DINÂMICAS #3

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JANEIRO 2015

E S C O L A A RT Í S T I C A D E S OA R E S D O S R E I S


DINÂMICAS | MAGAZINE DE DESIGN DE PRODUTO

FICHA TÉCNICA

PUBLICAÇÃO ANUAL COORDENAÇÃO: ARTUR GONÇALVES, MICAELA REIS COLABORAÇÃO NESTA EDIÇÃO ALBERTO TEIXEIRA, ARTUR GONÇALVES, FÁTIMA FERNANDES, JOAQUIM FLORES, JORGE JESUS, JOSÉ ANTÓNIO FUNDO, LAURINDA BRANCO, MARIA DA LUZ ROSMANINHO, MARCO GINOULHIAC, MARIANA RÊGO, MARTA VARZIM, MICAELA REIS, PAOLO MARCOLIN, RUI ALEXANDRE, RUI TEIXEIRA, RUI PANELO, SARA ALMEIDA, SUSANA MILÃO, VERA SANTOS E OS ALUNOS ABEL MARTINS, ANA SANTOS, ANA RITA FERREIRA, ANA RITA FONSECA, ANA SOFIA COSTA, ANA MARTA SILVA, BRUNA TEIXEIRA, DÉBORA SILVA, FÁBIO MOTA, GONÇALO SILVA, INÊS RAMALHÃO, INÊS SILVA, JOANA RIBEIRO, LUNA FONSECA, MARIANA ALVES, MARIANA CARDOSO, MARTA FREITAS, NUNO MENDES, NUNO SARMENTO, PATRÍCIA CARVALHO, RAQUEL SILVA, ROSANA SOUSA, SOFIA VIEIRA, TOMÁS ALMEIDA, . PRODUÇÃO GRÁFICA/ EDIÇÃO DIGITAL: MICAELA REIS CONTATO EDITORIAL: dinamicas@essr.net PROPRIEDADE: ESCOLA ARTÍSTICA DE SOARES DOS REIS RUA MAJOR DAVID MAGNO, 139 | 4000-191 PORTO TEL. +351 22 537 10 10


LAURINDA BRANCO

PROFESSORA DE PROJETO E TECNOLOGIAS | EASR

ED ITORIAL Processos. Processos… Este é o tema do dinâmicas 3 e eu tenho que fazer o editorial… Começo por colar na parede uma folha de papel vegetal e sempre que por ela passo, vou colocando questões, sinónimos e mais questões e pistas. Caminhos, percursos e inquietações. Misturo a música e a poesia, acrescento lugares comuns: Vou onde me levam os meus passos, canto com o José Mário Branco que “há sempre qualquer coisa que está para acontecer e que eu devia perceber”, e caminho, releio o Cântico Negro de José Régio – “Vem por aqui – dizemme alguns com olhos doces (…) e cruzo os braços e nunca vou por ali.”… E métodos, metodologia, metodologia projectual, Munari, arroz verde ou bacalhau com natas. Mas também Descarte e o Discurso do Método. Razão? “Penso, logo existo”. Durante dias passei e parei junto da parede com o papel, à deriva… e falam-me da Teoria da Deriva de Gui Debord (obrigada Rui) e percebi que saíra da minha zona “geográfica”, não em busca de uma resposta mas em busca de questões, em mim mesma. E sigo… Este é o meu processo. Não sei onde vou chegar, mas agora experimento ir por aqui.

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ED I TO RI A L


LAURINDA BRANCO

PROFESSORA DE PROJETO E TECNOLOGIAS | EASR

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ÍN DI CE

ÍNDICE 1-3

EDITORIAL - LAURINDA BRANCO

4-5

INDICE

6-7

PROCESSOS PROCEDIMENTOS - ALBERTO MARTINS TEIXEIRA

8-11

PROCESSO EDUCATIVO - JOSÉ ANTÓNIO FUNDO

PERCURSOS 12-15

TENHO QUE COMEÇAR POR VOS CONTAR UM SEGREDO - SARA ALMEIDA

18-23

EDUARDO AFONSO DIAS - MICAELA REIS

24-29

ISAMU NOGUCHI - ARTUR GONÇALVES

REFLEXÃO 30-37

COMO O CONHECIMENTO HUMANO É MOLDADO PELA FIÇÃO - MARTA VARZIM

38-45

CONSTRUCTION TOYS - MARCO GINOULHIAC

46-53

PROJETOS PARA A ZONA DAS FONTAINHAS NO PORTO - PAOLO MARCOLIN SUSANA MILÃO | FÁTIMA FERNANDES | JOAQUIM FLORES

54-59

O PROCESSO CRIATIVO - RUI TEIXEIRA

60-65

UMA PERSPETIVA SOBRE O CONCURSO EDUCACIONAL SQÉDIO - 2003.14 RUI ALEXANDRE

ATIVIDADES 66-69

FÁBRICAS DIGITAIS - JORGE JESUS

PROJETO 70-71

F-51 | WALTER GROPIUS - DÉBORA SILVA

72-73

ANEL GROPIUS F-51 | EMBALAGEM F511 - DÉBORA SILVA

74-75

MOCE - INÊS RAMALHÃO


76-77

FINITO - TOMÁS ALMEIDA

78-79

MOMITA - ANA SANTOS

80-83

HIPÉRBOLE - FÁBIO MOTA

84-85

PORTA-GUARDANAPOS | SUPORTE GARRAFAS - NUNO MENDES

86-91

ESCOVA VIDEIRA | FCT - ABEL MARTINS

92-93

SIGMA | FCT - GONÇALO SILVA

94-95

BANGA | FCT - SOFIA VIEIRA

96-99

PORTUGAL EM QUATRO LINHAS | FCT - ANA MARTA SILVA

100-101

COLEÇÃO DE TECIDOS PARA CAMISAS DE HOMEM | FCT - MARIANA ALVES

102-107

SÉRIE CANVA, ONDA E PIÃO | FCT - PATRÍCIA CARVALHO

108-113

QUADRA | PAA - ANA SOFIA COSTA

114-117

[DES] CONSTRUÍDO | PAA - ANA RITA FERREIRA

118-119

SIGA | PAA - BRUNA TEIXEIRA

120-125

CONTÉM VIDA | PAA - INÊS SILVA

126-127

UPA MERCADO | PAA - JOANA RIBEIRO

128-131

MERCADOS DIRECIONADOS | PAA - MARTA FREITAS

132-137

VEM | PAA - NUNO SARMENTO

138-143

EXPOSITOR MÓVEL | PAA - RAQUEL SILVA

144-145

A-BANCA | PAA - ROSANA SOUSA

146-149

LENDAS & MITOS | PAP - CURSO PROFISSIONAL DE DESIGN DE MODA ANA RITA FONSECA | MARIANA CARDOSO | LUNA FONSECA

LIVRO 150-151

“DAS COISAS NASCEM COISAS” - BRUNO MUNARI

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PRO C ED I M ENTO S Na língua inglesa distingue a palavra “process” da pala-

sos nascem determinados por fatores de ordem social e

vra “procedure”. Não que seja uma distinção exatamen-

política e deles resultam novas relações sociais. Como

te clara. Process seria como que um fenómeno susten-

exemplo elucidativo tome-se a máquina a vapor que de-

tável constituído por mudanças graduais ao longo duma

sencadeou novos processos de produção eles próprios

série de estados; procedure seria por sua vez uma série

responsáveis por novas relações sociais. O passo se-

de atos de natureza prática ou mecânicos relacionados

guinte talvez tenha sido o aparecimento do conceito de

com uma forma particular de trabalho. Em complemen-

design e da produção standartizada, capaz de chegar

to destes dois vocábulos, que em português são tradu-

às massas. A massificação foi o resultado natural dos

zidos quase sempre pela mesma palavra – processos

processos mecânicos capazes de criar grandes quan-

– são usadas com frequência as palavras: algoritmo e

tidades de mercadoria igual (ou semelhante) a baixo

protocolo. Os contextos determinam normalmente o uso

custo. Outra consequência deste tipo de produção foi a

de um ou outro vocábulo mas, a raiz, o padrão de pen-

implementação subconsciente dum pensamento único,

samento envolvido é o mesmo. Está em causa um con-

uma espécie de “homem unidimensional” de Marcuse.

junto de etapas simples, organizadas de forma sequen-

Com o aparecimento do computador, numa primeira

cial com um objetivo, uma finalidade. Esta matriz, este

fase aliado do engenheiro nos seus cálculos complexos

processo, aplica-se tanto à receita do bolo-rei como ao

e morosos, e um seu derivado, o robot, começou a ser

algoritmo que colocou recentemente os professores em

possível produzir com intervenção mínima de mão-de-

BCE (um bom exemplo dum processo cheio de boas in-

-obra humana. Dir-se-ia que num futuro suficientemente

tenções mas mal organizado ou construído), passando

próximo o homem seria dispensável no processo pro-

pela avaliação dum qualquer aluno.

dutivo. Aliás a geração de computadores capazes de

Por detrás de qualquer produto ou produção há um pro-

aprender parecem apontar nessa direção. Mas só pare-

cesso na forma de algoritmo, organizado em torno de

cem! Aquilo que Marx conheceu e esteve na base das

etapas simples (simples no sentido em que não se sub-

grandes construções sociais (o proletário escravizado e

dividem noutras etapas). Em termos gráficos será a ima-

alienado) desapareceu (ou modificou-se) para dar ori-

gem duma molécula descrita através dos átomos (seres

gem a uma classe média alienada ao novo processo de

indivisíveis) que a constituem.

produção (operários especializados, designers, progra-

Qualquer sociólogo que se prese dirá que os proces-

madores).


ALBERTO MARTINS TEIXEIRA

DIRETOR DA ESCOLA ARTÍSTICA DE SOARES DOS REIS

Porém, os novos processos de produção trazem em

informação científica livre e à disposição de qualquer

si o ovo da serpente. Com a evolução da robótica e o

um é inevitável que novas relações sociais apareçam e

salto tecnológico das máquinas/impressoras 3D o pro-

a sociedade caminhe para uma nova ordem institucio-

cesso uniforme de produção, a cadeia, a massificação,

nal.

tudo isso deixa de fazer sentido. Baixando os custos de

Quando todos estes processos atingirem um grau de

produção da peça única é possível recuperar um certo

maturação que os torne possíveis o que será da escola?

conceito até aqui reservado ao domínio do artesanato.

Se a isto aliarmos o homem biónico feito de código ge-

O novo artesão é o programador/designer que, com os

nético e próteses, evoluindo também com um software

mesmos custos e até custos mais baixos produz obje-

próprio capaz de lhe prolongar a vida até ao infinito o

tos únicos ou pequenas séries respeitando totalmente a

que será o processo de aprendizagem deste novo ser?

vontade, ou até o capricho, do consumidor e com isso

Aliás o que será aprender? Haverá o “ir à escola”, ou

levando à “desmassificação” da sociedade.

será a escola a vir até nós na forma de plataformas de

Em toda esta dinâmica ganha relevo a palavra algoritmo

aprendizagem e tutoriais? Não tarda a ouvirmos uma

associada aos artefactos automáticos. Para já é difícil

voz virada para nós em tom de desafio a dizer “ ó kota

perceber de que forma as relações sociais se vão trans-

isso que estás a explicar já eu vi num vídeo bué de fixe

formar. Se pensarmos no aparecimento da internet, nas

do TED com muito mais pinta”. Quando aí chegarmos

redes sociais e na forma como o processo de comuni-

o que vamos fazer? Cairemos na tentação de competir

cação se está a modificar temos uma ideia da imprevi-

expositivamente com o youtub?

sibilidade que os meios digitais arrastam. Conceitos e

Nesses próximos longínquos tempos teremos que voltar

normas socias estão a mudar a cada dia que passa e

ao núcleo central de tudo e ter uma resposta pronta e

mesmo os “espaços” dos sentimentos e o conceito de

segura para a eterna questão: o que é e para que serve

“vida” parece ganhar novas dimensões que geram um

a escola? Se a isto não conseguirmos responder o cami-

hiperespaço de novas realidades. Já é possível ter uma

nho aponta para um admirável mundo novo onde tudo é

vida na dimensão do real clássico e outra no hiperespa-

perfeito, saudável e possível.

ço onde nos construímos sem obedecer a um determinismo genético. Se numa realidade os euros são insuficientes para as nossas necessidades na outra as bit coins podem-nos permitir os maiores luxos concebíveis. Contudo, o paradoxal é que o espaço clássico se transformam num espaço construível graças às impressoras 3D. Há um certo grau de autonomia ao nosso alcance. Podemos construir a nossa casa, a nossa roupa, a nossa alimentação, tudo isto através duma máquina e dum algoritmo. Se juntarmos a isto o manancial de informação que a net nos pode fornecer, os vídeos tutoriais, a

Em si os processos são neutros, incolores e inodoros. Quem os vai colorir somos nós e da forma como os colorirmos teremos resultados diferentes. Na essência o que se deve garantir é o controlo dos processos pelo ser humano e não o contrário. Pode ser que um dia se pegue numa impressora 3D e se construa uma escola ou um professor. Quem sabe? 7



JOSÉ ANTÓNIO FUNDO

SUBDIRETOR DA ESCOLA ARTÍSTICA DE SOARES DOS REIS

Processo Educativo A educação é um modo de fazer e não um resultado.

"The stick which drips paint is a toot which acknowledges the nature of the fluidity of paint. Like any other tool it is still one that controls and transforms matter. But unlike the brush it is in far greater sympathy with matter because it acknowledges the inherent tendencies and properties of that matter." Robert Morris, 1968 9


Robert Morris, escreveu em 1968 um pequeno ensaio que viria a cunhar o termo "Process Art" para um movimento

que mais não foi do que um princípio simples de entender a obra de arte como um processo ao contrário de um objeto ou um resultado. Para o efeito Morris realçou

o trabalho de Pollock e como os materiais utilizados

funcionam uns em articulação com os outros e no estrito respeito pela sua natureza. Assim, para Morris, o "pau"

que Pollock utiliza para pingar a tinta sobre a tela está em harmonia com a fluidez da tinta mais do que o tradicional

pincel que a disciplina. O "fazer" é a obra e não apenas do ponto de vista performativo. As formas de fazer emergem nos materiais e a sua manipulação é ritual estático. Ao

despromover o objeto de arte em relação ao processo que o faz existir Morris está a fazer a mais sincera afirmação.

Não são os resultados que nos movem, são os processos. A arte de Robert Morris, como a de Pollock, destaca-se

de números e resultados e em que os meios são

pela materialidade e profundidade dos modos de fazer

condicionados pelas finalidades projetadas, a escola

que implica. Estão lá os materiais de uma forma tão

deve separar-se dessa loucura insana e afirmar-se

palpável que os sentimos intimamente ligados ao prazer

como um lugar de processos, de caminhos, e não de

que produz a sua manipulação. São trabalhos que

metas. Claro que aqui a semântica é importante. O

produzem em nós o desejo de inventar novas soluções

que queremos dizer com umas palavras podemos

e processos artísticos. Meter as mãos à obra. Morris

dizer com outras. Por isso é importante que fique

realça no seu trabalho e nos seus ensaios algo que

claro o seu significado. Os indicadores, os resultados,

os artistas sabem há muito. Mesmo quando o objecto

são importantes na educação. Mas são-no apenas

de arte se quer destacar do seu próprio processo e

na medida em que podem ensinar-nos algo sobre o

se afirma apenas pelo produto final, por vezes quase

processo.

sobre-humano, para o artista o processo é muitas

É fácil manipular os resultados. O mediatismo educativo,

vezes um ritual quase mágico e os ateliers autênticos

a popularidade de rankings e gráficos que vivemos

santuários

procedimentos,

hoje, promove a visibilidade de apenas uns poucos

sons, espaços e estados de alma que constituem um

indicadores ou resultados. Facilmente as políticas

processo nem sempre visível na obra mas fundamental

educativas populistas e centradas nos resultados se

à sua construção.

deixam levar pela simplificação dos processos e pela

Nas escolas é igualmente importante valorizar os

economia de meios para alterar os números naqueles

processos. Numa época em que vivemos rodeados

indicadores. Por isso os rankings matam as escolas.

do

fazer.

etapas,


JOSÉ ANTÓNIO FUNDO

SUBDIRETOR DA ESCOLA ARTÍSTICA DE SOARES DOS REIS

Sobretudo algumas escolas que se deixam escravizar

permanente transformação, produzida por todos os

pelos resultados dos exames e que cedem à tentação

intervenientes enquanto o espaço social que ocupa se

de manipular os seus resultados, sacrificando o

vai transformando. Uma escola que rejeita o facilitismo

processo educativo em favor da ilusão criada por

dos resultados imediatos e que opta por viver com

uma mão cheia de notas atingidas em três ou quatro

entusiasmo o seu dia-a-dia. Esta escola, atelier do

provas. O treino para os exameWs é isso mesmo, um

aluno, é a escola do "fazer". Não a escola técnica mas

treino. Dificilmente se pode confundir com um processo

a escola do "fazer" diário. Um "fazer" que ensina, com

educativo. Um processo educativo centrado no aluno e

consequências, com espaço de desenvolvimento e

em aprendizagens significativas permite outro tipo de

crescimento e com oportunidades de correção e recuo.

resultados, menos mensuráveis no imediato. Porque é

Um "fazer" em conjunto e em partilha. Um "fazer" que

centrado nas experiências dos alunos, de cada aluno,

promove o conhecimento. A escola não é mais um

e está planeado de modo a produzir conhecimento e

horário em que os sapientes fazem a transmissão do

felicidade. A escola é um espaço de felicidade e de

saber a indivíduos a quem pouco mais se pede do que

aprendizagem para a felicidade. Mas a felicidade

provar, por escrito, que ouviram a lição. É um espaço de

dos alunos, o gosto por tarefas que promovem o seu

trabalho onde acontece um processo, multidimensional,

desenvolvimento humano e intelectual, o seu empenho

de desenvolvimento de seres humanos. Como Robert

e prazer por frequentar a escola, não é reproduzido nos

Morris escrevia sobre Pollock e sobre a harmonia entre

rankings dos resultados imediatos.

as ferramentas, os materiais e os suportes numa ação

A implementação, nas escolas de artes, de modelos

coerente, na escola os meios, os modos de fazer a

de ensino/aprendizagem baseados em projetos e

educação e os alunos devem estar em harmonia.

na resolução criativa de problemas pode e deve ser

Se um projecto visa um resultado, um processo, um

um laboratório para a aplicação destes processos

processo educativo, visa uma transformação eterna,

educativos noutros contextos. Uma escola que investe

uma ação imparável. Um aluno preparado para essa

no caminho e não na meta e que deixa que cada

transformação e desenvolvimento permanentes será um

aluno possa contribuir também para metas diferentes.

cidadão que faz avançar o mundo e não simplesmente

Estes modelos implicam uma escola humana, reflexiva

um que se usa dele para um qualquer objetivo.

e que funciona como coletivo. Uma escola em

11


PER CURS O S

Tenho que começar por vos contar um

segredo

Talvez mais interessante do que não a ter escrito é o facto de sentir, sempre num desses momentos decisivos, que é hora de o fazer. Pergunto-me se os meu professores imaginam que isto é um assunto que me "atormenta" desde esse fatídico ultimo dia de aulas do 12º ano. A Soares dos Reis teve tal influencia em mim que o simples facto de não ter parado para tratar de escrever os pontos finais (ou ponto e vírgula) no assunto, me deixou com um sentido de “inacabadez” desmesurável. Talvez seja pelo melhor. Levo comigo um pouco da Soares para todo o lado. Sempre a pensar em como escrever esse capítulo. Como é que eu acabei na Nova Zelândia, a trabalhar num estúdio como Designer de Produto? Não sei bem. Não sei como começou, mas sei que a história passa pela Soares dos Reis e que ainda não acabou. O melhor está por vir. Estava eu no 9º ano quando uma pessoa que me conhecia bem me falou da Soares dos Reis. Era uma ex-aluna e disse-me “acho que é uma escola que te encaixava bem”. Eu, que vivia na conchichina (aka Ovar) achei a ideia espetacular. Como quem quando lhe dizem “Queres ir à Lua?” e começa logo a imaginar-se dentro da nave com o capacete e a descolar ainda sem saber os contornos da aventura. Nessa noite pesquisei tudo o que consegui sobre esta escola e absorvi tanta informação quanto possível. Ao final do dia estava a


SARA ALMEIDA

DESIGNER EX-ALUNA DA EASR

Nunca escrevi a minha reflexão do 3º período no 12º ano e sempre soube que um dia a reflexão me viria bater à porta e dizer "é hoje!". Pensei em escrevê-la quando acabei o meu primeiro ano de universidade em Inglaterra, quando acabei o curso, quando estava naquela fase estranha em que tenho uma licenciatura e não sei o que fazer com ela, quando cheguei à Nova Zelândia... e nunca aconteceu.

rebentar. Notas de entrada? Listas? Anos comuns?

candidatar juntas. Esperei por ela meses e meses a fio.

Escolhas??? AJUDA! Escrevi o email mais aterrorizado

Quando percebi que ela afinal gostava muito da ideia,

de sempre (mas sempre com cuidado, porque não sabia

mas que nunca iria pôr mãos à obra, decidi candidatar-

se ia ser tido em conta na minha candidatura) e enviei

me sozinha. O único problema foi que as candidaturas

para o conselho executivo. Quando acordei tinha uma

para o ano lectivo seguinte tinham acabado... nesse dia.

resposta. Não uma resposta qualquer, mas a resposta

Eis que quando, recebo um email a informar-me que o

que precisava.

prazo tinha sido prolongado porque estava a nevar em

“Ovar não é propriamente na China! Tenha calma.”

Inglaterra. Numa semana tratei de tudo. 8 meses depois,

Lembro-me de respirar fundo e ler por entre as linhas

estava a aterrar numa nova aventura.

desta mensagem "não há nada que não consigas fazer!" Acho mesmo que foi o início das aventuras da Sara Almeida (mal sabia eu que o “Alberto” que me respondeu, era O Professor Alberto). Muitos dos ensinamentos que trago desta escola só foram completamente absorvidos por mim já depois de a deixar. Depois do 12º ano, ingressei no curso de Design de Produto numa Universidade na parte rural de Inglaterra. Como é que lá fui parar? Algures no 11º ano falei do assunto com uma amiga. Decidimos que nos íamos

Logo no meu primeiro ano percebi as diferenças entre mim e os meus colegas. Eles pesquisavam na Internet. Eu pesquisava na rua, a falar com pessoas. Eles desenhavam cadeiras e mesas. Eu sonhava com espaços onde tudo coexistia com as emoções e sensações dos utilizadores. Eles criavam candeeiros, eu pensava em como resolver a guerra no Sudão através do design. Esta maneira de encarar o design foi-me passada na Sores dos Reis. Estive envolvida nos projectos para o aeroporto de Gatwick, as lojas da Primark e algumas habitações privadas. Pela primeira vez tive experiência em produzir

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PER CURS O S

No segundo ano do curso fiz um estágio de três meses numa empresa de iluminação chamada iGuzzini. Trabalhava no departamento de design,

algo de acordo com o pedido de um cliente, criar o produto, enviar para produção , recebê-lo e admiralo. Adorei a sensação! No final do estágio o diretor do departamento de design, Rory Marples, disse-me para o contactar quando acabasse o curso, se quisesse trabalhar lá. Disse que me escrevia uma carta de recomendação se eu precisasse. Mas não foi o suficiente:

pedidos especiais: quando

Não me pagavam nem transporte nem subsídio de

alguém nos contratava

produtos de iluminação e não gostei do ambiente de

para fazer o projecto de iluminação para um projecto e queria uma alteração do produto do nosso catálogo, o departamento onde eu estava entrava em acção.

alimentação. Não gostei de trabalhar unicamente em trabalho. Todos os dias os designers trabalhavam no mínimo 2 horas extra. Em alguns dias até á meia noite. Se alguém saia á hora normal, havia sempre conversa sobre o assunto "acreditas que ele foi mesmo embora ás 5:30??". Ao fim de três meses decidi vir embora. Na altura agradeci a oferta do Rory mas sabia que não fazia nenhuma intenção de a aceitar. Não era o sítio ideal para mim. Dois anos mais tarde , finalmente liguei-lhe para pedir a minha carta de recomendação. Ia viajar para a Nova Zelândia e tinha lido que estavam a precisar de designers de produto. A meio da conversa perguntei


SARA ALMEIDA

DESIGNER EX-ALUNA DA EASR

lhe se conhecia alguém pelo país. Disse logo que sim

emprego. Eram eles a dizer: queremos te a ti. Um salário

e deu-me o número de um designer Kiwi (pessoa de

em condições. Férias pagas. Horas normais. Essas coisas

origem neozelandesa). Toda despachada, liguei lhe logo

todas que ensinaram à minha geração que só acontece

e expliquei a história. Ele pareceu apreensivo mas ao fim

em sonhos. E eu disse que sim, qual casal a aceitar ser

de 5 minutos de conversa disse "envia-me o teu portfólio".

feliz para sempre.

