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ANO 5 - EDIÇÃO 43 - SETEMBRO DE 2021
Henrique Veber: Editor Geral
Tudo junto misturado ao mesmo tempo: poeta, escritor, filósofo, professor, mediador de leitura, editor da Entreverbo, acredita no fazer sem crer em resultados.
Jonatan Ortiz Borges: Editor de Conteúdo Não pode dizer que no princípio fez o céu e a terra. Pois um tal de Deus já tinha roubado a ideia. Faz desde então o que pode com seu ofício de poeta e vez em quando consegue construir e desconstruir, criar e recriar tudo o que há no mundo através do verbo. É um ser em constante busca e construção sem ser, e pelo que é não sabe se será... Amém.
Felipe Magnus: Editor Gráfico Cidadão do mundo. Escreve e interpreta poesia. Produz revistas, livros, colagens, curta-metragens. Também é professor de idiomas e tradutor. Aprendiz de flautista. Acredita na arte como ferramenta de crescimento individual e coletivo.
Conselho Editorial: Henrique Veber, Jonatan Ortiz Borges, Felipe Magnus. Elementos Gráficos e Correção de Cores: Felipe Magnus Publicação produzida 100% em Software Livre + Linux
Editorial A vida é feita de escolhas! Eis, o convite: ENTRE! Eis, o motivo: O VERBO. Então, Permitamo-nos estar: ENTREVERBO(S)! Sabemos que dita assim, avulsa: “A vida é feita de escolhas!” Sem propriamente a frase ser inserida em um elaborado contexto, ela pode ser vista como clichê... e de fato: É! Mas trata-se de um clichê que é, também, a síntese inquestionável do existir, pois a todo instante deparamo-nos com escolhas: To Be or not To Be? Exatas ou humanas? Descer ou subir? Ficar ou partir? Acasos ou ocasos? Vermelho ou azul? Até podemos protelar o que impõe-se definitivo, procrastinar decisões, mas inevitavelmente se não as fazemos a vida acaba fazendo por nós. E é por isso que na edição #43 de nosso periódico poético, temos o orgulho de anunciar (enquanto também editora que somos) que Dois livros serão lançados com o selo Entreverbo, e ambos estão na programação da 37ª Feira do Livro de Canoas, da qual também participamos com o sarau em formato híbrido, obrigado poetas Helena da Rosa e Mari Regina Rigo que confiaram seus escritos a nós e, por tal motivo, no dia 9 de outubro às 16:00 h, no Café da Feira, terão suas obras compartilhadas com o público leitor. Aproveitamos para ressaltar que vocês são e fazem a ENTREVERBO! Todas e todos que já participaram ao longo de nossas 43 edições são responsáveis por continuarmos a acreditar no poder transmutacional de mundo e realidades através da palavra, do verbo, da poesia e do versejar. Quando antes de lançarmos a primeira edição, enquanto pensávamos a iniciativa Entreverbo, tivemos de fazer uma escolha: e entre várias impossibilidades, escolhemos a única para nós possível: sermos agregadores de pessoas cativas por um bem comum : A POESIA! E consequentemente estávamos escolhendo o agora, este momento, o tempo presente.
