Independência
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Independência Memória e Historiografia
Wilma Peres Costa Télio Cravo [org.]
© Télio Cravo e Wilma Peres Costa, 2023
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Edição Plinio Martins Filho
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Capa Fabio Pinotti
Foto da capa Michelli Cristine Scapol Monteiro Revisão Raira Cortes
Ficha catalográfica elaborada pelo Serviço de Biblioteca e Documentação da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (bbm-usp)
IN38
Independência: Memória e Historiografia / Télio Cravo; Wilma Peres Costa (orgs.). – 1. ed. – São Paulo: Edições Sesc, 2023.
416 p. ; 18 x 25 cm ; il.
ISBN: 978-85-9493-235-8
1. Independência do Brasil. 2. História do Brasil. 3. Nação. 4. Brasil. I. Organizadores. II. Título
CDD: 981.04
Bibliotecário Resp.
Rodrigo M. Garcia, CRB8ª: SP-007584/O
Temporalidades Heterogêneas – Danilo Santos de Miranda
Sobre o Passado e o Futuro de uma Memória – Wilma Peres
Costa e Télio Cravo
parte 1. sobre o futuro de uma memória
i. Foram os Grandes Vultos que Fizeram a História das Independências do Brasil? – Lucia Bastos P. Neves
ii. O Nacionalismo Autoritário Ritualizado: O 31 de Março e o 7 de Setembro nas Comemorações Cívicas da Ditadura Militar –
Rodrigo Patto Sá Motta
iii. Independência, Documentos de Arquivo e Políticas da Memória – Renato Venancio
iv. Brasil Paralelo: Restaurando a Pátria, Resgatando a História. A Independência entre Memórias Públicas e Usos do Passado –Fernando Nicolazzi
parte 2. narrativas, conexões e imagens
v. A Independência, em Síntese: Sobre um Exercício de Escrita Histórica – Jurandir Malerba
vi. A Independência Negociada com os Artistas: Afonso Taunay, o Museu Paulista e a Fabricação das Imagens para 1922 – Carlos
Lima Junior
vii. Do Reino Unido ao Império: Memórias, Narrativas e Prismas –
Wilma Peres Costa
viii. Ideias Republicanas na Era da Independência – Heloisa Murgel
Starling
ix. Memórias da Independência: Um Projeto Expositivo para Discutir o Bicentenário – Paulo César Garcez Marins
parte 3. territórios em movimento
x. Nossas Províncias Africanas: Angola (Benguela) e a Independência do Brasil (c. 1822-1825) – Roquinaldo Ferreira
xi. Expansionismo e Crise: A Independência do Brasil e a Província Cisplatina (1808-1828) – Fabrício Prado
xii. 1825: Um Ponto de Inflexão no Processo Independentista do Brasil e da América Hispânica – João Paulo Pimenta
xiii. As Praças de Comércio: Ordem Liberal e Persistências do Antigo Regime – Cláudia Maria das Graças Chaves
xiv. Crise, Desenclave das Minas e o Avesso do Vicinal: Conexões e Território no Processo de Independência do Brasil – Télio Cravo
parte 4. fronteiras da cidadania na formação da nação
xv. Escravidão e Regimes Representativos no Atlântico: Um Exercício de História Conceitual – Tâmis Parron
xvi. Independência, Constituição e Cidadania: Que Sujeitos? Que direitos? – Andréa Slemian
xvii. Quem Eram os “Briosos Militares”? O Exército de d. Pedro às Vésperas da Independência (Rio de Janeiro, 1821-1822) –Adriana Barreto de Souza
xviii. Interpretações e Alinhamentos dos Povos Indígenas na Era das Revoluções Atlânticas – André Roberto de A. Machado
xix. Tráfico de Escravos, Africanos Livres e Trabalho Compulsório ou os Silêncios na História da Independência – Beatriz G. Mamigonian
xx. Vozes Africanas no Lado Avesso da Independência e da Língua Brasileira – Ivana Stolze
Temporalidades Heterogêneas
danilo santos de miranda Diretor do Sesc São PauloMuitos processos mentais humanos dependem de analogias para serem compreendidos, e, dentre eles, a memória talvez seja nossa faculdade mais subordinada à metaforização. No contexto da cultura ocidental, exemplos como os blocos de cera em que os gregos antigos escreviam, o palimpsesto medieval, a chapa fotográfica do século xix e, mais recentemente, os bits digitais, têm sido utilizados para registrar o modo como nos lembramos do passado.
Na esteira dessa lógica comparativa, porém inversamente, poderíamos dizer que a história enquanto disciplina apresenta similitudes com as dinâmicas verificadas na experiência pessoal da rememoração: certas reminiscências são evocadas segundo uma busca premeditada e intencional, enquanto outras se desdobram na medida em que eventos da atualidade as desencadeiam, como ocorre nas efemérides ou nas festividades. Já no caso de eventos traumáticos, fazem-se necessários trabalhos psíquicos capazes de atenuar a dor ensejada por tais experiências, principalmente no sentido de constituir um aprendizado com o passado, como propõem espaços de recordação como os monumentos públicos ou os estudos que preservam e dão visibilidade aos testemunhos das vítimas dessas ocorrências.
Na aproximação entre memória e história, essa última, ao se fundar nas exigências do presente, dirige aos tempos idos uma mirada que, se por um lado, parte dos dados objetivos da realidade, por outro, é dotada de certa instabilidade originária dos usos que podem ser feitos do passado.
A publicação Independência: Memória e Historiografia se detém nos veios de contradição e complexidade que marcam a escrita da história da emancipação do Brasil em relação a Portugal. Esses estudos, organizados pelos historiadores Wilma Peres Costa e
Télio Cravo, abordam desde a construção do imaginário da independência em pinturas localizadas no Museu Paulista – cuja reabertura também compõe o feixe de ações comemorativas de 2022 – até a análise documental sobre o conceito de cidadania numa sociedade escravocrata que, ao mesmo tempo que reivindicava um regime representativo, se alicerçava na exclusão da maior parcela de sua população quanto a essas instâncias governamentais, dentre outros mecanismos de negação de direitos humanos. Por acreditar no papel fundamental que o conhecimento sobre a complexidade do passado desempenha no delineamento do futuro, o Sesc, instituição comprometida com o desenvolvimento humano e social, encontra nesta obra oportunidade de reafirmar seu compromisso com a sociedade. Assim, por ocasião da efeméride dos duzentos anos da Independência do Brasil, propomos um ato comemorativo pautado na reflexão crítica, dialógica e plural acerca das histórias que nos perfazem enquanto coletividade.
Sobre o Passado e o Futuro de uma Memória
Wilma Peres Costa e Télio CravoO meu pai era paulista
Meu avô, pernambucano
O meu bisavô, mineiro
Meu tataravô, baiano
Meu maestro soberano
Foi Antônio Brasileiro
Chico Buarque de Holanda, Paratodos
O livro que o leitor tem em mãos reúne trabalhos apresentados no Seminário 3x22: 1822 – Independência: Memória e Historiografia, evento que integrou o vasto empreendimento posto em marcha pela Biblioteca Brasiliana Mindlin da Universidade de São Paulo, em colaboração com o Sesc, em torno da instigante sobreposição de efemérides e temporalidades que terá lugar em 2022 – o bicentenário da Independência do Brasil e o centenário da Semana da Arte Moderna. Menos do que a definição de um lugar de comemoração, o espírito da iniciativa convidava a falar dos múltiplos significados daqueles eventos e da sua reverberação no nosso presente. Sabidamente, uma das virtualidades das comemorações é a de desenhar atalhos inéditos entre os pesquisadores e o grande público, pois nessas ocasiões novas trilhas de pesquisa e interpretações podem dialogar com os lugares de memória e alcançar também as salas de aula, além do campo sempre alargado das tecnologias digitais.
