ECOS
Jornal Laboratório Ecos - Edição 1 - FBV| DeVry
O LEGADO DE ARIANO SUASSUNA
Entrevista Raimundo Carrero p. 04
Literaturas do Cárcere p. 10
Um passeio pelas ruas do Recife p. 16
Expediente Editorial Reportagem: Cibelly Melo Larissa Leite Nívea Siqueira Ramone Ramalho Sarah Meneses Projeto Gráfico: Francisco Cassemiro Camila Bresani Lucas Beltrão Colaboração: Gustavo Militão Maria Eduarda Fonsêca
O Jornal Ecos é uma produção do curso de Jornalismo da Faculdade Boa Viagem/DeVry. Com ele, os estudantes vivem a experiência de realizar um jornal. Para isso, participam de reuniões de pauta e, com os assuntos das matérias definidos, lançam-se para apurar as informações que ajudarão a compor os textos. Eles também acompanham o processo de edição, que conta a participação de alunos de Publicidade e Propaganda na diagramação do material, aprendendo e aperfeiçoando técnicas jornalísticas. Para a primeira edição, resolvemos prestar uma homenagem ao escritor pernambucano Ariano Suassuna. A repórter Sarah Meneses mergulhou na história do artista para, em um texto envolvente, mostrar o legado de Ariano para os vários campos das Artes. Uma entrevista com o também escritor Raimundo Carrero, feita por Larissa Leite, antecipa a herança de Ariano para o mundos das Letras e traz informações sobre a vida e obra de Carrero. A repórter Nívea Siqueira nos presenteia com um relato dos difíceis anos da Ditadura Militar e a repercussão das histórias com a atuação da Comissão da Verdade. A estudante de Jornalismo também visitou Dona Léu, no bairro do Pina, para acompanhar o seu trabalho como marisqueira e mostrar, em uma reportagem emocionante, a riqueza da vida da mulher que atravessa diariamente o rio Capibaribe para sustentar a família. Família é também assunto de uma matéria da repórter Cibelly Melo que conta o quanto se gasta para realizar o sonho de um casamento. Há também reportagens de Ramone Ramalho sobre passeios públicos pelas ruas do Recife e alimentação saudável do Hare Krishna. Esses e outros assuntos podem ser conferidos nas próximas páginas. Boa leitura! Cecilia Almeida e Diego Gouveia, os editores e professores do curso de Jornalismo
Edição:
Índice de Matérias
Diego Gouveia
Crônica - Lugar de pedestre é na calçada? Por Gustavo Militão........................................................................................03
Coordenação Geral:
Entrevista - Raimundo Carrero: trajetória de vida dedicada ao jornalismo e à escrita literária.
Cecília Almeida Acesse em: http://issuu.com/ecosjornal
Por Larissa Leite.............................................................................................04 Projetos sociais asseguram direitos de crianças e adolescentes Por Sarah Meneses.........................................................................................06 Mercado de noivas movimenta economia Por Cibelly Melo............................................................................................08 Literaturas do cárcere Por Nívea Siqueira.........................................................................................10 Vegetarianismo no Hare Khrishna Por Ramone Ramalho....................................................................................12 Vida Severina: raízes fincadas nas marés Por Nívea Siqueira..........................................................................................14 Um passeio pelas ruas do Recife Por Ramone Ramalho....................................................................................16 Capa - O mundo de Ariano Suassuna Por Sarah Meneses.........................................................................................18 Dicas Culturais...............................................................................................22 Fotografia.......................................................................................................24
Lugar de pedestre é na calçada? Por Gustavo Militão Catkin (Creative Commons) Desde criança, ainda nos bancos da escola, nós somos condicionados pelos professores e livros naquelas aulas sobre trânsito e cidades a acreditar que “o lugar do pedestre é andando pela calçada”. De fato, deveria ser. Ainda mais em cidades em que a mobilidade urbana é complicada e mal resolvida. Mas e quando essas calçadas - que deveriam servir para proteger a população de acidentes e facilitar a mobilidade de cadeirantes, crianças e idosos - se encontram tão irregulares, quebradas e até obstruídas por carros e barracas? Uma cidade na qual seus habitantes não têm garantidos o pleno direito de andar pelas vias públicas em segurança não se pode dizer que é uma cidade que respeita de fato o cidadão. Em várias cidades do Brasil, quando se fala na tal “mobilidade urbana”, imediatamente vem à cabeça aquelas obras gigantes, de largas avenidas, viadutos, pontes, túneis, enormes ciclovias ou ampliação de opções para o modal do transporte coletivo. Muitas obras são aquelas que já foram chamadas de “obras faraônicas” certo dia por aí. Convenhamos, são intervenções extremamente necessárias para a boa fluidez do trânsito, seja qual for a cidade. Só que, por razões que muitas vezes não são compreendidas (ou não se incentiva a compreensão), o assunto “calçadas” é tratado com certa irrelevância pelas autoridades e até mesmo ignorado como se não fosse responsabilidade das administrações públicas. Afinal, se eu, você ou qualquer pessoa fala de “mobilidade”, a padronização e manutenção das calçadas também não deveriam estar nesse pacote? É evidente. Ou então esqueceram que não se deve colocar crianças, pessoas com necessidades especiais e idosos para andar no meio da rua. Eu não me esqueci das aulas em que ouvia “lugar de pedestre é na calçada”, dos livros que os professores liam e que tratavam da mobilidade urbana Brasil afora. Não é raro encontrar numa simples volta pelos quarteirões de qualquer rua do Recife um carro estacionado em cima de uma calçada obstruindo a passagem, a ausência de rampas para facilitar o acesso de cadeirantes, esgotos estourados, lixo espalhado, buracos, alturas desproporcionais que impedem o trânsito seguro de pedestres e, nos tempos eleitorais, os famigerados “cavaletes” anunciando um determinado candidato, que não parece tão preocupado se está atrapalhando a passagem de uma senhora de idade avançada, por exemplo. Toda essa “salada mista” de problemas é fato corriqueiro e que nossas autoridades não conseguem resolver. Não me arriscaria a andar particularmente com meu triciclo motorizado numa cidade como Recife. Com rampas insuficientes, calçadas esburacadas e desniveladas, andar pela nossa cidade é quase que como participar do Rally Paris-Dakar. Tenho certeza de que outros tantos companheiros que possuem necessidades especiais como eu pensam da mesma forma. Punições até existem no papel para aqueles que obstruem as passagens. Estacionar carro em cima de uma calçada, por exemplo, rende uma multa de R$ 127,69 e cinco pontos na Carteira de Habilitação para os condutores desavisados. Mas pior que a multa é a nítida falta de educação das pessoas. Zelar pelas nossas calçadas é uma obrigação de todos para que no futuro não se torne um “problema de todos”. A conscientização não deve partir só do poder público, criando regras de padronização e conservação, mas também do próprio cidadão, que não deveria obstruir um espaço que é direito dele usufruir. Raras as cidades que se preocupam com um plano de organização dos passeios públicos, preferindo transferir a responsabilidade para os proprietários dos imóveis em vez de trabalhar em “parceria”. Algumas cidades pelo Brasil, como Belo Horizonte, tentam seguir exemplos de outras cidades no mundo que obtiveram êxito em resolver esse problema. Numa pesquisa realizada em 2012 pelo portal Mobilize Brasil, a belíssima Fortaleza foi apontada como a capital com “as melhores calçadas do Brasil”, seguida por Belo Horizonte e Curitiba. Manaus foi a capital pior avaliada na pesquisa, que seguiu critérios como acessibilidade e conforto ao pedestre. O problema da conservação das calçadas no Brasil está longe de ser resolvido. Mas, em tempos em que mobilidade urbana virou um verbete da moda (embora muitos não saibam o seu real significado), já se percebe alguns tímidos avanços. Brigar pelo pleno direito de ir e vir com segurança, respeito e fazer valer o que os livros nos ensinaram na escola naquelas aulas de trânsito é dever de todo cidadão. Afinal, o trânsito ágil e seguro não deve ser exclusividade apenas aos motoristas. Gostaria muito de um dia pegar o meu triciclo e sair em paz pelas ruas da cidade. Mas também sei que é um sonho ainda distante de virar realidade. Por enquanto, sejamos bons pedestres, comportados e vamos andar na calçada que é o lugar correto. Pois, antes andando numa calçada irregular do que no meio da rua à mercê dos “excelentes” motoristas recifenses, não é? (Gustavo Militão é estudante de jornalismo da Faculdade Boa Viagem)
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Entrevista: Raimundo Carrero: trajetória de vida dedicada ao jornalismo e à escrita literária Como jornalista, trabalhou em diversos veículos de comunicação. Como escritor, publicou várias obras literárias de sucesso. No decorrer dessa trajetória, superou um Acidente Vascular Cerebral (AVC) Por Larissa Leite
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Nascido em Salgueiro, interior do estado de Pernambuco, Raimundo Carrero, jornalista e escritor com reconhecimento da crítica e dos leitores, traz consigo um currículo repleto de atividades relacionadas à comunicação. No início da década de 1970, participou ativamente, como cronista e contista, do Movimento Armorial, idealizado pelo escritor e dramaturgo Ariano Suassuna, que visava à exaltação e propagação da cultura nordestina. Foi assessor de imprensa da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) e da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Também integrou o Conselho Municipal de Cultura em Recife durante oito anos e o Movimento de Cultura Popular. Até 1998, foi presidente da Fundação de Patrimônio Artístico e Histórico de Pernambuco (Fundarpe). Como jornalista, trabalhou no rádio, na televisão e no jornal Diario de Pernambuco, onde exerceu a atividade por 25 anos. Ao longo da vida, já publicou várias obras literárias, destacando-se os livros “Somos pedras que se consomem”, que conquistou prêmios da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA), da Biblioteca Nacional. Outra obra em destaque é o livro “As Sombrias Ruínas da Alma”, ganhador do Prêmio Jabuti, o mais tradicional prêmio de livro no Brasil, criado em 1958. Outros dois livros em sua lista de premiação são: “O senhor dos sonhos” (premiado pela Prefeitura Municipal do Recife – Lucilo Varejão) e “Sombra Severa” (ganhou o Prêmio José Conde, do Governo do Estado de Pernambuco). Em 2010, alegrias e superação fez parte de sua vida. No ano, somaram-se outros dois prêmios: o Prêmio Machado de Assis, da Fundação Biblioteca Nacional, e o São Paulo de Literatura por “A minha alma é irmã de Deus”, de 2009, que conta a história da jovem Camila, aspirante à santa sequestrada pelo pastor e saxofonista Leonardo. Em outubro deste mesmo ano, a vida do romancista foi abalada, por um Acidente Vascular Cerebral (AVC), logo após vencer o prêmio São Paulo de Literatura. Ficou afastado de suas atividades por aproximadamente um ano, mas, em 2011, já estava retomando seus projetos.