Canoas é o município onde a Entreverbo nasceu, e é com alegria que participamos desta Feira do Livro tão relevante e especial para todos nós... Aproveitando o gancho do lema da feira: Nascemos em Canoas, mas fazemos, e ainda faremos, infinitas conexões pelo Brasil inteiro e para além-mar! Somos gratos pela confiança que vocês depositam em nosso singelo trabalho. Gostaríamos de ressaltar que foi graças ao ofício de lapidar versos que suportamos juntos a pandemia de Covid-19, unidos continuaremos a suportar enquanto for necessário. Ninguém estava preparado para os dias de incertezas pelos quais fomos assolados, mas adaptamo-nos: o sarau antes presencial passou a ser on-line, a revista que era física tornou-se digital... tudo com o intuito de continuarmos a promover o encontro, a conexão humana, as ligações de afeto e os sentimentos tão necessários para o exercício de reinventar um mundo todo através do verbo. Hoje estamos ainda mais conectados e ligados, tanto virtualmente quanto afetivamente, ao nosso público e viceversa: a necessidade de buscarmos o coletivo em tempos de distanciamento social e individualismos, fortaleceu ainda mais o amor que partilhamos pelo ofício da palavra, e é com imenso contentamento que o nosso sarau já tão tradicional está na feira do livro, metamorfoseando-se para o formato híbrido. Adaptar as formas, transformar os meios, mudar os conceitos, readequar a realidade... A pandemia continua, mas a bem da verdade, a POESIA também! Vamos continuar promovendo a vida e a poética da existência, cuidando-nos para que o quanto antes voltemos a conectar presencialmente nossas humanidades. Eis, a única escolha: A VIDA! Eis, o derradeiro motivo: VIVER! Então, permitamo-nos escolher uma existência: ENTREVERBO(S)!!!
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A MADRUGADA E A DEFORMIDADE Navego a madrugada de olho seco, templário descrente de qualquer sol que espante o breu em todos nós. Renego a madrugada a palo seco, sem misericórdia pelos que não gargalham nem inveja dos que ainda têm lágrimas. Trafego a madrugada a corpo seco, como o menino que sobe o morro sem saber que já não tem pai. Me entrego à madrugada a golpe seco, como quem esfrega a própria chaga no granito de cada palavra. O poeta é uma deformidade do cotidiano. Tony Saad Santa Cruz do Sul / RS
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nós só nós que trancamos a porta da sala nós que não fomos mais à praia nós que não bebemos mais em bares nós que não viajamos mais nós que nos apartamos dos amigos nós que usamos máscaras quase não nos reconhecemos mais nesse espelho raso sem lastro nós lais de guia desatados e sem farol à deriva de mar a mar com uma mensagem antiga dentro de nós para entregar estamos solzinhos boiando na linha tênue do horizonte Rubermária Sperandio Rio de Janeiro / RJ @rubermariasperandio
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Parto Quando me propus a vir ao mundo - lá nos idos dos 70 incentivado por mãe e pai - que eu ainda não conhecia e projetado para ser algo que não me era dado saber o que seria vim, vi e me estabeleci. Não pela certeza do que eu era, mas pela necessidade do que então senti. E naquilo a que me propus supus-me não eu mesmo - na qualidade de recém-chegado porém carente do que não soubera, do que me fora ofertado. Ipsis litteris: ipso facto. Elroucian Motta Porto Alegre / RS @elroucian_motta
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Soro fobia assumida: cobras todas as cores e formas todos os silvos e Silvas cada veneno escorrido bocas falsas sorridentes espreitam feito serpentes e temo o olhar de soslaio o selvagem na tocaia quando na sombra se esgueira ao dar o bote, ao trejeito do bicho-homem de peçonha vivo aos sorvos do meu soro Jorge Ventura Rio de Janeiro / RJ @jorgeventura4758
