in convenientes, cniende-se que o con trato de conteúdo monetário variável é preíerível ao de con.eúdo fixo coin possibilidade de revisão. O íca^ustamento automático é, com efeito, um processo de restauração do equilibrio contratual muito mais pronto e eficaz do que o da revisão judicialII. Mas, a simples permissão de estipular a escala móvel, legitimandose e.xpressamentc a liberdade de intro duzi-la no contrato, não c suficiente para corrigir os desequilíbrios injustos que, freqüeniemcntc, se verificam co mo efeito da inflação. A adoção con vencional da escala móvel só se torna viável quando as duas partes t>m o mesmo interesse na realização do con trato. Quando, porém, a necessidade, ou a conveniência, dc concluí-lo é mais sensível para uma delas, o que ocor re, na prática, ordinàriamenie, é a re cusa da escala móvel por parte de quem se beneficiaria com a inalterabilidade do preço. Ao incorporador de um edifício de apartamentos, por exemplo, é multo mais difícil a sua co locação no mercado se o contrato pa ra a sua construção contém a cláusula de reajustamento.

Necessário, assim, para os negócios jurídicos sujeitos à destruição da rela ção- de equivalência por força da de preciação monetária, que se adote uma destas duas soluções: ou a ex pressa determinação legal do reajusta mento ou a presunção de que, em tais contratos, a equivalência das presta¬

ções pode ser restaurada, independentcnicnte de previsão contratual, por decisão judicial.

ções contratuais vem se fazendo cm relação ao contrato de traballio nos dissídios coletivos submetidos à apre-

A primeira solução teria a vantagem ciação dos tribunais trabalhistas. A "depreciação monetária atinge (dura mente as classes trabalhadoras- Torde eliminar ciivergcncias não só quan to ao próiirio reajustamento, mas, também, quanto aos índices de refe rência. Constituiría, porém, grave aten tado á liberdade de contratar.

12. Entre nós, o reajustamento do preço por efeito direto de perm'ssão legal foi admitido na Ici do inquilinato. Congelados que vem sendo os alu guéis por sucessivas leis, a liberação íniciou-sc modcradaniente pela possi bilidade de majoração, cm certa pro porção, nlcsm(^ contra a vontade do inquilino. /\ rigor, porém, tal permis são não constitui pròpr'amente uma formulação do princípio dc variação do conteúdo monetário do contrato.

A outra solução tem sido aceita em relação a certos contratos, élcs, na órbita civil, o de construção. Sc há alteração do preço da emprei tada, notadanicn'c cm conseqü''ncia da elevação do custo da mão-de-obra por efeito da majoração compulsória dos salários, o construtor pode pleitear o reajustamento do preço e os tribu nais têm admitido a justiça da pre tensão, como, por igual, a indexação, sôbre o custo da construção, do preço do apartamento ou compartimento que o incorporador haja se obrigado a en tregar. Verdade é que, tanto a doutri na como a jurisprudência, têm pro curado fundamentar o reajustamento na teoria da imprevisão, manifestamenle inaplicável à espécie. O que, po rém, importa é a tese, não sua fun damentação-

Outra aplicação do princípio de res tauração da equivalência das presta-

nando-sc crônica, como entre nós ocorre, gera desajustamentos salariais que se tornam fonte de conflitos de trabalho. Em face da pretensão de au mento salarial manifestada pelos sin dicatos, os tribunais de trabalho, no exercício do poder normativo de que estão investidos, costumam conceder o reajustamento indexando-o ao custo de vida, e se servindo, para ésse fim, dc índices oficiais. Tanto nas conven ções coletivas como nos acordos do mesmo caráter tem-se tentado, ültimamente, a introdução da cláusula de es cala móvel, mas a preferência conti nua pelos acordes de conteúdo mone tário fixo, suscetível de revisão pe riódica.

13. A revisão judicial legalmente autorizada parece ser, assim, a solução mais viável, pelo menos para certos contratos.

Todos os processos de defesa contra os efeitos da depreciação monetária, visam, afinal, a assegurar, na instabi lidade, uma certa segurança no con trato, como diz TRASBOT. No fundo, pois, o que se busca é a segurança, o império da justiça comutaiiva. Os cami nhos são diferentes, a meta,.a mesma. Preservar o princípio da intangibiüdade dos contratos numa economia debi litada por longa deterioração da moe da seria manter o valor nominal das obrigações em detrimento do seu valor real, ignorando a real-dade da vida por apêgo ao sentido literal de um princípio. Ê preciso, a contrário en-

Dentre

Icarar a situação com espírito realístico, — deplorando-a embora, — para adaptar o direito aos fatos,.

A inflação, avassaladora, terrível, desnorteante, influi sôbre o Direito dos contratos, causando-lhe. profundas perturbações. Se não é fácil encontrar soluções que neutralizem ou ao menos

jninorem os nocivos efeitos da depre ciação monetária nos contratos de duração ou de execução diferida, por isso que o problema tem implicações que interessam vivamente ao jurista, urge procurar os meios próprios para conseguir a adaptação do direito das obrigações à depreciação da moeda.

MATER ET MÁGISTRÁ

* (Profi ssm de Economia Política da Universidade de Minas Gerais e deputado federal)

Apublicação, pe’a Síntese Polí tica, Econômica, Social (SPES), da Enciclica "Mater et Magistra”, precedida de estudos de Paulo Sá, Alceu Amoroso Lima, Ma nuel Diégues Júnior o Pe. Fernando Bastos de Avila, S.J.. e seguidn <le minucioso índice geral e alfabéticoremissivo, ensejou-nos n oportunida de de, rc*lendo-a agora, bem como, conhecendo as apreciações que a an tecedem, tecer alguns breves comen tários, a esta altura necessários.

Poucos documcntü.s terão provoca do tantos pronunciamentos e se terão notabilizado tão depressa. O mais interessante, e que raia nelo estranho, surpreendente e inexplicá vel mcímio, é n quase unânime, para não dizer unânime '’pÍnião favorável com que foi acolhida, pelas mais diversas corrente.s de pensamento, de centro, direita ou esquerda, pelos mais diferentes comentaristas, das tendências mais antagônicas, adver sários mais intolerantes e intransi gentes.

Todos a elogiam, comentam, citam, invocando-lhe as palavras, a orien tação ou o espírito; todos se dizem abrigados' dentro dela; e serve, por isso, a todas as explorações, de onde quer que partam ou a onde quer que se destinem os que as fazem, provocam ou insuflam.

Se isto constitui demonstração evi dente da segurança e habilidade com que se enunciou o pensamento da

Igreja, por outro lado representa ônus que não pode ser menospre.ado: esse pensamento sempre tão obje tivo, exato e indeformável, prestan do-se aos aproveitamentos, desvir tuado, torcido, modificado; servindo a favor, nuis principalmente servindo contra, porque utili.ndo paios nvJis ousados, precisamen\:e minoria que se faz apregoar maioria.

Esta a verdade: a Enciclica vem sendo usada muito mais pelos que defendem e exploram teses que não são da Igreja do que pelos que, mantendo-lhe a Unha tradicional, a interpretam com moderação c con tinuidade (como acentua Paulo Sá, no artigo “A enciclica e a superação da questão social", neste mesmo vo lume da SPES). Daí a necessidade de salientar êste aspecto: a continui dade do pensamento da Igreja, que não pode e não deve ser tomado num documento ou pronunciamento isola do, e menos aind:\ uma citação co lhida a pinça no contexto geral, mas na sua continuidade, elohração longa e meditada. Como todo documento que retrata uma realidade social, não uma "continuidade con-telada e está tica, antes uma continuidade viva e em evolução, que conserva o que é permanente e modifica o que é neces sariamente episódico e contemporâ neo” (Paulo Sá, art cit., SPES p. 6)

A importância dessa continuidade expressa-se na própria forma de ex posição utilizada por S.S. João

XXIII: a primeira parte destina-se à síntese do pensamento da “Rei*um Novarum” e dos desenvolvimentos que teve nos ensinamentos de Pio XI e Pio XI, concluindo pela afir mação do dever de “conservar viva a chama acesa” por aqueles eminen tes Pontífices, e da necessidade de “repetir e precisar pontos de doutrina já expostos” ou “cuidar dos novos e mais importantes problemas do mo mento”.

Na exegese da “Mater et Magistra”, entretanto, tal não vem ocor rendo, Ao invés de lhe tomarem a lição, no que ela tem de perene, per manente, íntegro, contínuo, os intér pretes interessados tomam-lhe a ex pressão literal, simples palavras, tre chos isolados arrancados ao contexto inconsútil, para utfizá-las em bene fício das teses que sustentam.

cas que lhes interessam, arte em que não são principiantes. . .

Da mesma forma que ao liberalis mo se denominou capitalismo, para dar à palavra o sentido dos abusos dos exploradores cio trabalho, dos aproveitadores do opei-ariado, dos usuários desabusados do capital (e a queixa é de Luclwig von Mises), à palavra socialização se emprestou o significado falso mas usual e con sagrado entre os leigos, de vitória dos princípios socialistas.

Verdade é que nunca a “dignidade da palavra” esteve tão ameaçada pela ação dos ideólogos, prontos servirem dela como lhes aproveite intentos.

E se improcedente seria, como diz Alceu Amoroso Lima ("O princípio da socialização”, SPES, p. 30) condenação de qualquer tipo de sociali..ação como sendo o primeiro passo ou mesmo o último. para o socia lismo”, sendo a “socialização ape nas um sociaMsmo disfarçado”, mais inadmissível é pleitear-se a inter pretação de que a socialização im porta em conquista do socialismo.

a se aos

É estranho, por exemplo, como os socialistas, em gera], procuram valer-se do que nela se diz contra os abusos do liberalismo, e de como os não socialistas se calam diante da quela exploração, quando não a acei tam e apregoam.

Veja-se o que ocorre com a cha mada socialização, idéia a cíclica fa.- referência, nas expressões latinas incrementa rationum sociali e progressus vitae socialis (SPES, nota p. 68) e que as traduções con sagram nesse termo.

Socialização é vitória do social, predomínio ou influência do social sôbre o uso e o abuso individualista; é compreensão do vulor social da ati vidade humana, da função social do seu trabalho, que só se pode fazer em bem do homem na sociedade, integrando-a e não dissolvendo ou com batendo; tendência para o social, para o abrandamento do individual em benefício do coletivo.

que a enpresta-se às interpretações ideológi-

Do uso da palavra têm feito os socialistas a sua fortuna e o seu êxito: adotando-a nas traduções,

A Encíclica, conhecendo a dificul dade, define socialização “a inultip*!caçâo progressiva das relações den tro da convivência social, e com porta a associação de várias formas de vida e de atividade, e a criação de instituições jurídicas. O fato de ve-se a múltiplas causas históricas, como os progressos científicos e téc- . a

nicos, à maior eficiência produtiva e ao aumento do nível dc vida”.

Mas é também fruto

E continua: “a sociali. ação é si multâneamente efeito e causa duma crescente intervenção dos poderes pú blicos, mesmo nos domínios mais de licados”. . . e expressão duma tendência natural, quase irreprimível, dos seres huma nos: tendência a associnrem-se para fins que ultrapassam as capacidades e os meios de que podem dispor os indivíduos cm particular".

Dessa longa citação — que não é tudo ainda, e demonstra como é difí cil invocar, com probidade, o pen samento da Encíclica, resumidamente — verifica-se que o Santo Padre conhecia os riscos das interpretações, distor ções e mal-entendidos que poderiam atribuir a suas palavras. Objetiva seu pensamento assegurar quela prevalência do social (sem exclusão da pessoa e da liberdade), societarização digamos assim, procura da associação pe los homens, assimilação do social, sem que isso importe, entre tanto, em determinação do homem, em transformação ●'m autômato, an tes “favorecendo o desenvolvimento integral da personalidade”, “a satis fação das exigências da justiça so da’

iPrega S. Santidade se obtenham as vantagens e se evitem ou repri mam as consequências negativas da socialização, pí^ra o que é necessário “as autoridade.5 públicas se te- que nham formado e realizem pràticamente uma concepção exata do bem comum”. E diz mais que “se a socia-

lização se praticasse em conformi dade com as leis morais indicadas, não traria, por sua natureza perigos graves de vir a oprimir os indiví duos. Pelo contrário, ajudaria a que nestes se desenvolvessem as qua lidades próprias da pessoa humana”.

Mas a própria colocação do pro blema nessas palavras indica como estamos longe daqueles benefícios e próximos daqueles graves perigos.

Se vem, de novo, na Encíclica (afirma Alceu Amoroso Lima, art. cit. loc. cit., p. 26) “a análise mais detida do próprio elemento básico da doutrina das duas Encíclicas anteriores; o social”, isto é, “relação que une o.indivíduo a ou tro indivíduo, na socieda de, assim como a parte ao todo e este àquela ”; o que é preciso dizer, repe tir e repisar é “a con denação explícita do socia lismo”, que existiu não apenas nas duas encíclicas anteriore.s como na atual.

xm

Condenação formal do sociaMsmo, mesmo modera do, quase .sempre omitidas nas interpretações .que dela se fa zem, tomadas, muitas vêzes como apoio ou conivência.

Por outro lado, não poderia levar à condenação do regime liberal, como hoje se apresenta, expungido da maioria dos abusos rjue o marcavam, visto como 0 que lhe caracteriza a evolução é a “assimilação dessa ten dência social”, perdendo o individua lismo intransigente e inadmissível dos primeiros tempos e eliminados os excessos que o incompatibiMzaram com os princípios da justiça social. Impõe-se, pois, mereça a Encíclica

tos e de que cada um se utiliza quanto e como lhe apraz.

Enquanto a disputa se fizer na queles termos em que a viu von Mises análises mais detidas, para que não sirva apenas aos que a exploram, mas se preste ao esclarecimento do povo e das massas operárias.

Os tópicos, aliás, em que S.S. ex plicita 0 estudo dos problemas mo dernos ligados à atividade econômico-social, não deixam margem a dúvidas. Se demonstram aqueles profundos e cruéis”, apresentam remédios para sua supe ração, como bem diz a nota introdu tória da SPES.

Seguem a linha tradicional da Igre ja, projetando-a para a análise e solução dos problemas atuais.

O que acontece, porém, é que en quanto os tímidos partidários do sis tema ocidental de vida se escondem e o não defendem, e se omitem no salientar-lhe as virtudes, ainda que lhe apontassem os defeitos e incri minassem os abusos; os que pregam a modificação ou a subverção da or dem social atual, pela implantação de outra (que não sabem qual é, nem as características que teria, o que já ocorria a Schumpeter, quando se re feria à “marcha para o socialismo”), apressam-se em tomar tôdas as afir mações que, isoladas ou torcidas, pos sam prestár-se aos seus desígnios, para tirar delas proveito., em favor das teses que sustentam.

Nisso têm sido e se fazem cada mais eficazes, enquanto nós ou tros nos tornamos cada vez mais omissos e tímidos.

Daí os êxitos dos socialismos ambíguos, mal-definidos (lembre-se palavra de Oscar Jásni na Enciclopaedia of the Social Sciences, vb. socialism), indefiníveis mesmo, in clusive por mercadoria que serve a todõs os goscontrastes vez a conveniência própria,

'“LiberalÍKm and Capitalism addres themselves (o the cool. well balanced mind. They proceed by atrict logic, elimina* ting any nppcal to t!*o enio* tions. Socialism, nn the contrary, nork.s «n the emotions. tries to violatc logical con* siderations' by rousing a sense of personal intere.st and to stifle the voicc of reason h.v awaltening primitive instincts (“Socialism”).

não há como eliminar essa impres são desfavorável e falsa da agonia de um regime, o nosso, em perma nente elaboração e em inegável vita lidade.

Falta aos que o defendem, entu siasmo e ânimo de defendê-lo — con fessemos — como se .se houvessem desiludido da cura do doente, princípios fundamentais do sistema, no entanto, mantêm-sc, c o mecanis mo das instituições econômicas está intacto, no fundamental e básico, que se vê é que a realidade (e, por que não dizê-lo, o temor do socia lismo) foi eliminando os abusos, po dando excessos, retificando falhas, adaptando o sistema às conveniên cias sociais, com aquela adaptabi lidade que o caracteriza e lhe ga rantiu a sobrevivência, n.ão obstante as mutações por que puíjsou e velhos e renovados pregões de sua agonia e morte.

A Igreja não uoderia romper t não rompeu a tradição dos pronunOs O os

o Sumo PontificG a o com hjcide., segurança nos seus

Enquanto isto não se der, conti nuará sujeita a tôdas as torções das ideologias, por mais que nos esfor cemos em entendê-la e fazê-la en tendida e defender-lhe o pensamento objetivo, claro, firme, a um tempo tradicional e renovador.

A edição da SPES, com os estudos que antecedem o texto da Encíclica, 6 um passo nesse sentido, que se deve louvar, para que outros o imitem e ampliem.

ciamentos anteriores: os temas e a do interesse em torcer-lhe o signifiorientação, a base e o espírito con tinuam os mesmos. Apen:is, verifi cando a existência Jc uma realidade — que é diversa, hem diversa, na turalmente analisa e antevisão luminosa aspectos mais sérios c graves. Não é possível, contudo, continui o do cumento ontregUG às análises parci ais, e parciais nos dois sentidos: da falta de integração, que nelas se nota, do pensamento da Igreja, e cado e o alc:ince.

BARBOSA LIMA E SEUS IDEAIS

REPUBLICANOS

(Conferência na Academia Brasileira de Letras, cm comemoração do primeiro centenário do nas:imento do grande republicano e que a nossa revista tem a honra de publicar cm primeira mão)

Quem estuda os últimos anos do Im pério e a fundação da República, não pode deixar de espantar-se com a in fluência que, nessa quadra do nosso evolver político, exerceu o Positivismo, apenas oito anos depois de fundado o Apostolado de Miguel Lemos e Teixei ra Mendes.

IO espanto desaparece, porém, quando se sabe que muito antes de Miguel Le mos e Teixeira Mendes, e também pa ralelamente a êles, numerosos foram os adeptos de Comte que contribuiram pa ra a formação, entre nós, de uma at mosfera carregada de pos’tivismo.

Ao estudar "Pedro Lessa e a Filoso-

Herbcrt Spcncer, chcgam-no.s hoje com vigor atenuado, como uma controvérsia entre irmãos ou primos”.

Aceitando apenas o espírito geral da doutrina e o seu método, sem. aderirem ao culto e ás prescrições da ReligTio da Humanidade, foram os positivistas inde pendentes que, na.s duas últimas déca das do século passado, tornaram po.ssível encontrasse entre nós rcssonânci.i po lítica a ação sistemática da ígrcj i o Apostolado de Miguel Lemos e Teixei ra Mendes.

Sem êsses positivistas independentes (muitos dos quais ingressaram no m.igistério superior e secundário, militaiam fh Positiva em São Paulo”, observa Mi- na imprensa, participaram do Governo guel Reale que, tomado cm seu sentido Provisório, da Constituinte e das íisscmglobal, com seus princípios e coorde- bléías e governos estaduais, além dc nadas bem definidas, indo da crença no ocuparem importantes po.stos no Exército determinismo universal até à certeza da c na Marinha, no alto funcíonarsmo, na capacidade cmancipadora do homem sõ- diplomacia c na magistratura) quase bre a n"tureza — foi o Positivismo o nula teria sido a influencia política do eixo cm tôrno do qual girou o ”est'do de Apostolado, afastado do postos de goesfnrito de tôda uma geração”. Se, por vôrno c demasiadanicnte envolvido cm vêzes, são visíveis as diferenças de in- problemas litúrgicos, assim como se foi terrretação, variando com a personali- tornando imperceptível, cm no.sso cedade dos autores, esta circunstancia, cn- nárío cívico, depois de escassearem en tretanto, não destrói a linha comum de tre nós os discípulos de Comte alheios pensamento, ligando correntes e teorias so grêmio de Miguel Lemos e Teixeira que, na época, se supunham distancia- Mendes, das. E, assim, acentua aquêle publicis- Barbosa Lima foi, como Benjamin ta, livros "como o de Sílvio Romero. Gonstmt, Pereira Barreto, Júlio de Cas"Doufrirui contra Doutrina”, contrapon- tilhos, Lauro Sodré, João Pinheiro, De do com veemência Augusto Comte u métrio Ribeiro, Silva Jardim e Borges

de Medeiros, um dos numerosos adeptos do sistema filosófico e político de Au gusto Comte qiic, no Brasil, o transpu seram do plano puramente teórico c doutrinário para a prática da nossa vida púbKca c social. ●

Pertencia cie h falange de discípulos formados por Bcnjamin Constant lu Es cola Militar, os quais, pela sua cultura científi a o geral, passaram á história como sendo os ”c detes jilósofos”, tal a soma dos seus conhecimentos cm todos os setores do saber.

Foi exatamcnlc esse lastro de cultura

geral — cicntifxa, literária, histórica e filosófica — que imprim’u á ação po lítica de Barbosa Lima uma solidez e uma coerência que o torn. m uma figu ra singular cm nossa vida parlamentar, desde a Constituinte republicana até ser extinto o Congres-so Nacional com a vitória da Revolução de 3 de outubro de 1930.

Alexandre José Barbosa Lima, filho de Dona Rita de Cássia

Cintra e do Dr. Joaquim Bar bosa Lima, nasceu cm Recife a 23 de março dc 1S62,

Seu pai, cearense de nascimento, di rigia nessa época um colégio na rua Aurora. Não sondo bem sucedido nesse empreendimento, resolveu o Dr. Joaquim Barbosa Lima ingressar na mag‘stratura.

Com a unidade da justiça, então vi gente, a magistratura significava, no Império, interminável nomadismo. Os magistrados, como se fôssem ciganos, percorriam as diferentes províncias do p.íís, carregando suas famílias, em geral numerosas, cm viagens constantemente renovadas, através de estradas péssimas, cheias de c"nseira.s e perigos. Era co mo se fóssrm os caixeiros viajantes da justiça brasileira.

Foi o que ocorreu com o pai de Bar¬

bosa Lima que, a partir de 1864. foi juiz no Ceará, em Minas, no Pará, em Go'ás, Scrg pc, Alagoas e M.to Grosso. Em Goiás, no Alto Tocantins, os ín dios apinagés aind.i pcrambulavam des pidos pelas ruas da cidade de Boa Vis ta, quando nela o Dr. Joaquim Barbosa Lima exerceu a judicatura.

Em contato com tantas províncias di versas desde a infância, exatamente quando mais \avas sâo as impressões, foi que se formou a alma fund.mienlalmento brasileira de Alexandre José Bar bosa Lima. Ainda menino, póde reco lher aspectos c imagens do Goiás sel vagem, da pacata Fortaleza e d-’.s alcantiladas montanhas de Minas, daí de correndo para êle o benefício de uma visão panorâmica do Brasil.

As primeiras letras, aprcnd'd.is no Alto Tocantins, foram comple tadas em Minas com sóVdas hu manidades, tendo b latim à frente: Juiz de Fora, Lawas e Trôs Pontas foram as cidades mineiras.em que Barbosa Lima adquiriu a sua in.strução básica.

Tão grande proveito tirou dôsses estudos que, em 1879, aos 17 anos, obteve matrícula na Escola Politécnica do Rio de Janeiro.

Sondo, porém, extremamente parcos os vencimentos de seu pai, e tendo ou tro irmão cm idade de cursar o ensino superior, resolveu abandonar a Politéc nica para matricular-se na Escola Mili tar da Praia Vermellia, sentando praça como soldado e procurando merecer, pe la excelência de seu rproveitamento. a promoção a alferes aluno, o que conse guiu em janeiro de 1884.

Como observa Barbosa L’ma Sobri nho. o grande rontinuador das tradições intelectuais e cívicas de seu ilustre tio, êsse passo havia de ser decisivo, por-

quanto “aproximou Barbosa Lima de Benjamin Constant, cuja personalidade 0 iascinara com o duplo prestígio da inteligência e da nobreza de caráter”.

Não demorou a incorporar-se à corrente positivista, cuja doutrina aprofundou, dedicando-Ihe as sobras do seu tempo no exaustivo regime de estudos da Escola da Praia Vermelha, Formou-se, assim,

o seu espírito na forja ciclópica da Fi losofia Positiva, para nunca mais querer Outros métodos, outra disciplina mental.

creve o Professor Tocary Bustos nu tese “O Positivismo e a recMdadc brasileira”,

com quo conquistou a docência du ca deira de Política da Faculdade dc Filo sofia e Letras da Universidade dc Minas Gerais. Não foi dentro da,s mochilas que os nossos oficiais trouxeram o ideal re publicano, mas ele aqui chegou nas pá ginas dos livros, que, vindos da França, traziam uma mensagem política, <pic era também uma nova concepção da vida: o positivismo”.

tribuna do Congres- na SC na

“Mais tarde, o declínio da vida, quan do já emancipado da ortodoxia comtista, repetia Barbosa Lima, a todo momen to, idéias e sugestões do filósofo dc Montpellicr. E era pela profundeza dc sua cultura filosófica que a sua inteli gência se habituara a considerar, em todos os problemas, o aspecto geral das queslõe.s, libertando-as dos fatores su perficiais para ligá-las a um sistema mai.s amplo de determinantes. Em iodos os seus trabalhos, so, ou no jornalismo, Barbosa Lima revelava, antes de tudo, o filósofo, o ho mem habituado a considerar o que de mais geral apresentavam os problemas. Sua inteligência procurava' sempre, sucessá|o das serranias, aquela cordi lheira mais distante, que se vem perdei sempre no azul e no infinito”.

A Escola Militar da Praia Vermelha não se limitaria a influir sôbre a forma ção intelectual de Barbosa Lima. Foi ainda nela que se modelaram as suas doutrinas políticas, exercendo êle poi êsse tempo a Vice-Presidência dc uma sociedade abolicionista, e declarando-se desde então republicano.

“E’ ridículo imaginar-se que o repu blicanismo de nossos oficiais tenha .sido adquirido nos contatos com os seus ca maradas subnos, durante a guerra da Tríplice Aliança com o Paraguai — es¬

Dom Pedro II, que o coniiccia das bancas dc exame, não achou, com a sua costumeira magnanimidade, constituís sem as tendências política.s de Barbos.i Lima um obstáculo para nomeá-lo pro fessor de Geometria Analítica da Escola Militar do Ceará, criada em IStSO. Foi, portanto, cm Fortalezii que o en controu a proclamação da República, passando então a ocupar um dos lugares de secretário do govôrno rcpuldicano do Ceará. E, desde êsse momento, empol gado pela política, só a deixaria com a morte.

Eleito Deputado constituinte Ceará, logo grande Assembléia pela variedade o segurança dc sua cultura.

Com Demétrio Ribeiro, Júlio de Castilhos, João Pinheiro, Borges de Medei ros, Lauro Sodré, Moniz Freire, Rangel Pestana, José Bevilaqua c numerosos outros discípulos de Augusto Comte, defendeu a liberdade religiosa, impug nando o projeto de Con.stituição, que Ruy Barbosa emendara, c que não só mantinha os bens da Igreja imobilizados à discreção do govôrno, através da le gislação de mão morta, mas ainda e.xcluía do país a Companhia de Jesus e proibia a fundação de novos conventos e ordens monásticas.

E’ que Ruy Barbosa ainda estava por pelo se destacou Barbosa Lima na

êsse tempo muito imbuído dos precon ceitos anticlericais decorrentes de seu convívio com Saldanlia Marinho e outros maçons da época.

Fiel ã verdade histórica, o grande caló lico — Dr. .úntônio Felício dos San tos, diretor de “A União”, — deu u “O Jornal” em guinte depoimento sôbre

Igreja relativaincnle ao

celebrado, há quarenta anos, na própria capital do Catolicismo.

“Como '.SC .sabe, grufas aos votos dos positivistas, puderam os dcputado.s ca tólicos fazer passar, na Constituinte, a liberdade da Igreja, que passou por 6 (seis) votos apena.s”.

Defendendo a separação dos dois Po deres, Espiritual c Tcnqxiial, como a entendiam os seus correligionários, disse Barbosa Lima, na sessão da Constituin te de 13 de janeiro dc 1891, ser Deus “uma hipótese (pic, durante algum tem po, foi capaz de prestar serviços ã hu manidade”.

“E’ que os nossos Arcebispados, dos quais, no advento da República, não c.Nistia senão um, fundado ha\ia mais de dois séculos, são hoje, decorrido apenas meio século, dezessete; os buspados, que eram apenas onze, são agora cinquenta e seis; as Prelazias e Prefeituras Apos tólicas, enfim, de que não havia nenhu ma, sobem atualmente a vinte c cinco”.

Contribuiu ainda Barbosa Lima, com seus correligionários positivistas, no sen tido dc ser rejeitada a emenda dc (^»simiro júnior c Lopes Trovão atinente à adoção do divórcio.

Eis. a respeito, o depoimento do Car deal Dom Carlos Carmclo de Vascon celos Mota na conferência que, em 3 dc maio de 1958, pronunciou cm Belo Horizonte, no forum político do Partido Trabalhista Brasileiro;

ao impugnar a

Tornou, assim, claro que defendia a liberdade da Igreja levado por um prin cípio sociológico, c, emenda de Ruy Barbosa atinente á ex pulsão- dos jesuítas, dizia: ó decretar medidas como 8 de outubro dc 1925, o sea separação da Estado:

O que é preciso não esta; o que c preciso é opor aos argu mentos espirituais outros argumentos da mesma natureza, que c,sclarcçam o poDaí chegava u conclusão de quo separação da Igreja rclativamcntc ao Estado seria um benefício para a própria Igreja, previsão confirmada por Aquino Correia cm sermão proferido na Igreja da Candelária cm 10 de juUio do 1939 a propósito.do Primeiro Con cilio Plenário Brasileiro'. vo'

“No Brasil, ainda tivemos um exem plo que é digno de recordar, o exemplo dos positivistas que, cm 1891, livraram o Brasil do perigo do divórcio: porqiio, entâo, ua primeira Constituição da Bepública, os católicos estavam completamento desarvorados c mis tu7o tínhamos nenhuma organização para falar no p :rlamento. O que nos valeu provldcncialmente foi que os posithãstas cerraram fileiras coiitra o divórcio ...

Dom

“A sombra da liberdade republicana, tanto prosperou a Igreja no Brasil, que hoje nos deslumbra com o espetáculo dêste Concilio, mais numeroso e magnificente que o de tôda a América Latina,

“Os autênticos positivistas sempre se bateram contra o divórcio e esta foi a felicidade do Brasil. Podemos repetir algumas palavras da Bíblia: a nossa sal vação vem dos nossos inimigos. Nesse ponto, não foram inimigos, foram ami gos, foram defensores da boa causa”.

Na Constituinte Barbosa Lima repre sentou o Ceará; na Câmara Federal, Pernambuco, o Distrito Federal e o Rio Grande do Sul; e, no Senado, o Amazona.s.

IDo que foi a sua atuação nas duas casas Qo Congresso, invoco o depoimen to de Eloi de Souza, seu colega em vá rias legislaturas. Depois de assinalar que Barbosa Lima enirentou os maiores oradores pailamentures de seu tempo Gastão da Cunha, David Campista, João Luiz Alves, Germano Hassiocher, Augusto de Freitas, Carlos Peixoto e oiuitos outros, observa que a todos êles cra Barbosa Lima equ.valente, salvo num ponto — “o da universalidade do saber”.

E compreende-se que assim fôsse por ser, como vimos, a sua formação cientí fica, filosófica, literária e histórica ali cerçada, nessa "catedral de idéias”, ou Suma Filosófica, que é, no dizer do Gabriel Tarde, a construção de Augus to Comte.

Levando a sério o trabalho parlamen tar, faLva Barbosa Lima várias vezes em cada sessão e ocasiões houve que pronunciou mais de cem discursos oum só mcs. Eram manifestações vi brantes, eni que havia "verdadeiras fulgurafôes”, c nas quais a eloquência de^rria, não de cnieiles retóricos, frios e convencionais, mjs da veemente pai xão do bem público, da variedade e profundeza d.i cultura com que impri mia irresistível fôrça aos seus argumen tos.

Em defesa da atitude de Barbosa Li ma, Lauro Sodré e dc seus correligio nários ao combaterem no Parlamento a obrigatoriedade da vacina, vou liistoriar, rapidamente, à moda de Tácito — íiric ira ac studio — o que então de fato se passou.

