Revista Entrementes - Edição de Inverno

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Ano 3 - Edição 6 - Inverno de 2016 www.entrementes.com.br

CONECTANDO IDEIAS ARTE - CIÊNCIA - ESOTERISMO - FILOSOFIA

EDIÇÃO DE INVERNO RICOLA DE PAULA

A Poesia e as obras de um Poeta Multifacetado.

LON AMORIM

Duas décadas trilhando o caminho da Música em São José dos Campos.

ENTREVISTAS

- A escritora Rita Elisa Seda fala do novo filme inspirado em sua obra sobre Cora Coralina. - Conhecedor profundo dos sonhos premonitórios, Jucelino da Luz fala sobre suas experiências.

SISTEMA DE COOPERAÇÃO NO TRÂNSITO Aplicativo criado pelo inventor Paulo Gannam.

SÃO LUÍS DO MARANHÃO

Patrimônio histórico, cultural e arquitetônico reconhecido pelo mundo.


Editorial Apresento-lhes a nova edição da Revista Entrementes. Esta estação de inverno, marcada por frio intenso - e nos aquecemos com uma boa sopa quente, alimento para o corpo. E com uma sopa de letras para nossa alma, sedenta por calor, pela quentura e brandura de outras almas também sequiosas por alimentos quentes. Para esquentar o frio esta edição sugere o abraço profundo entre os seres e também entre as ideias reinantes no mundo dos humanos. Muita poesia e muita prosa. Calor das ideias que se concretizam em invenções inusitadas, teorias excêntricas, mundos diferentes dentro de um Universo não linear. Um mundo que abraça a arte como o único refúgio para alcançar voos mirabolantes, como o único oásis de um deserto sem perspectivas, único edredom numa noite fria. Confira os contos, poesias, artigos, entrevistas, críticas e comentários dos nossos colunistas e colaboradores. São preciosidades que compõem todo o trabalho de uma equipe ligada e conectada, presenteando nossos queridos leitores. Conectando ideias, conectando Revista Entrementes - Edição de Inverno. Boa leitura a todos! Elizabeth de Souza

Sumário ENTRE SONS

3 - Matuto Moderno - Um novo cenário à Música Raiz Por Paola Domingues

ENTRE VERSOS E PROSAS 5 - O homem do saco - Por Ronie Von R. Martins 6 - Prefácio ao livro que não li - Por Marcelo Pirajá Sguassabia 7 - Deus e o Diabo na Chess Premier League - Por Escobar Franelas 12 - A Queda da Bastilha...Uma história de amor - Por Teresa Bendini 21 - Aquilo tudo / alguma coisa - Por Jorge Xerxes

ENTREVISTA 8 - Entrevista com Rita Elisa Seda - Por Teresa Cristina Bendini 25 - Entrevista com Jucelino da Luz - Por Joana D’Arc

ENTRE AUTORES 10 - Ricola de Paula - O Poeta Multifacetado - Por Elizabeth de Souza

ENTRE CULTURA 14 - Língua Brasileira - Por George de Paula Furlan 22 - HQ : “Persépolis” - Por Rodolfo Salvador

ENTRE FILSOFIA 16 - Sob frestas - Por Alexandre Lúcio Fernandes

POESIAS X POETAS 17 - Qual é a da poesia? - Por Germano Xavier 18 - Saudação ao inverno - Por Joka Faria • O tempo é um verso inacabado - Por Joka Faria • Do livro “Falha Magnética” Por Ricola de Paula • Historinha da criação - Por Domingos dos Santos • Fuziote - Por Domingos dos Santos 19 - Cantada de amor - Por Sanjo Muchanga • Doce Encanto Por Gustavo Souza Silva • (eu me vejo em você) - Por Wallace Puosso • Eros e Psique - Por Elizabeth de Souza 20 - Lua - Por Joana D’Arc • Todas as coisa que tenho, ou acho - Por Paulo Vinheir • Djarmai. Guarda-me 1 - Por Luisa Fresta • Oaristo - Por Marcus Groza • Cantiga de Amor [3505] - Por Glauco Mattoso

ENTRE INVENÇÕES

Expediente Ano 3 - Edição 6 - Inverno de 2016 Jornalista responsável: Elizabeth de Souza MTB 0079356/SP Conselho editorial: Elizabeth de Souza, Dalto Fidencio, Joka Faria e George P. Furlan. Revisão: George P. Furlan Diagramação: Filipe Oliveira Capa: Musa Erado - A musa da Poesia Lírica de Charles Meynier

24 - “Sistema de Cooperação no Trânsito” - Paulo Gannam

ENTRE MÚSICOS 26 - Lon Amorim - Por Dalto Fidencio

ENTRE TESES E ANTÍTESES 30 - Reflexões sobre a perfeição - Parte 1 - Por Rafael Arrais

ENTRE TRILHAS E VIAGENS 32 - São Luís - Patrimônio Mundial - Por Ana Maria Alcides

CANTO DA CULTURA 35 - Um Movimento em movimento - Por Elizabeth de Souza


ENTRE SONS

MATUTO MODERNO – Um novo cenário à Música Raiz Por Paola Domingues

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nome da banda já descreve o perfil. Matuto Moderno traz o genuíno som brasileiro ao acompanhamento das cordas de aço do rock. Essa mistura originou um som diversificado, moderno, por assim dizer, às novas composições de moda de viola que a banda, há seus 14 anos, vem encantando públicos de todo o Brasil. O quinto álbum da banda, é um trabalho muito especial para os integrantes do Matuto Moderno. A partir dos anos de trabalho e toda a experiência como músicos, neste álbum em especial, os compositores tiveram principal influência e liberdade em tocar aquilo que lhes dava prazer; sem arquitetar demais, organizar demais. O âmago do desenvolvimento criativo – deixar-se criar. Com o apoio da mais bela paisagem de Pedralva e Maria da Fé, no Estado de Minas Gerais, a casa da família de um dos integrantes, já conhecidos no “Progressão”, Zé Helder, foi o abrigo necessário para expandir o desenvolvimento musical. O silêncio proporcionado pelo isolamento muito colaborou para que a gravação fosse feita ao vivo, sem “trabuques”, como metrônomos e overdubs, bem como eram gravados à moda dos anos 70. O ponto alto do disco todo são as aproximações à cultura regional em formato inovador. Músicas como “Viola fala, alma reza”, engajada em um ritmo todo estilizado em comparação às tradicionais cantigas, descreve o famoso cenário da Folia de Reis, algo muito marcante na nossa cultura e, em especial, aos integrantes da banda que possui participação ativa nesta caracterização. Também encontramos esta aproximação em “Fulaninha” quando descreve a situação pitoresca do cenário caipira: a “Festa de São João”, envolto de mitos da crença popular, do nosso folclore e das religiões que acercam nosso país, que se mistura e converge numa linguagem bastante comum entre os interioranos dos estados de São Paulo e Sul de Minas. Para aqueles “da cidade grande”, um vocabulário bastante extenso a ser compreendido: os compositores fazem uso da linguagem “antiga” como Ricardo Vignini cita Antonio Candido, onde precisa mesmo parar para ouvir, entender e compreender. Palavras como “Banzeiro”, “Preto Véio Raizeiro” e “arresorvi”, compõem um cenário que pode não ser tão comum aos habitantes de metrópoles, mas absolutamente corriqueiro aos “caipiras” do interior. A visão do interior do interior, cheio de suas raízes e cantigas, uma mistura de “causos da beira de um fogão a lenha” que vai di-

Os integrantes da banda, da esquerda para direita: Zé Helder, Ricardo Berti,Ricardo Vignini, Edson Fontes e Marcelo Berzotti facebook.com/matutomoderno/

reto para as apresentações nos grandes palcos, regido por um arsenal de violas, guitarras, baterias e violões provindos do rock n´roll. Um espetáculo!!! Os integrantes da banda: Ricardo Vignini - Violeiro, compositor, professor de música, produtor fonográfico e cultural e pesquisador de musica tradicional Marcelo Berzotti - Baixista e compositor. O “caipira personificado”, contador de causos oficial do Matuto. Zé Helder - Violeiro e compositor Zé Helder, nasceu em Cachoeira de Minas / MG. Edson Fontes - acompanha os giros de Folia de Reis com “Os Mensageiros de Santos Reis” e a catira dos “Os Favoritos da Catira”. André Rass - O contato com as murgas, candombes, milongas, chacareras, zambas, entre outros ritmos latinos, lhe deram novos horizontes no universo da percussão. DISCOGRAFIA Bojo Elétrico, Festeiro, Razão da Raça Rústica Empreitada Perigosa, Matuto Moderno 5

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ENTRE CLÁSSICOS DO CINEMA

RANGO

Por Elizabeth de Souza

Sinopse: Rango é um camaleão de estimação que após um acidente, vai parar no velho oeste, na cidade de Poeira no deserto do Mojave, na Califórnia. Uma cidade sem lei e selvagem que precisa desesperadamente de um herói. A vida do camaleão muda completamente e agora ele precisa deixar a sua vida “camuflada” para enfrentar os perigos do mundo real..

Lançamento: 14 de fevereiro de 2011 (mundial) Roteiro: John Logan, baseado no argumento do próprio Gore Verbinski e James Ward Bykrit • Direção: Gore Verbinski • Música composta por: Hans Zimmer • Montagem: Craig Wood • Duração: 107 min • Elenco Principal (Voz): Johnny Depp – Rango/Lars, Isla Fisher – Beans, Abigail Breslin – Priscilla, Bill Nighy – Rattlesnake Jake, Ray Winstone – Bad Bill, Alfred Molina – Roadkill, Ned Beatty – Prefeito Prêmios: OSCAR 2012 - Melhor Filme de Animação GLOBO DE OURO 2012 - Indicado: Melhor Filme de Animação

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Comentário Eu sou Rango! “Estou entre a cruz e a espada” - Que frase mais repetida! Esse paradoxo dá o clímax para todas as aventuras. E nesse momento surge o herói e/ou anti-herói. Conhecimento é tudo, disse o Tatu para Rango, que no momento estava meio confuso e alienado, depois do acidente. Isso é bem comum em todas as trajetórias dos heróis - Fica-se confuso, caótico, desesperado e então aparece uma figura e faz um discurso. Quando não é com a gente, tudo parece fácil e cabe o discurso; quando a desgraça é com a gente fica mais complicado. Conhecimento é tudo, já dizia o grande filósofo nas planícies paranaenses, entre o canto do grilo e o brilho da lua. E na busca de conhecimentos vamos trilhando desertos empoeirados, ambientes selvagens, sem noção de nada. E lá no fim da linha, descobrimos que não conhecemos nada e tudo que aprendemos pelo caminho não é suficiente para dar voos de águia, ainda rastejamos como lagartos sob o sol escaldante. No fim, ainda somos camaleões mutantes, flexíveis no tempo, fluídicos no vento, lentos e preguiçosos diante do absoluto. Mas o Rango é legal, recomendo. Excelente animação! É a história de um camaleão em busca de si mesmo.


ENTRE VERSOS E PROSAS

O HOMEM DO SACO Por Ronie Von R. Martins

Cabia tudo na vastidão do meu medo. E o universo era o saco. Solidão e pânico. Sempre tive medo. Ainda na memória, me vejo. Olhos arregalados perseguindo o movimento lento e ameaçador. Ele era como um monstro. Uma fera que espreitava as ruas da minha imaginação de guri. Tinha olhos profundos e uma barba espessa. Caminhava lentamente carregando o peso de um corpo cansado e maltrapilho. Nas costas, o temido saco. Os discursos que construíam a imagem daquele homem me diziam que era para “pegar as crianças mal educadas”. Era uma ameaça, um risco que nós meninos do Recinto da Viação Férrea temíamos. Não lembro o nome. E me sinto culpado por isso. É como se tivéssemos definitivamente tirado a humanidade daquele homem. Sim. Era um homem. E isso, agora, já com os meus quarenta e cinco anos, me faz pensar. Havia uma história sob o andar lento e pesado daquela criatura. Uma história que ia muito além de sua figura triste a perambular pelos trilhos da minha memória. História que nós, crianças, não queríamos conhecer. Não podíamos. Ele era o nosso monstro. Nossa criatura dos sonhos e pesadelos. Quando queriam nos assustar, diziam que ele ia nos “pegar”. “Olha o homem do saco...” e nós tremíamos.

