Dinâmicas #1

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JANEIRO 2013

E S C O L A A RT Í S T I C A D E S OA R E S D O S R E I S


FICHA TÉCNICA

DINÂMICAS | MAGAZINE DE DESIGN DE PRODUTO PUBLICAÇÃO ANUAL COORDENAÇÃO: ARTUR GONÇALVES, MARTA CRUZ, MICAELA REIS COLABORAÇÃO NESTA EDIÇÃO ALBERTO TEIXEIRA, ARTUR GONÇALVES, CARLOS RAMOS, CONCEIÇÃO MAGALHÃES, FRANCISCO PROVIDÊNCIA, JAIME SARRÓ, LUCAS PINHEIRO, MADALENA MENESES, MARIA MILANO, MARIA DA LUZ ROSMANINHO, MARIANA RÊGO, MARTA CRUZ, MICAELA REIS, SUSANA AFONSO, SUSANA BRANDÃO, VERA SANTOS E OS ALUNOS AFONSO CASTRO, CARINA CARMO, CÍNTIA SILVA, CLÁUDIA FONTES, ELSA PINTO, GABRIELA MAGALHÃES, INÊS OLIVEIRA, JOANA RIBEIRO, JOÃO MOURA E MATILDE MAIA. PRODUÇÃO GRÁFICA/ EDIÇÃO DIGITAL: MARTA CRUZ, MICAELA REIS CONTATO EDITORIAL: dinamicas@essr.net PROPRIEDADE: ESCOLA ARTÍSTICA DE SOARES DOS REIS RUA MAJOR DAVID MAGNO, 139 | 4000-191 PORTO TEL. +351 22 537 10 10


CARLOS RAMOS

EX-PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO DE PAIS DA ESCOLA ARTÍSTICA DE SOARES DOS REIS

NOVA FRONTEIRA Fronteira é conceito intrínseco da existência. E sempre foi, e será, desafio para o ser humano. A começar pelo seu corpo físico, delimitado, não podendo por osmose, ou outro processo qualquer, fundir-se com outro, alargando, expandindo assim a sua fronteira, até à chamada descoberta do Universo que, ainda hoje em dia, se encontra em discussão se é finito, ou não, o desafio de passar os limites aí está. E no campo do não físico, sempre ouviu dizer, por exemplo, que a liberdade acaba (estando assim entre fronteiras) quando e onde se inicia a liberdade de um outro. E quanto mais pugnamos pela nossa liberdade, logo, logo, uma nova fronteira se lhe aparece. Neste campo, o do etéreo, será que ao percorremos o caminho dos sonhos, da imaginação, da criatividade, também encontramos linhas para além das quais é preciso dar o salto? Há pessoas que não sonham, que têm receio de imaginar seja o que for e então, quanto à criatividade, é um descalabro. Do seu “centro” à periferia, à fronteira, o espaço é desmesuradamente ínfimo. No entanto, contrariando, todos os dias se desfazem fronteiras, se alargam os horizontes, aumentando o nosso território, quer seja físico, quer seja espiritual. A ciência descobre e define novos conceitos. A arte, não digo que a seu desejo, se expande e altera a todo o momento os seus limites. E quanto à metafísica é só andar por aí e verificar quantas fronteiras já foram desfeitas. É pois, também, intrínseco ao ser humano, alterar, destruir fronteiras. E quando isto acontece é também natureza do humano, inventar ou, mais exactamente, descobrir novas fronteiras. E posto isto, chegamos ao “Design”. Para mim, já não é o espaço a “new frontier”, mas sim a não aceitação da existência do conceito, da disciplina do “Design”, a fronteira que é preciso atravessar. Pois tudo na vida é desenho. Ela própria, a vida, é consequência do desenho, ou já está desenhada ou está em vias de o ser. DINÂMICAS _ MAGAZINE DE DESIGN DE PRODUTO _ NÚMERO 1

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ED I TO RI A L

Esta frase ainda se deve encontrar no imaginário de

to de partida. Só a partida para o espaço, a conquista

muitos de nós, os que acompanharam as aventuras do

da Lua nos garantiu que não será necessário confinar-

capitão Kirk e da sua tripulação. A fronteira para a qual

mos-nos à Terra. Esta não é o nosso “World’s End”. Mas

se dirigiam era ainda a mítica fronteira dos antigos, a

não será o espaço outra bola onde nos movemos circu-

dos navegadores de quinhentos ou a dos argonautas. Ir

larmente? A Terra vive na terceira dimensão, viverá o es-

em busca dessa mesma fronteiras era alargá-la o mais

paço numa outra que desconhecemos? Outra fronteira!

possível, levá-la mais além em nome do conhecimento

Que dizer das fronteiras que servem para apartar? Para

e do domínio humano. Fronteiras físicas ou não, reais ou

separar? O muro de Berlim, o muro da Palestina, o muro

construídas, temidas e desafiadas. Lembro, na saudosa

da fronteira Mexicana? Dum lado uns e do outro lado

Edimburgo das lendas e mistérios, o pub denominado

de lá outros. Esses outros que também somos nós para

“World’s End”. À porta, um conjunto de paralelos metáli-

os que estão do lado de lá. Não nos queremos juntar.

cos anunciam que outrora por ali passava a muralha da

Mas, destes muros pouco se dirá, apodrecem com o

cidade. Nesses tempos o mundo acabava ali. As pes-

tempo, esboroam-se com as gerações vindouras ávidas

soas que viviam dentro da muralha nasciam lá, viviam

de conhecer e conviver. Há também a fronteira do co-

lá e morriam lá, sem jamais conhecerem outro mundo.

nhecimento, parecida com a fronteira geográfica porque

Nesse mundo pequeno e asfixiante, de parco conheci-

se alarga com o tempo, parecida com a fronteira física

mento onde tudo haveria de parecer eterno e imutável.

porque divide e separa. O positivismo mapeou o conhe-

Foi preciso derrubar todas as muralhas (as que restam

cimento em zonas objetivamente separáveis que logo a

são ícones nostálgicos dum passado pouco saudoso)

era pós moderna misturou, miscigenou. Tudo acaba por

para se perceber que havia mais e mais e sempre mais.

se interpenetrar e já não é certo onde começa uma área

Mas, ai pesadelo de Ícaro, as fronteiras/muralhas exis-

de conhecimento e termina outra.

tem mesmo. O nosso planeta é ele próprio limitado, seguindo

Acabaram-se as fronteiras e sentimos-nos perdidos,

sempre em frente temos a garantia de regressar ao pon-

inseguros. As definições caem uma após outra e nós,


ALBERTO MARTINS TEIXEIRA

DIRETOR DA ESCOLA ARTÍSTICA DE SOARES DOS REIS

“Space, the last frontier. These are the voyagers of the Starship

Entreprise. Its fiveyear mission: to explore strange new worlds, to

seek out new life and new civilizations, to boldly go where no man has gone before”

- início de cada episódio da série Star Trek.

sem porto de abrigo, sem âncora segura, vamos sendo

teira entre o objeto utilitário e o objeto decorativo, ambos

empurrados por ventos que não dominamos. O conhe-

poderão ser a mesma coisa, basta a intenção. A ciência

cimento não tem fronteiras, em cada dia se acrescenta

avança, a tecnologia avança, os novos materiais polu-

mais um segmento, mais uma área de conhecimento

lam gritando por um novo design. A biotecnologia há-

neste quadro complexo e enciclopédico onde já se diz

-de-nos escapar um dia quando os abjetos se reprodu-

re-descoberta. Enquanto isto todos aguardam que a

zirem e autoevoluirem no tempo. Morre o sagrado, tudo

TOE (theory of everything) anuncie o fim da Física, tal

é profano. O que tiver de ser inventado será inventado

como em 1899 Charles H. Duell, encarregado do escri-

e não haverá fronteiras legislativas que o impeçam. Mui-

tório de patentes dos EUA dizia “tudo o que podia ser

tas ovelhas Dolly espreitam o seu momento em labora-

inventado já o foi”. Nisto de fronteiras a intuição poderá

tórios clandestinos à espera de transações chorudas.

ser a nossa pior inimiga. Em 18 de abril de 1939 o cir-

O último reduto somos nós, o nosso cérebro que nos

cunspecto New York Times tranquilizava os seus leitores

cria fronteiras através das crenças que desenvolvemos

“a televisão não dará certo. As pessoas terão de ficar a

e inculcamos. Essas são as últimas fronteiras que pode-

olhar o ecrã e a família americana média não tem tempo

remos querer (ou não) derrubar. As fronteiras mentais

para isso”. Para além dos entusiastas existem os céti-

podem ser a diferença entre a salvação e a condena-

cos que o tempo se encarrega de condenar tal como

ção. Mas, será a morte também uma fronteira?

fez a J. Watson, presidente da IBM, que em 1943 dizia

Nietzche matou Deus para logo os karamasov de Dos-

“acredito que há mercado mundial para cerca de cinco

toievsky anunciarem um reino onde tudo seria permiti-

computadores”.

do. Nem tudo, a tomar como verdadeiras e sábias as palavras de alguém que diz “a liberdade do seu pulso

Pensando coleteralmente será que tudo poderá ser

termina na ponta do meu nariz”.

tudo? Que as fronteiras se diluem a cada momento? Na verdade a arte morreu quando Duchamp pegou num

Estas são as fronteiras convencionais que é neces-

urinol e fez dele um objeto artístico. Desapareceu a fron-

sário respeitar. Mas, e as outras? Todas as outras?

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ÍN DI CE

ÍNDICE 3

NOVA FRONTEIRA - CARLOS RAMOS

4-5

EDITORIAL - ALBERTO MARTINS TEIXEIRA

6-7

INDICE

PERCURSOS

8-11

O PRAZER É MELHOR QUANDO PARTILHADO - LUCAS PINHEIRO

12-15

DACIANO DA COSTA - JOÃO PAULO MARTINS

16-19

PROCURA-SE IDENTIDADE, PROCURA-SE FUNÇÃO - JAIME SARRÓ

REFLEXÃO

20-25

DEUS ETERNAMENTE GEOMETRIZA - SUSANA BRANDÃO

26-29

A BELEZA PRODUZ MAIS JUSTIÇA SOCIAL? - FRANCISCO PROVIDÊNCIA

30-33

DESIGN DE INTERIORES - MARIA MILANO

34-37

JORNADAS DE DESIGN DE PRODUTO - M. CRUZ | S. AFONSO | M. REIS

38-41

DAR GÁS AO DESIGN - ARTUR GONÇALVES

42-45

COMENIUS, UM PROJETO SEM FRONTEIRAS - MADALENA MENESES

42-45

A ENGENHARIA E O DESIGN DE PRODUTO - MARIANA RÊGO

46-47

MODA, ARTE OU DESIGN? - VERA SANTOS

48-49

FRONTEIRA - CONCEIÇÃO MAGALHÃES


PROJETO

52-53

CÍNTIA SILVA

54-55

MESA EM PÉ - MATILDE MAIA

56-57

PRODUTO GLOBAL - SARA MAGALHÃES

58-59

SÃO JOÃO COM MANJERICO - INÊS OLIVEIRA

60-61

TAVOLO - AFONSO CASTRO

62-63

CHEGAR A “BOM PORTO” - CARINA CARMO

64-65

CASTANHAS PARA SOBREMESA - ELSA PINTO

66-67

ENCOSTA - JOÃO MOURA

68-69

PATRIS - CLÁUDIA FONTES

70-71

LAVOURA - JOANA RIBEIRO

72-73

TRANSLÚCIDO - GABRIELA MAGALHÃES

LIVRO

74-75

“DAS COISAS NASCEM COISAS” - BRUNO MUNARI

BREVES

76-77

FRONTEIRA 7


PER CURS O S

“Um pianista não é um compositor, um carpinteiro não é um designer de equipamento. Eles dependem uns dos outros e são a sua qualidade e capacidade de comunicar que vão contribuir para um resultado que não seria possível alcançar individualmente.

Sinfonias são bons exemplos da articulação possível entre partes dependentes. Há uma linguagem comum que a orquestra respeita e entende; o que a torna possível é cada um dos seus membros desempenhar a sua função sem desprestígio ou conflitos maiores.”


