EMRC_11_UL7_Ciência e religião

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Queridos Alunas e Alunos Esti madas Famílias Caros Docentes lO com grande alegria que vos entreg amos os manuais de Educação Moral e Religiosa Cató lica , que foram preparados para lecio nar o novo Programa da disci plina, na sua edição de 2014. O que aqui encontrareis procura ajudar, cada um dos alunos e das alunas que frequentam a disciplina, a "posicionar-se, pessoalmente, fren te ao fenómeno religioso e agir co m responsabilidade e coerência», tal como a Conferência Episcopa l Portug uesa def iniu como grande f inalidade da disc iplina'. Para tal, realizou-se um exten so traba lho que pretende , de forma pedagogicamente adequada e cientifica mente signif icat iva, cont ribuir com serieda de para a educaçã o int egral das crianças e dos jovens do nosso País. Esta ta refa, realizada sob a superior orien tação da Conferência Episcopal Portuguesa , a responsabilidade da Comissão Episcopal da Educação Cristã e Dout rina da Fé e a dedicação permanente do Secretariado Nacional da Educação Cristã, envolveu uma exte nsa e motivada equipa de tr abalho. Queremos , pois, agradecer aos aut ores dos t extos e aos art ista s que elaboraram a montagem dos mesmos, pelo seu entu siasmo permanente e pela qualidade do result ado final. Também referimos , com apreço e gratidão, os docentes que experimentaram e com ent aram os manuais, ainda durant e a sua execução, e o cont ributo insubst it uível dos Secret ariados Diocesanos responsáve is pela disciplina na Igrej a local. E a todos os docen tes de Educação Moral e Religiosa Católica, não só entrega mos estes indispensáveis instrumentos ped agógicos como aproveitamos esta feliz ocasião para sublinhar a relevânci a do seu fu ndame ntal papel, nas escolas e na formação das suas alunas e dos seus alunos, e testemunhamos o nosso reconhecimento pelo seu extenso comp romisso pasto ral na socied ade portugue sa. Do mesmo modo, estamos agradecidos às Famílias, porque desejam o melhor para os seus f ilhos e filhas e, nesse contexto, escolhem a disc iplina de Educação Moral e Religiosa Catól ica como um import ant e cont ributo para a formação e o desenvolvimento pleno e feliz dos seus jovens. Os jovens conformam o nosso fut uro comum e o empenh o sério na sua educação é sempre uma garant ia de uma sociedade mais bon dosa, mais bela e mais j usta. Finalmente, queridas crianças e quer idos jov ens, a Igreja quer ir ao vosso encontro, esta r convosco, ajudar-vos a viver bem e, nesse sent ido, colaborar com o esfo rço de co nst rução de um mundo melhor a que sois chamados , enraizados e firmes (cf. Coi 2, 7) na proposta de vida que Jesus Cristo tem para cada um de vós. lO esse o horizonte de vida, de missão e de f uturo, a cons t ruir convosco, que nos propomos realizar com a disciplina de Educação Moral e Religiosa Católi ca. Em nome da Conferênc ia Episcopal Port uguesa e no nosso próprio, saudamos toda s as alunas e todos os alunos de Educação Moral e Religiosa Cató lica de Portuga l com alegria e esperança, Comissão Episcopal da Educação Crista e Doutrina da Fé Lisboa, '9 de março de 2015,

Solenidade de S. José, Esposo da Virgem Maria e Padroeiro da Igreja Universal

* Conferência Episcopal Portuguesa, (2006), Educação Moral e Religioso Católico - Um valioso contributo paro a formação da personalidade. n. 6.


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Educaçã o '.'0'2 1 e ~eli;·r;sa Cat(::a

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Frequenta r o Ensino Secundá rio e matr iculares-te em Educação Moral e Religiosa Católica, diz alguma co isa sob re t i... Talvez t u não te nhas a certeza do que diz, talvez te nham sido os teus amigos a desaf iar-te - e ainda bem - ou porque o professor ou a profess ora é alguém que t u aprecias , o que é excelente, ou... e nada disto se exclui, esco lheste EMRC porque tens vontade de pensar, de disc ut ir, de co nst ruir novas ideias sob re alguns temas que parecem ser importan tes ... ou interessantes ... ou, tu lá sabes ' Nós estamos aqui para isso. Propomos-t e um camin ho, um Caminho que podes organizar em conjun to co m O teu professor ou professo ra, passando pelas seguintes dez etapas : UL 1 - Política, Ética e Religião; UL 2 - Valores e Ética Cristã ; UL 3 - Ética e Economia; UL 4 - A Civilização do Amor; UL 5 - A Religião como Modo de Habitar e Transformar o Mundo; UL 6 - Um Sentido para a Vida; UL 7 - Ciência e Religião; UL 8 ;:, A Comunidade dos Crentes em Cristo; UL 9 - A Arte Cristã e UL 10 - Amor e Sexualidade. Provavelme nte , já tens aulas de EMRC há alguns anos , mas t ambém podes ter acabado de chegar... Em qualque r dos casos, se deres uma vista de olhos no Programa da disciplina, fic as a saber que f izemos todo este tr abalho te ndo uma grande Finali da de em vista : ajudar os alunos, ajudar-te a ti , a «Aprender a posicionar-se, pessoalmente, frente ao fenómeno religioso e agir com responsabilidade e coerência ». A part ir dest a pr imeira página do teu manual, ou melhor, de cada um dos fascicu los, que, no tod o, cons t ituem o man ual de EMRC do Ensino Secundá rio, podiamos começa r já a explicar-te tu do isso. Mas não. Tu, em co njunto com os te us amigos , os te us co legas e com a ajuda dos teus professo res, é que vais enco nt rar essa explicação, muitas das explicações que te fazem falta, que queres e que procuras. Depois, t alvez queiras part ilhá- Ias com os out ros amigos e - quem sabe? - em t ua casa, co m a tu a famil ia. E quando for a hora cer ta, vais te r de co meça r a fazer algumas esco lhas, daquelas que tê m mesmo imp ort ância para o resto da tu a vida. O ensino sec undário te m, por isso, uma import ante com ponen te voc acio nal, contribuindo para que defin as quem é que t u queres ser e o que é que queres fazer com a t ua vida. Nessa alt ura, espe ramos que estes manuais, com os seus textos, as suas imagens, as suas vozes, as suas sugestões e as suas «janelas» sob re a realidade pró xima e longínqua, te possam ajudar. Ent reta nto, deixamos a palavra mais importante para quem sabe mes mo dizer isto, os artistas. Fica connosco, f ica com a poes ia, fica bem: EMRC é para t i e para te aj udar a esco lher um fu t uro de beleza, de bondade e de j ust iça, uma vida boa e fe liz!

Escuto

Escuto mas não sei Se o que oiço é silêncio Ou Deus Escuto sem sabe r se esto u ouvindo O ressoar das planícies do vazio Ou a consciência atenta Que nos co nfi ns do universo Me decif ra e f ita Apenas sei que ca minho como quem É olhado amad o e con hec ido E por isso em cada gesto ponho Solenidade e risco

Sophia de MeIJ a Breyner Andresen Obro Poético I, 1992, Lisboa, Círculo de Leito res. Geografia , 2004, Lisboa, Edit orial Ca minho, p. 30.

Com votos de um ótimo trabalho, agradecemos a tua confiança!

A equipa de Autores


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Indice - ----- -- -- -- -- -- -- -- -- -- -6 ,I 7 Not a Intro dutór ia

1. Ciência e Fé - Fé e Ciênc ia: a racionalidade de uma relação

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1.1 . Ciência, tecnologia e cultu ra: implicações 1.2. Uma racionalidade global e abrangente 1.3. Ciência e Religião: irreconciliáveis? As interrogações essenciais 1.4. O que é a ciência - f unção da tecnologia 1.5. O que é a religião - O religioso e o sentido da vida

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2.1. Fé e razão art iculam-se e comple mentam-se 2.2. Mensagem de Joã o Paulo II à Academia Pont ifícia das Ciências, 22 de outubro de 1996 2.3. O homem como imagem de Deus. Uma "antropologia adequada". 2.4. O Génesis como documento "cient ífico" 2.5. A ciência alarga as frontei ras do modelo cosmológico standard 2.6. A Mensagem de João Paulo II a George Coyne, Direto r do Observat ório do Vat icano, de 1 de j unho de 1988 2.7. As posições dos Papas Bento XVI e Francisco

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2. Diálogo entre Ciência e Teologia

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3. Religião, conhecimento cientifico e progresso moral

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Conclusão

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Bibliografia

3.1. Domínio do espírito sobre a matéria 3.2. Neurociências - o cérebro e a atividade profi ssional 3.3. Alterações climát icas - limites à criatividade humana? 3.4. Ét ica e invest igação científi ca 3.4.1 . J. Robert Oppenheimer ("pai da bomba ató mica"): a ciência não é moralmente neut ra - a responsabilidade cient if ica 3.4.2. As Ciências da Vida 3.4.3. Bioética: ét ica da ciência para as ciências 3.5. Racionalidade e realidade - mundo, ser humano e Deus. Uma "ant ropologia da redenção"


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1. Ciência e Fé - Fé e Ciência: a racionalidade de uma relação !

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Nota Introdutória A racionalidade da relação entr e ciência e fé pressupõe a relativização de ambos os polos, inst it uindo uma relação de consonãncia e com plementar idade. Nos nossos dias, esse debate adquiriu aspetos inéditos. De facto e de modo especial, como veremos, uma mensagem inovadora de João Paulo II - publicada em J ohn Pou/II on science ond Re/igion . Reflections on the new from Rome, R. J. Russell, W. R. Stoeger and G. V. Coyne, Editors, Vatican Observatory Publicat ions, 1990 - fala de "aprendizagem mútu a" entre ciência e religião, "busca comum", "unidade relacional", sugerindo uma colaboração em pé de igualdade, não podendo dizer-se que uma é superior ou inferior à out ra'. Mas a questã o sobre a natureza e o grau de relação ent re ciência e religião vem de longe, de fo rma mais ou menos expressa. Com feito, sinal de colaboração e interação entr e os dois campos, em termos históricos, são as figuras da Igrej a que foram igualmente produzindo ciência, algumas das quais são "precursoras" da ciên cia moderna. Numa lista a esmo, poder-s e-ia m indicar os nomes de Nicolau Copérnico, Gregor Mendel, Albert o Magno, Rogério Bacon, Pierre Gassendi, Ruder Boskovi é, Marin Mersenne, Francesco Maria Grimaldi, Nicole Oresme, Jean Buridan, Robert o Grosseteste, Christopher Clavius, Nicolas Steno, At hanasius Kircher, Giovanni Batt ist a Ricciol i, Guilherme de Ockham, ent re muito s outros . O historiador Alist air C. Crombie privilegia a escola de Oxford e, em particular, dois seus eminentes represent antes: os fr anciscanos Roberto Grosseteste (1 175-1253) e Roger Bacon (1214/1 220-1292). Com efeito, a escola de Oxford caracteriza- se pela forte ate nção à lógica e

Educação ~/ora l e R ~li€: osa Catou-a

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r -- - - - - -- ---- ----- -- - - - - - - - - - - - - - - às matemát icas. A Grossete ste, qu e t ambém escreve sobre ót ica, deve-se, uma das primeiras propost as de refo rm a do calendá rio para evita r o acumular de atrasos na contagem do tempo ast ronómico. Cromb ie not a que o aut or fr anciscano atr ibui ao raciocínio matemático um papel primacial como cond ição de qualq uer progresso nos vários vetores da invest igação f ísica. Por sua vez, Rogério Bacon, que fo i aluno de Roberto Grosseteste, prolonga e desenvo lve o inter esse pela experimen ta ção , que vê como facto r de melh oramento da vida humana . Bacon refere, como exemp los, a cons truç ão, na Ant iguidade Clássica , de máqu inas capazes de viajar sob a superfície dos mares , emb ora duvide que tenham sido realizadas, na época de ouro das té cnicas alexandrinas, máq uinas capazes de voar graças a um mecanismo que aciona asas artif iciais. Não tem dúv idas de que, no f uturo, engenhos semelhant es pe rmitirão conqu istar os mares e os céus' . No entan to, a ide ia de uma harmon ia possível ou real ent re ciência e religião é exte nsiva a muitos outros autores, membros da Igreja ou não. Bast a lembrar, das épocas moderna e conte rnpor ànea, os nom es de Isaac Newton (1642-1727), William Herschel (1 738 -1822), Alessandro Volt a (1745 -1827), André Marie Amp ere (1755-1836), H. C. Oerste d (1 777-1851 ), Jon s Jacob Berzelius (1 779-1848), Karl Fried rich Gauss (1777-1855), Agustin-Louis Cauchy (1 789 -1857), James Prescot t Joule (1818-18 89), Ernest Werner Von Siemen s (1816-1892), William Thompson Kelvin (1824-1907), P. Sabatie r (1854-1941), Art hur Eddington (1882-1946), Carl Gustav Jung (1875-1 961), Werner Von Braun (1 912-1977), Max Plank (1858-1947), Guglielm o Marconi (18741937), Thom as Alva Edison (1847-1931), Albert Eintein (1879-1955), Ar t hur H. Compton (18921962). Todos eles, f ísicos , químicos, matemáticos , ast rónomos, biólogos, psicanalistas... que certamente não precisa m de apres entaçã o, admitem q ue, no essencial, não pode haver confli to entre ciência e religião. Além de marcarem indelevelmente a ciência, reconhecem o raizame religioso que habit a a investi gação científica. Para lá da natureza iluminada pela ciência, permanece o espírito que dá senti do à vida' . Importa, pois, fazer observar q ue entre ciência e fé não há, nem pode haver, op osição nat ural. O conflito/an tagon ismo, quando existe ou ainda persiste, e cujas raízes remontam sobretudo ao Iluminismo (ideia de um cer to tecnologismo exacer bado e rad icalista), reside, entre out ros aspetos, numa conceção antropológica subjacente e numa visão unilatera l e monódica do co nhecimento. Uma união como a qu e a mensagem inovadora de João Paulo II prop õe - união interativo - implica que tanto a ciência com o a co mpreensã o da fé aceit em sofrer modificaçõ es em conse quên cia dessa ínts rac ão. Eis o desaf io que este novo cenár io coloca, quer à ciên cia quer à religião.

"A ciência pode purificar a religião do erro e da supersti ção; a religião pode purificar a ciência da idolat ria e dos falsos absolutos. Cada uma delas pode int roduzir a out ra num mundo mais vasto, num mundo em que ambas podem f lorescer." João Paulo li, 1990, «Mensagem a GeorgeCoyne, S. J_. Dtretor do Observatóno do Vaticano, 1 de Junho de 1998», ln: Russel R.J ., Stoegger W. R., Coyne G. V. (eds.l, John Paul // on sc.ence and Re/Igion, Rettecucne on the New View from Rome, Unive rsity af Notre Dame Prese. p. 13 1\

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Archer, L., 199 515. «Ciência e Rehgiâc ao mesmo mvet?», Comm unio, 12, p. 478 .

Crom bie, A.C., 20 0 6, The history ot science trem Augustine to Ga/i1eo, Mine ola . N. V., Dever Publica tio ns. pp. 110 e 55. Veja-se a sugestiva obra: Goodman, T. Ied), 199 7, The Forbes Book of Business Ouotations: 10.0 00 Thoughts on tne Business ot U fe, Nova lorque,

Black Dog & Leventh al Publishers,pp. 700 e ss . (Digital: httpiz/www.vatican.va/hf.jp.H; let _198 8D6Dl_pa dre-c oyne_en.htmll.

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Ci-.. ncia e Rg, g'ao


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"Ciênc ia e fé são duas dimensões em confrontação conflitual , mas não necessariamente conflituosa, da mesm a vida humana. " Arch er, L., 20 01, «Fé e Ciência ", Brotéria, 152, p. 36 4.25 •

Pe. Luís Archer, Jesu íta, (Porto , 1926- Lisboa 2011), doutoro u-se em genét ica mo lecu lar na Unive rsi dade de Georgetown (EUA) em 1967 e f undo u os laboratóri os de Genética Mo lecula r do Insti t ut o Gulbenkian de Ciênc ia e do Inst it ut o de Ciênc ias Bioméd icas Abel Sala zar da Univers ida de do Porto. Dese mpenhou um pa pel m uito releva nte na int ro dução, em Portugal, do ensino e da invest igaç ão em Genét ic a Molecular e em Engenha ria Genética, dom inios em que publicou uma ext ensa ob ra científi c a. Presidi u à Com issão de Ética para as Ciênci as da Vida de 1996 a 2001 e é-lhe rec onhec ido um signif icativo diá logo interativo ent re ciênc ia e religião, cada qual no seu foro e propósito pec ulia res, mas com interaç ões prov áveis entre si. 5

1.1. Ciência, tecnologia e cultura: implicações o

conhecimento científico e tecno lógico t em vindo a assumir um pape l crescent emente preponderante nas nossas sociedades, associado consensua lmente ao desenvolvimen to económico , soc ial e cultural, tornando-se igualmente, dada a reconhecida irnport ància do elemento cient ifico , essen cial para as representações cognit ivas do ser humano. Ciência e desenvo lvimento vão caminhan do a par. Possivelme nte, estão hoje mais cient ist as vivos do que a soma de todos os que nos precederam. Ao mesmo tempo, como nota João Lobo Ant unes:

"A explosão da realidade virtual e do ciberespaço têm contribuído para que se crie entre os homens uma ilusão de omnis ciê nc ia, omn ipotência e omn ipresença, atributos (...) pertença de Deus". Antu nes , J . L., 2001 «Ciência e Fé», Brotéria, 152, p. 335 .

Ed ccca-i \/lc -,,: e r-<~\i gi ') S l Católic a

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Seria natural admiti r, como refere ainda João Lobo Antunes, "que o avanço da ciência te ria co mo co nsequência, como se de um j ogo de foças antagón icas se tratasse, um r ecuo da crença reljglosa ". Contu do, o oposto parece verificar-se, dad o o crescente int eresse pelos debate s ent re ciência e fé, de que é exemplo demonst rat ivo a abundante bibliograf ia hoje dedicada à questão, definida de um modo simp les, Deus e a Ciência. De facto, se a ciência oferece um molde de desenvolvimento que aposta nas descon tinuidades e nas substituições de paradigmas, a cultura não vive apenas da presente e da futuro, mas também do patr imónio herdado, que alimenta e enriquece o trabalho do presente e do futuro. to significativo, aliás, que o Papa João Paulo II tenha int itu lado a enciclica comemorativa dos vint e anos do seu pontificado , Fides et Rotio, ou seja, Fé e Razão. Nela, dirige-se especificamente aos cient istas, a quem recorda:

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"Não posso , enf im, deixar de dirigir uma palavra t ambém aos cientistas, que nos proporc ionam, com as suas pesq uisas, um conhec imento sempre maior do universo inteiro e da variedade extra ordinariamente rica dos seus componentes, animados e inanimados, com as suas comple xas est ruturas de átomos e moléculas. O caminho por eles realizado atingiu, especialmente neste séc ulo, metas que não cessam de nos maravilhar. Ao expr imir a minha admiração e o meu encorajamento a estes valoros os pioneiros da pesquisa cient íf ica, a quem a human idade muito deve do seu progresso at ual, sinto o dever de exortá-los a prosseguir nos seus esforços, per manece ndo semp re naquele horizonte a onde aos result ados científ icos e t ecnológicos se unem aos valores f ilosóficos e ét icos , que são manifestação característ ica e imprescind ível da pessoa humana". Jo ão Paulo II. 1998, Fé e RazOo. Carta enc(clico Fides et Rat;o, Braga, Editorial A. 0 , p, 142.

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- -- -- -- -- -- -- -- -- -- -- -- -- -- -- -- -- -, 1.2. Uma racionalidade global e abrangente t: interessant e nota r que João Paulo II sem pre apreciou a com panhia dos cien t ista s. Logo no pr imeiro ano do seu pont if icado, em março de 1979, recebeu no Vat icano, co m manif est o agrado, a Europeon Physic ol Society, e, no d iscurso que fez nesta ocas ião, conf ide nciou qu e, quando era ainda Arceb ispo de Crac óvia, tinha como hábito enco nt rar-se com os cie ntistas, espec ialmen te com os físicos, para diversos colóquios' . Agora, exorta os cienti st as a dial ogar co m a sabed or ia teo lógica , cons idera ndo esse diálogo da maior importâ ncia. Os cientis tas , como todo s os seres humanos, tomarã o decisõe s acerca daqui lo que em últ ima inst áncia dá sentido e valor às suas vidas e ao seu t rabalho. Por outro lado, a permuta interdisciplinar poderá proporcionar um sign ificativo prog resso na co mpreensão da verdade, que é com plexa, e, por isso mesmo , precisa de ser encarada de diversos ângulos. Por outras palavras, a ciê ncia e a religião não têm de ser incompatíveis; elas podem, de facto, coexist ir num enr iqueci men to mútuo , reconhecendo a origina lidade de ambas as grandezas. Cont udo , pers istem ainda atitudes avoengas, afigurando -se irreconciliáveis e aparen te mente contraditórias. Como também refere J. C. Gonça lves, marcados pelo modelo cient icist a de entender, segundo o qua l "cultu ra" e "cultura científica" parecem co incidir, reduzin do-se todo o saber ao processo da construção científica, vendo só o que se consegue obj etivar, passamos a viver de um produto artificial, esvaziados da sua espessura 6ntica, onde se esvai a dim ensão da te mpo ralidade' . O tem po, precisamente, isto é, a orientaç ão e a pro gressão da realidade para um termo, que torna possível a união de t udo com t udo , em part icul ar a união de Deus com o homem (quer pelo esforço do homem , quer sobretudo pela ac ão transfo rman te de Deus) é facto r essencial do cristianismo. t: também por isso que, em sentido op osto, como no-l o apo nta o hori zonte sapienci al que Joã o Paulo II adverte na sua Mensagem, deve realçar-se o ca rácter de uma racionalidade globa l e abrangente, onde os textos cien t íficos, independentemente da épo ca da sua elaboração podem exprimir imperativos ét icos e mesmo formulários religiosos de co nduta, que serão ilustra t ivos de uma posição qu e reconhece uma harm on ia pos sível ou real ent re ciência e religião. Não é dif ícil, de facto, encont rar nos textos cient íficos um raizame religioso, o subs t rato da existência' . Fundamentalmente, ta l significa reco nhecer uma hierarquização de valores, exigindo uma referênc ia ao abso luto, não estando, por outro lado, essa esca la axiológica circunscrita ao campo religioso e ét ico, mas ati ngindo toda a exte nsão da realidade - mu ndo, ser huma no e Deus" . Como refere o Papa,

"a busca da verdade, mesmo quando se refere a uma realidade limit ada do mundo ou do homem,jamais termina; remet e sempre para alguma coisa que está acima do objeto imediat o dos est udos, para as questões que abrem o acesso ao Misté rio". João Paulo II, 1998, Fé e Razdo . pp . 142 -14 3

Educação '.1ora c R(: "igic3a Cató'ica

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Em síntese , nem a ciênc ia é todo o saber nem a cultura se rest ringe à ciência. E a religião, enquanto perene elemento cult ural, acompanha to da a história do saber. Neste contex to, não há motivo para antago nismos . O ressurgimento do diálogo ent re ciência e religião deve-se em grande parte ao impacto da tecnologia sobre a cultura, principalmente em duas áreas científicas fundamen tais, a física (astrofísica) e a nova cosmologia do Big Bong, e a biologia molecular, que conduz iu à deci fração do genoma e, paralelamente, a um neodarwinismo pujante" . Signif ica ísto que o diá logo entre ciência e religião vai assumindo novas faces, determinadas certamente pelo progresso científica e tec nológico, mas também por uma nova hermenêutica da religião, que requer empenhamento solícito e competente de cientistas e filóso fos crentes, bem como o conhecimento das ciênc ias pelo menos por alguns teólogos" . Est amos perante renovados problemas que revelam e relevam o diálogo secular entre a demanda científica e as religiões, entre o noturol e o sobrenoturol enquanto polos de cham ada e de resposta. Tornando -se inapagável a presença do fator religioso no palco das sociedades hodiernas, este facto, a par de outros, obriga a recons iderar as articulações ciência -relig ião - tarefa que a presente Unidade Letiva pretende explicitar.