Reduzira, ele, o homem do saco, toda a sua vida. Para caber em seu encardido saco, carregado nas costas. Às vezes penso que fazemos a mesma coisa. Nossas “pequenas” vidas. Carregadas em nossas malas, nossos computadores, nossos telefones, nossos carros... Somos um pouco mais “limpos” e vistosos. Mas a pobreza é a mesma. E a velocidade com que movemos nossos corpos, não nos distância muito dos passos cansados do “homem do saco”. Ele era o monstro da minha rua, da minha infância. Nós somos os monstros de nós mesmos. Em nossas costas, muito bem acondicionado, carregamos o nosso “eu”, nossa identidade, exatamente igual à de todo o resto. Lembro de ver o homem do saco sentado comendo um pedaço de pão. O tempo era dele. Apenas o tempo. Nada mais lhe pertencia. Só o tempo. Caminhava, sentava, parava, andava, no ritmo que queria. Os “novos homens do saco” são apenas fluxos. Tão despersonalizados que se confundem nos gosto, atitude, estilo e pensamento. E não podem parar. Jamais podem largar o saco, a mala que carregam sobre os ombros. Pelo contrário. Devem acompanhar o discurso que lhes obriga a sempre “evoluírem”, a sempre “aprenderem mais” a sempre “aperfeiçoarem-se” mais. A mala, o saco... deve estar sempre cheio. Carregado. Carregado de informação, de conhecimento, de certificados, de capacidades... e a rua se torna o mundo, e o mundo é um movimento de velocidade e não-pertencimento a nada. Somos sugados, devorados por um espírito que exige sempre mais de nosso corpo e da nossa mente. Até o esgotamento. Somos avaliados pelo que produzimos. E se não pudermos mais suprir adequadamente os “gostos” e desejos do grande mercado que orienta nossa ética e moral contemporânea, somos literalmente “excluídos”.

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ENTRE VERSOS E PROSA

PREFÁCIO AO LIVRO QUE NÃO LI Por Marcelo Pirajá Sguassábia

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uando é que sai o livro?”, perguntam-me isso sempre. Minha resposta, definitiva e inapelável: nunca. Se Deus quiser nunquinha, pelo menos no que depender de mim esse equívoco não será cometido. É confortadora a ideia de que a publicação virtual pode ser editada a qualquer momento, e que a coluna de jornal, tão logo seja lida (se é que será), passará a forrar gaiolas de papagaio. Eu vejo uma espécie de segurança nessas plataformas, de reversibilidade da obra e, consequentemente, da reputação de quem a assina. Nada de volume, de editora, de noite de autógrafo, de virar adorno de prateleira ou encheção de linguiça no currículo. O livro é um tijolo à prova de arrependimento, é obra catalogada na Biblioteca Nacional, passa de mão em mão e espalha-se mundo afora, ainda que seja pequena a tiragem. Se o escriba renega a cria, não há chance de reparar o erro. A menos que faça um recall, oferecendo recompensa por exemplar devolvido. Uma espécie de errata da obra toda. Um livro é um negócio com aura de testamento, de coisa pronta e acabada. Não há o que possa ser

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feito depois de impresso, e essa perspectiva é uma sentença dura demais. Nega ao pobre do escritor a chance do control Z. A supressão de um advérbio mal empregado, um ponto-e-vírgula que poderia muito bem ser ponto, uma palavra repetida dentro do mesmo parágrafo, a troca de um substantivo que faria toda diferença. Dizem que o Graciliano Ramos acordava de madrugada, cismando de mudar uma palavra, corria à gráfica e mandava parar as máquinas para fazer a correção. E sendo ele quem era: o imortal Graça. Mas o pior não são esses escorregões de forma, e sim os desarranjos de conteúdo. Um assunto escolhido na falta de outro melhor, um final sem charme, algo que na hora parecia bom mas que irá, lá na frente, macular o bom nome do autor e trazer constrangimento à descendência... Para completar, o pior e mais humilhante dos riscos que um incauto escrevinhador pode correr: encontrar o seu rebento em um sebo, naquela banquinha de 1 real, autografado e tudo. E ainda ficar sabendo quem foi o amaldiçoado que vendeu, por quase nada, aquilo que um dia valeu tanto.


ENTRE VERSOS E PROSA

DEUS E O DIABO NA CHESS PREMIER LEAGUE Por Escobar Franelas

Bem, amigos, estamos aqui na Arena Brasília, nesse país atlântico, essa ilha chamada Brasil. Lugar bucólico, paradisíaco, com um povo carnavalesco e radicalmente alegre. E, como todo grupo extremista, os brasileiros são uma gente sediciosa, bélica, homicida e suicida. Por causa da sua felicidade, são capazes de matar… e morrer! Mas nós, da rede universo, estamos aqui por outro motivo. Estamos aqui, pois enfim chegou o grande dia. Hoje acontece o match final entre aqueles que são considerados os maiores enxadristas de toda a história e de todos os tempos. De uma lado, o anjo de luz, o galã dos tabuleiros, o rebel way of life. De outro lado, o sisudo carismático, o hermético pragmático, o prático, o burocrático, aquele que tem a torcida mais fanática. Após os intervalos, teremos os comentários de nossos convidados especiais que estão aqui para presenciar esse duelo de titãs, na batalha do século. Ao perdedor será concedida a efemeridade, mas ao vencedor, a eternidade, esse troféu sem devolução ou retorno! Voltamos a apresentar esse encontro fenomenal, esse duelo fabuloso, com duas forças rivais. Uma partida que simbolicamente traduz o fim de uma era: quem ganhar leva tudo; quem perde, fica sem nada. Bem, vamos com nossos repórteres que tudo veem, tudo escutam e aqui retransmitem a realidade cruel desse encontro apocalíptico em Brasília, esse lugar quente, abafado, onde os coqueiros acenam de um lado como a dizer adeus e as palmeiras acenam de outro como se respondessem aos coqueiros um gesto involuntário de partida. Com vocês, Papagaio de Pirata! Boa tarde, senhoras e senhores, damas e cavalheiros, crianças e idosos. É… aqui estamos nesse monumental estádio de Brasília, especialmente para este confronto entre dois estilos opostos, táticas, diria que complementares de batalha. De um lado temos Deus, o cofiador de barbas brancas, sempre calmo, munido de seu silêncio sepulcral e avassalador. De outro, o diabólico, o loquaz, o rubro da capa negra, Lúcifer, sempre com seu sorriso maroto, uma de suas marcas. Desconcentrado e inquieto, ele está ali, na sala de imprensa, distribuindo autógrafos para seus adoradores. Nessa guerra de táticas e posturas, a pergunta que não quer calar é: quem ganhará essa parti-

da? Eu não arrisco palpite. E você, meu companheiro de trabalho, Pagão dos Santos, prostrado aí do outro lado da mesa? O que você vê que ninguém mais consegue enxergar? Antes de tudo, o meu “boa noite” a todos os espectadores. Eu também não arrisco palpite, Papagaio, até porque sou admirador dos dois estilos, tão distintos, tão sedutores e – como alguém já comentou aqui nessa transmissão – tão complementares. Parece até que um vive para dar luz ao outro. Seria para usar uma metáfora futebolística – como se Pelé estivesse para Garrincha, ou Messi para Cristiano Ronaldo em sua sombra. Ou Senna para Prost. Agora é aguardar e, quem tiver juízo, que espere até o final. Quem viver verá um embate transcendental. Bem, meus amigos, tivemos aí os comentários poéticos de nosso repórter. Agora vamos a mais um break comercial. Logo voltamos - é pá e pum, vapt-vupt, zás-trás. Terráqueos e terrenos, aluados e lunáticos, depois de um zap com nossos patrocinadores, depois de faturar o dinheirinho do leite das crianças e o trocadinho da feira da patroa, estamos de volta com nosso match final ao vivo. Uma partida para ficar além da história, um encontro transmitindo para todas as galáxias através das ondas celestiais da nossa rede universo. Depois de três dias, o grande jogo de xadrez entre Deus e o Diabo nessa terra do sol está empatado. Se por um lado, o grande lorde cedeu sua dama, num lance muito ousado e discutido nas redes sociais, ele também abriu mão de atacar com os bispos. Lúcifer, por sua vez, numa estratégia inédita, se desfez de um de seus cavalos, sacrificando também quatro peões. Aliás, Deus acaba de perder um dos bispos – os dois! – num erro que parece meio primário, e que pode lhe custar a própria vida. Mas também pode ser um movimento inesperado. Vamos aguardar o desenlace disso tudo! Nesse momento, Pagão e Papagaio, parece que o Diabo tem um certo predomínio do jogo, mas sendo os dois os reis das táticas, tudo pode acontecer. Lembrando que a partida não poderá durar mais que seis dias, pois, se isso acontecer, será empate, pois ao sétimo descansarão, conforme ditam as regras. Os nossos comerciais, por favor!...

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ENTREVISTA

“DUAS ANAS E UMA FLIP” Por Teresa Cristina Bendini

RITA ELISA SEDA, Jornalista, Biógrafa, Romancista, Cronista, Poeta, Fotógrafa, Autora de 18 livros, Santa-ritense de nascença, tem cidadania Vilaboense e se considera Joseense de coração. Ela nos conta nessa entrevista suas impressões sobre o Filme: “CORA CORALINA TODAS AS VIDAS”, que será exibido na FLIP, no dia 2 de julho, próximo, em telão exposto ao grande público. O Filme foi livremente inspirado no livro: “CORA CORALINA, Raízes de Aninha” escrito por Rita Elisa e por seu amigo e sociólogo Clóvis Carvalho Britto, em 2009.

1- Por que motivo seu Livro foi escolhido como referência para esse filme? Paulo Sérgio Salles, neto de Cora Coralina, muito nos apoiou durante a pesquisa para compor o livro. Depois do lançamento ele lançou o Projeto: “ Cora Coralina Raízes de Aninha”. Longa metragem baseado no Livro. Projeto que a ASACINE abraçou com muita distinção. O projeto foi selecionado pelo programa Petrobrás Cultural, com o patrocínio do BNDES. 2- Sabemos que o Filme já teve outra estreia além da que vai ocorrer na FLIP dia 2 de Julho próximo. Ele foi apresentado no FICA em Goiás, em agosto de 2015. Você estava lá? Qual foi sua impressão acerca do Filme e como ele repercutiu entre os conterrâneos de Cora? Sim. Houve uma mostra do filme no Festival de Cinema Ambiental (FICA). Na cidade de Goiás. Estive presente e me emocionei quando, ao final da sessão, os Vilaboenses aplaudiram de pé a exibição. Ainda mais porque a maioria que ali estava eu conheço ao longo de 16 anos. Conhecem a minha fascinação por Cora e pela cidade de Goiás.

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3- Seu Livro faz questão de desmistificar a figura da poetisa goiana, quebrando alguns paradigmas criados pela memória construída a respeito de Cora. Imagino que a construção de uma biografia faz o biógrafo ter uma relação afetiva com o biografado. Isso aconteceu com você e a Cora? Poderia narrar algum episódio que evidenciasse esse vínculo?

Comecei a guardar tudo que eu encontrava a respeito de Cora Coralina desde 1983, revistas, livros, jornais; gravava as entrevistas dela e colocava frases de seus poemas em minhas exposições fotográficas. Nessa paixão por Cora, quando tive oportunidade de morar na cidade de Goiás, não pensei duas vezes e me mudei para lá. Ao longo de quase sete anos eu aprofundei minhas pesquisas e, mais do que isso, eu conheci a sinestesia vilaboense que é impregnada aos poemas coralineanos.


Em 2006 recebi o título de cidadania Vilaboense, tornando-me conterrânea de Cora Coralina e senti uma enorme alegria na minha alma. Em 2007 finalizei o livro: ‘Cora em/cantadora Coralina’ e enviei-o para a editora. Em 2008 a diretoria do Museu Casa de Cora Coralina me convidou para compor junto com o sociólogo Clóvis Carvalho Britto um livro foto-biográfico em comemoração aos 120 anos de nascimento de Cora Coralina. Aceitei. Durante o tempo de escrita para o novo livro, viajei muito para colher depoimentos e documentos. Por essa estrada eu caminhei junto com Clovis e nos tornamos inseparáveis. Uma amizade que transcende qualquer entendimento humano. Eu respirava e transpirava Cora Coralina durante o dia e à noite ela me aparecia, várias vezes, me mostrando onde encontrar documentos perdidos e me alertando para acontecimentos futuros. Foi tão intenso que tinha noites que eu tinha a nítida impressão da Cora estar ao meu lado, em meu quarto. Com a ajuda dela encontrei bem mais do que eu esperava e Clóvis, também encontrou. A questão é que nem todos estão prontos para a verdade e por isso sofremos muito ao anunciar a quebra de vários paradigmas na vida de Cora Coralina. Ao mesmo tempo, alguns familiares de Cora Coralina nos davam respaldo para continuar a pesquisa. Apresentei o projeto do livro para a Editora Ideias & Letras, isso foi em junho de 2009, na época usei o que Cora Coralina me disse em sonho: ‘daqui a cinco anos terá um filme baseado no livro’. O grupo de avaliação editorial não entendeu muito bem o que eu falava e até argumentou: ‘não precisa apelar, Rita Elisa! Fica tranquila que o projeto Cora Coralina Raízes de Aninha está aprovado’. Para dizer a verdade... desde o título do filme até a

imagem da contracapa do livro, o encontro de documentos e anotações particulares a respeito da vida dela... foi Cora quem me falou em sonho. Foram tantos sonhos e coincidências que eu e Clóvis tivemos que nos equilibrar um ao outro, pois também havia a informação de que encontraríamos muitas pedras no caminho. Até hoje é um pouco doloroso falar a respeito, enfrentamos tantos obstáculos, mas vencermos e conseguimos apresentar aos apaixonados por Cora essa linda obra de amor à poetisa vilaboense. Ela merece. 4 - O que é o FICA e como a Cora Coralina se insere na questão ambiental hoje? Existe algum poema dela que queira citar? O Festival Internacional de Cinema Ambiental sempre traz em sua programação as questões ambientais. Cora Coralina era ambientalista desde criança, através de seus poemas podemos encontrar a Cora que se denominava “EU SOU A TERRA”, a mulher telúrica que irradiava amor à natureza. Amo todos os poemas de Cora, fica difícil apresentar somente um. Porém, dentro desse contexto telúrico, o mais rico é o que ela deixou escrito em seu “Epitáfio”: “Morta... serei árvore / serei tronco, serei fronde /e minhas raízes / enlaçadas às pedras de meu berço / são as cordas que brotam de uma lira”. 5- Haveria algum paralelo a se fazer entre Cora Coralina e Ana Cristina César (Poeta Marginal) homenageada pela FLIP em 2016? Duas retas paralelas: Idênticas no primeiro nome e no amor à Literatura; antagônicas na vivência.

