O ourico riccardo

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Histórias da Lagoa

O ouriço Riccardo FRANCESCO SMELZO

Tradução de Elizabeth Lemes Dos Santos


Na lagoa, dentro de um ninho cavado no velho carvalho, vivia um velho corujão. Nenhum dos outros animais saberia dizer com certeza quantos anos ele tinha, porque todos haviam nascido depois dele. O corujão Pompeo- este era seu nome- era considerado o animal mais sábio da lagoa. Tinha uma resposta pronta para tudo. “Pompeo, será um inverno frio?”- “Pompeo, segundo você onde seria melhor construir o ninho para evitar que seja destruído pelo rio nas cheias?”- “ Pompeo, meu marido ficará bom da doença?”-estas e muitas outras eram as perguntas que lhe faziam continuamente os animais. Pompeo respondia , apoiado no galho em frente ao seu ninho, depois, aborrecido por tantas perguntas, voltava para seu buraco, sacudindo as penas e resmungando : “ não se pode estar em paz nem um minuto para para tomar um pouco de ar! “ Diz-se- mas estas são vozes não confirmadas,transmitidas por gerações- que o ninho de Pompeo, com aquela entrada assim incômoda, dentro era muito espaçoso e tinha muitos livros. Parece – sempre segundo as vozes- que na juventude o corujão fora criado por humanos, em uma vila próxima da cidade e aprendera a ler.

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Como houvesse conseguido os livros é um mistério, há quem dizmas são sempre vozes- que uma noite um carro cheio de livros dirigia-se para a cidade e quando passava próximo da lagoa quebrou uma roda, derrubando parte da carga na beira da estrada. Diz-se que Pompeo , que ainda era um jovem corujão, levara os livros abandonados pelos humanos, que foram procurar ajuda, e levou-os um a um para seu ninho e depois fechou-se e leu-os por muitos anos. De qualquer forma que estivessem as coisas Pompeo sempre tinha uma resposta pronta sobre tudo, bastava não insultá-lo com demasiadas perguntas.Na primeira pergunta levantava uma asa , arranhando-a com a pata, na segunda pergunta levantava as penas da cabeça como se tivesse uma crista, na terceira pergunta apertava os grandes olhos amarelos e na quarta...bem, na quarta reagia como disseramos antes: entrava no seu buraco, sacudindo as penas e resmungando. Os animais da lagoa então sabiam que tinham no máximo três perguntas quando queriam perguntar alguma coisa ao corujão. Tornara-se também uma maneira de dizer. Quando algum animal fazia a outro uma pergunta difícil, muitas vezes este respondia:”...e como vou saber! Pergunte ao corujão!” “ Pergunte ao corujão” disse aquele dia mamãe Ouriça a seu filho Riccardo. 2


O ouriço Riccardo era o menor da ninhada da mamãe Ouriça.E ao contrário de seus irmãos que iam sempre ao bosque a procura de minhocas, Riccardo estava sempre às costas de sua mãe martelando-a com perguntas. Aquele dia lhe fez uma pergunta realmente estranha: “ mamãe, mamãe onde o sol vai quando se põe?” “Oh Riccardo curioso...Mas como vêm a sua cabeça estas coisas? Como posso saber para onde vai o sol...irá onde ele quiser. Vá ao bosque procurar minhocas com seus irmãos!” “ Mas mamãe, eu tenho muita curiosidade de saber onde o sol vai à noite, quem poderá me dizer?” Mamãe Ouriça, tomada pelo desconforto , exclamou então – “ pergunte ao corujão! E agora vá com seus irmãos que tenho muito que fazer.” O ouriço Riccardo tomou ao pé da letra o conselho da mãe e partiu a procura do corujão. Perguntando aos animais que encontrava, chegou então sob o velho carvalho, encontrando o corujão Pompeo encolhido à frente do ninho, aproveitando a frescura da aragem. Ninguem porém havia dito a Riccardo da estória das três perguntas e do mau gênio do corujão, e assim ele pôs-se a gritar sem nenhuma timidez: “ corujão, CORUUUUJÃO!!!”

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Este aborrecido com aquele barulhão, respondeu: “ o que diabos você quer pequeno porta-alfinetes!” “ Você sabe para onde vai o sol quando se põe?”- perguntou-lhe logo o ouriço. O corujão levantou a asa, arranhou-a com a pata e respondeu: “ O sol nada mais é que uma das tantas estrelas, só um pouco mais próxima de nós, não é ele que vai embora, é a terra que girando sobre si mesma lhe volta a face, expondo ao sol um outro lado e deixando no escuro aquele onde nós vivemos.” Vieram à mente do ouriço Riccardo um milhão de coisas para perguntar ao corujão, mas no fim escolheu uma: “ Corujão sábio, mas o sol e as estrelas e o universo inteiro quanto são grandes?” O corujão levantou as penas da cabeça como se possuísse uma crista e respondeu: “ Se toda a lagoa fosse todo o universo, um grãozinho de areia que você tem sob seus pés, seria todo o universo que você poderia ver e conhecer com os mais potentes instrumentos que temos .” O ouriço pensou sobre a resposta do corujão, ficando em silêncio por um bom tempo. Depois disse ao corujão: “ Se somos apenas um grãozinho de areia diante de toda a lagoa não poderemos nunca chegar a conhecer tudo, veremos no 4


máximo os grãozinhos de areia que estão perto de nós, mas não aqueles que estão na outra margem !” O corujão desta vez não apertou os grandes olhos amarelos e ficou em silêncio ,agora ele, por um bom tempo, olhando o pequeno ouriço, Finalmente lhe disse: “ Obrigado rapaz, hoje foi você que ensinou-me uma coisa muito importante.” “ Que coisa?”- respondeu Riccardo. “ Que por mais que me esforce, nunca chegarei a saber tudo.” “ Mas o importante é...experimentarmos, não é mesmo?- disse o ouriço. Contrariando seus próprios hábitos, na quarta pergunta o corujão não voltou para seu ninho, sacudindo suas penas e resmungando, mas disse: “ Sim , pequeno ouriço, o importante é experimentarmos.” E daquele dia em diante, o ouriço e o corujão tornaram-se grandes amigos. Era possível encontrá-los, quase todas as tardes, antes do pôr do sol, no velho carvalho próximo à lagoa, a conversar por horas, ficando em silêncio algum tempo a fixar o horizonte, como se procurassem ver ao menos um grãozinho de areia mais além.

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Tradução de Elizabeth Lemes Dos Santos

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