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Citnc '. e Religião


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1.3. Ciência e Religião: irreconciliáveis? As interrogações essenciais

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Na verdade, ciência e religião são at ividades humanas contem porãneas da histó ria da humanidade. A capacidade de nos maravilharmos perante algo espantoso e mist erioso levou-nos sempre a querer saber, a pensar no signific ado de tudo. Lembremo-nos das perguntas co meçadas com "Porquê?", ou de out ras como "Quem somos?", "De onde viemos?", "Que devo fazer?", "Para onde vamos?", "Porque est amos aqui?", "O que é a realidade?": são questões de to dos os tempos e que todo o ser humano acaba por colocar um dia . Como dizia Aristóteles, "Todos os homens desejam saber" (Metafísica, I, 1), por tendência natur al e porque a possibilidade de se projetar como ser livre supõe uma certa previsão das coisas, à luz, é certo , da cada época e em termos dos progresso s dos saberes que convergem para a clarifi cação dessas questões. Contud o, apesar da sua preponderãncia no mundo de hoje e dos seus milénios de exist ência, não é fácil defi nir quer a ciência quer a religião. Cabe, pois, nat uralmente perguntar: de que falamos quando falamos de ciência e religião? Existirá uma contradição insanável entre ambas? Poderá a religião ser suplantada pela ciência?

Ec.... cacao ' .o-e :: Rer~ : JsJ Cato.ica

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Ora, é sabido que a resposta a estas perguntas mot ivou, ao longo dos séculos, consideráveis disputas e, inclusive, combates ferozes. Verdadeiramente, elas são atividades diferentes do homem , respondendo a necess idades diferentes do mesmo homem , pelo que não há mot ivo para co nsidera r como rivais a ciência e a re líglão. Porém, o debate sobre a sua compatibilização é t ão antigo que até causa adm iração o facto de não ter ainda chegado ao f im. O que, por vezes, tem compl icado a questão é que embo ra a maior parte das pessoas estej a de acordo relativamente ao que é a "ciência", já o mesmo não sucede no que respeita ao conceito de "religião". É a partir daqu i que as duas faci lmente se contrast am. Pelo que a articulação ent re ambas tem de passar pelo esclarecimento de uma e de out ra.

1.4. O que é a ciência - função da tecnologia

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Distintos homens de ciência , Natio nal Gallery, Londres.

Vejamos, pois, quais os seus respetivos dom ínios e especificidades . Quanto à ciênc ia, e para a presente finalidade, pode conside rar-se, em termos suci ntos, como um sistema hipotético-dedutivo. Trat a-se, efetivamente, de um conjun to de conhecimentos metodicamente organizados que , para além da experiência/experimentação, utiliza raciocínios, provas e demonstrações que nos permitem obter conclusões gerais/universais. Sem discutirmos, neste momento, se a instância da verificação é essencial à construção cie ntífica, notamos que a confi rmação pela verif icação pode não ser conc lusiva, ao menos no plano teórico.

Desde logo, ao falarmos da construção científica, cabe disti nguir ent re o saber puro e a sua aplicação , isto é, entre ciênc ia e tecnologia. A ciência produz instrumentos que, por sua vez, também a torn am poss ível. Ou melhor, a ciência produz, no imediato , conhecimento, e de forma indireta produz meios de ação (instrumentos). Const rói-se com os meios que ela própria vai produzindo , podendo falar -se, neste sent ido, de um certa circularidade. Conduz -nos a procedimentos metódicos, desde que os seus fi ns sejam prev iamente definidos . Por isso, ela é essencialmente operatória; mas a função de defin ir esses f ins ou os j uízos de valor é algo que transcende o seu dom ínio. A ciência destina-se a construir um mundo, onde a vida humana não se sente globalmente envolvida. Efetivamente, a ativ idade humana de clarificação e autocompreensão não se exerce apenas no esforço científico, mas ta mbém no pensamento analítico e simbó lico , virado para a total idade do ser, que o saber teo lógico costuma co ntemplar. Se é verdade que a ciênc ia, na medida em que dec ifra cone xões causais, pode chegar a conclusões importantes sobre a compatibilidade ou incompat ibilidade dos f ins e das valorações, não é menos verdade que as definições independentes e f undamentais a respeito dos f ins em si são algo que permanece fora do seu alcance. Tal como a racionalidade ult rapassa o âmb ito da ciência, também nem todo o saber se pode reduzir ao processo da cons tr ução científica. O conce ito de razão é mais vasto do que o de razão científica . A experiência humana, onde a expe riência religiosa está incluída , não se confunde com o experimental pos itivo ou o lógico-empírico. Como escreveu o fi lósofo Ludw ig Witgen stein, "Sent imos que mesmo quando todas as possíveis questões da ciência fossem resolvidas os problemas da v ida ficar iam ainda por tocar" (Tractatus Logico- Philosophicus, 6 .52).

Com efeito, se assim não fosse, é claro que não haveria mais questões. Urge relembr ar que "existe uma verdade sob re a vida humana (a «parte essencial»), que não pode ser expressa em termos de algoritmos lógicos. Esta verdade pode ser descoberta na invest igação da filosofia, na ref lexão e adm iração da teologia e na contemplação da vida humana . Newton e Einst ein, Planck e Gódel ofereceram grandes c ontribu ições para o co nhecimento do mundo. Todavia, este saber seria incom pleto e extremamente pobre, se não tivessem existido as contribu ições de Platão e de S. Tomás de Aquino, as obras teológicas de Santo Agost inho e de John Henry Newman, as experiências místicas de São João da Cruz e as ref lexões espirituais de Thomas Merton . Se eliminássemos da cultu ra humana estes últimos elementos, permaneceríamos com uma cultura profun dame nte defo rmada e unidimensional. "

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Ctê. r- ~iJ

c Relig.ão


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"Na inst ituição de novas formas de unidade académica, num continente em que no séc ulo passado se instau raram dois sistema s total it ários, tem os o dever moral de reconhecer o valor fulc ral da dignidade humana e o seu papel elementar no seio da sociedade da nova Europa. J oão Paulo II costum ava recorrer à expressão «ecologia humana», para denota r a gama de valores básicos, necessários para promover o crescimento integral da pessoa humana. ... «valores fu ndamentais, adquiridos co m o contributo determinante do cristiani smo, que se podem compe ndiar na afirmação da dignidade transcendente da pessoa humana, do valor da razão, da liberdade , da democracia, do Estado de direito e da distinção entre vida polít ica e religião» (Exortação Apostólica Ecclesia in Europa, 109). Quando f risamos a busca humana da verdade , da beleza e da liberdade, salvaguardamos 05 valores básicos que constituem a essência do nosso desenvolvimento moral, espiritual e cultural. Como a história nos ensina, os valores humanos só resist irão se esti verem arraigados num alice rce transcendente. O célebre memb ro da Universidade de Oxfo rd e autor de The Idea of a University, J ohn Henry Newman, afi rmou: «A virtude meramente humana definha, quando os homens deixam de a mer gulhar no princípio religioso» (J. H. Newman, 1901, Paroch ial and Plain Sermons, VaI. 3, Londres, p. 40). [...] No limiar da cult ura europeia encontram-se importantes elementos intelectuais, que vão para além do princípio biológico da luta pela sobrevivência . Não havia qualquer lucro ou vantagem pragmática na solicitude helénica pela metafísica, pela ética, pela matemát ica e pela estética . Nas suas preocupações intelectuais, 05 nossos antepassados gregos sublinhavam a função da autoconsciência espiritual, inspirada pelo princ ípio do gnothi seauthon. Eles desenvolveram o papel da avaliação ética socrática, extremamente impor tante nos dilemas morais. Além disso, buscaram cânones de beleza que estã o completamente desprovidos de uma relação com a utili dade biológica. Tendo descoberto esta realidade, a pessoa humana co meço u a orienta r-se rumo a um mundo transcendente , que por si só não traz qualquer vant agem concreta imediata, mas constitui o próprio ãmago daquele ser a que nós chamamos animal rationale. Não deveríamos perm itir que a sua existência


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se reduzisse ao simples nível do «homem consum ista», interessado de modo principa l na realização pragmática . A herança cultural da antiga Grécia evoluiu, chegando a atingir o seu ápice na axiologia proposta por Jesus Cristo. Ele veio ao nosso mundo como um Men ino desprovido de um lar, e morreu como um criminoso condenado pelos líderes da sua própria nação. Declarou bem-aventurados os pobres , aqueles que choram e os que são perseguidos. Penetrando na cultura do cont inente europeu, que durante mu ito temp o era conhec ido como a Cristandad e (Christianitas), o Evangelho cr iou um a at mosf era intelectual em qu e os valores humanos univer sais eram reconh ecidos, quando se evid enciavam a fraternidade humana e a igualdade de todos os f ilhos do nosso Pai celest ial. Em t al atmosfera intelectual, por um lado, foram desen volvidos os princípios teóricos do humanismo e inclusive a doutrina dos direitos do homem; por outro, as Universidad es começaram a ser instituídas, os princípios da ciência moderna foram enfim definidos na obra de Newton, Prin cip ia, e as descobertas da tecnologia pas saram a ser coloc adas ao serviço da humanidade. Em vista de dar continu idade a est a grand iosa trad ição, na nossa pr át ica acadé mic a a expo siçã o consistente do humanismo inte gral deve ter precedência em relação à formação utilitária, em qu e chegam a ser ignorad as as dimen sõ es morais e axiológicas da ciência. [...] Existe uma verdade sobre a vida humana, qu e não pode ser expressa em t ermos de algoritmos lógicos. Esta verdade pode ser descoberta na investi gação da filosofia, na reflexão e adm iração da teologia e na contemplaçã o da vid a hum ana. Newton e Einstein, Planck e G6d el ofereceram grandes cont ribuições para o conhe cimento do mundo. Todavia, este sab er seria incompleto e extremamente pobre, se não t ivessem existido as contribu ições de Platã o e de S. Tomás de Aqu ino, as obras teol ógica s de Santo Agostinho e de John Henry Newman, as experiências mística s de São Joã o da Cruz e as reflexões esp ir itu ais de Thomas Merton. Se elim inássemos da cul tura humana estes últi mos elementos, permaneceríamos com uma cultura profundamente deformada e unid imensional." Józef Mrrosla w Zycmski, secretá rio de Estad o do VAti cano, a propósito da Intervencão da Santa Sé na IV confere ncia rrumst er tal do ' Processo de Bolonha?" .

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Ciência e Rt "j2ião


Assim, se nem t odo o saber obedece à ciência, repita-se, e sendo possível disting uir diferentes expressões de saber, ent re as quais, a religião, que abunda no pensa mento simból ico (discurso constituído por metáforas, imagens, símbolos , alegorias), os cr itérios a que geralmente se recorre para contrasta r ciência e religião, não parecem de facto de convincente alcance .

1.5. O que é a religião - O religioso e o sentido da vida Por outro lado, o que podemos entender, afinal , quando ouvimos a palavra religião? Ora, como foi refer ido, a capac idade de nos maravilharmos e querer saber é ingrediente essencial tanto da ciência como da religião. Mas a religião oferece ao homem uma resposta integral ao problema do sentido da vida e do seu dest ino. Representa , ao mesmo tempo, a transposição dos limites de uma existênc ia merament e biológica e de luta pela sobrevivência da espécie, implicando fins e valores, o pensamen to e a ação humanas face a um Poder superior de que t udo depende e que t udo governa. Com efeito, a palavra religião evoca de imediat o um com plexo de represe ntações, de ritos e de observâncias que tra duzem, exteriormente, as relações do homem com o divino ou sagrado. Usado universalmente , o vocábulo adquire as mais variadas significações, em con for midade com as cult uras e mentali dades em que se expr ime e onde historicamente emergiu e se manifestou. Neste sent ido, empregado t anto no âmbito dos cultos da religião romana ant iga como designando a nova religião cristã , o termo "religião" (religio) apresenta -se dividido entre duas etimologias possíveis: uma de origem cristã e out ra de origem dita pagã. Assim, Cícero (45 a.C.) dist ingue entre os "religiosos" e os "superst iciosos". Estes eram os que levavam os dias to dos a rezar e a oferecer sacrifícios aos deuses para que os seus f ilhos sobrev ivessem. Aqueles eram os que tod os os dias "diligentemente" prat icavam e pensavam em tudo o que diz respeito ao culto dos deuses. A palavra "religião" (religio), deriva do lat im relego, como elegantes deriva de eligere, diligentes de diligere e intellegentes de intellegere (De notura dearum, II, 28,72) . O senti da de reJigia seria confirma do pelo derivado reJigiosus que designa o "escrupuloso em relação ao culto". Religioso signif icaria, pois, pudor e recolhimento, esc rúpulo e delicadeza de consciência, cum primento do dever para com as coisas e pesso as. De sinónimo de disposição subjetiva, o t ermo depre ssa derivou, por extensão, para as realidades objetivas e correspondentes do culto e observâ ncias rituais. Os primeiros autores cristãos pude ram recolher e apurar o conce ito ass im formulado por Cicero, para fazer valer, cont ra a romana religio, a fé e a prát ica cr istãs. Nos escr itos de Tertu liano, com o Ad not iones e Apologeticum , ambos redigidos no ano de 197, "a passagem dos deuse s múltiplos ao Deus único é a passagem do erro à verdade?", opondo à Romana reJigia a vera religia veri Dei. São apresentados dois sistemas religiosos, um deve substituir o out ro, o erro deve ceder lugar à verdade.

Lactáncio (Africa do Norte, 240-320) Autor do crist ianismo primi-

tivo, foi amigodo Imperador Constantino e tutor de latim do seu f ilho c rtsous. Entre as suas obras ma is importantes enco nt ra-se Divinorum Institutionum Libri VII, um tra tado sistemático e apo logética em que mostra a fu ti li-

dadedas crenças pagãs e onde defende a razoabilidade e verdadedo crist ianismo.Constitui a primeira tentativa de expor sistematica me nte a teo logia Cristã em lat im.

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Cf. Bouitlard, H , 1976, «La tormat ton du co ncep t de retigion en Occident». ln Kannengiesser, Ch et Marchansson, Y, Humonlsme et FOI Chretlenne Méla nges scie nufiq ues du Cente naIre de l'Institut Cathclique de Paris. Paris, Beauches ne, p 445.

Educaç ão r' -ei- Ré..

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l.a ct ãnc io propõe ao termo relig io uma origem eti mológica própria, ao defender que deriva do verbo religore, "religar". A verdadeira religião dirige-se ao único e verdade iro Deus, divindade única, pelo que tende a valorizar esse laço que liga (religare) o homem a Deus". Pretende-se, ent ão, t raçar uma f ronte ira nítida ent re religião pagã e a "verdadeira religião", a religião cristã (religia christiana), que foi inaugurada num deter minado momento da hist ória e cujo mérito consiste em te r revelado os mistér ios de uma verdade até então oculta . O maior desenvo lvimento e profund idade do conce ito, por opos ição à religião pagã, a cuja repercussão assoc ia a queda do Império Romano, encon tra m-se em Santo Agost inho (século IV-V). Est e fi lósofo e padre da Igreja dedica mesmo uma obra ao est udo da religião cristã, a verdadeira religião, na qual afi rma:

"O caminho que conduz a toda a vida reta e ditosa reside na verdade ira religião, pela qual o Deus único é venerado e, com puríssima piedade, é reco nhec ido como o princíp io de todas as naturezas e pelo qual a totalidade das coisas tem o seu começo, a sua plen itude e a sua conservação". Santo Agostinho, De vere retsgione, 1, 1: 7, 13.

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Ver o completo e rigoroso artigo de Freitas, M

B (1992), «Retigtão». ln Logos, Enciclopéd ia Luso-Btas iteira de Filosofia, vai 4, pp 675-685.

Lembrando ainda algumas razões da queda de Roma e o f im do Império Romano (a inj ust iça esse ncia l), explica a preponderência crescente do Crist ianismo:

"Os mais perspicazes e respe itáveis romanos, embora obrigados a ritos demoníacos, não deixavam de acreditar que deviam presta r culto religioso, próprio de Deus, à nat ureza criada e estabelecida sob o governo e a dependência do único Deus verdadeiro". Santo Agostinho, De civitate Dei, IV. 29.

O conc eito agostin iano, pouco a pouco, to rnou-se universal, passando a designar tanto a exper iência do sagrado em si mesmo como as diversas organizações religiosas em que publicamente se man ifes ta. E debaixo deste horizonte semântico que o conceito de religião se vai formando no Ocident e, torna ndo -se um co nceito abrangente e ecuménico. Ent re as plurívocas def inições, podemos dizer que a religião configura uma atitude do hom em perante a nat ureza no seu conj unto, uma relação de ser, apreendida, experimentada e expressa de modos diferentes e em diversos graus pelas consciências individuais do homem universal, que se descob re com ela profu ndamente com prometido e realizado. Comparad a assim com a religião, a ciência é uma at ividade mais acentuadamente ant ropomór f ica.

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c ência c R, "b'JQ


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Por t udo ist o, cabe realçar que nem a experiencia religiosa se circunscreve ao âmbit o mental, nem este pode ser dissoc iado da ordem inerent e à organização de to da a realidade. A dimensão religiosa é certamente uma das mais significativas, no que ao sentido respeita . Tal co mo a intuição artística, por exem plo, também o sentido religioso acompanha o ser humano. Para a teologia e antropologia cr istãs a dimensão religiosa deriva de um acontecimento e de uma experiência primordial em que o ser humano, criado à imagem de Deus, com Ele se pode relac ionar. Trata- se do ponto de intercecão fu ndam enta l entre a pré- históri a teo lógica revelada e a pré-história científ ica , como veremos.

Síntese

1. A ciência e a tec nologia caracte rizam a nossa época , dominando, direta ou indiretamente, partes essenc iais das nossas vidas. 2. O recrudescer do diálogo entre a ciê ncia e a religião deco rre em boa medid a do impacto da te cnologia sob re a cult ura mas também de uma nova hermenê ut ica da religião. 3. A ciênc ia e a religião são at ividades desen volv idas pelo homem ao responde r a dife rentes necessidades. 4. A ciênc ia t rat a do conhec imento do mundo nat ural (incluindo o próprio homem), enquanto a religião tra t a da relação do homem com o tra nscen dente. 5. A ciênci a é um co rpo de conhecimentos sistem atizados e organizados, é o resulta do da invest igação metódica, produz teo rias explicat ivas crit icame nte avaliadas. 6. A ciência assume um carácter hipot éti co; é essenc ialmente imanente e int ramundana. 7. A religião oferece um vetar de transc endência que engloba o mundo, mas lhe at ribui um sentido que dele não deriva. 8. A religião at inge toda a extensão da realidade: mundo, ser humano e Deus. 9. A realidade que pode ser abarcada pelo modo de pensar das ciênc ias não representa, nem pode representa r, toda a realidade. 10. O saber jamais pode reduz ir-se ao processo da construção cient ífica; podemos dist inguir dife rentes expres sões de saber, entre as quais a racionalidade religiosa. 11. A religião acom panha, enquanto perene elemento cultural, toda a hist ória do saber, indo este talha ndo o seu perfil em f requente e mult iforme articu lação com os fatores religiosos. Para Ref letir 1. A primeira coisa a dizer sobre ciência e religião é que é extremamente difícil definir ambas.

Concordas?Justifica. 2.Ciência e fé cristã não são antagónicas ao nível dos seus dogmas, mas são-no ao nível dos respetívos processos.Clarifica esta afirmação.

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Eo uc ec ';o ;\1' )ra l e ReligiosJ Cate .rce

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2. Diálogo entre Ciência e Teologia

r- -- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - I 2.1. Fé e razão articulam-se e complementam-se Não há motivo para existir co ncorrênc ia entre a razão e a fé. Inquirir as origens do Universo, da Vida e do Homem faz parte da axiológica aventu ra humana, onde ciência e religião constituem diferen te s expressões de sabe r, duas ações humanas, antagón icas ao nível dos processos mas não ao nível do objeto. Visam o mesmo objeto sob formalidades diferentes e at ravés de métodos diversos. A religião refere-se ao mundo, à vida e ao homem na sua relação com Deus , enquanto a ciência o estuda do ponto de vista físico, qu ímico e biológico. Neste sentido, deve verifi car- se entre elas uma independência que não deixe lugar a co nfrontações.

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Ciência e Rel.gião


--- - - - - - - - -- - ------- - - - - - - - - - - - - - - , Há, por vezes, a t endência a ident if icar rac ionalidade e saber ou, mais exata mente, racio nalidade e ciência. A partir daqui facilmente se cont rasta a religião com a ciênc ia, para se concluir que, sendo a racio nalidade a ciência (o que é objetivo), a religião, porque destituída das características cient íf icas, carecer ia dos requisitos da raciona lidade (o que é irracional). Deste modo, o cerne do conflito (quando existe ou ainda pers iste) reside, ent re outros aspetos , na conceção antropoló gica subjace nte e quase sempre numa visão parce lar e "mon ódica" do co nhecimento, quando, na verdade, a sua est rutu ra é "po lit ónica". A ciênc ia não deve esquecer-se que part ilha com a fé religiosa o sentim ento de adm iração e espanto; deve, na sua expansão interpretativa para o contexto ontológico global, aprender da religião a sens ibilidade ao to do humano e, relat ivizando o seu reducionismo metodológico, reconhecer que ele é mais do que a soma das par tes . Na verdade, como no-lo lembra João Paulo II:

"existem duas orden s de conhecimento, distintas não apenas pelo seu princíp io, mas t ambém pelo seu objeto" João Paulo II. 1998, Fé e Razão, P 75.