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ENTRE AUTORES

RICOLA DE PAULA Por Elizabeth de Souza

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Portal Entrementes se orgulha em apresentar o projeto ENTRE VERSOS E PROSA, que tem por objetivo catalogar os escritores da contemporaneidade, além de criar um canal de dialogo entre leitor e escritor, de modo a valorizar a produção literária do Vale do Paraíba e região.” (George P. Furlan) Belas e formosas donzelas que conduzem por caminhos misteriosos, os que buscam a si mesmos e o próprio coração: Calíope e Erato. Poesia – a expressão de sentimentos através de versos, rimados ou não, livres ou não. Carrega em si a beleza das palavras, aliadas ao sentimento profundo de quem a escreve, refletindo de maneira plena, a essência humana. A prosa é um texto onde predomina os parágrafos e sua forma nunca será com versos e rimas, apesar de existirem textos que são considerados prosas poéticas. Dentro da Prosa estão as crônicas, os contos, as ficções, o romance e as novelas. O verbo se cristaliza e cria formas para o deleite dos homens! E o nosso primeiro escritor é Ricola de Paula. Ricola de Paula – O Poeta Multifacetado O Poeta Ricola de Paula nos recebeu com muito carinho em sua casa, no Souza. Um café quentinho com um queijo das bandas de Minas Gerais, sobre o fogão de lenha, nos esperava. Joseense de nascimento, sempre participou ativamente do cenário poético-literário de São José dos Campos. Desde os anos 80, ainda no Canto da Cultura e Rádio Aguapé, onde sempre declamou seus poemas com muita intensidade. Hoje, ele vive no Souza, onde além de escrever seus belos e fortes poemas, também é apicultor. Afinal colher mel é uma arte e uma ciência, que se junta com a filosofia de vida do Poeta, misturada com um lado oculto, envolto num laboratório alquímico. O Souza é um bairro da cidade de Monteiro Lobato. Um lugar paradisíaco e convidativo, do qual não temos vontade de voltar pra casa. O Bairro fica na belíssima Serra da Mantiqueira, infestado de cachoeiras e pode-se ouvir o som dos pássaros cantando e sentir o cheiro do mato no ar e do café que sai das casas dos moradores, espalhando-se pelas nossas narinas. A casa do Ricola fica no meio das árvores, arbustos e

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flores. Ao fundo, o rio com o som mântrico das águas do rio que desce da Serra. A casa é aconchegante, bela, com fogão de lenha e violão. A arte do Ricola junto à tecnologia... Sobre a mesa um tablet onde ele posta poemas para o mundo. Seus poemas transbordam conhecimentos variados, sentimentos profundos, emoções fortes, de forma prazerosa ele brinca com as palavras, seus sons e grafia de forma magistral. Uma escrita cativante que nos carrega para uma realidade multifacetada, contextualizando o mundo que nos cerca, da forma mais fiel possível. A realidade da ordem e do caos contemporâneo, que se divide em concreta e virtual. Uma realidade apalpada com mãos e teclado. Um frio cortante das montanhas nos toma de surpresa e a tremular saímos da casa do nosso querido poeta Ricola de Paula, tarde da noite... nem percebemos o tempo juntos, passou tão rápido.

Ricola de Paula escreve no Portal Entrementes e praticamente produziu um livro com os poemas que posta em sua coluna. Obras de Ricola de Paula:

Antologia da Poética de São José dos Campos (1981, 1985, 1987,1988). – Poesia: “Sirva-se da minha seiva/Poesia não gera violência (1983); “Ria de Arte” (1984); “Falha Magnética” (2002); “Agenda Curumim” (Editora Tribo / 2003). – Literatura Infanto Juvenil: “Quem fala é que é” (2004). – Zine: “Ouriço” (2006) -Livro da tribo (2010) – Poesia Coletânea: “Carlos Drummond de Andrade” Sesc Brasília DF (2010); “AsasVespas” (2011).

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ENTRE VERSOS E PROSA

A QUEDA DA BASTILHA...UMA HISTÓRIA DE AMOR Por Teresa Bendini

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les formavam um casal perfeito. O interior da caixa, aconchegante e macio, favorecia o namoro. Passavam o dia se declarando um para o outro. Durante a noite se esfregavam loucamente enroladinhos em papel de seda branco e perfumado. No outro dia, o papel amassadinho, revelava a noitada. Afinal, entre “as quatro paredes” daquela caixa de papelão tudo era permitido. O lojista nem sequer desconfiava que os dois faziam amor lá dentro. Pela manhã, a caixa era aberta e os sapatinhos levados cuidadosamente até a vitrine da loja. Eram amparados por suportes de acrílico prateados ou dourados e se exibiam orgulhosamente sobre um vidro revestido de cetim. Julia e Jean viviam assim há meses. Haviam se apaixonado imediatamente logo que foram colocados lado a lado naquela caixa de sapatos. A partir daí, souberam que ficariam coladinhos para sempre. Tinham tantas afinidades. Os dois eram do mesmo tamanho, os dois tinham o mesmo salto alto, os dois eram de verniz. Os dois possuíam uma fivela banhada à ouro. Eram pretos e da Lanvin. Da vitrine observavam o movimento da rua chique em que moravam. Seria bom se fossem comprados. Poderiam se exercitar um pouco. Passear juntos. Rodopiar em salões de festa até ficarem exaustos. Um dia a coisa aconteceu de fato. A dona que os compraria chegou vestida num tailleur azul. O tule que enfeitava seu chapeuzin h o simpático

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bem que podia ser da França, país onde sonhavam passar a lua de mel. É que agora entendiam tudo sobre moda e viagens, de tanto ouvir as conversas das “socialites” que entravam na loja. Nancy foi rápida! Firme e decidida, nem pechinchou. Experimentou e pagou. Foi amor à primeira vista. Iria usá-los numa festa de casamento. Era a madrinha. Foi assim que eles foram parar nas ruas da metrópole. Mas “passo a passo” terminaram por se desentender e brigar. Era só Nancy calçá-los e a briga começava. Por que será? Logicamente a moça foi culpada, visto que ao caminhar, os separava inevitavelmente. Enquanto Jean ia pra frente, Julia ficava pra trás. Depois era a vez de Julia, que não podia olhar para o Jean, que havia ficado pra trás. Sendo assim começaram a ver o mundo de outras formas, tendo ideias diferentes sobre isso ou sobre aquilo. Maldita hora em que saíram da vitrine da loja de sapatos. Agora nem mesmo na caixa ela os guardava mais. Nancy tinha deixado de usar os dois em festas. Preferia usá-los em locais mais necessários, como exposições, idas ao médico, shoppings e mercados. Até dormiam separados, quase sempre esquecidos e jogados. Um embaixo da cama e o outro embaixo do sofá. E um dia despertaram em um centro de Candomblé. Assim os dois só se viam de vez em quando, em breves momentos, quando a moça relaxava e parava de se movimentar. Julia metida no pé esquerdo começou a olhar o mundo com olhos de Eva. Quase sempre se revoltava ao vê-lo tão dividido. Queria boicotar tudo. Subverter aquela ordem desvairada onde os mais fortes mandavam e os mais fracos obedeciam. Estava cansada de ser “pisada” pela burguesa Nancy, que preferia chamar de “Patricinha”. Mas seu namorado Jean discordava plenamente desse pensamento subversivo. Metido no pé direito, ele defendia a ordem instalada. Achava que a miséria era culpa dos desqualificados, preguiçosos, bandidos que não queriam saber de dar duro. Seria muito bom se o estado de São Paulo se tornasse um país à parte. Separado da Fe-


deração, com uma legislação própria, que mandasse os nordestinos de volta para sua terra e os pretos para a África. Sendo assim, os dois começaram a se desentender, embora raramente dormissem na sua caixa. Conversavam em dias de manicure, ou em dias de Cinemark, quando a Nancy parava quieta. Nessas horas, os dois quase sapateavam de raiva. Porque tinham pensamentos diferentes em relação à política, lazer, educação e finanças. Jean idolatrava o estilo de vida de Nancy. Julia odiava. Jean batia o pé direito defendendo o interesse da elite branca e Julia, metida no pé esquerdo, o interesse do proletariado. Um dia a Nancy cruzou as pernas e o Jean foi parar do outro lado. O mesmo ocorreu com Julia, que mais à direita, examinou sem se exaltar o ponto de vista do namorado. Afinal, estavam ficando velhos. Já era tempo de compreenderem as divergências que os mantinha separados. Nesse mesmo dia Nancy foi vítima de um assalto. Estava subindo a escada rolante de um Shopping, quando um rapaz destrambelhado agarrou violentamente a alça de sua bolsa e se mandou, levando com ele seus documentos, dinheiro e cartões de crédito. Nancy foi rápida e certeira. Arrancou o sapato do pé esquerdo e o arremessou na cabeça do gaiato. Era boa de pontaria, a danada. Assim, o garoto acabou nocauteado por uma sapatada de Julia. Que bizarro!

Logo ela que defendia ferozmente a visão marxista de mundo. Logo ela que lamentava a desigualdade social existente. Logo ela que os via como reféns de um sistema cruel e avassalador. Que os encarava como o verdadeiro estopim da revolução socialista. Nesse momento Jean não se conteve. Buscou na sua garganta dourada uma voz humana um tanto engasgada e revelou a Nancy toda história de amor que fazia daquele par de sapatos os amantes mais esdrúxulos desse planeta. Depois disso, nunca mais foram separados. Um dia, Nancy decidiu se casar e exigiu que os dois amantes lhe conduzissem até o altar. Afinal, Jean e Julia haviam lhe ensinado tudo sobre a boa convivência. Os noivos foram passar a lua de mel em Paris. Enfiaram Jean e Julia na velha caixa de sapatos e os levaram com eles. Mas no palco da Revolução Francesa, Julia sentiu-se agitada. Imbuída por um espírito Rosbesperiano, resolveu torcer o pé de quem a pisava tanto. Afinal a Nancy era como a Maria Antonieta, alienada, egoísta, chegando a ser mesquinha frente as necessidades dos mais fracos. E num acesso de fúria, perdendo de vez “a cabeça”, forçou a queda da burguesa Nancy, que ao cair, bateu a nuca na guia de uma calçada. Le nom de la rue? Bastille!

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ENTRE CULTURA

LÍNGUA BRASILEIRA Por George de Paula Furlan

J

á apareceram como possibilidades as denominações “língua nacional” e “língua brasileira” nos debates para as Constituições de 1824, 1890 e 1946, mas (as denominações) não chegaram a ser concretizadas. A identidade da nossa língua fora defendida por personalidades ilustres, como: José de Alencar, Said Ali, Macedo Soares, Mário de Andrade, entre outros. Com destaque ao romancista Alencar, perceba nos trechos a seguir, extraídos, respectivamente, dos pós-escritos de Diva e Sonhos D’Ouro, que ele estava certo de que não se pode separar a língua dos seus usuários, de modo que os idiomas encarnam, acompanham e refletem os destinos das nações a que servem, que transplantada para o Brasil, a língua portuguesa tinha, irrefreavelmente, de diferençar-se da língua praticada em Portugal: “A língua é a nacionalidade do pensamento como a pátria é a nacionalidade do povo, não é obrigando-a a estacionar que hão de manter e polir as qualidades que porventura ornem uma língua qualquer; mas

Moema - Victor Meirelles

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sim fazendo que acompanhe o progresso das ideias e se molde às novas tendências do espírito humano (...). Desse modo não somente se vão substituindo aquelas edições que, por antigas e desusadas, caducam, como se estimula o gosto literário, variando a expressão que afinal de tanto repetida se tornaria monótona. De resto, essa é a lei indeclinável de toda a concepção do espírito humano, seja simples ideia, arte ou ciência: progredir sob pena de aniquilar-se”. “O povo que chupa o caju, a manga, o cambucá e a jabuticaba, pode falar uma língua com igual pronúncia e o mesmo espírito do povo que sorve o figo, a pera, o damasco e a nêspera?“ No Brasil o padrão de língua estabelecido é baseado nos textos literários lusitanos do século passado. Eis aí a problemática, com tentativa de resolução no chamado “Novo Acordo Ortográfico”. Vale salientar que um dos principais fatores que motivou este acordo foi nossa predominância lusofônica, pois representamos mais de 80% dos indivíduos que fa-


lam o português; também a influência do nosso falar sobre outros países lusófonos, devido à expansão da indústria televisiva brasileira. Nosso idioma, tecnicamente, pode ser considerado uma variante do português europeu e, historicamente, evoluiu separadamente, a partir do século XVI, devido à miscigenação das línguas que já existiam por aqui com as que vieram de fora e, hoje, apresenta diferenças estruturais importantes, de ordem lexical, sintática, morfológica e fonética em relação à língua colonizadora. Esta diferença gera incorrespondência entre o padrão e a nossa fala, caracterizando-a como uma fala marginal (não oficial). Portanto, necessitamos dum padrão de língua baseado no que falamos aqui. Quando nos comunicamos por meio da fala, pensamos simultaneamente, assim se dá o encadeamento da linguagem, e pensamos com a língua que nós utilizamos – com que outra haveríamos de pensar? Veja que quando aprendemos outro idioma, e ao nos utilizarmos dele para nos comunicar, pensamos conforme a sintaxe deste idioma. Assim, a problemática da língua no Brasil não somente gera um prejuízo à comunicação, mas também ao pensamento de modo geral. Veja o que diz o historiador Jean Baptiste Nardi sobre a língua brasileira, em seu artigo “Cultura,