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Eu Cultivo Serenamente Eu cultivo serenamente A solidão das paredes O murmúrio opaco e sem cor Das noites de névoas dançantes Eu cultivo palavras No silêncio petrificante das horas Ao tácito sabor dos beijos Roubados e jamais devolvidos Eu cultivo a exata medida Dos desejos atirados ao léu Oferecidos à inconstância Das marés Sou um agricultor De letras Mãos sujas de terra Fronte tostada pelo sol Eu planto a posteridade Em cada palavra Que escrevo
Maximiliano da Rosa Imbé / RS
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TRASLADO Está no fim a última réstia do inverno, com rostos fechados, transitam os viventes dos tempos de lata atravessando a estação, enferrujados por dentro, como flandres ao sabor das intempéries. Os sem fósforo nas mãos estão lá fora, implorando a misericórdia das estrelas, para preparar o embrulho com o que restou dos pertences. O balde da ordenha está vazio, a única melodia é a das moscas, quase inaudível, como se o som da nova estação permanecesse na caixa do esquecimento. Jonas Pessoa Brasília/DF facebook.com/jonaspessoa.pessoa
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07/09/2021 Enquanto desfilas Destilando teu ódio Em plena Esplanada Nem sentes o sangue A escorrer da bandeira Em que estás enrolada Jorge Abreu Barra do Corda / MA jorgedepaula20012@gmail.com
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AUTOBIOGRAFIA Na esquina em que nasci existiam lâmpadas de vaga-lumes, as janelas tinham um bocadinho de paredes, os tombos se serviam de mertiolate. A gravidade, senhora muito séria, abacateava as calçadas, enquanto o lençol do céu cobria qualquer nudez. A porteira do dia e da noite estava sempre aberta para que o rebanho das horas encontrasse pastores que lhe guiassem. Era tão bom cair em alguns pequenos abismos. O poente devolvia a locomotiva lubrificada ao nascente, e a algazarra servia a seiva que alimentava as árvores. A chuva que caía dos telhados era um fruto com polpa eterna, e todos os recados tinham asas. Robson Alves Soares Porto Alegre / RS Facebook: Da Lua e Outras Coisas Mágicas.
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ELAS POR ELAS Do lado de cá e do lado de lá direitos e deveres usurpados pelas elites castradoras impossível declarar os culpados querem-nos anônimas, errôneas filhas de Eva brasileiras e afegãs maçãs podres somos todas serpentes a rastejar vá de retro, satanás! Do lado de lá e do lado de cá vozes imperialistas a nos ceifar vá de retro, satanás! SOS além-mar e aqui ninguém solta a mão de ninguém somos sementes a desabrochar somos ovelhas desgarradas que não aceitam pastor, nem temor somos legião, coragem e amor Rozana Gastaldi Cominal Hortolândia / SP @rozanagastaldi
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TABOSA paro a observar duas poças de sangue a enrubescer o enegrecido da avenida atravessa meu olhar turista o assombro que causam duas poças de sangue paro a observar duas poças de sangue com medo do ataque que poderia vir das esquinas (sem medir o tamanho de meu ataque) pergunto a quem passa mas não há quem veja ou sinta o rasgo da pele a céu azul mas estão ali duas poças de sangue imaculadas a violentar corpos a anestesiar olhos e a assinar cartões postais Mila Rosa Porto Alegre / RS @omilarosa
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Instante Ontem foi um dia de azul Dia em que a alma atravessa O canteiro da realidade E o céu o nasce eternamente Em tudo que há. Ontem, um dia qualquer Comum, com todas as tristezas Encantos, amores e estradas Pleno de horas e acontecimentos Ontem foi um dia de azul O choro suave por entre Os longínquos da vida, a penumbra suave No breve instante do corpo A decrepitude das rosas O nosso ser - etéreo e transitório Fustigado nas margens dos sonhos Nas leves incertezas circundantes A morte encoberta Na vida apressada A busca de sentidos Nos passos quotidianos A feira, o trabalho, o limiar Talvez ainda se ouça o difuso Azul do momento: estrada partida Entre o sentir a noite posta no jantar E o paladar inatingível do ocaso Paula Albuquerque Rio de Janeiro / RJ @paulabeatrizalbuquerque