Assim , importa afirma r a independência entre os domínios da ciência e da fé, quer contra qualquer forma de racionalismo quer cont ra as pos ições mais fi deíst as. As manifestações religiosas não são nem mais nem menos racionais do que quaisq uer outra s, por um lado, e, po r out ro, urge reconhecer a import il ncia do conhecimento racionai para a compreensão da fé, melhor, para a própria possib ilidade de acredit ar em Deus. Luís Archer, nome que marcou, indelevelment e, a ciênc ia em Portugal nos últ imos decénios, co nsidera que a ciência e a f é podem, de facto, co nve rg ir num enriquecimento mútuo. A ciência pode libertar a fé de uma leit ura ingénua, literal e fundamentalista da Escritura e de atitudes de superstição e magia que atribuem ao sobrenatural o que é exp licá vel pe la natu reza. A t eologi a poderá igualment e, sem perder a sua especif ic idade, recorrer com vantagem a alguns cânones met odol ógi cos da ciência contemporânea" . Com efeito , a pos ição at ual opõe-se a ambos os ext remos , defen dendo uma união int erati va entre ciência e re ligião . Como é sabido, aludindo ao chamado "Caso Galileu", João Paulo II reconheceu que houve erros da parte dos homens da Igreja e pediu desc ulpa por eles, ao mesmo tempo que urgiu que se inic iasse um estudo aprofundado e sereno da histó ria daque le tempo, para que to da a verdade fosse repost a e todo o antagonismo se desvanece" . Em 14 de setembro de 1998, João Paulo II pub lico u a carta encíc lica Fides et Ratio, destinada precisamente a disc ut ir as relações ent re a Fé e a Razão. No proém io encont ra-se a cél ebre imagem que resume o teo r dos ensinamentos do Papa: "A f é e a razão (fides et ratia) const it uem como que as duas asas pe las quais o esp írito huma no se el eva pa ra a contemplação da ve rdade "" . A encíclica contém o programa de Joã o Paulo II para combater a separação entre a teologia e a ciência. O Pont ífice faz o diagnóstico das causas que levaram a tal separação, que teve, na sua avaliação, consequências nefastas para a humani dade . São do Papa estas palavras:

Educação t.toret e ~~ ~ : .)sa Cató lica

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I

"No âmbito da invest igação científica, fo i-se impondo uma mentalidade pos itivista, que não apenas se afastou de toda a referência à visão cristã do mundo, mas sobretudo deixou cair qualquer alusão à visão metafísica e mora l. Por causa disso, certos cie ntistas, privados de qualquer referência ét ica, correm o risco de não manterem no ce ntro do seu interesse a pessoa e a globa lidade da sua vida. Mais, alguns deles, cien tes das potencialidades contidas no progresso tecnológico, parecem ceder à lógica do mercado e ainda à tentação dum poder demiúrgico sobre a natureza e o próprio ser humano". João Paulo II, 199B. Fé e Rozdo. p. 66.

Com efeito . João Paulo II é contr a a polarização e mútua exclusão da ciência e da religião. Uma refl exão sobre a racionalidade da relação entre ciênc ia e fé pareceria, aliás, co nt raditó ria caso se visse a racionalidade co mo antít ese da fé, da míst ica, da religião, co mo se o que é "objetivo" ident if icasse a ciência e o que é "irracional" fosse reservado à teo logia. A ciência def inir-se -ia, ent ão, em cont raste com a religião, que seria sempre exter ior e oposta àquela - posição expressamente criticada e rejeitada por Jo ão Paulo II. Vamos, portanto, expor a posição do Papa João Paulo II, glosando dois dos seus discursos mais emblemáticos, escr itos, respetivamente, em 1996 e 1998; textos nos quais o pontíf ice advogaj ustamente a interação e convergência entre ciênc ia e religião. A quest ão que assim enquadra a int ervenção papal, como vamos ver, faz equacionar as implicações antropológicas entr e a Revelação e as te orias da evolução (para o Papa, devemos dizer "teorias", mais do que "teoria").

2.2. Mensagem de João Paulo II à Academia Pontifícia das Ciências, 22 de outubro de 1996 Trat a-se de uma perspet iva proposta, há quase um séc ulo, por Mauric e Blondel e Teilhard de Chardin, ofic ialmente preconizada por João Paulo II na Mensagem à Academia Pontifícia das Ciências, em 22 de outu bro de 1996, cujos membros haviam reunido para tratar da origem da vida e da evolução . Nesta mensagem, o Pontífice, logo após menc ionar a encíclica Humoni generis, escrita por Pio XII, em 1950, referiu-se ao discurso de 31 de out ubro de 1992 na Pont ifícia Academ ia de Ciência s:

"Da minha parte, quando recebi os que tomaram parte da assembleia plenária da Academia em 31 de outubro de 1992, tive a oportunidade, no que diz respeito a Galileu, de chamar a atenção para a necessidade de uma hermenêutica rigorosa que corretamente interpret asse a palavra inspirada. É necessário determinar o sentido próprio da Escritura, enquanto se evita quaisquer interpret ações indesej adas, que dizem o que não se faz intenção de dizer. De modo a delinear o seu campo de estudo, o exegeta e o teólogo devem manter-se informados acerca dos resultados obtidos pelas ciências naturais". «Mensagem do Papa João Paulo II à Pontifícia Academia das Ciências sobre a relação entre Revelação e teorias da evolu ç ão», disponível em: http ://goo.gl/BorV36.


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Na perspetiva de João Paulo II, a separação entre razão e fé causa danos irrep aráveis tanto à religião como à cultura . Para o Papa, o caso Galileu Galilei t raz à memória a semp re presente tens ão exist ent e entre razão e fé. Ao refe rir Pio XII, João Paulo II salienta que aquele Papa afirmou não haver oposição ent re a do ut rina cr istã e a t eoria da evolução, sob con dição de alguns pont os indisputáveis; por exemplo, o corpo humano pode provir de uma outra forma pré-existent e mas a alma humana provém diretamente de Deus. Diz ent ão João Paulo II que, hoje, pass ado quase meio século da publicação da carta encíclica Humon i generis, "novos conhe ciment os dão -nos co nta de que a teoria da evolução é mais do que uma mera hipótese". Deste modo, também elevando o estatuto epist emológico da teo ria da evolução, fica evidente que o Papa quis est imular os teólogos a emp enha r-s e no estu do da evolução e a examinar as consequências dela para a doutr ina cristã. Por outras palavras, a invest igação científica não é necessariamente antagónica à fé, pode mesmo ajudar a co mpleta r a criação divina . Não há razões por que cr iar tensões entre fé e ciência. t: pois de desejar que os estudos teo lógicos contemporàneos não percam de vista o progresso do conhecimento científico, nomea damente, como sub linha o Papa, o que se refere ao "homem e ao seu ambie nte de vida". Refere a seguir o Papa que a Revelação e a teo ria da evolução não podem contradizer-se, pois "a verdade não pode cont radizer a verdade". São ainda palavras dirigidas à Academia Pontifícia das Ciência s:

"O Magistério da Igrej a está particularmente interessado na quest ão da evolução, porqu e influi na conceção do homem, acerca do qual a Revelação nos ensina que foi criado à imagem e semelhança de Deus. (...) Mas, além disso, o homem está chamado a ent rar numa relação de conhecimento e de amor com o próprio Deus, relação que encont rará a sua plena realização para lá do tempo, na eternidade. No mistério de Cristo ressus citado revelou -se-nos toda a profundidade e toda a grandez a desta vocaç ão". Ib,d

verdade que as teorias da evolução , inspiradas meramente pelo ideal de natureza, cons iderando que o "espírit o" emerg e da "matéria viva" ou que se tr at a de um sim ples "epifenómeno", são incompatíveis com a verdade sobre o homem , e assim incap azes de explicar a dignidade da pessoa. Este excerto do discurso de Joã o Paulo II constitui, a este título, uma importante referência para a sua antropologia, como fundamento da teologia do cor po. A pessoa humana é considerada a instância essencial que permite estabelecer ligações entre ciênc ia e religião. Com efeito, quando proferiu este discurso já tinha desenvolvido uma ant ropologia, ao longo de quase t rês anos (5-IX-1979 a 10-11-1982), estr uturada sob a forma de um tríptico: "uiotico de palavras essenciais e constitut ivas para a teolog ia do cor po" (cf. audiênc ia geral, l 1-XI-1981 e 21 -VII-1982). Composta por tr ês partes fundamentais , a te ologia do co rpo tem como obj etivo dar a conhecer uma visão integ ral do ser humano: na Criação, "varão e mulher"; na dimensão histór ica, "redenção do corpo"; no mundo novo, "ressurreição". É

Nesta antropo logia, João Paulo II coloca a pessoa huma na num plano t rans-hist órlco, isto é, como portadora das ligaçõ es ent re Criação, Redenção, Consumação. A novid ade reside no facto de se insp irar no Comentário Literal 0 0 Génesis, de Santo Agostinho.

Edt.caçáo t.toraí t: Re'igio sa Católica

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Tal como o Bispo de Hipona, tam bém João Paulo II analisa na primei ra parte do trípt ico os três primeiros capítulos do Génesis: da criação ao pecad o original (Gen 1,1 - 3,24). Acrescenta a esta prime ira parte Gen 4,1-2, de modo a impedir que o corpo e a sexualidade humana sejam conotados com o pecado das origens. Esta linha de conti nuidade não permite a habit ual rutu ra entre o "pri ncípio" da Criação e o "começo" da dimensão histórica propriamente dita.

r- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -- - - -- - Ao apo iar-se no Comentário Literal 00 Génesis também ele se detém nas dinâm icas de "princípio", "início" e "começo", que def ine como «pré- hist ória teológica revelada», num conceit o de te mpo ant erior à dimensão histórica e cronológica. ~ nesta pré-h istória teoló gica - int emporal - que ident if ica e matiz a as diferenças entre o Fiot Lux genesíaco e o Big Bang científ ico. No entanto, con sidera os t rês primeiros capítu los do Génesis um acontec imento determina nte para a experiênc ia do ser huma no histó rica após o pecado ori ginal. Ainda na primeira peça do t rípt ico intr oduz duas categorias antropológ icas diferentes - antropologia adequada e antropologia naturalista - que lhe per mitem definir a natu reza humana na co ndiçào ante rior e poste rior ao estado de int egridade inicial. São este s dois modelos que conciliam, numa perspe t iva t eológica e ant ropo lógica, a visão integral do ser humano e a teoria da evolução. Somos ass im con f rontados com toda a prob lemát ica que surge quando se avaliam os limites da história ent re a teoria do Big Bang e a consumaçã o dos séc ulos. Para Jo ão Paulo II, a antropologia do tr ípt ico pe rmite resolver muitos dos questioname ntos que a ciência at ual coloc a, no âmb ito das biote cno logias e das biome dic inas, pela simples razão de que o próprio ser humano é o "lugar" onde se unifica m espírito e mat éria. Assim o afi rmou na aud iêncio geral de 8 de obr il de 1981:

"Ao analisar estes te xtos chave da Bíblia até à próp ria raiz do sentido que encerram, descobrimos aquela ant ropologia que pode ser denominada «teologia do corpo». Esta teologia do corpo fundamenta o método mais apropriado para a pedagogia do corpo, isto é, para a educação - mais propriamente: para a autoeducação - do homem. Tudo ist o adquire uma atualidade particular para o homem contemporâneo, cujos conhecimentos no campo da biofisiologia e da biomedicina, progrediram muito. Contudo, estas ciências tratam o homem sob um determinado e único «espeto» e, portanto, são mais parciais que totais. Conhecemos bem as funções do corpo como organismo, as funções vinculadas à masculinidade e à fem inilidade da pessoa humana. Mas estas ciências, por si só, não conseguem desenvolver a consciência do corpo como sinal da pessoa . Todo o desenvolvimento da ciência contemporânea no que se refere ao corpo como organismo, tem carácter de conhecimento biológico, porque está baseado na desvinculação entre o corpóreo e o espiritual no homem. Partindo de um conhecimento tão unilateral das funções do corpo como organ ismo, não é difícil chegar a tratar o corpo, de maneira mais ou menos


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sistemática, como objeto de manipulação; neste caso, o homem deixa, por assim dizer, de identificar-se subjetivamente com o próprio corpo, porque é privado do significado e da dignidade que derivam do facto de que esse corpo é, precisamente, da pessoa. Neste ponto, encontramo-nos nafronteira de certos problemas que exigem soluções fundamentais, que resultariam impossíveis sem uma visão integral do homem. (...) Esta pedagogia pode ser entendida sob o aspeto de uma específica «espiritualidade do corpo»; com efeito, o corpo, na sua masculinidade ou feminilidade, é dado como uma tarefa ao espírito humano - como foi dito de modo estupendo por São Paulo com a sua própria linguagem. Através de uma adequada maturidade espiritual, converte-se inclusive em sinal da pessoa - de que a pessoa é consciente - e em autêntica «matéria» da comunhão interpessoal. Dito noutros termos: o homem, através da sua progressiva maturidade espiritual, descobre o significado esponsal do próprio corpo."

A criação do primeiro ser humano antecede qualquer forma de cont ingência ou. até mesmo, de evolução da maté ria, pois tem a sua origem na própria vida ínt ima de Deus, do qual é imagem. Na primeira parte do tríptico, João Paulo II projeta a criação do ser humano, o modo como Deus Uno-Trino plasma na matéria corpo - diferencia da em masculino e fem inino - a Sua vida ínt ima de comunhão de Pessoas. Assente nas fontes da Revelação, distancia-se das metodologias escolást icas e fenomenológicas que anterio rmente t inha ut ilizado em Pessoa e Ato'Oe Amor e Responsabi lidade". É marcante o salto qualitativo que realiza numa eficaz cooperação entre antropologia cristã e ciências. Na mesma Mensagem que dirigiu aos part icipantes do encontro plenário da Pontifícia Academia das Ciências, em outubro 1996, João Paulo II referiu-se precisamente os limites da ciência, face à questão fundamental da dignidade humana:

"Em consequência, as teorias da evolução que, em função das filosofias nas quais se insp iram, consideram que o espírito surge das forças da matéria viva ou que se trata de um simples epifenómeno desta matéria, são incompatíveis com a verdade sobre o homem . Por outro lado, essas teorias são incapazes de fundar a dignidade da pessoa human a. Ass im, referindo-se ao homem, poderíamos dizer que nos encontramos perante uma diferença de ordem ontológica, perante um salto ontológico. Mas, colocar esta descontinuidade ontológica, não significa defrontar-se com a continu idade física, que parece ser o fio condutor das invest igações sobre a evolução, e ist o no plano da física e da química?" «Mens agem do Papa João Paulo II à Pcnttftcra Acade mia das CIências sobre a relação entre Revelação e t eonas da evoluç ão».

É assim legít imo, sublinha o Papa, dizer que nos encon tramos ante uma diferença de ordem ontológica, isto é, ante um salto onto lógico. Mas, cabe perguntar, em que t ermos? Será questionando a "continuidade física, que parece ser o fio co ndutor das invest igações sobre a evolução, tanto no plano da física como no da química?"

João Paulo II recorda algumas linhas metodológicas a serem observadas pelos te ólogos que se debruçam sobre questões que são sim ultaneamente objeto das ciênc ias humanas e das ciências natura is, ao afirmar que "para delinear o campo do seu próprio estudo , o exegeta e o t eólogo devem manter-se informados acerca dos resultados cons eguidos pelas ciências natura is?". Mas João Paulo IIt raça claramente os limites entre as ciências da nat ureza e as ciências f ilosóf ico-t eológicas:


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"As ciências da observação descrevem e medem as múlt iplas manifestações da vida com uma prec isão crescente, correlacionando-as com a flecha do tempo. O momento da transição para o espiritua l não pode ser objecto deste género de observação, embora possa descob rir ao nível exper imenta l uma série de valiosos sinais que indicam aquilo que é específico no ser humano. Mas a exper iência do conhec imento metafísico, da autoconsciência e da autorref lexão, da consciê ncia moral, da liberdade ou da exper iência estética e religiosa, é da competência da análise e reflexão filosóficas, enquanto a teologia, por seu lado, permite compreender o seu significado últ imo, de acordo com os planos do criador". Jbid. Um por todos. veja-se: Se-r ão. Daniel, 1992, «As grandesquestões antropológicas provocadas pelo desenvolvimento cientifico e tecnológico», Humanístico e Teologia, 13, pp. 163-176.

Estam os verdadeiramente perante as implicaçõ es antro pológicas da ciência do nosso tempo e tematizadas expressamente por João Paulo II.

2.3. O homem como imagem de Deus. Uma "antropologia adequada". A primeira parte do tr ípti co da teologia do cor po é fundam enta l para esclarecer a quest ão da "descontinuidad e ontológica", explicando em que consiste o salto ont ológico perante as teorias evoluc ionistas . João Paulo II co meça por ampliar a perceção do real e colocar a criação do ser humano num plano ante rior ao começo da dimensão histó rica; ist o é, situa -a num "princípio" de integridade - o estado de inocência original - que tem a sua origem na part icipação da vida ínt ima de Deus. Também o livro da Sabedoria nos dá notíci as desse primeiro estad o:

"Com efeito, Deus criou o homem para a incorruptibilidade e fê-lo à imagem do seu próprio ser". Sb 2.23

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Extrato das mãos na coccco de Adão da Capela Sis tma , MIgue l Ângelo.

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Ciência e Religão

João Paulo II expõe as dinãm icas de comp letude ent re o primeiro e o segundo relato do Génesis. O primeiro relato provém da t radição sacerdotal, num plano teológico e metafísico; pelo cont rário, no segundo capítulo deparamos com uma descr ição arcaic a, com relevantes caracter ísticas antropomó rficas. Embora o primeiro capítulo ofereça uma visão cosmológica, o ser hum ano não é aí cri ado segundo uma sucessão nat ural, igual ao ciclo da criação: "o Criador parece deter-se antes de o cham ar à existênci a, como se voltass e a entr ar em si mesmo para tomar a decisão: «Façamos o homem à nossa imagem e à nossa semelhança ...» (Gen 1,26)". "Deus criou , então , o ser humano à sua imagem: homem e mulher os criou (cf. Gen 1,27)."


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João Paulo II afirma , na Audiênc ia Geral de 12 de setem bro de 1979, que este salto onto lógico (ser imagem de Deus) impede a redução do homem ao «mundo», "o homem não pode se r nem compreendido nem exp licado, em toda a sua profundidade, co m as categorias t iradas do «mundo», ou seja, do con junto v is ível dos corpos" (AG, 12- IX-1979). Demarca -se, assim , da antropologia natura lista que reduz o ser humano às mesmas categorias encontradas na natureza . O segundo relato do Génes is corresponde à descrição detalhada de como Deus plasmou a sua imagem no ser humano, homem e mulher, imagem que tem a forma de uma "com unhão de pessoas". Ou seja, Deus projeta no ser humano, dife renciado em mascu lino e fem inino, a sua vida ínt ima: a visibilidade da imagem de Deus corres ponde também às caracter ísticas corpóreas (cf. AG, 2+1980). A passagem de Gen 2,23 revela essa comunhão de pessoas na est rut ura do ser huma no. O salto ontológico dá -se nesta consubstancialidade genét ica, entre varão e mulher - no desdobramento somát ico da mesma humanidade - , à imagem da "imagem consubstancial" int rat rinit ária.

Na continuação, João Paulo II int roduz a t eologia e ontolog ia da imagem, uma noção f undamental da t radição Patrística. Nos primeiros séculos da era cristã, os Padres da Igreja - Atanásio de Alexandria, Gregório de Nissa, Gregório Nazianzeno e Basílio - viram a necessidade de def inir os conce itos de pessoa e de imagem cristãs face à cultura grega-heleníst ica, profundamente marcada pelo ideal da natureza. Real izaram então a inversão teológ ica e antropológica desses concei tos , que é hoje de extrema atua lidade. Ficou definido, no primeiro conc ílio de Niceia (325) e em Calcedónia (451), que os conce itos cristãos de imagem co nsubsta nciai e de pessoa têm a sua origem na Trindade de Deus" . Nestes dados elementares assenta toda a originalidade da antropologia de João Paulo II, demarcando -se das tradicionais int erpretações sobre fé e ciência ao ent rar no campo da semiót ica. Precisamente, o reconhecimento , ou não, da consubs tancialidade da imagem de Deus na natureza humana t ransfor mou-se no campo de bat alha da cultura atual. Na primeira peça do t rípt ico da teo logia do corpo refere ainda Génesis 5,3 e afirma que a imagem de Deus se conti nua a transmitir (depois do pecado original) por geração-co nhecimento: "O texto de Gen 5,3: «Adão... engendrou um fi lho à sua imagem e semelhança», une-se explicitame nte ao relato da criação do homem (Gen 1,27)" (AG, 12- 111 -1980).

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Cf. Schonborn, c, 1999, EI tcono de Cnsto. Una tntroducc,ón teo/ag/co, trad casto de Antonio Belletla. Madrid. EdicionesEncuentro, pp 17e 55

Educação Me-a ! e R: :igiosa Católica

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,- -- - - - - - - - - - - - - - --- ---- - - - - - - ---2.4. O Génesis como documento "científico" Um out ro elemento a cons iderar, a propósito das ligações (reais ou possíveis) entre Criação e teoria da evolução , foi apresentado por Werner Arbe r, presiden te da Pontifícia Academia das Ciências, durante a oitava congregação geral do Sínodo para a nova evangelização, em outubro de 2012. Convidado espec ial para o Sínodo dos bispos, Werner Arber, professor de microbiologia, que foi prémio Nobel da medicina, em 1978, juntamente com os investi gadores americanos Hamilton Smith e Daniel Nathans , falou, nesta intervenção sinodal , da compatibilidade entre o conh ecimento científico e a fé religiosa :

"Por longos períodos, homens curiosos adquiriram o conhecim ento cient íf ico sobret udo observando co m os seus senti dos e ajud ados pela refl exão mental, pelo raciocínio lógico. O capítul o do Génesis no Ant igo Testam ento represent a para mim o testemunho de uma antig a visão cient íf ica do mundo já existente desde há diversos milhares de anos. Além disso, este capítulo reflete uma ampla concordância entre a fé religiosa e o conheciment o cient ífico dispon ível na época . (...) Deixando de lado a questão da Revelação, ele é claramen te uma narração lógica da poss ível origem evolucionista das coisas segundo acontecimentos imaginados que t inham levado à natureza obse rvada pelas antigas populações. Da genealogia descrita no Ant igo Testamento, posso conc luir t ambé m que os seus autores estavam consc ientes das variantes fenotípicas (ou sej a, genéticas). As pessoas desc rit as ti nham as próprias caract erísti cas pessoais, não eram, por conseguinte, clon es genet icamente idênt icos a Adão e Eva. Nestas narrações , podemos encont rar uma boa coerência ent re a fé religiosa das origens e o conhec imento científico dos desenvolv imentos evolucionistas. Hoj e, é nosso dever conservar (e, se for necessário , restabelecer) esta coerência com base no melhorado conhecimento científ ico de que agora dispomos. Na minha opinião, o conhecimento científico e a fé são, e devem permanecer, elementos co mplementares do nosso saber orientad or." L'Os s erva tore Romano. edição semanal em port uguês, 17 de outubr o de 2012, p.22 .

