Entreverbo #38

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ANO 5 - EDIÇÃO 38 - ABRIL DE 2021

Henrique Veber: Editor Geral

Tudo junto misturado ao mesmo tempo: poeta, escritor, filósofo, professor, mediador de leitura, editor da Entreverbo, acredita no fazer sem crer em resultados.

Jonatan Ortiz Borges: Editor de Conteúdo Não pode dizer que no princípio fez o céu e a terra. Pois um tal de Deus já tinha roubado a ideia. Faz desde então o que pode com seu ofício de poeta e vez em quando consegue construir e desconstruir, criar e recriar tudo o que há no mundo através do verbo. É um ser em constante busca e construção sem ser, e pelo que é não sabe se será... Amém.

Felipe Magnus: Editor Gráfico Cidadão do mundo. Escreve e interpreta poesia. Produz revistas, livros, colagens, curta-metragens. Também é professor de idiomas e tradutor. Aprendiz de flautista. Acredita na arte como ferramenta de crescimento individual e coletivo. Daiane Irschlinger: Ilustradora Arteira: faz sua arte ilustrando sentimentos, ama cinema e música. Gateira: tem paixão por felinos. Bruxa: possui lá seus feitiços e encantamentos… Gosta de Confeitaria, aprendeu a fazer trufas e doces de chocolate. Penso, logo escrevo.

Conselho Editorial: Henrique Veber, Jonatan Ortiz Borges, Felipe Magnus. Publicação produzida 100% em Software Livre + Linux


Editorial “Não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes A vida presente” (Poema “Mãos dadas”, Carlos Drummond de Andrade) Olá amantes, apreciadores e aprendizes da palavra! Eis que chegamos na edição #38 da Entreverbo e saudamos a todas e todos que, ao longo de todas as edições confiaram e ainda confiam em nosso singelo trabalho. Apesar de a realidade imposta insinuar um tempo de escassa poesia, continuamos firmes e fortes, juntos e de mãos dadas, acreditando no fazer poético como forma de transmutar o mundo através da palavra; e mais do que nunca ela é, e se faz necessária, como ferramenta de aproximação, comunicação e manutenção de nossas humanidades em meio a dias tão sombrios. O Presente editorial é um convite para celebrarmos a vida. Ainda não é chegado o momento de perdermos a fé que nos move, nem de fugirmos para as ilhas ou de permitirmo-nos ser raptados por serafins insanos que, com promessas de indivisíveis quimeridades, tentam nos seduzir a não mais voltar para o presente da existência, mas voltamos, pois o tempo presente é a nossa matéria e é nossa missão enquanto artistas do verbo continuar e lutar, para que através da poesia possamos levar certo alento ao encontro de almas que andam tão cansadas. Então, continuemos! Aproveitamos para salientar a importância de todos vocês que aqui estão, e de todos aqueles que aqui estiveram, para que nós tenhamos cada vez mais vontade de dar seguimento em nosso trabalho. Pedimos que continuem a colaborar com a Entreverbo: divulguem, mandem seus poemas e, para quem for possível, colabore com a nossa campanha de financiamento através do Apoia-se ou via “PIX” (mais detalhes nos perfis do Instagram, Facebook, YouTube e/ou inbox). Vocês são e fazem a ENTREVERBO. Eis o convite: a vida! Eis o motivo: a arte! Então, permitamo-nos: ACREDITAR!!!

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INTERMEZZO Não é apenas Sobre meus pedaços Jogados por aí Não é sobre a fúria Dos famintos Os disparos O menino negro Fugindo da polícia Não é sobre a democracia Rude e mal vestida Meus irmãos cegos Engolindo a dor Não é sobre o antilirismo A secura das manhãs A morte do amor É muito mais sobre Esse bicho triste dentro de mim Flertando com a aurora. Luiza Cantanhêde Santa Inês - MA @luiza_cantanhede

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Exercício de consciência Meu egoísmo “ainda” me impede de falar, Cantar Minha arrogância “ainda” me conduz à extravagância Minha idolatria “ainda” seduz com magia Se o “ainda” se torna “não”, Estou no exercício da Prontidão... O “Não” Liberta o cuidado, O orgulho por mérito, A devoção autêntica. As pedras no caminho Não são ornamentais! Avante! Dá-lhe! Dá-lhe! Olé! Ednize Judite Rio de Janeiro - RJ @eddeversoscontosecantos

