Foca Livre 216

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FOCA LIVRE jornalismo UEPG | março 2021 | n° 216

Início de 2021 é o pior momento da pandemia em Ponta Grossa Ana Paula Almeida

ESPECIAL Enquanto em 2020, 199 ponta­grossenses perderam a vida por conta do coronavírus, até o dia 16 de março, quando se completou um ano de pandemia, 300 pessoas morreram na cidade em 2021. p.06

SAÚDE Mais de 12 mil ponta­ grossenses já receberam a primeira dose da vacina contra o novo coronavírus. Prefeitura de Ponta Grossa estima vacinar maiores de 18 anos até outubro. p.10

Mulher reza aos pés do cruzeiro no cemitério São José.

ENTREVISTA

POLÍTICA

OPINIÃO

ENSAIO

Foca Livre entrevista a primeira mulher eleita Prefeita em Ponta Grossa, Professora Elizabeth Schmidt. p.09

Número de mulheres em secretarias municipais cresce 100% em 2021. Apesar do aumento, homens ainda representam 70% das secretarias em PG. p.03

Foca em casa. A edição 216 do Foca Livre é acima de tudo cidadã. p.02

Ensaio fotográfico apresenta cotidiano durante a pandemia em Ponta Grossa. p.12 Maria Luiza Pontaldi

EDUCAÇÃO Devido ao colapso no sistema de saúde em Ponta Grossa, aulas da rede municipal e particular são interrompidas novamente. p.05

ECONOMIA Alimentos da cesta básica estão mais caros em 2021. Estudo de pesquisadores ponta­ grossenses comprova aumento de mais de R$ 140 em um ano. p.04

Rodoviária fechada reflete a cidade vazia.


OPINIÃO

FOCA LIVRE | MARÇO 2021 |

02

Editorial

O

Foca Livre, jornal laboratorial do curso de jornalismo da UEPG, tem como compromisso ouvir e dar voz à população de Ponta Grossa, expondo abusos econômicos ou de poder que sejam cometidos por pessoas que são, de alguma forma, privilegiadas. A atual edição do Foca é muito especial. Originalmente, a edição 216 seria publicada em março de 2020, mas uma pandemia de dimensões inimagináveis impediu que isto acontecesse. Ela é especial porque marca um momento de retomada das produções de Jornalismo UEPG, é importante porque foi feita integralmente de maneira remota. Todas as etapas de produção seguiram a recomendação das instâncias superiores que regem a Universidade, e, neste sentido, é inovadora, porque todos os processos jornalísticos executados por estudantes e professores ocorreram de nossas casas. O percurso até aqui nos trouxe perdas, em todos os sentidos, e exigiu de nós fortalecimento enquanto profissionais e, principalmente, enquanto cidadãos. Vale destacar o quão difícil é para nós, estudantes do 2º ano do curso de jornalismo, realizar todo o processo - desde a reunião de pauta até a publicação do jornal exclusivamente de casa. Na teoria, pode até parecer mais simples, pois não tivemos que nos deslocar para determinados locais da cidade para realizar a apuração. Entretanto, diversos fatores deixaram as atividades práticas ainda mais estressantes. Dito isto, é com sentimento de trabalho cumprido que publicamos o primeiro Foca totalmente digital. O jornal tradicionalmente apresenta uma visão cidadã da-

quilo que ocorre em Ponta Grossa. Nesta edição, mostramos um pouco do que a pandemia causou na cidade, com um balanço dos doze meses de Covid-19 no município, os impactos econômicos, o preço elevado dos alimentos, a importância dos auxílios emergenciais na vida dos ponta-grossenses. Abordamos ainda a situação do retorno das aulas presenciais das escolas em Ponta Grossa e, em meio às dificuldades causadas pela crise pandêmica para diferentes grupos, como desempregados e artistas, tratamos também do impacto em setores como o turismo e lazer. A projeção da vacinação contra a Covid19 na cidade também é pauta deste Foca que, ainda, traz uma entrevista exclusiva com a nova prefeita da cidade, eleita no final de 2020. E, aqui, chamamos atenção para a gestão municipal diante de todos os temas pautados pelo jornal. Neste momento, em que a cidade de Ponta Grossa enfrenta o estágio mais crítico da pandemia,