Tal com pat ibilidade tem vindo j ust amente a ser considerada por inúmeros investigadores , sobr et udo ao nível mais fundamental da físic a, da cosmo logia e da biologia; conse quentemente, ampliando e entrecruzando as fronteiras das suas pesquis as".

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cencta e Rc, <:" 10


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o que está realmente em causa é aceit ar e co mpreender que o homem é produto de um desígnio divino, ou então apenas o resulta do de uma seleção nat ural. Na primeira parte da sua antrop ologia, Joã o Paulo II vai ta mbém analisar o "mit o adàm ico" disti nguindo-o dos restantes mitos criacionistas. Afirma, na mesma linha de racioc ínio de Werner Arber, que o primeiro reloto do criação "é conciso, livre de qualquer marca de subjetivismo: contém só o facto objetivo e define a realidade objetiva do ser humano" (AG, 12-IX-1979). A narrat iva do Génesis não está meramente ao nível da fábula ou do mito, pois descreve um processo de cri ação da vida humana, acompanhado por uma experiência inter ior e espiritu al, não verificáveis por meio dos métodos de exper imentação cientifica. A Mensogem de 22 de outubro de 1996 confirma-o: "Aconsideração do mét odo utilizado em diversos campos do saber permite pôr de acordo dois pontos de vista, que pareceriam irreconcil iáveis. As ciências da observação descrevem e medem cada vez com maior precisão as múltiplas manifestações da vida e inscrevem-nas na linha do tempo. O momento da passagem ao espirit ual não é objeto de uma observação deste tipo que, contudo, a nível experimental, pode descobrir uma série de sinais muito valiosos do carácter específico do ser humano. Mas a experiência do saber metafísico, da consciência de si e da sua índole reflexiva, da consciência mora l, da liberdade ou, inclusive, a experiência estética e religiosa, competem à análise e à reflexão filosóficas, enquanto a teolog ia deduz o sentido último segundo os desígnios do Criador."

Descrevendo met aforicamente a forma ção do homem primordial e a sua colo cação por Deus no "pomar de uma várzea" e não no "Paraíso terrestre das delícias" espiritua is humano- divinas, os dois primeiros relatos do livro do Génesis oferecem -nos elementos essenci ais para se con hecer a visão integral do ser humano, a sua origem e o sent ido da história. Teologia e onto logia da imagem são pilares estruturant es dessa antropologia adequada, t emati zada por João Paulo II, também para explicar a questão da origem do mal. Com efeito, quando analisa o segundo relato da Criação, João Paulo II refere vários auto res dos séculos XIX e XX, para indicar diferente s interpret ações sobre o con ceito de mito. Centra- se, acima de tu do, no texto de Paul Ricoeur, Le conflit des interprétotions", que melho r ident if ica a diferença que se dá, de um século para out ro, entre as narrativas bíblicas e os mito s criacionist as:

Ver Ricoeur, P. 1969. Le ccnfut des mterpretotIDns , Paris. ~d du SeUlI. pp 291 e 55.

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::d .cacao ' /C? ' e 12'"gio':> J Ca. ó.ica

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"O mito adâmico é por excelência o mito antro pológi co; Adão quer dizer Homem; mas todo o mito do homem primord ial não é mito adâmico, que é o único prop riamente antropológico; nele dist inguem-se três aspetos: o mito et iológico refere a origem do mal a um antepassado da humanidade atua l cuja condição é homogénea à nossa C..); o mito etiológico é a tentativa mais extrema para ultrapassar a origem do mal e do bem . A intenção deste mito é a de dar consistência a uma orige m radical do mal diferente da origem mais originária do ser-bom das coisas (.. .l. Esta distinção do radical e do originário é essencial ao carácter antropológico do mito adâmico; é aquele que faz do homem um começo do mal no seio de uma cr iação que tem já o seu começ o absoluto no ato cr iador de Deus; o mito adâmico subordina à imagem centra l do home m primord ial out ras figuras que tende m a descent rar o relato, sem port anto suprimir a primazia da f igura adâmica." .João Paulo II. AG, 19- IX-19 79

Para responder às interrogações cruciais que se insurgem na ciência atual, sobre o mais além do universo observ ável, o mist ério incom preensivel, o predecessor de Bento XVI rompe as categorias do esquema clássico. Quando int roduz o conceito de "pré-histór ia teológica" - pré-científ ica - antepõe uma outr a forma de conhecimento, no "princípio", onde é possível conjugar a dimensão psicológica e subjetiva da pessoa humana com a experiência obj et iva do conhecimento das coisas em Deus. Nào se trata, portanto, de uma perspeti va anti científica mas de conson ância de realidades, de uma simultaneidade, onde tudo é presente em Deus. Trata-se de uma outra forma de conhec imento, que reúne e post ula outras possibilidades, capaz de ampliar os hor izontes das mais recentes descobertas da física das partículas e da cosmo logia. Segundo as últimas teorias, o universo supõe dois modelos: o stondord (sem antima téria) e o altern ativo (com ant imatéria). Avaliando a teoria da evolução segundo o modelo cosmológico stondard, que tem início com a deflagração do Big Bang, essa evolução corresponde a apenas 5% de uma tota lidade que permanece inacessível. O pensamento crist ão aceita esta perspet iva da evolução, mas ultr apassa-a quanto à origem e f initude. Vejamos, pois, em primeiro lugar, algumas das mais recent es formulações científ icas.

2.5. A ciência alarga as fronteiras do modelo cosmológico standard Como é sabido, o universo da ciência, sobretudo nas últimas décadas, tem vindo a fornecer elementos preciosos para um aperfeiçoado conhecimento do mundo da matéria. As ciências naturais, da física das partículas elementares e da cosmologia às ciências da natureza, da biologia à biomedicina e neurociências, todas têm contribu ído para o aprofundamento da comp reensão do universo obs erv ável e do próprio ser humano. Os art igos de fundo das mais prest igiadas edições científicas demonst ram-no e tornam acessíveis. a um público alargado, os grandes feitos da invest igação científ ica. Do macro ao microcosmos é notório que a ciência domina grande parte das leis que regem o nosso universo. Matéria, tempo e espaço, têm sido redimensionados no intuito de chegar a def inições mais abrangentes e possíveis à compreensão humana. Grandes questões como, por

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exemplo, o que se esconde para além do nosso universo, têm vindo a impor -se com maior insistência desde a deteção da partícu la subatóm ica, designada por Bosão de Higgs; e mais recent emente, desde a descod ificação da «radiação cósm ica de fundo» (a designada Era de Planck) revelada nos inícios de 2013. Estabe lecidas as fro ntei ras do universo observável os físicos avançam já noutra direção, anterior à def lagração do Big Bong, algo que ultrapassa o ãmbito da estrita ciência embo ra a questão seja colocada , precisamente, pela pró pria ciência. A edição da revista Science & Vie, de maio de 2012, avança com esta novidade: "Antes do tem po, fora do nosso Universo , os primeiros sinais para além - os físicos começam a descrevê -los". Também o número espec ial da Science & Vie, de setembro de 2011 , inteiramente ded icado aos «Dez grandes enigmas da ciênc ia», coloca cinco hipóteses sobre os poss íveis cenários ante riores ao Big Bang. Essas hipóteses, esquematicamente, são as seguintes: • "1 .' Cenário anter ior ao Big Bang: Um tempo infinita expandiu -se. Há uma dezena de anos, Thibault Damour, do Insti t ut des Hautes Études Scient if iques de Bures-sur-Yvette, Marc Henneaux, do Insti t uto Solvay, na Bélgica, e Hermann Nicolai, do Instituto Max Planck , na Alemanha, lançaram uma pro posta de causar vertigens sobre o possível cenár io da origem do Universo. Estes três físicos estudam uma teor ia da gravidade quânt ica a 11 dimensões no quadro da teoria das cordas. Eles constataram que atravessando o muro de Planck, (isto é, projetando antes dos 10-43 segundos), toda a noção de distância , e de um modo geral o conjunto de parâmet ros que descrevem a geometr ia do espaço-tempo, desapa rece' Assim , segundo estes f ísicos, antes da era de Planck, a própria ideia de espaço muito simplesmente não faz qualquer sentido. Não resta senão o te mpo, mas não importa qual, pois segundo os teó ricos, este alonga-se à medida que o aproximamos da singularidade inicial! «Torna-se impreciso», admite Thibault Damou r. «Mas, tecnicamente, constatamos que quanto mais remontamos ao passado, mais aume nta o número de fenómenos físicos que se produzem entre os dois instantes». (. ..) É possível que, entre a era de Planck e «o inst ante inicial», o intervalo de tempo a percorrer não ten ha limite .

• 2.' Cenár io anterior ao Big Bang: Membranas que colidem. Em 2011, Neil Turok, da Univers idade de Cambridge, e Paul Stei nhardt , de Princeton , inspiraram- se na ideia contida na t eoria das cordas, de um espaço-tempo que poss ui não três, mas dez dimensões de espaço. Segundo eles, o nosso Universo poderá ser apenas uma espéc ie de membran a t rid imensiona l, cha mada 'brane', f lutuan te entre outras membranas num espaço de dimensão superior. Após os seus cálcu los, duas membra nas inicialmen te vazias atraem-se ante s de ent rar em colisão. A energia do choque é então transfo rmada em mat éria e em radiação, naqu ilo que nós chamamos big-bang . As duas membranas afastam-se então uma da outra dilat ando- se, ao mesmo tempo que o seu conteúdo mate rial se organiza. Este cenário não pode produzir-se se não uma vez. Mas é igualment e poss ível que aconteça ciclicamente. Neste caso, a expansão de uma membrana reduz-se antes que ela se afaste de uma outra com a qual t inha ent rado em col isão. A expansão acelerada averiguada atua lmente no nosso Universo poderá ser... o sinal de um próximo choque.

• 3.' Cenário antes do Big Bang: O Universo contra iu-se. Depois dos cálculos de Abhay Ashtekar, Tomasz Pawlowski e Parampeet Singh, da Universidade da Pensilvânia, é possível imaginar que um universo preexistente desde toda a eterni dade teria suc umbi do pelo efeito da força da gravidade . Quando acede à densidade crítica, a gravitação torna- se repulsiva, e irá então explod ir (provocando o nosso big-bang) , antes de ent rar na fase de expansão que nós constatamos atua lmente. Este cenár io baseia-se na teoria quãntica elástica (concorrente da teoria das cordas), que estipu la que, quando a dens idade do


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Universo ultrapassa mil milhões de massas solares numa dimensão co mo a de um protã o, a gravitação t orna-se repulsiva. Assim, com este cenário, uma vez mais, o Universo existe desde toda a etern idade. Por isso, após os recentes t rabalhos de Mart in Bojowald, também da Universidade da Pensilvãnia, durante a explosão, o Universo ter- se-la encontrado num esta do qu ânt ico de uma inson dável incer teza. A tal ponto que toda a info rmação sob re o pré -universo teria sido definiti vamente eliminada.

• 4 .0 Cenár io anterior ao Big Bang: A matéria formou buracos negros. No cenário desenvolvido por Gabriel Veneziano, do College d e Franc e, e Maurizio Gasperini, da Universi dade de Bari, no início dos anos 1990, o Universo é eterno, no passad o como no f ut uro. Bat izado 'Pr é- Big Bang', projeta-se num passado longínq uo, no qual o cosmos con tinha um gás extremamente diluído de radiaç ão e matéria. Pouco a pouco, as forças ganharam em intensidade e a matéria começou a agregar-se, a ta l pon to que em certas regiões, fo rmar am -s e buracos negros. Dentro de cad a buraco negro, a densidad e da matéria con t inuou a aumentar até alcançar o valor má ximo permitido pela teoria das c ordas. A matéria explodiu então sob re si mesma, recom eçando a alast rar, dando origem ao que nós chamamos big-b ong. Nesta visão, o nosso Univer so será apenas o interior de um desses buracos negros.

• 5.' Cenário anterior ao Big Bang: Multiplicarom-se outros big-bang. Nos anos de 1980, Andrei Linde, da Universidade de St anfo rd, desenvolveu a teoria da inf lação, segundo a qual, pouco depois da era de Planck, o Universo co nheceu uma fase de expansão ace lerada durante a qua l o seu diâ metro se teria mu lt iplicado po r 1030 , Ora, segundo a teo ria da inf laç ão, o nosso Universo, bem mais vasto que o Universo observável, poderia ter um diêmet ro de 10 à potência de 10 à potência de 10 anos - luz. Mais ainda, esse Universo não seria mais que uma ínf ima fração de um meta-universo no qual, a ca da inst ante, e ist o desde toda a eternidade, uma nova fase de infl ação poderia produzir-se, engend rando uma nova 'bo lha' numa espuma de inf initos universos. Aliás, segundo os avanços mai s rec entes da teoria das cordas, poderá exist ir à potência de 10500 à potênc ia de 101000 j ogos diferent es de parãmetros nece ssár ios para descrever um universo. Também, segundo Léonard Sussk ind , da Universidad e de St anford, é possível que, cada um dos universos nasc idos da inf lação eterna, t enham as suas próprias leis físicas. O nosso Big Bang não seria mais do que um epife nómeno numa história sem limite, nem espac ial nem temporal". (Science & Vie, número especial, setembro de 2011 ). Cabe, portanto, naturalmente perguntar: "O que está mai s além?" Precisamente, em fevereiro de 2012, a conh ecida revista Science & Vie anunciava que os "primeiros sinais de mais além' seriam em breve acessíveis graças ao satélite Planc k. No entanto, é preciso ainda espera r para ver o que há antes do Big Bang e o que existe fora do Universo. Por agora, os cosmólogos acaba ram de revelar o mapa das flutuaçõ es térmicas da radiação fóssil, graças ao qua l será possível examinar a teo ria acerca do nosso Universo. Entretanto, foi publicado o mapa da polarização difusa de fundo co smológica. Segundo as teorias especulativas sobre o que est á para além da cosmologia standard, é este mapa que talvez contenha os primeiros sinais do que está para lá". (Science & Vie, maio de 2013). Perant e ta l sit uação, pod emos dizer que a epistemo logia at ual, mesmo não mencionado a palavra te ologia, não deixa de sent ir uma certa nosta lgia da unidade e da globalidade do saber, próp rio da teologia. As novas interpretações da ciênc ia faci litam a aproximação desta à teologia. Ao mesmo tempo, vão-se redefinindo as f ronteiras do que de facto pode ser comprovado pela ciência nestas teorias, como é o caso da anti matéria; é necessário socorrermo- nos de fundamentos ant ropo lógicos . Nas últ imas décadas os limit es da ciênc ia têm adq uirido contornos signif icativamente mais amp los, isto é, pretende -se fazer uma reavaliação das fro nte iras do campo de atuação da física , que interfere já com questões metafísicas e da próp ria religião. Estamos, sem dúvida, diante de uma grande revolução que, no ent ant o, se mantém ainda no êrnbito da matéria. Neste senti do, apresentam-se duas quest ões cru ciais: con siderar a eternidade da matéria , que do caos evolui at é um estado de per feição , ou um universo onde tu do o que existe é criado do nada e obedece a regras, isto é, a uma hierarquia de valores, da qual, verdadeiramen te, tudo dependerá.

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2.6. A Mensagem de João Paulo II a George Coyne, Diretor do Observatório do Vaticano, de 1 de junho de 1988

Neste exato contexto, além da Mensagem que temos vindo a referir, pela semelhança da temática e do t ratamento dado ao assunto, import a igualmente mencionar a carta de João Paulo II ao padre George Coyne, diretor do Observatór io do Vaticano, de 1 de junho de 198826, caracte rizada, por um insuspeito historiador da ciência, como sendo "o mais importa nte e específico documento papal sobre as relações entre religião e ciência publicado em tempos recentes? ' . Esta mensagem, como o observa Luís Archer, foi t ão universalmente considerada como inovadora, que se publicou um livra de comentários sobre ela, recolhidos dos mais variados quadrantes religiosos e cient íficos, que tem precisamente como subtítulo Reflections on the New View tram Rome" . Segundo Luís Archer, para melhor avaliarmos a novidade e originalidade desta posição de Roma, te mos de a contrastar com atitudes anter iores, tomadas ao longo da hist ória. E est as podem ser esquematizadas em t rês posições principais: concordismo, antagonismo e separatismo. De todas se distancia a mensa gem de João Paulo II, no que elas representam de reduto r e inibit ório. Seguindo o texto de Luís Archer, vejamos entã o quais são as caract erísticas principais dessas perspet ivas, com as quais cont rast a a posição de João Paulo II - a nova posição de Roma.

Educacáo Mora l e Religiosa Católica

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Concordismo A posição concordista foi particularmente ciara nos séculos XVII e XVIII, em que a ciência e a fé estavam de acordo. Utilizavam-se dados ou teorias cient íficas para fu ndamentar teses t eológicas ou para mostrar que a Bíblia tinha razão. t: a físico-teologia de William Derham, com a demonstração da existência e atribu tos de Deus. Ou aínda, por exempio, a Biblia naturae de Jan Swammerdam, a defender que o sábio descob re na natureza aquela mesma presença de Deus na sua giória que se afirma pelos livros santos. Esta posição teve mesmo reflexos no século XX, em discursos de Pio XII, em que ele ut ilizou resultados cient íficos de astronom ia e cosmo logia ou teorias como a do Big Bang no intuito de provar a ação criadora de Deus. Antagonismo Está historicamente provado que a uruao conco rdista, que buscava nos resultados científicos argumentos para a crença religiosa, teve responsabilidades no surgir do ateísmo moderno e da situação de antagonismo ciência/ religião. Contudo, se o progresso científico substituiu aiguns argumentos do concordismo, persisti u a convicção de que ele deveria existir, porque cont inuava a julgar-se que as concl usões científicas e teológ icas se localizavam ao mesmo nível, como se tivessem o mesmo objeto formal. Pelo que a sua oposição levou a um choque inevit ável. O homem é impelido pela religião numa direção, e pela ciência na direção oposta. Típicos foram os casos de Galileu e a controvérsia evolucionismo/cri acionismo. Separatismo Uma solução para o citado antagonismo foi, por vezes, constru ída, relegando ciência e religião para mundos diferent es e compartimentos estanques. Tendo elas objetos formais diferentes, t eriam forçosament e objet os mater iais diferentes . A parti r daqui, facilmente se concluiria que os conflitos não deveriam surgir enquanto cada uma se mantivesse no seu âmbito. A consequê ncia é que a construção teológica alheou-se por completo dos dados científicos, e a ciênc ia desinteressou-se da fi losofia e da teologia para a elaboração da sua mundividência. Ainda na perspetiva de Luís Archer, a separação de ciência e fé indicia-se em algumas posições filosóficas (de que é exemplo a distin ção kantiana entre razão teórica e razão prática), tornando-s e fre quente em cert a teolog ia protestante, em que a doutrina religiosa é esvaziada de um significa do de conhec imento objetivo, ficando este a pertencer exclusivamente à ciência. Os conflitos , neste sentido, desapareceriam, mas à custa do empobrec imento e da capacidade cognitiva da t eologia. Como sublinhámos, no polo oposto a t odas estas atitudes, perniciosas para o diálogo entre ciência e religião, está J oão Paulo II. Na sua mensagem ao padre George Coyne, considera que "t ant o a ciência como a religião devem preservar a sua autonomia e a sua especificidade. Cada uma delas deve possuir os seus próprios princípios , as suas normas de procedimento, as suas diversidades e as suas próprias conclusões. O Cristianismo possui a fonte de jus tificaç ão dentro de si mesmo e não espera que a ciência constitua a sua apologética primária. Ainda que ciência e religião se devam apoiar mutu amente como dimensões diferentes de uma cultu ra humana comum, nenhuma delas se deve assumir como const ituindo uma premissa necessária para a outra . A religião não se fundamenta na ciência, nem a ciênc ia é uma extensão da religião. A ciênc ia pode purificar a religião do erro e da superst ição. A religião pode purificar a ciência da idolatr ia e de falsos absolutos." João Paulo II most ra-se contrário a quaisquer formas de fusão, oposição e separação, propondo uma união em complementa ridade. O Papa distan cia-se do antagonismo, pretendendo encerrar uma era de conflitos que ele diz que eram evitáveis e que mancharam a hist ória ta nto da ciência como da religião. Por outro lado, distancia- se do separatismo, propondo uma união

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Ciênc ia ., Religião


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de esforços, que diz evitará a fragmentação da cultura humana e o caos. Mas nesta união distancia- se igualmente do concordismo ao insistir que tanto a ciência como a teologia devem manter íntegros os seus principios, a sua autonomia, as suas normas de procedimento e as suas conclusões. E acrescenta:

"A união que nó s procuramos, com o já sub linhámos, não

é identidade. A Igreja não propõe q ue a c iência se torne re ligião, ou a religião se t orn e ciência . Pelo contrário, a união pressupõe sempre a divers id ad e e a int egrid ade dos seus elementos. [...] pois a união em que um dos m embros é absorvido po r outro, é uma uniã o d estrutiva, fa lsa na s suas promessas de harmonia e ruinosa para a int egrid ade dos seus componentes . Pede-se-n os que sejamos um, não que nos transform emos un s nos outro s." Cp. ct . p. Ma .

A natureza e a função da ciência e da religião alteram-se completamente, se transferidas do registo do conflito e da luta para o da relação comungante, atingindo esta toda a realidade e não apenas a dimensão humana. Pa ra esta interação, o Papa, julga que a teologia, ao buscar a inteligibilidade da fé, deve incorporar metodo logias ou teorias cientificas. to certo que o significado de "ciência" mudou muito desde os tempos medievais. Esta mudança não foi bem acompanhada pela teologia, o que a levou de ser acusada de não-racional ou não-científica. A questão é agora se a teologia poderá, sem perder a sua especificidade, recorrer com vantagem a alguns cânones metodológicos da ciência contemporânea. Ta l como Tomás de Aquino, no século XI II, assimilando a física e a metafisica aristotélicas, forneceu algumas das mais profundas expressões da doutr ina teológica, assim também os teólogos contemporâneos devem realizar obra semelhante a part ir da ciência moderna. João Paulo II diz mesmo que os progressos científicos do nosso tempo desafiam a teologia muito mais do que a introdução de Aristóteles no Ocidente. João PauloIIconcretiza oseupensamentofazendo asseguintesperguntas:

"Se as antigas cos m ologias do próxim o oriente pudera m se r pu rificadas e assimi ladas pe los prime iros capítu los dos Génesis, não poderá a cosmologia contempo rânea ofe recer algo às nossas refl exões sobre a criação? A perspetiva evolucionist a não poderá p roj et ar alguma luz sobre a antropologia teo lógica, o sig nif ica d o da pesso a hu mana com o im agem d e Deu s, o p roblema da Cristo log ia e até mesmo sob re a evolução doutrina l? Qua is são (se de f act o existem) as implicações escato lógicas da c os m ologia contemporâ nea , especial mente à luz do fu turo longínquo do nosso planeta? Poderá o método teo lógico apropriar-se com util idade das perspetivas d a metodologia científica e da f ilos ofia das c iências?". oo. cit., p. M11.