Como se sabe, uma das acusações mais frequentes contra os positivistas 6 a de acharem que a ciência parou cm Augusto Comte, na vacina, nem na cróbio.

núo acreditando por isto, existência do inia mm-

Sendo a Filosofia Positiva aind to recente no comôço do nosso século, contrariava de modo cho ante os hábi tos mentais então estabelecidos, divul gando-se sôbre el.i e seus adeptos as mais disparatadas versões.

cm suas no

Não sendo preparadas de antemão, imagens brotavam, espontâneas, da vibração de seus sentimentos patrióticos e de suas inílam.adas convicções filosó ficas e republ.canas.

A prova disto encontramos, entre mui tos outros episódios parlamentares, caso da vacinação obr gatória, até hoje tão mal contado e símplòriamente ex plorado contra Barbosa L'ma, Lauro Soóré, Teixeira Mendes, Bagueira Leal e demais adeptos do Positivismo.

Nada, entretanto, menos cstranhávcl, porque são sempre mal recebidas pelos homens as verdades novas felizes forasteiras^' Fontenellc.

tf essas in— na expressão de

Ao traçar o quadro dos costumes, ciências e artes do reinado do Carlos I de Inglaterra, conta David Ilumc que descobrindo Ilarvey a circulação do san gue, nenhum dos médicos do tempo, cuja idade atingia aos quarenta anos, lhe aceitou nunca a irrefragável argu mentação a respeito. Ao contrário, caiu em imenso descrédito, perdendo inteirnmonte a sua clínica em Londres, tais os sarcasmos e remoques de que foi ví tima. Criou-se mesmo a denominação pejorativa dc circuhidor para designar os partidários de Harvey, c, no "Mal do Imaginaire”, um dos personagens de Molière se gaba de haver sustentado uma tese contra os "circuladores”.

Já quando se d vulgara a descoberta de Servet, nem mesmo Vésale e F..1Ópio, dois dos mais intrépidos inícíadores da anatomia moderna, admitiram a sim-

pies existência das válvulas venosas e que, em parte, decorria dos trabalhos dêles próprios!

tàricimcnte, mais ou menos hostis aos desenvolvimentos ulteriores, aos quais cessam de poder dignamente concorrer”.

na moci-

0 mesmo se dou cm França com a lei da gravitação universal formulada por Newton. Para ser aceita com tô das as suas consequências, foi preciso desaparecesse a geração que. d de, adotara a teoria dos turbilhões de Descartes.

Tão lento 6, ponderará o historiador filósofo, o progresso da verdade, mesmo quando não tem a cntravâ-lo as preven ções partidárias ou a stipersVção!

Tnmbém

fonógrafo de Éd‘son, já no último quartel do século XIX — tal a fôrça do misonc‘smol — foi declara do, pela Academia de Ciências do Fran ça, após longo exame, fruto de charla tanismo c simples residtado dc ventriloquia. "por não ser possível” — são os termos do parecer da comissão que le vou mais do seis meses a estudar o nõvo invento

admitir-se que um vd. metal

substitua 0 nobre aparelho da fonação humana”!

No Rio de Janeiro, cm 1834, ao in formar sôbre a provisão dc um privilé gio de iluminação a gador declarou “que um impostor, porque torcida”.. .

gás, um Desembarpretendente era não há luz sem

O que hoje se dá rclativamcnte à Filosofia Positiva, aconteceu também com a Filosofia Monoteista, p.or ocasião de seu aparecimento.

Sócrates, como se sabe, foi condena do a beber a cicuta por ser monoteista. Maomé foi vítima das maiores lutas e perseguições antes de conseguir fazer adotar o seu sistema.

A Filosofia Aíonoícís/fl Cíjfüíicn en controu, igualmcntc, a maior resistên cia por parte do politeísmo exausto.

Sendo, na verdade, o cristianismo pou co acessível à mentalidade da época em que surgiu, tôdas as exccntric'dades, individualmente peculiares nos cristãos, eram atribuídas, não a cada um dêles cm particular, mas ;\ doutrina de que se diziam adeptos.

Assim 6 que foram feitas ao Cristia nismo as acusações mais cm desa^ôrdo com aqudo mesmo que era por êle pre gado.

Tertuhano. em seu vigoroso e brilhan te "Apologótico", diz que o òdio no simples nome cristão era tão cego, que, mesmo elogiando as qualidades de um adepto da Cruz, lhe faziam um crime do seu credo.

Assim como i\ Filosofia Monoteíca, até oito séculos devais de havet surgido, também h Filosofin PosHha, mais de um século depois do constHuída, se fazem as imputarões mais absurdas e mais contrárias àquilo mesmo que sina. en-

se tornarem, involun-

Essa tão pronunciada tendência con servadora dc nossa espécie levou Au gusto Comte a proclamar que, em prin cípio, o progresso social repousa, essencialmente, sôbre a morte, porque “pela extrema impcrfe'ç5o de nossa natureza moral, e, sobretudo, intelectual, aque les mesmos que mais pnderosamente con tribuem, em sua virilidade, para os pro gressos do espírito humano, ou da so ciedade, não podem cm seguida conserv r por muito tempo sua justa pre ponderância, sem

E, por uma dessas contradições in"xFilosofia Positiva ciência, iulcando os seus plicáveis, dizem que par^-lisa adeptos que. depois de Angaisto Comte, nenhum progresso científico se possa realizar.

IEntretanto, sendo a sistematização do conjunto das ciências, torna-se a Filo sofia Positiva, como diz Comte, supcquaisquer de seus órgãos, inclusi- nor a

gi-los diretahicnte, como no caso cia sar na, tornada hoje uma afccção sem im portância, que umu fricção faz desapa recer. Assim também atacando os vive até ao seu próprio instituidor, como este mesmo frisou.

Entre as acusações feitas ao PositiWsmo, esta como que obrigatória, tal a sua frequência, se acha a de que não admite a existência do micróbio, porque êste, só depois da morte de Comte, foi definitivamente patenteado...

bnÕes do pus com ácido fênico, estan cam os cirurgiões modernos a fonte dêsse humor mórbido, evitam a infecção pútrida, e, não temendo mais as aber turas articulares e as vastas ablações de substâncias, ousam quais recuavam seus mestres da geração precedente.

operações diante das ao 1883 microscópíco.s.

Para sc acabar com essa balela, basta "Nos casos virulentos tcntou-sc atrarecordar o que, sôbre o micróbio, escre- vós da inoculaçâo, prosocar nos p icienveram dois médicos positivistas, díscí- tes uma doença benigna <iuc os livraspulos diretos de Augusto Comte, o Dr. se de uma doença grave, como sc faAudiffrent e o Dr. Sémérie. ' zia, no século XVIII, relutivamentc à Ei varíola, antes da descoberta da vacina de Jenner. Êste processo havia fic-'do. “Os micróbios podem transmitir suas porém, empírico até os nossos dl qualidades nocivas de um organismo a mm os trabalhos modernos, c notadaoutro, dando, consequentemente, origem mente os dc Pasteur, que o tornaram a d s algumas das conclusões do pri meiro: ias. Fooenças suscetíveis dc revestir a for- racional e sistemático u realizaram, como m epidêmica; podemos defender-no.s salientei, a conquista do micróbio. contra o seu contacto por processos, cujo “Assim como um jardineiro cultiva emp a rego, de algum modo, transformou plantas e transforma as espécies selvaa cirurgia contemporânea”. gens em civilizadas, desenvolvendo cni

Quanto ao Dr, Sémérie, publicou em cada uma delas as qualidades úteis uma monografia intitulada La homem, assim também fêz-se Pastem Conquête du Microbe, que ainda hoje jardineiro de vegetais podería ser subscrita por qualquer microbiologista competente, que só teria de acrescentar-lhe os desenvolvimentos realizados daquela data aos nossos dias.

Dessa monografia são os seguintes tó picos:

Convencido de que cada vírus é devi do à existência de um organismo mi croscópico especial, êlc procura e iso la êsse micróbio, depois o semeia no que ôle chama caldo de cultura, Icvcdo de cerveja, caldo de galinha ou de car

ne, com as precauções mais delicadas, Desenvolvendo-se nos meios orgâni: conservar-se para evitar as causas de ôrro; estuda o em estado de germe, na atmosfera, sob desenvolvimento e a evolução dôsse mia forma de poeira ressequida, não espe rando senão uma oportunidade para pu lularem com a terrível fecundidade dos COS, podem os micróbios

organismos inferiores

“Como livrar-nos dos micróbio.s?

“Destruindo-os, quando podemos atin-

cróbio, sua maneira de nascer e morrer; em que condições precisas de calor oxigenização êsse pequeno selvagem de 0 nova espécie conserva sua propriedade virulenta, em que circunstâncias essa virulência c aumentada ou atenuada.

“Numa palavra: èle cultiva os micró bios e chegou a criar assim, no mundo microscópico, \’aricdadcs novas mesmo raças hcrcditàriaincnte dotadas de propriedades opostas às do tronco do c[ue procedem. Resultado maravilhoso do gênio do homrin que domina e sub mete à sua vontade inteligente os ge radores desses abomináveis flagelos, obrigando-os a perder sua letífera in fluência para se tornarem salutares! O Iransforma-sc cm vírus até e vírus venenoso

ma, Lauro Sodré e seus correligioná rios positivistas de não admitirem a va cina e a c.vistência do micrcibio.

O que aconteceu, entre nós, foi o se guinte.

Pretendeu o Governo, cm 1904, esta belecer a obrigatoriedade da vacina antivariólica. Acharam os positi\-istas que essa obrigatoriedade constituía um aten tado à ciignidadc da pessoa humana c da força bruta, o que os que, em vez

apologistas da vacina deviam fazer ora apelar para a persuasão c a convicção da excelência do processo teraainda acerca pêutico que prcconiá'.vam, como vacínico e o micróbio mortífero em mi-

Mais do que um fato aí um método de.senvolvimentos. cróbio benfazejo. empírico, depara-.se-nos que comporta E’ mais um capítulo lolal da Inimanidade sobre acrescent

fazendo entre nós. agora se ^’om E tanto mais assim sc devia proceder então quanto, por êsse tenqx), devido a defi ciências técnicas dc preparação, muitas vêzcs a vacina não só deixava de apre sentar eficácia, mas até me.smo se maEra nifestava altamente prejudicial, ado à ação o sen plaE' o mundo microscópico que tributário do homem. Denêta. passa a ser pois do cão c do ca\-alo, depois da vi nha e do trigo, ó o micróbio quo, afi nal, é conquistado!

E 0 Dr. Sémérie, assim concluiu, cm 1883, a sua monografia:

“Dia virá cm que um Pasteur do fu turo, tendo cm seu líquido dc cultura micróbios da febre amarela, do có lera e da peste, bá dc mostrar-nos na extremidade dc sua lanceta os filhos do mesticados dê.sses temíveis flagelos trans formados em vacinas dc seus pais. Poi mais distante e -duvidoso que ainda es teja tão grandioso resultado, é possível, c, consequentemente, deve scr tentado, porquanto não ultrapassa os limites per mitidos ao ideal científico moderno”.

Eis aqui, minhas Senhoras e meus Senhores, o que, sôbre as descobertas de Pasteur e as vacinas, escreveu um

pois, um abuso da fôrça, era uma tira nia pretender o Governo impingi-la com a violência do crê nu morre dos Inquisidores.

Augusto Comte era um entusiasta da descoberta da vacina por Jenner e che gou a colocar êste último cm seu Ca lendário dos Grandes Homens, só não o mantendo nêlc por ter sido a sua des coberta apenas empírica, sem que a guiasse qualquer indicação de ordem pròpriamcntc científica, o que só se tor nou possível depois dos trabalhos de : Pasteur.

E é curioso observar que enquanto êste último e sua equipe vinham reali zando descobertas surpreendentes relação às vacinas em geral (de que basta citar a vacina contra a raiva), vacina antivnriólica, por certos defeitos de preparação, vinha sendo objeto de sérias restrições por parte de cientistas do mais alto conceito como uma cnmiscm . os médico positivista apenas quatro anos depois da realização de tais descobertas, isto é, em 1883.

Não procede, portanto, em grau ne nhum, a acusação feita a Barbosa Li-

Isão de bacteriologistas alemães, presi didos por Koch, que, em 1896, encon^●■aram, na vacina antivariólica, além e streptococus, ç bacilo da difteria, en quanto, na América do Norte, Copem.mn 6 Braxall achar m na linfa vacínica mi cróbios dj tuberculose e da eris’pela. Grandes professores e cientistas de fins do século XIX e primeiros anos do atual também se manifestaram sobre os perigos e a ineficácia da vacina antivariól ca tal como era então praticada: na Itália, o Professor Cario Ruata, tedrático de matéria médica da Univer sidade de Perúgic; na França, Peter, cafedrát:co de Clínica Médica da Faculda de de Medicina e Paris; na Áustria, Kaposi, professor e Dermatologia da Uni^rs dade de Viena; na Bélgica, o Dr. Henri Boucher, cientista de renome, o o médico Dr. Hector Grasset; m Ingla terra, entre muitos outros

de Medicina dc Paris, Henri Rogor, cm sua clássica Introdução d Medicina.

Não assumiram, portanto, Bagueira Leal, Te xeira Mendjs, B irbosa Lima, Lauro Sodré e demais positivistas, l.tivamente a essas questões, c princi palmente na da vacina, uma posição sin gular. Com eles cncontraram-sc gr mdes bacteriologistas e acatados professôres de medicina de várias Universida des européias e norte-ameriernas.

Crookshand, professor de patologi’ _■ parada e de bacteriologia do K ng s Colb-gc, de Londres; o Dr. Creighton, autor de numerosos trabalhos, inclusive tigo sobre va''ina incluído na Enciclo pédia BriíárifCfl, que sempre foi, sob o ponto de vista científico, uma das publi cações mais autorizadas; Alfred Russel Wallace, um dos cientistas inglêses do maior fama nesse tempo, êmulo de Darwin; e. por fim, o filósofo Herbert Spencer. grandemente conceituado pela :u:. cultura científica e prlnoipalmente bio lógica.

Era natural que essas dúvidas

Dr. Edgar 0 la com0 arsua ocor

ressem então acêrea da vacina e da teo ria microbiana. Achava-se esta em seus que cerprimórdios e muito se tinha ainda invest gar e apurar para esclarecer tos de seus ângulcs ainda obs:uros, co mo 0 da especificidade de cada microorgan'smo, conforme salientava, ainda há poucos anos, o Professor da Faculdade

Mesmo no Brasil não estavam sòziDe igual perecer eram o Dr. B irata Ribe.ro, pediatra de fa tedrático de ortopedia da Escola de Medicina do Rio de Janeiro, c Buy Bar bosa, que, éle só, valia por tôda legião.

ma. cauma

Cegados, porém, pela paixão, nada disto referem os adversários do Positi vismo quando historiam a grande obra dc saneamento re. lizada, no Rio, pelo Govôrno Rodrigues Alves.

0 Dr. Sallcs Guerra, por exemplo, cm sua biografia de Oswaldo Cruz. cita sôbre a vacina frases isolad.is do Dr. Bagueira Leal, de Teixeira Mendes e de outros positivistas, como B rbosa Li ma e Lauro Sodré. Omite, porém, por completo, que o Professor Barata Ribei ro c Ruy Barbosa partiepassem das mesmas opiniões.

Eis, todavia, o que, em 16 de novem bro de 1904, já depois dc fracassada n cham da revolução da vacina, disse Ruy Barbosa no Senado:

“Contrário era e continuo a ser à obrigação legal da vacina. Não sou, entretanto, suspeito. Sempre a pratiquei, em mim e nas pessoas dc minha família e dependônc'a, coneju nto a mi nha experiência mesma, no círculo dos msus, registre um caso gravíssimo dos seus perigos, às vezes fatais. Ma§ n minha antiga confiança nesse preserva¬ rcnhos.

tivo contra a varíola não mc autorizava a impô-lo sob a forma de lei aos meus semelhantes. Eu não tenho o direito de legislar coercitivamcnte para cs ineus con.idadãos a terapêutica do meu uso, por mais autorizada que seja com bons fl_dorcs nacionais e estrangeiros.

“Depois que os CvStudos científicos c trab.dhos médicos, tão amplamcnte administração milit.rizada. ventilados entre nós nos últimos deba tes, derr. maram .sôbre a maté:ia-luz, o meu juízo e o meu sentir dc outros tem pos sofreram o ma’s profundo aba’o.

“A veemência com que se agitou a discussão, c a autoridade respeitável dos conlraditorcs d.» medida proposta mc atrairam a atenção para o campo do Busquei então csclareccr-me fontes seguras e via a in.onsistência da teori.i oficial, cm. cujo nome se preconiza a obrigatoriedade da vacina.

ções constitucionais, a do que o Estado perpetra um crime, assumindo o papel de árbitro nesta lide e ditando penalmente a sua leviana sentença. Não va lem exemplos da Alemanha. A Alema nha é uma nação aquarlelada. Seu di reito constitucional culmina no poder pessoal do Imperador, servido por uma Falem-me da Alemanha nas suas lições científicas. Mas não venham fal.rr a uma Repúbli ca liberal nas lições administrativas e políticrs de um Império moldado no aço dos reg‘mentos dc guerra.

“Duvidosa pende ainda, aqui, a ver dade científica. M.^s, por isso mesmo, quanto à verdade jurídica não pode ha ver dúvida alguma. Assim como o di reito veda ao peder humano invadir-nos a conseiêncii, assim lhe veda transpornos a epiderme.

“Uma envolve a região moral do pen samento. A outra a rcg'ão fisiológica do organismo. Dessas dvias regiões se forma 0 domínio impenetrável da nossa personaldadc.

“£ moralmcnte uma opinião impug nada por outras opiniões. Grandes apa rências a recomendam. Gr..ndes fatos a desautorizam. Não chegou a ser uma verd.idc prcmulg.;da. Apenas está na categoria das hipóteses controvensas. No “Até aqui, até à pele que nos reveste, longo processo de verificação, que tcni pode chegar a ação do Estado. Sua atravessado, r.s mais sérias objeções a polícia podería lançar-me a mão à gola desmentem. E, se a certeza científica do casaco, encadear-me os punhos, lanainda a não reveste, como é que a aco- çar-me ferro aos pés. Mas introdiízir-me lhem sob o império d.a Lei? Os sábios nas velas, em nome da higiene pública, contendem. Como é que o legislador rs drogas da sua medicina, isso não poresolve, tomando voz por uma das par- de, sem abalançar-se ao que os mais an tes? A ciência duvida. Com que di- tigos despotismos não ousaram, reito 0 poder leigo afirm,.? Na esfera “Não o poderia, ainda que elas fôsprofi.ssional o caso ainda se discute livre- sem indub tàvelmente inofensivas. A mente. Que autoridade nos assiste, cn- medicina do meu corpo, como do meu tão, na esfera política para fechar a espírito, me pertence. Os que se tequestão e reduzir, a golpes de penalida- merem do contágio, preservem-se com de, os dissidentes? a ino; ulação recomendada. Eu tenho o os combate. em

“Neste assunto, é hoje, pois, convic- direito incontestável, renunciando à imuçáo minha, só uma certeza existe: a de niz çáo, de correr os riscos, ao abrigo Estado comete uma violência, a de cujo alcance estão os imunizados. “A vacina, porém, não é inofensiva. que o de que o Estado exorbita das suas íun-

Há, pelo menos, a esse respeito, as dú vidas mais graves.

la-

modificações em pontos importantes d;j teoria microbiana, a qual ainda hoje veir recebendo decisivos aperfeiçoamentos.

_ Logo, não tem no me, na categoria dos crimes do poder, a temeridade, a violência, a tirania a que êle. se aventura, expondo-se, voluntàri: mente, obstinadamente, a me envenenar, com a introdução, no meu sangue, dc- magístralmente desenvolvido por Barbomn vírus, em cuja influencia existem os sa Lima Sobrinho ao analisar-lhe iIS Cbmais bem fundados receios de que seja plêndidas monografias .sobre Dom Vital, condulora da moléstia ou da morte.

“O Sr, Barata Ribeiro — Muito bem.

O Sr. Ruy Barbosa — O Estado ma ta, em nome da lei, os grandes crimi nosos. Mas não pode, cm nome da saú de pública, impor o suicídio aos ino centes. Os condenados antigos recebiam das mãos da autoridade a taça do veneMas eram condenados, a quem se infligia diretamente a morte como expiaçáo dos seus crimes, reais ou su postos”.

no. so na um um

Fica assim provado, minhas Senhoras e meus Senhores, através dêste discor de Ruy Barbosa em 1904, no Sena do, que Barbosa Lima, Lauro Sodré, Bagueira Leal, Tei.xeira Mendes e de mais positivistas não estavam isolado;' maneira pela qual encaravam a obri gatoriedade e mesmo o mérito da vaci na tal como esta se apresentava cm seu tempo, isto é, com sérios defeitos na sua técnica de fabricação, de vez que se achavam na companhia de um Ruv Barbosa e de um Barata Ribeiro; de Herbert Spencer, de um Wallace, de Creighton em artigo, como disse, incluído na Enciclopédia Britânica; de um Koch, de um Kaposi, de um Grasset, dc um Croüskshand, de um Peter c de um Cario Ruata, entre muitos oiitios. Foram mesmo as restrições de cientis tas tão notáveis que levaram os bacte riologistas não só a aperfeiçoar o fabri co da vacina antívariólica e das vaci nas em

Já muito longa vai esta palestra. Não posso, pois, deter-me cin cstucirr o lí.irbosa Lima historiador, a.specto <{iie foi

Bispo de Olinda, e sobre a Rcvoluç-ruPcmambucaiia de 1817, cm confercnei.i realizada êste ano no Instituto líi.stórico.

Nem também posso focalizar o jorna lista fulgurante que se revelou Barbo.sa Lima em sua colaboração cni “O Nacionalista”, em “O Século” e nu “Gazeta de Notícias”.

Não quero, porém, terminar .sem sa lientar dois aspectos característicos da personalidade do grande rcjjublicano.

Um é 0 do pacifista, confiante na crescente supremacia do altruísmo, ini' pondo-se aos estadistas e òs multidões.

Por isto mesmo, de acôrdo com as suas convicções doutrinárias, não aceitava nos fatos sociais o exclusivo critério da in terpretação econômica, isolada dos fatôros morais e “esquecida da reação dôste sôbre aquôles, podendo atingir proporções extraordinárias”.

No discunso que pronunciou ao ser recebido, em 1908, no Instituto Histó rico, dizia Barbosa Lima como cjue tmtevendo os anseios unânimes de nossos dias:

“Do mais profundo seio da multidão anônima vêm acordando em tôdas as pátrias os que não querem a guerra. Os humildes despertam e, nfio conhe cendo fronteiras, arregimentam-se. Ain da incoerentes, unem-se, desunem-se, reunem-se, deprecam, requerem, quei xam-se, expõem, e, por fim, formidàvclgeral, mas ainda a introduzir ■ mente, impõem. Essa é a nova fôrça

com que, queiram ou não queiram, hão de contar os que sofismam ou procraslinam a pa?., o.s potentados que improvi sam as guerras para proveito dos ricos que querem ficar mais ricos”. A fór mula “si vis pneem p-.rci haUum” pareda-lhc falsa e ele a desdobrava cm suas duas faces \-crdadeiras: “si vis belliim para bellum” e “si vis pacem para pa cem”, como demonstrações da eficiên cia do poder espiritual, na di?fcsa dos ideais de que O.sório, o m.ignànimo, foi apologista eloquente, proclamar “que o momento mais hdi/. de sua vida seria aquêlc cm que lhes dessem notícia dc que os povos, os civilizados pelo meno'^, festejaram a .sua confraternização, quei mando os seus arsenais”.

Outro aspecto da personalidade dc Barbosa Lima, aiíula hoje de palpitante atualidade, é a coerência dc sua atitu de ao sustentar, de aeòrdo com suas conVÍCÇÕC.S filosóficas, cjue só o pensamen to vcnco c detém n pensamento, cons tituindo uma insensatez imaginarem os homens que a inteligência possa ser imo bilizada pelos grilhões policiais.

Na Constituinte Republicana, a prO' pósito da expulsão dos jesuítas e dc ou tras restrições à liberdade da Igreja que Ruy Barbosa tentou introduzir na Cons tituição dc 1891, dissera Barbosa Lima, como vimos, que nas questões doutriná rias "é preciso opor aos argumentos es pirituais, outros argumentos da mesma natureza, que esclareçam o povo”.

Trinta e seis anos depois, ao subir, pela última vez, à tribuna parlamentar para impugnar a lei que impedia a pro paganda do comunismo, repetiría Bar bosa Lima o mesmo conceito de inflexí vel liberalismo: o que era preciso reiterava êle — “era opor, aos argu mentos espirituais, outros argumentos da mesma natureza”.

Eis a pcror.iÇião desse memorável dis curso, canto de cisne do indefesso lidador:

“Nenhum governo tem a verdade dou trinária definitiva nas mãos. A sua mis são é assegurar a li\rc critica c a 1í\tc exposição de tôdas as doutrinas, porque dentre elas o dessa discussão é que pode surgir, fulgurante, a verdade. A verda de andou soterrada nas catacumbas, per seguida na pessoa de seus confessores, e SC chamou, do ponto dc vista moral, a verdade crista. Quanto mais perse guida, mais forte e mais próxima da vi tória aurcolada pelo martírio. A ver dade foi Ncro e foi Domiciano, c, sem embargo de t(kla compressão, a verda de moral veio a ser Constantino e Teodósio.

“Que competência tom o governante, que dispõe da espada, símbolo da auto ridade material, para decretar a verda de, quando a fragilidade das suas deli berações 6 de tal ordem que não pode sequer decretar o preço da subsistência? Ainda quando, na melhor das intenções, decreta uma tabela máxima de preços, o incocrcívcl das leis econômicas a afo

ga c não há tabela que resista. E, | se assim é no domínio dos fotos mais

familiares da viái\ de cada momento, o | que será em relação aos conflitos entro sistemas políticos que caem e sistemas | políticos que surgem? ^

“Pode o governo enrolar a bandeira ^ ● que a revolução de 15 de novembro deu } aos brasileiros. Ela se desfraldará um ! dia, para as realizações de .sua incom parável divisa — Ordem e Progresso.

“Nem os retrógrados que falam e.xclusivamente em nome da ordem, po dem furtar-se ao progresso, nem os re volucionários, impacientados na concep ção que alimentam em nome do progres so, podem abstrair da ordem. Os veI

Ihos Republicanos só compreendem a República, conciliando a ordem com o progresso. Nem é possivel progredir,

se surgem”.

leis astronômicas não capitularam diante do despotismo passageiro. Também as I a República capitularão diante dos déspotas que a pretexto da segurança pública, se fica impedido de estudar os problemas que cad; momento suscita e de examinar

Admirador entusiasta do Apóstolo das Gentes, cujas qplstolas imortais constan temente relia. Barbosa Lima, cm seus derr deiros dias, ao rememorar a sua própria vida, tôda de luta por ideais superiores, poderia parafrascá-lo c di zer:

as verdadeiras soluções que êles com portam, mercê da liberdade de critica, da liberdade de exposição, da liberdade de tribuna, da liberdade de consc'ên ia. Os melhores filósofos, infensos sob diver sos, aspectos à Revolução Francesa, crítíerndo a fórmula que lhe ser\'ía de di visa, excluíam o têrmo méd o — igual dade — mas conservavam os dois extre mos — liberdade fraternidade. ... terminei a minha carreira; fidem sero''

Mas, Sr. Presidente, a vitória será efêmera. Não há mão de déspota que possa comprimir definitivamente os es tos do ser livre.coração de um povo que quer

A liberdade ressurgirá c os pretorlanos com os seus centuriões que de I:nça erguida supõem' poder impedir que ela caminhe avante, iluminando cenário brasileiro, esses tombarão terra, como os soldados que guardavam 0 sepulcro de Cristo no terceiro dia do drama do Gólgota.

íí Bomtm certo77Jen ccrtavl: eu comba tí 0 bom combate; ctirsum coijsummovi: vi: conservei-me fiel aos ideais de lileis sociais que iluminam não

berdade, justiça c fraternidade; in rcliqiio, reposita at mihi corona jiisiitiae: eis por que um dia será a minha me mória cultuada. Tendo-me esforçado por desprender-me das contingências do meu próprio cu, procurando viver para outrém — a família, a pátria e a human‘dade, hei de reviver um dia nalembrcnça de meus compatrícios.

por cosenque a terra j zia imota

“E digo, por úlfmo, com a mais ar dente fé, que se d.rá, em relação ao ideal republicano, que ora se procura sufocar, o que se deu com o egrégio Galileu. E’ certo poder-se afirmar mo o grande astrônomo, depois da tença que o fulm nou — e pur si muove. Ainda que lhe tivessem arrancado a confissão de

no seio do mundo, a sua convicção cien tífica, inabalável para todos os cientis tas seus herdeiros, era confirmada frase — e pur si muove. Todavia, e sem embargo da conden'ção, sem em bargo dos pronunciamentos oficiais, as na

Ao completar o seu primeiro cente nário, acha-sc, na verdade, Barbosa Lima incorporado àquele hwisível Câro, a que se referia sua correligionária Geerge Eliot — constituído de mortos imortais que ressusc'tam em ânimos por eles me lhorados e vivem num pulsar só dirigi do a generosos fins; cm nrbres feitos de ousada retitude e no desprezo de am bições miseráveis que se extinguem com 0 próprio ser; em remont do voo de sublimes e claros pensamentos, que da noite os necrumes atravessam quais se fôssem estrelas resplcndentes, e cujo reluzT, constante brando, a mais dignos e vastos horizontes incita sem cessar a busca humana, a encher o mundo de imorredoura música soanto. . .

O ESTADO E A EMPRÊSA

Tiiemístocles Brandão Cavalc/vxti (Palestra rculiz..aa na Cunicucraçao iNacioUai ao Comércio)

^ tema que vamos abordar não se deve situar no plano geral das re lações entre o lüsiaclo c a cmprèsa, ntas da posição que deve assumir o Estado cm face da cmpiêsa privada, nos diversos regimes políticos.

Na realidade, um dos elementos de identificação désses regimes é prccisamente a C{ualiíicação do comportamen to do Estado, em face da iniciativa privada e, mais particularniente, da emprêsa.

A própria conccituação da emprêsa varia, como tem variado a estrutura da emprêsa, mesmo dentro do sistema cliamado capitalista.

Mas, quaisquer que tenham sido es sas variações, dificilmente seria possí vel confundir o conceito de emprêsa, como peça de um sistema econômico em que a iniciativa individual c a au tonomia são essenciais, com aquelas entidades que em outros sistemas, são apenas peças do aparelho do Estado e sujeitas a um regime jurídico que se identifica com o próprio sistema esta-

Poder-se-á dizer, sem receio de er rar, que a autonomia da emprêsa em face do Estado, constitui um índice seguro para a identificação de um sis tema político-

0 Professor Dimock, em seu livro Business and government, csiabcie>.e OS seguintes princípios na compara ção das rcalçòes entre ésses dois e.emcnios — negócios e governo.

Primeiro — nos sistemas que chamariamos embora impròpraimente ca pitalistas, existe um minimo de apro priação pelo poder público das ativida des comerciais e industriais.

Em países como os Estados Unidçs, embora a área governamental se haja alargado, não foi afetado, com isso, o próprio sistema; prcva.ece ainda o princípio da apropriação privada dos ●bens de produção e consumo.

Segundo — Alargou-so a área da regulamentação. Mesmo nos Estados Unidos (a observação ainda é de Di mock) o número de órgãos (agencies) de regulamentação é maior do que em qualquer parte do mundo.

A idéia c de que a regulamentação visa preservar a iniciativa individual ou privada, porque constitui um pro cesso de disciplina dessas atividades, visando coibir os abusos, os monopó lios, a violação da liberdade de ini ciativa, a concorrência, a fraude sob todos os seus aspectos;

O terceiro é o sistema cooperativo que se desenvolve de preferência em certos países de economia mista, notadamente na Inglaterra e na Suécia.

Vem, entretanto, crescendo nos Es tados Unidos, depois da 2.a guerra.

Pouco importa que haja variantes, que o grau de integração no sistema estatal obedeça a tôda uma escala; não deixará por isso, o regime de se deíinír pela atitude do Estado em fa ce da emprêsa.

O quarto finalniente é a planificação que tem sentidos diferentes no» I tal.

I^o-s sistemas políticos, que se dife renciam pela natureza e área da ação compulsória do Estado em relação às atividades privadas.

A economia socialista é necessària, Devemos, por i.sso, excluir da defini ção todos cs-scs serviços que, cm mui tos países não socialistas, ficam nacio nalizados ou ficam sol) a responsabili dade do Estado.

