Estórias da Lagoa
O melhor texugo FRANCESCO SMELZO
Tradução de Elizabeth Lemes Dos Santos
Próximo à lagoa havia dois grupos de texugos. Aquele dos texugos “ de Colar” que vivia nas imediações do grande Olmo , chamado assim porque um colar de pêlos brancos enfeitava o peito deles. O outro , aquele dos texugos “ Nariz Rosa” , habitava a margem Sul próximo ao salgueiro e tinham mesmo o nariz cor de rosa ao invés de negro. Antes do inverno, quando os dias tornam-se mais curtos, os dois grupos organizavam um grande encontro no prado próximo à lagoa, para disputar algumas competições de habilidade, que coroariam o “melhor Texugo”. Este título era muito desejado porque o vencedor era honrado e respeitado pelo ano todo : podia pescar onde quisesse, mesmo no território dos outros texugos, sem que estes pudessem protestar; era cumprimentado primeiramente com duas balançadas de cabeça quando cruzava com um outro texugo mesmo se mais velho que ele ( a balançada de cabeça era sinal de homenagem entre os texugos ) e podia escolher o ninho que lhe agradasse , mesmo se este pertencesse a um outro texugo. A tradição dos jogos do “melhor texugo” ( assim eram chamados) começara há muitos e muitos anos atrás . Nenhum dos texugos vivos se recordava o porque.Faziam os jogos simplesmente
1
porque os haviam feito os seus pais e seus avós e assim continuaria. Os texugos mais jovens competiam na esperança de chegarem em primeiro lugar, mas antes ainda de vencê-los, cada um queria que não vencesse os outros, particularmente aqueles do grupo antagonista. Por isso cada grupo tinha alguns “campeões” que eram preparados e cuidados o ano todo em vista do épico encontro. Aquele ano os campeões dos dois grupos eram : De um lado Rolando, pelos texugos do Colar e do outro Orlando dos “Nariz rosa”. Ambos dariam qualquer coisa para vencer e detestavam o adversário de todo coração. As competições em que deveriam participar os concorrentes eram três. Havia a corrida com o peixe na boca, onde os participantes precisavam fazer três voltas pelo prado apertando entre os dentes um peixe, sob pena de desqualificação. Havia depois a competição de “cavar buraco”, que consistia em escavar um buraco o mais fundo possível , no tempo em que o árbitro conseguisse debulhar completamente uma raiz amarga. E finalmente a luta, a competição à qual participavam os primeiros dois vencedores das outras e não tinha regras : Vencia quem conseguisse render ou escapar do adversário.
2
A manhã do dia do encontro o tempo não prometia nada de bom, soprava um vento frio do Norte que trazia consigo algumas nuvens grandes , negras e nada promissoras. Todavia as torcidas dos “Colares” e dos “Narizes rosas” estavam tão “ligadas” que , depois de reunirem-se, os anciães decidiram não remarcar o encontro. Os participantes da competição da corrida com o peixe se alinharam então para a partida, incitados pelos respectivos grupos de torcedores. Rolando , dos “Colares” , sabia que Orlando o “Nariz rosa” naquela disputa era mais forte do que ele...havia espionado-o nas semanas anteriores, quando disparava a uma velocidade incrível tendo na boca uma grande carpa e, diga-se que agora quando, por regulamento, o peixe seria um mais leve, uma tinca. Assim, Orlando pensou de aplicar em Orlando um feio golpe: a noite anterior havia convencido um responsável pela organização da disputa, um “ Colar”, a pôr no lugar de Orlando uma tinca já meio “ passada”. Quando Orlando percebeu era já tarde demais, o árbitro estava para dar o grito do início- entre os texugos usa-se assim- e então precisou fazer uma cara boa à má sorte, abocanhando o peixe meio ensopado. Nas primeiras duas voltas da corrida, o pobre Orlando resistiu heroicamente, mas o mau cheiro do peixe era to forte que , no 3
começo da terceira volta, foi obrigado a deixá-lo cair sendo então desclassificado. Sem concorrentes à sua altura Rolando venceu então a prova facilmente. Havia depois a vez de escavar o buraco, e neste Rolando sentiase bem seguro de si, sabendo que era o mais forte escavador entre os texugos da lagoa. Mas isto também sabia Orlando, que já vira Rolando treinar e o via em condição de escavar buracos fundos como poços. Agora foi Orlando a cogitar um truque; nas semanas anteriores à prova escavara um buraco no prado e ali colocara uma grande pedra, cobrindo tudo com terra. Neste ponto havia já crescido o mato e nada fazia crer que ali havia uma escavação. Foi Orlando a pôr-se de acordo com o árbitro da disputa, acrescentando que era desta vez um “Nariz rosa”, para que Rolando fosse designado naquele lugar. O texugo árbitro deu o grito do início e começou a debulhar a raiz amarga. Após poucas patadas Orlando encontrou-se diante da pedra e, por mais que escavasse, quebrando os unhões, não conseguiu nem mesmo arranhá-la. Então , ao fim da competição, Orlando que era o mais hábil escavador foi obviamente o vencedor. Os dois campeões então se encontraram frente a frente na terceira prova, aquela da luta. O 4
ódio com que se olhavam dava para compreender que daquela vez um dos dois não se levantaria mais. E a luta começou, violenta e cheia de golpes baixos. Mordidas na barriga e unhadas no nariz. Porem acendeu-se também entre os dois grupos de torcedores, os “Colares “ insultaram pesadamente os “Narizes”, chamando-os de “descoloridos” e estes devolviam chamando-os de “bolão”, por causa do colar branco. Dos insultos os dois grupos passaram em breve à rixa e já ninguém fazia mais caso da luta entre Orlando e Rolando, cada um agora empenhado na sua própria luta contra o adversário. Mas ninguém também fez caso do tempo, que mudara neste ínterim. As grandes nuvens, trazidas pelo vento do Norte, começaram a descarregar água aos cântaros e o rio que levava água à lagoa saíra dos diques , alagando o prado. Os raios golpeavam algumas árvores a volta do prado que caíram sobre os texugos, impedindo-os de escapar das águas que subiam , arriscando de matá-los afogados. Foi então que Rolando e Orlando olharam-se nos olhos, desta vez sem ódio e compreenderam. Os dois campeões procuraram cada um salvar da morte seus semelhantes. Rolando, o escavador, escavando sob as árvores para ajudar os texugos encurralados e Orlando, o corredor, levando na boca os
5
filhotes que vagavam pelo prado alagado, mantendo-os pela nuca. Infelizmente nem todos os texugos se salvaram, mas os sobreviventes concordaram que aquele ano seriam proclamados dois campeões. E desde então entre os “Colares” e os “Narizes” não houve mais rivalidade e o encontro anual transformou-se em um grande almoço a base de raízes amargas , que os texugos realmente adoram. Tradução de Elizabeth Lemes Dos Santos
6