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5.5 Oportunidades de desenvolvimento profissional e colaboração

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5.8 Conclusão

5.8 Conclusão

Apoiar os professores na implementação de abordagens de estimulação cognitiva de forma eficaz pode beneficiar o Brasil

Pesquisas da OCDE destacaram os benefícios do uso de abordagens de estimulação cognitiva em Matemática para a aprendizagem dos alunos. Nessa abordagem, o professor faz perguntas que levam os alunos a pensarem sobre o problema, propõe desafios que incentivam uma reflexão mais cuidadosa, pede aos alunos que decidam sobre seus próprios procedimentos para resolver problemas complexos, apresenta questões para as quais não há uma solução imediatamente óbvia e que podem ser resolvidas de maneiras diferentes, apresenta questões em contextos diferentes, ajuda os alunos a aprender com os erros que cometeram e pede que expliquem como resolveram um problema.

As autoavaliações de professores e alunos na Talis 2018 e no Pisa 2012 sugerem um uso um pouco maior de técnicas associadas às abordagens cde estimulação cognitiva no Brasil do que em toda a OCDE. As evidências do Pisa em vários países, inclusive no Brasil, mostram que o uso dessa abordagem pode melhorar o desempenho em Matemática (Echazarra et al., 2016[48]). No entanto, implementar estratégias de estimulação cognitiva de forma eficaz pode ser desafiador e demorado, motivo pelo qual é provável que os professores sejam menos propensos a adotá-las quando relatam baixos níveis de autoeficácia ou trabalham em escolas mais vulneráveis ou em turmas indisciplinadas (OCDE, 2016[49]). Considerando o potencial de tais práticas no desempenho dos alunos, seria positivo para o Brasil dar mais atenção às abordagens de estimulação cognitiva. Isso inclui fornecer aos professores, e particularmente aos de escolas em contextos mais desafiadores, um treinamento mais eficaz para desenvolver suas habilidades nesse aspecto do ensino.

5.5 OPORTUNIDADES DE DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL E COLABORAÇÃO

Ao longo da carreira de um professor, os métodos pedagógicos, os currículos e o ambiente escolar provavelmente sofrerão mudanças. Ao mesmo tempo, as habilidades existentes precisarão ser atualizadas e sustentadas (Schleicher, 2016[40]). O Desenvolvimento Profissional Contínuo (DPC) e as oportunidades de colaboração36 podem atender a essas

36 Internacionalmente, o DPC abrange diversas atividades, incluindo treinamento formal e informal, mentoria e aprendizagem colaborativa com outros professores.

necessidades. Eles também oferecem uma estrutura na qual os professores podem refletir, com os colegas, sobre sua experiência de trabalho e integrar essa experiência com a aquisição de conhecimentos e habilidades adicionais. De acordo com os dados da Talis, três quartos dos professores que participaram de programas de desenvolvimento profissional relataram que tiveram um impacto moderado ou grande em seu ensino (Darling-Hammond, 2014[50]).

Os professores expressam grande interesse no desenvolvimento profissional

Quando questionados sobre as prioridades nos gastos com Educação, 95% dos professores no Brasil (ao contrário de muitos outros países) identificaram o desenvolvimento profissional como uma delas (média da OCDE: 55%) (OCDE, 2019[5]). Quando questionados sobre necessidades específicas de desenvolvimento profissional, os professores brasileiros respondem de forma semelhante aos de outros países da Latam e da OCDE, mas existem algumas diferenças. Os professores brasileiros dão mais importância para: ensino de alunos com necessidades especiais37; ensino em ambientes multiculturais; comunicar-se com pessoas de diferentes culturas; habilidades em Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC); cooperação entre pais e professores; e gestão e administração escolar (ver Figura 5.16). Essas preferências estão relacionadas a alguns dos atuais desafios discutidos neste relatório, como:

Necessidades especiais: seguindo a legislação de 2011, destinada a integrar mais alunos com necessidades especiais em escolas regulares, a proporção de escolas com mais de 10% dos alunos identificados como tendo necessidades especiais aumentou significativamente entre 2013 e 2018 (OCDE, 2019[5]). De acordo com o Pisa 2018, 10% dos professores dos Anos Finais do Ensino Fundamental, no Brasil, lecionam em escolas onde mais de 10% dos alunos têm necessidades especiais, semelhante à Colômbia (9%) e ao México (7%), mas muito menos do que no Chile (54%) e a média da OCDE (31%) (OCDE, 2019[5]). Os professores das escolas que possuem uma proporção maior de alunos com necessidades especiais fizeram maior uso das oportunidades de desenvolvimento profissional (OCDE, 2019[5]);

37 De acordo com a Talis, alunos com necessidades especiais são definidos como “aqueles que possuem uma necessidade especial de aprendizagem formalmente identificada em função de desvantagens físicas, mentais ou emocionais”.

Habilidades em TIC: esse interesse pode refletir um reconhecimento do potencial valor das TICs no ensino e aprendizagem em um contexto em que seu uso está atualmente subdesenvolvido, dada a relativa falta de infraestrutura de TIC nas escolas brasileiras (conforme discutido no Capítulo 4) ou em tarefas administrativas que consomem muito tempo dos professores;

Gestão e administração escolar: essa necessidade pode refletir uma aspiração a se tornar gestor escolar, um dos poucos caminhos para a progressão na carreira. Também pode refletir os desafios enfrentados por algumas escolas em áreas de nível socioeconômico mais baixo, onde a falta de recursos humanos e de capacidade técnica significa que os professores, muitas vezes, têm de assumir várias funções, incluindo a gestão escolar. Apesar de poucos professores brasileiros relatarem ser capazes de controlar efetivamente o comportamento indisciplinado ou de variar as estratégias de ensino em sala de aula (OCDE, 2019[5]), o desenvolvimento profissional contínuo voltado para a gestão de sala de aula e comportamento do aluno, competências pedagógicas ou ensino personalizado não estavam entre as principais prioridades dos professores no que diz respeito à formação profissional, de acordo com a Talis. Isso contrasta com as evidências nacionais e os relatos dos gestores escolares, que sugerem que a falta dessas habilidades é significativa para muitos professores.

Figura 5.16 Porcentagem de professores que relatam necessidade de desenvolvimento profissional nas seguintes áreas - 2018

Resultados com base nas respostas de professores dos Anos Finais do Ensino Fundamental

Brasil Média da OCDE

Ensino de alunos com necessidades especiais

Ensino em um ambiente multicultural ou multilíngue

Comunicar-se com pessoas de diferentes culturas ou países

Habilidades de TIC para o ensino

Cooperação professor-pai/responsável

Gestão e administração escolar

Comportamento do aluno e gestão da sala de aula

Abordagens para aprendizagem individualizada

Ensino de habilidades transversais

Análise e uso de avaliações de alunos

Práticas de avaliação de alunos

Conhecimento e compreensão da(s) minha(s) área(s) do conhecimento Competências pedagógicas no ensino da(s) minha(s) disciplina(s)

Conhecimento do currículo

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90

Fonte: (OCDE, 2019[21]), Banco de Dados da Talis 2018, https://www.oecd.org/education/talis/talis-2018data.htm (acesso em 14 de outubro de 2020).

A formação continuada, no Brasil, enfrenta desafios tanto na forma como é criada quanto nos obstáculos para adoção

Embora reconheçam sua própria necessidade de desenvolvimento profissional, segundo os dados da Talis, os professores brasileiros também identificaram vários obstáculos referentes à participação nos programas de formação continuada, incluindo a falta de apoio do empregador, os custos envolvidos, a falta de incenti-