no período que marca um ano do início da crise epidêmica, nós reiteramos que existem responsáveis pelo atual momento que a cidade se encontra. E que eles devem ser responsabilizados, como também devem ser responsivos. Destacamos que a atual gestão da Prefeitura Municipal é uma continuidade da gestão que comandou Ponta Grossa nos últimos oito anos. Do mesmo modo, deu continuidade às medidas de enfrentamento à pandemia de Covid-19, as quais, infelizmente, mostraram-se insuficientes. Afinal, 499 ponta-grossenses perderam a vida por conta dessa doença neste último ano, de 16 março de 2020 a 16 de março de 2021. E muitos ainda continuarão morrendo se nada de efetivo for feito. Os números, frios, não revelam o peso que cada uma destas mortes teve, nem expressam a dor das famílias que perderam seus entes. E, por mais que muitas pessoas não se choquem com os números atualmente, de tão absurdos que se tornaram, eles são sintomáticos, reais, e expõem o plano de combate à pandemia da cidade de Ponta Grossa, insuficiente e ineficaz. As mortes são a face mais triste desta situação, mas não podemos ignorar as pessoas que perderam seu sustento, que perderam suas casas, que ti-

veram seus negócios fechados, ou as pessoas que terão, para o resto da vida, sequelas deixadas pelo vírus. As medidas de combate à pandemia impactaram a sociedade de uma forma geral, e as pessoas que implementaram e executaram tais medidas são responsáveis pelo atual momento de Ponta Grossa. Não há desculpas. A campanha eleitoral, medidas que desestabilizaram a economia, o lockdown que deveria ter sido mantido por um período maior no início da crise, são medidas que demonstram a contradição do Poder Público, que tomado de incerteza adotou medidas que não foram suficientes, e que muita das vezes foram, acima de tudo, medidas políticas, visando a boa relação com instituições da cidade ao invés do controle e combate rígido à disseminação do vírus. E este Foca Livre também faz referência com extremo pesar, ao falecimento de Domingos Silva Souza, o "Seu Domingos", figura muito importante para a fotografia da cidade, e que sempre foi muito solícito com os estudantes e projetos do curso. Fica aqui, na lembrança sincera de afeto e na charge desta edição, nossa singela homenagem a ele. Por fim, um ensaio fotográfico sobre o cotidiano em meio a uma pandemia encerra a edição 216 de nosso periódico. Dada a particularidade da produção laboratorial não presencial, contamos com o apoio do Projeto Foca Foto, que cedeu as fotografias produzidas em atividade complementar remota promovida pelo Departamento de Jornalismo da UEPG em junho de 2020. Os detalhes estão na contracapa. Boa leitura! Jornal fechado em 16/03/21.

As edições do jornal laboratorial Foca Livre, produzidas pela turma T34, apresentam uma linha abaixo da palavra "Livre" na marca do jornal. A intenção é alternar a cor durante as edições, de acordo com o editorial de cada mês. Nesta edição, escolhemos o preto em luto a todos que perderam a vida em decorrência do novo coronavírus.


03 | MARÇO 2021 | FOCA LIVRE

POLÍTICA

Apenas 30% das secretarias municipais são ocupadas por mulheres Sem equidade de gênero, homens são maioria nos cargos municipais

Moradores do Lagoa Dourada estão sem ônibus desde o início da pandemia

Rota da linha de ônibus de San Martin


ECONOMIA

FOCA LIVRE | MARÇO 2021 |

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Em período de 12 meses, produtos da cesta básica de alimentos registram aumento de R$ 143,00 Informação é do boletim publicado pelo Nerepp em janeiro de 2021