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O SOL SE PÕE NAS SOLAS DOS COTURNOS era o dia em que esperava ou era o dia de todos os santos mas o certo é que era dia e esperava dentro e fora das horas esperava pais, mães seus dez tios esquecidos esperava os assassinos vivem mais mais do que se espera e a vida mastigada na boca dos santos espera

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Mila Rosa Porto Alegre - RS @omilarosa



SCRIPTUM do que sai desta tinta senão a cor da escrita a mancha que deslancha meu verso transmudado em que deixo ao leitor sacramentada dica: escreva-se na dor escreva-se no gozo escreva-se no pranto escreva-se no riso escreva-se no amor escreva-se na raiva escreva-se no voo escreva-se na queda escreva-se na festa escreva-se no tédio escreva-se e livre-se nas linhas, ilimite-se qual eu, entregue ao borro qual eu, intenso e grato: devo à pena a palavra, a que me fez poeta

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Jorge Ventura Rio de Janeiro - RJ jorgeventura@terra.com.br


Despedida com fúria deixarei o mundo aqui tudo será como antes na secura das palavras e no remorso vão reminiscências do que fui o desejo de ser alinhavo certo de não levar mágoas somente o que amei irá comigo meu verso o passaporte para um amanhã na eternidade Luiz Otávio Oliani Rio de Janeiro - RJ

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Jazigo Olhos cerrados, uma vez mais teto e desabrigo no leito escuro inférteis desvios e a jura, revogada remota felicidade, a vida equivocada roteiros alterados - prossiga, esqueça a paz é absurda e o céu é calabouço esboço tão injusto, ajuste e impasse só me desprendo, me rendo, aprendo no todo inverdade do que já não há tola toda verdade, espaço laço e dor sonho ao viés, a vida ávida vagueia fugaz - arde, ensaia e é tão tarde revela zelo a gélida mão amiga abraço de brisa ânsia fim de linha somente pétalas desbotadas urge e já tanto faz: sementes e um único, definitivo adeus Aqui jaz. Renata Rothstein Rio de Janeiro - RJ facebook.com/renatarothstein

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Recortes Rio, quem te viu primeiro? Terra à vista E o índio em terra. Rio, quem te fez janeiro? Rei, conquista? O início da quimera. Rio, quem te ri por último? Quem afana sem cessar e assombra o escrúpulo? Ou quem ama o mar e o sabe múltiplo? Delayne Brasil Rio de Janeiro - RJ delaynebrasil@gmail.com

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Labirinto das maçãs douradas Todos os dias se parecem com todos os dias de anteontem E anteontem tem o mesmo gosto do amanhã que não é o amanhã, é o resultado da espera ansiosa dos dias anteriores E se houver o amanhã, se nem sabemos se haverá o fim do hoje? E todos dos dias se parecem com uma porta que leva a outra porta E nunca saímos desta trilha de portas A luz incide e é tênue Todos os dias são o preparativo do amanhã Como foi ontem a grande espera que terminou em nada Sobrando apenas um resto de luz Caminho de luz no labirinto das maçãs douradas Aquelas que atiçam a vontade Mas não se deixam consumir Somente o hoje, o ontem e o amanhã que nos consomem todos os dias, como todos os outros dias que nunca deixaram de ser o instante inacabado Paulo Sérgio Kajal Rio de Janeiro - RJ @bruxo217

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Pianíssimo caminhando entre pedras e cacos me ensurdecem os ruídos monstros pontiagudos me pisam a pauta dos pés pulo esta clave caio na via do silêncio no ar da noite de sol onde anjos me tocam a melodia dos afetos desafinam gravidades que me cabem flutuar Chris Herrmann Duisburgo - Alemanha www.christinaherrmann.com

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Garcia Lorca (verde que te quero verde, verde, verde) cães vagabundos porcos da rua torta anjos que não nos encaram monstros de óbvios pesadelos meninos de efêmera trajetória a ciranda abraça a praça cordas esticadas das gargantas cortadas a música regendo o passeio dos pássaros a morte de asas púrpuras o fardo da existência pedras rolando saltimbancos em romaria medieval cavaleiros armados de cruz e espada combinações de astros alinhados verdades impostas por falsos profetas a paixão anda de mãos dadas com o abismo escapando ao pelotão de fuzilamento avançando pela manhã de desencantos antecipando sofrimentos falência geral dos sentidos tortura diurna proclamando arrependimentos tardios. Flavio Machado Cabo Frio - Rio de Janeiro flaviomachado_@uol.com.br