Um dia antes de embarcar no vôo, recebo um email

Deixem-me contar-vos como funciona o estúdio MW

de um estúdio a perguntar se podíamos marcar uma

Design: somos 2 designers de produto e dois engenheiros

entrevista pelo skype porque alguém lhes tinha enviado

designers. Trabalhamos das 9 às 5:30. A essa hora, o

o meu portfólio. Liguei-lhes logo e disse : em 48h posso

patrão activa o alarme e temos que correr dali para fora.

aparecer no estúdio. E assim foi. Na entrevista fizeram

Ninguém trabalha depois da hora. A não ser quando

me vários testes e exercícios de design. Muitos deles

sabemos que é preciso cumprir um prazo e todos

parecidos com os que fiz na Soares dos Reis no início do

trabalhamos sem nos queixarmos , de boa vontade. As

ano lectivo nas aulas de projecto. Repensar um objecto.

secretárias estão organizadas numa circunferência pelo

Melhorá-lo. Reinventá-lo. No final, perguntaram-me num

estúdio. Todos vemos o que os outros estão a fazer e

tom que nunca tinha encontrado "gostaríamos muito que

todos contribuímos. Várias vezes ao dia é esperado que

te juntasses á equipa. Achas que estas interessada?"

nos levantemos e exponhamos o trabalho que estamos

Percebi depois que o tom foi o mesmo que usamos

a desenvolver na parede e que o expliquemos em voz

quando pedimos aos nossos pais para nos emprestarem

alta. Com este processo detectamos erros muito mais

o carro para ir sair à noite. Dizemos muitas vezes "diz

rápido , recebemos críticas construtivas e dessa forma o

que sim, diz que sim" na nossa cabeça , à espera que

design é muito melhor do que se fosse pensado por uma

seja essa a resposta que lhes sai da boca. Eles estavam

só pessoa. Somos incentivados a falar de coisas que nos

interessados em mim. Não era eu a implorar por um

interessam para que o patrão encontre clientes e projectos

15


R EFLE X Ã O

que vão de encontro ao que gostamos. Trabalho ao

Quando digo que cheguei onde cheguei por ter uma

mesmo tempo em mais ou menos 5 projectos que vão

grande dose de boa sorte, algumas pessoas tentam-

de coisas altamente tecnológicas como máquinas de

me contrariar. Não sei porque nos custa admitir que

diagnóstico de problemas em tubos de extração de gás

somos a força por detrás da nossa sorte. Será porque

a objectos de aplicação de dispositivos intra uterino em

achamos que muita gente luta tanto ou mais que nós

vacas. Passando por mesas de bilhar, armadilhas para

mas não chegou ao mesmo lugar? De verdade não sinto

ratazanas e embalagens para leite de bebé. Nunca há

que me possa responsabilizar totalmente pela minha

um momento aborrecido nem a sensação que todos os

"sorte". Demorei um pouquinho a perceber porquê, mas

dias são a mesma coisa. Tenho dois patrões que todos

cheguei lá: aquilo que eu sou, não sou sozinha. Qualquer

os dias me perguntam no que me podem ajudar. E

um pode saber "fazer design". Mas só alguns têm a

sei que estão a falar tanto na parte profissional como

"sorte" de terem aprendido a serem pessoas sensíveis

pessoal. Nas primeiras semanas entrei em parafuso

aos objectos , às emoções e às necessidades dos

quando me pediam para fazer coisas que nunca

seus utilizadores. Para isso é preciso uma combinação

tinha feito. Fui aprendendo à medida que era preciso.

especial de bons professores, educadores e amigos

Percebi depois, que até os designers seniores faziam o

, tudo numa só pessoa. E quem passou pela Escola

mesmo. Não era só eu que passava a vida a ver vídeos

Artística Soares dos Reis recebeu isso tudo. Só espero

no YouTube com tutoriais do SolidWorks ou que ia á

que o tenham agarrado.

biblioteca aprender sobre técnicas de fabrico. Estamos

Sou tão pequenina para dar conselhos do que quer

todos a aprender à medida que precisamos. E ainda me

que seja, mas há uma coisa que aprendi e que tento

marcaram lugar num curso de SolidWorks, para ajudar

manter sempre comigo. Nenhum projecto, trabalho ou

mais um bocadinho. Não me posso queixar. Por agora,

ideia é pequeno ou insignificante demais. Tudo nos está

parece que encontrei um lugar à minha medida

a ajudar a chegar onde temos que chegar. Eu sei que é


SARA ALMEIDA

DESIGNER EX-ALUNA DA EASR

o tipo de coisa que ouvimos depois de um falhanço qualquer, da boca de alguém que nos está a tentar animar, mas acredito mesmo que seja verdade. Não mencionei o facto de no 10º ano uma colega de turma ter morrido e de eu saber que de nós todos ela era a que teria sido a verdadeira artista com um futuro fantástico à sua espera, a ameaça do meu director de curso na universidade em me expulsar pelas recentes escolhas de tema para os meus projectos ou a minha rejeição para fazer o mestrado dos meus sonhos. Mas tudo isto faz parte de mim e do meu percurso. Encarem tudo como pesquisa! Um dia vão canalizar todos esses ensinamentos e aprendizagens no vosso trabalho.

“A Soares não é uma ilha isolada na sociedade." disse-me o professor Alberto no final do email. E ainda bem. Naquela altura tomei a decisão que teria mesmo que conhecer esta "não ilha" que na verdade se revelou como ponte. E que boa decisão que foi! 17


PER CURS O S

EDUARDO AFONSO DIAS um percurso com mais de 50 anos

Pensou. Projetou. Ensinou Design. Apaixonado pela fotografia, estudou escultura e mais tarde fez-se designer. Nasceu em Lisboa, em 1938 e com quase 77 anos é um dos mais reconhecidos designers portugueses, com mais de quinhentos projetos, desenhados, redesenhados e produzidos, em mais de 50 anos de profissão. Dada a sua longa experiência profissional, particularmente à frente da Uniteam, Intério e Uniforma, entre os anos 1977 e 1998, tornou-se um dos grandes conhecedores do universo empresarial português, defendendo sempre que a diferenciação de um produto, se constrói numa “articulada estratégia de comunicação, marketing, venda e distribuição dos mesmos, [sendo] o único caminho possível para a plena e sólida afirmação da economia portuguesa”. (Coutinho, 2014, p. 19)

A sua vasta e diversificada obra, passa pelo design de

incorporados e apropriados no modo de vida dos seus

interiores, design expositivo, design de produto, design

utilizadores, que lhes retirou o seu reconhecimento

gráfico, destacando ainda a sua atividade enquanto

como objetos de design.

professor de design e pioneiro em Portugal na gestão

Assume assim, que o design é antes de mais uma forma

do design.

de estar e ser. É uma atitude, um método, que dado

Norteado, segundo Daciano da Costa (cit in Pacheco,

as suas características é possível aplicar a numerosas

1984, p.25), por uma ‘inteligência prática e imaginação

atividades humanas. Como o próprio define, “Direi que

construtiva’, que se reflete numa vasta obra em vários

[o design] é uma forma de comportamento que recusa

domínios, foi no design produto que mais se destacou.

o impensado, a solução do acaso ou de inspiração, e

Enquanto no design de interiores, o seu trabalho, se

que, pelo contrário procura as informações e métodos

carateriza pela procura de um sentido de unidade,

corretos na resolução de um problema, adaptando-o da

gerando uma complementaridade entre o espaço

melhor maneira às necessidades dos homens” (Dias,

e o equipamento, através de soluções articuladas,

1984, p. 26). Uma atitude que exterioriza que deve

funcionais e simples, no design de produto, as mais

ser adotada por todas as atividades criadoras, desde

de 50 coleções e 400 peças de cutelaria, recipientes,

designers a arquitetos, de engenheiros a urbanistas,

faianças e utensílios do dia-a-dia, tornaram-se peças

no sentido de melhor sistematizar o processo projetual,

icónicas, que transformaram mentalidades, hábitos e

obtendo um produto final mais eficaz.

comportamentos. Os seus produtos foram de tal modo

Eduardo Afonso Dias, trabalhou com os maiores nomes


MICAELA REIS

PROFESSORA DE PROJETO E TECNOLOGIAS | EASR

Eduardo Afonso Dias fotografia @ Miguel Manso

do design português, como Sena da Silva, Frederico

nem poderia aprender na escola (...) O Daciano tinha

George, Daciano da Costa e Conceição Silva – tendo

uma prática muito mais refletida e profunda, (...) uma

herdado “destes mestres a prática metodológica e

grande preocupação com o desenvolvimento da

concepção do design como atividade globalizante”.

profissão e da disciplina de design. Com ele, tive um

(Dias, 2014, p. 115)

curso de iniciação artística ou ao design, uma espécie

Embora manifeste a importância de cada um destes

de Bauhaus à Portuguesa no seu atelier em Belém.

mestres na sua formação, foi sem dúvida, Daciano da

(...) No Frederico, consistia mais em desenhar, ouvir e

Costa, que mais peso teve no seu percurso, tornando-se

entender as fases do projeto, assim como as angustias

como o próprio recorda, ‘companheiros’. Quando refere

que o mestre tinha. Foi uma formação que considero a

os processos projetuais de cada um e os ensinamentos

melhor que poderia ter.” (Dias, A Fénix do design, 2014,

que assimilou e que o formaram e construíram enquanto

p. 119).

designer, Afonso Dias rememora:“No Frederico, era o

Foi entre o ouvido atento, que escutava o mestre e

‘enegrecer do papel vegetal’ (desenhador copista) e

a possibilidade de experienciar todas as fases da

ía ouvindo as poucas conversas que ele tinha sobre a

concepção e implementação de um produto, que se

disciplina, mas tudo com sofreguidão: as reflexões, o

construiu como designer. Embora reconheça que a

estilo de funcionar e a cultura do mestre. Com Daciano,

teoria é muito importante e decisiva, durante o processo

por seu turno, foi meter as ‘mãos na massa’ e aprender,

projetual, carateriza-se acima de tudo como um

no dia-a-dia, durante nove anos, aquilo que não aprendi,

pragmático. Reconhece-se na frase ‘Design possível’

19


PER CURS O S

Faqueiro de mesa Design 1971 Aço cromo-níquel AISI-304 1ª Produção: 1972 - Indústrias Lever Portuguesa, Lda Produção: MAFIL - Manuel Machado & Ca, Lda

GUME

Cutelaria para cozinha Design 1976_77 Aço inox T5-M0, cabo em madeira de faia maciça vaporizada com isolante epoxi Produção: 1978 - ICEL Lda | Benedita Mercados: Suécia - IKEA | Canada - Pier One

PLATO

Tábuas de corte para cozinha| Design 1982 Madeira de pinho colada por ultra-sons Produção: SOT Lda | Pernes Mercado nacional/ exportação Espanha, Dinamarca

e explica-a como a flexibilidade “de poder desenvolver

vindouras. “E o olhar continua a sorrir, quase miúdo,

produtos sem ferir os princípios estéticos, comerciais e

quando partilha apontamentos de estórias e episódios

industriais, no limite razoável”. (Dias, 2014, p. 131)

onde o seu idealismo, alguma ingenuidade, intuição e

Com esta forma de se posicionar, atravessou fronteiras

espírito de aventura o guiaram...como aquela vez em

e internacionalizou o seu nome e em conjunto o design

que foi sozinho à IKEA, em Almhult, levando unicamente

português, introduzindo noutros mercados, os seus

debaixo do braço o protótipo do que viria a ser uma das

objetos. Durante cerca de duas décadas, os seus

cutelarias mais vendidas nos anos seguintes pela marca

produtos, foram comercializados em toda a Europa,

sueca, a GUME, produzido pela ICEL." (idem, p.24)

destacando o mercado Escandinavo, mas também atravessaram oceanos e chegaram aos Estado Unidos, Canadá e Austrália.

O seu posicionamento no e sobre o design

Falar de Eduardo Afonso Dias, é em simultâneo falar da

Foi um dos pioneiros na prática de gestão do design em

história do design português e como ele hoje se desenha

Portugal e encara o designer não como um elemento

no presente. O seu percurso e a sua obra “podem ser

isolado na criação de um produto, nem como mero

a metáfora perfeita das potencialidades, vicissitudes e

desenhador, mas como um interveniente na gestão,

mal-entendidos do design no nosso país”. (Coutinho,

produção e promoção de um produto. Afonso Dias,

2014, p. 24). Portador de um olhar irónico e crítico, não

avoca que o grande problema do design de produto

deixa de continuar a acreditar no potencial das gerações

é conseguir “viabilizar as ideias (...) comercialmente e

@ Luísa Ferreira

OMO


MICAELA REIS

fotografias @ João Firmino

PROFESSORA DE PROJETO E TECNOLOGIAS | EASR

LYRICA

@ Miguel Manso

Conjunto de facas e pormenor de desenho Design 1976 Faiança vidrada pintada à mão (réplica em faiança das caixas latonadas) Produção: 1976 - Safaril Lda | Vanda das Raparigas Mercado exportação Noruega, Inglaterra e Irlanda

DIVERSA

Bases para quentes Design 1976 Madeira de pinho e bastões e esferas de cortiça natural Produção: 1976 - Sociedade Nacional Corticeira Lda Barreiro Mercado exportação Inglaterra, Irlanda e Canada

LIZA

Linha bandejas/ fruteiras Design 1977 Estrutura de apoio em pinho vaporizado, faia ou freixo Produção: 1977 - Intercoop crl | Lisboa Mercado exportação Suécia, Inglaterra e Alemanha

dominar isso conjuntamente com o espírito, a filosofia

(Dias, 2014, p. 136)

e a qualidade de produção” (Dias, 2014, p. 127), numa

Num

perspetiva, onde o design orienta as outras atividades

importância capital do design, “como um fator [de

económicas, estatísticas, marketing, vendas, etc e não

diferenciação e] transformação da sociedade e alicerce

se confina somente a uma concepção formal.

de um modelo sustentado de desenvolvimento”,

Nunca aceitou a visão que o tecido empresarial

para além de impedir a falência de várias empresas

português tinha e de algum modo ainda têm, em relação

nacionais, produziu um aumento de produção e

ao design e aos designers. Não corroborando com a

reforçou o posicionamento das mesmas empresas no

ideia do “design como um luxo desnecessário”, nem

mercado. Numa procura constante em sensibilizar para

que “os designers eram e são uns tipos que têm jeito

o verdadeiro sentido do design, no interior das políticas

para fazer uns bonecos e nada mais” (Dias, 2014, p.

estratégicas empresariais, tentou atualizar os sectores

127), no seu papel como designer procurou alterar

tradicionais de produção e alertou para a irrevogável

mentalidades, numa tentativa de reconhecimento da

necessidade da formação e requalificação dos recursos

importância da relação do designer com o produto e

humanos das empresas. Para Afonso Dias, “o mote era

com o mercado, ou seja, o designer deve assumir-se e

racionalizar a produção e corrigir os seus processos

ser assumido como um mediador. Para Afonso Dias, um

de fabrico, modernizar as linhas de montagem com

empresário que encare o design, como um investimento

a tecnologia e os recursos humanos, tornar os seus

tecnológico e a inovação como um luxo “está liquidado”.

produtos mais competitivos nos mercados internacionais

período

pós-revolucionário,

acreditando

na

21


PER CURS O S

AQUA

Copos de mesa Design 1977 Cristal Produção: 1978 - Crisal SA Mercados nacional/ exportação: Espanha

BICOR

Acessórios para cozinha Design 1985 Pinho maciço vaporizado e MDF lacado por imersão Produção: 1986 - Arbotécnica lda | Leiria Mercado Inglaterra e Filândia

BLOK

Contentores para alimentos Design 1985 Faiança vidrada com tampas estanques em MDF lacado Produção: 1986 - AR, António Rosa lda Mercado Suécia e Filândia

e, deste modo, contribuir para a efetiva industrialização

um determinado mercado, num determinado contexto.

do país.” (Coutinho, 2014, p. 18)

E, é com este propósito e neste sentido que deve ser

Refletindo sobre atividade, reconhece que “o design

ensinado o design. “Um pouco à semelhança das

é ainda uma jovem disciplina que tem pouco mais de

sessões de esclarecimento que havia no 25 de Abril, no

cem anos [e] 99,9% das pessoas não o entendem

âmbito das campanhas de alfabetização, falta fazer a

verdadeiramente. Se um Ministro da Educação foi

‘alfabetização do design’” (Dias, 2014, p. 136)

capaz de afirmar que no produto industrial a intervenção

No seu percurso como professor, reconhece que

do design era importante porque ‘alindava’ as peças, é

muito ficou por fazer e que é preciso “meter as mãos

porque não entende nada sobre o assunto”. (Dias, 2014,

na massa”, se queremos que o design deixe de ser

p. 135)

identificado como uma ato insulado e estanque na

Para Afonso Dias, temos ainda um grande caminho a

criação de um objeto e passe a ser encarado como uma

percorrer e que parte da solução para o design passa

ação proliferadora, que se alimenta e alimenta todas as

por um ensino onde seja visível a relação entre saberes

áreas que interseta. Ou seja, é necessário perceber que

e a realidade material. O design não pode ser entendido

o design não pode ser visto com um ato dinamizado,

como um elemento isolado, mas sim como uma prática

mas deve assumir-se como dinamizador. “Saibamos

inter e transdisciplinar, de possíveis conexões que

aprender com o seu percurso e obra” (Coutinho, 2014,

nos levam a conceber um determinado produto, para

p. 24)


MICAELA REIS

fotografias @ João Firmino

PROFESSORA DE PROJETO E TECNOLOGIAS | EASR

Cooktime

Conjunto compacto de caçarolas Design 1984 Corpos com tampas em chapa de cobre, interior com estanhagem, cabos e pegas em choupo vaporizado com isolante epóxi, componentes em latão Produção: 1985 - Metalútil lda | Oliveira de Azeméis Mercado Alemanha, Suécia e Dinamarca

COMBI

Caneca térmica Design 1992 (colaboração Filipe Cardoso) Dois copos numa mistura de dois polímeros (SAN) e ABS, com pigmentos orgânicos não tóxicos Produção: 1992 - Romão e Rosa Lda | Juncal, Porto de Mós Mercados nacional/ exportação: Espanha

Projetos mais relevantes: -1971 – Faqueiro Omo

-1976 – Série de cutelaria para cozinha Gume – Ikea -1977 – Tábuas de corte em madeira Plato

-1976 – Conjunto de caixas de faiança pintada Lyrica

-1976 – Bases para quentes em aglomerado de cortiça Diversa -1977 – Tabuleiros/ bandejas Liza -1977 – Copos Aqua

-1985 – Acessórios cozinha Bicor -1985 – Recipientes Blok

-1985 – Tachos e frigideiras Cooktime -1992 – Canecas térmicas Combi

Coutinho, B. (2014). Um percurso guiado por "uma inteligência prática e imaginação construtiva". In E. A. Dias, O design possível - 50 anos de profissão (pp. 15-26). Lisboa: Mude. Dias, E. A. (2014, Abril). A Fénix do design. 115-138. (R. Carreto, Interviewer) Dias, E. A. (1984, Maio). Eduardo Afonso Dias, Revista Exportar - ICEP. 25-26. Pacheco, F. A. (1984). Eduardo Afonso Dias: Faço o design possível... Jornal de Letras , 25-26.

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PER CURS O S

ISAMU NOGUCHI TANGÊNCIAS E INTERSEÇÕES ESCULTURA E DESIGN


ARTUR GONÇALVES

DIRETOR DE CURSO DE DESIGN DE PRODUTO PROFESSOR DE PROJETO E TECNOLOGIAS | EASR

Valores da escultura e do design “Estou sempre à procura de uma nova maneira de dizer a mesma coisa” Isamu Noguchi A atividade criativa na área das artes visuais exerce-se

Com base neste pensamento é fácil perceber a

sobre meios e espaços bidimensionais e tridimensionais,

intervenção do artista em outras áreas como a

convocando o tempo para poder ser vivenciada.

qualificação de espaços públicos através do desenho

Se nos focarmos nos objetos tridimensionais, a começar

de jardins, fontes, parques de lazer e, de especial

pelos relevos, até às peças isoladas no espaço,

interesse para nós, na área do design.

estamos perante uma categoria a que chamamos

A criação e transformação de objetos de que se

escultura. Escultura, como expressão artística, será a

ocupa o design não deixa de ter, nos valores estéticos

que recorre a elementos expressivos - a forma, a cor,

e simbólicos, no discurso visual que tais valores

o material, a estrutura e a outros elementos conexos,

envolvem, uma atenção e uma aposta fundamental. O

articulando-os pela composição e relação de escala

que há a que acrescentar a tudo isso são os valores

com o homem, produzindo artefactos que patenteiam

do uso, da intervenção prática que os objetos têm na

valores estéticos e valores simbólicos. Efetivamente, é a

realização de atividades humanas, e os valores que

ênfase comunicativa e representativa que distingue uma

decorrem da necessidade de viabilizar a sua produção

escultura da generalidade dos objetos tridimensionais.

e a distribuição para chegarem, de facto, à vida das

A obra de escultura emerge, de uma forma única e

pessoas.

assertiva, do poder criativo e do discurso do seu autor.

Assim, para Isamu Noguchi, os objetos utilitários são

Para Isamu Noguchi tudo é escultura, ou seja, todos

esculturas que facilitam e enriquecem a vida trazendo

os objetos tridimensionais estão marcados por valores

o encanto, o refinamento e a expressividade emocional

estéticos e simbólicos. Esta afirmação, algo polémica,

para a vida quotidiana.

resulta da ideia de que, numa visão de arte próxima da

Isto não significa que defenda da dissolução da

vida, todo o espaço é participante na comunicação e

escultura ou preconize o primado de uma arte aplicada.

as criações artísticas não podem ser apenas as que

Reconhece apenas que não interessa ter uma visão

se exibem em galerias ou museus, apoiadas sobre

acabada do mundo, ou ser senhor da última palavra

pedestais. Advoga, apoiado nestes pressupostos, uma

sobre a arte.

escultura sem peanha…

25


PERCURS O S

A verdade dos materiais "As formas superficiais e as funções podem ser imitadas, mas as qualidades não" Isamu Noguchi

Ao recorrer a elementos físicos para se manifestar,

indivisa que se auto afirma na sua nobreza e significado.

a criação artística acolhe uma infinita variedade de

O artista reservava uma parte muito substancial

materiais que transforma e modela. Isamu Noguchi

do seu tempo a visitar as pedreiras, as fábricas de

elege o material como um elemento decisivo para

transformação de rochas, metais ferrosos e ligas de

concretização da intenção comunicativa, demonstrando

fundição, as olarias e as oficinas de preparação das

um respeito extremo pelas propriedades gerais e

pastas cerâmicas, assim como se interessava pelas

específicas que este apresenta e, dessa forma, uma

propriedades dos novos materiais tais como o vidro e

sensibilidade, cara à cultura japonesa, de observação

o aço inoxidável, retirando daí um conhecimento mais

e de deleite para com o que natureza nos dá. Esta

profundo sobre a essência de cada um, parecendo que,

atenção ao cerne físico e simbólico do material, num

de uma forma autêntica, a ideia a comunicar já estava

certo contexto histórico e civilizacional, conduz a uma

no material.

cuidadosa formulação de intervenções cujo objetivo é

Mas nada de medos e de interdições face ao material – a

o de mobilizar a matéria para se definir o que se diz e

“força” e a visão do artista revelam-se verdadeiramente

como se diz.

face às interrogações e incertezas que enfrenta,

O material não pode ser um mero suporte ou veículo

acreditando que o seu discurso vai juntar-se, como um

de algo externo. Tem que ser uma parte fundadora e

só, à afirmação primordial da matéria.


ARTUR GONÇALVES

DIRETOR DE CURSO DE DESIGN DE PRODUTO PROFESSOR DE PROJETO E TECNOLOGIAS | EASR

O experimentalismo "Pode-se descobrir como se faz algo e depois fazê-lo, ou fazer qualquer coisa e depois descobrir como se faz" Isamu Noguchi O atravessamento das fronteiras da escultura, do design, da qualificação do espaço público e da cenografia demonstram a natureza inquieta deste criador. Em vez de dispersão, o que devemos ver nisso é um movimento de interesses que se articulam naturalmente em função dos problemas que lhe interessavam. Na pequena escala e na grande escala, em esboços livres e em desenhos rigorosos, no material comum ou no material nobre, Noguchi trabalhava em modelos e em obras, num processo que combina o avanço sobre o material e a respetiva reflexão/aprendizagem e vice-versa. O experimentalismo é a faceta viva, criativa e interventiva que complementa o respeito pela verdade dos materiais. Esta era a sua forma de, reiteradamente, procurar e encontrar novas soluções para os problemas permanentes.

27


PER CURS O S

nota biográfica:

Nasceu no ano de 1904 na cidade norte americana de Los Angeles, filho de Léonie Gilmour, uma jornalista e editora literária, e de Yone Noguchi, poeta japonês. Viveu a infância no Japão, regressando aos Estados Unidos aos 13 anos de idade. Iniciou estudos na área da Medicina que abandonou para se dedicar em pleno à sua grande paixão – a escultura, iniciando a sua formação sob a orientação do escultor Onorio Ruotolo. Entre 1927 e 1929 Noguchi viveu em Paris graças a uma bolsa da Fundação Guggenheim,

trabalhando

como

assistente de Constantin Brancusi, um escultor de vanguarda cujo trabalho o fascinava, tendo este encontro alterado radicalmente a sua visão sobre a escultura numa senda de exploração dos conceitos de abstracionismo, refinamento formal, lirismo e expressão emocional. O reconhecimento público chegou em


ARTUR GONÇALVES

DIRETOR DE CURSO DE DESIGN DE PRODUTO PROFESSOR DE PROJETO E TECNOLOGIAS | EASR

Isamu Noguchi

foi um criador independente, um explorador

de conceitos e processos, avesso a movimentos e a “escolas” de arte com trabalho que se afirmou na área do desenho, da escultura, da cenografia, do design e da qualificação do espaço público.