Caricatura gentilmente cedida pela Companhia Editora de Pernamuco (Cepe) Depois do problema de saúde, o derrame, mudou sua rotina, disposição e forma de trabalhar? Não. Apenas diminuiu o tempo das aulas. Antes, eu dava quatro horas semanais e agora dou apenas duas horas, mas continuo no trabalho normal, na Companhia Editora de Pernambuco (Cepe). Escrevo normalmente. Já escrevi dois livros. O primeiro “Tangolomango” e lançei em fevereiro o livro “O Senhor Agora Vai Mudar de Corpo”, que fala justamente sobre o Acidente Vascular Cerebral (AVC) que tive em 2010. Na Festa Literária Internacional de Pernambuco (Fliporto), também lançarei um livro, Chama-se “O Romance do Bordado e da Pantera Negra”, que comecei a escrever em 1970, mas se perdeu nas cheias e agora foi recuperado. Já se inspirou em outros acontecimentos de sua vida para escrever outro livro, além do “Viagem no Ventre da Baleia”? Não. O livro “Viagem Do Ventre Na Baleia” foi um romance autobiográfico. Suas obras são escritas para um público específico? Não. Escrevo para o público adulto, mas pode ser lido por qualquer pessoa. Só escrevi um livro chamado “O Senhor dos Sonhos” que é classificado infanto-juvenil, mas que eu não o classifico dessa forma. Como o senhor descreve o momento de escrever? É um momento de grande esforço de imaginação com algum momento de inspiração, embora eu ache que literatura é mais transpiração do que inspiração. Qual é a sua relação com a religião? Ela o influencia quando o senhor escreve? Profunda relação. Eu sou um homem religioso desde que nasci e acredito sinceramente em Jesus Cristo por quem tenho fé e esperança
A religião o influencia quando o senhor escreve? Sim, por ser religioso, eu não poderei me afastar dela porque me ajuda a escrever. Qual a intenção das Oficinas Literárias na formação de novos escritores? É passar para os jovens as técnicas que podem ser atrativas e sedutoras. Qual o perfil de um bom escritor? Disciplina e preocupação com a condição humana. Sobre escrever ficção, o senhor se refere à inspiração de uma forma como se fosse balela e indica outros caminhos como: impulso, intuição, técnica, e pulsação. Poderia falar um pouco sobre isso? Naturalmente, quando um escritor se prepara para escrever, o primeiro movimento é o impulso, ou seja, o impulso é o que concretiza o sonho. Em seguida, vem a intuição e é justamente, o que precisa para discernir entre o bom gosto e mau gosto. Depois, vem a técnica e que o saber, o material que dá forma ao impulso. Por último, vem a pulsação. O senhor escreveu a história de uma novela baseada em uma notícia publicada em um jornal impresso do Recife. Esse tipo de situação acontece com frequência? Não com frequência, de vez em quando, porque as notícias reais podem provocar uma novela ficcional. Nós estamos fazendo uma reportagem especial sobre Ariano Suassuna. Em sua opinião, qual o principal legado que ele nos deixou? Além da obra, dos grandes romances e do teatro, ele deixou o Movimento Armorial, que é uma expressão artística genial na cultura brasileira.
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Projetos sociais asseguram direitos de crianças e adolescentes Iniciativas cumprem papel de políticas públicas e melhoram a qualidade de vida dos jovens Por Sarah Meneses
Roar Pettersen (Creative Commons) “É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”. O texto acima é o quarto artigo do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que é um conjunto de leis dentro do código civil voltado para mobilizar a forma de a sociedade se relacionar com os jovens de maneira a executar mudanças no tratamento dado para o desenvolvimento das juventudes. Esse Estatuto tem como base a Declaração dos Direitos Humanos, marco baseado em princípios como tratamento igualitário, na educação, alimentação, moradia, assistência médica, proteção ao desenvolvimento e integridade física, mental e social. Seguindo essa linha, o ECA, promulgado em 1990 integrara um conjunto de mobilizações sociais, e teve papel importante no processo de democratização do País. Por meio do Estatuto, foi dada aos jovens a garantia de ser prioridade para receber socorro emergencial e proteção independentemente da situação, atendimento em serviços públicos ou relevância pública, na formulação e efetuação de políticas públicas e destinação de recursos públicos para áreas de proteção ao jovem.
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Sendo o Brasil um País continental e possuindo um
grande contingente da população na fase de inclusão pelo ECA, as políticas públicas não conseguem atingir a todos os jovens da nação de maneira homogênea e imediata. Assim, os mecanismos criados para que essas mudanças sejam asseguradas ainda depende da sociedade para se tornarem efetivas. Problemas como falta de escolas nas cidades, exploração infantil e a falta de informação são exemplos de como o poder público não alcança todas as crianças e adolescentes. Com esse cenário defasado e com o objetivo de conseguir a garantia dos direitos para todos, as organizações não governamentais (ONGs) surgem como um suporte de grande valia. O Auçuba tem como objetivo defender os direitos da criança e do adolescente por meio da comunicação. Usando a ideologia freiriana, que tem como principal eixo o diálogo, a ONG possui dois programas: “Só Para Fazer Mídia” e “Canal Auçuba”. O primeiro, com participação política, busca o direito à comunicação e o direito dos jovens na mídia. O segundo programa exerce os direitos da criança e do adolescente por meio de projetos comunicativos, como a Escola Kabum Recife! e Cine Bomba Cultura e Comunidade. “Além da parte técnica, existem as discussões, visando desenvolver a parte humana, facilitando o jovem no mundo”, afirma Rosa Sampaio, coordenadora executiva da área de comunicação e mobilização de recursos da ONG. Sampaio vê a criança e o adolescente como o sujeito atuante na sociedade, assim o jovem é um multiplicador do que lhe é passado. “É uma troca de informações, pois o jovem já vem com uma carga de conhecimento, e nos projetos adquire mais”, comenta. Outra organização não governamental também empenhada na atuação dos direitos dos jovens é o Centro das Mulheres do Cabo (CMC), que trabalha pela igualdade de gênero e garantia dos direitos das mulheres, do mesmo modo em projetos voltados
para a juventude. Dentro dos programas para esse público, há o “Reduzindo a exploração sexual de meninas no Recife: uma abordagem integrada”, com parceria da ActionAid, Casa da Mulher do Nordeste (CMN) e Equipe Técnica de Assessoria, Pesquisa e Ação Social (Etapas). A iniciativa ajuda meninas e jovens vulneráveis a garantir seus direitos e a procurar novos caminhos de vida. Ainda em andamento, até março de 2015, o projeto realiza oficinas temáticas com foco nos direitos humanos como: o próprio ECA, abuso e exploração de diversas maneiras e drogas. Com a participação de quase quarto mil crianças e adolescentes, de forma direta e indireta, a ONG busca renovar os projetos já existentes e elaborar novos. Sobre o Estatuo da Criança e do Adolescente, Hyldiane Lima, da equipe de coordenação de projetos da ONG, afirma que o ECA é uma legislação inovadora e traz consigo a mudança de visão da sociedade brasileira com relação às crianças e adolescentes. “Antes do Estatuto, crianças e adolescentes eram tratados como “adultos mirins” e o que falta para as políticas públicas atingirem todos de forma homogênea é ação articulada entre as secretarias, a sociedade civil e o sistema de garantia de direitos”, avalia. Vale destacar também a organização não governamental Serviço de Tecnologia Alternativa (Serta) que proporciona a formação de jovens, adultos e educadores para o desenvolvimento sustentável no campo. Com a Proposta Educacional de Apoio ao Desenvolvimento Sustentável (Peads) como metodologia, que trabalha dentro e fora das escolas, o Serta atua para que todos se tornem coautores e coexecutores no processo de desenvolvimentos sustentável. Na opinião do assessor de comunicação da ONG, Romário Henriques, o Serta defende todos os direitos humanos, como o acesso a água e a terra. “Assim, além desses direitos, a ONG inclui o direito a educação”, pontua. Dessa forma, os direitos das crianças e dos adolescentes, mesmo não sendo colocados em prática pelo poder público em sua totalidade, são garantidos pelo engajamento das ONGs com as questões que envolvem esse público. “Qualquer política pública, governamental ou não, é uma conquista, pois garante que os direitos sejam efetivados”, explica Sampaio.
