Clareira Flamejante - O norte do paraná antes e depois do advento da energia elétrica

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R OG É RIO R ECCO

Clareira Flamejante O Norte do Paraná antes e após o advento da energia elétrica



Florestas com 40 metros de altura sucumbiam aos desbravadores, que abriam grandes clareiras para dar lugar a fazendas e cidades. Atrás deles vinha o fogo, igualmente implacável, e tudo ardia por semanas. De dia, de tanta fumaça, quase não se via o sol. De noite, a visão fascinante e aterradora das clareiras flamejantes.



R OG É RIO R ECCO

Clareira Flamejante Projeto desenvolvido com o apoio da Romagnole Produtos Elétricos S.A.

LEI DE INCENTIVO À CULTURA

MINISTÉRIO DA CULTURA

1ª Edição - Maringá - PR - 2007 Santo é o Senhor Deus do Universo


www.clareiraflamejante.com.br PROJETO ESPECIAL

Ao completar 45 anos, a Romagnole tem a satisfação de apresentar “Clareira Flamejante”, uma obra documental em formato literário que, de forma objetiva, relata as etapas de desenvolvimento da energia elétrica, com ênfase no Norte do Paraná. É a contribuição da empresa para a memória da região, através da pesquisa de fatos e depoimentos que enriquecem uma narrativa envolvente, onde não faltam emoções e surpresas. Um trabalho que possibilita às novas gerações conhecer os desafios que marcaram a aventura dos antepassados, os quais, acalentando muitos sonhos, deram-nos um exemplo de capacidade realizadora.

Av. Carneiro Leão, 135, 9° andar, Cj 902 – CEP 87013-080 Maringá-PR Tel/fax (44) 3028-5005 rogeriorecco@flammacom.com.br www.flammacom.com.br PRODUTOR EXECUTIVO

Pery de Canti

PROJETO GRÁFICO E EDITORAÇÃO

André Bacarin Ernesto

APOIO TÉCNICO

André de Canini, Wallace Antonio Matarolli Freires, Carmem Salgueiro, Daniel Aires, Marly Aires AGRADECIMENTOS

João Laércio Lopes Leal, Jorge Fregadolli, Kurt Jakowatz, Cézar Lima, Afra de Oliveira, Sérgio Mendes, Rose Machado, Maurinho Piccioly, Akimitsu Yokoyama, Museu da Energia e Copel IMPRESSÃO E ACABAMENTO

Midiograf

SILVANA ROMAGNOLE

Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) (Biblioteca Central - UEM, Maringá - PR., Brasil) R295c

Recco, Rogério Clareira flamejante / Rogério Recco.-- Maringá : Gráfica e Editora Midiograf, 2007. 140p.:il. ; color. ;fot. ISBN 978-85-60591-03-9 1. Energia elétrica - Paraná - História. 2. COPEL Paraná - História. 3. Eletrificação - Paraná. 4. Romagnole - Paraná - História. CDD 21.ed.

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Em pouco mais de um século o Paraná saiu da luminosidade incipiente dos lampiões públicos, que precisavam ser acesos e apagados todos os dias pelos chamados “vagalumes”, para tornar-se um dos maiores produtores brasileiros de energia elétrica. Apesar dessa trajetória, o processo de expansão da eletricidade pelo interior foi bastante lento, a ponto de, em plena década de 50, uma cidade importante como Maringá, servida por obsoleto equipamento de geração eletro-diesel, ainda ficar praticamente às escuras, a exemplo o que ocorria na maior parte dos municípios do Norte e Noroeste do Estado. O livro “Clareira Flamejante”, que tem o respaldo da empresa Romagnole, propõe-se a contar essa história, resgatando os passos do desenvolvimento da energia elétrica no Paraná e os acontecimentos – dramáticos, por sinal – vividos por regiões que, mesmo em meio a um surto de desenvolvimento tão veloz, não tinham como eferecer esse recurso à sua gente. Surgida em 1954, a Copel começou a operar, dois anos depois, justamente em Maringá e outras cidades da região, conseguindo, com dificuldades, superar os desafios. O livro é uma obra importante sob o ponto de vista histórico e documental. Parabéns a todos que se encontram envolvidos nesse projeto. RUBENS GHILARDI Diretor-Presidente da Copel

Mais que um rico conteúdo sob o ponto de vista histórico sobre os avanços da energia elétrica no Paraná, “Clareira Flamejante” é, acima de tudo, uma demonstração de zelo, respeito e comprometimento da Romagnole para com a história. Tal obra, que merece ser lida com atenção, constitui também um exemplo a ser seguido pelas demais indústrias paranaenses. Através de instrumentos como a Lei Rouanet de Incentivo à Cultura, do Ministério da Cultura, é possível desenvolver projetos brilhantes como este, que preservam a memória de um povo. RODRIGO ROCHA LOURES Presidente do Sistema FIEP (Federação das Indústrias do Estado do PR)

É sempre muito interessante poder falar e, ao mesmo tempo, aprender através dos livros. Neste sentido, “Clareira Flamejante” se soma, certamente, às iniciativas bem-sucedidas no campo da história e da literatura paranaenses, mostrando os avanços da energia elétrica, bem como os detalhes de seu advento na região Norte do Estado. Meus cumprimentos à empresa Romagnole, ela própria resultado da visão e do trabalho de seus empreendedores, por oferecer-nos uma obra tão valiosa. PAULO CRUZ PIMENTEL Ex-governador do Paraná e ex-presidente da Copel

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Sumário Introdução

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- Fantásticas mudanças

Parte 1

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- A colonização

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- Os “pés vermeios”

36

- Os italianos e o café

44

- Terra dividida

Parte 2

62

- Rápido crescimento populacional

72 - O governo cria a Copel 88

- A família segue em frente

90 - A Copel se estrutura em Maringá Parte 3

100 - Artefatos de concreto 102 - O Paraná moderniza sua economia 106 - Tudo era feito no braço 110 - Trabalhando como nunca 114 - Governo Federal estabelece diretrizes 120 - Prestígio 126 - Começa a privatização... 134 - Paraná aproveita quase todo seu potencial hidrelétrico 136 - Final 138 - Referências

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Prefácio

A

A luz, segundo o ensinamento bíblico, foi obra realizada no primeiro dia da criação divina. O Criador, ao separar a luz da treva, chamou a primeira de dia e a segunda de noite. Embora tenha um significado mais amplo, a citada imagem da luz remete, obviamente, ao sol. Espontaneamente, os homens primitivos beneficiavam-se com o calor e a luminosidade do sol. Não sabiam, porém, como canalizá-lo. O fogo foi a primeira fonte natural de energia dominada pelo homem.[1] O impacto foi tão grande que a cultura grega nos legou o mito de Prometeu, o titã que tomou o fogo dos deuses e o entregou aos homens. Prometeu foi castigado pela ousadia, mas os homens souberam usar o benefício recebido. “Fonte de todas as artes”, o fogo iluminava, aquecia, servia para forjar equipamentos de trabalho, objetos diversos e armas. Na contemporaneidade, o domínio da energia elétrica desempenhou um papel equivalente no imaginário da humanidade, tal foi a revolução que propiciou na tecnologia e no cotidiano da população. A energia elétrica tornou-se, acima de tudo, sinônimo de progresso. No Brasil, sabe-se que o uso da energia elétrica data dos tempos de D. Pedro II, no último quartel do século XIX. No Paraná, chegou em 1890. Sua expansão para o interior foi lenta, embora muito desejada. E em Maringá, como ocorreu essa história? A pioneira Winifred Ethel Netto, que chegou a Maringá no final de 1947, relata que sua família contou com luz elétrica desde o início. Mas era uma exceção. Prevenidos, ela e seu marido, Odwaldo Bueno Netto, trouxeram um gerador, fios e lâmpadas.[2] O fato de destacar que não viveram tal privação decorre da percepção de que não era essa a situação geral, detalhada em abundantes registros. Ao se mudar para Maringá, a pioneira Marianna Tait acusou: “não tinha luz, era lamparina, só vi o pessoal tirando água”.[3] Na obra do escritor J. F. Duque Estrada, há cenas reveladoras daquele final dos anos 1940. No romance Isto é você, Maria, descreve o ambiente do Hotel Bom Descanso: “a arrumação dos móveis, as cortinas com longos babados, toalhas e lençóis muito limpos e um artístico lampião a querosene colocado sobre o camiseiro”.[4] Menos prosaicas são as passagens do livro Terra crua, que tece cenas com enormes toras de perobas semi-queimadas e com ruas e praças sem iluminação. As noites, que nada tinham de atraentes, tornavam obrigatório o uso de lanterna, medida de segurança para quem se aventurasse pelas ruas escuras e desertas.[5] No início dos anos 1950, Maringá era a cidade mais iluminada de toda a região, conforme a memória do advogado Edmundo Canto. Só que a claridade vinha dos troncos queimados, que “ardiam em brasa durante dias e noites seguidas”. Daí a iluminação noturna.[6] Entre os migrantes que constituíram a população de nossa cidade, muitos vinham de zonas rurais, mas não era desprezível o contingente, oriundo de centros urbanos mais antigos, habituado ao uso da energia elétrica. Não espanta que essa fosse uma 10


das carências mais acusadas por aqueles que adotavam Maringá para viver. Na escala de prioridades, estava entre as primeiras. Por isso mesmo, era pauta inadiável a ser enfrentada pelos primeiros dirigentes públicos do município, eleitos em 1952. Aliás, no último comício da campanha de Inocente Villanova Jr., que se tornaria o primeiro prefeito de Maringá, a carência desse serviço gerou um saboroso episódio político. Quando ele se preparava para discursar, “sabotaram a luz, cortando os fios que a levavam ao palanque”. O candidato não deixou barato. Manteve o discurso e bradou que “a escuridão significava a mentalidade dos seus adversários”.[7] Testemunhos da época sugerem, entretanto, que foi uma artimanha de sua coordenação de campanha. Simulando preocupação, um dirigente de seu partido teria dito aos adversários da UDN: “se acabar a luz na hora do discurso do Villanova, será um desastre”. A isca teria sido mordida pelos udenistas.[8] Qualquer que seja a origem da idéia, o fato é que os cabos da bateria foram desligados e o discurso de Villanova, extraindo dividendos políticos da situação, foi concluído com uma promessa: “eu lhes garanto: se eleito, vou instalar a energia elétrica em Maringá”. Mal tomou posse, Inocente Villanova Jr. começou a enfrentar o problema. Na primeira sessão da Câmara Municipal, um vereador da base de apoio do prefeito informou a seus pares quais eram as providências que o Executivo vinha adotando a respeito da questão da eletricidade. No relatório de gestão de Inocente Villanova Jr., lê-se: “instalação de quatro motores para o fornecimento de energia elétrica”.[9] A solução definitiva, evidentemente, ocorreu em processo. Por muito tempo, a cidade, mesmo com a expansão dos serviços de energia elétrica, conviveu com a presença de lamparinas e lampiões, especialmente nas regiões de população de baixa renda. Em um período em que a fronteira entre o campo e a cidade não era tão rígida, as pessoas costumavam se referir a essa novidade de seu cotidiano com um vocabulário repleto de permanências do universo rural. Assim, uma lâmpada de 100 watts era referida como uma “lâmpada de 100 velas”. Solução original e criativa. Em Clareira Flamejante, o jornalista e escritor Rogério Recco faz um relato rico e denso dessa epopéia, tendo como foco a história de Maringá e região. Sua narrativa abarca tanto o período em que o clarão vinha dos troncos que ardiam em brasa, imagem traduzida no próprio título do livro, quanto o processo de implantação dos serviços de energia elétrica. Seu trabalho tem o mérito inicial de propor um tema que, em um primeiro contato, poderia até parecer técnico e desinteressante. Basta, porém, que se leia cada página para verificar quanto o tema é fascinante. Afinal, a relação de homens e mulheres com o controle e o uso de energias, independentemente da época e dos padrões tecnológicos vigentes, diz respeito a tudo que envolve a sua vida. Atento às múltiplas dimensões do fenômeno, Rogério Recco acerta ao analisar a repercussão da questão da energia elétrica, seja pela presença ou pela ausência, no cotidiano da população, onde a relação se torna concreta. Traz à tona, com isso, 11


aqueles elementos mágicos do universo da memória, impregnado de emoções as mais diversas. Mais do que tornar a leitura agradável, isso imprime mais densidade à história narrada. Afinal, não é propriamente de energia elétrica que se quer falar, mas da vida de mulheres e homens e de sua experiência na edificação de sua cidade. Nos últimos anos, a bibliografia sobre a história de Maringá e região ampliou-se muito. O livro Clareira Flamejante não é apenas mais um título que se soma a tantos outros. Baseado em uma pesquisa extensa, apresenta uma contribuição singular, vertida em um texto sóbrio e acessível, sobre um tema pouco explorado entre nós. Diverte, informa e faz refletir. Merece ser lido, divulgado e debatido. Até mesmo para salientar a atualidade do tema do livro, não posso deixar de observar como, apesar de vivermos uma época em que os debates concentram-se na utilização sustentável de múltiplas formas de energia, o imaginário popular ainda é preenchido pela energia elétrica. Seu apelo pode ser medido pelo alcance social dos programas “Luz para Todos” e “Luz Fraterna”, implementados, recentemente, pelos governos federal e estadual. Esses programas pautam tanto a expansão dos serviços quanto a oferta gratuita à população de baixa renda. Na sensibilidade e no linguajar de nossa época, trata-se de promover a inclusão social. Em contrapartida, o vocabulário da grande política recebeu a incorporação de um termo curioso: “apagão”. Originalmente empregado para definir a falta de provisionamento e de fornecimento de energia elétrica, virou sinônimo de crise na prestação de qualquer serviço público. Há quem não goste do curioso vocábulo e de seus usos. Não se pode negar, contudo, que ele tem a enorme vantagem de ser fácil de entender. Apagar a luz, afinal, é voltar às trevas, sejam elas literais ou metafóricas. Desde as mais remotas épocas, o que a humanidade quer mesmo é poder dizer, fazendo eco ao que se lê na Bíblia a respeito do primeiro dia da criação, “haja luz”. Reginaldo Benedito Dias Professor do Dep. de História da UEM [1] Cf. MELLO, Lilia, N.C. Luz e força movimentando a história. Rio de Janeiro: Centro de Memória da eletricidade no Brasil, 2003. [2] Cf. NETTO, Winifred Ethell. Quando o amor transpõe o oceano: uma história de coragem. São Paulo: Cultural, 2005. [3]TAIT, Tania. As excluídas da história: o olhar feminino sobre a história de Maringá. In DIAS, Reginaldo B. & GONÇALVES, J. H. R (orgs). Maringá e o norte do Paraná: estudos de história regional. Maringá: Eduem, 1999, p. 358. [4]DUQUE ESTRADA, J. F. Isto é você, Maria. Curitiba: Artes gráficas, Maringá, 1974, p. 13. [5] DUQUE ESTRADA, J. F. Terra crua. Curitiba, 1961. [6] SERRA, E. Cocamar: sua história, sua gente. Maringá: Cocamar, 1989, p. 18. [7] DUQUE ESTRADA, J. F. Terra Crua. Curitiba, 1961, p. 70. [8] Conforme anotações do professor Antonio Augusto de Assis, o petebista Álvaro Fernandes reivindicava a autoria do plano e afirmava ter “soprado” a idéia para Malachias de Abreu (UDN). Houve quem atribuísse a Fernandes a própria execução do ato. [9] REIS, O. Maringá e seus prefeitos. Maringá: Clichetec, 1996, p. 33.

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“As noites eram tenebrosas. Vultos silenciosos se moviam no escuro. Alguns se moviam como sombras e outros levando uma lanterna e lampião numa das mãos e, na outra, uma arma. Lendas eram criadas e o medo se tornava contagiante.” (Jacus & Picaretas, Ildeu Manso Vieira, página 145)

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Introdução

Fantásticas mudanças

A

eletricidade faz parte da natureza e se manifesta de diferentes maneiras. Entre as mais visíveis, as descargas elétricas que faíscam os céus quando de tempestades. Pois foi somente no século XIX que a civilização humana conseguiu colocá-la a seu serviço.

As aplicações de energia elétrica vinham sendo desenvolvidas na Europa desde a Revolução Industrial. Na segunda metade dos anos de 1850, após séculos de uso da lenha, das velas de cera, das lamparinas que queimavam óleo de baleia e da iluminação a gás inaugurada pelo Barão de Mauá, essa evolução chegava ao Brasil. De acordo com Lourenço Lustosa Froes da Silva, em seu “Iluminação pública no Brasil, aspectos energéticos e institucionais”, Dom Pedro II havia visitado a Exposição de Filadélfia em 1876 e voltara encantado com a energia elétrica. Autorizou então que Thomas Edison introduzisse suas invenções no País e, em 1879, era inaugurada a iluminação elétrica da estação central da Estrada de Ferro D. Pedro II (depois Central do Brasil), no Rio de Janeiro, constituída por apenas 6 lâmpadas “Jablockhov” acionadas a partir da energia elétrica gerada por dois dínamos. Em 1887, Porto Alegre inaugurava um serviço municipal de iluminação pública o primeiro do País - aproveitando a energia gerada em uma usina da Companhia Fiat 14


Lux. No Rio de Janeiro, criava-se a Companhia de Força e Luz, responsável por mais de 100 lâmpadas. Ao mesmo tempo, os serviços viabilizados pela energia elétrica se estendiam à forma motriz, principalmente no setor têxtil. Embora as primeiras experiências tivessem acontecido no Rio de Janeiro, anteriormente outras cidades já haviam experimentado o melhoramento, ainda que precariamente. A primeira, em 1883, foi Campos dos Goytacazes-RJ. A seguir vieram outras: Rio Claro-SP, Juiz de Fora-MG, Piracicaba-SP, São Carlos do PinhalSP, Ribeirão Preto-SP, São João Del Rei-MG, Belo Horizonte-MG, Petrópolis-RJ, Manaus-AM e Belém-PA. A primeira usina considerada de porte para “força e luz”, expressão corrente para denominar os serviços de força motriz e iluminação, foi a hidrelétrica de Marmelos, erguida pelo industrial Bernardo Mascarenhas, considerada o marco zero da história da energia elétrica no Brasil e na América Latina, construída em 1889 às margens do Rio Paraibuna, em Juiz de Fora-MG. Com isso, um dos primeiros serviços produzidos a partir da energia elétrica foi a iluminação pública. Até 1900, as pequenas usinas instaladas somavam apenas 12 MW de capacidade, eminentemente técnica. Com a chegada do Grupo Light (do Canadá) o potencial hidrelétrico do País começaria a ser explorado de forma mais intensa. Em 1889, a Light iniciava a operação de suas primeiras linhas de bondes elétricos na capital paulista, produzindo energia numa pequena central a vapor.

No Brasil, o êxito na difusão da eletricidade somente viria ocorrer no período republicano, pois até então era utilizada iluminação a gás.

Rio de Janeiro, meados do século XIX, foto de Marc Ferrez (www.memoriaviva.com.br).

A capital do País realizou as primeiras experiências com iluminação pública

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Acima, a aquarela de Jean Baptista Debret, de 1820, mostra escravos manipulando um lampião à azeite de peixe; abaixo, lampadário público instalado na esquina das ruas Alfândega e Regente Feijó

(www.memoriaviva.com.br)

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A cidade do Rio de Janeiro, ainda em meados do século XVI e até o início do século XVII, era dotada de fraca iluminação noturna, percebida somente através das janelas, vindas de candeeiros, lamparinas e velas voltadas para o interior das construções. Nas vias públicas, a única iluminação que se tinha era de cunho religioso, nos oratórios. Os hábitos dos habitantes eram, portanto, diurnos. A primeira lanterna permanente acesa no Rio de Janeiro foi a que o Convento de Santo Agostinho, no Largo da Carioca, ergueu em sua portaria em 1710. No início do século XVIII, quando a população da cidade era de 12 mil habitantes, as lanternas começaram a suprir a iluminação externa, nos prédios públicos e em algumas residências, sendo fixadas nas ombreiras das portas. Entre 1779 e 1790 já havia 73 lampadários instalados, custeados por particulares, em oratórios da cidade, conforme cita Ruy Maurício de Lima e Silva, em “Rio de Janeiro em seus 400 anos”. “Em 1763, quando o Rio de Janeiro passou a ser capital do Brasil, a cidade era iluminada apenas e muito precariamente, por meio de lampiões e candeeiros alimentados a óleo de peixe. A iluminação pública era assim precaríssima em ruas estreitas e não calçadas, o que fazia o povo recolher-se cedo, fechar as portas e evitar saídas noturnas”. Foram instalados pelo governo em 1794 os lampiões e candeeiros de azeite, fixados em postes nas ruas da cidade, custeados pelo poder público e por particulares. As casas eram iluminadas por meio de pequenos cilindros coloridos de vidro, enchidos com cera com um pavio no centro. A Família Real se transfere para o Brasil em 1808 e D. João VI institui a Intendência Nacional de Polícia para cuidar da segurança e do policiamento. A Intendência de Polícia providenciaria a instalação de iluminação em diversas ruas da cidade para evitar a escuridão, tida como propícia à proliferação de marginais. Foram colocados, a cada 100 passos de distância, lampiões sobre colunas de pedra e cal no trajeto do coche de D. João em direção à Quinta da Boa Vista. Essa estrada ficaria conhecida como Caminho das Lanternas e, posteriormente, Caminho do Aterrado, por avançar sobre alagadiços então existentes. Na Europa, a partir de 1784, o engenheiro escocês William Murdock (1754-1839) iniciou estudos para utilizar o gás advindo da gaseificação do


As primeiras experiências com eletricidade 1800 – Criação da bateria pelo físico italiano Alessandro Volta. 1831 – Desenvolvimento de transformação da energia mecânica em energia elétrica pelo pesquisador inglês Michel Faraday e o norte-americano Joseph Henry. 1867 – O alemão Werner von Siemens concebe o dínamo e sua aplicação industrial. 1879 – A lâmpada elétrica é inventada pelo norte-americano Thomas Alva Edison (foto) 1888 – Nikola Tesla, croata, desenvolve a corrente alternada, o que leva à instalação de sistemas de iluminação em larga escala. 1900 – O uso do alternador e do transformador possibilita o transporte de energia a longa distância.

A viabilização da eletricidade foi progressiva e comercial. Primeiro nas comunicações, depois na metalurgia, na indústria química leve e finalmente na iluminação

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Os “vagalumes”, profissionais responsáveis por acender e apagar os lampiões das cidades, foram fundamentais até 1930, quando a eletricidade ainda era artigo raro e, no lugar de lâmpadas, os postes usavam gás. Ao lado, a Rua do Ouvidor no dia 18 de fevereiro de 1911, quando da inauguração do sistema de iluminação elétrica

(www.memoriaviva.com.br)

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carvão como fonte de iluminação. Em 1802, no Soho, em Londres, seria feita a primeira experiência pública de queima desse gás, por meio de dois abajures. Já em 1819, Londres contava com 288 milhas de dutos de distribuição de gás para prover 51 mil queimadores destinados a iluminar ruas. Irineu Evangelista de Souza, Barão de Mauá, conseguiu finalmente em 1850 apresentar ao Ministério da Justiça uma proposta viável para iluminar a cidade com “gás hidrogênio carbonado”, garantindo-lhe o monopólio da exploração da atividade por 25 anos. Em 1854, o Barão inaugura a iluminação a gás, alimentada por uma rede de 20 quilômetros de dutos de ferro. Cada combustor fornecia iluminação equivalente a seis velas de cera. A iluminação a gás era um sucesso. Em 1857 foram instalados 3.027 combustores e a área central da cidade viria a ser rapidamente atendida. Porém, após a descoberta do petróleo nos EUA, em 1859, o uso do querosene, com chama mais intensa e menos fuligem, começou a ganhar espaço. O lampião passou então a ser a opção para as populações rurais e mais carentes. O gás teve seu apogeu no Rio de Janeiro em 1912, com o registro de 22.440 combustores de iluminação pública, mas em 1913, começou a ser substituído pela eletricidade. A lâmpada incandescente, desde a sua invenção, em 1879, passaria por uma série de aperfeiçoamentos que a tornaria tecnologia quase absoluta para iluminação durante a primeira metade do século XX. Por volta de 1930, foram desligados os últimos lampiões a gás no Rio de Janeiro. Nesta mesma época a cidade recebeu o título de “Cidade-luz sul-americana”, sendo reconhecida como uma das mais iluminadas do mundo e comparável, inclusive, com Paris.


O Paraná passou a contar com energia elétrica praticamente na mesma época que o Rio Grande do Sul, Estado onde o século XIX foi marcado pela Revolução Farroupilha e também, mais ao seu final, pela Guerra do Paraguai. A capital gaúcha era a cidade mais próxima do teatro de operações. De 1889 a 1940, as administrações republicanas promoveram um surto de desenvolvimento em Porto Alegre, instalando eletricidade, rede de esgotos, transporte elétrico, água encanada, as primeiras faculdades, enfim. Em Santa Catarina, algumas cidades saíram na frente em matéria de energia elétrica. Na primeira década do século, Blumenau já dispunha de um rudimentar sistema de iluminação pública. A Usina Hidrelétrica Salto Wissbach, construída em 1916, significou um avanço em relação aos modestos geradores, além de impulsionar a industrialização em todo o Médio Vale do Itajaí. Joinville serviu-se da Usina Hdirelétrica Piraí a partir de 1908 e, em 1913, foi a vez da São Lourenço, em Mafra. Para atender a capital, o governador Gustavo Richard determinou a construção da Usina Hidrelétrica Maroim, em São José. A cidade reafirmou sua vocação como prestadora de serviços, em especial depois da chegada da iluminação pública e da inauguração da Ponte Hercílio Luz, em 1926. No Paraná, desde a criação da Província, em 1853, já havia registro da existência de iluminação, com base na combustão a óleo de peixe e em condições precárias, conforme expôs o presidente da Província, Zacarias de Goes e Vasconcelos: (...) Apenas em Paranaguá accendem-se quatro ou pouco mais lampeões na cadeia e na alfandega, e nesta cidade dous junto à residencia do governo. A preferência pelo uso do lampião a querosene se dá em 1863, em detrimento do similar a óleo, devido à comodidade e também o custo. A responsabilidade pela iluminação pública era das municipalidades, através de suas Câmaras Municipais, mas na década de 1870 a iniciativa privada começava a atuar na execução dos serviços. Em 1880, o presidente da Província, Sancho de Barros Pimentel, determinou que o Thesouro Provincial abrisse concorrência para que fosse implantada iluminação a gás carbônico, assim, a primeira lâmpada elétrica de Curitiba seria instalada no Passeio Público, em 1886. A iniciativa pioneira para a iluminação de Curitiba ocorreu no dia 9 de setembro de 1890, após celebrado contrato entre a Intendência Municipal e a Companhia de Água e Luz do Estado de São Paulo. Buscava-se um melhor serviço de fornecimento, o que, entretanto, não viria a acontecer tão logo. Dona de uma concessão de 20 anos, a Companhia investiu na construção da Usina Termelétrica de Capanema, a primeira do Estado, que ficava em um terreno localizado atrás do então Congresso Estadual, hoje a Câmara Municipal de Curitiba. Sob a direção do engenheiro Leopoldo Starck, seu construtor, a usina entrou em funcionamento no dia 12 de outubro de 1892, utilizando duas unidades a vapor. Ambas produziam 4.270 HP de força, devorando 200 metros cúbicos de lenha por dia.

O presidente da Província, Sancho de Barros Pimentel

O Passeio Público, inaugurado em 1886, recebeu a primeira lâmpada elétrica da cidade

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A usina termelétrica de Curitiba começou a funcionar em 1901 no local onde hoje é a estação rodoferroviária

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Em 18 de março de 1898, José Hauer consegue a concessão dos serviços de iluminação da capital, que contava, então, com cerca de 40 mil habitantes. Sua empresa, José Hauer & Filhos, adquire a Usina de Capanema. As melhorias quanto à qualidade dos serviços foram, contudo, muito poucas. Se a iluminação era privilégio de poucos, contar com energia em casa ou no estabelecimento comercial ainda não passava de um sonho. Data de 1901 a instalação da segunda usina termelétrica, em um terreno na Avenida Capanema, onde hoje está a Estação Rodoferroviária. Operando inicialmente com dois conjuntos geradores de 200 HP cada um, poucos anos depois a usina seria ampliada com outro gerador de idêntica capacidade. Em 1903, o governo do Estado assume a administração do serviço de iluminação pública e particular. No ano seguinte o contrato de concessão passou para a Empresa de Eletricidade de Curitiba (Hauer Júnior & Companhia). Desse modo, o desenvolvimento da indústria de eletricidade foi possibilitando acesso à iluminação, ao aquecimento, à utilização de pequenos motores, transformando hábitos domiciliares, gerando novas necessidades e se tornando um serviço imprescindível. O jornal A República, em sua edição de 14 de agosto de 1907, relata o advento da energia elétrica na cidade, sob o título “A electricidade e suas vantagens”.