LUCAS PINHEIRO EX-ALUNO EASR

O PRAZER é melhor quando é

PA R T I L H A D O

O prazer é melhor quando é partilhado, assim como depender dos outros torna a nossa vida melhor. Nós dependemos - e eu acredito que não há nada de errado nisso, pelo contrário: interdependência é parte de nós e um dos nossos fortes. Construímos uma rede de dependências que nos permite viver melhor e confiar em outras pessoas, produtos e soluções. Nós todos somos dependentes embora alguns pensem que não são. Acredito na dependência como o caminho para uma vida, trabalho e soluções melhores; o valor da minha forma de trabalhar está também nas pessoas com quem trabalho e na maneira como as envolvo no processo de design. Penso melhor do que faço e mesmo assim invisto tanto tempo a aprender a fazer como a aprender a pensar. Sendo o meu forte trabalhar conceptualmente não deveria investir em desenvolver essa característica e aliar-me a quem a possa completar? O ideal seria articular talentos de pessoas diferentes num processo comum. Saber comunicar é essencial para permitir que os esforços se fundam e se entendam. A comunicação e a consciência da sua importância são o segredo para uma boa parceria. Saber respeitar os talentos dos outros é igualmente importante. Um pianista não é um compositor, um carpinteiro não é um designer de equipamento. Eles dependem uns dos outros e são a sua qualidade e capacidade de comunicar que vão contribuir para um resultado que não seria possível alcançar individualmente. Sinfonias são bons exemplos da articulação possível entre partes dependentes. Há uma linguagem comum que a orquestra respeita e entende; o que a torna possível é cada um dos seus membros desempenhar a sua função sem desprestígio ou conflitos maiores.

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PER CURS O S

Porque devemos então tentar ser seres multi-talentosos se podemos confiar nos outros e nas suas qualidades para tirar o máximo de proveito do talento de todos? Nunca sonhei ser um canivete suíço, pelo contrário, sempre quis ser bom a fazer uma coisa. E muito embora não duvide que um canivete suíço possa ser muito útil, não deixo de pensar que, quando usado para tirar a rolha de uma garrafa de vinho, não se pode comparar a um saca-rolhas que foi pensado especialmente para desempenhar essa função. Há lugar para pessoas multi-talentosas, mas esse lugar não nos conduz à qualidade. Uma parceria é uma multiplicação de potencial e uma maneira muito mais rica de trabalhar. Se se compararem as ferramentas de um canivete suíço com as ferramentas que lhe servem de inspiração não há dúvidas em descobrir qual dos conjuntos é o mais eficaz. A especialização tem um grande potencial uma vez que se tira proveito da qualidade de cada uma das partes em vez de se explorar uma solução única que não responde bem a nenhum dos problemas para a qual foi criada.

Ter as ferramentas certas é a melhor forma de começar. Encontrar as pessoas que acreditam no que acreditamos, que confiam em nós e no nosso talento e nos seus próprios talentos é metade do caminho para fazer bom design. Ser um coletivo que trabalha como tal, trazer os talentos uns dos outros para descobrir uma nova solução, delegar o que não sabemos fazer em quem o sabe fazer, reconhecer o talento dos outros e perceber o quão dependentes somos deles é igualmente importante. Todos somos uns melhores que os outros, todos sabemos mais do que os outros, mas nem sempre sabemos ouvir e comunicar. Ainda não há uma linguagem que articule designers e produtores da mesma maneira que uma pauta musical articula os instrumentistas e os compositores. Se existe, ou não é suficientemente boa ou não é conhecida pela maioria das pessoas de ambos os lados. Conhecer e usar a mesma linguagem é garantir a compreensão e é ao mesmo tempo respeitar os outros. Essa é uma das grandes lacunas na educação design: comunicar na mesma língua da indústria. Envolver muitas pessoas nos nossos projetos obriga-nos, de cada vez, a mudar a forma como comunicamos. É um bom exercício e também uma boa maneira de perceber o nosso projeto de uma nova perspectiva, a dos outros. Ao partilhar um trabalho durante as fases inicias é possível obter um feedback eclético e fazer com que o projeto dependa de uma realidade mais ampla do que a nossa e do que as coisas que sabemos.


LUCAS PINHEIRO EX-ALUNO EASR

É essencial ter um processo de trabalho que depende de pessoas e que se lembre das suas necessidades mais diversas. Criar objetos que são palcos de interação, lugares para se poder tocar e ser tocado, instrumentos que podem produzir histórias e fazer as pessoas sentirem, soluções que dependem de quem as usa para serem valiosas, objetos que crescem em valor quando são lembrados depois de serem usados. Designers são músicos do silêncio. São criadores de espaços e formas que promovem acções e suscitam emoções. São responsáveis pelo silêncio que significa. Silêncios não significam sem o contexto certo, eles dependem profundamente um do outro. A tarefa de um designer é fazer esta relação clara. Entender o que é necessário para que uma forma possa comunicar num determinado contexto. Por entendermos as nossas falhas, podemos procurar quem as preencha. Se queremos um trabalho bem apresentado e não temos as ferramentas necessárias para o apresentar, temos que recorrer a quem melhor sabe para colaborar connosco. Boa fotografia, bom design gráfico, bons spots publicitários, bons textos, etc... são fundamentais para fazer com que os outros acreditem nos nossos projectos. Não vejo problema nenhum em depender dos outros para fazer melhor. O mérito nunca se divide - multiplica-se. A interdependência é o que distingue o Homem e é só por temermos, não confiarmos e não sabermos comunicar e respeitar que não trabalhamos juntos ainda melhor. Ser dependente e consciente da nossa dependência é a melhor ferramenta que podemos ter. Aprender a delegar, confiar e depender dos outros é fundamental dentro de qualquer modelo de sociedade.

Transforma os teus defeitos em colaborações, transforma o que não sabes em espaço para aprenderes com os outros. Aprende a depender e não a ser independente. Encontra a tua forma de comunicar e partilhar o prazer. Sê tolerante e respeita a forma e valor do trabalho dos outros. Procura em ti o que te move e rodeia-te daqueles que te querem ensinar e aprender. Mantémte dependente e tolerante. Procura nos outros aquilo que não podes encontrar dentro de ti. 11


PERCURS O S

DACIANO DA C O S TA designer

Lisboa, 1930-2005

O design de Daciano da Costa (1930-2005) tem sido

muitos artistas da geração anterior à sua, passando a

muito justamente valorizado pela crítica e a historiogra-

ocupar-se do desenho de pavilhões e stands para fei-

fia portuguesas devido à sua coerência, rigor profis-

ras e exposições. Depois, “circunstância, vocação e

sional e maturidade de desenho; pelo equilíbrio no uso

acaso” - como sempre repetia, parafraseando Ortega y

dos materiais, pelo acerto da proporção, a elegância

Gasset - rapidamente o conduziram ao desenho de in-

do detalhe; pela exemplar ligação que estabeleceu

teriores públicos. A passagem gradual da Decoração à

com a indústria, pelo modo inteligente como soube inte-

Arquitetura de Interiores reconhece-se claramente. (...)

grar a cultura do seu tempo. Esta ideia - reforçada por uma prática pedagógica de décadas, reclamando a

(...) Daciano da Costa sempre revelou uma especial

definição de uma nova classe profissional, levando ger-

apetência para definir o seu mercado em “tarefas inter-

ações de jovens arquitetos a “ver pelo desenho”, confer-

sticiais”, nas margens das disciplinas convencionadas.

indo sentido universitário à formação dos designers - é

Ao longo do tempo, iria afirmar-se como um especialista

também uma consequência da sua militância na defesa

em coisas que outros não faziam, ocupando posições

e na consolidação da disciplina, fazendo a apologia de

tradicionalmente descuradas pelas compartimentações

um método, empenhado numa causa, intransigente. (...)

profissionais estanques, pelas visões demasiado condicionadas aos compromissos corporativos. Foi certa-

(...) Muito cedo, Daciano optou pelo abandono de uma

mente essa atitude - servida por um talento seguro, múl-

carreira promissora nas artes plásticas, investindo con-

tiplo e flexível - que lhe permitiu promover hibridações

victa e irreversivelmente nas disciplinas do projeto.

e contaminações, frutuosas e estimulantes, procurando

Num primeiro momento, como colaborador no atelier

respostas que eram então ainda demasiado novas. In-

do seu mestre Frederico George, repetiu os passos de

augurou tarefas que, no contexto português, estavam


FORMAÇÃO ACADÉMICA | Curso de Pintura Decorativa, Escola de Artes Decorativas António Arroio [1943-1948] Curso de Pintura da Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa [1950-1961] ATIVIDADE DOCENTE | Desenvolveu atividade pedagógica na área do Design desde 1954 em diversos níveis de ensino oficial e privado. Desde 1977, foi docente convidado do Departamento de Arquitetura da Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, hoje Faculdade da Universidade Técnica de Lisboa [FA-UTL]. Elaborou e implementou o plano de estudos e os programas das disciplinas fundamentais do curso da Licenciatura em Arquitetura do Design, criado em 1992 na FA-UTL, de que foi coordenador. Foi nomeado professor catedrático do Departamento de Arte e Design da FA-UTL em 1998. Professor Catedrático Convidado da FA-UTL. Doutor Honoris Causa pela Universidade de Aveiro [2003] e pela Universidade Técnica de Lisboa [2004]. ATIVIDADE PROFISSIONAL | Sob a orientação de Frederico George iniciou a atividade de designer [1947-1959]. Estabeleceu atelier próprio em Lisboa em 1959, desenvolvendo desde então a sua atividade no projeto de Arquitetura de Interiores, Equipamento e Mobiliário, Design de Exposições e Design de Produtos. Iniciou em 1962 a sua colaboração com a Metalúrgica da Longra. Em 1974 fundou a empresa “Risco”, orientada para o desenvolvimento de projetos de Design Industrial, Design de Exposições e Design Gráfico.

apenas em fase de enunciação, atividades que, por

curso em que iam participar, eram doseadas para se in-

vezes, só depois desse seu contributo fundador viriam

screverem na hierarquia do conjunto, no sentido global

a ganhar efetiva definição. Quando recusou o estatuto

da composição; sublinhavam as suas especificidades,

de artista iria manter a capacidade do desenho singular

procurando torná-las mais claras, potenciá-las; deviam

e expressivo, do gesto único e irrepetível, que dominava

adequar-se às funções dos espaços e à relação que

com invulgar mestria. E saberia importar para o projeto a

o utilizador com eles iria, previsivelmente, estabelecer.

disponibilidade para entender, e tirar partido, da poten-

As qualidades do contexto - a evidência do conceito

cialidade comunicativa dos objetos, da relação sensível

gerador, a coerência global, a maturidade do desenho

com os materiais, as cores e as texturas.

– iriam refletir-se de forma positiva sobre os ambientes que projetou, como o podem demonstrar as obras da

Design para o contexto/ desenhar em contexto

Fundação Calouste Gulbenkian (1966-1969) e do Ca-

A atividade projetual de Daciano da Costa desenvolveu-

sino Park Hotel (1972-1984).

se em torno do “desenho do detalhe”: o detalhe da arquitetura, o detalhe da cidade. Esta circunstância terá

Os seus objetos assumiam uma posição discreta, de

despertado a consciência de se tratar de intervenções

acompanhamento, diluindo-se nos ambientes, ou, pelo

destinadas a contextos que lhes são “exteriores”; con-

contrário, reclamavam protagonismo e destacavam-se

textos (físicos e, sobretudo, culturais) que justificam e

para pontuar os espaços. Frequentemente, essa cum-

suportam esses projetos, mas que os antecedem no

plicidade com o contexto passava pela exploração de

tempo e os ultrapassam em escala. Daí a necessidade

afinidades – estruturais, formais, construtivas, materiais

de estabelecer compromissos com a envolvente: as op-

– que tornavam evidente a continuidade estabelecida.

ções de projeto deviam refletir uma leitura crítica do dis-

No limite, podia materializar-se em meticulosos exercíci-

13


PER CURS O S

Reitoria da Universidade de Lisboa 1961

Cadeira em napa Grenat década de 60

os de “design total”, em busca de nexos entre todos os

aprendizagem permanente e mútua, como gostava de

níveis do espaço existencial (projeto de interiores, equi-

sublinhar - com comitentes, arquitetos engenheiros, téc-

pamento e mobiliário, sinalização e grafismos, padrões

nicos, artistas plásticos; mas igualmente com aqueles

de tecidos, uniformes, complementos de decoração...).

que se encarregavam de passar o projeto à realidade: marceneiros, serralheiros, estofadores... “Desenhar em

Em qualquer dos casos, estes procedimentos não im-

contexto” representava também uma particular atenção

plicavam um apagamento contextualista nem signifi-

dispensada ao contexto técnico, cultural e social dos

cavam uma excessiva neutralidade. Pelo contrário, na

agentes envolvidos na produção. O modo, frequente-

obra de Daciano da Costa são abundantes os exem-

mente seguido, de fazer a passagem do desenho ao

plos de móveis que, tendo sido concebidos para um

objecto, em diálogo, permitia que o projeto pudesse ser

contexto bem determinado, revelam suficiente carácter

enriquecido com o “toque de mão” do mestre artesão

para adquirir autonomia e alcançar a produção em sé-

(sobretudo na relação, longamente cultivada, com as

rie, dirigida já a um público mais vasto. (...)

famílias Olaio, Sampaio e Sousa Braga) ou com a marca de uma “cultura da empresa”, sedimentada em longos

(...)Desta atitude decorria também a firme consciência

anos de colaboração (como na irrepetível oficina de pro-

de participar numa construção colectiva - cujo destino

tótipos da Metalúrgica da Longra). (...)

final é a colectividade -, e no qual cada autor é apenas um elo mais que vem somar-se aos restantes. Por isso, certamente, a sua vida profissional foi construída em torno de cumplicidades com todos os participantes no processo. Dos afectos e discursos partilhados com os colaboradores diretos, no atelier, à relação intensa - de

JOÃO PAULO MARTINS

Faculdade de Arquitetura. Universidade Técnica de Lisboa Excertos do texto publicado no catálogo da exposição “Daciano da Costa, Designer” Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001


MobiliĂĄrio Bibliotena Nacional Lisboa - 1965

Centro Cultural de BelĂŠm 1990

15


PER CURS O S

PROCURA-SE

identidade

PROCURA-SE

função

Os objectos utilitários são, numa primeira instância, objectos que ditam o seu uso, que falam por si próprios, e de maneira secundária podem ter outras utilidades, mais ou menos comuns. Se vemos uma cadeira, esta comunica-nos imediatamente a sua função: Podes sentar-te. Mas também podemos utilizar uma cadeira em situações bem diferentes; podemos trancar uma porta, pendurar o casaco, subir para o assento para mudar uma lâmpada ou tantos outros usos. Se bem para todas estas situações existe um objecto próprio (um fecho, uma cruzeta ou um escadote) a cadeira é utilizada habitualmente para outras funções para as quais não foi pensada. Estas são utilizações espontâneas, normalmente colectivas, mas espontâneas. A complexidade da mensagem deste tipo de objectos, os úteis, aumenta paralelamente com o incremento da especificidade para a qual foi concebida.