Para os historiadores de ofício, a Independência é temática incontornável. Ela se liga à própria trajetória da disciplina, do seu ensino e da sua pedagogia nos espaços públicos onde se cristalizam memórias e celebrações. Por essa razão, pareceu a nós
que o evento, e o livro que dele resulta, devesse enfatizar, ao lado da apresentação de algumas das novas linhagens que têm sido exploradas sobre o tema da Independência, a própria historicidade das suas comemorações. Ao propor a reflexão sobre as comemorações como um dos eixos do evento, buscávamos um modo de revisitar a sempre sensível relação entre história e memória, por meio de alguns relevos que vale a pena aqui explicitar.
O tema das celebrações da independência convidava-nos a olhar não apenas para o passado dessas celebrações, na conhecida acepção de que cada época o recria e reincorpora, a seu modo, mas também para as demandas que as vozes do presente expressam, com urgência sobre o “futuro da memória”, disputa que se manifesta por vezes com grande estridência no ataque a imagens e efígies ou na exigência do tratamento de temas e personagens antes silenciados.
Na busca de um recorte que respondesse ao desafio de pensar a efeméride da Independência a partir de suas celebrações, dois momentos nos ajudaram a organizar os eixos do evento e que se expressam nas duas partes iniciais do livro. O primeiro, analisar, à luz dos debates historiográficos atuais, a narrativa sobre a formação da nação brasileira que se cristalizou em um dos seus “lugares de memória”, o Museu do Ipiranga, às vésperas de sua reabertura à visitação pública, programada para 2022, depois de longa ausência. Entre as manifestações populares que problematizaram alguns dos ícones daquela decoração – a estátua do Borba Gato – e a sonoridade poética da canção
Paratodos de Chico Buarque de Holanda (na epígrafe), que pontuou a mensagem de Ano Novo veiculada pelo Museu (2020-2021), as discussões sobre a memória da independência adquiriram, para nós, pertinência e sentido.
Uma segunda referência orientou nossas escolhas e também nossas apreensões, pois não é demais registrar que vivemos tempos sombrios, doentes e cercados de incertezas. Presentes em nossas discussões estiveram reiteradamente os modos de comemoração/rememoração do Sesquicentenário da Independência (1972). Os eventos de 1972 invadiam nossas falas, pois naquela ocasião se fizeram presentes de modo particularmente significativo as distintas dimensões aqui propostas – comemoração, disputas pela memória e historiografia – razão pela qual reverberam até nossos dias.
Dentre elas vale ressaltar, naquele ano, as cerimônias de repatriamento dos restos mortais de d. Pedro i pelo governo ditatorial, construindo um périplo pelas várias regiões do país, evento que foi um notório investimento político do regime, ecoando na imprensa escrita e televisada, quando se aprofundavam as suas dimensões mais cruéis. Ao mesmo tempo na esfera acadêmica, que fora fortemente vitimada pelo regime, 1972 foi a data de
publicação do livro 1822: Dimensões, pela Editora Perspectiva, coordenado pelo historiador Carlos Guilherme Mota, livro que constituiu um marco em torno do qual gravitaram muitos dos debates em torno da Independência pelas décadas subsequentes.
A memória do sesquicentenário se faz presente em nossos debates com admiração e respeito por aqueles historiadores, que souberam naquela altura responder com coragem, rigor e argúcia crítica ao espetáculo patético do funeral extemporâneo do nosso primeiro Imperador. Ao mesmo tempo, somos tomados pela incerteza ao nos defrontar com o fato de que as comemorações do bicentenário da Independência se farão sob a égide de governantes que não têm apreço pela democracia nem pelo pensamento crítico. É certo que não temos mais imperadores para repatriar, mas é impossível imaginar quais cenografias poderão ser projetadas para dar visibilidade a tentações autoritárias que as manifestações do Sete de Setembro de 2021 tristemente prefiguraram.
O livro que apresentamos ao leitor ecoa essas apreensões. Se não podemos responder a elas, registrá-las é um dever do nosso ofício.
Se, em efemérides passadas (1922, 1972) os círculos do poder fizeram-se presentes pelas cerimônias fúnebres (e extemporâneas) dos esquifes de d. Pedro ii (1822) e d. Pedro i (1972), agora trata-se de honrar a memória de mais de 600 mil mortos pela terrível pandemia, agravada pela irresponsabilidade e pelo negacionismo dos nossos dirigentes.
Compartilhamos essa apreensão sobre o “o futuro da memória” com nossos leitores enfatizando, na segunda metade do livro, o esforço de dar lugar àquelas vozes que têm expressado em suas lutas e pesquisas o desejo e o direito de fazer parte da história e da memória da construção da nação: os indígenas, os escravizados, os forros, os livres e pobres, pessoas de todos os gêneros e raças, gente que estava viva e que precisa ser lembrada como quem viveu – em suas lutas, escolhas e nos indícios que deixaram e que pedem lugar de entrada na história escrita, na história ensinada, nos lugares públicos. Por essa, entre tantas razões, é que refletir sobre a Independência no contexto da comemoração é tarefa que envolve um desafio distinto daquele que os historiadores de ofício enfrentam em seu trabalho cotidiano em salas de aula ou em encontros acadêmicos regulares, pois envolve a necessidade de nos questionarmos sobre que respostas seríamos capazes de oferecer, a partir do nosso ofício, nesses tempos insalubres e sombrios, que possam contribuir de algum modo para minorar a incerteza e abrir janelas para o futuro.
Parte 1
Sobre o Futuro de uma Memória
Foram os Grandes Vultos que Fizeram a História das Independências do Brasil?
lucia bastos p. neves
Independência
1. O projeto foi de Eliseu Visconti. Neste selo, à esquerda aparece o retrato de d. Pedro i. Entre ele e José Bonifácio de Andrada e Silva, o Cruzeiro do Sul, à direita o presidente da República Epitácio Pessoa. Ao centro, uma figura feminina coroa com uma mão Epitácio Pessoa e, na outra, há o escudo com o valor do selo. Disponível em https:// eliseuvisconti.com.br/obra/a822/. Acesso em 14 out. 2022.
Independência: Memória e Historiografia
Em 7 de setembro de 1922, quando a Independência do Brasil completou 100 anos de existência, a narrativa da história de sua construção ainda se voltava essencialmente para o estudo dos fatos e das grandes personagens que haviam realizado esse processo. Inúmeros festejos e comemorações foram realizados, sempre em caráter oficial, provocando, portanto, desconfiança por parte da historiografia posterior. Artigos de jornais e escritos de divulgação também exaltavam os grandes heróis do feito. Regra geral, não havia novidades que trouxessem inquietações ao historiador para outras abordagens acerca do fato, considerado, por muitos, como o marco fundador da nacionalidade brasileira2.
Na produção historiográfica, coube a Manuel de Oliveira Lima, em 1922, publicar uma das obras fundamentais a fim de explicar o processo – O Movimento da Independência – iniciado pelo regresso de d. João e “as causas e efeitos da Revolução Portuguesa de 1820”, e finalizado com a coroação de d. Pedro e as intrigas e tramas entre os grupos de José Bonifácio e de Gonçalves Ledo3. Utilizando uma narrativa minuciosa e erudita e pautando-se em rigorosa crítica documental de fontes ainda inexploradas, como documentos de arquivos estrangeiros, cartas trocadas entre d. Pedro e seu pai, relatos de viajantes, periódicos e panfletos, Oliveira Lima inovou ao procurar apresentar uma visão processual da Independência, em que estruturas e acontecimentos mesclavam-se4. Malgré tout, os indivíduos não deixavam de se fazer presentes como os grandes responsáveis pela Independência.
Ainda, posteriormente, trabalhos clássicos, como o de Otávio Tarquínio de Sousa, trilhavam o caminho da historiografia do oitocentos, revelando, em certa medida, o papel adquirido por uma personagem fundamental no mundo contemporâneo: o indivíduo.
2. Para o estudo das comemorações dos 100 anos da Independência, ver, especialmente, Marly Silva da Motta, A Nação Faz 100 Anos: A Questão Nacional no Centenário da Independência, Rio de Janeiro, Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1992.