(...) As preeminentes qualidades da energia electrica, deram-lhe em pouco tempo ingresso nas maiores e menores cidades e aldeas de todos os paizes civilizados e em todos os ramos da industria, influindo sobre esta proveitosamente e transformando-a, de modo que hoje, a existencia de uma communidade sem a força electrica é quasi impossivel. Imprescindivel o seu uso na electro-chimica e medicina, terreno em que ela presta inestimaveis serviços, emprega-se a energia electrica a grandes distancias; varios motores, em differentes pontos dos edificios, podem ser installados para as grandes emprezas, com o fim de moverem machinas separadas e em grupos, tornando-se desse modo inuteis as dispendiosas e perigosas correias e polias de transmissões, que adquirem tanta força (...) Não levando em consideração estas commodidades, tambem seria abandonado por completo, o enfadonho e perigoso combustivel: a lenha ou o carvão, que muitas vezes enche de fumo a cosinha, como também os fuliginosos trastes da mesma, o fogão e accessorios. Em lugar destes encontrar-se-ha, elegantes aparelhos que, sem o necessario carvão ou lenha trabalham sem cheiro e fumaça e que previnem, pela simplicidade e commodidade de sua regulação, qualquer transbordamento da comida quando estiver fervendo; de modo que a cosinha, pode sempre, com pouco esforço e trabalho, ser conservada agradavel e limpa. A commoda regulação da corrente electrica, lhe dá tambem as qualidades necessarias para aquecer ferros de engommar, que podem ser conservados em qualquer temperatura desejada, evitando-se assim o queimar da fazenda e roupa, ou o desenvolvimento de fumaça (...)

Sistema elétrico de bonde, Curitiba 21


Primórdios da manutenção de rede em Curitiba, durante 1912

Em 1912, a iluminação pública de Curitiba passaria para a responsabilidade da The South Brazilian Raiway Co. Ltd. A South, como era chamada, já naquele ano abriu matrículas para a Escola Prática de Mecânica e Eletricidade, destinada a formar eletricistas, profissão até então desconhecida na capital. O uso da eletricidade na indústria também significou um avanço ao permitir o uso de motores de diferentes capacidades dentro de uma mesma fábrica, o que não era possível com a utilização do vapor. Com isso, foi dado um passo decisivo em direção à mecanização generalizada da indústria e, em muitos casos, à produção em série nas grandes fábricas, conforme revela o livro “Um Século de Eletricidade no Paraná”, produzido por historiadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR) em convênio com a Copel, publicado quando dos 40 anos da empresa, em 1996. Somente uma década após a chegada da eletricidade em Curitiba é que uma segunda cidade do Estado, Paranaguá, contaria com esse recurso. A família Blitzkow pôs em funcionamento, no ano de 1902, um sistema de geração com dois grupos a vapor de 65 kVA. Dois anos mais tarde, Ponta Grossa contaria com energia elétrica, seguida de União da Vitória. As primeiras usinas geradoras de eletricidade do Paraná eram movidas a vapor. Só em 1910 seria inaugurada a Usina de Serra da Prata, perto de Paranaguá, a primeira hidrelétrica do Estado, com potência de 400 kVA.


Àquelas localidades pioneiras seguiram-se Campo Largo, Prudentópolis, Castro, Guarapuava, Piraí do Sul e Campo do Tenente, todas em 1911. Em 1912, Ponta Grossa mostrava-se em estágio adiantado quando comparada a outros municípios. Um texto publicado no dia 27 de junho daquele ano no jornal “O Progresso”, com o título “Electricidade e vida moderna”, dá idéia desse melhoramento: (...) Em Ponta Grossa, pode haver relativo conforto nas habitações até dos pobres. Em algumas casas de família o ferro de engommar a carvão foi substituído pelo electrico, nickelado, limpo e aquecido em 5 minutos. A chaleira da cosinha encrustada de fuligem negra foi substituída pela caçarola brilhante e limpa que pode ser transportada da cosinha para a sala de jantar onde qualquer pessoa da casa (o criado hoje é coisa rara) aquecerá o seu chá, leite ou café, a qualquer hora do dia ou da noite, em alguns minutos após a ligação da corrente. Na estação hibernal não será mais necessario o tradicional caqueiro ou fogareiro de brasa tão nocivo a saude, pois temos a estufa portatil com a sua luz fosca e isenta de exhalações podendo se usa-la mesmo no quarto de dormir. A grelha em que se preparavam as torradas deu logar ao aquecedor nickelado, às mesas de chá e sobre este mesmo apparelho aquecem-se ou fritam-se os ovos. Daqui há pouco até mesmo os fogões a lenha ou carvão desaparecerão a vista das enormes vantagens dos electricos, vantagens de economia, de asseio e de promptidão. As donas de casa poderão accionar as machinas de costura, as batedeiras de manteiga, o pequeno moinho de café, e poderão prover muitas outras necessidades domesticas. Nessa época, outras cidades paranaenses passariam a contar com eletricidade. Por ordem cronológica: Palmeira, Irati, Ipiranga, São Mateus do Sul, Jaguariaíva, Senges, Tibagi, Araucária, Cambará, Rio Azul, Andirá, Itambaracá, Santo Antonio da Platina, Antonina, Guarapuava, Rio Negro, Lapa e Siqueira Campos, estas últimas já no final da década de 20. Durante a Primeira Guerra Mundial, houve grande crise de abastecimento de energia elétrica no País. Em Curitiba, as reclamações contra a atuação da empresa responsável pela eletrificação, a The South, mostravam que a população estava descontente com os serviços. O surto do progresso industrial foi acelerado logo após a Guerra, dadas as dificuldades de importação de produtos industriais durante os quatro anos de conflito. No Paraná, em 1920, já havia 20 unidades instaladas de energia elétrica, com potência de 6.715 kW, gerada por termeletricidade e hidreletricidade. Algumas indústrias começaram a instalar geradoras para consumo próprio. A primeira delas, a Indústrias Reunidas F. Matarazzo, em 1921, para movimentar um moinho de trigo junto ao porto de Antonina e, em 1925, para fazer funcionar um frigorífico e uma indústria têxtil em Jaguariaíva. A Indústrias Brasileiras de Papéis, em Arapoti, trabalharia com eletricidade em 1926. Em 1927, o governador Caetano Munhoz da Rocha deixou registrada a insatisfação dos consumidores curitibanos com o péssimo atendimento da South. Naquele mesmo ano, o serviço de iluminação pública da capital seria transferido

A cidade de Ponta Grossa do começo do século XX: adiantada para a época (Coleção Adolfo Frioli)

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às Emprezas Electricas Brasileiras S.A., que por sua vez organizaram a Companhia Força e Luz do Paraná (CFLP), subsidiária do grupo norte-americano AMFORP, passando a atuar na capital e cidades próximas. Nessa época, a região da capital contava com 2.590 kVA de capacidade geradora e 7.543 unidades consumidoras. Nos anos seguintes, a queixa dos consumidores seria com o excessivo custo do serviço, o que chegou a gerar um boicote ao consumo em 1932. A energia elétrica ia chegando, assim, a um número cada vez maior de consumidores. Até poucas décadas, as cidades estavam completamente às escuras e não se fazia idéia das grandes mudanças pelas quais passariam. Aos poucos, o uso doméstico da energia elétrica popularizava-se, ao mesmo tempo em que isso ia modificando o hábito das famílias. Os partidários da revolução de 1930, que levou Getúlio Vargas à presidência da República, dominaram com facilidade o Paraná. O Estado ficou até 1935 sob intervenção federal, ano em que realizaram-se eleições. Mas em 1937, Vargas deu um golpe de Estado, iniciando um período de oito anos de ditadura. Durante toda essa época, destacou-se no Paraná a figura de Manoel Ribas, que dirigiu o Estado de 1932 até 1935, como interventor, de 1935 até 1937, como governador eleito, e de 1937 até 1945, novamente como interventor. Ao longo de sua administração houve alguns avanços na eletrificação, sobretudo no interior, embora a queixa com a qualidade dos serviços fosse constante. No entanto, a má qualidade dos serviços podia resultar, também, em atritos com as empresas. Em 1933, a população de Tomazina revoltou-se com a precariedade da estrutura mantida pela companhia responsável pelo fornecimento de energia na cidade, a Norte do Paraná Ltda, que usava máquinas obsoletas e postes de madeira (chamados de palitinhos de fósforo). Um relatório sobre isso seria apresentado pelo prefeito Avelino A. Vieira ao interventor Manoel Ribas, em 1941. Os serviços de luz e força ficaram interrompidos por vários anos, sem que se conseguisse chegar a um acordo. 24


A solução foi a transferência da concessão para a Cia. Sul Paulista, que passou a fornecer luz a Tomazina e demais distritos. Com a instituição do Código de Águas em 10 de julho de 1934, considerado um divisor na história da energia elétrica nacional, foi decretado o início da estatização do setor. Diante dos protestos das empresas estrangeiras, que limitavam as margens de lucro em 10%, só em 1938 o Supremo Tribunal Federal proferiu sentença definitiva em favor da constitucionalidade do Código. Com a eclosão da Segunda Guerra Mundial, seria interrompida a importação de material elétrico, do qual o País era dependente. Ao final, os Estados Unidos proibiram terminantemente a venda e a fabricação desses equipamentos, a não ser para uso estritamente militar. Nessas circunstâncias, houve a estagnação do setor durante o período, o que pressionou as margens de lucros e criou animosidade entre as companhias e os consumidores devido aos inevitáveis problemas com a insuficiência do fornecimento de luz. O final da Guerra (1945) coincidiu, inclusive, com o recrudescimento dessas dificuldades, havendo escassez e racionamentos de energia. Mas, em paralelo a todo esse fascinante choque de modernidade, o Paraná presenciaria uma odisséia em que a energia elétrica seria, forçosamente, relegada a um plano secundário. O veloz processo de colonização do Norte do Estado, que fez brotar um manancial de oportunidades de enriquecimento aos que se dispusessem a enfrentar condições absolutamente rudes e quase primitivas de sobrevivência no sertão, fez com que um outro tipo de civilização fosse forjada. Como que num túnel do tempo, milhares de famílias deixavam para trás países de vários continentes e suas cidades iluminadas para tentar a sorte na selva e viver quase como silvícolas. Despidos de conforto, lançavam-se a uma aventura admirável, habitando inicialmente toscos ranchinhos erguidos em meio ao sertão hostil, cultivando o próprio alimento, oferecendo aos filhos apenas a perspectiva de uma vida melhor, como veremos adiante. 25


Registros O que ficou para a história

LEÃO JÚNIOR Na véspera do Natal de 1900, Agostinho Ermelino de Leão Júnior - que em maio de 1901 fundaria a empresa Leão Júnior - estava em viagem à Argentina, comercializando mate. Durante visita à cidade de Córdoba, mostrou-se impressionado com o desenvolvimento da mesma e, especialmente, a iluminação pública. Em carta endereçada à esposa Maria Clara de Abreu Leão, ele assim escreveu: “Aqui chegamos ontem as 2 e meia da tarde, tendo embarcado anteontem em Buenos Aires. Foram 18 h de estrada de ferro!!! Os carros dormitórios são bons porem jogam extraordinariamente quase como os vapores. Córdova é maior que Curitiba, em todos os sentidos. É iluminada a luz eléctrica, gaz incandescente, tendo também o acetileno... Já percorri os armazeneiros e terça-feira seguirei para Rosário. Beijos aos filhos, saudades à todos... Do teu esposo que muito lhe quer... Sinhozinho.”

TODESCHINI Em 1878, o italiano Giuseppe Todeschini, natural da província de Verona, Itália, se casa em Curitiba com Domênica Cemin. Seis anos mais tarde, o casal adquire uma chácara na Avenida Sete de Setembro, iniciando nesse local, no ano seguinte, a atividade industrial de primeira fábrica de macarrão do Sul do Brasil, com 6 empregados. Nessa época, a escassez de energia elétrica na capital, não diminuiu o ânimo do italiano, ele próprio idealizador das máquinas para a sua indústria. Giuseppe costumava ir, pessoalmente, de casa em casa, oferecendo o macarrão, alimento ainda pouco conhecido da maior parte da população.

ARTES GRÁFICAS Em Curitiba, as artes gráficas tiveram um impulso significativo a partir de 1880. Esse período coincide, praticamente, com o advento da energia elétrica na cidade, quando os serviços de tipografia passaram a utilizar o preto mecânico. O equipamento viabilizou o lançamento de revistas, a edição de livros e a melhoria da periodicidade de jornais como o “Dezenove de Novembro” que, em 1884, passou a ter edição diária. Alguns estabelecimentos tornaram conhecidos seus trabalhos de litografia, como a Impressora Paranaense, a Litografia de Alfredo Hoffmann, a Litografia Progresso e a Sociedade Metalgráfica. 26


Parte 1


A colonização

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lanejada em meados dos anos 1920, a colonização do Norte do Paraná ocorreria nas décadas seguintes em ritmo alucinante, como poucas vezes se viu no mundo, o que fez da falta de energia elétrica um grande problema. Simon Joseph Fraser, o perspicaz Lord Lovat da Escócia

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Tudo começou quando Simon Joseph Fraser, o Lord Lovat da Escócia, tinha vindo ao Brasil para pesquisar terras apropriadas ao plantio de algodão, atendendo interesses da indústria têxtil britânica. Experiente, viajou por várias regiões do interior paulista e, seguindo a trilha do café, viu-se diante das terras vermelhas recobertas por floresta no Paraná. Adentrando ao Estado, percorreu fazendas entre os rios Paranapanema e Tibagi, onde avistou-se com cafeicultores. Bem impressionado, soube que a Estrada de ferro Sorocabana, cuja linha ia até a divisa com o Paraná, em Ourinhos, havia construído um ramal em direção ao município paranaense de Cambará, o que facilitava o escoamento da safra cafeeira para a capital paulista. Por orientação de Lovat, os ingleses adquiriram algumas propriedades para cultivar algodão e fundaram uma empresa, a Brazil Plantation Sindicate, que ficou sob o comando do escocês Arthur Thomas. Percebeu-se, logo depois, que o investimento na cotonicultura não seria promissor. No entanto, diante de tamanha área inexplorada e vislumbrando a oportunidade de desenvolver um grande projeto de colonização, os ingleses adquiriram 515 mil alqueires de terras junto ao governo do Estado e, em Londres, no ano de 1925, fundam outra empresa, a Paraná Plantation Sindicate que, no Brasil, teria o seu braço, a Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP). Como eram terras com muitos rios e ramificações de afluentes, os lotes podiam


ser divididos todos com acesso a água numa ponta e estrada na outra. Seriam, assim, finos e compridos. Os ingleses fragmentaram toda a área em pequenos lotes de modo a oferecer a oportunidade para que milhares de pessoas pudessem adquirir as terras e fazer a vida com a agricultura. O café, então um produto de grande valor econômico, serviria como uma espécie de âncora para as propriedades que iam sendo abertas. Com tudo pronto e definido, a Companhia decidiu então fazer a divulgação do projeto de colonização, utilizando-se dos principais jornais e emissoras de rádios do Brasil. Publicações importantes, como o jornal O Estado de S. Paulo, traziam anúncios nos quais se procurava chamar a atenção para a excepcional qualidade das terras vermelhas, próprias para o cultivo de café e livres de pragas como as formigas saúvas, que infestavam o desgastado solo do interior paulista. Nas mensagens de rádio, dizia-se: “visite o Norte do Paraná e mande buscar sua família”. Dessa forma, a região começou a receber gente de todo lado, o que acelerou o processo de colonização, realizando-se rapidamente a venda de lotes urbanos e rurais, o que originou fazendas e povoados que iam abrindo ou alargando clareiras na floresta. ..... Não havia tempo a perder: as frentes de trabalho eram muitas. Ao mesmo tempo em que vendia lotes de terras a todos que iam chegando (mesmo a quem não tinha dinheiro, mas comprometia-se a pagar com os lucros do café), a CTNP investia na melhoria de estradas e não demorou a iniciar a construção da linha do trem em direção à bacia do Tibagi. Contingentes de trabalhadores surgiam para executar a tarefa de pôr abaixo o sertão. Como uma onda, primeiro vinham os “foiceiros”, aniquilando toda a vegetação mais baixa com suas ferramentas sempre muito afiadas. As árvores, inúmeras delas de grande porte, ficavam para os “machadeiros”, que iam fazendo a destruição e tudo no braço. Quando uma dessas árvores vinha ao chão, várias outras, em volta, eram esmagadas.

Grupo de desbravadores no meio da floresta que recobria as terras da região; abaixo, o resultado da caça à uma pintada e detalhe de uma serraria (acervo Kurt Jakowatz)

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Arthur Thomas executou o projeto de colonização da companhia; na foto abaixo; uma idéia de como era difícil vencer as estradas do sertão

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Em seguida, outro grupo aparecia para fazer leiras, que ficavam a secar por um tempo. Depois, era a vez do fogo. Tanto fogo e fumaça se via ao mesmo tempo que parecia o fim do mundo. Labaredas chegavam às alturas, queimando por semanas as volumosas toras e toda aquela coivara. De longe se podiam ver gigantescas colunas de fumaça se juntando às nuvens. Em plena noite, o céu se mantinha avermelhado, intrigando quem, de longe, contemplasse o sertão. A impressão era de que o sol ainda estava ali, em algum lugar, pouco abaixo da linha do horizonte. A legião seguinte de mão-de-obra, contratada por muitos donos de lotes, atuava na limpeza final e no preparo das terras vermelhas, agora desnudas, bem como no plantio e na formação de lavouras de café. As estradinhas eram um formigueiro humano: famílias chegando em caminhão de mudança, automóvel, carroça, jardineira. Aquele povo todo ia se embrenhando na selva como se fosse a coisa mais natural. Elas geralmente chegavam em Ourinhos, no Estado de São Paulo, última parada antes de adentrar ao Paraná, onde eram orientadas por representantes da CTNP e viajavam prevenidas até o ponto final, Jataí (hoje o município de Jataizinho). Para facilitar o transporte do pessoal, a CTNP transformou caminhões Ford 1929 em jardineiras, colocando bancos nas carrocerias. Compradores de terras, muitos de origem estrangeira, eram dessa forma conduzidos aos povoados. No caminho, após muitas horas de cansativa jornada, os viajantes paravam para um pernoite na chamada Serra Morena, onde mais tarde surgiria a cidade de Cornélio Procópio. Descansados, seguiam em frente na manhã seguinte, varando


um picadão repleto de buracos e banhados. Os rios das Cinzas e Laranjinhas eram atravessados em pontes improvisadas e, quando chovia, o veículo invariavelmente encalhava e a maioria dos passageiros tinha que descer para empurrar. Jataí era o ponto de partida para a CTNP empreender o projeto de colonização. Para chegar lá, os pioneiros atravessavam o rio Tibagi em uma pequena balsa. A partir de então, acompanhavam os agenciadores até acampamentos abertos no meio da mata. Uma dessas áreas havia sido reservada pela Companhia para sediar a cidade de Londrina, o primeiro posto avançado do projeto inglês, que começaria a nascer no dia 21 de agosto de 1929. Dessa forma, sem outro jeito, eles decidiam se valia a pena ficar com uns lotes de terras, a serem pagos por vários anos. Em 1930, a empresa começou a ampliar o ramal da Estrada de Ferro São PauloParaná rumo à Londrina. Sob as ordens de equipes de encarregados, centenas de homens chegavam para devastar a mata, vencer barrancos, nivelar o terreno e abrir caminho para o tal progresso. “Progresso”: uma palavra que justificava toda aquela odisséia. A ferrovia era imprescindível para escoar as safras e sua existência valorizaria as terras. No ano de 1933, a CTNP abriu um patrimônio com o nome de Nova Dantzig (hoje Cambé), para abrigar imigrantes que vinham de Dantzig, Alemanha. Surgiram, também, os povoados de Rolândia e Arapongas. Em 1934, Apucarana e, 1936, Lovat (cujo nome seria mudado para Mandaguari durante a Segunda Guerra Mundial).

A construção da estrada de ferro entre Cambará e Londrina (acervo Kurt Jakowatz)

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Os “pés vermeios”

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uando os primeiros homens chegaram para desafiar o sertão do Paraná, sentiram-se insignificantes ao contemplar aquela imensidão verde.

“Ehhh, Paranazão”, saudavam alguns. “Ehhh, fim do mundo”, lamuriavam outros. Movidos pela promessa de uma nova vida, eles vinham de longe, dispostos a viver o tempo que fosse preciso nas entranhas da floresta. “Isso é pra gente maluca, que não preza a vida”, ouvia-se. Cheias de coragem, famílias sujeitavam-se a adversidades, sacrifícios e sofrimento. Mas se acostumavam logo a uma situação de despojamento, ao trabalho penoso, à sujeira, aos riscos tão evidentes de uma aventura que poderia dar em nada e, pior, abreviar-lhes a existência. Coisas mínimas não haviam e estavam elas privadas da convivência com o mundo civilizado. Quem ia para os povoados nascentes, habitava casebres miseráveis a poucos metros de ruazinhas poeirentas ou encharcadas de lama grudenta. Quando o sol se punha, quem tinha juízo recolhia-se em casa, evitando os perigos da escuridão. Para as famílias, era a hora da prosa costumeira, ao redor de uma lamparina, geralmente em companhia do fogão de lenha. Quem ia abrir uma fazenda, estava alongado no mato fechado, sem ao menos um vizinho por perto. Esse, mais do que ninguém, precisava da proteção dos céus e, por via das dúvidas, de cachorros bravos soltos pelo quintal, além de um potente “berro” sempre à mão para espantar um animal selvagem ou um intruso que se atrevesse. Picadas no mato tinham que ser rasgadas no braço, fazendo tombar grandes árvores, sob o risco de acidentes. Uma galhada, um pau solto, podia vir abaixo com a vibração das pancadas do machado. Tinha gente que morria assim. Cobras habita-

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vam aos montes aquelas matas, assim como inúmeras espécies animais, sem falar dos insetos que infernizavam o tempo todo, abrindo feridas no couro. Outros tantos também encontravam o fim onde, cheios de esperança, buscavam vida melhor. “Não sei como vim parar aqui”, choramingavam os desanimados. “Esse é um lugar de futuro”, bradavam os valentes. Maluca a aventura de viajar por aqueles caminhos, sobretudo em períodos de chuva, enfrentando lama. As estradinhas viravam lagoas que, à sombra do arvoredo, permaneciam úmidas por muito tempo, encalhando veículos e enterrando até os joelhos qualquer um que ousasse encará-las. Muita gente, por isso, preferia deixar pra lá os automóveis e seguir adiante em carroças, montado em lombo de burros ou mesmo a pé. Famílias inteiras, com rapazes, moças e até filhos pequenos, se metiam sertão adentro para tomar posse de suas terras ou cuidar das fazendas dos outros em lugares onde jamais tinham ouvido falar. Fazendo um rastro de lágrimas, traziam provisões para várias semanas, roupas, armas, utensílios de casa, ferramentas e umas poucas tralhas, além de sementes, quase sempre um casal de porcos e algumas galinhas. Era tudo o que tinham para começar a nova vida. “Como é que a gente vai viver num mato desses?”, se perguntavam. Chegando ao destino, encontravam um mínimo de clareira na mata para poder levantar um ranchinho de lona com troncos de palmito e passar a primeira noite. A comida era preparada no chão mesmo, com água recolhida em rio ou

Norte do Paraná: típica propriedade rural da época do desbravamento (acervo Kurt Jakowatz)

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Anúncio da Wilson, fabricante de enxadas, em jornais e revistas

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córrego próximo. Nos dias seguintes a família plantava feijão, milho, hortaliças e melhorava a casa, reforçando as paredes com madeira de palmito e preparando um telhado a base de cascas de árvores. Mesas, bancos e camas se faziam com tocos e paus recolhidos à volta, de onde vinha também a lenha para cozinhar. A criação era arranjada em precários viveiros e, dessa forma, a vida prosseguia. Por mais que imaginassem dominar a floresta, era a floresta que os vigiava com superioridade, a olhos atentos, botando medo. Aquela gente corajosa dava uma risada triste quando se lembrava das regalias que deixara para trás: o comércio, o povo na rua iluminada, os botecos, a missa aos domingos, a convivência com os parentes, as festas da comunidade. No mato, só se pensava em trabalhar, derrubar árvores, plantar, colher. Todo mundo parecia bicho, com unhas e mãos sempre encardidas e vestes surradas que iam sendo remendadas até não dar mais. Soavam ainda, na memória, as últimas frases ouvidas antes de partir, acompanhadas de muita risada: “Paraná é só fama, quando não é poeira é lama”. Ou então: “Vai pro Paraná, vai virar 'pé vermeio'”. “Pé vermeio”. Muitas vezes em plena labuta, quando todos se distraíam, era preciso voltar correndo para casa e espantar os macacos que entravam por qualquer fresta, causando estragos. “Sai daqui seus lazarento”. E tome bala. Os animais da floresta, abundantes, eram caçados sem piedade. Porcos-do-mato, veados, pacas, capivaras e até tatus sucumbiam diante do estrondo da espingarda. Alguns paravam nas panelas. O palmito, tão útil e em quantidade, era também um acompanhamento comum no dia-a-dia, assim como frutas e peixes. Quando caía a noite, ninguém conseguia ficar acordado por muito tempo: os “pé vermeio” estavam sempre cansados demais e não era para menos. Depois do banho na bacia, com água fervida, eles se reuniam para comer. Seria muito luxo se alguém, em casa, tivesse um pouco de cachaça para amaciar o estômago antes da bóia. A “mardita” tinha que vir de longe e era artigo disputado, só conseguido por encomenda. Não havia nada melhor que um gole pra aliviar o cansaço do dia. Já pensando no amanhã, os homens pitavam pensativos, com a brasa brilhando nos olhos. Dormiam abraçados às suas mulheres, sob mosquiteiros, a salvo dos


insetos, com as armas ao alcance dos dedos. Tantas privações e dificuldades, no entanto, não abatiam os ânimos. Os “pé vermeio” lutavam por um futuro para suas famílias. A terra era fértil. Se Deus ajudasse, fariam fortuna com o plantio de café. Era assim que pensavam. Como podiam acreditar tanto no futuro? Era tudo tão desolador. No breu da noite, o tímido brilhar das casinhas rivalizava com o cintilar dos vagalumes, sob o olhar indiferente das estrelas. “Pés vermeios”.

Café, fonte de progresso regional e sonho de riqueza

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Os italianos e o café

A

Lei 581 de 4 de setembro de 1850 definia como crime o tráfico e a entrada de escravos no Brasil, o que abria caminho para a importação de mão-de-obra branca. Como cerca de 80% da população brasileira, até então, era formada de negros, índios e mestiços, a entrada de estrangeiros seria uma forma também de “branquear” o povo.

Milão

Cagliari

Foram mantidos acordos com países europeus para a introdução de agricultores em colônias e, através do Ministério do Interior e Agricultura, fez-se o financiamento da viagem e a venda de terras para os interessados. Com isso, grandes levas de imigrantes italianos começariam a chegar ao Brasil. As lutas pela unificação da Itália e da Alemanha, marcadas pela adoção das técnicas de produção moderna, com o uso de máquinas, desempregaram um grande número de trabalhadores. Isso estimulou a fuga da população em busca Veneza de melhores condições de vida. De forma geral, foram pequenos proprietários, ou meeiros, pobres e casados, que saíram em busca de terras e de um futuro Florença melhor para suas famílias. Os italianos começaram a chegar em 1875 e, até 1900, mais de 1,1 milhão se ITÁLIA espalhariam por vários Estados, principalmente Rio Grande do Sul, Roma Córsega Santa Catarina e São Paulo. No interior paulista, aprenderam a lidar com o café, surpreendendo os patrões por sua afeição ao Nápoles trabalho. Essa gente levantava bem cedo, dava duro o dia Sardenha inteiro - de sol a sol, como se dizia - e não enjeitava serviço. Homens e mulheres, que gostavam de cantar enquanto “lavoravam”, trouxeram costumes que, aos poucos, incorpoPalermo raram-se às tradições regionais, como festas e comidas. As mulheSicília

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res rapidamente ganharam fama de boas cozinheiras e todos, ao contrário dos escravos que absolutamente nada pretendiam da vida, senão servir seus senhores - , tinham objetivo e determinação. Na verdade, mais que fugir da miséria na Itália, eles pretendiam “fazer a América”, conseguir o próprio pedaço de chão, plantar suas lavouras e prosperar. No entanto, por mais que quisessem, isso não passava de um sonho distante. Quando chegaram de seu país e foram trabalhar nos cafezais, os italianos ganhavam tão pouco que sequer podiam fazer compras em armazéns, mesmo a prazo. Quem vendesse, sabia que dificilmente conseguiria ver a cor do dinheiro. Dessa forma, sem muitas oportunidades, parte do contingente de imigrantes italianos acabou envelhecendo em meio à pobreza nas fazendas, enquanto outros desistiram da agricultura e partiram para as cidades em busca de outro tipo de vida. Muitos também, regressaram para seu país. No entanto, quando espalhou-se a notícia de que matas estavam sendo abertas no Paraná, o alvoroço foi grande entre as famílias, que enxergavam aí, finalmente, a oportunidade tão esperada. Como os imigrantes ainda vivos já estavam muito idosos e sem condições de enfrentar o desafio de desbravar uma nova fronteira, a empreitada recairia sobre os ombros dos filhos e netos.