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Ninfa Quando se perde razão, sanidade E desloca-se a sensível emoção Resulta em explosão e é verdade Pulsa o corpo, não só o coração Quando se perde a razão, sanidade Por conta de um doce tão instigante Irresistível ninfeta sem idade Adoça a vida como nunca antes E desloca-se a sensível emoção Deste poeta ao que lhe é primazia A arte, a dança, poesia e canção Expressões que nos embalam em fantasia Resulta em explosão e é verdade Não me nego que se exploda o mundo E não se negue, pois é forte, profundo O impulso que nos liga, eletricidade Pulsa o corpo, não só o coração Língua calada usa de outros sentidos Leves gemidos testam minha audição Eu sem razão, mas permaneço vivo Zéu Pereira Santo Amaro-BA @poesiaelementar 16


IMAGO Noite alta, a pulga-medo revolve, espreita, escala. Salta. Pulga áptera, minha ópera, traviatta artrópoda, Pulga-gaga, escancara tua insânia, tuas chagas, incandesce de laser os olhos miserabundos, safados. Resfolega o abdômen ebúrneo nas camas, nos carmas. Sofás (so far, wherever you are). Pulga amiga, escrota, fada vagabunda, escalavrada e linda. Meu medo ainda te adora, implora e chama outra(o) brama. E agora? Esmago a pulga na borda do copo (sangue borrifado em toda a tela). Marcelo Francisco Domingues Pereira Sales Bertioga - SP marcelodomingues.sales@gmail.com

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vermelho voei como a outra que no meio da noite voou com seus olhos sedutores brilhando os segredos escritos num diário de notas proibidas com suas pontes e túneis secretos abrindo-se em êxtase vermelho ali, úmida diante dele engolindo planetas cheios de perigos Benette Bacellar Porto Alegre - RS

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eis a porta de tal devaneio a grama cercou meus pés e o metal torcido se elevou na casa dos meus pontapés eis a porta que os devaneou se o começo não é mistério mas oculto e concreto por que meus pés afundam no instante líquido às margens? … a grama tornou-se a carcaça metal de azul chumbo e vidraça no forro da terra vermelha os olhos sobre o piso se o começo não é mistério o que mora em seu exílio ? eis a porta de tal devaneio Ramon Samurio Canoas - RS

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Nós Costuro estrelas na janela pra que sempre tenha luz. Posso pintar o mar sob seus pés pra que sempre tenha paz. Invento alguma estação do ano pra que sempre tenha ânimo. Refaço algum dicionário pra que sempre encontre sentido. Te cubro com meu corpo pra que sempre tenha calor. Sorria o seu sorriso, sempre. Isso faz com que meu mundo tome alguma cor. Ana Carolina Oliveira Ituiutaba - MG @pfvrcarol

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Travessias

(para Maria Helena Miranda Franca * Leninha)

Se ao findar da Travessia Amor é o que se deixa Amor é o que se leva Proponho, pois, um pacto. Não de sangue. De Luz. Sem trevas, Solar! No silêncio. Sem medos! Que seja o entardecer O elo entre o baixio do chão E as terras das “altas paragens”! Que seja a Poesia, A corrente inspiradora Que sejam os livros, A fonte do Saber Do querer, de Ser De estar, do fazer Transcender! Diêgo Alves Araçuaí - MG @digas.alves

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Um caminho livre para a poesia Crescer por si só não tem limites Faz parte ser livre para se erguer Quando eu penso em meu ser Começo a partir de uma paz interior Escolhendo a palavra certa Que precisa ser perfeita para despertar Porque faz parte do amor à feição De ficar próximo do paraíso Quando eu penso em escrever Tenho na consciência o poder De escolher o meu caminho Quando eu me encontro solitário No limiar dos desejos penso A partir de um voo profundo Para qual futuro irei me projetar O que seria a vontade do espírito livre Se transformando na vontade de provar O acaso e a necessidade de amar Alexandre Agostini Canoas - RS

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SOBRE - VIVER Orar O silêncio interno do barulho Abraçar A saudade em turnos Comer Com os olhos os resumos Chorar Rios de alívios soluços Brincar Palavras analógicas luxos Sorrir espontâneos risos intrusos Abraçar O entorno vida a cada minuto Amar Fora do juízo absoluto Esperançar O horizonte difuso Reinventar A fase odisseia do futuro Realizar Benevolênciosos recursos úrgicos Acordar a paz Adormecida nos vãos dos absurdos Ser luz Explosão a colorir o escuro Fruir O prazer no céu oculto Dos desejos Do mundo! Delma Gonçalves 24