Identidade e língua nacional no Brasil: uma utopia?”: “Negada a possibilidade de expressão pela língua falada na sociedade – por não corresponder à língua de comunicação oficial – limita-se o pensamento. O discurso permanece no nível do solilóquio, das relações familiares ou da vizinhança. A sociedade perde assim a oportunidade de aprender sua mundividência, um pouco dela mesma. Se a língua de comunicação, oficial e ensinada, é muito diferente da língua falada, ela introduz confusões na expressão e, simultaneamente, no pensamento: o indivíduo não pode pensar de maneira clara e lógica. Em conseqüência, a sociedade perde outra oportunidade que é aumentar suas capacidades de conviver em harmonia com o meio e a desenvolver-se. Em outras palavras, a língua que não permite a completa expressão do pensamento não é representativa da sociedade da qual pertence; ela cria uma situação contrária aos interesses da mesma sociedade”. Em suma, uma língua oficial que não leva em consideração as transformações derivadas do uso perde sua representatividade, sua capacidade de coesão e sua finalidade que é ser o instrumento de expressão da sociedade. Como, nessas condições, não acreditar na necessidade de reformas na língua oficial do Brasil?

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ENTRE FILOSOFIA

SOB FRESTAS Por Alexandre Lúcio Fernandes

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gesto de espreitar antecipa qualquer dedução, qualquer limite que decora o mapa da alma. E o corpo padece, atiça as ranhuras pelas quais os medos deslizam sorrateiros. Seguir em frente faz-nos ter uma existência furtiva que delibera as rotas sem a certeza do querer, sem caracterizar exatamente a textura de nossas amplitudes. Há um sobrepeso na atmosfera que precipita a letargia dos dias, a falsa consciência de véus obscuros no céu e nos becos. E o mundo se torna conivente com as limitações e todas as falhas pertinentes nas fronteiras do âmago. Uma escuridão densa contamina o ambiente, resultado de um manto negro de nuvens, oriundas da poluição humana. Mas ultrapassa as barreiras físicas. É um negror de caráter mais intenso, residente no espírito, no céu interno das massas humanas. Não é visível, tampouco transponível. Mas é presente, muito latente dentro do perceptível território por onde a alma transita. E medos culminam sob uma frieza inconsequente, refém de atos transcendidos pelas rachaduras dos homens, pelos becos perigosos erigidos nessa corrupção dos sentimentos tão eloquente – e infeliz – nos dias de hoje. Em meio a essa redoma opaca que cobre as cabeças, a esperança retroalimenta as sensações engavetadas, espanadas pelo desajuste dos dias negros. Sobra a coragem de espionar trincas nessa couraça que se criou em razão da iniquidade tão abundante por aí, desse esvanecimento que desembrulha tensão e tristeza pelos detalhes da vida. Não há senso que se descubra, razão que se oculte em detrimento de nascentes alheias, por luzes distintas e paralelas aos desejos mundanos. Mas as frestas escapolem ao olhar humano, as delicadezas camuflam-se nas ininterruptas piscadelas. Os intransitáveis caminhos subvertem as emoções, sobretudo aquelas tão embebidas com o cálice do amor. Mas não inibe a capacidade de sobrepujar as derradeiras faces de um mundo doentio. E a vontade é força que agiganta. Porém, haja habilidade para desvencilhar os enigmas, as neblinas e as camadas que circundam os reles espaços por onde ainda cinge

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luz. Em meio à cegueira induzida pelo ciclo vital desequilibrado, raro é debulhar a alma nos parcos raios de luzes que esquivam das armaduras de dor e tristeza, de demasiada matéria desumana. Contudo, não é efêmero o que se busca, nem desprovido de valor. Em meio às dificuldades de se locomover na contramão dos dias nebulosos, abençoado é quem consegue, nessa insistência em investigar o mundo, encontrar brechas na penumbra e ser raiado com a luz do amor. Porque em meio a tanta cegueira, enxergar é fruto de esperança.


Qual é a da poesia? oesia não é um crime premeditado, em P que o escritor forja álibis ou procura esconder pistas sobre um “assassinato”

de um indigente qualquer. Pode até vir a ser, se dominado, o poeta, pelo mal-do-tempo. Porém, na maioria dos casos, não é delito sabido. E é aqui onde o perigo reside. O poeta simplesmente atira seu projétil-verdade e acaba ferindo estruturas diversas, inclusive os andaimes que o sustentam. É claro que cometo algumas gafes, como por exemplo dizer “Eu vou escrever um poema”. Mas todo homem tem o direito de errar uma vez na vida. Pensando assim, talvez o crime poético esteja aí, na falácia impensada e sem juízo de quem legitima sua escrita em pulsões distraídas e cobertas de uma volúpia insensata. Mas também é certo que, no maior do tempo, o poeta, aquele de verdade, costuma escovar os cabelos do silêncio e åpermacer absorto, tentando se encontrar. Quem aqui irá dizer que não é necessário escutar-se, que não é importante ouvir seu próprio barulho interno, refletir, amar ou odiar a si mesmo? Escrevo como quem existe. É mais do que lógico: ninguém hesita em existir. E não me venha dizer de defenestradores de quinta categoria, ébrios que ateiam fogo em suas carcaças doentias ou de loucos arrependidos. Se, por acaso, a poesia for uma atitude criminal, partirei do princípio de que ela tem o seu lado passional. E isto também é fato, indubitável. O poeta escreve por que ama, e também porque odeia. Odiar também é amar, amar inversamente. Se você me perguntar o que é Poesia, eu simplesmente agirei da forma mais vaga possível. Eu não sei explicar, sinceramente. Não conheço sua face primaz, primitiva. Eu apenas suspeito de tudo. Acredito até que ela é uma “coisa” que não possui conceituação plausível e humana. A poesia transcende, duplica-se, quadruplica-

-se, perde-se em si mesma por tão gigantesca ser. Para mim, ela sempre foi algo maior que eu, muito maior, mil anos-luz maior que eu, um universo maior que eu. E sempre será uma explosão de música, de nervos, de pensamentos, surgindo de um ato quase sempre solitário, intransferível e altamente singular. Se há alguma coisa que desejo nesse mundo é um dia escrever um poema. Mas sei que isso me ocorrerá apenas se eu não desistir no meio do caminho ou tropeçar nas pedras da vida, porque, como diria o nobel Elias Canetti, cada poeta que nasce ajuda a tecer um irrisório fio na poesia-una, na poesia total do mundo. Por isso sigo, lançando lanças em combates diários e quase sempre madrugadores. Poetar significa, entre tantas outras coisas, matar o Amor para que ele sobreviva sem a pieguice. Significa desbastar o poema para que fique somente o essencial, como tantos assim já disseram. É ter o verso como uma escultura ainda não lapidada: o rosto está lá dentro, sendo preciso descobri-lo extraindo pedra. Daí a dureza de escrever, o suor. Há quem pense que o texto poético se faz derramando sentimentos no papel, inflamando o ego da namorada, chantageando os amigos com loas, descrevendo as belezas do mundo, registrando nossos melhores momentos no diário. É também, mas isso é o mínimo, e justamente o contrário. Não há de ser desabafo somente, poesia revela a realidade sem intermediários e filtros, ou é o próprio aparelho filtrante. Uma comoção, sem choro ou com, psíquica, nunca servindo para maquiar ou obscurecer o cotidiano, mas para apanhar os detalhes e as distrações que tornam o homem mais verdadeiro e intenso. A poesia também faz sangrar, é preciso lembrar disso. Duvida? Por Germano Xavier

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Saudação ao inverno E o inverno chega Um poema para celebrar o inverno ainda não. Mas tempo é inexistente. Uma invenção humana. Estamos aqui há uma eternidade... bom inverno a todos! E os irmãos que estão nas ruas? E o frio que mata... e o inverno de nossas almas? Utopia, mudanças, transformações. Qualquer hora desta chega o trem e embarcamos na estação. Enquanto isto sonhar, realizar, amar... E deixar uma pegada para outras gerações. Tudo se faz breve... Tudo é urgente! Silenciemos a mente. Por Joka Faria

Historinha da criação No dia 3/12/1919 Pierre-Auguste Renoir chegou no céu e logo foi fazer arte na paleta de cores do Criador e, desde então, passou a existir a saíra de sete lenços, com um lenço verde, outro cinza, um lenço azul celeste, outro amarelo um lenço preto, e por fim, um lenço azul anil, o passarim mais bonito do Brasil. Por Domingos dos Santos

Do livro “falha magnética” Posso agasalhar Meu corpo em suas pernas. Arrancar sua pele Com ácidas carícias. Deixá-la ser penetrada pelo orgasmo do meu sol mágico. Posso dedicar meu signo. Dedilhar seu sexo. Penetrar “Tao” como sou, sublime, pleno... Seu universo.

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Por Ricola de Paula

Djarmai. Guarda-me 1 GUARDA-me 1. Deita-se a luz no verde da montanha e a estrada longa corre como rios fica para trás uma saudade estranha [no sonho pássaros e assobios] A cada passo mais longe se resGUARDA campo florido de subtil encanto cidade que decerto já me aguarda onde a neblina se transmuta em canto Um pouco de mim deixo às manhãs de Maio [Aos meninos e aos acordes de violão lego pegadas matinais no empredrado] Deixo marcas de insónias no colchão uma morna trauteada, quase um fado e um abraço cantado para Djarmai. Por Luisa Fresta

O tempo é um verso inacabado E o tempo passa as revoltas passam. E a vida se esvai... A ampulheta do tempo esta ai. E o que fazer diante.. de nossa insignificância? Cantemos a vida dancemos cirandas. E a musa se faz musa... Enquanto o casal se ama. Dançar, dançar, dançar cirandas. O universo... se abre o tempo é um verso inacabado. Quero mergulhar dentro da estrela nascente e me fazer esperança. A mulher e o homem no desenho nos faz amar a vida. Por Joka Faria

Fuziote OVNI tirou raspão de mim com pressa de telegrama urgente, ou foi um beija-flor adolescente? Por Domingos dos Santos


Cantada de amor As flores deram brilho a primavera As borboletas encantaram o planeta O poema ouviu a voz da caneta E nasceu esta poesia do poeta sem era. A noite se deita em minha lembrança O dia acorda nos braços da esteira Ao silêncio dos sons da outra festeira Que rompeu a promessa desta esperança. Os rios correm pelo estreito caminho Eu me deito no eterno desespero da lua Ao cântico da voz do péssimo carinho Que nasceu no abraço morto e frio Dos mares com a simetria da rua Que as vezes é feliz e as vezes sombrio. Por Sanjo Muchanga

(eu me vejo em você) Olhe agora por cima do muro. O que se vê? O que se vê? Será possível sobreviver às verdades pela metade aos desejos e a ansiedade pelo que está por vir? Observa só. Entender é diametral a compreender diversidade é só uma palavra caso não haja eco em atos e atos e atitudes o resto é silêncio omisso, reticente, covarde. Pois então. Correndo na direção errada esse caminho não nos levará a lugar nenhum, nada. Olhe por cima do muro: Não é tão difícil. Alice através do espelho (eu me vejo em você) Por Wallace Puosso

Doce Encanto Você de fios loiros e mecha rosada; Eu a observo de meu distante farol; E pergunto-me como tu és chamada. Enquanto a contemplo sob este sol. Sei que esperas o rumo de tua casa; Mas apenas anseio saber como chamas. Será que já adquiriu longas e altivas asas? Para assim alcançar o que te inflamas. Pergunto-me a que anseios tu aspiras. Sei que gostas de Chaplin e de cinema; Gostaria de saber os filmes que tu admiras. E mais importante, por qual nome tu acena? A contemplando de um lugar distante; Pergunto-me quais canções costumas escutar; Ou quais romances ostentas na tua estante. Seria audácia o teu nome eu perguntar? Ao menos um olá eu gostaria de lhe dizer; Mas como um vulto da minha vista somes; E eu fico nas sombras esperanto a ti rever. Se ao menos eu soubesse o teu nome... Por Gustavo Souza Silva