Vapores cruzavam os mares trazendo mão-de-obra barata

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Europa

EUA

Ásia África

América do Sul

Oceania

Brasil

São Paulo

Paraná

Santos

Santa Catarina Rio Grande do Sul Oceano Atlântico

Rio Grande 38


Quando em 1940, em companhia de outros familiares, Francisco Romagnolo Junior e sua mulher Natalina Stramandinoli pegaram a estrada em direção ao Paraná, deixaram para trás uma história comum entre os descendentes de italianos no Estado de São Paulo. Francisco representava parte do legado dos pais, Ércole Paolo Romagnolo e Maria Ravegnani que, em 1888, partiram com três filhos da província de Rovigo, nas cercanias de Pádova, no Vêneto, norte da Itália. Lá, suas famílias lidavam tradicionalmente com o cultivo de vinhas. Após longa jornada em um vapor na travessia do Atlântico, Ércole, Maria e os filhos aportaram em Santos, no litoral brasileiro, de onde, em lombo de burros, seguiram para São Paulo, cidade que recebia com muitas oportunidades todos os que chegavam do estrangeiro, principalmente quem se dispusesse a enveredar pelo interior e trabalhar no campo. Dessa forma, naquelas mesmas condições de transporte, os Romagnolo deixaram a capital e fixaram-se em uma propriedade denominada Fazenda do Banco, no município de Botucatu, a mais de 200 quilômetros de distância. Devotado a trabalhar na terra, que foi o que sempre fez na vida, Ércole o mais novo dentre três irmãos adaptou-se bem à nova vida e aprendeu logo a formar lavouras de café, passando a prestar esse serviço para fazendas na região. Àquela época, os cafezais faziam a riqueza da maior parte dos municípios paulistas, de modo que bons profissionais eram valorizados. Com tal ofício, ao qual dedicou-se por muitos anos, Ércole conseguiu juntar algum patrimônio e, ao lado de Maria, criar e encaminhar na vida uma prole formada de oito filhos - os homens Giovani, Guerino, Giusepe, Santo e Francisco, as mulheres Tereza, Emília e Albina -, a maioria nascida na virada do século. Ter uma família numerosa, com muitos braços, era conveniente para que se pudesse enfrentar o desafio do trabalho diário e prosperar. Um dos filhos, Francisco, havia nascido em 3 de outubro de 1908 no povoado de Pardinho. Como os outros irmãos, ele cresceria ouvindo os pais comunicaremse diariamente no idioma pátrio e a quase tudo entendia sem dificuldades. Os italianos de origem, mesmo vivendo há muito tempo no País, não abandonavam seus hábitos, que transmitiam naturalmente aos herdeiros. Desde cedo Francisco passou a ajudar o pai na lavoura e a compreender que, um dia, quando homem feito, teria também a sua oportunidade de ser independente, constituir família, dar muitos netos aos “nonos” e tentar realizar o sonho de ter a própria terra. Já muito novo ele revelaria interesse por negócios, comprando e vendendo

Trabalhadores italianos em lavoura de café no Estado de São Paulo. Acervo Edgard Leuenroth (Unicamp)

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criações. Era também um rapaz altivo e atraente, que fazia suspirar as moças. Ércole faleceu antes que Francisco conhecesse Natalina, a mulher que estaria ao seu lado durante toda a vida. Casados no ano de 1930 em Botucatu, viveriam por algum tempo na cidade, onde, dois anos depois, nasceria Maria Edite, a primeira filha. A família passaria a cuidar, também, de Marieta, mãe de Francisco, e de uma tia deste, Albina, que tinha síndrome de down. Mudando-se em 1932 para o município de Bernardino de Campos, os Romagnollo tiveram mais três filhos. Além de Geraldo, o primogênito dentre os homens, mais duas Marias: Lúcia e Helena. Apesar da grande disposição de Francisco para o trabalho, as perspectivas em Bernardino apresentavam-se escassas, refletindo um período negativo da economia brasileira e mundial, provocada pela quebra da Bolsa de Nova York, em 1929, que arruinara as fazendas de café, abalando a economia dos municípios. De uma hora para outra, as exportações recuaram e o produto, sem mercado, perdeu valor, gerando excesso de oferta. Logo em seguida, no ano de 1932, o Estado de São Paulo viveria a Revolução Constitucionalista, o maior confronto militar no Brasil no século XX, cujo estopim foi a ascensão, em 1930, do gaúcho Getúlio Vargas à presidência da República. Em Bernardino de Campos, a vida continuava difícil e não havia jeito de melhorar. O sonho de cultivar o próprio chão parecia ainda mais distante, sempre empurrado para a frente. A partir de 1931, estoques excedentes de café, em poder do governo, começavam a ser queimados como forma de enxugar o mercado e reabilitar os preços. Buscando melhores perspectivas, a família decidiu transferir-se para Santa Cruz do Rio Pardo, quase na divisa com o Paraná. Planejava estabelecer-se ali, lugar onde os cafezais eram ainda abundantes. Nessa cidade, deram à luz mais um filho. Como os Romagnolo manti-nham uma tradição vicentina, caracte-rizada pela prática da caridade e a fé cristã, o rebento seria batizado com o nome de Vicente. Era o ano de 1938. Ao longo daquela década, as chances de conseguir o próprio espaço como agricultor continuavam especialmente difíceis no interior paulista. Em algumas regiões, a lavoura 40


seriA ylraM

dava sinais de cansaço e decadência, sendo substituída por pastagens e outras culturas, o que restringia as possibilidades de contratação de profissionais como Francisco, especializado na formação de café. De certo modo, insistir na cafeicultura talvez não fosse a melhor opção. Mas o que poderia fazer ele, com um prole numerosa para alimentar? Para quem dependesse de trabalhar em terras dos outros, não havia muito a escolher. A necessidade já tinha feito com que Francisco aprendesse a se virar bem em outras áreas. Graças à sua disposição, o jeito sincero, atirado e a facilidade em fazer amigos, ele jamais esmorecia e, bravamente, tentava de tudo na luta pela sobrevivência. Comercializar gado e mercadorias, por exemplo. Embora fosse um homem sem leitura, contava com a ajuda valiosa da esposa Natalina. Inquieto, experimentou o comércio. Se lá em Bernardino ele tivera um pequeno açougue, em Santa Cruz partiria para a compra e venda de frangos até estabelecer-se como dono de bar. Nesse negócio, conquistou freguesia em razão, principalmente, dos saborosos pastéis preparados com esmero pela esposa. No entanto, quando lhe dava na cabeça, Francisco se desfazia, sem cerimônia, do que tinha em mãos. Não era de acomodar-se atrás de um balcão: da vida queria muito mais. Também não era do tipo de apegar-se em coisas, embora corresse atrás do sonho de fazer riqueza. Um sonho, aliás, que custava a acontecer. Só o que encontravam pela frente era muito trabalho e pouco resultado. Por isso, quando Francisco ficou sabendo que estava em andamento um projeto de colonização do Norte do Paraná, animou-se. Poderia estar ali a chance tão aguardada.

A família mudou-se de Botucatu para Bernardino de Campos e de lá para Santa Cruz do Rio Pardo. Em mente, o firme objetivo de fazer a vida com o plantio de café, sonho que parecia tão distante.

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Registros Os americanos davam as cartas

No Estado de São Paulo, usinas hidrelétricas eram construídas desde 1893 com capital privado e, em 1912, quando foi criada, a Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL) passou a absorver esses ativos de geração e de distribuição localizados em diversos municípios. Não fosse pelo empreendedorismo de alguns pioneiros, a tarefa de iluminar ruas, casas e movimentar motores teria ocorrido com bastante atraso. Já naquela época, também, bondes elétricos circulavam em várias cidades paulistas. Aliás, o aparecimento de muitas empresas geradoras de energia elétrica no interior permitiu acelerar o desenvolvimento em São Paulo, algo sem paralelo em comparação com outros Estados brasileiros. Em 1927, o processo de eletrificação ganhou impulso quando o controle acionário da CPFL foi transferido para as mãos de uma companhia norte-americana, a American & Foreign Power Company, subsidiária da Electric Bond & Share Corporation-Ebasco, pertencente à General Eletric, criada em 1923. A AMFORP investiu, então, na compra de empresas em diversas cidades do interior daquele Estado e até mesmo em várias capitais brasileiras, aproveitando o fato de que muitas delas estavam sendo corroídas por problemas financeiros e técnicos. Essas unidades possuíam pequenos e pouco eficientes sistemas de força motriz, sujeitas a repentinas variações de voltagem e freqüência, ligados a uma antiquada rede de energia elétrica. Lentamente, os norte-americanos foram homogeneizando as estruturas que haviam adquirido, fazendo com que a CPFL e suas companhias associadas funcionassem cada vez mais em harmonia. Outro desafio enfrentado entre os anos de 1930 e 1950 foi organizar o faturamento das contas de energia elétrica, pois as tarifas obedeciam a contratos diferentes celebrados com as municipalidades, cujos preços e condições variavam de uma cidade para outra. Só com a revisão dos contratos das empresas concessionárias, determinada pelo Código de Águas, durante a década de 40, é que o setor conseguiria falar uma linguagem única. A AMFORP fazia o máximo que podia para acompanhar o progresso do País, sob o ritmo do Estado Novo de Getúlio Vargas. O lance de maior ousadia da empresa foi a construção da usina hidrelétrica Marechal Mascarenhas de Moraes, na época uma das maiores do mundo. Em abril de 1957 os seus dois primeiros geradores seriam oficialmente inaugurados, com capacidade de 40.000 kW cada um. 42 10 46


Nos anos 50, outra dificuldade foi a carência de recursos para o setor elétrico. A redução de investimentos nessa área acarretou, entre outras coisas, o lento crescimento da capacidade instalada e da oferta de energia. O desenvolvimento industrial no pós-guerra também contribuiu decisivamente para aumentar a deficiência no setor elétrico, que já era evidente, inclusive com racionamentos institucionalizados. Nessa época e no início dos anos 60 surgiriam no Brasil algumas manifestações nacionalistas, contrárias aos interesses norte-americanos, o que fez com que as empresas pertencentes ao grupo AMFORP fossem nacionalizadas.

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Terra dividida

O

rápido surto de desenvolvimento das cidades que surgiram nas áreas colonizadas do Norte e Noroeste do Paraná, durante as décadas de 30, 40 e até mesmo 50, não era acompanhado pela devida atenção por parte do governo do Estado. Este mantinha os olhos voltados, quase que exclusivamente, para Curitiba e as regiões mais tradicionais. Até então, o Paraná estava dividido em três. Uma parte, formada pelo litoral, Curitiba e os Campos Gerais; a segunda, pelo Norte do Paraná, que recebia forte influência do Estado de São Paulo. A terceira, o Oeste e o Sudoeste onde, ao contrário do Norte - que teve uma colonização organizada -, a ocupação das terras se deu em meio a muitos conflitos. Por muito tempo, inclusive, paranaenses do Oeste e Sudoeste alimentaram um projeto separatista, que visava a criação do Estado do Iguaçu. Nos anos 30, quando se estava ainda no início e havia tudo por fazer, o governo acompanhou de longe o andamento do projeto executado pela Companhia de Terras no Norte, como a derrubada de florestas, a abertura de estradas, a construção do ramal da linha férrea e o surgimento dos primeiros povoados. Por tratar-se de um empreendimento executado pela iniciativa privada, coube à empresa implantar toda a infraestrutura necessária sem a participação dos governantes, os quais se limitavam, na verdade, a recolher impostos. A partir de julho de 1934, os empreendimentos energéticos já contavam, ainda que de forma incipiente, com o respaldo do Código de Águas, instituído pelo Decreto-Lei número 24.463 e, pouco mais tarde, do Conselho Nacional de Águas e Energia Elétrica, surgido com a Lei número 1.85 de 1939. O poder público estadual iniciaria o processo de coordenação sobre o setor, até então dependente da iniciativa privada. Assim, com o apoio do Plano Nacional de Eletrificação, que preconizava a intervenção direta do Estado na área da produção 44


de energia, seria criado o Serviço de Energia Elétrica do Paraná, que no ano seguinte se transformaria no Departamento de Águas e Energia Elétrica - DAEE. Nos anos 1940, quando uma civilização já se consolidava e os povoados se transformavam rapidamente em aglomerados urbanos, o governo passou a agir de maneira mais interessada. Ao simples anúncio de que uma cidadezinha começava a nascer - e isto acontecia com freqüência surpreendente - a primeira coisa que fazia era instalar uma coletoria, para garantir que todos pagassem seus tributos. Depois, acionava a igreja para mandar logo um padre ao lugar. No entanto, o que se via era um grande descontentamento por parte das autoridades e da população dos municípios. Eles muito se queixavam do distanciamento que havia entre o governo e as regiões novas, as quais se sentiam desprestigiadas. Cidades do Norte, como Londrina, Maringá, Mandaguari, Apucarana, Arapongas, Rolândia e tantas outras, pareciam nem fazer parte do mapa do Paraná, apesar da enorme riqueza que geravam com suas lavouras de café e do tanto de impostos com os quais engordavam os cofres públicos. Uma das razões dessa insatisfação era a inexistência de energia elétrica abundante, situação que se agravaria com o advento da Segunda Guerra Mundial, quando, na realidade, começou a faltar combustíveis e gêneros alimentícios. Muitas das famílias que tinham se mudado para o Paraná eram provenientes de regiões do País onde já estavam habituadas a esse conforto. Por isso, para chamar a atenção dos governantes, os mais exaltados falavam até em desfechar um movimento para anexar o Norte paranaense ao Estado de São Paulo. Com recursos naturais oferecidos pela região, como quedas d’água, o município de Londrina procurou resolver, pelo menos em parte, a questão da energia elétrica. Em decorrência do rápido crescimento urbano e da inviabilidade de apenas manter motores à diesel na produção de energia elétrica, a Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP) acabou construindo inicialmente uma pequena usina hidrelétrica no Ribeirão Cambé (onde hoje está instalado o Parque Arthur Thomas), aproveitando uma queda d’água de 50 metros. A Usina Cambé ou Cambezinho, que mais tarde passou a ser chamada “Dr. Fernando de Barros Pinto”, foi inaugurada em 8 de fevereiro de 1939. Na época, Londrina contava com 10.531 habitantes. Os responsáveis pela obra foram os engenheiros Gastão de Mesquita Filho e André Kotchetkoff, contando com o trabalho de 50 operários. Precisou-se, para a sua

Acima, detalhe da construção da Usina Cambé ou Cambezinho, a primeira de Londrina, inaugurada em 1939 onde hoje é o Parque Arthur Thomas, no centro da cidade. (Fotos: Arquivo do município e site do Parque Arthur Thomas)

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construção, abrir uma estrada de mais de 15 quilômetros de extensão por três metros de largura no meio da floresta. Produzia uma média de 200 KW de energia, juntamente com alguns motores à diesel para a galeria técnica, capazes de atender uma população de apenas 6 a 7 mil habitantes, cerca de 5 quarteirões médios residenciais na época. Nascia, então, a Empresa Elétrica de Londrina S.A. (Eelsa). Em 1943, o município ganharia sua segunda usina, denominada Três Bocas, situada no Ribeirão do mesmo nome. Essa unidade, com potência de 0,6 MW, contribuiria para atender a forte demanda local. No ano seguinte, a Paraná Plantation se desfez da Companhia de Terras Norte do Paraná, vendendo as ações dessa empresa para um grupo formado pelo Banco Mercantil de São Paulo, o qual assumiu o empreendimento no mês de março. Historiadores apontam duas razões para a saída dos ingleses do negócio. De um lado, a necessidade de repatriar o capital inglês, pois a Segunda Guerra Mundial, com a decisiva participação da Grã-Bretanha, ainda estava em pleno andamento. De outro, uma certa hostilidade e perseguição com que o governo de Getúlio Vargas tratava empreendimentos estrangeiros no País. A Companhia, portanto, passaria às mãos brasileiras, o mesmo acontecendo com as suas subsidiárias, estradas de ferro - incorporadas à malha federal - e a Empresa Elétrica de Londrina S.A., cuja concessão foi entregue ao engenheiro Gastão de Mesquita Filho, recomendado ao presidente da Companhia de Terras Norte do

Em 1943, Londrina ganharia sua segunda usina, denominada Três Bocas, no Ribeirão do mesmo nome. Essa unidade, com potência de 0,6 MW, funcionaria por 36 anos

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Acima, a antiga Catedral de Londrina; ao lado, o prédio onde funcionava a sede da Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP)

Paraná, João Sampaio, pelo antigo e dileto amigo deste, Antonio Moraes Barros. Sampaio presidiu a Companhia durante toda a primeira fase da mesma, entre 1925 e início de 1944. No dia 12 de junho de 1967, ao receber o título de cidadania honorária de Londrina, João Sampaio deixou claro, em trecho de um detalhado pronunciamento, como tudo isso ocorreu: “Ao grupo formado pelo Banco Mercantil de São Paulo, que adquiriu a integralidade das ações da Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP), e as estradas de ferro, incorporadas ao seu patrimônio, devemos reconhecer a prudência, capacidade de trabalho e perseverança, com que desde a sua entrada (em março de 1944) até a atualidade, prosseguiu e deu desenvolvimento ao que, em linhas gerais, vinha sendo realizado pelos seus antecessores. Menos, na parte ferroviária, que passou ao Governo Federal e baixou de nível. Mas muito mais, na parte da industrialização – a que não chegamos – porque estava reservada para a segunda etapa. Na primeira, nós nos limitávamos a estimular a iniciativa privada. E nos ocupamos com os serviços necessários ao público: águas, luz e força elétricas. Para essa indústria, demos a primitiva concessão ao engenheiro Gastão de Mesquita Filho, recomendado, na oportunidade, por Antonio Moraes Barros, meu antigo e querido amigo e companheiro de trabalhos, havendo o concessionamento trazido o seu plano de organização da Empresa Elétrica de Londrina S.A., para o empreendimento. A concessão foi se estendendo às novas cidades – sempre em progresso e bem orientada – e creio que é a mesma, agora incorporada, entre outras, à Companhia Melhoramentos.” Em 1948, além de Londrina, as cidades de Arapongas, Cambé, Ibiporã, Rolândia e Jataizinho já estavam sendo abastecidas pela Empresa Elétrica de Londrina S.A. 47


A hidrelétrica de Apucaraninha, inaugurada em 1949

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No dia 6 de abril de 1949 era inaugurada a Usina Hidrelétrica Apucaraninha. Construída dentro da reserva Apucaraninha, dos índios Caingangue, com capacidade instalada de 9,5 MW, aproveitava uma queda d’água de 116 metros de altura no Rio Apucaraninha, afluente do Tibagi. Essa usina representou um significativo avanço e foi fundamental para deslanchar o desenvolvimento do município e região à volta. No entanto, deixaria no futuro um passivo para a Copel, que absorveu a Empresa Elétrica de Londrina S.A. em 1° de junho de 1974. Por conta disso, em 2006, a Copel e a comunidade Caingangue selariam na aldeia localizada em Tamarana, região Norte do Estado, um acordo histórico e sem precedentes no País. O documento deu fim a uma discussão que se prolongou por vários anos, indenizando passivos ambientais, sociais, culturais e morais decorrentes da construção e operação da usina. “Chegou o momento de compensar o impacto causado a esta comunidade e aos seus ancestrais”, disse na oportunidade o diretor de Geração e Transmissão de Energia da Copel, Raul Munhoz Neto. A implantação de projetos para a sustentabilidade das famílias, atendendo-se as suas vocações, bem como hábitos culturais e sociais, foi o objetivo dos recursos repassados pela Copel, no prazo de 5 anos. O acordo, denominado Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) é considerado inédito no setor elétrico brasileiro, tanto pelas dimensões quanto pela complexidade dos assuntos envolvidos. “Ele zera e liqüida todos os impactos provocados pela usina, desde o uso de mão-de-obra indígena nas obras de construção, até a vegetação e as terras que foram alagadas com a formação do reservatório”, acrescentou Munhoz Neto. Uma descrição técnica aponta que a hidrelétrica de Apucaraninha aproveita uma queda natural com dois barramentos. O primeiro é a Barragem do Fiú, que fica 6 quilômetros acima do ponto onde está a Casa de Força, com 109 metros de comprimento e 16,5 metros de altura. O segundo é a Barragem Apucaraninha, distante 100 metros do salto do mesmo nome, com 154 metros de comprimento e 5,3 metros de altura. Na Casa de Força operam três unidades geradoras, sendo duas com potência de 1,6 MW e uma terceira com 6,3 MW.


Em 1940, o casal Romagnolo e seus cinco filhos cruzaram a divisa do Paraná através da passagem por Ourinhos, fixando-se inicialmente em Ibiporã, na região de Londrina. Estavam na terra dos “pés vermeios”. Nesse período, o cenário era inquietante: o sertão paranaense estava sendo desbravado e grandes florestas sucumbiam para dar lugar a fazendas de café, em meio a uma intensa correria. Por uns tempos, Francisco tentou trabalhar na compra e venda de milho, mas a família não adaptou-se a Ibiporã porque as dificuldades eram de tal ordem que o povoado, para se ter idéia, sofria com a escassez de água, que às vezes faltava até mesmo para beber. Dura sina. O jeito foi juntar as tralhas e, mais uma vez, providenciar a mudança, agora para Londrina, cidade que crescia vigorosamente e prometia ser um bom lugar para quem quisesse ganhar a vida. Francisco, sempre trabalhador e esperançoso, com facilidade de adaptar-se a novas situações, decidiu atuar por algum tempo com a compra da madeira que a Companhia de Terras retirava do lugar onde, mais tarde, viria a ser a Avenida Higienópolis. Com essa madeira ele produzia carvão e lenha cortada, consumidos pela população local. Certo de que conseguiria prosperar nesse negócio e sustentar a família, Francisco só não contava com uma rasteira preparada pelo clima. Em decorrência de uma forte geada, muitos cafeicultores tiveram que promover uma poda mais drástica em suas lavouras, o

De Santa Cruz do Rio Pardo, a mudança para Ibiporã, através de Ourinhos. Mas, o destino final seria Londrina

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que aumentaria sobremaneira a oferta de lenha, fazendo com que os preços caíssem a níveis aviltantes. Mesmo alquebrado, Francisco não se entregou: decidiu achar um jeito de virar o jogo e enfrentar a sorte à sua maneira. Certa manhã, vestido em terno e gravata, dirigiu-se à estação ferroviária certo de que, ali, conseguiria achar algum negócio. Lá chegando, encontrou-se com um conhecido e, expondo-lhe sua situação aflitiva e o interesse em achar algo - talvez intermediar uma negociação -, foi informado pelo mesmo de uma bela fazenda na região que havia sido colocada à venda. Sem muito o que pensar, Francisco conseguiu emprestar algum dinheiro e, no mesmo dia, embarcou num trem com destino ao Estado de São Paulo, indo parar em Bernardino de Campos, onde vivera anos atrás. Lá chegando, procurou um fazendeiro seu amigo, de nome Francisco Lourenção, a quem propôs conhecer a propriedade no Paraná. O fazendeiro concordou em visitar as terras, viajando para o Estado vizinho em seu fordeco “Pé-de-Bode”, na companhia do amigo. ..... O café era uma cultura em que os ciclos de preços alternavam altas e baixas, provocados por fatores diversos que surpreendiam os produtores. Um inverno rigoroso, por exemplo, ao mesmo tempo em que podia dizimar a lavoura ante a ocorrência de uma geada forte, valorizava os estoques, para satisfação daqueles que costumavam ser mais previdentes. Mas o frio era um do pesadelo para quem, sem tradição na cafeicultura, se aventurava a ser fazendeiro acreditando no enriquecimento rápido. O coitado

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investia todas as suas economias e, após alguns anos vivendo em meio a toda sorte de dificuldades, via tudo perder-se em uma única noite de geada forte, ficando sem ter como recuperar-se. Nesse caso, tomado pelo desespero, o pobre se desfazia de suas terras por qualquer valor e tratava de voltar logo para o lugar de onde tinha vindo. Essas histórias de insucesso também corriam os outros Estados, esfriando os ânimos de muita gente em relação ao Paraná. Por isso, ouvia-se, em tom irônico, a frase que se espalhava com o vento: “O Paraná é só fama, quando não é poeira é lama”. Nenhuma geada, contudo, por mais intensa que fosse, conseguia impedir a determinação dos cafeicultores de verdade: eles chegavam, plantavam suas lavouras e iam sobrevivendo com cultivos de subsistência, em meio às próprias ruas do café. Eles sofriam prejuízos, sim, mas se recuperavam logo da “paulada” e não perdiam seus objetivos de vista. No ano seguinte e nos outros, estavam lá novamente com suas lavouras. Como não havia frio que os derrubasse, esses teimosos e valentes acabavam enriquecendo num “descuido” do tempo. ..... Durante a viagem de Bernardino de Campos a Londrina, com muito tempo para conversar sobre tudo, o fazendeiro Francisco Lourenção soube do conhecimento e da experiência de Francisco Romagnolo Junior na formação de cafezais em várias cidades do Estado de São Paulo e, também, de seu desejo de, um dia, ter a própria terra. Afinal, não lhe faltavam braços, pois a família era numerosa. Natalina também compartilhava da vontade do marido: em uma área rural, onde pudessem plantar de tudo um pouco e manter alguma criação, teriam a garantia do sustento com fartura para todos e viveriam sossegados. A vida na cidade não lhes apetecia. Sentiam-se b e m m a i s confortáveis, seguros e felizes no campo. Por isso o de-sejo de ter um sitio-zinho que fosse para semear o café e, nas entrelinhas deste, fei-jão, arroz, milho. Em outra parte, algumas vacas leiteiras, pomar e horta com um pouco de tudo, sem falar dos porcos e aves. Assim, o alimento à mesa só iria depender do pró-

Na página ao lado, cafezal a perder de vista. Caminhões carregados de café, iguais a este, eram comuns nas ruas de Londrina

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Marly Aires

Os Romagnolo: as crianças nos tempos da fazenda. Embaixo, abertura de picada em meio à mata fechada. Mais tarde esses caminhos dariam lugar a estradas

Chegando ao Paraná, foram conhecer as terras e Francisco Lourenção gostou da fazenda que lhe fora apresentada. Ficava em um espigão no meio de uma mata fechada, distante 21 quilômetros de Londrina e outros 21 do povoado de Arapongas. Uma área com plena aptidão para o café, conforme lhe atestara o amigo. Mas, para fechar negócio, impôs uma condição: a propriedade somente seria adquirida se ele, Francisco, por ser pessoa da confiança do fazendeiro paulista, se dispusesse a ser o seu administrador, cuidando de tudo pessoalmente, da derrubada do mato e em especial do plantio de café, sendo recompensado, ao final, com uma porcentagem sobre a produção. A oferta foi, de certo modo, uma surpresa. Muito embora estivesse trabalhando com a venda de terras, Francisco ainda mantinha a expectativa de conseguir a sua sonhada propriedade. Era para isso, afinal, que tinha vindo com a família ao Paraná. Mesmo sem recursos para comprar alguma coisa, nem mesmo um pequeno lote, estava convicto de que lhe seria possível alcançar o objetivo. No entanto, para melhor estruturar-se e por algum tempo acomodar a família, decidiu aceitar a proposta. Nos tempos em que viveu sob os céus na nascente cidade de Londrina, o casal Francisco e Natalina aumentou a prole. Nasceu a quarta das mulheres: Maria José. Mais uma Maria, agora paranaense, que haviam colocado no mundo. Nessa época, a filha mais velha, Maria Edite, contava apenas oito anos. ..... Quanta dificuldade! Antes de mais nada, seria preciso derrubar a mata e construir um pequeno rancho de lona, até que um outro, feito com troncos de palmito, repleto de frestas e coberto com cascas de peroba, pudesse receber o pessoal. Foi ali, em situação de absoluto desconforto, que os Romagnolo se instalaram e passaram os primeiros seis meses, dedicando-se a um trabalho que a todos consumia. A família despertava antes do sol e dedicava-se, cada um, à sua tarefa. Francisco coordenava a derrubada da floresta com a força braçal de um contingente de peões, recrutado em Londrina. Tinham que abrir espaço para o plantio de café, que acontecia


tão logo as terras vermelhas e férteis ficavam desnudas. As sementes vinham da Fazenda Bule, não muito distante. Por sua vez, Natalina se entregava aos afazeres de casa com a ajuda das filhas, cozinhava para um batalhão de trabalhadores e ainda encontrava tempo para cuidar das crianças. Os pequeninos Vicente e Maria José requeriam atenção redobrada, pois, bem mais que os outros, estavam sujeitos aos perigos e surpresas daqueles matos. Ambos ficavam, na verdade, por conta das filhas maiores, que faziam as vezes de mães. Até formar a fazenda, que veio a se chamar “São Francisco”, foi preciso buscar muita mão-de-obra em Londrina para dar conta do serviço mais pesado, ao qual braçais nordestinos estavam habituados. Eram pernambucanos, alagoanos, baianos, cearenses. Eles chegavam de seus Estados sem a ambição de fazer a vida, apenas para trabalhar, cumprir uma jornada de dias, semanas ou meses. Instalavam-se em pequenas pensões, onde podiam ser facilmente encontrados por quem precisasse contratá-los. Para isso, além de combinar o pagamento pelo trabalho a executar, o patrão se obrigava a saldar as despesas que haviam feito na pensão e, é claro, fornecer-lhes comida. Não raro, usando de malandragem, vários desses homens desistiam da tarefa logo no primeiro dia para retornar à mesma pensão, onde tinham crédito, pois suas dívidas estava quites. Permaneciam ali até que outros desavisados viessem contratá-los, não sem antes acertar suas contas com o estabelecimento.