vos e a incompatibilidade com seus horários de trabalho (ver Figura 5.17). Essas conclusões são corroboradas por evidências de pesquisas nacionais que relatam obstáculos, como a falta de incentivos, desconhecimento da oferta de formação continuada, pouca disponibilidade de tempo e falta de articulação com planos de carreira no contexto de alta rotatividade de pessoal (BCG e IAS, 2014[51]). Conforme observado anteriormente, metade dos professores dos Anos Finais do Ensino Fundamental, no Brasil, trabalha em meio período, muito mais do que na maioria dos outros países. Os professores de meio período podem ter pouco tempo para se dedicar à aquisição de novas habilidades e podem ver poucos benefícios em fazê-lo. Há uma exigência legal de que um terço das horas de trabalho dos professores seja dedicado a atividades extraclasse. Esse tempo inclui a preparação das aulas, correção de atividades e tarefas administrativas, que podem não deixar muito tempo livre para a formação continuada. Os relatórios nacionais também sugerem que poucas escolas e professores respeitam esse requisito legal (Presidência da República, 2008[43]).

Figura 5.17 Porcentagem de professores que identificam os seguintes obstáculos no desenvolvimento profissional - 2018

Resultados com base nas respostas de professores dos Anos Finais do Ensino Fundamental

Brasil Média da OCDE

Falta apoio do empregador

O desenvolvimento profissional é muito caro

Não há incentivos para participação em atividades que contribuem para o desenvolvimento profissional

O desenvolvimento profissional conflita com meu horário de trabalho

Não há desenvolvimento profissional relevante disponível

Não tenho tempo por causa das responsabilidades familiares

Não tenho os pré-requisitos (por exemplo, qualificações, experiência, senioridade)

0 10 20 30 40 50 60 70

Fonte: (OCDE, 2019[21]), Banco de Dados da Talis 2018, https://www.oecd.org/education/talis/talis-2018data.htm (acesso em 14 de outubro de 2020).

De acordo com uma pesquisa recente, as práticas de formação continuada, no Brasil, estão inadequadamente vinculadas à formação inicial de professores, a lacunas identificadas ou a avaliações docentes (Banco Mundial, 2016[11]). Raramente permitem que a didática seja observada e que seja oferecido feedback e, muitas vezes, são vistas como uma resposta compensatória às fraquezas, em vez de um veículo mais amplo de melhoria (BCG e IAS, 2014[51]). As novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores promovem oportunidades de formação colaborativa e baseada na prática em sala de aula e enfatizam a vinculação da formação continuada aos requisitos de Formação Inicial de Professores (FIP) e à nova Base Nacional Comum Curricular (MEC, CNE, 2020[52]). Embora isso seja promissor, não fica claro como as escolas, instituições de Ensino Superior e outras entidades serão responsabilizadas pelo cumprimento dessas diretrizes.

Três quartos dos professores brasileiros nunca observam as aulas dos outros para oferecer feedback

Na maioria dos contextos de trabalho, os profissionais desenvolvem e aprimoram suas habilidades observando os colegas e dando e recebendo feedback. Uma característica notável da profissão docente, na maioria dos países, é o isolamento em sala de aula, de modo que a maior parte do ensino é observada rotineiramente apenas pelos alunos e não pelos colegas. Esse obstáculo pode ser superado por meio de programas que incitem os professores a observarem uns aos outros no trabalho e façam comentários, o que ajuda no desenvolvimento profissional tanto de quem observa como de quem é observado (Vangrieken, 2015[53]). Infelizmente, esses programas são relativamente incomuns. Nos países da OCDE, 41% dos professores relatam que nunca observam as aulas de outros para avaliar o desempenho e oferecer feedback. No Brasil, três quartos dos professores dos Anos Finais do Ensino Fundamental (73%) e do Ensino Médio (74%) nunca o fizeram (OCDE, 2020[6]). Da mesma forma, uma pesquisa nacional concluiu que observar outros professores raramente fazia parte dos programas de formação continuada (BCG e IAS, 2014[51]). Por outro lado, no Vietnã, que reporta altos níveis de autoeficácia do professor e de desempenho dos alunos, quase 78% dos professores relatam que observam as aulas de outros, pelo menos, uma vez por mês (ver Tabelas II.4.1 e II.4.3 (OCDE, 2020[6]). No Brasil, há muito potencial para um maior uso da observação em sala de aula, aprendendo com as evidências e intervenções como a iniciativa do Ceará (ver Quadro 5.3), que mostra que a observação sistemática e o feedback podem ser utilizados para melhorar os resultados.