Ed ~ c:ct o r torcl -:: Religiosa Cetc.lca

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Deste modo, tal com o os pensadores medievais, que desenvolveram a categoria bíblica da historicidade, consider aram que para conhecer a realidade não era sufi ciente a apreensão da essência da natureza, a partir, por exemplo, do hilemorf ismo da filosofia natura l de Aristóteles, também os pensadores religiosos atua is devem incorporar no seu fieri esquemas científ icos e f ilosóficos, reconhecendo que todos esses modelos são precários (inc luindo os teo lógicos) e que eles, por isso mesmo, nunca podem esgota r a realidade. Eis um dos fatores que fac ilitam, decerto, a abert ura ao diálogo.

2.7. As posições dos Papas Bento XVI e Francisco Os Papas Bento XVI e Francisco abraçam igualmente a perspetiva int roduzida por João Paulo II, como no- lo indicam seus próprios discursos. Com efeito, em out ubro de 2010, no discurso que dirigiu à Pont ifícia Academia das Ciências, nos chamados encon tros plenár ios, Bento XVI cent rou-se na ref lexão sobre «A herança científ ica do sécul o XX», aí tendo confirmado a importância dos prog ressos científicos , sobretudo no que respeita ao conhecimento do macrocosmos e do microco smos. Most rando o apreço da Igrej a pelo inegável progresso da investigação científica, referiu-se aos limit es das ciênc ias e à necessidade da f ilosof ia para uma melhor definição dos f undamentos e das metodologias, rumo à t ransdisciplinaridade. As suas proposta s de ref lexão revelam uma ampla abertura de horizontes:

"Em primeiro lugar, ao cresce r profundamente dentro de nós a maravilha perante a comple xidade da natureza, graças aos resultados cada vez mais numerosos das ciências, a necessidade de uma abordagem interdisciplinar coincidente com a reflexão fi losófica que conduza a uma síntese, é cada vez mais senti da. Em segundo lugar, as conquistas cient ífi cas neste novo sécu lo deveriam conformar-se sempre com os imperat ivos da fratern idade e da paz, contribuindo para resolver os grandes problemas da humanidade e conc entrando os esforços de todo s em direção ao verdadeiro bem do homem e do desenvolv imento integral dos povos do mundo ." i' os se. vcrcre Romano, eotcao semanal em português, 6 de novembro de 2010, p. 7.

Um out ro encontro marcante realizou- se após a conclusão do Sínodo para a nova evangelização, a 8 de novembro de 2012. Na presença de Werner Arber, Bento XVI voltou a propor a unidade interdisciplinar af irm ando que:

"As ciênc ias não são mundos intelet uais separados uns dos outros e da realidade, mas ao contrário estão interligados e orientados para o estudo da natureza como realidade unificada, inteli gível e harmoniosa na sua indubitável comple xidade. Esta visão tem pontos de encontro fecundos com a visão do universo adotada pela filosofia e pela teologia cristãs, com a noção de ser participado, no qual cada criatura, dotada da própria perfeição, participa também numa natureza específica , e isto no seio de um universo ordenado que tem origem na Palavra criadora de Deus." L'Osservatore Romano. edição semanal em português, 17 de novembro de 2012, pp.5 e 7.

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Ciêr~ ia c Religião


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Através de uma renovada leit ura da Criação, t orna-se possivel, sob vários ângulos. abrir perspet ivas inovadoras à dimensão histórica e antec ipar, com realismo, as coordenadas do mund o novo. Pretende-se adq uirir uma visão unific ada do ser humano e da histó ria, isto é, contemplar a unidade e globa lidad e do saber. No capitulo IV da Exorta ção Apostóli ca Pós-si nodal, A Alegrio do Evongelho, o Papa Francisco indicou uma outra chave de leit ura que co rresponde aos "quatr o princípios relacionados com tensões bipolares próp rias de toda a realidade social" (221-237). Os quatro axiomas prop õem a conc iliação dos paradoxos ("tensões bipolares") "num plano superior que conserva em si as preciosas poten cialidades das polaridades em co ntraste" (228), Estes quat ro princípios foram anter iormente refer idos numa entrevista conced ida pelo Padre Scannone, ant igo professor de grego de Jo rge Mario Bergoglio:

"Quando era provincia l. Bergoglio fa lava de prio ridades e dava alguns critérios. Eram quatro axiomas. O todo é maior do que a soma das suas partes. A unidade deve ser sempre superior ao conflito. A realidade é mais decis iva do que as ideias. E o tempo t em precedência sobre o espaço".

PAPA

FRANCISCO A ALEG RIA DO EVANGELHO Exortação Apo stólica Et'llngtUi GaudiUIfI

L'Osservatore Romano, edição semanal em português, 7 de abril de 2013, p.4.

Deus af lora, assim, como fonte inesgot ável, como expressão máxima da realidade, a possibilidade de todas as possi bilidades, e ainda como termo da relaçã o comungante do ser humano . Trata -s e da capacidade de organizar sinteses orient adoras que. pela sua simplicidade e potencialidade desarmantes, dã o origem a novos processos. Quando nos detemos sobre estes quat ro princípios, encont ramos um ce rto paralelismo com as atua is tens ões, presentes no campo da fis ica, ent re macro e microcosmos e que dificu ltam a fo rmulação de uma teori a acerca do Tod o. Para a resolução dos parad oxos, o Papa Francisc o propõe o modelo poliédr ico, não a esfera. Vê na estrutura poliédrica o modelo da solidar iedad e. que se opõe ao sincret ismo, e possibilita a harmonia dos opost os:

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ti..... Exorta ção Apostóhca Evangelll Gaudlum, publica da em 24 de novemb ro de 2013

"A solida riedade. entendida no seu sentido mais profu ndo e desafiador, torna-se assim um esti lo de construção da história. um âmbito vital onde os conflitos. as tensões e os opostos podem alcança r uma unidade multifacetada que gera nova vida". Papa Francisco, 2013,A Alegr;o do Evangelho. Lisboa, Edições Paulinas, p. 228

-- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -- - - - - - l Quando privilegiamos o modelo poliédrico. a razão tom a um carácter dinâmico e const rut ivo e as resoluções torna m-se viáveis. No encontro com os Universitários. Reito res e Professores, dos Ateneus romanos e italianos, a 30 de novembro de 2013, Francisco apont ou de novo para a est rut ura poliéd rica que, segundo ele. permite uma maior flexibilidade para lidar com as diferenças (cf. L:Osservotore Romono, edição semanal em português, 5 de dezembro de 2013).

Ed rcacao Mora: " R: ligiosa Cetófca

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Síntese 1. Não há dúvida de que ciênci a e religi ão têm coisas em co mum. As pon tes começam logo pelo simples facto de serem ambas at ividades huma nas, isto é, de terem o homem como ator comum. 2. O sentid o do mu ndo dem andado pela ciênc ia - a ordem natural do mundo e a sua explicação pela lógica e pela experiênci a - não é o mes mo sent ido demandado pela religião - a ordem do mundo invocando O t ranscendente. 3. Não se pode dizer que uma atividade seja superior à outra: elas são de uma ordem diferente ao pe rseguirem objetivos distintos e ao usarem metodologias próprias. 4. Nem racionalismos exacerbados nem simp les f ideísmo . Todos os reducionismos metodológ icos são perniciosos. 5. Ciência e religião devem procurar o enr iquecimento mú tu o atra vés do respetivo contacto ; elas serão ma is completas se estiverem bem informadas acerca uma da outra. O Homem é um só e só se poderá compreender o Homem se se olhar para tu do aquilo que ele faz. 6. Para Joã o Paulo /I, a antítese ent re razão, fé, mística, religião causa danos irreparáveis tanto à religião como à cultura - que é o berço de todo o saber. 7. O chamado "c aso Galileu" fo i um mo me nto de ru ptu ra que iniciou todo um historial de antagonismo entre ciên cia e religião. 8. A pessoa humana é o ce ntro da relação entre ciênc ia e religião. O Papa J oão Paulo /I repre senta a nova pers pe t iva de Roma, segund o a qual ciência e fé são duas dimensões em conf ronta ção, mas não necessariamente co nf litu osa, da mes ma vida humana . 9. Inspirando-se na Esc ritura e em Sto . Agost inho, Jo ão Paulo II fo rmu la e dese nvolve uma antropologia em conso nà ncia e com pleme ntaridad e co m a imagem do mun do que a ciência oferec e. 10. O ser humano, que é "imagem de Deus", não pode ser compreendido nem explicado, em toda a sua prof undi dade, com as categorias provenientes do mun do natu ral. 11. Nos relatos mít icos do Génesis enco ntra mos já uma coe rênci a ent re a fé religiosa das origens e o con hecim ento científi co do s desenvolvimento s evolucionistas. 12. A ciência é um sistem a aberto, em cum pr ime nto e realização permanentes, visando uma certa unida de e globalida de. As novas interpretações da ciência e da própria racionalidad e facilit am - não dific ultam - a aprox imação à teologia. 13. O cris t ianismo po ssui a fon te da sua j ustificaçã o dent ro de si mesmo, não deven do esperar que a ciência cons titua uma sua apologética. 14. Ainda que ciência e religião se devam apoiar mutua mente, enquanto dim ensões diferentes duma cu ltura humana comum, nenh uma de las se deve assumir como constitu indo uma premissa necessária para a ou tra . 15. A religião não se fu ndamenta na ciência, nem a ciê nci a é uma extensão da religião. 16. A Igreja não propõe que a c iênc ia se torne religião, ou a religião se torne ciê ncia . 17. A ciência parte do observável ou experimental e, através do método cientif ico, estuda o mundo, a vida e o ser humano do ponto de vista físico, qu ímico ou bio lógico e conclu i os "cosmos" do universo e da sua evolução. 18. A fé adere à palavra revelada po r Deus e tenta perspetivar os "po rquês" últ imos do mu ndo, da vida e do ser hum ano na sua relação com o Deus da revelação, atra vés de uma ref lexão teológ ica que recorre à análise dos géneros literários, da filosofia antrop ológic a e de dados cient íficos . 19. Conc ord ismo, antagonismo e sep arat ismo são noci vos tanto à ciência co mo à religião . Em boa verdade, ciê nc ia e fé não existem. Exist e o Homem, construtor compulsivo do progress o científico e perseguidor imparável de Deus. 20. Os Papas Bento XVI e Francisco abraçam a perspetiva introduzida po r João Paulo /I: Ciência e fé espe lham , a seu modo, a tensão entre as duas naturezas antitéticas da pessoa de Cristo: a natureza humana e a natureza divina. Para Refle tir

1. João PauloII refere frequentemente ter-se instaladona ciência uma mentalidadepositivista. Quesignifica essa afirmação? 2. Segundoo Papa, nem a Revelação pode contrariar a teoria da evoluçãonem o inverso. Explicita as lrnolicec ões antropológicas da teoria da evolução. 3. A episte mologia atua l favorece a aproximação à teologia. Concordas com esta ft rmac ão? Just ifica.

4. A nova perspetiva de Roma, apesar de apelar para uma união entre ciência e religião, é diametralmente oposta à fusão de ambas e à apropriação de dados científicos para fins apologétic os. Clarifica a nova posição papal.

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Ciàr-:'a e R(- .sióo


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3. Religião, conhecimento científico e progresso moral

3.1. Domínio do espírito sobre a matéria No capítu lo VI da te rceira encíc lica de Bento XVI - A Coridade no Verdade - subordinado ao tema do "desenvo lvimento dos povos e a t écnica"> , o Papa emé rito relaciona rO PE RENED IC T XVI o progresso tecnológico com o segundo relato do livro do Génesis, inscrevendo-o no mandato de "cultivar e guardar a te rra" (Gn 2,15). Reconhece o inegável potencia l dos meios t écnic os que, unidos à autonomia e liberdade do ser humano, exprimem e conf irmam "o do mínio do espír ito sobre a matéria". O progresso tecnológico tem o seu ponto de partida na Criação e exprime as potenc ialidades do ser humano criado nào i só à imagem de Deus mas, t amb ém, como cocriador. De igual modo , o primeiro relato do livro do Génesis indica a supremacia do ser huma no em relação a todas as coisas cr iadas: "submetei a terra . Domin ai sobre ..." (Gn 1,28). A evolução tecno lógica é inerente à consciência e à capacidade de domínio do universo material , que tem como fina lidade o progresso e o desenvolvimento da vida humana ao longo dos séc ulos (cf. Caritas in Veritate 69). O progresso tecnológico é um poderoso aliado da investigação científica e potencia o sentido corpóreo da vist a. Quando o número especia l da Science & Vie, de setembro de 2010, nos coloca perante este grande desa f io: "Ver o invisível - Como a ciência ult ra passa os limites da nossa visão", não podemos deixar de questionar em que cons iste tal capacidade de visõa. Tratar-se -á de uma forma de acesso à visão interior e esp iritual adqu irida através dos meios tecnológicos? Que invisível? O mundo do esp írito? Potenciará a tecnologia a visibi lidade do mundo espiritua l? De um outro esta do da maté ria? Aqui é necessário def inir as diferentes categorias de mundo: mundo espi ritua l e mundo submetido às leis da física. Na sua antropologia João Paulo II fala-n os de um "etbos" do corpo - que provém da forma interior e espi ritua l referente à imagem de Deus - mais do que de uma "éti ca", no que se refere à moral e aos comportamentos humanos. O mundo espiritual t raz co nsigo uma nova visão, tanto da ciência co mo da religião, onde a técnica resu lta em benefíc io da pessoa.

,CHARITY I lN TRUTH

Sinteticamente af irman do, a pessoa humana constitui a questão matr icial das relações entre ciência e tecnologia, bem como entre ciência e religião. Se a tec nologia tem a função de facilit ar o acesso a novas formas de conhecimento, entendidas como dom ínio do espírito sobre a matéria, estamos então a assistir ao processo de inversão, no cam po biológico, que amp lia os hor izontes e acede a outras dimensões da realidade, sendo também, nesse processo que a referência à transcendência, decisiva na religiosidade, se impõe.

Educação' 'ora: e Religiosa Católica

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Cresce, cada vez mais, o interesse pelas neurociências, que é o vért ice desta s ligações. Talvez pela consciência de que através do conhecimen to das funções do cérebro humano se poderá aceder ao conhec imento integral da pessoa e obte r, assim, supremacia também no modo de t ratar e errad icar diversas patolog ias. No capitulo IV da sua terceira encíclica, Bento XVI afirma:

"A técnica per mite dominar a matéria, reduzir os riscos, poupar fad igas, melhorar as condições de vida. Dá resposta à própri a vocação do trabalho humano: na técnica, considerada como obra do génio pessoal, o homem recon hece-se a si mesmo e realiza a próp ria humanidade. A téc nica é o aspeto objetivo do agir humano, cuja origem e razão de ser estão no elemento subj et ivo: o homem que atua ". Bento XVI, Camas ln vent ote, 69 ,

Neste sent ido, tem interesse considerar aqui o art igo de fu ndo da revista Science & Vie, de dezembro de 2013, sobre a plast icidade cerebral relacionada com a especialização profissional. Na at ividade pro fiss ional inscreve-se a difere nça que dista ncia os seres humanos do mundo animal:

"Cada um, à nossa maneira, ocupamos os milhões de neurónios em algo mais que a procura de alimento e de parceiros reprodutivos. As inumeráveis espécies com as quais partilhamos o privilégio de seres vivos demo nstraram amplamente que não têm necessidade de uma tal hipertrofia do córtex para assegurar as suas exigências básicas. Que fazer destas inumeráveis células nervosas disponíveis que a inativid ade conde nará à morte? É vital. (. ..) Conhecemos a plasticidade do cérebro, a sua capacidade de se organizar

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C:ência e Religião


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e reorganizar em função dos riscos e das solicitações da vida. O que descobrimos hoje vai muito para além. Desde que sabemos observar os cérebros dos viventes graças à Imagem de Ressonância Magnética, desde que nos dotámos dos meios próprios para seguir a evolução do que se passa na nossa cabeça ao longo da sua vida, nós descobrimos uma coisa inaudita: o cérebro transforma-se em função da atividade profissional exercida, ao ponto de que aquele que corresponde a um motorista de táxi aparece muito diferente do de um músico ou de um desportista. Literalmente: tornamo-nos naquilo que fazemos."

A ciênc ia tem vindo a revelar, com pormenor crescente, os segredos da biologia que suporta a vida. Quem somos? O que som os? O que é e para que serve o cérebro? Será a mente humana capaz de descobrir qualquer coisa que a tr anscend a? Como pode mos garantir que estamo s providos dos instrumentos apropriados, quer sensor iais quer cognitivo s, para aceder ao conhecimento global? Eis algumas das questões que hoje guindam as neurociências. Dito de outro modo: a dimensão religiosa não é um apêndice do espírito humano; as manifestaçõ es religiosas não são nem mais nem menos racionais do que quaisquer out ras A este nível a religião pode af lorar ulteriormente no espírito, co m profundidade e 30 Referim o-nos a celebre formula minúcia, a invest igação científ ica. Ou, parafraseando o poet a, quanto mais verdadeiro.mais poético" mais profundo, mais verdadeiro".

3.2. Neurociências profissional

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de Novelis "quanto

cérebro e a atividade

~ inequívoco que a ligação entre as biomedicinas e as biotecnologias oferece espaço preferencial às neurociências. As neurociências, precis amente, estiveram no centro das comu nicações apresentadas no Fórum Saúde, organizado pela Fundação Calouste Gulbenkian , ent re 9 e 10 de outubro de 2012, com o sugestivo título «Brain.org». Foram debat idas questões essenciais ao conh ecimento da pesso a:

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Structure of qNA Bt RNA "A neurociência da consciência. Porque é que dormimos? O que é a consciência Moral? Quando o cérebro toca música . Neuro-estética: cérebro, beleza e arte. Podemos cop iar o cérebro humano em computador? O teu cérebro tem um género? Porque o cérebro é diferente - Os novos desafios éticos".

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Verificam-s e avanços cada vez mais significativos sobre o conhecimento da ativ idade cerebral. Há desco bertas que produzem até alguma perplexidade e que obrigam a repensar o ser humano, como, por exemplo, a capacidade que o cérebro tem de mod ificar o seu próprio ADN: ao longo do seu tempo a vida regenera-se cont inuamente. Por outro lado, apesar dest as descobertas significativas. os cient istas debatem-se para encon trar as causas que conduzem às doenças neurológicas degenerat ivas, co mo é o caso da depressão , esquizofr enia, alzheimer, aut ismo, etc.

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3.3. Alterações climáticas - limites à criatividade humana? Um out ro grande problema, com o qual os homens da ciência se confrontam, são as alterações climá ticas; a Terra é um planeta em alto risco: tempestades cada vez mais violentas, sismos, dilúvios e secas, vulcões e furações. Somos conscie ntes de que as alt erações climáticas estão int imamente ligadas à exploração excessiva dos recursos do planeta , com desrespeito pelas próprias leis da nat ureza. Estamos diante de um paradoxo, equacionado ent re a veloz con quista do espírito humano sobre a maté ria e o ponto de não retorno climát ico. 60" ~O"

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Alte rações cürnaticas: Mapa do fen ómeno conhec ido como EI NII10 "Chart of ab norma ! ocean surface temperatures ("C] observed ln December 1997 dunng t he last stro ng EI Nino. Nancnal Centers for Environmenta ! Preoictlon . USA ~

Com a revolução industrial das nanotecnologias (a tec nologia desenvolvida à escala subató mica), o ser humano tende a explorar cada vez mais a própria natur eza a f im de alcançar todas as possibilidades que lhe proporc ionam auto nomia e liberdade. Neste sentido, fala-se já em "mater iais sobrenaturais" - os novos t ijolos da matéria - obtidos a partir de uma matéria-p rima simplif icada e aperfeiçoada à escala subatómica. A ciência, aliada à produção de inst rumentos tec nológicos, tem a virtude de nos int roduzir num universo cada vez mais simplificado, cont udo, existe o risco considerável de ceder à matéria um poder que não lhe é próprio. Bento XVI dá-nos cont a disso mesmo:

"Otema do desenvolvimento aparece, hoje,estreita mente associado também com os deveres que nascem do relacionamento do homem com o ambiente natural. C..) Quando a natureza, a começar pelo ser humano, é considerada como f ruto do acaso ou do determinismo evolutivo, a noção da referida respon sabilidade debilit a-se nas consciência s". Bento XVI, Coritos ;n verrrcte . 48.

Embora os alertas seja m considerados à escala global, sobretudo nas Cimeiras, parecem não resta r dúvidas quanto ao desacordo sobre a prevalência do bem comum.

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Ciênc'a ... Re'i: iJo


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Em boa verdade, o prob lema amb ient al é tanto científ ico, como téc nico e político; mas é igualmente um prob lema cultu ral, éti co e religioso, pois nos bast idores da crise ecológica emerge a questão da j ustiç a, da igualdade de direitos humanos e do respeito pelo mundo natu ral. Por outro lado, à ciência não compete presc rever o que é bom ou mau nem f ixar critérios de valor. Impõe-se o recurso à ét ica, à cri ação de uma nova ment alidade e à int erferência da religião, para dar às ciências a consci ência de que devem orien tar-se para o bem comum .

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3.4. Ética e investigação científica Etica e ciência mantêm um diálogo, por vezes, "dif ícil'?'. Não por que a ciência seja natura lmente adversa à ét ica, ou a ét ica uma manifestação ant iciência. Na verdade, ambas são criações do espírito humano, que é uno; ambas buscam, para o Homem, felic idade e auto-realização; ambas têm ãmb ito limit ado, aspirando a uma comp lementação de mútuo interesse, uma vez que o cientista é também um ser humano e, portanto, ético. Mas, então, porque conf lituam ética e ciência? Como sublinhámos, a ciência e a tecnologia caracte rizam a nossa époc a, dominando direta ou indiretamente partes essenciais das nossas vidas. Por um lado, franque aram ao Homem oport unidades dificilmente imagináveis, em quant idade e qualidade, de coloc ar a nat ureza ao seu serviço e de aliviar a sua própria sorte neste mundo. Por outro lado, e estamos a ganhar cada vez mais consc iência disso, a ciência e a tec nologia tam bém conferiram ao Homem a capacidade de se destruir a si e a todo o meio natura l em que se encontra inserido. Assim, a ciência e a tec nologia celeb ram os maiores t riunfos, deixando-nos, ao mesmo tem po, com uma antevisão do abismo" . 31

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Arc her, L.,2005, ~O difícil diálogo entre ética e ciência", in Ciência e Ético: do Célula ao Embrião. Atas do 8 0 semin6rio do CNECV (Lisboa, 2004), Lisboa,

Presidênciado Conselho de Ministros, pp. 101-111. Dürr, Hans-Peter: Nabodil. Lumir, 1999, Da ciéncia

à ético: o teco moderna e a responsabilidade do cientista. Lisboa, Instituto Piaget, p. 37.