Eros e Psiqué Tudo vale a pena Quando a alma não é pequena Psique é grande na sua nobreza Na sua coragem, na sua força feminina. Se todos os anjos Cantassem as mais belas canções De nada valeriam se não falassem de amor Poder maior que sustenta o mundo Eros que a tudo cria e a tudo principia. O véu da dualidade nos cobre levemente Rouba a Consciência, adormece o ser Mas quando Eros se une a sua amada Psique Brota a Síntese, Unidade Absoluta Lei maior que rege todo o Cosmos. Por Elizabeth de Souza

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Oaristo Por horas e anos monologuei contigo e o teu silêncio foi uma terceira pessoa entre mim e ti. E, nas lacunas de minhas frases e sílabas, repercutia apenas o eco magro de talheres digladiando-se, feito espadas e sabres, sobre o branco ringue dos pratos... Comi o teu silêncio. Comeste o meu tedioso discurso de épocas e circunstâncias. Solilóquio de um fôlego sem boca, medo do mofo que o silêncio traz... E sobre a mesa, isolando-nos, jaziam corpos em cemitérios, onde éramos obeliscos separados, distantes, incomunicáveis apontando não sei que infinito de solidão nas alturas... E assim avançamos, eu e tu, em direção a madrugadas e invernos, à luz de velas e pirotecnias arcaicas, ao som da minha voz em cânticos e digressões. balé da língua na boca, homilias e desvarios que a lua olvida... E eu te falei do amor entre os gregos, de palimpsestos perdidos, da medicina medieval e de poetas modernos e antigos... Eu recitei para ti todos os versos que sabia de cór, eu te disse todas as palavras e sílabas que fora capaz de conhecer, e depois de tudo eu te disse então: - Eu te amo! - Eu te amo! E então eu gritei que te amava, mas tua inclinação sobre a mesa, teu sorriso esquecido no rosto, o teu nariz me disseram sem desvelo o que pensavas do amor e o que de azul me guardavas em teu céu desbotado. Nada, nada houve em ti ao longo dos anos que não fosse um breve bocejo... E como um domingo extenso e monótono em que há nuvens e trovoadas, mas não chove, continuas ao meu lado muda e silenciosa e eu a falar, porque o silêncio seria agora inútil como um suicídio na senilidade... E hoje eu ainda tartamudeio vogais, tentando dizer o teu nome, mas sei que tenho uma amante maneta a quem faltam olhos para ver a luz e as montanhas. Todos temos amores manetas e amamos um espectro de sol entre as árvores... por Marcus Groza

Todas as coisa que tenho, ou acho Mão cheia, mãos leves Tudo que se sonhava Nada e tudo num bolso Estrada, terra, poeira E neste segundo, luz Viver e morrer poesia Distraidamente só Meus pés vagalumeam Iluminando meu caminho Já vou tarde trançando Alguns versos, palavras Desconhecidas palavras Por Paulo Vinheiro

Lua Noite estrelada e olhos serenos, iluminados pelo céu. Poeta solitário só se sente completo, quando vê a Lua no céu. Por Joana D’Arc

Cantiga de Amor [3505] Te amo tanto, porem tu correspondes de mentira! Nunca vi teu corpo nu! Tua roupa ninguem tira! Ninguem mesmo? Acho que o cu tu ja deste! E ha quem prefira tua xota, pois tutu sei que pedes, si és da lyra! Não, não negues! A Chiquinha, tanto tempo attraz, não tinha pejo algum e confessava! Si não queres meu amor, deverei, talvez, propor que tu sejas minha escrava? Por Glauco Mattoso


ENTRE VERSOS E PROSA

AQUILO TUDO / ALGUMA COISA Por Jorge Xerxes

É certo que havia vivenciado eventos de natureza telecinética. Como aquela noite no Rio de Janeiro, onde o apartamento, no último andar do edifício, fora inundado pela chuva que, súbita e inusitadamente, atravessara o telhado. E aquela tigela invertida que chamamos de Céu, Sob prisão rastejante vivemos e morremos... Tudo é um Tabuleiro de Xadrez de Noites e Dias Onde o Destino joga com os Homens como Peças. - Rubaiyat, de Omar Khayyam Outro acontecimento, de natureza improvável, foi a vez em que seu apartamento, já transmudado para a cidade de São José dos Campos, fora inundado por uma simples torneira deixada aberta numa manhã em que faltou a água da rua. Fato é, quando o abastecimento foi restabelecido, não bastou a torneira aberta, sendo necessária também a ocorrência inusitada de entupimentos, duplos e simultâneos, dos ralos da pia e daquele do banheiro. A água escorreu pelo piso inundando não só o apartamento, como também desceu pelas escadas de incêndio, esparramando-se pelo hall do edifício e o salão de festas. Muito suspeita a coincidência.

Seja modesto, correto, moderado, coma pouco, contente-se com alguns bens para que o vergonhoso amor pelo dinheiro não possa macular a glória da sua ciência divina. - Firmicus Maternus Parece evidente que a elevação da umidade do ar catalisa os eventos de natureza telecinética, servindo os íons O+ e os ânions OH- de veículo para o fluxo de corrente energética, que posteriormente resultará em efeito mecânico sensível e inteligente, operado a média distância. De certa forma, estas ocorrências corroboram para a transcendência das faculdades conscientes para aquelas instâncias inconscientes com a mesma magnitude e sentido de orientação em contrário. Para qualquer visão deve haver um olho adaptado para aquilo que existe para ser visto. - Plotino 4qu1l0 7ud0 d3v14 519n1f1c4r 4l9um4 c0154. p0r 5up0570, r3m373 40 3qu1l18r10 d45 f0rc45 c0n57ru71v45 3 d357ru71v45 n4 n47ur324.

Você não sabe, Esculápio, que o Egito é uma imagem do céu, ou, para ser mais preciso, que tudo que era governado e que se movia no céu desceu para o Egito e foi aqui transformado? Se a verdade foi contada, a nossa terra é o templo do mundo inteiro. - Hermes Trismegisto Some-se a estes, o terceiro evento de natureza inexplicável, quando o móvel inteiro da cozinha, com fogão, pia e prateleira com louças, veio abaixo, desabando no chão de uma única vez. É interessante que todos estes fenômenos estão associados ao elemento água: o último acontecimento, mais recente, de colapso súbito do móvel da cozinha deu-se num sábado chuvoso.

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ENTRE CULTURA

“Persepolis” – HQ Por Rodolfo Salvador

Ocidente versus oriente: a manipulação da cultura em prol de uma falsa versão da história, o caso do quadrinho “Persépolis”.

O texto a seguir tem algumas ressalvas, já que muitas das questões abordadas passaram por transformações. Atualizei com notas durante o texto. O texto busca demonstrar o papel dos EUA na construção de governo alinhados aos seus interesses ao redor do globo mesmo que isso resulte em governos ditatoriais pouco interessados nas questões sociais, nos direitos humanos, etc. como foi o caso do Irã e também do Brasil em 1964. Em suma, o texto é uma tentativa de denunciar o, cada vez mais presente – inclusive hoje no Brasil, esvaziamento do espaço público, dos direitos sociais e políticos e o crescimento do autoritarismo.

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Durante grande parte do século XX diversos setores da sociedade vislumbravam o século XXI como um período onde os avanços científicos garantiriam ao mundo uma certa estabilidade. Porém a primeira década do novo século trouxe apenas uma série de fatos negativos para o pleno desenvolvimento da sociedade humana. Terrorismo, a continuidade da destruição do meio ambiente na busca desenfreada por novas reservas de commodities, suspensão dos direitos civis frente a interesses corporativos, privatização do espaço público, esvaziamento cultural, são apenas alguns exemplos das consequências do falso casamento ocorrido após a queda do muro de Berlim e a consequente desagregação do mundo soviético – que significou para alguns o “fim da história” – entre a democracia liberal ocidental e o neoliberalismo. O ano de 2001 pode ser visto como um marco histórico do século XXI por ter comportado logo em seu início a resposta para a agenda política internacional encabeçada pelos norte-americanos, cuja intenção era colocar na ordem do dia para todo o globo a introdução – mesmo que forçada – do sistema capitalista de mercado em conjunto com um pseudo regime democrático. O refluxo de anos de política externa violenta invadiu o território norte americano e tirou milhares de vidas, além de ter destruído um dos símbolos do capitalismo americano – o Word Trade Center – e ter destruído parte do cérebro militar americano – o Pentágono – tal fato evidenciou para todo o globo a existência de grupos organizados que usam o terror para combater o terror. O ano de 2013, onde a guerra ao terror perdeu parte de seu fôlego e uma onda revolucionária – que ainda não pode ser analisada por completo – varreu parte do oriente médio e inspirou no ocidente o surgimento do movimento dos “anônimos”, que por todo globo se opuseram contra o sistema do “Wall Street”, sob a bandeira dos 99% que não tem nada contra o 1% que tem tudo, evidenciam uma nova ordem geopolítica para o mundo. Outro resultado que se conecta com as políticas bélicas colocadas em prática pelo EUA, durante os primeiros anos do século XX, foi o ressurgimento do Irã como um dos principais atores políticos do Oriente Médio, após a guerra do Iraque [1] . Enfraquecido desde a guerra Irã/Iraque, o país do ex-presidente Mahmoud Ahmadinejad é hoje uma grande pedra (de plutônio) no coturno dos EUA [2] . Um dos amargos refluxos da guerra levada a cabo pelos americanos no Iraque foi o surgimento de uma série de movimentos contrários


às políticas norte-americanas, fato que fortaleceu o Irã, uma vez que os EUA está perdendo sua moral enquanto “força policial do mundo livre”, moral baseada no modelo teórico da CIA, que bebe nos escritos da filosofa alemã Hannah Arendt [3]. Esse enfraquecimento do discurso policial norte americano possibilitou que o Irã, voltasse ao cenário político do Oriente com força renovada. Isso sem contar o poder adquirido pelos países exportadores de petróleo, dentro da lógica comercial mundial e ainda as já citadas convulsões sócias, chamadas de “Primavera árabe”, que retiram do poder muitos lideres que de certa forma eram aliados dos EUA, como por exemplo, o ex-presidente (ditador) egípcio Hosni Mubarak, aliado americano na guerra ao terror, acusado por movimentos sociais de prender e enviar para as bases militares americanas suspeitos de terrorismo. Porém o que queremos tratar nesse texto é da importância das mídias no processo de formação intelectual dos sujeitos, sendo inclusive alvo por vezes de atos de censura. Os recentes desentendimentos entre EUA e o Irã motivados por uma série de fatores ideológicos, comerciais, e bélicos fez com que o quadrinho “Persépolis” da escritora Marjane Satrap fosse retirado de algumas bibliotecas escolares americanas [4]. Sob o argumento de que esse tipo de leitura não era coerente com a idade dos jovens, as escolas americanas retiram da prateleira as HQs. Porém uma análise mais crítica da realidade evidencia uma tentativa americana de limpar a sua imagem com relação ao Irã e o passado político de ambos os países. Não é segredo para ninguém o envolvimento do EUA no golpe militar que ocorreu no Irã em 1979, contra o Xá Pahlevi, nem também o envolvimento da CIA na derrubada do governo democraticamente eleito de Mohammad Mosaddeq, em 1953 para colocar em seu lugar o próprio Xá Pahlelvi. A partir do momento em que o Xá passou a agir de forma destoante aos interesses do EUA em relação principalmente a venda de petróleo, o governo norte americano passou a apoiar uma nova revolução, primeiramente apoiada por grupos de esquerda, liberais e religiosos e que posteriormente resultou na chegada dos aiatolás ao poder.

contra o Iraque que supostamente tinha como objetivo tirar do poder o ditador Saddan Hussein). [4] http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2013/03/ 1248811-autora-de-persepolis-reclama-que-livro-foi-banido-em-escolas-dos-eua.shtml O quadrinho escrito por Marjane é uma demonstração artística dessa história sob o prisma de uma garotinha, a própria Marjane, que viveu intensamente a revolução e suas consequências. No HQ em questão é demonstrado também o papel dos norte-americanos nos bastidores do golpe político, quando colocou e depois retirou o Xá do poder. Logo, a censura do quadrinho no contexto de hoje não poder ser visto apenas como uma iniciativa educacional, na verdade se esconde um movimento político de “limpeza” histórica da participação “secreta” do serviço de inteligência americana na Revolução Iraniana, tentando direcionar o espírito de uma nação para seus próprios fins mercadológicos. Também não deve ser coincidência o prêmio dado ao filme “Argo” que trata também sobre o tema, mas que aborda o fato sob uma perspectiva muito mais heroica do que política, demonstrando todo o esforço para se retirar os diplomatas americanos do Irã durante a eclosão dos movimentos revolucionários, tendo inclusive ganhado o Oscar de melhor roteiro adaptado e de melhor filme. O prêmio em questão foi inclusive entregue de dentro da Casa Branca pela primeira dama Michelle Obama. Tal fato parece deixar de lado o aspecto polêmico da intervenção direta do governo norte americano na política interna de um Estado estrangeiro motivado por interesses econômicos. Enfim, diante aos fatos políticos e econômicos os poderes dominantes do Estado – ou seja, os interesses corporativos que dominam as instituições políticas – tendem a controlar a circulação de informação, visando se construir uma imagem distinta sobre o fenômeno em questão, seja excluindo algo ou criando imagens para ilustrar os fatos, distorcendo-se assim a própria realidade.