Por João Gabriel Vieira

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limentos como arroz e óleo de soja atingiram valores recordes entre janeiro de 2020 e janeiro de 2021, mesmo sem apresentarem histórico de aumento. Em setembro de 2020, o arroz teve alta superior a 18% em relação ao mês anterior; em outubro, o óleo de soja apresentou aumento de 9,79% em relação ao mês de setembro. De modo geral, o valor da cesta básica de alimentos em Ponta Grossa passou de R$ 524,12, em janeiro de 2020, para R$ 667,18 no início de 2021. Outro dado apresentado pelo Núcleo de Economia Regional e Políticas Públicas (Nerepp) da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) diz respeito ao montante de renda mensal direcionado por cada família para compra de alimentos. Entre as famílias com faturamento fixo de até um salário mínimo, o total passou de 50,15% no início do ano de 2020 para 63,85% em fevereiro de 2021. Segundo o economista da UEPG, Alexandre Lages, um dos fatores que ajuda a explicar as constantes altas é a mudança do perfil de consumo da população. Com um maior di-

recionamento para o consumo dos produtos dentro de casa, devido às regras de distanciamento social impostas pela pandemia de Covid-19, há maior demanda por produtos como carnes e hortifrutigranjeiros, o que resultou na alta dos preços. Outro fator destacado por Lages é o subsídio oferecido pelo governo federal, através do auxílio emergencial, que gerou uma busca maior por aspectos básicos como a alimentação, o que acabou por aumentar a demanda por produtos do gênero. O economista ressalta ainda a relação e o impacto da subida do dólar, com a estabilização da moeda estrangeira acima dos R$ 5,00, que prejudicou vários produtos básicos que têm em sua produção insumos estrangeiros, como a farinha de trigo. A elevação do preço da farinha impactou uma série de produ-

tos derivados, como pães e massas. Como consequência, o cenário que se desenhou no trimestre final do ano de 2020 foi de uma demanda interna crescente, mas com o direcionamento da produção nacional para a exportação, uma vez que os produtores optaram pela venda para o exterior devido à subida constante do dólar. Outro fator destacado por Lages é o aumento da oferta de serviços de delivery. Aplicativos, redes de distribuição e supermercados aderiram ao modelo que já tem causado uma mudança no perfil do consumo, o que consequentemente impacta nos preços. Segundo o economista, há uma tendência que pode se tornar definitiva, com o interesse crescente dos clientes no serviço ofertado e a entrada no

mercado de multinacionais que operam com valores menores e com um sistema de entregas eficiente. O comerciante Fabiano Camargo, proprietário de um mercado no bairro Nova Ponta Grossa, afirma que as constantes mudanças nos preços dificultaram a relação diária com os clientes e que, mesmo entendendo que se tratava de um momento difícil, o repasse no valor dos produtos era necessário para manter seu estabelecimento funcionando. O comerciante ressalta também que, com o fim do auxílio emergencial, as vendas diminuíram. Segundo ele, os clientes relatam que não podem mais comprar na mesma proporção anterior. Em uma previsão de curto prazo, o economista da UEPG afirma que é improvável que se note uma queda no valor da cesta básica no próximo mês. Lages aponta que tal previsão se baseia no cenário em que o dólar se mantém no atual patamar, superior a R$5,00, a pandemia continua sem grandes alterações e também leva em consideração as sazonalidades de alguns produtos, especialmente os hortifrutigranjeiros. “Então, se houver uma queda, ela não vai ser muito drástica”, complementa.

Governo deve liberar auxílio emergencial de R$250 Por Larissa Godoi O Governo anunciou a volta do auxílio para 2021, no valor de R$ 250 mensais, que serão distribuídos em quatro parcelas. O custo será de aproximadamente R$ 30 bilhões. Se aprovado por Proposta de Emenda Constitucional (PEC), o recurso tem previsão para retorno no mês de março e término em junho. O auxílio emergencial destina-se aos trabalhadores informais, microempreendedores, autônomos e desempregados, com o objetivo de fornecer pro-

teção emergencial e diminuir o impacto econômico no período de pandemia da Covid-19. De acordo com dados disponibilizados pelo Portal da Transparência, em Ponta Grossa mais de 60 mil pessoas receberam o benefício no ano passado. As últimas parcelas foram pagas em janeiro de 2021. Segundo o economista e analista financeiro Anderson Carneiro da Silva, o auxílio fez com que o país não parasse totalmente, evitando assim a falência em cadeia de diversos setores da economia. Segundo ele, o auxílio impediu que milhares de pessoas passassem pa-