O que define o sistema c o compor tamento do Estado cm face da em presa c dos investimentos privados-

Se o Estado déles se apropria — não há dúvida que sc verifica a socializa ção. niente planiíicada, enquanto que no outro regime, representa apenas uma orientação, disciplina e cordenação das atividades públicas e privadas.

É preciso portanto distinguir sem pre doE aspectos do problema da in tervenção do Estado — o primeiro é o da área da apropriação pelo Estado dos bens de produção — será grande nos regimes socialistas e mínima nos regimes não socialistas.

Se o Estado apenas disciplina a atividade, sem interferir na direção o regime não será socialista.

individuais,

O segundo é o direito emiesmo dever do Esta do, de regulamentar as atividades competência cada vez mais ampla mas que não deve atingir a liberdade de iniciativa nem reduzir a propriedade dos parti culares sóbre os bens e as empresas.

É preciso também dis tinguir o que deve ser sempre de iniciativa in dividual com que 0 que se pode incluir na infraestrutura econômica e que se confun de, muitas vezes, com 0 próprio servi ço público.

Circunstâncias várias têm ampliado essa área — estradas, canais, rios na vegáveis, usinas elétricas, estradas de ferro, transportes aéreos etc. Basta citar os Estados Unidos, que em vinte anos aplicaram mais de 25 bilhões de dólares nos seus rios navegáveis, na

instalação de barragens e usinas elé tricas, sem que com isso se alterdsse o seu sistema econômico ou político.

Quando se fala, aqui, em democra¬ cia, não se entende a democracia puramente formal ou aquela que se traduz pela simples par ticipação ativa do povo na organização do po der, mas um conjunto de elementos sociais,

nómicos e políticos que assegurem ao homem o desenvolvimento de sua ccopersonalidade, entre os quais, a liberdade de ini ciativa, condição do jo go democrático.

As modernas constitui ções que incluem em seu texto, normas relativas à ordem eco nômica e social, representam bem esse tipo de democracia, de que já nos fala va Hauriou, muito antes da primeira guerra mundial. ●

É bem verdade que existem tendên cias e opiniões diferentes, como aque las expostas por Schumpeter (Capitalism, Socialism and democracy), que conciliam a democracia com o socialis mo, dentro evidentemente de novos conceitos que êle chamará theory of democracy”, de conteúdo puanother

, ramente político, baseado no “compclitive struggle for lhe peopIcs’s note”. Será uma democracia fundada em Uma estrutura burocrática, com carac terísticas desconhecidas naquilo que chama a doutrina clássica.

Quando sc íala ein socialismo en tende-se a socialização dc todos os meios de produção c não apenas na expansão da faixa dc intervenção do Estado e dos seus investimentos.

O sociali.smo iran.sfcrc para o Esta do ou, como queiram, para o iiúblico, todo o setor dc atividades econômi cas, hoje entregue á iniciativa parti cular (Schumpeter, op. c'it. 167).

A democracia, dentro do seu pro cesso, pode conduzir ao socialismo, co. nio pretendia Jaurés, mas o mecanis mo democrático não pode funcionar sem a ocupação dc uma boa área das iniciativas econômicas, pelos particula res, porque o conflito dêsses interes ses é da essência mesma do sistema democrático.

Uma estrutura puramente burocráti ca não oferece condições para o fun cionamento do mecanismo democráti co, baseado na compòtição para obter o voto popular por aquêlcs que pre tendem o poder.

Essa opinião não é pacífica. Schum peter a contesta c procura conciliar os dois termos dc um mesmo proble ma que se nos afiguram impossíveis de um entendimento, porque o meca nismo democrático não se concilia com o de uma sociedade totalniente planificada. É indispensável um mínimo de iniciativa individual e de concorrência

Um eminente político da Nigéria JuHus Momo Udochi, chegou mesmo a afirmar que a democracia pode exis tir mesmo em um regime unipartídário. (The Annals of the American Aca-

demy of Political and Social Science — July 1962 pg. 20).

Tudo isso vem mostrar a confusão

em tóriio das definições e do sentido das instituições, o que não significa que se devam aceitar conceitos forma dos sob a influência dc inlerêsses po líticos do momento.

A democracia tem uma definição política, é antes de tudo, um regime político, mas o seu funcionamento, isto é, a organização do poder através da representação do povo, exige o de bate popular, a luta eleitoral, a con corrência, um mínimo de liberdade e de iniciativas individuais, enfim, um conjunto de circunstâncias que valo.izem o liomcm, prestigiando a sua ca pacidade dc livre iniciativa.

A disciplina levada a extremo das atividades individuais e a redução da livre iniciativa constituem problema grave para a prática democrática.

A questão portanto não c tão sim ples, porque preciso também analisar a natureza e o grau dessa disciplina que pode atingir uma (regulatioii) tal profundidade que tire à iniciativa privada os meios de realizar os seus objetivos.

A regulamentação deve visar principalmentc a eliminação do ilícito na atividade econômica, prestigiando a li vre atividade econômica.

Nada tem que ver êsse problema com, a delimitação da área reservada à iniciativa e aos investimentos priva dos, cujos limites são variáveis; é quegtão apenas de medida.

Os levantamentos realizados mos tram que ela é cada vez menor, nos países subdesenvolvidos, porque au menta a área dos serviços púbÜCos ou mesmo das iniciativas que são repre sentadas por investimentos do Estado.

IDeve-se observar também que as mais das vêzes não se ver.ííca o mo nopólio estatal, mas a panicipação do Estado em iniciativas, muitas v.uzes pione.ras, mas que vivem no regime normal de concorrência com as em presas privadas.

Êsses investimentos públicos não obedecera a um plano, nem a um monopolio, mas a uma pcHt.ca que visa sempre suprir a falta de investimentos privados.

Não sou economista nem tenho a pretensão de pene.rar nesse terreno, procuro apenas tirar conclusões polí ticas e estabelecer definições, em lunÇÕes de dados bem conhe^iüos.

A medida da participação do Esta do na atividade privada, a extensão que possa ter a inic.ativa privada, são índices de um regime polít.co.

£m sua simplicidade, poderiamos considerar, de um lado os regimes po líticos que asseguram ao indivíduo pleno exercício das suas atividades, principalmente as de natureza econô mica, em contraposição às diversas /formas socializantes que alargam a in tervenção do Estado, em de rimento da iniciativa individual e da liberdade-

Existe uma verdadeira escala de in tervenção, desde a simples regulamen tação até atingir-se o máximo de ex pansão das áreas de atividades micas, pelo Estado, que representa final da liberdade do indivíduo o econoo e a sua

incorporação a um sistema político e social que pass^ a ser a essência mes ma da sua vida.

Contingências sociais, econômicas, humanas, impuseram o aumento do que se poderia chamar o “contrôle so cial”, isto é, providências que visam abolir o abuso do direito, reprimir a

desordem social, através de medidas de pro.eção da coletividade.

Por outro lado, as modalidades de sistemas econômicos se multiplicaram e o processo de intervenção do Esta do, permitiu que este viesse também participar de atividades econômicas, dentro de numerosas modalidades-

Por aí se veriíita a diferença entre não intervenção, participação e socia lização, e daí se pode também con cluir que existem fórmulas interme diárias que permitem maior participa ção do Estado nas atividades econô micas, sem que isto importe na elimi nação da empresa privada.

O perigo e.stá na transformação dêsse sistema de participação, em uma ocupação de áreas tão vastas de ativi dades econômicas, que importe na eli* minação da atividade privada, porque então se verificará a transíormaç.-.o do próprio sitema e a abertura do ca minho para a socialização, com a re dução ao mínimo e quiçá o desapa recimento da iniciativa privada.

Não vamos aqui, por ísso mesmo, analisar o problema cm sua comple.xidade, o que envolvería necessariamen te, como fizeram outros, entre os quais Lescure, o exame comparativo dos di ferentes sistemas políticos.

O nosso objetivo é mais restrito trataremos apenas do nosso sistema político e econômico e só eventualraente a comparação servirá para real çar as características dos doís siste mas antagônicos.

Ka verdade, o que distingue o nosso sistema do antagônico, isto é, do regime socialista, é que ali, a empresa se confunde com o Estado e o sisteni» de relação entre empresa e Estado se incorpora ao processo governamental

dentro de uma estrutura hierárquica Conhecida.

É preciso não esquecer que. nesse particular, quaiulo se fala em Estado, não se deve considerar sòmcntc a pes soa jurídica que personifica o grupo humano, nem a entidade política que participa da comunidade internacional, porque sob o ponto de vista jurídico e político, o Estado é represen ado por um conjunto de valores materiais c humanos, que constituem a sua es sência mesma.

Assim, os que se afastam das con cepções jurídicas ou políticas, absor vidos pelas preocupações econômicas consideram o Estado como o conjun to de riquezas, de bens, de empresas, de atividades humanas que integram essa unidade sócÍo-polítÍca que é o Estado.

Mas a verdade é que um conjunto de pessoas, de bens, de riquezas, não podem, por si só, constituir o Estado, que não pode viver sem sua expressão jurídica e política,

Na verdade, a sua personalidade, re conhecida pelo cargo social, exige a organização de um governo e dos ins trumentos de governo ^ue possam exercer, na expressão de Finer, o mo nopólio do poder coercitivo, sem o qual não haverá nem ordem, nem dis ciplina. e, por conseguinte não poderá haver direito, porque dÍrei‘o é proble ma de coexistência, não sòmente entre o*: indivíduos, mas também entre in divíduos e governo.

Ê, portanto, elemento essencial do Estado, sem o qual não podem exis tir, nem viver, nem funcionar — os indivíduos ou empresas, ou so'íedades, ou qualquer grupo humano e o go verno.

Os diversos regimes políticos, os nu¬

merosos sistemas políticos, diferem em grande pane, pela natureza das rela ções que possam e.xistir e que devem existir, entre o governo e os indiví duos ou prejuízos sociais que integram a unidade politica — Estado.

.*\ medida do poder, a medida das liberdades políticas, como elas cem e como o Estado as considera, eis as grandes fronteiras entre os diver sos sistemas políticos.

Não é só o processo de organiza ção dos poderes que distingue o siste ma de relações entre o indivíduo e o Estado, critério que comanda também o sistema legislativo que disciplina a vida da comunidade. Existem muitos outros, que dificultam a classificação dos diversos regimes.

. A tarefa de classificação está bo’e, entretanto simplificada pela definição das ideologias em termos políticos mais objetivos, consideradas as posi ções de cada um, em face dos proble mas sociais e econômicos fundamen tais. se exer-

O professor Lipset dá bem uma idéia dessa revisão de posições, quando mos tra as transigências do lapitalismo com algumas teses, consideradas antigamenle de esquerda, dentro dos pres supostos da economia liberal, e os re cuos de grupos socialistas ingleses as sustados com o seu próprio avanço no sentido da socialização.

Há fatôres que contribuiram para |isso, como a própria crise dos sistemas a evolução das doutrinas humanisticas, o pensamento cristão, as contin gências da política internacional, os problemas do desenvolvimento, etc.

Mas essas transigências não ex cluem a contradição fundamental en tre as duas posições extremas — a que aceita como parte integrante do siste-

Ima estatal, a autonomia do indivíduo e dos grupos econômicos e de outro lado — a que submete ao Estado, to do o sistema econômico, inclusive os que se desenvolvem, no outro regime, dentro do princípio da autonomia-

Se quisermos, podemos qualificar os dois grupos com os rótulos — democrático e totalitário, o primeiro basgado no princípio das liberdades indivi duais e da economia livre, ou policia da e o segundo, o Estado absorvendo a totalidade das iniciativas.

Se quisermos, também, podemos qualificar os dois sistemas dentro do quí(dro das duas democracias.

Um encontra as suas raízes nos prin cípios da igualdade c da liberdade, no sistema representativo, baseado no vo to, 0 outro pressupõe a supressão das liberdades individuais, notadamente a propriedade, e sc constitui como dita dura. A primeira é fundada no pres tígio do indivíduo, a outra no do Es tado.

A distinção não é nossa, econtra-se nas origens dos dois sistemas políti cos. Um se' apresenta como expressão do poder político que sc manifesta através de um sistema representativo do povo; o outro se caracteriza pela emancipação econômica do proleta riado a quem cabe exercer o poder como ditadura de classe.

Um é a democracia ativa e de par ticipação do povo, o outro é a demo cracia consentida e passiva, que «e tra duz na aceitação tácita do regime.

A democracia soviética é uma dita dura de um partido. É um sistema po’ Htico, que tem um sentido discrimina tório, visando, segundo declara, abolir a opressão econômica, enquanto que a democracia ocidental é igualitária, uni versal. São dois estados de espírito,

(luas concepções humanas. O que so bra para o indivíduo no sistema eco nômico soviético c o mínimo possível, somente o que sc pode considerar do méstico em .seu sentido mais restrito.

Existem, é bem verdade, exceções a esse sistema radical, em países so cialistas, como ocorre, por exemplo na República Socialista do Vietnam c cuja constituição protege a proprieda de individual, a herança e o capitalis mo nacionalista (artigo 18 c seguin tes) mas dentro do plano traçado no artigo 9 da Constituição que declara o objetivo de avançar degrau por degrau da democracia popular ao socialismo, desenvolvendo e transformando a e<íonomia nacional cm uína economia so cialista etc., conceitos esses que ape nas vêm (íonfirmando o que acima fi cou dito em relação ao contraste entre as duas economias.

No sistema socialista — comunista, não há lugar para a empresa privada, nem para ,a liberdade de iniciativa e do trabalho.

A democracia portanto não é sòmente um regime político, que pressu põe o voto popular para a organiza ção do poder, será também um regi me social, fundado na igualdade e na ausência de discriminações, pelo sexo, pela riqueza, pela' côr, será também um sistema econômico no qual se admite o livre acesso de todos, às fon tes das riquezas e às atividades econô micas.

Sem esses elementos poderá haver outro regime, inclusive aqueles de re lativa satisfação popular pelo caráter parternalista do governo, não uma de mocracia.

A democracia ocidental que exprinic a filosofia política de uma parte do mundo, tem como condição, o prestf-

gio da iniciativa individual, ou dos grupos organizados na base da liber dade de associaç.ão enquanto cjuc as democracias chamadas populares, sc traduzem no processo de coletivízação da riqueza, eüminando-sc a lil)crdade dc associação para fins econô micos.

Por aí podc-sc compreender a posi ção da empresa nos do.s sitcmas quanto á sua origem c formação c quanto ao papel cpie reprcs'cn;am na vida econômica c quanto às relações que mantêm com o l''stado .

O conteúdo jurídico da cmprêsa se rá também diferente nos dois .sistemas, pela sua integração maior ou mc"or no mecanismo estatal- Dc qualquer forma, porem, exercem funções prólirias na vida c('Ieti\a c no sistema econômico — servem ao indivíduo c à coletividade, mas dentro de um sis tema dc liberdade e.xtrcmamcnte di versa.

A empresa privada, autônoma, com personalidade jurídica, vivendo no re gime da concorrência, representando papel econômico dcfinid\ tendo obje tivos, econômicos, individual e cole.ivamente, c condição do regime de mocrático, fundado na liberdade.

Embora com objetivos de lucro, repre.senta também uma função no sis tema econômico, função que sòmente pode ser dcscmpcniiada Com os direi tos e prerrogativas que possui.

É preciso não dar demasiada impor tância às formas de empresa, o essen cial é a identificação da política eco nômica que orienta cada país.

Melhor do que a forma, define a natureza do regime político, o seu con tendo, o apreço por alguns princípios fundamentais que caracterizam os di versos regimes.

Podem se admitir, é bem verdade, matizes, combinações, mas existem conceitos básicos que caracterizam os diferentes .sistemas, notadamente a po sição do homem 'no conjunto das re lações sociais.

.‘\ empresa é a expressão também dessa evolução, dessa transformação da ordem econômica.

A cmprêsa representa efetivamente na evolução social uma organização já minto de.senvolvida no sentido de uma estrutura mais complexa, não sòmente do ponto de vista social mas também econômico.

Os que estudaram, sob diversos as pectos, a estrutura da empresa, como Sombart, Shumpeter, Max Weber, ou mesmo alguns clássicos como Baudin ou Riperí, destacaram essas caracte rísticas, como processo de distiibuição das atividades econômicas, bem Como da organização do trabalho.

A divisão do trabalho pelos grupos sociais c econômicos, constitui, por isso, o problema fundamental da evo lução da cmprêsa, sem desprezar as características próprias ao sistema econômico — fins de lucro, mercado, participação dos empregados, etc., etc.

É curioso observar a evolução do conceito de empresa e principalmentc da sua estrutura, mesmo em países altamente Capitalistas, no sentido de uma democratização na constituição do capital das empresas e de medidas tendentes à proteção da instituição contra a fraude e os desvios da con corrência.

Berle Júnior foi inexcedível nos seus estudos com Mean e Gaibreith na aná lise crítica dessas transformações.

Até agora, entretanto, não se aba lou a posição da empresa no sistema

econômico nem a essência das rela ções novas que criou.

o

Essas relações se identificam pela colaboração no grupo que a constitui na distribuição das tarefas na sua ad ministração, na multiplicação muitas vezes, daqueles que contribuem para seu Capital, da participação dos que trabalham e contribuem para o pro gresso da empresa.

Por isso é que muitos autores consi deram a empresa como instituição, pe lo conjunto de atividades que repre senta, pela complexidade de sua com posição, pela autonomia de sua estru tura, sob o ponto de . vista social e econômico- É uma universalidade sob o ponto de vista jurídico, afirma Ripert, mas uma unidade técnica e econômica.

O Estado, não se poderia desinte ressar de sua existência e da sua co laboração.

Seria, também, impossível negar as modificações sofridas pelo sistema com a intervenção do Estado na dis ciplina da vida das empresas, e da vida econômica em geral-

Nos Estados Unidos, multiplicaramse as obras com o título “Government and Business”, para mostrar precisa mente a necessidade da participação dos governos na economia, no senLtdo de uma regulamentação legal da vida econômica, visando a proteção do in divíduo, da emprêsa, e da coletividade.

O respeito ao direito das empresas não significa abstenção.

Verificou-se, por isso, uma grande transformação do conceito de emprê sa e uma profunda modificação do seu mecanismo jurídico, mesmo no siste ma capitalista, ou, se preferem, nas democracias õddentais, acompanhando a própria evolução do sistema capita lista com aquilo que se poderia cha¬

mar de socialização dos conceitos jurí dicos, notaclamcnte, da propriedade, na vida moderna.

A expressão não espanta mais socialização — não tem mais somente o sentido que lhe deu a aplicação da doutrina marxista, também significa a predominância, do interesse social, ou, pelo menos, a consideração pelo interesse social, na formulação dos princípios básicos das relações jurídi cas.

Foi o sentido dado pela encícHca —● Mater et Magistra — bem longe de qualquer influencia marxista que per mita integrar no coletivo o que, por natureza, é individual, nada mais é, senão o reconhecimento da comunidade humana, como partici pante natural de tôcla atividade indi vidual, no campo social e econômico. Tem um sentido ético, evidente.

Basta acompanhar a evolução dos sistemas jurídicos sôbre as empresas e, de um modo mais geral, sôbre o conjunto de atividade humanas que se refletem sôbre a coletividade para en contrar um conjunto de medidas res tritivas da liberdade no setor eConôcompreender-se-á,

Socialização então. a mico: transformação sofrida pelas doutrinas liberais nestes últimos 50 anos.

Nos países de economia em forma ção ou em desenvolvimento, as medi das ainda são mais profundas, e atin gem a própria estrutura do sistema, respeitadas as suas bases fundamentais c irremovíveis.

É o que se chama correntemente o poder de polícia — Cpobce power) e que ,se poderia definir como o con junto de medidas tomadas para asse gurar, com a limitação dos direitos de cada um, o direito de todos.

Estas medidas de polícia, impõem a

todos os indivíduos uma série de res trições, a fim dc disciplinar as suas Atividades, em beneficio comum.

Elas visam proteger cada um contra Os grupos econômicos, contra os mo nopólios, contra os al)usos do poder oconóinico, contra lôda espécie de íraude, contra os grupos de pressão degítimos, contra tôdas as formas de violação da liberdade de concorrência oic., etc.

Hem aplicadas, e.ssas medidas garan tem a pro.speridade do comercio pela Certeza de que as empresas sofrem um Policiamento correto.

Não basta ter bom sistema repressi vo, também uma boa prevenção e ne cessário. Basta citar como exemplo, a “ sccurities and cxcliange coinmission dos Estados Unidos que parte do prin cípio de que não deve caber o contrôíe e a fiscalização, àquele que possui A maioria ou é responsável pela admi nistração.

Pois bem, essa comissão exerce a mais severa fiscalização sôbrc as emprêsas, com poderes de investigação etc. (ver Luois Loos — Sccurities Regulation), com o intuito de proteger os investidores, contra a fraude c os atos lesivos do patrimônio individual.

O progresso dos meios dc comuni cação e propaganda, multiplicou tam bém os métodos dc fraude, aumentou despropositadamente o número de re lações humanas, de operações de todo tipo, complicou o sistema de convivên cia, exigindo, assim, do poder público, maior fiscalização, melhor proteção e amparo-

Os métodos destinados a atender a essa polícia, também haveriam de so frer aperfeiçoamento. A técnica admi nistrativa aprimorou-se, estendendose a tôdas as atividades humanas, in¬

dividuais ou de grupo, que mereçam ser disciplinadas.

Cada um de nós sofre individualmen te as medidas dc policia — do tráfe go, da saúde pública, da atividade pro fissional mesmo liberal. As empresas sofrem restrições semelhantes.

Não perdemos a liberdade, com es sas restrições, também as empresas podem soírê-las, sem perder as suas características próprias, a sua perso nalidade, as condições elementares de funcionamento livre.

A preservação desse mínimo de vi da é que constiiui a base do problema.

Quais devem ser as relações reci procas entre a empresa e o Es;ado e o Estado c a empresa? resposta estará cm função do sis tema político e econômico, consideran do-se o período de integração da em prêsa no sistema estatal, e portanto, na medida dc subordinação.

No processo de maior integração, liaverá uma hierarquia, uma depen dência, uma sujeição, não sòmente às normas, mas também ao comando do Estado; no outro sistema, a medida da colaboração se inclui em um con junto de normas legislaiivas e regula mentares, bem como providências de natureza administrativa, dentro de um critério geral de colaboração, da es sência mesma do sistema politico e econômico, de acôrdo com fórmulas as mais variadas que excluem aquela op ção entre dois sistemas extremos de que falava von Mises.

No primeiro caso, a emprêsa é inte grada no processo estatal e no segun do, conserva a sua autonomia, mas é parte de um sistema político e econô mico onde exerce uma função própria, com características bem definidas.

As relações entre Estado e emprêserão de colaboração, de atividades harmônicas sa para um lim comum, con

servando cada um, as suas carac-terísticas essenciais.

Assim, o Estado deverá:

a) proteger e amparar a empresa como valor econômico e como inicia tiva individual. Trata-se de valorizar o trabalho do homem e a sua iniciati

va, criada no sentido, não só de au mentar a riqueza dos que nela partici pam, mas também de tóda a coieti.idade. As medidas de polícia aqui se justificam, impedindo a concorrência desleal, a fraude, os monopólios e to dos os meios que acarre.em desigual dades.

A proteção e o amparo de que tra tamos são medidas elementares á ma nutenção da ordem jurídica e ao livre exercício das atividades

propriedade privada, c uma exigência da liucrdade dc comércio c imciativa individual, é um processo tècni-anicnte rccomcndacio para a evolução do sis tema capitalista, ajustado às coiuliçoes sociais uo muiiuo moucrno, é uxn processo técnico que iavorc>.e a admi nistração de grandes capitais c £*nalmenie pernuie maior participação dos indivíduos, na íormaç.io do capit-10 Estado, como expressão do interêsse coletivo, só pode incentivar o progresso da Empi èsa-

Por sua vez, no sistema dc relações, as cmiirésas devem ao Estado:

b) o Estado deve assistir à emprésa, não sòmente através dc medidas legislativas

senvolvimento, no terreno financeiro, fiscal, mas também através de medi das que permitam o aumento de sua riqueza e valorizem o investimen.o.

O recurso a processos vários, desde aqueles que dizem com o regime al fandegário, de tarifas, até os que en volvem a área do financiamento, den tro de muitas modalidades que não fe rem o regime de igualdade e de repú dio aos privilégios que deve caracte rizar a política governamental setor,

c) 0 Estado deve incentivar a Em presa, como exercício de atividade econômica pelos indivíduos, porque a empresa está na base do sistema eco nômico baseado na liberdade de inicia tiva.

A empresa é uma peça do regime de econômicas. que permitam o seu denesse

a) colaboração, porcpic a empresa tem uma posição iuncional no sitema econômico, ela rcpicsenta uma pane da riqueza c corresponde a um setor de ativdade econômica, que c apenas uma parcela das a.ividades econômi cas nct.cssárias à vida c ao desenvol vimento da sociedade.

Sob certos aspectos, a empresa c uma parle do Estado que não poderia existir sem ela, ou com expressão au tônoma ou integrada no seu sistema administrativo.

A idéia dc colaboração exprime bem essa posição autônoma, e de participa ção no mesmo nível, das atividades econômicas do Estado,

b) cumprimento das suas obrigações fiscais e financeiras, precisamente pe lo seu valor econômico, pela sua posi ção nas atividades do Estado, pela parlicipação que devem ter na cons tituição do orçamento estatal.

É dever de todo cidadão, sem dúvi da, mas deve ser considerado com ên fase, dentro do processo econômico.

O aspecto fiscal, isto é, como contri buição financeira para a receita pú blica, constitui motivo de maior preo cupação do Estado, porque na emprê-

sa o Estado encontra fartos recursos, fàcilmcnte arrecadados c controlados pelos funcionários fiscais.

Esta participação da Empresa com a receita pública constitui, sem dúvi da, mais uma expressão da colabora ção do Estado com a Empresa, c) suljordinação, no cumprimento das leis e dos regulamentos, dever ge ral dc lodo cidadão, nias que corres ponde aqui ;i uma posição definida, porquanto não cria ncnluima situação de particular depcmlcncia.

Deve obscrvar-sc (pie, prccisamcnte neste setor, as medidas são mais se veras, no que diz com o exercício do poder dc polícia, precisamente porque a cmprèsa representará sempre uma parcela da riqueza social, mais ou me nos integrada no sistema estatal, cor respondendo a unia parcela da ativi dade econômica que atende às neces sidades de consumo da coletividade.

Todas essas relações decorrem do princípio da autonomia da cmprèsa em relação ao Estado, que se traduz na personalidade jurídica própria, dentro do sistema legal fundado na iniciativa individual e na propriedade individual, (piaisquer que sejam as limitações que se lhes oponha.

Depois de Robinson e Chamberlim, o professor Gaibraith (Le capitalisme américain) mostrou como evoluiu o sentido do capitalismo neste século, e como, em suas bases, desapareceram aquelas concepções tradicionais, de um sistema econômico, modificado pelo engranclecimento dos grupos capitalis tas, pelas concentrações financeiras, pelo sistema de concorrência, pelos no vos conceitos, a respeito de monopó lio, e da importância das teorias raonopolísticas, da criação dessa nova for-

ma de concorrência chamada concor rência imperfeita.

O conceito dc empresa capitalista haveria dc sofrer esse impacto, como também a sua situação em relação Estado e à natureza das relações que, com êle teria de manter. Embora au tônoma a empresa se integraria mais no mecanismo estatal, principalmente a grande cmprèsa e a cúpula das or ganizações industriais e comerciais.

De qualquer maneira por que se en care o problema pelos seus aspectos doutrinários, a realidade aí está — a empresa contribuindo para a evolução da estrutura econômica e para a transformação das bases de economia capitalista, fator preponderante no aperfeiçoamento da técnica adminis trativa c das relações no trabalho.

A sua integração, entretanto, na eco nomia estatal, não importa cm abdi cação dos pressupostos essenciais da empresa no sistema capitalista — a liberdade de trabalho, a liberdade de iniciativa, a propriedade privada.

Da conciliação desses princípios bá sicos da economia capitalista, com o progresso social, depende, sem dúvida, a sobrevivência da empresa privada.

Não seria, entretanto, fiel ao qua dro das atividades privadas e do Es tado, se não nie referisse de maneira mais explícita em relação a alguns sis temas intermediários, ou melhor de algumas formas peculiares nascidas do processo de desenvolvimento e indus trialização de alguns países.

Essas formas são múltiplas, rara mente alargam o campo da apropria ção das atividades privadas pelo Es tado, mas certamente aprofundam o sistema de intervenção e regulamen tação e oferecem maiores possibilida des aos investimentos públicosao

IO professor Hanson, estudando a es trutura das empresas públ.cas ou semipúblicas (que nós chamamos mis tas) no processo de desenvolvimento econômico e apoiando-se principalmen te. no seminário das Nações Unidas que estudou o problema, em 1954, em Rangoon, distingue três alternativas no desenvolvimento dos tipos de em presas, Considerando-sc o subdesen volvimento de alguns países-

São os seguintes:

No primeiro, o Estado cuida apenas de criar uma infra-estrutura adequada à implantação das empresas privadas que devem prover ao desenvolvimento.

No segundo, do tipo comunista, a empresa privada é considerada anti social e somente tolerável para o ca minho inexorável do socialismo.

No terceiro, a empresa privada é prestigiada mas alguns investimentos de base são realizados por emprésas públicas ou empresas mistas.

Essa última solução é justificada de duas maneiras — ou como processo parcial de socialização, compreenden do as indústrias dc base ou então co mo recurso único para atender a gran des investimentos que não encontram meios na -iniciativa privada, nos países subdesenvolvidos ou em fase de indus trialização.

ções mesmas de seu' funcionamento, os lucros, a sua expansão.

A própria regulamentação adquire assim, uma profundidade e uma im portância, desconhecidas no regime tradicional da empresa privada, mo dificando o sentido próprio da regu lamentação.

Mais do que a apropriação públiCa dc algumas atividades indiustríais ou mesmo de numerosos serviços públi cos, perfeilamente tolerável e justifi cável, mesmo cm paí.scs ele estrutura capitalista, o sistema c atingido na re gulamentação da iniciativa privada.

O sistema capitalista já se acostu mou a ceder ao Estado, a produção e distribuição da energia elétrica, dos meios de transportes e comunicações, mesmo algumas indústrias de ba^e, mas se sente afetado em sua estrutu ra pelo aprofundamento dos métodos de intervenção naquele setor que con tinua a deter, intervenção que afeta a própria essência da iniciativa privada. Devo confessar a minha simpatia pe la ampliação do setor público, mas também não compreendo a deformação da iniciativa privada, em seu setor próprio, por uma intempestiva inter venção, que vá além das medidas in dispensáveis à disciplina e prosperida de do próprio sistema.

nao

A análise do professor Hanson penetra, entretanto, em alguns aspeótos característicos dessa pclítíca, que embora adote o sistema legítimo da regulamentação, dá por vêzes a êsse sistema, feição própria porque na pro fundidade da ação intervencionista, ti ra à empresa privada algumas de suas características essenciais de li berdade, porque, em vez de incentivar a sua prosperidade e criar condições para o seu progresso, limiia as condi¬

Essa regulamentação deve consistir, na repressão às práticas que impedem o livre funcionamento da iniciativa

privada como fraude, as pressões eco nômicas, o abuso do poder econômico. Não seria entretanto, honesto, se não pusesse em relevo as dificuldades insuperáveis, da ampliação da inicia tiva estatal nos países subdesenvolvi dos.

Subdesenvolvimento não é somente pobreza material, miséria, é, também

e em conscqücncia, escassez de recur sos humanos aptos a realizarem certas tareias. Subdesenvolvimento c ainda íal.a de maturidade política, pela con servação de práticas tradicionais em sociedades primárias, prcdominâncias do paternalismo, da confusão da coisa pública com a coisa particular, transigências c fraquezas que comprome tem a boa seleção, a escolha dos mais capazes, dos melhores.

●Ê a preferência do amigo sôbre o melhor.

O drama do subdesenvolvimento é que éle precisa vencer o subdesenvol vimento com indivíduos subdesenvolvi dos, com limitações incompatíveis com a boa c sadia concepção do Estado e da coisa pública.

É o drama da empresa pública nos países subdesenvolvidos com excepções evidentes c muito honrosas era todos os países.

Diíicilmcnte, entretanto, poderá ser evitada a expansão da iniciativa do Estado, dentro do Clima político e ideológico desses países — situação, no meu entender irreversível, sujeita apenas a temperamento disciplina.

Essas empresas como os concessio nários são entidades públicas, e se in corporam de maneira mais ou menos centralizadora ao mecanismo do Es tado-

São essas, cm largos traços as li nhas mestras de um problema que me rece acurado exame e meditação.