JAIME SARRÓ DESIGNER

É provável que a muitas pessoas lhes custe reconhecer

tramos uma cadeira de madeira, em perfeito estado, e

como assento uma particular cadeira suíça que se usa

ninguém sentado nela. Podemos pensar: é una cadeira

para o ordenho. Consiste num cinto com uma peque-

de madeira e não está fixa ao chão, portanto não é um

na tábua ao meio e um pau fixo nela. Uma vez atado

elemento urbano, uma cadeira pública; é uma única ca-

o cinto da maneira habitual, temos um banco que nos

deira, não há mesas, não há outras cadeiras, não há um

acompanha a todo o lado durante o ordenho dos ani-

café; alguém que está a meio de uma mudança? Mas

mais. Aumenta a especificidade e aumenta a dificulda-

esse alguém não vai e vem, não aparece. Analisando os

de da mensagem para o ignorante mas, pelo contrário,

dados que a envolvente nos oferece não conseguimos

mantém-se igualmente imediata para o experimentado.

discernir o porquê desta cadeira no meio do nada. O

Existem também situações de uso espontâneo de um

que não sabemos é que a pessoa a pôs ali previamente

objecto que só têm sentido para o seu utilizador. Por

tapou um pequeno buraco no chão com cimento que

exemplo, vamos pela rua e no meio do passeio encon-

ainda está fresco. Esta solução é totalmente eficaz, nin-

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Um coiso é aquilo que não tem identidade, quando a identidade é o facto de uma coisa ser a mesma que é suposta ser.

guém pisará o trabalho realizado, e transmite a mensa-

coisa ser a mesma que é suposto ser ou que se procu-

gem – contorna-me – sem que ninguém seja consciente

ra”, a resposta às anteriores perguntas é afirmativa.

disto, ninguém excepto a pessoa que lá a pôs e que deu a uma cadeira uma utilização diferente da que lhe é própria. No uso natural de um objecto não há lugar a dúvidas, serve para isto e utiliza-se para isto. No uso espontâneo de um objecto o utilizador pega em algo que serve para isto mas usa-o para aquilo. Tudo identificável, concreto. Agora bem, que acontece quan-

Aqui é onde a coisa se converte em coiso. Este projecto procura obter respostas a estas outras perguntas: Pode o designer projectar objectos utilitários que ofereçam soluções espontâneas a possíveis necessidades diferentes e não identificadas?

do um objecto só oferece a possibilidade de utilizações espontâneas? Pode um objecto ser útil, funcional mas

Consegue o utilizador dar identidade a um objec-

não identificável? Carece de identidade por não ter fun-

to carente dela?

ção afixada? Se atendemos à definição de identidade encontramos no dicionário, “Facto de uma pessoa ou

É possível transformar o coiso em coisa?


JAIME SARRÓ DESIGNER

Resultado | Um coiso

Autoria | Design: Jaime Sarró

Produção | Escovaria de Belomonte e MG Maquetas

Ateliers do Porto Ateliers do Porto aparece como uma iniciativa que

Ao abrigo desta iniciativa acontece o encontro entre

promove os encontros entre designers e algumas

design de produto, a antiga técnica de costura ma-

oficinas artesanais e tradicionais que tem subsisti-

nual de escovas, a produção artesanal de moldes de

do até a actualidade na cidade do Porto.

silicone e o vazado de resina.

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REFLE X Ã O

“DEUS ETERNAMENTE GEOMETRIZA… platonismos e desabafos.”

Figura 1

“Que não entre quem não sabe geometria!”

Frase célebre proferida por Platão.

Voltemos a inscrever na entrada das nossas escolas a máxima da academia de Platão! Porém, com uma ligeira variação: que não entre quem não quer saber geometria. Para que só fiquem do lado de fora aqueles que não querem aprender (ou ensinar) a linguagem do espaço. É consensual que a geometria está em toda a parte. A importância da geometria é óbvia e gritante desde os primórdios da civilização e sempre foi utilizada em prol do desenvolvimento da Humanidade. Os argumentos para justificar o interesse da geometria vão dos práticos aos filosóficos, passando pelos científicos e artísticos. Questionar a sua utilidade é daquelas atitudes que considero insensatas (para não dizer estúpidas). Por isso, ao grupo de pessoas que o faz, recomendo que, das duas, uma: ou façam uma reflexão ou não pretendam ser profissionais de áreas que a solicitem. Assim, pelo menos não causam danos! A minha introdução impetuosa é o reflexo da revolta e frustração que sinto, enquanto arquiteta e docente de artes visuais, face à aversão que muitos alunos e colegas têm pela geometria, mais concretamente a descritiva, que nos diz diretamente respeito. No âmbito do design, da arquitetura, assim como de outras artes visuais e algumas engenharias, a geometria estabeleFigura 1 - Deus, Arquiteto do Universo (Bíblia moralizante, Codex Vindobonensis 2554, França, c. 1250, Österreichische Nationalbibliothek

ce a ligação entre a conceção e a representação, é graças a ela que comunicamos com clareza, é graças a ela que somos criadores!


SUSANA BRANDÃO

ARQUITETA E PROFESSORA MESTRANDA EM ENSINO DAS ARTES VISUAIS

É consensual que a geometria está em toda a parte. A importância da geometria é óbvia e gritante desde os primórdios da civilização e sempre foi utilizada em prol do desenvolvimento da Humanidade. Os argumentos para justificar o interesse da geometria vão dos práticos aos filosóficos, passando pelos científicos e artísticos. Questionar a sua utilidade é daquelas atitudes que considero insensatas (para não dizer estúpidas). Por isso, ao grupo de pessoas que o faz, recomendo que, das duas, uma: ou façam uma reflexão ou não pretendam ser profissionais de áreas que a solicitem. Assim, pelo menos não causam danos!

Figura 2 - Sólidos Platónicos (Johannes Kepler, 1596, Mysterium Cosmographicum, Alemanha)

Figura 2

Se o Universo não existisse fisicamente, não teríamos

Proclamam a soberania do desenho mas esquecem-se

espaço onde ser e estar. A noção clássica de espaço

que é a geometria que lhe confere cognição. Não só no

geométrico remonta a Platão que o denomina de khora,

desenho técnico, mas também no livre, no de memória,

“uma espécie difícil e obscura. Que propriedade natural

no de imaginação ou por observação. Nos desenhos

havemos de lhe atribuir? Antes de tudo, esta: ela é o

usamos medidas e proporções, relações espaciais,

recetáculo e, por assim dizer, a mãe de tudo o que nas-

simetrias, ângulos, curvas, superfícies… Recorremos

ce.” (Platão, 1969: 275) Ou seja, Platão considera que

a noções de escala ampliando ou reduzindo. Mais ou

o khora é um vazio, invisível, no qual existem formas e

menos inconscientemente, com mais ou menos rigor,

matéria. Abstrato e indefinido, o khora é o espaço da for-

utilizamos métodos de representação geométrica. Não

mação e criação do Cosmos, onde os quatro elementos

obstante a importância da sensibilidade de um dese-

(água, ar, terra e fogo) se concretizam em formas geo-

nho, só o compreendemos porque a geometria que nele

métricas. Deus (seja ele quem for) representou o Mundo

se manifesta define um contexto ou forma “dominada”.

e o Homem, caso contrário não teríamos passado de

“A geometria num desenho pode não se ver mas foi

mera imaginação.

pensada; ou o desenho visível só foi possível porque

Os criativos, mais concretamente os artistas, especifi-

houve um pensamento matemático ou geométrico, ou

camente os visuais, têm no desenho um meio que ope-

uma intuição desses saberes.” (Vieira, 2007: 19)

ra entre a perceção e a representação, conectando-as.

21


REFLE X Ã O

“ DEUS ETERNAMENTE GEOMETRIZA… platonismos

A geometria é a gramática da linguagem gráfica e os seus conceitos só chegam às artes através do desenho, por isso, não a podemos discriminar ou sonegar. Principalmente nas áreas de projeto, como o design de produto ou a arquitetura, em que o desenho é essencialmente informativo e, por conseguinte, maioritariamente geométrico e praticamente sem expressão.

Figura 3 - Esboços de Phillipe Starck (Castiçal Abbraccio, 2012)

e desabafos. ”

Alguém imagina um designer a descrever uma das suas peças sem perspetivar uma axonometria ou um arquiteto a explicar a disposição de um edifício sem esquissar uma planta? Ainda que possível, é redutor. Acima de tudo interessa perceber que, mais do que dificuldade em comunicar, sem conhecimento e pensamento geométrico é impossível conceber. Tornamo-nos incapazes de racionalizar dados, de articular as funções com as


SUSANA BRANDÃO

ARQUITETA E PROFESSORA MESTRANDA EM ENSINO DAS ARTES VISUAIS

Figura 4 - Esquiços de Siza Vieira (Casa Armando Barbosa, 1996)

relações e de detetar e organizar interações e depen-

torna a falta de conhecimento geométrico cíclica e com

dências. Só o restabelecimento do interesse pela ge-

consequências negativas, sejam na prática pedagógica

ometria nas artes projetuais pode salvar a inteligência

e nas estratégias didáticas do docente, como ao nível

criativa.

da motivação, desempenho e aproveitamento do aluno.

Os motivos deste triste fracasso são muitos e variados…

E depois há o argumento que os computadores subs-

Há uma cisão notória entre a geometria teórica (vinda da

tituem a geometria descritiva e o desenho geométrico!

matemática) e a prática (associada ao projeto). O ensi-

Concordo totalmente que a informática potenciou mui-

no/aprendizagem da geometria ao longo dos primeiros

to as possibilidades e recursos de visualização e rigor,

ciclos escolares não é adequada ao futuro estudante

mas não podemos passar a representar e a controlar

de geometria descritiva. Nos programas curriculares da

graficamente através de programas CAD, fingindo que

disciplina não é contemplado um enquadramento nas

a geometria não é o conhecimento base das imagens

atividades artísticas e projetuais. Além disso a aversão

geradas. Com o CAD operamos mais diretamente sobre

afeta não só os alunos, mas também professores, o que

os objetos, mas se não houver a consciência dos mé-

23


REFLE X Ã O

“ DEUS ETERNAMENTE GEOMETRIZA… platonismos

e desabafos. ”

Figura 5 - Estampa de livro didático de Desenho - interseção de sólidos (C.A. Marques Leitão, 1909, Desenho, Lisboa: Fernandes e Comp.ª Editores)

Figura 6 - Modelos tridimensionais de livro didático de Desenho - interseção de sólidos (C.A. Marques Leitão, 1909, Desenho, Lisboa: Fernandes e Comp.ª Editores)

todos de representação intrínsecos mas dissimulados

Uma ação do sujeito sobre o meio, devidamente inte-

nestas ferramentas, provocam-se sérios malefícios na

riorizada e organizada, desencadeia um processo evo-

forma como o sujeito de relaciona com o espaço, tanto

lutivo de estruturas lógicas que permitem evoluir nos

pessoal, como profissionalmente.

patamares do conhecimento, passar do concreto para

Por tudo isto retorno a Platão! Pela paixão com que es-

o abstrato. Sou uma geómetra platónica que acredita

tudou a geometria e a ela se dedicou. Não que tenha

que a geometria está na fronteira entre o sensível e o

descoberto novos métodos e teorias, mas despertou

inteligível, faz a ponte, é a conexão entre os dois mun-

curiosidades, foi inspirador e teve papel de guia para

dos. «Metade do caminho entre opinião e intelecto (hós

muitos jovens matemáticos. Na República Platão faz Só-

metaxú tes doxés te kaì nou tén diánoian)” (Platão, 1987:

crates afirmar, em relação à matemática e à geometria:

511d). O tipo de pensamento e as competências ineren-

“Sobretudo por costume (éthos) as chamamos com fre-

tes ao conhecimento geométrico têm por base um saber

quência de ciências (epistéme), mas é necessária outra

ativo no qual importa associar os sistemas cognitivos e

denominação, mais clara que opinião e mais obscura

a construção do saber. A aprendizagem resulta da in-

que ciência: nesse sentido antes a definimos como en-

terpretação e entendimento da informação envolvida,

tendimento (diánoia).” (Platão, 1987: 533d 1)

capaz de gerar soluções baseadas na reflexão.