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Mercado de noivas movimenta economia Antes do “sim”, noivos precisam planejar quanto gastar no casamento. Por Cibelly Melo
Eu, Fulano de Tal, recebo-te por minha esposa e prometo ser-te fiel, amar-te e respeitar-te, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, todos os dias das nossas vidas... Mas espera aí. Antes de todo esse discurso, é preciso planejar o casamento. E o que é necessário para organizar o grande dia? Logo, surge uma lista que parece interminável. É preciso decidir o local da cerimônia, depois o da recepção, o buffet que será contratado, foto e filmagem, o vestido da noiva, o traje do noivo, o buquê, o bolo, o DJ, iluminação, convites, quantidade de convidados, o dia do evento, e tantos outros detalhes que surgirão ao longo do planejamento. O mercado de casamento tem crescido ano após ano. Em 2013, o faturamento foi de R$ 16 bilhões, de acordo com um dos organizadores da Expo Noivas e festas José Luiz de Carvalho César, evento que reúne milhares de noivos, debutantes, famílias e profissionais, há 20 anos. E com todo esse crescimento, não é de espantar que existam empresas especializadas em tudo que se imaginar, o que torna o serviço ainda mais caro. Flávia Cibelle é dona de um buffet há 23 anos e relata que chegou a organizar até três eventos por semana, mas, hoje, por opção, só realiza um por semana. Cada evento é único e precisa representar a personalidade dos noivos, mas tudo depende também da situação financeira para que o sonho se realize. Perguntada sobre o assunto, Flávia nos diz que o evento com menor orçamento já organizado pelo seu buffet, foi no valor de R$ 9 mil. A estudante Mayra Nascimento, de 21 anos, garante que em uma semana conseguiu organizar a cerimônia de seu casamento, para um total de 170 convidados, com um orçamento de R$ 4 mil. Um feito e tanto. É certo que nem tudo foi como ela queria e como sempre sonhou, mas preferiu investir na casa própria e inclusive comprar a mobília. “Porque uma festa, por mais simples que seja, vai ficar na memória e servir como lembrança. Recomendo as noivas que estiverem na mesma situação que a minha que invistam na casa própria, pois é muito importante para o início da vida a dois”, diz Mayra. Se essa noiva não conseguiu tudo o que queria no seu grande dia, os sonhos de outra brasileira, que casou com um russo, não poderiam ter sido realizados de melhor maneira. Flávia nos conta que o casal gastou R$ 140 mil para a realização de seu casamento, que foi realizado no Parque da Jaqueira, área nobre do Recife. Entre os serviços contratados, estavam o nivelamento de piso e uma estrutura de refrigeração, tudo para o conforto dos convidados. Se há uma coisa que as noivas suspiram ao falar, é sobre o vestido. O tão desejado vestido que Mayra queria não foi possível. “Eu queria um vestido deslumbrante, lindo, mas não deu”, afirma. Diferente da maioria das noivas, ela preferiu fazer o vestido e não alugar. O orçamento estava apertado. De acordo com a estudante, nas lojas, os vestidos mais simples custavam em torno de R$ 500. Aí mandei fazer e saiu por R$ 300 e o melhor disso é que ele é meu. Um fato curioso citado por Flávia Cibelle é que, há dez anos, quem procurava o buffet e custeava a festa eram os pais da noiva. Hoje, são os próprios noivos que pagam pelos serviços. Foi exatamente assim com Mayra. Ela e o noivo, Henrique Nascimento, foram os únicos a coçar o bolso para que o casamento deixasse de ser um sonho e se tornasse realidade. Para finalizar, Flávia nos conta que o “mercado continua promissor e cresce dia após dia, mas que é preciso trabalhar com seriedade”. Afinal de contas, se o que vale é o amor, não importa se o orçamento é de R$ 4 mil ou de R$ 140 mil. O importante é o que se sente no momento em que de longe se vê a pessoa amada e como é literalmente inexplicável o momento do “sim”. Os noivos gastam tudo o que podem para ver o sonho se tornar real e no momento em que finalmente o “sim” é ouvido pelos convidados, existe a certeza de que o primeiro passo para a vida a dois foi dado. Podemos, então, desejar que, como em um conto de fadas, eles sejam felizes para sempre.
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Daniel Chang (Creative Commons)
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Literaturas do cárcere Histórias dos escritores Graciliano Ramos e Artur Eduardo de Carvalho suscitam discussão sobre política Por Nívea Siqueira
Dois nordestinos e uma semelhança: o gosto pela literatura. Duas vidas entrelaçadas por uma mesma situação comum, embora em épocas distintas: os estertores e a solidão da prisão no Quartel do Forte das Cinco Pontas, região central do Recife. Um hiato de 28 anos separa as ‘memórias do cárcere’ do escritor alagoano de ‘Vidas Secas’, Graciliano Ramos, e do cronista baiano de ‘Lua Branca’, Arthur Eduardo de Carvalho. O motivo: a acusação de prática subversiva ao governo. Apontados por subversão pelo regime de exceção, a vida destes jornalistas estariam irremediável e literalmente fragmentadas num divisor de águas. Responsável por milhares de prisões no Brasil, as calúnias de subversão, orquestradas pelos órgãos da Segurança Nacional, desintegraram famílias, abortaram sonhos, deixaram sequelas permanentes. No ano de sua prisão, em 1936, Graciliano Ramos tivera o romance ‘Angústia’, publicado em agosto. A obra é uma narrativa do personagem Luís da Silva, funcionário público que nutre ódio profundo pelo sistema que o oprime. Qualquer semelhança não é mera coincidência. Antes da detenção em 03 de março de 1936, o romancista não havia se incorporado oficialmente ao Partido Comunista do Brasil, apesar de que a milícia secreta do Estado Novo já o tivesse na conta de comunista revolucionário. Sobre Graciliano pesava a denúncia de conspiração na Intentona Comunista de 1935, que tentou derrubar o governo Vargas, idealizada pelo PCB. Naquela época, o golpe do Estado Novo, expressão máxima da ditadura alicerçada pelo governo Getúlio Vargas, era gestado para somente vir a eclodir em 1937. Instalou-se por oito anos no País, cassou ‘comunistas’ e se estendeu na Era varguista até o final de 1945. O combate ao Comunismo efervescia e gerava detenções ao mínimo indício ou suposição de resistência ao regime. O fato é que jamais fora provada a participação do escritor na Revolta Vermelha. As peregrinações do autor de Memórias do Cárcere – narrativa das agruras vividas durante os dez meses de prisão - contabilizam as detenções nas cidades de Maceió, Recife e Rio de Janeiro. A acusação rendeu-lhe a demissão do cargo de diretor da Instrução Pública de Alagoas – do qual fora nomeado em 1933 - posto semelhante a Secretário Estadual da Educação à época. Liberto em janeiro de 1937, Graciliano trabalhou como copidesque revisando textos em jornais do Rio de Janeiro. Pouco mais de duas décadas separam as trajetórias de Arthur Eduardo de Carvalho, autor das crônicas ‘um reencontro inesperado (1977)’ e ‘saca-trapo (1996)’ e Graciliano Ramos dentro do contexto político. Em 1964 uma nova ditadura é instaurada no Brasil, desta vez sob o jugo dos militares, com a deposição do presidente João Goulart. A repressão política protagonizou nos 21 anos seguintes histórias dantescas, dignas de serem catalogadas em um manual de “como violar os direitos humanos”. Poucos meses após o Golpe, o jornalista e advogado baiano, radicado no Recife, Eduardo Artur de Carvalho, então funcionário do Instituto Seccional de Ensino Secundário, no centro do Recife, teve a prisão decretada por agentes da Polícia Civil a serviço do Exército. “Fui preso antes de tomar o café da manhã, como de costume fazia ao início de cada expediente e recordo que fiquei os dois dias seguintes sem alimentação e água”, afirma. Estudante de Direito aos 29 anos, casado e à espera do nascimento do primeiro filho, viu a vida dar um giro de 360 graus ao ser conduzido ao Quartel General do IV Exército, à presença do Major Manoel Paes, em que respondeu ao Inquérito Policial Militar/IPM. “Naquela época, os considerados subversivos respondiam ao Inquérito na Auditoria Militar” – enfatiza. As mazelas decorrentes da prisão viriam depois com o desemprego por causa do fichamento no Exército, que enviava circulares para as empresas e estatais com a relação dos subversivos, daquelas pessoas que não poderiam ser admitidas em atividades nas empresas privadas ou cargo público. “Passei em concurso no Banco do Brasil, mas jamais fui efetivado porque tinha o estigma da subversão” – sublinha. O recomeço foi difícil e para sobreviver, o recém-advogado vendia água de coco nos restaurantes da orla marítima do Janga, litoral norte de Pernambuco.