A rusticidade e a falta de conforto eram comuns nas fazendas

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Em propriedades rurais, era comum o uso de “batatões”, colhidos no mato, para que fossem usados como suporte à iluminação caseira. Para isso, um pano embebido em querosene era colocado em um buraco na “batata” e, a seguir, aceso, provocando uma chama que durava horas.

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Assim iam vivendo. Acostumados a enfrentar desafios, os Romagnolo não imaginavam que sofreriam tanto na selva do Paraná. A começar pelas condições em que viviam. As tarimbas, onde dormiam, eram feitas com varas de madeira. Sobre elas, dispunham colchões forrados de palha de milho e travesseiros recheados com penas de aves. Quando vinha a temporada de chuvas, tudo virava um imenso lamaçal, tornando impossível sair da fazenda, ante a precaridade das estradas. Para complicar, eram tempos de Segunda Guerra Mundial, o que provocou escassez de gêneros como açúcar, farinha de trigo, sal e óleo diesel. Porém, à sua maneira, eles davam jeito em tudo. Para poder saborear um café “adocicado”, por exemplo, a família tinha que moer cana e ferver o caldo. O pó de café, então, era passado na garapa. E, como não havia combustível para as lamparinas, a única maneira era queimar óleo de mamona, colhida e moída no próprio quintal. A combustão produzia tufos de fumaça preta, mas, pelo menos, ninguém ficava no escuro. Só depois de seis meses é que a propriedade, enfim, começava a ganhar cara e jeito de fazenda. Milhares de pés de café - e foram 100 mil no total - cresciam em meio a lavouras de subsistência, onde se colhia o alimento diário. Com as coisas já mais organizadas e definidas, era o momento de construir uma casa melhor para a família, pois a vida no ranchinho de palmito, com chão de terra batida, já não justificava tamanho sacrifício. Nessa época, muitos portugueses especialistas em construções de madeira, matéria-prima abundante no Norte do Paraná, tinham vindo em busca de trabalho e eram disputados tanto nas cidades quanto nas propriedades rurais. Com madeira extraída das imediações, a casa ampla e confortável ficou pronta, o que premiou os Romagnolo. Era a recompensa após tantas privações. Natalina, enfim, teria um lugar mais seguro para criar os filhos e, junto com o marido, ter força e ânimo para continuar acreditando em prosperidade. Aquela casa seria apenas a primeira. Para formar uma colônia de trabalhadores, que cuidaria do cafezal, outras duas dezenas de moradias foram levantadas com caprichosa mão-de-obra portuguesa. Mesmo sob condições tão inóspitas, a família não deixaria de continuar crescendo. Na Fazenda, Francisco e Natalina tiveram mais dois filhos paranaenses: Maria Cecília e Armindo. Cecília, a última das Marias. Ambos, autênticos “pés vermeios”. O tempo foi correndo e as coisas, enfim, pareciam ajustar-se. As lavouras iam bem e, no terceiro ano, a fazenda começou a receber famílias para ocupar as casas da colônia e trabalhar no café. Era gente que resultava da mistura de várias raças, geral-


mente portuguesa, italiana e negra. Todas, já com muitos filhos, revelavam-se férteis na geração de outros tantos. Não raro, mães levavam seus recém-nascidos para o trabalho, deixando-os devidamente protegidos sob a saia de um cafeeiro. Na colônia, tudo era motivo para festa e alegria, o que divertia os Romagnolo. Francisco e Natalina, volta e meia, apadrinhavam batizados e casamentos. Eles e também os filhos eram estimados pelos trabalhadores e seus familiares. Quando de temporadas de chuvas, a fazenda ficava isolada por meses. Para ir até a cidade, só mesmo na boléia de um valente caminhão Chevrolet, cujo motor precisava ser propulsionado com manivela. Uma viagem de 21 quilômetros até Londrina podia demorar 3 horas. Assumindo a figura de patrão, embora a propriedade não lhe pertencesse, Francisco gostava de tudo organizado e em perfeita ordem. Quando necessário, era um homem duro, exigente nos detalhes. Gostava de confiar e acreditar nas pessoas, mas não tolerava abusos. Fazia amigos com facilidade, apreciava conversar, trocar idéias. Sabia conquistar o respeito e a simpatia dos que o cercavam. Na fazenda, Francisco tomara a iniciativa de instalar uma escola para que as crianças pudessem conhecer as letras. Até os dez anos, tinham a chance e o direito de aprender a ler e a escrever, ao menos o próprio nome. Depois disso, acabavam largando tudo para

Uma viagem de carro podia acabar mal. Acima, grãos em estágio “cereja”

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A vida simples, mas feliz, na pequena propriedade

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ajudar os pais e os irmãos na lavoura. Não havia como ser diferente no sertão. Em 1945, o proprietário da fazenda decidiu se desfazer das terras. Foi só abrir a boca para, em pouco tempo, começar a aparecer comprador. O negócio, após fechado, acabou rendendo uma merecida participação financeira a Francisco. Uma compensação pelo seu trabalho, que resultara na expressiva valorização da propriedade. Por isso, chegara o momento de partir para uma nova etapa. Desta vez, ao contrário de quando chegaram a Londrina, trazendo apenas disposição para vencer na vida, os Romagnollo estavam suficientemente preparados para, enfim, realizar o velho sonho de comprar as suas terras. Em outubro de 1946, a família deixou a fazenda e seguiu rumo a Mandaguari, distante 60 quilômetros, ao Noroeste. Com suas economias, Francisco havia adquirido lá uma pequena chácara de 2 alqueires, à qual denominou Boa Vista. Ele, Natalina e os filhos - pelo menos os maiores - já haviam se acostumado às mudanças drásticas da vida, a começar tudo de novo, a passar pelos mesmos sacrifícios. Desta vez, no entanto, as dificuldades seriam compensadas pela satisfação e a alegria de cultivar a própria terra, ainda que a dimensão fosse reduzida. Nessa época, Mandaguari era um povoamento em efervescência, preparado pela Companhia de Terras Norte do Paraná para ser uma sede regional do projeto de colonização. Ali concentravam-se muitos estabelecimentos comerciais que abasteciam fazendas e os povoados que iam surgindo rapidamente nas imediações. Havia escola, igreja, cartório, juiz de paz e até cadeia. Em pouco tempo, a chácara estava formada com um cafezinho vistoso, pomar de frutas, horta variada, criação de porcos, vacas leiteiras e aves. Como era muita gente para trabalhar e cada qual com sua tarefa, tudo andava bem e depressa. Porcos eram engordados e, de vez em quando, abatidos para produção de lingüiça e vários outros derivados. A carne e a banha guardava-se em latas de 20 litros para consumo nas refeições, preparando-se com essa gordura o arroz e o feijão de todo dia. O leite rendia subprodutos diversos, as frutas originavam doces e conservas. Na época da colheita do café, o empenho de toda a família era total. Até o pequeno Vicente participava, levando comida para a roça com uma vara sobre os ombros e se ocupando de funções como a varrição do quintal e o trato das criações. Foram tempos felizes, em que finalmente experimentaram prosperidade. Para completar, os últimos dois filhos, de um


total de dez, nasceriam na Chácara Boa Vista: Álvaro e Francisco. Logo que instalaram-se em Mandaguari, os Romagnolo fizeram amizade com os vizinhos, os jovens Lucindo e Penha Schincariol, casados em 1944. Ficaram tão próximos que Natalina amamentou por seis meses o primeiro dos dois filhos do casal. Integrando grandes levas que surgiam a todo moRolândia Maringá Londrina mento para colonizar o Norte do Paraná, Lucindo e Apucarana Mandaguari Penha tinham sido trazidos por seus familiares ainda muito moços, com 14 anos. Ela chegaria ao povoamento de Lovat um ano antes do futuro marido, em Paraná 1937, indo em seguida para Marialva, onde os pais haviam comprado um pequeno sítio. Naquela época, as condições eram tão primitivas que, para fazer compras, o único jeito era caminhar 27 quilômetros no meio da mata até Lovat, onde só havia uma ou duas ruas e um pequeno aglomerado de casas. Como a floresta era escura e amedrontadora, Penha, o pai e um irmão se preveniam com uma tocha de fogo para espantar bichos. A vida também não era fácil para Lucindo: sempre após uma chuva mais forte, ele percorria a pé 35 quilômetros até Apucarana. No caminho, ia cortando touceiras de bambus que, com o peso da água nas folhas, pendiam sobre a estrada, o que impediria a passagem da jardineira. Casados, eles jamais perderiam contato com os Romagnolo. Os Romagnolo, aliás, eram o que se podia chamar de família unida. Todos se davam bem: durante os afazeres, sempre juntos, conversavam e sorriam muito, por qualquer motivo. Religiosos, freqüentavam a missa aos domingos e, no almoço, rendiam-se às delícias preparadas pela mãe, como o macarrão com carne de cabrito, o pastel de batata doce e as apreciadas queijadinhas. Viviam tão bem na chácara em Mandaguari que, certa ocasião, Natalina precisou dizer ao marido, em tom firme e definitivo, que não aceitaria mais mudar-se dali. Sabia que ele, diante de uma boa proposta, dificilmente resistiria à tentação de vender a propriedade. Ademais, os filhos estavam crescendo e começavam a encaminhar-se. O mais velho dos homens, Geraldo, abraçara a profissão de alfaiate. Fácil seria imaginar, entretanto, que Francisco não se aquietaria. O espírito destemido falava mais alto e ele não deixaria de sonhar com a própria fazenda. A pequena chácara da família seria preservada a pedido de Natalina, mas ele acalentava o desejo de fazer a sua parte na concretização do sonho dos pais, que vieram da Itália à custa de grandes sacrifícios para “fazer a América”. Sentia que

A famíilia radicou-se em Mandaguari

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A antiga igreja da paróquia N. Sª Aparecida, em Mandaguari, durante a década de 40 (foto Akimitsu Yokoyama)

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estava perto de realizá-lo. Nesse final dos anos 40 e início da década de 50, o preço do café experimentara novamente valorização após um longo período em baixa, período que coincidiu com a ausência de geadas fortes. Dessa forma, aqueles cafeicultores que não desistiam nunca, acabaram favorecidos por essa combinação e ganharam dinheiro como nunca. Isto fortaleceu a procura por terras no Paraná e fez com que a Companhia colocasse à venda novas áreas de terras na região de Cianorte, mais ao Noroeste. Histórias de gente enriquecendo com o café voltaram a varrer o País. Por isso, via-se muitas famílias chegando com o propósito de comprar terras e tentar a vida. Aqui, ficavam fascinadas ao ouvir relatos de gente bem sucedida, como a experiência de Joaquim Romero Fontes, um paulista que, em 1949, decidiu mudar-se de Lucélia para Maringá, contrariando a vontade do pai. Já na primeira safra, Joaquim contou com a ajuda do tempo para colher uma produção abundante, de 4.700 sacas. E teve, também, a sorte de ver o preço da saca disparar. Na segunda safra, o felizardo Joaquim obteve mais 4.400 sacas e o preço continuou a subir. Em dois anos apenas, tinha ficado rico.


Registros O que ficou para a história...

O topógrafo japonês Shigueyoshi Yokoyama chegou à então localidade de Lovat entre os anos 1934/35, para trabalhar no escritório da Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP). A família somente seria trazida para a cidade – cujo nome já havia sido alterado para Mandaguari - em 1944, pois antes disso não havia casas disponíveis e foi preciso morar, por algum tempo, no quarteirão da Companhia, onde eram alojados alguns dos funcionários. Yokoyama participou, juntamente com o também topógrafo Vladimir Babikov e o engenheiro agrimensor Alexandre Razgulaeff, do planejamento urbano de Mandaguari e de várias outras cidades no trecho Londrina-Maringá. Nascido no Japão e trazido com apenas três anos para o Brasil, Akimitsu, filho do topógrafo Shigueyoshi, seria no futuro um personagem importante para a preservação da memória regional. Fotógrafo desde muito cedo, ele registrou milhares de cenas que marcaram a saga dos pioneiros. Suas fotografias, a maior parte em preto e branco, compõem hoje um acervo dos mais valiosos.

Na foto tirada na segunda metade dos anos 30, o japonês Shigueyoshi Yokoyama e o russo Vladimir Babikov, ambos topógrafos, juntamente com o engenheiro agrimensor Alexandre Razgulaeff, também de origem russa; ao fundo aparece ainda um funcionário da Companhia na então localidade de Lovat, hoje Mandaguari (acervo Akimitsu Yokoyama)

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Nos anos 50, as dificuldades encontradas por quem se aventurava a enfrentar a estrada entre Mandaguari e MaringĂĄ eram, principalmente, os grandes atoleiros, comuns em perĂ­odos chuvosos (Fotos Akimitsu Yokoyama)

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Parte 2


Rápido crescimento populacional

Cenas da Avenida Brasil no final dos anos 40. Acima, no registro de Fleuri Scheidt e, embaixo, de Akimitsu Yokoyama

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urante o século XX, o território paranaense foi sendo gradativamente ocupado. Na década de 1920, toda a região centralizada pelas cidades de Tomazina, Siqueira Campos e Jacarezinho já estava povoada. A partir da década de 1940, descendentes de imigrantes italianos e alemães, do Rio Grande do Sul, subiram de Sul para o Norte e, ultrapassando o Rio Iguaçu, avançaram pelo Oeste paranaense, ao longo do Rio Paraná, até encontrar os plantadores de café, a outra corrente de migração interna que descia do Norte para o Sul. Ainda em meados dos anos 1940 a utilização de energia enquanto força motriz superou o seu uso para iluminação pública e particular. Ao mesmo tempo, apesar das dificuldades de fornecimento de energia, houve intensa difusão do uso de eletrodomésticos pela Cia. Força e Luz do Paraná, como o refrigerador GE.


Sobretudo a partir dessa época o Paraná começou a viver um forte crescimento populacional, pressionando o governo a investir em infra-estrutura, o que não era tarefa simples. Para se ter idéia, em 1940 a população paranaense que era de 1,236 milhão de habitantes, chegaria a 2,115 milhões em 1950, registrando aumento de 70% e uma densidade de 10 habitantes por km.2 Em 1960, outro grande salto: os paranaenses já eram 4,263 milhões, o correspondente a 21 por km.2 Em 1970, a população subiu para 6,929 milhões de habitantes, 60% a mais, o equivalente a 35 por km.2 Ao longo daquelas mesmas décadas, houve um aumento considerável do número de indústrias no Paraná. Segundo dados do Ipardes (1987), em 1939 eram 1.832 unidades, com 21.898 trabalhadores; dez anos depois, em 1949, o Estado registrava 3.460 indústrias, com 35.176 empregados; em 1959, já eram 6.417 unidades fabris e 68.455 trabalhadores, números que em 1970 chegaram, respectivamente, a 10.855 e 114.344. Além da Companhia Força e Luz do Paraná (CFLP), havia no Estado outras empresas em operação nesse setor, como a Empresa de Eletricidade Alexandre Schlemm e a Empresa Sul Americana de Eletricidade, esta última sediada em Santa Catarina, ambas fornecendo energia aos municípios da região Sul do Paraná; a Cia Prada de Eletricidade, servindo a região em torno de Ponta Grossa, Castro e Piraí do Sul; a Empresa Elétrica de Londrina, atuando naquela cidade e em municípios próximos; e a Cia Hidrelétrica do Paranapanema que, apesar de estar sediada em Ponta Grossa, fornecia energia a mais de 20 municípios do Norte do Paraná. O restante das municipalidades tinha seus serviços de energia mantidos pelas próprias prefeituras e/ou auto-produtores.

A partir da década de 40, as cidades do Norte do Paraná, como Mandaguari, começaram a viver um intenso crescimento populacional. (foto: Marilena Meyer)

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Acima, o governador Moysés Lupion. Umas das mais urgentes prioridades do primeiro prefeito de Maringá, Inocente Villanova Júnior (abaixo), era dotar a cidade de geradores eletro-diesel, o que foi conseguido em 1952

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A hidrografia paranaense possibilitou a viabilização de usinas hidrelétricas relativamente próximas aos centros, como foi o caso de Londrina. Nas regiões onde tais características não se apresentaram, a única opção eram os geradores a diesel. No dia 7 de agosto de 1947, a Secretaria de Viação e Obras Públicas instalou o Serviço de Energia Elétrica do Estado, o qual seria reconhecido no ano seguinte como órgão auxiliar do Conselho Nacional de Águas e Energia Elétrica. Ainda em 1948 ele seria transformado no Departamento de Água e Energia Elétrica (DAEE), com autonomia administrativa e financeira. Uma de suas primeiras iniciativas foi propor um plano para a eletrificação do Estado, o Plano Hidrelétrico Paranaense, de 1948. No governo de Moysés Lupion (1947-1950), o Estado passou a absorver empresas privadas de energia nos municípios, como a Força e Luz de Antonina, parte da rede de Apucarana, pertencente à Empresa Elétrica de Londrina S.A.; Força e Luz de Imbituva e Empresa Elétrica de Foz do Iguaçu. Por outro lado, o governo participou da constituição de algumas sociedades, como a Empresa Hidro-Elétrica do Vale do Ivaí, Empresa Hidro-Elétrica de Laranjinha e Empresa Hidro-Elétrica de Mallet. Pelo Plano de Eletrificação, observava-se que o Norte do Paraná era a região menos atendida, apesar do intenso crescimento populacional. Mas o governo não podia fazer muita coisa, pois o Estado encontrava-se, nessa época, com insuficiência de recursos. Em 1952, o primeiro prefeito de Maringá, Inocente Villanova Júnior, gozando de bom relacionamento com pessoas influentes da capital, conseguiu a cessão de quatro motores usados de 2.080 cavalos de potência. A cidade, fundada em 1947 e emancipada em 1951, ainda não contava com energia elétrica nessa época, a não ser com alguns pequenos motores a diesel, mantidos por meia dúzia de comerciantes e de uso estritamente particular. O projeto de instalação foi feito pela UTIL Companhia Brasileira de Planejamento. Os motores foram instalados junto ao córrego Mandacaru e a montagem executada por engenheiros vindos de Hamburgo, funcionários da fábrica alemã que os produzira. Tão logo instalados foi estendida nas principais ruas da cidade uma rede de postes com pequenas lâmpadas que, de tão fracas, as pessoas chamavam de “tomates”. Só funcionavam até às 22 horas com duas piscadelas que avisavam os moradores que era hora de acender velas e lampiões. Em seu livro, editado em 1997, quando do cinqüentenário de Maringá, Edgar Werner Osterrotht cita que “Velhos pioneiros e fundadores lembram-se bem deste sofrido e saudoso tempo. Luz, só de velas, das antigas lanternas, dos 'lampiões Aladim' ou da 'Petromax' à querosene, que ficavam pendurados nas principais ruas


comerciais, nos botecos, nas 'vendas' de secos e molhados, produzindo aquele barulho irritante. Quem não se lembra? A manutenção de 'luz acesa' era feita através de um 'técnico' encarregado de bombear o querosene, ou trocar a 'camisinha' dos lampiões 'Aladim” e 'Petromax'. Interessante é que, de vez em quando, caboclos curiosos, e às vezes bêbados, botavam tudo a perder de tão 'chumbados' que estavam da velha 'pinga'. Às vezes, algumas lanternas até explodiam de tanto querosene.” A irritação com a falta de perspectivas em relação à energia elétrica ganhava o reforço dos donos de máquinas beneficiadoras de café, demandadas por grandes safras. Em Maringá, no começo dos anos 50, contava-se pelo menos 50 máquinas de grande porte, que se espalhavam também por outras cidades à volta, entre as quais Mandaguari. Elas compravam o café “em coco” dos agricultores e limpavam o produto para ser entregue, em sua maior parte, ao governo federal. Para funcionar, as máquinas recorriam a motores estacionários movidos a óleo diesel, que geravam a necessária energia. Como esses equipamentos não eram fabricados no Brasil, precisavam ser trazidos da Europa ou comprados de segunda mão. Contudo, a importação esbarrava na demora em função da grande procura e essas engenhocas, na visão das lideranças, não passavam de paliativos ou “quebra galhos”: o que se queria, na verdade, era energia elétrica de fornecimento estável para mover motores, indústrias, comércio e oferecer conforto aos moradores, além de iluminar as praças e vias públicas, a exemplo do que ocorria no vizinho Estado de São Paulo. Até então, as cidades do Norte do Paraná - cantadas em verso e prosa como exemplos de crescimento e progresso - ficavam completamente às escuras após às 22 horas, horário em que as máquinas eram desligadas. Portanto, enquanto os paulistas já tinham superado essa etapa há décadas, várias regiões do Paraná ainda eram mantidas na dependência de poucos e arcaicos equipamentos de geração de luz à base de diesel, sem falar que velas, lamparinas e lampiões continuavam sendo artigos de primeira necessidade. .....

Equipamentos rústicos de geração de energia elétrica, à base de diesel, comum na época em estabelecimentos comerciais

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A Rádio Cultura foi instalada em Maringá mesmo antes da chegada da energia elétrica, prestando valiosos serviços

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A falta de energia elétrica não impediu que a cidade de Maringá recebesse uma emissora de radiodifusão, que foi, aliás, uma das primeiras da região Norte do Paraná. Um estudo realizado por Ana Paula Machado Velho, Doutoranda do Curso de Comunicação e Semiótica da PUC/SP e da Universidade Estadual de Maringá (UEM), em conjunto com Mariane Maio, Fabiane Giandotti, Arieta Arruda e Bárbara Fernandes, que, em 2005, cursavam o quarto ano de Jornalismo no Cesumar (Centro Universitário de Maringá), permite conhecer essa história. A primeira rádio maringaense, a Rádio Cultura, resultou de uma iniciativa de José Medeiros da Silveira, Odwaldo Bueno Neto, Amadeu Vuolo e Átila de Souza Melo. O grupo fundou a emissora em 16 de novembro de 1949, mas não conseguiu concretizar a transmissão por falta de estrutura. O contrato acabou cancelado em 19 de janeiro de 1950. Quem, afinal, conseguiu superar as adversidades e colocar a emissora no ar foi Samuel Silveira, radialista profissional. Depois de exercer cargos de gerência em várias emissoras, ele adquiriu equipamentos e um conjunto gerador e, em 15 de junho de 1951, a Rádio Cultura de Maringá AM já podia ser ouvida, o que era um grande acontecimento. Francisco Dias Rocamora foi o técnico responsável pela montagem e manutenção da rádio. Exercia também as funções de locutor de estúdio e locutor esportivo e foi ele quem colocou as primeiras palavras no ar: “Senhores, senhoras, esta é a ZYS-23, Rádio Cultura de Maringá, em 1.520 kHz, inaugurando suas atividades”. Inicialmente, a idéia era instalar a emissora em Mandaguari, cidade pólo da região naquela época. No entanto, como Samuel Silveira era amigo de Alfredo Nyeffler, gerente da Companhia Melhoramentos em Maringá, acabou mudando de idéia. A Cultura, então, nasceu praticamente na mesma época de transformação de Maringá em município. E, para isso, precisou passar por cima de dificuldades. O novo município não tinha energia elétrica, telefone nem estradas. Não tinha infra-estrutura. Era uma clareira na mata. A primeira sede foi em um quarto de madeira, de 36 metros quadrados, na avenida Herval. Dentro desse pequeno espaço funcionava o estúdio transmissor, a discoteca e o escritório. Ali, os discos 78 rotações, as pick-ups e os equipamentos da época, permitiam a irradiação. A antena da rádio ficava numa área que hoje pertence à Universidade Estadual de Maringá e se encontra a “Casa da Música”. Como não havia energia elétrica, a rádio funcionava à base de dois motores a óleo diesel. Um estava instalado no estúdio e outro na torre de transmissão. Mas, transmitir não era o único problema. Como não existiam transistores, os rádios eram valvulados, muito caros, o que impossibilitava que qualquer pessoa tivesse um. Para colocar um aparelho desses em funcionamento eram necessárias 280 pilhas pequenas, que equivaliam a uma pilha grande. O pioneiro Antenor Sanches lembra que essa pilha grande chegava a ser quase do tamanho do rádio. Algumas


pessoas usavam pilhas comuns de farolete, ou até mesmo baterias de automóveis. Só que elas descarregavam logo. As pilhas duravam mais tempo, mas não eram baratas. Por isso, costumava-se ouvir com o volume baixo para economizar pilha. Por causa da falta de energia elétrica e de aparelhos receptores, a Rádio Cultura foi autorizada a instalar alto-falantes ao longo da Avenida Brasil, a mais importante via da cidade. Samuel Silveira conta que as pessoas se sentavam na rua para “assistir” jogos de futebol, como os da seleção brasileira. Naquela época a rádio tinha uma potência pequena, mas o alcance era grande porque só havia uma outra emissora em Londrina. Segundo Silveira, a Cultura começou com 100 watts. Para ele, a chegada do rádio em Maringá foi um ato heróico, mas também gratificante. Como não havia gravadores, a programação era inteiramente ao vivo. Além dele, as primeiras vozes que chegaram aos ouvintes foram as dos locutores Luís Barros, o Barrinhos, Dirceu Fernandes de Souza e Thomás de Aquino Negreiros. Na calçada de casa ou junto ao alto-falante da rua, os moradores ficavam “do lado de fora” para ouvir os programas sertanejos. Essa era a preferência das pessoas da época, conforme lembra Reginaldo Nunes Ferreira. O que mais tocava era música caipira, como as de Tonico e Tinoco, e Pedro Bento e Zé da Estrada. Em 1953, a Rádio Cultura chegou a construir um auditório para fazer programas de entretenimento. O mais famoso deles era o Clube do Caçula. Outro destaque da Cultura era um programa para aproximar os corações dos apaixonados. O pioneiro e historiador Antenor Sanches lembra que nos primeiros programas de rádio, moças indicavam músicas para os rapazes, que retribuíram. Através desse serviço de alto falante começaram muitos namoros e casamentos. Samuel Silveira também lembra que a Cultura não era só entretenimento. A cobertura de eventos oficiais e a transmissão de fatos do cotidiano levavam às regiões mais afastadas da zona rural informações sobre o que acontecia na cidade e até notícias sobre parentes, que ficavam algum tempo sem se ver, por causa da falta de transporte coletivo e das precárias condições das estradas. A chegada da luz propiciou, mais tarde, avanços como o telex, que traziam as notícias nacionais. A exemplo do que aconteceu em muitos municípios do interior, o rádio “funcionou” em Maringá como um veículo de informação, entretenimento e prestação de serviço. Seus primeiros locutores foram Aloysio Raphael Barros, Dirceu Fernandes de Souza, Thomaz Aquino Negreiros, Dirce Righetti, Joaquim Dutra, Olindor Camargo, Orlando João Zenaro Manin, Moacir Savelli, Paulo Martins Silles, Lindolfo Luiz Silva, Ladislau Alberto de Lima, Roberto de Mello Meira, José Alfredo Silva Filho, Sergio Andreucetti, José Ambrosio Netto, Jayme Vieira Lopes, José Pinto Oliveira, Evaldo Rodrigues, Antonio Lazaro do Amaral, Jairo de Oliveira Tomaz, Ivens Lagoano Pacheco, Abel Decleva, entre outros. Os primeiros operadores de som: José Augusto de Negreiros, Ilda Ramos, Olinda Oliveira, Maria Helena Savelli, Loreto Agnaldo Bochoski, Nelson Bartolo, Bruno Piovezam, Adilson Andreatta, Aristeu Ferreira Miguel, Anaídes Batista Nogueira.

