Rodrigues & Branco
Métodos em
Farmacologia
Alice Cristina Rodrigues Paola Cristina Branco
Atualidades e Desafios A farmacologia é uma ciência que nasceu no século XIX e passa por grandes mudanças e atualizações constantemente. Por este motivo, faz-se necessário propagar as atualizações e novidades frequentemente. O livro Métodos em Farmacologia descreve, de maneira minuciosa, um grande número de técnicas de laboratório, absolutamente atuais, e que são fundamentais para uma abordagem contemporânea da Farmacologia. Métodos em Farmacologia é uma obra prático-teórica cuja finalidade é apresentar a experiência prática de um laboratório de pesquisa, com seus desafios, bem como sinalizar quais caminhos a farmacologia atual busca trilhar nos próximos anos de pesquisa. Escrita por profissionais brasileiros atuantes na área e destina-se aos alunos de graduação e pós-graduação das áreas de Ciências Biológicas e da Saúde e pesquisadores da área de Farmacologia.
Métodos em
Métodos em
Farmacologia
Atualidades e Desafios
ISBN: 978-85-5795-012-2
Farmacologia
Atualidades e Desafios
Sumário
Seção 1 – Bioética e Modelos Animais de Estudo em Farmacologia.............................................................. 1 Capítulo 1 – Bioética e Uso de Animais em Pesquisa....................................................... 3 Flavia Neto de Jesus
Capítulo 2 – Farmacologia da Inflamação..........................................................................11 Anderson Romério A. Cerqueira e Anaysa Paola Bolin
Capítulo 3 – Farmacologia Cardiovascular........................................................................23 Flavia Neto de Jesus, Paula Rodrigues de Barros, Tiago Januário Costa e Cinthya Echem
Capítulo 4 – Resistência à Insulina e Obesidade..............................................................33 Mariana de Mendonça, Renée de Nazaré Oliveira da Silva e Bruno Vinicius Duarte Marques
Capítulo 5 – Atividade Neuronal: Estudos Eletrofisiológicos da Plasticidade Sináptica em Fatias (Slices) da Região CA1 do Hipocampo......................................................................................................41 Caio Henrique Mazucanti
Capítulo 6 – Comportamento Animal na Neuropsicofarmacologia.........................47 Subcapítulo 6.1 – Comportamento Exploratório e Atividade Locomotora..................48 Amanda Midori Matumoto e Silvana Chiavegatto Subcapítulo 6.2 – Ansiedade e Depressão..........................................................................51 Bruna Genisa Costa Lima e Silvana Chiavegatto Subcapítulo 6.3 – Aprendizado e Memória.........................................................................55 Diana Zukas Andreotti, Jacqueline Alves Leite e Silvana Chiavegatto Subcapítulo 6.4 – Comportamentos Sociais.......................................................................59 Bruna Genisa Costa Lima e Silvana Chiavegatto Subcapítulo 6.5 – Drogas de Abuso.....................................................................................62 Lucas B. Hoffmann Subcapítulo 6.6 – Dor e Analgesia........................................................................................67 Louise Faggionato Kimura
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Métodos em Farmacologia: Atualidades e Desafios
Seção 2 – Modelos Alternativos ao Uso de Animais em Farmacologia.........................................................73 Capítulo 7 – Cultura Celular....................................................................................................75 Larissa Costa de Almeida e Luciana de Araújo Pimenta
Capítulo 8 – Biodisponibilidade Cutânea...........................................................................85 Sandra Costa-Fernandez, Vanessa Franco Marcelo Carvalho e Luciana B. Lopes
Capítulo 9 – Pele Artificial........................................................................................................93 Vanessa Franco Marcelo Carvalho
Seção 3 – Técnicas Aplicadas ao Estudo em Farmacologia......................................................... 101 Capítulo 10 – Ferramentas Multiômicas para Descoberta de Biomarcadores e Alvos Terapêuticos para Tratamento do Câncer.................... 103 Jennifer Eliana Montoya Neyra, Izabela Daniel Sardinha Caldeira e José Ernesto Belizário
Capítulo 11 – Silenciamento Gênico................................................................................. 111 Paula Rezende-Teixeira, Carolina Maria Berra e Karen Velasco-Alzate
Capítulo 12 – Determinação da Atividade de Fatores de Transcrição pelo Ensaio de Retardamento da Mobilidade Eletroforética (EMSA)....................................................................................... 123 Vinicius Watanabe Nakao, Paula Fernanda Kinoshita e Ana Maria M. Orellana
Capítulo 13 – Determinação da Expressão Proteica................................................... 131 Beatriz Maria Veloso Pereira, Bruno Vinicius Duarte Marques, Marcos Brandão Contó e Erica de Sousa
Capítulo 14 – Cinética Enzimática..................................................................................... 141 Marcos Brandão Contó
Capítulo 15 – Interação Droga-Receptor: Ensaios de Ligação com Radioligante...................................................................................................... 151 Marcos Brandão Contó
Capítulo 16 – Estudo das Vias de Sinalização................................................................ 161 João Agostinho Machado-Neto e Antonio Garcia Soares Júnior
Capítulo 17 – Métodos de Prospecção de Novos Fármacos.................................... 167 Bianca Del B. Sahm, Catarina Sofia Mateus Reis e Silva, Luciana Costa Furtado e Paola Cristina Branco
Sumário
Seção 4 – Novas Tendências em Farmacologia............................ 177 Capítulo 18 – Novos Alvos para o Câncer....................................................................... 179 Paola Cristina Branco e João Agostinho Machado-Neto
Capítulo 19 – Terapia à Base de microRNAs................................................................... 189 Lucas Ariel F. da Rocha, Karina Cunha e Rocha e Alice Cristina Rodrigues
Capítulo 20 – Nanofarmacologia e Teragnóstico ........................................................ 199 Giovanna Cassone Salata e Vanessa Franco Marcelo Carvalho
Capítulo 21 – Produtos Naturais como Fonte de Fármacos..................................... 209 Larissa Costa de Almeida, Louise Faggionato Kimura, Luciana de Araújo Pimenta, Bianca Del B. Sahm e Luciana Costa Furtado
Capítulo 22 – Peptídeos Intracelulares como Fonte de Fármacos......................... 223 Roseane Durante Franco e Mayara Calegaro Ferrari Gewehr
Capítulo 23 – Hormese.......................................................................................................... 231 Amanda Galvão da Paixão e Natália Prudente de Mello
Capítulo 24 – Farmacogenética.......................................................................................... 239 Karina Cunha e Rocha e Alice Cristina Rodrigues
Capítulo 25 – Cronofarmacologia...................................................................................... 247 Sanseray da Silveira Cruz Machado
Índice Remissivo...................................................................................................................... 255
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13 Determinação da Expressão Proteica Beatriz Maria Veloso Pereira* Marcos Brandão Contó* Erica de Sousa Bruno Vinicius Duarte Marques
A determinação da expressão proteica por métodos quantitativos ou semiquantitativos é de suma importância para diversas áreas da ciência, e pode ser aplicada nos mais diferentes contextos: medicina diagnóstica, toxicologia forense, industrial alimentícia, farmacêutica, ambiental, veterinária, e na área de investigações científicas. Particularmente, em pesquisa industrial e acadêmica, a detecção e quantificação da expressão de proteínas solúveis, incluindo hormônios, fatores de crescimento, fatores de transcrição, enzimas, citocinas, receptores de hormônios e de neurotransmissores, efetores de apoptose, entre outras proteínas, podem fornecer informações essenciais para a compreensão de mecanismos celulares envolvidos em diferentes condições fisiológicas e patológicas e assim ajudar na busca por novos alvos farmacológicos. Dentre as técnicas comumente utilizadas nos laboratórios, podemos destacar os métodos de ELISA (enzyme-linked immunosorbent assay) e de Western Blot (também chamada immunoblotting). Como descrito a seguir, ambas as técnicas são baseadas na reação antígeno-anticorpo e na alta especificidade dessa ligação. Porém, elas são distintas entre si
* Autores contribuíram igualmente para o capítulo
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Métodos em Farmacologia: Atualidades e Desafios
no que concerne aos materiais e equipamentos necessários à execução, bem como aos procedimentos e à expressão final dos resultados obtidos.