IA Nova Discriminação de Rendas

A Emenda Constitucional n.o 5, promulgada em 21 de novembro de 1961 instituiu nova discriminação de rendas com o objetivo, declai-ado em sua própria emenda, de favorecer aos Municípios. Modificaram-se os artigos 15, 19 e 29 da Constituição para o fim de contemplar os Muni cípios, na partilha tributária, com novas fontes de receita, em detri mento da União e dos Estados.

A compreensão do sentido e dos efeitos do texto, reeentemnte pro mulgado pelo Congresso Nacional, no quadro político e administrativo do país, reclama uma explicação prévia do regime tributário brasileiro e de sua evolução no curso do tempo.

A discriminação de rendas, no pla no jurídico, pressupõe a existência de mais de um ente público, competência privativa para criar e arrecadar certos e determinados tri butos. Essa especificação das fon tes de receita deve corresponder a uma proporcional atribuição de cargos governamentais.

com a enver sua

Nos regimes unitários, de centra lização administrativa, cabem a um único poder as duas tarefas de proà receita e de pàgar as despesas públicas, em todo o território sob jurisdição. A descentralização governamental, reclamada por vários motivos, segundo as conveniências de cada povo, em cada época, acar reta a criação, a outorga e a deter minação simultânea de recursos e de encargos, aos órgãos de menor hierarquia.

A discriminação de rendas deve re fletir, na prática um maior ou me nor grau de concentração ou dis persão da atividade governamental, Essa distribuição de competências, dentro de um mesmo Estado, politi camente organizado, traduz a medida da autonomia dos órgãos que o com põem. Nos países, como o nosso, em que a federação foi constituída como conquista intocável dos parti dários da descentralização (Consti tuição, art. 217, § G.o), qualquer al teração na partilha tributária en volve, automàticamente, inodificação de estrutura do regime. De fato, quando um só é o poder tributante, ou não ocorre nítida separação en tre as áreas de competência de cada órgão estatal, são de pouca, ou ne nhuma repercussão, as transferên cias de fontes de receita. Assim não acontece se a partilha é rígida e traduz autonomia c poder político.

II

São entidades tributantes, em nosso regime constitucional vigente, a União, os Estados e os Municípios, segundo a discriminação feita no pacto fundamental. Mas no passado, outro era o quadro das competências tributárias.

Na época colonial o sistema tribu tário era empírico e variável ao sa bor das necessidades da Coroa Por tuguesa. Cobrava-se o dízimo que equivalia à décima parte dos pro dutos colhidos ou fabricados e o quinto do ouro extraído. Além dês-

ses impostos ordinários, que onera vam a produção, liavia os extraordi nários e transitórios, destinados a cobrir as despesas excepcionais, como as derramas o as fintas. Êsses impostos cabiam ao poder central que outorgava, às Câmaras Munici pais, competência para usufrui-los também, em caráter permanente ou temporário.

Com a vinda do D. João VI para o Brasil as crescentes necessidades do erário determinaram a criação de novas fontes tributárias.

A independência política e a ou torga da Constituição Imperial, em 1824, não alteraram essa orientação difusa, com o propósito de aumentar a receita. Os impostos eram cobra dos pela forma prcscidta no orçamento geral e nêle eram discrimina dos os montantes que tocavam à Nação e às Províncias. (1)

Segundo Amaro Ca valcanti, “quando cm 1822 foi aqui fundado o império, êste, além de ser domínio territorial imenso, que, por inexplorado, quase nenhuma renda produzia, achou-se ig-ua’mente na posse de numerosas contribuições que então passaram a formar as fontes de receita do novo Estado Consistiam, elas, na sua maioria, em direitos, taxas, impostos e pequenos rendimentos dos próprios nacionais etc. Tais contribuições tinham sido criadas e eram ari*ecadadas sem mé todo, ordem, uniformidade ou siste ma, nas diversas províncias, desde 03 mais remotos tempos da colônia. (2)

Uma lei de 24-10-1832 mandou dis criminar, no orçamento, as rendas públicas em receita geral e receita provincial; enumerou quais das pertencentes a uma e outra re ceita, bem como as despesas vinciais.

No ano seguinte (lei de que as

8-10-1833) determinou-se rendas provinciais seriam escritura das à parte e arrecadadas pelas te sourarias respectivas, em cofre dis tinto. A receita e a despesa pro vincial passaram a ser fixadas pelos Conselhos Gerais sobre o orçamento dos Presidentes das Províncias.

Mas 0 germe da discriminação de rendas foi o chamado Ato Adicional, de 12-8-1834, que reorga nizou a administração proviUíCial e substituiu os antigos Conselhos por Assembléias Legis lativas, com a atri buição de fazer leis e ff decretar impostos para ocorrer às despesas provinciais e munici pais, com a vedação de não invadir a área de tributação resei’vada à Nação.

Não sendo nítida a discriminação, 0 sistema tributário continuou con fuso e aberto às usurpações recípro cas de competência. Nação e Pro víncias porfiavam no mesmo afã de arrecadar mais, sobrecarregando 0 contribuinte com incidências cumu lativas e absurdas. as renpro-

III

Com o advento da república e a adoção do regime federativo, o pro blema da partilha tributária ganhou

De fato, nos Estados Unidos, pac tuada entre as antigas colônias a confederação, não dispunha esta de receita própria. Os recursos para fazer face à guerra da independên cia eram fornecidos pelos novos Es tados, com certa relutância. Na con venção de Filadélfia foi que o Es tados delegaram à União o poder de lançar impostos.

Comentando o fato observou ALIOEssa foi a MAR BALEEIRO:

celebrado entre os Estados norteamericanos, para proverem às neces sidades financeiras da União. (4) Couberam à União, em geral, *»s impostos de importação e as taxas e aos Estados os de exportação, sô bre transmissão de propriedade, imó veis, indústrias e profissões e as taxas. Houve certa apreensão quan to aos resultados práticos que a discriminação ii*ia provocar.

RUI BARBOSA, um dos princi pais responsáveis pela elaboração Jo texto constitucional, quando Minis tro da Fa. enda do Governo ProviRecorda-se relêvo e importância, mesmo que a gênese da federação se confunde com a da discriminação de rendas públicas entre a União e os Estados.

sório, conclamava os Estados a ex plorarem, com mais audácia e ima ginação, as suas fontes de receitasNão havemos de cingir-nos, em ma téria de impostos”, dizia o paladino das liberdades individuais, “aos ins trumentos enferrujados, às fontes escassas, de que se sustentavam províncias do antigo regimve. Muitos ramos por aí ainda virgens; e êsse campo sôbre o qual a antiga administração passava e repassava, é vasto, seguro e fecundidade”. (6)

Os rente, mais importante novidade do Es tado federa’, pois as confederações sem poder fiscal direto não eram desconhecidas da história. Esta mos trara que acabavam pelo malogro irremediável, tanto que não sobre viveram no mundo contemporâ neo”. (3)

A Constituição brasileira de 1891 adotou sistema rígido de discrimi nação de rendas entre a União e os Estados (arts. 7 e 9), admitida a competência concorrente, em relação às fontes de receita não discrimi nadas (art.l2). Os Municípios não foram contemplados pelo texto fe deral; coube aos Estados (art. 68) organizá-los, assegurando-lhes auto nomia em tudo quanto respeitasse ao seu peculiar interêsse, inclusive com a transferência de impostos, dentre aquêles que a Constituição lhes reservou.

UBALDINÓ DE AMARAL justi

ficou plenamente a fórmula que se tornou vitoriosa de assegurar-se, a União, impostos privativos e se re feriu aos maus resultados do acordo,

O apelo não ficou em vão. Estados continuaram a cobrar não só impostos qne vinham do regime anterior, mas incompatíveis com o nôvo. mas decretaram outros, prin cipalmente usando da franquia cons titucional da competência concor União, entretanto, coube U 3S de matéria tributável estão , sem utilizá-lo. de considerável

dar expansão ao campo tributáriu. Do impôsto de importação e de con sumo passou ao de renda, criado substituição ao tributo sôbre subsídios e vencimentos e consoli dado em 1926; criou, entre outros, o impôsto sôbre vendas e consignaem JL

ções, depois transferido aos Estados. Após 1930, vitoriosa a revo^ujão que pôs termo ao regime instituído em 1891, o problema da partilha tr.butária mereceu acurados estudos que se refletiram na Constituição promulgada em 190Í.

O texto constitucional de 1934 tor nou a discriminação mais vigida e mais nítida, restringindo o campo da competência concorrente. À União couberam os impostos de importação sobre mercadorias de procedência es trangeira. de consumo, de renda, de transferência de fundos para o ex terior e o do sêlo sôbre atos e contratos, bem como taxas de ser viços federais (art. 6.o); aos Estados tocaram os impostos sôbre a pro priedade territorial exceto a urbana, a transmissão de propriedade caiisamortis, e inter-vivos, o consumo de combustíveis de motor de explosão, as vendas e consignações, a exporta ção de mercadorias de sua produção, de indústrias e profissões, do sêio sôbre atos regulados por lei esta dual e taxas de serviços estaduais (art. 10, número VII) com repar tição do produto (art. 10, § único) vedada a bitributação, prevalecendo o impôsto decretacfo pe’a União quando concorrente a competência (art. 11).

Pela primeira vez os Municípios foram contemplados no pacto federal, com impostos privativos. Êstes lhes foram dados como apanágio de sua autonomia (art. ID). Tiveram os Municípios metade do impôsto de indústrias e profissões (art. 8.o, § 2.0); 20% sôbre os impostos não discriminados na partilha entre a União e os Estados (art. 10, § úni co); os que 03 Estados houvessem

por bem transferir-lhes e mais os seguintes em caráter privativo: o impôsto de licença, o predial e o territórial urbanos, o de diversões púbicas, o cedular sôbre a renda de imóveis rurais, a par das taxas sôbre serviços municipais (ai-tigo 13, § 2.0).

Mas a discriminação de vendas, en tão estabelecida, somente entrou em vigor em l.o de janeiro de 1936, por fôrça do art. 6.o das Disposições Transitórias da Constituição. Apesar da curta duração, porque, a 10 de novembro de 1937, foi outorgada ao país nova Carta Constitucional, a discriminação feita era 1934 repre sentou um grande avanço sôbre a ce 1891, no sentido de delimitar e redistribuir as fontes de receita, se gundo as necessidades de cada órgão da federação, inclusive os Municípios. O texto de 1937 não apresentou variação sensível em relação à dis criminação anterior. Os impostos de consumo e de renda passaram in totum para a União (art. 20). As Emendas constitucionais n.os 3 e 4, de 1940, introduziram ligeiras modi ficações na partilha, mas criou-se o impôsto único, de grande repercus são, sôbre combustíveis e lubrifican tes líquidos, lançado pela União e dividido com os Estados e Municí pios, na proporção do consumo e des tinado a conservação e desenvolvi mento das redes rodoviárias.

A Constituição vigente manteve, em linhas gerais, a partilha reali zada em 1934 e 1937. Deixou, na competência da União, os impostos de importação, de consumo, de renda, de transferência de fundos para o exterior, sôbre atos, negócios e ins trumentos regulados por lei federal;

determinou que o regime do impôsto único sôbre combustíveis fôsse es

tendido aos minerais do país e à energia elétrica.

Como novidade assegurou a parti cipação dos Municípios, excluídos os das capitais, na arrecadação do im pôsto de renda, na proporção de 10%, com a obrigação de serem aplicados, pelo menos, em sua metade, em be nefícios de ordem rural (art. 15).

Compete, ainda, à União decretar impostos previstos' no art. 19 (Es tados) que devem ser cobrados pelos Territórios (art. 16).

A exemplo de RUI BAREOSA, conclamou os Estados a procurarem novas fontes tributárias cm vez de propugnarem por uma reforma cons titucional, visando ao aumento de suas rendas, ati’avés de nova disciúminação. E indicou modalidades passíveis de incidências não explo radas pelos Estados. (6)

Os Estados perderam o impôsto de indústrias e profissões, cuja metade lhes cabia, em favor dos Municípios (arts. 19 e 20). Igua’mente 30% do excesso de axTecadação estadual sôbi*e a municipal tocou aos Municípios (artigo 20).

Ao Distrito Federal cabem os mes mos impostos atribuídos pela Cons tituição (art. 26, § 4.o) aos Estados e Municípios. No Estado da Gua nabara, enquanto não forem criados Municípios. 0 regime tributário será idêntico (Emenda Constitucional n.o 3. de 8-6-61. art. 5; Constituição de Estado, A.C.D.T., art. l.o).

Segun'^0 0 Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a dis criminação de rendas, fixada em 1946 não entrou em vigor imediata mente, mas dentro de pra:os mar cados no articro 13 do mesmo Ato, os quais já estão vencidos.

A discriminação feita em 1934 foi geralmente louvada e um dos seus princinais redatores, ALIOMAR BA LEEIRO, em sua defesa, afirmou, em 1952, que ela foi intencionalmente rí gida, pois êsse era o preço das qua lidades positivas que apresenta. os

Aliás, VIVEIROS DE CASTRO, em obra especiaMzada, comentou que “em matéria da impostos verifica-se a exatidão do adágio: nel nove sub sole e recordou os extravagantes tri butos cobrados, na antiguidade, sobre a urina (Vespasiano), o fogo, a som bra, o ar e os cadáveres”. (7)

J. M. F. PEREIRA DE BARROS. em obra publicada há mais de um século, no capítulo relativo à fisca lização das rendas públicas, repro duz a opinião do famoso J. B. SAY, que bem retrata o estado de espírito dos contribuintes da época. Disse êle que “todos consideram o contri buinte como um adversário e muito legítimas todas as conquistas que se façam sôbi*e êle. Acontece mesmo que os empregados encontram em vexar o devedor uma certa satisfa ção de amor próprio, um prazer aná logo ao que experimentam os caça dores quando conseguem pela força ou pelo ardil assenhorearem-se da caça”. (8)

Mas 0 pagamento de impostos é obrigação inexoráve\ justificada por vários motivos, em todas as épocas.

MONTESQUIEU di. ia que o impos to representa “a contribuição de uma parte da fortuna de cada cidadão, que êle dá para garantir a outra parte ou para gozá-la mais agradàve’mente” e, para VOLTAIRE pagar impostos é empregar uma «

Autores modernos de-

parte dos seus bens na conservação da outra”, finem o impôsto como a contribui ção exigida de cada cidadão para ocorrer às despesas e encargos pú blicos. (9)

IV

É interessante citar algumas cifras sôbre as arrecadações dc impostos, entre nós.

AMARO CAVALCANTI fornece os seguintes dados sôbre as receitas, no século passado. Em 1822. a geral, realizada foi de ?'.8nn;fin08000. e, em 1892. atingiu a 227.681:075S000. Com relação à receita provincial, or çada em 1846. somou 4.9®0:R9.5S217 e, em 1888 subni a 33.110:8768863*. A receita municipal, 1886. foi de 8.867:00(18600. Com a discriminação feita na Constituição de 1891 houve sensíveis alterações, em favor dos Estados, que. em atingiram h cifra dc 137 6^1 ;0008000. aumento que. no comentário do xnee-mo autor, representou ma’s do triplo, em cer ca de 5 anos. (IO")

Os efeitos práti-^os da discrimina ção de rendas, nos últimos 20 anos, po'iem ser avalmdos de acordo com as seguintes cifras, citadas em nú meros rndrndo°.

Em 1940, a TTnulo ar’*ecndou 58% das re'''l'’s os Estados 33% e o« M»”iicí*iios 9*%.

dade: 13%; territorial rural: 8%; sê’o: 6%, outros impostos: 5%; em relação aos Municípios foi esta a es pecificação: indústrias e profissões: 36%; predial: 27%; teritorial ur bano: 5%, licenças: 18%; diversões: 3%; outros impostos 11%. (11) Em 1959, em números absolutos e desprezadas as frações, foram as se guintes as arrecadações: — União: 157 bilhões e 826 milhões de cruzei ros; Estados: 145 bilhões e 749 mi lhões; Municípios: 34 bilhões e 104 milhões.

Os impostos da União, em 1960. fo ram arrecadados pela forma seguin te: consumo: 83 bilhões, renda: 62, importação: 22, sêlo e ágios: 25 e imnnsto único sôbre energia elétrica: 1 billião: com referência aos Estados as parcelas fnram: vendas e consig nações: 133 bilhões e 700 milhões; transmissão entre vivos; 7 bilhões; trancniissão causa-mortis: 1 bilhão e 700 milhões: terintorial ruraU 1 lr‘’^no o 800 mill-iôos; exportação: 2 bilhões: pp'*f': 9. bilhões; ontros impo^-i-o®: 12 bilhões!: taxa»?: 15 bilhões. No«! Municínios. em 1959. foi a se-

gninte a n'>ri^’'’lnacão: predial: 5 bí]l->õe«! e 3on milhões; inHúsirias e profissõos: 5 hilhõos; o ono milhões; ter ritorial; 1 b’lhãn: li^^nca; 1 bi’hão; outros im^mstos: 96Q milhões. (12)

Nos demais naíses de organização fíi-XoTc+nra os í’^di/'ps da p^írfilha tidbutõr'a vem sofrendo também fortes v'''r’neões. Nos Estados Unidos, em 1927. a nronoreão era a segxúnte:

iO.s tr'butos federais copcnrrex‘am para êsse resxútado. na so^^ninte ni’oconsiimo: 89%; imnnr- poreao: União 27%. Estados 15% e entidatacão: 35%. renda: 1.5%; sêlo: 11%; no>= Estados a comnosicão foi a segnini-e: vendas e eo'^sign''eõos; 44%; indiístrias o profissn°s; 13%; exnortaçâo: 12%; transmissão de proprie-

des Innais 5Q%: decorridos 20 anos, em 1948. a União sobvemijou. de mui to. os seus co^^correntes, com o se guinte resultado: União. 75%, Es tados,14%,entidades locais 11%.(13)

V

A Comissão de Juristas, organi zada em 1956 pe’o Ministro NEREU RAMOS, para oferecer emendas ao texto constitucional e da qual tive honra de fazer parte, abordou a questão da discriminação de rendas.

e são obtidos ã custa do desgaste de sua autonomia política e administra tiva. Antes da abordar o a’cance da re cente Emenda municipalista, vamos recordar alguns problemas relevan tes, intimamente ligados à discrimi nação de rendas que, apesar de sus citados e debatidos, não mereceram, entretanto, a atenção do Congresso Nacional, na oportunidade da revisão constitucional que acaba de promul gar.

A questão fundamental, decorrente da partilha tributária, é a autonomia dos Estados, sôbre a qual assenta o regime federativo. Em modesto tra balho sôbre a “Evolução do Regime Pedei'ativo”, publicado em 1954, pro curei demonstrar que a idéia federalista tal como foi concebida em 1891 se tornara anacrônica, dos Estados, que os constituintes re publicanos procuraram fortalecer, tem sempre perdido terreno em be nefício da União e dos Municípios; “estão êles fadados a ocupar uma posição de meros intermediários en tre aquelas entidades de direito pú blico, que lhes absorvem e extraem por um duplo processo de sucção, cada vez mais violento, as suas mais nobres e relevantes atribuições”. “O platonismo do texto de 1946, in capaz de deter a marcha avassala dora e desordenada para a centrali zação e 0 unitarismo, dizia eu, está a exigir uma reforma que coloque a União e os Estados sob nova equa ção, mais realística e condizente com altos interesses da pátria”. (14) Vozes autori.adas clamaram em prol do esforço das receitas tributá rias dos Estados, cada vez mais de pendentes dos favores da União que cias mais variadas formas

A posição 03 se revestem

Inspirou o seu trabalho no propósito de aumentar a receita dos Estados, dando-lhes 5% da arrecadação do imposto sobre a renda, assegurandolhes 5%, ad valorem, do imposto de exportação que seria transferido para a União e permitindo-lhes a co brança de imposto sôbre promessa de venda de imóveis ou a respectiva cessão de direitos. (15)

Ponderou, a Comissão de Juristas, reportando-se à opinião de Octávio Gouvea de Bulhões (16), que “a dis criminação das fontes tributárias en tre a União, Estados e Municípios está prêsa às condições da formação da renda nacional”.

Considerando a forte desigualdade de arrecadação dos impostos fede rais, nas várias regiões do país, não atingiría os objetivos colimados a simples transferência de determina dos tributos da União para os Esta dos ou Municípios. Assim, nas re giões de fraca rentabilidade fiscal a alienação da fonte tributária seria um engodo enquanto que para as outras, mais produtivas, o benefício viria aumentar-hies o cabedal.

Em outras palavras, a transferên cia pura e simples de determinado imposto ou parte dêle, da União para os Estados ou Municípios, se ria obra empírica, deixando as re giões pobres na pobreza e aumen tando a fortuna das ricas, a

Um exemplo prático elucida a questão. Se aos Estados ou aos Municípios do Piaui fôsse atribuída capacidade para tributar a renda ou 0 consumo, êles pouco lucrariam, da da a pequena margem de incidência; 0 contrário aconteceria se o benefi ciário da outorga fôsse São Paulo, ou os seus Municípios.

a

também no que concerne à elabora ção das normas gerais do direito fi nanceiro (art. 5, n.o XV, b) ainda não baixadas pelo legislador federal, despeito da apresentação do pro jeto de codificação, à Câmara dos Deputados em 1954. Essas “nor mas”, uma vez aprovadas, em mui to contribuirão paru o deslinde de controvérsias em torno da pai*tilha tributária. (17)

A solução racional não estaria em transferir, enipiricamonte, determi nadas fontes de receita da União para os Estados e Municípios, mas conservar, em seu poder, as que pos sui e transformá-la em órgão de redistribuição da renda nacional em partes iguais, contemplando da mes ma forma as regiões ricas e as VI

Passemos agora ao exame da re cente Emenda Constitucional, que to mou o n.o 5 e foi promulgada em 27 de novembro de 1961. Teve ela, por objetivo, favorecer aos Municípios, está escrito na sua ementa.

O art. 15 e seus três primeiros parágrafos, que tratam da compe tência tributária da União, não soEsta começa nos como freram alteração, pobres.

O principio federativo ficaria re forçado com êste expediente da redistribuição, que propiciaria recursos substanciais às regiões menos pro dutivas, para incremento de seu proEsta idéia foi acolhida em gresso.

parte pehi recente Emenda Constitu cional, mas em favor dos Municípios, com exclusão dos Estados, conto se verá.

Aventou, também, a Comissão de Juristas, a transformação do impôsto de exportação em instrumento de po lítica monetária, segundo a hábil concepções de OCTAVIO GOUVEA DE BULHÕES. A transferência do impôsto de exportação, dos Estados para a União, mantida a percenta gem vigente em favor daqueles, pos sibilitaria que os Estados mediter râneos dêle se beneficiassem, o que atualmente é pràticamente impos sível.

Questões ligadas ao exercício da competência concorrente (art. 21) não foram objeto de esclarecimento;

seus parágrafos, a partir do quarto, segundo o qual a União entregará aos Municípios 107o do total que ar recadar do impôsto de consumo de mercadorias, efetuada a distribuição em partes iguais e fa.endo-se o pa gamento, de modo integral, de uma só vez, a cada Município, durante o quarto trimestre de cada ano.

Na forma do parágrafo quinto a União deverá entregar, igualmente, aos Municípios, 157o do total que ar recadar do impôsto sôbre a renda e proventos de qualquer natureza, fei ta a distribuição em pai'tes iguais, devendo o pagamento a cada Muni cípio ser feito integralmente, de uma só vez, durante o terceiro trimestre de cada ano.

A participação no impôsto de con sumo é dádiva nova e foi aumen-

tada de 10 para 15% a quota do imposto de renda. Não foram ex cluídos os Municípios das Capitais, ®m qualquer das hipóteses, como acontecia, anteriormente, em relação ao imposto de renda. Foram fixa das épocas certas, terceiro e quarto trimestre de cada anc, para os paga mentos que deverão ser integrais, condições estas que não existiam no texto emendado.

Não há restrição, para os Municí pios, quanto à aplicação da quota sô bre 0 imposto de consumo. Mas, relação ao de renda, a obrigatorie dade de seu emprego em benefícios de ordem rural, de metade, pelo *103, que já existia, foi objeto de uma definição, segundo a qual bene fício de ordem rural compreende “todo 0 serviço que fôr instalado obra que fôr realizada com o obje tivo de melhoria das condições econô micas sociais, sanitárias e culturais das populações das em meou zonas rurais”.

O parágrafo sétimo, corresponden te ao antigo quinto, sofreu alteração de relação, com o cancelamento da expressão “quando fôrem partes a União, os Estados ou os Municípios”. Ue acordo com a nova redação da competência federal para decretar impostos sôbre “negócios de nomia, atos e instrumentos regu’ados por lei federal excluídos “os atos jurídicos sua econão mais estão e seus instrumentos” quando dêles partici pem a própria União, os Estados e Municípios. A matéria nova recla ma especificação, por lei ordinária, cuja feitura merece cuidados, a fim de evitar conflitos de competência.

O parágrafo oitavo, do mesmo ar tigo 16, apenas mudou de número,

consei-vada, como foi, a redação do antigo parágrafo G.o. *

O art. 19, que discrimina as rendas dos Estados, foi amputado dos itens I e III que se reportavam à nropriedade territorial, exceto a urbana, e à transmissão de propriedade imobiliá ria inter-vivos e sua incorporação ao capital de sociedades. Foi suprimido também o parágrafo primeiro que * exclui da incidência do imposto terri- ^ torial as pequenas áreas cultivadas. Os demais dispositivos do art. 19 fo ram mantidos em sua redação, com a respectiva numeração alterada.

Finalmente, o art. 29, que trata da competência tributária dos Municí pios, além das quotas retiradas dos impostos federais, de consumo, de renda e sobre combustíveis e lubri ficantes, também os cobrados sôbre a propriedade teritorial rural, a trans missão de propriedade imobiliária inter-vivos e sua incorporação ao capi tal de sociedade, que pertenciam aos Estados, mantida a imunidade dos pequenos sítios, cultivados por seu proprietário.

Não houve a preocupação, na re cente Emenda, de coibir o abuso da criação de Municípios com o objetivo de participar dos impostos íeaerais. Nenhum requisito foi exigido, como 0 fi..era o projeto da Comissão de juristas, de 195G, que estabelecia o prazo de 10 anos para que os Muni cípios instalados percebessem tais percentagens. Em 19üU, os Municí pios eram em número de 2.7üd e tudo indica que a nova Emenda, vai estimular a sua multiplicação.

São

Outro aspecto relevante, que não foi regulado no texto recente, é o da fiscalização da ampliação das quo tas entregues aos Municípios.

notórios os abusos que as leis fede rais n.os 305, de 1948, n.o 1.393, de 1951, no 2.572, de 1955 e n.o 3.570, de 1957, não conseguiram estancar.

VII

Como SG vê, a Emenda trouxe con siderável reforço para as receitas Municipais, ã custa das rendas da União e dos Estados. Mas, os mais sacrificados serão êstes últimos, por que a União dispõe do outros meios para a satisfação de suas necessi dades de governo, como o controlo do câmbio e das emissões, campo em que age com a maior desenvol tura e discricionaridade.

A nova Emenda marca uma etapa na consolidação da autoridade munipal. Esta evoluiu de um conceito polêmico q impreciso, mais político do que jurídico, com a invocação do “peculiar interêsse” para atingir a concisão e a objetividade que ressal tam da redação dos textos constitu cionais mais recentes, como já tive oportunidade de acentuar em mo desto trabalho forense.

Dc fato, foi através da atribuição de impostos privativos, com as suces sivas modificações da partilha tri butária, que a autonomia municipal se consolidou, fundada em recursos econômicos e financeiros próprios. Sem esta base tributária, concebida . como reduto intransponível à ação legislativa das demais entidades que compõem a federação, os outros atri butos da autonomia, inc'’usive a eletividade dos prefeitos e vereadores e a organização dos serviços públicos locais poderíam transformar-se, co mo aconteceu até certo ponto, no re-

gime de 1891, em mera aspiração, sem possibilidade de realizar-se. (18)

VIII

Consolidada como está a autono mia municipal, pelo novo texto cons titucional, é fora de dúvida que a dos Estados sofreu rude golpe. Não foram êles beneficiados com as quo tas dos impostos de consumo e de renda e perderam dois tributos sô bre a propriedade imobiliária.

Com o fortalecimento da União, por expedientes fiscais e monetários que lhe são privativos e dos Muni cípios, à custa de nova discriminação de rendas, cumpre-se o vaticínio de Estados se transfomiam em intermediários entre que os meros órgãos os poderes central e local.

Os débitos dos Estados e MuniBanco do Brasil cípios para com o S.A. mostram, outrossim, a preca riedade das suas finanças. Em 1961 14 com acréscimo de mais somavam de 600 milhões sôbre o ano anterior: os Municípios deviam Banco, em 1960, 321 milhões e, em 1961, 317 milhões com ligeiro decrés cimo. (D. O. de 17-4-62, Suplemento ao n.o 74). ao mesmo

Os interêsses dos Municípios e a porfia de seus arautos apesar de não terem, como a União, representantes qualificados no seio do Congresso Nacional, que se compõe de delega dos dos Estados, abriram larga bre cha na idéia federativa, considerada, ainda, no texto constitucional de 1946, como na fundação do regime representativo, no mesmo plano da idéia republicana (Constituição, arts, 1 e 217 § 6.0).

Os estudos sobre a renda nacional são recentes e de difícil intei'pretaçào; 03 relativos à partilha tributá ria ganharam importância depois de 1934, quando, por efeito do texto constitucional, ela se tornou rígida, mediante a especificação dos tribu tos e a inclusão dos Municípios entre os seus beneficiários, indica que a relação entre a renda e a partilha se tornará mais íntima, de forma a propiciar aos legisladores os elementos básicos para as revi sões periódicas do sistema tributá rio, não só quanto aos seus efei tos geográficos, como em relação aos dados de incidência: Tudo produção e

consumo, capital e remuneração do trabalho.

Os problemas ligados à partilha tributária são de maior relevância, pelos seus refexos na vida financei ra das entidades que compõem a fe deração; de seu estudo e solução dependem o desenvolvimento econô mico do país, a consolidação da uni dade nacional.

As profundas desigualdades verifi cadas na produção da renda nacio nal, entre as várias regiões do país, repercutem fortemente no campo tri butário, No curso do tempo essas anomalias estão fadadas a provocar

lução inexorável do regime federati vo traga à Nação os benefícios a que faz jus 0 seu povo generoso, ins creveu em sua bandeira o lema ordem e progresso”. «

1 — JOSÉ MAURÍCIO FERNANDES “ApontamenBras leiro”. PEREIRA DE BARROS, tos de Direito Financeiro 1855. pág. 19 e segts.; AMARO CAVAL CANTI, “Elementos de Finanças”, 1896. págs. 84 e 224 e segts.; RAUL HUGON. ”0 Impôstn”. 1945. páe 154 e segts : RUBENS GOMES DF. SOUZA. “Compên dio de Legislação Tributária”, pág. 145 e segts.

2 AMARO CAVALCANTI, ob. cit.. pág. 84.

3 — ALIOMAR BALEEIRO. “Estados. Dlscr'minacão de Rondas e Reforma Constitucional”. 1952, in Pevista de Di reito Adminlstrafvo. vol. 30. pá«s. 11-27; Revista Forense, vol. 143, págs. 7-16; JOAO BARBALHO, “Comentár os”, páj.

28.

4 — JOAO BARBALHO, ob. clt., pág. 28 e segts.

5 _ JOAO BARBALHO, ob. cit., pág. 43.

6 ~ ALIOMAR BALEEIRO, ob. c't.

7 — AUGUSTO OLYMPIO VtVE"ROS DE CASTRO, “Tr-tado dos Impostos”. 2.a ed. 1910. pág. 95

8 — J. M. F. PEREIRA DE BARROS. ob. clt., pág. 18. A. O. VUfT^fROS DE CASTRO, ob. clt., págs., 113-117.

9 reações separatistas ou a fomentar a criação de privilégios e discrimi nação em favor de uns Estados tra outros. con-

Cabe à União evitar a competição ao interesse nacional pelo incremen to intensivo da economia das áreas menos produtivas. A redistribuição das rendas, com êsse objetivo, será um instrumento profícuo e patrió tico.

Façamos votos para que essa evo-

10 — AMARO CAVALCANTI, ob. clt.. pág. 97 e segts.

11 — PAUL HUGON. ob. clt., pág. 197 e segts. 12 Anuário Estatístico do Brasil, 1961. I.B.G.E.