[1] Hoje em 2016 percebemos como consequência da guerra ao terror, da primavera árabe e do movimento “Occupy” o surgimento do Estado Islâmico, a continuidade da guerra civil na Síria, o surgimento de novos movimentos de esquerda chamados de movimentos-partidos como o “Podemos” na Espanha, o “Syriza” na Grécia e o “Raiz” aqui no Brasil. Tais fatores levam a necessidade de uma nova elaboração teórica sobre esses processos e seus impactos, trabalho esse que será realizado em breve. [2] A querela entre os EUA e o Irã em torno da energia nuclear encontra-se hoje em uma fase de negociações. [3] Centrado na possibilidade de intervenção em um Estado autônomo por outro Estado a partir do momento em que a “democracia” – como desenhada por eles – está em perigo (um exemplo disso foi a guerra

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ENTRE INVENÇÕES

SISTEMA DE COOPERAÇÃO NO TRÂNSITO Por Paulo Gannam

Brasileiro afirma ter inventado solução para comunicação mais segura no trânsito. Sistema teria usabilidade muito mais simples do que smartphones usados separadamente e funcionamento possível em qualquer veículo. Você está dirigindo. O celular toca e uma ansiedade começa a te incomodar. Você dá tanta importância àquela ligação que decide acreditar que atendê-la poderia mudar os rumos de sua vida. E vai mesmo: você se acidenta, fratura a coluna e fica imóvel pelo resto da vida! Ou você está realizando uma manobra numa curva acentuada, mas não sabe que há pouco houve um deslizamento. Você até consegue frear a tempo, mas o carro que vinha “chutado” atrás não... Para ajudar a diminuir acidentes causados por problemas no trânsito, nos veículos, e por causa do envio moroso de mensagens pelo celular, o inventor Paulo Gannam desenvolveu o “Sistema de Cooperação no Trânsito”. É um sistema eletrônico de comunicação instantânea que alerta, com botões que ativam frases curtas pré-gravadas, qualquer problema identificável num veículo e nas estradas. A comunicação é feita entre usuários que disponham do aparelho ou de um aplicativo para smartphone. Alguns exemplos de mensagens: “luz de freio/ ré queimada”, “farol alto”, ”pneu murcho”, “emergência”, “porta entreaberta”, “pessoa doente no carro”, “acidente/animal/buraco à frente”, etc. “O aplicativo que desenvolvemos se diferencia, pois ele é o único que foi feito especialmente para interagir com o Comunicador, contendo mensagens de fácil envio,

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reconhecimento, comando de voz e GPS. Então tanto quem tiver apenas o Comunicador, quanto quem tiver apenas o APP, vai poder participar da comunicação e colaborar”, explica Paulo. De acordo com Gannam, o sistema desenvolvido é livre de intermediários e outras distrações. Por isso, ele acredita que possa ser de fato útil e condicionar os motoristas a ajudarem uns aos outros. “Com isso, a possibilidade de interação no trânsito e a criação de informações valiosas para consumidores, governos e empresas é potencializada”, afirma. Anualmente, são registrados cerca de 1,3 milhão de acidentes relacionados ao uso do celular. E 80% dos motoristas admitem que utilizam o aparelho enquanto dirigem. Outras estimativas apontam que 40 motoristas são multados a cada hora por usar o aparelho ao volante. Um estudo do Departamento de Transportes dos Estados Unidos apontou que quem digita mensagem de texto ao volante tem 23 vezes mais chances de sofrer um acidente. Uma ligação aumenta o risco em seis vezes. Atualmente, Paulo está em busca de apoiadores. Com patente requerida em todo o território brasileiro, o inventor busca obter parceria entre empresas do setor automotivo, de tecnologia, telemetria e telecomunicações, para verificar viabilidades e lançar o produto no mercado. Aqui o inventor explica o funcionamento dos primeiros protótipos. ***Aqui o inventor explica o funcionamento dos primeiros protótipos. https://www.dropbox.com/s/r6ihw2gq3wkipb3/2016-04-19%2014.37.48.mp4?dl=0 Perfil do Escritor Paulo Gannam é formado em jornalismo pela Universidade de Taubaté e especialista em dependência química pela Universidade de São Paulo. Nos últimos 5 anos atua na criação, solicitação da patente, negociação e busca pela comercialização de produtos no mercado através de parcerias com empresas – tanto estabelecidas quanto emergentes.


ENTREVISTA

JOANA D’ARC ENTREVISTA JUCELINO DA LUZ Por Joana D’arc

Jucelino Nóbrega da Luz com apenas 56 anos de idade é reconhecido pelo alto grau de acerto de suas Previsões, é um médium de premonição e Intuitivo com percepção extra-sensorial. Profundo conhecedor dos sonhos premonitórios, é considerado um dos maiores clarividentes do Brasil e do Mundo.. 1- Como você descobriu que tinha o dom da premonição? Bem, isso aconteceu em 1969, quando recebi o primeiro sonho, sabia que algo era diferente, pois vi um acidente de carro (Brasília) chocando-se com um caminhão. O mais estranho que naquela época esse carro nem existia, depois, foi em 1973 que o sonho se concretizou, dai aconteceu a colisão contra um caminhão, dai em diante já fiquei desconfiado que seria premonição, digo, sonhos premonitórios. 2- Você se recorda qual foi a primeira premonição que você acertou? Eu coloco como primeira o acidente entre o carro Brasí- lia e o Caminhão. Mas, logo depois dessa em 1970, recebi uma visão sobre o ”Carlinhos - no Rio de Janeiro” que foi sequestrado e morto. 3- E como você aprendeu a lidar com essas premonições? Não aprendi ainda, estou vivendo uma vida de aprendizados no dia a dia. 4- Como você avalia a situação atual ao redor do mundo? Péssima... violência em toda parte, corrupção, destruição do meio ambiente, a falta de água, daqui uns 15 anos os efeitos serão catastróficos para a sobrevivência humana, teremos calor severo, frio severo, bactérias e vírus des- truidores , tufões(furacões) devastadores, chuvas fortes, seca severa, fora outros eventos de dar medo! 5- Você teria como dizer agora como será o futuro do Brasil? Como Brasileiro sou otimista e espero o melhor para to- dos; mas como espiritualista, não vejo melhora e infeliz- mente, muitas coisas negativas no ponto de vista Político e geral. Os brasileiros precisam abrir os olhos; estamos sem direção e podemos cair num abismo. Abra os olhos Brasileiros?!

6- Você tem alguma premonição para nos contar que você ainda não tenha divulgado? Qual? Espero que os Governantes estejam ligados a essa visão: ”Há um grande furacão aproximando-se da terra e esse é negro como um asfalto ,destrói como uma máquina de moer carne ,forte como aço e será em 22 de maio de 2034. 7- Quem tem este dom pode até que ponto influenciar nossas vidas? Não há como influenciar nas vidas das pessoas porque temos o livre arbítrio; precisamos apenas saber ouvir as pessoas sérias que tem como objetivo ajudar a humanidade. 8- Deixe uma mensagem para nossos leitores. Primeiramente agradecer pelo carinho e desejar que to- dos tenham muita paz, felicidade, saúde e que essa força positiva espiritual entre em seus lares; dando muita força para enfrentar os problemas futuros que haveremos de ter. Amor e paz pra todos. Contatos: Facebook: https://www.facebook.com/jucelino.nobreg- gadaluz?fref=ts “Foi o único do mundo a prever os ataques terroristas ao World Trade Center, em Setembro de 2001, Nova Ior- que, Estados Unidos, Morte do Michael Jackson(trecho da carta publicada no livro em 2005 - “O homem à frente das Profecias“, o Tsunami da Ásia em 26 de dezembro de 2004 - esteve pessoalmente com o Embaixador da indo- nésia à convite dele; previu o ataque em Madrid - 11 de março de 2004 - recebeu em sua residência o Cônsul Geral da Espanha; previu a queda do Avião da Gol, a que- da do Avião da TAM, O grande terremoto na china - Si- chuan, Terremoto em Kobe Japão e o terremoto de 11 de março de 2011. A captura de Saddam Hussein, onde ga- nhou no Superior Tribunal de Justiça uma Ação contra o Governo Americano. Tudo comprovado com documen- tos incontestáveis e registrados em Cartório.” (Retirado do site http://www. jucelinoluz.com.br/quem-e-jnl/ )

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ENTRE MÚSICOS

2 DÉCADAS TRILHANDO O CAMINHO DA MÚSICA! Por Dalto Fidencio

O

Entrementes visitou Lon Amorim, grande músico de São José dos Campos, que nos contou um pouco de sua trajetória em meio a 1ª Arte... leia tudo aqui! Basta adentrar à sua sala para saber que ali vive alguém com a Música no sangue... pois a decoração remete totalmente a esta arte sem a qual a vida não teria sentido, como sabiamente nos disse Friedrich Nietzsche. Somos recebidos por Beatles, Elvis, Raul... isso sem falar nos vários instrumentos que descansam por ali, antes de voltar ao batente. Além da ligação profissional, o elo de Lon com a música se dá também com sua vasta coleção de LPs, estimada por ele em cerca de 3 mil álbuns! Sua ligação com a Música começou de forma peculiar: caçula de uma família de mais de 10 irmãos, ele é o primeiro músico entre os Amorim, mas seus irmãos ouviam muita música, o que veio a influenciar o pequeno Lon de forma incisiva. E então, ainda nos anos 80, apareceram 2 violões em sua casa, pertencentes aos seus irmãos mais velhos... mas eles não desenvolveram e os violões ficaram lá. Era a dica do Universo para que o mais novo da casa adentrasse ao mundo da Música. Em 1988, ele se interessou pelos instrumentos e logo passou a dominá-los. E isso já estava mesmo escrito, pois Lon nasceu nada mais nada menos que em 22 de novembro, data em que se comemora Dia do Músico! Ele nos conta que, ainda com apenas 9 anos, quando descobriu que a data de seu aniversário era uma data em homenagem aos músicos, ele se emocionou, pois mesmo com tão pouca idade, ele já era um profundo

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admirador desta Arte. Perguntado quando se deu conta de que a Música seria sua profissão e não apenas um hobbie, Lon nos conta que começou tocando Raul Seixas, vai mais longe e diz que a primeira música que tocou foi Água Viva... isso que é começar com o pé direito! Já começou “conhecendo bem a fonte, que os céus e a terra bebem”... “Eu realmente senti que meu caminho estava na Música quando, aos 14 anos, fiz uma apresentação no SENAI, onde era aluno... Fiquei tonto depois daquela apresentação... acho que naquele dia a Música me tocou de vez. Foi ali que fiquei sabendo o que queria fazer na minha vida.”. Lon nos conta nostálgico que até alguns professores do SENAI vieram falar para ele que o seu negócio não era ser ajustador mecânico e sim, seguir o caminho da Música. Isso foi marcante para Lon e ele foi seguindo o caminho artístico até chegar ao primeiro cachê, 20 anos atrás. “Eu já tocava, mas ainda não recebia... aqui no Brasil é difícil, como todos sabem. Eu tocava Raul, Caetano, Zé Ramalho, Gilberto Gil, Beatles. Eu não fiquei radical, apenas no Rock, pois eu já gostava também de Blues e MPB. Meus pais na Música foram o Blues e o Raul, mas tenho muitas outras referências,”, nos fala Lon. Como ele não tinha músicos em casa, foi aprender na rua, nas rodas. Sobre instrumentos, Lon nos fala de seus favoritos: “Comecei com o violão, depois o Blues me puxou pra gaita diatônica (nota deste que vos escreve: essa é a gaita usada no Blues, é uma gaita de solo, diferente da acromática). Quando se convive muito tempo com um instrumento, ele te leva para outro. Abrir o horizonte para ouro instrumento é algo que acontece naturalmente. Aí fui para o piano, guitarra... fui abrindo o leque. E tenho vontade de um dia tocar contrabaixo. Adoro baixo e trompete, mas não sei se um dia vou chegar nesse estágio.”. Lon fala também de alguns dos vários músicos com quem trabalhou, como Jorge Alegre e Marcus Flexa, com quem tocou por muito tempo quando estava começando na noite. “Aprendi muito com eles, como tocar ao vivo, tirar vícios, até dicas de canto. São pessoas maravilhosas que sempre me apoiaram.”, ele nos conta. Sua família também o apoiou muito, ele nos conta de um dos irmãos, dono de um dos violões originais que aportaram na casa de Lon, sempre o acompanhou na noite. Não só dos irmãos como de sua mãe também. Lon cita outras pessoas que o apoiaram, como