Fundamento: Interação Antígeno-Anticorpo Assim como na interação enzima-substrato e droga-receptor, a força de interação entre antígeno-anticorpo é determinada por uma variedade de ligações fracas não covalentes, incluindo atração eletrostática coulombiana, pontes de hidrogênio, forças de Van der Waals e interações hidrofóbicas. A reação antígeno-anticorpo obedece a Lei de Ação das Massas, e pode ser descrita segundo o esquema a seguir:
Ag + Ac
Ka Kd
Ag:Ac
Ag: antígeno livre Ac: anticorpo livre Ag:Ac: complexo antígeno-anticorpo Ka: constante da taxa de associação Kd: constante da taxa de dissociação
Rearranjando, KA = Ka/Kd = [Ag:Ac]/[Ag].[Ac]
KA constante de equilíbrio de associação
Assim, quanto maior o valor de KA, maior a afinidade de ligação entre antígeno e anticorpo ou, colocando de outra forma, mais deslocada a reação no sentido direto em relação ao sentido inverso, quando a reação reversível atinge o equilíbrio dinâmico. Portanto, maior a quantidade de complexo Ag:Ac em relação às espécies reativas não complexadas. Via de regra, o anticorpo ideal para ensaios de ELISA e de WB é aquele que apresenta as seguintes características: (1) alta afinidade pelo antígeno (KA na ordem de 109 a 1012L/mol), exigindo pequena quantidade de anticorpo e impedindo sua dissociação durante as lavagens (separação entre anticorpo ligado e anticorpo livre); e (2) alta especificidade (baixa reatividade cruzada), isto é, capacidade de se ligar especificamente ao antígeno-alvo, ou, dito de outra forma, que não tenha afinidade de ligação por outras moléculas. Além do anticorpo que se liga ao antígeno – denominado anticorpo primário –, existe também o anticorpo secundário, o qual se liga a um anticorpo primário. Desta forma, o anticorpo primário reconhece a proteína-alvo de maneira específica, enquanto o secundário é marcado (por exemplo, com fluoróforos ou enzima geradora de quimioluminescência), permitindo a detecção do sinal.
ELISA A técnica de ELISA surgiu no início da década de 1970, como uma alternativa mais segura ao radioimunoensaio, a qual se utiliza de antígenos ou anticorpos marcados com isótopos radioativos. Assim, ao invés da emissão do sinal ser proveniente de decaimento radioativo, o sinal passa a ser decorrente da transformação enzimática de substratos cromogênicos em produtos passíveis de quantificação mediante um espectrofotômetro. Embora exista uma ampla variedade de imunoensaios enzimáticos, todos eles são
Determinação da Expressão Proteica
baseados na reação antígeno-anticorpo, envolvendo uma enzima acoplada ao anticorpo (ou antígeno) que catalisa a transformação de um substrato em produto. Atualmente, os ensaios de ELISA são realizados seguindo as instruções detalhadas que acompanham os kits comerciais para os mais variados antígenos. Tais kits contêm os reagentes necessários para a realização do ensaio, e seus protocolos são pré-estabelecidos no sentido de otimizar a eficácia e sensibilidade do método (temperatura das reações, pH e força iônica das soluções-tampão, tempo de incubação e concentração dos reagentes). Um método de ELISA muito utilizado nos laboratórios de pesquisa é o ELISA “sanduíche”, o qual é dotado de alta precisão e sensibilidade e recebe tal denominação pelo fato do antígeno ficar preso entre dois anticorpos, como ilustrado na Figura 13.1. Ele pode ser dividido em 8 etapas básicas: 1. Imobilização na fase sólida do anticorpo primário específico para o antígeno a ser estudado. A fase sólida consiste, geralmente, em microplacas de poliestireno, no qual o anticorpo é adsorvido pela superfície de plástico. O anticorpo liga-se ao poliestireno dos poços com alta tenacidade. 2. Bloqueio dos sítios não ocupados pelo anticorpo na fase sólida tem como objetivo impedir a ligação não específica de anticorpos ou outras proteínas nas etapas subsequentes. Após a lavagem dos anticorpos livres não adsorvidos, adiciona-se solução contendo substância quimicamente inerte (geralmente albumina), que possui afinidade pelos sítios da fase sólida (p. ex., poliestireno), porém menor afinidade que o anticorpo, para não o deslocar de seu sítio. 3. Incubação da amostra líquida (p. ex., fluidos biológicos, lisados celulares, cultura de células), contendo antígeno a ser quantificado e incubação de antígenos em quantidades específicas para a curva padrão. O antígeno é “capturado” pelo anticorpo – com o qual tem alta afinidade –, formando-se então o complexo Ag:Ac. As demais proteínas presentes na amostra são lavadas. 4. Incubação com anticorpo primário, específico para o antígeno, porém se ligando a um epítopo distinto do anticorpo primário adsorvido no poliestireno, formando o “sanduíche”; 5. Incubação com anticorpo secundário (que possui especificidade pelo anticorpo primário) acoplado covalentemente a uma enzima. Uma das enzimas mais utilizadas no conjugado é a peroxidase HRP (horsadish peroxidase), devido a vantagens como alto número de renovação (turnover) e capacidade de gerar produto que possui alta intensidade de sinal, conferindo elevada sensibilidade de análise. 6. Incubação com substrato cromogênico por tempo determinado, para sua conversão enzimática em produto colorido. Esta etapa produz grande amplificação de sinal, permitindo detecção do antígeno em quantidades extremamente diminutas (10-14 a 10-17 moles). O substrato cromogênico mais comumente utilizado é o 3,3’,5,5’-tetrametilbenzidina, ou TMB, cujo produto gerado pela enzima peroxidase HRP fornece uma cor azul, com um pico de absorção em comprimento de onda de 650nm e alto coeficiente de extinção molar (ε650 nm = 3,9 x 104 M-1 cm-1).
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Métodos em Farmacologia: Atualidades e Desafios
7. Interrupção da reação enzimática por desnaturação proteica através da adição de um ácido ou base forte – dentro de um intervalo em que a formação do produto é linear em função do tempo. Em seguida, é feita a leitura espectrofotométrica da densidade óptica das amostras, em comprimento de onda correspondente ao pico de absorbância do produto enzimático após adição do reagente interruptor da reação (uma vez que a adição de ácido ou base forte altera o espectro de absorção do produto). No caso do TMB, após reação com ácido forte, a cor azul muda para amarelo, com pico de absorção de 450nm, possuindo alto coeficiente de extinção molar (ε450nm = 5,9 x 104 M-1cm-1), e, portanto, elevada sensibilidade. 8. Conversão da absorbância em concentração de antígeno (p. ex., pg/mL), a partir da equação fornecida pela curva de calibração ou curva-padrão. Os valores da amostra devem estar dentro da faixa de concentrações utilizadas para a construção da curva-padrão. Após cada incubação – seja com anticorpos primários, substância de bloqueio, secundários, antígenos da amostra e da curva-padrão –, realiza-se o processo de lavagem com solução-tampão, o qual permite a separação entre substância ligada (seja ela antígeno, anticorpo primário e secundário conjugado à enzima) e a substância livre (não ligada). O ensaio de ELISA “sanduíche” descrito anteriormente é o “sanduíche” indireto. No ELISA “sanduíche” direto, segue-se o mesmo princípio, porém o antígeno fica preso entre o anticorpo primário e outro anticorpo primário acoplado à enzima. Também é possível dosar um anticorpo presente em soro, através da imobilização de seu antígeno na fase sólida, e após o anticorpo sérico ser capturado pelo antígeno, adiciona-se um novo anticorpo conjugado com uma enzima.
Substrato Produto Enzima Enzima Anticorpo Anticorpo Anticorpo secundário Anticorpo secundário primário primário Ag Ag Anticorpo Anticorpo Anticorpo primário primário primário 3 4 5 Lavagem Lavagem
Anticorpo primário Ag
Ag Anticorpo Anticorpo primário primário 1 2 Lavagem Lavagem
Figura 13.1 Resumo do procedimento do ensaio de ELISA “sanduíche” para quantificação de um antígeno. (1) Adsorção do anticorpo primário na superfície de poliestireno; (2) Captura do antígeno (contido na amostra ou da curva-padrão) pelo anticorpo primário; (3) Ligação de outro anticorpo primário ao antígeno, formando o “sanduíche”; (4) Ligação de anticorpo secundário (conjugado a uma enzima) ao anticorpo primário; (5) Conversão enzimática do substrato em produto colorido, o qual pode ser quantificado por espectrofotometria. Assim, a quantidade de produto mensurada é diretamente proporcional ao antígeno que se intenciona quantificar.
