Faria mais justiça poética ao crítico literário Harold Bloom se a morte o viesse buscar na sala de aula da universidade Yale, onde ele, aos 89 anos, seguia a fascinar seus alunos com a memória mais prodigiosa que eles um dia vieram a conhecer. Bloom era capaz de fazer citações e falar de improviso sem recorrer a livros, anotações ou – que Bloom não vire no túmulo – ao Google. Se essas citações fossem de Shakespeare, aí era covardia. O cânone ocidental que ele inventariou tinha no bardo inglês seu grande timoneiro, a despeito do que disso pudessem dizer os contemporâneos multiculturalistas. Esses eram os críticos da “escola do ressentimento”, como dizia, certamente para ecoar Nietzsche, um dos filósofos que admirava. O livro que expressa sua teoria mais famosa, A Angústia da Influência, mostra como a literatura, talvez toda ela, é fruto da luta travada entre o escritor que ora escreve e aquele que o precedeu. Não deixava de ser uma provocação, assim como propor anos mais tarde uma Bíblia narrada por uma única pessoa – uma mulher.
64 PODER JOYCE PASCOWITCH
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