AUH 5700 - Metodologia científica aplicada à arquitetura e ao urbanismo Profs. Drs.: Júlio Roberto Katinsky, Luiz Munari e Karina Leitão
Resenha de “Prefácio à Crítica da razão pura” e “Introdução de Prolegômenos a toda a metafísica futura” de Immanuel Kant Diogo Augusto Mondini Pereira
São Paulo, junho de 2017
“E de que serve executar projetos se o projeto em si já é fruição o suficiente?” BAUDELAIRE, Charles - Os Projetos in Pequenos Poemas em Prosa Paolo Rossi em seu prefácio de “Francis Bacon, da magia à ciência” cita como um dos maiores equívocos do pensamento contemporâneo dito pós-moderno a acepção de que os pensadores, filósofos e cientistas modernos acreditavam numa construção inabalável e num progresso linear e sem volta da ciência rumo à verdade absoluta. Talvez tenha sido a ideia da metafísica o maior alvo desta leitura. O filósofo prussiano do século XVIII Immanuel Kant (1727 – 1804) parece dar razão para a contestação de Paolo Rossi, inclusive no campo da metafísica. No seu prefácio à ”crítica da razão pura” e na sua introdução dos prolegómenos a toda a metafísica futura”, Kant demonstra o profundo embate de ideias do campo do pensamento moderno, cujo caminho rumo a uma verdade absoluta não é senão um desejo declaradamente incipiente. Kant se dispõe em ambos os textos a realizar uma revisão do campo científico da metafísica, de forma a abrir um caminho possível para o desenvolvimento da mesma como ciência. Ele propõe uma revisão dos procedimentos tradicionais da ciência, sobretudo pensando em definir seus limites bem como a sua estrutura interna como ciência, revendo, portanto, conceitos então milenares, da filosofia grega, propostos nos livros da Metafísica aristotélica. A metafísica, isto é, a filosofia primeira, mais pura e eminente das ciências, segundo Aristóteles, visava o entendimento das causas e princípios dos objetos e fenômenos, visava os universais em detrimento dos singulares. Para Aristóteles a ciência deveria se sobrepor ao conhecimento sensível, dado apenas pela experiência dos sentidos, puramente empírica. Em seu exemplo, a partir de um empirismo puro e embasado pelos sentidos tão somente, poder-se-ia descobrir que o fogo é quente, mas não porquê é quente. Esta razão de ser, sua causa e princípio eram os alvos da filosofia e da ciência que historicamente partia dos problemas mais básicos para alcançar temas mais complexos, como a astronomia e o funcionamento do cosmos, sendo a metafísica o caminho natural do desejo pelo saber. A ideia da causa e princípio funcionou para desenvolvimento das ciências que lidavam com problemas singulares, como demonstra Kant no seu prefácio à “crítica da razão pura”. No entanto, no próprio campo da metafísica, predecessor a muitas das ciências consagradas de então (a lógica, a matemática e as ciências naturais no exemplo de Kant), pouco tinha avançado em seus milênios de existência se comparada às demais ciências. Para o autor ela se encontrava presa em dogmas e meros conceitos.
Kant avança na crítica à metafísica clássica a partir da leitura dos textos do filósofo britânico David Hume (1711 – 1776), que contesta um dos princípios básicos da metafísica de então, que seria a causa e efeito. Para Hume o efeito não poderia ser pensado a priori, sendo este pensamento apenas fruto da imaginação e da experiência, que enseja a imaginação (fato para o qual Kant definirá como entendimento a priori). O autor prussiano procura levar adiante as indagações iniciadas por Hume, contestando todo o fundamento da metafísica de então, que segundo ele não poderia ser ciência em seu formato, para transformá-la em uma ciência possível. Kant, como vimos, inicia por analisar as ciências que avançavam plenamente no campo do conhecimento de então. Desenvolvendo, então, seu raciocínio sobre a razão nas ciências: a razão deveria ser dada a priori ao objeto, a ideia portanto já deveria estar projetada antes da experiência: “observações feitas ao acaso, sem um plano previamente projetado, não se interconectariam numa lei necessária, coisa que todavia a razão procura e necessita.” Esta fórmula é também a raiz do método gallileano, que vimos no início da disciplina: do qual se parte da observação de um fenômeno da natureza, que leva a indagações e um raciocínio, capaz de, experimentalmente, retirar da natureza as respostas para o problema. A proposta kantiana de reformulação da metafísica tem em vista, tal qual fará Durkheim (1858 – 1917) com a sociologia – também já debatido em aula, o funcionamento e estrutura das ciências já consagradas. Kant procura nelas estabelecer o método, forma da qual ele acreditava ser possível o desenvolvimento da metafísica enquanto ciência. É importante notar que o esforço de Kant não se dá, pelo menos nestes textos, em explanar uma nova metafísica, porém em formatá-la como ciência. Para isso, o método tem uma função central, ao observar que a metafísica ao longo dos séculos se encontrava travada justamente por se ser ensimesmada, por ser um conhecimento especulativo da razão totalmente isolado. Kant acreditava que com sua reformulação a metafísica poderia galgar uma posição como ciência, baseando-a no entendimento humano. Referências Bibliográficas DURKHEIM, Émile – As regras do método sociológico, Lisboa: Editora Presença, 2004 KANT, Immanuel – Crítica à razão pura - Prolegómenos a toda a metafísica futura, Lisboa: Edições 70 MONDOLFO, Rodolfo - Figuras e ideas de la filosofía del Renacimiento, Barcelona: Icaria 1980 ROSSI, Paolo – Francis Bacon: da magia à ciência, Londrina, Curitiba: Eduel e Editora UFPR