Determinação da Expressão Proteica
Western Blot Esta técnica também permite a identificação de proteínas específicas em amostras de lisados celulares ou teciduais, fluídos corporais e outras amostras biológicas, mas produz dados qualitativos e semiquantitativos sobre a proteína de interesse. De maneira geral, a(s) proteína(s) de interesse será(ão) separada(s) por eletroforese em gel de poliacrilamida e imunodetectada(s) em uma membrana sólida em meio a uma complexa mistura de proteínas, como ilustrado na Figura 13.2 e descritas a seguir:
Proteína de interesse
Extração das proteínas
Separação por SDS-PAGE Mistura de proteínas
Proteína alvo
Transferência para membrana
Detecção Parte 1 Anticorpo primário
Detecção Parte 2 Substrato
Enzima +
Célula eucariótica íntegra
Célula lisada
Luz Anticorpo secundário
–
Figura 13.2 Etapas do WB. Após extração, as proteínas são separadas de acordo com seu peso molecular e transferidas para a membrana, onde ocorre reconhecimento por anticorpo e detecção do sinal. 1. Homogeneização e extração de proteínas de células e tecidos. Para estudar a expressão de proteínas contidas em células ou tecidos, é necessário primeiramente que estas sejam extraídas dos compartimentos em que se encontram: membrana, citoplasma ou núcleo e, para isso, as células ou os tecidos precisam ser homogeneizados em condições que permitam ao mesmo tempo liberação e estabilidade dessas proteínas. A homogeneização geralmente se dá por ruptura mecânica (tensão de cisalhamento para romper a célula), ultrassônica (quebra das células por ondas sonoras de alta frequência), por pressão, por descongelamento e osmótica ou lise por surfactantes. Adicionalmente, sais que regulam pH, osmolaridade e força iônica são usados no tampão de homogeneização. Ainda, considerando que as enzimas e seus substratos, que antes estavam compartimentalizados em organelas onde reações específicas ocorriam num espaço delimitado por membranas, estão agora no mesmo ambiente, a extração deve ocorrer em baixas temperaturas e na presença de inibidores de protease e fosfatases, para evitar a proteólise e desfosforilação de sua proteína de interesse. 2. Quantificação da concentração de proteínas totais presentes no homogenato. Uma vez que, em geral, busca-se avaliar a expressão da proteína entre diferentes contextos experimentais, é imprescindível que a determinação da concentração total de proteínas extraídas seja feita para que a mesma quantidade inicial de proteínas seja colocada no gel de eletroforese e as densidades ópticas das bandas resultante na membrana reflitam as diferentes abundâncias sob uma base equivalente. Em geral, 20 a 50µg de proteína são
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Métodos em Farmacologia: Atualidades e Desafios
carregadas por poço no gel de eletroforese. A concentração de proteínas é frequentemente mensurada usando um espectrofotômetro. Entre os ensaios mais conhecidos para a quantificação de proteínas, estão: Bradford, Lowry e BCA (bicinchoninic acid assay). Os dois últimos se baseiam na redução de íons metálicos por ligações peptídicas. Já o ensaio de Bradford se baseia na mudança de cor do corante Coomassie Blue G-250 na presença de proteínas. Para quantificação, uma curva-padrão com concentrações conhecidas de uma proteína (em geral, usa-se a albumina sérica bovina, BSA) é feita, e a partir dela é obtida uma equação linear com a qual é possível substituir os valores médios de absorbâncias das amostras, obtendo-se assim os valores da concentração de proteínas. 3. Preparação das amostras para eletroforese em gel de poliacrilamida. Após a determinação do volume apropriado de amostra a ser usado, deve-se diluir esse volume em um tampão de carregamento. Esse tampão possui componentes como o glicerol (que aumenta a densidade das amostras, fazendo com que elas se depositem no fundo do poço), um corante de rastreamento, como o azul de bromofenol (permite a visualização da progressão da corrida) e um agente redutor, como o b-mercaptoetanol ou Ditiotreitol. Geralmente, as amostras também são aquecidas. O uso de agente redutor e aquecimento são necessários para desnaturação das proteínas (perda da forma tridimensional por quebras das pontes de dissulfeto, forças eletrostáticas e pontes de hidrogênio), permitindo assim que possam ser separadas na eletroforese de maneira proporcional ao seu tamanho, independentemente de sua estrutura terciária. 4. Separação das proteínas por eletroforese em gel de poliacrilamida A eletroforese consiste na migração de partículas carregadas numa matriz inerte (formada por polimerização de monômeros de acrilamida) quando essas estão sob influência de um campo elétrico. Como as proteínas podem possuir cargas positivas ou negativas, dependendo da somatória de cargas dos aminoácidos que as compõem, pode-se utilizar o SDS (sodium dodecyl sulfate), um poderoso detergente aniônico que se liga nas regiões hidrofóbicas das moléculas de proteínas para neutralizar a carga intrínseca da proteína e lhe conferir uma carga negativa. Uma vez que todas as proteínas estão com a mesma forma (estruturas nativas foram desnaturadas) e com a mesma carga (negativa), elas podem ser separadas de acordo com seu peso molecular na migração em direção ao pólo positivo quando uma voltagem é aplicada. Proteínas de mesmo peso molecular tendem a correr na mesma velocidade em um gel de poliacrilamida na presença de uma corrente elétrica. Esse tipo de eletroforese se chama SDS-PAGE (sodium dodecyl sulfate-polyacrylamide gel electrophoresis). Para preparar o gel, é necessário primeiramente conhecer o peso molecular da proteína de interesse, uma vez que o tamanho dos poros do gel varia conforme a concentração de acrilamida. O tamanho do poro, por sua vez, influencia a velocidade de migração das proteínas, de modo que as proteínas de baixo peso molecular passam com facilidade por grandes poros, enquanto proteínas mais pesadas tendem a ficar retidas se os poros forem pequenos. Na Tabela 13.1 está descrita a relação entre tamanho da proteína e porcentagem de acrilamida para separação otimizada. No gel utilizado para a eletroforese, há poços para a aplicação das amostras experimentais, as quais ficam concentradas na mesma região como bandas finas e bem definidas. Este passo é importante, pois garante que todas as proteínas serão separadas de
Determinação da Expressão Proteica
Tabela 13.1 Porcentagens de géis de poliacrilamida referentes ao tamanho da proteína. Tamanho da proteína (kDa)
Porcentagem gel resolving (%)
4 a 40
20
12 a 45
15
10 a 70
12,5
15 a 100
10
25 a 200
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acordo com o peso molecular a partir de um mesmo ponto. Posteriormente, as proteínas são de fato separadas, dependendo da concentração de acrilamida do gel. Quanto mais concentrado, menor é o poro do gel, permitindo maior resolução para proteínas de baixo peso molecular e vice-versa. É possível também que o gel apresente um gradiente de concentração de acrilamida, com a parte superior menos concentrada e a parte inferior mais concentrada. Assim, é possível dar resolução a uma ampla faixa de peso molecular. Em geral, além das amostras que se deseja estudar, os géis são carregados com um marcador de peso molecular, e é recomendada a adição de um controle positivo (tecido que já se sabe o padrão de expressão da proteína) quando se utiliza um novo anticorpo ou se quer saber a expressão de uma proteína que ainda não foi descrita em determinado tecido. Assim que todas as amostras forem colocadas no gel, ele pode ser conectado a uma fonte de energia e é permitida a corrida das proteínas. A voltagem é muito importante, uma vez que uma alta tensão pode sobreaquecer e distorcer as faixas. Dependendo do tampão utilizado na corrida, a voltagem varia de 70V a 200V. 5. Transferência das proteínas do gel para um suporte sólido (membrana de nitrocelulose ou PVDF). Quando as proteínas já estão separadas de acordo com seu peso molecular, há a necessidade de transferir essas proteínas para uma matriz sólida que permitirá a interação do anticorpo com a proteína adsorvida nela. Para que as proteínas sejam transferidas do gel para a membrana, utiliza-se um campo elétrico orientado perpendicularmente à superfície do gel. A membrana é colocada entre a superfície do gel e o eletrodo positivo em um “sanduíche”. Assim, as proteínas carregadas negativamente no gel migram para a membrana em direção ao polo positivo. Esse sanduíche é formado por papéis filtro nas extremidades, o gel e a membrana de transferência. A transferência pode ser dar em meio úmido ou semi-seco. Cada uma dessas condições possui vantagens e desvantagens que devem ser consideradas de acordo com sua proteína de interesse. Por ambos os métodos, o resultado é uma membrana cópia do padrão de proteínas do gel. O tipo de membrana escolhido, seja nitrocelulose ou PVDF (polyvinylidene fluoride), também depende da preferência do pesquisador e do experimento, uma vez que diferentes proteínas podem se ligar com eficiências diferentes nessas membranas, e particulares epítopos antigênicos podem ser melhor preservados em um tipo em relação a outro. Entre as vantagens da nitrocelulose está sua alta afinidade por proteínas e suas habilidades de retenção. Por outro lado, é frágil e é menos efetiva quando a membrana precisa ser reutilizada. Já as membranas PVDF proporcionam melhor suporte mecânico e permitem que o blotting seja reutilizado e armazenado. No entanto, às vezes pode
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Métodos em Farmacologia: Atualidades e Desafios
apresentar um background maior que as membranas de nitrocelulose. Para confirmação da transferência das proteínas para membrana, geralmente usa-se um corante chamado Ponceau S. Esse corante é facilmente retirado com água e pode ser dada continuidade ao experimento de Western blot. 6. Bloqueio da membrana. Na membrana, os locais não ocupados pelas proteínas da sua amostra devem ser preenchidos para prevenir a ligação inespecífica de anticorpos. Para esse fim, trata-se, em geral, a membrana com tampões que possuem proteínas (BSA ou leite desnatado). Usualmente, a membrana fica nesta solução por 1 a 2 horas em temperatura ambiente. 7. Marcação da proteína alvo com anticorpo primário. A proteína de interesse é finalmente reconhecida pelo anticorpo, que pode ser policlonal ou monoclonal (ou seja, que reconhece mais de um ou apenas um epítopo da proteína de interesse, respectivamente). Esses anticorpos são geralmente produzidos por camundongo, coelho ou cabra. O anticorpo primário pode ser diluído junto com o bloqueio no tampão de lavagem, e essa solução é incubada com a membrana em temperatura ambiente por algumas horas ou overnight a 4°C (padronização necessária), para que ocorra a interação antígeno-anticorpo. Depois disso, é importante a lavagem da membrana para retirada do excesso de anticorpos não ligados. 8. Detecção e análise semiquantitativa. De maneira geral, o anticorpo primário usado não é detectável. Assim, faz-se necessária a adição de um segundo anticorpo específico para a espécie hospedeira do anticorpo primário apropriado para visualização. A modificação mais comum é a conjugação desse anticorpo secundário com enzimas ou fluoróforos. Se um fluoróforo é conjugado ao anticorpo secundário, não há necessidade de adição de nenhum reagente e a membrana apenas será excitada com um laser de comprimento de onda específico para esse fluoróforo, e então as regiões onde o anticorpo se ligou serão evidenciadas. Nesse caso, é possível a detecção de múltiplas proteínas ao mesmo tempo. Por outro lado, se o anticorpo secundário está conjugado a uma enzima, é necessária a adição do substrato à membrana. Nos locais em que a enzima está presente, ocorrerá a reação enzima-substrato, resultando num produto que pode emitir luz ou fluorescência que é detectada por câmera ou scanner apropriados para esta função. Uma vez que a proteína de interesse foi evidenciada, é possível obter um valor numérico da intensidade de sinal emitida por ela. É importante notar que o WB permite uma análise semiquantitativa da proteína, sendo a abundância da proteína medida por comparação relativa entre as amostras estudadas. Dentre os motivos pelos quais não é possível fazer uma quantificação absoluta, está o fato de que o sinal gerado pela detecção não é linear para as diferentes concentrações de proteína, além das variações no carregamento da amostra e nas taxas de transferência entre amostras em poços diferentes. A fim de corrigir essas variações, usa-se uma proteína constitutiva, já conhecida no tecido estudado, cuja expressão não se altera significativamente entre os grupos em análise.