Porto Alegre - RS @delmagoncalvesmattos


A benzedeira As crianças correm em frente a casa E o aroma de café perfuma o ar. Imagens de santos, orixás e velas Entre luz e sombras compõem o altar. O homem pálido senta-se ofegante Seu humilde semblante, suplicante, Dirige-se à velha benzedeira, Em busca de alívio à sua canseira. Ela apanha seus unguentos E em suaves movimentos sinuosos O envolve em seu círculo de fogo. Sibilos evocam os deuses antigos. Céu e terra articulados no horizonte. Vozes confusas dos pássaros E a agitação violenta das folhas Denunciam maus presságios. Um quase semblante insinua-se das sombras. Do peito aberto sai o encosto Respira-se aliviado pela hora concedida. Num gesto final o corpo é selado O camponês retorna à colheita do dia. Filipe Oliveira Belém - PA @filipe8072

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União estável Segue entre eu e você, A função do saber Entre dois indivíduos que nada sabem, Tentando seus frutos colher. Plantamos espinhos, Esperamos amores, Colhemos um maldito vício De beber e celebrar nossas dores. Cansados de plantar destinos, Decidimos plantar decepções. No fim somos tão desgarrados, Que perfuramos nossos próprios corações. Sempre unidos, Até que a morte nos separe, Nem depois dela separamos É o ódio que nos une e não há nada que nos pare. Emanuelle da Silva Bento Gonçalves - RS @escritora.emanuelle

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Poema de um pessimista Hoje a dor dilacera-me a alma como uma gangrena [a corroer a carne. O tempo, esse ancião horrendo me destroça voraz, [aniquila o peito. Apenas maldigo da desesperança, em meio ao caos, Pois a epigênese da vida causa-me repugnância. À noite quando em profunda tristeza definho O vítreo olhar compadecente dos vermes da podridão, Esse monstro desgraçado, arquiteto da ruína, devora-me [na frialdade da terra. A morte, essa serpente traiçoeira afeita às ruínas e [ao tormento, Não se compadece da desventura lúgubre das loucas [dores da amargura. E de forma voraz age para pôr fim à vida, à dor e [ao sofrimento. Da eterna alvorada, apenas a campa enegrecida Das lembranças vagas que ainda sangram o peito, A vida, da qual nem sei se fui feliz um dia. Regiane Nunes São Gonçalo dos Campos - BA @regiane.nunesnunes35

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Júpiter e o cajueiro Entre Júpiter e eu havia um cajueiro. Galhos tortuosos e folhas alternas, de ápices arredondados, buscam tocar estrelas, planetas e satélites. Buscam tocar-me. E tocam-me na congruência inimaginável. Por que te importaste comigo, cajueiro? Se o vento que lhe resvala ora esconde Júpiter, ora o revela. Acaso sabes que somos apenas a mesma coisa? O meu sangue corre em tuas nervuras. E tua resina amarela escorre das minhas veias ao céu. Entre Júpiter, o cajueiro e eu, sempre houve o mesmo caminho. Maurício Simionato Campinas - SP mauriciosimionato@yahoo.com.br

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Panela de Barro Sou como as panelas forjadas no barro dessa terra, acochado no calor da brasa acendida, resistente a trancos e barrancos, de troncos longos e raízes altas, desatolado da lama de onde emana suspiros de vida. De rústicos e tradicionais atos passado de mãe para filha, de geração em geração, martelado por mãos altivas, brinco entre amasso e rebates, no lado lúdico da rotina. Entre tampas silvo o tempero que se desmancha no paladar, dando gosto à comida, artesanato de ensaios dantescos entre fogo e assopro, tenho formas sem medidas, deixo a vida mais sabor’lorida. Neide Pereira de Oliveira Vitória - ES

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Poema arejado A existência me respira me sopra, bufa, ópera ventosa e sem pulso, esse hálito, esse abafado jeito de levar a vida em apuros. Helton Lucinda Ribeiro São Paulo - SP

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OS OUTROS faça sua travessia apesar dos outros sem as palmas a crítica velada ou venenosa dos outros receba o abraço amigo do sol apesar dos outros o afago do vento sem nada a dividir com os outros pois os outros são outros usam palavras amenas mas tem pensamento diverso fique com o verso olhe de frente para encarar o mundo. Ricardo Mainieri Porto Alegre - RS facebook.com/ricardo.mainieri