ra a situação de extrema pobreza, o que acarretaria outros problemas sociais, como, por exemplo, o aumento no índice de violência. Silva destaca que o programa de transferência de renda foi decisivo para o país sustentar a demanda dos consumidores e garantiu a manutenção e a recuperação parcial de segmentos da economia, como a indústria, comércio e serviços. O recurso foi criado para durar os primeiros três meses de pandemia – abril, maio e junho de 2020, com o repasse de R$ 600 mensais. Com a continuidade da pandemia, houve a

prorrogação da medida até o mês de dezembro. Contudo, a partir de setembro, o valor passou a ser de R$ 300 por parcela Para a dona de casa Jéssica Pistore, o auxílio e o Bolsa Família são as únicas fontes de renda. Quando o benefício de R$ 600 diminuiu pela metade, houve a necessidade de eleger prioridades para o que fazer com o dinheiro. Pistore relata que não fazia compras no mercado e as contas que conseguia pagar com o valor eram as de água e luz. Com a redução, foi necessário escolher entre a alimentação e as contas mensais.


05 | MARÇO 2021 | FOCA LIVRE

CIDADE

Após breve retorno, aulas presenciais são suspensas novamente Com colapso da saúde, as aulas voltaram para formato on-line sem previsão de ocorrer no modelo híbrido

Apesar dos protocolos, aulas presenciais preocupam mães


ESPECIAL

06 | MARÇO 2021 |

PG completa um ano de e 25 mil ponta-grosse A cidade tem UTIs lotadas e o número


| FOCA LIVRE |

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pandemia: 499 mortos enses contaminados de casos e mortes aumenta a cada dia

ESPECIAL


CIDADE

FOCA LIVRE | MARÇO 2021 |

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Turismo de Ponta Grossa tem prejuízo de R$ 300 milhões em consequência da Covid-19 Mesmo com o setor em queda, ecoturismo se destaca

Por Levi de Brito

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pandemia afetou o turismo na cidade e gerou danos de 300 milhões de reais em 2020, segundo dados do Ponta Grossa Campos Gerais Convention & Visitors Bureau (PGCG CVB). As referências decorrem do grande número de eventos cancelados por conta da Covid-19. A única área do turismo que não teve queda foi a de atividades e excursões ao ar livre, com aumento na procura em agências. A atividade turística consegue movimentar hotéis, restaurantes, parques naturais, bares e empresas de eventos. Deste modo, traz pessoas de outras cidades e gera impacto socioeconômico. O setor turístico de Ponta Grossa foca no turismo de negócios e eventos, principalmente em atividades de periodicidade anual e de grande porte. Algumas das atividades canceladas em decorrência do coronavírus, foram a München Fest, a Feira Paraná e os JogosEstudantisMunicipais. O presidente do Sindicato Empresarial de Hotelaria e Gas-

tronomia dos Campos Gerais (SEHG), Daniel Wagner, explica que, para que o turismo aconteça, é necessário movimentação e aglomeração de pessoas. “Essas duas variáveis foram muito impactadas e ficaram muito restritas com a pandemia. Eventos, reunião de pessoas em restaurantes, festas e cerimônias, tudo isso ficou restrito”. De acordo com a presidente do PGCG CVB, Thaís Pius, a movimentação de pessoas gera ocupação nos hotéis da cidade de segunda a sexta-feira. Nos finais de semana, há uma movimentação menor de turistas. Com a pandemia e a paralisação dos eventos e viagens de negócios, muitas famílias passaram a visitar os pontos turísticos da região. Para a presidente do PGCG CVB, há uma retomada do setor turístico, principalmente por conta do turismo de curta distância, quando pessoas de cidades próximas vêm conhecer a região. Thaís também explica que há um aumento do público local nos atrativos turísticos dacidade. “Essa questão do turismo de curta distância está muito forte

Um dos principais pontos turísticos de Ponta Grossa, o Buraco do Padre está localizado dentro do Parque Nacional dos Campos Gerais.

neste momento. A gente consegue perceber claramente um aumento no público local porque isso se torna uma opção mais segura, você vai para mais perto de casa e não se expõe tanto. Então é uma opção que tem sido bastante procurada pelos moradores de Ponta Grossa” reitera a presidente.