Determinação da Expressão Proteica
ELISA versus WB Embora as duas técnicas sejam usadas para determinação da expressão proteica e ambas tenham como fundamento a interação antígeno anticorpo, é possível destacar algumas diferenças básicas entre as técnicas: ELISA produz resultados rápidos e quantitativos, pode ser usado como triagem primária e identifica proteínas apenas por especificidade de anticorpos, além de geralmente detectar a proteína na sua forma nativa. O WB pode confirmar resultados do ELISA e é mais específico já que identifica proteínas tanto por especificidade de anticorpo quanto por peso molecular. Pelo tratamento que as amostras recebem, os anticorpos podem não apresentar o mesmo desempenho entre as técnicas. No ELISA, as proteínas geralmente são apresentadas em sua forma nativa, e anticorpos que reconhecem epítopos estruturais funcionam melhor neste contexto. No WB, em que geralmente as proteínas são desnaturadas, epítopos estruturais geralmente não são bem reconhecidos. Assim, a escolha da melhor técnica depende do contexto e da pergunta do investigador e das ferramentas de que ele dispõe.
Bibliografia Sugerida Crowther JR. ELISA: Theory and Practice. Totowa: Human Press Inc, 1995. Deshpande SS. Enzyme immunoassays: from concept to product development. New York: Chapman & Hall, 1996. Mahmood T, Yang P. Western blot: Technique, theory, and trouble shooting. North Am J Med Sci. 2012;4:4
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SEÇÃO 4 Novas Tendências em Farmacologia
18 Novos Alvos para o Câncer Paola Cristina Branco João Agostinho Machado-Neto
O câncer pode ser caracterizado como um conjunto de mais de 100 doenças de origens histológicas bastante variáveis. É reconhecido como uma doença genética, na qual o processo de carcinogênese reflete alterações genéticas que guiam a transformação de células normais em células malignas ou tumorais. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), o câncer é a principal causa de mortes por doenças no mundo. No Brasil, apesar de o câncer permanecer como a segunda causa de mortes por doenças no país, superado pelas doenças do aparelho circulatório, a mortalidade correspondeu em 2012 a 13,3% do total, ou 157.490 óbitos. Diversos são os tipos tumorais que apresentam casos recidivantes e quimiorresistência adquirida. Essas são apenas algumas razões que justificam a busca de novas drogas e novas estratégias terapêuticas.
Heterogeneidade do Câncer e Dificuldades no Tratamento O câncer apresenta algumas características básicas, como proliferação exacerbada devido à ativação constitutiva de vias de sinalização e evasão dos supressores de crescimento, resistência à morte celular, capacidade replicativa imortal, indução da angiogênese, ativação da capacidade de invasão e metástase. Há ainda que ressaltar que recentemente dois fatores emergentes e dois fatores permissivos
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Métodos em Farmacologia: Atualidades e Desafios
foram adicionados a essa lista: capacidade das células tumorais de evadir o sistema imune e alteração no metabolismo energético da célula tumoral, além da capacidade do tumor induzir inflamação e instabilidade genômica. Dada à complexidade do câncer, há de se entender por que é tão difícil encontrar um tratamento efetivo. Soma-se a isso o fato de que diversos tipos tumorais apresentam resistência aos fármacos disponíveis. Há, primeiramente, que se esclarecer que os mecanismos pelos quais as células tumorais se tornam quimiorresistentes à terapia convencional não estão totalmente elucidados. De acordo com o que se sabe atualmente, diversos fatores contribuem para que o tratamento não seja satisfatoriamente atingido. Neste capítulo abordaremos somente alguns aspectos. Uma razão que prejudica o tratamento quimioterápico diz respeito à própria dinâmica das células neoplásicas. Estudos mostram que o tumor, independente de sua origem histológica, apresenta uma heterogeneidade bem acentuada. Essa heterogeneidade observada pode ser de dois tipos (1) intratumoral, ou seja, células de um mesmo tumor apresentam variabilidade genética importante, e isso explica por que algumas células dentre essa população não respondem ao tratamento; e (2) intertumoral, em que o mesmo tipo tumoral pode apresentar características distintas entre diferentes pacientes, e isso explica por que apenas uma porcentagem dos pacientes responde bem à quimioterapia para um mesmo tipo tumoral. Associado a isto, soma-se o fato de que as células tumorais são controladas tanto por fatores intrínsecos, produzidos por elas próprias, mas também por fatores do ambiente em que vivem, o chamado microambiente tumoral.
Microambiente Tumoral As células tumorais contam com um microambiente em que podem tanto regulá-lo quanto sofrer uma regulação por este. Esse microambiente tumoral é composto por vasos sanguíneos, vasos linfáticos, fibroblastos associados ao tumor, células imunes associadas ao tumor e elementos da matriz extracelular. A interação entre os componentes do microambiente e as próprias células tumorais pode determinar a evolução e progressão do tumor, contribuindo inclusive para sua maior agressividade e capacidade metastática. Uma questão central do microambiente tumoral em tumores sólidos é a hipóxia, que está associada a ele em decorrência do acesso limitado a nutrientes e oxigênio. Esse contexto leva à produção de fatores induzidos por hipóxia (HIFs, do inglês hypoxia-inducible factors), que por sua vez faz com o que o metabolismo celular seja desviado para a forma glicolítica, levando ao aumento de consumo de glicose, lactato e piruvato, culminando em maior produção de íons H+. Esse tipo de metabolismo favorece o crescimento e a progressão tumoral. Ao contrário do que se imagina, a população do tumor não é constituída majoritariamente por células tumorais, mas sim por fibroblastos associados ao tumor (CAF, do inglês Cancer Associated Fibroblasts) que representam cerca de 80% da população de células presente no tumor. Esses fibroblastos produzem uma grande quantidade de glicosaminoglicanas e MMP-2, favorecendo a migração e invasão tumoral. Soma-se a isso
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o fato que a matriz extracelular produzida por estes fibroblastos difere da matriz produzida por fibroblastos normais, contribuindo para o aumento do potencial metastático do tumor. Outro componente do microambiente tumoral que pode modular a progressão tumoral são os macrófagos associados ao tumor. Estudos mostram que fatores produzidos por macrófagos podem estimular a angiogênese e favorecer a migração e invasão tumoral. Vale ressaltar a importância das células-tronco mesenquimais para a formação do microambiente tumoral, onde estas assumem um papel de células-tronco associadas ao tumor (TA-MSC, do inglês tumour-associated MSCs). Essas células podem modular tanto o crescimento tumoral e a capacidade metastática, mas também podem produzir citocinas e quimiocinas que, por sua vez, podem predizer a resposta (ou a falta de) em decorrência da quimioterapia e radioterapia.