Muita música caipira, informação e prestação de serviço: a programação era inteiramente ao vivo

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Iluminação em Lovat só havia no escritório da CTNP (registrada na foto acima por Vladimir Babikov). Em Maringá (abaixo), a construção do cinema, no início dos anos 50 (foto: Akimitsu Yokoyama)

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Na então Lovat do início dos anos 40, energia elétrica e com motor estacionário só havia mesmo no escritório da Companhia de Terras e em algumas poucas casas vizinhas, ocupadas por seus empregados. Nessa época, em que a empresa tinha como gerente Raul Silva, o motor era acionado às 7 horas da manhã e desligado às 22 horas. Além de iluminar, o equipamento servia também para puxar água do poço, provendo as caixas. Em Londrina, as pequenas hidrelétricas eram insuficientes para atender a forte demanda de uma cidade em acelerado crescimento. Por isso, cientes de que nada conseguiriam em suas gestões junto ao governo do Estado, os londrinenses organizaram-se em torno da Companhia Melhoramentos Norte do Paraná e recorreram ao Estado de São Paulo, onde grandes usinas hidrelétricas estavam sendo construídas nas proximidades da divisa com o Paraná. Dessa forma, a Companhia Hidroelétrica do Paranapanema, através da Usina de Salto Grande, passou a atender 20 municípios do Norte Pioneiro. Em pouco tempo, Londrina também passou a contar com energia elétrica proveniente do Estado vizinho, o que representou um grande avanço. Com a energia chegando a Londrina, através da instalação de uma rede de alta tensão e postes de madeira, fincados com força braçal, outros municípios próximos também se beneficiariam. ..... O desenvolvimento do Paraná, no entanto, deixava claro que a carência de energia elétrica não podia ser resolvida apenas por usinas situadas no Estado de


São Paulo. Aliás, o primeiro Plano Hidrelétrico do Estado, que data de 1948, previa sistemas elétricos distribuídos por regiões. O Sul seria apoiado nas futuras usinas de Capivari-Cachoeira e Salto Grande do Iguaçu; o Norte, abastecido pelas usinas de Salto Grande e Capivara, nos rios Paranapanema e Mourão; o Oeste, com alguns geradores isolados. Em 1952, o plano estadual incluiu a conclusão de pequenas hidrelétricas (Cavernoso, Caiacanga e Laranjinha) e previu, finalmente, a construção de várias outras, bem maiores, como Capivari-Cachoeira, Tibagi, Carvalhópolis e a termelétrica de Figueira, esta última à base de carvão. Ao mesmo tempo, o Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) passou a instalar motores e conjuntos a diesel com capacidade entre 70 e 154 kVA em muitas localidades, em caráter de emergência, além de proporcionar assistência a prefeituras que mantinham serviços próprios de eletricidade. Foi o caso de Maringá e Mandaguari. Nessa última cidade, a família de Aleixo Leão de Oliveira, que havia chegado alguns anos antes de Campos Gerais, sul de Minas, para tentar a sorte na agricultura, apreciou a novidade. Ele e a mulher Maria Augusta já deviam ter, naquela época, mais de dez de seus dezoito filhos - todos nascidos de parto normal - quando a luz passou a ser especialmente importante. A exemplo das outras famílias, eles deixariam de ir para a cama tão cedo, como faziam antes. Afra, uma das filhas, lembra que, com o cair da noite e sem nada para fazer, o sono era invencível. Mas, com a casa iluminada por lâmpadas colocadas em bocais que pendiam do teto, a família havia adotado o costume de fazer orações todas as noites após o jantar. O tempo, em seguida, era geralmente consumido com reuniões em que se contavam histórias bíblicas. Só mesmo perto das 22 horas - que era o horário máximo de fornecimento de energia às casas e estabelecimentos comerciais -, o pai Aleixo começava a assombrar a todos com seus costumeiros e amedrontadores “causos” de fantasmas, que duravam até que a luz fosse interrompida, para algazarra geral.

A agência postal de Lovat, de responsabilidade de Aleixo Leão de Oliveira (foto: A. Yokoyama)

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Acima, um ferro à brasa, muito comum na época. Ao lado, detalhe de um banheiro (repare no chuveiro “tiradentes”)

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O advento da energia elétrica possibilitou, também, que muitas famílias pudessem adquirir aparelhos de rádio, mantendo-se mais informadas acerca do que ocorria no País e no mundo. Até então, rádio era um privilégio de poucos, pois só funcionavam à pilha. Costumava-se ouvir a programação de emissoras de Apucarana e Londrina, bem como das Rádios Nacional, Tupi, Mayrink Veiga e Bandeirantes. Durante a Guerra, quando Mandaguari ainda era chamada de Lovat, vivia-se em absoluto isolamento, sem qualquer notícia da civilização. Nessa época, Aleixo trabalhou também como picador, abrindo caminhos ou picadas no mato. Com luz em casa, hábitos familiares começaram a se modificar, pois as mulheres tinham a possibilidade de deixar para o período noturno algumas tarefas, como costurar ou passar roupas (e agora com ferro elétrico, em vez de ferro a brasa ou a gás), enquanto os homens podiam fazer consertos ou simplesmente ler. Da mesma forma, o banho diário deixaria de ser feito em bacião com água esquentada, evoluindo para o “tiradentes”, um balde de 20 litros içado com um pequeno chuveiro na parte inferior, de onde caía a água - quente ou fria - que ali havia sido antes despejada. Sabonete, nem pensar. As próprias famílias produziam um sabão que chamavam “de coada”, de simples preparo: em um tacho, diluíam miúdos de porco em água fervente, ao mesmo tempo em que cinzas de fogão eram depositadas em um balde com água que, aos poucos, ia sendo coada. Da mistura final desses ingredientes é que se obtinha o sabão, usado para tudo. A geladeira elétrica aposentava as similares a querosene; por sua vez, a limpeza do chão, que antes demandava escovão de ferro com palha de aço, agora podia ser feita com enceradeira elétrica, um luxo.


Nas casas e no comércio, as lâmpadas eram colocadas em bocais pendurados ao teto

Durante anos, também, sempre com o apoio da mulher e alguns dos filhos, Aleixo de Oliveira dedicou-se à função de representante dos serviços de correios em Mandaguari, numa casa apegada a do agrimensor russo Vladimir Babikov, funcionário da Companhia de Terras. Quando luz elétrica não havia, ele trabalhava até tarde lançando mão de um fogareiro e algumas lamparinas para clarear o ambiente onde separava as correspondências. O advento da energia possibilitou que as famílias saíssem de casa à noite, para um passeio em ruas iluminadas, tomar um sorvete ou então ir ao cinema - outra novidade da qual antes só se ouvia falar. Da mesma forma, os comícios políticos, que só podiam acontecer sob a claridade do sol, passaram para o horário noturno, bem mais agradável. A luz, ainda que precária, gerava empregos e um dos filhos de Aleixo encaixouse na até então inexistente função de “guarda-fios”. Sua função era percorrer a cidade observando algum possível dano na fiação elétrica e nos postes, principalmente após temporais.

Os primeiros “guarda-fios” de Mandaguari foram Abdon Leão de Oliveira (acima) e João Calijuri

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O governo cria a

O governador Bento Munhoz da Rocha Netto

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m 1953, ao instituir a Taxa de Eletrificação por meio de uma lei estadual, o governo do Estado garantiria mais recursos financeiros para implementar a eletrificação. No ano seguinte, por iniciativa do governador Bento Munhoz da Rocha Netto, através do Decreto n° 14.947 de 26 de outubro, era criada a Companhia Paranaense de Energia Elétrica (Copel) - cuja denominação seria alterada no futuro para Companhia Paranaense de Energia -, com a proposta de assumir a responsabilidade pelos serviços até então a cargo do DAEE, prefeituras e concessionárias particulares. Como referência, a empresa seguiria os moldes da concessionária estadual congênere de Minas Gerais, a Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais), e também da antiga Uselpa (Usinas Elétricas do Paranapanema), de São Paulo. O primeiro diretor-presidente foi o professor universitário Themístocles Linhares, que teve como companheiros de diretoria, o diretor técnico Pedro Viriato Parigot de Souza e o diretor administrativo Heraldo Vidal Corrêa. O Decreto previa que a Companhia - cujo capital social era de 800 mil cruzeiros, 60% subscritos pelo Estado - se destinava a “planejar, construir e explorar sistemas de produção, transmissão, transformação, distribuição e comércio de energia elétrica e serviços correlatos, por si ou por sociedade que organizar ou de que vier a participar”. A primeira reunião da diretoria, no dia 28 de março de 1955, precisou acontecer em uma pequena sala do Instituto Nacional do Mate, do qual Linhares era delegado, na rua Marechal Floriano, porque não havia dinheiro sequer para custear um aluguel. A empresa somente contaria com uma sede alugada a partir do mês de junho daquele mesmo ano: um conjunto de 12 salas no 8° andar do Edifício José Loureiro, na Rua XV de Novembro. Poucos antes, o Decreto n°. 37.399, de 27 de maio, sancionado pelo Presidente Café Filho, autorizava o funcionamento da Copel como companhia de energia

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elétrica, de acordo com as exigências do Código de Águas e Leis Subseqüentes. Assim, no dia 23 de agosto, quando grande parte dos cafezais paranaenses amanheceu destruída por uma forte geada, o governador Adolpho de Oliveira Franco julgou ser oportuno afirmar que o Estado precisava avançar imediatamente para uma nova etapa, a industrialização. “O fim a que se entrega a Copel não é outro senão o de fornecer elementos para essa nova etapa histórica”, disse ele. “O problema que ela tem a resolver não se restringe apenas a construir usinas. Consiste, também, no lançamento de uma vasta rede básica de linhas de transmissão e subestações, de modo a permitir o fornecimento de energia gerado a todos os consumidores nos vários núcleos de industrialização indicados no mapa do Paraná, pela geografia econômica de nossas matérias-primas”, sustentou. A primeira cidade a ser abastecida pela Copel foi Maringá. Sua ligação deu-se no dia 1° de agosto de 1956. Na mesma data, seriam ligadas também: Apucarana, Pirapó, Mandaguaçu, Cambira e Campo Mourão. Até então, todos esses municípios estavam sob a responsabilidade do Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE). Nessa época, com 15 mil habitantes e 1.700 ligações, Maringá dispunha de uma usina com quatro motores à diesel de 360 kVA cada, instalados pelo DAEE em 1952. Além de insuficientes, pois a cidade vivia um período de rápido crescimento, dois motores estavam com os mancais fundidos, o que impunha um racionamento de eletricidade. A usina funcionava das 7 às 11h30 e das 18 às 22 horas. Em 1957, a Copel adquiriu um motor de 525 kVA e, nos anos seguintes, outras unidades, até que a usina tivesse uma potência de 5.000 kW. Material histórico publicado em setembro de 1979 pela empresa, quando da passagem de seus 25 anos, relata que o técnico especializado em montagem e manutenção, Eugênio Rosa, conheceu bem os dramas vividos pela representação regional da Companhia, em Maringá. “As passeatas de usuários se repetiam toda vez que faltava eletricidade. Numa dessas manifestações de desagrado, o próprio Eugênio Rosa foi envolvido e teve de seguir a multidão furiosa até o escritório da empresa, ponto em que se concentrava a ira dos manifestantes”, diz um trecho. “A situação, antes da Copel, era tão precária que, ao assumir os serviços de Maringá, a Companhia precisou enfrentar sérios problemas de consumo clandestino de energia elétrica, feito inclusive com extensões de arame de aço e arame farpado. Cerca de 30% do consumo energético não era pago (por influências políticas) e isso, naturalmente, refletia na situação financeira. Os serviços estavam

Decreto sancionado pelo Presidente Café Filho autorizava o funcionamento da empresa. Abaixo, o governador Adolpho de Oliveira Franco

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Maringá, em 1952, recebeu do Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) esta usina dieselétrica com quatro motores. Funcionava das 7 às 11h30m e das 18 às 22 horas

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em descrédito, a ponto de um dos fornecedores de óleo diesel ter cortado o suprimento. Através de gestões com outro fornecedor, o abastecimento de óleo foi restabelecido, mas, todos os dias, o primeiro dinheiro do caixa era destinado ao pagamento do combustível, sem o qual as usinas paravam. De Maringá, Eugênio Rosa devia atender aos defeitos e quebras de equipamentos nas usinas de localidades vizinhas, o que ocorria com demasiada freqüência, principalmente aos domingos, feriados e dias de festas importantes. Não havia telefones, nem outro meio de comunicação rápida entre as cidades. Se ocorria um problema com a usina de Apucarana, por exemplo, o encarregado mandava um bilhete a Eugênio, pelo primeiro veículo que demandasse Maringá. E, pela descrição sumária do defeito na usina (fumaceira, vazamento de óleo etc), o técnico dava um diagnóstico à distância, indo pessoalmente ou mandando seus auxiliares consertarem a avaria. Bastava um fraco temporal para o sistema elétrico entrar em pane. Os transformadores eram instalados em cima dos célebres “chiqueirinhos” ou gaiolas de madeira, caracterizando verdadeiras improvisações que só podiam funcionar precariamente. Recordando-se de episódios pitorescos da época, Eugênio Rosa conta que, em Apucarana, a usina à diesel tinha oito motores, distribuídos em dois grupos e de várias marcas. Todos deficientes. Mas, o motor ‘Hamilton’, de 1.000 kW, era uma ‘parada’, porque cuspia fogo, óleo lubrificante e fumaça: era o ‘vulcão de Apucarana’, no conceito do técnico. Nos anos de 1956 e 1958 foram instalados mais dois motores de 1.000 kW cada, que contribuíram para o abastecimento energético das localidades de Mandaguaçu, Pirapó e Cambira, através de linhas de conexão com Apucarana. Em Campo Mourão havia duas turbinas, uma de 125 kVA e outra de 360 kVA. Posteriormente, em 1960, foram instalados um motor diesel de 1.000 kW e uma turbina de 1.000 kW, na chamada Usina Piloto de Campo Mourão. Por sua vez, os problemas de reposição de peças causavam os maiores trans-


tornos, pois os motores diesel, além de absoletos, não dispunham de componentes originais para troca. Para superar as dificuldades, muitas peças eram feitas na oficina de um alemão chamado Kurt, em Maringá, mediante orientação do técnico Eugênio Rosa. “Era preciso remendar tudo, senão a luz faltava e aí ocorriam as passeatas.” Dessa maneira, a empresa foi centralizando todas as ações governamentais de planejamento, construção e exploração dos sistemas de produção, transmissão, transformação, distribuição e comércio de energia elétrica e outros, tendo incorporado todos os bens, serviços e obras em poder de diversos órgãos. Coubelhe, então, a responsabilidade pela construção dos grandes sistemas de integração energética e dos empreendimentos hidrelétricos previstos no Plano de Eletrificação do Paraná. ..... Catarinense de Concórdia, Osvaldo Chiuchetta chegou a Maringá em 1956, atraído, como ocorrera com inúmeros outros, pela intensa propaganda que se fazia do Norte do Paraná. Ele lembra que como a cidade era servida de motores estacionários a diesel, os empresários estavam insatisfeitos. Os motores eram enormes, ruidosos e precisavam ser desligados por volta das 22 horas, além de exigirem um cuidadoso trabalho de manutenção para que não viessem a pifar. Mas, nas serrarias, olarias e empresas mais afastadas das cidades, onde havia fartura de lenha, era comum ainda o emprego de equipamentos vetustos para a geração de energia, como os legendários locomóveis (abaixo), criados no século XVIII. Fazendo lembrar, por suas formas, pequenas “maria fumaça”, eles não eram mais que uma caldeira a vapor, geralmente de fabricação alemã. Como iam sendo descartados no interior de São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, acabavam trazidos para regiões mais atrasadas, como o Norte do Paraná, onde ainda encontravam serventia. Osvaldo Chiuchetta afirma que, de qualquer forma, ao poderem contar com fornecimento regular de energia, ainda que por meio de motores, os municípios puderam alavancar seu desenvolvimento, com a chegada de outros tipos de indústrias. Empreendedor, logo que chegou ao Norte do Paraná, Chiuchetta percebeu que pelo menos 70% das pessoas eram, como ele, descendentes de italianos. Por isso, em 1958, decidiu estabelecer-se como industrial, comprando trigo e milho para transformar em fubá e farinha. Lembra ele que, em função da instabilidade do fornecimento de energia, esse problema era, até então, um grande obstáculo para qualquer tipo de indústria. 75


Em meados dos anos 50, Mário Piccioly era um dos primeiros funcionários da Copel em Maringá. Casado com Maria Conceição, 5 filhos, ele passou a trabalhar como operador do conjunto de máquinas geradoras de energia elétrica. Paulista de São Simão, Mário havia chegado com os pais ao Paraná em 1948, para lidar inicialmente com café, permanecendo alguns anos em uma localidade conhecida como “Oitenta”, no município de Ivatuba. Os motores eram barulhentos e um de seus filhos, Maurinho Piccioly, embora ainda muito pequeno na época, recorda que o ruído chegava a ser irritante, cansativo, de doer o ouvido. “Parecia a batida de um sino”, conta Maurinho, que, junto com a molecada, costumava brincar nas proximidades do Embora potentes, os motores que serviam Maringá durante a década de 50, eram incapazes de atender a demanda da cidade (acervo Maurinho Piccioly)

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barracão onde ficavam as máquinas. O pai, homem caprichoso, gostava de manter aquela estrutura toda sempre muito limpa e bem cuidada. Para se ter idéia, o piso de cimento alisado era encerado com “vermelhão” e ficava brilhando. Para divertir os meninos e preservar a limpeza, Mário pegava um escovão e costumava empurrá-lo de um lado a outro com um dos garotos sobre o mesmo, em meio a muitas risadas. O chão ficava tão limpo que até parecia espelho, mas também escorregadio: por isso, o uso de galochas era providencial para evitar acidentes. Mário era tão preocupado com o bem-estar do pessoal de sua equipe, formada por outros operadores e auxiliares, que chegou a construir uma cancha de bocha no próprio terreno onde funcionavam as máquinas para o lazer dos companheiros. É que, nas horas de folga, vários deles costumavam jogar baralho e, entre uma carta e outra, começar a falar dos outros, o que podia ser perigoso. Com a bocha, o risco de uma briga era quase zero. Rotineiramente, as máquinas eram ligadas e somente quando estavam em plena atividade é que se acionavam as chaves para a geração de energia à cidade. Esses motores, abastecidos a óleo diesel, eram refrigerados à água, como radiadores. Por isso, em área anexa, ficavam uns tanques de água, a céu aberto, para onde a água que passava pelas máquinas era destinada, caindo em forma de chuveiro. Como Maurinho e os outros meninos não perdiam tempo, aqueles tanques viravam “piscinas” que podiam ser aproveitadas sem maiores problemas, desde, é claro, que os motores estivessem parados. Mário e os outros operadores aprenderam a traba-

Mário Piccioly (o primeiro à direita) com demais operadores e auxiliares; na foto abaixo, de branco, o operador Catulino Machado, apoiado em uma das máquinas mais antigas

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Ao lado, alguns dos primeiros funcionários da Copel em Maringá. A foto abaixo mostra que eles eram “pau pra toda obra”

lhar com os equipamentos porque um senhor alemão, que ficou conhecido como “Papi”, foi mandado de Curitiba. Ele ficou algum tempo, em companhia da esposa, “Mami”, morando em uma das casas que haviam sido construídas especialmente para os operadores, e ficavam ao lado do conjunto de máquinas. Sujeito simpático, embora falasse bem arrastado, o tal “Papi” só tinha um defeito: quando participava de um churrasco, ele costumava guardar pedaços de carne nos bolsos, o que intrigava o pessoal. Embora de funcionamento precário, o que expunha a cidade a riscos constantes de falta de luz e racionamento, as máquinas até que não apresentavam tantos problemas e, volta e meia, aparecia alguém para elogiar o trabalho dos operadores. No entanto, Maringá crescia muito rápido, o que fazia com que a questão da energia elétrica fosse um de seus principais problemas, além de fonte de constante irritação entre os moradores. O que aprendeu com o “Papi”, Mário procurou transmitir a outros trabalhadores que chegaram depois. Foi o caso de Catulino Machado, o seu “Tula”, de quem se tornou um grande amigo. Tão caprichoso quanto o “professor”, seu “Tula” ficava horas lustrando as máquinas, além de 78 10


mantê-las bem lubrificadas. Maurinho lembra que a cidade ainda estava cheia, naquela época, de postes de madeira, alguns bem tortos. Eles eram vulneráveis a vendavais, além de muito altos, porque o povo - principalmente a molecada - ainda não estava acostumado com fiação elétrica. Volta e meia ouvia-se, por exemplo, que alguém tinha sido eletrocutado enquanto empinava um papagaio. Quando isso ocorria, a cidade ficava sem luz por algum tempo. Mas ficava sem luz, também, não por acidente, mas pela arte dos moleques - sempre eles - que, à noite, costumavam atirar arames sobre a fiação elétrica, só para ver as faíscas - que acabavam resultando em curto-circuitos. Mário morreu no dia 5 de fevereiro de 1976. Depois que a cidade passou a contar com energia elétrica estável, que aposentou os velhos motores a diesel, ele foi transferido para uma outra função, assim como todos os seus companheiros. Era inspetor de linha de alta tensão, viajando com Toyota ou caminhão por toda a região Norte do Paraná. Nessas viagens, como ainda havia muita mata, o veículo sempre acabava atropelando algum animal que, inadvertidamente, invadia a estrada. Sem cerimônia, o bicho era colocado na carroceria e aproveitado em churrascadas. Maurinho lembra que todos tinham muito orgulho de trabalhar na Copel. A empresa se preocupava com a satisfação de seus funcionários e, todo final de ano, além de uma cesta básica para as famílias, mandava brinquedos para as crianças.

Equipe que fazia a inspeção e a manutenção da rede elétrica na região de Maringá

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GETÚLIO E A ESTRADA DE FERRO

Acima, o presidente Getúlio Vargas. Na outra página, uma locomotiva à vapor fazendo o percurso entre Curitiba e Paranaguá, no começo do último século (acervo Serra Verde Express)

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O presidente da República, Getúlio Vargas, participou no dia 24 de janeiro de 1953, em Curitiba, da inauguração oficial da eletrificação na Rede de Viação Paraná-Santa Catarina (RVPSC). Ele estava acompanhado do governador do Paraná, Bento Munhoz da Rocha Netto, e do Ministro da Viação, Álvaro Souza Lima, entre outras autoridades. A eletrificação operava num trecho de apenas 36 quilômetros, entre Curitiba e Banhado, faltando ainda 74 quilômetros para que alcançasse Paranaguá, pois a usina hidrelétrica de Marumbi ainda não estava pronta. O terreno no trecho de planalto da Curitiba-Paranaguá era acidentado e três túneis tiveram de ser refeitos para a instalação das catenárias, o que encareceu e prolongou o tempo necessário às obras. Ao ser procurado pela RVPSC para conceder um financiamento, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), orientou a companhia a abandonar o projeto de eletrificação da ferrovia, por considerá-lo inviável. Se fizesse isto, a empresa teria que desperdiçar os edifícios já construídos, bem como os equipamentos elétricos adquiridos das subestações retificadoras, além de mais de oitenta quilômetros de postes já plantados, sem falar que a maior parte dos fios e cabos que se faziam necessários ao empreendimento já estava comprada. Em 1956 os dirigentes da RVPSC procuraram a Copel para iniciar negociações visando a transferência da Usina do Marumbi para a empresa, desde que fosse assegurado o fornecimento de energia para o trecho eletrificado da ferrovia. A proposta foi recebida com entusiasmo pela diretoria da Copel, uma vez que a energia produzida pela futura usina solucionaria a crítica carência de eletricidade que então havia ao longo do litoral paranaense, especialmente o Porto de Paranaguá, cujas máquinas freqüentemente tinham de ser paralisadas por falta de eletricidade. Além disso, o controle da Usina de Marumbi facilitaria a construção de uma grande hidrelétrica, a Capivari-Cachoeira. Somente em 5 de abril de 1961, com oito anos de atraso, é que a Usina de Marumbi - também conhecida como Usina do Véu de Noiva - iniciaria a geração de energia elétrica, com potência de 2.000.000 kWh; por volta de 1966 sua potência chegou a 7.000.000 kWh, com a entrada de todas as turbinas em funcionamento. Ainda em 1961 foi assinado um acordo para que o excedente da produção da hidrelétrica fosse vendido à concessionária pública de energia. Esse acordo foi decisivo para acabar com a então crônica precariedade no fornecimento de energia elétrica ao litoral do Estado do Paraná. Nesse mesmo ano já eram atendidas as cidades de Morretes, Antonina e Paranaguá. Em 1965 entraram em operação linhas de transmissão que também possibilitariam o fornecimento da energia gerada por essa hidrelétrica às localidades de Matinhos, Guaratuba e Caiobá. A Usina do Véu da Noiva somente seria adquirida pela Copel em 1998.


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Registros O que ficou para a história...

PADRE EMÍLIO, O PRECURSOR Registros do uso pioneiro de energia elétrica em Maringá são citados rapidamente em algumas publicações. O livro “A Igreja que brotou da mata”, escrito pelo Pe. Orivaldo Robles, relata, na página 115, que o padre alemão Michael Emil Clement Scherer, dono de uma fazenda a partir de 1938 na região onde seria formado o futuro município de Maringá, pode ter sido o precursor da energia elétrica na localidade: “Padre Scherer era homem de seu tempo e esforçava-se por acompanhar avanços da ciência, beneficiando-se da tecnologia. Além da mini-estação meteorológica, possuía telefone para comunicação dentro da propriedade, moinho de trigo e, aproveitando a queda d'água do ribeirão, instalou uma turbina para geração de energia elétrica.” O Padre Emílio instalou-se na região em 1938. Abaixo, Odwaldo e Winifred, que chegaram em 1947

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ODWALDO E WINIFRED Em seu “Quando o amor transpõe o oceano - uma história de coragem”, Winifred Ethel Netto relembra a aventura de ter chegado com o marido Odwaldo Bueno Netto e os filhos, após penosa viagem de caminhão desde Catanduva-SP, àquela cidadezinha ainda praticamente sem casas, cujas ruas estavam só demarcadas, cheias de buracos feitos pelos grandes troncos de árvores arrancados. Era domingo, 14 de dezembro de 1947. Escreveu Winifred, nas páginas 107 e 110: “O que estava diante dos nossos olhos era nossa casa, com as paredes levantadas e buracos no lugar das portas e janelas, mas com parte do telhado. Sem portas, sem janelas, sem forro, sem banheiro, sem o telhado completo, sem reboco nas paredes, sem cozinha! ... Ao olhar em volta, vimos que parecia uma cidade fantasma, com a poeira levantando e dificultando ver as pessoas com quem conversávamos, no que viria a ser uma rua... Mas quando a estação das águas chegou e com ela a lama, nosso telhado já estava pronto, mas havia um pequeno problema: Odwaldo quis fazer um telhado sofisticado, com várias ‘águas’, mesmo não sendo engenheiro, nem tampouco ‘mestre de obras’. Em conseqüência disso surgiram problemas de vedação e as goteiras se multiplicavam. Mas o Odwaldo sempre foi assim, arrojado, criativo e sem medo de enfrentar desafios... um exemplo disso é que tivemos luz elétrica desde o início, graças ao gerador,


lâmpadas e fios elétricos que trouxemos conosco. Construímos o banheiro dentro de casa, para surpresa da vizinhança, nosso fogão a lenha tinha serpentina e os banhos eram de água quente. Isso fazia com que nossos companheiros de pioneirismo nos achassem milionários. Na realidade, Odwaldo era um empreendedor muito criativo e eu sua companheira topa-tudo.”

JÂNIO E O BISPO O livro “A Igreja que brotou da mata”, escrito pelo Padre Orivaldo Robles e editado em março de 2007 (quando por ocasião dos 50 anos da Diocese de Maringá), registra um episódio que bem ilustra a precária situação da energia elétrica na cidade: “Em 1959, Jânio Quadros, candidato à presidência da República, percorrendo o Paraná, vem a Maringá. Entre as lideranças da cidade, não podia deixar de visitar o bispo. Amável, como todo político em campanha, pergunta quais as necessidades mais sentidas em Maringá. Uma das primeiras, apontada por dom Jaime, é a energia elétrica, bastante precária. Já é noitinha e as luzes estão acesas. Na cozinha, uma irmã liga o liquidificador e a luz começa a piscar. “Está vendo do que estou falando?” esclarece o bispo. Conhecido pelas decisões desconcertantes que tomava, Jânio não foge do padrão. Ignorando a homenagem das lideranças políticas, o jantar e o pernoite em Maringá previstos no programa, simplesmente deixa a cidade e vai dormir em Londrina.”