3. O Movimento da Independência, 1821-1822, São Paulo, Melhoramentos, 1922, ver capítulos i e xxi. A obra foi criticada em vários aspectos, à época, por Capistrano de Abreu, Correspondência de Capistrano de Abreu, Rio de Janeiro/Brasília, Civilização Brasileira/inl, 1977, vol. 2, Carta de 3 de agosto de 1922. No sesquicentenário também mereceu a crítica de José Honório Rodrigues, Independência: Revolução e Contrarrevolução: As Forças Armadas, Rio de Janeiro, Livraria Francisco Alves Editora s.a., 1975, p. 16.
4. Para a análise da escrita da história em Oliveira Lima, cf. Eduardo Luis Flach Käfer, Entre Memória e História: A Historiografia da Independência nos Cem Anos de Emancipação, Dissertação de Mestrado apresentada no Programa de Pós-graduação em História na puc-rs, 2016. Disponível em: http://tede2.pucrs.br/tede2/handle/tede/6978. Acesso em: 30 jan. 2020. Cf. também: Lucia Bastos P. Neves, “Oliveira Lima e o Império do Brasil: Uma Nova Narrativa”, em André Heráclio do Rêgo, Lucia Bastos P. Neves e Lucia Maria Paschoal Guimarães (orgs.), Oliveira Lima e a Longa História da Independência, São Paulo, Alameda Casa Editorial, 2021, pp. 165-188.
Foram os Grandes Vultos que Fizeram a História das Independências do Brasil?
No ritual dos sucessos políticos brasileiros da época faltava ainda parte essencial: a consagração no recinto do teatro. E à noite lá esteve o imperador, saudado por vivas estrondosos. [...] “Numerosas composições” de poetas improvisados antecederam ao principal da noite – um elogio dramático, uma cantata de Troncarelli, o drama Independência de Escócia. [...] Programa vasto, a que não faltou “um novo hino patriótico, que a todos agradou, ainda mais pelo entusiasmo que inspiraram as letras do que pela sua harmoniosa música”. [...] No dia seguinte prosseguiram as festas. Salvas de artilharia logo de madrugada lembraram aos fluminenses que tinham um imperador constitucional, e este, ainda debaixo da comoção da véspera, quis louvar a Deus, pedir suas graças. Às onze horas deixava o Paço da Boa Vista para o da cidade e de lá se encaminhava para a Capela Imperial, onde o bispo capelão-mor e todo o cabido, paramentados com magnificência o esperavam. [...] celebrou-se missa pontifical, ouvindo-se no curso desta a “música do insigne herói a quem a natureza prodigalizou todos os talentos”. Quem poderia ser esse herói senão d. Pedro?5
A longa transcrição acima demonstra o caráter laudatório da obra de Tarquínio de Sousa em relação à personagem que considerava como central no processo da Independência do Brasil: Pedro i.
Sem dúvida, alguns avanços se fizeram. Em 1972, no sesquicentenário da Independência, José Honório Rodrigues trouxe à luz a participação de atores de menor importância – o homem comum – nesse processo, mas ainda pouco avançou nesse sentido6. Foi preciso esperar a renovação de uma historiografia do final do século xx que forneceu pistas inovadoras em relação ao processo de separação entre Brasil e Portugal, mas, que ainda não se debruçou de maneira profunda sobre aqueles que permaneceram na sombra, embora estes tenham lutado e interferido de algum modo nos rumos da cisão. Tais estudos abriram novas perspectivas para se analisar o papel das camadas médias e populares ao longo desses anos. Mas muito ainda é necessário se fazer.
Há conhecimento que “eles” – escravos, libertos, homens pobres, mulheres livres, brancos ou mestiços, indígenas, homens e mulheres das camadas médias – estiveram presentes no processo de separação do Brasil. Ainda é, contudo, bastante difícil compreender como essa presença se efetivou nas práticas políticas. Um primeiro problema é a escassez de fontes produzidas por esses atores. Regra geral eram iletrados,
5. Otávio Tarquínio de Sousa, A Vida de d. Pedro i, [1952], Brasília, Senado Federal, Conselho Editorial, 2015, tomo 2, pp. 426-428.
6. José Honório Rodrigues, Independência: Revolução e Contrarrevolução, Rio de Janeiro, Livraria Francisco Alves Editora S. A., 1975, vol. 5. Outro trabalho de fundamental importância que veio à luz naquela época foi: Carlos Guilherme Mota (org.), 1822: Dimensões, São Paulo, Perspectiva, 1972.
Independência: Memória e Historiografia
embora travassem conhecimento com a cultura letrada por meio da oralidade7, o que muitas vezes levou o historiador a aceitar uma certa inércia dessas camadas populares, cabendo apenas às elites o papel de protagonistas no processo. Além disso, há documentos que foram produzidos pelas camadas ilustradas ou pelas autoridades locais, que preocupadas com qualquer levante ou movimentação que viesse das ruas, ampliavam o teor das mensagens, exagerando a possibilidade de motins ou revoltas. Apesar destes fatores e mesmo que nem sempre seus projetos tenham culminado em uma vitória, esses anônimos e esquecidos precisam ser apreendidos, pois suas ações indicam tensões em um processo repleto de incertezas e de possibilidades. É necessário também observar que nem sempre tais documentos apresentavam como objetivo final a independência do Brasil em si, especialmente em uma sociedade multifacetada, em que mais de 30 por cento da população era escravizada, e em que a população livre de cor era a faixa da população que mais crescia8. Esse trabalho procura apontar outras formas de abordar a Independência do Brasil, para além de seus grandes vultos e heróis, bastante conhecidos e analisados pela historiografia do oitocentos e mesmo do século xx. Objetiva-se, portanto, trazer à tona personagens comuns ou anônimos que mediante suas ideias e práticas políticas também apresentaram projetos distintos de se construir as Independências do Brasil. Por outras linguagens distintas daquelas das elites que comandaram o processo, forneceram argumentos e percepções que possuíam sobre o momento histórico que vivenciaram, emprestando outros significados ao conceito de Independência9. Por conseguinte, nas proximidades dos duzentos anos desse processo, cabe não apenas comemorar ou relembrar fatos que fornecem um discurso político que pode “constituir uma memória nacional”, nas palavras de Pollack10. Torna-se necessário alargar o campo de análise e repensar o processo que não se circunscreve ao Sete de Setembro e ao consagrado Grito do Ipiranga, reconstruindo por meio de uma trama
7. Cf. Lucia Bastos P. Neves, Corcundas e Constitucionais. A Cultura Política da Independência (1820-1823), Rio de Janeiro, Faperj/Revan, 2003, pp. 103-104.
8. Hendrik Kraay, “Slaves, Indians, and the “Classes of Color: Popular Participation in Brazilian Independence”, em Willem Klooster (org.), The Cambridge History of the Age of Atlantic Revolution, Cambridge, Cambridge University Press, no prelo.
9. Javier Fernández Sebastián, Diccionario Político y Social del Mundo Iberoamericano, La Era de las Revoluciones, 1750-1850, Madrid, Fundación Carolina, Sociedad Estatal de Conmemoraciones Culturales, Centro de Estudios Políticos, 2009, pp. 25-48.
10. Michael Pollack, “Mémoire, Oublie, Silence”, Une Identité Blessée, Paris, Métailié, 1993, pp. 28-29.
Foram os Grandes Vultos que Fizeram a História das Independências do Brasil?
coerente, a Independência, voltada não apenas em suas fronteiras, mas em um diálogo, que encontra no Atlântico o ponto de união de suas ideias e ações11.
Novos Instrumentos e Espaços da Política: Os Escritos de Circunstâncias, as Ruas, as Praças Públicas, as Petições e as Listas Eleitorais
Às armas Cidadãos. É tempo Às Armas
Nem um momento mais, perder deveis
Se à força da razão, os Reis não cedem
Das armas ao [sic] poder cedam os reis12
Dis o Pagoni que hade por sobrescriptos na testa dos Independentes, cada um deles esta cagando huma poia de merda para lhe cobrir a calva, e as sobras para lhe untar nos bigodes e a seos companheiros bigodistas13 .