Abordagens Atuais para Tratamento do Câncer Atualmente algumas abordagens estão sendo amplamente estudadas, e acredita-se que estas estratégias sejam importantes para o tratamento do câncer. Neste capítulo trataremos das seguintes: (1) terapia combinatória em que ocorre o tratamento combinando diferentes quimioterápicos, com a estratégia de silenciar uma ou mais vias de sinalização de grande relevância para a progressão tumoral; (2) microambiente tumoral, em que se observa que não somente as células tumorais, mas também as células do ambiente tumoral (p. ex., células endoteliais, fibroblastos associados ao tumor), desempenham um fator-chave na manutenção e progressão tumoral; (3) célula-tronco tumoral, que são células que apresentam a capacidade intrínseca de retomar o crescimento tumoral independente da quimioterapia empregada; (4) terapia alvo-dirigida que leva em conta um histórico mais detalhado do ponto de vista genético de cada paciente, de modo a empregar uma estratégia terapêutica mais personalizada; e (5) microRNAs, que podem controlar diversos processos importantes na progressão tumoral, dentre eles: angiogênese, migração, capacidade proliferativa e evasão à apoptose. A Figura 18.1 resume as estratégias atuais para o tratamento do câncer.
Terapia Combinatória Devido a essa heterogeneidade mencionada anteriormente, existe uma corrente que sugere fortemente a utilização de uma terapia combinatória, ou seja, uma estratégia terapêutica que utilize pelo menos dois inibidores de uma mesma via ou de vias de sinalização distintas, com o intuito de deter a proliferação celular. Há evidências de que a terapia combinatória atinge mais subpopulações tumorais e pode, com isso, dificultar ou impedir o aparecimento da quimiorresistência. A terapia combinatória já é uma realidade para pacientes com melanoma. A estratégia empregada atualmente utiliza, em sua maioria, um inibidor da forma mutante do gene BRAF (Vemurafenib) junto com um inibidor da proteína MEK (Trametinib). Embora os dois fármacos atuem na mesma via de sinalização, estudos mostram que um dos fatores que leva à quimiorresistência adquirida em melanoma é a reativação da via por uma alça
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BRAFV600E
1
2
MEK ERK
B
DSH
β-catenina A
β-catenina
C Célula normal Célula tumoral
miR-9
Célula-tronco tumoral Macrófago associado ao tumor
SNAIL
Fibroblasto associado ao tumor Célula-tronco mesenquimal
D
TEM
Figura 18.1 Estratégias terapêuticas para o tratamento do câncer. O câncer é uma doença heterotípica, cuja heterogeneidade pode ser determinante para o sucesso terapêutico. A título de exemplificação, optou-se por considerar o modelo de melanoma. (A) O microambiente tumoral é composto por células tumorais, células normais encontradas adjacentes ao tumor, células-tronco tumorais e células imunes associadas. Nesta imagem estão representados os macrófagos associados ao tumor, fibroblastos associados ao tumor e células-tronco mesenquimais. Cada tipo celular pode modular e/ou ser modulado pela célula tumoral e constituir uma estratégia terapêutica para o tratamento do câncer. Além dos componentes celulares, fazem parte do microambiente tumoral, os vasos sanguíneos e a matriz extracelular, que não serão abordados neste capítulo. (B) Estratégia alvo-dirigida e terapia combinatória são comumente utilizadas no tratamento do melanoma. A primeira diz respeito a fármacos que reconhecem especificamente a proteína BRAF mutada (BRAFV600E), como é o caso do vemurafenibe (1). No entanto, essa estratégia isolada não é tão eficiente quanto a terapia combinatória, em que se utiliza uma associação com outro fármaco que atue em outro ponto da via. Um exemplo que merece ser citado é a associação do uso do vemurafenibe com o fármaco trametinibe, que atua em um ponto downstream a via da MAPK, mais especificamente na proteína MEK (2). (continua)
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(C) As células-tronco tumorais são importantes alvos terapêuticos, embora de forma não totalmente elucidada. Uma via de sinalização que apresenta relevância neste caso é a via Wnt, em que ocorre a translocação da b-catenina para o núcleo ativando a transcrição de genes importantes para a tumorigenese. (D) Os microRNAs (miR) também apresentam a função de regular o microambiente tumoral. No melanoma, o miR-9 é relevante, uma vez que inibe a proteína SNAIL, impedindo o processo de transição epitélio-mesenquimal (TEM), diminuindo assim a capacidade migratória e invasiva das células tumorais.
de regulação positiva via MEK, de modo que fármacos que atuem em pontos diferentes da mesma via de sinalização desempenham um papel importante no tratamento do melanoma. Ainda assim, mesmo na presença da combinação de inibidores de BRAF e MEK, uma porcentagem de pacientes desenvolve a quimiorresistência. Estudos recentes mostraram que esses pacientes apresentam uma expressão elevada do receptor de tirosina quinase AXL, relatado como um fenótipo mais invasivo e de pior prognóstico. A utilização de um anticorpo que reconheça AXL em combinação com inibidores de BRAF e MEK trouxe resultados promissores no que tange à terapia combinatória. Outro tipo de tumor que se beneficiou dessa estratégia terapêutica foi o tumor de mama triplo negativo. Para tumores de mama, é importante que se faça uma caracterização com relação à presença ou não de receptores de estrógeno. No caso de tumores de mama triplo negativo, que acometem 15 a 20% dos casos, a terapia convencional não mostra bons resultados. Uma revisão recente mostrou que diferentes estratégias combinatórias foram empregadas com sucesso para esse tipo de tumor, dentre elas, destaca-se a inibição combinada de CDK4/6 e PI3K; de PI3K/AKT/mTOR, dentre outros.
Microambiente Tumoral como Alvo Alguns trabalhos mostraram que o microambiente tumoral pode ser um interessante alvo para drogas anticâncer. É o caso, por exemplo, da inibição do fator CDF1R em glioblastoma, que pode ter uma ação em macrófagos associados ao tumor, reduzindo o seu fenótipo maligno. A inibição deste fator promoveu uma redução da massa tumoral em modelos animais, levando a uma maior sobrevida deste modelo. Foi visto também que um produto natural extraído de plantas, astragalosídeo IV, foi capaz de promover uma diminuição na capacidade proliferativa, migratória e invasiva de fibroblastos associados ao tumor, sendo, portanto, capaz de modular a atividade deste tipo celular no microambiente tumoral. Outro trabalho revisou estudos prévios para como fibroblastos associados ao câncer podem ser possíveis alvos terapêuticos e apontou que essas células produzem uma proteína ativadora de fibroblastos (FAP, do inglês Fibroblasts Activated Protein), que é expressa exclusivamente em fibroblastos associados ao câncer, mostrando que essas células podem ser importantes alvos terapêuticos. Em neoplasias hematológicas, as células mesenquimais estromais presentes na medula óssea são capazes de produzir citocinas e fatores de crescimento que promovem a resistência de células neoplásicas à quimioterapia convencional e a inibição de algumas
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citocinas-chave é capaz de modular essa resposta. Por exemplo, a inibição do CXCL12 produzido pelas células mesenquimais estromais é capaz de inibir a ativação do eixo CXCL12/CXCR4 nas células leucêmicas, reduzir a quimiotaxia e o recrutamento dessas células para nichos mais quiescentes e, desta forma, aumentar a apoptose.
Célula-tronco Tumoral O conceito de célula-tronco tumoral foi primeiramente estabelecido para as leucemias, onde foi demonstrado que uma subpopulação específica de células leucêmicas é capaz de iniciar a doença (LIC, do inglês Leukemia-Initiating Cells). Atualmente, é amplamente aceito que virtualmente a maioria, senão todos os tumores apresentam células-tronco tumorais. Essas células são quiescentes e, por esse motivo, resistentes à terapia. Após os ciclos de tratamento, essas células ressurgem e iniciam o crescimento, sendo um fator determinante para recidiva. Atuar de forma seletiva nesta população celular é um desafio atual no campo da oncologia e da farmacologia, pois essas células têm comportamentos mais semelhantes às células-tronco normais. Em tumores sólidos, como no melanoma, as células-tronco tumorais parecem ter um papel decisivo na progressão tumoral e no desenvolvimento de quimiorresistência. A literatura sugere que vias de sinalização, como Wnt/b-catenina, TGF-b, Notch1, EGFR/ HER2, SMO e EpCAM, parecem ter relevância como alvos para a progressão das células-tronco tumorais. Foi demonstrado anteriormente que a salinomicina, um produto natural isolado de bactérias do gênero Streptomyces, foi capaz de induzir a morte celular de células-tronco tumorais em diversos tipos de tumores. Os mecanismos de ação pelos quais atuam não estão totalmente esclarecidos, mas parecem estar relacionados aos transportadores do tipo ABC e a via de sinalização Wnt/β catenina. Foi visto, inclusive, que essa droga é bastante promissora para o tratamento de células resistentes à terapia convencional. Os ensaios pré-clínicos tiveram resultados bastante promissores.