EduC3ÇtiO1\:0(, ' '"' Rd il.. ; ' c- ~ cstorca

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r-- -- - - - - - -- - - - -- - -- - - - ---- - -- - - - - Por tudo isto, são de vária ordem as questões que se coloc am relativament e aos sentidos do desenvolvimento da ciênc ia e da tecnologia. Por exemplo: até que ponto se pode afir mar que a ciência é neutra? Até que ponto os cient istas têm responsabilidades éticas perante as sociedades? Até que ponto a investi gação científ ica, os seus resultado s e aplicações são domínios separados? Mais ainda, os direitos humanos devem prevalecer sobre a invest igação científica ou devem apenas ser uma coor denada a ter em consideração? A invest igação científica deve ser regulada de form a mais rígida ou mais liberal do que out ras atividades humanas que afetam interesses moralmente relevant es? Na verdade. debaixo de todas estas questões é impossível não pressent ir um antagonismo. muit o antigo. ent re cient istas e eticistas. De alguma forma faz lembrar o conflito das duas cult uras de que falava Lord Snow". Da parte dos cient ist as relevava-se, pode dizer-se, uma arrogância moral, declarando que a ciência nasce de uma imaculada concecao e que a culpa não é dos cientistas mas das aplicações que derivam da ciência, ou seja, da tec nologia. A ciência seria, entã o, moralmente neutr a; já a tecnologia, sobret udo porque implica uma fu ncionalidade, seria moralmente 'carregada'. Ora, isto não é obviamente verdade hoje em dia, visto que a dist inção entr e ciência e tecno logia se encontra cada vez mais esbatida. Por outo lado, como vimos, a realidade que pode ser descrita por métodos científi cos, não representa nem pode representar a realidade propriamente dita, a realidade toda . Além de nem todo o saber se reduzir ao proc esso da construção científica , a ciênc ia não pode lançar luz sobre a "parte essencial" para o Homem dessa realidade propriamente dita . Por outo lado ainda, a credibilidade da ciência depende da integridade da invest igação científ ica. Chamar a aten ção, assim , para princípios que devem constituir as balizas das ciências nada poderá ter a ver com uma atitu de host il em relação à própria ciência. Pois é precisamente a indicacào de limites que aguça a visão para o que pode ser com preendido, acabando por forta lecer os alicerces do edifício cient if ico. Entendendo-se por étic a uma genuína compreensâo da natureza humana, e não apenas um conju nto de normas pré-estabelecidas por dada sociedade na base de presumíveis j uízos ét icos dos indivíduos dessa comu nidade, chama-se ético a todo o comportamento que visa, promove ou respeit a a realização de si próprio, na relação consti t ut iva com e para os outros , no quadro das inst it uições jus tas. E, neste sent ido, designa-se ético o progresso científico que contrib ui para uma felicidade genuína e sustentável do homem todo e de tod os os homens, no contexto de uma ecologia humana que seja globalmente justa.

3.4.1. J. Robert Oppenheimer ("pai da bomba atómica"): a ciência não é moralmente neutra - a responsabilidade científica

o tema da responsabilidade cient ífica surge, na sequência da Segunda Guerra Mundial, a partir da prob lemat ização do risco decorrente da incerteza científica. De facto, a ciência j á conheceu o pecado. Desde que o físico J . Robert Oppenheimer, diretor científico do Proje ct o Manhat tan , desde 1942, e responsável máximo do Centro de Invest igação da bom ba ató mica de Los Alamos, a partir de 1943, declarou, no seu célebre discurso no Mossachusetts Institute of Tecno/ogy, que "os cientist as [físicos) conhece ram o pecado" ("scientist s have known sin"), percebeu-se que, quer as escolhas dos tóp icos de investigação, quer a forma como o saber é adquirido, podem gerar saberes proibidos, saberes que podem mesmo ter cons equências t rágicas" . JJ

Snow, eh P , 1964. The Two Cultur es an d o Second

Look Ao Exponded vers .on of The TWD Currcres and rne SClen tlflc RevolutlOn, Cambridge. z-eo 3. Thorpe, Charles, 2006. Oppenhelmer. the troglc mtellect. Chicago. universrt y of Chicago Press, p 190

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C'ência

e Rehgiào


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Oppenhe imer distanciar-se-ia progressivament e desse projeto de ciência bélica, ao qual aderira entusiasticame nte. O chamado "caso Oppenheime r" f igura como primeiro exemplo histó rico da tema tização da responsabilidade científica assum ida a part ir do interior da própr ia co munidade científica, encontrando- se nele present e j á a ambiguidade essencial que é inerente à assuncão da responsabilidade por parte dos pró prios cient istas. Trata-se de uma contrad ição originár ia da responsa bilidade científica. Por um lado, Oppenheimer considera que só a comunidade científ ica pode estabelecer as condições de responsabilidade da própria ciência; e, por outro lado, reconhece ele també m que a rac ionalidade cient ífica não con tém em si os elementos sufic ientes para propo rcionar esse controlo efet ivo. Ou seja, à perceção da necessidade de regulação das com unidades científicas, e respet ivas at ividades, contrapõe -se a resistênc ia daquelas em aceit ar limitações de ordem exte rna, não paritária, à sua J5 Cfr. Cynthia, C. Kelly {ed.) , 2006, Oppenheimer libe rdade científ ica. Tal vai adquirir ainda maior pert inência com a poliond tne Manhottan Project: /nsights Into J. Robert t ização da ciência, da investigaç ão e das suas aplicações. As preocuOpp enheimer, 'Father of the Atomic Bomb', World Scien t tüc Publishing Company, pp. 77 e 55. pações então expressas por Oppenhe imer perduram até ao presente ; (Obra dedicada ao centenário do nascimento de o físico amer icano to mar-se -la, assim , figura científica emblemática Oppenhetmer, em 2004, reunindo o concurso de da comp lexa relação entre ciência, ét ica e moral". múltip los especialistas].

3.4.2. As Ciências da Vida Ciência tem de t er integridade. Nas últimas décadas, uma das áreas da invest igação cient ífic a em que as questões assoc iadas à ét ica mais se revelam e relevam é a das Ciências da Vida. Cabe, pois, natu ralmente pergunta r: o que são as Ciências da Vida? Como é sabido, a comparti mentalização do conhecimento científico, carater ística da ciência clássica, t em vindo a desaparecer, dando lugar à interdisci plinaridade, à parti lha de conhecime ntos e competências científ icas. As Ciências da Vida comp reendem to das aque las ciências onde a Vida é est udada e ensinada a vários níveis, desde os aspeto s molecu lares até às fo rmas mais complexas de interac ão entre os seres vivos (plantas, animais e seres humanos). Constituem pois um campo inte rdisciplinar. Embora a biologia seja o tóp ico fu ndamenta l, os desenvo lvimentos médicos e biotec nológicos e as suas implicações no devir social e humano clamam por tomadas de posição sobre quais as aplicações das novas tecnologias que convêm ou não à humanidade. t: que, avassaladores, estes progressos têm o poder de originar uma diferente visão da vida e do próprio Homem e de abrir camin ho a profundas muda nças socia is, com impacto global e que se estenderá às gerações futuras. A biote cno logia e a engenharia genét ica constituem possivelme nte as áreas, de aplicação ao ser humano , da invest igação biológ ica em que as preocupações éticas se to rnaram mais prof unda e prof usamente acuti lantes. A biotec nologia é uma técnica que produz, por manipulação genét ica, moléc ulas biológicas ou organismos transgénicos tendo em vista aplicações indust riais, agrícolas, farmacê utic as, químicas, etc . As ciências da vida e a biote cno logia são geralmente consideradas tecnologias de ponta das mais prom issoras para as próximas décadas, com aplicações em vários planos da vida humana, em especial o da saúde. O desenvo lvimento e a aplicação de con hecime ntos das Ciências da Vida e da biotecnologia colocam questões ét icas fundamen tais , como a def inição e a natureza do ser humano ou a ut ilização e o controlo das informações genét icas. Com efeito, a biotecn ologia permite a disponibilização mais segura e ét ica de um número cresce nte de medicamentos e de serviços médicos . Neste contexto, a invest igação sobre as cé lulas esta minais abre a via para a substitu ição de tecidos e órgãos para f ins de t rat amento de doenças degenerat ivas, da doença de Alzheimer, da doe nça de Parkinson, etc. Mas há semp re a perceção de um risco. Ora, a leitura ét ica engloba não apenas os aspetos biológico-cient íf icos, mas, igualmente, as vertentes cultu ral e social. A Biologia e a Medicina têm experimentado uma evolução vert iginosa, prosseg uindo permanenteme nte enr iquecidas por avanços científ icos e pelo desenvolvimento das tecnologias inovadoras que poss ibilitam cada vez mais curar, ou pelo menos ult rapassa r situ ações patológic as outrora cons ideradas invencíveis. Mas - repitamo-lo - as mesmas ciênc ia e técn ica que facu ltam o t rata mento da doença e que permitem serv ir o Homem quando f ruídas como inst rumentos da sua valorização, encerram também enormes pot enciais de risco.

Educaç àc ... : x ai e Religiosa Caté: ::::a

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A ciência e a téc nica podem, de facto, interfe rir em patamares profundos da nossa existência individual e colet iva, pondo em causa diversas normas e valores. E a nova biologia t em, de facto, modificado a imagem que o homem ti nha da sua próp ria nature za, da sua origem, das suas relações inter-r aciais, interpe ssoais e com os outros seres vivos. Algumas das suas aplicações (a reprodução humana, o comportamento psíquico e a doença, por exemplo) t êm pot encial para alcançar uma intervenção em niveis que questionam o Homem na sua essência, no direito à vida e nas suas inerentes dignid ade e liberdade. Começa a pode r mod if icar genet icamente os seres vivos, incluindo o própr io homem. Inaugura a medicina preditiva, a terapia genética e a medicina regenerat iva. Ao mesmo tempo, põe em quest ão a arquitetu ra da soc iedade, dos valo res cultu rais e sociais em que se edif ica e os alicerc es f undament ais, entre os quais o do agregado familiar como núcleo de base da sua estrutu ração. Por t udo isto, podemos dizer que as ciênc ias da vida pretendem tornar- se responsáveis por um novo t ipo de cultura e de soc iedade. Est amos perante uma nova mundividência , onde nem a ciênc ia se arvora em solução única para todos os prob lemas, mesmo os mais profunda mente humanos , nem a éti ca fica acantonada numa pura deontologia (normas profissionais) estenden do-se, pelo contrá rio, à aplicação das novas tec nologias que afeta m a socie dade. Lidando com o estoc ást ico, a ciência e a tecn ologia buscam forçosament e com panhia noutras áreas do saber. Buscam aproximação ao humano. E assim surgirá sem pre o interesse pelo diálogo entre ética e ciência, apesar das dif iculdades que encerra. É de salienta r ainda que hoj e é comum que a uma exigência de excelência cient if ica, se acrescente uma exigência de excelência ética. Segundo Adela Cortina, o progresso social tem que consist ir não só em pote nciar a ciência e a tecnologia, mas sobret udo orientá-Ias a parti r do reforço da intersubjet ividade que compõe o progresso moral. Porque as sociedades não aprendem só t ecnicament e, mas tam bém moralmente e nesta aprendizagem, posta em prát ica, radica o autê nt ico progre sso".

3.4.3. Bioética: ética da ciência para as ciências Hoje, é comu m falar de princípios que devem delimitar a ciência. De facto, ao mesmo tempo que uma certa eufo ria científica e tecnológica vai enf raquecen do, presenciamos uma toma da de co nsciência sobre as forte s limita ções das possib ilidades da tecnociência, bem como de efeitos secundá rios imprevist os. Dir-se -ia que soc iedade vai estand o cansada de técnica e carente de humanidade. A ética não é uma opçã o do cient ista; é uma necessidade da ciência. Bioética é uma palavra relativame nte recente, mas as questões que aborda são tão antigas como a cur iosidade dos homens ao interrogarem-se sob re a origem e a preservação da vida, sobre o modo de ata lhar a doença e vence r a dor, outra face do nosso insti nto de sob revivência. Pode ser def inida com o co njun to de questões de dimensão ética (ou seja, que põem em jogo valores e que não podem ser resolvidas a não ser por meio de escolha) originado pelo poder cada vez maior da intervenção tecn ocient ífica no ser vivo (em espec ial, mas não em exclusivo, no Homem). Bioét ica designa ta mbém, se não uma verdadeira metodologia, pelo menos um certo espírito de aproximação a esses prob lemas". Trata- se assim de um estu do mult idiscip linar ou int erdisciplinar, mas ta mbém pluralista. O crescente interesse pela bioét ica é tam bém reflexo de um imp ulso da sociedade para manter as ciências , e, em especial, as ciências nat urais e da vida , dentro dos devidos limites morais. A verdade é que nem as apl icações da ciênc ia nem a sua prát ica podem hoje f ugir ao escrut ínio público e soc ial. Por outro lado, as ciências natu rais e da vida têm hoje implicações que t ranscendem aquele domínio. É por isso que a bioéti ca reveste um ãmbito mais vasto, cobrindo todos os aspetos ét icos das ciênc ias da vida, sendo interpelada sem pre que surgem questões ét icas suscitad as por um novo desenvo lvimento cient ifico ou tec nológico envolvendo o mundo vivo, humano ou não huma no. Simplificando muito, pode reconduzir- se a duas posições extre mas a def inição do espaço da bioética. se Cortina, Adeja, 2007, «Ética e investigeción en las Ciências de la Vida», in Ética e Investigação nas Ciências da Vida, Atas do 10° Seminário do CNECV (Porto, 2006), Lisboa, Presidência do Conselho de Ministros. pp. 33-42. 37 Hottois.

Gilber t, 1992,

o paradigma bioético:umaético

parao tecnociência, Lisboa, Edições Salamandra, pp. 135 e ss.

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Ciência e Religião

A primeira seria a que defende que o progresso cient íf ico é bom em si mesmo e que qualquer limitação ao desenvolvimento do con hecime nto é negativa e arbit rária (uma ética do progresso e do aperfeiçoamento). A segunda, receosa dos excessos possíveis, por exemplo da manipulação genét ica ou do contro lo da procriação, do que já foi chamado a "heurística do medo", propõe entraves livremente conse ntidos (uma ética da conservação, da preservação e impedimento).


--- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - , No entanto, estas duas posições extremas podem ser moderadas por uma terce ira via, segundo a qual tudo depende da discussão, do debate ético e da vontade esclarecida dos homens, inscrevendo-se numa perspetiva humanist a e pluralista que ultrapasse clivagens f ilosóficas e religiosas. O objetivo é conciliar os inúmeros contributos que a biologia e a biomedicina, por exemplo, oferecem ao indivíduo e à sociedade com o respeito pela dignidade do ser humano, do seu corpo e da sua liberdade individual" . Eis o conjunto de temas com que a bioética se depara: biodiversidade, biotecnolog ia, genética, experiment ação, organismos geneticament e modific ados. Os atuais conhecimentos no campo da genét ica, associados à capacidade tecnológica cada vez maior, permitem- nos encarar a manipulação de qualquer organismo com relativa facilidade. Tal pode signif icar um inesti mável cont ributo para a Humanidade, colocando ao serviço do Homem novas perspetivas para a resolução de problemas no campo da medicina (t ratamento do cancro , doença de Alzheimer e de outra s doenças degenerativas), da agricultura (melhoramento vegetal e a criação dos organismos t ransgénicos), da bioengenharia (construção de armas biológicas, domínio do mercado por parte dos países que detêm a tecnologia, aumento das desigualdades ent re os países ricos e os países em vias de desenvolvimento , por exemplo), mas confront a-nos também com novas questões , nomeadamente de natureza soc ial e ecológica, exigindo-se uma ét ica global para a ciência . Em síntese, a ciênci a é hoj e global. Tal como a ética, a ciênc ia tem de t er integ ridade. Se, por um lado, o progresso tecnológico vai ao encontr o da realização humana, por out ro, possui tamb ém uma natu reza ambigua. Mediante a tecnologia podemos viajar, comun icar, const ruir, curar e investigar em moldes inimagináveis pelos nossos antepassados. O con hecimento, que é poder (scientia potentia est), pode ser ut ilizado para melhorar as nossas vidas, ou, pelo contrár io, para diminuir ou destru ir a vida humana, incluindo à escala global. O deslumb ramento que o progresso tecnológico produz no ser humano despert a-lhe o desejo de estabe lecer novas regras no aperfeiçoamento das realidades existentes, princ ipalmente no que se refere à pessoa humana. Alcançar o prolongamento da vida e a imortalidade são objeti vos priorit ários da ciên cia aliada à tecnologia. Neste contexto, têm-se realizado experiências cons ideráveis no campo da biologia sint ética e das biotecnologias, com a tentativa de criar novas formas de vida e, inclusive, de recr iar o ser humano. Parece ser este o núcleo das grandes questões ao nível das ciências. Quando Bento XVI se dir igiu à plenária da Pontifícia Academia das Ciências, a 28 de out ubro de 2010, confirmou a impossib il idade de a c iênc ia cr iar vida a partir do nada . Muito provavelmente , fê-lo em resposta à not ícia, publi cada nesse mesmo ano, de que o cientista Craig Venter teria criado em laborató rio o primeiro organism o sintétic o (cf. The Ecanomist, 22-28 de maio 2010, pp. 81-83). Bento XVI foi determinante:

"Os cienti stas não criam o mundo, aprendem sobre ele e tentam imitá -lo, seguindo as leis e a inteligibilidade que a natureza nos manifest a. A experiência do cient ist a como ser humano consiste por conseguinte na perceção de uma constante, uma lei, um logos que ele não criou mas que ele próp rio observou : com efeito, isto leva-nos a aceitar a existência de uma Razão omnipotente, que é diferente daquela do homem e suporta o mundo. É este o ponto focal do encontro entre as ciências da natureza e a religião. Por conseguinte, a ciência torna-se o lugar do diálogo, um encontro entre o homem e a natureza e, potencialmente, também entre o homem e o seu Criador." L.'Osservatore Romano. edição semanal em português, 6 de novembro de 2010. p.7.

Bento XVI lembra-no s que a ciência procura a verdade, estando ao serviço do verdadeiro bem do homem. Ela tem sido uma extraordinária empresa humana. Mas não pod e dar todas as respostas , nem pode dar resposta s rapidamente ou de uma forma comp leta logo à partida . Religião e ciência part ilham, afinal, o mesmo berço, a ativ idade cultural, que é sempre expressão de racionalidade. Nem a ciênc ia é isenta de determinantes religiosas, nem a religião é isenta de dete rminantes cient ífica s (i.e., racionais), a não ser pela redução da cult ura ao modelo cient ificista. Por isso, a nova perspet iva de Roma põe ciência e fé num diálogo de iguais. Tanto a religião como a ciênc ia devem preservar a sua autonomia e especif icidade . Rejeita - recordemo-lo - t anto o cient ifi cismo como o religionismo, que mutuamente se excluem desse diálogo.

Ecucacão 'oral e Rel'giosa Católica

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De facto, o modelo t radicional da irreconciliável contenda ent re ciência/fé tende a deixar a religião fora do campo da razão, ao co mprimir esta ao modelo cientificista. Contudo, nos nossos dias, passos decisivos foram igualmente dados no processo epistemológico de interpretação da racionalidade; passou-se t ambé m a observar a ciência com outros olhos, realçando nela a presença de múltiplos e inext ricáveis fato res culturais, inclusive o religioso. E o tator religioso tem sido sempre uma presença inapagável na vida dos povos. A questã o colocada por Bento XVI, nas referidas palavras à plenária da Ponti fícia Academia das Ciências , dist ingue originalmente ent re a capac idade de dominar a vida e a de criar vida a parti r do nada. Se cons iderarmos o tercei ro cap ítulo do livro do Génesis, somo s co nfrontados com essa origem do problema: Deus impede o caminho de acesso à "árvore da Vida" depois de o primeiro casal se te r apropriado do conhe cimento do bem e do mal:

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"O Senhor Deus disse: «Eis que o homem, quanto ao conhecimento do bem e do mal, se tornou como um de nós. Agora é preciso que ele não est enda a mão para se apoderar também do fruto da árvore da Vida e, comendo dele, viva para sempre». (...) Depois de ter expulsado o homem, colocou, a oriente do jardim do Éden, os querubins com a espada f lamejante, para guardar o caminho da árvore da Vida". Gen 3.22-23 .

Apesar de tal interdição, é bem evident e que a ciência at ual se direciono u no senti do de poder alcançar as fontes da Vida. As experimentações que se têm realizado não deixam margem para dúvidas: terapia genét ica, clonagem humana, uso terapêutico das cé lulas estam inais, tentativas de hibri dação, etc . Sobretudo a ideologia t rans-hurna nista joga amplament e co m todos estes elementos. São aind a de Bento XVI estas palavras:

"Hoje, um campo primário e crucia l de luta cult ural entre o absolutismo da técn ica e a responsabilidade moral do homem é o da bioética, onde se joga radicalmente a própria possibilidade de um desenvolvime nto humano integra l. Trata-se de um âmbito delicadíssimo e decisivo, onde irrompe, com dramática intensidade, a questão fundamental de saber se o homem se produziu por si mesmo ou depende de Deus. As descobertas científicas neste campo e as possib ilidades de intervenção técn ica parecem tão avançadas que impõem a escol ha entre estas duas conceções: a da razão aberta à transce ndência ou a razão fechada na imanência ." Bento XVI, Contos ln

vcn tote, p. 74.

Se pensa rmos o progresso tecnológico na persp et iva do Génesis, ist o é, co mo expressão de dom ínio do espírito sobre a matéria, as possibilidades como cocriadores parecem infi ndáveis. Porém, somos confron tados atu almente com ideologias que pretendem o aperfe içoamento do ser humano at ravés da fusão do cor po humano com as pot encialidades tec nológicas . O organism o humano, f isiológico, torn a- se então questão central".


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3.5. Racionalidade e realidade - mundo, ser humano e Deus. Uma "antropologia da redenção".