Assim proclamavam dois panfletos manuscritos, colados nas paredes e nos postes das ruas de cidades brasileiras entre os anos de 1820 e 1824, quando a política ganhava as ruas e as praças públicas, demonstrando um clima agitado pela constitucionalização e pelas independências do Brasil. O primeiro, encontrado na cidade do Rio de Janeiro, incitava o povo a aderir ao movimento constitucionalista português. Utilizando-se de uma retórica que lembrava aquela dos textos da Revolução Francesa de 1789 – Citoyens! Aux armes! – ainda que não refletisse o mesmo clima, pois o objetivo não consistia em destronar a dinastia reinante – a de Bragança – apenas desejava-se quebrar os grilhões do despotismo, que, há tanto tempo, julgava-se, oprimiam os luso-brasileiros. Refletia, assim, o clima do ano de 1821 – aquele do constitucionalismo e das ideias liberais. O segundo, presente nas ruas do Maranhão, datado provavelmente de 1823, indicava a indignação dos grupos contrários à união com o Rio de Janeiro – os indepen-
11. Jeremy Aldeman, Sovereignty and Revolution in the Iberian Atlantic, Princeton, Princeton University Press, 2006.
12. Arquivo Histórico do Itamaraty, Rio de Janeiro, Lata 195, maço 6, pasta 13. Transcrito em José Murilo de Carvalho, Lucia Bastos P. Neves e Marcello Basile, Às Armas Cidadãos Panfletos Manuscritos da Independência do Brasil (1820-1823), São Paulo/Belo Horizonte, Companhia das Letras/Fapemig/Editora ufmg, 2012, pp. 126-128.
13. Biblioteca Pública Benedito Leite, São Luís. Documentos Manuscritos, 27 A, M4A, G – 2, E – 11. Documentos enviados à Junta do Governo da província do Maranhão, contendo pasquins alusivos à Independência, 1822-1823.
dentistas – e demonstrava uma outra postura em relação à Independência realizada no Sudeste, sob a égide de d. Pedro.
Todos eram anônimos, em especial por sua linguagem mais enfática e virulenta do que os panfletos políticos impressos, motivados, sem dúvida, por uma censura que ainda assombrava o Reino/Império do Brasil.
Era o tempo convulsivo das revoluções liberais iberoamericanas que afluíram nos movimentos de independência. Tais conflitos, iniciados em 1820 no chamado triênio liberal, do qual a Revolução de 1820 é resultante, bem como o movimento constitucionalista de 1821 no Reino do Brasil, criaram as condições para os primeiros ensaios de uma relativa liberdade de imprensa, exercida em espaços públicos cada vez mais amplos e que se propagavam por toda as províncias do norte ao centro-sul da antiga América portuguesa. Seus diálogos atravessaram ainda, inúmeras vezes, o Atlântico, numa espécie de conversas estridentes entre o Brasil e a antiga metrópole. Instituía-se, por conseguinte, uma nova maneira de fazer política, uma vez que esta ganhava, de um lado, as ruas, as praças públicas, as casas de pasto e, de outro, os salões, as sociedades secretas e as tipografias. Eram anos de crise e movimentação política.
Desses acontecimentos inéditos surgiu uma espantosa quantidade de jornais e panfletos, contendo vocabulários, palavras e conceitos ressignificados, que utilizados pelos atores da época, traduziam, de alguma forma, uma época de mudanças e revoluções. Igualmente, uma nova prática política – aquela do uso de requerimentos, petições, cartas e memórias, escritas por camadas médias, não só pelos homens, mas também pelo belo sexo, permitem identificar argumentos e percepções que esse grupo, mantido, muitas vezes, fora do direito de cidadania, possuía sobre a moderna política daquele momento na passagem para o Império no Brasil14
Um ponto fundamental para esse novo olhar sobre as Independências é trazer à tona esta documentação rica, em sua maioria inédita ou pouco explorada pelas pesquisas históricas sobre o período. Esse material constitui a história de um tempo, pois os fatos e personagens que aí se encontram narrados podem ser vistos como registros com que os historiadores elaboram a reconstrução de um momento do passado. Como escrevia o redator do jornal O Conciliador do Maranhão, em abril de 1821: “Os grandes acontecimentos políticos das Nações devendo algum dia entrar nas páginas da História,
Foram os Grandes Vultos que Fizeram a História das Independências do Brasil?
precisam ser minutados por testemunhas contemporâneas e desinteressadas, a fim de que a posteridade possa avaliar o mérito, ou demérito dos seus cooperadores”. Assim, os jornais serviam de “mediadores entre os governos e os povos”, auxiliando o trabalho dos historiadores, contemporâneos dos fatos, e cuja história escrevem, precisando do auxílio de “documentos verídicos”, como os periódicos, para além de uma tradição, “quase sempre suspeita”15. Portanto, esses escritos constituem-se em memórias que, ao apresentar distintas visões de um mesmo fato, servem como fundamentos da história porque servem também para pensar e repensar a História do Brasil. E, muitas vezes, é possível se deparar nesses textos com personagens desconhecidas ou com uma gama de anônimos que também foram protagonistas das Independências. Em meio a esse clima agitado e efervescente, as pessoas, mesmo as comuns, passavam a discutir sobre todas essas novidades políticas ainda que não tivessem voz decisiva na condução política do governo, mas expressavam suas opiniões com indignação e veemência, expressando-se por meio da cultura escrita e oral.
Ao dar forma a esse discurso, utilizavam-se de instrumentos simples, por meio de uma escrita pouco custosa e de rápida circulação. Não eram tratados teóricos, mas textos que trilhavam o caminho entre a história e a política, permitindo a circulação das informações entre os vários segmentos da sociedade – principalmente os panfletos políticos.
Há muito conhecidos no mundo da política ocidental trouxeram à luz, especialmente os panfletos manuscritos, aqueles indivíduos que permaneceram anônimos.
Aqueles que, muitas vezes, não se encontra o rosto ou o nome de seus autores, mas cujos traços revelam outras interpretações sobre as Independências do Brasil16. Chamados, algumas vezes, de papelinhos ou pasquins, pois se apresentavam em folhas soltas, ora verticais, ora horizontais, eram colocados nas paredes e postes dos locais públicos, como demonstram os restos de caliça nos poucos exemplares encontrados hoje nos arquivos, especialmente nos arquivos regionais. Revelavam por meio de sua escrita um estilo simples e direto, buscando causar impacto sobre o receptor e facilitar a compreensão da mensagem.
Encontravam-se repletos de erros de grafia e de estruturação lógica do texto, indicando que, provavelmente, eram redigidos por indivíduos que apresentavam algum grau de estudo, mas não eram, certamente, letrados diplomados em Coimbra ou ver-
sados nas ideias do século das Luzes, que, regra geral, são considerados como personagens-chave do processo que permitiu a entrada do antigo Reino Luso-Brasileiro na modernidade política, conduzindo-o à formação de um novo Estado, independente de Portugal. Se de início, apresentavam suas opiniões sobre as novas ideias constitucionais, anos mais tarde fornecem pistas de outros projetos de independência. Assim, refletindo o ambiente do processo constitucional de 1821, e ainda da aceitação da Constituição que se elaborava em Portugal, encontra-se um panfleto que, certamente, não expressava a linguagem mais moderada daqueles que lideraram o movimento de 1821:
AVISO
Pelo povo ao Rei, o poder é dado, A(o) povo portanto legislar compete, Se a este aviso o Rei não cede, Às armas cederá o seu poder inerte.
Da Nação o Rei não é mais que chefe, Para executara Lei por ela imposta.
Como é possível então que o Rei dite?
Não! Não! Cidadãos! ex [eis] a resposta!!
Viva o rei que jurar
A sábia Constituição
Que pelas Cortes for dada
Da Portuguesa Nação17.