Terapia Alvo-Dirigida A terapia alvo-dirigida já é uma realidade e vem sendo cada vez mais explorada, especialmente no que concerne à personalização da terapia, onde há a busca de novas drogas utilizando como ponto de partida o background genético e proteico de cada indivíduo. Esse tipo de terapia revolucionou o tratamento de pacientes oncológicos. Essa revolução deu início com o desenvolvimento do fármaco imatinibe (Gleevec®), um inibidor de tirosina quinase que contribuiu significativamente para o tratamento de alguns tipos de neoplasias hematológicas, especialmente a leucemia mieloide crônica. Antes da sua descoberta, a quimioterapia convencional proporcionava uma taxa de sobrevida de apenas 5 anos após a descoberta da doença para 1 em cada 3 pacientes. Com o advento do imatinibe, estudos mostraram que a expectativa de vida de pacientes que estavam em remissão da doença era a mesma de pessoas que nunca apresentaram leucemia. Atualmente, já existem outras gerações de inibidores de tirosina quinases que são utilizados para pacientes que apresentam resistências ao imatinibe. Com o avanço
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da descoberta dos mecanismos moleculares que levam à resistência, foi identificada a mutação T315I no oncogene BCR-ABL1, que confere resistência aos inibidores de primeira (imatinibe) e segunda geração (dasatinibe e nilotinibe), e um novo inibidor foi desenvolvido (ponatinibe) e é capaz de inibir parcialmente a atividade do BCR-ABL1 mutado. Esses achados exemplificam que mesmo as terapias alvo-dirigidas com alta eficiência e que mudaram a história natural de uma doença precisam de avanços, pois tratamentos crônicos podem resultar em aquisição de resistência e a necessidade de novas drogas. A terapia alvo-dirigida difere em diversos pontos da quimioterapia convencional. Primeiramente, as terapias direcionadas atuam em alvos moleculares específicos, ou seja, apenas grupos celulares que expressam determinadas moléculas seriam afetados por esta estratégia terapêutica, ao passo que a quimioterapia convencional apresenta uma inespecificidade maior de ação, podendo, inclusive, prejudicar as células normais do indivíduo. Em segundo lugar, espera-se que os efeitos colaterais oriundos do tratamento sejam menores ou mesmo ausentes em pacientes submetidos ao tratamento com terapia alvo-dirigida. O vemurafenibe é outro exemplo de droga que revolucionou a terapia do câncer, especificamente o melanoma, cujo mecanismo de ação reside no fato que esse fármaco reconhece especificamente a forma mutada da proteína BRAF, agindo especificamente na mutação BRAFV600E, uma mutação presente em aproximadamente 60% dos pacientes com melanoma. No entanto, o contraponto do uso desta droga é que aproximadamente metade dos pacientes desenvolve quimioresistência com pior prognóstico e, por essa razão, atualmente se preconiza o uso de terapia combinatória, conforme mencionado em Terapia Combinatória. Mais um exemplo é o Herceptin®, cujo princípio ativo é o trastazumabe, uma terapia dirigida que reconhece especificamente tumores HER2 positivos. Seu desenvolvimento foi importante para o tratamento de câncer de mama metastático HER2 positivo e câncer gástrico HER2 positivo.
MicroRNAs MicroRNAs (ver Cap. 19 Terapia à base de microRNAs) são pequenas moléculas de RNA não codificantes que regulam diversos processos fisiológicos e também estão presentes como papel regulatório no curso de diversas doenças, dentre elas, o câncer. Os miRNAs podem reduzir a expressão gênica de diferentes genes-alvo com relevância para a tumorigenese, manutenção e progressão do tumor. Existem, na literatura, relatos que diferentes miRNAs podem ser encontrados diminuídos ou aumentados no câncer, e alguns deles já estão consagrados como biomarcadores da progressão tumoral, podendo até predizer o prognóstico do paciente baseado na diminuição ou no aumento de sua expressão. Nesta seção apenas citaremos alguns dos miRNAs que foram relatados como possíveis alvos terapêuticos. Conforme bem revisado por Lou et al., 2017, a superexpressão do microRNA(miR)-29c inibe a angiogênese pela regulação negativa na expressão do fator VEGF, além de diminuir a capacidade migratória e invasiva em glioma. Para glioblastoma, o miR capaz de promover
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resultados semelhantes foi o miR-101. Do mesmo modo, a indução do miR-9 resultou em diminuída capacidade de migração e invasão em melanoma e neuroblastoma. Já em tumores de mama, os resultados são bem promissores para o miRNA-181-5p, mostrando uma redução nos mesmos processos citados anteriormente. Outro exemplo interessante é o miR-218, que inibiu a progressão do câncer nasofaringeano, modulando a expressão de survivina e a via de SLIT-ROBO1. Esses são apenas alguns exemplos encontrados na literatura que mostram quão promissores são os miRNAs como alvos terapêuticos para o câncer.
Antigos Fármacos: Novos Alvos Outra tendência da oncologia e da farmacologia é fazer a releitura de fármacos já utilizados para outras doenças e utilizá-las em terapias contra o câncer. Um dos exemplos mais atuais é a metformina. A metformina é uma droga amplamente utilizada há décadas para o tratamento de diabetes do tipo II e da síndrome metabólica. Estudos epidemiológicos sugerem que a metformina exerce atividade antineoplásicas em humanos, o que tem sido confirmado em experimentos in vitro e in vivo em uma grande variedade de tipos de tumores. Os mecanismos moleculares de atuação da metformina ainda não são totalmente elucidados. Inicialmente a metformina foi descrita como um inibidor do complexo I da mitocôndria, e de fato ela exerce essa função nas células tumorais, reduzindo o metabolismo celular e a ativação da via de sinalização PI3K/ AKT/mTOR via ativação da AMPK. Entretanto, novos mecanismos celulares têm sido identificados, como a inibição da ativação das proteínas STATs, da via MAPK e a redução da expressão de ciclina D e consequentemente redução na progressão do ciclo celular. Todos esses atributos sugerem que a metformina atua como uma droga de múltiplos alvos importantes para o fenótipo neoplásico. Outro exemplo de fármaco que está sendo relido é a cloroquina. A cloroquina é utilizada para tratamento de doenças como a artrite reumatoide e da malária. Atualmente é bem aceito que a cloroquina atua como inibidor de autofagia. A autofagia é um processo celular que atua como uma “espada de dois gumes”. Se por um lado, ela é capaz de induzir a morte autofágica das células tumorais, por outro lado, é capaz de induzir a resistência à terapia e ao estresse celular. O desfecho celular vai depender do tipo de célula e da intensidade do dano causado. Muitos estudos pré-clínicos têm demonstrado que a inibição da autofagia utilizando a cloroquina é capaz de reverter a resistência à apoptose. Uma vez que ambos os fármacos, metformina e cloroquina, são seguros e utilizados há muitos anos na prática clínica, sua utilização em ensaios clínicos já é uma realidade. Na maior parte desses ensaios clínicos, esses fármacos estão sendo combinados com esquemas terapêuticos convencionais.
Tendências Há um forte consenso de que a oncologia caminha para uma era da terapia personalizada. Para isso, acredita-se que a tendência é que ocorra o sequenciamento de um amplo painel de genes para cada paciente, de modo a escolher a terapia que
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melhor se adeque para aquele perfil genético. Também há a possibilidade de realizar o sequenciamento do genoma completo ou do exoma do paciente, com o intuito de predizer quais genes podem vir a apresentar potencial oncogênico e prever uma melhor terapia individualizada. Essas duas estratégias mencionadas previamente dizem respeito a casos em que há um histórico familiar de câncer, mas em que ainda não houve manifestação no indivíduo. Há também estratégias que podem ser adotadas pelos pacientes diagnosticados com algum tipo tumoral, que seriam: análise mutacional do tumor, para obter quais são as mutações encontradas naquele tumor específico e verificar uma melhor terapia individualizada; realizar o transcriptoma tumoral, para que se possa ver quais genes estão sendo expressos de fato e atuar precisamente nestes genes. Ao contrário do genoma, em que se sequencia todos os genes de um indivíduo, mas essa informação não necessariamente implica em uma atividade dos genes em questão.