SUSANA BRANDÃO

ARQUITETA E PROFESSORA MESTRANDA EM ENSINO DAS ARTES VISUAIS

“Deus eternamente geometriza.” Nas montanhas, nas nuvens, nas plantas, nos organismos, nos rios, nos mares, nas florestas… Mas o Homem está a parar de o fazer. Sem imaginação, sem invenção, sem inteligência criativa, voltamos a ser meros animais desprovidos de alma e espírito. O Criador persistirá, o planeta perdurará, mas a Humanidade, conforme a conhecemos, desvanecerá.

Bibliografia: _Platão, (1969), Diálogos IV: Sofista, Político, Filebo, Timeu, Crítias. Col. Livros de bolso Europa-América, 403, Lisboa: Publicações Europa América (obra original séc. 361-347 a.C.) _Platão, (1987), A República. (Pereira, M., trad.), 5ª ed., Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, (obra original séc. IV a.C.) Saffrey, H., (1968), “Ageômetrètos mèdeis eisitô: une inscription légendaire”, Revue des Études Grecques. 81, 67-87. _Vieira, J., (2007), “O desenho da Geometria é a geometria do desenho”, Boletim da Aproged. 26 (março), 15-21.

25


R EFLE X Ã O

Ainda que com uma origem comum, Design e Arte parecem cada vez mais afastados. A incorporação de funções simbólicas e retóricas emocionais nos artefactos do design ao longo dos anos oitenta — com as propostas de “anti-design” editadas pela Memphis, pela Alchymia ou mesmo por Starck_, parecem afastar ainda mais o design ornamental (estetizante) da função estética da arte contemporânea. Ainda que a Documenta de Kassel tenha eleito, na mesma época, o Design à dimensão da Arte, convidando-o a participar na celebração artística da exposição, perguntar-nos-emos: — Que relação terão os trocadilhos de um Starck com as metáforas de Beuys? Beuys também recorre a objectos, a instrumentos (trenós, garrafas, cadeira, vitrines, feltro, blocos de pedra, gordura, cera, mel, animais mortos e vivos), mas os seus objectos não estão indisponíveis ao uso — são mais para meditar (contemplar) do que para trabalhar. Design e Arte opõem-se mesmo nas suas intenções. Se o Design procura a maior integração funcional, a Arte tem o propósito da maior resistência à reificação hegemónica da máquina, ainda que ambas subsistam sob o mesmo paradigma da liberdade. A liberdade, a procura da liberdade, une os propósitos do design e da arte, mas as suas metodologias e convicções afastam-nas; o que o design tem de criativo, deve-o à arte, sua ancestral, encontrando na poética o motivo da sua renovada criatividade, não só como retórica, mas como processo e reper-


FRANCISCO PROVIDÊNCIA DESIGNER

A B e l e z a PRODUZ MAIS

(na cultura material)

Justiça Social?

tório. Arte e Design partilham o radical poético comum

jecto culmina na construção que devolverá sentido ao

_ no gr. poiés ou “eclosão”, é origem de toda a criação.

esforço empregue; a arquitectura é uma imposição físi-

A Arte é o futuro do design; mas Arte e Design são radi-

ca. Para Lapa, a relevância do acto artístico não consis-

calmente distintos.

te no produto material, resíduo da experiência vivêncial

Embora contrariando a tradição (pseudo) científica da

que lhe deu origem. Os “festins da consciência” são

Escola de Ulm, não poucas vezes o design prescinde

momentos de felicidade e revelação, estados de ilumi-

da sua utilidade prática e programada, para se imiscuir

nação (budista), possibilidade última de redenção da

entre as coisas inúteis da Arte _ Fernando Brízio tem

consciência pela beleza, abertura a uma estética que

sido o nosso mais divulgado caso. No entanto, a singu-

não se exclui nos sentidos, mas que ganha uma dimen-

laridade identitária do design tem no compromisso en-

são outra, do espiritual ou do intelectual. A arquitectura

tre uma autoria, uma tecnologia e um programa, a sua

também pode ser bela, como denuncia Jorge Figueira

maior diferença em relação à Arte que, modernamente,

comentando a mais recente obra de Souto Moura: “o

prescindiu do programa imposto, para se entregar toda

metro do Porto não receia, mas ambiciona, ser Belo”.

desinteressada e genuína à fruição dos seus públicos.

O que procura a Arte? A recuperação de um estado de

Mas há na tradição artística diferentes modos criativos.

beleza que talvez nunca tenha existido; a invenção da

A Arte é umas vezes máquina de efeitos emocionais,

beleza enquanto estado, não como objecto. Um estado

outras vezes vestígio emocionado da existência.

catalítico de percepção sobre a realidade, capaz de envolver e comover os indivíduos, assim revelando o novo

Siza, como Lapa, denunciam a urgência das suas obras como domínios próprios de liberdade. Para Siza o pro-

e o futuro.

27


REFLE X Ã O

A BELEZA (na cultura material) PRODUZ MAIS JUSTIÇA SOCIAL?

O propósito da beleza está presente tanto no Design (arquitectura de Siza) como na Arte (pintura de Lapa); mas no primeiro (parece) reportar-se-á à ideia de eficácia (bom funcionamento, organicidade, complementaridade com o homem, prótese), na segunda é construção nostálgica motivada por um estado de carência que nasce do confronto com a imperfeição.

Se um busca a construção física como condição de re-

que nunca como hoje a consciência pareça merecer tão

alização, para o outro a construção física é o que so-

pouco interesse).

beja. Se o design busca a perfeição da regularidade funcional, a arte procura a felicidade da existência, a

De que serve ao design fenómenos artísticos como a

perfeição da vida — um artista não é um especialista

pintura de Álvaro Lapa? A pintura de Lapa, entre outras,

em arte, mas um especialista em vida, um especialista

constitui um importante recurso ético sobre a forma.

em re-inventar a vida, ou comprometerá o seu desígnio.

A “forma” é conteúdo de verdade das obras de arte,

A arte opera na alma (lat. anima, “vida”), o design opera

dizia Adorno. Uma pintura que não se substitui à vida,

no corpo (lat. corpu, “corpo”; gr. sôma, “corpo”). Mas

nem a representa, mas serve-a como meio de auto-

não havendo corpo sem vida, cabe ao design reflectir

-conhecimento, como meditação zen (digo eu)— como

sobre o fim último dos seus projectos sobre o corpo. Por

percepção do “estado acerca de mim próprio (…) limiar

isso a Arte dá glória a Deus e o Design julga ajudar os

de um espaço íntimo onde me reconheço “livre”, como

homens.

escreveu o pintor no catálogo da exposição da EMI V.C.

Se, por absurdo, a Arte fosse substituída pelo De-

(1985). A pintura de Lapa que é para Pinharanda lingua-

sign, o homem acabaria submerso pela tecnologia,

gem (o que Lapa faz são “escritas visuais”, ideogramas,

reduzido à dimensão de dispositivo apto / inapto.

sempre em recomposição e remontagem), e para José

Faz falta a Arte ao Design. Ao reflectir sobre as suas

Gil não-linguagem (idiolecto aberto, campo sintáctico

razões primeiras, o design no séc. XXI é convocado a

aberto à dimensão do universo), constitui o lugar da ten-

entorpecer menos os seus utilizadores com as suas má-

tativa e do falhanço (artista é aquele que ousa falhar),

quinas de in-satisfação, para actuar como catalisador

de um conhecimento tão subjectivo quanto universalista;

do mundo, contribuinte atento para a consciencializa-

pudessem os artefactos do design questionar a liberda-

ção do indivíduo sobre si próprio e sobre o meio (ainda

de e dignidade dos seus autores, para se tornarem mais


FRANCISCO PROVIDÊNCIA DESIGNER

fundamentais, “a captar o sinal-mensagem que vem do

público consumidor. Desta estética da relação (mais

futuro” . Se A. Calvera denuncia o mau desenho como

ética?) poderá nascer uma nova estética do design,

negação de inovação, Fátima Pombo defende que só o

mais humanizada que as propostas massificadoras

erro fará inovar o desenho.

dos anos setenta, menos alienante que as decora-

“Temos a arte, dizia Nietzsche, para não morrer ou en-

tivas dos anos oitenta, mais ecológicas que as dos

louquecer perante a verdade, portanto não temos a

anos noventa, mas menos tecnológicas que as da

verdade, temos a arte para não enlouquecer” . Talvez

primeira década do séc. XXI (sobre a suposta arte di-

resida aqui a impossibilidade científica das coisas ar-

gital diria que há a Arte e há as novas tecnologias digi-

tísticas.

tais do multimédia interactivo e entre elas não há nada, se não puros acasos circunstanciais de encontros aci-

“O ser, diz José Matoso , é o encontro do acidental —

dentais, como se poderá dizer, aliás, da relação entre o

nós — com o absoluto” (…) e a experiência da beleza

óleo de linhaça e a arte).

é exactamente isso (…) não é possível ter um discurso

Só deste modo poético, catalisador e experiencial,

racional. Só a linguagem poética dá conta dessa vivência. O poema “Noite escura” de S. João da Cruz, não é literatura, é uma experiência pessoal”. Uma experiência pessoal que se dá à troca, que moldará a forma subjec-

o Design poderá constituir-se concorrente da Arte, ainda que, arriscando-se perder papel na funcionalização social do mundo.

tiva e justa. O grande desafio que se coloca hoje ao design, não é na conformação estética, mas na estética das relações que possa estabelecer com o outro, com o

Autores referidos: Álvaro Lapa, Álvaro Siza, Fernando Brízio, Friedrich Nietzsche, João da Cruz, João Pinharanda, José Gil, José Matoso, Joseph Beuys, Phillippe Starck.

29


REFLE X Ã O

DESIGN DE INTERIORES A cultura do habitar é o principal fundamento a partir do qual se estruturam a arquitectura e o design de interiores. Esta reflecte a

forma como nos relacionamos com o nosso envolvente, com o tempo e o

espaço. Reflecte também a cultura material de cada um, construída ao longo de gerações, com as múltiplas implicações produzidas pelo contexto no qual está inserido quem habita e quem projecta. Por esta razão, o projectista de interiores tem de considerar múltiplos campos disciplinares, mas tem, sobretudo, de estar particularmente atento aos condicionamentos de ordem social, económica, política e antropológica da sociedade contemporânea.

O design de interiores é uma disciplina recente em Por-

ciais fixas e definitivas a um sistema de partições mais

tugal, caracterizada por um forte condicionamento dis-

efémero e móvel, até mais flexível, concebido a partir

ciplinar vindo da arquitectura e pela quase inexistência

de mobiliário e de objectos que, pela escala ou pela

de uma tradição culturalmente sólida do design indus-

sua repetição, se tornam dispositivos espaciais, instru-

trial. De facto, o design de interiores é uma disciplina

mentos de manipulação e de construção do espaço. O

que nasce do cruzamento entre arquitectura e design.

design de interiores, como disciplina de fronteira, tem

E é o design que, na maioria dos países europeus, tem

sido objecto de diversos equívocos e de uma falta de

contribuído para o desenvolvimento de uma ideia de

definição ou unívoca caracterização disciplinar. Mas

espaço constituído não só pela arquitectura tradicional,

o que parece ser a sua limitação acaba por ser o seu

pela construção e pela tectónica das formas, mas

maior recurso.

também pelos objectos e pelo mobiliário, testemunhos

Não ficando amarrada a definições disciplinares,

mais directos da cultura material do habitante, da sua

consegue deambular entre vários âmbitos, servindo-

forma de habitar. Assim, passa-se de uma ideia de es-

se de um ou de outro, em função do contexto de cada

paço concebido a partir de paredes e partições espa-

projecto, utilizando todos os inputs como elementos


MARIA MILANO

ARQUITETA COORDENADORA DO MESTRADO EM DESIGN DE INTERIORES ESCOLA SUPERIOR DE ARTES E DESIGN - MATOSINHOS

catalisadores e impulsionadores da ideia de projecto.

têm tendência a tornarem-se mutáveis, dinâmicos e

A denominação design de interiores valoriza o design

flexíveis. Trabalhar no comboio, comer na rua, dormir

enquanto disciplina aglutinadora de diversos saberes

no autocarro, telefonar na casa de banho, tomar duche

que informam o projecto.

no escritório, lavar as roupas no café e, vice-versa,

Design é, pois, a palavra que melhor denuncia

tomar o café nas lavandarias são disso exemplo. Deste

uma visão global do projecto que promove a dimensão não especialista mas inter-especialista da arquitectura e dos interiores.

modo, é inevitável, por um lado, uma cultura de projecto que valorize o espaço colectivo “público”, capaz de catalisar momentos de encontro e socialização e processos de identificação entre os habitantes e a sua

A sociedade contemporânea é, cada vez mais, uma

cidade; por outro, uma forma mentis projectual que

sociedade fluida e difusa, organizada em função da

privilegie a “compactação” das cidades face à sua

mobilidade e inter-conectada a uma rede de infra-

difusão, através do re-uso e reabilitação do património

estruturas para a mobilidade física e virtual. Con-

construído, hoje grande recurso de materiais, marcas e

sequentemente, as acções e os comportamentos

história para o projectista.

