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Faltou a regulamentação

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TNP e Fenômeno

TNP e Fenômeno

Apesar da euforia com o Relatório sobre

a Indústria de Cartões de Pagamento, o ano chega quase à metade sem que qualquer medida efetiva tenha sido anunciada. Embora as propostas já estejam nas mãos dos ministros

n Por Morgana Campos

Em recente decisão, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) proibiu um posto de combustíveis do Rio Grande do Sul de cobrar preços diferenciados para pagamento em dinheiro ou no cartão. Se descumprir, o estabelecimento terá que pagar multa diária de R$ 500. Péssima notícia para todos aqueles que vêm brigando contra o lobby da indústria de cartões, mas que não chega a ser o fim do mundo. Afinal, como não se trata de decisão sumulada, os demais tribunais do país seguem livres para se posicionarem sobre a questão como acharem

Compartilhamento de POS vai reduzir alugueis e permitir negociação de condições com as credenciadoras conveniente. Entretanto, é fato que a decisão cria importante precedente, influenciado outros magistrados em suas sentenças.

Tudo isso, no entanto, poderia ser evitado se a tão esperada regulamentação do setor já tivesse sido anunciada. E essa tem sido a expectativa do mercado desde que foi publicado o Relatório Sobre a Indústria de Cartões de Pagamento, elaborado pelo Banco Central do Brasil, SDE (Secretaria de Acompanhamento Econômico, do Ministério da Fazenda) e Seae (Secretaria de Direito Econômico, do Ministério da Justiça), no ano passado.

De acordo com Paulo Augusto Pettenuzzo Britto, coordenador-geral de análise econômica da SDE, após a divulgação do Relatório, foram recebidos comentários e feitas pequenas alterações no documento. “Enviamos algumas propostas de medidas, que não podem ser abertas, aos respectivos ministros. Tais propostas estão agora em avaliação e sem prazo definido para serem divulgadas”, explica. E, com o ano eleitoral apenas começando, é muito improvável que qualquer medida seja anunciada no curto ou médio prazo.

Britto explica que a SDE é favorável ao desconto para pagamentos à vista, assim como o DPDC (Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor) do

Ministério da Justiça. “Na verdade, o DPDC emitiu, há alguns anos, um parecer contrário sobre a questão (que era apenas uma sinalização), porém já mudou de opinião. Só que o DPDC tem uma tarefa bem mais difícil, porque é o coordenador-geral do sistema e precisa convencer todos os agentes, como alguns Procons, por exemplo, que não aceitam tal prática por considerar prejudicial ao consumidor. É um processo muito mais demorado, de convencimento”, enfatiza. Ele reconhece que a decisão do STJ atrasa esse processo de convencimento.

O coordenador da SDE lembra, entretanto, que não existe vedação na legislação à cobrança de preços diferenciados, não havendo, portanto, necessidade de mudanças em leis no Congresso Nacional, o que tornaria o processo bem mais lento e demorado. “O que existem são os contratos entre comerciante e as empresas de cartões com cláusulas impedindo a cobrança de preços diferenciados. Com o posicionamento anterior (contra a prática), estas cláusulas não podiam ser consideradas abusivas, mas agora podem. Os comerciantes podem alegar que estão sendo prejudicados na competição de mercado”, ressalta.

Compartilhamento à vista

De concreto mesmo, a única mudança trazida pelo Relatório foi a possibilidade de compartilhamento entre os POS (os terminais onde os cartões são passados), anunciada voluntariamente pelas empresas e que deve vigorar a partir de meados deste ano.

A Redecard (credenciadora da Mastercard) até já anunciou que está apta a trabalhar com mais de uma bandeira, mas como o mercado é dominado por Mastercard e Visa, na prática não existe compartilhamento até que a VisaNet (credenciadora da Visa) também faça o mesmo. A expectativa é de que, a partir de junho, uma mesma máquina possa usar Mastercard ou Visa, o que abriria espaço para que VisaNet e Redecard disputem os mesmos clientes e, assim, os donos de estabelecimentos comerciais possam negociar melhores taxas de administração e reduzirem os custos de aluguel dos equipamentos.

A decisão de adotarem, voluntariamente, o compartilhamento busca desestimular o governo a promover uma regulamentação do setor, mostrando assim que as próprias empresas podem implementar medidas que aumentem a concorrência nesse mercado, a principal preocupação do governo. A ABECS (Associação Brasileira das Empresas de Cartões e Serviços) chegou inclusive a procurar o governo para apresentar uma proposta. “Concordamos em ouvir, mas sem o compromisso de que a proposta seria chancelada pelo governo ou que, de alguma forma, sinalizasse que o governo estaria negociando uma autorregulamentação com as empresas. De fato, a proposta ia ao encontro das nossas conclusões, mas havia problemas, pois não deixava claro, por exemplo, em qual prazo ou como as medidas seriam implementadas”, destacou Paulo Britto.

Comissão no Congresso

Apesar do ano eleitoral, o Congresso segue trabalhando na questão dos cartões de crédito. No final de março, a Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados criou a Subcomissão Especial sobre Cartões de Créditos, que acompanhará as medidas do governo e propostas em tramitação no Congresso para regulamentar o mercado de cartões de crédito. O deputado André Vargas (PT-PR), que preside a Subcomissão, diz que a ideia é promover um amplo debate público sobre a questão. “É um tema complexo e qualquer medida no sentido de se adotar um controle absoluto não é bem vista pelo mercado. Mas vemos que a quebra da exclusividade irá surtir efeito no longo prazo, já vai melhorar um pouco”, afirmou.

A primeira reunião, com representantes da SDE, foi realizada em meados de abril.

“O que existem são os contratos entre comerciante e as empresas de cartões com cláusulas impedindo a cobrança de preços diferenciados. Com o posicionamento anterior (contra a prática), estas cláusulas não podiam ser consideradas abusivas, mas agora podem. Os comerciantes podem alegar que estão sendo prejudicados na competição de mercado”, diz Paulo Britto

Processo contra Redecard encontra-se na reta final

Se a regulamentação ainda não veio, os diversos órgãos do governo estão buscando atacar práticas consideradas anticoncorrenciais e, assim, forçar as próprias empresas a adotarem medidas que melhorem a concorrência no mercado ou, pelo menos, mostrar que estão de olho nelas.

Um claro exemplo disso diz respeito ao processo instaurado pela SDE contra a Redecard, acusada de abuso de poder em operações de comércio eletrônico, ao tentar impor contratos de exclusividade aos facilitadores de compras pela Internet , como MercadoPago e o MercadoLivre, além de outras medidas. “Entramos com uma preventiva, mantida pelo CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), determinando que a Redecard se abstivesse de implementar as mudanças contratuais sob investigação até que fosse analisado o mérito. No início, tentou-se argumentar que não se tratava de condições anticoncorrenciais, mas depois a empresa se mostrou disposta a negociar com os facilitadores uma solução”, explica Paulo Britto, da SDE. De acordo com ele, o processo está andando, mas não há uma previsão de conclusão. A expectativa é de que as duas partes cheguem a um acordo sobre a questão, o que não impede que punições de caráter disciplinar, por exemplo, sejam adotadas. n

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