OURO VERDE A Indústria de Bebidas Internacional – cujo nome, mais tarde, mudaria para Ouro Verde - foi uma das primeiras unidades industriais de Maringá, instalando-se em um terreno na Avenida Mauá em 1952, um ano após a emancipação política do município. A experiência de produzir refrigerantes e engarrafar bebidas tinha sido trazida pela família Projiante de Estrela do Oeste-SP. Naquele ano, portanto, o pai Armando, juntamente com os filhos Fiori, José e Guido, passaram a produzir guaraná, soda e sodinha, além de engarrafar aguardente e vinho. Guido recorda-se que eles contavam com um pequeno gerador próprio, movido à óleo diesel, para iluminar a fábrica, mas os equipamentos para tampar as garrafas, por exemplo, tinham que ser tracionados pelo pessoal com a força dos pés. Só alguns anos mais tarde é que a Ouro Verde, em franca prosperidade, trouxe equipamentos que modernizaram a limpeza das garrafas - até então manual - e toda a linha de produção. A empresa ia tão

Peter, um dos filhos de Odwaldo e Winifred, trabalhou como piloto de avião na empresa da família, a TAMA, numa época em que a energia elétrica ainda era escassa em Maringá. O campo de aviação ficava completamente às escuras, mas ele nunca se apertava quando era preciso aterrissar em horários noturnos. Para que isso fosse possível, Peter mantinha um trato com motoristas de praça da cidade: estes, ao ouvirem o ronco do motor de sua aeronave, corriam imediatamente para o campo, onde, utilizando os faróis de seus veículos, faziam o balizamento da pista de pouso, além de clareá-la. Com essa ajuda, Peter descia sem nenhum risco.

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bem que chegaram a ser produzidas 30 mil garrafas de 600 mililitros (ml) por hora, atendendo grande parte do Estado e até mesmo o Paraguai.

MALUF E AS MÁQUINAS

Alfredo Moisés Maluf

Sobre a início da energia elétrica em Maringá, o livro “O Sonho se Faz ACIM”, editado em 2006 pela Associação Comercial e Industrial de Maringá, traz um relato do pioneiro Emílio Germani, na página 55, envolvendo o empresário Alfredo Maluf, que era dono de importante posto de combustíveis na cidade: “Um dia dois caminhões carregados com geradores a diesel passavam por Maringá e pararam no Posto Maluf. O empresário questionou os motoristas sobre o destino da carga e ficou sabendo que elas iam para Paranavaí. Aí o Maluf retrucou: 'negativo, eles vão ficar é aqui mesmo!'” Segundo Germani, Maluf não deixou que os equipamentos saíssem de Maringá e iniciou uma campanha para que os mesmos fossem instalados definitivamente aqui. Foram feitas várias viagens até Curitiba para pressionar o governo do Estado, até que houve a decisão de se instalar os geradores na cidade. Essa decisão foi o ponto de partida para a futura instalação da Copel em Maringá.

TUDO NOS PÉS As gráficas e tipografias também utilizavam equipamentos movimentados por pedais, contando com a força dos pés dos trabalhadores, a exemplo do que ocorria com as velhas máquinas de costura. O gráfico Reynaldo Costa lembra que como a energia elétrica era escassa na cidade, não havia outro meio. Pouco tempo depois de 1950, ano em que chegou com a família do interior de Minas Gerais, Reynaldo foi trabalhar na Tipografia Maringá, de propriedade de João José de Oliveira. O impressor ficava o tempo todo gerando “energia” através do movimento contínuo dos pés sobre os pedais, conta. Só mais tarde, com o crescimento do negócio, é que o proprietário decidiu adquirir um motor a diesel, para alívio dos funcionários.

FOGO NO POSTE Na Avenida Paissandu dos primeiros tempos de Maringá, conta o pioneiro João Mayo, postes de madeira foram instalados no meio da rua, bastante larga. Porém, a energia era fraquinha e, à noite, as lâmpadas não iluminavam nada, sendo até 84 10


chamadas de “tomatinhos”, pois apenas ficavam vermelhas. Nessa época, lembra Mayo, famílias costumavam incinerar na rua o lixo que produziam. Não raro, quando o lixo queimava próximo a um daqueles postes de madeira, o acidente era previsível. Como os moradores estavam muito insatisfeitos com a questão da energia, o incêndio “casual” de um poste, ainda que parcialmente, podia ser entendido como uma forma de expressar o descontentamento.

A LUZ DEMOROU... No final dos anos 40, seguindo os passos de inúmeras outras famílias que partiam em busca de melhores condições de vida, os Borghi deixaram o interior de São Paulo para tentar a sorte no Paraná. Eles, que plantavam café na região de Catanduva, adquiriram uma propriedade agrícola nas cobiçadas terras vermelhas de Maringá. Só que o tal sítio ficava na chamada Gleba Pingüim, assim denominada por ser baixa e muito fria durante o inverno, sendo imprópria para quem desejasse viver da cafeicultura. No começo, a família enfrentou dificuldades em razão das geadas, mas aos poucos foi firmando-se, conforme lembra o produtor Aníbal Borghi, o seu Zico. Ele conta que o pessoal mudou logo de atividade e foi sobrevivendo de outras culturas até que, com a soja, a vida ficou bem mais fácil. Conta também que em seu sítio, assim como na vizinhança, a energia elétrica chegaria quase trinta anos depois deles, em 1975. Até então, luz em casa somente à base de lamparina. De acordo com seu Zico, a escuridão do campo, à noite, não impedia que as pessoas se deslocassem, apenas sob a claridade da lua, para visitar um parente ou participar de alguma reza ou festança nas imediações, devidamente iluminadas por lampiões.

FRIGORÍFICO CENTRAL No final dos anos 50, algumas empresas de Maringá tiveram que providenciar a rede de alta tensão, financiando com recursos próprios a instalação de postes de madeira e fiação de cobre, para poder contar com energia elétrica. Foi o caso do Frigorífico Central, fundado em 1958 pelos irmãos portugueses Amorim e Virgulino Moleirinho, filhos do carpinteiro Joaquim Duarte Moleirinho. O pai já estava trabalhando a algum tempo em Maringá, onde atuava na construção de casas e estabelecimentos comerciais quando, em 1957, os dois foram trazidos de Leiria. 85


Amorim Moleirinho lembra que era preciso construir a rede de alta tensão e, em seguida, fazer uma escritura de doação para a Copel que, a partir daí, fornecia a energia elétrica. No caso do Frigorífico - que, na época, ficava em lugar afastado da cidade, no final da Avenida Itororó -, a rede seria puxada no mês de março de 1958 a partir de um poste existente na antiga Rua General Câmara (hoje Basílio Sautchuk), no trecho entre a Rua Arthur Thomas e a Avenida Tiradentes. Para alcançar a empresa, cerca de 1,5 quilômetro adiante, a rede estendeu-se pela Rua Marcelino Champagnat até a Rua Fernandes Vieira, continuando dali, pela margem esquerda da Avenida Itororó, até chegar ao frigorífico, onde foi ligado um transformador de 45 kVA. Esse sistema elétrico, lembra Amorim, utilizou 39 postes de madeira e possibilitou que a Copel levasse iluminação ao Ginásio Estadual Dr. Brasílio Itiberê, construído na Rua Marcelino Champagnat. Nessa época, como Maringá ainda era servida por precários motores de geração eletro-diesel, sensíveis alterações ocorriam no fornecimento de energia, sem falar das longas interrupções quando de tempestades.

APUCARANA E REGIÃO Quando chegou a Apucarana no final dos anos 50 para administrar a Copel, o engenheiro carioca Domingos Prata Barbosa constatou que a situação era calamitosa. A usina de energia, equipada com velhas máquinas a diesel, apresentava problemas de toda ordem e não havia dinheiro para nada, nem mesmo para comprar combustível, que ia sendo conseguido com muito jeito junto ao fornecedor. Domingos respondia também pelos municípios de Cambira, Jandaia do Sul e Mandaguari. Nessa última cidade, “a coisa era ainda mais feia”, lembra Domingos, brincando que “se um bêbado encostasse num poste, os dois iam para o chão”. Além de máquinas sucateadas e postes apodrecidos, que muitos chamavam de “palitos”, a fiação também não colaborava: qualquer ventania mais forte e pronto, o curto-circuito era inevitável. Casado, Domingos preferiu inicialmente deixar a família morando em Curitiba e instalou-se num hotel de Apucarana, mesmo porque a cidade não dispunha de casas para alugar e o ambiente por lá não era nada amistoso, devido ao excesso de cobranças por parte de todo mundo. Só o que ouvia eram queixas e reclamações.

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De noite, estava sujeito a passar por apuros. Às vezes, enquanto jantava no restaurante do hotel, podia acontecer de a luz pifar, irritando os outros comensais que, de imediato, reagiam previsivelmente, destilando impropérios. Quando isso ocorria, Domingos saía de fininho e, na rua, embarcava no primeiro carro de praça que encontrasse - pois não dispunha de automóvel - rumo à usina, na busca de resolver o problema. Da mesma forma, quando arriscava ir ao Cine Rex, o engenheiro sentava estrategicamente na última poltrona, bem perto da saída. Era para evadir-se logo em caso de pane de energia e, mais do que depressa, seguir em direção à usina, onde contava com a ajuda de alguns operadores e eletricistas. Certa vez, como não via progressos significativos, um grupo de moradores mais exaltados, com cerca de 500 a 600 pessoas, aglomerou-se na Avenida Curitiba decidido a aprontar um quebra-quebra. Sempre ligeiro, Domingos correu até a usina onde, no portão, desfraldou uma Bandeira do Brasil. Pouco depois, quando a malta enfurecida surgiu à frente do pequeno prédio, após destruir todas as lâmpadas de iluminação pública que havia pelo caminho, encontrou Domingos firme e corajosamente postado ao lado do portão. Como a condição era única, ou seja, passar por sobre o seu cadáver, a massa percebeu logo, felizmente, que não valia a pena ir tão longe, dispersando-se em seguida. As coisas só começaram a melhorar mesmo quando, no final de 1959 ou início de 1960, após tratar do assunto com o prefeito apucaranense Marino Pereira, Domingos articulou uma mobilização supra-partidária com lideranças dos quatro municípios e adjacências. O objetivo era conseguir que o governador de São Paulo, Carvalho Pinto, autorizasse o uso da energia produzida pela usina de Salto Grande, no Rio Paranapanema. Como o Paraná tinha uma parceria com São Paulo e já vinha utilizando parte dessa energia para abastecer Londrina e municípios vizinhos, foi possível, enfim, estender uma linha de transmissão até Apucarana. Com energia abundante, as queixas foram diminuindo e o fornecimento estável chegou logo depois, também, em Cambira, Jandaia do Sul e Mandaguari.

A primeira usina de energia a diesel, de Mandaguari, no final dos anos 40. O velho motor não agüentava muito e a cidade ficava sempre sem luz (foto: Akimitsu Yokoyama)

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A família segue em frente

N

a cidade de Mandaguari, os Romagnolo ainda recompunham-se da morte de Francisco quando Vicente, aos 18 anos, recebia convocação para servir ao Exército no Rio de Janeiro.

Francisco morreu antes de realizar o sonho de ser o senhor de suas terras

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Francisco morrera no dia 15 de maio de 1957, causando comoção na cidade: o coração que tanto o impulsionou rumo aos desafios durante toda a vida, tinha preparado uma surpresa. Justo quando estava às vésperas de alcançar o objetivo que tanto perseguira: ser o senhor de sua própria lavoura de café, plantada com o capricho que lhe era peculiar. Ele tinha adquirido, em 1953, 10 alqueires da Companhia Melhoramentos em São Tomé, perto de Cianorte. A família ficava em Mandaguari, porque Natalina não queria mais saber de mudanças. Ela julgava ser necessário, agora, dar atenção aos filhos, vários dos quais, já crescidos, começavam a pensar e a planejar o próprio destino. Francisco tivera o apoio da esposa, sim, para comprar as terras. Mas caberia a ele, certamente com a ajuda de alguns dos filhos, enfrentar o desafio de derrubar o mato, plantar café e viver todas aquelas dificuldades tão conhecidas dos tempos da fazenda em Londrina. Quem conhecesse Francisco, sabia que nada conseguiria detê-lo. Com pouco menos de 15 anos, Vicente passou a acompanhar o pai em suas idas ao sítio. Sempre companheiro e bem disposto, topava qualquer parada, até mesmo a aventura de uma viagem cansativa e demorada, cheia de solavancos, feita de automóvel ou na boléia de um caminhão. A estrada passava por Maringá, onde ia até o “Fim da Picada”, no Maringá Velho, seguindo dali para Cianorte. No caminho, via-se cafezais produzindo ou em formação, mas também muito mato que, em breve, cederia espaço para novas lavouras. Rapagão alto e forte, que pouco tinha viajado e, nos últimos anos, vivia embrenhado no mato, ajudando o pai a formar lavoura de café em São Tomé, encontrava-se diante de uma nova e decisiva fase em sua vida.


No Rio de Janeiro, mesmo com breves intervalos de tempo para passear e conhecer melhor a cidade, Vicente sentia-se fascinado pela modernidade, a beleza e o dinamismo do mundo que encontrara. Era tudo tão diferente do Paraná, onde o povo precisou rasgar floresta para fazer a vida e trabalhar duro. Na capital brasileira, sorvia-se com refinamento e estilo, em bares repletos de homens elegantes, o café produzido por gente encardida e sofredora lá no sertão. Com olhos curiosos e atentos a cada detalhe, encantou-se com o modo de viver dos cariocas, a arquitetura dos prédios e do casario, a orla aprazível e, é claro, o mar, que ainda não conhecia. Ao colocar-se diante do oceano, percebeu Vicente que os horizontes poderiam ser muito mais amplos do que imaginava para si. Tinha valido a pena, sim, exilar-se do Paraná: longe, encontraria motivação para, quando voltasse, ajudar a família a potencializar os negócios e a prosperar. Na cabeça, muitos planos para o futuro, os quais compartilhava em cartas que, regularmente, trocava com a mãe. ..... Assim, em 1958, ao retornar para Mandaguari, após cumprir o serviço militar, Vicente apresentava disposição redobrada para promover mudanças no ritmo da pequena chácara da família. Em pouco tempo, convenceu os irmãos de que dependeria de uma união, envolvimento e empenho ainda maiores, por parte de todos, para superar aquela vida difícil e buscar novas perspectivas. Os olhos de Vicente, no entanto, estavam voltados para a cidade. Não queria continuar por muito tempo ali na chácara e, sim, sonhava em ir atrás de seu futuro. O tempo ia passando e ele tinha consciência de que precisava definir sua vida, aproveitar as oportunidades que um município novo oferecia. A família, afinal, era grande e não sobrava muito para cada um. Na cidade, trabalharia algum tempo como encanador e pedreiro. Em novembro de 1959, após quatro anos de namoro, casa-se com Rosa, cuja família possuía uma chácara vizinha a dos Romagnolo, na Vila Vitória. Era ela uma das filhas de José Sophia, ex-cafeicultor e dono de um pequeno armazém de secos e molhados, situado na Rua René Táccola. Quando casaram-se, Vicente tinha como patrimônio único uma surrada bicicleta, sobre a qual costumava sair bem cedo à procura de serviço. Mas não demoraria muito para que, diante da idade avançada de Sophia, o genro Vicente, no vigor de seus 21 anos, juntamente com a esposa, assumisse o comando do estabelecimento, após adquiri-lo. Nessa época, a mãe Natalina seguiria os passos dos filhos que, aos poucos, iam migrando para a cidade. Sob seus cuidados, ela ainda tinha dois meninos pequenos: Álvaro e Francisco.

Construída em 1938, a velha igreja matriz (retratada por Akimitsu Yokoyama) receberia iluminação elétrica em 1949. Abaixo, Vicente e a esposa Rosa

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A Copel se estrutura em Maringá O escritório da Copel em Maringá, em 1956, ficava na Avenida Herval, 373. Foi o primeiro da empresa.

Parigot estruturou e imprimiu modernidade à empresa

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orria o ano de 1960 quando o então diretor da Copel, Pedro Viriato Parigot de Souza (que ocuparia a presidência de 1961 a 1970 e o cargo de governador do Estado entre 1971 e 1973), se viu diante da necessidade de mandar alguém para estruturar e coordenar as atividades da empresa em Maringá e região. Como a cidade crescia de forma acelerada, havia graves problemas com energia elétrica, razão pela qual suas lideranças faziam grande alarde na tentativa de sensibilizar o governo estadual. O desafio recaiu sobre os ombros do engenheiro civil Antonio Eriberto Schwabe, um catarinense bem preparado que já trabalhava como assistente de Parigot em Curitiba, e que prestaria serviços à companhia entre agosto de 1960 e janeiro de 1964. Logo ao chegar, Schwabe encontrou uma situação desanimadora. Apenas três motores estacionários a diesel, de funcionamento precário, estavam em condições de servir ao município. E, como estavam longe de conseguir atender a demanda, a cidade continuava sofrendo com a falta e o racionamento de energia. Com um relatório em mãos, Parigot prometeu ajudar, avisando que dois motores grandes, de segunda mão, tinham sido adquiridos de algumas unidades das Indústrias Matarazzo no Paraná. Após isso, contaram-se seis meses de aflitiva demora para Schwabe até que os mesmos fossem, enfim, trazidos e colocados em operação. Mesmo assim, a regional da Copel dependia da bondade e de favores de terceiros, pois nem sempre, ao final de cada mês, havia recursos para pagar o


combustível consumido pelas máquinas, comprado do Posto Maluf, de Alfredo Moisés Maluf. A única maneira era dar um “jeitinho”: receber dinheiro adiantado do Grande Hotel Maringá, por conta do consumo de luz, repassando imediatamente ao posto. O hotel, sob a gerência de Herbert Mayer, pertencia à Companhia Melhoramentos, que tinha interesse em ajudar. Para isso, a colaboração de diretores como Alfredo Nyeffler mostrou-se decisiva. Ainda assim, quando chovia muito e o caminhão de combustível não conseguia vencer o lamaçal e chegar até às máquinas, era preciso pedir socorro ao prefeito Américo Dias Ferraz que, lançando mão de motoniveladoras, tornava o caminho transitável. Os novos motores, que ficaram sob os cuidados do alemão Kurt, dono de uma oficina em Maringá (aquele mesmo que havia prestado importante ajuda ao técnico Eugênio Rosa logo que a empresa assumiu os serviços na cidade) resolveram grande parte dos problemas de Maringá e as coisas melhoraram, embora ainda houvesse muita gente brava. A Copel, com sua estrutura pequena e a solução modesta que havia trazido, estava longe ainda de contentar a todos. Portanto, as reclamações

Av. Getúlio Vargas em Maringá, no início dos anos 60

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O engenheiro Francisco Inácio de Oliveira, foi o primeiro superintendente da Copel em Maringá, entre 1956 e 1958. O segundo, João Laurindo Souza Neto, de 1958 a 1960. O terceiro, Antonio Eriberto Schwabe, no início dos anos 60, na outra foto, Schwabe em 2007.

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eram comuns e as pessoas revelavam impaciência quando lembravam que Londrina e municípios vizinhos já eram servidos de energia elétrica “de verdade”. Até mesmo um “enterro da Copel” seria organizado por estudantes, com caixão de defunto e tudo, para protestar contra a empresa. Não bastasse, quase sempre ouviam-se piadas e gracejos, em que se desdenhava da cidade. Repetia-se a história, inventada certamente, de um viajante que, ao retornar a seu destino após passar por Maringá, era indagado se a cidade possuia luz. “Não sei, passei por lá de noite”, era a jocosa resposta. Quando saía às ruas, Schwabe sofria pressões de toda ordem. Não escapava de enfrentar os mais exaltados, agindo sempre com muita cautela e parcimônia para não acabar no centro de uma briga. Mas nem sempre era assim: pelo menos uma vez sofreu atentado à bala que quase o matou. Certo dia, recostado distraidamente na parede frontal do escritório da empresa, na Avenida Herval, o engenheiro foi surpreendido por um tiro de revólver, que só não o atingiu por poucos centímetros, na altura do coração. Muito assustado, Schwabe nem chegou a ver o atirador, mas lembra ter sido protegido, na correria que se sucedeu, por um pistoleiro famoso em Maringá na época, chamado Aníbal Goulart. Algumas outras cidades do Norte do Paraná também já contavam com motores estacionários para geração de energia. Porém, determinou-se que a Copel, através da regional de Maringá, ficasse responsável, a partir de então, pelo fornecimento de energia também para Mandaguari, Marialva, Loanda e Santa Isabel do Ivaí, entre várias outras que vieram a seguir, as quais eram percorridas pelo engenheiro Schwabe em seu jipe. Em vários desses municípios, particulares tinham investido na construção de pequenas usinas hidrelétricas, movimentadas com rodões, aproveitando o curso dos rios, onde geravam energia para si próprios e algumas fazendas ao redor. Tais usinas, desprovidas de maiores recursos, operavam com dificuldades e não sobreviveriam por muito tempo. Às margens do Ribeirão Marialva, por exemplo, no município do mesmo nome, agricultores como Santo Calefi e Mário Meloni contavam com energia elétrica em suas propriedades. Na vizinhança deles, a família Megiatto chegou a manter um moinho de trigo por vários anos, ativado, igualmente, com energia ali mesmo produzida.


Em 1959, a Copel já respondia por Marialva, Jandaia do Sul, Apucarana, Mandaguari, Cambira, Pirapó, Mandaguaçu, Campo Mourão, Santa Isabel do Ivaí, Paranaguá, Guaratuba, Caiobá, Morretes, Antonina e Guaraqueçaba. Em 1960, a potência instalada da Copel somava apenas 4.724 kW, menor que a do DAEE, com 5.869 kW, mas era superior à capacidade de várias prefeituras que, até então, tinham um parque gerador da ordem de 2.524 kW. Esses números perdem significação se comparados, por exemplo, aos da Companhia Força e Luz do Paraná (CFLP), de 41.000 kW, ou mesmo da Companhia Elétrica de Londrina (9.120 kW). Até o início da década de 60, a produção de energia da Copel era pouca e de má-qualidade: 95% da produção ainda se apoiava em geradores diesel-elétricos que se encontravam em sua maioria em deplorável estado de conservação.

A construção da rede de alta tensão entre Londrina e Maringá

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Na cidade, Elias Kalaf colocara um motor diesel em operação na rua Santa Efigênia e vivia de vender energia para várias famílias, cobrando pelo número de bocais existente em cada casa. Maria Olga Malvezzi Lima, moradora da cidade na época, lembra que como a capacidade de geração era muito pequena, pedia-se que a eletricidade fosse consumida apenas com iluminação, evitando o uso, por exemplo, de ferro elétrico. Por algumas vezes, o presidente da Copel esteve em Maringá, reunido com prefeitos, para colocá-los a par dos avanços. Mas no início de 1961, Parigot de Souza chegou à cidade, recepcionado pelo prefeito João Paulino Vieira Filho, para trazer pessoalmente a notícia tão esperada por todos: Maringá e região, enfim, teriam energia elétrica abundante, proveniente da hidrelétrica de Salto Grande, a mesma que há anos abastecia Londrina e municípios próximos. Para isso, a empresa já havia iniciado a construção da rede de alta tensão até Maringá. Nesse sentido, propriedades rurais estavam sendo contatadas para a passagem da linha de transmissão, através de um complicado processo que enfrentava a resistência dos sitiantes. Debaixo dos fios, é claro, ninguém poderia plantar árvores e fazer construções. Em compensação, essas áreas já poderiam servir-se de energia elétrica, como foi o caso da Fazenda Ubatuba, no município de Apucarana. Aberta pela família Schindler, de origem alemã, durante os anos 40, a propriedade especializou-se na produção de café e, com energia de sobra, deu-se ao luxo de providenciar até mesmo um cinema para seus empregados. Em Mandaguari, o produtor rural Attílio Genta criaria uma padrão de referência para outros agricultores, pela maneira equilibrada como conduziu o assunto com a empresa, chegando a bom termo sobre a passagem das linhas por suas terras. Enquanto puxava a rede de alta tensão em direção a Maringá, a Copel cuidava de substituir os postes de madeira, nas cidades, por similares de concreto. Para esse trabalho, que era

Linhas de alta tensão, puxadas a partir de Londrina, permitiram que Maringá e dezenas de municípios da região, tivessem energia elétrica abundante. Ao mesmo tempo, postes de madeira (ao lado) eram substituídos por postes de concreto. A Fazenda Ubatuba (página ao lado) passou a contar com eletricidade bem antes de muitos municípios do Norte do Paraná

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Em Maringá, a energia elétrica estável permitiu que famílias, ainda nos anos 60, tivessem acesso a uma grande novidade: a televisão. Na outra página, detalhe da construção da subestação da Copel, no jardim Alvorada, inaugurada em 1962

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todo manual, a empresa enviou um contingente de aproximadamente 300 trabalhadores, chefiados por um engenheiro de nome Ophir. O principal fornecedor desses postes, até então, era a Cavan, sediada em São Paulo, que havia instalado uma unidade em Apucarana, onde era representada por alguns engenheiros, entre eles Carlos Amazonas de Almeida, o qual costumava estar, com freqüência, em companhia de Antonio Eriberto Schwabe. Não demoraria muito tempo, portanto, para que Maringá experimentasse o conforto de usar energia elétrica “de verdade”, como se dizia, livrando-se dos barulhentos motores a diesel. No final de 1962, o governador Ney Braga presidiria a solenidade oficial de inauguração da subestação da Copel, situada no Jardim Alvorada. Uma segunda subestação, situada na confluência das Avenidas Colombo e São Paulo, viria pouco tempo depois. Com tudo isso, a cidade, a exemplo de toda a região, deslanchou em seu desenvolvimento, pois não ficaria mais à mercê de um conjunto de motores sucateados que, vez ou outra, apresentavam algum tipo de defeito. A regional contaria, a partir de então, com uma estrutura adequada e os préstimos de uma equipe chefiada por um dedicado eletricista conhecido por Zé Coco. O engenheiro Schwabe, que ocupava uma casa alugada na Avenida Tiradentes, ao lado da residência do comerciante de combustíveis Alfredo Moisés Maluf, lembra que, aos poucos, a população foi se esquecendo dos tempos difíceis e se simpatizando com a Copel, cuja imagem se firmava positivamente a cada dia. Nem todo mundo, no entanto, apreciou a chegada da luz. Após adentrarem à casa de Schwabe, enquanto este encontrava-se em viagem com a família, ladrões fizeram questão de deixar uma frase escrita em cartaz: “No escuro se age melhor”. Encontrar uma solução definitiva para o abastecimento de energia elétrica em larga escala seria o maior desafio para a Copel durante a década de 1960. A história da empresa relata que a entrada em operação em 1963 da Usina Termelétrica de Figueira (20 MW), no Norte Pioneiro, foi de fundamental importância para a implantação do Plano Estadual de Eletrificação, viabilizando os sistemas de interligação que beneficiaram as regiões Norte e Central do Paraná.


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Para proteger a arborização e reduzir o risco de apagões, Maringá foi a primeira cidade do País a contar com “linhas verdes”

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Em 13 de dezembro de 1996, o superintendente regional de distribuição da Copel em Maringá, Victor Hugo Marmelo Passos, entregou ao prefeito Said Ferreira os 370 quilômetros de rede elétrica primária de alta tensão, formada por linhas compactas protegidas, as chamadas “linhas verdes”. A instalação da rede somente foi possível graças a convênio entre Copel e prefeitura, dividindo meio a meio o investimento, de R$ 10,9 milhões. Com isso, Maringá conseguiu reduzir em 84% a freqüência e em 82% a duração das interrupções no fornecimento de energia. Da mesma forma, a poda das árvores foi diminuída pela metade.


Parte 3


Artefatos de concreto Com o passar das décadas, ao lavrar registros de nascimentos, cartorários cometeram equívocos que originaram vertentes para o sobrenome Romagnolo, como “Romagnole”, no caso de Vicente, e de “Romagnolli” para o seu irmão Álvaro.

Com 12 anos, Álvaro foi convidado a ser sócio de Vicente na ICACI

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omo o pequeno armazém em Mandaguari não propiciava renda que permitisse uma vida tranqüila, Vicente começou a diversificar os itens ali vendidos, passando a oferecer, além de alimentos em geral, também artefatos de cimento, como tanques de lavar roupas e pias de cozinha, que comprava para revenda. Arrojado, teve a iniciativa, ainda, de lidar com encanamentos, instalando bombas de água e produzindo lajes para vedar “bocas” de poço e de fossas negras, comuns em todas as casas naquela época. Com cimento, produzia também caixas d'água, a partir de formas e estaleiros que ele mesmo construía. Nessa época, o irmão Álvaro, com apenas 12 anos, seria chamado a ajudar no armazém, bem como em serviços de encanamento, tudo o que fosse aparecendo. Desse modo, a vida de Vicente acabou dando uma guinada, o que o levou a refletir sobre a oportunidade que tinha nas mãos. Se lidar com secos e molhados era um negócio incipiente e de retorno modesto, percebia, por outro lado, que havia uma forte demanda por artefatos de cimento, e não apenas de tanques, pias e lajes, mas também de muros e até calçadas. Assim, em 1962, ele venderia o estabelecimento comercial para montar, em sociedade com o irmão Álvaro, uma promissora empresa, a Indústria e Comércio de Artefatos de Cimento (ICACI). Para isso, com as economias que havia juntado, tinha sido possível comprar dois terrenos, com total de 1.236,50 metros quadrados, situados na rua Rocha Pombo, que pertenciam a José


Nóbile Rocha, o “Casquinha”. O negócio foi fechado no dia 27 de junho daquele ano. Como Álvaro ainda era menor de idade, apenas o nome de Vicente Romagnole permaneceria, por algum tempo, no contrato social da indústria. Isto porque a legislação não permitia que um menino fosse co-proprietário de empresa, o que somente seria possível após a sua emancipação. No entanto, mesmo tão jovenzinho, Álvaro trabalhava feito gente grande. À noite, quando voltava para a casa da mãe, suas roupas estavam sempre impregnadas de cimento. ..... Como se imaginava, a indústria começou suas atividades a todo vapor, produzindo um pouco de tudo. E, como a Copel ia ampliando sua atuação no processo de eletrificação, novas oportunidades apareciam. Atento, Vicente observou que, na cidade, começava a procura por postes destinados à instalação de caixas medidoras de energia elétrica nas residências, os quais, até então, eram improvisados com madeira. Mais do que depressa, organizouse para passar a produzir, também, pequenos postes com 6 metros de altura, os quais não dependiam de regulamentação específica por parte da Copel. Ao mesmo tempo em que pilhas de pequenos postes chegavam à Mandaguari para suprir a demanda dos moradores, a ICACI se impunha com seu produto. Vicente, então, desdobrava-se para vender, enquanto Álvaro ficava na fábrica, com os empregados, trabalhando na produção.