Tratava-se, sem dúvida, de algum escrito, claramente favorável à adesão da causa portuguesa, não apresentando qualquer menção a um processo de separação entre Brasil e Portugal. No entanto, em suas palavras, encontram-se uma proposta de uma nova legitimidade que se pautava na vontade e na soberania da nação e dos povos e, não mais, na “figura simbólica do rei” ou em uma ordem imemorial sancionada por Deus. O panfleto transmite uma mensagem como se fosse uma estrutura complexa de pressupostos, usos e experiências presentes de um tempo determinado, cujos agentes, que dela fazem uso, articulam uma visão de mundo e possibilitam um grande número de enunciados coerentes entre si, pois só dessa forma, essa linguagem era capaz de for-
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necer significado ao passado. Seus autores podiam não ser homens da plebe, mas eram anônimos que, embora aceitassem a monarquia, vislumbravam um outro horizonte de expectativas, distinto dos projetos das elites do Rio de Janeiro, comandadas por José Bonifácio ou por Joaquim Gonçalves Ledo.
Nestes escritos é possível também encontrar propostas distintas para a constituição do Império, considerando-se, inclusive, uma participação mais ampla das diversas camadas da sociedade. Se os conceitos de liberdade e igualdade eram proclamados por todos os cidadãos, nem sempre seu significado era semelhante. Assim, em um panfleto impresso encontra-se uma alusão crítica ao conceito de igualdade social. Um “pedreiro” (entenda-se um pedreiro-livre) narrava a seguinte passagem em relação a um sonho que tivera a respeito das Cortes de Lisboa:
Diz-se que todas as comodidades que deve ter uma sociedade devem ter os habitantes dessa sociedade: isto não é assim; os direitos dos habitantes de uma sociedade são iguais, mas as comodidades não o podem ser para todos, [dizia o Sr Cal]. Ora isto lá me pareceu assim, quando me recordei então, que todos têm direito a dormir na cama, mas que nem todos têm a comodidade de deitar-se em colchões fofos, porque alguns dormem em tarimbas!18
Depreende-se que o conceito de igualdade social não se incluía nessa nova cultura política19, proclamada pelas camadas mais abastadas e ilustradas. Tal perspectiva, no entanto, não era uma proposta totalmente ignorada. No Maranhão, província que se destacou por sua adesão às Cortes de Lisboa, sendo contrária, de início, ao movimento separatista, um panfleto manuscrito, proveniente dessa conjuntura, proclamava:
El Rey e as Cortes, e por isso, a Lei é igual para todos e somos iguais qual seja o castigo para quem fizer crime, que tanto faz o branco como os das mais cores livres, e não cativos; iguais se hão de enviar para mais longe desta capital. [...] O Povo Livre do Maranhão20
18. Carta de Hum Pedreiro ao Seu Amigo em que lhe Refere Hum Sonho que Teve a Respeito das Cortes, Rio de Janeiro, Tip. do Diário, 1822, pp. 6-7. O Sr. Cal era, na discussão das Cortes, o deputado português Manuel Borges Carneiro, segundo o autor do próprio panfleto.
19. Para o conceito de cultura política, cf. Keith Michael Baker, “Introduction”, em K. M. Baker (ed.), The French Revolution and the Creation of Modern Political Culture (vol. 1: The Political Culture of the Old Regime), Oxford, Pergamon Press, 1987, p. 12; Serge Berstein, “La Culture Politique”, em Jean-Pierre Rioux e Jean François Sirinelli, Pour une Histoire Culturelle, Paris, Seuil, 1997, pp. 371-386.
20. Biblioteca Pública Benedito Leite, São Luís. Documentos Manuscritos. 27 A, G2, E11. Documentos enviados à junta da Província do Maranhão contendo pasquins alusivos à Independência, 1820-1823.
Nesse pasquim o povo livre não era certamente formado pelas camadas mais altas da sociedade. Indicava, contudo, outros setores que acreditavam na possibilidade de uma igualdade civil e social, que, embora, não tenha se constituído em realidade, não deixou de se fazer presente nas expectativas de determinados segmentos sociais. Pasquins em São Luís conclamavam que o bispo, como presidente da junta da província, devia ler o papel que se encontrava à “entrada da porta da Catedral”, para que os fiéis à Constituição não permitissem que “homens mulatos e mulatas forras” apanhassem “castigos arbitrários”. Afinal, a Lei era igual para todos21.
Encontram-se ainda para esse tipo de abordagem os panfletos políticos impressos –uma das mais instigantes fontes para o estudo das Independências22. Sendo instrumentos de divulgação da nova cultura política do constitucionalismo e, posteriormente, do separatismo, apresentavam um caráter didático e polêmico. Mantinham-se, regra geral, anônimos por causa da censura. Escritos sob a forma de comentários aos fatos recentes ou de discussões sobre as grandes questões do momento, traduziam em linguagem acessível os temas fundamentais do constitucionalismo. Procuravam, assim, levar notícias e informações a uma plateia mais ampla, que deixava de vê-las como meras novidades do domínio privado para encará-las como parte de um espaço comum, esboçando-se a formação de espaços públicos. Naquelas ocasiões esses escritos surgiam como eficazes meios de mobilização por meio do debate que propiciavam, fazendo alcançar um público cada vez mais amplo, graças à leitura coletiva em voz alta, concorrendo para uma maior familiaridade com o escrito e assegurando uma roupagem nova – a interpretação política – a antigos hábitos. Afinal, vislumbrava-se a possibilidade de intervenção do indivíduo comum na condução dos destinos públicos.
Nestes escritos de circunstâncias faziam-se presentes personagens diversas, que envolviam em seus diálogos figuras das mais distintas categorias sociais. Se o médico formado em uma universidade tornava-se presença frequente, pois a metáfora bio-
21. Biblioteca Pública Benedito Leite, São Luís. Documentos Manuscritos. 27 A, G2, E11. Documentos enviados à junta da Província do Maranhão contendo pasquins alusivos à Independência, 1820-1823.
22. A edição mais accessível de alguns folhetos é a de Raimundo Faoro, “Introdução”, O Debate Político no Processo de Independência, Rio de Janeiro, Conselho Federal de Cultura, 1973. Para uma visão mais completa dos panfletos impressos, ver José Murilo de Carvalho, Lucia Bastos P. Neves e Marcello Basile, Guerra Panfletária... Essas publicações foram estudadas de maneira mais sistemática por: José Honório Rodrigues, A Independência: Revolução e Contrarrevolução (vol. 1: A Evolução Política), Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1975, pp. 156-168; Cecília Helena Salles de Oliveira, O Disfarce do Anonimato. O Debate Político Através dos Folhetos: 1820-1822, Dissertação de Mestrado apresentada à Universidade de São Paulo, 1979; Maria Beatriz Nizza da Silva. Movimento Constitucional e Separatismo no Brasil, 1821-1823, Lisboa, Livros Horizonte, 1988; Lucia Bastos P. Neves, Corcundas e Constitucionais
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lógica dominava esse tipo de discurso, uma vez que devia curar as deformidades dos “corcundas”23, outras figuras do povo também eram contempladas, como um alfaiate, adepto às ideias liberais, voltadas para “servir o povo”, enquanto muito de seus clientes – o negociante, o fidalgo, o mercador de lã, o comendador e outros – assumiam atitudes, no mais das vezes, anticonstitucionais24.