31


REFLE X Ã O

DESIGN DE INTERIORES

A principal característica de um designer de interiores,

nando uma qualidade do habitar baseada no gosto e

a qual o diferencia de outros projectistas, é o facto de,

no prazer de viver e habitar. Assim, a formação de um

na maior parte dos casos, operar dentro de um espaço

designer de interiores deve valorizar a interpretação

pré-existente. Pode ser um monumento ou uma arqui-

da cidade contemporânea, com os estilos de vida que

tectura anónima, um edifício qualificado do ponto de

a caracterizam; a aplicação de conceitos de flexibili-

vista arquitectónico ou o resultado de um gradual e

dade, entendida como a “disponibilidade” do espaço

progressivo processo de adição espontânea. O de-

para se adequar a diversas exigências de modalidade

signer de interiores tem a capacidade de valorizar as

de habitar; o uso de mobiliário como dispositivo espa-

características mais relevantes de um espaço, desco-

cial; o estilo de vida e as exigências do futuro “mora-

brindo-lhe a vocação e a capacidade de se adequar a

dor”; uma relação do projecto com a preexistência que

novos programas, novas exigências, novos habitantes.

tenda a recuperar o mais possível o tecido construído

É capaz de interpretar as exigências do futuro habit-

e os desperdícios da nossa cultura material e material-

ante do espaço projectado, definindo as características

ista, reintegrando-os no novo habitat e impulsionando

físicas e funcionais do espaço, mas contemporanea-

uma abordagem mais sustentável da arquitectura e do

mente as suas características relacionais e percepti-

design.

vas, valorizando a luz, a cor e os materiais e proporcio-


MARIA MILANO

ARQUITETA COORDENADORA DO MESTRADO EM DESIGN DE INTERIORES ESCOLA SUPERIOR DE ARTES E DESIGN - MATOSINHOS

MARIA MILANO CURRICULUM VITAE

Doutoranda em “Materiais sustentáveis para a arquitectura” na Faculdade de Engenharia Mecânica da Universidade de Aveiro. Mestre em Projecto do Ambiente Urbano, pela FAUP, Faculdade de Arquitectura do Porto e FEUP, Faculdade de Engenharia do Porto, com tese intitulada “Os lugares da mobilidade. Uma nova dimensão do espaço público contemporâneo”, orientada pelo Prof. Arq. Nuno Portas e Prof. Álvaro Domingues, em 2001. Licenciada em Arquitectura, pela Università degli Studi di Palermo (Itália), com tese de projecto orientada pelo Arq. Eduardo Souto de Moura e pelo Arq. Prof. Roberto Collovà, em 1996. Directora da Pós-Graduação em Arquitectura e Habitar Sustentável 2010/11, na ESAD. Coordenadora do Mestrado em Design de Interiores desde 2009. Coordenadora do Curso de Design de Interiores na ESAD, de 2001 até 2009. Docente da cadeira de Design de Interiores na ESAD, desde 1996. Autora de diversos artigos de crítica do Design e da Arquitectura, publicados em revistas especializadas nacionais e internacionais; Coordenadora do livro Do Habitar, Edições ESAD, Matosinhos 2005; Coordenadora do livro O projecto de Interiores, Edições ESAD/RAR Imobiliária, Matosinhos 2008. Autora do livro Paolo Deganello. As razões do meu projecto radical, Edições ESAD, Matosinhos, 2009. Autora de vários projectos de Arquitectura e Design. Curadora da colecção Arquitectos Portugueses, ed. Quid Novi, Matosinhos, 2011, distribuída pelo Jornal Público. Autora da monografia José Gigante, Ed. Quid Novi, Matosinhos, 2011, distribuída pelo Jornal Público.

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REFLE X Ã O

JORNADAS DO PRODUTO As jornadas do produto assumem-se como uma forma privilegiada de dinamizar e enriquecer o ensino do Design de Produto na Escola Artística Soares dos Reis. Quando assumimos dinamizar as jornadas, o nosso primeiro objetivo foi o de divulgar o trabalho de profissionais, que tenham contribuído para a qualificação do design em Portugal e no estrangeiro. Como objetivo último pretendia-se que o contacto com estes profissionais desse aos nossos alunos a oportunidade de alargarem os seus horizontes, de diversificarem o seu leque de conhecimentos e aprendizagens, de contactarem com diferentes metodologias de trabalho, de aumentarem a sua cultura de design e de os aproximar de uma realidade que poderá constituir o seu possível devir. Em 2011 propusemo-nos realizar um ciclo de conferências que focalizassem as quatro especializações do curso de design de produto. Estabelecemos que este ciclo teria a duração de dois anos letivos. Desta forma, em 2011 começámos pelas especializações de equipamento e joalharia e em 2012 concluímos o ciclo com cerâmica e têxteis.


MARTA CRUZ | MICAELA REIS | SUSANA AFONSO PROFESSORAS DE PROJETO E TENCOLOGIAS CURSO DE DESIGN DE PRODUTO DA EASR

A escolha dos convidados pareceu-nos que devia ser feita de forma cuidadosa. Deveriam, por um lado ser designers ou empresas que possuíssem obra marcante e de referência quer no mercado nacional quer internacional, e por outro lado, deveriam possuir processos de trabalho suficientemente ricos e diversificados. Porque as jornadas são feitas essencialmente para os alunos era fundamental que tivessem uma vertente pedagógica e como tal, quando fizemos os contactos, pedimos aos designers que relatassem o seu processo de trabalho desde o aparecimento da primeira ideia até à concretização do objeto. Pretendíamos também perceber como se conseguiram afirmar num mercado internacional tão competitivo. Por esta razão, resolvemos atribuir a este ciclo de conferências o nome de Percursos. Percurso da ideia.., percurso do objeto..., percurso do designer… Assim, as opções centraram-se: na marca de mobiliário Boca de Lobo, do grupo Menina Design, que já foi distinguida com vários prémios de design como

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REFLE X Ã O

JORNADAS DO PRODUTO

“Best Product Design 2010” pela revista JulyB (EUA) e

A Boca de Lobo foi representada pelo designer Marco

pela agência de tendências Nelly Rodi em 2009 e 2010;

Costa. A obra produzida pela empresa caracteriza-se

na designer de joalharia Liliana Guerreiro que ganhou

pela valorização e recurso das técnicas tradicionais

vários prémios nos concursos de artesanato tradicional

(ourivesaria, talha, metal, pintura de azulejo, trabalho de

e contêmporaneo da FIA, assim como o concurso inter-

vidro e vernizes alto brilho) adaptando-as a uma lingua-

nacional de filigrana da Câmara Municipal de Póvoa do

gem contemporânea. Na sua intervenção Marco Costa

Lanhoso; na empresa têxtil NGwear que tem desenvolvi-

descreveu a metodologia de trabalho da marca desde

do um trabalho louvável na área dos tecidos inteligentes

a sua conceção, à produção passando pelo estudo e

e no designer de produto Fernando Brízio, considerado

posição no mercado.

um dos melhores designers portugueses da atualidade com trabalho desenvolvido para Droog Design, Schre-

A designer Liliana Guerreiro, licenciada pela ESAD de

der, ExperimentaDesign, Fábrica Rafael Bordallo Pinhei-

Matosinhos, fez uma abordagem a toda a sua obra as-

ro e representado em museus como o Mude e o Moma.

sim como ao processo de trabalho que a envolve. O seu trabalho tem uma vertente fortemente ligada à técnica

Em 17 de Março de 2011 demos início à primeira sessão

tradicional da filigrana. No entanto, as suas peças liber-

com a Boca de Lobo e Liliana Guerreiro e em 17 de Abril

tam-se dos cânones tradicionais e adaptam-se a uma

de 2012 o ciclo foi concluído com a NGwear e Fernando

linguagem que já é a sua e em que, o círculo é a forma

Brízio.

de eleição.


MARTA CRUZ | MICAELA REIS | SUSANA AFONSO PROFESSORAS DE PROJETO E TENCOLOGIAS CURSO DE DESIGN DE PRODUTO DA EASR

NGwear é uma empresa vocacionada para a área têx-

mor continuamente presente. Uma parte relevante do

til e de vestuário. As atividades da empresa são a pro-

seu trabalho, deixa em aberto uma possível mutação

dução de vestuário técnico em malha, com ênfase nas

gerada por diversos fatores tanto ambientais como hu-

características repelentes, anti-UV e termo-cromáticas.

manos. Como ele próprio afirma (…) os designers são

Desenvolve artigos em parceria com o CITEVE (Centro

quase como coreógrafos do nosso dia a dia, pelo modo

Tecnológico das Indústrias Têxtil e do Vestuário de Por-

como a forma dos objetos condicionam os gestos na

tugal) e com o Instituto de Higiene e Medicina Tropical

sua utilização. Na sua intervenção percebe-se também

da Universidade Nova de Lisboa.

a grande importância que atribui à dimensão simbólica dos objetos.

O designer Fernando Brízio fez uma abordagem geral a todo o seu trabalho e focou mais em pormenor, como

Resta-nos agradecer a todos os que estiveram presen-

lhe tínhamos pedido, o trabalho realizado na área da ce-

tes e tornaram estas jornadas possíveis e realçamos o

râmica. Licenciado em design de Produto pela FBAUL é

agradecimento à Mariana Rego pela colaboração pres-

atualmente um dos designers nacionais mais reconhe-

tada.

cido a nível internacional. A sua obra passa por áreas distintas como a cerâmica, têxteis, mobiliário, interiores e joalharia. A sua obra caracteriza-se por uma grande simplicidade formal conjugada com um sentido de hu-

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R EFLE X Ã O

Ao visitar a rua Miguel Bombarda e as artérias adjacentes encontramos sinais de um processo de revitalização interna da cidade do Porto. Este despontar e crescimento de espaços/projetos de arte, moda e vida urbana assenta diretamente na produção artística e de design de uma comunidade de autores maioritariamente locais e nacionais que anseiam mostrar e partilhar o seu trabalho, intervindo, de forma qualificada, na esfera cultural e social da cidade. Percebe-se que há agentes criativos e há públicos com uma escala capaz de gerar correntes sociais e de, em consequência, atrair corporações e outras entidades patrocinadoras que procuram a boleia desta “marca” emergente. Não se está aqui perante um fruto de uma estratégia planificada e centralizada, antes pelo contrário. Temos um movimento cosmopolita, impulsionado pelas elites que, organicamente, se organizam para agitar o panorama cultural da cidade e marcar a sua face. Em simultâneo, no centro histórico da cidade do Porto, a par de um lento progresso na recuperação urbana de iniciativa municipal, assiste-se à abertura de espaços de associam a natureza comercial a uma faceta cultural na qual o design cerâmico, têxtil, joalharia e de equipamento pontuam. Parece emergir uma alternativa à oferta de objetos do asfixiante universo da produção massificada que, há algum tempo atrás, era hegemónico e que, ainda assim, continua


ARTUR GONÇALVES

DIRETOR DE CURSO DE DESIGN DE PRODUTO PROFESSOR DE PROJETO

DAR GÁS AOD E S I G N a ser dominante. Afirmam-se nesta vaga renovadora vá-

são de voluntarismos dispersos, a mudança em causa

rias perspetivas de oferta que vão desde o mundo dos

é uma questão de sobrevivência. Economistas e soció-

objetos de saudade, onde há uma recuperação pura e

logos, refletindo sobre as sociedades urbanas contem-

simples de produtos e marcas portuguesas de meados

porâneas, alertam para a insustentabilidade do modelo

do século XX, apelativos num contexto de enfraqueci-

pós-industrial que remete para a dependência energéti-

mento das memórias, passando pelo novo e delicado

ca, alimentar e da generalidade dos bens e para o res-

artesanato urbano e não só, o chamado “craft”, movi-

petivo desperdício. A fobia industrial das cidades nas

mento ecológico com raízes nas culturas locais que se

décadas finais do século anterior, aliada ao processo

difundiu nas cidades centro-europeias, até à ampla pro-

de deslocalização, acelerou o esvaziamento produtivo

dução de design erudito, que apela a uma especial sín-

das cidades, deixando-as reféns de uma economia ter-

tese de valores de identidade/poética e modernidade/

ciarizada, financeira e centralizada. “Local dollars, local

racionalidade, sem esquecer o reforço dos espaços que

sense” é a expressão lançada por autores americanos

remetem para o objeto usado, para o retorno do bric-à-

que pretende resumir o sentido da mudança necessária,

-brac, uma reafirmação da intemporalidade das coisas

ou seja, colocar a ênfase na produção local, ampliar a

com qualidade.