1938 com a concretização do relevo de grandes

subjacente a essa confrontação bélica.

dimensões, celebrando a liberdade de imprensa, que

A par da criação na área da escultura Noguchi

criou para o portal do edifício da Associated Press,

desenvolveu continuamente um importante trabalho na

localizado no Rockfeller Center, em Nova Iorque.

área da cenografia para espetáculos de bailado e dança

Esta década de 30, e início da de 40, foi pontuada

moderna, colaborando com nomes da coreografia

por diversas viagens à Ásia, México e Europa, onde

como Merce Cunningham, George Balanchine e Martha

contactou com as comunidades artísticas locais,

Graham.

estabelecendo aí muitas amizades. Esta faceta de

Colaborou com arquitetos como Kenzo Tange e Louis

viajante que procura a relação direta com as realidades,

Kahn em projetos de espaços públicos, praças, jardins,

foi uma das que manteve ao longo da sua vida.

fontes e parques lúdicos, lutando pela aproximação da

O conflito da 2ª guerra mundial, em que há uma

arte às pessoas e pela qualificação estética e simbólica

confrontação total entre os Estados Unidos da América

dos ambientes abertos ao usufruto de todos os cidadãos.

e o Japão, constitui um choque profundo na via de

Nesta área destaca-se o projeto completado em 1958,

Isamu Noguchi. As sociedades que corporizavam as

para o jardim do edifício sede da UNESCO, em Paris,

suas próprias raízes estavam em guerra. Tal facto vai

por indicação do arquiteto Marcel Breuer.

refletir-se na sua postura pública que, daí em diante, vai

Abraçou desafios na área do design concebendo objetos

dar relevo à intervenção cívica na defesa da democracia

de tipologias diversificadas para produção industrial,

e das liberdades.

em colaboração com empresas como a Zenith Radio

Terminada a guerra em 1945, o artista volta ao Japão,

Corporation, Herman Miller e Knoll Company. A coleção

passando aí alguns anos nos quais o seu trabalho

das

artístico se focou na exploração das questões dolorosas

comercial, continuando ainda hoje em produção.

criadas pelo conflito e pelo choque de civilizações

Faleceu em 1988 na cidade de Nova Iorque.

“Luminárias Akari”

teve um enorme sucesso

29


REFLE X Ã O

como o conhecimento humano é moldado pela ficção

Imagem 1 - http://adsoftheworld.com/media/print/levis_audience


MARTA VARZIM

PROFESSORA | ARTES DIGITAIS E MULTIMÉDIA ESCOLA SUPERIOR DE ARTES E DESIGN | MATOSINHOS

introdução A nossa noção de realidade é limitada e por essa razão, a mente humana cede, impotente, à sucção das histórias. Além disso, constata-se com facilidade que por muito que lutemos em manter a lucidez ou a ligação à realidade, a verdade é que não sabemos resistir à generosidade dos pensamentos e dos seus mundos alternativos. Enquanto o nosso corpo está preso a um aqui e a um agora, a nossa mente liberta-se e põe-nos a divagar sem qualquer restrição por terras do faz-de-conta. A nossa imersão pelas narrativas ficcionais vai muito além dos sonhos e das fantasias, das canções, da literatura e dos filmes. Há muito mais na vida humana que nos mostra que esta está impregnada por histórias ficcionais.

as histórias que são estórias A nossa incapacidade de perceber o que realmente

processos de infindáveis inferências semióticas. Nessa

somos e o que neste mundo fazemos, atira-nos para

produção, procuramos superar o dualismo ontológico

todo o tipo de situações que, de alguma forma, nos sirva

entre o ideal e o real e a experiência e a razão. Os

de consolo e de recompensa. Dessa vulnerabilidade

objetos que produzimos para o mundo real e a nossa

emerge o “cogito do sonhador“ (Bachelard 2001: 21),

experiência fundem-se na percepção sensorial e

fruto de uma atividade psíquica em incessante busca

formam, a partir daí, um novo ciclo: novas imagens são

de autoconhecimento. Nesse decurso, surgem imagens

geradas de forma invocada ou subjetiva e passam a

perceptivas (Arnheim, 1998: 27) - impulsionadas por

ser reconstruídas, reinterpretadas e ficcionadas com

desejos, sonhos e vontades - e através da incessante

a ajuda da memória e da imaginação (Damásio, 1995:

busca de autoconhecimento, ativam-se e atualizam-se as

112; 2000: 177-178). Uma vez que a nossa percepção

nossas infinitas potencialidades mentais. Este paradoxo

nunca é perfeita porque é construtora de ajustamentos

entre “incapacidade” e “infinitas potencialidades” é o

(Damásio, 2000: 177), nós não sabemos tudo e é

que efetivamente nos impulsiona para uma produção

improvável que alguma vez venhamos a saber o que

desmedida de imagens-símbolo e nos mergulha em

é verdadeiramente a realidade. A nossa relação com o

31


REFLE X Ã O

real é, portanto, construída, é artificial. E nesse sentido,

sentido. Do exposto não admira então que se diga que

todas as histórias tendem a ser estórias.

os seres humanos são “criaturas de histórias de ficção”

Ao não sermos capazes de ter uma consciência

(Morin, 1972; Metz, 1980; Bachelard, 2001; Boyd,

total sobre a realidade, a imersão pelas narrativas

2009; Damásio, 2010; Gottschall, 2013). Delas parece

ficcionais sobrevém como alternativa, tornando-se parte

dependermos para conseguirmos significar o mundo e

integrante dos processos cognitivos de produção de

todos os elementos que o constituem.

Imagem 2 - Screen shot do Filme Weekend de Jean-Luc Godard (1967).

a ficção

Os seres humanos são então criaturas de histórias e não

palavras, perdemos um terço das nossas vidas

obstante, estas tocam quase todos os aspetos das suas

afundados em fantasias. Sonhamos com o passado,

vidas.

com as nossas vitórias e fracassos e com as coisas

Jonathan Gottschall, especialista em literatura e

de deveríamos ter dito mas não dissemos. Sonhamos

evolução humana, acredita que temos uma grande

com coisas perfeitamente mundanas, nomeadamente

tendência para contarmos algumas dessa melhores

imaginando como lidar com um conflito na escola ou

histórias a nós próprios e acredita que as memórias que

no trabalho. E sonhamos ainda duma outra forma mais

usamos para as formar são ficcionadas pelo corpo, ora

intensa: internamente, realizamos filmes onde todos os

em forma de pensamentos, ora em forma de sonhos.

nossos desejos – mais realistas ou mais efabulados –

Segundo estudos descritos por Gottschall, em média,

vão sendo testados e realizados.

os sonhos têm uma duração de catorze segundos e

O imperativo humano para fazer e consumir histórias é

surgem cerca de duzentas vezes ao dia. Por outras

então algo muito profundo. Mas porque estaremos nós


MARTA VARZIM

PROFESSORA | ARTES DIGITAIS E MULTIMÉDIA ESCOLA SUPERIOR DE ARTES E DESIGN | MATOSINHOS

os simuladores de voo permitem aos pilotos treinar o voo

impregnados de narrativas ficcionais? liberta-nos

em segurança, as ficções treinam-nos – em segurança

temporariamente dos nossos problemas. Porém, ao

– a enfrentarmos os maiores desafios do mundo real,

fazê-lo, enreda-nos num outro conjunto de perturbações,

projetando-nos para intensas simulações de problemas

nomeadamente em cenários imaginários de luta e

paralelos àqueles que temos de enfrentar na realidade

stresse, de confrontos mas também de superações.

do dia-a-dia. Assim como os simuladores, a maior

Há, portanto, um paradoxo na ficção e este já havia

virtude da ficção é poder oferecer uma fértil e intensa

sido notado por Aristóteles na sua obra “Poetics” (350

experiência sem nos magoarmos ou morrermos no final.

a.C): nós somos atraídos pela ficção porque ela dá-nos

No concreto, procuramos e produzimos histórias por

prazer. Efetivamente, a ficção é aonde as pessoas vão

gostamos das experiências que estas nos proporcionam

praticar as principais habilidades da vida humana e a

e porque, de alguma forma, beneficiamos com a sua

experiência emocional é o principal benefício da ficção.

prática. Além disso, o potencial destas produções, leva-

Esta oferece-nos sensações pelas quais não temos que

nos, no limiar, a estar bem próximos de um demiurgo,

temer, na medida em que, com ela, podemos amar,

capaz de tudo criar e tudo transfigurar, simplesmente

matar, condenar, desculpar, ter esperança, ter pavor

através de uma vontade ou de uma crença. Assim, a

ou horror sem o prejuízo real de passarmos pelos

ficção, para além de nos libertar dos constrangimentos

constrangimentos que estas experiências normalmente

do tempo e do espaço e de estar mais em conformidade

envolvem na realidade. Este argumento que não é novo

com as nossas vontades e sonhos, realiza o profundo

para a psicologia evolucionista, mostra que as ficções

desejo humano de transcendência.

Segundo

Thomas

Hobbes

a

ficção

são como simuladores para a vida humana: assim como

Imagem 2 - Screen shot do Filme Weekend de Jean-Luc Godard (1967).

33


R EFLE X Ã O

os neurónios espelho e a teoria da simulação Os neurónios espelho e a teoria da simulação

que que alguns estados mentais são transferidos

Entre as décadas de 1980 e 1990, um grupo de

por contagio, levou os referidos cientistas a afirmar

neurocientistas italianos descobriu acidentalmente que

que os neurónios espelho estão na base da nossa

temos neurónios espelho. Deste então, tem havido uma

capacidade de gerar simulações ficcionais, dentro

corrida ao estudo desses neurónios com o intuito de

das nossas mentes.

se medir a eficácia do seu alcance e de testar a sua capacidade de “contágio”.

Mais recentemente, o psiquiatra e especialista em ciências comportamentais, Marco Iacoboni

De um conjunto de experiências realizadas resultou a

veio explicar porque é que as representações

convicção de que temos redes neurais especializadas que

cinemáticas nos dizem tanto e nos parecem ser tão

se ativam especificamente quando executamos uma ação

autênticas. Segundo este, esta simbiose acontece

ou experienciamos uma emoção e, de igual forma, quando

“because mirror neurons in our brain

observamos alguém a executar uma ação ou a vivenciar uma emoção. Esta revelação que veio mostrar porque é

re-create for us the distress we see on the screen. We have empathy for the fictional characters – we know how

they’re feeling – because we literally

experience the same feelings ourselves. And when we watch the movie star kiss

on screen? Some of the cell firing in our brain are the same ones that fire when we kiss our lovers. “Vicarious” is not

a strong enough word to describe the effect of these mirror neurons” (Iacoboni, 2008: 4).

IImagens da experiência de Meltzoff (1977) que mostra a capacidade que uma criança com 2 a 3 semanas de idade tem em imitar posturas faciais de um adulto. A mesma experiência realizada a um chimpanzé com 2 meses de idade demonstra a mesma capacidade de resposta. http://www.replicatedtypo.com/sticking-the-tongue-out-earlyimitation-in-infants/6082.html


MARTA VARZIM

PROFESSORA | ARTES DIGITAIS E MULTIMÉDIA ESCOLA SUPERIOR DE ARTES E DESIGN | MATOSINHOS

o alcance da ficção hiper-realista e o da ficção abstrata A distinção entre realidade e ficção implica a

A “suspensão voluntária da descrença” de Samuel

compreensão de que não há representação abstracta

Taylor Coleridge (1817), o "Efeito Pigmalião” da

separada do ato material e biológico de a gerar.

psicologia positiva e o “conceito do inquietante” de

Christian Metz defende que na base de qualquer ficção

Ernst Jentsch (1906) rebatizado por Masahiro Mori como

está a relação instância real / instância imaginário e

“O Vale da Estranheza” (1970) vêm justamente mostrar a

que o equilíbrio que se estabelece entre estes dois

gradação exata dos regimes de crença adoptados pelo

polos pode variar duma técnica ficcional para outra. Ao

espectador e explicar a vontade deste aceitar como

explicar como o imaginário interfere na percepção que o

verdadeiras as premissas de um trabalho de ficção

indivíduo tem sobre a realidade, Metz afirma que por muito

mesmo que elas sejam fantásticas, impossíveis ou

que os espetáculos sejam extravagantes, subjetivos ou

contraditórias relativamente à realidade. É a suspensão

abstratos, por muito que as suas ligações se afastem

do julgamento em troca da premissa de entretenimento,

da experiência do real, há sempre oportunidade para

ou, a aceitação de um certo nível de improbabilidade

que o seu sentido se constitua: «o saber do sujeito dá-

em benefício da história que permite que o espectador

se mesmo quando este acha o espetáculo estranho»

se envolva com o acontecimento.

(Metz, 1980: 58-59).

Imagem 5 - Screen shot do vídeo Solipsist de Andrew Thomas Huang, 2012.

35


R EFLE X Ã O

Numa breve análise aos dois polos da ficção, constata-

Sobre o assunto, o designer de vídeo jogos James Wallis

se que a ficção hiper-realista tende a apresentar a vida

salienta que: “Human beings like stories. Our brains

como nós realmente a experimentamos. Nessa medida,

have a natural affinity not only for enjoying narratives

o hiper-realismo tem interesse como experiência no

and learning from them but also for creating them. In the

sentido em que, fielmente nos ajuda a ver o que é ficção,

same way that our mind sees an abstract pattern and

mostrando-nos o que ela não é. Todavia, a ficção hiper-

resolves it into a face, our imagination sees a pattern of

realista falha pelas mesmas razões que falham as outras

events and resolves it into a story”. (Wallis, 2007: 69).

ficções mais extravagantes, subjetivas ou abstratas,

Esta afirmação de Wallis mostra que extraímos

na medida em que todas elas apresentam o mesmo

automaticamente

ingrediente-chave: o enredo artificial de problemas.

recebemos e, no caso de não haver nenhuma história

Na verdade, não importa o quão próximos estamos

em concreto, a tendência é a de inventarmos uma.

da representação da realidade, pois saberemos

Muitos são os exemplos e as experiências deste

sempre que esta é uma representação. O que nos vai

fenómeno que mostram o quão indispostos estamos a

fazer aceitá-la não é a afinidade perante a qualidade

ficar sem histórias e o quão avidamente trabalhamos

ou regime de representação mas sim o interesse ou a

para impor uma estrutura numa história que tem por

vontade que temos em usufruir dessa experiência.

base uma referência sem sentido. Com isto, queremos

Quanto à ficção abstrata, constata-se que a evolução

dizer que, independentemente do grau ou regime de

da literacia visual, nomeadamente a capacidade de

realidade dessas histórias, há no ser humano uma

interpretar representações simbólicas abstratas, tem-

inequívoca tendência para imbricar o relato presenciado

nos possibilitado discernir com algum à-vontade a

com o contexto vivencial (experiência pessoal). É o que

essência de muitas figurações. Segundo a psicologia,

afirma Morin (1972: 114) e Damásio (2000: 366; 2010:

isto acontece porque a mente humana esteve sempre

264): afim de podermos assimilar, (re)interpretamos o

predisposta para detetar padrões mesmo no seio do

relato - abstracto ou concreto - fazendo pontes entre

caos. O “software mental” que nos põe em alerta quando

a conjunção e a disjunção das nossas memórias e

vemos um rosto humano ou uma figura, é o mesmo

conhecimentos armazenados.

que nos permite ver ou associar formas familiares em elementos com figurações abstratas como as nuvens, a pintura ou a escultura. Para esta ciência, esta capacidade humana é uma parte do “design da mente” que nos ajuda a perceber os padrões mais significativos do nosso ambiente. Isto explica que a nossa apetência por dar um significado aos padrões que vemos, traduz na verdade a nossa ânsia por histórias.

histórias

das

informações

que


MARTA VARZIM

PROFESSORAS DIGITAIS E MULTIMÉDIA ESCOLA SUPERIOR DE ARTES E DESIGN | MATOSINHOS

conclusão Em geral, todas estas pesquisas mostram que somos

dá-nos terreno seguro para treinarmos inseguranças e

obras-primas das nossas próprias construções mentais

incertezas e tudo aquilo que necessitarmos. Além disso,

e fragmentos da nossa imaginação. Pensamos que

as histórias resultantes da ficção - ou se preferirmos do

somos muito estáveis e “reais” e temos a ideia de que as

onirismo intelectual (Bachelard, 2001), são condição de

nossas memórias restringem a nossa autocriação, mas

integridade do conhecimento e a “cola” da vida social

na verdade são os nossos sonhos e as nossas crenças

humana. São elas que definem grupos culturais e são

que as modelam. Nós somos fruto das nossas histórias

as mesmas que os mantêm coesos. Nós vivemos no

pessoais. E essas são para nós, mais verdadeiras do

mundo do “faz de conta” porque não podemos viver fora

que a própria realidade.

dele. O mundo do “faz de conta” é o lugar de regulação

A ficção é, então, a nossa maior e melhor habilidade

que nos garante algum equilíbrio homeostático. Ao

enquanto seres. Ela é um dos elementos essenciais do

serem inventadas formas de consolo e de recompensa

nosso nicho evolucionário. E se a ela estamos ligados é

– e como vimos não importa o grau de verosimilhança

porque, na sua essência, a ficção é benéfica para nós:

com a realidade – o ser humano cumpre, dentro das

alimenta a nossa imaginação, reforça hábitos morais,

suas possibilidades, a sua reconciliação com o mundo.

Referências bibliográficas Arnheim, R. (1980). Arte & Percepção visual. Uma Psicologia da Visão Criadora. S. Paulo: Thomson. Bachelard, G. (2001). O Ar e os Sonhos. São Paulo: Martins Fontes. Boyd, B. (2009). On the Origin of Stories: Evolution, Cognition, Fiction. Cambridge, MA: Harvard University Press. Damásio, A. (1995). O Erro de Descartes: Emoção, Razão e Cérebro Humano. Mem Martins: Europa-América. Damásio, A. (2000). O Sentimento de Si: O Corpo, a Emoção e a Neurobiologia da Consciência. Mem Martins: Europa- América. Damásio, A. (2010). O livro da Consciência. A construção do cérebro consciente. Maia: Circulo de Leitores. Gottschall, J., (2013). The Storytelling Animal, How Stories Make Us Human. New York: Houghton Mifflin Harcourt. Iacoboni, M. (2008). Mirroring People: The Science of Empathy and How We Connect with Others. New York: Picador. Metz, C. (1980). O Significante Imaginário. Psicanálise e Cinema. Lisboa: Livros Horizonte. Morin, E., (1972). El cine o el hombre imaginario, Barcelona: Seix Barral. Reeves B., & Nass C. (2003). The Media Equation: How People Treat Computers, Television, and New Media Like Real People and Places Stanford University: Center for the Study of Language and Information. Wallis, J. (2007). Making Games that Make Stories. Cambridge, MA: MIT Press. Textos em linha Hobbes, T. (1681), Animation / Fiction. http://csmt. uchicago.edu/ glossary2004/animation.htm. Acedido em 19 Abril de 2014.

37


R EFLE X Ã O

Construction Toys Make Better Boys1

Se tivesse que escolher uma categoria de objectos que reflicta todas as relações sociais e económicas, artísticas e culturais do passado e do presente, escolheria certamente os brinquedos. Ao procurarmos analisar o funcionamento desta parte central das diversas culturas materiais chegamos à conclusão de que se trata, realmente, de um objecto extremo2 com características muito peculiares. De forma geral, os objectos são estudados através de uma abordagem que articula o valor funcional (para o que serve, qual a sua real função) e o seu valor simbólico (qual é a imagem que o objecto produz, qual a ideia que veicula). Alguns objectos possuem um valor exclusivamente funcional, como um martelo ou um abrelatas, mesmo que, por vezes, possam ser extraídos da sua função para serem utilizados pelo seu significado (a da foice e o martelo no símbolo comunista é um exemplo disso). Mas, geralmente, o seu desenho, produção e consumo estão associados á sua função e não á sua imagem ou significado.

Outros objectos não possuem nenhum valor funcional permanecendo, contudo, o seu valor simbólico, como acontece com os objectos religiosos ou com as obras de arte. Neste caso não existe uma “utilidade”, pois a função da obra de arte está exclusivamente ancorada no seu valor simbólico. Os objectos simbólicos existem alimentados pela sua capacidade em veicular significados e não pela sua utilidade enquanto ferramentas. Através do estudo destas duas categorias, função e representação, de como elas se articulam e se afectam mutuamente, constrói-se o discurso da cultura material, o qual visa compreender a identidade cultural de um povo ou de um período histórico através do estudo dos artefactos, dos objectos do seu uso e do seu sentido. No caso dos brinquedos esta distinção torna-se insuficiente, pois o seu valor simbólico reside na base do seu valor funcional. Por outras palavras o brinquedo serve para uma função, o brincar, porque significa alguma coisa. E este significar é o que faz dele um objecto educativo, transportador de valores, saberes e tradições. Como refere o filósofo francês Roland Barthes3, é essa a razão pela qual o brinquedo é um objecto totalmente socializado. Uma “imagem manipulável em três dimensões”4 que possui todos os símbolos e os significados da sociedade adulta que nela se reproduz num projecto, nem sempre voluntário ou explícito, de reprodução intelectual.

Este frase encontra-se numa caixa de construções The Constructioneer da Urbana Manufacturing Company, Urbana, Ohio de 1947 Brougère, Gilles. Brinquedo e cultura. São Paulo: Cortez, 2000. 3 Bathers, Roland. Mythologies. Paris: Seuil, 1957 4 Brougère, Gilles. Brinquedo e cultura. São Paulo: Cortez, 2000 1 2


MARCO GINOULHIAC ARQUITETO PROFESSOR FAUP

Quando o brinquedo é um artefacto feito para ser brinquedo (ou seja quando não é um objecto vulgar adaptado, pelo contexto da brincadeira, a brinquedo), é algo pensado e produzido pelos adultos para as crianças e inserido numa narrativa educativa que visa a reprodução daquilo que é considerada a parte mais importante ou significativa de cada

1920 reproduzindo os veículos reais que iam circulando, cada vez mais numerosos, pelas ruas da Europa e dos EUA; ou, ainda, todos os brinquedos que repetiam, em miniatura, a cultura doméstica do pós-guerra com os seus numerosos eletrodomésticos e as suas rotinas, deixando claras as suas configurações sociais e familiares; e, em geral, todos aqueles que permitiam às crianças brincar com instituições do universo adulto como a polícia, os bombeiros, os correios ou a escola.

sociedade.

1935 - soldados de chumbo da Manoil Brothers

Os Gift número 1,2,3 e 4 de Froebel

Pensamos, por exemplo, nos soldadinhos de chumbo

O poder educativo dos brinquedos não é, contudo,

que participaram nas brincadeiras de imensas crianças entre o século XVIII e XX, representando a cultura militar de cada época; ou os carrinhos em metal que começaram a ser produzidos na Alemanha na década de

exclusivo do século XX; desde o século XVIII vários pensadores, entre os quais o filósofo inglês John Locke (1632 – 1704), a escritora irlandesa Maria Edgeworth (1768 –1849)5 , ou ainda, um pouco mais tarde, já no

39


R EFLE X Ã O

Construction Toys Make Better Boys

(continuação)

século XIX, o suíço Johann Pestalozzi (1746-1827) ou

permitiram um sustancial aumento da produção e do

o alemão Friedrich Fröebel (1782–1852), defenderam a

consumo dos brinquedos. Os brinquedos da segunda

importância do uso de artefactos específicos utilizados

metade do século XIX e de todo o século XX foram

em brincadeiras com as crianças de forma a facilitar a

considerados como uma oportunidade para satisfazer

aprendizagem. Entre esses Fröebel, que ficou conhecido

uma das inquietações mais antigas e universais que o

pela invenção do Kindergarten (jardim de infância),

ser humano possui: a sua reprodução intelectual.

chegou a desenvolver dois conjuntos de objectos: os primeiros, que chamou de gift, tinham a função de

Uma das disciplinas que manteve uma maior ligação às

educar à descoberta através do entretenimento; os

rotinas e aos brinquedos dos programas Froebelianos

segundos, chamados de actividade (occupations),

foi a Arquitectura. O próprio Fröebel, que chegou a

serviam para treinar a criação através do exercício do

frequentar um curso de Arquitectura, reforçou esta

poder. Ainda hoje se encontram estes conjuntos em

ligação tanto nos seus textos como nos manuais de

muitas escolas infantis do mundo inteiro, estando na

apoio aos artefactos. O reconhecimento das formas

base dos programas educativos e, em geral, de muitos

e a composição tridimensional são competências

brinquedos para a primeira infância.

claramente ligadas aos gifts e não é por acaso que o

Os brinquedos de Fröebel, faziam parte integrante de

próprio arquitecto Frank Lloyd Wright (filho de uma

um programa de ensino inspirado na mineralogia que

educadora de infância com formação froebeliana), teve

procurava desenvolver na criança capacidades de

na sua autobiografia o cuidado de relembrar que em

compreensão e de criação de formas geométricas bi

criança brincou muito com os gifts e que este brincar

e tridimensionais, além de competências técnicas e

teve um efeito considerável na sua vida profissional.

manuais. A partir do momento em que foi homologada uma teoria pedagógica que integrava os brinquedos

A ligação entre a Arquitectura e os brinquedos, além

como ferramentas educativas, todos os sectores do

de ser uma das que mais cedo se encontra no instinto

saber procuraram encontrar a melhor forma de serem

constructivo das crianças (que se manifesta de cada vez

representados e reproduzidos para que existisse, já na

que estas empilham cubos, caixas ou peças de Lego) é,

infância, uma reprodução disciplinar.

também, uma das mais antigas e que, de certa forma,

Além

das

alterações

sociais,

económicas

(nos

acompanha e representa as várias fases da própria

próprios meios e técnicas de produção), esta vontade

disciplina da Arquitectura. Assim, os gift de Fröebel

“educativa” foi uma das razões que, desde o século XIX,

serviram de modelo para uma grande quantidade de

“We have recommended the use of plain, regular solids, cubes, globes, etc. Made of wood, as playthings for children, instead of uncouth figures of men, women and animals. For teaching arithmetic, half inch cubes, which can be easily grasped by infant fingers, mat be employed with great advantage; they can be easily arranged in various combinations (…)” Practical Education. Vol II. Chap. XVI. Geometry. Maria Edgeworth e Richard Lovell Edgeworth. p 40. 1798 5


MARCO GINOULHIAC ARQUITETO PROFESSOR FAUP

caixas de construção que, desde o século XIX, invadiram

formais da Arquitectura. Se nas primeiras décadas do

o mercado prometendo a renovação da educação em

século XX a Anker produziu conjuntos inspirados nas

Arquitectura. Por vezes inspiradas na simplicidade de

fortalezas da primeira guerra mundial, mais tarde, a sua

sólidos básicos e auxiliadas por livretes de instruções

produção inspirar-se-á no revivalismo, no eclectismo

com modelos mais complexos, outras, reproduzindo

nas linguagens da arquitectura industrial que se iam

edifícios inteiros ou, ainda, tecnologias construtivas.

alastrando por toda a Europa.