A empresa investiu na produção de postes residenciais para medição de energia

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O Paraná moderniza sua economia

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ritmo forte da ICACI se deu porque no período de 1961 a 1964, o Paraná seria transformado em uma economia mais moderna pelo governo Ney Braga, que imprimiu desenvolvimento ao interior de maneira nunca vista antes.

Governador Ney Braga

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O governador implantara um Plano de Desenvolvimento Econômico, projeto ousado de industrialização que se baseou em financiamento com recursos próprios do Estado. Para isso, foram criadas empresas como instrumentos de apoio a esse projeto de modernização, entre elas a Codepar (Companhia de Desenvolvimento do Paraná) - que mais tarde seria convertida no Badep (Banco de Desenvolvimento do Paraná) - e a Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar). Da mesma forma, para oferecer suporte a esse crescimento, a Copel seria completamente reestruturada. O governo estadual realizou, ainda, o primeiro esforço de ligação rodoviária do Norte cafeeiro ao litoral do Estado, permitindo a efetiva ativação do Porto de Paranaguá, bem como a integração física de “dois Paranás”: o do Norte cafeeiro e o dos tradicionais litoral e planalto curitibano. Em 1964, quando o regime militar assumiu o poder com um golpe de Estado, a proposta era de estabilizar a economia brasileira, debelar a inflação que ganhava contornos preocupantes e iniciar um novo ciclo de expansão do setor elétrico. Dessa forma, seria organizada uma estrutura de investimentos com recursos das próprias empresas, do governo e com financiamentos externos. Embora tivesse passado por duas fases preliminares, referentes à fundação em 1954 e ao período que se estendeu até 1960, a Copel começaria a execução efetiva dos planos de obras a partir de 1961, quando inaugurou uma terceira fase de ação. Vários fatores contribuíram para isso, como a decidida política do governo Ney


Braga, que assegurou à Copel os recursos da Taxa de Eletrificação que não vinha sendo liberada integralmente, como também parte do Fundo de Desenvolvimento Econômico, administrado pela então Codepar. Nessa terceira fase, a Copel daria início a um programa de emergência, visando a atenuar a crise energética, ao mesmo tempo em que seriam desencadeados empreendimentos de maior vulto. De acordo com as “Diretrizes Globais do Governo Ney Braga”, teria sido feita a ligação de mais de 415 mil usuários de eletricidade localizados no meio rural e periferias de cidades. Nesse contexto favorável, entre 1962 a 1967 os irmãos Romagnole dedicaram-se à fabricação de vários produtos, já contando com duas dezenas de empregados e conseguindo agregar outros terrenos ao espaço físico da indústria. Em maio de 1967, com a emancipação de Álvaro, este tornava-se, oficialmente, sócio de Vicente, o que ensejou mudança na denominação da pessoa jurídica para “Irmãos Romagnole Ltda”. Rosa, a esposa de Vicente, lembra que mesmo com a empresa em plena atividade e gerando vários postos de trabalho, não havia dinheiro e as dificuldades eram grandes, o que fazia o marido, preocupado, perder muitas noites de sono. Alguns anos antes, como a Copel havia começado a investir na substituição dos postes de madeira nas ruas das cidades, por similares de concreto, os irmãos, sempre atentos, mobilizaram-se no sentido de desenvolver um produto que atendesse às exigências da empresa, a qual precisaria adquirir grandes volumes. Foram feitos moldes de madeira de postes de 12 metros, versão “duplo T”, caprichando-se na qualidade do produto que, até então, era artesanal. Estes passaram a ser vendidos inicialmente para cooperativas, áreas de loteamentos e para projetos de eletrificação rural. Foram necessárias várias tentativas e consumido algum tempo até que, em 1965, a Copel se decidisse a experimentar os postes da Romagnole, os quais, ao final, foram bem aceitos. Com isso, a empresa iniciaria um bem sucedido histórico como fabricante de postes em larga escala e fornecedora para a companhia de energia elétrica paranaense. A produção desse item ganharia tanta importância que, em poucos anos, se tornaria o principal negócio da pequena fábrica, a qual não parava de crescer e ampliar o quadro de funcionários.

Álvaro praticamente cresceu dentro da indústria

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O ARQUIPÉLAGO As safras eram levadas por carreadores e caminhos de terra, pois estradas asfaltadas inexistiam em muitas regiões do Estado

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“O Paraná dos anos 60 era um arquipélago em todos os sentidos figurados, em que algumas 'ilhas' eram cercadas de carências absolutas: a energia elétrica era uma luxuosa raridade, com cidades à meia-luz: à medida em que a noite chegava, as lâmpadas acesas se transformavam em rubros tomates. O asfalto era uma distante promessa. Cidades como Medianeira e Matelândia eram meros povoados e a região era uma área sendo desbravada. O pó vermelho entrava pelo nariz, pela garganta, irritava os olhos e se entranhava irremediavelmente na roupa. O Norte do Paraná já estava em um estágio mais avançado e Londrina, Maringá e algumas outras poucas cidades já mereciam esse nome. Mas muitas outras estavam em plena adolescência, como Campo Mourão, Umuarama, Paranavaí. No Sudoeste, Marrecas, que recentemente havia mudado o nome para Francisco Beltrão, se digladiava com Pato Branco para se afirmar como centro regional, abandonando o apelido de 'Quilômetro 59', apenas um marco na estrada, que os patobranquenses maldosamente lhe atribuíam. A viagem pelas pequenas cidades que nasciam era uma aventura excitante pela trepidação econômica e cultural que se sentia no ar, mas profundamente incômoda pela trepidação dos velhos jipes e Rural Willys em estradinhas e carreadores maltratados. Marmeleiro, Planalto, Realeza, Salgado Filho, Vitorino e toda a região eram promessas, só promessas. Hotéis? Nem pensar. Em algumas cidades, nos hospedávamos em hospitais; em outras, na casa do prefeito ou de algum figurão local. Mas a economia e a política fervilhavam. As concen-


trações políticas e as visitas das 'autoridades' atraíam comitivas sempre amistosas, mas nem sempre pacientes: os indefectíveis memoriais com rosários de reivindicações locais eram entremeados com queixas diretas - e sem muitos salamaleques - de que o governo havia abandonado a região. Ouvia-se na fuça a impaciente cobrança da população. Estradas? É, havia algumas dignas dessa denominação. Ney Braga estava completando a Rodovia do Café, ligando o Norte à capital e ao porto por asfalto e serenando os ânimos separatistas dos adeptos da criação de um estado do Paranapanema. A partir de Maringá, asfalto nem pensar e no Norte Pioneiro, fora do eixo Londrina-Jacarezinho, idem. Escolas? A maior parte das cidades mal e mal tinha o ensino primário e o ginasial e freqüentar o ensino médio representava para os filhos das famílias das cidades pequenas embarcar em um microônibus e viajar dezenas de quilômetros para assistir aulas em um município vizinho, mais afortunado. Do já distante 1945, quando meu pai, o então capitão Castor, garbosamente fardado e conduzindo a família, desembarcou do trem da Rede Viação Paraná-Santa Catarina na minúscula Rio Negro até os dias de hoje, o Paraná se transformou sob nossas vistas e insinuou-se em meu coração até ocupá-lo por inteiro. (Trecho de “Máquina do tempo”, crônica de Belmiro Valverde Jobim Castor, professor universitário e membro da Academia Paranaense de Letras, publicado no dia 11 de março de 2007 na Gazeta do Povo)

Na foto de Akimitsu Yokoyama, o governador Ney Braga inaugurando o Colégio de Mandaguari, em abril de 1965

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Tudo era feito no braço

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s primeiros anos foram marcados por um ambiente de camaradagem entre Vicente, Álvaro e os funcionários: todos trabalhavam duro, sem hora para terminar a jornada diária, mas não perdiam as chances de se divertirem juntos.

Joaquim André, o funcionário número um; abaixo, o registro de outro dos primeiros colaboradores, Joaquim Mattias

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Grande parte dessa mão-de-obra, oriunda de fazendas de café do município e região, buscava na cidade melhores condições de vida e oportunidades de trabalho. Joaquim André, o primeiro a ser contratado quando a indústria abriu as portas, fazia de tudo um pouco e não costumava deixar serviço para mais tarde. Não imaginava, certamente, que seria o número um de uma equipe numerosa, que não pararia de crescer nos anos e décadas seguintes. Outros, naquele começo, foram sendo admitidos para formar uma equipe para a qual não havia “tempo ruim”, cuja principal característica era o envolvimento e a integral dedicação. Dentre os cinco primeiros estavam, além de Joaquim André, também Joaquim Mattias, Gilberto Dário, José André e Manoel Cardoso de Andrade, todos admitidos em 1963. Gilberto Dário, por exemplo, especializou-se na produção de ladrilhos, o que ajudou a ICACI a angariar prestígio. Ele sugeria formatos, desenhos e, com sua arte, possibilitou à empresa fabricar vários outros itens, como bancos de jardim, pias e vasos de granito, que ajudaram na diversificação dos negócios. Para isso, Dário valia-se de fotos que eram tiradas por Vicente durante viagens a São Paulo: de posse de uma pequena máquina fotográfica, este registrava tudo o que achava interessante e trazia para o


funcionário. Por sua vez, além de cumprir sua rotina diária na produção, o pedreiro José André, amigo de infância de Vicente, era também companheiro do patrão que, dirigindo um caminhãozinho, ia fazer entregas por tudo quanto era canto. À custa de penoso esforço braçal de ambos, o veículo era descarregado no destino. Quem também não encontrou moleza foi José Severo de Aquino, que entraria como pedreiro e fundidor em 1966. O corpo franzino do moço acostumado à lida na roça parecia agigantar-se quando da entrega de peças pesadas, como tanques. Mas, sem nunca queixar-se, ele vivia sorrindo e cultivava simpatia por Vicente, seu dileto amigo. De vez em quando, em fins de semana, a turma juntava as famílias e, viajando na carroceria de um caminhão, seguia para um dia festivo às margens de alguma represa. Seria assim também com Anastácio Quintanilha, admitido em 1969: serralheiro experiente, ele tinha a função de atuar no desenvolvimento de produtos de metalurgia. Como o trabalho na indústria era basicamente artesanal e sem muitas referências onde pudessem buscar um mínimo de conhecimento, esses homens tinham a tarefa de descobrir, eles próprios, a maneira de fazer. Então, punham a cachola para funcionar na concepção de moldes e matrizes, tudo feito à mão, que ia sendo aprimorado. Para que a empresa pudesse fabricar postes, por exemplo, um desses foi adquirido para ser inteiramente desmanchado: só assim podiam conhecer a configuração do esqueleto de ferragem que existia em seu interior.

Em meados dos anos 60, um registro com a primeira equipe. Na indicação, a partir da esquerda, Vicente e o irmão Álvaro

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Em 1967, com a maioridade de Álvaro (na foto abaixo, junto ao poste), este tornava-se oficialmente sócio de Vicente. Com isso, a empresa mudaria de nome: de ICACI para Vicente Romagnole e outro; no futuro, a denominação seria alterada para Romagnole Produtos Elétricos Ltda e, em seguida, para Romagnole Produtos Elétricos S.A. Abaixo, equipamentos como a monovia, desenvolvidos na própria empresa, trouxeram grande facilidade no manejo dos postes.

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Dessa forma, a ICACI foi conseguindo desenvolver tecnologia própria e, com o empenho dos funcionários, construiu um equipamento de fundamental importância para agilizar o trabalho em seu pátio: a monovia, usada para a remoção e o carregamento de postes. Até então, esses produtos, muito pesados, eram removidos no braço. Muitos outros funcionários entraram para a história da indústria, como Joaquim Gonçalves Guimarães e Moacir Salvador. Este último atuava na área de materiais elétricos quando, em 1977, foi adquirida a primeira empilhadeira, a qual ele, com orgulho, passou a manejar. Assim como tantos outros, Salvador também havia sido desamparado pelo café, cuja geada de 1975 - a mais devastadora do século - decretara o fim do ciclo dessa atividade no Norte do Paraná. Só em 1967 é que Vicente e o irmão Álvaro, sócios no empreendimento, conseguiriam equilibrar as finanças e pensar em crescer. Até essa época, praticamente tudo o que faturavam era para estruturar a empresa e pagar os funcionários. Naquele ano, a Copel inauguraria a Usina de Salto Grande do Iguaçu, de 15,6 MW, que atenderia o Sul do Estado.


Por algum tempo, Vicente Romagnole conseguiu ganhar dinheiro fazendo um bom aproveitamento de seu pequeno e velho caminhão, que viajava carregado para levar produtos a diversos municípios do Estado. Para não retornar vazio, foi usado durante algum tempo para trazer sucatas de metais, como cobre, alumínio e ferro, comprados por ninharia em depósitos, estabelecimentos comerciais e propriedades rurais. Em Mandaguari, esse material era classificado e vendido para empresas, geralmente de São Paulo, que os reciclavam. Romagnole ficaria satisfeito se tirasse, com esse negócio, apenas as despesas de transporte do retorno. No entanto, descobriu que havia uma enorme procura por esse tipo de sucata, cotada a preço convidativo. Como encontrava quantidade abundante para comprar em várias regiões do Paraná, auferia lucro razoável. Tanto que, com apenas duas ou três viagens conseguia juntar dinheiro suficiente para comprar um outro caminhão. Com o tempo, os volumes foram diminuindo, ao mesmo tempo em que esse mercado tornou-se mais concorrido. A indústria também engordaria sua receita, entre 1967 e 1968, com uma atividade que complementaria a programação de trabalho: a fabricação de postes para sinalização de trânsito, o que incluía elaboração de placa e letreiro de propaganda. Tudo começou quando os irmãos foram procurados, certa ocasião, por um vendedor de publicidade, que apresentou a proposta, considerada interessante. O vendedor, então, passou a percorrer a cidade e os municípios da região, divulgando a novidade e fechando muitos contratos. Quem anunciasse, teria o nome de sua empresa afixado em uma placa de sinalização de trânsito, colocada, obviamente, em ruas de maior movimento. O sucesso seria tão grande e rápido que isto ajudaria a alavancar a empresa dos irmãos, cujos trabalhadores se desdobravam para atender aos inúmeros pedidos que iam chegando. A certa altura, cerca de 35 municípios já contavam com esse serviço em suas ruas, mas o negócio não iria adiante. Conhecedores do trabalho no café e aprendendo cada vez mais sobre os segredos do comércio, os irmãos já tinham, também, assimilado muita coisa sobre trânsito. Mas este, decididamente, não era o seu negócio.

Vicente: embora evoluindo no segmento de postes, a indústria não deixava de buscar outras oportunidades

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Trabalhando como nunca

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o ano de 1965, em que Paulo Cruz Pimentel sucedeu a Ney Braga no governo do Paraná, a sociedade brasileira ainda tentava absorver o impacto da revolução militar de 31 de março de 1964, que mudara os rumos do País.

O governador Paulo Cruz Pimentel

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Isso inquietou os donos da Romagnole, que precisavam realizar investimentos contando com a fluidez dos pagamentos por parte do governo estadual, que controlava a Copel. Como Pimentel havia feito um bom trabalho como secretário da Agricultura na gestão de Ney Braga e sua principal proposta era a continuidade dos programas de expansão econômica, a sinalização foi clara para os irmãos. Sem hesitar, estes recorreram a recursos que estavam sendo disponibilizados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), por meio do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE). A decisão foi acertada porque, de fato, a administração de Paulo Pimentel deu seqüência à anterior, avançando com os programas desenvolvimentistas. O governador estenderia para várias outras regiões do interior o serviço de luz e energia, o que foi importante para a empresa de Mandaguari, que trabalhou como nunca, na condição de fornecedora de postes. Ainda na área de energia, o governo de Paulo Pimentel colocou em funcionamento diversas usinas elétricas, como CapivariCachoeira e Júlio de Mesquita Filho, além da já mencionada Salto Grande do Iguaçu. Sobre a inauguração dessas usinas, dois fatos, relatados pelo próprio Paulo Pimentel, merecem ser contados. - O presidente Emílio Garrastazu Médici vinha para a inauguração da hidrelétrica de Capivari-Cachoeira no início de 1970 e Pimentel ficou apreensivo. Médici desceria em Curitiba e, em companhia do governador, seguiria de carro até Antonina, onde fica a usina. Era uma viagem de uma hora e meia. Acontece que o presidente só sabia falar de futebol. Como Pimentel não gostava tanto desse esporte, ficou imaginando sobre o


Ao lado do governador, o presidente MĂŠdici inaugura, em 1970, a Usina Capivariachoeira, com capacidade para 247 MW

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Usina Hidrelétrica Júlio de Mesquita Filho, construída no rio Chopim, município de Dois Vizinhos, representou a redenção das regiões Oeste e Sudoeste

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que poderiam conversar. Para ter assunto com o presidente e para que a viagem não ficasse monótona, o governador decidiu passar uma noite inteira lendo tudo o que podia sobre futebol, decorando nomes, times e fatos. - Ao inaugurar várias hidrelétricas, o Paraná era sempre destaque na imprensa. Mas isto foi ficando comum e já não rendia tanto: os jornais se limitavam a colocar apenas algumas linhas. Então, Paulo Pimentel sugeriu que uma das hidrelétricas tivesse o nome do jornalista Júlio de Mesquita Filho, herdeiro do fundador do jornal O Estado de São Paulo. Na época, o presidente da Copel, Pedro Viriato Parigot de Souza, foi contra, dizendo que Júlio de Mesquita Filho nunca havia feito qualquer coisa pelo Paraná. Mas a inauguração renderia uma manchete de primeira página e foi assunto por uma semana no jornal. A “badalação” foi tamanha que governadores de outros Estados queriam saber por que o Paraná era tão divulgado. No caso da Júlio de Mesquita Filho, quando perguntado, Pimentel sempre sugeria que conversassem com Parigot de Souza. .... Até 1967, a Romagnole manteve a sua “miscelânia” de produtos, fazendo de tudo um pouco e mantendo como carro-chefe a fabricação de postes para fornecimento ao Estado. Porém, diante a necessidade de ajustar o seu foco e agregar novos itens ligados à área de energia, alguns artefatos de cimento, como lajes, tanques, postes residenciais de entrada e outros, de menor retorno financeiro, deixariam de ser


produzidos. Nessa época, a empresa contava com uma equipe de vendedores percorrendo o Paraná, os quais, após seus inúmeros contatos, retornavam para Mandaguari trazendo não apenas blocos de pedidos, mas também sugestões de novos produtos que haviam sido feitas pelos compradores. ..... As coisas iam acontecendo rápido para Álvaro que, em novembro de 1968, com pouco mais de 20 anos, casava-se com Ana Maria Sophia, sobrinha de sua cunhada Rosa, esposa de Vicente. Era também uma vizinha dos tempos de chácara, que Álvaro conhecia desde quando ela nascera, passando a infância juntos. Os irmãos carregavam a responsabilidade de comandar uma empresa que crescia de maneira acelerada, sempre contratando novos funcionários e ampliando seu espaço físico na Rua Rocha Pombo. Sem dizer que, um ano antes, ambos decidiram prestar apoio ao irmão mais novo, Francisco, que demonstrava interesse pelos estudos. Isto seria importante para ele e a própria empresa em seu futuro. Como a Romagnole havia se tornado fornecedora de razoável volume de postes para a Copel, numa época em que o processo de eletrificação se desenvolvia em todas as regiões do Estado, o trabalho era intenso e as oportunidades de novos negócios apareciam a todo instante, o que levava, forçosamente, a uma expansão. Mesmo sem uma formação acadêmica que pudesse oferecer-lhes um mínimo de conhecimento teórico para avançar nessa área industrial e superar desafios cada vez mais complexos, os irmãos, sempre ousados, mantinham-se atentos e receptivos à incorporação de novos produtos. Portanto, após deixarem de produzir alguns itens que demandavam grande esforço das equipes e não eram o foco da empresa, eles começaram a voltar suas atenções para produtos que tivessem afinidade com a eletrificação. Sim, pois percebendo a demanda que se manifestava através dos contatos e das sugestões trazidas pelos vendedores, viram que o melhor a fazer, naquele momento, seria ampliar o portfólio específico na área. Dessa forma, em 1969, os Romagnole começaram a produzir todo um conjunto de ferragens galvanizadas para uso na instalação da rede elétrica. O desafio se repetia: primeiro conseguiam peças que eram levadas ao funcionário Anastácio Quintanilha, contratado especialmente para o desenvolvimento de metalurgia, a quem cabia gastar “tutano” na busca de um jeito de fabricá-las, o que sempre acontecia. Para isso, o criativo Quintanilha usava sucatas e até mesmo peças de caminhão, concebendo matrizes que dariam origem a uma intensa linha de produção.

Álvaro e Ana Maria casam-se em 1968

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Governo Federal estabelece diretrizes

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mbora tivesse sido constituída em 1962, apenas a partir da década de 70 a Eletrobrás assumiria posição ativa no setor elétrico nacional. Nesse sentido, a postura e a atuação da estatal foram decisivas para a consolidação da nova estrutura produtiva e financeira do setor de energia elétrica. A política energética da Eletrobrás seria pautada por quatro itens: prioridade atribuída à opção hidrelétrica, em oposição à termoelétrica; estratégia de construir grandes usinas geradoras de alcance regional em termos de mercado consumidor; constituir-se em holding estatal e elaborar um padrão de financiamento do setor elétrico nacional, conjugando recursos de diferentes fontes: tarifária, impostos, empréstimos compulsórios e empréstimos do sistema financeiro internacional.

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Aliado a isso, no decorrer da década de 70, ocorreriam mudanças significativas no setor elétrico e nas atividades de planejamento energético em todo o mundo, entre elas o choque mundial do petróleo, em 1973. O primeiro choque mundial do petróleo não afetaria tão drasticamente a economia brasileira, devido ao chamado “milagre econômico” que, entre 1968 e 1973, levou o Produto Interno Bruto (PIB) a crescer a uma taxa média anual superior a 10%. O Brasil não escapou, porém, do segundo choque, em 1979, que teve reflexos importantes na economia nacional, destacando-se a aceleração do processo inflacionário, a redução das taxas de crescimento do PIB, o desemprego e o desequilíbrio das contas públicas. A redução do crescimento econômico fez com que a demanda energética apresentasse taxas declinantes, o que gerou capacidade ociosa no setor elétrico nacional. Isso implicou no aumento dos prazos de amadurecimento do capital investido e na diminuição da capacidade de auto-financiamento do setor. De acordo com especialistas, o impacto da percepção mundial da dependência do petróleo levou o mundo todo, pela primeira vez, a abordar o planejamento energético sob uma ótica multi-setorial, ou seja, integrando o setor elétrico e de petróleo. Além disso, buscouse uma maior interação entre oferta e demanda nos planos para o setor. ..... As eletroferragens, adquiridas em grandes volumes pela Copel, significariam mais um forte impulso para a Romagnole, que iniciava a década de 70 de maneira muito promissora. Nesse ritmo, imaginando que em poucos anos, provavelmente, as instalações da Rua Rocha Pombo se tornariam acanhadas, Vicente e Álvaro se depararam com a necessidade de transferir a fabricação de postes para uma área bem mais ampla e adequada a esse fim, no parque industrial do município. Para isso, sabendo que o governo do Estado dispunha de recursos para serem investidos no desenvolvimento da economia estadual através do serviço público, eles encorajaram-se a pleitear um financiamento ao BRDE (Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo-Sul), instituição que, por sua vez, representava o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Era preciso “pensar grande”, como se dizia na época e, assim, aproveitar o momento para consolidar a Romagnole como empresa fornecedora de produtos para

O processo de produção de ferragens impulsionou as vendas

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A fabricação de transformadores começou modestamente em um dos barracões da empresa

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eletrificação. Obtido o financiamento, foi possível então construir uma moderna estrutura de fabricação de postes em uma área de 75 mil metros quadrados, localizada no parque industrial situado na saída de Mandaguari para Maringá. Quando se fez a transferência desse setor, em 1975, continuaram em mais de 8.500 metros quadrados na Rua Rocha Pombo as atividades relacionadas à produção de eletroferragens e também alguns itens remanescentes da elaboração de artefatos de cimento. ..... Com duas unidades, a indústria conseguiria deslanchar ainda mais em seus negócios. No entanto, uma nova investida estaria sendo preparada para os próximos anos, de modo a ampliar o leque de produtos para eletrificação e garantir à empresa uma posição de destaque ainda maior em seu segmento. Tudo começou quando, em 1976, Álvaro, durante uma conversa com Vicente, lançou uma indagação: por qual motivo eles ainda não estavam fabricando transformadores? Sim, pois se haviam conseguido, com muita garra e talento, desenvolver tecnologia de produção de postes e ferragens afins, fornecendo produtos de qualidade reconhecida para um mercado exigente, certamente que também


fariam sucesso com transformadores. O emblemático questionamento de Álvaro suscitaria tamanha reflexão por parte de Vicente que este, enxergando aí uma nova e interessante oportunidade, decidiu sair atrás de alguém que entendesse do assunto. Claro, a complexidade que envolvia a fabricação de um transformador dependeria do conhecimento de uma pessoa especializada. Pois Vicente, em suas andanças, encontrou um engenheiro com esse perfil, o qual aceitou trabalhar com os irmãos mediante uma participação de 5% sobre a venda desses produtos. Começava assim, então, a aventura da Romagnole no novo segmento: inicialmente, os equipamentos eram bastante robustos, o que agradava aos clientes. Para produzir transformadores, a indústria montou um setor específico nos barracões da Rua Rocha Pombo e alguns dos funcionários, entre eles Anastácio Quintanilha, participaram do estágio

Robustos, os produtos encontraram boa receptividade no mercado

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inicial da fabricação. O engenheiro deu conta do recado e a empresa foi em frente, oferecendo ao mercado um produto de grande porte, sempre do mesmo tamanho. Com o passar dos anos, Vicente e Álvaro perceberam que era preciso aperfeiçoar o transformador: além de melhorar a qualidade, buscar meios de reduzir os custos, que ofereciam pouca margem de lucro, e também diversificar nos tamanhos, de modo a ampliar a clientela. Como o engenheiro não conseguia promover as mudanças necessárias, um outro profissional seria contratado pelos irmãos, o qual trouxe uma gama de novos conhecimentos que possibilitou à empresa, enfim, impulsionar a fabricação dos transformadores. Esse setor se incorporou com tamanha perfeição à estrutura da Romagnole que seu crescimento seria significativo nos anos seguintes, a ponto de levar os diretores a buscar um novo financiamento junto ao BRDE para a instalação de uma unidade própria, com 45 mil metros quadrados, inaugurada em 1979. Naquele ano, o irmão Francisco termina a sua faculdade de Engenharia Elétrica em Curitiba e passa a trabalhar nessa nova unidade, coordenando as áreas técnicas e de controle de qualidade. Ali, eram fabricadas peças de 5 a 5.000 kVA, nas classes de tensão de 15, 24 e 36,2 kV, destinadas a aplicações industriais, prediais e a linhas de distribuição urbanas e rurais. A empresa começou a exportar transformadores já em 1977

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Prestígio

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roduzindo postes, ferragens e transformadores em larga escala, a Romagnole se tornaria uma importante fornecedora da Copel, no Paraná, além de uma série de outras companhias de energia elétrica pelo País, sem contar prefeituras, loteadoras, cooperativas e empresas em geral. Além de diversificar e sofisticar a linha de transformadores, a Romagnole, em expansão, implantou unidades de fabricação de postes em Pato Branco-PR e Amélia Rodrigues-BA

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Os irmãos Vicente e Álvaro eram empresários que se destacavam, por suas realizações, em toda a região. Com as três unidades da empresa, já empregavam mais de mil funcionários e a perspectiva era de continuar crescendo. A marca Romagnole havia angariado prestígio nacional e a demanda por seus produtos impunha um ritmo veloz, como nunca se tinha visto. Em 1982, os irmãos decidiram investir na expansão dos negócios, instalando unidades para fabricação de postes em outros Estados, visando a aproveitar oportunidades que surgiam. Começaram por Pato Branco, no Paraná, onde a demanda regional era intensa. Montou-se, então, uma empresa no comando da qual permaneceriam por cerca de cinco anos. Ainda em 1982, a Romagnole é convidada por duas companhias baianas para instalar-se naquele Estado, onde o desafio era avançar fortemente no processo de eletrificação rural. Com isso, chegaria ao município de Amélia Rodrigues,


próximo a Feira de Santana, onde permaneceu por aproximadamente dez anos, fabricando postes. Quando, em 1983, José Richa assumiu o governo do Paraná, a empresa, que já havia ascendido à condição de maior fornecedora da Copel, encontrava condições favoráveis para desenvolver-se ainda mais. Isto porque, no setor de energia elétrica, o governo de Richa foi marcado pela execução do mais ambicioso programa de eletrificação rural já realizado no Estado, o Clic Rural, que ligou 120 mil propriedades no prazo de quatro anos. Até então, apenas 20% dos imóveis existentes no campo contavam com luz elétrica, índice quase quatro vezes menor que os de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Entendendo que o grande obstáculo para a expansão das redes elétricas no meio rural era o seu custo de construção e instalação, que resultava em um elevado desembolso para o agricultor, José Richa determinou à Copel estudos para simplificar e baratear tais projetos com o uso de técnicas, materiais e equipamentos alternativos, capazes de tornar o serviço acessível, mas sem comprometer os requisitos de segurança e desempenho. O resultado foi um corte praticamente pela metade dos custos até então praticados, com a adoção, por exemplo, das linhas elétricas monofilares (redes com um só cabo condutor em lugar dos três habituais). Só com o emprego dessa técnica seria possível atingir uma redução de 32% no custo de construção. Adicionalmente,

Com o Programa Clic Rural, o governador José Richa impulsionou o processo de eletrificação a um grande número de regiões ainda desassistidas no interior

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Em quatro anos, cerca de 120 mil propriedades rurais passaram a contar com energia elétrica

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um financiamento do Banco Mundial de US$ 104 milhões possibilitou à Copel financiar os agricultores no pagamento da sua parte no custo da ligação, o que levou a um número expressivo de interessados a aderir ao programa. Durante os quatro anos do governo de Richa, a Copel construiu 50 mil quilômetros de linhas e redes elétricas rurais o equivalente a uma volta em redor da Terra e elevou o índice de eletrificação do Estado para 50%. Nas diversas solenidades de inauguração de obras do Clic Rural de que participou, Richa sempre destacava a necessidade de oferecer ao homem do campo conforto, bem estar e meios de melhorar a produtividade como formas de evitar o êxodo rumo às cidades. Uma das frases preferidas do governador nessas ocasiões era o lema do programa americano de recuperação social e econômica daquele país após a grande depressão de 1929, o “New Deal”, idealizado pelo presidente Roosevelt: “Em cada propriedade um poste, em cada panela uma galinha”. Além do Clic Rural, Richa criou também o programa Clic Urbano, que atenderia mais de 60 mil famílias de baixa renda, moradoras nas cidades. Em seu período, o governador enfrentou dois eventos climáticos de forte impacto no Estado, que tiveram reflexo na área de geração de energia da Copel: a grande enchente do rio Iguaçu, em 1983, e a longa estiagem entre 1985 e 1986.