13 14

ORLANDO M. CARVALHO. "Perspectivas do Fe-^erallsmo Pras“elro”. 1958. pág. 80: PAUL HUGON. ob. clt., págs., 137 e segts. CARLOS MEDEIROS S’LVA. “Evolução do Regime Federativo” 19)4. in Revista Forense, vol. 158. rágs. 7-16; DARIO DE ALMEIDA MAGALHA^^^S, “A crise do Federalismo”, Rev. vlt., págs. 17-25.

15

Revista Forense, vol. 167, págs. 9-13; Revista de Direito Admin strativo, vol. 46. paes. 1 e segts.

16 —OCTAVIO GOUVEA DE BULHÕES. “Discriminação de Ren as”. Revis a Fo rense, vol. 167. págs. 428-485; Rev sta de Direito Administrativo, vol. 44, págs. 41-46.

17 — “Discriminação de Rondes”, 1953, I.BD.F; "Normas Gcra's de Drelto Fi nanceiro”, 1950; Ed. F nance ras; CAR LOS A. A. CARVALHO PINTO, “Normas Gerais de D reito Financeiro, 1949; RU BENS GOMES DE SOUZA. “Normas Gerals dc Direito Financeiro”, in Revista de D'reito Administrativo, vol. 1; GIL BERTO DE ULHOA CANTO, “Aguns Pr^b’em?s da Competôncia Tributária Concorrente", in Revista de Dl-elto Ad ministrativo. vol. 57. págs. 8 19; CAR LOS DA ROCHA OUIMARAV.S "O servaç5es ao anteprojeto do Código Tribu tário Nacional”, in Revista de Direito

Administrativo, vol. 34. págs. 446 e scgts. ■●CODIFICAÇÃO DO DIREITO TRIBU TÁRIO”. I.BD.F.; Projeto u. 4 834. de, 1954. da Câmara dos Deputados, in D.C.N.I.. 1954. pâg. 6.071; 19 — CARLOS MEDEIROS SILVA. ■'Em defesa da autonomia municlpa’”; 1961, Memorial forense, no Reo. Man. Scg. n.o 8.392. Sup. Trib. Federal. Em julgamento de 18 10-61, dê:se caso, foi de cretada a inconstltuc onal dade do art. 169 da Constituição de Minas Gera s em relação aos impostos municipais. Idem. Rec. Ext. n. 33.719 e 35,326. em 20-10-61 e Rec. Mand. Segu. N.o 9.518, em 26-1-62.

As Graves Decepções Comunistas

UAVIA

uma radical distinção entre a Europa e os Estados Unidos, quanto aos aspectos econômico e social. Ti nham os soviéticos a convicção de que os Estados Unidos eram um I país dotado de amplas riquezas na: turais e de um povo possuidor de * ,1 'V grande energia. Ao passo que Europa Ocidental, pensavam êles, era um continente fadado à deca dência desde 1914. vitàvelmente para o caos, salvo” pelo comunismo.

Ora, acontece que essa previsão foi FRAGAROSAaMENTE DES MENTIDA NOS ANOS DE 50, que a Eurona demonstrou uma me capacidade de recuperação insuspeitado fdêles, soviéticos) dina mismo econômico.

Nos ú’timos anos do decênio de 60 e primeiros do de 60. produziu até uma relativa inversão de posições quanto aos índices de pujança nnmica da Europa e dos Estados Unidos. A prosneridade atineiu níveis imprevistos:

na concepção comunista. a Marcharia, inee seria U em enore um -se ecoeuropéia 0 marco

referências ao Mercado Comum Eu ropeu. * * *

Além do aspecto econômico havia, do lado político, a convicção sovié tica de que as desavenças <2 os conflitos entre os países europeus degenerariam em guerra o no caos propício à implantação do nismo.

Ainda aí comu¬ segunda decepção os acontecimentos desmentiram as esperanças soviéticas, verificando-se não só uma aproximação política cada vez maior entre os países euro peus como sugestões partidas de um e de outro lado do oceano para a fundação de uma comunidade atlân tica. Haja vista o discurso de Kennedy do ano passado, em que êle sustentou a doutrina da interde pendência das nações e abriu os bra ços à nova união européia para nma maior aproximação com a já velha União Americana.

alemão e o florim ho’andês tiveram de ser “valorizados” e foi o dólar que pa«sou a m''re'’pr cuidados quan to à sua estabilidade. ★ ★

»I

As esperanças soviéticas a ê«se respeito foram, portanto, destruí'^ias pela base. O ressurgimento da Eu ropa mostrou que Lenine e Stalin r ; estavam errados e infligiu ao nosso particular amigo Nikita a maior das ' i decepções. Basta ver a irritação patente em tôdas as suas amargas

Uma terceira ilu^^ão, baseada n.a esperança de que as nações africa nas ou asiáticas, agora tornadas in dependentes, viessem a constituir novos focos de comunismo, também se desvaneceu. Com ligeiras e duvidosas excessões. o divói’cio entre as metrópoles européias e as antigas colônias foi consentido e amigável. De um lado e de outi*o, os interesses econômicos e culturais tornam im-

.4^

perativa a colaboi*ação entre o Mer cado Comum Europeu e as novas nações africanas e asiáticas.

A propaganda comunista — “De mocracia e Capitalismo são na apa rência atrativos, mas não servem para vocês, que só pelo comunismo podem atingir o desenvolvimento al mejado uma só sequer das novas nações para o campo soviético.

conseguiu atrair I» nao

China Ccmvmista, em posições quase antípodas dos- Estados Unidos. No caso de Cuba, a situação se inverteu; linhas de suprimento da Rússia Antilhas são extremamente ex tensas e vulneráveis, e a proximi dade dos EUA, esmagadora haveria para os soviéticos pioi campo para uma disputa militar. as às Não

Dir-se-á que os acontecimentos da política exterior não afetam a so lidez da estrutura interna dos sovieTalvez não a afetem já. Mas suas tes, por quanto tempo suportarão

Quarto, o caso de Cuba, que foi sovietes uma dádiva do na realidade um presenNo caso da Coréia, do Vietnam, o campo de populações os sacrifícios que o re gime lhes impõe, sem ao menos o derivativo de sucesso político no para os acaso, mas te dc grego. como no combate foi de livre escolha dos so viéticos; situou-se nas fronteiras da exterior?

/.

E DIREITO NA CONCEPÇÃO DE FARIAS BRITO

(A LIBERDADE COMO CONVICÇÃO DA VERDADE)

(Catedrático de Filosofia do Direito da Universidade do São Paulo — Presidente do Instituto Brasileiro dc Filosofia)

Poaiçâo de Farias Brito no pensamento brasileiro

Q que assegura a Farias Brito uma posição deveras singular na his tória do pensamento filosófico bra-

I■j sileíro é a sua perserverante preocupa ção de tratar dos temas f.losóficos como tais, sem os dissolver em consi derações de ordem sociológica ou his tórica. Embora não seja um pensador alheio aos problemas humanos líticos de seu tempo, não se deixa ar rastar pela tentação de converter a filosofia em um conglomerado amorfo de noções gerais hauridas aqui e ali no estudo das ciências sociais, o que demonstra ser a filosofia para êle uma exigência primordial e não mera atividade acessória ou complementar, simples adorno ou brinCo da científica.

ou popesquisa cons¬

Abstração feita do valor intrínseco de suas concepções', que seria tarefa ingrata demonstrar vacilantes ou con traditórias, o que inegàvelmente litui marco saliente de sua personali dade é a vivência da Filosofia na ple nitude de suas aporias, num desejo quase torturante de atingir a verdade como êondição de liberdade, de paz in terior e de realização ética. Se me fôsse dado formular o juízo que me sugere o reexame ora feito das

obras do pensador cearense, diria que seria infecunda a preocupação de des cobrir origiualidadcs ou contradições em seu pensamento a respeito dos te mas fundamentais, diante dos quais divergem justainentc os seus intérpre tes, em virtude da reformulação tínua que ele faz das teses que mais o apaixonam, sem haver um desenvol vimento interno Coeren.e que corres ponda a momentos de uma revisão crí tica brotada cie uma meditação autô noma, não sujeita aos impactos suces sivos das influencias externas.

O que, ao contrário, me impressio na e, a meu ver, Ibc confere a dignida de cic pensador autentico é a sua fi delidade à filosofia, a atitude assumi da no ato dc filosofar, cm primeiro lu gar pela ampla capacidade de capta ção objetiva dos sistemas, revelando sempre êsse toque dc simpatia tão ne cessário à compreensão das idéias: segundo lugar, por não scr a filoso fia para êle, como já disse, uma ativi dade secundária e comp’emcntar, mas antes a base inamovível da vida leorética e prática; e, finalmente, por demonstrar que, no plano filosófico, inexistem problemas isolados, de endo cada solução singular harmonizar-se Com as demais, assim como as partes se ordenam no todo.

Se nessa atividade honesta e perseconeni

cional da natureza, qual o papel que representamos no mundo e como de vemos de vida. É esse o tema central desenA verdade com regra proceder nas múl.iplas relações volvido em ''erante, não isenta de certa sedução apostolado, (1) podem-se apontar teses contraditórias c saltos inexpHllic faltam intuiçoes criaimprevistas c originais eaveis, não doras, nem aproximações de idéias, à primeira vis ta desconcertantes, mas ricas de protilemas e de fecundas perplexidades.

Aos que cultivam a Filosofia cm sua problemática aberta a obra de Farias Brito parecerá uma experiência filosó fica intensaniente vivida, concluindo por admirar, talvez, mais ao filósofo do que a sua Filosofia.

Ultrapassa aos propósitos dêste tra balho maiiiícstar-mc sòbrc o exi o do pensador pátrio na formulação de sua tão discutida concepção do universo e da vida, i)OÍs o que mc move é tão sònientc o desejo dc mostrar como até mesmo um tema, situado pelos coevos em um plano puramente cmpírico-positivo, — o do conceito de Ici, — adquiria na pena de Farias Brito uma íôrça sugerindo problemas e dificul- nova,

das ações”, talvez o seu livro dotado de mais unidade sistemática, e aquêle se revelam, mais daramente, convicções sôbre o primado da em que as suas vida ética.

Numa época em que os juristas se sistemas legislativida toda enclausuravam nos vos, certos de encontrar a refletida nos preceitos dos códigos, Concebidos estes como unidades her méticas válidas para as mais imprevi síveis hipóteses da condu a humana, foi, sem dúvida, grande mérito de Fa rias Brito ter indagado dos pressuposjuridicidade, subordinando a do direito à concepcada ● tos da concepção ção da vida c do cosmos: um, escrevia êle, deduz as nor mas de sua conduta e. por con seguinte, a sua cempreensão do direito, conforme a idéia que tem de i mesmo e da natureza”^ ("A verdade regra das açÕes”,

SI Pará, 1905’ como

dades com rcssonancía no quadro ge ral dc sua filosofia do espírito, im plicando prévio e necessário esclarcciideia dc direito”. mento sôbre a \ ‘^7).

Num ambiente carregado dc positios jurisconsul- vismo jurídico, quando tos em geral se trancavam na sua au to-suficiência técnica ou dogmática, deve ter ressoado de maneira estranha esta advertência britiana; “ a noção conseguinte, a idcia de dever e, por

E conhecida a tese, a que se man teve sempre fiel o pensador cearense, de que a Filosofia vai constituindo as diferentes disciplinas científicas, ten dendo, ao mesmo tempo, a abraçar o todo universal, lançando as bases de concepção do mundo, apresentan- uma do direito sòmente pode ser deduzida do todo universal, ainda: por uma concepção isto é do-se, assim, como metafísica, da qual se deduzem as leis de conduta, visto plica qual a significação ra- como ex , por uma filosofia”, ou “ninguém poderá definir o direito seconformidade do prisma da não na sua concepção do universo”, (ibidem, págs. 47, óO), afirmações, aliás, já im plícitas em sua primeira Finalidade do Mundo”, (Cfa. obra funda¬ mental a

\ Apostolado moral e, ao mesmo temteorétlco. po's em sua concepção o se Identificam, quase s po. saber e o querer msneira de FTCHTE. apesar do con^^eclmento superficial que parece ter do idea lismo alemão.

IFinalidade do Mundo, vol. I “A Filo sofia como atividade permanente do espírito humano”, 1895).

O conceito de Direito

atenção por parte dos raros estudiosos da Filosofia jurídica briiiana. mas que vale a pena examinar, não obstante a obscuridade terminológica de reveste e as dificuldades que suscita.

Segundo Farias Brito, por conse guinte, as noções de dever, de direito e de lei resultam, como consequência necesssária, das cas” que se têm, transformando-se de 'época para época e de autor para au tor, pois, se a filosofia varia como fôr-

intuições filosófi¬

Antes de mais nada, cumpre lem brar qual a significação da palav conceito na obra de Farias Bri‘o, contraposição a idéia* De certa forma, esta distinção prende-se à tese funda mental já lembrada sóbre a Filosofia como matriz eterna do saber científique se ra em

ça em desenvolvimento contínuo, tam bém 0 direito, fôrça, como uma repercussão, na or dem prática, dessa mesma atividade, está também necessariamente sujeito a variar . (A verdade como regra das ações, cit., pág- 57).

A subordinação do direito à cosmovisão é tão decisiva no pensamento britiano que êle chega a afirmar: ze-me como compreendes a natureza e eu te direi qual a noção que tens de teu dever” (op. cit. pág. 57) o que ex plica, por exemplo, que, no âmbito de uma concepção teocrática, o direito seja “a expressão da vontade divina”, assim como, nos quadros de preensão mecanicista do universo, só poderá ser concebido “como um pro duto mecânico, como um dado momen to no desenvolvimento das forças quando muito, como

como produto dessa diuma comff ou, o equilíbrio das

forças sociais” (op. cit. pág. 58). Ora, conclui Farias Brito um deduz o direito da se cada concepção que tem de si mesmo e do mundo, tornase impossível determinar um conceito de direito de validade intemporal: o que nos é dado atingir é apenas a idéia do direito.

Eis aí uma afirmação que, ao que parece, não tem merecido a devida

co, na passagem sempre renovada do indistinto para o distinto ou o deter minado, pois, SC ela dá nascimento às ciências particulares, estas

vez suscitam novos problemas gir novas determinações, so infindável, marcado pela crescente conquista da verdade, sendo, conhecimento o fim da evolução uni versal: é na escala ascendente da to-conscíência cósmica (“todo vimento da matéria não é senão um esforço permanente do cosmos adquirir consciência de por sua a exinum procesassim o auo mopara si mesmo”.)

(op. cit. pág. 24) que a verdade des penha uma função bivalente. mo tempo teorética e prática, razão da realidade e razão da c‘onduta, o que faz fundir, na concepção de Farias Brito, a gnoseología e a ética como expressões da verdade”. (2)

Pois bem, a multiplicidade das defi nições do direito podería levar a estas duas conclusões, ambas a seu ver eremao mescomo metafísica da

2 — Não é demats recordar aaul a In fluência aue o filósofo Italirno ROBER TO ARDTGÔ exerceu sôb>-e o esn'r'to de Farias Brito, não só no con''e-n'>ntè à Fi losofia como domfn*o do "Jnd'st n*o tale” gerador do "dlsPnto mentale” íCfr. ARDTGÔ — “Opere Fllosofiche”. Pádua, vol, II, 1884, págs. 129 e segs.) mas tam bém quanto ã compreensão do proeeaso evolutivo em têrmos psicológicos ou de consciência. men*

roncas: ou cada autor o define à vista de um só de seus complexos elemen tos, olvidando os demais; ou então, há um conceito dc direito para cada po vo ou cada época, tal como asseveram os rclativistas partidários da escola histórica. Na primeira hipótese não se pode falar em conceito, pois este de ve abranger todo o definido; na se gunda hipótese, tamljcm é de excluirse o emprego desse termo, pois o con ceito de direito só pode ser universal, "compreendendo tòdas as suas varia ções e mutações imagináveis” e “se o direito é relativo e variável, quem o definir, deve defini-lo tendo em vista 6Sta circunstância”. (3)

d)

“o conceito é a idéia geral, é a representação universal e neces sária de um fato” (pág. 45).

Tendo dc “conceito” essa noção es tática, Como o pertinente somente àquilo que já se tornou distinto e imutável, por fòrça de evidência ou de verificação, considera êle idéia o conhei-imcnto ainda indistinto ou que, por sua natureza, não se poderá tor nar distinto e, logo, concei.ual: todo conceito é precedido por uma idéia, mas nem sempre esta se formaliza em conceito.

Segundo Farias Brito, na formação do conhecimento, primeiro surge a

Já se torna claro que, para Farias imagem, “depois a idéia e, por último, o conceito, que é já uma operação do juízo” (pág. 52) sendo, pois, a idéia algo de pré-conceitual, no sentido do indeterminado c do indistinto Como fa se inicial do conhecimento, e não no abstrato” ou o indeter-

Brito, o termo conceito traduz uma exigência de tipo matemático, impli cando uma determinação insuscetível de mudança e em si mesma unitária e totalizadora. Nem sempre as suas ex pressões são precisas, mas essa é a sentido que o noção que se pode inferir de afirma ções como estas:

a)

minado possui na dialética hegeliana, como momento preparatório e cons titutivo do processus de concretização conCeito é um ponto fixo no espaço do pensamento” (pág. 41)

“quando se diz que os conceitos são os pontos fixos do pensa mento, significa isto exatamente conceitos são imutáveis o que os da IdéiaPostos assim os dados do problema, e repelida a solução do relativismo, a conclusão de Farias Brito é negativa quanto à possibilidade de concoituarse o direito, pois, o direito pertence a um tipo de realidade se podendo dêle formar “propriamente um conceito, na verdadeira significa ção da palavra”, (pág. 58).

b) (pág. 42) conceitos são “ de fato podefinidas do espírito. c) 05 sições idéias perfeitamente claras e po sitivas, noções devidamente defi nidas e delimitadas” (pág. 44)

3 — Eis aí um exemplo da acuidade de FARIAS BRTTO na compreensão de cer tos problemas essenciais. Pode dlzer-se que um dos principais objetivos dos neokantlanos. desde Stammier, até Del Vecchio, consistiu em atingir um conceito universal de direito que leva-^se em conta tMas as suas mutações históricas.

Preocupa-o a verificação de que o direito é também um fato, parecendolhe difícil, senão impossível, na ordem distinguir a idéia do fato. exafieri”, não U ● in moral

tamente por isto, porque as idéias na ordem moral são fatos (pág, 59). estudo da idéia do direito”; desde qué não se

Isto, porém, não impede o

pretenda fixar “ definitiva e positiva mente o conceito de direito”, pois, se assim se fizesse, “ficaria cerrado o ci clo do desenvolvimento do direito”.

Em suma, para Farias Brito o di reito interessa mais como “força viva da história”, uma idéia que se expres sa através de intuições ligadas às con dições históricas “ dentro do círculo estrito do desenvolvimento mental de um indivíduo ou de um povo” (págs. 59 e 60).

É com todas essas ressalvas que o autor de “Finalidade do Mundo avança timidamente a sua “definição de direito, ,em nada diversa da domi nante no positivismo da época, mas que se distingue exatamente pelo seu caráter de provisoríedade, refletido na pergunta-ressalva que é dela in separável: “Eu defino, por II exemplo, o direito nestes ter mos: é a norma de conduta im posta por autoridade do poder público. É a minha definição própria. Mas quem nos garan tirá que o poder público não venha a desaparecer um dia, sendo que é pos sível imaginar que a harmonia social se estabeleça por Hvre acordo de von tade?” (pág. 59).

Dessarte o que os positivistas pro clamavam ser a verdade brotada da experiência histórica, para êle é ape nas uma verdade provisória, uma “in tuição particular, variável e relativa que pressupõe algo não suscetível de conceituacão, algo que é, ao mesmo tempo, idéia e fato, "uma obra a se fazer sempre, nunca dcfinítivamente feita”, isto é, o direito que. tal como a fMosofia da oual promana, é uma atividade permanente do espírito- (pág. ff

ga esta concepção, mas devemos rece bê-la no seu valor postiivo, que con siste em arrancar o véu da auto-sufi ciência positivista para começar a perceber tôda a profundidade dos pro- r blemas comodamente postos cn.re parêntesis pelos seguidores dc Comte ou de Spencer.

Além do mais, a especulação de Fa rias Brito não sc exaure na afirmação acima referida, pois, se o Direito é 9 “norma de conduta”, ele desde logo ' se propõe a perguntar sôbrc o que se (leve entender por lei jurídica.

Lei e idéia do Direito

O presente estudo ficaria cm ver dade, incompleto se não lembrasse que, no pensamento britiano, há um dado complementar, que desempenha papel saliente em sua concepção jurídica: é o conceito ele lei-

A distinção que êle estabelece entre lei moral e lei natural é, não é demais friz.á-lo, de impressionan te modernidade, a Começar pela rei vindicação, mais tarde firmada CasBirer e rc’terada por Kelsen, to à transladação do conceito de lei, da esfera moral, onde se originara, para os domínios da natureza, e a ponderação irônica sôbre a atitude daqueles que, — entusiasmados erm os triunfos da fí.sica, — se eqnivo-am pleiteando a modelagem da fei jurídi ca segundo a matriz da lei física...

Entre ambas, Farias Brito aponta uma diferença radical, pois as leis na turais “são apenas uma representação abstrata da ordem dos fenômenos”, e, por conseguinte, “uma abstração em nós”: como tais "são absolutamente inertes e nenhuma influência poderão por qu.m57).

Não hâ dúvida que é demasiado va1

r 9 '

exercer sôbre as coisas, a menos que sejam consideradas como conhecimen to, porque então hab.H»,am o homem a dominar as íòrças da natuieza: só néste caso podem ser consideradas co mo íòrças, não na na.urcza, de onde são abstraídas, mas no homem, que fi ca, por sua compreensão, dotado de um novo poder” (págs- 27 e 28).

O mesmo não ocorre em sc tra tando de leis jurídicas, que não são abstrações de íciiòmcnos, mas sim “regras dc ação, princípios de ativi dades”.

Essa afirmação só se torna compre ensível à luz de uma das teses persis tentes dc Farias Brito, a que levou Leonel Franca a considerá-lo um Famp«íqui6ta, tal a importância que o fenômeno da consciência ostenta em

sua doutrina, onde o ti mesmo” socrálico sc funde ou se confunde com o panteismo espinosista, visto scr destino dc tudo quanto existe tornar-se consciente de si mes mo.

E eu

Mundo Interior”, pág. 422) resulta do fato de qu© “em Deus pensar é criar”. (4)

Xo quadro dessa concepção, distin gue êle, todavia, duas modalidades de existência”: a consciência e as coi sas, sendo a primeira a existência ver dadeira, a mais real e profunda, o espírito} as segundas correspondem ao mundo fenomcnico, exteriorização da realidade primeira.

Êsses dois princípios — a consciên cia c as coisas, formam uma dua.ida de irredutível e é dai que deriva a dualidade, considerada também irre dutível, do espírito e da matéria”, mas estão ambos subordinados a um con ceito mais geral, que encerra, ao mes mo tempo, o espírito e a matéria: é o conceito de existência.

conhecc-te a Pois bem, tudo o que se eleva ao plano de consciência (e, como já disé essa para êle a lei ascencional e necessária que governa o cosmos) não abstração, simples aparência se, e mera

de uma realidade subjacen.e, mas é a realidade mesma, trazida à luz do co nhecimento e da verdade: produz o movimento, escreve ele, e com êste a necessidade mecânica; o pensamento produz o conhecimento e a fôrça digo, em conclusão, escreve êlc, e nisto consiste a minlia concep ção fundamental: o mundo é uma ati vidade intelectual, pois é Deus pen sando, e nós, homens como elementos que somos do mecanismo do mundo, fazemos também parte do pensamento de Deus, c somos, por conseguinte, no mais rigoroso sentido, idéias divinas (“O Mundo Interior”, Rio, 1914, pág. 423).

4 — o curioso é que Farias Brito pro(nara conciliar essa colocação do proble ma, de cunho idealista, com uma gnoseologia marcadamente real sta (Cfr. "Mun do Interior”, pág. 375) afirmando, inefável candura: "tôdas as teses do Healismo absoluto são absurdas" (pág. 374).

Parece-me que, em última análise, êle ainda se mantém jungido aos horizontes do naturalismo, por mais que o queira superar: como pensador situado na en cruzilhada de duas concepções do mundo, o máximo que faz é procurar infundir es pírito à natureza, concebendo o existente (o que êle impròpriamente denomina exis. tência) como um processo contínuo de auto-consciência, que faz da verdade o prlncíp‘o gnoseológico e ético do cosmos, numa concepção não isenta de pendores místicos. com incapaz de superar o naturalismo, Farias Brito converte á natureza em projeção de Deus, como momento do pensar divino, sendo a criação do uni verso (c nunca é demais acentuar que êle mantém do pensamento hebraicocristão a idéia fundamental de Deus criador de tôdas as coisas) (“O

com éste a liberdade, e é só com a li berdade que começa a ordem moral.” (“A verdade como regra das ações”, pág. 30).

È nessa ordem de idéias que o pen sador cearense funda a sua distinção entre as leis naturais ou fenomenais, que são abstrações inertes, e as leis morais (religiosas, morais estrito sensu e jurídicas) que são realidades es pirituais ativas, ao mesmo tempo fato» e idéias.

Daí a conclusão de que as leis mo rais, não sendo abstração do real, não podem ser consideradas verdadeiras ou falsas, como tudo, aliás, que se de senrola no plano do pensamento ou déle é expressão, a exemplo da lingua gem. Assim como não sc pode dizer que uma língua ou uma religião sejam verdadeiras ou falsas, da mesma for ma não será lícito afirmar que ‘‘a le gislação de' tal povo seja verdadeira ou falsa, por mais grosseira que se nos afigure. Essa legislação é um fo. nômeno real e um processo de vida, um produto, sim, da inteligência, mas de significação objetiva e Concreta, pois permanece como fato e exerce ação como princípio c como regra de conduta”. (‘‘O Mundo Interior”, pág101).

A lei, por conseguinte, que o homem estabelece para a sua conduta, não pode ser senão expressão da verdade, pela “subordinação de nossas necessi dades orgânicas, ou mais precisamente, do elemento natural da vida ao ele mento racional da consciência” (“A verdade como regra das ações”, pág. 24).

Ligando o problema da lei ao pro blema da verdade repele Fanas Brito a definição corrente de lei jundiCa coa regra da ação imposta mo sendo

pela autoridade”, por seu caráter pu~ ramente formal, ao passo que o ver dadeiro conceito de lei deve ser subs tancial, isto é, fundado no critério su premo da conduta.

Como, porem, não nos é dado agir segundo critério.s absolutos de verda de, pois erramos a todo instante sôbre as coisas mais simiiles, só nos resta aceitar o que se compadece com o H-niite de nossos conliccimento.s, ijroce- ● dendo, sempre c em tôclas as relações da vida, “ dc conformidade com o que pensamos ser a verdade, isto é, de conformidade Com as nossas convic ções” (íbidem, pág. 31). Donde o seu conceito ele lei: “c a convicção co mum, c a convicção da consciência co letiva; já, tendo por si sòmentc a au toridade da razão, e neste caso é a lei moral; já, tendo por sl também a autoridade do poder público, e neste caso é a lel jurídica” (pág. 33).

Como sc vê, as leis jurídicas englo bam os seguintes elementos:

a) representam ditames da cons ciência coletiva;

b) têm por si a autoridade da ra- ® zão;

c) e são garantidas pela autorida de do poder público.

A prccminêiicia assegurada à cons ciência comum da verdade correlacio na o pensamento de Farias Brito ao de alguns pensadores eminentes de seu tempo, desde Bierling a Duguit apresentando, porem, um fundamento de ordem piiramente sociológica. Das duas interpretações possíveis da ria do reconhecimento (5), uma de cunho sociológico, outra Funda

5 — Cfr. MIGUEL REALE

mentos do Direito, São Paulo, 1940, cãf. 14 e segs. nao teoff de Birling.

de caráter lógico, inclina-se. a meu ver, mais para a segunda a doutrina de Farias Brito,' que apresenta a lei como uma transação (sic) entre o cri tério objetivo da verdade e o crité rio subjetivo da convicção, transação esta que sc impõe a cada homem por três motivos: “l.o, porque a parte necessàriamente deve ceder cm fase do todo; 2.0, porque isto c uma das con dições da ordem social; 3.o, porque bá cm favor da consciência comum a

gem relativa à compreensão da lei co mo um ato de consciência.

De temperamento retraído e talvez timido Fanas Brito revela amar, aci ma de tudo, a liberdade c‘omo autoconsciência c como afirmação da ver dade, o que o leva a uma concepção radical no julgamento dos povos que se sujeitam ao querer de um tirano. Sc os súditos não se revoltam; se an tes se conformam com as ordens iní quas baixadas por um déspota, é por que assim o querem: as decisões de um déspota não deixam de ser leis, expressam a consciência comum de um "rebanho de escravos”, que se dobra aos imperativos da fôrça... Nesse ponte, o ensinamento de Farias Brito recorda o de Hegel, no adendo ao § 27 de sua “Filosofia do Direito”: “ Que alguém seja escravo, depende de sua vontade particular, assim como está na vontade de um povo ser subju gado. Os responsáveis não são, porém, escravizam ou escravos apenas aqueles que subjugam presunção da verdade” (pág. 31).

Dessarte, razõe.s ele ordem lógica e exigências pragmáticas c clcontológicas legitimam o conceito briiiano de lei, a qual não sc reduz à mera von tade do poder público, o qual deve ser intérprcic da consciência coletiva. Obediência à lei como convicção comum”; c desobediência à lei quan do mera expressão da íòrça, c'S dois ' conceitos que demonstram ser o pen samento dc Farias Brito essctu-ialmentc democrático, inclusive pelo reconhe cimento dc que se não nos é possí vel atingir o ideal do “livre assenti mento de tôclas as vontades unifica das i)cla posse dc uma só e mesma convicção”, “o mais que se pode exi gir é que a lei seja a convicção da n\aioria” (ó) invoca o filósofo nordestino em apoio de sua tese o exemplo de Só crates, morrendo por obediência à lei, embora convencido de que ela não re presentava a verdade- Sócrates está sempre presen‘e na obra do pensador brasileiro, c não apenas nesta passa, mas também os ou subjugados mesmo”. (7) É velho, aliás, o famoso brocardo: “coactus voluit tamen voluit”, que coincide com a doutrina dc Croce quando nega a possibilidade de coagir-se a vontade ou o espírito, focalizando exatamente a hipótese de uma ordem despótica. (8)

n — É o que não o percebem ou não o querem reconhecer certos críticos preve nidos, como é o caso, por oxemp’o, de JOAO CRUZ COSTA, fazendo. alí;s, ci tação ambígua de um meu ant'go livro, o "ABC do Integralismo", São Paulo, 1937, onde sequer é citado o pensador cearense.

ínfelizmente Farias Brito dedica poucas linhas ao problema da coação, limitando-se a admitir o caráter com plementar do direito, em confronto com a moral, cujos imperativos a lei

7 — Cfr. HEGEL "Grundlinlen der Phtlosophie des Rechts”, ed. Lasson, 3.a ed., Lipeia, 1930, “Zusâtze aus Hegels Vorlesungen", pág. 301.

8 — Cfr. CROCE — "Filosofia delia Pra tica", Bari, 4.a ed., 1932, págs. 210 e segs.

jurídica assegura graças à sanção ma terial, pelo emprego da força. Tratase, porém, de “um constrangimento exterior" (pág. 62) ou de um “com plemento exterior da fôrça” (pág. 63) ' ● o que demonstra que não se pode afirmar, sem maior exame, ser éle partidário da teoria da coação. Bara V éle a lei jurídica nunca deixa de ser ' lei moral, porque deve ser necessàriaexpressão da consciência meiile uma coletiva, munida extrinsecamente da fôrça que lhe empresta o poder pú blico, na medida em que êste se man tém nos limites da convicção comum, cujo valor se impõe ao legislador e destinatários da lei. aos

IMais do que o elemento material da coação, o que sobreleva cm sua con cepção ,-do direito é a fôrça da ver dade, que é um imperativo indecliná vel para todos os homens, pois a jus tiça absoluta seria “a perfeita confor midade da ação com o pensamento, e a perfeita conformidade do pensamen to com a realidade”. Sendo impossí vel a justiça absoluta, não deixa ela de ser nossa permanente aspiração: “quando não exista como fato, deve existir como ideal” (pág, 62),

sempre afirmação que corresponde a cé'ebre lição de Stammler: “o direito é sem-

pre uma tentativa de ser direito jus* I to". (9) I

Neste, como em outros pontos, re- jj vela-se Farias Brito, inegàvelmente, I um pensador empenhado na revisão do í positivismo dominunle no Ocidente, " quer por compreender as necessárias implicações da e.xpcriéncia jurídica com a temática filosófica geral, quer por lhe infundir um sôpro novo haurido nas fontes inexauríveis dos valo- k res humanos. ExpÜca-se, dessarte, a I coexistência ou o amalgama de velho J e de novo cm seus escritos, sem se | integrarem cm uma unidade superado- J* ra: em suas obras ainda persistem al- ^ gumas das posições do naturalismo, mas, até mesmo quando parece repetir concepções vigentes na Filosofia ou na Jurisprudência de seu tempo, fácil é perceber que já vêm elas densas de problemas universais e de perguntas que depois vieram a consti'.uir al guns dos temas centrais de nossa época.