Ecoturismo Por outro lado, o turismo de natureza se destaca no período da pandemia. “O crescimento do ecoturismo veio numa hora muito boa, porque as pessoas estão de fato va-

lorizando cada vez mais espaços ao ar livre e áreas naturais”, relata Daniel Wagner. O presidente do SEHG destaca o parque Buraco do Padre como um dos mais atrativos. No primeiro final de semana de reabertura do parque Buraco do Padre em setembro de 2020, houve filas de espera na entrada, nos atrativos e banheiros. O gerente operacional do parque Buraco do Padre, Samuel Vogetta, relata que, após o ocorrido, o parque limitou a venda de ingressos de maneira online e presencial de modo a receber um número menorde visitantes.

Mesmo com retorno, campos de society têm prejuízo na pandemia Por Manuela Roque A decisão da prefeitura de liberar o retorno do setor esportivo privado, em agosto de 2020, evitou que campos de futebol society paralisassem totalmente suas atividades. Durante oito meses, as quadras voltaram a ser alugadas com 80% do faturamento médio pré-pandemia. Até 17 de março de 2021, os estabelecimentos deveriam cumprir algumas obrigações para estarem abertos com restrição de horário. Entre elas, estão a medição da temperatura dos atletas antes de entrar em quadra, a proibição da presença de espectadores nos jogos, de confraternizações após a partida e do compartilhamento de uniformes e materiais entre os jogadores, como o uso dos vestiários para banho. O gerente de um campo de futebol society no bairro Órfãs,

Paulo Roberto Breda, afirma que, de março a agosto de 2020, o estabelecimento perdeu todo o lucro que tinha em comparação aos meses anteriores à pandemia. Para manter o negócio aberto, o empresário alugou de forma exclusiva o espaço para atletas praticarem atividades de condicionamento físico durante a quarentena. Breda lembra que, mesmo com o aluguel do campo, o retorno financeiro não era o mesmo que os dos jogos de futebol. “Eu tinha três horários de aluguel na semana de uma hora só. Eu normalmente alugava, no mínimo, de quatro a cinco horas por dia”, explica. As mesmas dificuldades foram enfrentadas por Andréia Maciel, proprietária de uma arena de society no Jardim Carvalho. Enquanto esteve aberto com restrição de horário, a renda não era completa, pois o maior faturamento estava no horário noturno,

com a abertura do bar e lanchonete em dias de campeonatos transmitidos pela televisão. Já André Armstrong, responsável por um campo de society na Colônia Dona Luiza, conta que a sua empresa não teve tantas dificuldades. Ele relata que possuía reserva em caixa, mas que não foi suficiente para financiar todas as despesas. O prejuízo o obrigou a demitir dois funcionários, o que corresponde a 50% da equipe do campo de society.

O que dizem os atletas Marcos Souza e Victor Mota frequentaram campos de society durante a pandemia. Eles relatam que nem todos estavam cumprindo as medidas de segurança contra a Covid-19. Marcos destaca o não uso de máscara como a prática mais preocupante. “Já aconteceu de eu ser o único atleta usando máscara nos arredores da qua-

dra. Em alguns estabelecimentos o álcool em gel era fornecido, em outros não tem”. Ele também explica que retornou à prática do esporte com menos frequência justamente por não sentir segurança nos locais de jogo. Marcos costumava jogar futebol por lazer cinco vezes na semana antes da pandemia. Já Victor busca carreira profissional no futebol e veio à cidade jogar nas categorias de base do Operário. Atualmente, o atleta é jogador de um clube de futebol amador de Ponta Grossa e relata que retornou à prática do esporte em novembro, participando de jogos em campos de society nos fins de semana. Victor destaca que entre as medidas de prevenção, os atletas se programavam para evitar a utilização dos equipamentos e uniformes disponibilizados pelos estabelecimentos antes do lockdown.