Um exemplo pode ser fornecido pelo panfleto intitulado Diálogo político e instrutivo entre dois homens da roça, André Raposo, e seu compadre Bolonio Simplício, acerca da Bernarda do Rio de Janeiro e Novidades da mesma25. O compadre André explicava a Simplício o que eram as Bernardas – “novidades e mudanças que se fazem no Rocio, juntando-se tropas e o povo”. Num tom crítico narrava o que havia acontecido no dia 5 de junho de 1821 – um motim liderado pelas tropas portuguesas, comandadas por Jorge Avilez, que impuseram a d. Pedro o juramento das bases da Constituição portuguesa, a demissão do ministério e a nomeação de uma Junta Consultiva de Governo. Mesmo sem ter um desfecho totalmente favorável, o diálogo mostrava a imagem de uma turba, composta por homens do povo – soldados – que fizeram grande barulho. Tudo se iniciara com um tiro dado inadvertidamente por “um soldado, que corria, caiu e disparou-se-lhe a espingarda”. Apesar da ironia, o diálogo não deixava de indicar uma participação de segmentos mais comuns das camadas sociais. Ainda fazia críticas aos “letrados da Corte”, que ao invés de cuidarem de suas obrigações, envolviam-se em discussões estéreis e tomavam medidas inúteis, deixando muita gente desaconselhada porque escreviam “na areia e [faziam] castelos no ar”26. Embora, muitas vezes, tais personagens fossem figuras de retórica, artifícios de construção do texto indicavam, sem dúvida, certa preocupação social, produzindo escritos que pudessem transmitir os princípios fundamentais do constitucionalismo a uma camada mais alargada da população.
23. Corcundas eram os seguidores do Antigo Regime, cf. Diálogo entre Hum Médico e Três Corcundas, Lisboa, Officina de J. F. M. de Campos, 1821.
24. Cf. O Alfaiate Constitucional. Diálogo Entre o Alfaiate e Seus Fregueses... por José Anastácio Falcão, Rio de Janeiro, Tipografia Nacional, 1821.
25. Rio de Janeiro, Tipografia Régia, 1821.
26. Diálogo Político e Instructivo Entre Dous Homens da Roça..., pp. 4-5 e 16. Esse panfleto trouxe inúmeras discussões que se fizeram presentes por meio de correspondências nos periódicos, como no Revérbero Constitucional Fluminense, nos números 12, 16 e 17 de janeiro, fevereiro e março de 1822. Para a análise dessa polêmica, ver Isabel Lustosa, Insultos Impressos: A Guerra dos Jornalistas na Independência, 1821-1823, São Paulo, Companhia das Letras, 2000, pp. 149-155.
Assim, pode-se afirmar que o povo, ou seja, aqueles que se situavam nas fímbrias da sociedade, mesmo sem estudos mais aprofundados, não desconheciam o que se passava na Corte e nas demais províncias naquele agitado momento. Mesmo sem saber ler, inteiravam-se das novidades políticas por meio do falar de boca do cotidiano, do imaginário que se fazia circular, traduzindo uma luta simbólica das representações e concepções de mundo que eram resultantes de um novo horizonte de expectativas por meio do ingresso na política moderna27. Comprovando tal argumento, pode-se verificar que Cailhé de Geine, considerado um espião da polícia, elaborara um relatório em 1820 ao Intendente geral da polícia alertando para a gravidade da situação em que se encontrava o Brasil, pois inúmeras obras eram lidas “diante de um auditório já predisposto” a “passagens mais infestadas do espírito revolucionário das obras francesas mais perniciosas”, traduzidas “para o português, para a edificação dos ignorantes”. Não se tratavam de reuniões secretas, mas se manifestavam no “salão dourado, na humilde loja e mesmo na praça pública”28. Logo, ainda que se tratasse de documento redigido por indivíduo que pretendia alarmar as autoridades, pode-se pressupor que o público real desses acontecimentos e manifestações era bem mais amplo do que a historiografia fez supor. E que a massa anônima, à sombra dos fatos, assistia ao desenrolar do processo, nem sempre de forma silenciosa, pois a política tornava-se pública, demonstrando a capacidade do indivíduo em interferir na vida e nos acontecimentos da sociedade.
Outro meio de manifestação dessas personagens, esquecidas pela história da Independência, foi o das petições. Conhecidas no Império português desde os tempos medievais, elaboradas de forma oral ou escrita, por súditos – em caráter privado – ou por corporações, representavam a opinião de um corpo coletivo do Antigo Regime, apresentando reclamações ou queixas ao monarca ou a qualquer instância jurisdicional. Foi no contexto da Revolução Liberal do Porto de 1820, possibilitando uma nova linguagem relacionada à cultura política do constitucionalismo, que as petições se ressignificaram e politizaram29, sob a forma de requerimentos e memórias ainda que escritas ao monarca, mas também a um novo poder que se estabelecia – o Soberano Congresso. Segundo Benjamin Constant, a petição institucionalizada em seu sentido moderno era
27. Reinhart Koselleck, Futuro Passado, Contribuição à Semântica dos Tempos Históricos, Rio de Janeiro, Contraponto/ puc-Rio, 2006, pp. 305-327.
28. “Rapport sur l’Opinion Publique”, em Angelo Pereira, d. João vi, Príncipe e Rei, Lisboa, Empresa Nacional de Publicidade, 1856, pp. 304-307, citação à p. 306.
29. Reinhart Koselleck, “Introducción al Diccionario Histórico de Conceptos Políticos-sociales Básicos em Lengua Alemana”, Revista Anthropos, trad. Luis Fernández Torres, 223, pp. 92-105, Barcelona, 2009.
Foram os Grandes Vultos que Fizeram a História das Independências do Brasil? o “exercício de um direito político” desejável em um país de governo representativo30. O periódico Correio do Rio de Janeiro informava que “nos governos constitucionais” as representações e petições são parte integrante da “Liberdade Pública”, pois podem conter “assinaturas de todas as classes”31. Assim, é possível exemplificar essa questão com a Petição do Senado da Câmara do Rio de Janeiro de 23 de maio de 1822, que encaminhou uma representação a d. Pedro pedindo a convocação de uma Assembleia Geral das províncias do Brasil, consolidando essa instituição como lugar essencial nos espaços públicos de poder político. Se o documento foi elaborado por alguns membros das elites mais radicais: Joaquim Gonçalves Ledo, José Clemente Pereira, os padres Januário da Cunha Barbosa e Antonio João Lessa, João Soares Lisboa e Bernardo José da Gama, buscava-se um cunho popular, convidando o público, por meio de um anúncio estampado no Correio do Rio de Janeiro. Exortava a todos a comparecerem à loja da Gazeta ou à Tipografia de Silva Porto nos dias 21 e 22 de maio, “desde às 8 horas da manhã até o meio-dia, e desde as duas até às seis da tarde”, trazendo memórias e planos a este respeito, ou para simplesmente “ver, ler e assinar a representação a ser enviada a Sua Alteza Real”. Segundo o mesmo jornal, 6 000 pessoas assinaram. Entretanto, o original do documento registra um total de 2 982 assinaturas32. De qualquer modo, legitimava-se a representação por meio de uma demonstração da vontade popular, caracterizando uma nova postura na prática política do Brasil constitucional, pois, doravante, o apoio da nação representava a decidida maioria da opinião pública”. Analisar tais assinaturas pode desvendar pistas interessantes, especialmente porque no documento, ao lado da assinatura, identifica-se a ocupação do subscritor. Assim encontram-se profissões das camadas mais baixas, como marceneiros, sapateiros, lavradores33, alfaiates, criados, empregados e, mesmo uma mulher que dizia ser viúva. Talvez, o mais instigante seja a indicação em 31 assinaturas da categoria “cidadãos”. Como afirmava Cipriano Barata, deputado baiano junto às Cortes de Lisboa – “todos diante da lei são iguais”, todos são
30. Para o papel das petições políticas no mundo ibérico cf. Diego Palacios Cerezales, “Ejercer Derechos: Reivindicación, Petición y Conflicto”, em M. Romeo, e M. Sierra, (eds.), La España Liberal, 1833-1874, vol. ii: Historia de las Culturas Políticas en España y América Latina, Madrid, Marcial Pons, pp. 253-285. A citação de Constant encontra-se nesse texto.
31. Correio do Rio de Janeiro, n. 40, 28 de maio de 1822.
32. Cf. Correio do Rio de Janeiro, n. 33, 18 de maio de 1822. A última citação encontra-se no Correio do Rio de Janeiro, n. 62, 27 jun. 1822. Para o número de assinaturas na Representação do Rio de Janeiro, cf. Arquivo Nacional do Rio de Janeiro. Cód. 2. Representação do Senado da Câmara do Rio de Janeiro, pedindo a convocação de uma Assembleia Legislativa, 20 de maio de 1822.