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Sua prisão nada mais fora do que uma retaliação dos militares pelos préstimos no Serviço de Extensão Cultural (SEC) da Universidade Federal
Luigi Caterino (Creative Commons) do Recife, extinta pelo Golpe. Eduardo de Carvalho compunha a equipe do pedagogo pernambucano Paulo Freire – expoente na educação brasileira. No SEC, lecionava Realidade Brasileira desde 1962 a um grupo de adultos analfabetos, cujo sistema de alfabetização obtinha resultados em tempo recorde, em conjunto com outros nove educadores, dentre os quais o filósofo recifense Jomar Muniz de Brito. Na denúncia remetida ao Superior Tribunal Militar a atribuição de “sob a direção de Paulo Reglus Freire, cerne intelectual da subversão no Serviço de Extensão Cultural, incentivar a desagregação da estrutura social brasileira a serviço da comunização do povo”. A ideia do pedido de habeas corpus junto ao STM veio com a iminente possibilidade de uma transferência para cumprir pena na Ilha de Fernando de Noronha, local onde também estava preso o ex-governador de Pernambuco, Miguel Arraes, deposto em 1º de abril de 64. “Havia no Forte das Cinco Pontas um burburinho de que seríamos transferidos para o arquipélago”. O pai, então engenheiro da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste - SUDENE tratou logo de contratar o advogado criminalista Roque de Brito Alves, professor de Eduardo Carvalho no curso de Direito da Universidade Católica de Pernambuco, aonde viria a se tornar bacharel em 1966. De acordo com Roque de Brito, “as queixas eram infundadas, ridículas”, o que culminou na extinção do processo ainda na fase inicial por “absoluta falta de justa causa e inépcia das denúncias”, pontua o criminalista. “Não havia nenhum fato concreto, tanto que o ministrogeneral Mourão Filho, presidente do STM, concedeu o habeas corpus”, complementa. Eduardo de Carvalho relembra que o interessante é que foram todos excluídos do processo por justa causa, o que significa que não havia indícios de subversão. Recorda ainda que tanto ele quanto os nove colegas do Serviço de Extensão Cultural tiveram os seus processos extintos. Com voz mansa e dedo em riste endossa que o “Major Manoel Paes entendeu
que éramos subversivos comunistas e no Inquérito remetido à Justiça fomos apontados de pregar o Marxismo em pílulas”. A medida serviu para os demais colegas do SEC, que aproveitaram o habeas corpus, uma vez que a acusação era a mesma para todos os envolvidos no processo. Caso fosse condenado, o grupo cumpriria prisão por 30 anos, por crime de traição à pátria. Naquela época, não existiam recursos para redução de pena. Tanto Graciliano quanto Arthur não tem predileção por uma obra em específico. Arthur Carvalho diz ser incapaz de ser comparado com aquele que é o “segundo maior escritor brasileiro. Só perde para Machado de Assis”. Se os labirintos obscuros das prisões renderam pelas mãos de Graciliano Ramos a literatura “Memórias do Cárcere”, ao afirmar que “na escuridão percebeu o valor enorme das palavras”, para Artur Eduardo, autor da coletânea de crônicas “Lua Branca”, apagar da memória os pouco mais de quatro meses de ostracismo social numa cela úmida e escura foi a válvula de escape, como uma espécie de mecanismo de defesa. Os sentimentos em relação ao passado traduzem a irreparável injustiça sofrida apenas por alfabetizar pessoas à margem de uma educação básica efetiva. Dos momentos de solidão em que “esporadicamente compartilhou a clausura com algum preso recém-chegado”, diz não lembrar-se daqueles dias, contabilizados precisamente pelo seu pai, como se quisera, tal qual o autor de Vidas Secas, “endurecer o coração, eliminar o passado, fazer com ele o que faço quando emendo um período - riscar, engrossar os riscos e transformá-los em borrões, suprimir todas as letras, não deixar vestígios de ideias obliteradas”. A Comissão Estadual da Memória e Verdade Dom Helder Câmara, que apura casos de violação aos direitos humanos durante a ditadura militar, lançou no dia 17 de setembro de 2014, na Faculdade de Direito do Recife, o livro “Habeas corpus perante o Superior Tribunal Militar”. Sob a autoria do advogado Roque de Brito Alves, a obra é composta por coleção de peças de 17 habeas corpus impetrados junto ao Superior Tribunal Militar, durante os anos de chumbo compreendidos entre 1967 e 1968, além de oito Acórdãos. A edição, que tem reprodução fidedigna de toda a documentação original do autor, traz ainda o habeas corpus de Eduardo Artur de Carvalho, além de outros presos-políticos de Recife e Natal.