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Violência Vitima qualquer idade nas sombras da cidade uma sangrenta vantagem a cada outra contagem fardas golpeiam sem face a todo clamor e impasse negro, pobre, operário, mestre, puta, vigário, não importa! Leva pau! No gueto é tudo igual : ao ato de resistência vingará a prepotência: bala perdida, canhão, spray, jato d’água, caveirão, silencia com ameaça a velha guarda reaça. Leonardo de Magalhaens Belo Horizonte / MG leoliteraturaescrita.blogspot.com
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Plantei rosas pra você engarrafei as lembranças dos momentos felizes adornei com pequenos enfeites coloridos e perfumados guardei em lugar de destaque na estante dos afetos troféu dos felizes dias das memórias de instantes da felicidade fugaz dos ínfimos segundos de alegrias neste cotidiano selvagem e urbano de concreto e pressa confesso que bebi uma a uma, gota a gota os perfumados detalhes daquelas memórias de afetos e dos momentos eternos no fim plantei rosas para você Nirlei Maria Oliveira Campinas / SP @oliveiranirlei
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Verso Embrulhado Novas palavras saem alvoroçadas, atropelando o cansaço, dos passantes. Velhas regras prendem a arte cortando os planos geometricamente. Ignorando as predições, visualiza um futuro sem bainha, mas vivo. Não sobraram papéis para escrever poesia. Por isso se consome mais tempo com vitrines. Leila Silveira Canoas / RS
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ESPERANÇA Essa noite não será diferente: fitarei estrelas e pedirei que de verde tinjas o mundo E me olharás com olhar perdido retinas tingidas de vermelho exibindo dores do mundo: uma morte a cada minuto nos faz pensar em desistência Resistes eu sei e insisto: Creio-te pássaro de asas cintilantes a preservar o futuro e com fé acomodo-te no fundo do peito. Helena da Rosa Canoas / RS
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teus ombros suportam o viaduto paisagem noturna que se vê do alto reduz-se ao desejo instigante de medir tempo e espaço até o desfecho do chão. lua que boia estática na água correndo entre colunas sustenta a velocidade do mundo que emerge no desequilíbrio das horas suspensas. vida que mantemos à custa de intenções atravessa o olhar vazio e faróis apressados dos veículos na contramão. Sidnei Olivio São José do Rio Preto / SP http://peloapelodapena.blogspot.com
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Onomatopéias da Vida Clack! Algemados então, pela própria liberdade Forasteiros em terra alheia Andarilhos em Terra de ninguém. Ninguém? Quem disse? Ludibriados pela promessa De um amanhã Que tarda em chegar. Ops! Esperançosos, Cruzam os braços e nada fazem Acreditando, dessa forma Que grandes peripécias acontecerão. Bang-Bang! Milhões de palavras trocadas Como se fossem projéteis Direcionados rumo ao peito Marcas que não cicatrizarão. Booooommmm!!! Eis que surge um novo brado Um novo ímpeto Um novo amanhã... ...são novos olhares Sentimentos que ganham graça, vida e cor - RESISTÊNCIA ! Emerson Garcia de Souza Paverama / RS emersongarciadesouza2019@gmail.com
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Encastelada A poesia do olhar Profundo como o mar Salga a garganta O coração estranha A boca saliva O coração palpita Amar traz terremoto Eu desmorono inteira No teu olhar Me entrego no teu beijo Me encastelo em tua cama Roubo teus gemidos E te dou os meus Cris Tavares Brasilia / DF @cristavarespoesiaefoto