09 | MARÇO 2021 | FOCA LIVRE

ENTREVISTA

“Hoje a gente vê que mulher vota em mulher sim”, afirma Elizabeth Schmidt


CIDADE

FOCA LIVRE | MARÇO 2021 |

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Prefeitura de PG estima vacinar população acima de 18 anos até outubro Dos 355 mil habitantes da cidade, cerca de 250 mil devem ser imunizados SAÚDE Por Deborah Kuki

Vacinação lenta, hospitais lotados e o colapso da saúde

Vacinação em Ponta Grossa

A

estimativa feita pela Prefeitura de Ponta Grossa considera duas possibilidades para imunizar a população. Em um primeiro cenário, do ritmo atual apenas com as doses enviadas pelo Ministério da Saúde, seriam necessários 240 dias para vacinar 250 mil pessoas acima de 18 anos seguindo o Plano Nacional de Imunização. Nesse ritmo, a vacinação terminaria em outubro. Em um segundo cenário, com as doses do Ministério da Saúde mais as doses de um Consórcio de Municípios para compra de vacinas, com média de 40 mil doses a mais por mês, seriam necessários 180 dias para imunizar a população. Assim, a vacinação terminaria em setembro. A vacinação em Ponta Grossa iniciou em janeiro e, até o início de março, 12.443 mil receberam a primeira dose, o que representa 4,9% do objetivo da campanha. E 3.016 mil pessoas receberam a segunda dose, 1,2% do necessário. Profissionais de saúde fazem parte do grupo prioritário para as doses e Bianca Adryan da Silva, agente comunitária, foi vacinada na Unidade Básica de Saúde Cyro de

Dados de 01/03/21

Infografia: Deborah Kuki

Lima Garcia. “Receber a vacina foi algo gratificante. A vacina é uma luz no fim do túnel. Onde no meio de tanta desgraça, ela veio para dar uma amenizada no que está acontecendo”, conta. O assistente social Marcos Koczur, vacinado em 21 de janeiro, ressalta a importância da vacinação para o retorno das atividades coletivas. “Tomar a vacina significa assumir o nosso pacto enquanto nação para enfrentar a pandemia no país, a qual se soma com uma ‘pandemia da ignorância’, do negacionismo e da descredibilidade do governo federal”, afirma. Koczur entende que reconhecer a vacina contra o Covid-19 como estratégia para o seu enfrentamento, significa afirmar que a ciência é a solução para tal problema.

Vacinação no Brasil Para conter a pandemia em até um ano, o Brasil precisa vacinar pelo menos 2 milhões de pessoas por dia. Os cálculos foram realizados pelo Programa de Pós-Graduação em Modelagem Computacional da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência da Computação de São João del-Rei. Segundo o estudo, com esse número de pessoas vacinadas diariamente a pandemia seria controlada após um ano, independentemente da eficácia da vacina. Já com uma taxa de 100 mil pessoas vacinadas por dia, a doença não seria controlada nesse mesmo tempo. Isso porque o número de casos ativos continuaria alto, com 85.135 casos.

A 3ª Regional da Saúde recebeu, no dia 12 de março, 4080 doses de vacina contra a Covid-19 para serem distribuídas, entre 12 municípios. Segundo a infectologista Gabriela Magraf, a vacinação lenta por conta das poucas doses atrasa o cronograma de imunização, o que, por sua vez, agrava a pressão no sistema de saúde da região de Ponta Grossa. “A vacinação lenta nos grupos prioritários faz com que os serviços de saúde fiquem superlotados, com casos graves e óbitos. Precisamos vacinar esses grupos prioritários que têm muito mais risco de ir a óbito se contrair a doença. Precisamos aplicar a segunda dose”, ressalta a especialista. A taxa de transmissão de 1,8 do vírus levou o sistema de saúde na cidade ao colapso no dia 11 de março de 2021. A UPA Santa Paula paralisou o atendimento ao público devido a não suportar receber mais pacientes e o Hospital Regional de Ponta Grossa também opera com superlotação. Há quase um mês os leitos de UTI covid estão com 100% da ocupação. O pronto atendimento do hospital, que possui capacidade para quatro pessoas, opera com funcionamento acima dos 500%.