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Vegetarianismo no Hare Khrishna Viver na consciência de Krishna e Rama é compreender a presença da luz de Deus em todos os seres e em todas as coisas da natureza Por Ramone Ramalho
“Eu vi a lágrima do animal escorrer ao ouvir o melancólico grito de morte do ser que estava na sua frente na fila do abate. Chegada a sua hora, o vi ajoelharse diante do seu carrasco e suplicar piedosamente para que não fizesse aquilo. Depois dessa cena, eu nunca mais comi carne”. A experiência citada acima foi vivida pela repórter que assina este texto em visita a um abatedouro de animais no interior de Pernambuco em 2009. O motivo? Curiosidade. Ao ouvir o desespero dos animais, tive uma nova percepção sobre a vida e mergulhei fundo no universo das pessoas que tem essa mesma concepção. Foi aí que encontrei os Hare Krishna. Gênios e líderes como Gandhi e Pitágoras eram adeptos do vegetarianismo. “Não molhes nunca o teu pão nem no sangue nem nas lágrimas dos teus irmãos. Uma dieta vegetariana proporciona uma energia pacífica e amorosa não somente ao nosso corpo, como a todo o nosso espírito”, disseminava o filósofo e matemático grego Pitágoras de Samos. Para além da sua importância, relativa à saúde, à economia, ao meio ambiente e à ética, o vegetarianismo engloba uma dimensão mais elevada e espiritual, uma vez que favorece a percepção de Deus na natureza e o desenvolvimento do amor natural por ele. A cultura foi trazida pelos discípulos de Prabhupada, um mestre espiritual para os adeptos da crença ao Brasil. O movimento Hare Krishna chegou ao País em 1975 e hoje já conta com mais de vinte templos nas principais capitais, além de possuir cinco comunidades rurais. A consciência de Krishna é mais do que outra mera fé sectária, é uma ciência técnica de valores espirituais plenamente descrita na literatura milenar da Índia. A meta do movimento da consciência de Krishna é informar ao mundo inteiro sobre os princípios universais da compreensão acerca de Deus para que todos possam colher os sublimes benefícios do entendimento paz e unidades espirituais. Além de ensinar o conhecimento védico, cultura associada ao povo veda do subcontinente indiano, e difundir seus mantras, a Sociedade Internacional para o Conhecimento de Krishna (ISKCON) também distribui gratuitamente alimento espiritual no mundo todo. Assim como a filosofia e o canto, a comida vegetariana, que primeiro foi oferecida ao senhor, purifica o coração e a mente. Para conhecer a alimentação vegetariana do Hare Krishna, uma boa opção é visitar o restaurante Govinda, do Centro Cultural Hare Krishna Recife. “Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna, Krishna, Hare, Hare Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare”. Os vedas recomendam que, na era atual, o meio mais adequado para chegar à autorrealização é ouvir àquele que é todo atrativo, ou seja, Krishna. “Rama” quer dizer o reservatório de todo prazer e “Hare” significa a inconcebível energia do senhor. Por isso, repetem incessantemente essas palavras. E, seguindo a melodia alegre, acompanhada de sons de sinos e instrumentos de sopro, os frequentadores são levados a outro mundo. Quando visitei, o portão estava aberto. Na entrada, pude perceber lindos cachos de banana ainda no pé. Entrei e lá encontrei pessoas alegres. Conversei e conheci até a cozinha que estava assombrosamente impecável de tão limpa. Enquanto cozinhavam, estavam bastante concentrados e os pratos prontos passavam pelos alegres rapazes que entoavam o mantra. “Esse sublime canto coloca o praticante em contato direto com o ser supremo, por meio da vibração sonora dos seus santos nomes”, revela-me um dos responsáveis pela cozinha. O alimento oferecido a Deus, tradicionalmente denominado na Índia de Krishna-prasada, propaga a necessidade de um alimento espiritual para todos, para além da vida sã conectada com o vegetarianismo. A comida servida nos templos é benéfica para o corpo e também para a alma de todo aquele que saboreia o “alimento para a vida” como é conhecido internacionalmente. Quem cozinha nos templos precisa seguir os ensinamentos básicos de Krishna e não pode pensar em si próprio, mas sim no prazer de Krishna e, enquanto cozinha, ora ou canta: “Meu senhor, pela tua bondade, forneces todos esses ingredientes. Vou combiná-los e cozinhá-los para o teu prazer”. A limpeza significa um passo para santidade dos locais que são mantidos sempre bem limpos. O mais curioso é que o cozinheiro nunca prova a comida antes de ser oferecida à Krishna, pois, se ele provar antes, a comida perde a pureza.
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Doshas Pitta É o dosha formado por fogo e água, suas características são quente, oleoso e leve. São pessoas ativas e com boa conformação física. Têm tendência a serem nervosas e facilmente irritáveis. As pessoas com predominância Pitta devem evitar alimentos salgados e picantes, para não aumentar o fogo digestivo. Em caso de desarmonia de Pitta, o sintoma inicial é a febre e as infecções.
Vata É o dosha formado por ar e éter. Suas características são ser seco, leve e frio. As pessoas com predominância de Vata são geralmente magras, ativas e costumam ter a pele seca e eventualmente constipação intestinal. Elas devem evitar alimentos amargos, bem como frio e umidade.
Kapha Formado por água e terra, é o dosha com características de ser úmido, pesado e frio. As pessoas com predominância Kapha costumam ser grandes e pesadas, podendo facilmente tender à obesidade. Devem evitar alimentos úmidos, frios e pesados, como massas e arroz. Em caso de desequilíbrio, este costuma manifestar-se como excesso de muco e problemas respiratórios.
andreaerdna (Creative Commons) No livro, estudado pelos Hare Krishna, “Bhagavad-Gita”, é encontrado o conceito do Ayurveda, que é uma antiga ciência médica da índia. De acordo com ela, cada pessoa nasce sob influência de uma energia predominante, seja da mente ou do corpo. No Ayurveda, essa energia recebe o nome sânscrito Prakriti, que significa “natureza” e conhecer a nossa prakiti nos permite eleger um estilo de vida de forma sábia. De acordo com o Ayurveda, a caracterização do perfil biológico do indivíduo é determinada a partir do dosha. Existem três doshas: Vata, Pitta e Kapha, sendo que cada um apresenta suas determinadas características. Todas as pessoas possuem os três doshas, mas em proporções variadas. Eventualmente, há excesso ou carência de um dos três doshas, o que constitui um desequilíbrio, que pode originar uma doença. Saiba mais sobre os doshas no infográfico nesta matéria. A explicação dada pelos Hare Krishna diante da dieta sem consumo de carne se dá a partir da noção de karma. Palavra sânscrita, Karma significa ação ou mais especificamente uma ação material que causa reação que, por sua vez, nos enreda no mundo material. De acordo com a lei do karma, se causarmos dor e sofrimento, eles voltarão para nós potencializados. Aqueles que entendem a lei do karma aplicam à área da alimentação. Eles sabem que a paz não resultará de manifestações nem de negociações, mas será fruto de campanhas educativas sobre as consequências de matar animais. Para a guardiã do templo Krishna do Recife, Táraka, “o mundo precisa mais de amor porque as pessoas estão carentes disso. Uma boa alimentação contribui inculive para a compressão do amor”, finaliza.
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Vida Severina: raízes fincadas nas marés Por Nívea Siqueira
Naquele verão de 2010, conheci-a de uma forma despretensiosa: na praia do Pina, zona sul do Recife, entre um peixe frito e alguns goles de cerveja, bem gelada, vendidos na sua barraca desde 1974. Entre um belo domingo de sol e uma rodada de agulhas fritas, logo nos identificamos com algo em comum: o gosto pela boa conversa, regada a muitas histórias do bairro de Brasília Teimosa. Ali, ficamos horas às gargalhadas, numa situação confortável que nos remetia a uma ligação antiga e de cumplicidade. Eu, embevecida, a ouvir seus relatos inusitados, daqueles que prendem qualquer ouvinte, saí daquele local não da mesma forma como havia chegado. Aquela mulher pequena e aparentemente frágil pôs-me a nocaute com suas experiências e uma capacidade de reinventar-se em meio a situações adversas e de até mesmo sorrir dos problemas. Alguns anos depois, agora no jornalismo, lembrei-me daquela que me marcou pela propriedade com que enfrenta a pobreza, a depressão e saúde debilitada pela vida dura, o descaso da saúde pública, que a deixa à margem de um atendimento efetivo, a renda mensal ínfima, que, abaixo de um salário mínimo, deixa-me em situação de constrangimento, como se meus problemas fossem meros ‘cafés pequenos’, de uma pequenez absurda. Não hesitei em ir ao encontro dela novamente.
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Nosso reencontro foi em sua parca e minúscula residência, a aproximados 50 metros da maré, dividida em dois pavimentos, cujas paredes sem reboco em algumas áreas demonstram uma privação das coisas mais simples. Percebo que ela não quer que eu entre. “Tenho vergonha da minha casa, que é muito pobre”. Às 4 horas de uma manhã de início de dezembro, com céu escuro e ruas desertas, adentramos nas margens da Bacia do Pina, no Rio Capibaribe, que serpenteia a capital pernambucana, para iniciar o que para ela já é de costume, mas, para mim, seria uma experiência ímpar. Nas mãos, apenas dois pesados remos, que ajudei a segurar enquanto ela desencalhava a baiteira, espécie de embarcação de madeira, muito comum em áreas ribeirinhas. “Totoca”, a baiteira, tem furos que permitem que a água entre em abundância. Com paciência de Jó, minha guia na expedição retira, balde por balde, a água intrusa. “Já me furtaram três baiteiras e só me restou Totoca, fazer o quê?”, diz com um sorriso largo.