autonomia em todos os setores económicos para gerir o processo com mais proximidade e assim fortalecer a

A realidade que emerge do que atrás ficou descrito não

estrutura social, o sentido comunitário, a segurança e a

é exclusiva da cidade do Porto. Por todas as cidades

qualidade do ambiente.

do mundo ocidental chegam sinais de reafirmação da energia criativa das pessoas. Mais do que uma expres-

39


R EFLE X Ã O

DAR GÁS AO DESIGN

1

2

Há portanto que reconhecer a importância do renasci-

nas vocações do ambiente físico e na disponibilidade

mento urbano e as potencialidades deste modelo num

de matérias-primas aí encontradas.

processo de equilíbrio orgânico estre as cidades e o território a que pertencem. Há que olhar para esse território

Mais do que a mera arqueologia das estruturas indus-

físico e cultural e ver onde estão os recursos a partir dos

triais arruinadas do passado, o tempo é para repor a

quais se construa uma economia com sentido para as

máquina em ação. Este é um tempo especialmente

comunidades.

desafiador para o mundo do Design. Paul Ricoeur, no seu livro de 1961, Civilização Universal e Culturas Na-

O caso da cidade do Porto é claro. As mudanças es-

cionais, tecia uma crítica ao modelo uniformizador do

tão a começar. Um processo idêntico está a germinar

modernismo, apresentando uma via alternativa entre a

em todas as cidades onde as pessoas intervêm com o

marcha triunfante da civilização universal e o conserva-

objetivo de retomar o controlo sobre a gestão e o de-

dorismo da cultura vernacular. Era a via do “crepúsculo

senvolvimento das suas comunidades. Os ativos de que

do dogmatismo e o amanhecer do autêntico diálogo”

dispõem estão, em primeiro lugar, nas pessoas, nos

entre estes mundos. Creio que estamos num momento

seus saberes e valores, na riqueza e diversidade do

em que é imperativo perceber esta questão, participan-

património invejável legado pelas gerações anteriores,

do e dinamizando projetos em que, na formulação dos


ARTUR GONÇALVES

DIRETOR DE CURSO DE DESIGN DE PRODUTO PROFESSOR DE PROJETO

3 problemas, se consideram as dimensões local e universal, num processo de individualização e contextualização que não pode nunca deixar de estar primordialmente ligado ao desenvolvimento global. Observando o caso da rua Miguel Bombarda, a rua das galerias, a comunidade ligada ao Design poderá aí encontrar matéria para basear uma estratégia de mobilização das cidades que, estabelecendo redes entre si mesma e as áreas afins da arquitetura e do urbanismo, criando pontes com a estrutura produtiva e comercial existente, envolvendo os críticos e os meios de comunicação social, de forma a, no difícil contexto atual, cumprir o seu papel fundamental de facilitar e dar significado à vida das comunidades.

LEGENDA

1

Grandes Armazéns Nascimento, fotografia de Teófilo Rêgo, 1953, projeto do arquiteto Marques da Silva, concluído em 1927. Os Armazéns Nascimento eram uma importante firma de mobiliário que, no início do século XX e seguindo as lógicas da produção industrial, abasteciam a cidade do Porto e a região Norte do país.

2

Grandes Armazéns Nascimento, pormenor de interior, fotografia de Teófilo Rêgo, 1953.

3

Ruínas da “Fábrica do Gás”, unidade industrial que garantiu o fornecimento deste produto à cidade do Porto, localizada na marginal do rio Douro.

41


R EFLE X Ã O

COMENIUS um projeto sem fronteiras

Jan Amos Komensk - Comenius, nasce a 28 de março de 1592, na Morávia, região da Europa Central, que corresponde hoje à atual República Checa, foi o criador da Didática Moderna e filósofo do século XVII. Concebeu uma teoria humanista e espiritualista da formação do homem assente no desenvolvimento do raciocínio lógico e do espírito científico, na formação do homem religioso, social, político, racional, afetivo e moral. Comenius dá enfase ao respeito pelo estágio de desenvolvimento do jovem no processo de aprendizagem, na construção do conhecimento através da experiência, da observação e da ação. Defendia o conceito de que “as escolas têm de se abrir ao mundo exterior”. Comenius, empresta o seu nome a esta Acção da União Europeia - Ao(s) Projecto(s) Comenius. Face à mudança de paradigma exigido por um mundo cada vez mais globalizado, onde o conceito de distância se relativizou, mas, ao mesmo tempo, o risco de exclusão se acentuou, a educação defronta-se hoje com desafios e propostas pedagógicas, como é o caso dos projetos de parcerias multilaterais “Comenius”, capazes de constituir uma mais-valia no processo de ensino e aprendizagem, particularmente no ensino secundário e numa escola pública especializada no ensino artístico que acolhe muitos alunos de diferentes origens, com variadas capacidades e diferentes níveis de conhecimentos. De facto, a mudança, situa-se precisamente na proposta de construção de projetos curriculares que tornem possível a (re)construção do currículo em face das dificuldades diagnosticadas. Vivemos num tempo em que a colaboração interdisciplinar europeia é exigida pela compreensão de que um novo mundo em rápida transformação exige também novas abordagens das temáticas curriculares e uma partilha de conhecimentos premente.


MADALENA MENESES

PROFESSORA DE JOALHARIA CURSO DE DESIGN DE PRODUTO DA EASR

A internacionalização do ensino e a relevância dos Projectos Comenius

Enquanto Coordenadora deste Projeto, na área da Ouri-

aula, gera a motivação para a aprendizagem das lín-

vesaria/Joalharia da EASR, com frequência sou interpe-

guas estrangeiras e um aumento significativo do empe-

lada face aos motivos que me levam a querer aumentar

nho na abordagem das matérias e conteúdos curricula-

a já “pesada” carga de tarefas a que me exige a escola.

res da disciplina de Projeto e Tecnologias, com especial

É inegável que o envolvimento em projetos deste cariz

enfoque na área da Ourivesaria/ Joalharia.

implica trabalho. Contudo, e apesar dos constrangimentos existentes no ensino em geral e no secundário em

Relativamente às mobilidades de alunos, que se têm

particular, onde habita uma lógica curricular organiza-

vindo a realizar, a sensibilização para a nova realidade

cional e de gestão rígida, que passa pelo pragmatis-

europeia e integração desta em projetos artísticos as-

mo do funcionamento da própria escola-espaço físico,

sociados à produção de ourivesaria/joalharia (períodos

até à obrigatoriedade de cumprimento dos programas

de formação em escolas parceiras, prosseguimento de

existentes, procuro, contornar esses condicionalismos e

estudos, participação em exposições e concursos euro-

implementar metodologias pedagógicas que potenciem

peus, etc.), assim como o contacto direto entre alunos

junto dos alunos o desejo e vontade de se envolverem

de realidades culturais diferentes, contribuem para uma

no seu próprio processo de aprendizagem. Outro dos

maior valorização da sua identidade e cumulativamente

motivos que me leva há já alguns anos, a apresentar

potenciam uma aproximação à construção de uma iden-

a candidatura a este tipo de projetos subjaze na falta

tidade e partilha de conhecimentos de dimensão euro-

de oportunidades que os nossos alunos têm para de-

peia, para além do desenvolvimento de competências

senvolver projetos conjuntamente com jovens de cul-

de estudo, socialização, comunicação e interação.

tura e língua diferentes, aplicando, num universo mais abrangente e mais cativante, o que lhes é ensinado nas

Ao longo dos anos, tenho vindo a constatar que os alu-

aulas de língua estrangeira e nas disciplinas de Projeto

nos assinalam como pontos fortes do seu envolvimento

e Tecnologias, Desenho; Físico-química aplicada às Ar-

em projetos desta natureza, o aumento da motivação, da

tes, etc.

capacidade de autorregulação da sua aprendizagem e do seu aproveitamento, na verdade, esse aumento de

A consciencialização de alunos e professores para uma

motivação provem, não só da variedade de estratégias,

realidade comunicativa diferente do contexto de sala de

técnicas e materiais usados, mas também do “poder”

43


R EFLE X Ã O

COMENIUS, UM PROJETO SEM FRONTEIRAS

que o aluno sente possuir quando lhe é dada a possibilidade e a responsabilidade de regular a sua própria aprendizagem. Para os professores envolvidos, a mais-valia reside na planificação e gestão conjunta de projetos, na qual se partilham novas metodologias e pedagogias de ensino. Permite ainda comparar sistemas de educação e de organização curricular e escolares diferentes que conduzem à inovação pedagógica. Além disso e em conjunto, alunos e professores desfrutam de experiências culturais que contribuem para o seu desenvolvimento enquanto indivíduos capazes de aprender com os outros e de conviver de forma mais positiva com a diversidade e a diferença. Para a Escola, a participação em projetos desta índole remete para uma visão, da e sobre a escola, a qual passa a ser vista como veículo de conhecimento científico, artístico e cultural, importante para a formação integral e social dos alunos e cujas aprendizagens passam a fazer sentido para a construção de projetos de vida dos nossos jovens num contexto de cidadania Europeia. Permite ainda à escola aumentar o seu prestígio, sendo mais valorizada pelos alunos, pais e parceiros regionais, institucionais e europeus. Este é, com efeito, um projeto sem fronteiras, que me permite, numa análise retrospectiva, afirmar que os trabalhos desenvolvidos pelos alunos da EASR evidenciam claras aptidões, tanto ao nível da formação técnica e científica, como do ponto de vista cultural e artístico, para intervir inter e pluridisciplinarmente na internacionalização do ensino. São igualmente relevantes os resultados pessoais e socio/culturais, que se manifestam no reforço da confiança e autoestima, o que favorece a expressão individual, o trabalho de equipa, a compreensão intercultural e a participação cultural.


MADALENA MENESES

PROFESSORA DE JOALHARIA CURSO DE DESIGN DE PRODUTO DA EASR

brincos

SOPROS “tem como ponto de partida a obra de René

Margritte e a sua posterior influência no desenvolvimento do surrealismo português. Nesta premissa foi desenvolvido, codificando símbolos deste movimento, dois pares de brincos e um anel, que devem a sua forma a um trabalho de análise e estudo de um quadro de Mário Cesariny “Sopros” e do poema deste mesmo autor “Faz-se luz”. Os objetos dão resposta diretiva do projeto Comenius: “Ceci n’est pas un bijou”” Ana Raquel Torres

45


R EFLE X Ã O

A ENGENHARIA E O DESIGN DE PRODUTO...

Engenharia e Design. A ciência e a arte juntas no desenvolvimento de um produto. Onde começa uma e acaba a outra? Como se articulam e interagem?

“O design é uma atividade criativa cujo objetivo é estabelecer as qualidades multifacetadas de objetos, processos, serviços e sistemas em ciclo de vida. Portanto, design é o fator central da inovadora humanização das tecnologias e o fator crucial para o intercâmbio económico e cultural “


MARIANA RÊGO

PROFESSORA DE TÊXTEIS CURSO DE DESIGN DE MODA E DESIGN DE PRODUTO DA EASR

A engenharia e o design, ao contrário do que o senso comum poderá pensar, não se posicionam como áreas antagónicas e irreconciliáveis. No design de produto, estas duas áreas misturam-se numa simbiose perfeita e os princípios científicos, a informação técnica colocam-se ao serviço da imaginação, da criação, da estética, na definição de uma estrutura mecânica ou sistema de forma, a desempenhar funções previamente especificadas com o máximo de economia e eficiência. (Araújo, 1995).

De acordo com o ICSID, Conselho Internacional das Sociedades de Design Industrial, “Design is a creative activity whose aim is to establish the multi-faceted qualities of objects, processes, services and their systems in whole life cycle. Therefore, design is the central factor of innovative humanisation of technologies and the crucial factor to the economic and cultural exchange” 1. (apud Rui Miguel et al, [2010?]), exigindo, a sua complexidade, a formação de equipas multidisciplinares a interagir com diferentes sistemas de conhecimento: humanidades, tecnologia/engenharia, arte/ criatividade, marketing, economia e gestão. (Miguel R., 2010). De acordo com Mário Araújo (1995), o design vê o produto por fora e a engenharia vê o produto por dentro; o design de produto vê o produto por dentro e por fora, de forma interativa e multidisciplinar. Assim sendo, o design de produto deverá ser cada vez mais uma atividade de equipa, exigindo que o sistema produtivo convoque diferentes e diversificados recursos humanos qualificados, se quiser alcançar os objetivos e convencer o mercado. Desenvolvendo-se numa economia global, onde as fronteiras desaparecem do dia para a noite e as empresas procuram, através da aplicação sistemática da inovação industrial, atrair para si clientes, através de produtos de qualidade (conseguida pela simbiose entre a estética e a tecnologia), o design de produto é hoje, época em que o consumidor se tornou exigente e a concorrência feroz, uma atividade fundamental para o desenvolvimento económico e social de um país.