1932 Caixa de construçõe da Anker-Steinbaukasten para a construções do Partenon

A firma alemã Anker-Steinbaukasten foi uma das que melhor representou estas dinâmicas. Começou a

Imagem publicitária de 1920 da Meccano

sua produção em 1880 e rapidamente se tornou uma verdadeira multinacional com marca registada em vários países europeus e nos EUA. Se, por um lado, as peças produzidas mantiveram-se iguais até hoje, os modelos de referência nos manuais de instruções desenhados por arquitectos foram-se adaptando às alterações

A Arquitectura do aço, que em finais do século XIX ostentava a grandiosidade da engenharia e da indústria, teve uma sua versão reduzida pelo Meccano na Europa, e pelo Erector Set nos EUA. Ambos nascidos nos primeiros anos do século XX, o Meccano e o Erector Set

41


R EFLE X Ã O

Construction Toys Make Better Boys

(continuação)

educaram, de forma muito idêntica, milhares de crianças

às vanguardas artísticas alastraram-se ao desenho

durante praticamente todo o século através das suas

de brinquedos, como na escola Bauhaus em Dessaut

peças metálicas perfuradas com as quais era possível

(1919-1933). Os brinquedos além de representar

construir uma enorme panóplia de máquinas e veículos,

frequentemente um tema para os exercícios nas várias

edifícios ou outras criações mais ou menos complexas.

artes, eram objecto de produção e venda por parte da instituição. Ainda hoje, a firma de brinquedos suíça Naef

Os dois brinquedos ficaram também conhecidos pelo

tem no seu catálogo brinquedos desenhados por Alma

esforço dos seus produtores em divulgar a cultura

Siedhoff‐Buscher, em 1923, ou por Ludwig Hirschfeld‐

técnica e científica da época através da publicação

Mack, em 1924.

de revistas e concursos. A Meccano Magazine, por exemplo, foi publicada entre 1916 e 1963 com um grande sucesso de venda junto de várias camadas etárias e sociais.

As cores primárias e os sólidos elementares procuravam quebrar a tradicional ligação entre o mundo imaginário dos brinquedos e o real partindo da ideia que o primeiro era, normalmente, uma imagem reduzida do segundo. Havia subjacente uma clara vontade em transmitir às novas gerações novos valores artísticos criando uma ruptura com o anterior formalismo. Tanto no campo da arte como no da educação, a psicologia cognitiva começou a ganhar um lugar de destaque na abordagem ao desenvolvimento da

1923 - Bauspiele de Alma Siedhoff‐Buscher

Também no âmbito específico da Arquitectura, durante

criança, consagrando o manuseamento dos brinquedos como acto educativo.6

a década de 1920, as experiências pedagógicas ligadas

6

Chudacoff, Howard P. Children at play: an American history. New York: New York University Press, 2007.


MARCO GINOULHIAC ARQUITETO PROFESSOR FAUP

1919 - Dandanah de Bruno Taut

Análogas purezas formais e clarezas temáticas podem ser encontradas no Dandanah, um brinquedo de construções desenhado na mesma época, em 1919,

1923 - Bauspiele de Alma Siedhoff‐Buscher

pelo arquitecto alemão Bruno Taut. No seu desenho são

A mesma Arquitectura industrial foi evocada de forma

introduzidos dois temas do trabalho de Taut enquanto arquitecto: o vidro e a cor. Os blocos, com formas simples, eram feitos em cristal colorido apelando à tecnologia que o arquitecto tinha utilizado cinco anos antes no projecto do pavilhão para a indústria vidreira em Colonia. Cores e transparências remetiam para o universo teórico que Taut tinha construído ao redor da uma Arquitectura a partrir dos contactos com o filósofo alemão Paul Scheerbart, autor do livro Glasarchitektur.

7

Em 1920, o conjunto Fabrik do arquitecto austríaco Josef Hoffman representa uma abordagem mais explícita à Arquitectura numa escala urbana. Com pequenos blocos em madeira pintada a criança podia construir uma cidade caracterizada por prédios de grandes dimensões e edifícios industriais com a linguagem severa da cidade moderna.

mais sintetizada e abstracta nos blocos Build the Town do designer checo Ladislav Sutnar que, em 1940. Três sólidos: um paralelepípedo, um prisma triangular e um tronco de cone, pintados com cores vividas e padrões elementares, permitem várias combinações de edifícios que resultam facilmente reconhecíveis, por mais simples que fossem. Na mesma época nos Estados Unidos, John Loyd Wright, filho do famoso arquitecto Frank Lloyd Wright, desenou um brinquedo que representava o espirito doméstico de uma nação8. Ainda hoje à venda, o Lincoln Log é um sistema de construções que permite construir cabanas em madeira e que deve o seu nome a Abraham Lincoln, 16º presidente dos EUA. O mesmo autor desenhou outros sistemas de construção claramente inspirados na arquitectura do pai e, de alguma forma, na época histórica.

Em 1920 Taut chega a fazer uma referência ao brinquedo Dandanah na Crystal Chain, uma troca de correspondência entre um pequeno grupo de arquitectos alemães entre Novembro de 1919 e Dezembro de 1920. Neste ano Taut escreve: “but there is an ever-changing life in it. It’s simply fantastic what effects the light produced, and yet within a fixed form. The vessel of the new spirit that we are preparing will be like this”. Taut, Bruno. Letter to the Crystal Chain, April 15, 1920. In Whyte, Iain B., and Bruno Taut. The Crystal Chain letters: architectural fantasies by Bruno Taut and his circle. Cambridge, Mass: MIT Press, 1985 p. 84. 8 Kinchin, Juliet, et al. Century of the child: growing by design, 1900-2000. New York: Museum of Modern Art, 2012. 7

43


R EFLE X Ã O

Construction Toys Make Better Boys

(continuação)

diferença era o tamanho, sintetizavam vários aspectos formais, estruturais e cromáticos de toda uma ideia de arquitectura muito ligada às linguagens utilizadas na altura, permitiam construir estruturas tridimensionais baseada em triângulos e quadrados.

Ilustração 8. 1951 - The Toy de Charles e Ray Eames

Ainda nos EUA, na década de 1940 assistiu-se a uma euforia consumista que não deixou de contaminar o desenho e a produção dos brinquedos. Além dos inúmeros objectos inspirados na vida doméstica, no universo militar e nos progressos da engenharia, alguns arquitectos aproveitaram este entusiasmo para criar brinquedos inspirados no próprio tema da Arquitectura. Uma das ligações mais evidentes foi a do casal Eames cuja produção artística e arquitectónica representam o fervor criativo do pós guerra norte-americano. Charles e Ray Eames desenvolveram muitos projectos fruto das

Ilustração 9 Imagem publicitária do brinquedo Supercity

investigações nas novas tecnologias de materiais como o contraplacado, a fibra de vidro ou os tecidos armados.

A difusão das tecnologias de injecção de plásticos

Paralelamente ao projecto de várias casas (entre as

permitiu um grande avanço na produção de brinquedos

quais a House nº8 claramente inspirada nas tecnologias

ao baixar drasticamente o custo e aumentar o grau de

dos papagaios9 que era uma das grandes paixões de

precisão da execução. Além do sempre presente Lego,

Charles), desenvolveram piões e dois brinquedos:

muitos outros brinquedos de arquitectura em plástico

The Toy e The Little Toy. Este conjuntos, cuja principal

foram desenvolvidos nas últimas décadas do século

Colomina, Beatriz, Annmarie Brennan, and Jeannie Kim. Cold war hothouses : inventing postwar culture, from cockpit to playboy. New York: Princeton Architectural Press, 2004. 9


MARCO GINOULHIAC ARQUITETO PROFESSOR FAUP

Ilustração 10 Balancing Blocks

XX. O inglês Betta Bilda, da Airfix, ou o norte-americano

Balancing Block ou Geemo são dois exemplos norte-

Supercity são dois exemplos entre muitos sistemas

americanos que bem exemplificam estas dinâmicas.

que abrangiam quer a produção de pequenos tijolos,

O primeiro é um sistema de construções em madeira

quer estruturas complexas ou verdadeiros sistemas de

pintada cujas formas facetadas irregulares, com um

prefabricação, como era o caso do alemão Baukasten,

acabamento propositadamente “retrô”, evocam edifícios

ou do Girder and Panel, ambos de 1960.

contemporâneos como a Casa da Musica do Porto ou a Libraria de Seattle, ambos do arquitecto holandês Rem

Nas últimas duas décadas do século XX assistiu-se a um eclipse dos brinquedos de Arquitectura e, em geral, de todos os brinquedos ligados a alguma manualidade e manipulação directa dos materiais em

Koolhaas. Enquanto Geemo, um sistema de elementos com formas orgânicas baseado em junções magnéticas, remete para as formas de algumas arquitecturas orgânicas como as de Peter Cook, de Zaha Hadid ou de Frank Gehry’s.

favor dos jogos electrónicos.

Todos estes exemplos representam ligações explícitas

Este entusiasmo quase arruinou firmas como a Lego

universo disciplinar da Arquitectura. Ligações com dois

á falência e o computador ganhou um protagonismo absoluto tanto como objecto lúdico como, e sobretudo,

entre o universo lúdico/educativo dos brinquedos e o sentidos de leitura: dos brinquedos, enquanto objectos educativos, para a Arquitectura e da Arquitectura,

enquanto artefacto educativo incontornável.

enquanto disciplina reprodutível, para os brinquedos.

Recentemente assistiu-se a um retorno aos “velhos

parte da disciplina é conservada e transmitida para as

tempo” veiculado por uma certa nostalgia do tempo passado mas também pelas novas tendências ligadas ao gosto pelo artesanato e pelos trabalhos manuais. Tanto do lado do desenho e produção, como do lado do utilizador, isto permitiu o aparecimento de novos brinquedos, alguns deles inspirados em linguagens e símbolos actuais.

10

Brougère, Gilles. Brinquedo e cultura. São Paulo: Cortez, 2000. p. 63.

Leituras que permitem compreender como e qual gerações futuras, pois como o sociólogo francês Gilles Brougère afirma: “os brinquedos são a materialização de um projecto dos adultos para as crianças”10. Neste sentido eles são, certamente, os objectos com o maior potencial cultural e intelectual para compreender o passado, mas também o presente que queremos conservar e reproduzir para o futuro, como seres humano e como arquitectos.

45


REFLE X Ã O

PROJETOS PARA A ZONA

DAS FONTAINHAS NO PORTO. DESAFIOS E CONTRIBUTOS DO ENSINO DA ARQUITETURA PARA A QUALIFICAÇÃO DA CIDADE CONTEMPORÂNEA “Saber ver a arquitetura”1 , será, talvez, o primeiro

realizada em setembro de 2014 e publicada com o

passo e requisito essencial para saber fazer projetos de

apoio do Departamento de Arquitetura. Esta exposição

arquitetura e, em última análise, para saber concretizá-

sintetiza o percurso projetual do MIA, que se inicia com

los. Três saberes sobre e para a arquitetura que

a elaboração de exercícios mais abstratos, introduzindo

exigem um método de ensino estruturado; um método

a problemática do espaço arquitetónico e do lugar

que, para além da observação e compreensão do

numa estreita articulação com a disciplina de Desenho;

espaço, da realização de exercícios de projeto, impõe

prossegue gradualmente para o desenvolvimento de

uma reflexão, periódica e atenta, sobre os resultados

temas e programas sobre a habitação, os equipamentos

que decorrem da sua aplicação. Em linha com este

e o desenho urbano; e acaba com a concepção de

entendimento, o Mestrado Integrado em Arquitetura

projetos finais de maior complexidade programática

(MIA) da Escola Superior Artística do Porto (ESAP) tem

e conceptual, onde se exige a aplicação e integração

vindo a realizar com maior frequência exposições sobre

estruturada dos saberes adquiridos e amadurecidos

trabalhos desenvolvidos pelos discentes no âmbito das

ao longo dos anteriores anos curriculares. Neste

disciplinas de projeto, a última das quais, a Coletiva,

percurso proporcionam-se desafios e, ao mesmo

1

Zevi, B., (1996), Saber ver a Arquitetura, 5ª ed., São Paulo: Martins Fontes.


PAOLO MARCOLIN SUSANA MILÃO FÁTIMA FERNANDES JOAQUIM FLORES

ARQUITETOS ESCOLA SUPERIOR ARTÍSTICA DO PORTO

tempo, oportunidades para discentes e docentes se

neste dois últimos anos letivos destacam-se os que

confrontarem com as questões da transformação urbana,

incidiram na Zona das Fontainhas, um território urbano

e do projeto de arquitetura como principal instrumento

que se distingue pelas suas caraterísticas físicas,

de intervenção e de qualificação do tecido urbano,

como sejam a geomorfologia da escarpa e a suas

produzindo soluções que, além de constituírem etapas

diversas situações panorâmicas, e pela persistência

fundamentais no processo de aprendizagem, procuram

de carências estruturais que se prendem com a falta

contribuir para enriquecer o debate e a reflexão sobre a

de acessibilidades, infraestruturas e espaços públicos

maneira de entender a cidade contemporânea e o papel

qualificados, e com a necessidade de uma ação mais

da arquitetura. De entre os desafios de projeto lançados

consistente em matéria de habitação.

Fotografia aérea da Zona das Fontainhas, Fonte: Google Earth 2007.

47


REFLE X Ã O

Fotografia das maquetes de projeto do Largo Baltazar Guedes.

De facto, apesar de ter sido alvo de várias propostas,

caráter sociocultural e espacial, desenvolvidos nas áreas

a última das quais o projeto para a requalificação da

disciplinares da Antropologia, Sociologia e Desenho,

Avenida Gustavo Eiffel na marginal entre as pontes D.

os discentes do segundo e quinto ano do MIA foram

Luiz I e D. Maria Pia, da autoria do Arquiteto Manuel

convidados a desenvolver, individualmente, propostas

Fernandes de Sá, que prevê a passagem de uma

de projeto de escalas e complexidade programática

ciclovia e a criação de varandas para uma melhor fruição

distintas.

da paisagem ribeirinha, esta zona continua a necessitar de uma intervenção de regeneração e de reabilitação

No âmbito do segundo ano, as propostas de projeto

urbana mais profunda e abrangente, que permita criar

centraram-se na requalificação do espaço público

condições para uma efetiva utilização e habitabilidade

Largo Baltazar Guedes, vulgarmente designado por

dos seus espaços. Assim sendo, e aproveitando

Largo Colégio dos Órfãos, e na criação de um Conjunto

ainda das informações de diversos estudos realizados

Habitacional para a Comunidade Salesiana que,

na ESAP ao longo dos últimos anos sobre esta zona,

atualmente, tem as suas instalações escolares no Largo

nomeadamente os que privilegiaram um enfoque de

Padre Baltazar Guedes. Em relação ao Largo Baltazar


PAOLO MARCOLIN SUSANA MILÃO FÁTIMA FERNANDES JOAQUIM FLORES

ARQUITETOS ESCOLA SUPERIOR ARTÍSTICA DO PORTO

Guedes, partiu-se do princípio de que, para assegurar

(distante). Quanto ao Conjunto Habitacional, definiu-

a sua melhor integração na cidade, este espaço público

se como fundamento e princípio de projeto integrar o

assumiria um carácter de utilização pedonal e de lazer,

construído e o não construído. Nesse sentido, o habitar

tendo como premissas fundamentais o estabelecimento

havia de ser projetado tendo em consideração a relação

da ligação pedonal à ponte D. Maria e Fontainhas,

entre interior e exterior (colectivo ao individual), nas suas

e o acesso pontual automóvel (cargas/descargas,

diferentes gradações, e na correspondente definição

emergência, mobilidade condicionada, etc.) ao cemitério

e hierarquização do espaço exterior. Assim, a área de

e à zona desportiva do Colégio dos Salesianos. Outro

intervenção situada no terreno com frente para o Largo

aspeto relacionado com o programa, foi a colocação

Padre Baltazar Guedes, confrontante a Poente com a Rua

de um pavilhão/escultura, da autoria de Dan Graham,

Gomes Freire, a Nascente com o Colégio dos Salesianos

associado à área de permanência do Largo. A proposta

e a sul com a escarpa do Rio Douro, deveria assegurar

arquitetónica havia de procurar estabelecer relações

a relação física entre as duas plataformas existente à

com o edificado e a comunidade local, bem como

cota do Largo, definindo a “entrada pública” e o acesso

a valorização das relações visuais com a paisagem

interior do terreno na conjugação com um equipamento

49


REFLE X Ã O

de apoio ao conjunto habitacional e área envolvente,

índole cultural, mas também como oportunidade para

constituído por balneários e lavadouros públicos. Das

a extensão social e espacial da cidade através da

premissas conceptuais e programáticas destes desafios

inserção de um novo nível de interatividade entre funções

resultaram experiências distintas, sobretudo na maneira

artísticas que desempenham um papel fundamental

de organizar formas e materialidades ordenadoras do

para o desenvolvimento das práticas culturais e das

espaço urbano, mas unanimemente preocupadas com

interseções sociais. As condições básicas para a

a questão das relação entre as partes e a paisagem,

organização arquitetónica deste edifício impõem a

perseguindo o mais possível um sistema de equilíbrio

distinção de três blocos de espaços para diferentes

entre a afirmação plástica e identitária dos elementos

tipos de funcionalidades e utilizadores: um destinado

arquitetónicos, e o resultado global do projeto, restituindo

ao público em geral, que reúne funções de recepção,

deste modo um contributo que, de certo modo, reitera a

comércio, restauração, lazer, exposição, educação

importância da arquitetura do espaço urbano.

e formação; outro para a recepção dos funcionários

Já no que respeita ao quinto ano e último ano do MIA,

e os serviços auxiliares relativos aos escritórios e às

as propostas dos discentes no âmbito da unidade

indústrias criativas; e outro ainda, estritamente limitado

curricular de Trabalho de Projeto, ainda em fase de

a pessoal autorizado, especificamente concebido

elaboração, preveem dois programas distintos. Um

para a recepção, preparação e armazenamento das

deles prende-se com a realização de um projeto para um

obras de arte. A formalização do espaço arquitetónico

Centro de Produção de Arte e Ofícios, a localizar numa

do edifício será ainda pretexto para uma operação de

área próxima da Praça da Batalha, caraterizada por

reconversão funcional do referido terminal rodoviário e

um intenso movimento, tanto pedonal como rodoviário,

para a inserção de espaços públicos qualificados em

que abrange a Encosta dos Guindais e o Terminal

articulação com as intervenções de qualificação urbana

Rodoviário do Parque das Camélias. Trata-se, neste

desenvolvidas no âmbito da iniciativa Porto 2001.

caso, de implantar um edifício de caráter multifuncional

O outro programa tem a ver com a Reabilitação Urbana

que deverá constituir-se não só como uma alternativa

da Escarpa das Fontainhas, e deverá ser desenvolvido

às tipologias mais tradicionais dos equipamentos de

a

uma

escala

de

maior

abrangência

espacial,


PAOLO MARCOLIN SUSANA MILÃO FÁTIMA FERNANDES JOAQUIM FLORES

ARQUITETOS ESCOLA SUPERIOR ARTÍSTICA DO PORTO

compreendendo a totalidade da encosta escarpada

desafio lançado aos discentes é o de entender o valor

situada junto à margem do Rio Douro entre as Pontes

que a escarpa tem hoje em dia no contexto geral da

de D. Luís I e de D. Maria, com vista a desencadear

cidade, e no contexto específico da frente ribeirinha

uma reflexão sobre a vocação desta área no contexto

que brevemente será requalificada neste troço entre as

global da cidade. Tal implicará percebê-la nas suas

duas pontes representativas da tecnologia construtiva

diversas dimensões (física, social, estética, funcional,

do ferro no Porto. A complexidade deste desafio deverá

etc.) e integrá-la nas diversas escalas da abordagem

estimular o desenvolvimento do conceito e a descoberta

ao projeto de escala intermédia. Neste caso, o principal

da solução projetual.

Extrato da «Planta Redonda» de George Balck, 1813.

51


REFLE X Ã O

Recorrendo à cartografia histórica do Porto, é possível observar que a topografia de declive rochoso acentuado sempre condicionou a fixação humana nesta área,

Os resultados de todos estes desafios, juntamente com os do segundo ano,

permanecendo como elemento natural no exterior da

contribuirão para configurar uma nova e

muralha Fernandina junto à Porta do Sol. A construção

ulterior perspetiva projetual, diversificada

que gradualmente foi aparecendo ocupa as zonas mais favoráveis à sua implantação, rarefazendo-se e

e multiescalar. A reflexão, a partir desta

adquirindo uma condição progressivamente precária,

perspetiva surgirá, no entanto, não

física e socialmente, conforme nos aproximamos das

só da leitura e da apresentação da

áreas mais rochosas e de topografia mais difícil. Condicionantes e eventos de vária natureza conduziram a que esta área tenha permanecido como mais um “vazio urbano” na cidade do Porto. Contudo, apesar da evidente degradação e dos problemas de exclusão social, a sua visibilidade, bem como a imagem predominante dos afloramentos rochosos, conferemlhe um valor cénico, transformando-a naquilo a que Manuel de Solà-Morales apelidou de Terrain Vague2 , o

organização projetada do espaço físico, mas também e sobretudo do confronto desta

organização

com

a

social e espacial da cidade tradicional”3 enquanto referência incontornável no processo de construção do ambiente urbano da contemporaneidade.

que nos leva a concluir que qualquer projeto para este local terá de lidar com esta dualidade, tentando resolver os diversos problemas urbanos identificados, mas sem lhe retirar este estatuto, já adquirido, de elemento fortemente marcante da paisagem urbana.

2 3

“clareza

Solà-Morales, I., (2002),Territórios. Barcelona: Editorial Gustavo Gili. Davies, C., (2011), Thinking about Architecture. An Introduction to Architectural Theory, London: Laurence King Publishing Ldt.


PAOLO MARCOLIN SUSANA MILÃO FÁTIMA FERNANDES JOAQUIM FLORES

ARQUITETOS ESCOLA SUPERIOR ARTÍSTICA DO PORTO

Escarpa das Fontainhas e ramais ferroviários da Alfândega e de São Bento, Fonte: Nuno Mourão, 2010.

Paolo Marcolin | Arquiteto, Docente do MIA e Diretor do Departamento de Arquitetura - ESAP Susana Milão | Arquiteta, Docente do MIA - ESAP

Fátima Fernandes | Arquiteta, Docente do MIA e Diretora do MIA- ESAP Joaquim Flores | Arquiteto, Docente do MIA - ESAP

53


REFLE X Ã O

O Processo Criativo:

do transcendente ao design thinking

Criatividade

Apesar de, há uns anos a este parte, se falar muito de

esteve imbuída de uma enorme carga filosófica e

criatividade e do seu enorme potencial para as mais

religiosa, que dificultou uma definição coerente e

diversas áreas do conhecimento humano, o interesse

racional do seu termo. Assim, e apesar do conceito

por esta temática não é recente.

de criatividade existir desde a antiguidade, é apenas

Sendo, atualmente, reconhecida como uma capacidade

em 1950, com o artigo do psicólogo J. P. Guilford,

humana, foi apontada durante longos séculos como algo

intitulado “Creativity” - investigação centrada sobretudo

que nos transcende, resultado de magia, proveniente

na questão da personalidade criativa e sua importância

de forças divinas ou demoníacas. Um fenómeno

para a industria, a ciência, as artes e no ensino – que se

complexo que englobou as mais diversas atividades e

abre o caminho para um maior e fundamentado estudo

acontecimentos, como o encantamento e pinturas do

científico sobre o tema.

homem primitivo, o aparecimento de novas formas na

Contudo, apesar do enorme quantidade e variedade

natureza e, até mesmo, o génio malévolo de Fausto.

de publicações que vêm sendo lançadas sobre esta

Etimologicamente, o termo criatividade provem do

temática, verificamos a ausência de uma definição

verbo latim “creare”, que significa originar, gerar,

que seja cabal, precisa e objectiva. Confirmando

formar, remetendo-o para raízes de dimensão criadora

a criatividade como “um fenómeno multifacetado e

e transformadora. Mas por muitos anos a sua noção

complexo”.