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25 Cronofarmacologia Sanseray da Silveira Cruz Machado
Os seres vivos são regidos pelos ritmos da Terra: alternância diária entre fases de claro e escuro, variação das estações do ano, dentre outros. Em mamíferos, um relógio endógeno central é sincronizado às variações ambientais, o que harmoniza todos os ritmos internos ao ambiente. O relógio central, em mamíferos, está localizado nos núcleos supraquiasmáticos do hipotálamo (NSQs). Assim, oscilações originadas desse relógio, através da sincronia da atividade de diferentes glândulas no organismo, permitem preparar, antever e ajustar respostas que surgem no organismo ao longo das 24 horas do dia. Em humanos, a produção de cortisol, por exemplo, possui maior produção e secreção pelas glândulas adrenais durante a manhã. Em todos os animais, a presença do escuro é informada através da elevação da melatonina plasmática, produzida pela glândula pineal. O efeito de medicamentos é altamente dependente do horário de sua administração, pois tanto a farmacocinética quanto a farmacodinâmica variam ao longo do dia. A cronofarmacologia, assim como muitos dos achados iniciais da terapêutica, resulta de observações clínicas, muitas vezes não reprodutíveis entre modelos e espécies. Atualmente, com a ampliação dos fundamentos teóricos das funções temporais, a cronofarmacologia tem ganhado relevância tanto na Farmacologia Experimental quanto na Terapêutica. Neste capítulo, serão abordados os principais mecanismos biológicos para sincronia da marcação de tempo interno, seus efeitos sobre a farmacocinética e a farmacodinâmica, bem como as estratégias cronofarmacológicas mais bem-sucedidas na terapêutica.
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Organização do Sistema de Marcação de Tempo Endógeno Considerando os ciclos naturais aos quais o organismo é submetido, a integração de sinais externos ao meio interno prepara o organismo para o amanhecer, o anoitecer e os diferentes momentos das 24 horas do dia, para permitir respostas adequadas aos desafios que surgem. A organização temporal de mamíferos envolve um oscilador endógeno central, que marca o tempo independente do meio ambiente. Por outro lado, cada célula individual possui um relógio gênico cujo período é de aproximadamente 24 horas. Para integrar a atividade interna do organismo às variações ambientais, um sistema de detecção e distribuição de informações geradas pelo fotoperíodo é chave para sincronizar todos os órgãos e tecidos (Fig. 25.1). A atividade endógena do organismo é harmonizada ao meio externo através da percepção da variação cíclica da luminosidade ambiental, sua integração no relógio central localizado no hipotálamo e pela geração de respostas por vias neuroendócrinas, as quais ajustam o tempo de diferentes células do organismo a um único relógio. A melanopsina, um fotopigmento da superfamília das opsinas, localizada nas células ganglionares da retina, percebe as variações de luminosidade no ambiente e, através de neurônios do trato retino-hipotalâmico (TRH), projeta as informações ambientais aos NSQs. Os neurônios do TRH liberam glutamato e PACAP (do inglês, pituitary adenylate cyclase-activating peptide), promovendo a sincronização da maquinaria gênica do relógio central (do inglês, clock genes), sincronizando sua oscilação endógena ao meio externo. Dessa forma, a presença de luz promove diariamente o reinício na marcação de tempo. Através de sinais neuroendócrinos, os NSQs orquestram diversas atividades rítmicas do organismo. Neste contexto, a regulação da atividade das glândulas pineal e adrenal é um ótimo exemplo. Projeções dos NSQs para os núcleos paraventriculares do hipotálamo (PVN) ativam o sistema nervoso simpático via coluna intermediolateral da medula espinhal. Uma das vias mais estudadas neste contexto é a ativação do gânglio cervical superior e suas projeções para a glândula pineal. Potenciais de ação fluem via fibras pós-ganglionares simpáticas durante a fase de escuro, induzindo a liberação de noradrenalina diretamente na glândula pineal, ativando a produção de melatonina por pinealócitos. A glândula pineal é um órgão circunventricular e altamente vascularizado, o que permite que a secreção de melatonina ocorra na mesma hora na circulação sistêmica e no líquido cefalorraquidiano, sincronizando as funções do organismo ao escuro ambiental. A liberação de corticosteroides pelas adrenais, em condições normais, também segue um ritmo de 24 horas. A produção destes hormônios ocorre imediatamente antes do acordar. Portanto, a liberação de corticosterona, em roedores, ocorre na transição entre as fases de claro/escuro, enquanto cortisol, em humanos, ocorre na transição escuro/ claro. Para a produção rítmica de cortisol, o relógio central atua de duas formas: a primeira, por uma via neuroendócrina, que consiste na atuação do PVN sobre a adeno-hipófise, induzindo a secreção de hormônios; entre eles, o hormônio adrenocorticotrófico (ACTH)
Cronofarmacologia
Luz ambiental
NSQ
Retina
Pi
Glândula pineal
Hipófise GCS
PER CRY
CLOCK BMAL
NSQ
ACTH
Glândula adrenal
Conteúdo plasmático
Dia Noite
Melatonina
Cortisol
Dia Noite Dia
Figura 25.1 Organização do sistema de marcação de tempo endógeno: variações cíclicas na luminosidade ambiente são percebidas por fotorreceptores presentes na retina que expressam melanopsina. A projeção das informações de fotorrecepção provenientes da retina para os Núcleos Supraquiasmáticos (NSQ), via trato retino-hipotalâmico, sincroniza a atividade oscilatória da maquinaria gênica presente nos neurônios desse núcleo hipotalâmico. Tais genes do relógio (do inglês, clock genes) oscilam de forma independente, exercendo controle transcricional entre si através de alças de retroalimentação negativas e positivas em um ciclo completo de aproximadamente 24 horas. Desta forma, a presença de luz promove o reset no controle transcricional dos genes dessa maquinaria e a sincroniza à presença de luz no ambiente. A partir desse relógio central, diversos ritmos internos são harmonizados em sincronia através da resposta endócrina das glândulas pineal e adrenal. A produção de melatonina, pela glândula pineal (Pi), é elevada durante a fase de escuro, via controle da liberação de noradrenalina proveniente de fibras pós-ganglionares simpáticas originadas no gânglio cervical superior (GCS). O relógio central também orquestra a produção de corticosteroides via controle neural da hipófise e secreção do hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) que, via circulação sistêmica, atua no córtex da glândula adrenal, induzindo a produção de cortisol. Em humanos, o pico de cortisol ocorre na transição entre as fases de escuro/claro e, portanto, antecede a fase de atividade (vigília), enquanto a produção de melatonina sinaliza a presença da fase de escuro. que, via circulação sistêmica, atua no córtex da glândula adrenal. A outra via ocorre por via neural, onde a neurotransmissão estimulatória originada via PVN induz a síntese de corticosteroides via coluna intermédio-lateral da medula espinhal. A conversa cruzada entre as glândulas adrenal e pineal reforça o ajuste fino dos ritmos do organismo. Concentrações fisiológicas de corticosteroides potenciam a síntese de melatonina por pinealócitos. No
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caso de inflamação crônica em roedores, o aumento da concentração de corticosterona circulante é essencial para manter o ritmo de melatonina, cuja síntese é inibida por mediadores pró-inflamatórios. Por outro lado, concentrações imunossupressoras de glicocorticoides inibem a produção do hormônio da pineal. Em suma, em condições de higidez, o aumento na síntese e secreção de corticosteroides antecede a fase de atividade da espécie, enquanto a produção de melatonina sinaliza a presença da fase de escuro, o que permite a geração de sinais endócrinos através de um único marcador de tempo (NSQs), de forma a favorecer a sincronia de atividades endógenas.