Por Leonardo Duarte

Construção civil e serviços lideram geração de empregos na pandemia EMPREGO Por Diego Santana A pandemia de Covid-19 aumentou o número de desempregados no Brasil para 14 milhões, mas, em Ponta Grossa, foram gerados 5.200 empregos entre março e dezembro de 2020 segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED). Os dados apresentados pelo CAGED correspondem à diferença entre admissões e desligamentos no município,

o melhor resultado do Paraná. Na cidade, as áreas que mais geraram empregos foram a construção civil (29%), o setor de serviços (27%), a indústria (21%) e o comércio (16%), segundo a Prefeitura Municipal de Ponta Grossa. Em segunda visita à Agência do Trabalhador de Ponta Grossa, a padeira Antonia Aparecida Ramos conseguiu marcar três entrevistas no mesmo dia. Ela tinha recém chegado de São Paulo e procurava um emprego. Se-

gundo Antonia, a realização de cursos de aperfeiçoamento na sua área de atuação foi um dos diferenciais para conseguir a contratação. “Sou a favor de oportunidades para quem não tem experiência, mas buscar cursos é necessário”, afirma. Evelin Ferreira dos Santos, consultora de vendas, foi algumas vezes até a Agência do Trabalhador no ano passado, logo após a divulgação de vagas de emprego em uma rede de supermercados. Ela

preencheu as fichas de solicitação e aguardou o contato da empresa. Mesmo com todos os requisitos para a vaga, o contato para entrevista nunca aconteceu. Para conseguir pagar as contas, Evelin foi trabalhar de servente de pedreiro em uma obra, onde fez um vídeo com desabafo sobre sua condição enquanto rebocava uma parede. A história viralizou nas redes digitais e fez com que uma provedora de internet contratasse a Evelin como consultora de vendas.


CULTURA

11 MARÇO 2021 | FOCA LIVRE

Artistas estão sem auxílios de renda em Ponta Grossa Área cultural está entre as mais afetadas financeiramente pela pandemia da Covid-19 AUXÍLIO Por Yasmin Orlowski s artistas de Ponta Grossa estão sem receber auxílios cul­ turais do Estado du­ rante a pandemia de Covid­19. No início da quarentena, o Conselho Municipal de Políti­ ca Cultural distribuiu R$ 133.800,00 para mais de 100 artistas da cidade. Já em de­ zembro de 2020, alguns deles foram contemplados pela Lei Aldir Blanc (14.017/2020) por meio de editais da Fundação Municipal de Cultura, que dis­ tribuiu os recursos oriundos do Governo Federal. A lei federal foi criada, durante a pandemia, para aju­ dar o meio cultural afetado pe­ lo isolamento social, pois peças teatrais, shows, aulas de dança e outras ações culturais não puderam ser realizadas. Após o primeiro e único repasse, o au­ xílio não foi renovado e o mu­ nicípio não é responsável por criar novos editais. O presi­ dente da Fundação Municipal de Cultura, Alberto Portugal, afirma que a lei ajudou a classe artística a sobreviver. Segundo ele, o setor cultural é um dos

Créditos: Manuela Roque

grupos, coletivos e projetos e outro para seleção de produ­ ções artísticas e culturais. Os premiados criaram conteúdo nos segmentos de teatro, artes visuais, dança e literatura.

O

Casulo Casa Colaborativa promovia apresentações musicas todos os finais de semana antes da pandemia.

que mais sofre financeiramen­ te, pois foi um dos primeiros a paralisar suas atividades. Do Fundo Nacional de Cultura, Ponta Grossa recebeu R$ 2.239.284,46 para serem distribuídos ao setor cultural a partir da Lei Aldir Blanc. O re­ passe do auxílio ocorreu por meio de três etapas, divididas em editais por finalidades e público­alvo. Na primeira, fo­ ram destinados R$ 9 mil a 126 empresas do setor cultural e empreendedores para subsidi­ ar o pagamento das despesas de manutenção, como contas de água e luz dos espaços cul­