RUI TEIXEIRA

PROFESSOR DE PROJETO E TECNOLOGIAS | EASR

Processo criativo Embora inicialmente o fenómeno da

novas ideias decorrentes dos seus próprios processos

psicólogos e pedagogos, foram os cientistas

Apesar de aparentemente Poincaré não ter aprofundado

primeira vez, explicar os mecanismos e

seus apontamentos sobre este tema tiveram uma

Assim, seguindo um ponto de vista processual,

criatividade.

propuseram

criativo,

Dessa forma, em 1926, impulsionado pelos relatos

desmontando-o em fases e etapas criativas na tentativa

de Poincaré, Graham Wallas, desenvolve um modelo

de perceber o caminho percorrido até o alcance do

composto por fases, que publicou em “The art of

“produto criativo”.

thought”.

As primeiras referências à existência de uma estrutura

Este modelo que, segundo Katja Tschimmel (2010),

do processo criativo composta por múltiplas fases

é a base das atuais teorias sobre a estrutura fásica

surgiram em 1924, por Henri Poincaré, na sua obra

do pensamento criativo, bem como das numerosas

“The foundation of science”, resultado da reflexão deste

descrições de processos de resolução de problemas e

cientista, matemático e filósofo, sobre a formação de

de processos de design, é composto por quatro fases:

criatividade tenha sido estudado sobretudo por

de trabalho.

das ciências naturais quem procurou, pela

mais a sua explicação sobre processos criativos, os

estruturas do processo criativo.

grande influência em diversos estudiosos da área da

uma

aproximação

ao

ato

55


REFLE X Ã O

1.Preparação: recolha das informações necessárias

Martínez (1999) chama atenção para o facto deste

conhecimentos e capacidades analíticas;

“iluminação”, como surgimento súbito e espontâneo de

a solução do problema, aparentemente, não é uma

sujeito não sabe como explicar. No entanto, e apesar de

sobre o problema e análise preliminar usando os seus

modelo se apoiar no mito da criatividade entendida como

2.Incubação: fase de preparação do caminho para

ideias provenientes do subconsciente e que o próprio

atividade consciente e supõe-se que nela trabalhem os

recorrer à intervenção de mecanismos não controláveis,

processos subconscientes na formação de combinações

e sem uma explicação operacional da sua forma de

conceptuais;

atuação, trata-se de um dos modelos de obteve maior

criativa;

Mais recentemente, alguns modelos abriram essa

validade das ideias.

específicos e fases do seus processos criativos.

3.Iluminação: Aparecimento súbito da solução

repercussão.

4.Verificação: refinamento e comprovação da

“caixa negra”, e analisam os diversos componentes

Porquanto, é um modelo que se foca no desenvolvimento

Tais modelos apresentam as ligações lógicas entre os

de soluções criativas através de momentos de inspiração, considerados , pelo autor, nucleares no processo criativo.

resultados de uma das fases da resolução criativa de problemas e as fases subsequentes, examinando a forma como esses elementos se relacionam e, em última instância, geram um “produto criativo”.


RUI TEIXEIRA

PROFESSOR DE PROJETO E TECNOLOGIAS | EASR

Entre as numerosas e diferentes abordagens que

inúmeras vezes, enquanto se exploram problemas e

expandem este modelo por etapas de Wallas, Tschimmel

tentam desenvolver uma solução criativa efetiva (Fink,

(2010) aponta o modelo fásico concebido por Guntern,

Ward & Smith, 1992).

por o considerar mais completo.

Também, nas estruturas que suportam a atividade

Neste modelo o autor subdivide o processo criativo em

projetual de design ou, mais recentemente, nos modelos

sete momentos: 1.º a germinação, 2.º a inspiração, 3.º

do chamado design thinking podemos encontrar

a preparação, 4.º a incubação, 5.º a iluminação, 6.º a

um

elaboração e, por fim, 7.º a verificação.

anteriormente apresentadas.

Guntern refere que estas sete fases são delimitáveis mas

Apesar destes terem especificações orientadas para a

que não ocorrem numa sequência linear simples: podem-

ação e para processos técnicos, o que distingue design

se repetir, acontecer em simultâneo ou ser omitidas;

de uma atividade puramente artística, percebe-se entre

podem decorrer consciente ou inconscientemente;

as fases que os constituem um processo iterativo,

podem decorrer com intensidades e velocidades muito

onde o conceito da não linearidade está presente e

diversas.

ocorre repetidas vezes para se chegar a um resultado

Por conseguinte, o processo criativo pode agora ser

“desejável”, podendo gerar outros resultados parciais

definido como uma série de iterações sucessivas,

que serão novamente reutilizados para geração de

onde as ideias são concebidas, analisadas, e revistas

novas soluções criativas.

grande

alinhamento

com

as

considerações

57


De uma forma mais específica, podemos afirmar que no design thinking, o mesmo processo acontece de forma sistemática, todas as suas etapas são definidas e moldadas pelo pensamento do designer que constrói uma lógica de raciocínio de inovação criativa e viável, baseada na sua experiência e conhecimentos e delineados pelo pensamento analítico e intuitivo. O modelo concebido por Tim Brown, CEO e Presidente

Para Brown, não existe uma “melhor forma” de percorrer o processo. Há pontos de

partida e pontos de referência úteis ao longo do caminho, mas o continuum da inovação pode ser visto mais como um sistema de

espaços que se sobrepõem, do que como uma sequencia de passos ordenados.

da empresa de design IDEO, evidência a lógica

No entanto reconhece alguns princípios e ferramentas

apresentada, através da sistematização dos seus

que facilitam esse percurso processual, bem como a

processos de design, numa estrutura composta por, o

obtenção de bons resultados, estes são:

que apelidou de, três "espaços" da criação:

- Insights obtidos pela observação do comportamento

a) Inspiração, o problema ou oportunidade que motiva

real de pessoas, especialmente pela forma como se

a busca de soluções;

relacionam entre elas;

b) Ideação, o processo de gerar , desenvolver e testar

- Observação daquilo que as pessoas fazem e não

ideias;

fazem, ouvindo o que eles dizem e não dizem;

c) Implementação, o caminho que leva da sala de

- Empatia, sentindo as pessoas reais pois elas não são

projeto para o mercado.

objetos, mas indivíduos com seu próprio mundo;


- Prototipagem ajuda a gerar resultados mais rápidos, é mais fácil de avaliar ideias que se tornam tangíveis também se podem prototipar organizações; - Experiências, através da sua simulação e projeção (voos, restaurantes, etc.); - Storytelling, contar histórias abre uma nova dimensão para a concepção do tempo, das memórias, dos cenários, abrindo novos pontos de vista sobre as coisas, atribuindo-lhes novos significados. Assim, segundo Brown (2010), a missão do design thinking é traduzir observações em insights, e estes em produtos e serviços capazes de melhorar a vida da espécie humana. Construções suportadas pela empatia, numa tentativa de ver o mundo através dos olhos dos outros, de o compreender por meio das experiências e

Estamos perante um processo centrado no ser humano, que se pretende eticamente correto, e integrador de todo o espectro de atividades que visam a inovação. Se é verdade que sem criatividade não há evolução, também não é menos verosímil que o aprofundar do estudo dos processos criativos contribuiu de forma muito significativa para estes evoluíssem no sentido de melhor servirem o bem estar humano.

emoções alheias.

59


REFLE X Ã O

uma perspetiva sobre

CONCURSO EDUCACIONAL SQÉDIO 2002.2014 Tal como em outros mercados, lembro-me por

exemplo do que aconteceu com o lançamento das ferramentas de processamento e impressão

digital da Apple, que abriram um mercado de nicho a um público muito mais generalizado – ou

a mais recente democratização da tecnologia de impressão 3D, anteriormente domínio dos poucos que podiam suportar os seus custos, aquilo que

a SolidWorks traz para o mercado é uma enorme

acessibilidade. Aquilo que antes era caro, obscuro e difícil de aprender (estamos a falar

das ferramentas preexistentes, baseadas em

Unix, alguém se lembra?) torna-se subitamente acessível – em custo e facilidade de uso.


RUI ALEXANDRE

DIRETOR PRÉ-VENDA, MARKETING E EDUCAÇÃO SQÉDIO, SA

O Concurso Educacional organizado pela Sqédio tem vindo a afirmar-se como um dos mais apelativos para a comunidade estudantil nacional envolvida em currículos académicos na área do design ou da engenharia mecânica. Neste artigo iremos tentar descobrir algumas das razões do seu sucesso, colocando-o em perspectiva e juntando a nossa própria intuição. Antes de mais, um pouco de contexto: Quem é a Sqédio? A Sqédio representa em Portugal as soluções

de software SolidWorks praticamente desde que elas existem – estamos a falar de 1996! Ao longo deste percurso de 18 anos, a Sqédio introduziu gradualmente no mercado uma nova geração de ferramentas de desenho assistido por computador em 3D baseadas no Windows. Mensagens como “Put the power of 3D on every engineers desktop” ou a mais recente “Let’s Go Design”, usadas abundantemente nos

materiais de marketing e comunicação expressavam bem – e ainda hoje o fazem – aquilo que é o DNA SolidWorks, bem como a sua tradução no trabalho diário da Sqédio: tornar o 3D acessível a todos.

Evolução do Concurso Educacional Sqédio ao longo dos anos (Poster de divulgação, estatísticas)

61


R EFLE X Ã O

A Sqédio sempre compreendeu que uma verdadeira revolução nesta área não poderia ocorrer à margem do contexto educacional. Desde sempre procurou demonstrar junto das instituições de ensino as vantagens – para alunos e professores – em adoptar esta nova geração tecnológica. Em meados dos anos 90 seriam necessários vários meses para que um aluno pudesse compreender os comandos básicos de uma aplicação 3D a correr sobre Unix. O investimento monetário das instituições - e de tempo de professores e estudantes Vencedor da última edição do Concurso Educacional, o projecto de uma miniatura Porsche 356 e suas variações foi criado por um grupo de estudantes da Universidade de Aveiro (Filipe Silva, Luís Santos, João Januário e Tomás Osório)

revelava-se excessivo para obter resultados que hoje pareceriam simplistas. Por esta razão muitas instituições simplesmente ignovaram o 3D, assumindo para os seus programas pedagógicos ferramentas de desenho 2D, na grande maioria das vezes, AutoCAD. Este panorama não era diferente da realidade das empresas comerciais: a esmagadora maioria mantinha o projecto em 2D; o 3D era um luxo, implicando investimentos de tempo e dinheiro proibitivos para a generalidade. A Sqédio navegou o final dos anos 90 efectuando este trabalho de divulgação tecnológica nos dois tabuleiros. A acompanhar as primeiras vendas comerciais vieram instalações nas Universidades de referência – a Universidade de Aveiro comprou SolidWorks em 1997; até ao ano de 2002 instituições como o IST, a FEUP,

Esta mini-escavadora ganhou o Concurso Educacional em 2003. Foi desenhada pelo Nuno Pires e pelo Marco Moreira, estudantes na Escola Superior de Tecnologia e Gestão do Instituto Politécnico de Leiria

o ISEL, o IPL entre muitas outras começaram a dar os seus primeiros passos com SolidWorks, substituindo no processo ferramentas tecnologicamente ultrapassadas.


RUI ALEXANDRE

DIRETOR PRÉ-VENDA, MARKETING E EDUCAÇÃO SQÉDIO, SA

A título de referência, a Sqédio conta hoje como clientes

Concurso da Sqédio decorreu em 1998, acompanhando

educacionais praticamente todas as instituições públicas

a muito recente instalação na Universidade de Aveiro

de ensino na área da mecânica e do design industrial,

e os primeiros projectos criados por estudantes desta

bem como muitas das escolas privadas, centros de

Universidade. Mas foi a partir de 2002 que o Concurso

formação e escolas militares. Outra tendência, mais

ganhou um novo fôlego, potenciado pelas instalações

recente, é a crescente adopção do SolidWorks por parte

em muitas outras Universidades. Seguiram-se as edições

de escolas secundárias e vocacionais, em particular as

de 2003, 2004 e 2005-2006. Após um interregno, o

de ensino artístico, de que a Escola Artistica de Soares

concurso foi retomado em 2012, e teve a sua mais recente

dos Reis no Porto é um excelente exemplo.

edição neste ano de 2014. A edição de 2012 introduziu

A ideia de um Concurso Educacional, de tema

algumas inovações ao nível do regulamento, em

aberto, destinado a premiar projectos de qualidade

particular no que diz respeito aos prémios. Inicialmente

desenhados em SolidWorks por estudantes nacionais,

prevendo apenas três prémios monetários para os três

reconhecendo o seu mérito técnico e criatividade

primeiros lugares, a edição de 2012 introduziu um maior

também não é exactamente nova. A primeira edição do

número de prémios para os estudantes (Grande Prémio

Este parque infantil inspirado no tema Angry Birds venceu o Concurso Educacional em 2012. O projecto é da autoria de Bruno Oliveira e Tiago Fernandes, estudantes na EBS Ferreira de Castro em Oliveira de Azeméis

63 27


R EFLE X Ã O

Habitualmente prolífica na apresentação de projectos a concurso, a Escola Superior de Artes e Design das Caldas da Rainha (IPL) participou, sob a orientação do Prof. João Mateus, com 15 projectos na última edição


RUI ALEXANDRE

DIRETOR PRÉ-VENDA, MARKETING E EDUCAÇÃO SQÉDIO, SA

Projecto, Criatividade, Modelação, Simulação, Imagem

melhor talento de engenharia de Portugal.” Palavras

e Animação), bem como distinções para a Instituição e

que gostamos de ouvir, naturalmente. Contribuímos

o Professor responsável. Foi criado também o Prémio do

para mostrar publicamente o esforço e dedicação

Público, atribuído ao projecto com maior votação online

colocados nos trabalhos que recebemos, que vai muitas

na plataforma Facebook.

vezes e sem qualquer margem de dúvida muito para

Desde 2002 a Sqédio recebeu ao seu cuidado como

além do que poderia ser exigido pelos professores

participantes no concurso 163 projectos criados por

numa determinada cadeira ou projecto académico.

278 alunos. No total mais de 30.000 ficheiros, ocupando

Professores que naturalmente desempenham um papel

mais de 25GB de informação. Outra tendência, que

essencial na divulgação do Concurso junto dos seus

verificamos com agrado, é a crescente participação

estudantes, posicionando-o frequentemente como um

de estudantes do sexo feminino. Analisar a temática

motivador adicional para a procura de elevados padrões

dos projectos recebidos torna-se no entanto um

de qualidade nos trabalhos prácticos apresentados.

exercício de difícil validade estatística, dada a enorme

Em jeito de conclusão, diria o seguinte: o Concurso

variedade do que nos chega todos os anos: de pentes

educacional da Sqédio é um projecto vivo, vibrante,

de cabelo a escavadoras, passando por candeeiros,

com história e com futuro. Como interveniente na sua

motores, bicicletas, canivetes e máquinas de café,

organização desde a primeira hora, sinto um orgulho

brinquedos diversos, carros e aviões, parques infantis

especial por contribuir para a sua melhoria contínua. Mais

e microscópios, lagares de azeite e naves espacias,

do que suportado em intenções comerciais, o Concurso

recebemos efectivamente um pouco de tudo aquilo

foi pensado e executado desde o princípio para ser uma

que constitui o imaginário criativo dos estudantes,

montra daquilo que os nossos estudantes decidirem

representado em 3D com o auxílio do SolidWorks.

criar em 3D. Para estimular o seu empreendorismo

O concurso é também aplaudido pela SolidWorks a

criativo, para os ajudar a transferir ideias da cabeça

nível mundial – Marie Planchard, Directora Mundial

para o palpável, resolvendo pelo caminho os problemas

da SolidWorks para a área da Educação afirmou

inerentes a esta mudança básica de paradigma. E, pelo

por exemplo em 2007, que “o calibre de projeto que

que temos visto até agora, estamos muito optimistas no

verificamos nos estudantes deste concurso exige um

que o seu trabalho e as suas capacidades conseguirão

reconhecimento especial”; e mais recentemente em

criar daqui para a frente.

2012, que “o Concurso da Sqédio apresenta algum do

65


ATIVI DA DE

fábricas digitais A “Fábricas digitais” é uma atividade onde se coloca em

prática o Ciclo Industrial de um produto. Recorre a noções de CNC, Prototipagem, Desenho CAD, Marketing e Planeamento

de produção. Fornece aos alunos a possibilidade de

impressão dos vários protótipos de produtos usando a mais recente tecnologia de impressão 3D.


JORGE JESUS

PROFESSOR DE PROJETO E TECNOLOGIAS | EASR COORDENADOR EASR DA ATIVIDADE FÁBRICAS DIGITAIS

A Escola Artística Soares dos Reis associou-se a este

replicável”, ou seja, qualquer um pode construir tendo

projeto, através do Curso de Design de Produto e o elo

os materiais necessários e tempo! É uma extensão mais

de ligação foi o CATIM - Centro de apoio tecnológico

tecnológica e técnica da cultura “Faça Você Mesmo”

à indústria metalomecânica. Os alunos voluntários que

(DIY - Do It Yourself).

participaram nesta atividade extra curricular foram: a Raquel Jesus, a Inês Fernandes, a Luísa Prieto, o Bruno

A Impressão 3D também conhecida como prototipagem

Filipe, o Bruno Silva e a Joana Silva, construíram uma

rápida, é uma forma de tecnologia de fabricação aditiva

impressora 3D durante o 1º período do atual ano letivo

onde um modelo tridimensional é criado por sucessivas

2014/15.

camadas de material. Trata-se de uma tecnologia

Esta impressora 3D é um hardware eletrônico projetado e

de impressão avançada que permite imitar com

oferecido da mesma maneira que um software de código

precisão quase exata a aparência e funcionalidades

livre (open source), composta por uma placa “Arduino”

dos protótipos dos produtos. Convém realçar que se

(plataforma de prototipagem electrónica de hardware

o utilizador não souber modelar os seus produtos, a

livre e de placa única, com suporte de entrada e saída

impressora 3D não servirá para nada...

embutido que utiliza uma linguagem de programação padrão) e uma série de componentes, onde a grande

A atividade “Fábricas Digitais” correu como

generalidade poderá ser comprada na Rua do Almada

programada e o seu resultado é sem dúvida uma

– Porto. Como a maioria das peças da Impressora 3D

mais valia para os nossos alunos, que têm agora

são feitas de plástico e a própria impressora pode

a possibilidade de poder usufruir desta tecnologia

imprimir essas peças, então temos uma máquina “auto-

“revolucionária” na sua metodologia de trabalho.

67


ATIVI DA DE

resumo da atividade

1. Coloca em prática o Ciclo Industrial de um Produto 2. Recorre a Noções de CNC e Prototipagem 3. Utiliza Software CAD 4. Elabora o teu plano de Marketing 5. Planeia a tua produção 6. Aprende a modelar em 3D 7. Imprime o teu Protótipo

O projeto Pense Indústria Nova Geração tinha como objetivo conseguir envolver 11.000 jovens até Dezembro de 2014. Promovido pelos Centros Tecnológicos de Portugal, o Pense Indústria Nova Geração tem como parceiros, para além do CATIM, o CITEVE, o CENTINFE, o CTIC, CTVC, CTCP e CEVALOR.


JORGE JESUS

PROFESSOR DE PROJETO E TECNOLOGIAS | EASR COORDENADOR EASR DA ATIVIDADE FÁBRICAS DIGITAIS

ESTRUTURA

MODELAÇÃO 3D

Orientar a conceção dos produtos para as necessidades

Preparação e análise virtual do produto concebido.

Conceção do Produto do mercado. Orientar a ideias dos jovens para produtos que sejam funcionais no fim do processo de impressão.

PLANEAMENTO DE PRODUÇÃO

Explicar o futuro do produto, que matérias primas

Introdução à modelação 3D.

IMPRESSÃO 3D

Introdução à Impressão 3D e suas capacidades no auxilio à conceção de novos produtos. Materialização e finalização do protótipo. Teste de funcionamento.

comprar, em que máquina o produto desse ser produzido, que pessoas devemos alocar à produção, em que quantidades produzir e preço a ser comercializado.

MARKETING

Desenvolver uma estratégia de marketing para o produto. Abordagem a soluções de promoção digital e on-line.

69


PRO J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | 11ºANO _ EASR | 2013.14

F-51 WALTER GROPIUS

A cadeira F-51 foi criada por Walter Gropius no ano de 1920 e desenvolvida na escolar de design da Bauhaus em Weimar, logo pertence ao estilo modernista.

Foi projetada para a sala do diretor da Bauhaus, respeitando o conceito funcionalista - a forma segue a função. A sua forma deriva de um cubo com 70 cm de lado e apresenta linhas retas, formas simples, geométricas e simétricas. Pode ser dividida em duas partes: a estrutura de metal ou madeira que serve de suporte e a de tecido ou couro que é constituída pelas costas e assento da cadeira. A F‐51 é fabricada pela TECTA.

Walter Adolph Gropius

nasceu na Alemanha,

em Berlim, no ano de 1883.

Estudou arquitetura no Politécnico em Munique e em Berlim, mas abandonou os estudos para prestar serviço militar. Através de Karl-Ernest Osthaus, artista alemão, Gropius conseguiu um lugar como assistente no atelier de Peter Behrens, famoso arquiteto e designer (1º designer industrial com a empresa AEG), com a ajuda do qual Walter Gropius adquire aprendizagens acerca da arquitetura. Em 1910 abre o seu próprio atelier, tendo como

principal colaborador, Adolf Meyer, do qual dependia para executar as suas ideias, isto porque Walter Gropius apresentava dificuldades no campo do desenho. Em 1911, Walter Gropius e Adolf Meyer receberam a primeira proposta, a de construer uma fábrica, a fábrica da Fagus em Alfed. Em 1913 começou a fazer design de equipamento. Após o fim da 1ª Guerra, em 1918, tornou‐se membro fundador do Arbeitsrat fur Kunst, o Conselho de Trabalho para a Arte em Berlim. No ano seguinte foi nomeado director da Hochschule fur Bildende Kunst, Academia de Belas-Artes e da


DÉBORA SILVA

Kunstgewerbeschule, Escola de Artes e Ofícios, em

o Pavilhão da Pensilvânia.

Weimar. A junção destas duas escolas, tornou-se a

Nos anos seguintes Walter Gropius continua a trabalhar

Staatliches Bauhaus em Weimar.

em projetos, com Marcel Beuer, que fora um dos seus

Em 1925, a Bauhaus foi transferida para Dessau.

estudantes na Alemanha.

Nesse mesmo ano Walter Gropius projetou o edifício da

No mesmo ano, em 1939, ambos projetam o Lake Eden

escolar e nos anos seguintes, as casas dos mestres e a

Campus e no ano seguinte apresentaram o projeto

propriedade residencial de Torten.

para o Black Mountain College. Ganha o prémio Royal

No ano de 1928 demite‐se do cargo de diretor que

Gold Medal e no ano de 1946 funda The Architects

exercia desde 1919 e em 1934 refugia-se em Inglaterra.

Collaborative.

No ano de 1936 projeta o Village College, no ano

Morre em 1969 em Boston e é sepultado no seu país

seguinte muda-se para Nova Iorque, torna‐se professor

natal.

na Universidade de Harvard e no ano de 1939 desenha

71


PRO J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | 11ºANO _ EASR | 2013.14

mercado de rua ao sábado de manhã

anel Com inspiração na cadeira F-51 de Walter Gropius, surge o anel Gropius 51 e a embalagem expositor F511. Tendo sido, esta cadeira, criada no ano de 1920, segundo teorias modernistas e funcionalistas, tanto o anel, como a embalagem foram concebidos numa tentativa de responder a tais teorias. Caracterizando-se pelas formas geométricas, linhas retas e extrema funcionalidade e minimalismo. Tal como a cadeira, tanto o anel Gropius 51 como a embalagem F511, são constituídos por duas partes. No anel Gropius 51, a estrutura base que envolve o dedo, corresponde à estrutura da cadeira e a peça em acrílico encarnada corresponde à parte almofadada da cadeira. A embalagem F511, é pensada e estabelece-se com base nos conceitos de ‘abraçar’ e ‘segurar’, que permitem, o seu sistema de abertura e fecho. Tal como a cadeira, a embalagem F511, é constituída por duas partes: a estrutura/ suporte, que ‘abraça’ e ‘segura’, um cubo que corresponde à parte da almofada F-51.

Anel Gropius 51 Dimensões: 2.1cm/ 1.8cm/ 2.1cm Materiais: Latão e acrílico


DÉBORA SILVA

embalagem Embalagem/ Expositor F511

DimensĂľes: 8.7cm/ 8.7cm/ 8.7cm

Materiais: Folhas de madeira e madeira

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PR O J E TO

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moce USA E RE-USA

E CO D ESIGN E DESI G N SUSTENTÁV E L

p asse p ar t out O objeto consiste num passepartout.

