LUTAR
NO MODO SOBREVIVÊNCIA Com o retorno do trabalho presencial um novo desafio se apresenta: como as empresas estão lidando com o luto de suas equipes? Mariana Clark, especializada em psicologia positiva, aposta em um ambiente mais acolhedor e afetuoso
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POR JOYCE PASCOWITCH
eguimos trilhando por tempos desafiadores. A pandemia da Covid-19 cedeu à vacinação em massa, mas ainda assombra o planeta com novas ondas e cepas. Também deixou sequelas – físicas em milhões de pessoas que tiveram a doença e emocionais em toda a humanidade. Após momentos impactantes como os que vivemos com a chegada do coronavírus, vem o luto. Luto pelos mortos, luto por tudo que perdemos, desde empregos até vida social. Para resgatar o que nos foi tirado é necessário ressignificar nossa vida, processos, crenças. E é aí que entram profissionais como Mariana Clark. Especializada em psicologia positiva, ela exerceu por muitos anos o cargo de executiva de RH de grandes organizações. “Em um determinado momento notei que os processos usados na relação com os funcionários estavam errados. Em 2016 conheci o capitalismo consciente, movimento cuja proposta é fazer com que as empresas sejam lugares de cura e não de adoecimento”, explica ela, que atuou junto à população de Brumadinho (MG) na época da tragédia com a barragem da Vale, e se dedica a conscientizar lideranças de grandes empresas de que é crucial lidar com o luto de cada um e cuidar da saúde emocional das pessoas que ali trabalham. PODER: O QUE É O LUTO, NO SENTIDO AMPLO DA PALAVRA? MARIANA CLARK: O luto é um processo de rompimento
de vínculo. À medida que rompemos um vínculo com alguém ou alguma coisa, entramos em processo de luto. Só que não passamos por isso só quando perdemos pessoas que amamos. Existe uma categoria chamada “lutos não reconhecidos”, que são essas experiências de rompimentos que vivemos ao longo da vida. Pesquisas apontam que passaremos por 20 dessas em média e, assim como com o luto de quando perdemos alguém, temos que reaprender a
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FOTO PAULO FREITAS
viver a partir dessas dores. O luto é uma dor se ajustando à vida e vida se ajustando a ela. Quais são esses “lutos reconhecidos”? Aborto, infertilidade, síndrome do ninho vazio, aposentadoria, perda de animal de estimação, divórcio... são experiências que desencadeiam sentimentos muito desagradáveis, como raiva, inveja, medo, desamparo, angústia, impotência. E o processo de luto exige enfrentamento. É preciso viver o luto completamente. PODER: É JUSTAMENTE COM ESSE LUTO QUE VOCÊ VEM TRABALHANDO JUNTO ÀS EMPRESAS? MC: Sempre tivemos que separar a vida profissional da
vida pessoal, mas isso está mudando em função de tudo o que temos vivido, das estatísticas de adoecimento estarem crescendo assustadoramente no nosso país. Mesmo antes da pandemia o Brasil já encabeçava pesquisas como o país mais ansioso, mais deprimido do mundo, por uma série de razões, desde o aumento da violência, do desemprego, da fome, até por causa da felicidade tóxica das redes sociais, que é incompatível com a condição humana. Passamos 1/3 de nossa vida conectados ao trabalho, então esse deve ser um lugar de maior bem-estar e não fonte de dores, de medos, de ameaças. O contexto corporativo sempre foi adverso e árido, e agora começamos a abrir espaço para o acolhimento. Costumo trabalhar capacitando líderes para que sejam mais tolerantes com seus funcionários e possam se tornar uma base segura para as equipes, afastando processos de adoecimento mental, como transtornos de ansiedade e burnout, muito comuns atualmente. À medida que conseguem encarar suas próprias dores e ressignificá-las, vão ter condições de passar isso para os outros.