Adentramos na maré. Eu, um tanto receosa pelo balanço do barco enquanto ela, com segurança e braços ágeis, rema ao nosso destino. No percurso, fomos recepcionadas por uma chuva rápida e grossa. Mas nada abala aquela criatura que fez da maré e dos mangues da zona sul recifense uma extensão da sua vida e personalidade, como se já tivesse raízes iguais às dos manguezais, fixas naquele lugar. Ela entra na maré sozinha todos os dias e sob qualquer intempérie. “Para mim, não tem tempo ruim. Venho pra cá duas vezes por dia, de janeiro a janeiro. Às vezes, pesco à noite, depende da necessidade, tudo é muito difícil, minha filha”. Com o fim da chuva, desponta no horizonte um imponente arco-íris. Penso logo: e se lá existisse mesmo um pote de ouro? Ao longe, casas minúsculas, que parecem brinquedos, formam um mosaico emoldurado pelo céu cinza, cujas nuances roxas anunciam o romper do dia. Já nas águas escuras e munida de uma galeia, caixa de plástico vazada, que mais parece uma grade de cerveja, começa a catação de frutos do mar, desta vez o sururu. Enquanto conversamos, ela imerge nas águas e ressurge com as duas mãos cheias do molusco, o mais que pode arrancar do leito lodoso, num ritmo frenético. Catados, os frutos são separados das algas, lavados, aquecidos numa fogueira nas imediações da sua casa e em seguida retirados das conchas. Um ‘trabalho de Hércules’ que realiza solitária e cotidianamente. Diz que por dia precisa encher sete galeias, que rendem uma média de quatro quilos, vendidos por R$ 8,00. Mas nem sempre o objetivo é alcançado. Para ela, uma das causas da diminuição do sustento é a construção do Shopping RioMar, inaugurado em 2012, às margens da maré. “Aqui tem muito lixo de lá, bolsa, sacola e isso acaba com o meio ambiente”. Se pudéssemos personificar a resiliência, ela teria personalidade e braços fortes, baixa estatura, pele queimada de sol, corpo roliço, olhos escuros e puxados ao estilo oriental, sorriso largo, cabelos sempre envoltos em lenços coloridos, pés e mãos marcadas por incontáveis cicatrizes, de anos a fio submetidos à pesca e manuseio de ostras, sururus e mariscos. Edileuza Silva do Nascimento, semianalfabeta, nascida em São José da Coroa Grande, litoral sul pernambucano, marisqueira desde os quatro anos de idade, profissão que herdou da mãe “com muito orgulho” e uma capacidade de vir à tona todas as manhãs, assim como o sol ou a chuva que a acompanha rotineiramente nas regiões ribeirinhas que margeiam Brasília Teimosa, Pina e adjacências. “Leu”, como é popularmente conhecida, mãe de quatro filhos “todos encaminhados e assalariados”, aos 59 anos, reclama do poder público, que “dá as costas aos pescadores”. Com diabetes, pressão alta e anemia, afirma que nem sempre se sente bem para ir à maré, mas que “a pobreza a obriga”. Na tentativa de engordar a famigerada renda, trabalha na praia do Pina nos finais de semana vendendo alimentos e bebidas. Pergunto se ela tem um sonho. A resposta me desconcerta: “sim, sonho em ter uma boa televisão, uma baiteira nova e uma casa decente onde eu possa receber as pessoas”. Num trecho da obra Morte e Vida Severina, do poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto, diz-se que “E se somos Severinos, iguais em tudo na vida, morremos de morte igual. Da mesma morte severina.” Mas Leu, nordestina incansável que é, conduz sua vida tal como a sua própria baiteira: contornando os obstáculos, que segundo afirma, no trajeto pode “sacolejar, mas não afunda. Enverga, mas não quebra”. Ainda há muita vida fervilhando no solo fluvial à espera de suas mãos incansáveis, que de tão acostumadas às águas do Capibaribe, parecem ter vida própria.
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Um passeio pelas ruas do Recife Ruas como espaços culturais ao alcance de toda a população Por Ramone Ramalho
Márcio Cabral de Moura (Creative Commons)
Henrique Pinto (Creative Commons) Pernambuco é conhecido pela sua rica forma de manifestação cultural. O Recife é tido como cenário principal desse espetáculo. As ruas da cidade emanam poesia: do Sol, da Amizade, da Saudade. Segundo Gilberto Freyre, nos nomes poéticos das ruas da capital pernambucana, “residem imensidades” com potencial para evocar memória afetiva dos seus moradores e visitantes. A cultura está ao alcance da maioria, pois até no cemitério de Santo Amaro existem mais de 20 obras de arte. Algumas da época do império, que tornam o local um verdadeiro museu a céu aberto. Qualquer saída de casa é um convite à manifestação cultural e histórica sobre as ruas e, para os recifenses com mais carga de experiência chega a ser apaixonante. As particularidades dos nomes das ruas remetem a lembranças de muitos moradores da cidade. O historiador Leonardo Dantas idealizou um projeto em uma rede social e o batizou como Arruando o Recife. Nele, conta a história de cada canto das ruas e bairros do Recife. Para ele, a poesia que emana das tradicionais ruas da cidade é capaz de contar a história dos seus primeiros moradores e hábitos. Como mostra o registro em seu livro Luzes da Cidade. “A rua da Concórdia, que tentaram mudar para Marquês do Herval, teve seu nome originado de uma disputa dos moradores Manoel José e José
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Thiago Pedrosa (Creative Commons) Fernandes. Em 1833, foi proposta a denominação de rua da Concórdia e a sugestão pôs um fim à celeuma”, explica Dantas. Uma das mais belas ruas se chama rua da Aurora, inspiração para jovens poetas populares como Bruno Belo. De acordo com ele, olhar a paisagem e o contraste do mangue e arquitetura na Aurora é fonte de inspiração inigualável. “Todos os sábados venho aqui e fico sentado próximo à escultura Carne da minha Perna de Augusto Ferrer em alusão ao poeta Mário Andrade, representante do modernismo no Brasil. Aqui, tenho inspiração para escrever meus poemas populares urbanos”, argumenta Belo. O conjunto arquitetônico das ruas do Recife Antigo, grande parte reconstruído após a invasão holandesa, no fim do século 17, é uma boa opção de livre acesso à cultura. Na época, judeus perseguidos na Europa migraram para cá e se estabeleceram na Rua dos Judeus, hoje Rua do Bom Jesus. Caminhando pela via, é possível conhecer a antiga sinagoga local, que virou o Centro Cultural Judaico, a Embaixada dos Bonecos Gigantes, a Torre Malakoff e o Paço do Frevo, na Praça do Arsenal da Marinha, além da Feira do Recife Antigo, que ocorre aos domingos. Ali pertinho, o recente processo de revitalização da zona portuária já trouxe o Centro do Artesanato de Pernambuco e o Museu Cais do Sertão - Luiz Gonzaga. Lá também se encontram os poetas populares, artesãos e a juventude alternativa. É uma ótima opção para quem quer aderir mais bagagem cultural. Seja de ônibus, metrô ou barco, o Recife respira cultura. Para cada canto em que você olhar, terá um pedaço histórico dessa cidade. No entanto, as caminhadas reais sobre as pontes, os pés no chão, o sol na cabeça, o vento no rosto, as cores nos olhos é o barato de viver a cultura com livre acesso à materiais e lugares sinônimo de movimentos de resistência e de expansão da cidade.
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O Mundo de Ariano Suassuna Movimento armorial ,iniciado pelo autor, marcou a história do País Por Sarah Meneses
Quem nunca ouviu a história da expectativa do Rei Dom Sebastião retornar para um novo reino? Ou as aventuras de João Grilo e Chicó? O grande autor por trás dessas histórias, também responsável por criar o Movimento Armorial e mudar a cara do Nordeste, foi Ariano Suassuna. Mais do que autor, Ariano também foi dramaturgo, poeta, romancista, ensaísta, um filósofo que transitou por várias áreas da arte, apaixonado pelo Brasil e pelo povo, interessado em estudar as questões do homem. Com 87 anos, o grande escritor faleceu por causa de uma parada cardíaca produzida por uma hipertensão intracraniana, no dia 23 De Julho 2014. Dois dias antes de seu falecimento, o autor sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) e foi internado em um hospital no Recife, onde foi submetido a uma cirurgia para o implante de dois drenos no cérebro.