Este projeto pretende reaproveitar um objeto em fim de vida (prensa para confecionar

sanduíches), dando-lhe um outro fim (expor

fotografias). Desta forma, as potencialidades dos materiais não são desperdiçadas.

Os materiais utilizados foram os próprios

constituintes do objeto inicial (o Alumínio), o MDF, fio de algodão e algumas ferramentas que ajudaram na sua construção.


INÊS RAMALHÃO

Os materiais que o constituem são o alumínio, o MDF e o fio de algodão. Enquanto que o MDF foi usado para elaborar as molduras, o fio de algodão tem no objeto uma função meramente decorativa. Assim, o objeto é constituído por duas molduras ligadas por um encaixe que permite ao objeto abrir e fechar. Cada moldura possui 12 cm de largura por 11,5 cm de altura. As cores rondam o cinzento e o acastanhado na vista de frente e o vermelho, verde e amarelo na vista de trás. O objecto destina-se a todas as idades, na medida em que qualquer pessoa pode expor as suas fotografias numa moldura. É um objeto meramente decorativo que pode, portanto, ser utilizado por qualquer pessoa que queira decorar algum espaço. As cores foram escolhidas com o intuito do objecto poder ser utilizado tanto por indivíduos do sexo masculino como feminino. O objecto chama-se MOCE. A sílaba MO corresponde a moldura (MOldura) e OCE corresponde a ECO (Ecodesign) ao contrário.

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FINITO USA E RE -U S A

E C O D ESI GN E D ESI G N S US T E NT Á V E L

PROJ ETO D E AMPLI F I C AD O R

No âmbito da disciplina de Projecto e Tecnologias, aquando da segunda unidade de trabalho, o aluno Tomás Almeida, estudante na Escola Artística de Soares dos Reis, criou um objecto funcional respeitando a temática do Eco Design e Design Sustentável ao qual foi chamado “Finito”. Este objecto, com 17cm de largura por 26,5cm de comprimento por 72,5cm de altura, corresponde a um amplificador de som cujo principal conceito e objectivo assentam na ideia de trazer de volta o som antigo, analógico e mais orgânico da sua antecedente, a grafonola.


TOMÁS ALMEIDA

"O Finito abrange a temática do Eco Design e Design Sustentável e tem como objectivo trazer de volta o som mais analógico e orgânico da grafonola."

Dimensões: 17cm x26,5cm x72,5cm Materiais: Madeira (Mogno), Metal (Alumínio), Plásticos, Circuito Elétrico.

O nome, “Finito”, relaciona-se com a sua marcada

topo da vareta fixou-se a “cabeça” inclinável do “Finito”,

altimetria e finura e é consequência do seu objectivo,

composta pela peça de canalização de alumínio que

isto é, o som que produz não é perfeito, abrangente e

antecede o abat-jour branco também ele de alumínio.

ilimitado e é, pelo contrário, imperfeito e finito.

O circuito eléctrico viaja desde o topo da estrutura até

O “Finito” parte de uma tábua de madeira de mogno,

à cavidade na base onde foi resguardado e de onde

uma placa, uma vareta e um abat-jour de alumínio, duas

apenas emerge o pequeno interruptor prateado e uma

peças de canalização (uma de plástico e outra de a-

entrada usb onde se pode ligar qualquer reprodutor de

lumínio) e um circuito elétrico. As várias partes deste

música.

objecto são todas elas reutili- zadas à excepção do

Para o acabamento final do objecto optou-se por lixar a

pequeno interruptor que controla o circuito.

placa de alumínio tor- nando-a fosca e menos agressiva,

O objecto começou com a base de mogno brasileiro,

e em brunir o mogno de modo a torná-lo mais macio e

coberta até metade por uma placa de alumínio fosco, de

agradável, tanto ao toque como ao aparelho portátil nele

onde emerge a vareta brilhante de alumínio que define

pousado.

e salienta a altimetria e delicadeza da estrutura. No

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MoMita MER CA DO D E R U A A O S Á B ADO DE M ANHÃ

[ MoMita = mochila + marmita ] Este projeto está inserido na proposta apresentada na disciplina de Projeto e Tecnologias - “Os artefactos e o seu consumo na sociedade atual, O Mercado do Bolhão e as suas vivências”. O produto é uma mochila-lancheira, que tem como objetivo otimizar o espaço que, neste caso, um aluno transporta, desde a sua saída de casa, o percurso até chegar à sua escola e as horas passadas na escola.


ANA SANTOS

O individual idealizado será composto por duas partes:

da mochila em algodão e a parte inferior da mochila

a primeira é uma mochila-lancheira (onde o aluno coloca

algodão no seu exterior e tela térmica na parte inferior.

os livros e a “marmita”) e a segunda um recipiente para

Estas duas partes são unidas com um zipper.

transporte de alimentos sólidos (onde coloca o almoço).

Esta tem duas alças que permite a sua colocação nas

A mochila-lancheira é, por sua vez, formada por uma

costas da pessoa.

mochila para o transporte de livros, na parte superior,

O recipiente para transporte de alimentos sólidos é em

e, na parte inferior, por uma lancheira onde se pode

latão. Tem a forma paralelepípeda, com uma tampa

colocar o recipiente para transporte da merenda. É

deslizante.

confecionado nos seguintes tecidos - parte superior

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HIPÉRBOLE MERCADO DE RUA AO SÁBADO D E M A N H Ã

Individual para refeição ligeira Conjunto de tabuleiro e recipiente para líquidos

A fim de responder à proposta de trabalho introduzida na unidade “Os artefactos e o seu consumo na sociedade atual”, começou-se por um levantamento fotográfico do Mercado do Bolhão contemplando pormenores, quer da sua arquitetura, quer das suas essências, nomeadamente produtos, circulação comercial e populacional, etc..

Esta fase referente à proposta procedeu a inicial

deveriam contemplar leveza e custos maioritariamente

definição do conceito. Sendo assim, foi necessário

reduzidos, reunindo equilíbrio de relação entre função e

estabelecer a refeição selecionada, sendo que se optou

estética. Ainda, destacaram-se a questões ecológicas e

pelo pequeno-almoço. No entanto, foi tida em conta a

de durabilidade, reduzindo ao máximo a quantidade de

possibilidade do conjunto, (limitado ao máximo de três

matérias-primas para a sua execução..

peças), poder abarcar outros géneros que não só a

À partida, quando se fala em tabuleiro parte-se do

refeição escolhida. Para além disso, foram ponderadas

princípio que seja necessário o uso do habitual prato,

outras questões que não a tentativa de aplicar, direta

colocado sobre este, que contenha alimentos sólidos e

e evidentemente, os detalhes do Mercado, a destacar

ao mesmo tempo líquidos. No entanto, pensou-se em

a necessidade de se projetar um conjunto de objetos

reunir, numa só peça, no tabuleiro, duas funções: a de

acima de tudo funcional, prático e adaptável a diferentes

transporte fácil de vários componentes e a dispensa

necessidades e utilizadores, desmontável (para fins

de um prato. Esta última apontava para a colocação

de arrumação e transporte fáceis), cujos materiais

de alimentos sólidos diretamente sobre o tabuleiro,


FÁBIO MOTA

podendo o uso do prato ser opcional. Após o surgimento de novas questões, essencialmente ligadas à higiene e limpeza, concebeu-se a alternativa de dividir proporcionalmente o tabuleiro em três partes distintas, sendo que duas delas, as extremidades, quando retiradas e unidas teriam as mesmas dimensões da parte central. Mas, o facto de estas poderem ser retiradas e novamente repostas do mesmo modo pressupunha que fossem, obviamente, amovíveis e por isso careciam de um sistema de encaixe (após variados estudos sugerimos um perfil em “H” magnético). Toda esta insistência em permitir que o tabuleiro fosse desmontável deveu-se essencialmente a questões de

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PR O J E TO

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arrumação do mesmo, sendo que depois de retiradas

material (madeira) que impedem a deslocação dos

as extremidades (uma com a parte do H referente ao

objetos para os quais foram projetados, tentando dar

macho, a outra com a fêmea) podem ser fixas uma à

resposta ao problema da deslocação dos recipientes e

outra e colocadas sobre a central, reduzindo o tabuleiro

objetos durante a deslocação.

de 52 cm a metade do seu comprimento.

Quanto a questões de movimentação e estabilidade

O tabuleiro, como anteriormente enunciado, é composto

do tabuleiro, aplicaram-se duas peças semicirculares

por três partes: A extremidade esquerda comtempla

por debaixo das extremidades laterais de modo a que

o local para os talheres, onde se aplicou uma forma

quando sobrepostas à parte central a ela se fixassem,

retangular,

como

e que ao mesmo tempo servem de elevação e base

referência à planta do Mercado do Bolhão; A central, um

ao corpo do tabuleiro, facilitando o modo de pega ao

local circular para permitir a colocação da base de um

utilizador.

prato ou servir como tal. Por fim, a extremidade lateral

A Ergonomia e Antropometria delimitaram as dimensões

direita, possui um local também circular, de referência

do tabuleiro, sendo que, genericamente, este possui

às cúpulas do Bolhão, para a colocação de um copo.

52cm de comprimento, 27cm de largura e 2.5cm de

Em todos estes locais referidos existem rebaixos do

altura. As componentes para a colocação dos objetos

com

os

cantos

arredondados,


FÁBIO MOTA

anteriormente

descritos,

constituem

as

medidas

útil do mesmo, estabelecendo um contraste entre o

standard de prato, talheres e copo.

castanho-escuro mate da madeira (envernizada com

A definição dos materiais a aplicar na produção em série

pouco brilho).

deste produto estabeleceu que, para serem atingidos

A aparente complexidade deste produto, contudo,

os pressupostos estéticos desejáveis, este deveria

permitiu uma outra particularidade na sua utilização

ser materialmente constituído por madeira de Ébano,

diária. O usuário pode utilizá-lo na sua total composição,

quando destinado a um público-alvo de uma classe alta

se necessário todo o espaço útil, utilizar a parte central

ou média-alta. No entanto, para que o produto pudesse

como prato para componentes alimentares sólidos e

abarcar classes mais baixas, seria utilizada uma madeira

secos, ou ainda alternar com as partes laterais referentes

menos dispendiosa a qual seria revestida por folha de

ao copo e espaço para talheres, caso necessite apenas

madeira de ébano, assumindo um acabamento estético

de transportar e colocar sobre, pequenos alimentos,

similar. Por fim, foi mentalmente considerado que para

a deslocar para locais onde a utilização total seja

os mesmos fins estéticos, o rebordo total do tabuleiro

desconfortável (ex.: sofá, cama, etc.).

deveria ser revestido a chapa de aço inoxidável e assim, também aplicadas duas tiras deste metal na superfície

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PRO J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | 11ºANO _ EASR | 2013.14

MERCA DO DE R U A A O S Á B A D O D E M A N H Ã Este trabalho foi inspirado no objeto da unidade 2: a cadeira Follia de Giuseppe Terragni. A proposta cinco, pedia para realizar estudos para dois objetos de servir à mesa, tendo como ponto de partida a cadeira modernista.

Cadeira Follia (1934)

Designer Giuseppe Terragni Produzida pela Zanotta


NUNO MENDES

Um dos objetos é um porta guardanapos. A sua base é em madeira e dela saem duas barras em aço inox rematadas por uma peça, também em madeira, que têm como função segurar e pressionar os guardanapos.

O outro objeto é um porta garrafas. Tem uma base em madeira com um rebaixamento de 1 cm para estabilizar a garrafa. Da base sai uma barra em aço inox com 28 cm de comprimento e com uma perfuração ovalada. Esta tem como função prender a garrafa pelo gargalo e servir de pega.

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PR O J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO EQUIPAMENTO _EASR | 2013.2014 FORMAÇÃO EM CONTEXTO DE TRABALHO | ESCOVARIA DE BELOMONTE

FORMAÇÃO EM CONTEXTO DE TRABALHO ESCOVARIA DE BELOMONTE


ABEL MARTINS

Ao entender o processo tradicional que as escovas

a escova. Conjuga-se através do nascer de pequenos

na Escovaria de Belomonte têm e ao constatar a

seres vivos (sementes de trigo) que anexados ao corpo

potencialidade dos produtos, pensase em promover os

da escova mostram a essência da vida que todas as

objetos que são lá vendidos. É a pensar em algo que

escovas com este tipo de cozimento têm.

promova toda a entidade e não apenas um objeto só

O nome escolhido para o efeito Escova Videira pretende

que surge uma resposta para este problema. Os objetos

simbolizar a existência de vida na escova. Ao fazer a

vendidos são de extrema qualidade com durabilidade e

associação a árvores de fruto, que por norma tendem a

resistência, sendo capazes de durar anos sem quebrar

receber o sufixo –eira após o nome do fruto

qualquer traço de funcionalidade. Escovas com tal tipo

(exemplo o fruto pera provém da pereira), relato que

de cozimento duram bastantes anos e assumem assim

este nome videira surge não como a trepadeira cujo o

um contrato vitalício com o usuário. Estes objetos irão

fruto é a uva mas como algo de que resulta vida. Ao

acompanhar a vida de um cliente e irão durar uma vida

considerar a vida como o fruto e ao se combinar

– aqui percebe-se que a vida que todas as escovas

com o sufixo ‘–eira’ obtem-se este nome videira do qual

têm é algo de procura – questões da durabilidade

originam vidas que neste caso são mostradas pela

e resistência. No entanto do modo em que todas as

existência das sementes de trigo.

escovas se encontram, nenhuma delas apresenta ter realmente vida - processo do qual os seres vivos são uma parte. É desta forma que se chega ao núcleo do conceito. É com a semântica desta palavra – vida – que se associa ao sentido de estar vivo. Ao espaço de tempo entre a nascença e a morte de um organismo, é com estas palavras que se pretende conjugar a vida com

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PR O J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO EQUIPAMENTO _EASR | 2013.2014 FORMAÇÃO EM CONTEXTO DE TRABALHO | ESCOVARIA DE BELOMONTE

A Escova Videira é constituída por 5 peças. A primeira

de uma outra placa quadrada com 36 mm de lado conta

peça, o corpo da escova, é composta por quatro placas

com 10 mm de espessura. Para a execução dos 36 tufos

de madeira (idealizadas em mogno ou castanho). Estas

é necessário furar esta peça pelos dois lados.

placas quadradas 40x40 mm tem 5 mm de espessura

Um lado consta com buracos de 4 mm de diâmetro e 6

e na parte inferior há uma redução da parede para 2

mm de profundidade.

mm a uma profundidade de 13 mm. Para que estas

O outro lado tem furos mais pequenos com apenas 2 mm

quatro placas formem uma caixa cúbica as peças são

de diâmetro e 4 mm de profundidade. Após a realização

chanfradas a 45 graus para de seguida serem coladas

dos furos, esta peça juntamente com as outras deveram

com cola branca. A parede divisória interior que divide a

ser levemente lixadas para

escova tem 3 mm de espessura e contempla um furo no

receber tapa poros celuloso. Estando o tapa poros seco

seu centro com 20 mm de diâmetro. Este furo é vazado

procede-se ao enchimento do bloco de escova com

de um lado ao outro. O bloco de escova é feito a partir

tufos de cerda (branca ou preta).


ABEL MARTINS

O comprimento de cada tufo é de 20 mm. Esta escova possui uma peça metálica em latão. Utilizando uma chapa de 0,6 mm planifica-se um cubo sem uma das faces com 30 mm de lado. Depois de recortada a chapa é depois dobrada e soldada. A nível de acabamento seguemse os seguintes passos: limar, lixar, polir e lustrar. A quinta peça é composta por uma malha de sarapilheira quadrada com 150 mm de lado, cerca de 30 gramas de fibra de coco e 4 gramas de sementes de trigo. Misturam-se a fibra de coco com as sementes e coloca-se sobre o meio da malha de sarapilheira de modo a que se consiga utilizar o restante espaço para fechar o saco. Para selar o saco amarra-se fio de algodão e para impossibilitar a sua abertura retiram-se os excessos de sarapilheira e de fio.

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PR O J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO EQUIPAMENTO _EASR | 2013.2014 FORMAÇÃO EM CONTEXTO DE TRABALHO | ESCOVARIA DE BELOMONTE


ABEL MARTINS

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PR O J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO EQUIPAMENTO _EASR | 2013.2014 FORMAÇÃO EM CONTEXTO DE TRABALHO | ERESERV - MOBILIÁRIO URBANO

SIGMA BANCO / MESA PARA PARQUES E JARDINS

Neste projeto foi desenvolvida uma peça de mobiliário urbano para locais públicos de exterior, de acordo com o desafio lançado pela empresa parceira, a ERESERV, Mobiliário Urbano. Chegou-se assim à definição de uma peça única que assume as funções de banco e mesa, opção que tem sido pouco explorada pelo setor mas que tem um grande potencial de uso e de atração de utilizadores no contexto informal e lúdico dos espaços livres das cidades.

DIMENSÕES: Comprimento – 890 mm Largura – 840 mm Altura – 900 mm


GONÇALO SILVA

Formalmente a peça foi inspirada no origami – arte de

Como o objeto é para um único utilizador, foram criados

dobrar papel, e por isso assemelha-se a uma folha

modelos similares que se conjugam de forma a serem

dobrada que cria os vários planos.

disponibilizados para várias pessoas. Assim, podemos

A forma da peça, vista de frente assemelha-se a um “G”,

ter duas peças dispostas uma em frente à outra, ou

vista de lado parece um “V”, e vista de cima quase que

lado a lado, ou seja, as duas pessoas podem estar do

só vemos dois planos desnivelados, os que assumem

mesmo lado ou em lados opostos.

as funções de mesa e banco.

Esta peça em betão, material robusto e durável,

Este objeto pode ser dividido em cinco partes ou

enquadra-se bem em qualquer tipo de ambiente de

paralelepípedos interligados obliquamente: o que se

exterior e oferece uma maior comodidade à população.

encontra mais longe do chão, que desempenha a função

Nesta peça podemos lanchar ou almoçar ao ar livre,

de mesa, é um paralelepípedo truncado precisamente

podemos estudar, ler um livro ou o jornal, ou até mesmo,

por um plano oblíquo.

trabalhar e utilizar o computador portátil.

Esta peça foi desenvolvida para um ambiente exterior público, como por exemplo, praças, jardins, parques, largos, ou outros espaços urbanos.

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PR O J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO EQUIPAMENTO _EASR | 2013.2014 FORMAÇÃO EM CONTEXTO DE TRABALHO | TECNAREA

BANGA O convívio à volta de uma mesa de centro num hotel de Angola

O desafio para a realização deste projeto foi lançando pela empresa TECNAREA que desenvolve a sua atividade no setor da decoração e do mobiliário para a indústria de hotelaria. No caso concreto o cliente era uma cadeia de hotéis angolana e a obra em questão era um hotel da região de Benguela.

DIMENSÕES: Comprimento - 800 mm Largura - 800 mm Altura - 415 mm

Dentro das tipologias de equipamentos previstas para o

geométrica associa o valor estético e simbólico de

hotel foi selecionada a mesa de centro, equipamento a

raízes locais com a sobriedade e a racionalidade

aplicar tanto em espaços sociais como em espaços de

contemporâneas, num conjunto em que não pode faltar,

quartos de hóspedes.

dado o nível de serviço oferecido pela cadeia de hotéis,

Foi a tradição e a arte angolana que esteve na base

a elegância e o requinte.

da solução proposta, nomeadamente através da

À função base de mesa foi associada de forma subtil e

exploração de padrões geométricos presentes nos

pertinente a arrumação de revistas num espaço criado

têxteis de manufatura artesanal. Desta forma a natureza

no interior de um apoio e face lateral da mesa.


SOFIA VIEIRA

Os materiais previstos para a construção integram o MDF folheado a Zebrano, madeira exótica local, de textura forte e contrastes intensos, e o vidro temperado que atribui leveza e transparência ao objeto. O conjunto fica completo com acessórios de metal, realizados em latão dourado.

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CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO OURIVESARIA _EASR | 2013.2014 FORMAÇÃO EM CONTEXTO DE TRABALHO | EUGÉNIO CAMPOS

PORTUGAL

em quatro linhas Como cliente da nossa FCT, contámos com a colaboração da Empresa Eugénio Campos, que nos apresentou uma proposta de trabalho, resumida numa frase: “identificar Portugal com as técnicas da joalharia tradicional portuguesa”. Em resposta ao objetivo desta proposta, o foco inicial foi tentar deduzir a forma como Portugal é visto e encarado e o que o identifica. Ainda que cliché, o sentimento patriotista e aventureiro acaba por ser sempre, inevitavelmente, associado a esse grande acontecimento histórico que foram os Descobrimentos. É sem dúvida, um aspeto que reconhecem nos Portugueses enquanto povo.

Até os contemporâneos dos dias de hoje que não

após reflexão, me fez senti-lo mais meu e por isso,

viram caravelas partir sem rumo certo, sentem que já

algo que sinto vontade de honrar optando por fazê-

conquistaram o mundo. Acredito que tenha sido esse

lo desta forma: tentando materializar algo incorpóreo

reconhecimento e até vaidade que levou por todo

que, apesar de longínquo merece continuar a ser

este mundo que os Portugueses ajudaram a descobrir

enaltecido simplesmente porque assim como amanhã

a ideia de que estes são persistentes e capazes de

se descobrirão mais aprofundadamente novas galáxias,

coisas incríveis que, de tal forma magistrais, continuam

assim como hoje se descobrem novos planetas e como

presentes atualmente, repare-se que se diz: “nós

ontem se pisaram satélites, há seis séculos as cortinas

portugueses navegámos por mares nunca dantes

do mundo abriram-se, ou melhor, a valentia lusitana

navegados” mas este nós não é um nós individual,

abriu as cortinas do mundo ao mundo.

não individualiza seres, individualiza um povo que,


ANA MARTA SILVA

Com os Descobrimentos, estabeleceram-se novas rotas

porque houve determinados espaços físicos que foram

comerciais intercontinentais que fizeram chegar novos

percorridos pelos nossos navegadores. Estes espaços

produtos e permitiram estabelecer novos costumes no

foram as Rotas dos Descobrimentos que, precisamente

quotidiano das populações.

pelo que permitiram, servirão de mote a este trabalho.

Distinguem-se então dois méritos nos Descobrimentos:

Das

o mudar hábitos pelos produtos trazidos e o alargar do

Descobrimentos, houve quatro que, pelas consequências

conhecimento do mundo.

que trouxeram e pelos diferentes locais que “uniram”, se

Ambos os feitos apenas conseguiram ser concretizados

revestem de maior destaque.

várias

rotas

existentes

do

período

dos

São elas: A rota de passagem do cabo da Boa Esperança, com Bartolomeu Dias em 1488 A rota da descoberta das Antilhas (América Central), por Cristóvão Colombo em 1492 A rota da chegada à Índia, por Vasco da Gama em 1498 A rota de descoberta do Brasil, por Pedro Álvares Cabral em 1500 O ponto de partida para todas estas descobertas foi Portugal. Considerando estes aspetos, procurei uma forma que unisse um ponto (Portugal) a outros quatro pontos distintos (Sul de África, América Central, Índia e Brasil). Esta união de pontos é feita, claro está, por linhas porque no fundo, as rotas marítimas são isso mesmo, linhas.

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PR O J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO OURIVESARIA _EASR | 2013.2014 FORMAÇÃO EM CONTEXTO DE TRABALHO | EUGÉNIO CAMPOS

De uma união mais “fiel” destes pontos, a forma evoluiu

e planas passam a ser apresentadas numa estrutura

no sentido de ser estilizada e simplificada. Porém, em

tridimensional que confere uma maior fluidez à peça e

termos práticos, esta nova forma poderia não ser a

que pode ser associada à volumetria do globo terrestre.

mais apropriada para uma peça de joalharia visto que

A fim de se realçarem as linhas das rotas, estes espaços

os diversos vértices seriam um obstáculo por poderem

serão preenchidos por zircónias.

prender na roupa, no cabelo…

Encontrada

Assim, a unir as linhas das rotas, passam a existir outras

meramente estéticas) que a peça surja na posição

linhas que simbolicamente remetem para a unificação

inversa: os pontos das Antilhas e do Brasil passam a ser

do mundo para que contribuíram os Descobrimentos,

pontos mais à direita da peça.

ligando distantes pontos do globo. As novas linhas, começam a evoluir para faces (o que resolve o problema dos vértices) que, de bidimensionais

a

estrutura,

proponho

(por

razões

Nasceu assim “Portugal em quatro linhas”.


ANA MARTA SILVA

PORTUGAL EM QUATRO LINHAS

Na linha do tempo são já seis,

Seis os séculos que nos separam Das linhas que alguns navegaram, Linhas, rotas que nos unificaram.

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PR O J E TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO TÊXTEIS _EASR | 2013.2014 FORMAÇÃO EM CONTEXTO DE TRABALHO | SOMELOS

COLEÇÃO DE TECIDOS PARA CAMISARIA DE HOMEM

Vestir bem reunindo estilos e sensações Este projeto foi lançando pela empresa SOMELOS que desenvolve a sua atividade no setor da tecelagem industrial. No caso concreto o desafio lançado pela empresa foi a criação de uma coleção de tecidos de camisaria para homem.

Cada vez mais os homens têm vindo a preferir um

nesta tendência com cores tão distintas, para poder

look elegante mas descontraído, com acessórios que

juntá-las de modo a criar algo agradável e apetecível ao

contribuam para isso mesmo, bem como os motivos mais

público masculino, completando o conceito com mais

irreverentes. Claro que tudo isto varia de público-alvo

imagens que também me remetem para a reunião de

para público-alvo, até porque mesmo a nível geográfico

cores, de sabores, de estilos.

a moda difere muito de país para país.