33. Essa categoria não inclui os proprietários, que vão também assinalados.
cidadãos34. Verifica-se, portanto, o interesse e a participação daqueles que se podem enquadrar como povo nestes novos meios de organização da política. Uma outra fonte que pode trazer à luz atores originais e pouco conhecidos nesse processo são as listas eleitorais. Para a época, uma “lei fundamental de eleições pode chamar-se o paládio das liberdades civis”35. O fim último desse processo era o voto, direito que cada cidadão exercia individualmente. O voto transformava-se em uma arma com que se podia defender os direitos e os foros pelos representantes de cada indivíduo. Daí, por não haver no primeiro processo eleitoral de 1821 para a deputação nas Cortes de Lisboa, o estabelecimento de censo, foi necessário a adoção de vários níveis de eleição. Em um primeiro nível, elegiam-se os compromissários, por meio dos paroquianos votantes, que se reuniam na Casa da Câmara ou na igreja, sob a presidência do Juiz de Fora, Juiz ordinário ou de quem fizessem suas vezes. Esse era o nível em que os eleitores se achavam mais próximos de seus escolhidos. Embora, o material seja muito escasso, é possível encontrar as listas dos compromissários eleitos em diversas freguesias do Rio de Janeiro. Por exemplo, na freguesia de Santa Rita os eleitos em 8 de abril de 1821 revelam as diversas personagens que se envolveram nesse processo: negociantes, totalizando um número de 15; dois bacharéis em Direito, sendo que um obteve o maior número de votos; quatro militares; um médico; um tabelião; um conselheiro; um lente de matemática; e um funcionário da administração real. Somam-se a essas personagens outras figuras comuns, que eram presenças marcantes na freguesia: o vigário e o coadjutor da freguesia e o mestre de primeiras letras. Também, na freguesia de Santana, encontra-se o pároco da mesma na lista dos compromissários36. Verifica-se, portanto, que em um primeiro nível das eleições, segundo as fontes de época, os compromissários deviam ter como qualidades, além de um juízo reto e um “decidido amor à causa da Constituição”, o conhecimento das pessoas da respectiva freguesia37, demonstrando uma maior proximidade entre eleitores e candidatos, e escolhendo-se, por conseguinte, figuras do cotidiano da vida desses votantes. Nesse sentido, a importância do papel do pároco em uma sociedade que ainda sentia o peso de ser regida por alguns valores do Antigo Regime.
34. Diário das Cortes de Lisboa, Sessão de 17 de junho de 1822, pp. 467-468.
35. Porto, Gênio Constitucional, n. 13, 16 out. 1820.
36. Para as listas de compromissários, cf. Gazeta do Rio de Janeiro, n. 30, 14 abr. 1821. Para a análise da lista de Compromissários da Freguesia de Santa Rita, ver Maria Beatriz Nizza da Silva, Movimento Constitucional..., pp. 58-63.
37. Semanário Cívico, n. 15, 7 jun. 1821, Bahia.
Sobre os Autores
Adriana Barreto de Souza é professora do Departamento de História da ufruralrj, pesquisadora do cnpq (pq/cnpq) e Cientista do Nosso Estado (cne/Faperj). Foi pesquisadora visitante na Universidade de Paris i – Panthéon Sorbonne e no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. É autora dos livros: O Exército na Consolidação do Império: um Estudo Sobre a Política Militar Conservadora, publicado pelo Arquivo Nacional, e Duque de Caxias: o Homem por Trás do Monumento, publicado pela editora Civilização Brasileira. Co-organizou ainda o livro: Pacificar o Brasil: das Guerras Justas às upps, pela editora Alameda.
André Roberto de A. Machado é professor do Departamento de História da Universidade Federal de São Paulo (unifesp). É doutor em História Social pela usp (2006) e realizou estágios de pesquisa (pós-doutorado) no cebrap, entre 2007 e 2009, na Brown University e na Harvard University, entre 2019 e 2020. É co-editor da Revista Almanack. Ao longo dos anos vem desenvolvendo pesquisas sobre a formação do Estado e da Nação no Brasil, estudando o processo de Independência, assim como o desenvolvimento do sistema representativo no Império. Atualmente, pesquisa as formas de trabalho compulsório dos indígenas empregados no Pará entre 1821 e 1840, bem como outras formas de trabalho forçado nas Américas.
Andréa Slemian é graduada em História pela Universidade de São Paulo, mestre e doutora na mesma instituição. Professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), onde leciona na graduação e na pós-graduação. Desenvolveu estágios de pesquisa na Universidade Nova de Lisboa (Portugal) e na Università di Roma “La
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Sapienza”. Foi professora visitante da Universitat Jaume i (Espanha), no Instituto Tecnológico Autónomo do México (itam), na Universidade Jean Jaurés (Toulouse), na University of Texas (Austin, eua), na Universidad del Pais Vasco (upv, Bilbao) e na Universidade do Espírito Santo (ufes). Atualmente é editora da Revista Brasileira de História (rbh).
Beatriz G. Mamigonian doutorou-se em História pela Universidade de Waterloo (Canadá). É professora titular do Departamento de História da ufsc e pesquisadora do cnpq. Publicou o livro Africanos Livres: a Abolição do Tráfico de Escravos no Brasil (Companhia das Letras, 2017) e co-organizou as coletâneas The Human Tradition in the Black Atlantic e The Human Tradition in the Atlantic World (Rowman and Littlefield, 2009 e 2010), História Diversa: Africanos e Afrodescendentes na Ilha de Santa Catarina (Editora da ufsc, 2013) e Revisitar Laguna: Histórias de Conexões Atlânticas (Editora da ufsc, 2021). Coordena o Programa Santa Afro Catarina de educação patrimonial.
Carlos Lima Junior, doutor em Estética e História da Arte pelo mac-usp, com estágio de pesquisa pela Université de Bourgogne (França), sob financiamento da fapesp. Pesquisador de Pós-doutorado pelo Departamento de História da Unicamp, bolsista fapesp. Docente do curso de Especialização em Museologia, Cultura e Educação da puc-sp. Foi curador-adjunto para a exposição Memórias da Independência no Museu Paulista da usp (2021).
Cláudia Maria das Graças Chaves é doutora em História pela Universidade Federal Fluminense (uff) e é professora e pesquisadora do Departamento de História e do Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal de Ouro Preto em Minas Gerais (ufop). Atua nas áreas de História do Brasil (Colônia e Império: século xviii e xix) e tem pesquisado e publicado sobre os seguintes temas: Economia colonial e elites mercantis; Instrução e formação de negociantes e mercadores; Administração e governo econômico; Instituições e contencioso administrativo. Atualmente é editora chefe da Revista Almanack
Fabrício Prado é doutor em História da América Latina pela Emory University e professor de História da América Latina Colonial e de História do Mundo Atlântico na Universidade William & Mary, nos Estados Unidos.
Fernando Nicolazzi, graduado em história pela ufpr, com mestrado e doutorado pela ufrgs, foi professor do Departamento de História da ufop (2008-2011) e atualmente é professor do Departamento de História e do Programa de Pós-Graduação em História da ufrgs. É coordenador do Laboratório de Estudos sobre os Usos Políticos do Passado/luppa e pesquisador do cnpq.
Heloisa Murgel Starling é professora titular-livre de História da Universidade Federal de Minas Gerais e coordenadora do Projeto República: núcleo de pesquisa, documentação e memória da ufmg. Historiadora e cientista política. Publicou, entre outros livros, Brasil, uma Biografia, em coautoria com Lília Schwartz (2015) e Ser Republicano no Brasil Colônia: A História de uma Tradição Esquecida (2018). Organizou Ação e Busca da Felicidade. Hannah Arendt (2018); Vozes do Brasil: A Linguagem Política da Independência, coorganizado com Marcela Telles Elian de Lima (2021). Entre seus trabalhos mais recentes estão os livros Linguagem da Destruição: A Democracia Brasileira em Crise, em coautoria com Miguel Lago e Newton Bignotto (2022) e Independência do Brasil: As Mulheres que Estavam Lá, coorganizado com Antonia Pellegrino (2022).