D — Como se vê. não sc pode asseverar que FARIAS BRITO seja um adepto da teoria da coação, sem a compreensão to* j tal de seu pensamento. Nessa falha de I Interpretação incide SILVIO RABELLO * num livro onde a apreciação c Itica é muitas vôzcs empanada por espIri*o cK>* lêmlco e até mesmo agressivo. Cfr. "Fa rias Brito ou uma aventura do espirito". Rio, 1941, págs. 150 e segs.

PRIMADO DO DIREITO

Daiuo de Almeid.-v Magalhães

("Specch” de agradecimento proferido pelo notável advogado, em nome dos juristas bra.sileiros, no encerramento do Congresso da Comi.ssão Inter nacional do Juristas, a que compareceram representantes de 73 países)

I T.ma cálida palavra de agnidecimen^ to vos é devida, srs. congressistas, pelos juristas brasileiros, a que sc asso cia, sem dúvida, o povo do Bra.sil, pela honra conferida ao nos.so país, com a escolha desta amena cidade de Petrópolis para cenário do vosso encontro.

ximação, propícia a revelar à vossa curiosidade dc estudiosos marcas e ca racterísticos que assinalam a nossa evo lução social, jurídica e política c defi nem a nossa personalidade nacional.

Orgulhamos-nos de possuir a vocação da convivência. A cordialidade é uma

O trabalho realizado correspondeu das qualid..des que mais reputamos c plenamente à relevância dos temas ver- procuramos cultivar. Por isso, abominasados, nos méritos dos que dôle parti- nio.s a violência; não nos atraem as sociparam e h tradição da Comissão In- luções radicais ou extremadas; não melemacional de Juristas, acrescentando dram duradouramente entro nós os re novos títulos ao reconhecimento e ao gimes do fôrça. As soluções que predorespeito que já merece de todos os po- minam inst nlivnmentc no nosso país são vos, que se beneficiam da sua ativida- de equilíbrio. Os precoiKTilos de rade benemérita, c especialmentc dos ju- 9*1) de côr, de religião, e dc condição ristas, que bão de encontrar no labor social são repelidos pelo sentimento mais , fecundo aqui desenvolvido. novos esti- profundo c autêntico do povo, antes de mulos p-ra o cumprimento da sua mis- serem condenados pelo nosso sistema le são e motivos de orgulho pelo papel gal. A mesma capacidade de assimilasocial que Ibcs incumbe desempenhar. ção que revelamos no terreno racicl sc Dc nossa parte, estamos certos de idenüfica no terreno cultural, institucloque a vossa permanência entre nós, que político e jurídico. O nosso espír to lastimamos tenha sido fugaz, permitiu está aberto à compreensão, ao entendiao vossO agudo senso de observação e mento, à conciliação e ao compromisso, análise, em contato com a nossa gente, O ideal que perseguimos é de uma depelo conhecimento direto das nossas ins- mocracia social, (^slruturada sob a ins tituições e da nossa vida, compreender piração do humanismo jurítlico. que a vossa viagem Qté essas paragens Essa é uma iniilinação natural e proremotas se justificava, de alguma forma; funda da nossa gente, como fruto da pela oportunidade de' melhor conhecí- nossa formação histórica. Por fsso mosmento da terra e do povo quo vos aco- mo, a tarefa de organização e disciplina Ihcram com espirito fraterno. que incumbe ás classes dirigentes e aos Acreditamos apresentar alguns traços juristas se facilita pela maneira de ser e condições que poderíam justificar a do nosso povo, tolerante, cordato e acodistinção que nos fizestes, compensada Ihedor. Só por uma deliberação propopelo ensejo que se abriu para esta apro- sitada, fruto de êrro consciente, de inap-

tidão, ou de intuito per\'erso, inspirado pela ambição, ou por sentimentos subal ternos, as classes dirigentes forçam o desvio dessa linha de evolução espontâ nea e orgânica — desvio, que, feliz mente, tem sido sempre tríinsitório, per mitindo, pelas reaçõjs inelutáve s, a re tomada do rumo que corresponde à ín dole nacional, votada aos métodos de composição e de compromisso.

Essa inclinação permanente do senti mento coletivo se reflete nas nossas ins tituições políticas c jurídicas que têm alcançado duração. Ven cida a fase conturb.ida da consolidação da in dependência nacional, vivemos quase meio sé culo sob a monarquia representativa, de estilo europeu, desfrutando de uma estabilidade que permitu assegurar a unidade da pátria disper sa e preparar uma elite dirigente de alto nível, dominada pelo mais arraigado sentímenlo ju rídico. Do eixo do constitucíonalismo monárqui co à maneira européia, evoluímos, sem choques profundos, pa ra o sistema presidencial segundo o fi gurino norte-americano, cuja técnica ju rídica assimilamos cem rapidez, rele vando a cap cidade de adaptação do povo e das classes dirigentes. Movimentos rebeldes inspirados no ideal de aperfeiçoamento da prática das instituições republicanas, com a garan tia de eleições legítimas e da efetiva participação popular na composição do governo, favorecidos pela crise econôlíiica que, como um catacl smo, se ir radiou pelo mundo na década de 30,

forçaram a reestruturação do sistema. O govêino discricionário que a revolu ção instaurou teve, porém, breve dura ção. A consciência jurídica impôs o res tabelecimento das franquias democráti cas, restauradas através da Constituição de 1934,

mento constitucional dom nante na épo ca, embora a carta fundanicnlul conser vasse as linhas mr.stras do modelo norqual SC assimilou o pensana tc-americano. P. gamos depois o nosso tributo à crise que abalou us democra cias, com ascenção dos regimes de

fôrça, que ha\iam de desencadear a segunda conflagração Conhecemos, então, o flagelo d'' um golpe dc estado, desferido do almundial

to. que obrigou a lega lidade a tomar férias. O interregno cesarista, im posto pela fôrça, não chegou felizmente a * constituir um sistema. Não passou dc uma “nr.kcd power’', reduzi do ao mero poder pes soal do ditador. A na ção não aderiu no regi me a que quizeram suhnietô-la; o regime não sc integrou na nação. A experiência nefasta pôs à pro va, ma;s uma vez, a índole do povo. avesso às forma.s extremas, c serviu do “test” ao vigor do e.spírito jurídico, dc que está impregnada a consciência co letiva. Uma defesa passiva, espontânea, embora desarticulada, estabeleceu o iso lamento mortal dá ditadura, que não lo grou deitar raízes, por não encontrar no ambiente os estímulos c as condições necessárias à sua vitaPdade. Êsse interrégiio não representou um recuo na nos sa evolução; foi um desvio que serviu

para revitalizar o aprofundar a Jiossa consciência democrática c a compreen

são do valor das garantias jurídicas. Re tomamos cm 1946 o fio da tradição in terrompida, sob signo propício, com amor revigorado às instituições ]i\res.

No curso dc 140 ano.s, \ i\ cmos, cm duas etapas de quase igual duração, sob a monarquia rcprcscntali\ a c a repúbli ca presidencial; c rccenlcmcntc .sob o en saio do si.stema parlamentar. Cinco^constituições servem de mareo a essas trans formações. Não é \inia experiência excessivamente conturbada, que rc\olc ins tabilidade anormal, num país que sc de senvolve cm condições complexas. Ou tros povos superiormente amadurecidos conheceram mais mimcrosa.s c radicais mutações, com maiores abalos c sofri-

A uma assembléia tão ilustre esta, formada de juristas eminentes, \ intlos de todos os qiiadranlcs do mundo, unidos todos por um pensamento conium, que é o de trabalhar pelo “prima do do direito”, o estudo da experiência que vivemos há de ser ilustrativo c ofe rece estímulo para que prossigam na “^ua obra benemérita.

puro arbítrio pessoal. Das ditaduras já se disse que são um flagelo sem saídas normais; não tem portas, nem janelas; c delas só se libertam os po\ os pela sub versão ou pela guerra. O pronunciamento unanime das forças armadas pòs termo,

cm algumas horas, sem choques, nem \iolcncias, ao poder ditatorial que, ãquela época, já durava havia 8 anos. E \itorioso o movimento se verificou o triun fo do sentimento jurídico da nação, do todos os chefes milique participaram

"e no ano passado, quando uma crise política imprevista e gravíssima ameaçou pôr em risco a paz nacional, foi urna fórmula jurídica - a reestruturação do sistema de governo, realizada pelo Con gresso Nacional, no exercício da sua competência — que logrou restabelecer ràpidamontc o clima dc normalidade, neutralizando os choques e garantindo o primado da legalidade. Senhores congressistas: As vossas lições não serão por esquecidas. Na terra, que vos agazalhou muita lionra e prazer, as vossas pa lavras terão ressonância duradoura, porfalam à nossa sensibilidade e à nós com que mentos.

A nossa existência nacional se desen volveu sob o signo do sentimento jurí dico. E êsse sentimento arraigado é que nos tem permitido atravessar os transes mais delicados da nossa história sem abalos mais graves c convulsões sangren tas. Para diir testemunho da influência bemfaseja dessa confiança nas institui ções jurídicas o no império do direito, a que servis no plano universal, permiti que vos recordo dois episódios recentes da nossa história nacional.

Em 1945, tivemos que transpôr uma crise delicada: a reimplantação da or dem legal e da normalidade política, emergindo dc uma ditadura apoiada no

tares: o go\'crno foi entregue aos presi dentes dos tribunais de justiça do pais, csidissem às eleições, com para que pi plenas garantias — eleições que se lizaram logo depois, em perfeita ordem e liberdade. Cederam as armas à toga, vitória do regime de roacompleta com a 4 legalidade.

nossa compreensão.

É a recompensa que podemos var à distinção que nos foi feita, per mitindo-nos receber-vos na nossa casa como velhos amigos, para retomarmos a conversa que, à distância, nunca se in terrompeu.

O que desejamos conservar, como o tesouro mais valioso de nossa comunidareser-

Ide, é e5sa vocação para a democracia dida: ela precisa ser recriada c aperfei- ' scdal, sob a inspiração do humanismo çoada sem cessar, para não perecer, pois jurídico. Hoje, mais do que nunca, de vemos recordar estas paLvras de CARNELUTTI: “Que bem os homens pro curam assegurar com o d reito? O maior de todos: a paz”. Paz entre os homens; paz entre as nações. E é para servir a êsse ideal que aqui nos rsunimos, propugnando pelo “primado do d reito”.

Não nos ctemorisa a crise do direito. Seria de temer-se — isso sim — a crise ponsável pela sorte comum, dos juristas, pela traição aos seus ideais e pelo abandono dos deveres inerentes ao seu “status”. Como lembrava DEL VECCHIO, em sentido geral, o direito e a ciênc’a, como a própria consciên cia e a vidj humana, estão em crise per pétua, empenhados no esfôrço incessan te de adaptação, de transformação e de reintegração. A procura das soluções, ra ramente perfeitas, é o drama da nossa existência.

Temos bem viva a consciência de que a ordem jurídica, como a civilização mesma, não precisa apenas ser defen-

tôdas cs criações lium.m.is trazem cm si o germen da própria degonerescência. As'formas legas e as instituições jurídi cas são para todos nós meros instrumen tos destinados a assegurar a justiça, a paz e a dignidade do homem, não como indivíduo isoLdo e protegido no seu egoísmo, mas como parte integrante ds uma comunhão social, solidária c res-

Por isso mesmo não trabalhamos para preservar uma ordem jurídica estagnada ou coagulad.1. O direito a que servimos há de ter, por sua natureza, estab.Iidade e continuidade; não será, porém, imutá vel ou retrogado.

O pensamento generoso que nos con grega é 0 de ajudar à realização da obra reclamada por uma das consciên cias mais vigorosas da nossa época — c que nosso país teve o privilégio de aco lher por vários anos — Georges Bernanos; construir um mundo justo para os [ homens livres.

O CONTRÔLE DE PREÇOS

£M vão se vem tentando o controle de preços no Brasil para evitar os abusos e especulações no nob.e Íii uÍto de resguardar a bòlsa popular n.iq.tilo que é mais necessário â subsistcncia.

Alal colocado o problema, cnt.cgae a improvisadores, nem sempre de pro bidade à prova das tentações que êle oferece, tém os preços subido sempre ante o expediente tradicional do desa parecimento das mercadorias do mer cado livre, forçando o mercado negro, Com a derrota das autoridades empe nhadas em evitá-lo.

tribuem com altas propinas, sendo di fícil extirpá-los.

Um patrício estudioso dessas ques tões, impressionado com o prima;ismo, a ignorância, a presunção, tempera dos com a corrupção dos homens que úhimos vinte e cinco anos vêm conduzindo o controle de preços en tre nós. publicou uma espécie de bo letim que distribuiu, remetendo a pes soas que se intcicssam pelo assunto. É apenas uma página onde se alinham os insucessos de quarenta séculos de tentativas frustradas para controlar preços, insuflados pelas inflações, ü resultado fatal tem sido sempre o mes mo. isto é. a morte da P^o^uçao a fuga das mercadorias, levando as po pulações ao desespero.

Há cêrea de quarenta séculos o Có digo Hamurabi impôs um sistema rí gido de controle de salários, de prede produção e consumo, abrangendo a economia da Babilôma. Resultado, asfixia completa.

É uma ingenuidade supor preços das coisas mais necessárias à população possam ser contidos por de cretos ou portarias, mesmo com a ameaça das sanções mais violentas. Aliás essas tentativas vêm da Anti guidade, sempre mal sucedidas c sem pre renovadas cada vez que uma cau sa abala a marcha normal do equilí brio cconômii.o entre a produção e o consumo. De nada valem as chamadas comissões coordenadoras ou controla doras, onde se intrometem indivíduos hábeis cm e.xplorar, para proveito pró prio, as restrições impostas ao comér cio livre. Só este, mostra a experiên cia, é ca.paz de restabelecer o equi líbrio entre a produção e o consumo. É verdade que medidas sóbrias podem eliminar do intervalo “ produção-consumo” os intermediários que vivem da especulação; êstes, porém, são em ge ral figurões políticos, ou protegidos da política dominante, para a qual çon-

nos ÇO.S; comero sis-

que os [ 1 3 1 donado. O Édito

Em Atenas, quatro séculos antes de Cristo, o governo submeteu o^ cio de cereais a um sistema férreo de controle de preços, enviando para o pôrto um contingente de inspetores para fiscalizarem as transações. As in frações eram punidas com a pena de morte dos mercadores e, também, dos inspetores, se êstes se mostrassem ne gligentes. Apesar da severidade tema fracassou na prática e foi aban-

procurando regular os preços, atingiu em cheio a economia romana, empo brecendo o Império. O imperador es tabeleceu preços máximos que grava ram os objetos que na época se ven diam em Roma, e fixou o salário de cada trabalhador. Os infratores eram punidos com a pena de morte. Os mercados esvaziaram-se, as mercado rias eram escondidas, os produtores abandonavam o comércio- Os citadinos sofriam as mais sérias privações. Deoclcciano reinou durante 21 anos e per seguiu os cristãos nos dois últimos anos, abdicando em 305, retirando-se para Salona, onde viveu na maior sim plicidade ainda durante oito anos, re fletindo sóbre o malogro de boas in tenções mal aplicadas.

No fim do século XII a Inglaterra repetiu a experiência, limitando o má ximo dos preços do pão, do peixe c do vinho. Durante cinco sé culos a lei foi revista vá' rias vêzes, emendada e... fraudada até que o Par lamento a revogou no in teresse do bem público”.

Quando o Duque de Parma sítiou Antuérpia, as autoridades da cidade decretaram o controle dos preços do que havia. Consumidos ràpidamente os estoques, nada mais en trou na cidade onde os preços eram baixos. Esta rendeu-se, mais pelo seu êrro econômico do que pela pressão dos sitiantes.

Em nossos dias a COFAP repete essa aventura no Estado da Guanaba ra, tabelando os preços abaixo do cus to nas regiões produtoras, mesmo de pois de o Banco do Brasil ter pago a diferença entre o preço tabelado e custo de produção. E a população

guanabarina sofre as maiores tortu ras e vexames, sitiada pelo Governo Federal. Com uma cliícicnça dc An tuérpia, porém, porque no Rio dc Ja neiro foi o jjróprio "sitiani.c” que fêz o tabclamcnto...

Os exemplos da França c da Alemamanha, depois da última Grande Guer ra, são significativos. A França pou co ou quase nada conseguiu com a li mitação dos preços, ao passo que a Alemanha Ocidental, sob a inspiração do Ministro Erhartlt, liberou os pre ços e rccupcrou-sc na abundância da produção.

O mesmo sc verificara na Índia, cm 178Ó, batida pela calamidade da fome. O próprio Governo fomentou a espe culação, elevando os preços nas zonas flageladas para onde aíluíam as mer cadorias necessárias.

O autor desses dados históricos so bre o crucial problema que aflige a população carioca, conserva-se discretamente anônimo. O exemplar que recebí vem com uma dedi catória, datado de São Paulo, com as iniciais A.S-, sc bem as decifrei. Mas a verdade histórica não vale menos por isso.

0‘ que a COFAP está fazendo com a população carioca, tabelando os gê neros de maior necessidade abaixo do custo nas zonas produtoras, impedin do que cies cheguem ao Estado da Guanaljara, isolado por um cordão de fiscais, c determinação do Governo Federal para levar a população ao desespero e criar uma situação que justifique a intervenção federal, com a deposição do Governador. Faltou o feijão, faltou o arroz, e, agora que êles ameaçam chegar, começam a fal-

tar o pão c a carne... Já sc sabia <lue isto iria acontecer.

Não temos como adquirir diretamen te 0 que nos falta. A COFAP, órgão federal, não permite. Somos uma ter¬

ra ocupada por inimigos que nos im põem a tortura da humilhação c da fome.

Confiemos em Deus, que escreve certo por linhas tortas.

Socialismo e Socialização em face da

Encíclica Mafer et Magistra

Pedro GalvÃo de Sousa p ● í; eni meio à ressonância alcançada no mundo inteiro pela EncícMca Mater et Magistra, vimos desde logo levantar-se uma questão propícia a confundir os leitoras apressados do luminoso documento pontifício: terá n Igreja, através da palavra do Papa João XXIII, promovido uma aber-tura para a esquerda, pe’o fato de reconhecer e admitir a “socialização” como uma das notas características de nossa época?

ao Conselho Técnico do Instituto de Sociologia e Po'ítica da Federação do Comércio do Estado de São Paulo

e numa conferência profeiúda no Centro de Debates de Assuntos Eco nômicos “Cáspor Libero”.

U socialismo cristão”, que ansiosos por

Nesse sentido, chegaram alguns ao ponto de invocar a autoridade do Vigário de Cristo para justificar um suposto pregam afoitamente, conseguir um lugar na crista da onda os tempos. Também se insinuou um recuo do atual Pontífice em relação às diretrizes claramente expressas por Pio XI a respeito do assunto. Finalmente houve mesmo quem visse na Encíclica uma porta aberta aos

católicos para praticarem a poMtica da “mão estendida”, aceitando a idéia da coexistência pacífica, ' conizada pela propaganda comunista para quebrar as resistências povos ocidentais ainaa sejam capa zes de oferecer à tática soviética da guerra fria.

Encaminhando estas notas ao Digesto Econômico, faço-o depois de , haver por repetidas vê_es focalizado ' o tema, especialmente em curso mi[! nistrado no Instituto Teológico Pio XI, em comunicações apresentadas preque os

E antes de mais nada, tenhamos presente a admirável continuidade da doutrina social da Igreja, através dos numerosos documentos emanados da Cátedra de Pedro, aplicando aos problemas destes últimos tempos os princípios eternos do Evangelho. Essa doutrina tem por fontes os princípios do direito natural e os en sinamentos' da Revelação. De Gregório XVI, quando o liberalismo co meçava a difundir-se pelo mundo, até João XXIII, quando muitos jul gam no socialismo uma fatalidade histórica, há uma linha de coerência na qual em vão se hão de pi*ocurar contradições. O que variam são as situações de cada época, exi gindo uma aplicação diferente dos mesmos princípios.

De um modo especial estas obser vações valem para as trcs grandes Encíclicas concernentes à ordem eco nômica, isto é, a Rerum novarum de Leão XIII, a Quadragésimo anno de Pio XI e a Mater et Magistra. A estes documentos acrescentem-se os memoráveis discursos de Pio XII alu sivos a temas semelhantes.

Definindo a posição da Igreja, ao condenar os abusos do capitaMsmo, de inspiração liberal, o o falsos princí-

pios socialistas. Leão XIII, primeira destas EncícMcas, dava-nos a “carta magna” do operariado. Comemorando o quadragésimo versário de sua publicação, Pio XI precisava alguns pontos da Kerum novarum e doscorl.inava

conr a aninovos e uma série e importantíssimas. Encíclicas, sem falar no Syllabus de Pio IX e nas que versam temas especificamente religiosos, cujo conhe cimento permite alcançar em toda a sua profundidade o significado e o alcance da doutrina social católica. mais amplos hoiizontes. O mesmo veio fazer o atual Pontífice, ocasião do septuagésimo aniversário da sempre lembirda Encíclica do Leão XIII. Quanto imediato, governando a Igreja nos anos torpor ao seu sucessor

mentosos da guerra e preocupado problemas da reovgani.ação do mundo de após-guerra, não com 03 ne-

1. Cristianismo e socialismo

Nessas perspectivas é que se deve colocar o problema do socialismo em face da doutrina ' da Igreja.

Na Encíclica Quadrage.simo anno decla0 so- Pio XI: i*ava cialismo, quer se con sidere como doutrinq, fato histó- gou a escrever uma EncícMca do teor das que formam êsse tríp tico, mas deixou escla recimentos dos mais oportunos em numero sas alocuções proleridas a operários o a patrões, a participan tes de Semanas Sociais e membros de diver sas entidades. j quer como rico, ou como se é verdadeiro sociadepois açao', mesmo lismo. de se aproximar da verdade e da justiça pontos sobreditos, pode conciliar-se doutrina catópbis concebe a modo nos não com a lica, sociedade de j í completamente avesso à verdade cristã”. E

Para bem compreEncíclica a mais 0 seguinte: “Sosocialismo católico ender lismo religioso, são termos contraditórios: ninguém pode ao mesmo tempo ser bom cató-. verdadeiro socialista*. lico e Mater et Magistra, cumpre conside rá-la não apenas em trechos isolados, ou em frases e até palavras a que

a’guns se apegam para daí tirar partido, mas na integridade do seu texto e ainda no contexto doutriná rio dos mencionuuos documentos, além de outras diretrizes pontifícias. Sôbre a constituição da sociedade e do Estado, o poder político e a li berdade, o liberalismo e o socialismo em suas várias modalidades, há tôda

Cristianismo e socialismo repelempelo antagonismo de duas concepda vida irreconciMáveis. C . se Os çoes pressupostos ideológicos do socialismoderno são incompatíveis com verdades fundamentais da vida cristã. 0 socialismo deve ser enten dido na linha do pènsamento natumo as

ralista — negando a ordem sobre natural — e partindo de certas pre missas que já eram as do individua lismo liberal: nega o direito natural ^ de propriedade, o caráter sagrado da família e a origem divina do poder, enquanto por outro lado enseja o to talitarismo do Estado e preconiza teoricamente uma sociedade iguali tária, em contraposição com as reali dades humanas e com as nonnas do Evangelho.

O Cristianismo essencialmente é uma religião. Procede da revelação de Cristo, que representa o Novo Testamento, na continuação do An tigo, isto é, dos tempos em que a humanidade era [rreparada para a vinda do Redentor. Não é uma dou-

Itrina social, nem um sistema polí tico. Mas, sendo religião, implica em uma concepção geral da vida e do destino do homem, da qual de correm consequências de natureza so cial, econômica e política.

inspirador da revolução russa. Su perada a fase do socmlismo utópico, que vinha da Renascença, foi feita por Karl Marx a sistematização dos princípios socialistas. Marx aplicou, para a interpretação filosófica dos fenômenos sociais, o idealismo de Hegel e o materialismo de Feuerbach. Daí resultou o materialismo histórico ou dialético, base ideológica do chamado “socialismo científico”. Tôdas as correntes socialistas têm recebido esta influência, e o último Congresso do Partido Comunista rea lizado em Moscou reafirmava os mes mos princípios, fazendo ver como deve entender-se p:*esentemente, na visão socialista, a concepção cientí fica do mundo.

Evidentemente uma tal concep ção filosófica torna o socialismo in compatível com o Cristianismo. Mas — pergunta-se — não poderiamos aceitar os princípios socialistas ape nas no domínio econômico? E as sim 0 socialismo, despojado da filo sofia materialista que lhe serve de pressuposto não poderia conciliar-se com a doutiúna social católica?

mas sim de

Eis porque a Igreja, sendo depo sitária do autêntico Cristianismo, tem uma doutrina social, o que não se deve entender no sentido de receitas técnicas para oi*ganizar a vida em sociedade — iLgime político ou sistema econômico princípios gerais tocantes à funda mentação da ordem social e enca minhando os homens à realização do seu fim último.

Quanto ao socialismo, é um sis tema econômico-político que deter mina que a produ ;âo e distribuição dos bens deve ser feita pelo Estado, uma vez transferido para o Estado 0 domínio dos bens produtivos. As sim se apresenta na atualidade, sob várias formas, desde as mais mode radas até ao coletivismo integi-al,

O simples fato do socialismo estar construído na ba.se da negação do direito de propriedade — um dos princípios fundamentais da ordem econômica segundo o direito natural € o direito cristão de um intervencionismo exagerado do Estado, comprometendo as liberda des individuais e familiares, exclui a possibilidade de qualquer resposta afirmativa.

Consideremos, tendo em vista par ticularmente os ensinamentos da Encíclica Mater et Magistra, esses dois aspectos da questão; o primeiro, relativo à propriedade, situando-nos ● e da aceitação

na ordem econômica; o segundo, sôbre a ação social do Estado, con duzindo-nos ao plano político.

pais, lhes disse: plicai-vos, e enchei toda a terra e dominai-a”. (Gen. 1,28). E ao prichefe de família disse em Comerás o teu pão com o Crescei e multimeiro seguida:

2. O direito de propriedade suor do teu rosto” (Gen. 111,19). A dignidade da pessoa humana supõe, pois, normalmente, como fundamento natural para viver, o direito ao uso dos bens da terra; a êste direito cor responde a obrigação fundamental de propriedade particular, todos. As normas dar quanto possível,

As concepções jurídicas do libera lismo fundavam-se no direito roma no, segundo o qual a instituição da propriedade era estruturada com um cunho acentuadamentü individualista. Èste individualismo era reforçado pe las doutrinas liberais acêrca da livre concorrência, propiciando a expan são do capitalismo.

Desde Proudhon, com o seu slogan la propriéte c’cst le vol, anarquistas e socialistas começaram a denunciar na propriedade privada a principal fonte da exploração do homem pelo homem e dos abusos das classes abas tadas, condu:.indo à proletarização tios trabalhadores.

Passava-se assim de um extremo a outro, e perdia-se o sentido cristão da propriedade, enunciado com tôda a clareza pelos primeiros Padre.s dn Igreja, a verberarom com veemência 03 abusos dos ricos ao mesmo tempo em que sustentavam a legitimidade do uso e da posse exclusiva de bens materiais pelo homem. Santo Tomás de Aquino e outros expoentes da escolástica medieval, à luz do direito natural ou comcmtando textos da Sagrada Escritura, reafirmavam princípios do uso comum das coisas da natureza, necessárias a todos os homens, e da divisão dos bens deter minados por vários motivos, entre 03 quais exigências da paz social. Na mensagem radiofônica de Natal de 1942, Pio XII fazia as seguintes ponderações a respeito dêste tema: Deus, abençoando nossos primeiros os

uma a a

jurídicas positivas, regulamentando propriedade privada, podem mudar ou restringir o seu uso, mas se qui serem contribuir para a pacificaçao da comunidade, deverão impedii- .que o operário, pai ou futuro pai de fa mília, seja condenado a uma depenservidão econômica, direitos de sua

dência ou a uma incompatível com os pessoa. servidão derive do po do poder “Que esta der do capital privado ou do Estado, o efeito é o aotes, sob a pvessao de “

que domina tudo, íjuo tôda a esfera da v,da publica e pi vada, que penetra ato no campo das idéias e das convicções da conscienfalta de liberdade pode tei Ou 11 cònseíências ainda mais como a experiência o manifesta testemunha”.

Note-se aí a repulsa à tirania do poder econômico, qner proceda do capital privado, quer do Estado, exer cendo-o êste último nos regimes de Condenando a ser- tipo socialista, vidão decorrente do um ou de outro, a p)‘opriedade tendo a Igreja defende em vista seus altos fins éticos e O mesmo Pio XII, falando sociais, ao mundo por ocasião do quinto ani-

Iversário da guerra, s l.o de setembro de 1944,.lembrava que Leão XIII e Pio XI haviam enunciado o princípio de que tôda ordem econômica e so cial deve apoiar-ss sobre a base só lida do direito à propriedade pri vada, acrescentando: “A consciência cristã não pode ’e.''onhecer a jus tiça de uma ordem social que nega em princípio ou que torna pràticamente impossível ou vão o direito natural de propriedade, tanto sôbre os bens de uso quanto sôbre os meios de produção”.

Através destes trechos já se pode perceber como a Igx*eja condena o capitalismo nos seus abusos e o so cialismo nos seus piúncípios. O so cialismo é, pois, repelido de um modo radical. O regime capitalista — ba seado na livre empresa e no salariado — é suscetível de ser realizado numa ordem social cristã, desde que haja observância das normas éticas, 0 que supõe da parte dos empresários uma consciência cristã bem formada. O, mesmo não se pode dizer do socia lismo: negando o direito de proprie dade, nunca lhe será possível instau rar uma ordem social conforme com a doutrina da Igreja

Observe-se que o capitalismo, como Se desenvolveu no mundo ocidental, cspecialmente nos países que sofre ram a influência da ética protestante — segundo a tese de Max Weber — tornou-se uma antecipação do so cialismo, sistema a que aplainou o caminho. Nem é c socialismo, nas consequências lógicas e na sua suas realização prática, senão um grande capitalismo de Estado, como esta mos vendo na Rússia. Há no capitaUsmo gerado no clima da econo mia liberal um materialismo prag-

mático, ao qual vem suceder o materialismo dialético do socialismo. Dai o haver escrito Berdiaeíf: “o socia lismo é a carne da carne e o sangue do sangue do capitalismo”.

Por isso mesmo não se deve pensar que a doutrina social da Igreja seja uma espécie de conciliação ou meio termo entre a posição capitalistaliberal e a socialista. A Igreja su pera a êstes dois extremos que se tocam, colocando-SG num plano supe* rior ao de tais sistemas, etapas su cessivas do naturalismo econômico moderno.

Nas Encíclicas Rerum novarum e Quadragésimo annc e nos discursos de Pio XI, acha-se afirmado o cará ter da propriedade como um direito natural e inviolável, que deve ser reconhecido e protegido pelos pode res púbMcos, e ao mesmo tempo a função social que lhe é inerente, donde decorre, a legitimidade de sua limitação em vista do bem comum. Enquanto o liberalismo individualista consapnrava o direito de propriedade sem levar em conta a sua função social, e 0 socialismo quer suprimir a propriedade, a doutrina da Igreja preconiza a propriedade utiM. ada se gundo os seus fins sociais a sua má xima difusão possível.

Assim podemos, em síntese, caraterizar essas três concepções distin tas de propriedade:

Liberalismo — A propriedade Ê um direito.

Socialismo uma função social.