Assim, a coleção oferece um conjunto diversificado de

As camisas, porém, são uma peça de vestuário comum

tecidos pensados para situações diversas mas sempre

e constante a quase todas as culturas. Os homens

modernas e elegantes, que se agrupam de acordo com

preferem-nas por serem uma peça versátil, elegante e

valores funcionais, estéticos e simbólicos, explorando o

que lhes assenta bem. As tendências dizem-nos que

imaginário associado à denominação de cada grupo:

a moda aponta cada vez mais para padrões de riscas

• Descontraído

horizontais, xadrez, animal prints e efeitos óticos.

• Divertido

Dentro dos “painéis-ambiente” fornecidos foi selecionado

• Ilusão ótica

o Assemble quer dizer juntar, reunir. Daí ter pegado

• Formal

COORDENADOS POR COR Coodenado por cor

Coordenado por cor

Coordenado por cor


MARIANA ALVES

PAINEL DE INSPIRAÇÃO

Coordendos por cor

Coordenados por cor

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PR O JE TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | 12ºANO _ EASR | 2013.14

SÉRIE

CANVA, ONDA E PIÃO INTRODUÇÃO

Aquaglass, uma empresa localizada em Campo de

A Forma o em Contexto de Trabalho visa aperfeiçoar as

Valongo, destinada à venda de produtos de cariz sanitário

competências técnico-artísticas dos alunos e para tal, a

e artigos de decoração.

escola propõe que em parceria com uma empresa, estes

Trata-se de uma empresa de venda de produtos

realizem uma proposta de trabalho, simulando que tenha

fabricados em série

características semelhantes .s propostas de trabalho

sendo quase que excluído o cariz artesanal dos artigos

reais.

comercializados. Vende, entre outros, ferragens para vidro

Esta proposta de trabalho foi feita pela empresa

temperado para cabines de duche com portas de correr,

Aquaglass a alguns dos alunos tanto de Cerâmica como

resguardos de banheira, toalheiros, cabides e piaçabas.

de Equipamento.

Destina-se a um mercado de elevada qualidade onde se

Neste caso, a proposta seria a cria..o de uma série

pode observar preocupações relacionadas tanto com

de três artefactos e os alunos de Equipamento

o design como com a relação entre os vários materiais

poderiam optar por três dos seguintes: toalheiro,

aplicados nos produtos.

prateleira, suporte de piaçaba, porta rolos ou cabide.

Os materiais utilizados são o latão cromado com brilho


PATRÍCIA CARVALHO

e o aço inoxidável polido espelhado. Dado que investe maioritariamente no design, os objetos tem um caráter inovador quando aplicado neles materiais como madeira, peles e polímeros. Não tendo fabrico independente o fabrico dos seus produtos feito, na maior parte, pela empresa JNF.

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PR O JE TO

CURSO DESIGN DE PRODUTO | 12ºANO _ EASR | 2013.14

Um movimento tranquilizante, dotado de uma certa delicadeza, sofisticação e leveza, características que pretendia transportar para a linha de objetos final.

SIMBOLISMO

PROCESSO CRIATIVO

O movimento artístico que serviu de inspiração para a

O processo criativo iniciou-se de uma forma arbitrária,

série final foi o simbolismo.

explorando a relação das várias linhas em cada objeto:

Esta série deveria ser diretamente inspirada na água - o

recurso a linhas retas, conjugação destas com linhas

elemento natural presente no quarto de banho e com o

curvas e por fim, utilização predominante da linha

qual se interage na maioria do tempo.

curva que transmite sensação visual de organicismo e

Após essa consciencialização passou-se à exploração

consequentemente, simbolistas.

dos seus movimentos, das suas características e particularidades. O

movimento

que

suscitou

mais

interesse,

e

consequentemente foi a base da inspiração para toda a série final, foi a ondulação da água.


PATRÍCIA CARVALHO

SÉRIE CANVA Uma das primeiras ideias surgiu tendo como base de inspiração os projetos do designer Adalberto Dias. Neste suporte de piaçaba foi explorada a forma cilíndrica e as curvas e cortes que esta poderia sofrer.

SÉRIE ONDA Tal como o nome indica, a série onda é inspirada pelas

A série de objetos, constituída por um toalheiro de chão,

ondas do mar. O movimento destas, quando o mar

um toalheiro de parede, um piaçaba e um porta rolos.

se encontra calmo, sugere tranquilidade, uma certa

Para além do cumprimento da função, nesta série

delicadeza e sofisticação e, por isso, leveza.

a estética, também muito valorizada, sendo um dos

Estas características foram as “palavras-chave” de toda

objetivos principais na criação da série, a coesão de

uma série que se seguiria, tentando nela ser transmitido

todos os objetos constituintes desta mesma.

o movimento, a serenidade e sofisticação adequadas.

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SÉRIE PIÃO A Série Pião, diretamente inspirada pelo trabalho de Jozeph Forakis, serviu como ponto de partida para a exploração dos vários materiais, cores e acabamentos que os objetos da s.rie final poderiam vir a ter. Foi ainda uma série projetada para o público infantil sendo assim utilizadas cores vivas e a forma inspirada num pião.

A forma da linha de objetos foi evoluindo, podendo

polímero de modo a que os líquidos corrosivos não

observar-se algumas alterações tanto no toalheiro de

danifiquem o metal.

chão como no porta piaçaba.

A primeira solução encontrada seria a colocação,

O toalheiro de chão sofreu alterações na sua base. Esta

através da base superior de um copo de polímero

começou por ser retangular mas, dado que toda a série

moldável que seria facilmente retirado e colocado,

se carateriza pela utilização de linhas curvas, optou-

moldando-se às curvas da base. No entanto, esta

se por uma base elíptica. Para além desta alteração,

solução seria impossível porque, até aos dias de hoje,

foi alterado também o tamanho desta pois inicialmente

não existe nenhum polímero moldável e resistente à

aparentava estar demasiado comprida, sendo assim

corrosão simultaneamente.

reduzido o tamanho desta.

A solução encontrada passa pela colocação de um copo

Já o porta piaçaba começou por ter uma forma um pouco

de ABS, que encaixa na parte inferior base do suporte.

bruta e grosseira, destoando do que era pretendido. Para chegar à forma final foi então adelgada a forma

MEMÓRIA DESCRITIVA E JUSTIFICATIVA

como se pode observar.

Tendo como ponto de partida a proposta de cria..o

Para além desse apontamento, o cabo do suporte de

de uma série de três artefactos feita pela empresa

piaçaba sofreu um aumento de diâmetro por questões

Aquaglass, o trabalho desenvolvido foi inspirado no

antropométricas. Dado que era extremamente fino

movimento da água - mais concretamente ondulação

poderia prejudicar a sua função, tal como foi referido na

desta. Neste projeto tentou transportar-se para a série

avaliação intermedia.

características típicas das ondas, tais como a leveza,

Sendo a base do suporte de piaçaba irregular foi

sofisticação e tranquilidade.

necessário encontrar uma solução para o copo onde o

O conjunto de artefactos criado, constituído por um

cabo deste iria ficar seguro.

toalheiro (onde tanto foi explorada a hipótese de

Geralmente, necessária a colocação de um copo de

toalheiro de parede como de toalheiro de chão), por um


PATRÍCIA CARVALHO

suporte de piaçaba e por um porta-rolos.

relativamente simples sendo facilitada a sua produção

Trata-se de um conjunto de objeto projetados em latão

em série.

cromado devido às suas características principais e por ser um dos materiais explorados pela empresa. Para al.m

CONCLUSÃO

do metal, existe um objeto em ABS - o copo interior da

Tendo em conta que a Formação em Contexto de

base do piaçaba, que tem como função evitar a oxida..o

Trabalho foi uma simulação do que será a interação do

e corrosão deste metal, dado que este está em contacto

“futuro designer” com a empresa produtora, penso que

direto com líquidos corrosivos.

esta resultou bastante bem.

No que diz respeito ao processo de ligação entre as

Houve desde o começo até ao final, grande cooperação

varias partes constituintes:

tanto por parte da empresa como dos alunos o que

- nos toalheiros, as várias partes ligam-se através de

levou a um grande empenho e dedicação na idealização

enroscamentos ou pelo recurso a rebites em certos

daquilo que seria a série de objetos.

casos;

Apesar do receio inicial dado que uma linha de objetos

- no porta-rolos e no cabo do piaçaba, as peças são

sanitários nunca tinha sido abordada ou pensada por

fixadas através de enroscamento de uma peça principal

mim, com o desenvolver deste trabalho comecei a

.s restantes.

interessar-me pelo tema e a querer aprofundar cada vez

Por fim, o processo de fixação à parede do toalheiro de

mais aquilo que seria uma possível linha.

parede e do porta-rolos é semelhante. Na parede é fixada

Terminada a Formação em Contexto de Trabalho, penso

uma peça que é nela enroscada e, na parte visível desta

que foi uma experiência positiva e cativante.

peça existe uma cavilha com um furo roscado. Esta entra no interior do tubo correspondente, também com um furo roscado, e são fixados um ao outro com um parafuso. Apesar das formas curvas da série, a sua conceção é

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QUADRA M ER C A D OS D O POR TO

CO NTENTO R DE APERI T I V O S

Quem visita o mercado do bolhão é atraído pela sua agitação, caos, vivências e pelo estilo arquitetónico do seu edifício. Na ótica do observador, ao procurar repetições, padrões e ritmos, destacam-se as linhas geométricas. Para encontrar uma linguagem visual de design que se relacione com o mercado, produtos e expositores, tomouse como ponto de partida as formas e grelhas quadradas observadas nos painéis de azulejos, nas caixas de transporte de produtos, nos telhados, nos tetos, no chão e nos portões do mercado. Simbolicamente, na peça desenvolvida é objetivada a padronização e a modularidade interligando estas com a arquitetura do mercado, no entanto, as mesmas também definem o sentido funcional do objeto. É premissa responder com um produto cerâmico, que não só se relacione esteticamente e simbolicamente com o mercado, mas também traga ao mesmo, mais valias comerciais.


ANA SOFIA COSTA

Design Modular O design modular, pela utilização de componentes modulares que podem ser configurados numa grande variedade de produtos e de serviços, é o melhor método para alcançar a fabricação personalizada minimizando custos

enquanto

se

maximiza

a

personalização

de produtos no sentido de alcançar necessidades específicas dos utilizadores. Num Design Modular, a divisão da informação em módulos tem em consideração o uso repartido dos módulos por diversas estruturas, ou seja, é feita de modo a que esses módulos possam ser combinados e montados em diferentes produtos ou sistemas com o objetivo de rentabilizar esses módulos. O Design Modular, ao permitir alterar componentes de um sistema, sem ter que o refazer na sua totalidade, torna os sistemas modulares flexíveis, adaptáveis e capazes de evoluir.

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A Aplicação do conceito modular no design de produto

Dimensões: Contentor-1 80x1 80; Tabuleiro-385x385

traduz-se pela divisão do produto e permite que ele

Materiais: Porcelana e Madeira

execute a sua função principal.

Uso público e uso doméstico: Este objeto pode ser

Estes módulos, quando interligados, contribuem para

utilizado tanto no mercado como em casa.

que o produto execute a sua função principal.

Funcionamento/Modo de uso: O Contentor - unidade

As relações que estabelecem entre os utilizadores e o

modular - dispõe de um tabuleiro de base no qual

produto modelar, são de facto de cumplicidade em que

se podem agrupar várias unidades da mesma peça,

um modifica e o outro se deixa modificar.

possibilitando deste modo diversas geometrias/padrões

Quadra - Conjunto ou série de quatro coisas.

e funcionalidades - versatilidade. O elemento modular geométrico - forma/metáfora - remete para a tipologia de formas; elementos

Compartimento, recinto ou terreno em forma de quadrado.

arquitetónicos e decorativos (ferro /cerâmica) intregantes

Cada um dos lados de um quadrado. Quadra poética

e caracterizadores da tipologia do mercado.

(popular) formada por uma estrofe de quatro versos.

Vantagens: Devido à forma explorada é possivel

Figurado: estação do ano; tempo; época; ocasião; idade.

formar vários conjuntos, utilizando módulos simples ou

O objeto Quadra é um contentor de aperitivos, que foi

associados ao tabuleiro de madeira.

projetado incidindo nos conceitos de funcionalidade, modularidade, versatilidade e simbolismo.


ANA SOFIA COSTA

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O objeto Quadra é um contentor de aperitivos, que foi projetado incidindo nos conceitos de funcionalidade, modularidade, versatilidade e simbolismo. A criação do módulo Quadra foi também concebido tendo em conta aspetos associados à sua viabilidade técnica. Neste caso, a produção industrial desta peça seria preferêncialmente realizada pelo processo de prensagem isostática através de uma pasta (porcelana) atomizada. Em alternativa, poderia também ser utilizado um processo de enchimento sobre pressão, ou, ainda, a utilização da prensagem plástica. Ao nível de acabamentos a peça seria vidrada com um vidrado transparente (alto fogo), sendo apresentada na versão base, sem decoração, e na versão decorada a dois tons, com uma gama alternativa de seis cores.


ANA SOFIA COSTA

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[des]construído Aromas, cores, vozes e movimentos que também insistem e persistem em espaços que esperam a nossa visita. Espaços povoados de tradição. Mas acima de tudo, lugares vívidos e vividos. Eles são os mercados. Do Porto. São espaços vivos. É sobre esses espaços-emblema da Invicta que surge o tema orientador de todo o projecto: Mercados do Porto. E o que resta senão uma memória desgastada daquilo que outrora se apresentaria como um verdadeiro mercado tradicional portuense? O Bolhão, um organismo que se constrói pelas pessoas e para as pessoas. E feiras da pulga aparte, nele reside o verdadeiro mote deste trabalho. Assim, esta prova centrase essencialmente na procura de uma forma de renovação do interior dos mercados do Porto, exercendo maior foco nas estruturas de exposição dos produtos. Pretende-se projectar um micro-ambiente móvel que dinamize o espaço. Desta forma, a atmosfera mercantil será constituída por módulos que se combinam e transformam, e que alteram a organização espacial do recinto conforme as necessidades, proporcionando maior flexibilidade e mobilidade ao mercado e apresentando-o como um espaço vivo.

Modularidade. Versatilidade. Multi-funcionalidade, aliados a sensações.


ANA RITA FERREIRA

A pesquisa traduziu-se numa procura conceptual e

portáveis e dinâmicos. Além disso, recorreu-se à obra

visual. Surgiram palavras e expressões que definem

do designer Joe Colombo “Boby Trolley” de 1970 e

o projecto e que de alguma forma foram recriadas e

recuou-se no tempo com o mobiliário mecânico de

reconstruídas com o mesmo. Termos cujo significado se

Thomas Sheraton “Night Bason Stand” publicado

defendeu visualmente - um dicionário visual. Observou-

no livro “The Cabinet Dictionary” de 1803. Colombo

se o mercado. O primeiro, renovado e embelezado mas

contribuiu com a sua visão futurista, que se proliferou

carente de tradição. O outro, desgastado e cansado

por peças modulares e versáteis, e por estruturas uni-

porém persistente em prosperar com o seu encanto

bloco que possuíam mais que uma função num só

tradicional. Este último foi a musa do trabalho. Precisa-

espaço. Sheraton foi também um dos grandes designers

se de dinâmica, inovação, organização. De integrar

de mobiliário do século XVIII, se assim lhe pudermos

flexibilidade e multi-funcionalidade nas formas de

chamar. A época e os ideais destes dois grandes nomes

expor. Mas também se precisa de arrumação. Assim,

são completamente afastados.

segundo esta linha de pensamento, emergiram imagens

No entanto, ambos se encontram aliados numa pequena

de produtos versáteis, articuláveis, multi-funcionais,

grande coisa: o génio multifuncional.

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Depois de uma pesquisa cuidada de premissas que se pretendiam integrar no produto a projectar, foi certo o caminho a tomar. A projecção de um espaço, criado por módulos, que reunisse a área de exposição das mercadorias e a área de trabalho do comerciante. Um espaço dinâmico e móvel, que possibilitasse a circulação das pessoas ao redor dos expositores. Desta forma

desenvolveram-se

esboços.

Procuraram-se

formas. E dessa busca surgiu uma fórmula matemática. A sequência de Fibonacci. A base matemática do trabalho. Que gerou e proporcionou uma outra dimensão estética e funcional ao projecto. Uma variedade imensa de configurações. E funções, também. Apenas restou saber o que se queria expor e como se queria expor.


ANA RITA FERREIRA

[DES]CONSTRUÍDO. Constrói-se e desconstrói-se. Um desenrolar de módulos que se combinam e transformam. Um organismo. Que se personaliza, podemos até dizer, “à vontade do freguês”.

Que dá suporte aos artistas da cena, as frutas, as flores, as especiarias. Povoado por cores. Que vive e mexe, ao som

dos ritmos do mercado. Que substitui modelos estáticos e preconcebidos. Que possibilita um espaço em constante

mudança. Que depois de utilizado se arruma e dá lugar a

outras actividades e eventos que possam convidar turistas e curiosos ao mercado. Não se pretende raptar a essência

tradicional do mercado. Apenas semear-lhe nova vida, nova dinâmica.

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Expor, organizar, transportar e oferecer flores muitas vezes!

DIMENSÕES: Pequeno

Comprimento – 150 mm Diâmetro – 75 mm Grande Comprimento – 250 mm Diâmetro – 85 mm

O projeto teve como ponto de partida o conceito

Esta tipologia foi pensada como forma de auxílio ao

“reflorescer tradições” com o qual se pretende recuperar

cliente na realização das suas compras, apontando

para os dias de hoje algo com grande significado

para um objeto simples e pequeno, prático e resistente,

histórico. O objetivo era desenvolver um produto que

economicamente acessível, que pudesse satisfazer

respondesse a necessidades funcionais existentes

todas as faixas etárias.

nos mercados como também promovesse a venda e a

O material escolhido para a parte exterior da tampa

tradicional oferta de flores, sem nunca esquecer o seu

superior e dos tubos foi o pvc, visto ser um material

carácter simples e prático.

reutilizável e bastante económico para ser vendido nos

Foram observados os problemas de funcionamento do

mercados tradicionais.

mercado de flores, e foi definida a tipologia do produto,

É um produto simples e transparente, sendo que a

ao destacar-se a falta de um objeto de transporte e

única cor que exalta o objeto é a membrana em silicone.

suporte de flores, que proporcionasse ao comprador

As duas cores escolhidas para as membranas foram

conforto e segurança no manuseamento dos pequenos

baseadas nas cores mais presentes no mercado de

e grandes molhos de flores, sem recorrer aos típicos

flores – o verde e o cor-de-rosa.

arranjos florais com fitas e fios.


BRUNA TEIXEIRA

“SIGA” é então uma coleção de objetos que proporciona ao cliente o transporte e exposição de fores, até dez unidades das dimensões mais comuns.

A coleção é composta apenas por quatro peças: a tampa pequena com o tubo de 15 cm pequeno, a tampa pequena com o tubo de 25 cm pequeno, e por fim, a tampa grande com o tubo de 25 cm grande e a tampa grande com o tubo de15 cm grande. As tampas inferiores são componentes que se adquirem à parte, pois só são utilizadas quando é necessária a utilização de água para conservação das fores por períodos mais longos.

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CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO OURIVESARIA _EASR | 2013.2014 PROVA DE APTIDÃO ARTÍSTICA | ‘OS MERCADOS DO PORTO’

Um mercado é um lugar de vida e segundo o que afirma Marx, numa das suas teses mais divulgadas, "não é a consciência dos homens que determina a sua existência, porém, pelo contrário, é a sua existência social que lhes determina a consciência".

Na minha opinião as interações são fundamentais tanto no desenvolvimento das capacidades físicas, cognitivas e emocionais, como no desenvolvimento das funções psicológicas próprias do Homem. Vygotsky, pensador dos finais do sec. XIX afirmou que “Nós tornamo-nos nós mesmos através dos outros”. Nesta frase conseguimos constatar que há nitidamente um destaque para as interações humanas, sendo estas um fator para a construção da nossa própria identidade. As interações num mercado são uma constante e são elas que nos fazem sentir vivos, pertencentes a uma sociedade, na vida pública.


INÊS SILVA

Mercado s.m. Lugar público, ao ar livre ou em recinto fechado, onde se vendem e onde se compram mercadorias. Referência convencional em relação à compra e à venda. Designação que se dá à oferta e à procura de mercadorias. Conjunto de consumidores, encarados como futuros compradores de uma mercadoria ou beneficiários de um serviço.

O produto “ConTEM” vida baseia-se na minha visão

sonhos e de vidas, que são materializados de uma

do que é um mercado. Uma visão que dá uma grande

forma simbólica através de plantas, flores, ou o que a

importância àquilo que o torna especial e diferente de

pessoa achar que faz

outros espaços comerciais: as interações.

sentido colocar lá.

Eu vejo o mercado como local de constantes relações, de troca de experiências e de vidas que se cruzam num local onde a confiança é a palavra-chave. É assim que surge este produto de uma forma genuína e simples. Trata-se de um contentor de histórias, de

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O “ConTEM” vida tem o objetivo de criar laços, interações com as pessoas (mais propriamente com o utilizador), desde o regar, ao aparar, ao ver aquela sementinha dar origem a algo mais. Uma das principais finalidades é o cuidar de uma pequena vida, e deste modo alertar para a importância e a necessidade de preservarmos a natureza. Contribui também para uma ânsia incessante de uma relação mais harmoniosa e produtiva entre os seres humanos e a natureza.

O Contem vida é sem dúvida um produto que tem uma vertente lúdica, interativa e emocional, que fará com que o utilizador permaneça em harmonia com a natureza e com a vida. É um produto sobretudo ecológico, visto que a embalagem foi feita através de caixas de garrafas de vinho já usadas. A embalagem teve como inspiração as caixas de madeira existentes nos mercados tradicionais, conferindo ao produto um ar rústico, mas ao mesmo tempo contemporâneo. Na embalagem tive o desejo de fazer algo simples mas com influências do passado pois acredito que o passado é uma forma de repensar o futuro O saquinho com pequenas seedbombs vem dar um toque lúdico, divertido, e invulgar ao produto.


INÊS SILVA

Este tem como finalidade uma permanente interação

O Contem Vida tem de alguma forma uma ligação

com o utilizador. Considero também que tem um cariz

com o meu percurso na Escola Artística Soares dos

pedagógico, e pretendo que surja a vontade de fazer

Reis. O “nascer” de uma vida, pode ser comparado

mais seedbombs e até quem sabe encher a casa e o

ao

jardim de plantas! Por fim temos o folheto que explica de

conhecimentos. Quando aqui entrei não parei de crescer

uma forma muito sucinta o conceito do produto, formas

em cultura, conhecimentos, vivências que levo para o

de utilização e uma pequena abordagem do que são

futuro. Quando cá cheguei era apenas uma semente

as seedbombs. O folheto acaba com um pequeno texto

com imenso gosto e vontade de aprender mais sobre

de reflexão sobre a importância da natureza na vida

o mundo das artes, que era e continua a ser algo que

dos homens e os seus benefícios, tentando desta forma

tanto me fascina. O “nascer da vida” é materializado

conferir um caracter reflexivo à peça.

pelas plantas que surgem a partir das seedbombs.

desenvolvimento

das

minhas

experiências

e

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CURSO DESIGN DE PRODUTO | ESPECIALIZAÇÃO OURIVESARIA _EASR | 2013.2014 PROVA DE APTIDTÃO ARTÍSTICA | ‘OS MERCADOS DO PORTO’

Optei pelas Seedbombs porque me pareceu a forma mais indicada de inserir uma planta dentro do corpo principal da peça. As seedbombs que eu desenvolvi são compostas por pasta de papel misturada com sementes. Assim, desaparece o problema da sujidade que a terra originária, sendo apenas necessário humedecer as seedbombs quando estas estiverem muito secas. As seed bombs ou bombas de sementes surgiram no século XX, quando um agricultor japonês promoveu o uso de sementes em bolas de barro. Nos anos 70, uma cidadã de Nova York juntou-se a um grupo de ativistas jardineiros e transformaram um terreno abandonado num jardim. Mais tarde em 2004, quando o Reino Unido iniciou o movimento “Guerrilla Gardening“*: várias pessoas começaram a cultivar em terrenos públicos a fim de aumentar o espaço verde. Esta iniciativa teve um grande sucesso e espalhou-se a cidades como Paris, Los Angeles, Madrid, Toronto e Roma, entre muitas outras.

Com as Seed Bomb, bolas feitas de argila ou outros materiais carregadas de sementes, consegue-se chegar a espaços de difícil acesso. Estas podem ser compostas por sementes de diferentes variedades. *Guerrilla gardening é um movimento de ativismo politico que consiste em plantar num terreno do qual os jardineiros não têm direito legal para a sua utilização, como por exemplo: em locais abandonados ou em áreas mal cuidadas.