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R EFLE X Ã O

MODA arte ou design? Moda – arte ou design? A primeira dificuldade com que nos confrontamos para tentar responder a esta questão prende-se com as definições indefinidas do que é arte e do que é design – quais os conceitos, qual a fronteira que separa a arte do design?


VERA SANTOS

PROFESSORA DE TÊXTEIS CURSO DE DESIGN DE MODA DA EASR

Várias são as propostas, algumas controversas, nada

marcas, originando (talvez) o pronto-a-vestir.

objetivo e claro, nada que nos permita considerar a

Assim, numa visão simplista dos termos, associa-se o

moda uma arte ou olhá-la como design. A solução, a

termo “arte” a moda de alta-costura e o termo “design”

tentação que espreita, impele-nos a olhar para a moda

a moda pronto-a-vestir. Empiricamente, a analogia dos

como algo que fica no meio, reunindo e integrando as

modelos de alta-costura a objetos de contemplação –

duas vertentes – a arte e o design.

objeto artístico/moda artística 1 - é clara. Por sua vez, os

Na verdade, o termo moda tem estado intrinsecamente

modelos de pronto-a-vestir, pelas suas características,

relacionado com as mutações socioculturais. Para definir

em que a função é aliada a estética, têm subjacente

moda, é imprescindível perceber a evolução desta no

“design” como palavra de ordem. Neste contexto, Gilles

tempo e na sociedade. A moda é entendida como “… o

Lipovetsky afirma que “o design é um hino à estreita

processo de transformação incessante e de tendência

modernidade e conota e valoriza, tal como a moda, o

cíclica das preferências próprias dos membros de uma

presente social. (…) Hostil ao fútil, o design é todavia

dada sociedade, em todas as espécies de domínios”

subtendido pela mesma lógica temporal da moda,

(dicionário de sociologia, 1999).

a do contemporâneo, e revela-se uma das figuras da soberania do presente. (…) Com tendência poetizada

Se analisarmos a moda, desde o final do século XIX

e pós-funcionalista, o design, ao mesmo tempo que

aos dias de hoje, percebemos instintivamente que

opera uma viragem espetacular, limita-se a exibir mais

o conceito de moda pode ter nascido nas casas dos

abertamente a sua essência-moda.”

grandes mestres costureiros, com a chamada alta-

Moda é arte e é design. As duas palavras parecem

costura, exclusiva da alta sociedade. Com a revolução

entrelaçar-se, entretecer-se, enquanto os fios das meadas

impulsionada pela juventude, nos anos 60, a moda

dos dois conceitos se perdem na arbitrariedade de uma

passa a ser criada nas ruas, influenciando as grandes

fronteira, que nem sabemos ao certo se existe.

“o arquiteto belga Henry Van de Velde defendeu uma moda artística baseada em dois princípios essenciais: a relação entre a linha e a forma em movimento, o que vale dizer, a construção dos elementos do traje em função dos movimentos do corpo, é a logica decorativa que visa uma ornamentação adaptada a estrutura da vestimenta” - in A MODA E A ARTE, Eugénia Tomaz.

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R EFLE X Ã O

É como andar na “corda bamba” sempre a mostrar as nossas habilidades. A fronteira pode ser tangível ou imaterial.

No 10º ano, a proposta de trabalho é a realização e concretização de um contentor e logo se colocam as questões de interior/exterior, aberto/fechado, leve/pesado, etc. Condicionados pelas características dos materiais a utilizar, questiona-se o sabor da madeira, a temperatura da cerâmica e surgem as expressões de rígido ou flexível, de duro ou mole, da curva ou da reta, não esquecendo que no limite da circunferência, levando o raio até ao infinito, surge-nos a reta. No entanto, a própria reta depende do referencial e do ponto de vista. Mas não divagando e voltando à peça do 10º ano, coloca-se a questão: é um contentor de quê? Já na “Caixa de Pandora” se retirava do seu interior os desejos e esperanças que se abrem para o mundo, para o exterior; também na peça a criar, esse interior pode ser o do aluno que se reflete na aparência visível da peça. E a fronteira do rigor? Desenho rigoroso à mão? Ou com régua? Ou é o pensamento que é rigoroso?

Em Design de Produto, no processo criativo, há momentos de desespero e raiva e, do outro lado da fronteira, de paixão e criatividade. Não se consegue distinguir se a ideia surgiu a dormir ou acordado mas sabe-se que a forma é real e tem sentido.


CONCEIÇÃO MAGALHÃES

PROFESSORA DE PROJETO DA EASR

51


PR O J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | 11ºANO _ EASR | 2011.12

“Das coisas nascem coisas.” BRUNO MUNARI

Peter Behrens foi considerado o primeiro

designer industrial de produtos de uso,

foi um arquitecto de formação, um dos mais influentes da Alemanha no começo do século XX e um dos fundadores da Deutscher Wekbund (grupo de artistas e artesãos que se uniram em 1907 para aproximar a industria da sociedade como forma de melhorar a vida de todos). Produziu um grande número de objectos como talheres, relógios, peças cerâmicas, móveis, utensílios para cozinha, etc. Foi contratado pela a empresa AEG, para recriar o logótipo e toda a identidade corporativa da empresa, além encarregarse da arte gráfica publicitária. Onde se destacou mais foi no fabrico de objectos como chaleiras eléctricas, ventiladores, móveis, relógios, todos livres das grafias decorativas e com a forma como resultado da função.

Os objectos que ele produzia tinham a presença de formas simples e geométricas, como se pode verificar nas suas chaleiras. Os materiais que geralmente utilizava nas suas chaleiras eram 3 tipos de metal, mas o mais utilizado suponho que tenha sido o latão. Behrens fazia parte do movimento Dustsche Werkbund juntamente com outros doze artistas. Entre eles o que possui maior destaque é Peter Behrens. A Werkbund também tinha a preocupação de dar espaço aos jovens iniciantes e entre estes que tiveram contacto com Behrens estavam, Jesef Hoffmann, Henri van de Veld, Bruno Taut e Wlter Gropius. No amadurecimento da Werkbuns Peter Behrens teve importância prática, enquanto Henri Van de Velde contribuiu de forma intelectual. No pós-guerra Behrens desiste do classicismo e adota as formas medievais, enquanto as ideias da Werkbund sobreviveram dentro da Bauhaus.


CÍNTIA SILVA

Quando alguém diz “isto também eu sei fazer”, quer dizer que o sabe Refazer, se não tê-lo-ía já feito antes de Bruno Munari em “Das Coisas Nascem Coisas”. A história do design como motor de inspiração no desenvolvimento de novos produtos. A chaleira de Peter Behrens serviu de elemento referenciador na concretização do projeto de um anel. O anel é constituído por uma pirâmide octogonal, sem base (octogonal como a chaleira), o interior dessa pirâmide tem uma textura idêntica à da chaleira e uma meia calote polida. O aro é rectangular tal como a pega (da chaleira) e encaixa em duas das faces da pirâmide. Obecto de referência: Chaleira Eléctrica; Autor: Peter Behrens; Materiais: latão, palhinha e madeira

Nome do objecto: Anel behrens Materiais: Latão

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PR O J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | 11ºANO _ EASR | 2011.12

...Após a proposta ter sido lançada, uma ideia ocorreu-me quase de imediato: uma mesa, carregada de papel tendo este a forma da mesa e com um copo, para armazenamento dos materiais, no centro.

MESA EM PÉ

O tema da proposta de trabalho tinha em vista as crianças e pretendia-se a realização de um objeto para equipar parques infantis ou jardins escolares. A forma circular surgiu para oferecer um maior dinamismo à peça e a motivação à libertação desejada nas crianças. Quando o papel já estivesse suficientemente gasto, apenas seria necessário retirar a folha do topo e, logo a seguir, já se ia encontrar uma nova folha visto que o tampo da mesa seria como um bloco. A forma circular, no entanto, trazia um grande problema, o desperdicio de papel na produção do bloco/tampo. A solução,não fugindo ao objetivo da ideia, estaria na alteração do formato da mesa passando para um formato quadrangular. Desta forma, o desperdício de papel já não seria tão grande, sendo o objetivo, caso este objeto fosse produzido na realidade, serem vendidas recargas especialmente produzidas para a mesa.


MATILDE MAIA

...Sendo uma “mesa em pé”, como lhe chamei, o objectivo seria, os utilizadores fazerem sobre ela um desenho em conjunto estando todos a desenhar no mesmo suporte, com total liberdade para se expressarem, usando os mesmos materiais, entreajudaremse e desenvolverem o seu lado criativo fugindo um pouco à ideia habitual em que um desenho é algo individual ou algo “rígido” na medida em que teriam que estar sentados numa cadeira concentrados naquilo que cada um estaria que fazer.

PRODUCED BY AN AUTODESK EDUCATIONAL PRODUCT

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PR O J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | 11ºANO _ EASR | 2011.12

PRODUTO GLOBAL

A proposta de trabalho consistia no desenvolvimento de dois objetos “para a mesa” a partir de 2 formas apresentadas. Na criação da linha de objetos deveriam ser concebidos dois contentores (um para líquidos e outro “indiferenciado” com tampa), incluindo materiais associados às duas tecnologias frequentadas. O processo de exploração de ideias seria desenvolvido a partir da inversão, rotação, subtração, secção de uma, ou, das duas formas apresentadas.

formas iniciais


SARA MAGALHÃES

A partir da duas formas propostas para criar uma linha de objetos para mesa, foi decidido realizar um serviço de chávenas.

Procurou-se que este serviço fosse composto por contentores com as mesmas

características podendo estes servir não só para conter líquidos, servidos ao

pequeno-almoço (chá, sumos, leite, meias de leite etc) como também poderiam conter açúcar, chocolate em pó e outros “alimentos” que complementassem estes mesmos líquidos.

Neste sentido estes contentores possuem uma utilização versátil cujos elementos completam-se uns aos outros, facilitando o transporte e armazenamento.

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PR O J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO CERÂMICA _EASR | 2011.2012

S. João com mangerico

Uma tradição antiga, um vaso novo. Este vaso e prato têm como tema a vida portuense.

Tem o objetivo geral de “modernizar” os tradicionais vasos de manjerico utilizados para a festa popular mais portuense, o S. João. O vaso em cerâmica parte de uma forma simples, um cone invertido. O motivo de decoração, que aposta numa técnica de vazamento da parede do vaso, cria a ligação com a planta, dando a sensação de sua continuidade. O prato quebrará com as cores neutras devido à utilização de uma peça polimérica que adquire uma das duas cores disponíveis, o roxo e o vermelho, possibilitando a visualização da quantidade de água disponível. A ligação das duas peças será resultando do simples repouso do vaso a aberturas existente no prato. Com estas duas novas peças será possível inovar a apresentação desta planta simbólica do S. João. Assim sendo as pessoas poderão ter um vaso que as cative mais, e quem sabe, as faça ter mais curiosidade em descobrir mais coisas sobre a planta, sem esquecer que devido às três dimensões existentes de vasos e pratos, é possível ir acompanhando o crescimento do manjerico, adaptando-se e mantendo a mesma estética.


INÊS OLIVEIRA

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PR O J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO EQUIPAMENTO EASR | 2012.13

T A V O L O

E Q U I PA M E N T O E X P O S I T O R p a r a

d i v u l g a ç ã o

d a

e a s r

um P R O B L E M A Os expositores existentes na escola que não facilitam o transporte nem a arrumação porque são constituídos por estruturas pesadas e fixas (não desmontáveis).

um C A M I N H O Este projecto pretende criar um equipamento expositor de divulgação e representação da escola, que possa ser transportado e arrumado com facilidade, assim como também poderá expor mais do que um tipo de objectos (versatilidade), respeitando a antropometria e ergonomia de todo o ser humano (acessibilidade).

uma S O L U Ç Ã O

Para responder a estes problemas desenvolveu-se um objecto bastante simples que tem uma variedade de posições que permitem expor mais do que um determinado conjunto de objectos, assim como uma grande facilidade de arrumação e transporte. Composto essencialmente por um tampo, duas pernas em forma de U e um eixo, através das diferentes perfurações nas pernas, o eixo pode ser encaixado conferindo várias configurações possíveis ao objecto: - expositor horizontal (para objectos ou cartazes) - expositor vertical com várias amplitudes (para cartazes) - varão expositor de peças de vestuário - estrutura para colocação de prateleiras (para objectos)


AFONSO CASTRO

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PR O J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO EQUIPAMENTO _ EASR | 2011.12

Chegar a “BOM PORTO” Um projeto de bomboneira para “Porvinos”

(Bombons de vinho do Porto)

Em países como a Alemanha e a Inglaterra, para além de se apreciar como bebida, enaltece-se o valor do vinho do Porto com inovação e criatividade, fazendo-se experiências com o produto das quais resultam chocolates, geleias, doces, mousses, entre outros produtos requintados e deliciosos. Porque é que os portuenses não o fazem de forma a alargarem o âmbito do consumo deste produto tão ligado à história e à economia da cidade? Respondendo a este desafio, criei a bomboneira “BOM PORTO”, especialmente dedicada aos bombons de vinho do Porto. Neste projeto todas as formas que integram a peça têm como objetivo evidenciar elementos ligados ao “néctar dos deuses”, tal como a recriação da técnica da tábua trincada, característica da construção dos barcos rabelos, do efeito de cascata e de turbulência das águas do rio Douro e da transparência, cor e brilho do vinho. Assim se afirma a dimensão simbólica da peça.