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Como herança, deixa, para o Brasil, uma vasta produção artística. Entre elas, o Movimento Armorial, que foi fundado e dirigido por Ariano. Teve como objetivo criar uma cultura erudita com base nos costumes do povo brasileiro e ao mesmo tempo valorizar a cultura nordestina. O movimento tinha como meta elaborar uma arte de natureza erudita entretecida por ingredientes típicos da cultura popular. A corrente artística foi lançado na Igreja de S. Pedro dos Clérigos, acompanhado por uma mostra de artes plásticas e pela apresentação da Orquestra Armorial de Câmara, que tinha então como regente o maestro Cussy de Almeida. É marcada principalmente pela tendência de Suassuna em sintetizar elementos e figuras da cultura do povo nordestino e obras clássicas da literatura universal. Essa mistura de gostos e expressões é o móvel que inspira o tempo todo o autor e seus companheiros do Movimento Armorial, que foi criado para fazer face ao massivo domínio dos imperativos culturais estadunidenses no Brasil. Os integrantes do Movimento têm como objetivo empenhar todas as modalidades artísticas nesta direção – música, dança, literatura, artes plásticas, teatro, cinema, arquitetura, entre outras expressões. Assim, figuras de todos os campos se uniram neste esforço nos anos 70: Antonio
“O homem nasceu para a imortalidade. A morte foi um acidente de percurso. Mas depois que eu me tornei pai e avô, descobri que a família é quase uma imortalidade, porque é uma continuidade”
“Comecei a querer ser escritor aos 12 anos, quando fiz meu primeiro conto. Na época, era um assassino terrível. Quando não sabia o que fazer com um personagem, matava”
“Eu acho que a arte, por natureza, não é uma imitação do real, é uma recriação. (...) Se fosse para imitar a realidade do dia a dia, melhor seria ficar com a própria realidade”
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Nóbrega, Antonio José Madureira, Capiba, Jarbas Maciel e Guerra Peixe, dentre outros nomes conhecidos. O armorial está associado à produção da literatura de cordel, à moda de viola, a instrumentos como a rabeca, que cria a atmosfera sonora que sustenta o canto dos músicos que seguem esta filosofia. As capas de seus trabalhos são manufaturadas com a técnica própria da Xilogravura, segundo os ditames desta arte inovadora. Como movimento, o armorialismo atingiu vários campos da arte e em todos teve êxito. O de maior sucesso e que mais repercutiu foi na área musical. Exemplos como o Quinteto Armorial e da Orquestra Armorial de Câmara foram a razão para esse campo ficar conhecido. O Quinteto Armorial foi formado por Antônio Nóbrega, Antônio Madureira, Edilson Cabral, Egildo Nascimento e Fernando Barbosa, com duração de 1970 a 1980. Entre esses anos, foram gravados quatros álbuns, com base em instrumentos como a rabeca, a viola sertaneja e o berimbau. Foi aclamada pelo público, uma vez que na época a música brasileira era fortemente influenciada pelas características da cultura norte-americana. Isso fez com que as ideias do grupo se expandissem para outros estados. Ao mesmo tempo, a Orquestra Armorial de Câmara, composta por Jarbas Maciel, Clóvis Pereira e Cussy de Almeida, teve como objetivo venerar e ampliar o som dos instrumentos nordestinos. Maciel e Pereira foram os principais responsáveis pelo repertório. Com suas bases e raízes consolidadas, bem como ideias eternas, a expressão artística continuará. Na opinião da jornalista Adriana Victor, amiga e exassessora quando Ariano foi secretário de Cultura de Pernambuco, “o pintor Manuel Dantas Suassuna, por ser artista de talento intenso e filho de Ariano, talvez seja um dos principais responsáveis por levar adiante os ideais do movimento”. Porém, ela citou outros artistas responsáveis pela continuação do movimento, como Antônio Nóbrega, Antônio Madureira, Romero de Andrade Lima, Maria Paula Costa Rêgo e outros. Da nova geração, Victor apontou o pintor e neto de Ariano, Lucas Suassuna. O professor de Teoria da Arte e especialista sobre Ariano Suassuna da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Carlos Newton, comentou que a expressão artística irá permanecer por causa de seus pensamentos atemporais e seus seguidores, pelo motivo de “diversos artistas, em várias partes do país, ainda hoje seguirem esses princípios, por acreditarem que são importantes para a criação de uma arte que expresse melhor o nosso país e o nosso povo”. Em carta divulgada para a imprensa na época da morte de Ariano Suassuna, Antônio Carlos Nóbrega deixou clara a parceria entre eles. “Conheci Ariano em 1970 quando fui convidado por ele a integrar o Quinteto armorial. Na ocasião, ele acabara de publicar o seu livro, o “Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai e Volta”, e foi por meio dessa obra que adentrei no Mundo Ariano. Minha ligação com Ariano foi imensamente frutífera. Anos de convivência quase que cotidiana durante a fase de apresentações do Quinteto. Musiquei alguns de seus poemas. Representei o personagem Joaquim Simão da sua peça “A Farsa da Boa Preguiça” numa versão realizada pela TV Globo. Inspirei-me em seus “amarelinhos” para construir o meu personagem Tonheta e, sobretudo isso, foi a partir do meu encontro com ele que minha maneira de fazer arte, entender cultura e ver o mundo ganharam outras e novas dimensões”, destaca o multiartista Antônio Carlos Nóbrega, que foi cofundador do Quinteto Armorial. Para Nóbrega, Ariano teve, continuará tendo, um papel absolutamente imprescindível, vital para a arte e cultura brasileiras. “Foi escritor versátil – dramaturgo, romancista, poeta, cronista, ensaísta – e um misto de empreendedor, ativista e animador cultural. Todas essas suas atividades tiveram como pano de fundo a sua visceral paixão pelo povo e pela cultura brasileira, uma tão intensa amorosidade só comparável àquela de brasileiros como Mário de Andrade e Darcy Ribeiro”, afirma. No campo literário, destaca-se, entre as publicações de Ariano, o “Romance d’A Pedra do Reino”, que é um dos maiores romances da literatura tanto brasileira quanto pernambucana e sua existência justifica a expressão artística. A obra foi inspirada em dois acontecimentos reais da própria vida de Ariano, porque o pai foi assassinado em 1930, quando ele tinha três anos, e em um fato ocorrido na cidade São José do Belmonte, o qual foi um objeto de estudo do autor. Nessa cidade, situada no interior de Pernambuco, um grupo messiânico executou diversas pessoas com o propósito de banhar com sangue a Pedra do Reino. Assim, Dom Sebastião, rei de Portugal, desaparecido em uma batalha na África, retornaria e tiraria o povo do sofrimento. Com isso, o romance narra a história de Quaderna, que é preso no sertão da Paraíba e, nessa situação, faz sua própria defesa contando os acontecimentos trágicos de sua família. O teatro de Ariano é bastante conhecido. O “Auto da Compadecida” conta as aventuras de João Grilo e Chicó no sertão nordestino, como no ato “O Testamento do Cachorro”. A peça é importante por mudar a cara
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do Nordeste diante do resto do Brasil, em razão de sua encenação no Rio de Janeiro, em 1957, quando o resto do Brasil começa a notar a importância de Ariano para a nossa literatura. Existe a peça “Farsa da Boa Preguiça”, encenada em 1961, no Teatro Popular do Nordeste. A peça narra a vida de João Simão, um contador de cordel preguiçoso e casado com Nevinha. Também há na trama Aderaldo e Clarabela, um casal rico que não dão valor ao matrimonio. Com isso, Aderaldo é apaixonado por Nevinha e quer conquistá-la, enquanto Clarabela tenta seduzir João Simão. No enredo, também existem três demônios, que tentam de tudo para o casal humilde se renda e quebre seus votos matrimoniais, e dois anjos, que tentam interferir. O legado de Ariano Suassuna não foi somente com o Movimento Armorial. A forma de criação, sendo original e genial, somou ao romance e ao teatro brasileiro. O louvor e a crença de Ariano pelo povo brasileiro são notáveis pelo trecho que o autor falava repetitivamente “O nosso povo já se garantiu como povo. E é um grande povo. Nós somos um grande país. É isso o que eu tento mostrar com tudo o que faço e em tudo o que escrevo. Se o Brasil se portar como merece o nosso povo, nós ainda vamos iluminar o mundo”, dizia. A ideia de criar o Movimento Armorial, bem como uma linguagem elaborada com base na cultura popular e a defesa da cultura brasileira foi citada pelo músico, compositor, dançarino e artesão Antúlio Madureira, que fez uma participação no Movimento Armorial. “Ariano contribuiu muito para a cultura pernambucana, com a promoção e o respeito a nossa cultura, também com a criação das expressões artísticas como o Balé Popular. Como resultado, podese ver o carnaval de Pernambuco que é todo voltado para a nossa cultura.”, comenta. O violinista, escritor, regente e compositor, Zoca Madureira, trabalhou com Ariano desde seus 21 anos. Ele diz que o escritor abriu sua mente e teve muita influência no seu trabalho. “Suassuna também deixou suas aulas espetáculos, uma forma de palestras, mas com uma forma de apresentação diferenciada, pois envolve a emoção”, comenta Muitos consideram um privilégio e uma dádiva ter tido a oportunidade de trabalhar com o escritor. O seu bom humor foi mencionado por quem o conheceu. Ariano foi descrito como um escritor versátil e com um talento incomum, um perfeccionista, pois escrevia a mão, assim permitindo a ele mudar o texto toda vez que relia. Seu trabalho foi descrito como intenso. Quem trabalhava com ele diz ter aprendido muito, pois o autor transmitia tudo o que conhecia para os outros. “Um grande amigo com quem eu amava conversar, ouvir, aprender. Aprendi muito com ele, sobre arte e, principalmente, sobre a vida”, explica Adriana Victor. Ariano Suassuna “cumpriu sua sentença e encontrou-se com o único mal irremediável, aquilo que é a marca de nosso estranho destino sobre a terra, aquele fato sem explicação que iguala tudo que é vivo, que só rebanho de condenados, porque tudo o que é vivo, morre”, como ele escreveu em uma das suas obras. A saudade de Ariano é grande. A dor da perda um dia será curada, mas toda vez que alguém ler ou assistir a uma de suas obras será como tê-lo no mundo dos vivos.