Rui Maia e Regiane, que o presentearam com sua primeira guitarra, inclusive. Lon Amorim possui um CD gravado de forma independente, chamado “Invenções”. Nele ele contou com a participação de vários músicos de gabarito, como o próprio Marcus Flexa (guitarras e piano), Tales (baixo), Lincoln (sax tenor e soprano), Karica (flauta), Maionese (bateria), Roberto Delavechia (trombone) e Pedro Wella (trompete com surdina), entre outros. “Invenções” é um álbum autoral, já que Lon além de tocar e cantar, é compositor. É um trabalho feito “na raça”, que reverbera o grande amor e talento que Lon Amorim tem neste caminho que decidiu seguir. “Esse CD eu lancei em 2007. É completamente autoral, todas as músicas são minhas. “Invenções” para mim era uma coleção de ritmos, daí o seu nome. Eu quis trabalhar todos os ritmos da música brasileira. Aqui eu tenho samba, tenho forró, tenho blues, afoxé... não é um disco de um só estilo musical. É um disco de música. É verdadeiramente música popular brasileira. É um produção independente, não houve um lançamento por uma gravadora, mas mesmo assim eu vendi mais de 2 mil unidades, mas no trabalho de boca a boca mesmo, depois dos shows. E além deste primeiro CD, ele já possui outro disco praticamente já pronto para ser gravado, só faltando mesmo o ato de entrar em estúdio. Todas suas músicas já foram compostas e estão lá esperando ansiosas para serem gravadas. Questionado sobre como anda o apoio ao músico independente em São José dos Campos, Lon responde sem pestanejar: “Não vejo apoio por parte do Poder

Público. É um apoio muito pequeno, irrisório. Nós é que temos que correr atrás por conta própria, mas infelizmente isso é uma situação comum no Brasil. Existem poucas ações de apoio e muita, mas muita burocracia. Para conseguir entrar numa ação de fomento público à arte, você quase tem que ter um escritório só para isso.”. Lon conta que nunca dependeu de aporte público para conseguir fazer sua Música, sempre correu atrás por conta própria. Seu CD “Invenções” por exemplo, ele conseguiu realizar buscando o apoio e patrocínio de amigos. Cada um ajudando com uma quantia até conseguir o montante necessário para a gravação ser realizada, como um crowfunding. Mas ele diz esperançoso que espera que isso mude, que novas políticas surjam, acabando com a estagnação de sua área. Lon nos conta que seu próximo projeto é um CD chamado “Tragédias e Glórias”. Ele está procurando apoio para a empreitada. Será um álbum bem diferente do “Invenções”, pois será um trabalho mais filosófico. “São as minhas tragédias e as minhas glórias. As coisas boas e negativas por que passei na vida, como por exemplo, a perda de minha mãe. Este CD já tem 12 músicas prontas. Só falta entrar em estúdio e fazer os arranjos. Procuro apoio pra conseguir fazer uma gravação mais profissional que do primeiro CD. Lon volta então a nos falar um pouco de sua vasta coleção de LPs. Sua paixão pelo vinil começou no final dos anos 80. Ele começou com Raul Seixas, e nunca mais parou, se tornou uma paixão que jamais teve intervalo, com sua coleção sempre crescendo. Ele frisa que mesmo tendo milhares de álbuns, é uma coleção

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de qualidade, não de quantidade. Ele possui alguns discos muito importantes, e nos diz: “Tenho todos do Chico, todos do Caetano, todos do Gil, todos do Raul, todos do Zé Ramalho, Jobim...aí passa pelo Jazz, Dizzy Gillespie, Billie Holiday... e no rock clássico, mais de 10 discos do Pink Floyd, mais de 10 discos do Queen... Genesis, Yes, Led Zeppelin, Deep Purple, Jimmy Hendrix... tenho tudo aí. Os primeiros discos do Hendrix, importados, eu tenho. Elvis Presley... tenho muita coisa do Elvis. Compro discos do Brasil inteiro. Tenho a coleção dos Beatles, completa. Do Paul McCartney solo, que é um dos músicos que eu mais curto, só dele tenho uns 30 ou 40 discos. E tenho muitos CDs também...o que não completo no vinil eu completo no CD.”. Ele nos conta divertido sobre essa volta do vinil aos holofotes, depois de ter sido dado como morto quando do lançamento do CD: “Eu acho muito interessante essa volta, pois eu mesmo sofri chacotas, por ir comprar LPs. ‘Você ainda escuta esse museu aí, esse negócio velho? Nem toca direito, arranha, tem som ruim.’. Só que isso não é verdade, se você ouvir num equipamento legal, o vinil te traz graves que o CD não te oferece. O som analógico tem uma profundidade diferente de graves e de agudos. É claro que o CD também tem o seu valor, mas o vinil hoje virou uma coisa cult né? E é um artigo bem caro hoje em dia.” Lon também nos conta da importância do ritual de se ouvir um vinil. Cita que hoje em dia o MP3 nos dá uma coleção toda, mas te tira o prazer de ouvir, pois é muito material para se ouvir num dia só. Ele diz que não se pode comparar com pegar um disco, que vai ter apenas 6 músicas de um lado e mais 6 do outro, e realmente desfrutar cada uma das faixas. E isso sem falar da arte gráfica das capas, que não se pode comparar com a de um CD. Outra diferença apontada por ele é que no MP3 a pessoa ouvirá tudo compactado,

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bem diferente do som puro dos vinis. E faltarão também as informações das fichas técnicas, pois não se saberá quem foi que tocou, quem foi o guitarrista, o trombonista, etc. Lon também possui muitos álbuns autografados, que foi pegando ao longo dos anos, chegando no artista e pedindo para que ele autografasse o álbum. Ele pensa em um dia ter um espaço para poder dividir com os amantes da Música a sua coleção. Fazer exposições de seus discos, transformar sua coleção como que num acervo de museu. As apresentações de Lon costumam ter o apoio de um baterista. Como ele toca mais MPB, ele resolveu que um duo violão & bateria seria o ideal. Isso também se deve ao fato de que se trabalhasse com uma banda toda de apoio, o valor do cachê seria complicado. “Então, violão, voz e bateria funcionam bem, você consegue puxar o ritmo, fazer um som legal e dignamente pagar o músico que está ao seu lado.. É por isso que eu trabalho mais nessa formação, pois contratar uma banda não é nada barato. Eu trabalho muito com bateristas... o Maionese trabalhou 15 anos comigo. O Marcelo Moreira... são muitos músicos com quem tive contato.”. Aliás, Lon nos fala que a bateria é um instrumento para o qual ele não possui talento. Mas ele adora bateria, Lon tem um grande conhecimento “de ouvido” do instrumento, por trabalhar tanto com ele. “Eu conheço quando a bateria é bem tocada, quando o músico é versátil mesmo, porque eu trabalhei muito com esse instrumento. É um instrumento que considero lindo, mérito de quem toca, mas não é para mim.”. Para ainda vir a dominar, o instrumento no norte de Lon é o contrabaixo. E depois seria o trompete. Ele aprecia tanto o contrabaixo elétrico quanto o erudito, mas seu preferido é mesmo o elétrico. Ele já teve oportunidade de ter em mãos por alguns minutos um


baixo Hofner original, 1966, o mesmo tipo que um certo Paul McCartney usa até hoje. Para ele foi como pegar parte da história do rock nas próprias mãos. “Acho incrível isso, o fato de um instrumento conseguir contar parte da história da Música. Eu gosto de olhar não apenas para a Música em si, mas tudo que está ao redor dela, tudo que a engloba. Tudo é Música aqui, eu respiro Música.”. Lon está trilhando este caminho há duas décadas, ele simplesmente nunca trabalhou com outra coisa. Ele também dá aulas de violão, vende seus CDs... mas tudo é relacionado à Música. “Eu dei aula a vida toda praticamente, mas nunca tive muitos alunos ao mesmo tempo, foi sempre coisa de aula particular, principalmente crianças. Filhos de vários amigos meus aprenderam a tocar violão comigo, e acho isso muito legal. Para um pré-adolescente, eu acho que ajuda muito a abrir a mente. Ver uma criança de 10 anos que adora Beatles, como é o caso de um aluno meu, não tem preço!”. Mas a atividade principal de Lon é mesmo tocar na noite. Bares, restaurantes... os locais onde ele toca são cíclicos, mas o importante, como ele nos diz, é que sempre consegue trabalho. “Nesses 20 anos eu nunca parei de tocar, pois além dos bares, eu toco em festas... de casamento, bodas, eventos. Já fiz muita coisa nesse sentido, mas são os bares que mais rendem trabalho mesmo. O músico vive muito de agenda, e eu estou numa média de 4 apresentações por semana.”. Lon já tocou muito em cidades próximas, como Santa Branca, Jacareí, Taubaté... mas concentra mesmo suas apresentações em São José dos Campos, sua cidade. “Pelo fato de ser profissional, vou colhendo as sementes que vou plantando. É uma luta diária. Inclusive, além dos bares, festas e eventos, eu toco muito em indústrias também. Eventos em refeitórios de indústrias... eu acho que fiz quase todas de São José. E em horários que vocês nem imaginam. Ceia, 3 horas da

madrugada tocando... ou então 9 horas da manhã. É assim que você consegue trabalhar um valor legal de venda de trabalho. Eu consigo viver de Música neste país, mas é uma batalha.”. Lon sabiamente afirma que tudo no Brasil relacionado à Arte e Cultura, se a pessoa quiser trabalhar com isso, deverá fazer com total amor, pois caso contrário não conseguirá fazê-lo. Ele diz que muitos até o fazem, enriquecem, mas não deixam uma marca como esses grandes artistas que inspiram gerações fizeram. Um projeto paralelo de Lon é o da banda Raul 70, um trabalho em que ele e outros músicos prestam homenagem à obra do grande Raul Seixas... o artista que abriu as antenas da percepção para Lon, que, ainda criança, se encantou com a loucura lúcida de Raul. Lon Amorim finaliza seu bate-papo com o Entrementes deixando um importante recado a todos: “Eu parabenizo vocês por estar nessa batalha, pois sei que não é fácil. Nós não temos muito apoio...infelizmente é tanto desvio que não sobra pra quem realmente precisa. Todo mundo que está lá quer ganhar desigualmente... se fosse uma coisa mais social, creio que até a qualidade da Música que ouvimos hoje seria melhor. Há muitos artistas, há muitos grandes músicos, poetas... aqui, que não têm mais voz. Estão sendo calados por tudo... por políticos, pela mídia, por tudo. Pela grande mídia voraz, que só pensa no dinheiro.”. E assim nos despedimos deste grande músico de São José dos Campos, sem dúvida alguma um dos ícones da 1ª Arte da cidade e região, que nos provou que tem conteúdo não apenas quando canta, mas igualmente quando expõe o que pensa.

“Harmonizar / Toda a imaginação Verbo e sentido, a palavra sua forma tomar Sem se calar” (Morena, por Lon Amorin)

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ENTRE TESES E ANTÍTESES

REFLEXÕES SOBRE A PERFEIÇÃO, PARTE 1 Por Rafael Arrais

Natureza imperfeita

A beleza na simetria e na assimetria A perfeição é um estado de completude e ausência de falhas. Normalmente atribuímos a perfeição a um Criador, um Ser Perfeito ou as Leis da Natureza.

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Ante a grandiosa perplexidade que a observação profunda da natureza nos imprime a alma, somos inexoravelmente levados a crer que o Cosmos – tudo o que há, que foi ou que será – é perfeito. Apesar se ser muitas vezes complexos para nós definir tal perfeição, quase sempre a associamos com a beleza, a simetria, a homogeneidade das formas naturais. Na geometria a perfeição parece estar associada ao círculo: um espaço onde todos os pontos estão à mesma distância do centro, e conseqüentemente não temos nenhum ponto em posição privilegiada em relação aos demais. Essa igualdade nos parece sublime, e muitas vezes a tentamos traduzir para a realidade, tanto que muitos símbolos e signos da geometria sagrada se baseiam ou contém o círculo... Entretanto, ainda temos o ponto central do círculo – este está em posição privilegiada, na medida em que está a mesma distância de todos os demais. O centro é necessário para que os outros pontos se sintam em igualdade. Retire o centro e teremos novamente uma guerra em busca do ponto de superioridade. É mais simples supor que Deus está no centro. A mente de Deus, o motor inicial do Cosmos, a essência da natureza – aí está a perfeição! Porém, quando aplicamos essa noção ao espaço-tempo, não temos o resultado que esperaríamos. Segundo a cosmologia, é impossível definir um “centro espacial” do universo. Certamente segundo a teoria do Big Bang, toda a matéria e energia cósmica foi catapultada de um mesmo “ponto inicial”, mas o espaço-tempo cresceu por igual em todas as direções. É como se o próprio centro crescesse ele mesmo, e não os pontos que estavam a sua volta… Nenhum ponto do universo está “em torno de algum centro”, pois que todo o espaço-tempo é ele mesmo um único ponto original que simplesmente cresceu rumo ao infinito. Não há nada fora nem além do universo – e, se é que há, haverá de ser o que o criou. Costuma-se imaginar que a natureza é perfeita. Perfeita, simplesmente porque é o que havia já aqui muito antes de nós chegarmos (ou pelo menos, muito antes de nossa lembrança de estarmos conscientes da chegada). Como imaginar uma natureza imperfeita? Como imaginar falhas no projeto da criação? A ciência tem descoberto algumas... Por exemplo: a grama é verde por causa do pigmen-