No ano de 1985, uma nova unidade Romagnole seria implantada em Pindamonhangaba-SP, para a fabricação de postes. E, em 1987, Francisco assumiria o cargo de Diretor Industrial. Até o final daquela década, a economia brasileira passaria por grandes dificuldades em razão do descontrole da inflação que, em alguns períodos, chegou a 80% ao mês. Com isso, companhias de outros Estados que compravam produtos da empresa, demoravam para efetuar os pagamentos. O País vivia um momento de incertezas com sua economia instável, em que as organizações não conseguiam planejar-se, enquanto muitas outras fechavam as portas. Tal situação alarmou a Romagnole, que se via, ainda, dependente do faturamento resultante das vendas para grandes companhias estatais de energia. Em paralelo a esse cenário preocupante, era cada vez mais comum ocorrer uma “ressaca” quando de mudanças no âmbito dos governos estadual e federal: após eleitos, governantes colocavam em segundo plano os compromissos financeiros assumidos anteriormente, que apenas eram honrados após exaustivas e demoradas gestões. Diante disso, tornou-se imprescindível diversificar a clientela, sob pena de a empresa entrar em dificuldades. Vicente e Álvaro decidiram, então, reavaliar o foco, direcionando parte das vendas para o mercado privado, através da ampliação de uma rede de representantes em vários Estados. E, ao mesmo tempo, investir na exportação de produtos como transformadores e ferragens, confiando em sua qualidade e competitividade, o que viria a acontecer em escala crescente a seguir.

Álvaro Fernandes Dias, que foi governador do Paraná entre março de 1987 e março de 1991, também foi responsável por avanços do setor de energia elétrica no Estado. Em seu governo, foi viabilizada a Usina de Segredo e ampliado o atendimento com energia, realizando-se 252 mil ligações residenciais urbanas, 80 mil rurais, 27 mil comerciais e mais de 5 mil para novas indústrias. Além disso, foram implantados 940 km de linhas transmissoras, 67 novas subestações e ampliada a potência de outras 357. As obras da Usina do Xisto, em São Mateus do Sul, abriram perspectivas de desenvolvimento industrial para a região.

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Durante alguns anos, a Romagnole atuou no segmento de pré-moldados, fornecendo estruturas de concreto para diversos fins nas áreas urbana e rural. No início dos anos 80, inclusive, a empresa aproveitou-se do “boom” do setor sucroalcooleiro do País, sendo fornecedora de pré-moldados para a implantação de várias usinas no Paraná, como a de Cidade Gaúcha. Na foto abaixo, um dos veículos da empresa de transportes Ana Rosa, de propriedade da Romagnole, surgida para suprir as necessidades da empresa no escoamento da produção rumo às diferentes regiões do País

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Começa a privatização...

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e acordo com especialistas, as soluções para os problemas enfrentados pelo setor elétrico no final dos anos 70 e em toda a década de 80 foram se delineando no sentido de mudar qualitativamente a atuação do Estado no setor. Dessa forma, a nova estrutura construída na metade dos anos 80 esteve voltada para a diminuição da participação e intervenção direta do Estado, substituindo-a pela função de agente regulador e financiador. Isso seria o sinal verde para o processo de privatização. O entendimento é que não se pode atribuir apenas à crise econômica o motivo da diminuição da participação do Estado no setor elétrico. Durante os anos 90, a "onda neoliberal" que tomou conta do cenário econômico mundial, em decorrência da queda do socialismo e do fenômeno da globalização, aliada à ineficiência das companhias por ingerências políticas, fizeram com que no Brasil o setor elétrico seguisse em direção à privatização.


Em vista dessas mudanças e também da instituição de um aparato legal em favor da privatização, a década de 90 seria marcada pela competição. Analistas explicam que a implantação de um novo modelo setorial, privilegiando a busca de competição, onde ela fosse possível, bem como a atração de investimentos privados, valorizaram em excesso a atividade de auto-regulação do mercado, relegando a um segundo plano a formulação de políticas energéticas e também a realização de exercícios de planejamento. Isto ocorreria não apenas no Brasil, mas também em alguns outros países que passavam por esta mesma transição na organização de indústrias de suprimento de energia. No Paraná, os avanços técnicos e as vantagens econômicas advindas do Clic Rural, seriam mantidas e ampliadas pelo governador Roberto Requião no programa de eletrificação desenvolvido em seu primeiro mandato, iniciado em 1991: o Força Rural. Para realizar 50 mil novas ligações a custos acessíveis em quatro anos, Requião inovou introduzindo a equivalência em milho, mecanismo destinado a proteger o agricultor contra a variação dos índices oficiais de correção monetária. Assim, o valor da parcela mensal financiada pela Copel era convertido em sacas de milho pelo preço de comercialização do dia e, no vencimento, a prestação era atualizada segundo os índices oficiais e pelo critério das sacas de milho, permitindo que o agricultor pagasse o valor menor. Outra inovação importante adotada por Requião foi permitir aos agricultores beneficiados que se organizassem em mutirões para ajudar na construção das redes de distribuição de energia, reduzindo o custo da obra e, por conseqüência, o valor a ser desembolsado.

O governo Requião inovou ao implantar um sistema de equivalência em milho para que os proprietários rurais pudessem custear suas ligações

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Em 2001, País viveu período de desabastecimento e, no Paraná, governo estadual tenta vender a Copel

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Nesse período, o Brasil passaria por profundas transformações no setor elétrico. O governo de Fernando Henrique Cardoso implantaria a livre concorrência para promover a eficiência no setor, com regulação e fiscalização, visando a garantir transparência para atrair o capital privado. A perspectiva era de privatizar praticamente todo o setor de distribuição de energia elétrica como condição necessária à alocação de recursos, a criação de um programa de termelétricas (Programa Prioritário de Termelétricas - PPT) e a implantação do Mercado Atacadista de Energia (MAE). Seria então criada a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) como agente regulador do setor. O novo modelo para o setor elétrico não chegou, porém, a ser totalmente implementado nos oito anos do governo FHC, visto que o processo de privatização não foi concluído, da mesma forma que o PPT se resumiria a uma idéia que sequer saiu do papel. Além disso, mantiveram-se incertezas regulatórias, o que desestimularia o investimento privado. Para completar, o governo ainda enfrentaria uma crise de desabastecimento de energia em 2001, deixando evidente a fragilidade do setor. Diante disso, o governo se afastaria do exercício de planejamento energético, acreditando que o mercado poderia resolver tudo. .... O ano de 2001, aliás, foi especialmente importante para o setor energético do Paraná, ente a possibilidade de venda da Copel. No entanto, a mobilização popular reacenderia a discussão no País sobre as privatizações e acabou freando o processo de venda da empresa, articulado durante o governo de Jaime Lerner. Pode se dizer que o obscuro processo de privatização da Copel recebeu um banho de luz e cidadania, como publicou a Revista Confea/PR. Vender a Companhia, afinal, não foi tão fácil quanto o governo do Paraná imaginava. E por um simples fato: ninguém contava com a ampla mobilização da sociedade em torno do assunto e nem com a interferência direta de especialistas no setor de energia elétrica, como fez o CREA-PR. A novela, que demoraria vários meses, passou por capítulos que mostraram tanto tentativas desesperadas do governo do Estado de vender a Copel como comemorações populares momentâneas por vencer algumas etapas da briga contra a privatização. Na verdade, as movimentações do governo do Estado para privatizar a empresa começaram atribuladas e num cenário bem pouco recomendado para uma operação comercial dessa magnitude. De um lado, o governo federal já havia suspendido o processo de privatização desse setor, visando a não comprometer ainda mais o vexaminoso quadro do apagão nacional. De outro, o cenário internacional - pós atentado terrorista nos Estados Unidos da América - mostrava que o momento não era propício ao fechamento de grandes negócios com investidores estrangeiros: a moeda estava desvalorizada e a segurança econômica mundial inibia a oferta de


potenciais compradores. Dizia-se que a importância estratégica da Copel está para o Paraná assim como Furnas e Itaipu estão para o Brasil. No dia 11 de junho, uma marcha com 40 mil pessoas contrárias à venda da Copel cercou a Assembléia Legislativa durante ato de entrega de 40 mil assinaturas do primeiro projeto de iniciativa popular a tramitar em um legislativo estadual no País. No entanto, em setembro, o governo do Paraná anuncia o preço mínimo para o leilão, de R$ 4,324 bilhões. O Fórum Popular contra a Venda da Copel, com mais de 400 entidades, contesta o valor e diz que a empresa vale pelo menos R$ 35 bilhões. A Copel é considerada uma das mais rentáveis e lucrativas empresas do setor energético brasileiro. Quando foi assinado o decreto de desestatização, em setembro de 1999, a companhia anunciava um lucro, referente ao exercício anterior, de R$ 403 milhões. Com 5 subsidiárias, responsáveis pela geração, transmissão, distribuição, comunicações e participações em outros empreendimentos, a empresa já representava 10% de toda a demanda de pico no Brasil, com 4.545 MW/hora. Um quinto de toda a energia de suas 18 usinas já era destinada para outros Estados, sendo 95% de sua energia de origem hidráulica, permanente e renovável. Além de tudo isso, a Copel dispunha de um potencial hídrico remanescente de 17 mil MW, bem superior à capacidade de Itaipu, e mantinha em suas barragens um volume extraordinário de água. No Paraná, existe em abundância o cobiçado vetor de geração de riquezas. Como foi dito, produz-se 30% além da demanda de consumo interno do Estado, excedente que é destinado a cobrir o pico da demanda nacional. Portanto, a conscientização popular contra a venda da Copel não ocorreu por acaso. As mais de 400 entidades representativas investiram na realização de dezenas de debates e palestras como forma de instrumentalizar a população contra a privatização. Cerca de 98% dos eleitores do Paraná opinaram contrariamente à alienação das ações, durante um plebiscito, mesmo sem valor legal, exercendo a cidadania como jamais tinha sido visto na história política do Estado. As batalhas travadas em várias frentes - tanto jurídicas como políticas - somadas à determinação de centenas de entidades nacionais em apontar o erro estratégico que estava sendo cometido contra o desenvolvimento social e econômico, transformaram-se nos principais escudos do povo paranaense contra a venda da Copel. Além disso, as entidades integrantes do Fórum foram orientadas a republicar a lista com nome e foto dos “28 deputados traidores” que votaram contra o projeto de iniciativa popular. Numa fase seguinte, o Estado buscou retomar o papel central das decisões no setor elétrico, não como uma volta ao passado, mas tentando encontrar a melhor forma de

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A Usina de Figueira é a única termelétrica entre as 18 centrais de geração próprias da Copel, as demais são todas hidrelétricas. Inaugurada em abril de 1963, tem capacidade instalada nominal de 20 MW (megawatts) dividida em dois grupos geradores, e 14 MW médios de energia assegurada. Comparativamente, essa capacidade de geração equivale ao consumo de uma cidade com 70 mil habitantes.

Com quatro unidades em operação, 24 mil postes são produzidos por mês

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intervenção no setor por meio de políticas energéticas adequadas, regulação e planejamento. Na opinião de especialistas, o Brasil revela uma tendência de voltar a intervir na política energética em maior grau do que se vê em outros países. Com o novo modelo do setor elétrico nacional, implementado no primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Ministério de Minas e Energia (MME) passou a ser o poder concedente e centralizador das decisões do setor. Tem ele a responsabilidade pela escolha dos dirigentes dos órgãos responsáveis pela operação do sistema elétrico, assim como pelas licitações de compra de energia das geradoras pelas distribuidoras. A partir de então, as empresas só podem comprar energia por meio de licitações pelo menor preço. O objetivo é oferecer, no futuro, menores tarifas ao consumidor. Outra mudança implementada pelo governo Lula ocorreu na área de prestação de serviços no que refere a estudos e pesquisas, destinadas a subsidiar o planejamento do setor, que passa a ser feita pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), criada a partir da Lei 10.847/04. Nesse novo modelo, todos os esforços estão voltados para a modicidade tarifária e a estabilidade regulatória, numa tentativa de atrair investimentos. Avançando em seu projeto de expansão, a Romagnole implanta em 2002 uma unidade de fabricação de postes na cidade de Cuiabá, Mato Grosso. No ano seguinte, adquire uma estrutura montada, para o mesmo fim, no município de Itaboraí, Estado do Rio de Janeiro. Essas duas novas plantas, somadas às de Mandaguari-PR e Pindamonhangaba-SP cada uma delas com área de 60 mil metros quadrados em média - atendem a um raio de 400 quilômetros em suas regiões e elevam a capacidade de produção da empresa para 24 mil postes por mês. Já a área de eletroferragens, que coloca a Romagnole como líder nacional no setor, compreende a produção de cerca de 3 mil itens com a operação de duas fábricas em


Mandaguari, cidade que passou a sediar também um Centro de Distribuição. Com isso, o portfólio da empresa, além de toda a linha de alta tensão, inclui uma série de outros produtos complementares, como cabos de alumínio, parafusos e ferragens diversas. Por sua vez, a Romagnole chegaria também à liderança no segmento de transformadores de 5 a 30 kVa, produzindo em torno de 6 mil unidades mensais. No processo de fabricação em série desse tipo de equipamento, passariam a ser elaboradas 100 toneladas mensais, em média, de fio esmaltado, produto que deixou de fazer parte do leque oferecido aos clientes para atender exclusivamente o próprio consumo. Intensificada, a exportação de transformadores e ferragens chegaria ao final de 2006 atingindo cerca de 30 países das três Américas, Caribe e Oriente Médio. O mercado externo - para o qual a empresa começou a direcionar seus negócios a partir de meados dos anos 80 - ganharia tamanha importância para a empresa que absorveria 25% do volume total atualmente produzido. Do restante, 40% são direcionados para companhias estatais de energia de vários Estados e 35% para consumidores do setor privado. Para atuar em condições de pronta-entrega no suprimento de transformadores e ferragens ao mercado norte-americano, a Romagnole teria a partir de 2004 a sua primeira unidade internacional, um Centro de Distribuição localizado em Houston, no Texas, Estados Unidos.

Acima, um dos itens da produção de ferragens; abaixo, embarque de transformadores

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Assim, com tamanha estrutura, a empresa chegou ao final de 2006 contabilizando um faturamento da ordem de US$ 130 milhões, montante que significava praticamente o dobro em relação ao total obtido em 2004, para se ter idéia do forte ritmo de crescimento - o que tem sido uma constante em sua história. Considerada a mais diversificada e completa organização em seu setor no País, a Romagnole vem sendo preparada para novos desafios, entre os quais a exigência de dobrar a capacidade de produção de todos os seus itens em curto espaço de tempo, de forma a responder com rapidez a um vigoroso crescimento da demanda. Afinal, tudo o que estiver relacionado a desenvolvimento da região e do País implicará, direta e necessariamente, na participação da empresa, por ser, a mesma, uma das principais provedoras de materiais e insumos voltados à infraestrutura para eletrificação. Desde crianças, na faixa entre 10 e 12 anos, Silvana, Alexandre e os primos Álvaro Márcio e Simone acostumaram-se a estar presentes nos corredores e setores da Romagnole, estimulados pelos pais Vicente e Álvaro. À medida em que iam crescendo, começaram a executar pequenas tarefas e a tomar gosto pelo trabalho, bem como as responsabilidades do dia-a-dia. Em 2004, um passo decisivo seria dado no sentido de direcionar a Romagnole para os novos tempos. De uma única unidade de negócios, a empresa seria segmentada em quatro divisões específicas: 1) fabricação de transformadores, 2) fabricação de postes, 3) fabricação de ferragens galvanizadas e, 4) Centro de Distribuição. Para avançar

Estados Unidos Houston

América Central África

Países da América do Sul Centro de Distribuição (CD) de Houston-USA

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Oriente Médio


ainda mais nesse objetivo, em agosto de 2006 o Grupo decidiu empreender uma importante mudança em seu capital, alterando-o de sociedade limitada (Ltda) para sociedade anônima (S/A), mas ainda sem acesso à participação de terceiros, o que poderá acontecer no futuro. Com Vicente na função de Diretor-Superintendente do Conselho de Administração e com Álvaro nos cargos de Diretor-Geral e Diretor-Presidente do Conselho de Administração, a empresa caminha para um novo salto em sua história, tendo à frente um horizonte repleto de oportunidades.

Em 2007, os irmão Vicente e Álvaro comandam empresa com 1.900 colaboradores que em 2006 faturou US$ 130 milhões

Uma iluminada história brasileira Ao deixar o Vêneto no final do Século XIX, atrás de melhores perspectivas de vida em terras brasileiras, a família Romagnolo avançaria para ser, duas gerações mais tarde, participante direta do processo de eletrificação do País. Para isso, pioneiros sonhadores como Francisco e sua mulher Natalina encorajaram-se a superar desafios no Estado de São Paulo e a enveredar pelo Norte paranaense, seguindo a bendita trilha do café. Da agricultura para o comércio, os filhos Vicente e Álvaro, sob a chama de um intrépido espírito empreendedor, forjariam uma nova realidade. Assim, as agruras dos primeiros tempos seriam os alicerces de uma empresa que nascia para ser uma das principais fabricantes de produtos elétricos do Brasil. São muitos os símbolos de coragem e de luta a referendar essa trajetória de sucesso. Desde o vapor a singrar o Atlântico, o duro trabalho nas lavouras cafeeiras, às mudanças de uma região para outra e o desbravar do sertão inóspito, descortinando oportunidades, o sonho jamais se perdeu. Agora, no alvorecer do Século XXI, a quarta geração da família assume o seu papel com uma visão ainda mais ampla. Dessa forma, páginas continuam sendo escritas com desenvoltura, paixão e sensibilidade, envolvendo mais de 1,9 mil outras famílias e movendo toda uma economia regional. De um extremo a outro, uma saga com personagens marcantes e cenários variados, o fio condutor de uma iluminada história brasileira. 76 10 133


Paraná aproveitou quase todo seu potencial hidrelétrico

A

construção de um grande número de usinas transformou o Estado, excluindo Itaipu, no terceiro maior produtor brasileiro de energia Lembrança de Sete Quedas, no Rio Paraná (acervo família Bacarin)

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O crescente número de barragens para construção de usinas hidrelétricas nos Rios Iguaçu, Paranapanema, Capivari e Paraná, causou perturbações ambientais e disputas por terras, até mesmo em reservas indígenas. Em 1982, o desaparecimento do Salto de Sete Quedas, imposto pela necessidade de formar o reservatório da represa de Itaipu, provocou intenso movimento de protesto. Sobre isso, em seu “Caderno de Idéias”, publicado no mês de dezembro de 2003, o jornalista Fábio Campana comenta que “Nos anos 70, o Estado passou a represar os rios e a construir grandes hidrelétricas. Afogamos Sete Quedas e as terras mais férteis do extremo-Oeste. Expulsamos população para o Paraguai e para o Norte. Alto preço para passar à condição de grande produtor de energia”. ..... O Paraná conta com um grande potencial hidrelétrico, muito bem aproveitado, especialmente no Rio Iguaçu, onde foram construídas várias hidrelétricas, entre elas as de Foz do Areia, Salto Osório e Salto Santiago. Próximo de Curitiba está a usina hidrelétrica de Capivari-Cachoeira, uma das primeiras construídas pela Copel. Mais recentemente foram construídas pequenas centrais hidrelétricas em vários rios de menor porte, como a de Chavantes e Vossoroca. No Rio Chopim, no Sudoeste do Estado, foi


construída a usina hidrelétrica de Júlio de Mesquita Filho. Mas está localizada entre Brasil e Paraguai, no Rio Paraná, a usina hidrelétrica de Itaipu, a maior do mundo, construída em conjunto com o país vizinho, e que fornece energia para vários Estados brasileiros. Tem capacidade para produzir 12.600 MW e só em 1991, quando foi concluída, instalou as últimas turbinas. Teve suas comportas fechadas em 12 de outubro de 1982 e a usina hidrelétrica foi inaugurada em 5 de novembro do mesmo ano, durante a presença dos presidentes João Baptista Figueiredo, do Brasil, e Alfredo Stroessner, do Paraguai. Devido à utilização de quase toda a sua capacidade instalada de megawatts, o Paraná é o terceiro maior produtor de energia elétrica do Brasil. Desde que Itaipu iniciou a produção comercial de energia, em maio de 1985, passou a pagar royalties aos governos dos dois países, conforme está previsto no Anexo C do Tratado de Itaipu, publicado no Diário Oficial da União, no Brasil, em 30 de agosto de 1973. O pagamento de royalties ao Brasil e ao Paraguai é uma compensação financeira pela utilização do potencial hidráulico do Rio Paraná para a produção de energia elétrica. No Brasil, em 11 de janeiro de 1991, entrou em vigor o Decreto nº. 1, discriminando a distribuição de royalties a Estados, municípios e órgãos federais, beneficiando principalmente os municípios mais afetados pelo alagamento de terras para a formação do reservatório. Com isso, os principais beneficiados foram o governo do Paraná e os 15 municípios paranaenses limítrofes ao reservatório de Itaipu. Calcula-se que de 1985 a 2007, Itaipu pagou ao Brasil mais de US$ 3,01 bilhões em royalties. No Paraná, os municípios que têm direito a recebê-los são: Santa Helena, Foz do Iguaçu, Itaipulândia, Diamante D’Oeste, Entre Rios do Oeste, Guaíra, Marechal Cândido Rondon, Medianeira, Mercedes, Missal, Pato Bragado, São José das Palmeiras, São Miguel do Iguaçu, Santa Terezinha de Itaipu e Terra Roxa. Também tem direito ao benefício o município de Mundo Novo, no Mato Grosso do Sul.

No ano de 1982, o Brasil colocou em operação, juntamente com o Paraguai a Usina Hidrelétrica de Itaipu, a maior do mundo, do gênero, localizada em Foz do Iguaçu-PR

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Final O presidente da Copel, Rubens Ghilardi, anunciou em junho de 2007 que a empresa pretende construir pelo menos dez Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) no Estado até 2010, numa soma total de geração de energia de 260 megawatts (MW). O investimento é de R$ 520 milhões.

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Para garantir crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) da ordem de 4% a 5% ao ano, o Brasil precisa aumentar sua capacidade instalada de geração de energia, que em 2006 era de 96,3 mil megawatts (MW) de potência. Segundo especialistas, a lição que ficou do racionamento de 2001 foi que ao longo dos anos anteriores a ele não houve a agregação de hidrelétricas no país com regularidade e nem um parque térmico de grande porte. O quadro atual não é muito diferente. Não há agregação de usinas hídricas e o parque térmico está inoperante por falta de combustível. O entendimento é que o Brasil precisa de mais térmicas para melhorar seu equilíbrio energético. Apesar de caras, elas são essenciais para dar segurança ao sistema. A questão do licenciamento ambiental, somada aos problemas relacionados com a preservação de terras indígenas, é tida por especialistas do setor como um obstáculo gigantesco para viabilizar obras que o próprio governo considera indispensáveis. ...


Ao relatar a trajetória da família Romagnolo, este livro homenageia a todos os imigrantes italianos e de outras origens que, à custa de sacrifícios, sofrimento e, principalmente, com muita coragem e vocação para o trabalho, contribuíram com suas gerações de descendentes para dinamizar e fortalecer a economia do Brasil. Seja de forma empreendedora ou, simplesmente, emprestando seu talento e força de trabalho à formação da sociedade e a cultura do País. O mesmo se pode dizer dos precursores da energia elétrica. Graças à sua inquietude e determinação, a humanidade experimentou um formidável processo de evolução que passou pela história de cada região, como o Norte do Paraná. Da mesma maneira que se olha, portanto, em direção aos novos tempos, é indispensável preservar a memória dessa aventura admirável, para que sirva de referência e lição de vida às próximas gerações.

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Referências - Copel Informações - edição especial - setembro 1979 - Site da Copel - “História da energia elétrica no Paraná” - Museu da Energia Elétrica - Curitiba-PR - Acervo família Romagnole - Mandaguari-PR - Acervo Akimitsu Yokoyama - Mandaguari-PR - Acervo Afra de Oliveira - Mandaguari-PR - Acervo Maurinho Piccioly - Maringá-PR - Acervo Paulo Cruz Pimentel - Curitiba-PR - Acervo Kurt Jacowatz - Apucarana-PR - Mandaguari, sua história, sua gente (1982) - Energia Elétrica no Brasil - Rio de Janeiro - Biblioteca do Exército Editora, 1977. - Paraná - Relatórios de Presidentes de Província ao Legislativo (Curitiba, 18541912 e 1927-1929). - Paraná em Páginas - Curitiba - 1941-1992 - Gazeta do Povo - Estado do Paraná - Diário do Paraná - Valor Econômico/CCEE (14/03/07) - Wilson, Sons - Ipardes - Prefeitura do Município de Maringá - Secretaria de Cultura - Divisão de Patrimônio Histórico e Cultural - Um Século de Eletricidade no Paraná, coordenado pela Profa. Dra Márcia Dalledona Siqueira (UFPR), Prof. Dennison de Oliveira (UFPR), Prof. Edson Armando Silva (UFPG), Profa. Dra. Etelvina Maria de Castro Trindade (UFPR) e Prof. Dr. Euclides Marchi (UFPR), resultado de convênio Copel-UFPR. - Departamento de Energia Elétrica da UFPR - Revista do Confea - Universidade Estadual de Londrina (UEL)



LEI DE INCENTIVO À CULTURA

MINISTÉRIO DA CULTURA

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