CARINA CARMO

A bomboneira oferece no plano superior um tabuleiro, e três gavetas distribuídas em níveis sobrepostos. A construção da estrutura é realizada em madeira de duas espécies: Wenge e faia, numa aposta de contraste de cor e de energia. A transparência das frentes de gaveta é dada pelo acrílico e os “puxadores”, em fio de algodão, são fixados com nós de marinheiro. O tabuleiro é realizado em latão cromado.

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PR O J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO EQUIPAMENTO _ EASR | 2011.12

castanhas p a r a s o b r e m e sa Um bom S. Martinho com o “Casquiço”!

Dimensões: Diâmetro – 372 mm Altura – 168 mm


ELSA PINTO O objeto criado transmite e representa o valor que a castanha (símbolo da tradição de S. Martinho) exerce

De facto, uma cidade não é apenas o conjunto das casas, da paisagem envolvente, mas as pessoas que habitam esse lugar e marcam gerações, caracterizando de tal modo a cidade que se torna inconfundível, desde materiais, ruas, casas, pessoas, cheiros, visões, conversas, pronúncias e gerações que vão deixando pequenos contributos. O povo vive e constrói as tradições. Através delas conseguimos caracterizar um determinado povo. Uma das maiores festas dos arredores do Porto é o São Martinho, destacando-se a feira de Penafiel. É em Setembro, no tempo das castanhas!

sobre a sociedade e um dos objetivos é que este objeto se torne emblemático nesta altura do ano, representando mais do que um mero alimento na sociedade portuense. O “Casquiço”, nome dado ao objeto (casqu- casca, iço-ouriço) transmite quatro valores importantes no projeto, nomeadamente o valor de uso: servir as castanhas sem “violar” a tradição, mas dinamizá-la; o valor de troca não será alto, pois se é um objeto para o povo, terá que ser produzido em série; o valor simbólico que já foi referido acima (realçar os valores da castanha) e um valor estético que, a propósito desta escolha do conceito, tem uma marca orgânica.

Formalmente o “Casquiço” deriva do ouriço da castanha e o mesmo acontece com as cores e texturas dos materiais em que é realizado - a madeira de castanho e o cobre. Funcionalmente é um objeto de ir à mesa das famílias para nele serem servidas as castanhas assadas ou cozidas.

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PR O J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO EQUIPAMENTO _ EASR | 2011.12 FORMAÇÃO EM CONTEXTO DE TRABALHO - LARUS

E N C O S TA

A falta de instalações próprias para fumadores, assim como o incómodo e a falta de comodidade para quem tem de se deslocar para o exterior de um estabelecimento, junto à porta, para fumar, bem como o impacto que um fumador cria à entrada de um estabelecimento tornam-se um problema. O objetivo neste projeto é criar equipamento/mobiliário de exterior para fumadores […] considerei como mais relevantes a questão do conforto para um fumador na via pública e a degradação do meio ambiente devido ao lixo proveniente do tabaco.

[…]defini o problema[…]fiz o levantamento de locais onde, por ser proibido fumar, o indivíduo é obrigado a deslocar-se para a via pública…questionei aspetos

sólido, estável, fácil conservação e limpeza. […] analisei os espaços envolventes e os aspetos antropométricos e ergonómicos. Tornou-se ainda indispensável, a realização de uma pesquisa/ levantamento das posturas adquiridas por fumadores de forma a perceber as dimensões ideais para um equipamento deste género. Conclui que: um fumador gosta de fumar tranquilamente e em posição relaxada. Assim, defini que o equipamento a projetar será essencialmente constituído por um balcão de apoio com cinzeiro incorporado, apoio para pés e cobertura de ensombramento.

74

86

lizadores?[...] O objeto deverá ser: de fácil arrumação,

120

montável? deverá ter cobertura?; assento? quantos uti-

106

po que irá ser utilizado pelo fumador?; amovível/ des-

173

relacionados com o equipamento a projetar: que tem-


JOÃO PEDRO MOURA

O fumador pode encostar-se, pode apoiar o pé e ainda pousar qualquer tipo de objeto que traga ou não do interior do estabelecimento. Possui também uma placa de acrílico translúcido para que seja possível a colocação de uma folha A4, onde poderá conter publicidade, informações do estabelecimento ou até uma notícia de destaque. O cinzeiro, em aço inoxidável de fácil manutenção e limpeza, é colocado na extremidade da peça, para evitar o contacto com bebidas ou produtos alimentares que possam estar no balcão[…] A cobertura é uma tela feita em polyester banhada em PVC o que permite ser bastante flexível, quase como um pano. Isto faz com que a tela vá sendo enrolada à medida que a fechamos, o que facilita a arrumação.

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PRO J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO JOALHARIA _EASR | 2011.2012

PATRIS

TRABALHO PREMIADO COM O 1º LUGAR NO CONCURSO DE OBJETO DE MERCHANDISING PARA O MUSEU DO DINHEIRO | BANCO DE PORTUGAL

A moeda acompanha a evolução do Homem e da sociedade em que este está inserido, já que, apesar da sua pequena dimen-são, transmite-nos imensas informações, provando factos, corporizando figuras míticas e reais, que nos levam à época, às crenças, aos costumes, à cultura de uma determinada região, representando um povo, uma comunidade. Nas moedas eram cunhados vários símbolos de Portugal: Os nossos reis, o brasão, o selo de D. Afonso Henriques, a epigrafe, entre outros, valorizando a pátria. Observamos igualmente várias moedas onde é cunhada a forma do ramo de oliveira. Já os gregos associavam a oliveira à força e à vida. Vejamos então a nossa pátria com outros olhos, como uma nação vitoriosa, como uma pátria renascida. O ramo de oliveira simboliza vitória, uma nova vida e uma nova força para o nosso país.


CLAUDIA FONTES

Esta jóia apresenta a pátria com uma nova visão, uma pátria renascida, um Portugal novo. Patris simboliza o valor de Portugal, o que o país representa, o que já foi e o que pode vir a ser. Esta peça tem aproximadamente 33 centímetros de altura, 16 de largura e 3 milímetros de espessura. Pode ser realizada em feltros, borracha, silicone ou resina flexível. A peça pode ter entre 2,5 a 4 mm de espessura

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PR O J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO JOALHARIA _ EASR | 2011.12

TRABALHO PREMIADO COM O 1º LUGAR NO CONCURSO DE JOALHARIA DO XXº ENCONTRO DO PLE

“«Lavoura» simboliza uma dimensão espácio-temporal e um ideal a reter, o suceder de épocas, de vidas que se expandem e se moldam em continuidade a partir de um ponto. A leitura decrescente é a retrospecção de toda uma vida, de uma cultura, é subir os degraus que descemos para aprender a descer os que restam.” JOANA RIBEIRO


JOANA RIBEIRO

“Na natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma.” LAVOISIER

Materiais: latão e polipropileno Dimensões: 8 x 3 x 13 cm

“O principio é o de que matéria prima que extraímos da natureza e transformamos conforme as nossas necessidades volta sempre à natureza, isto é, a matéria percorre um ciclo de renovação e nunca é perdida. Porém, este mecanismo natural é lento comparativamente ao ritmo de produção e desperdício de resíduos a que a sociedade ocidental se habituou. Este desequilíbrio tem consequências graves a vários níveis e começamos hoje a descobrir a importância de uma gestão responsável e eficiente dos recursos disponíveis. Deste modo torna-se essencial o desenvolvimento e aplicação de materiais alternativos no design.” JOANA RIBEIRO

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PR O J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO TEXTEIS_ EASR | 2011.12

TRABALHO PREMIADO COM O MENÇÃO HONROSA NO CONCURSO DE OBJETO DE MERCHANDISING PARA O MUSEU DO DINHEIRO BANCO DE PORTUGAL

Uma “sociedade transparente” onde tudo é visto de cima.


GABRIELA MAGALHÃES

Não há corrupção, não há mentiras, nem esconderijos. É uma sociedade limpa, onde o dinheiro se obtém pelo esforço de cada um, sabendo-se de onde vem, onde foi conseguido e para onde vai, sem mais valias que apenas servem alguns.

E

ste projecto tenta trazer positivismo à sociedade, nesta época de crise

sócio-económica e de valores. O padrão “Translúcido” tem como essência “a troca”, tal como nos primórdios da existência Humana. Mas, neste caso, aplica-se à sociedade atual, que funciona na base do dinheiro. Assim, o produto transmite, com força e convicção, o lado positivo deste e a crença no trabalho justo e no fim da corrupção. Este padrão é estampado digitalmente num tecido esponjado e envolvido em PVC cristal (tecido técnico transparente), existindo, sem dúvida, uma relação entre o conceito de “sociedade transparente” e o tecido. Por fim, foi aplicado em dois produtos: numa capa de computador e como revestimento de um caderno, podendo ser adaptado a outros objetos.

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L I VRO

“Das coisas nascem coisas”

“O problema de design resulta de uma necessidade.” Archer

“ O meu amigo Antonio Reboloni diz: « Quando um problema não se pode resolver, não é um problema. Quando um problema se pode resolver, também não é um problema. » E com efeito é verdade. Mas esta afirmação origina algumas observações: é necessário antes de tudo saber distinguir se um problema é resolúvel ou não. E para saber é preciso ter experiência, sobretudo técnica, que tem o meu amigo Antonio. Mas que pode fazer um designer no inicio da sua actividade?” Munari (2011, p.39)

P

rojectar é fácil quando se sabe o que fazer. Tudo se

torna fácil quando se conhece o modo de proceder para alcançar a solução de algum problema, e os problemas que se nos deparam na vida são infinitos: problemas simples que parecem difíceis porque não se conhecem os problemas que se mostram impossíveis de resolver. Se se aprender a enfrentar pequenos problemas pode-se pensar também em resolver problemas maiores. O método projectual não muda muito, apenas mudam as áreas: em vez de se resolver o problema sozinho, é necessário no caso de um grande projecto aumentar o número dos especialistas e dos colaboradores; e adaptar o método à nova situação.

Neste livro sobre metodologia projectual são apresentados alguns pequenos problemas e outros mais complexos, tendo sempre em vista o que se deve fazer para os resolver. Todos os exemplos são comunicados ao leitor de acordo com o método seguido para projectar a sua solução. O conhecimento deste método tornará mais fácil o projecto de outros problemas. O leitor não encontrará neste livro a forma de projectar uma astronave nem outros grandes projectos ilusórios baseados exclusivamente na livre e incontrolável fantasia pessoal dos projectistas; mas encontrará exemplos ao alcance de toda a gente que tenha o bom senso de fazer face aos problemas reais, aqueles que aparecem normalmente. “ Bruno Munari


METODOLOGIA PROJETUAL

BRUNO MUNARI

(n.24/10/ 1907 - f.30/09/1998

Nasceu em Milão (Itália) em 1907, onde viveu e desenvolveu grande parte do seu trabalho no campo das artes e do design. Ao longo do seu percurso profissional foi reconhecido com diversos prémios, entre os quais: 1954/ 1955/ 1979 Compasso d’Oro prêmio da ADI (Associazione per il Disegno Industriale) 1957 Medalha de Ouro da Triennale di Milano 1974 Prêmio Andersen como melhor autor infantil 1974 Menção Honrosa da Academia de Ciências de Nova York 1985 Prêmio de Design da Fundação Japão 1986 Prêmio Lego 1988 Award da Accademia dei Lincei 1971/ 1973/ 1987 Prêmio Spiel Gut de Ulm 1989 In architettura Honoris Causa da Universidade Genova 1990 ADCI Milão Hall of Fame em Criatividade e Comunicação 1992 Academia de Brera - Marconi prêmio 1994 Cavaliere di Gran Croce

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BR E V E S


FRONTEIRAS

FRONTEIRA

s.f. 1 linha que delimita uma região ou um território fixando a sua extensão; estrema; raia; 2 linha de separação entre dois territórios ou países; 3 o que separa duas coisas distintas ou contrárias (De fronte + -eira)

Dicionário da Língua Portuguesa 2006 - Porto Editora

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dinamicas @ essr.net E SC O LA ART Ă? S T I C A D E S OA R E S D O S R E I S


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