Obras de autores ponta­grossenses para conhecer na pandemia ''As bonecas Negras de Lara”, de Aparecida de Jesus Ferreira Lançada em 2017, a obra relata as experiências de La­ ra e seus dois amigos, Sérgio e Paula, brincando juntos com suas bonecas. A autora explora questões como di­ versidade e valorização das diferenças nas variadas rea­ lidades de cada uma das crianças. Ela também dá destaque para a cultura africana ao introduzir na vivên­ cia da protagonista as bonecas abayomi, de origem ioru­ bá, termo que significa “aquele que traz alegria”. Passadas de geração em geração na família, as bonecas dão um caráter histórico à obra. Criadas por mulheres escravizadas com pedaços de pano das suas próprias roupas, elas serviam para que as crianças brincassem nos navios negreiros. Com a sensibilidade das ilustra­ ções de Élio Chaves, a trama ganha mais vida para que os pequenos leitores sejam transportados para o univer­ so de brincadeiras de Lara e seus amigos. Uma história dedicada ao público infantil, mas com valiosas lições de tolerância e respeito também para os adultos.

turais afetados. Escolas de ar­ tes, música, dança, estúdios fo­ tográficos e de tatuagem, livrarias e danceterias pude­ ram se inscrever, desde que comprovado o mínimo de um ano de atuação na área e sede em Ponta Grossa. Na segunda etapa, fo­ ram destinadas cinco parcelas de R$ 600,00 aos artistas co­ mo renda emergencial. Por fim, foram criados três editais de estímulo à produção cultu­ ral: um de reconhecimento da trajetória de mestres populares e povos tradicionais, um de re­ conhecimento da trajetória de

Artistas beneficiados A Casulo Casa Colabo­ rativa recebeu R$ 15 mil na etapa de subsídio. Segundo a responsável pelo projeto, Tatyla Marques Barreto, o va­ lor foi fundamental para a manutenção da casa em de­ zembro e o pagamento de to­ das as despesas. Ela relata que, sem o auxílio, não have­ ria recurso para o básico. A fim de manter o Casulo, Taty­ la desenvolve algumas estra­ tégias para substituir a renda que ela obtinha com as ativi­ dades culturais no estabeleci­ mento. Mesmo assim, o movimento continua baixo. Já a jornalista e ma­ quiadora Rafaela Martins, uma das responsáveis pelo documentário Drag family: passando o batom de mãe pra filha, recebeu o prêmio de R$ 3.500, como estímulo que foi dividido entre as três respon­ sáveis pela produção.

''Forte Apache”, de Ramon Ronchi Em seu livro de estreia Ramon Ronchi traz uma co­ letânea de poesias produzidas durante mais dez anos. Publicado em 2019, a obra convida o leitor a conhecer a trajetória do poeta, englobando em seus versos temas como a infância, o cotidiano, as vivências como ponta­ grossense e reflexões contemporâneas sobre a realidade da sociedade brasileira. Ronchi também utiliza o eu líri­ co para implementar a subjetividade na escrita. Exem­ plo disso é a poesia “Forte Apache”, na qual o autor utiliza do recurso para abordar temas como conflitos fa­ miliares e violência doméstica. Também presta home­ nagem a grandes nomes da literatura portuguesa e brasileira como Fernando Pessoa, Manoel de Barros e Carlos Drummond de Andrade.

“Saudade”, de Melissa Garabeli e Phellip Willian Finalista do Prêmio Jabuti em 2019 na categoria “História em Quadrinhos”, a HQ ilustrada e roteirizada pelos ponta­grossenses conta a história dos irmãos La­ ra e Thomas, que durante um passeio em família en­ contram um cervo machucado na beira da estrada. As histórias das crianças e do animalzinho se entrelaçam e, aos poucos, percebemos o quão em comum essas per­ sonagens podem ter, e o quanto eles aprenderão um com o outro. A obra aborda temas como amizade, com­ panheirismo, luto, perdas, amor, despedidas, mas aci­ ma de tudo, saudade. A riqueza de detalhes da HQ ajuda a potencializar o quentinho no coração que a his­ tória traz. Uma leitura obrigatória para todos que tem seus fiéis companheiros e que, estejam vivos ou não, sempre serão nossos melhores amigos. Por João Gabriel Vieira e Manuela Roque


ENSAIO

FOCA LIVRE | MARÇO 2021

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