Burterf/y Apple . Vladimir Kush, (Moscovo, 1965)

---- - - - ----- - - - - - - - - - -- - - - - ----- - l A ciência é histórica e também escato lógica. Apesar dos progressos que se têm verif icado no campo das ciências experimentais, ou talvez por causa desses progressos, os próprios cient istas estão cons cientes, das múl tiplas limitações com as quais nat uralmente se defrontam. O número especi al da Science & Vie, de setem bro de 2011, deu expressão às interrogações fundamentais que o ser humano co loca e que ult rapassam o âmbito estrito da ciência . Os 10 grandes enigmas do ciência são apresentadas pela seguinte ardem: "Que existia ant es da big-bang? Est amos sós no universo? Porque é que o universo obed ece a leis? Que se escon de no centro da terra? Com o é que a vida apareceu? Quem foi o primeiro homem? Como disti nguir o inato do adquirido? Qual é o poder do espírito sobre o cor po? O que é a co nsciênc ia? Como é que a linguagem apareceu?". Os enigmas expostos aqui neces sitam, sem dúvida, de um outro campo de abordagem, além do estr itam ente cientifico, que amp lie perspetivas. Tudo aquilo que temos vindo a considerar na relação ent re ciência e religião aponta precisamente para esse alarga-

Educccão ' I C ~íc e R€. ;.:;.iosa Cet y.ca

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mento de coordenadas essenciais em que o homem interior e espir itual se interliga com a realidade fisica. Centremo-nos , uma vez mais, nas significat ivas palavras de Bent o XVI, proferidas na homilia da vigília pascal, a 7 de abr il de 2012:

"A Páscoa é a festa da nova criação.Jesus ressuscitou e não morre ja mais. Arrombou a porta que dá para uma nova vida, que já não con hece doença nem mort e. Assumiu o homem no próprio Deus. (...) Abriu-se uma nova dime nsão para o homem . A criação t ornou-se maior e mais vasta. A Páscoa é o dia de uma nova criação, mas por isso mesmo, neste dia, a Igreja começa a lit urgia apresentando-nos a criação antiga, para aprende rmos a compreender bem a nova." L'Osservatore Romano, edição semanal em port uguês, 14 de abril de 20 12, p. 7.

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Com a ressurreição de Jesus Cristo dá-se uma novo crioção: "Eis que renovo t odas as coisas" (Ap 21,5). Quer isso dizer que a Criação ocorre não só no "princípio", mas tam bém no decu rso da dimensão hist órica; esta "nova criação", que é afinal a criação sempre em aberto , abre para uma nova dimensão, tornando pos sivel o acesso a outros planos da realidade. João Paulo II desenvolveu igualment e essa quest ão na segunda parte da sua ant ropo logia, ao examinar de que modo se perceciona,j ustame nte no contexto histó rico, a "nova criação". A questão antropológica e onto lógica cont inua a ser crucial, mais ainda com o surgimento da ant ropologia da redenção, isto é, de um novo ethos - um novo modo de ser - orientad o para a consum ação dos século s. Deste modo, o contr aste ent re ciência e fé vai-se hoje esbatendo, t ambém em consequência das análises epistemo lógicas a que nos temos report ado.


- - - ---- - - ---- --- - - ---- - - - - - - - - ----, Lemb remos, po r exemp lo, que um dos grandes enigmas da ciência é a noção de tempo, num universo que se afirma em expansão acelerada . A edição da Science & Vie, de fevereiro de 2010, coloca-nos perante esta formulação desconcertante: "Por que é que o Tempo passa cada vez mais depressa - do nasc imento à morte?" São inúmeras as pub licações científicas que abrem espaço a est e debate, conscientes das profundas alterações que surgiram, na vida quoti diana, com o desen volvimento das potencialidades tecnológicas . Somos como que envolvidos e levados por algo que não conseguimos identificar mas que produz também em nós um cer to efeito de constrição e de questionamento, onde a interferência religiosa não pode ser esca moteada . Eis algumas dessas questões: est aremos peran te uma modi fic ação físic a da realidade, que afet a a noção do dia e do ano, ou será, antes, uma dimensão psicológica e antro pológica, interior a nós mesmos, que se reflete no modo de agir e de pensar? Tratar-se-a de uma coaçã o exte rior sobre a dimensão psíquica e espiritua l humana ou, pelo co nt rário, de uma realidade inte rior que se projeta em permanência e configura na realidade física? Também a revista Science & Vie, de setem bro de 2012, dedicou um número espec ial para aprofundar as noções de "Tempo, matéria e espaço". Do ponto de vista científico , defi nir estas categorias do universo material exige pensar à escala das partículas subató micas: neutrino, modelo do Big Bang, bosão de Higgs, física quântica, relatividade geral, un iversos paralelos, teoria das cordas, etc. Tal como verif icámos, tais categorias não bastam para obtermos respostas às necessidades atu ais e prementes da humanidade . No cap ítulo V de Introdução ao Cristianismo, Joseph Ratzinger, depois de ter equacionado a diferença entre o Deus dos fil ósofos e o Deus da Fé, propõe a experiência da relação como meio e possibilidade de conhecimento:

"E, Schrõdinger definiu a estrutura da matéria como «pacote de ondas », partindo da ideia de um ser não subst ancial, mas puramente atual, cuja «substancialidade » aparente resulta, na verd ade, apenas da est rut ura do movim ento de ondas sobreposta s. No âmbit o da matér ia, uma proposta deste tipo pode ser extremamente contestável, tanto do ponto de vista físico , quanto, sobretudo, do ponto de vista filosófico. Mesmo assim, parece tratar-se de uma metáfora interessantíssima da actualitasdivina, ou seja, do facto de Deus ser ato puro e de o mais denso dos seres - Deus - só poder exist ir numa plural idade de relações que não são subst âncias, mas sim nada mais, nada menos do que «ondas» que formam assim totalmente um, isto é, toda a plenitude do ser. (.,.l Esta ideia, obj etivamente, j á se encontr a formu lada em Santo Agost inho, quand o este dese nvolve o pensamento da pura existência no ato (<< pacote de ondas»)", Ct. Ratzmger , J .• 2005, Introdução 00 Cnstrcmsmo. Lisboa. Pnncrpra. pp 126-127.

Verdadeiramente, todas as absol utizações se dissipam pela recuperaçã o da int encionalidade para o abso luto, pelo diálogo co m o absol uto. Não está na coe rência do espírito cristão ver a ciência e a religião (ou as cu lt uras) quer em lut a, quer incomu nicáv eis, qu er com indiferença recíproca . Aliás, a relac ãc de que aí se sente falt a é já um sintoma do signif icad o relat ivo de ambas, a exigir con stante superação, sob interpelação da t ransc endência. Conve rgem assi m, neste mode lo de experiência relacional, as rece nt es con sideraç õe s de António Spad aro sobre "cibe rteologia", um dos pontos de interceção co m a cu ltu ra tecnológica e digit al. Spadaro pro põe o aprofunda mento da era digita l à luz de uma ant rop ologia escatológica e de uma ontologia da imagem:

"Abre-se diante de nós um mundo «int ermediário», híbrido, que põe em discussão a «metafísica da presença» e cuj a onto logia deveria ser indagada melhor para uma compreensão te ológica." Spadero, A.,20 13. Ciberteologla. Pensor o Cristianismo no ero do Internet, Lisboa , Peuhnas Editora . pp. 13 7-13 8

Se a antropologia da reden çã o emerge do mode lo cosmológic o standard, co m a Ressurreição é necessário avaliar em q ue pont os se intercet am o tem po litú rgic o co m as dinâmicas da Rede , no ciberespaço. Também aqui é f undament al a antropol ogia de J oão Paulo II para un ir e reunir a dimensão histó rica à dimensão escatológ ica da ress urrei ção dos co rp os : "Esse «outro s éculo», como nova pátria do homem , emerge definitivamente do mundo atua l, que é temporal ... através da ressurreição." (AG, 2-XII-1981). Na te rceira parte do t rípt ico, o Papa fala-nos da imorta lidade e da consolidação perfeita e definitiva da imagem de Deus no ser humano.

Edccacao \ 10r:.11 c: Rel:g:)sa

catouco

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"Tenho a suspeita de que a espécie humana - a única - est á prestes a extinguir-se e que a Biblioteca perdur ará: iluminada, solit ária, infinit a, perfeit amente imóvel, armada de volumes preciosos, inút il, incorruptível, sec reta ." Jorge Luis Borges

Na verdade, o cristianismo é um momento determinante do diálogo entr e ciência e fé pela sua vocação histór ica de tra nsforma r positivamente os valores cult urais. Na sessão de abert ura do Sínodo de 201 2, Hildegarda de Bingen foi proclamada, por Bento XVI, Doutora da Igreja e modelo para a nova evangelização . Hildegarda, pelo seu te stemunho de vida, é apont ada como exemplo no mod o de concilia r ciência e reli gião, razão e fé , Igr eja e mundo. Em Scivios - o livro das visões míst icas - descreve um ce nário de acontec imentos, desde a Criação à consumação dos séculos, em que no fina l "todos os elementos bril harão com calma e resplendor, como se uma pele negra lhes t ivesse sido reti rada" e em que os co rpos dos mortos ressuscit arão com toda a integridade e no seu próprio género. Antes , porém. descreve a grande questão do "ant icristo" que corr espond erá a uma réplica tanto da encarnação virginal como do Filho de Deus salvado r. Scivios ("Conhece as vias para Deus") parece apont ar para as atua is questões tr ans- humanistas face à ontologia da imagem. Indica, signif icat ivamente, a necess idade de um discernimento entre as "artes mágicas" e a dimens ão onto lógica da ideia de "imagem e semelhança ".

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Ciência e Religi<.Jo


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Ainda segundo Ant ónio Spadaro, criador do ter mo "cibert eologia", novas articulações se processam nos nossos dias, ao fazer referência à crescente dificuldade na avaliação e discern imento entre o mundo real e o mundo virt ual:

"O verdadeiro núcleo problemático da quest ão que enfrentamos parece provir do facto de que a existência «virtual» parece configurar-se com um status ontológico incerto: prescinde da presença f ísica, mas oferece uma forma, às vezes até vivida, de presença social. Ela, certamente, não é um simples produto da consciência, uma imagem da mente, mas não é também uma res extens a, uma realidade objetiva ordinária, mesmo quando existe só quando ocorre interação." Spadaro, A. , 2013, Ciberte% glo. Pensar o cristianismo na era da internet, Lisboa. Paulina s, p. 137.

Na prespetiva de Antón io Spadaro, as recentes tecno logias digita is coloca m novos desafios. Um dos desafios maiores é o de não ver na Rede uma realidade paralela, isto é, um mundo separado da vida, mas um espaço antropológico associ ado intima ment e à vida. A tecnologia não deverá fazer-nos sair do mundo criando um mundo virtual, mas fez ent rar o mundo digital no mundo da nossa vida. Os meios digitais não são port as de saída da realidade, mas exte nsões capazes de enriquecer a nossa vida. A ciberteologia, portanto, pode ser cons iderada como a inteligência da fé no tempo das novas tecno logias. Sobretudo nas últimas décadas, o Sudário de Turim tem sido alvo de inúmeros estudos de cientist as e teólog os. Se, por um lado, em termos de datação histó rica, há j á um consenso entre ciênc ia e relato bíblico, por outro, permanece desconhecida a radiação que produziu a imagem t ridimensional no lençol. Quando em 1976 uma equipa de físicos estudou a imagem do Sudário, através de um programa especial chamado "Interpretat ion Systems VP-S Image Analyser", descobriu-se que a imagem não t inha nenhuma das caracte rísti cas que normalmente se observa m em desenhos ou pintu ras (ao nível dos pigmentos): foi produzi da através de uma forma de radiação atóm ica desconhecida. Trata-se de um elemento chave para a antropologia da redenção . O salto ontológico confirma-se nesta dimensão míst ica, que é já passagem do simbólico para o Rea l, de que todos participamos na própria Ressurreição de Jesus Cristo. O debate atual, entre ciência e religião, centra-se neste ponto essencial: saber se a pessoa humana se produ ziu a si mesma ou depende de Deus e se a razão está abert a à transcendência ou fechada na imanência intr amundana. Hilde garda de Bingen e João Paulo II comu ngam da associação ínt ima ent re religião e ciência, ao af irmarem que a nova criação emerge, defi nit ivament e, do mundo atual, onde ciênc ia e fé, mantendo as suas características próprias, por se autoconterem nas suas áreas específicas, não rivalizam nem se antagonizam.

A cncc ôc do mundo em

se is

dias.

Hurnmura

do Servias iluminura do Scivies mostrando o corpo rmsnco da Sabedoria.

Neste mundo, isto é, em termos históri cos, somos constrangidos a reconhe cer que a persistênc ia nos caminhos da razão implic a o questionamento contínuo desta, pois, como vimos, uma das grandes fragilidades da razão consiste em permanecer, em exclusivo, numa das formas do seu exercício, como, por exemplo, o da ciência. E este quest ionamento implica, geralmente, uma referência ao absoluto , veiculado, quase sempre pela orientação religiosa. Como refere ainda Bento XVI, o homem religioso não surge apenas dos mundos antigos, pelo contrá rio, at ravessa toda a história da humanidade:

"':d cacao ' ::ral e Ft':osa Catc'Ica

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"O homem é religioso por sua natureza, é o homo religiosus como é o homo sapiens e homo faber: «O desejo de Deus - af irma ainda o Catecismo - está inscrito no coração do homem, porque o homem foi criado por Deus e para Deus» (n. 27). A imagem do Criador está impressa no seu ser, e ele sente a necessidade de encontrar uma luz para dar uma resposta às interrogações que dizem respeito ao sent ido profundo da realidade; resposta que ele não pode encontrar em si mesmo, no progresso, na ciência empírica. O homo religiosus não emerge só dos mundos antigos, mas atravessa toda a história da humanidade (...). O homem «digital», como o das cavernas, procura na experiência religiosa os caminhos para assegurar a sua precária avent ura na terra." Bento XVI. AG. 11-V-2011 .

Em síntes e, através das descobertas científicas das últimas déca das, principa lmente no ãmbito da f isica das partículas, da nova cosmologia e da biologia molecular, pode mos verificar que ciência e religião convergem numa mesma direcão , embo ra situando -se em planos dist int os. Mais ainda, os progresso s das ciências nat urais, consideradas em si mesmas como fenómeno ant ropo lógico e ta mbém na medida em que afet am as ciências humanas, incrementa m a com preensão do homem e, etiologicamente, também de Deus. Nessa medida, contribuem para uma compreensão mais profunda das relações hornern-D eus" .

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Cf Archer, L , 1997, «Ci ência e Teologia. hoje». ln As Ongens do Vldo Dialogo entre CiênCia e Teologlo, Lisboa , ReI do s Livros,

p 12.

I

Síntese 1. Nos nossos dias, a dist inção entr e ciência e te cnologia encontra-se cada vez mais esbatida . 2. A pessoa humana deve constituir a questão matricial das relações entre ciên cia e tecnol ogia. 3. A técn ica permite dominar a maté ria, mas ela é apenas o aspeto objetivo do agir humano. cuj a origem e razão de ser reside no elemento subjetivo: o homem que atua. 4. As neurociê ncias co nst itu em um campo preferencial e co nvergente da invest igação científic a. 5. O pro blema ambiental é tanto científ ico, té cnico e político, como ético e religioso. 6. À ciência não compete prescrever o que é bom ou mau nem fixar critérios de valor. Impõe-se o recurso à ét ica, à criação de uma nova mentalidade, bem como à influên cia da religião. para dar às ciências a con sciência de que devem orientar-se para o bem co mum. 7. O diálogo ent re ciência e ética pode ser dif iculta do por fatores económicos (fin anciamento s), prof issionais (com pet ição perniciosa entre grupos de invest igação), cond icionantes j urídico-polít icas (diferen tes legislações sobre a interrupção voluntária da gravidez. por exemplo) ou mesmo por simp les ati tude s pessoais. O respeito, a estima e a to terancia não podem levar à perda de convicções próprias, mas, sim. ao seu aprofundame nto.

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C - ncia ;

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I

8. O diálogo ent re ciência e ét ica requer uma argumenta ção trad uzida para as diferent es racionalidades e para as diferentes linguagens; essa t radução só é possível se apreenderem os pressupostos do outro. 9. Perante o antagonismo tr adicional, latente ou decl arado, entre cient ista s e etic istas torna - se necessário encontrar soluções que parecem impossíveis de conciliar. 10. A ciênci a é uma tarefa difícil, mas as dificu ldades não devem promover a ideia de que as coisas são apenas como nós queremos que elas sej am. 11. A nova biologia modif icou a imagem que o homem ti nha da sua próp ria nat ureza, da sua origem, das suas relações inte r-raciais, interpessoais e com outros seres vivos. Ganhou considerável contro lo sobr e a reprodução humana, o com portamento psíquico e a doença. Começa por modif icar genet icamente os seres vivos, incluindo o próprio homem. Inaugura a medicina predit iva, a terapia genét ica e a medicina regenerativa. 11. As Ciências da Vida tornaram-se resp onsáveis por um novo t ipo de cultura e de soc iedade: é uma nova mu ndividência. 12. Foi no diálogo franco e persiste nte que a bioética sempre apostou , com o objetivo de favorecer um desenvolvim ento científico e técnico que respe ite a dignidade do ser humano e contri bua para a sua auto rrealização. 13. O fac to r religioso tem sido semp re uma presen ça inapagável na vida dos povos. O progres so científico é ético quan do contribui para a uma felicidade genuína e sustentável do homem to do e de t odos os homen s, no cont exto de uma ecologia humana globalmente justa. 14. Ecologia humana é o relacionamento existencial e interat ivo de cada ser humano com o ambiente, de que depen de, e de modo especial com os outros seres humanos que lhe plasmaram o que o faz ser humano, ou seja, um ser-em-relação. 16. Reconhecer o mundo, perscrut ar o seu sent ido, com preender o papel do Homem que nele se vê colocado, sempre foi um objeti vo f undamental do Homem. 17. Nos nossos dias, o cont raste entr e ciência e fé vai-se esbatendo; mas também em consequênc ia das alte rações no processo epistemológico de interpretação da racionalidade. 18. As recentes tecnologias digitais colocam novos desaf ios. Um dos desafi os maiores é o de não ver na Rede uma realidade paralela, ist o é, um mundo separado da vida, mas antes um espaço antropológico associado intimament e à vida. 19. Através das descobertas científ icas das últimas décadas, principalmente no âmbito da física das partículas, da nova cosmologia e da biologia molecu lar, podemos verif icar que ciência e religião conve rgem numa mesma direção, embora situando -se em planos dist intos. 20. O cristi anismo favorece naturalmente o diálogo entre a ciência e a fé ao ser uma religião aberta e dinâmica, transformando positivamente os valores cultu rais. Para Reflet ir

1. Cada vez mais se distingue cada vez menos entre ciência e tecnologia. Porquê? 2. À ciência não compete fixar critérios de valor, pois não é moralmente neutra. Relaciona investigação

científica e ética. 3. O quadro concetual da blo ética ultrapassa os limites do debate episte mológico. A que se deve o

crescente interesse pela bioética? 4. O contraste entre ciência e fé tem vindo a esbater-se também em consequência da própria invest igaCão científica. Descreve três exemplos. 5. Segundo Antonio Spa õaro. a cultura digital processa art iculações insusceptiveis de ignorar pelo saber teológico. Caracteriza essas art iculações. 6. A ciência é histórica e també m escatológica. Clarifica o sentido desta af irmação.

Educação t.loral e Religiosa Católic a

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Conclusão Ciência e religião têm cam inhado a par, embora, por vezes, é certo, em regime de confli to . Na interpretação positiva, preco nizada sobretudo a part ir de João Paulo II, tanto a ciência como a religião devem preservar a sua auton omia e a sua especi fic idade. Cada uma delas deve possuir os seus próprios princípios, as suas normas de procedimento, as suas diversidad es de interpretação e as suas próprias conc lusões. Mas tal não signif ica que não possam aprender mutuamente . Há uma busca comu m, pelo que podemos falar de uma unidade relacional. Como faz notar Robert J. Russell, fundador e diretor do Center for Theology ond lhe Natural Sciences, nas Estados Unidas, tornou-se hoje imperativo cr iar pontes entre a ciência e a religião" . Neste nosso tempo, profundamente marcada pelo diálogo, pela t ransdisciplinaridade, pela convivência pluralista e pela globalização, o conflito, a confronta ção, a exclusão recíproca entre ciência e religião é não apenas sintoma de ignorância recíproca, como é também factor de violência insustentável. Também por isso, a ciência passau-s e a observar co m outros olhos, realçando nela a presença de múltip los e inext ricáveis fatores culturais, inclusive a religioso, que geram a própria ciência. Esta presença religiosa, quando é de índole cristã, torna-se ainda mais decisiva para a vida da cultura. O cristianismo é muito justamente co nside rado uma religião aberta e dinâmica. Isso deve-se, por um lado, ao alto sentido de transcendência do Deus cr istão, que nunca é esgotado em qua lquer realização, e, por outro lado, à nat ureza dinâm ica desse mesmo Deus, que a irradiação de amo r, dent ro e fora de si, traduz" .

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C:t nC'3 e Religião


--- - - - - - - - - - - - - - - ----- - - - - - - - - ---- , Nem cientismo, que se opõe à religi ão, em nome da ciênci a, nem religionismo, que se opõe à ciênc ia em nome da religião. t: por isso que o escla recimento de uma e de outra deve passar pela articulação entre ambas. Importa que a teologia nào professe uma pseudociência, e a ciênc ia não se torne numa teo logia inconsciente. Por outro lado, e dada a versátil dete rmin ante da vida sobre que assenta a atividade de uma e de outr a, essa articulaçã o nunca pode fixar-s e em esqu emas def initivos. A procura da verdade exclui posições abso lutizan tes , carentes de uma exigênc ia de sent ido sempre maior. Verdadeiramente , nenhuma delas contém o seu princípio e f im. O iti nerári o para a verdade não é exclusivo dos cientistas ou dos teólogos, mas exercício comungante q ue leva consigo uma nova perspetiva tanto da ciência como da re ligião. t: po r isso que falar da art icul ação entre ambas n ão trad uz uma not a acident al da histó ria de uma ou de out ra, mas algo que em boa med ida é est rutu ral t anto da ciência como da religi ão.

EdLcacao r.tor. e R2 ';oiosa Cctolica

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S ít ios CI~NCIA E RELIGIÃO

NB: Inc luem- se aqui os pr incipais electra -s ítios, onde se dese nvolve a mais viva e interessante discussão sob re as relações entre Ciênc ia e Religião . sobretud o cristã, mas não só. A maior parte dos sít ios tem na retaguarda insti t uições Que os suportam e alimenta m - o Que lhes promete uma lon ga vida.