Ivana Stolze Lima é pesquisadora titular da Fundação Casa de Rui Barbosa e bolsista pq2/cnpq. Possui doutorado em História pela Universidade Federal Fluminense (2000). Em 2010, concluiu pós-doutorado no Program of African Studies, Northwestern University. Autora de Cores, Marcas e Falas: Sentidos de Mestiçagem no Império do Brasil (Arquivo Nacional, 2003). Suas publicações mais recentes incluem as coletâneas Marcadores da Diferença: Raça e Racismo na História do Brasil (Editora ufba, 2019) e Diáspora Mina: Africanos entre o Golfo do Benim e o Brasil (Nau, 2020).
João Paulo Pimenta é doutor em História e professor do Departamento de História da usp desde 2004. Foi professor visitante do Colegio de México, da Universidad Andina Simón Bolívar – Equador, da puc-Chile, da Universitat Jaume i – Espanha, e da Universidad de la República – Uruguai. Especialista nos processos de independência e construção dos Estados nacionais americanos. Autor de oito livros editados em seis países, incluindo Estado e Nação no Fim dos Impérios Ibéricos no Prata (2002), A Independência do Brasil e a Experiência Hispano-americana (2015),
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Tempos e Espaços das Independências (2017), O Livro do Tempo: uma História Social (2021) e Independência do Brasil (2022).
Jurandir Malerba é doutor em História (usp, 1997), Professor Titular Livre da ufrgs e pesquisador pq/cnpq. Atuou em várias instituições brasileiras e foi pesquisador visitante na Universidade de Oxford (Inglaterra) e professor convidado nas universidades Georgetown (EUA) e Livre de Berlim (Alemanha), onde inaugurou a Cátedra Sérgio Buarque de Holanda de Estudos Brasileiros. Publicou dezenas de livros e artigos acadêmicos no Brasil e no exterior, entre os quais A Corte no Exílio (Companhia das Letras, 2000), Brasil em Projetos (Editora fgv, 2020) e Almanaque do Brasil nos tempos da Independência (Ática, 2020).
Lucia Bastos P. Neves é doutora em História pela Universidade de São Paulo (1992). Professora Titular de História Moderna na uerj. Pesquisadora do Programa Prociência da uerj, bolsista 1a do cnpq. Bolsista “Cientista do Nosso Estado” da Faperj. Sócia Titular do ihgb. Coordenadora principal do Projeto Pronex faperj/cnpq Os Caminhos da Política (2017 aos dias atuais).
Paulo César Garcez Marins Bacharel e licenciado em História, doutor em História Social e livre-docente pela Universidade de São Paulo. Professor Associado ms5-1 do Museu Paulista da Universidade de São Paulo, docente do Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo da fau-usp e do Programa de Pós-graduação em Museologia da usp. Chefe do Departamento de Acervo e Curadoria do Museu Paulista da usp (2022-2024). Membro do corpo de curadores do Programa de Exposições do Museu do Ipiranga 2022. Pesquisador principal no Projeto Temático “Coletar, identificar, processar, difundir: o ciclo curatorial e a produção do conhecimento”, financiado pela Fapesp (2017-2023). Membro do International Council of Museums (icom-br) e do Internacional Council of Monuments and Sites (icomos-br).
Renato Venancio é doutor pela Universidade de Paris iv – Sorbonne e professor do curso de Arquivologia na Universidade Federal de Minas Gerais (ufmg). Entre 2006-2008 foi consultor Científico da unesco, no Comitê Nacional Memória do Mundo e membro da Seção Brasileira da Comissão Luso-Brasileira para Salvaguarda e Divulgação do Patrimônio Documental – coluso – Conarq/Arquivo Nacio-
nal. Entre 2005 e 2008 dirigiu o Arquivo Público Mineiro, também atuando como Editor da Revista do Arquivo Público Mineiro. Atualmente desenvolve pesquisa a respeito da história dos arquivos e da arquivologia.
Rodrigo Patto Sá Motta é professor Titular de História do Brasil da Universidade Federal de Minas Gerais e pesquisador 1d do cnpq. Atuou como Professor visitante na Universidad de Santiago de Chile, na Universidad Nacional de Colombia, no iheal da Universidade de Paris iii (Cátedra Simón Bolivar) e nas Universidades Nacionais Argentinas de Rosario, de General Sarmiento e de San Martín. As principais publicações são os livros: Em Guarda Contra o Perigo Vermelho: o Anticomunismo no Brasil (2ª ed. Edufff, 2020 – editado em inglês pela editora Sussex Academic Press, 2020, e em espanhol pela editora universitária argentina ungs, 2019); Jango e o Golpe de 1964 na Caricatura (Zahar, 2006); As Universidades e o Regime Militar (Zahar, 2014); e Passados Presentes: o Golpe de 1964 e a Ditadura Militar (Zahar, 2021). Foi presidente da Associação Nacional de História (anpuh) no período 2013-2015.
Roquinaldo Ferreira é Henry Charles Lea Professor de História da Universidade da Pensilvânia. Autor de Cross-Cultural Exchange in the Atlantic World: Angola and Brazil during the Era of the Slave Trade (New York: Cambridge University Press, 2012) e Escravatura, Abolicionismo e Colonialismo em Angola: Algumas Contribuições para a Compreensão do Passado Angolano (Luanda: Narrativa Editora, 2018).
Tâmis Parron é professor do Instituto de História da uff, membro do Centro uffsobre Desigualdades Globais e integrante da Cátedra Unesco sobre Desigualdades Sociais e Globais. Estuda as relações históricas entre liberalismo, escravidão e economia mundial capitalista pelas perspectivas da sociologia histórica, da teoria crítica e da história conceitual. É autor de A Política da Escravidão no Império do Brasil (Civilização Brasileira, Prêmio Jabuti em Ciências Humanas) e coordenador da coleção Narrativas da Escravidão (Hedra, eleita para o pnld 2021). Foi Volkswagen Fellow em Harvard (2016–2017).
Télio Cravo é pós-doutorando no Max Weber Programme da European University Institute e autor do livro Construindo Pontes e Estradas no Brasil Império (Alame-
Independência: Memória e Historiografia
da, 2016). É doutor em História pelo Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas e mestre em História Social pela Universidade de São Paulo.
Wilma Peres Costa é historiadora, professora titular aposentada da Unicamp (História Econômica). Atualmente, é professora do Departamento de História da Universidade Federal de São Paulo. Suas áreas de pesquisa gravitam em torno da relação entre o escravismo e a formação do estado nacional brasileiro, focalizando a fiscalidade, as guerras platinas, as narrativas de guerra e de viagem e a historiografia do século xix e início do século xx. É autora, entre outros trabalhos, de A Espada de Dâmocles: o Exército, a Guerra do Paraguai e a Crise do Império (Hucitec, 1996) e Cidadãos e Contribuintes: Estudos de História Fiscal (Alameda, 2021). Atualmente pesquisa a família Taunay e seu enraizamento no Brasil no “longo” século xix.
Este livro reúne trabalhos que refletem sobre as comemorações da Independência do Brasil ao longo do tempo e sobre o futuro dessa memória no plano da historiografia, da cultura visual e das disputas políticas inerentes a esses momentos em que as produções acadêmicas ganham expressão junto ao público mais amplo e dialogam com suas expectativas e demandas.
Enfatizando que as comemorações sempre foram também espaços de disputa, procuramos dar relevo a personagens silenciados e a temas pouco abordados no estudo da Independência. Essas pesquisas expressam, assim, nosso reconhecimento de que os indígenas, os escravizados, os forros, os pobres livres e pessoas de todos os gêneros precisam estar presentes na história escrita e ensinada nas escolas e nas suas representações nos espaços públicos.