Doutrina social da Igi*eja — A pro priedade É um direito que TEM ixma função social. A propriedade- É

Reitera a Encíclica de 15 de maio de 1961 as afirmações de Leão XIII e de Pio XI, refevindo-se também de um modo especial à radio-mensagem de Pio XII íbigida ao mundo na festa de Pentecostes de 1941, plena guerra, para celebrar coentenário da Ucrum novarum. Re lembrando os em o cinargiimentos expostos por seus predecessores para justifi car a propriedade privada, o Papa João XXIII aponta para as modi ficações introduzidas no instituto da propriedade pelas novas condições sociais e técnicas dos povos. En frenta os .aspectos decorrentes da utilização da energia atômica sidera também .ns e ennpossibilidades

abertas pela automação, dera, entre outras questões, o desen volvimento da política de sociais.

E consi seguros

Na tradição do pensamento cató lico sempre se fci ver que a pro priedade particular tem, em outras motivações, o fato do, pela liberdade recebida de Deus, tornar-se o ho mem como que uma providência de si mesmo, assim participando da pro vidência com que Deus rege o universo. Sob êste a propriedade vem a tornar-se uma garantia do futuro da família, gurando ao pai a genuína liberdade de que precisa para cumprir todos os seus deveres com respeito ao bemestar físico, espiritual e religioso da sociedade doméstica.

Com tôda a objetividade e pleno conhecimento das situações vigentes no mundo atual. Sua Santidade cara o assunto. Diante de referidas o governa e prisma, asseen-

8. A propriedade Magistra ff if Mater et transformações e do desenvolvimento da previdência social a cargo do Es tado, pode-se levantar a questão de saber se o princípio da propriedade como um direito natural ainda tem valor hoje, ou se perdeu a sua sig nificação, que seria assim relativa, dependendo das condições de cada j época.

Ao que o Papa João XXIII, na ' Mater et Magistra, retruca de ma- I neira bem clara e rom:firmeza: “Es ta dúvida carece em absoluto de Pois 0 direito de pro- fundamento, na

pviedade privada, mesmo no tocante bens produtivos, tem um valor permanente, já que 6 um direito con tido na própria natureza das coisas, pe’a qual ficamos sabendo da ridade do homem individual sobie - sociedade civil e da consequente subordinação teleológica da socieda de civil ao homem”. Além disso frisa 0 Pontífice — “a história e a experiência demonstram que nos não reconheaos a regimes políticos (|ue

particulares a propriedade dos bens de produção o exercício da liberdade humana é violado ou su primido nos coisas tais, o que prova ã evidência que o da liberdade tem a sua garantia mesmo tempo o seu estímulo direito de propriedade”. Passando ao desenvolvimento da propriedade pública em nossos dias, trate do Estado quer de

cem aos mais fundamenuso e ao no quer se outras instituições, realça o princí pio ensinado pelos Papas anteriores sôbi*e a função social “intrinsecamente inerente” ao direito de pro priedade privada. Ainda a tal propósito faz a se guinte afirmação; na qual se po derá fàcilmente ver uma crítica às

Itendências hodiemas para o socia lismo de Estado: “Embora, em nosso tempo, tanto o Estido como as ins tituições públicas tenham estendido e continuem a estender o campo de sua intervenção, não se deve concluir que desapareceu, como alguns errôneamente opinam, a função social da propriedade privada, já que esta função tira sua força do próprio di reito de propriedade. Acrescente-se a isto 0 fato de haver uma variada gama de situações angustiosas, de necessidades ocultas e graves, que a assistência do Estado, em suas múl tiplas formas, não pode de nenhum modo atingir e solucionar. Por isso fica sempre aberto um vasto campo ao exercício da misoricórdia e da ca ridade cristã pelos particulares. Por fim, é evidente que para o fomento e 0 estímulo dos valores espirituais resulta mais fecunda a iniciativa dos particulares ou dos grupos privados do que a ação dos poderes públicos”.

Registra a nossa época a tendên cia para aquela progressiva amplia ção da propriedade do Estado e de outras instituições públicas. A ex plicação deste falo está na série crescente de funções atribuídas aos poderes públicos, e a esta situação aplica João XXIII o princípio da suplementação ou subsidiariedade, com estas palavras; “o Estadç e ou tras entidades de direito público só podem licitamente ampliar o seu do mínio na medida em que verdadeira mente o exijam motivos evidentes de bem comum, e uma vez excluído o perigo de que a propriedade privada se reduza em excesso ou, o que ainda seria pior, seja suprimido por com pleto”.

4. O princípio de subsidiariedade

Êsse princípio, que na passagem acima vimos aplicado à propriedade, é de um gi'ande alcance como cri tério para fixar o sentido e os li mites da ação social do Estado. Vêmo-lo formulado na Quadragésimo anno, e reiterado com ênfase na Mater et Magistra.

Na primeira destas duas EncícliAo falarmos cas, escrevia Pio XI: na reforma das iiistituições, temos em vista sobretudo o Estado; não porque dêle só deva esperar-se todo o remédio, mas poi^que o vício do já referido as coisas a tal extremo, que, enfra quecida e quase extinta aquela vida social outi'ora rica e harmônicamenít individualismo >9 levou (i

te manifestada em diversos gêneros de agremiações, quase só restam os indivíduos e o Estado. Esta defor

mação do regime social não deixa de prejudicar o próprio Estado, sôbre o qual recaem todos os serviços que as agremiações suprimidas presta vam e que verga ao pêso de negó cios e encargos quase infinitos”.

Refere-se aí Pio Xi à situação pro vocada pelo liberalismo de 1789, abo lido os grnipos existentes entre o indivíduo e o Estado, grupos êstes que na ordei^ econômica eram as corporações de ofício. Desta forma, os indivíduos ficaram isolados pe rante o Estado, no regime da livre concorrência, em qu?- os mais fracos não tinham condições de resistir à pressão dos mais poderosos. Sabe mos que depois começaram a for mar-se os sindicatos à margem da lei, quando não mesmo contra a lei e já insuflados pelo espírito de luta de classes. Basta lembrar que na 1

França, depois da lei de 1791, supressora das corpo? ações, o Código Penal proibia a formação dc coali zões, quer de patrões quer de ope rários. Leis posteriores revogaram tão rígidos dispositbms, mas deixara de existir aquele entendimento en tre profissões e classes outrora rei nante. Na dispersividade dos indi víduos soltos em face do Estado, e não mais existindo as autoridades intermediárias, qualquer ação ordenadora da vida econômica teria de partir do poder do Estado, e assim 0 caminho estava aberto para uma política de tendência socialista.

Mas continuava Pio XI: quenas.

Verdade

é, e a história o demonstra abun dantemente, que, devido à mudança de condições, só as gi*andes socie dades podem hoje levar a efeito o que antes podiam até mesmo as pePermanece, contudo, firme

0 que êles podem realizar com as próprias forças e indústrias, para 0 confiar à coletividade, do mesmo modo passar pai*a uma sociedade maior e mais elevada o que socie dades menores e inferiores poderíam conseguir, é uma injustiça, um gra ve dano e perturbação da boa ordem social. Toda ação da sociedade, em virtude da sua própria natureza, deve prestar ajuda — subsidium aos seus membros, e nunca destruílos nem absorvê-los”.

Aí está o princípio de subsidiarie dade ou suplementacão, indicando que a ação social do Estado deve ser supletiva em redação à dos particulaDonde o concluir Pio XI: res.

autoridade pública Deixe, pois, cuidado de associações inferiores aqueles negócios de menor importân cia, que a absorviam demasiado: po derá então desempenhar mais livre, enérgica e eficazmente o que só ela compete, porque só ela o pode fa:er: dirigir, vigiar, urgir e repri mir, conforme os casos e a neces sidade requeiram. Persuadam-se to dos os que governam de que quanto mais perfeita ordem hierárquica rei nar entre as várias agremiações, se gundo êste princípio da função “su pletiva” dos poderes públicos, tanto maior influência c autoridade terão estes, tanto mais feliz e hsonjeuo será o estado da Nação”.

O princípio assim enunciado por si mesmo vai contra o individualismo e o socialismo. O individualismo li beral, no seu extremo, que alias mmCí. chegou a ser de fato P™tieado, Estado-polícia, o Ètat gendarme, com os braços cruzados dian te dos problemas econômicos, deiinteiramonte ao livre jogo O socialismo, pelo a intervenção oferecer nenhum , limitá-la, tornando-se

e constante na fi^o;'ofia social aauê: le importantíssimo -.rincípio que é inamovível e imutável: assim como não é lícito subtrair aos indivíduos

U a ao a seiaa o xanco-os das leis natm‘ais. contrário, preconiza do Esi^ado critério pai’a

logo deniasiada uma tal liberdades.intervenção sem nos e pondo em risco as , -rx

O problema da intei-venção do Es tado na ordem econômica, em todos de regime deos países, mesmo nos niocrático, é êste: quando o Estado começa a intervir, êle tende sempre a avançar cada vez mais, na senda de um co^etivismo progressivo.

Nas páginas de sua filosofia polí tica, Du Pouvoir, Bertrand de Joufaz ver que quando o venel nos Estado põe o pé em algum terreno geralinente não o retira mais. Às

Ivêies, por necessidades excepcionais em tempo de guerra ou para aten der a medidas justificadas para de belar uma crise econômica, o Estado assume uma série de atribuições ou tarefas extraordiárias, e depois difi cilmente as abandona. Daí a ten dência para essa intervenção crescer numa progressão constante, sumprimindo a iniciativa privada e não en contrando mais nenhum limite à sua ação.

O principio de subsidiariedade vem trazer êste limite à ação do Estado, firmando a regra segundo a qual tudo aquilo que os particulares po dem fazer o Estado deve deixar que êles o façam, só lhe cabendo intervir quando a iniciativa privada se mani festar incapaz ou deficierite.

Mas que se deva entender por esta deficiência? Quando se justifica a intervenção do Estado, substituindo● se os particulares ?

Preliminarmente devemos dizer que o princípio vale quer para o Estado, quer para qua’quer outra sociedade. Assim, quando o indiví duo pode fazer alguma coisa, é na tural que êle o faça; quando não o pode, 0 grupo é que a deve fa er. Quando a família não pode fazer /' algo a um gi*upo maior cabe fazêlo em seu lugar. Quando o municí pio está em condições, realiza um determinado empreendimento; caso contrário, a região ou a provín cia. Finalmente, não podendo esta, chega a vez do Estado.

mos, mas o que vem a ser êste suprir?

Em primeiro lugar, deve conside rar-se aquilo que os particulares não são capaxes de fa.er por suas pró prias forças, ou então certas iniciciativas dispendiosas demais para os particulares e que êles, por si, não fariam mesmo. Compete aos pode res púbMcos reaMzar tais iniciativas, por exemplo; grandes barragens, reprêsas, estradas de rodagem, obras que vão além do âmbito de ação dos particulares, de snas possibilidades, do seus recursos.

Em segundo lugar, essa interven ção se justifica no caso dos agru pamentos em condições deficientes, provindas de anomalias sociais, como seja uma crise econômica. É o que se verifica na hipótese das famílias indigentes. Em épocas de crise, os grupos se ressentem, uns mais, ou tros menos, e deixam de poder rea lizar 0 que normalmente não ofereceria os mesmos obstáculos. En tão o Estado assume legUimamente certas tarefas pelas quais vem em auxílio das sociedades menores em crise.

em

Resta saber o que deve ser enten dido por necessidades decorrentes da insuficiência dos particulares. A ação do Estado se legítima para su prir a atividade dos grupos autôno¬

Finalmente, há um terceiro aspec to assaz importante e constante mente focalizado em nossos dias: o de certas iniciativas que não podem ser deixadas em mãos de particulares por estar em jôgo o interesse nacionah É o caso da exploração do pe tróleo ou das areias mona íticas, além de tantos outros, figurando hi póteses nas quais a segurança na cional e a independência econômica do País podem ser comprometidas uma vez entregues tais iniciativas á livre ação dos particulares.

Assim 0 princípio de subsidiarie dade apresenta os três seguintes as pectos:

l.o) — insuficiência dos particula res em virtude da própria natureza da obra a realizar;

2.0) — deficiência motivada por certas condições extrínsecas, geral mente oriundas de épocas de crise e que afetam aos grupos intermediá rios;

3.o) — restrições imjiostas à ação dos particulares em virtude do exi gências do bem comum nacional, pa ra atender a razões de segurança ou mesmo para assegurar a plena inde pendência d,e um povo.

5. Sentido e alcance do princípio de subsidiariedade na gistra” Matcr el Ma-

Precisamente após haver recorda do as diretrizes e exposto as ra.ões da nova Encíclica, visando não ape nas à comemoração da Rorum novarum mas também a esclarecimentos diante das mudanças operadas nes tes últimos anos, o Sumo Pontífice afirma, como tese inicial, que a eco nomia deve ser produto da iniciativa privada, justificando-se ao mesmo tempo a presença do poder civil para promover o progresso social e ga rantir a utilidade comum.

Reproduz então literalmente o Papa João XXITI aquêle mencionado trecho de Pio XI, dizendo que per manece de pé o princípio da função subsidiária do Estado, princípio êste que não pode ser removido nem alterado — noque moveri noque mutari potest.

sultado maiores possibilidades ao po der público no campo econômico, especialmente para reduzir os dese quilíbrios entre os divei^sos setores da produção, entre as várias regiões de um país e entre as diferentes

plano mundial, — insiste nações no èua Santidade sobre o valor e a atualidade do princípio em questão: “Mantenha-se sempre a salvo o prin cípio de que a intervenção das auto ridades públicas em matéria econô mica, por mais larga e_ penetrante que seja, não sòmente não deve re duzir a esfera da liberdade na ini ciativa dos particulares, mas antes contrário garantir-lhe maior direi- pe^o plitude, salvaguardando os tos essenciais da pessoa Entre êstes há de incluir-se o direito

e a obrigação qae oorresp.nàeJ cada um de ser uormalmente o pr. ruciro responsável pela da família, o que imphca que os sistemas econômicos permi tam e facilitem a todos ° \

am própria e exercício das atividades

Referindo-se aos progressos cien tíficos e técnicos, dos quais têm reproveitoso produtivas”.

No volume da Biblioteca de Auto res Cristianos de Madrid, ComeutaMater et Magistra, editado do Instimagnífico rios a la 1962 sob 0 patrocínio tuto Leão XIII, bá um estudo do conhecido constitucionaLuis Sánche: Agesta, Reitor da em lista , Universidade de Granada, sobre Iniciativa pessoal e interven0 tema: çâo dos poderes públicos no campo "A constituição econômiObserva o autor econômico, dos Estados”, que “o princípio de subsidiariedade 6 um princípio jurídico, fundado As próprias palavras de Pio XI, reproduzidas pe’a EncícPca Mater et Magistra, manifestam, sem ca na justiça.

Ilugar a dúvidas, que os Pontífices não o consideram era nenhum caso como um princípio técnico, isto é, um princípio que implique maior efi cácia da ação social ou maior ren dimento no âmbito econômico, mas um princípio estrito de justiça. Pio XI disse que era “injusto” atribuir a uma sociedade maior ou mais ele vada o que as comunidades menores ou os indivíduos podiam fazer por seu próprio esforço e indústria (ncfas est, iniuria est, diz o texto la tino). João XXIII 0 declara vincu lado à garantia e tutela dos direitos essenciais da pessoa humana (modo praecipua cuiusvis humanae personae iura sarta tecta serventur)”.

Assim, 0 Papa João XXII faz ver como o princípio de subsidiariedade está intimamente vinculado à tutela dos direitos essenciais da pessoa hu mana. Além disso, a Encíclica Ma ter et Magistra alarga-lhe o conteú do, não se limitando a interpretá-lo como simples “suplementação mero limite à ação do Estado. Preceitua de modo explícito e categó rico que 0 Estado deve fomentar, es timulai*, coordenar, suprir e com pletar a atividade dos particulares: Haec autem rcipublicae providentia, quac fovet, excitat, ordínat, supplet atque complet, illo subsidiarii officii principio innititur.

Comentando essas palavras da En cíclica, 0 professor Sánehez Agesta nota que o princípio de subsidiariedade acarreta uma divisão de compe tência e uma cooperação das diver sas esferas de açãc social e indivi dual.

Uma tal divisão de competência abrange tríplice aspecto, a saber: “a) — Pode, sem dúvida, e com um

valor restrito à prevenção de exces sos ou abusos de poder, considerarse como um limite, enquanto proibe ao Estado ou às comunidades maiores privar os indivíduos ou as comuni dades menores do que êles podem realÍLar por seu próprio esforço e indústria,

“b) — Porém, sua significação bá sica é delinear o contorno ou a di mensão do conteúdo positivo corres pondente à esfera de atividade re servada à iniciativa individual; aqui lo que os inivíduos podem realizar por seu próprio esforço ou indústria,

“c) — Por iiltimo deve advertirse que esta delimitação de compe tências não está traçada como uma autonomia ou independência recípro ca da esfera de ação do Estado e dos indivíduos, mas como uma coope ração. A missão o Estado é subsidium, isto é, ajuda; e o próprio prin cípio que traça esta divisão de com petências traz êstc nome: princípio de subsidiaviedade, isto c, de ajuda e tutela por parto do Estado. A missão do poder do Estado^ escla rece taxativamente o Pontífice, não é destruir ou ab.'-:oi*ver, mas favore cer, estimular, coordenar e comple tar a atividade dos sujeitos pessoais e das comunidades menores e, quando fôr 0 caso, suprí-la” (obra citada, pags. 164-165).

Do ponto de vista da ética e do direito natural, vários autores já haviam api*ofundado o sentido do princípio de subsidiariedade antes da publicação de Encíclica Mater Magistra- Entre tais autores, cum pre destacar Messner, em seu tra tado de Direito Natural (Das Naturrecht), e Utz, num exaustivo estudo sôbre as formas e os fundamentos

de tal princípio (Formen und Grezen des SubsidiaritiU-sprinzips).

A competência dos indivíduos e dos grupos sociais fundamenta-se na própria aptidão dos mesmos indiví duos ou grupos pai'a i'eali,.ar deter minadas tarefas, esta doutrina, como, pondera E assim vemos que Messner, radica-se na concepção ob jetiva do direito natural segundo a qual a justiça das relações jurídicas se apóia sobre a natureza das. coisas.

6. O problema da “socialização”

A ação subsidiária do poder pú blico e a autonomia dos grupos in termediários em face do Estado são duas teses correlatas, as quais por si mesmas excluem o socialismo de modo definitivo. um

Entretanto, uma palavra da En cíclica melòvolaniente interpretada deu margem a se propagar a idéia de um absurdo socialismo cristão que estaria contido no documento pontifício. Trata-se aliás de uma

não constante do texto laMas o mais interessante é expressão tino.

Tal não é, porém, o significado original do vocábulo em questão. Socializar quer dizer tornar social, e, assim sendo, vemos aquêle mesmo têrmo nas traduções da Encíclica di zendo respeito ao desenvolvimento da vida associativa, nos diversos grupos homens participam. Mater et Magistra de que os É certo que a

focaliza o problema das nacionali zações G do crescimento da proprie dade pública nas condições do mun do atual. Trata também da inter venção do Estado em matéria social, deniro dos limites P*;'» princípio de subsidiariedade. EntielàZ, nõo é s propósito das nac.onaencontramos a palavia texto italiano e no idiomas, e sim da multiplicação favorecendo a liiações que “socialização vernáculo de outros quando se cogita

prineípio íe subsid.ancdade Estamos diante do que a estudado na análise social. no sociologia moderna tem d

os fenômenos da integração como se pode ver, por exemplo, nas de Gurvitch, para nao citai E aquêle multipliformas de .conobras muitos outros,

que, utilizada em diferentes tradutem na Encíclica uma signi- çoes, car-se de relações e vivência social, nos'diferentes agru pamentos que compõem a sociedade global, sugere desde logo a ideia cen tral da Quadragésimo anno, retoma da com vigor em novas perspectivas pela Mater et Magistra: a valorizavida comunitária, a autonodiante do Estado, barreira erguida conção da mia dos grupos ou seja ficação exataniente oposta à idéia socialista.

Vimos que o socialismo preconiza a transferência para o Estado do domínio dos bens de produção. Além disso, atribui ao Estado uma série de funções no exercício de sua ação social, retirando-as das sociedades da iniciativa individual. menores ou Neste sentido, a palavra “socializa ção” tem sido empregada para de signar êsses dois aspectos do socia lismo, e tomou-se sinônimo de “estatização”, ou “nacionalização”.

, uma tra as invasões do poder publico na esfera de ação dos particulares. tudo isto vai frontalmente contra E 0 socialismo.

O indivíduo, na vida social, faz parte de uma série de comunidades a paitir da família. São grupos eco nômicos, culturais, esportivos, recrea tivos, sem falar ainda no município, que 6 a célula política, e no Estado, que coordena a atividade de tais STUpos em vista do bem comum na cional. A proliferação de tais gru pos li o fortalecimento das relações suscitadas no âmbito de cada um tem-se acentuado nestes últimos - tempos, e é a isto que o Papa chama de “.socialização”, ou melhor, segun do tradução literal e absolutamente fiel, “ ciais” menta.

Iincremento das relações so— socialíum rationum incre-

Lemos na Encíclica: “Uma das piindpais notas características da nossa época está no incremento das relações sociais, isto é, nos laços mú tuos 6 cada vez mais estreitos entre os cidadãos, que introduziram na sua vida e atividade, múltiplas formas de convívio social, era geral reconheci das pelo direito privado ou público. Origem e fonte dêste fato na atua lidade são, entre outras, as seguintes: o progresso cientifico e técnico, a maior eficácia da produção, o mais elevado nível cultural dos cidadãos”.

Notem-se agora as observações fei tas logo a segruir: “Os progressos da vida social são ao mesmo tempo início e causa da crescente inter¬ venção do Estado em matérias que, por .serem atinentes ao que há de íntimo nas pessoas humanas, não são de pouca importância nem es tão isentas de perigo”. Tais as questões relacionadas com a saúde pública, a instrução e educação da juventude, a orientação profissional e ou readaptação dos a recuperação

que sofrem de incapacidade física ou mental.

Apontando os riscos da ação do Estado, o Pontíficie refere-se tam bém aos perigos de uma regulamen tação minuciosa daquelas mútuas re lações entre os homens em diferen tes setores, podendo prejudicar a li berdade e a forr..ação pessoal de cada um. Mas ao mesmo tempo re conhece as vantagens decorrentes do desenvolvimento de tais relações, desde que se observem as normas da boa ordem social, a respeito das quais toma a lembrar as lições de Pio XI na Quadragésimo anno.

Muitos outros trechos da Encíclica poderíam ainda ser analisados. Para terminar citemos apenas mais uma passagem,- relativa à vida rural.

Discorrendo sobre as exigências da justiça no concernente às relações en tre os diversos setores da produção, Sua Santidade volta-se com particu lar atenção para os problemas da agricultura. Ao tratar da adequa ção das estruturas da empresa agrí cola, refere-se à empresa de dimen são familiar, dizendo que ela só será firme e estável quando render tanto quanto importa ao honesto sus tento da família. E acrescenta: “Para lográ-lo é absolutamente neçesário que os agricultores sejam perfeitamente instruídos nos seus trabalhos, possam conhecer os novos inventos e recebam assistência téc nica no exercício da sua profissão”. Aí vemos algumas normas de mui ta oportunidade a propósito de re formas agrárias. A divisão da pro priedade por si só nada resolve. Ê preciso que os pequenos lavradores estejam devidamente preparados

para cultivar a terra e tenham o devido assessoramento técnico.

Mas é no final daquela passagem que devemos fixar a nossa atenção: “É indispensável ainda que os agri cultores formem sociedades coopei'ativas, constituam associações profis sionais e participem eficientemente dos negócios púbMcos, tanto nos orga nismos administrativos quanto na política”.

Nessa afinnação do Pontífice, en contramos três idéias de grande al cance, que correspondem a ensina mentos dos seus imediatos predecessores, a saber:

1) — o cooperativisnio, como sis tema de organização das empresas;

2) — o sindicalismo, como proda organização da classe;

de entrosamento das profissões no plano nacional.

Conjugram-se assim as duas Encíclicas comemoativas da Rerum nova0 corporativismo, tese central rum-

3) — o corporativismo, como prin cípio de organização da profissão e cesso da Quadragésimo anno, relaciona-so indissolvivelmente com o princípio de subsidiariedade, que daquela Encíclipassou para a Mater et Magistra. Sobre o tema do corporativismo já tive ocasião de me entreter por vá rias vezes com os leitores do Digesto Ao niesmo assunto po¬ ça Econômico, deremos voltar em proxnno artigo. , vista os ensinamen- tendo agora em tos do Papa João XXIII, confirman do e renovando os de Pio XI e Pio XII.

face dos quais Ensinamentos em ...v.tj é insofismável a incompatibilidade doutrina social da absoluta entre a Igreja e o socialismo.

A SITUAÇÃO REAL DO BRASIL

(Excertos de uma conferência pronunciada, cm 19 do ciezcinbro do ano passado, pelo eminente embaixador e grande cconomist “Pan American Society of the United States”) I, na

j^STAMOS em meio de uma nação trazida à beira de uma verdadei ra ruína moral, política e material. A corrupção domina as urnas, a legisla tura, o Congresso e atinge até a beca judicial. O comércio em estado de prostração: nossas casas cobertas de hipotecas: empobrecido o operariado, concentrada a posse das terras nas mãos de capitalistas. Os frutos do la bor de milhões são audadosamente roubados, indo avolumar... as fortu nas de poucos. .. Há mais de um quar to de século que vimos assistindo a luta dos dois grandes partidos, visan do o poder e o esbulho. Nem agora prometem éles qualquer refor ma substancial... propõem sacrificar no altar de Mamon nossos lares, nos sas vidas e nossos filhos”.

mesmo

Êsse texto, não é uma descrição das atribulações que caracterizam o atual torvelinho dc transição qo Congo. Não se trata de uma admoestação por ' parte de algum jornal financeiro con servador de Nova York sôbre a situa ção de caos econômico que ora con frontaria a América Latina. O país descrito na passagem acima é a pró pria nação norte-americana, e a dia tribe citada não é nada mais que a plataforma do Partido Populista em sua convenção de Omaha, em 4 de julho de 1892.

A despeito da objurgatória do Par tido Populista, que assim demonstrou uma singular falta de perspectiva his¬

tórica, os Estados Unidos da .América cresceram até se tornarem uma nação poderosa, com .sólida economia e ra zoáveis padrões dc justiça social.

Pergunto-me se os círculos finan ceiros 'dos Esta<los Unido.s, bem como a imprensa deste país. não se acham afligidos no momento por uma falta semelhante de pcr.spcctiva histórica, ao examinarem a realidade brasileira? i> ♦ ♦

0 com|)ortaincnlo dc uma determi nada sociedade, tanto em tempos dc glória quanto em épocas de dificulda des, tem de scr julgado através de vá rios indicadores de natureza políticía social e econômica. No recente caso bra.sileiro, uma focalízação obsessiva sôbre o surto inflacionário tem leva do muitos analistas a desprezar, írrefletidamentc, realizações significativas em outros setores.

Com o advento da profunda crise constitucional ocasionada pela renún cia do presidente Quadros, cm agosto de 1961, a Nação viu-sc confrontada por um número de objetivos sociais prioritários.

O primeiro e principal era o de pre servar a estrutura dc uma sociedade aberta c democrática. O segundo era o de manter uma taxa elevada de cres cimento econômico. O terceiro urgia alcançar maior grau de autonomia nas decisões concernentes ao desenvolvi-

Alento e, o ciuarto, manter um nível Razoável de estabilidade dc preços.

O primeiro objetivo parece ter sido ^tibstancialmcnte alcançado, a despei do de graves tensões internas. Apro-■^ima-se o fim da crise constitucional ^irasileira, com a fixação da data dc 6 de janeiro para o plebiscito, que de cidirá entre a restauração do regime presidencialista (que. ao que parece, niereccrá a escolha do eleitorado) c a

dos 1950 foi conseguida pràticamentc sem acréscimo do insumo dc impor tações, pois enquanto o produto brunacional aumentou de 31% as impcimaneceram estáveis. to portaçoes

O segundo objetivo é quase tão im portante quanto o primeiro. Sòmcntc uma economia dinâmica pode prover a flexibilidade de empregos, a opor tunidade dc promoção social c o alarRamento dc horizontes, indispensáveis para abater as tensões sociais e asse gurar a cxcquibilicladc do projeto so cial. O que é que nos dizem os alga rismos? Na década de 1950. em geral, taxa brasileira dc crescimento 5,8' por ano om termos reais — foi a mais alta da America Latina. 1960/61, a despeito da crise política e da conjuntura adversa de comércio exterior, o aumento do produto bruto nacional foi de 7,2%. Conquanto em 1962 a taxa de expansão parece ter declinado, bá boas perspectivas de de 1963, ao frutificarem os a Em que o ano

Nenhuma outra parte do mundo socialista acusa comportamento seme lhante. Na maioria dos países em prode desenvolvimento, o crescitem sido acompanao cesso mento ccononuco nhado dc um porcional de importações, brasileiro, a melhoria do dc crescimento autonomo íoi tornada l^ssivd pelo surto das indústr.as subsda importação <= lS’\u;St^dd:Ssauto™tr. rd;co^.r..çao„ava,~=raço LS:TecUd"acbam-s=^orasu,..

Zí; e importações tende a aurnen-

mente re mais rcccnnotar as pressões inflac.onar.as sobre a "“'"'ixibilSe esTrmural e tornadc desenvolvimento me do comércio e auxíaumento mais que proNo caso virá aumentar a rá as opções dependentes nos continuação do parlamentarismo. Preservou-sc assim uma sociedade aber ta c de livre debate, não enodoada lior qualquer apossamento militar, sus pensão dc direitos constitucionais ou imposição de controles autoritários.

avanço inflacionáno ‘ Brasil é prova incontroversa de que falhamos no objetivo de manter L gi-au razoável de estabilidade de preços. Longe de mim^ desculpar a inflação ou negar as serias desloca ções e atritos econômicos que deixa em sua esteira. Sente-se hoje, na ver dade, em todos os setores da popula ção do Brasil, um clamor geral por medidas de controle da inflação. Alno pesados invesíimentos ora em curso setores de' energia elétrica e na um novo surto de nos siderurgia, marque produção.

Outro fato importante a ser obser vado na liistória recente do cresci mento da economia brasileira é que a expansão através da inteira década

Pgumas já foram tomadas, tais passagem de um projeto de reforma fiscal visando auraen.ar de Cr§ 130 bilhões, no mínimo, as rendas do Te souro. O Poder Executivo foi também autorizado a apresentar ao Congresso programa reduzindo de 45%, 1963, os gastos governamentais não fixos. O imposto específico sôbre o consumo de energia elétrica foi vertido em ad valorem a fim de como a um em conpro de investimentos), num ambiente Ca racterizado por condiões adversas exportação de bens na primários.

porcionar financiamento não inflacio nário para os programas de energia. Projetos para o reajustamento de ta xas sôbre utilidades públicas, transsendo es- porte e combustíveis estão ludados para aplicação como parte de um pro grama geral antiinflacionário. Está sendo % contemplado, um financiamento muito mais amplo do déficit orçamentário, da venda de títulos do Tesouro com cláusula de manutenção do poder de compra.

Há, em segundo lugar, a surda im plicação de que os países inflacionados são automàticamen.e culpados de inobservância do princípio de autoajuda. Isto pode ser verdade quando a inflação não crescimento é acompanhada por econômico e quando ;i 'A absorve elevada proporção dc recur sos externos mediante excessivo dispendio com importações. Tais, mente, não são as características da inflação brasileira, onde o Crescimen to vem sendo mantido e a dieta de importações magra. Se isto é de auto-ajuda, cursos para investimen to estão sendo espremi dos, ainda que por cruéis c brutais, de uma economia pobre, comentários não consti tuem de maneira algu ma uma defesa da infla ção, nem certatem sido prova pois re* meios Êsses ●se pretende

Conquanto a gravida de do problema inflacio nário no Brasil e em muitos outros países latino-americanos não possa ser negada, é igualmente cer‘o que a aná lise corrente do problema também, através

A , . por parte das organizações financeiras in ernacíonais e de círculos ban^-ários neste país está longe de sy equilibrada- Há, em primeiro lugar, ‘anma tendência pa ij ■t ra encarar a inflação dum ponto de vista moralista e não sociológi mo se fôsse simplesmente uma exibição de relaxamento moral e não o rer sultado de pressões distributivas irI resistíveis (demandas de consumo), ou S pressões de crescimento (demandas co, co- J r-

1 que a inflação tenha exercido papel causai processo cie crescirhcnto.

trário, é lícito supor que num contex to político adequado e presumida administração fiscal que a habitualmente encontrada países subdesenvolvidos, o desenvolvi mento econômico podería ser alcança do com pressões inflacionária moderadas. no Pelo conuma mais eficiente em apenas

Constituem êles, con*^udo, um apêlo em favor de uma visão equ’Hbrada do problema, em que se dê o devido cré dito ao desempenho brasi’eiro lação a outros importantes objetivos sociais e políticosem re-

Os devaneios íntimos da mente anglo-saxònica são frequentemente mis teriosos. Por motivos pouco claros, países que mantiveram estabilidade de preços e disciplina fiscal, exibindo ta xas baixas de crescimento ou mes mo estagnação, são tidos como exem plos magnos de au.o-ajuda e de con formidade com a filosofia da Aliança para o Progresso. Mas, ccrtamen.e, na filosofia, da Aliança o ciescimento tem precedência sôbre a estabilidade; e se a auto-ajuda quer dizer algo, sig nifica mobilização de recursos, a qual, por sua vez, não pode ter sentido se traduz em crescimento e ex- nao SC

pansão da economia brasileira no últi mo decênio.