1. Ll NGUA INGLESA AAAS Dialog ue on Sc ience. Ethics and ReJigion (-DOSER"): r:tp:/,....I'... w.aaas.crg/spp/dse - I • A Scien ce and Poli cy project ot the Americ an Ass ociation for t he Advance ment of Science. lhe Ame rican Asso ciat ion for t he Advancement af Scienc e. 'Tr iple A-S· (AAAS). is ao international nonprofit organizatíon dedicated to advancing sc ience aro und t he world by ser ving as an educat or. leade r. spokespe rso n and professio nat association. ln additlon to organizing membership activities, AAAS publis hes the j ourna l Science. as well as ma ny scientif ic newsletters. books and reports, and spea rhea ds programs th at raise the bar of understanding for science warldwide.

ASA - American Scient if ic Affiliation:

http:.. www.ar aa .org/ • Science in a Christ ian Perspective: lhe Am erican Scientlflc Affil iat ion (ASA) is a fellowship of men and wom en in serenes and discip lin es that relat e to science wha share a commo n fldelity to t he Word ot God and a c ornmitment to integrity ln t he practice af sci ence. Centre for Reli gion and the Bioscienc es (Chester, UK)

http .z/wv.•·..c hcst e r.ac ..J k/c :" tJ • lhe Cent re is dir ected by Professo r Celia Deane-Drummo nd and was fo rmally launched by Dr Art hur Peacocke an Febr uary 28t h 2002 . l he Centre is unique ln th e UK in th at t he staff ing af the centre includes five memb ers af t he Department of Theology and Religious Studi es and flve mem bers of the Depar tment of Biological Sciences. CPS - Cent er for Proc ess Stu dies (Craremont . USA): ; l ~ t p :II\', ...·'.. .ct r4process. orgl • The Cent er fo r Proc ess Stud ies is a faeul ty cente r of Claremont School of Theology, and affiliated with Claremont Graduate Univerai ty . CPS seeks to prom ote t he eommon good by means of the relat ional appr oach found in proeess tho ught . Center of Theologic al lnquiry (Princ eton, USA). Sinee its founding in 1978, the Center of Theologieal lnquiry has ded icated its efforts to revi talizing the human eapa eity to understand and live by the t ruth of God's wor k in the wo rld t hrough Jesus Christ. CTNS - l he Center for Theo log y and the Natural Seiences (Berkeley, USA): htt p:// wv. vv.ct ns.crg/

;lt tp:I.·N\, .....ssq.net/ • lhe rnission of ClNS is to prom ote the creat ive mut ual interact ion between t heology and the natural sciences . Cl NS is an intern ational non-protit membership organ izat ion ded ica ted t o resea rch, teaching and pub lic service . It foc uses on the relat ion between t he natu ral scíe nce s includin g physics, c osmology, evolutic nery and mo lecu lar bíolo gy, as weu as techn otogy and t he envi ronment. and Chr ist ian t heol ogy and et hics . As an Affi liate af the Graduate Theologica l Union (GIU) in Berke ley, Calif orn ia, CTNS otters courses at t he doctora t and se minar y leveis in arder to bring fu ture clergy and facu lty to a greater awareness ot t his import ant interdisciplinary wo rk. CHRI5TIANS lN SCIENCE: h t t p://'·'-':'\",·. ci s. o r ~.u kl

http:Jí"'N, w.s: -edrnunc s.c am.ec.ck/teradawt,cctu res.php CiS is an int ern ati onal netwo rk ot those eancerned wit h t he relat ionship betwee n science and Christ ian fa ith, open to scient ists , teacners, students and ali t hose with an interest in t his dia logue. Why Christians ln Science? lhe common rnispe rce pt ion that the re is always eonf liet between science and fa ith can be abused by t hose with anti -Christian or anti -science agendas. ln reality scíence has always been tn e do main of many com mitted Chnstlans such as the astro nomer Jo hannes Kepler who dedica ted one of his papers with a orayer. saying I have here com pleted the work of my eallin g, with as much intellect ual strength as you have granted me. This same attit ude is shared by many Christians who work in scie nce tod ay. eiS exists to support such Christians and the ir aims. COUNTERBAL ANCE: http://,·N .·u.cou nt erbalan::e.org/ • Um dos melhore s: art igos, vi deoconferências , arqu ivos repartidos por

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C1~ !"\~ ia e RC" 'gião

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ESSSAT - Euro pean Society for the Stud y af Sc ience and Theology: . 1 I .c.ecrcnc tccnt r ,,: . c C' n/~ i t ,.' /..:: 3 2 2 4 C • ESSSAT is a scholarly, nan -confessional orgenízatíon. based ln Europe. which aims to promete l he stu dy of relat ionshi ps between the natural sciences and t heoJogical views . ESSSAT has members frorn alrnost 8-"ery Europ ean c ountry as \'Iell as mem be rs trem oth er co nt inents. They have diffe rent con fessional bac kgrounds, an d may includ e believer s as well as no n- believers and atheists. As scie ntls t s. th eolo gfens. philos op hers and historian s th ey work 00 a better under sta nding of the interactions between two of th e most powerfu l human pursuit s, namely religion and science.

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FAITH AND REASON: t tt ru.. .. .ot s.or: /f~d l -c-es so.vctcv. rvinfo !'~ n "Fatth an d Reason" is a documentary about the interaction b etween se renes and reltglon . bot h historically an d today. Through interv iews with leading scientists and theologians. the program exp lores the history af lhe relat ionsh ip between these tWQ f íelds, and reveals that, con trary to widespread popu lar opinion, fo r mos! of history scíence and relíg ton neve been deep ly entwined. Mareaver, tne program lo oks at a growing movement af scientists and theologians around the world today who befleve that falth and reason can support ane anotner, Here we consider issues in evolutionary bio logy, ccsmology, genetics. and technology. 50 tar mos! af the people involved in th is movement have been working in a Christian contexto 50 that is what we focus on in t his programoBut issues raísed by science ultimately affect people of ali faith traditions and we hope the program and website will be of valu e to believers from many different reüglons. "Fait h and Reason" is hosted by international1y noted science wr ite r Margaret Wertheim. who has written wide ly about th is subj ect in books and mag azine art icl es, Ms Werthe im is t ne author of the pie ces on this site.

GIFFORD LECTURES (UK): ú'.< f fora ; ~ '~ . ,,; ~ ·-' s . c E.U:" • Whe n comp lete, it wou ld be a magn ificent rep ertoire of famo us lect ures on natural the ology and other related subject s. • The online Gifford Lec tures dat abas e pre sents a com pre hens ive couectton of book s de rived from the Gifford Lec tures. ln add it ion to the books, t he Web slte contai os biograph ies of each lecturer as well as a summary of th e lecture or book. The Web slte also con tains a biog raphy of Adam Lord Gif ford , a co py of his wltl bequeath ing ma ney to eaeh of the four major Scottish unive rsities to nold th e lect ures, a brief descript ion or natural t heo logy, an lnt roduction to each of the four uruvers ities. and news abo ut u pcam ing Giffard - re lated events.

IAN RAMSEY CENTER (Oxford, UK): h :t ~ :l1l vcr c.ox.ec.' . ,t/- H v c :C3f / • The lan Ramsey Cen tre is pa rt of the Theology Faculty in t he University of Oxford. It has the special aim of promoting high quality teaehing and researeh in the exciting field of sc íence and religion . With in the University tbe Centre runs a regular seminar series bringing scientists, ph ilosophers and theotogíans together to exp lore int erests they have in common. The sem inars are open to graduate students and are attende d by informed membe rs of the public. The Centre atso sponsors reg iona l conferences to encourage new networks through wh ich connect lons bet ween t heology and the sc iences ca n be explored. loternati onar wor kshops are organis ed to enhance t he qualit y ot courses 00 sci ence and religion that are ta ught worldw ide .

IRAS - Insti tu te on Religion in an Age of Scie nc e: !": ' di.: ... .i~3s .orb • Working for a dy nam ic and posit ive re lation ship betw een relígion and science sinc e 1954 . Each yea r IRAS holds a wee k·long co nfer ence on Sta r Isla nd, 10 miles off the co ast of Portsmouth, New Hampshi re. Topics are selec ted to be rele'/an t to cu rrent scientific thinking and to fundamentar re ligious qu esti ons. ISSR - Inte rnational Soc iety for Sc ience and Religion: nttp:/i . ·J.i~~r.c ;: : ~.1 • Leading scientists and theo logians of the world's majo r religions founded a high·powered internationa [ organizat ion with the goal of br idg ing the gap between the ir disciplines. The [nternational Society for Sc ience and Religioo took shape after a fou r-da1 conference in Granada, Spain . wh ich until the late 15th century was the center of pea ceful discourse between scholars of Judaism. Christianit,. and Isram. The ISSR is patterned after the Royal Soc iety of London for the Promotion of Natural Knowledge. JNI- The John Ray Initiat ive: ~ ' ~: J : tor";.L J • Estudo e fome nt o das relaç õe s ent re fé e ecologia.

1,1ETA-L1 BRARY: ~ I t t ') :. J~ ,·J . m E; ~ 1- DrJ ry.f'd/ \ -"SA; • Tópico s vá rios: ciênc ia e religi êo; ci ência e ética; pessoa e ne uroc iência , etc.

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METANEXUS INSTITUTE IPhiladelphia, USA): http:.," ,' · ', w.rr otan, XL.' .ne t/ • The Met anexus Institute advanc es research, ed uca tian and outr each on the c onstruct ive engagement of sci ence ano rengfon. We seek to create ao enduri ng intellectu al and social movement by collaborat ing with per sons and comrnunltles from diverse retigicus traditions and scienti f ic discip lines. ORIGINS: r··p:J1 .ocigins.o· w .tdex.l -rr PARI CENTER: : I ~ t p :/I",\·.".'q

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SCIENCEAND RELlGION FORUM: http:» ",'W v.s rtc-r. rn.c -. / SCIENCE & RELlGION INFORMATIVE SERVICE: ~': : ;i:/I\ ; w \ .5

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SCIENCE & THEOLOGY NEWS: · ., p:!I'.~ . . i. vU;·ne · -s.orl;.I/ SOCIETY, RELlGION & TECHNOLOGY PROJECT: h' :p: // '" W •. v : ;l.") r..:. .I.: :"'/ _rt l= ::l:,e3.sr ',m! STAR COURSE: ' . .v.stercour sc.c r ti TEMPLETON FOUNDATION: ::"tr :/" , .v. t er ~l? t ·:": , o r .j • The miss ion ot the John Templeton Foundation is to pursue new insi gnt s at the boundary between theology and scien ce t hro ugh a rigc rous . open-minded and empirically foc used methodology, drawing toge t her ta lented repre sentetlves fram a wide spectru m of f ields of expertise. Using "t he hum ble epp roach," t he Fou ndation ty pica lly seeks to f oc us the meth ods and resources of sclentiftc inquiry on toplcel areas whi ch have spirit ual and theologícal signif icanc e ranging across the di sciplines from cosmo log y to health care. ln the human sciences, t he fo undation supports progr ams, com petitions, publications. and stud ies that promote cha racter education and the expl oration of positive valu es and purpo se across th e life span, It supports f ree enterprise education and develop ment internationally t hrou gh th e Temp let on Freedom Award s, new curricu lum offerings, and oth er prog ram s th at encourage free market pr incip ies, ~ ' tp:/h: -r

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lhe Vati can Obser vat ory Research Group (Cast el Gandolfo, It aly) r : tp:1i . rvh -s.as.er.zor.r.cd h. C '~ ") 2':'/ , 'o.tnn, • l he Vati c an Observator y, one of the old est ast ronomi cal research institutions In the world, has its headqu art ers at th e pap al sum mer resldence in Castel Gandolfo. ltaly, outsi de Rome, lt s depen dent research center, t he va trcan Observatorv Researc h Group, is host ed by Steward Observatory at the University of Arizona. Tucson, USA. ZCRS - Zygan Center for Refigion and Science (Chicago . USA): ~tp://" ..... ·J. I , et l 'l eXl "" r ·: t /mc' a ne x jS3: ~· I . ; r .Ir'" ).\'_v - c;i? as p?39· 8 r i .o: í'z y ~ o n c c n · ~;, o r [/ • l he Zygon Cente r is housed at the Lutheran School of Theo logy at Chicago (LSTC). We sponsor two co uts es per year offe red by LSlC. the long- running Advance d Sem inar in Religion and Science (since 1965) and the Eplc of Creation (sinee 1989), We atsc have spon sore d many co nferences and sym posia. lhe purpose of our pro grams is t o enha nce the dialogue between religion and scienc e. lnformat ian about our courses, prcgrams. and pubhcat ions can be found on t he wcbsrte.

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2. LlNGUAS ESPANHOLA, ALEMÃ E ITALIANA DICCIONARIO INTERDISCIPLlNARE DE SCIENZA E FEDE: ht·o:// · ,v' :. G : .J o ~ J (It I "1) • Art igos de fu ndo sobre quase toda s as questões relat ivas ao nexo entr e religião e ciência. CENTRO DE INVESTIGACION SOBRE CIENCIA, RAZON Y FE (CRYF): h', tr' ..., ·.L - 3 ....~ s.. .;r . (I


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FORUM -GRENZFRAGEN:

il: tp:/h... , v.forum-grenzfrage .r.de • For um -grenzf ragen is! ein Angebot der Ak ademie der Diozese Rottenbu rg-Stuttgart und bietet ausfüh rliche Belt rage renom miert er Autor lnnen und wôche ntflch akt ualisierte Ar t ikel zum lnt erdls ztpllnaren Dialog.

INSTITUT FÜR GLAUBE UNO NATURWISSENSCHAFTEN: httr::/lw w.,.".i::.J·..... d t l • Das zur SMD gehbr ige lnst it ut für Glaube und Wissensch aft will das Gesprach zwisch en Glauben und Denken in vielen ver schiedenen Berelchen (o rdem. Ziel des Instituts ist es , den Dialog zwisc hen Glaube und Wissenschaft zu f õrdern und andere f ür diesen Dialog zu betanigen, einen Beit rag zum Verstàndnls der gegenwartígen Welt zu leisten un d Orientierung in eíner pluralis tischen wen zu geben . Dies gesch ieht dur ch vortrage. Tagungen und Pub likatio nen .

KARL-HEIM-GESELLSCHAFT: nt to.» , vw.kar l-h cirn- gc a- "sc -i etr.oe/ • Karl Heirn Gese llsc haft zur Fórd erung einer bibli sc h-chri stli c hen Orie nt ieru ng in de r wissens chaftlichtechn isc hen Weft. Die Karl Heim Gesellse haf t will dur ch ihre Veró f fent lichun gen, du rch Tagungen u nd Vortrage das interdlszip linare Gesprãeh zwiscnen de r chr ist liehe n Theo log ie und den Wissenschaften (ordem und vo ran bringen und sucht dabei aueh das Gespr ãc h rnit Menschen. die da rüber and ers de nken.

STUDIENGEMEINSCHAFT WORT UNOWISSEN: hOtp://w\'. ... ("H nd- .ssen.cc I

THEOLOGIE UNO NATURWISSENCHAFTEN: ~. ~ tp :// w \', ',V.th eorors - nat . l ~\·.: 5 5 '" nsc haf t .'nfo/g run 1 :a :~ er: . htm (Ale rna-' :' 3) TTN - Insti tu t Techni k-Theologie - Nat ur wissensc haf te n: t ttp. ".' ww.t tn-Ir.stltut.de/ • Das Inst it ut wur de 1992 mit dem Zie l gegr ündet. den int erdi sziplinàren Dialog üb er ethi sche Fragen aus Naturwissenschaft und Technik zu fõrdem. AIs wissenschaftl iches An- lnstitut der Lud wig - Maxlm itians-Univ er sitât Münc hen arbeitet TTN insb es ond ere an ethischen Frage n aus de n Bere ichen Bio- und Gent echnologie. Medizin, lnform at ions - und Kornrnuníketíonstechnotogten und Energ iet echn ik sowie ihrer wirtschaftlichen Anwe nd ung . Neb en der Veranstaltung õf fent hcher Tagungen od er Seminare bearbeltet TTN Projekte zu ethisch relevante n Themenbereiche n. Dies er fo lgt beispielwelse im Rahmen von interd isztplin ãren Arbeitskre isen oder in Dissertat ions- und Habilitatio nsprojekt en.

PESSOAS SINGULARES: BEDE'S L1BRARY: h: tp:,; t . ·r.•...o, j (;.o.J:Jklboyc e.htm "Be de ' is the pseudo nym of a Brit ish man (Ken net h A. Boyce), who . whi le working on a phys ics deg ree at Oxfo rd, aba nd oned his athe ism and convert ed to Cat ho licism. Bede's Libra r y. which is hosting t his artlc le, dea ls extenslvely with th e retattonsnip between tt- ec logy, p hilosop hy and sci enc e. His essays an d reviews are f lavo ure d by an understated Brit ish wit. One of his major the mes is t he way in w hic h, hist orically speaking , Chris t ianity encouraged t he b irt h and growt h of sci ence.

OEMBSKI, William A.: t i ~ : :): // ,' : \'<\' r.d ·~s i i: n ' ) ~ "" r cr-cc .c om/ r-t- o: '.\ ;. idth etu t ure cc r 12 0 C 6/0 ~ /f L: ' U er_md ca ncnstn»: _neoda.htm f#m ore t.·tp:/ / w w....isci J .Nr /

POLKINGHORNE, Joh n Charlton : r Otp:/1". •"0/ .pclkir ~ C -ns .dc/ h: to .z-,; \. v.theolog.e- exernen.c e/ oorkír of. rrne, ind ex_of f pai, e.h: :n • John C. Polkinghorne. K.B.E.. ER.S. ist ein her vo rragender Quante np hys iker und Pries te r de r Kirche von Eng land . de r sich seít mehr ats 20 J ah ren mit Theo log ie und de r Frage nach de m v er t rat t nrs vo n Glaube und Naturwissenschaften besc haftigt .

TANZELLA-NITII: 1':: tc c'l'\ , v v.õisf.org/ta nzc ~ I j -nit ti/articoti.htm • Organizador do Diziona rio fnterdisô plinare do; scienza e fede h:tp:. ··..... \I ..w.rnat.un.vie. ac.até- neurr -sc.enot.ntro: • Sítio pessoal de Arno ld Neumaier, com muitos mate riais e refe rê ncias.

4, POSiÇÕES ESPECiFICAS: A. INTELLlGENTDESIGN: http:» , .. .v.ir.t e .g cntoesignnotwo -k.org/ U tp: /, ~ 'J.int f 'li gr 'tde ~ :t,.:"ln.:)t·. " "k.or: ·put .ications.htm

t::ducação: 10:'a: c Rt, '3ioJS3 CJtó.ica

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B. ANTI-EVOLUÇÃO Access Research Network: (lntelligent Design): • .. W.3 r.. .Cr::-/

OISCOVERY INSTITUTE: http://www.discovery.o rgl • Trad icionalista e 'criac ion ista ', CENTERFOR SCIENCE ANO CULTURE (INTELLIGENT OESIGN): OISCOVERY INSTITUTE: · •.I.d ::-covery.org / \ . " .n et a-liorarv.r.«

Publicações SCIENCE & CHRISTIAN BElIEF • Science & Chris tian Befief is a journal conce rned with t he interactions of science and rellglo n. wit h part icular reterenc e to Christ ianit y.tt was founded in 1989, pub lish ed by Paternost er Periodicals and is sponsored by Christians in Science and the Victoria lnstítute. There are tWQ Issues per year publ ished on 15 Apr il and 15 Octo ber, A distinguished Editorial Board represents the brc arí mu lti-d isciplinary ínterest s of tne journal. SCIENCE & SPIRIT • Science & Spir it Magazine. published six t imes eac h year, explo res the retatíonshíp between seienee ano rellgio n in th e eonte xt of our everyd ay lives. SCIENCE & THEOLOGYNEWS • Scienee & Theology News is t he monthly, internation al newspa per reportin g tne lates! researeh fin ding s, funding opportun it ies and dlscussions on t he relat ionsh ip among religion, sciene e ano healt h (volume 1, issue 1. appeared in September 2000 unde r the t itle Researeh News and Opportunities in Seience and Theology). Over the past tour years , Science & Theo logy News has become t he definitiva source for infcr maticn about scrence -eoo-reugrcn. Our 30 ,000 nat ional and internati onal readers go t o Science & Theology News to learn about researeh, funding and edueat ion in the f ield. A generous grant trom the Jo hn Templeton Founda tion supports the newspaper, atlowing us to ofter a subs idized subscription priee.

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THEOLOGY& SCIENCE • Theology and Scie nce is the schola r/y journal of th e Center for Theology and the Natural Sciences and is published by Routle dge. The pr imary editorial goal of Theology and Seience is to publish criticaUy reviewed articles that promote the creetlve mutual interaction between the natural sc iences and theology. While the jo urnal assumes the integ rit y of each doma in, íts primary aim is to explore thls interacti on in te rms of t he lrnplic ati ons of the natural sciences for cons t ruct fve researeh in philasoph ieal and systematic theology, th e philosophica l and theo logical element s with in and underlying t heor etica l researc h in t he natu ral sctences. and the retations and inter actions bet ween t heolo gicat and scientific meth od ologíes. The secondary editorial goal is to mon it or and crl tica lly assess de bat es and contr oversies ar islng in the broader fiel d of seience and religian. Thus, Theo logy and Sciene e lnvesti gates, analyzes, and reports on lssues as th ey arise with the inte nt ion of prompt ing further academie discussion of th em.

ZYGON JOURNAL OF RElIGION ANO SCIENCE • Zygc ne facuses an the questiona of meaning and values tna t chaftenge individual and soc ial existe nce today. It br ings together tne best t hinklng of tne day trom t he physical, biologica l, and soc ial scienc es with ideas trom ph ilosophy, thea logy, and retlglous stud ies. The joumal's contributors seek to keep united what may often become dis connected : values with know ledge, goodness with truth , religion with science. Obras de consulta

COUNTERBALANCE FOUNOATION META-L1B RARY • Welcome to th e Counterbalance Interective Libra ry, oftering new views on comp lex issues trom scterce. eth ics, philosophy, and relígícn . Here you' ll find extenslve resou rces on t he evo lut ionlcreation ccntroversy, biomed ical eth ical chauenges . and much more. INTEROISCIPlINARY ENCYCLOPAEOIA OF RELlGION ANO SCIENCE • This Interdisciplinary Enc1cl opaedia is intended to pTO''Iide new seha larl.,. art icles in the rap idly-growing internatia nal f ield of Religion and Sci ence. These articles were writ ten pri marily by European authors and are available here for t he fi rst t ime in Englis h tran slat ion. The} oft er a unique window int o th e approaches and per spe ct ives of t he European communit:.' towa rds what has become a f ield of immen se cultu ral signif icance t hroughout the wor ld. Each article prov ides a very readable and com prehensive sum mary of what is currently being discussed in religion and science on a specific topic as well as how these topics \'lere discussed historically. ' .1ETANEXUS SELECTEO AUTHORS lISTlNG Over 8,000 essays, book reviews , and comm enta ries by distingu ished aut hors.

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