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todas as manhãs do mundo II para o poeta importa a luz invadindo a sala iluminando a poeira dos quadros queimando suavemente o corpo da mulher nua dourando frutas apodrecidas sobre a mesa as pessoas de passo apressado espremidas, oprimidas notícias de guerra a morte banalizada discurso dos vencidos discurso absurdo dos que acreditam na transformação da humanidade para o poeta o que importa não tem a menor importância para quem não percebe as luzes da manhã para quem não ama e mata inocentes nas ruas do Rio instaurando o terror tornando refém a cidade inteira para o poeta o que importa não diminuirá a fúria assassina dos narcotraficantes não alterará a cotação do dólar não salvará a América Latina dos ridículos tiranos. para o poeta o que importa não impedirá de torná-lo mais ou menos humano será grito abafado será a essência da vida mais forte do que poderia supor. Flavio Machado Cabo Frio / RJ flaviomachado_@uol.com.br
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DIA caminhando trôpego em tempos controversos, qual cavaleiro andante perdido e sem direcção, usando como bússola apenas o coração, nostálgico e puro em farrapos bem dispersos. ignorando afrontas e ameaças constantes, com uma armadura montada sempre em sonhos, uma barreira permeável a futuros risonhos, prestes a chegar, mas ainda distantes. fogos fátuos a surgir ao entardecer, iluminando tenuamente os pântanos em que as rãs insistem habitar, precedendo a lua ao anoitecer, numa oração que oculta só enganos mas que antecede um novo dia a nascer. Catarina Canas Coimbra, Portugal facebook.com/groups/268739633968036
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Ode ao Livro Abre-te, sol infinito, e cobre as extensas noites lacônicas que acenam, lúbricas, da janela. Ó Livro, ó amanhecer lavrado em folhas brancas, rasga-me a alma e nutre meus olhos de horizontes incógnitos. Ó fulgurante miragem, altaneira no céu de celulose, desenha meus anseios na areia infinda. Ó leito de êxtases futuros, alça meus lábios da sequidão aterradora. Ergue-te, ó arquipélago imponderável, onde emerge o Homem-Deus, substantivado na carne adjetiva do Verbo. Ó fulgor das verdades etéreas, sacia minhas mãos, que ávidas perecem em tua geografia abissal, antes de alcançarem a soleira de tua face. Ó refúgio dos paraísos palpáveis, semeia teus negros oásis na página deserta e, entre diamantes obtusos, espirra a palavra sonhada. Ó miraculosa fortaleza edificada em papel, aflora no vácuo prolífero e alvorece a estirpe imortal. Ó Livro, ó sepulcro das láureas que a Beleza repudia, ressuscita a Vida. Saul Cabral Gomes Júnior São Paulo / SP
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santo remédio amargo uma cerveja pro cidadão mal amado já foi a semana inteira na boca do cão pendurado crocodilo no leite só mordida quente seguindo a feira e um inferno pela frente extrato de tomate bancário e detergente de louças sujas num estado negligente uma cerveja pro santo derramado já foi a missa inteira de pé num busão lotado flamingos no parque a mata é verde queimada por sol e um perigo transparente película de vidro casca antiaderente de mãos limpas num espelho descontente Ramon Samurio Canoas / RS
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A URNA Na tarde morta, pela rua torta, a urna funerária carrega um voto de pesar. Massilon Silva Aracaju / SE massilonsilva00@gmail.com
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LETRAS DE FORMA Letra é sinal Que palavra forma Língua é letra Que palavra torna Língua-palavra Palavra-língua Palavra-palavra Língua-palavra Palavra-forma Língua é verbo Que produz a fala Fala é forma De soltar a língua Verbo-palavra Palavra-língua Palavra-palavra Letra-palavra Palavra-forma Verbo Forma Língua Forma Letra Forma Palavra Forma Lecy Sousa Contagem / MG lecysousa@gmail.com
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Pérolas do Rio Quando pravas balas perdidas perfuram o casto pueril coração do Rio, seu curso se afunda em um mar de sangue. E então o Rio inteiro, de janeiro a janeiro, se perde de si mesmo. Marcos Nunes Loiola Botuporã / BA
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NORMA AUTÊNTICA A norma imposta que devora até mesmo quem a impôs A norma imposta que deforma muitas vezes quem vem depois A norma imposta que não devora a forma do sincero que se impôs A norma autêntica recria a forma do verdadeiro que a propôs Dee Mercês Feira de Santana / BA linktr.ee/deemerces