INÊS SILVA

“Não devemos ter medo de inventar seja o que for. Tudo o que existe em nós existe também na natureza, pois fazemos parte dela.” Plabo Picasso

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upa mercado Coleção de estampados reerguendo os valores dos mercados do Porto

Trata-se de uma coleção de tecidos estampados, nomeada de “UPA mercado”, que têm o objetivo de revalorizar e publicitar os mercados do Porto. Com a meta de chamar novos e mais compradores

Quando aberto e utilizado como avental, observa-

aos mercados, foi desenvolvido um objeto com

se um padrão sobre o mesmo elemento, cuja

dupla função: um saco-avental, dois símbolos

composição se revela, mais uma vez, importante

deste tipo de comércio. “UPA mercado” abrange

para “remar” a mente do observador até ao

um vasto público-alvo, desde o adolescente até

mercado em questão.

ao idoso, pois é um produto que pode cativar

Os materiais utilizados foram: tafetá preto (pois

facilmente o gosto visual próprio de cada

é uma cor elegante e que disfarça a sujidade,

pessoa. Com a aplicação dos estampados e do

respeitando a forma-função), velcro preto e

tecido neste objeto, é pretendida a divulgação

molas de pressão (como sistemas de fecho).

da vida dos mercados, trazendo, de novo, o

As cores usadas, mais uma vez, remetem para

próprio mercado para os portuenses e visitantes

o mercado em questão e foram retiradas de

da cidade.

imagens de um tipo de mercadoria que se vende

Os

elementos

estampados

são

desenhos

nos mercados: fruta.

originais provenientes de ícones representativos

Por fim, o nome “UPA mercado” surgiu da ideia da

de três dos maiores e mais conhecidos mercados

força para se reerguer, utilizando a onomatopeia

do Porto. Quando o objeto está a ser usado como

“upa” como incentivo para os mercados do Porto

saco, pode ver-se um elemento estampado com

renascerem.

o nome do mercado que representa.


JOANA RIBEIRO

MERCADO DO BOLHテグ

MERCADO FERREIRA BORGES

MERCADO BOM SUCESSO

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MARTA FREITAS

Equipamento para uma campanha de orientação e sinalização dos mercados na cidade do Porto

O projeto visa promover o conhecimento e a visita aos mercados tradicionais da cidade do Porto ao mesmo tempo que cria condições para a recuperação da força com que estes equipamentos participavam na vida urbana. Assim foi pensada uma campanha em que a sinalização e a orientação dos percursos relativamente aos mercados são exploradas em termos funcionais, simbólicos e estéticos, garantindo-lhes um lugar de destaque numa seleção de lugares centrais da cidade. O elemento central desta campanha é o poste de sinalização e orientação. Este elemento foi pensado como um objeto de forte personalidade, capaz de se afirmar no contexto face à concorrência de outros equipamentos urbanos. Foi ainda tratado como uma marca identitária dos mercados destacando o caráter dinâmico e multifacetado do tipo de comércio que neles se pratica.

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Cada poste contém dois tipos de informação: Direções e distâncias, aplicadas no topo do poste sobre placas orientadas espacialmente, e um mapa simplificado, aplicado a meio do poste, sensivelmente à altura do olhar do observador, relacionando os mercados entre si e com os restantes elementos urbanos de interesse.

Na composição dos postes criados para esta campanha entra um conjunto de elementos modulares que permite a individualização de cada um em função do local onde é implantado. Na construção dos postes o papel mais importante foi dado ao metal e aos polímeros. A informação gráfica aplicada às placas e ao mapa seria objeto de um estudo específico em equipa com a colaboração de designers de comunicação.

DIMENSÕES DO POSTE: Altura máxima: 3,07 m Diâmetro máximo: 1,20 m


MARTA FREITAS

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VEM M ER C A D OS D O POR TO

S UP O RTE | EXPOSITO R DE CÁLI CES E G ARRAFA "O Porto é uma cidade de mercadores. Aqui, as raízes urbanas confundem-se com as raízes comerciais.! Não é preciso conhecer muito da história do Porto para se perceber que esta é uma cidade de comércio, de trocas, de compra e venda, de movimento. Quem passar uma tarrde na zona histórica da Invicta, quem passear pela rua de Sta.Catarina, quem ouvir os pregões no Mercado do Bolhão, quem se sentar a tomar um café no Mercado do Bom-Sucesso, quem for à beira rio, quem atravessar a ponte, quem sentir o cheiro das castanhas, quem se fizer ao Porto, saberá que não se trata de uma “cidadezinha”, mas de um pólo enorme de mercadores, mercadoras, boa gente e gente que, acima de tudo, fez e faz das tripas coração. O Porto é uma cidade que não pára e no entanto transmite a calma e a beleza de uma paisagem natural. É uma composição elaborada de moderno e antigo, velho e novo, uma composição de tal forma bem feita que marca qualquer um que cá venha e qualquer um que já cá esteja. Por ser desta enorme cidade e por compreender toda a importância e a influência que os mercados tiveram no Porto, é com muito orgulho e prazer que me proponho a realizar uma obra que simbolize e enalteça a história, os lugares e os acontecimentos comerciais que deram origem à Invicta.


NUNO SARMENTO

No âmbito da Prova de Aptidão Artística, com o tema “Mercados do Porto”, realizada para a disciplina de Projeto e Tecnologias, no curso de Design de Produto da Escola Artística Soares dos Reis, foi projectada a peça “Vem”. Esta peça propõe-se a resolver uma necessidade que o momento do Porto de Honra carece, que é conseguir servir os cálices de vinho e expor a garrafa e o rótulo do mesmo, ao mesmo tempo. Neste momento não existe um objeto que consiga realizar estas ações ao mesmo tempo, sendo por isso realizadas uma depois da outra. O Porto de Honra é um momento já com muita história e um dos pontos mais importantes é precisamente a pessoa que serve o vinho mostrar com orgulho o seu Porto e a que saboreia deliciar-se enquanto vê o rótulo. Embora pareça um pequeno detalhe saborear e ver o que se saboreia, é na verdade um dos elementos mais importantes, pelo que a peça se propõe a resolve-lo, tornando assim a experiência ainda mais agradável. Trata-se de uma peça que tem também um caráter social, pois aproxima as pessoas e melhora uma experiência que é por si só única – O Porto de Honra. Na conceção do projecto optou-se por resolver as questões funcionais com um forte e carregado aspeto

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simbólico que remete para a História do Vinho do Porto.

A peça tem 56cm de comprimento, 23cm de largura e 15

O objetivo foi conseguir que a peça “falasse” por si

de altura. A curva que faz tem aproximadamente 60cm

só e que cada detalhe surgerisse alguma parte dessa

e divide-se longitudinalmente em 2 partes distintas. A

história, quer das vinhas, quer das pipas, quer dos

parte anterior tem 6 buracos côncavos que fazem o

toneis.

perfil ex¬terior do cálice de vinho do Porto, sendo o

“Vem” tem duas funções principais: suporte de cálices,

cen¬tro de cada um a 4cm da extremidade anterior.

cheios ou vazios, e expositor/suporte da garrafa. A fusão

Como há inúmeros cálices diferentes, foi escolhido o

destas duas funções é concretizada com harmonia na

desenhado pelo Siza Vieira como modelo, visto que

peça.

esse é o cálice oficial para o Vinho do Porto. Entre esta

A forma foi concebida curvada para sugerir as curvas

concavidade e a extremidade anterior existe um rasgo de

das pipas, tendo um corte a meio para reforçar a ideia

aproximadamente 2cm para que o pé do cálice entre e o

das aduelas, podendo ser também interpretado como

cálice se possa pousar e segurar. Exatamente a meio da

os montes onde são plantadas as vinhas. O suporte da

curvatura, entre as duas partes, existe um furo elipsoidal

garrafa consiste no entrelaçamento de duas gavilhas

que faz uma inclinação de 50º para que a garrafa entre.

metálicas que sugerem as gavinhas presentes nas

Foi feita uma forma elipsoidal pois ao sofrer a inclinação

videiras. Este conjunto simbólico sugere duas partes

transforma-se num círculo, grande o suficiente para

fundamentais da produção do vinho do Porto, a recolha

caber qualquer garrafa de Porto dos últimos 40 anos

das uvas e o repouso do vinho.

A inclinação está feita para a parte posterior da peça


NUNO SARMENTO

para que aquele que se for servir do vinho possa ver o melhor possível o rótulo. A parte posterior da garrafa fica aproximadamente 12 cm “dentro da peça”, sendo que a anterior fica apenas 6cm devido à inclinação. Os materiais escolhidos foram a madeira de carvalho, por ser a madeira utilizada no fabrico das pipas, e por isso acrescentar ainda mais à carga simbólica e o aço inoxidável ou prata. O aço será utilizado no caso da peça ser fabricada em massa, para várias casas, e a prata será no caso de uma edição especial, feita para pessoas ou acontecimentos de maior importância. A escolha destes metais deve-se à sua resistência à humidade, força e fácil limpeza e manuseamento. O corpo principal da peça será realizado numa só tábua de madeira de carvalho, de aproximadamente 1,8 cm de espessura, curvada. Este corpo sofrerá 6 furos côncavos que perfazem o perfil exterior do cálice de vinho do Porto desenhado por Siza Vieira. Estes furos, tal como a sua

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NUNO SARMENTO

ligação com a extremidade, são feitos com uma fresa, construída através de um molde do cálice. A entrada para a garrafa é também realizada com uma fresa, tal como a pega lateral. Estando todos os recortes feitos na madeira, as suas arestas são boleadas para que não haja o risco de corte e para dar à peça um aspeto mais uniforme e homogéneo. Finalmente a madeira é envernizada com verniz marítimo mate, que tem maior resistência a líquidos, essencial numa peça que pode sofrer derrames de vinho e ao ser mate permite que a cor sobressaia. Os entrelaçamentos metálicos serão feitos de forma industrial, através do torno mecâni¬co, e a chapa metálica será recortada a lazer. Ambas serão polidas para realçar o brilho e tornar a peça mais elegante. A cor será a da madeira de Carvalho francês, que é um tom castanho acinzentado.

O nome escolhido para esta peça foi

”VEM”. Este nome reflete o intuito da sua criação, que é juntar e aproximar

mais as pessoas no momento do Porto de Honra. “VEM” chama as pessoas, convida-as a aproximarem-se, a

pegarem num cálice e a saborearem-

no, celebrando uma atividade comercial bem-sucedida. Além disso, este nome resulta também da junção do tema e

subtema: “VEM: Vinhos E Mercados” VEM

“À NOSSA!” 137


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O M ER C A D O D O B OL HÃO

EXPOSITOR MÓVEL

[ UM OBJETO FUNCIO N A L E SIMB Ó L IC O ] A Prova de Aptidão Artística do ano letivo 2013/2014 tem

Decidido o subtema, pretendeu-se criar um objeto de

como tema geral “Os Mercados do Porto”. A partir deste

design que resultasse da interação do Homem com as

tema foi-nos proposta a escolha de um subtema que se

suas vivências e com o espaço dos mercados.

delineasse dentro dos campos conceptuais, artísticos e tecnológicos ligados ao âmbito do tema geral.

DE UMA BANCA A UM EXPOSITOR MÓVEL

Dentro da cidade do Porto, optei por definir o Mercado do

O conceito original consistia numa banca portátil que

Bolhão como o subtema do meu trabalho. Esta escolha

poderia ser utilizada por toda a cidade. Estaria abastecida

deve-se à importância que o mercado desempenha na

de produtos do mercado do Bolhão e seguiria a imagem

cidade, sendo o mercado mais característico e rico em

de um vendedor ambulante, podendo deslocar-se entre

termos de vivências e tradições. Esta ligação ao passado

diferentes feiras no mesmo dia. Deste modo, os produtos

é algo cativante e bastante próprio da cidade do Porto, onde os hábitos mais peculiares parecem permanecer apesar do passar do tempo.

do Bolhão teriam dois locais de venda: o próprio edifício e a banca transportável.


RAQUEL SILVA

No entanto, apesar de a banca poder ser funcional, iria obrigatoriamente contra os cânones do modernismo graças às suas grandes dimensões, à robustez das formas e à falta de simplicidade. O abastecimento também não podia ter grandes dimensões e os produtos não iriam durar muito tempo, porque as pessoas acabariam por esgotá-los rapidamente. Para além dessas razões, o vendedor teria de se deslocar frequentemente ao mercado para reabastecer o armazenamento. Por essas razões, o objeto deixou de se resumir a uma banca de vendas e transformou-se numa banca expositora de produtos do Bolhão. Este expositor iria circular pelas ruas envolventes do mercado e dar a experimentar ao público os produtos mais frescos do Bolhão, como frutas, queijos ou até vinhos. Como iria ocupar o espaço circunscrito ao mercado, não teria problemas de abastecimento, visto que bastava pedir a algum comerciante do mercado para trazer alguns produtos para o exterior, ou simplesmente andar alguns metros até à banca mais próxima. Deste modo, o expositor cumpre o propósito de revitalizar e publicitar o Mercado do Bolhão, visto que incentiva o público a provar os produtos e a visitar o mercado para os comprar.

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"É a lei que permeia em todas as coisas orgânicas e inorgânicas, Em todas as coisas físicas e metafísicas, Em todas as coisas humanas e super-humanas, Em todas as verdadeiras manifestações da cabeça, Do coração e da alma, Que a vida é reconhecível na sua expressão, Que a forma segue a função. Esta é a lei." Louis Sulivan, 1896

UM EXPOSITOR MARCADO PELA SIMPLICIDADE Para conseguir projetar um expositor que fosse simples, claro e composto por formas geométricas, inspirei-me nas peças mais conceituadas de design moderno e orgânico. Posso considerar que o carro de chá de Alvar Aalto foi uma das grandes inspirações para o desenho do expositor, com as suas rodas largas e estrutura simples que parece interagir com o ser humano. No entanto, o expositor estava a adquirir muito a forma da típica banca de comerciante de rua, com uma forma compacta e cerrada, que parecia emoldurar o vendedor numa caixa que interagia com os clientes. Era preciso “limpar” o objeto de todos os excessos, reduzindo o número de prateleiras, modificando as dimensões e deixando apenas o esqueleto da peça e tudo o que fosse estritamente imprescindível para a estabilidade do expositor.


RAQUEL SILVA

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“Existe o corpo, que se transforma tão lentamente que pode usar cadeira egípcia. Despidos os objetos, existe a história de meia dúzia de formas. A imaginação voa entre essas formas, a baixa altura, se descontarmos aprendizes impacientes. (…) O objeto perfeito será um espelho sem moldura nem lapidado - o fragmento de um espelho - poisado no chão ou encostado a um muro. Nele um míope observa formas, sombras em movimento, reflexos de reflexos. Assim se alimenta o desenho.” Álvaro Siza Vieira, em “Sobre a Dificuldade de Desenhar um Móvel”, Abril 1992, Siza Design


RAQUEL SILVA

CONCLUSÃO Acabada a Prova de Aptidão Artística e o curso de Design de Produto, penso que não poderia ter frequentado um outro curso que me desse tanto júbilo e tantos desafios como este me proporcionou nos últimos dois anos. Ao rever todo o processo criativo desde as pesquisas até aos renders finais, sinto que o meu método de trabalho foi evoluindo de módulo para módulo, assim como a conceção, organização e estruturação de todo o trabalho. De facto, estes anos permitiram-me aprofundar os meus conhecimentos sobre os vários movimentos de design que existem, e ajudaram-me a perceber o que distingue o bom design do mau design. Todos estes conceitos vão ser uma mais-valia no meu futuro, pois formaram uma base de conhecimento que virá a estender-se com muito mais facilidade.

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Uma ferramenta verdadeiramente nómada para demonstrações nos mercados O objeto “A-Banca” é um equipamento versátil destinado a ser utilizado no mercado para demonstrações/workshops das áreas mais diversificadas, utilizando-se como ferramenta de trabalho e base de apoio. Desenvolve um conceito verdadeiramente genuíno e, simultaneamente, tradicional: estas demonstrações/workshops são realizados por iniciativa de qualquer pessoa, exterior ou não ao mercado, que requisita ou aluga este equipamento de trabalho a baixo custo. Assim, alia-se a promoção de um serviço, ou seja o benefício próprio da pessoa que se dirige ao mercado e que promove a arte que produz (podendo fazer publicidade ao seu trabalho) com o fortalecimento do dinamismo e interatividade social do mercado.


ROSANA SOUSA

Esta é uma banca dobrável, caracterizada pela sua

A facilidade de transporte e arrumação deste objeto é

transportabilidade e versatilidade com uma estrutura

conseguida com a ajuda de uma alça central em couro

essencialmente em madeira de formas retilíneas.

que envolve todos os elementos. A alça emerge da

Relativamente ao tampo, o plano de trabalho, optou-se

orla do tampo atravessando uma ranhura ai prevista

por uma placa de 1.30 m x 0.50 m, medidas standard

possibilitando um manuseamento ergonómico.

de uma bancada, tendo-se em consideração o atravancamento do espaço de mercado a que se destina o objeto – um espaço muito movimentado. Dispõe ainda de uma prateleira sob o tampo que desempenha um papel estabilizador da estrutura e que, simultaneamente, disponibiliza uma área de prateleira de grande utilidade para a arrumação de utensílios.

A construção do objeto em pinho nórdico garante a necessária leveza e economia de custos. O tampo é revestido por uma folha de polímero resistente a cortes e à humidade. As superfícies de madeira expostas ao exterior são envernizadas com verniz de poliuretano aquoso.

DIMENSÕES: Comprimento – 1300 mm Largura – 500 mm Altura – 850 mm

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CURSO PROFISSIONAL DE DESIGN DE MODA _ 2013.14 PROVA DE APTIDÃO PROFISSIONAL | ‘LENDAS & MITOS’

design de moda CURSO PROFISSIONAL

PROVA DE APTIDÃO PROFISSIONAL

Lendas mitos & 2013.14


ANA RITA FONSECA

O milagre das Rosas a lenda da Rainha Santa Isabel ANA RITA FONSECA

As Lendas & Mitos habitam a minha memória. Em criança estudávamos lendas portuguesas para que nos lembrássemos dos Reis e Rainhas de Portugal. A que nunca esqueci foi “O Milagre das Rosas”, razão pela qual ter escolhido este subtema. Uma lenda de século XIII, da cidade de Coimbra, que consiste na Rainha Santa Isabel. Reza a lenda que um nobre despeitado informou o rei D. Dinis que a rainha gastava demais nas obras e doações à igreja, esmolas e outras ações de caridade. O rei indignado com a situação resolveu confrontar a rainha. Ao perguntar-lhe o que trazia no regaço a Rainha respondeu: “Rosas meu Rei.” Acusada de estar a mentir, porque em janeiro não haviam rosas, para surpresa do Rei, quando a rainha abre o seu regaço, as rosas caem pelo seu manto fora. A surpresa e o arrependimento avassalam o Rei, que nunca tinha visto rosas mais lindas, pede perdão à rainha. A bondade, generosidade e compaixão da Rainha levaram o povo proclamá-la SANTA. Dentro da sua história agarrei-me aos elementos mais importantes e que alicerçaram este projeto. Esses elementos são as rosas, a bondade, riqueza e pureza da Rainha

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PR O J E TO

CURSO PROFISSIONAL DE DESIGN DE MODA _ 2013.14 PROVA DE APTIDÃO PROFISSIONAL | ‘LENDAS & MITOS’

O Desejado a lenda de D. Sebastião MARIANA CARDOSO

A opressão, a glória e o nevoeiro nascem após a morte de D.Sebastião aquando o aparecimento da sua lenda. A opressão a que o povo estava subjugado e a necessidade de voltar a restabelecer o seu brilho e glória estão espelhados nas formas, silhuetas, nos cortes e encaixes, nos pormenores, nos tecidos, na forma como as peças de ligam ao corpo e o seu comportamento. A manhã de nevoeiro na qual D.Sebastião viria está simbolizada pela paleta de cores e pelo uso de tricot de forma a descrever a sua densidade orgânica. Estas palavras traduzem todos os aspetos do projeto desenvolvido e estão diretamente ligadas ao tema, à lenda – são mais que palavras, são conceitos que ligam toda a coleção tornando-a coesa. O seu encadeamento no mito está espelhado na coleção. É o contar a história por palavras visuais e palpáveis, ainda que com a minha própria interpretação e visão.


MARIANA CARDOSO LUNA FONSECA

Cantar do galo a lenda do Galo de Barcelos LUNA FONSECA

Dita a lenda que há muitos anos atrás procuravam o culpado de um crime.

Suspeitavam de um inocente peregrino galego. Este, frente ao juiz que se encontrava num banquete, jurou ser tão impossível ter cometido o crime, como o galo assado, que estava na mesa, cantar. E assim foi… o galo cantou e salvou-se um inocente da forca. O ícone de Portugal “Galo de Barcelos” nasce da lenda que narra a intervenção milagrosa de um galo morto, na prova da inocência de um homem erradamente acusado. A imagem colorida do galo está na memória de todos os portugueses (e na minha), associada ao folclore e ao norte de Portugal despertou-me muita curiosidade, o que levou a escolha deste tema para desenvolver uma coleção de 20 peças de vestuário, dirigida a mulheres ligadas ao mundo espiritual e fantástico.

149


LI VRO

The Case for Working with Your Hands

The Craftsman

Matthew Crawford

Richard Sennett

Penguin Books

Penguin Books

Londres, 2011

Londres, 2008 (existe edição brasileira)

Recentemente li a transcrição das intervenções de

definição abrangente proposta por Sennett, “craftsman”

Jonathan Ive , vice-presidente para o design da Apple,

– cuja tradução para português pode ser artesão,

numa conversa aberta entre este e o diretor do Museu

artífice ou artista (retomando uma designação usada na

do Design de Londres ocorrida em novembro de

nossa tradição para quem domina um ofício). Sennett

2014, e em que Ive expressou a dificuldade que tem

é violoncelista e Crawford é mecânico e tem uma

em contratar jovens designers. E porquê? Porque,

pequena oficina de reparação de motas. É recorrendo

segundo ele, “os designers que entrevista não sabem

muitas vezes à sua experiência pessoal que os autores

fazer coisas, porque as oficinas nas escolas de design

perseguem o objetivo último destes ensaios que é o de

são caras e os computadores são baratos” e continuou

demonstrar, tal como Sennett refere na primeira página

dizendo que “é trágico que possas passar quatro anos

do seu livro, que fazer é pensar.

da tua vida a estudar design de objetos tridimensionais

Na perspetiva dos autores, a vontade e a capacidade

e que nunca faças um”. Ive esclareceu que não defende

de construir objetos, seja qual for a sua função, é inata

o abandono das ferramentas digitais, mas questiona a

na espécie humana. Somos os únicos seres no planeta

dependência total delas que põe em causa o instinto de

com a destreza física e mental para isso. No entanto, em

fazer e experimentar.

muitas das culturas ocidentais o valor do fazer e o do

Refiro aqui esta conversa porque ela faz, na minha

fazer com as mãos tem vindo a diminuir, não obstante, em

opinião, a ligação entre o Design de Produto, âmbito

meu entender, alguns sinais recentes de ressurgimento.

desta revista, os Processos, tema deste número, e os

As oficinas quase desapareceram das cidades, das

dois livros que sugiro. Apesar de convocarem muitas

escolas, da vida das pessoas. Com isto foi-se perdendo

reflexões, apresento-os dando ênfase ao contributo que

um espaço de transmissão de um conhecimento que só

dão sobre o “poder do fazer”2.

se pode concretizar de forma tácita, materializado em

Nenhum dos autores é designer, Matthew Crawford

sons, cheiros, gestos, movimentos e hábitos – que não

é filósofo e Richard Sennett é sociólogo, mas ambos,

se podem transmitir de outra forma que não na rotina da

tal como Jonathan Ive, atribuem uma importância

oficina.

determinante ao trabalho manual, ao seu espaço

É nesta prática continuada da construção de objetos

– a oficina – e ao seu ensino. O que os dois autores

com as nossas próprias mãos que, para os autores,

também têm em comum é o facto de serem, segundo a

existe uma grande valia formativa. Este tipo de prática,

1


RUI PANELO

PROFESSOR DE PROJETO E TECNOLOGIAS | EASR

@ Rui Panelo

à mercê de ferramentas e materiais ‘desobedientes’,

No trabalho oficinal a repetição existe como um meio

mobiliza todos os nossos sentidos e confronta-nos,

para o aperfeiçoamento e para a interiorização do ciclo

constantemente, com questões imediatas, concretas e

‘encontrar problema/encontrar solução’.

incontornáveis. É, portanto, obrigatória a experimentação

Contudo, ter uma oficina não é suficiente. É preciso lutar

contínua, cujos resultados – erros ou avanços – têm uma

pela valorização permanente desta cultura. A prática

existência própria, palpável, que deixa rasto e que não

oficinal é, para estes autores, uma forma de promover

pode desaparecer instantaneamente com um ctrl+z. A

um tipo de pensamento que traria melhorias para o

repetição, inerente a este processo, não é mecânica nem

indivíduo e para as sociedades em que se insere, e

desinteressada, tal como alguns pensam, influenciados

seria também, de uma forma mais concreta e voltando

por uma ideia de executante herdada de tempos em

às declarações de Jonathan Ive, uma ajuda para que se

que se forçou a separação entre o pensar e o fazer.

criassem melhores objetos.

1 2

Disponível em http://www.dezeen.com/2014/11/13/design-education-tragic-says-jonathan-ive-apple/ Expressão tomada de empréstimo do título da exposição "The Power of Making" do Victoria and Albert Museum em 2011. Nota: traduções da responsabilidade do autor.

151


dinamicas @ essr.net E SC O LA ART Ă? S T I C A D E S OA R E S D O S R E I S


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