A seriedade do problema de estag na América Latina foi pungen- naçao

temente frisada no recente relatório do Secretariado Misto da CEPAL/ OEA, na Reunião Ministerial da CIES, Cidade do México. Enquanto pelo menos sete países da América Laticonseguiram ul rapassar, durante o taxa anual de na na período de 1950/57, a crescimento de 2,57o por habifnte, soBrasil — teria logrado mente um — o no período 1957/61 alcançar essa ta mínima prevista na Carta dc Punta dei Este.

Nota-se hoje, neste país, fadiga c desencanto no que diz respeito a aju da externa. O desencanto tclvcz se funde numa falsa analogia. No da recuperação européia. rápidos foram obtidos a raves de uma injeção maciça de recursos Rapide^ semelhante não foi nem pode ser ai do desenvolvimento mecançada no campo pansão. Estas reflexões devem tornarnos mais sóbrios dc palavras c menos ásperos dc julgamento, ao avaliarmos a “performance” econômica dos paí ses subdesenvolvidos.

É justificada a apreensão reinante neste país quanto aos perigos da in flação na América Latina. Mas erram a fundo aqueles que não reconhecem na estagnação um perigo ainda maior. Quando há crescimento, dila a-se con tinuamente o horizonte econômico e a correção de injustiças sociais, emboàs vezes exasperantemente lenta, pode ser conseguida sem explosão so cial. Quando há estagnação, nada res ta senão uma luta amarga por uma parcela da miséria comum.

Vários países da Amércia Latina e da Ásia têm sofrido inflação e estag nação. enquanto alguns outros manti veram um nível estável de preços, sem contudo se desenvolverem.

Na América Latina, sòmen‘e dois países conseguiram nos últimos anos conciliar uma inflação moderada com uma taxa aceitável de crescimento econômico, porém mesmo estes não chegaram a alcançar a taxa de cxra _

econòmcio. Esta tarefa é mtinitamente mais complexa que o esforço de reconstrução da infra-estrutura f.sica e de ativação cio capital humano ja existente. ImpHCa em lento trabalho de educação de técnicos, de transforsocial e de modernização de econômica. Indepen da circunstância de que a mação tôcla a estrutura cientemente ordem de grandeza dos recursos moAliança para o Prouma frabiUzados para a gresso” representa apenas ção dos investidos na Europa, a na tureza da tarefa não .se presta a feitos dram.átiros a curto prazofadiga deriva possivelmente de uma superavaliação do ônus real impôsto à economia americana pelos programas de ajuda externa a países subdesenvolvidos, em geral e a AméA

Irica Latina em particular. Êsses pro gramas atualmente absorvem menos cie um por cento do prqduto bruto na

seqüentcmente, se eles tivessem ex portado muito maior quaniia desses produtos, é possível que tivessem re cebido meno.s cm vez de mais. Mes- cional, em comparação a cêrca de 2% ttc> período do plano Marshall, e a economia norte-americana tem pre¬

sentemente um vasto potencial de re cursos humanos e materiais subutilizados. Mais importante ainda, há ao mesmo tempo uma subavaliação da su til poupança que deflui para o consumidor-contribuinte mediante o de clínio, a partir de 1953, dos preços de importação de produtos de base, de- , clínio êsse que, no caso dos produtos de exportação da América Latina, tem sido suficientemenfe grande para frustrar vários dos efeitos benéficos esperados da assistência financeira terna.

Êste ponto, que tende a ser um tan to esquecido na discussão corrente, ínereceu adequada ênfase em recente discurso pronunciado pelo sr. Edwin Martin, secretário de Estado Assisten te para Assuntos Interamericanos, ‘Institute of World Affairs” (Insti tuto de Assuntos Mundiais) da Uni versidade da Califórnia do Sul. Disse o sr. Martin: exno

mo assim, o preço médio em 1961, do café e cacau, atingiu somente cêrca de 60% do nível de 1953, o das ba nanas 85% e o das fibras — algodão e lã — cêrca de 80%. Êstes produtos por si só representaram a quarta par te da renda proveniente das exporta ções latino-americanas naquele ano.

Entrementes, os preços de atacado norte-americanos — índice aproxima do dos custos de importação daque les países aumentaram de 10%.

Êste acréscimo de 4% nas rendas de exportação foi acompanhado de um acréscimo demográfico de cêrca de 20%. É claro que a renda per capi ta proveniente de exportações decaiu substancialmeiitc. E como as rendas governamentais são grandemente afe tadas tanto pelos níveis de exporta ção quanto pela quantidade de impor tações cuja compra é permitida pelas receitas de exportação, bem c‘omo pe la resultante prosperidade do comér cio nacional, aquelas rendas têm-se mostrado crescentemente deficitá rias”.

mas

com-

“ Entre 1953 e 1960 as exportações latino-americanas outras que o petró■ leo cresceram de 30% em volume, renderam somente 4% a mais em di visas. Se os preços tivessem permane cido aos níveis de 1953, a renda deri vada das exportações latino-america nas teria sido maior por 1,3 bilhões de dólares do que o foi. Podereis preender a diferença que isto tería feito.

As exportações dêsses países são em grande parte produtos cujos pre ços flutuam largamente, respondendo a pequenas variações de oferta. Con-

O sr. Martin frisou dois aspectos do declínio dos termos de intercâmbio

latino-americanos- O primeiro é a re sultante pressão sôbre o balanço de pagamentos, que tornou necessário aplicar direta ou indiretamente cêrca de 40% dos fundos desembolsados du rante o primeiro ano de oreração da “Aliança para o Progresso”, em em préstimos de balanço de pagamentos. Se a relação entre ajuda e comércio fôsse colocada em sua devida perspec tiva, a cíondenação cateeórica dêsses empréstimos compensatórios como

sendo indicativos de desperdício ou frouxidão na administração do auxílio externo, parecería bastante irracional O sr. Martin também chamou atenção efeito inflacionário da deteriodos termos de intercâmbio no de países cuja renda fiscal depen¬ para o ração caso

várias formas, empréstimos,

em suas doações, provisões alimentícias, de Eximbank, ICA, AID, Alimentos para a Paz, Voluntáa Paz — Fundo Fiduciário Progresso Social, PL 480 de um bilhão de ser exato, 1.024 mitôdas as fontes nos para para o montaram cêrca dólares de grandemente dos impostos sôbre a exportação. Efeito semelhante, pode-se dizer, ocorre sc a perda de re ceitas cambiais força uma redução de importações, cjuc poderíam de outra forma amenizar a pressão inflacioná, ou para Ihões. Distribuido por todo o perío do, isso representaria menos de 50 mi lhões de dólares por ano, embora, co mo já foi dito. o fluxo líquido de fun dos tenha aumentado substancialmentc desde o início da implementação da tc aesue w na. o Progresso . “Aliança pararia exato dizer que sido desperdiçado, pois tal assertiv compadecería -a alta tax não se

No decurso dos últimos meses, ouviram-sc objurgatórias, tanto de fon tes bem quanto de mal informadas, fustigando um suposto desperdício nos programas de empréstimo ao Brasil, vista da persistente inflação e das recorrentes crises do balanço de paem a mantida pela econo- ^ com dc crescimento niia brasileira. ainda é que, em ônus do auxireduzido peaufe-

Mais importante termos de bem-estar, o sido grandemente itravés do barateamento r p";; pC pe.os nossos produ tos primários de Urn s.m lio tem nles cálculo tornara patente este fato. Se o valor cumulativo das expor abrasileiras, aos preços correntes 1961. fôr reajustado na reIa’ção de trocas prevalecenrenda 1955 e gamentos.

À luz déste fato, não seria talvez desgracioso nem descortês tecer alcomentários, a fim de colocar em guns devida perspectiva o auxílio dado ao Brasil. Circula uma idéia totalmente exagerada quanto ao volume líquido transferidos à economia de recursos brasileira. Isto decorre em parte da utilização de cifras brutas,, relativas a ções compromissos e autorizações que entre excedem as importâncias de fato de- base da sembolsadas, e em parte da desaten_ te no período de 1950-1953, ^ fliixo inverso de pagamentos adicional de exportação teria ^ ^ 1,4 bilhões de dólares somente últimos seis anos. Durante aquedeficit acumulaçao ao de amortizações e juros. do a Outra razão é o Incremento subs nos le mesmo período, o tancial de desembolsos desde o inicio da “Aliança para o Progresso”, coin cidindo com as condições particular mente adversas do comércio exterior brasileiro- Em têrmos líquidos, e vis tas sob uma ótica de longo prazo, de 1940 a 1956, as transferências líquidas de auxílio governamental ao Brasil, , -d .o da balança de paagmentos do Bra sil foi de aproximadamente 966 mide dólares, muito menos do que rendas decorrentes da do Ihões o declínio nas exportaçãoConsciente do perigo de enfraquea tese por superdemonstração. cer

Ipasso a observ precisar o alcance de minhas ações. Meu propósito não é de a boa vontade e patiân^ o contribuinte americano, que en e duramente o ônus real do im posto, enquanto sua poupança

qua idade de consumidor de produtos a América Laiina, é distante, difusa e involuntária. Meu propósito não é arnbém imputar culpa aos Estados nidos pela deterioração da relação e trocas em desfavor da América La tina, Pois, assim como a elevação de produtos primários, entre 949 e 1954, não foi resultado da ge nerosidade do também comercainte americano, a queda dc preços, a partir não resulta de sua inclinação espohativa. A finalidade não é de ne gar que a melhoria da relação de em benefício dos produtoi dustnais beneficio de 1955, tro es inu tan.o a Europa quanto os Estados Unidos, e enquan to este se esforça por minorar o pro blema dos Produtores de bens primá rios. cas que através da ajuda externa

, que pela promoção de acordos de pro dutos de base, cOmo o do café, os paí ses da Europa Ocidental se comporta ram omissa ou timidamente, seja no que diz respeito à ajuda creditícia, se ja no que tange à melhoria das opor tunidades de comércio dos países sub desenvolvidos. A finalidade não é a de insinuar que existe uma obrigação moral de parte dos países indus rializados de restituir a diferença de pre ços, embora isso pudesse consultar seus próprios interesses, da forma os mesma que, internamente, na maior parte dos países industrializados, os preços dos produtos agrícolas são pro tegidos, com vistas na manutenção de mercados para bens industriais e para evitar desigualdades de renda, social-

mente dolorosas c politicamente peri gosas.

Tudo dito e pôsto, a verdade c que pouca jus:ificativa existe para uma atitude lorgulhosa e dogmática de par te dos países prestamistas, como se a inflação e as dificuldades de balanço de pagamentos da Amércia Latina, resultassem meramente da falta de fi bra ou de propensão viciosa, e não fossem sintomas de um esforço angustioso, cm face de ilima comercial adverso, da impaciência dos consumi dores c de confusas aspirações pelos frutos do progresso, antes que a ár vore do desenvolvimento tenha ama durecido.

A face cambiante da América Lati na é referta de paradoxos. Alguns dos países, relalivamente estáveis na superfície e capazes de manter uma disciplina financeira satisfatória, po dem entretanto esconder elementos explosivos: enquanto países menos disciplinados, embora exibindo a per turbação superficial característica das sociedades pluralísíicas de difuso po der, podem ser dotados de maior re sistência e fôrça duradoura.

Os critérios cruciais consistem era verificar se as massas estão sendo conduzidas a uma crescente participa ção no processo político, se as áreas de promoção social excedem as áreas de rigidez, e se a taxa de desenvol vimento é suficiente para interessar os grupos mais dinâmicos no progresso através do processo de neqociação, em vez da cirurgia da revolução.

Êsses fatores, muito mais do que as avaliações bancárias sóbre capacidade de pagamento, estabilidade de pre'*os ou disciplina orçamentária, tão obsessivamente inspecionadas pelas apênciâs de empréstimos era Washington, , na

é que vão determinar, em úllima aná lise, a viabilidade politica c econômi ca da sociedade.

Não nos devem perturbar as convoluções. muitas vezes hesitantes e per plexas, do processo demoerá ico, mes mo que ocasionalmentc viciadas pela demagogia e por políticas econômicas aparentemente mal di.igidas. Isso porque a história de nossos dias \ em provando que as revoluções comunis tas só têm vencido quando proje.adas contra Estados autoritários, onde o acesso ao poder é privilégio de uma classe ou de um grupo. (A Che^oslováquia constituiu exceção, mas a sua revolução foi imposta de fora). As democracias, mesmo quando pobres e imperfeitas, tem conseguido sobrevi ver, porque nunca apresen.am um al-

vo suricientcmente rígido para permi tir o é.xito de um impacto revolucio nário.

Tendo ouvido nos últimos meses, tantas funestas predições de caos na economia" brasileira, e exortações va riadas sôbie fórmulas saivudoras, confesso não poder resistir à tentade concluir meu discurso por onde — relembrando a fustiga da plataforma Popubsta à espeçao o começara

çao

rada catástrofe econômica e à desin● politica dos Estados Unidos fins do último século.

Não confundamos uma perspectiva histórica, que nos po:'e trazer recel.as de sabedoria, com uma perspectiva pode levar a decítegraçao em histérica, que nos sões irrascíveis e envenenar as fontes de entendimento.

aspectos do comércio exterior

DO BRASIL

Ose

intercâmbio comercial do Brasil com o exterior vem sofrendo efeitos de fatores adversos, que, no corrente ano, exprimem numa queda de cêrcia de US$ 200.000.000,00 (duzentos milhões de dólares)

valor das e.xportações. no ex-

O fenômeno é extensivo a todos os países latino-americanos e aos demais subdesenvolvidos, cuja receita de portação se funda em matérias-primas, independentemente do regime cambial vigente em cada um.

Ao mesmo passo, o proço cm dólares tendería a diminuir, favorecendo a co locação do produto nos mercados eitrangeiros, na medida cm que sejam eli minados concorrentes e cm que o con sumo seja influenciável pela queda de preços.

co-

Essa perda decorre não só da dimi nuição quantítati\'a das exportações mo da queda dos preços das matériasprimas.

Entretanto, os países produtores de matérias-primas oferecem igual compor tamento, no que tange ao estabeleci mento do preço e a guerra de preços, refletir-se-ia, não pela eliminação de um ou outro, mas simplesmente pelo aviltramento das cotações.

Por outro lado está comprovado que a demanda de certos produtos é “inelástica”.

anos, apresenta os

O valor da tonelada exportada pelo Brasil, nos últimos seguintes núraeros-índices: 1954 — 364 dólares; por toneladas; 1955 — 230; 1956 — 258; 1957 — 180; 1958 150; 1959 — 130; 1960 — 120; 1961 — 110; 1962 — 100.

Entre as soluções alvitradas para conjurar o dúplice problema da diminuição quantitativa das exportações e deterio ração dos preços dos artigos exportáveis tem sido preconizada a prática do câm bio livre.

Fundamenta-se êsse ponto de vista pressuposto de que, se o exportador re ceber no valor integral, convertido, em cruzeiros, da cambiai de exportação, a produção dos artigos exportáveis aumen taria e, consequentemente, o volume dis ponível para exportação.

No caso do café, nosso principal pro duto de exportação, a queda de preços não aumentaria decisivamente as expor tações.

Em alguns dos países consumidores, em particular nos países integrantes do Mercado Comum Europeu, a incidência de impostos e tratamentos tarifários pre ferenciais, têm papel decisivo não só ,na composição dos preços, como no favorecimento das importações oriund;is dos países africanos, nossos concorrentes.

No que se refere aos países socialistas, as importações do café, quer no seu vo lume, quer na preferência para êste ou aquele fornecedor, não estão vinculadas preço, mas à política comercial dêsses países.

O Governo monopilisa a importação e oferece o café à venda no varejo por ao

preço independente do custo de impor tação.

Em vista destes fatos, afigura-se-nos que não será pelo mecanismo dos pre ços que o Brasil poderá aumentar sen sivelmente suas exportações c defenderlhes os preços.

Tendo em vista a nossa capacidade de importação muito maior do que a da quase generalidade dos países correntes, entendemos que seria possí vel lançar mão dessa “capacidade de importação”, como elemento de nego ciações, condicionando nossas importa ções de cada país às compras que compensação, se obri gassem eles a efetuar con. em

Seria desejável que os créditos técni cos fôssein utilizados dentro do seu es pírito próprio, ou seja, se apresentassem altemadainente negativos e positivos, de forma a que não venha a se estabelecer uma forma sub-rcptícia de financiamen to do país credor ao devedor.

A solução não é só para esse problema dos acordos bilaterais, como também para que os mesmos benéficos efeitos sôbre a economia bra sileira, é uma só: o importações desses países.

A importação de matérias-primas les originárias, malte cevada, metais não ferrosos, produtos quí micos de base, paravem venham a exercer

aumento de nossas dêfina e outros,

sendo promovida pe las empresas privadas locais e nenhuma in terferência do Poder Público podería bene ficiá-la. a não ser em casos e.\cepc:onais. As aqui. fato Embora não tenha a divulga ção merecida, pode mos afirmar que con sórcios estrangeiros, sediados em países de economia liberal, manifestaram a dis posição de vender ao Brasil, maquinaria

particulares firmas brasileiras compram antidades ofere- as qu a prazo longo, obri gando-se a adquirir, em contra partida, mercadorias brasileiras de igual mon¬ cidas em base com peles forne- petitivas cedores dessa área.

Em nenhum caso, tratar-se-ia de com pensações comerciais de órbita privada, de acordos de pagamentos com a Carteira de Câmbio do Banco do Brasil, Relativamente aos países com os quais já mantemos acordos bilaterais, a rela tiva ineficiência 1 de tais acordos tem sido causada pela falta de medida com plementares.

Onde, entretanto, o Poder Público po dería ter papel significativo, seria na compra de máquinas e equipamentos.

E’ de notar-sc que tais acordos bila terais vêm apresentando saldo a nosso favor. mas

A maior parte das compras de maqui nas e equipamentos verificadas no Brasü, no último decênio, foram realizadas por empresas estatais como a Petrobras, a Rêde Ferroviária Federal, emprêsas elétricas, e outras integradas nos planos governamentais, beneficiadas com favoO Estado pode, assim, neste setor, exercer papel importante.

A intervenção do Poder Publico pro piciaria a utilização dos saldos e estimu¬ res. lante.

, lana, na medida em que a posição do balanço de pagamentos se invertesse, novas compras dos países em referência, inclusive de café.

No tocante aos países do leste euro peu com os quais mantemos acordos bilaterais, é equívoco imaginar que as populações dessa área não sejam necessàiiamente bebedoras de café, e não o possam ser em maior volume.

Os índices de consumo “per capita” anteriores à guerra, eram em alguns, ina‘s altos do que hoje.

lísse mercado pode ser recuperado e ampli.do.

Unia vez aumentado o volume de nos

sas compras de maquinária e equipa mentos, negoc.açÕes poderíam scr entabuladas, para venda de nossos produtos, in.lusíve de café.

ICom o objetivo de afastar o receio, não confirmado, de reexportações, cláu sulas de fiscalização poderiam ser discutídüs.

acordos bilaterais, foram introduzidas cláusulas que asseguram, iinilateralmen* te em benefício do Brasil, que a liqui dação dos saldos negativos, não possa ser exigível por transferên ia em moedjs conversíveis. Assim, tais países só podem recobrar as vendas que nos efe tuarem, comprando mercadorias brasi leiras.

Entre as providencias que o Poder Público podería tomar, visando evitar o acúmulo do saldos credores e a inten sificação das correntes de comércio, desej.mos apontar as seguintes:

No setor das exportações brasileiras, recomendações ã Caccx no sentido de restring r a expedição dc licenças de exportação aos artigos dc que haja e.xcedentes, sempre que a balança de pa gamentos, aprescnt.;r saldos superiores ao "Working-b..lance”.

Essa importação de maquinária implicaria na diminução das compras de nossos fornecedores tradicionais.

P..ÍS sequioso de bens de capital, co mo é o Brasil, sua aquisição não se fa ria cm detrimento de outras fontes for necedoras, e viría a estimular o procesmi

nao desenvolvimentista da Nação.

Desejamos assinalar que, por inicia tiva pessoal nossa, na negociação de

No setor das importações, instruções à Carteira de Cambio para colocar à disposição de autarquias e sociedades de economia mista, como a Petrobrds, a Uêde Ferroviária Federal e outras, os saldos à vista e os créditos d sponíveis em moeda convênio, independcntemenlo de tais entidades disporem de recursos em moeda nacional para liquidação ime diata de câmbio. Para êste efeito, pa ralelamente, créditos em cruzeiros seriam contrat-das com as mencionadas emprêsas públicas.

EXAME DE CONSCIÊNCIA

dermos um balanço em nossa consciência, neste Advento que precede o início das festas Htúrgicas do Natal, seremos obrigados a reco nhecer que êste ano de 1962 se ca racterizou por uma série de agitações dc caráter doutrinário, anos nào assistíamos no Brasil a um despertar da inteligência à procura de novas formas dc vida política e social. Pela primeira vez, depois das lutas pela abolição da escravatura e pela implantação do regime republi cano, estamos presenciando a uma to mada de consciência coletiva favorá vel a reformas de base de nossas es truturas políticas c sociais. A venta nia foi forte; muita velharia já voou pelos ares e irá caber aos próximos anos o delineamento da nova fisiono mia humana do Brasil. A juventude universitária c o operariado, assumi ram um papel de destaque na direção dos movimentos renovadores, enquan to que os partidos políticos, e os in telectuais se ausentaram da batalha. O pior de tudo foi a atitude rcadonárai dc grupos sociais privilegiados, violentamerite contrários a qualquer moditicação em nossas instituições tra dicionais. Os bem-pensantes, sobretu do os “liberais”, dogmáticos e intran sigentes por definição, cm lugar de procurarem compreender os anseios por uma renovação espiritual e estru tural, contentaram-se em pregar rótu los injuriosos cm tudo aquilo que os assustavam. Amedrontrados com os foguetes atômicos, colocados em Cuba pelos soviéticos, destribuiram, às ce-

gas, o apôdo de comunistas” a to dos os inconformados. Não contaruío mais com o apoio da mocidade, te mendo, por outro lado, agitar as for ças armadas, procuraram envolver a Igreja Católica em suas elocubrações desatinadas. A velhice, sobretudo .i dccrepitudc das classes dirigentes, atribui sempre à juventude os vici()s de sua própria decomposição- As ati tudes insólitas, e aparentemente, in subordinadas, dos universitários, pa receu-lhes movidas por agentes secre tos de Moscou, ou por dinbeiro de ori-gem suspeita. É próprio tlof que perderam a esperança, atribmr a .s moços, interesses mesqu.nltos e innofessáveis. Entretanto, nenhum Erantle jornal se lembrou dc tomar o dep.nmento de leaders univers.tar.os pa a informar o póblico a respetto das t.oimovem a açao.

rentes de idéias que ^ Parecc-nos, contudo, que valena a pe na tentar compreender a juvemude "transviada” do Brasil atual. É mui to difícil procurar compreender os h.qdefendê-los, do que para acusador, ar¬ os mens para atacá-los. É fácil a um mado com as provas l policial, livrar a considerado perigoso, e colhidas num jirosociedade de cesso um homem _ trancafiá-lo numa cela penitenciaria, uma socieda- O difícil é demonstrar a de insatisfeita consigo mesma, os seus omissões, como e qu.ijvel fazer com que um ofenerros e as suas se imposs sor descubra as razões do ofendido.

Apesar de dois mil anos da mensa gem cristã, ainda nos rejubilanios quando os outros se penitenciam pe*

Há muitos

ias nossas próprias faltas. Os liberais, '"OS livres pensadores se escandalizam com os católicos que batem no peito reconhecendo a própria culpa, enquan to, êles, como os fariseus, passam gostosamente para os outros a res ponsabilidade de tudo que foi mal fei to, ou deixou de ser feito. Como com preender a nova geração sem um exa me de consciência ou inventário do acervo que lhe foi legado? Seria, por exemplo interessante perguntar: quais foram os bens espirituais que os pais legaram aos filhos? No terreno reli gioso, a resposta é fá cil. Com raras exceções, o catolicismo no Brasil tem consistido na prática de devo ções, na repetição de fórmulas de manuais autorizados, na estrita observância de alguns preceitos garantidores de uma boa ordem moral e financeira nas relações familiares e sociais. As nossas clas ses dominantes se ha bituaram a considerar a Igreja católica, Co mo uma espécie de academia, guardiã de uma ordem moral intransigente, modelo de virtudes humanas, dispensadora de títulos e de bênçãos, aos cidadãos bem comportados. Por ou tro lado, uma parte da chamada “ bur guesia Católica”, bem instalada em seus privilégios temporais e intempolais, se contenta em assistir de cama rote ao espetáculo religioso, pago pot ela.

Tem sido quase nula no Brasil uma efetiva participação, militância, ou en gajamento, de leigos numa autêntica

ação católica de caráter doutrinário. 1»

É evidente que a juventude de hoje y não está disposta a deixar-se enqua drar na estrutura e na mentalidade de um psêudo-catolicismo anêmico e decadente. E quando os universitários se rebelam contra fórmulas mortas e apodrecidas c muito mais fácil acusálos de transviados, neuróticos ou co munistas do que indagar a motivação de sua rebeldia, para lhes indicar os ineio.s de alcançarem uma autenticida de existencial no catolicismo.

.Se a história é mestra da vída, não custa fazermos um exame do acervo espi ritual que nossos an tepassados mais re centes nos legaram. Como o espaço é pequeno, c o tempo ctirto, nos contentare mos cm delinear, em traços largos, o com plexo de icléias-fôrças que compôs a fisiono mia política e sorial da primeira República. Qualquer estudante de filosofia sabe que foi Augusto Comte o | plasmador da mentalidade dos republi canos brasileiros. A “ Ordem e Pro gresso” de nossa bandeira é o sím bolo na vitória do “ positivismo” no Brasil republicano.

A filosofia de Comte despertou ain da, entre nós, o gosto pelo estudo das ciências exatas, sobretudo da matemá tica. E a lassidão de nossos costumes encontrou normas morais na sociolo gia positiva.

Aliás, não somente o Brasil, mas a França e os Estados Unidos recebe- ' ram em cheio, no século XIX, o im- !

pacto do ritain em seu último trabalho: philosopltic moralc” 1960), fazendo crítico dos grandes sistemas”, nos dá uma admirável síntese da mentalidade dos discípulos de Comte.

“Sua influência se fêz sentir positivismo”, jaeques Ma“La (Paris. N.R.F. um exame histórico e nos de sereia de um marxismo primário, o Brasil serviu de cobaia para experiên cias já superadas no Ocidente.

Pelo menos desta vez, graças à clarividência e à tenacidade de alguns membros destacados de nossa hierar quia eclesiástica, o Brasil deu um pu lo para a frente na solução da “ques tão social”. Não seria lícito esquecer marxismo” na menta- o impacto do lidade dc nossa juventude universi¬ tária.

Na verdade a doutrina dc Marx não nem teve tempo inteligência encontrou terreno, para criar raízes, dêste país.

Na aguagem dêsse humanitarismo sem doutrina, elaborou-se a legisla ção do Trabalho, felizmente, era gran- ‘ de parte inspirada pelas Encíclicas Pontificais de Leão XIII e Pio XI. mais variados domínios. Não é somen te uma doutrina; é iami)em, c talvez antes de mais nada, um estado de es pírito. Não é pois surpreendente que no plano da vida dc cada clia, razão dos temperamentos, c'omo das circunstâncias, êsse estado dc espírito se encontre cm homens animados dc convicções práticas, não sòmcnte di ferentes, mas diamctralmcnlc opostas. Existe as.sim um positivismo de es querda lil)cral, luunanitário, ingênuo c inconsequente, que milita pela justiça, a fraternidade humana e os direitos humanos, tendo por nulo, c não acon tecido, tudo quanto fundamenta na í'azão, essas noções. e em

E existe, por outro lado, um positi vismo da direita, cínico c articulado

■— tão utópico, aliás, como o po.sitivismo da esquerda, mas sob o signo da ordem c da fôrça — que cm nome da natureza, e de suas necessidades, e de Um realismo que se diz científico, nu tre uma profunda aversão pela justi ça e pelos valores morais”. (Obr. cit- p. 331).

Êsse quadro nos pinta o retrato, em corpo inteiro, dos varões de Plutarco da Primeira República.

A rçvolução de 1930 acabou domi nada pelos resíduos dêsse mesmo “po sitivismo” qutí o senhor Getúlio Var gas trouxe dos pampas.

Assim, durante algumas 'décadas, ora namorando o socialismo fascista, ora se deixando seduzir pelos cantos

É claro, entretanto, que o primarisleninisna da tática e dos processos mo agitação das massas, e a tas para a tomada de poder por uma imnona agressiva foram, e continuam a_ ser pregados diante do indiferentismo dos responsáveis pela manutenção do democrático. em regime

je não para seu caz

Nesse rescaldo de ideologias legadas pelos antepassados, a mocidade de hoencontra guias, nem objetivo incontido desejo de ação eficontra a ignorância e a miséria. Assistimos à deteriorização de nossa moeda em razão direta da corrupção de nossos valores de inteligência.

Assim é extremamente penoso, nes se caos de idéias, o espetáculo ofere cido ao público por alguns intelectuais que se desgastam em estéreis polêmi cas pela televisão, e pelos jornais. Para um auditório mantido, propositadamente, em estado de alarma, as 1

discussões públicas sôbre temas reli giosos, ou filosóficos, tomam o aspec to de um diálogo de surdos, e termi nam sempre em forma agressiva.

Ora, a injúria, como anotava Paul Valery, só vale para as galerias. A sa cerdotes, arrastados a estéreis deba tes, não nos parece demais lembrar a advertência do impetuoso Pascal: “ quando nos afastamos da caridade, nos afastamos da verdade”.

Embora respirando um clima espi ritual contaminado e estéril, a juven tude encontrará o caminho da auten ticidade, desde que não se deixe cor¬

romper pelas lamúrias dos reacioná rios sem esperanças, nem se deLxe arrastar pelas águas poluídas da dia lética marxista- Há muito o que fazer por êste Brasil afora, e o que vai ser feito está nas mãos dos jovens.

É de esperar que os velhos não im peçam o ímpeto criador de nossa mo cidade.

No livro agora publicado pelo vraria Duas Cidades” e intitulado Evangelho e Revolução Social”, Frei Carlos Josaphat. O. P. abre à juventude católica, amplas perspecti vas para uma ação objetiva e eficaz. LiU

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Apucarnna

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Jacarèzlnho

Londrina

Maringá

Paranaguá

Paranavaí

DIRETORIA

AUGUSTO MEIRELLES REIS FILHO — Presidente PLÍNIO DE OLIVEIRA ADAMS — Vice-Presidente

JOAO ADHEMAR DE ALMEIDA PRADO — Superintendente

CORINTHO GOULART — Diretor-Gerente RUBENS MORAES ALVES LIMA — Diretor-Gerente NELSON DE ALMEIDA PRADO — Diretor-Gerente

PORQUE O SR. DEVE ANUNCIAR NO

DIGEST© noMico

Prectóo íidí informações, sóbrio e objetivo nos comentários, cômodo c elegante na apreseniaDicesto Econôaoco, dando aos mensal ao mundo dos classe de alio poder seus çao, o leitores um panorama negócios, circula numa aquisitivo e razões, os anúncios inseridos no Digesto Eco nômico sôo lidos, invariàoelmente, por um proelevado padrão de vida. Por essas

vável comprador.

Esta revista é publicada mensalmente pela Ediauspícios da Asso- tôra Comercial Etda., sob

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