Ritmos Biológicos, Metabolismo e Ação de Fármacos A sincronia da atividade interna de um organismo interfere na resposta a medicamentos através do controle de mecanismos de absorção, distribuição, metabolismo e ação de fármacos. O tempo biológico regula a expressão gênica e a atividade de receptores, moléculas adaptadoras, transportadores e enzimas. Algumas vias de transdução podem apresentar processos de regulação interna, mas a maioria dos processos que oscilam ao longo das 24 horas do dia ocorre via eferências do relógio central. Neste contexto, os conceitos de cronofarmacocinética e cronofarmacodinâmica estudam estes fenômenos com o objetivo de aumentar a eficácia e reduzir a toxicidade de fármacos, ajustando a hora da administração dos medicamentos ao momento mais apropriado. O princípio fundamental da cronofarmacologia se consolida no entendimento de que processos intrínsecos da ritmicidade do organismo envolvem o ajuste adequado de mecanismos que regulam as ações de fármacos. Essas observações abriram perspectivas para o entendimento de que os mecanismos de ação, produção de metabólitos e expressão de receptores e alvos intracelulares são modulados pela variação diária dos diversos aspectos da biologia do organismo. A literatura sobre as variações cíclicas desses fenômenos básicos cresce a cada dia e indica que tanto parâmetros farmacocinéticos quanto farmacodinâmicos são harmonizados ao longo das 24 horas do dia. Como exemplo de fatores de alta relevância para a farmacocinética, inclui-se: oscilação diária no pH gástrico, motilidade gástrica e intestinal, atividade metabólica e fluxo hepático, fluxo sanguíneo, concentração de proteínas no plasma, filtração glomerular e volume urinário. De relevância na farmacodinâmica, já foram descritas mudanças na expressão e atividade de receptores, transportadores, canais iônicos, entre outros. Neste contexto, é preciso salientar que os efeitos são específicos, mas podem ser gerados por controle de funções. Assim como a luz, o padrão de ingesta alimentar é um importante fator para regular ritmos endógenos. Neste contexto, estudos recentes demonstram que não apenas o horário da alimentação, mas também a qualidade de seu conteúdo, pode alterar de forma importante os genes do relógio e a produção de melatonina, interferindo diretamente na sincronia do organismo ao ambiente. O estudo da cronofarmacologia envolve não apenas a sincronia do organismo através de mudanças do relógio central, mas também via mudanças das respostas endócrinas,
Cronofarmacologia
como níveis plasmáticos de melatonina, corticosteroides, insulina, dentre outros. O entendimento de como esses fatores alteram a marcação do tempo endógeno e as mudanças facilmente mensuráveis clinicamente, como temperatura e peso, tem sido importante na escolha de regimes terapêuticos individualizados. Assim, a administração de fármacos em uma janela temporal definida é de alta relevância para o sucesso no tratamento de diversas patologias. Um exemplo já bastante explorado é a variação da eficácia e tolerância a quimioterápicos na dependência do horário de administração. Como estes fármacos são usados em doses muito elevadas, próximas à máxima tolerável, a administração em horários mais adequados pode ser determinante para o sucesso terapêutico. A cronofarmacologia também tem por objetivo avaliar rupturas da sincronia do organismo, as quais podem ocorrer como resposta do processo patológico. Portanto, seria importante dispor de fármacos que sincronizem as atividades do organismo e a oscilação de genes de relógio em tecidos-alvo, seja para tratamento da ruptura do sistema de marcação de tempo ou como adjuvante terapêutico para favorecer as ações de medicamentos. Nestes casos, o uso da melatonina, através da reposição hormonal noturna, vem sendo muito estudado. Em suma, a cronofarmacologia vem ao encontro dos conceitos da farmacocinética e farmacodinâmica, considerando que a marcação de tempo interno é relevante para regular fatores que favorecem processos onde a absorção e o metabolismo do medicamento, em sua dose ótima, geram eficácia máxima e toxicidade mínima, abrindo perspectivas para a análise e o entendimento das janelas temporais que permitem aumentar a eficiência de fármacos.
Cronofarmacologia e Terapêutica Os avanços da cronobiologia têm permitido ampliar os conceitos cronofarmacológicos para além de estipular o melhor horário de administração de fármacos, considerando o seu efeito terapêutico final. Alguns exemplos são bastante estudados, como no caso de fármacos que são administrados antes das refeições, para facilitar sua absorção, ou porque seus efeitos estão relacionados com atividade hepática relacionada ao metabolismo alimentar. Atualmente, busca-se entender em quais janelas temporais os processos farmacocinéticos e farmacodinâmicos favoreceriam a maior eficácia, com redução de efeitos colaterais ou adversos. Isso se deve ao entendimento atual de que pelo menos 500 medicamentos apresentam cerca de 5 vezes menos efeitos colaterais quando administrados em horários específicos. Um dos casos mais notáveis é administrar fármacos que modificam diretamente os ritmos biológicos. O uso de melatonina e análogos para insônia, altamente difundido e autorizado pelas agências reguladoras dos Estados Unidos, Europa e Brasil, dentre outras, traz benefícios quando administrado sempre no mesmo horário, e não antes de dormir. Como o aumento plasmático da melatonina informa ao organismo a presença e também a duração da fase de escuro, formulações que permitem a liberação plasmática prolongada têm sido desenvolvidas, com o objetivo de mimetizar a marcação de tempo do hormônio
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Métodos em Farmacologia: Atualidades e Desafios
da pineal. Os glicocorticoides, por sua vez, não deveriam ser administrados à noite em humanos, visto que, do ponto de vista fisiológico, o cortisol é o hormônio do despertar. Alguns exemplos evidentes de terapêuticas bem-sucedidas em estudos clínicos envolvem doenças cardiovasculares. É bem estabelecido o aumento no risco de infarto agudo do miocárdio, com cerca de 70% maior incidência pela manhã, quando comparado aos demais momentos do dia. Dentre os mecanismos envolvidos está o aumento na atividade de fatores ativadores de plaquetas, que possuem maior atividade pela manhã, predispondo o risco de formação de coágulos. A partir dessas observações, considerou-se avaliar o efeito de fármacos com atividade anticoagulante, como a aspirina, um importante bloqueador da síntese de prostaglandinas e inibidor do fator ativador de plaquetas. Ao se administrar aspirina de forma preventiva antes de dormir, para antever o aumento de fatores pró-coagulantes pela manhã, observou-se redução nos eventos cardiovasculares adversos, comparados aos que recebem o medicamento em outros horários do dia. Outro exemplo evidente é o uso de fármacos anti-hipertensivos: durante o sono, a pressão arterial possui a tendência de ser reduzida, devido ao relaxamento da musculatura vascular, dentre outros fatores. Em contrapartida, indivíduos hipertensos possuem maior pressão arterial ao longo das 24 horas e falha na redução noturna da pressão arterial. Ao analisar indivíduos que aderiram à terapia medicamentosa anti-hipertensiva, a terapia cronofarmacológica foi clinicamente mais eficaz quando o medicamento foi administrado à noite ou antes de dormir, comparado à administração do medicamento pela manhã, quando a pressão arterial já está elevada.
Conclusões e Relevância Clínica da Cronofarmacologia Um grande número de estudos pré-clínicos e clínicos têm determinado que a farmacocinética e a farmacodinâmica de medicamentos variam ao longo do dia e geram respostas diferentes de acordo com o horário da administração do fármaco. Ao considerarmos que a expressão de diversas moléculas e suas propriedades funcionais de metabolização e ação de medicamentos sejam inerentes ao modelo testado, algumas estratégias terapêuticas puderam ser extrapoladas para aplicações em humanos de forma eficiente. Nestas condições, a individualização da terapêutica em sincronia ao tempo biológico interno se demonstrou eficaz em otimizar a janela terapêutica para gerar melhores resultados, ao favorecer processos de metabolismo e resposta celular ao fármaco. Embora os princípios biológicos fundamentais e as bases de aplicações cronofarmacológicas sejam recentes, o impacto das alterações do sistema de marcação de tempo do organismo sobre estados de saúde, doença e tratamentos ainda são alvos de intenso estudo. Desta forma, futuros embasamentos serão relevantes para propostas translacionais e para fomentar normativas em agências reguladoras, como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) ou a Food and Drug Admnistration (FDA) e outras. Nessa perspectiva, bases de dados de estudos clínicos já apresentam pesquisas em andamento para análise de oportunidades para a descoberta de testes biomarcadores,
Cronofarmacologia
estabelecimento de rotinas terapêuticas e também para desenvolvimento farmacêutico considerando abordagens cronofarmacológicas. A alta relevância dos efeitos fisiológicos regulados pelo sistema de marcação de tempo interno, sincronizados pelo relógio central e suas respostas neuroendócrinas, sugere que o próprio sistema também possa ser alvo para intervenções farmacológicas. Neste contexto, o uso de adjuvantes ou fármacos que harmonizem a sincronia de atividades rítmicas do organismo fornece uma oportunidade para favorecer a eficácia ou otimizar as janelas terapêuticas adequadas no uso de determinados medicamentos. Portanto, as bases que fundamentam estratégias cronofarmacológicas também abrem perspectivas para o entendimento de como alvos circadianos podem contribuir para o diagnóstico e o tratamento de doenças.
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Rodrigues & Branco
Métodos em
Farmacologia
Alice Cristina Rodrigues Paola Cristina Branco
Atualidades e Desafios A farmacologia é uma ciência que nasceu no século XIX e passa por grandes mudanças e atualizações constantemente. Por este motivo, faz-se necessário propagar as atualizações e novidades frequentemente. O livro Métodos em Farmacologia descreve, de maneira minuciosa, um grande número de técnicas de laboratório, absolutamente atuais, e que são fundamentais para uma abordagem contemporânea da Farmacologia. Métodos em Farmacologia é uma obra prático-teórica cuja finalidade é apresentar a experiência prática de um laboratório de pesquisa, com seus desafios, bem como sinalizar quais caminhos a farmacologia atual busca trilhar nos próximos anos de pesquisa. Escrita por profissionais brasileiros atuantes na área e destina-se aos alunos de graduação e pós-graduação das áreas de Ciências Biológicas e da Saúde e pesquisadores da área de Farmacologia.
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Atualidades e Desafios
ISBN: 978-85-5795-012-2
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