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solidão a pele arde em febre terçã sua voz em meu ouvido corporifica a ausência a distância que nos separa tem a dimensão do mundo caminhos paralelos o amor silencia no canto da sala olhos vagam por lembranças de contato calor a solidão é o remédio amargo a se tomar Cecília Camargo Mauá / SP bedeschicamargo@gmail.com
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Onça No 1 Escuro arco-íris Amarrado em tua cintura Rosto de deus Estatura Fugimos do fuzilamento Foi mar Foi mar Avilhoso Jubiloso momento jocoso Preciosa onça Encantos cardinais Encontros bate pronto Santo em surto Vestido de noiva Adestrado Para que o gozo Seja furto. Everton Luiz Cidade São Leopoldo / RS
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ELIOTEMPO O tempo futuro de Eliot cinge passado e presente. Não pressupõe a espera, esse monstro devorador das noites e das intuições. O futuro aprisiona a todos como se fôssemos ladrões da hora encarcerada na caixa de aviamentos. Que desenho faremos com a linha obscura que atravessa as veias do calendário? Pagaremos para ver a costura do tempo na malha do nada? O futuro mostra-se muito caro. Noélia Ribeiro Brasília / DF @noeliaribeiropoeta
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TUDO É DÚVIDA NA PLANÍCIE ÚMIDA O corpo esfarela Em algum lugar desconhecido No rumo incerto, sem sentido Esparramam-se ódios Angústias e frustrações Está chovendo lá fora E só penso em fazer o bolo de banana Mesmo que rimasse com ira insana É só sonho que embolora No que poderia (e não foi) ter sido. O que fazer com as emoções? Gastar em filmes de romance idílico? Postar a frase do Osho, aquele vestido? Ou mandar embora a velha memória Viver a vida (aquela) que enfim reclama? Tudo é dúvida na planície úmida E o Sol, dizem, só volta na quarta-feira de Cinzas Alessandro José Padin Ferreira Praia Grande / SP https://medium.com/padin
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sobre desumanos ao céu aberto: nos últimos loucos anos há podridão nas águas do cais os olhos não enxergam os miseráveis e uma paixão agridoce atormenta o coração ressecado a noite se cansa na escuridão aponta as marcas da tragédia humana entre os perdidos na multidão que arrastam seus insondáveis sonhos diluídos Benette Bacellar Porto Alegre / RS
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De amores comuns O amor, bicho quieto e contemplativo, Está à espera Minha predileção, entreaberta, na janela Minha vida no vão, e em vão Na nossa mão, sem cautela E é intransitivo O amar que é foto na gaveta, tiras de papel ao chão, cartões de visita É intuitivo e bate à porta Bate de frente, escorregadio, rompe a aorta E com um sorriso cínico Começa uma tempestade interminável em copo d’água Leva as chaves de casa e não hesita Deixa a paz prisioneira e a esperança deixa morta. Charlene dos Santos França Nova Iguaçu / RJ @charlene.franca2
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MULHER Aquela que transpõe transgride transforma trança tece. Aquela que promove propaga propõe Aquela que reúne revive renasce remove Aquela que ama alimenta alegra abraça Aquela mulher sou eu, é você unidas pelo mesmo caminhar daqui, de lá e de além. Mari Regina Rigo Canoas / RS marigringa137@gmail.com
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O AFAGO DO VENTO O vento viaja em novelos. Às vezes vaga em suaves desvelos. Assovia em vaias, trama tocaias assanhando saias, arrepia pelos pelos pélagos e praias. E, no mais sublime dos apelos reverbera mil sóis nos revoltos caracóis dos seus cabelos. (e, entre ondas de lençóis, eu sonhando em tê-los). Paulo Cezar Tórtora Rio de Janeiro / RJ pctortora@gmail.com