to clorofila, que absorve as regiões azuis e vermelhas do espectro eletromagnético da luz solar. Por causa dessas absorções a luz que a grama reflete nos parece verde. Entretanto, as regiões verdes e amarelas do espectro da luz solar são as mais energéticas. Portanto, se formos pensar em perfeição no sentido de funcionalidade, a fotossíntese das plantas traria muito mais energia química caso a clorofila absorve-se as regiões verdes e amarelas do espectro, ao invés de absorver as regiões azuis e vermelhas. Seria isso um “erro de design” da natureza? Não paremos por aqui. Se a grama parece ter “escolhido a cor errada”, mesmo o tão aclamado “projeto homo sapiens” parece ter os seus erros... Soluços, por exemplo, que variam de um aborrecimento passageiro a uma doença que pode durar meses ou, em raríssimos casos, anos. O soluço é provocado por um espasmo de músculos na garganta e no peito. O som característico é produzido quando inspiramos ar repentinamente enquanto a epiglote, uma aba de tecido macio, localizada no fundo da garganta, se fecha. Todos esses movimentos são involuntários; soluçamos sem nem pensar no assunto. Os soluços revelam pelo menos duas camadas da nossa história evolutiva: uma parte compartilhada com os peixes e outra com os anfíbios, de acordo com uma teoria bem fundamentada [1]. Herdamos dos peixes os nervos principais usados na respiração. Um desses conjuntos de nervos (frênico) estende-se da base do crânio ao tórax e ao diafragma. Esse caminho sinuoso cria alguns problemas; qualquer coisa que interrompa o trajeto desses nervos pode interferir na respiração. Uma simples irritação pode deflagrar os soluços. Um projeto arquitetônico

mais radical do homo sapiens teria colocado o início dos nervos frênicos em local mais próximo do diafragma e não do pescoço. Já o soluço em si parece ter vindo do passado em comum com os anfíbios. Quando usam a respiração braquial, eles enfrentam um grande problema – precisam bombear água para a boca e garganta e depois para as brânquias, mas essa água não pode entrar nos pulmões. Como conseguem isso? Enquanto inspiram, eles fecham a glote, impedindo que a água escoe pelas vias respiratórias. Pode-se dizer que eles respiram com as brânquias usando uma forma estendida de soluço. Remexendo em nossa história evolutiva, vemos que uma boa parte dela se deu em oceanos, córregos e savanas - e não em cidades, igrejas ou academias. Para muitos religiosos, essa “ousadia” em se criticar a natureza suscita um senso de ingratidão, de falta de respeito... Provavelmente são os mesmos que criticam qualquer tentativa dos biólogos e geneticistas de “intervir” na natureza - clonando, modificando, até mesmo adicionando informações a obra divina. Louis Pasteur dizia que “uma pouco de ciência nos afasta de Deus. Muito, nos aproxima”. Eu gostaria de estender essa citação a religião: “um pouco de religião nos esconde a Deus. Muito, nos mostra-O em todo o Seu esplendor”... Para tentar lhes demonstrar o que eu quero dizer com isso, é preciso primeiro falar sobre o paradoxo da perfeição... Na continuação, as imperfeições que geraram o Cosmos, e uma visão mais aprofundada do que é realmente a perfeição. *** [1] Para saber mais consultar “A história de quando éramos peixes”, de Neil Shubin (Ed. Campus). Crédito da foto: James L. Amos/Corbis Rafael Arrais é webdesigner, desenhista e escritor.

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ENTRE TRILHAS E VIAGENS

SÃO LUÍS – PATRIMÔNIO MUNDIAL Por Ana Maria Alcides

Ponte José Sarney

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São Luís do Maranhão Viver num país como o Brasil, de proporções continentais é poder conhecer o mundo através das difåerentes regiões. Seus costumes, suas culturas diferentes, seus temperos e pratos regionais somados aos diferentes sotaques vem nos acrescentar uma riqueza muito grande de conhecimento. E conhecer para valorizar é uma das coisas que mais defendo trabalhando com o turismo. Hoje é dia de falar sobre São Luís do Maranhão, uma bela capital brasileira, fundada por franceses, mas que coube aos portugueses darem à capital do Maranhão a sua marca registrada: belíssimo estilo arquitetônico. São mais de 1000 construções na área declarada Patrimônio Mundial pela UNESCO. A Rua Portugal, o Palácio dos Leões, sede do governo estadual, a Catedral da Sé, os palácios Episcopal, La Ravardiere e Cristo Rei, o Teatro Arthur Azevedo, entre muitos outros, emocionam a todos com sua história e riqueza. Neste belíssimo cenário, a culinária também é atração. Não tem como não se deixar seduzir pelos sabores regionais do imperdível arroz de cuxá, da caldeirada de camarão e frutos do mar, dos sucos de bacuri e cupuaçu, além do tradicional doce de buriti. Tombada pela Unesco, grande parte dos casarões coloniais do século XVIII e XVIV nos leva a um passado de grande prosperidade e ostentação. Nos dias atuais os antigos casarões dos barões abrigam espaços culturais, museus, lojas e restaurantes que preservam em suas fachadas os coloridos azulejos portugueses. Os bares garantem as festas noturnas nas sextas feiras e sábados.

Infelizmente grande parte desses prédios históricos está em ruínas, clamando por restauração. Além da história, a cidade preserva culturas e tradições. De uma lenda surgiu uma brincadeira democrática do Bumba-meu-Boi, tradição que se mantém desde o século XIX, arrastando maranhenses e visitantes, principalmente durante o período das festas juninas, onde os grupos de diferentes sotaques se espalham pelos arraiais, e também no mês de julho, quando acontece o Vale Festejar, em São Luís. Essa manifestação secular reúne em todo o estado inúmeros grupos de Bumba-meu-Boi, diferenciados por seus diversos sotaques. Tambor de Crioula, emoção a cada batida. Não há como não se deixar levar pela magia do Tambor-de-Crioula, assim como o Bumba-Meu-Boi, tombado como Patrimônio Imaterial Nacional pelo IPHAN. Uma herança africana que se manifesta com dança, canto e a batida dos tambores e que no passado costumava ser praticada pelos escravos, em louvor a São Benedito, um dos seus santos mais populares. Alegre, vibrante e com movimentos marcantes, o Tambor-de-Crioula pode ser apreciado ao ar livre, nas praças, casas e interior de terreiros em qualquer época do ano, mas principalmente durante o São João e o Carnaval. As roupas das coreiras, como são chamadas as brincantes, são sempre muito coloridas, mas o que chama mesmo a atenção na dança é a “umbigada” ou “punga”, quando as mulheres rodopiam e, em seguida, vão de encontro uma das outras para dar a umbigada, que é o encontro da barriga com a barriga, que é a senha para nova dançarina entrar na roda. Sempre ao som


Palácio dos Leões, sede do governo do Maranhão

Casarões revestidos com azulejos portugueses

Igreja do Carmo

inebriante dos tambores tocados pelos homens. Estando em São Luís, terá muitas opções de passeios nos arredores. Poderá visitar e se encantar com a bela Alcântara que foi a primeira cidade maranhense tombada pelo IPHAN, em 1948 como cidade monumento. Cercada por praias, ilhas desertas, serena e tranquila Alcântara pode se orgulhar de ser também a mais importante cidade histórica da Amazônia. Seu casario colonial preservado e imponente e o silêncio de suas ruínas guardam reminiscências de um passado glorioso, um tempo de riqueza, de fausto, de famílias nobres e numerosa população escrava. Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses. Com pouco mais de 3 horas de carro você poderá chegar em Barreirinhas, à margem do Rio Preguiça que é a principal base para se conhecer o Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses. À partir desta cidade, se fazem os passeios mais famosos e obrigatórios: o da Lagoa Azul e o da Lagoa Bonita. De mais fácil acesso a partir de São Luís, Barreirinhas oferece uma boa infraestrutura turística e dispõe de serviços de hospedagem diversificados como hotéis, pousadas e eco resort. Os passeios ao Parque devem ser sempre ser feitos com guias locais. O acesso é feito apenas com veículos 4X4, oferecidos pelas agências da cidade, que deixam os visitantes na entrada do mesmo. Á partir daí deve-se seguir a pé, pois não é permitida a entrada de veículos na área protegida.

Igreja São José do Desterro

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Lagoa Azul nos Lençóis

A Lagoa Azul: É a mais visitada do Parque Nacional e também a de mais fácil acesso, por estar mais próxima do ponto de parada dos carros de tração que fazem o transporte até o parque. No passeio à lagoa Azul e demais lagoas de sua proximidade, o banho de água doce e transparente é muito refrescante. Artesanato. Uma ótima parada em São Luís é o CEPRAMA, Centro de Produção Artesanal do Maranhão- ocupa o prédio da antiga Companhia de Fiação e Tecidos de Cânhamo (1891). Em sua área interna, existem boxes em que artistas e artesãos maranhenses produzem e vendem o artesanato das diferentes regiões do estado. Em períodos sazonais, existem comemorações em sua área externa, tais como arraial junino, shows, espetáculos folclóricos, eventos, exposições temporárias, oficinas, etc. Na visitação, pode-se acompanhar os artesão produzindo suas peças. Maranhão – Único! Não sabemos até hoje o significado da palavra Maranhão, mas coloque seus pés nesta terra e terá a certeza da sua grandeza, seus encantos e sua energia. Uma mistura francesa e portuguesa na sua fundação que deu um ótimo resultado. Um destino único, afinal, em que lugar do mundo é possível presenciar o encontro da Amazônia com o mar? Onde mais se vê um deserto de areias brancas com milhares de lagoas cristalinas? Onde mais se pode apreciar o maior acervo de azulejos portugueses fora de Portugal? Tudo isso e muito mais é o Maranhão. Cenários naturais raros. Povo com raça, com graça, com fé. Patrimônio histórico, cultural e arquitetônico reconhecido pelo mundo. Sabor e afeto. Descanso e diversão. As festas, a dança, o toque e os sotaques, fazem parte da vida desse estado onde originalidade e tradição se misturam a uma culinária singular. O encontro da poesia com a natureza, do esporte com a aventura, da fala com o sorriso, da fauna com a flora. Maranhão de lugares que, pelo menos uma vez na vida, merecem ser conhecidos, vividos e experimentados.

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Centro Histórico

Rua do Giz


CANTO DA CULTURA

Era uma vez em São José dos Campos Por Elizabeth de Souza

Um Movimento em movimento Depois que o Alan e o Miran saíram do Canto da Cultura, os encontros esfriaram um pouco, afinal os dois davam o sabor e impulsionavam aquele movimento. Mas os que participavam com certa frequência, continuaram na praça todo sábado. E aos poucos, foi-se configurando um novo movimento. O Solfidone e eu continuamos com o varal poético. O Irael Luziano declamava e o Edu Planchez que retornou à SJC depois de ficar um bom tempo no Rio, fez uma parceria com o Irael nas performances. Na praça, mudamos de local, fomos para outro canto com o varal e as apresentações.

Solfidone

Novas figuras foram aparecendo, já com uma concepção diferente. E esses acréscimos foram enriquecendo o grupo. O Solfidone (Idelfonso) estava presente todos os sábados e passou a ser uma referência para todos os caóticos da cidade. Seu trabalho artístico e literário misturava-se com ideias filosóficas, científicas e metafísicas. A nova configuração do grupo desprendia essas características de modo que foi um chamariz para os filósofos, cientistas, artistas e místicos que conviviam harmoniosamente, apesar de suas diferenças fundamentais.

Alan... Solfidone... Miran É um pássaro? É um avião? É um disco voador? Não... É o solfidone! Desde o início estava lá... Ele sempre soube o que fazíamos no banheiro... Ele sempre aparecia do nada, com seus superpoderes... Não sabíamos se vinha do céu ou de uma cabine telefônica... Digo, de trás do orelhão da telesp, aquele alaranjado, que foi trocado por esse verde estrangeiro... Será que colocaram o verde só para impedir a transformação do sol? Então, como eu estava dizendo, ele sempre esteve lá... E mesmo depois que todos foram embora, lá permaneceu... Nunca traiu seus ideais, nunca abandonou o barco... Nunca deixou o caos...

Foram aparecendo pessoas interessantes com ideias e posturas inovadoras dando lugar a um relacionamento criativo e aconchegante que contaminava todos que se aproximavam do grupo. Uma das figuras mais interessantes a aparecer nessa nova onda foi o Kharistos. E outra figura, o Marzinho, artista plástico que fazia um varal com seus desenhos e textos interessantes.

Marzinho e Kharistos

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ANUNCIE NA REVISTA ENTREMENTES O Portal Entrementes é uma revista digital de conteúdo essencialmente cultural, conta com a colaboração de mais de 20 colunistas, escritores, poetas, críticos, músicos, artistas plásticos, ufólogos, etc que estão espalhados por várias partes do Brasil, assim como em Portugal e Moçambique. Além das postagens dos colunistas tem-se uma agenda onde são postados releases de vários eventos para divulgação e também são feitas matérias especiais sobre variados temas na região e em outras cidades ou estados, que são registrados através de vídeos, entrevistas e imagens. Agora no formato de revista impressa que é publicada trimestralmente (Março, Junho, Setembro, Dezembro).

O conteúdo da revista impressa é contribuição dos próprios colunistas junto com outras matérias interessantes feitas pela equipe do Entrementes. Para que o projeto continue levando conhecimento e cultura até as pessoas, precisamos da sua contribuição. Colaborando conosco, além de nos ajudar a divulgar conhecimentos, estará também divulgando sua empresa. Adote essa ideia e junte-se a nós... Agradeço a colaboração e a parceria! Elizabeth de Souza - Editora do Portal www.entrementes.com.br contato@entrementes.com.br (12) 98134-9857


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