Fot
“Eu tenho a maior convicção de que, com os elementos da chamada arte arcaica, a gente pode fazer uma arte que se projeta até para o futuro"
“Não tenho nada contra a cultura universal, mas não posso admitir que se considere sinônimo de universal a cultura de massa. Ela é o contrário da universalidade, é a uniformização”
tos: Secretaria de Educação de Pernambuco
“O otimista é um tolo. O pessimista, um chato. Bom mesmo é ser um realista esperanços”
Obras selecionadas Uma mulher vestida de Sol, (1947); Cantam as harpas de Sião ou O desertor de Princesa, (1948); Os homens de barro, (1949); Auto de João da Cruz, (1950); Torturas de um coração, (1951); O arco desolado, (1952); O castigo da soberba, (1953); O Rico Avarento, (1954); Auto da Compadecida, (1955); O casamento suspeitoso, (1957); O santo e a porca, (1957); O homem da vaca e o poder da fortuna, (1958); A pena e a lei, (1959); Farsa da boa preguiça, (1960); A Caseira e a Catarina, (1962); As conchambranças de Quaderna, (1987); Fernando e Isaura, (1956)"inédito até 1994". Romance A História de amor de Fernando e Isaura, (1956); O Romance d'A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-eVolta, (1971); História d'O Rei Degolado nas caatingas do sertão /Ao sol da Onça Caetana, (1976) Palestras[editar | editar código-fonte] Defesa contra a teoria da evolução. Poesia O pasto incendiado, (1945-1970);
Ode, (1955); Sonetos com mote alheio, (1980); Sonetos de Albano Cervonegro, (1985); Poemas (antologia), (1999) Os homens de barro, (1949) Adaptações *A Compadecida (1969): adaptação da peça Auto da Compadecida para as telas de cinema com a participação de Regina Duarte, como a Compadecida, e Antônio Fagundes, como Chicó. *Os Trapalhões no Auto da Compadecida (1987): adaptação livre da peça com Os Trapalhões (Renato Aragão, Dedé Santana, Mussum e Zacarias) e dirigido por Roberto Farias. * Auto da Compadecida (1999): a mais recente adaptação da peça, em que primeiramente foi uma minissérie com quatro capítulos, e depois adaptada para o cinema com acréscimo de elementos das peças O Santo e a Porca e Torturas de Um Coração. * A Farsa da Boa Preguiça (1995): especial para a televisão, dirigido por Luiz Fernando Carvalho e com a estrutura da literatura de cordel. * A Pedra do Reino (2007): adaptação do Romance d’A Pedra do Reino para televisão, como minissérie. Foi uma homenagem aos 80 anos de Ariano Suassuna. Sempre ligado à cultura e com interesse no desenvolvimento e no conhecimento das formas de expressão culturais populares tradicionais, em 1970, deu início ao Movimento Armorial. Esta corrente
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Dicas Culturais
Cais do Sertão O Cais Um dos mais modernos equipamentos culturais do Brasil, o Cais do Sertão, instalado no antigo Armazém 10 do Porto do Recife, é um local de convivência, diversão e conhecimento, polo gerador de novas ideias e experiências. Abrigando e reverenciando a obra de Luiz Gonzaga, o grande homenageado do espaço, o Cais traz para a beira-mar da capital do Estado um pouco do solo rico e generoso da cultura popular do nordeste brasileiro. Por que conhecer? Pela possibilidade de conhecer um vasto universo de personalidades, histórias, memórias e experimentar um pouco do sertão. Visitação Avenida Alfredo Lisboa, s/n Funcionamento Existe a possibilidade de realizar o agendamento de visitas guiadas pelo email agendamento@frevo.org.br ou pelo telefone (81) 3355-9500. O Cais funciona nos seguintes horários: Terça: 9h às 21h, Quarta a Sexta: 9h às 17h, Sábado: 13h às 19h, Domingo: 11h às 19h O agendamento poderá ser feito de segunda a sexta-feira, das 9h às 18h, pelos telefones (81) 3084-2074 e (81) 4062-9594. O ingresso custa R$ 8 (inteira) e R$ 4 (meia-entrada para estudantes e jovens até 24 anos). As terças, as visitas são gratuitas. Paço do Frevo O Paço Nacionalmente, o Dia do Frevo é comemorado no dia 14 de setembro. É uma boa ocasião para conhecer o Paço do Frevo. Instalado no Bairro do Recife, o espaço é dedicado à difusão, pesquisa, lazer e formação nas áreas da dança e música do frevo, O objetivo é propagar o ritmo para as futuras gerações. Por que conhecer? Pela possibilidade de conhecer um vasto universo de personalidades, histórias, memórias e experimentar o carnaval pernambucano durante o ano todo. Visitação Praça do Arsenal, s/n, Bairro do Recife Funcionamento Existe a possibilidade de realizar o agendamento de visitas guiadas pelo email agendamento@frevo.org.br ou pelo telefone (81) 3355-9500. Fechado às segundas, o Paço funciona nos seguintes horários: Terças, quartas e sextas, das 9h às 18h; Quintas, das 9h às 21h; Sábados e domingos, das 12h às 19h; Estudantes da rede pública em visita pré-agendada têm direito à gratuidade.
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O Fim da Televisão
Organizadores: Mario Carlón e Yvana Fechine Editora: Confraria do Vento Categoria: Comunicação e Novas Mídias Por que ler? O livro reúne artigos científicos de autores de diversos países em torno do fim da televisão. Mais do que centrar a discussão no futuro do importante meio de comunicação de massa, a publicação aponta as transformações pelas quais a mídia tem passado nos últimos anos. Na sala de aula O professor pode discutir mídia de massa e sua importância e falar um pouco sobre o atual cenário dos veículos de comunicação. Fala-se muito sobre o fim do rádio, da TV, do jornal impresso, mas será que eles vão acabar mesmo. Pode render uma boa discussão.
Chico Buarque para todos
Creative Commons por Sergio Fonseca
O Instituto Tom Jobim disponibiliza online diversas obras e documentos do acervo pessoal de Chico Buarque. O material completo conta com 7.916 letras e partituras, 26.152 textos, 1.044 imagens e por volta de 600 arquivos de vídeo e áudio, que incluem a discografia completa do compositor. Por que acessar? Excelente oportunidade de entrar em contato com as obras deste importante compositor da música popular brasileira. Entre os documentos para consulta, encontram-se algumas relíquias da vida do artista, como o livro de impressões da mãe do compositor que relata seus primeiros anos de vida. Ou a história em quadrinhos “O Chico-mirim”, que escreveu aos 12 anos, além de matérias a respeito de sua carreira. Acesse: http://www.jobim.org/chico/
Música clássica
A Cabra Cega
Obras de compositores clássicos para ouvir e baixar Público em geral pode ouvir ou baixar gratuitamente todas as composições de Bach, Beethoven e Vivaldi pelo site Classical Music. As peças são conduzidas por maestros e instrumentistas consagrados. Além deles, outros quatro mil compositores também poder ser ouvidos ou baixados, embora suas obras estejam disponibilizadas em número menor. No site, é possível criar playlists com os compositores preferidos.
Autora: Janaina de Holanda Costa Calazans Editora: Cepe Categoria: infantil
Por que acessar? Excelente oportunidade para docentes e discentes conhecerem obras de importantes compositores da música clássica como Johann Sebastian Bach e suas peças “O Cravo Bem-Temperado”, “Paixão Segundo São mateus” e “Oferenda Musical”. Boa oportunidade de conhecer mais sobre os trabalhos de Ludwig van Beethoven e a “Sonata Ao Luar”, “Sonata Apassionata” e as Sinfonias números 3, 5 e 9. De Antonio Lucio Vivaldi, vale a pena ouvir “As Quatro Estações” e “L’Estro Armonico”. Acesse: http://classical-music-online.net/
O Livro Conta a história da cabra Carol que fazia parte de um rebanho que foi atingido pela doença da cabra cega. Doente, Carol entra na fila para o transplante de córneas. Por que ler? Livro de leitura leve e temática muito importante. A partir da história de Carol, mitos e dúvidas sobre a doação de órgãos podem ser desmistificados e esclarecidos.
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Fotografia A Janela da Resistência
Ativistas do movimento #OcupeEstelita improvisaram uma entrada para a área interna do Cais José Estelita
Autor da Imagem: Reuel Almeida
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