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POEMIA Vem deste espaço de reclusão De incertezas e de isolamento De máscara e distanciamento Aonde vem e habita a solidão Vem de nossos nós amarrados Do medo do que nunca vimos Dos desejos que não sentimos De ter nossos “eus” desatados Vem da falta de ser abraçado De estarmos num aconchego Cheiro no cangote e chamego De mãos dadas ao nosso lado Vem desta ausência dolorida Ficar sem os entes queridos Sem os hobbies preferidos Teve que reinventar tua vida Vem, pois a vida está pesada Deste caos nasce a Poemia Ela é filha desta pandemia Na dor e lamento foi gerada Maria Veroni Martins Taguatinga / TO teluade.vero@hotmail.com
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CEMITÉRIOS OCULTOS Os mortos, assombrados com os vivos Não querem mais voltar, nem por instantes Preferem permanecer mortos, esquecidos Escondidos em suas sepulturas e mausoléus Os fantasmas dos vivos assustam os mortos Que com medo, deixaram de aparecer Até mesmo nas casas velhas ou encruzilhadas Exceto alguns distraídos, arrependendo-se depois Há ainda mortos que insistem em vir Visitar amigos, ex-amores e entes queridos Ou resolver pendências antigas, contudo Pouco ficam, sendo finados, porém felizes E a maioria dos vivos, não percebendo isso Continuam a perturbar os mortos, ao invés De se manterem quietos nos seus túmulos Em cemitérios ocultos e lápides sem epitáfios Geraldo Ramiere Planaltina / DF facebook.com/geraldo.ramiere
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INTERMEZZO embora viceje a flor da morte & seu hálito putrefato concedo-me uma pausa e vou extrair o néctar da vida beber de sons & utopias enquanto me seja permitido. Ricardo Mainieri Porto Alegre / RS facebook.com/ricardo.mainieri
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Textura tentei tirar de letra a vida, palavra amorfa, que não cabia no alfabeto criava um novo e morria na textura do meu corpo no papel da minha mente horas, dias, anos, sonhos, ganhos da minha releitura: - infernos ou fortunas? me livro da resposta e aceito ser apenas esta f(r)ase louca inacabada de me reescrever Chris Herrmann Duisburgo, Alemanha www.christinaherrmann.com
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abyssus abyssum invocat o abismo não mente: quem está embaixo puxa pra si outros cadáveres. Mariana Belize Belford Roxo / RJ literaturaintima.wordpress.com
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o figo prometido a dança agora é a do fogo da serpente que não mordeu a maçã mas ejaculou o veneno pra dentro das veias - em doses homeopáticas, pra curar todos os males minha língua em teu sangue injeta palavras forjadas pelo fogo das fogueiras aonde fui, tantas vidas queimada me morda, mastigue, devore pele pelos carne orelhas língua não deixe restar osso sobre osso se apenas uma célula restar, prometo, ao contrário de Prometheus, escalar cada degrau de tuas vértebras e te morder no pescoço bem l e n t a m e n t e até nos tornarmos inocentes sementes na ambiciosa pretensão de brotarmos sãos - nesses chãos não mais semi ou deuses apenas fauna flora sem mente ou memória vivendo como vivem criaturas que nunca conheceram signos significados ou signific antes Malú Bortoletto São Paulo / SP @mhaluh.h
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A Entreverbo aguarda sua colaboração na próxima edição para continuarmos reverberando poesia por todos os cantos… Evoé!
Escritores da 43ª edição: Alessandro Padin Benette Bacellar Catarina Canas Cecília Camargo Charlene S. França Chris Herrmann Cris Tavares Dee Mercês Elroucian Motta Emerson G. Souza Everton Luiz Cidade Flavio Machado Geraldo Ramiere Helena da Rosa Jonas Pessoa Jorge Abreu Jorge Ventura Lecy Souza Leila Silveira Leonardo Magalhaens
Malú Bortoletto Marcos Nunes Loiola Mari Regina Rigo Maria Verona Martins Mariana Belize Massilon Silva Maximiliano da Rosa Mila Rosa Nirlei Maria Oliveira Noélia Ribeiro Paula Albuquerque Paulo Cezar Tórtora Ramon Samurio Ricardo Mainieri Robson Alves Soares Rozana Gastaldi Cominal Rubermária Sperandio Saul Cabral Gomes Jr. Sidnei Olivio Tony Saad
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