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Eco (Poema Cubista) Entre cubos e cilindros, Minha mente tão quadrada Vai listando alguns palíndromos: Ele, oco, asa, ata... Entre cilindros e cubos, Paralelepípedos, cones... Meus olhos ficam insones. Não destacam mais palíndromos, Mas bolas, dados e tubos, Esferas, cubos, cilindros... Asas à imaginação, Que voou como fragata! E o oco virou eco, Que ocupa o lugar dele, Lá naquela antiga ata: Ele, ele, ele, ele... Fica nesse repeteco. Suely Andrade Fortaleza - CE facebook.com/suelyandradetextos

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SENTIDOR NÃO FAZ SENTIDO VER CADA VER CADA CADA VEZ CADA VEZ QUE VER CADA VEZ CADA VER CAVER CADA CAVEIRA CADA VEZ OUTRO CADA VER CADA CAVEIRA CADA VEZ MAIS CADA VER OUTRO CADÁVER FAZ SENTIDO SENTI DOR . Elton Manganelli Porto Alegre - RS

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ISTO Vejo minha face no espelho, está enrugada e de repente penso: não sou um animal, não sou uma planta, nem uma placa mãe de uma máquina qualquer, sou apenas um humano com a barba por fazer. Tenho saído pouco, falado menos ainda, tive tempo para não ser nada, mas sou humano e como humano, olho para a vida como o bem maior que tenho. Pena que agora eu veja no chão, minha sombra envelhecida como uma harpa que há tempos emudeceu. Com os atropelos do ofício, ando torto, inchado, todo grito de dor que vem do próximo traz insônia para minha noite, e meus olhos racham como se eu tivesse a pele cimentada. Não tenho nome esculpido em mármore nem gravado em placa, mandei engessar os ouvidos quero estar surdo para não ouvir as mentiras que falam de mim. Não tenho aqui balas de gengibre, do último whisky que bebi, ficou uma brasa na minha língua e sempre que preciso de gelo a forma está vazia fora da geladeira. Jonas Pessoa do Nascimento Brasília – DF facebook.com/Jonaspessoapoeta

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Verdade Inquestionável Há mundos infinitos no vazio E mundos incontáveis inda além. Não conhecemos nem o nosso bem E o que sabemos é um pequeno fio. Nosso conhecimento é fugidio, Nossa verdade é aquilo que convém: Apenas a aceitamos num amém Vendo o desconhecido por sombrio... Será que é tão difícil aceitar Que estamos muito longe de encontrar Verdade inquestionável sobre a vida? Desconfie de quem prega verdades, Certezas, rituais, moralidades, Pois esses têm um cérebro suicida. Jaime de Andruart Porto Alegre - RS @jaimedeandruartautor

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LIVRO-ME Não escrevo poesia A poesia é quem em mim se escreve Às vezes em bela caligrafia Noutras, garranchos indecifráveis De dentro pra fora sou manuscrito Nas minhas páginas-pele Em versos surgindo feito feridas Com a pena viciada pelo tinteiro Que meu sangue abastece E dessa metaforma rascunhada Amiúde desfolham poemas Que recolho, e quando quero Penduro no meu varal de vaidades Mas eu, este ser-livro Maior que a vontade De por outros ser lido Ando aprendendo, primeiramente A me ler, relendo-me se preciso Letra a letra, linha por linha Livrando-me pouco a pouco Das palavras mais pesadas Até poder, quem sabe Ser leve o bastante Para conseguir voar Com o simples levantar Das minhas capas-braços Tornando-me assim, além de livro Um ser livre, literalmente

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Geraldo Ramiere Planaltina - DF facebook.com/geraldo.ramiere


Oficina Literária Retífica de metáforas Retirada dos arranhões da lataria dos substantivos Restauração do estofamento dos adjetivos Encurtamento da carroceria dos parágrafos Acabamento em proparoxítonas Robson Alves Soares Porto Alegre - RS

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A Entreverbo aguarda sua colaboração na próxima edição para continuarmos reverberando poesia por todos os cantos… Evoé!

Escritores da 38ª edição: Alexandre Agostini Ana Carolina Oliveira Benette Bacellar Chris Herrmann Delayne Brasil Delma Gonçalves Diêgo Alves Ednize Judite Elton Manganelli Emanuelle da Silva Filipe Oliveira Flavio Machado Geraldo Ramiere Helton Lucinda Ribeiro Jaime de Andruart

Jonas Pessoa do Nascimento Jorge Ventura Luiz Otávio Oliani Luiza Cantanhêde Marcelo Francisco D. Pereira Sales Maurício Simionato Mila Rosa Neide Pereira de Oliveira Paulo Sérgio Kajal Ramon Samurio Regiane Nunes Renata Rothstein Ricardo Mainieri Robson Alves Soares Suely Andrade Zéu Pereira


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