QUADRO 5.3 TREINAMENTO DE PROFESSORES DOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL E DO ENSINO MÉDIO NO ESTADO DO CEARÁ

O programa cearense foi concebido como resposta a duas questões principais que afetam a qualidade do ensino e da aprendizagem no Brasil: tempo letivo limitado e baixo nível de envolvimento dos alunos. O programa de treinamento de nove meses para professores dos Anos Finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio forneceu suporte e estratégias práticas para o planejamento de aulas, a gestão da sala de aula e como manter os alunos engajados. O programa envolveu os coordenadores pedagógicos das escolas, que davam feedback aos professores com base em observações em sala de aula e outros recursos, como livros e exemplos de vídeos online. Além disso, inclui mentoria individual para coordenadores pedagógicos usando um software de videoconferência, o que torna o programa pouco custoso. Uma avaliação de impacto do programa revelou que a intervenção resultou em: maior tempo para ensino em sala de aula, reduzindo o tempo gasto na gestão da sala de aula; uso mais frequente de estratégias interativas para melhorar o engajamento dos alunos; e um aumento geral nos resultados acadêmicos dos alunos em exames estaduais e nacionais.

Fonte: (OCDE, 2019[5]), Talis 2018 Results (Volume I): Teachers and School Leaders as Lifelong Learners [Resultados da Talis 2018 (Volume I): Professores e Gestores Escolares como Aprendizes ao Longo da Vida], https://doi.org/10.1787/1d0bc92a-en.

Quanto a outros tipos de aprendizagem colaborativa, as evidências sobre o Brasil são mistas

Além da observação em sala de aula, há evidências mais amplas de que os professores podem melhorar seu próprio desempenho por meio da aprendizagem colaborativa com outros professores, já que, em todos os países participantes da Talis, essa prática está associada à autoeficácia do professor e, muitas vezes, à satisfação no trabalho (Darling-Hammond, 2014[50]). Como em outras partes da América Latina, é incomum encontrar redes de professores formais destinadas a apoiar o desenvolvimento profissional (ver Figura 5.18). Apenas 20% dos professores brasileiros relataram ter lecionado junto com um colega professor, enquanto o número comparável da OCDE chega perto de 30%. Apenas 29% dos professores brasileiros relataram que trocaram materiais didáticos com um colega, muito menos do que a média da OCDE, de 46% (ver Figura 5.19).

Figura 5.18 Percentual de professores que participaram de atividades de desenvolvimento profissional no ano anterior à pesquisa - 2018

Resultados com base nas respostas de professores dos Anos Finais do Ensino Fundamental

Brasil Média da OCDE

Cursos/seminários presenciais

Leitura de literatura profissional

Conferências de Educação onde professores e/ou pesquisadores apresentam suas pesquisas ou discutem questões educacionais

Cursos/seminários online

Outros tipos de atividades de desenvolvimento profissional

Observação de pares e/ou auto-observação e treinamento como parte de um programa escolar formal

Participação em uma rede de professores formada especificamente para o desenvolvimento profissional de professores Visitas de observação a outras escolas

Visita de observação a instalações comerciais, organizações públicas ou organizações não governamentais

Programa de qualificação formal

0 10 20 30 40 50 60 70 80

Fonte: (OCDE, 2019[21]), Banco de Dados da Talis 2018, https://www.oecd.org/education/talis/talis-2018data.htm (acesso em 14 de outubro de 2020).

Por outro lado, em outras medidas, como na participação em aprendizagem profissional colaborativa, os professores brasileiros pareciam mais ativos do que em outros países. Quase metade (49%) dos professores dos Anos Finais do Ensino Fundamental, no Brasil, relatam que agendaram um horário para colaborar no desenvolvimento de materiais didáticos, um pouco mais do que nos países da OCDE, onde o número equivalente é de 44%.

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